o Design e os Quadrinhos

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SUMÁRIO História dos Quadrinhos

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O Design Gráfico e os Quadrinhos

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Formato

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Materiais e Processos

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Grid

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Tipografia

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Ilustração

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Referencial Bibliográfico

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O quadrinho de Richard Fenton Outcalt, The Yellow Kid, é por muitos considerado a primeira história em quadrinhos, e já traz consigo muitos dos elementos que ainda hoje caracterizam o meio

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HISTÓRIA DOS QUADRINHOS As primeiras manifestações das Histórias em Quadrinhos são no começo do século XX, na busca de novos meios de comunicação e expressão gráfica e visual. Com o avanço da imprensa, da tecnologia e dos novos meios de impressão possibilitaram o desenvolvimento desse meio de comunicação de massa. Entre os precursores estão o suíço Rudolph Töpffer, o alemão Wilhelm Bush, o francês Georges (“Christophe”) Colomb, e o brasileiro Angelo Agostini. Alguns consideram como a primeira história em quadrinhos a criação de Richard Fenton Outcalt, The Yellow Kid em 1896. Outcalt essencialmente sintetizou o que tinha sido feito antes dele e introduziu um novo elemento: o balão. Este é o local onde se põe as falas das personagens. Nas primeiras décadas os quadrinhos eram essencialmente humorísticos, e essa é a explicação para o nome que elas carregam ainda hoje em inglês, comics (cômicos). Algumas destas histórias eram Little Nemo (de Winsor McCay), Mutt & Jeff (de Bud Fisher), e Popeye (de E.C. Segar). Os temas das histórias eram basicamente travessuras de crianças e bichinhos, e dessa época vem às designações kid strips, animal strips, family strips, boy-dog strips, entre outros.

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O crack da Bolsa de Valores em 1929 foi um ponto importante na história da história em quadrinhos, e nos anos 30 eles cresceram, invadindo o gênero da aventura. Flash Gordon, de Alex Raymond, Dick Tracy, de Chester Gould e a adaptação de Hal Foster para o Tarzan de E. R. Borroughs são conhecidos como o início da A Era de Ouro (Golden Age). Nesta década, três gêneros essenciais eram produzidos: a ficção científica, o policial e as aventuras na selva. Tarzan de Foster era uma adaptação sem balões e cheia de ação do livro de Borroughs, e o Dick Tracy de Gould era parcialmente inspirado nos gangsters de Chicago (onde Gould vivia), Flash Gordon era um produto total da imaginação de Alex Raymond, que também trazia o Agente Secreto X-9, Jim das Selvas e Nick Holmes. Na década de 30 tambem foi criado o primeiro herói uniformizado, Fantasma, escrito por Lee Falk e desenhado por Ray Moore. Falk também criou Mandrake, o mágico, que possuía os desenhos de Phil Davis. No final da década de 30, surgiu o primeiro super-herói que possuía identidade secreta, Superman de Siegel and Shuster. Muitos o destacam como o personagem que marca o início da Era de Ouro.O Superman foi criado em 1933, mas só chegou às bancas em 1938, depois que a dupla vendeu seus direitos para a DC Comics para ser publicado na revista Action Comics 1. 12


Poucos meses depois, teria início a Segunda Guerra Mundial, deflagrada pelas ações expansionistas de uma Alemanha comandada por Adolf Hitler desde 1933. No caldeirão ideológico daqueles anos, os quadrinhos logo despertaram interesses políticos. E o Homem de Aço, como um dos principais representantes desta forma de arte tornou-se alvo de polêmicas. Por causa da irmã de Friedrich Nietzche, os nazistas haviam se apropriado indevidamente de vários conceitos filosóficos deste autor alemão, inclusive o do übermensch que traduzido acaba, de certa maneira sendo similar ao título de Superman, sendo assim, preciso o fim do conflito mundial para que se denunciasse a deturpação do pensamento nietzchiano e se desfizesse o equívoco que pairava sobre o filósofo alemão. Quando superman surgiu em cena foi logo colhido pela confusão vigente. As pessoas de esquerda no mundo inteiro, desde o princípio, acusaram-no de ser símbolo do imperialismo norte-americano e, de quebra, da arrogância fascista. Já os políticos linha-dura do Partido Republicano viram nele a personificação do tal superman nazista.Nas palavras dos assessores de Hitler, o Superman não passava de um judeu. Em 1939 surgiu o herói aquático Namor, o Príncipe Submarino que despontou como o inimigo número um de toda a humanidade por ser um híbrido humano-atlante. Ele teve como opo13


nente o herói cibernético Tocha Humana (um andróide flamejante dotado de avançada tecnologia que ao contato com o oxigênio, podia inflamar-se). Namor criado por Bill Everett, além de ser um híbrido era dotado de super-força, domínio sobre os seres do mundo aquático, possuía o dom de voar e capacidade de respirar dentro e fora d’água. O Tocha Humana, por sua vez, apareceu pela primeira vez na Marvel Comics 1, numa história escrita e desenhada por Carl Burgos. Apesar do nome, ele não era realmente humano, mas um robô confeccionado pelo Prof. Phineas Horton. Apesar de comumente associados a super-heróis ou histórias para crianças, os quadrinhos são um meio bastante extenso, servindo de base inclusive para premiados textos jornálisticos e literários, como este exemplo de Joe Sacco, sobre o conflito entre israelenses e palestinos no oriente médio

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A interferência do governo que na época se deparava com a Segunda Guerra Mundial mostra como os Comics chamaram atenção das autoridades que perceberam o fascínio e a preocupação de seu poder como comunicação de massa. Ambos os heróis, tanto Namor quanto o Tocha Humana, fizeram parte do crossover significativo dos quadrinhos, era uma batalha entre fogo e água que despertaram grande interesse no público. No entanto, quis o desenrolar dos acontecimentos mundiais que Namor e Tocha chegassem a um acordo. Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial e a entrada dos Estados Unidos no conflito, o presidente Franklin Delano Roosevelt (1933-1945) “convocou” todos os heróis... e super-heróis para o esforço bélico do país.


Com isso, os dois aventureiros passaram a visitar histórias um do outro de tempos em tempos, agora aliados contra alemães e japoneses. Esta união espelhou um movimento muito semelhante que ocorria, na cena mundial. Países historicamente antagônicos juntaram esforços – ainda que a contragosto – contra as potências do Eixo. Em 1946, quase acompanhando o espírito da criação da Organização das Nações Unidas, os dois heróis tornam-se membros – juntamente com o Capitão América, Miss América e Whizzer – do efêmero All Winners Squad (ou como o grupo foi traduzido para o Brasil como Os Invasores). No período de 1940 até 1945 foram criados aproximadamente quatrocentos super- heróis, mas nem todos sobreviveram. O campo evoluiu, expandindo suas fronteiras e tornando-se parte da cultura de massa. Dois merecem destaque: Batman, criado em 1939 por Bob Kane, uma figura sombria (inspirada na máquina voadora de Da Vinci e no Zorro) cuja fama ultrapassaria a do Superman nos anos 80, e o Capitão Marvel, de C.C.Beck, um jovem que ganhava poderes mágicos toda vez que falava a palavra Shazam!, um acrônimo de nomes de deuses antigos. Vários personagens se alistaram e foram para a II Guerra Mundial, e os quadrinhos se tornaram armas ideológicas para elevar o moral dos soldados e do povo.

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O maior ícone do período da guerra é o Capitão América, de Jack Kirby e Joe Simon. Na capa de sua primeira revista ele combatia o próprio Adolf Hitler. Ao contrário de outros heróis, que acabaram “recrutados” para lutar na Segunda Guerra Mundial, o Sentinela da Liberdade foi criado especialmente com esse objetivo político. Desde o início, a única arma que o herói usou foi um escudo. A princípio, quase triangular, esta peça adquiriu, já na segunda edição, o formato circular famoso até os dias de hoje. Em momento algum, o Capitão América usou qualquer outra arma. É como se dissesse, para que todos ouvissem, que a “liberdade” é um valor que tem de ser defendido. Por outro lado, isso representa também a imagem que os Estados Unidos tinham de sua participação no conflito mundial, ou seja, aos próprios olhos, a América “apenas” defendia- se de ataques. Em todo o caso, seus companheiros de luta como o jovem Bucky, usava às vezes uma metralhadora. Outro fato curioso e que fala mais do imaginário dos norteamericanos do que da realidade propriamente dita é a escolha do arqui-inimigo do Capitão. A origem de seu oponente era de que o Caveira Vermelha foi treinado pelo próprio Hitler a fim de pôr em prática os interesses do 3° Reich.

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Nos anos 50 os quadrinhos foram alvo da maior caça as bruxas que já aconteceu por este meio de comunicação de massa. O psiquiatra Frederic Wertham escreveu um livro, A Sedução do Inocente (The Seduction of the Innocent), onde ele acusava os quadrinhos de corrupção e delinqüência juvenis. Nas 400 páginas de sua obra, o psiquiatra alemão esmiuçou suas idéias sobre o “verdadeiro intento subversivo” por trás dos quadrinhos. Dentre as hipóteses do tratado, havia a de que a Mulher Maravilha representava idéias sadomasoquistas e a da homossexualidade da dupla Batman & Robin. Entre outros argumentos de Whertham, também estão que os quadrinhos incitavam a juventude à violência – bem como havia acontecido com o rock’n’roll – havendo então um Código de Ética, para limitar e regular o que podia (e o que não podia) aparecer nas páginas limitando assim o alcance e a maneira de enfocar os assuntos, o que acabou por destruir todos os títulos de terror da EC Comics, exceto um, a revista humorística: Mad. Foi quando surgiu numa tira de jornal aparentemente inocente sobre um grupo de crianças: Peanuts, de Charles M. Schulz. Charlie Brown, o personagem principal, é um garoto de 6 anos, perdedor nato, simboliza a insegurança, a ingenuidade, a falta de iniciativa; um eterno esperançoso. Seu cão, Snoopy, é um beagle filosófico em cima de sua casinha vermelha. Esta tira

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marcou o começo da era intelectual dos quadrinhos, com uma maior valorização do texto sobre as imagens. Ainda na década de 50 o medo passou a estar em toda parte do mundo. Os soviéticos fizeram a bomba atômica e os americanos atacavam contra tudo que soasse como ataque velado e subversivo dessa superpotência ao seu “american way of life”. Enquanto, na vida real, a população procurava comunistas debaixo da cama, nas páginas das histórias em quadrinhos, os heróis faziam sua parte. Com o fim do conflito mundial e a polarização de forças entre EUA e URSS, o alvo das investidas não era mais os alemães e japoneses. Eram tempos em que se confundiam marxistas com comedores de criancinha. Numa demonstração de que comuna bom é comuna morto, Namor rechaçava insidiosos golpes de aquáticas foices e martelos, enquanto, de volta por um breve período no ano de 1954, o Capitão América enchia de socos os anticomunistas. Na década de 60 começou a Era de Prata dos quadrinhos que consolidaram a renovação no mundo dos super-heróis iniciada com o novo Flash da DC Comics em meados da década anterior. Logo após retornaram Superman, Mulher-maravilha, Batman, Aquaman, entre outros. Diante do sucesso da editora rival, em 1961, Martin Goodman, o diretor da Atlas Comics

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(antiga Timely Comics), pediu a Jack Kirby e Stan Lee que bolassem super-heróis capazes de fazer frente à Liga da Justiça da América. Os dois aproveitaram, então, o conceito de uma criação prévia de Kirby, os Desafiadores do Desconhecido, e acrescentaram superpoderes às personagens. Surgiu assim o Quarteto Fantástico da Marvel Comics, empresa herdeira da Atlas. Stan Lee e Jack Kirby desconsideraram todos os clichês das histórias de super- heróis existentes até então. Essa equipe de heróis não possuíam identidades secretas e eram uma família ao invés de uma equipe. Sue e Johnny Storm eram irmãos, Reed Richards era o noivo de Sue e Bem Grimm o amigo da família. Reed Richards era um cientista que preferia usar seu intelecto a seus poderes elásticos. O adolescente Johnny era o novo Tocha Humana. Sua irmã, Sue, podia se tornar invisível e projetar campos de força. E Ben Grimm, era uma rochoso Coisa, era dotado de enorme força, mas sua aparência aterradora ocultava a amargura de um ser desfigurado. Então, estavam os heróis simbolizando os quatro elementos da natureza: água, fogo, ar e terra respectivamente. Por trás de um grupo de amigos que, vitimados por um “acidente cósmico”, ganham superpoderes, havia um forte paralelo com a mais significativa 19


questão política daquele momento: a Guerra Fria e a paranóia anticomunista. Em 12 de Abril de 1961, o cosmonauta soviético Yuri Gagarin tornou-se o primeiro ser humano a alcançar o espaço. A notícia surpreendeu os Estados Unidos e acirrou os piores temores de seus habitantes. Era o auge da Guerra Fria. O duro golpe faz o presidente John Kennedy jurar que os norte-americanos chegariam à Lua antes do fim da década, derrotando a União Soviética naquela que viria a ser a Corrida Espacial. O Quarteto Fantástico foi à resposta dos quadrinhos ao apelo do dirigente da nação. Eles personificavam a nova era espacial, na qual seus heróis estavam dispostos a arriscar tudo, até mesmo a própria vida, para estar a um passo adiante da ameaça vermelha. Já na primeira edição de Fantastic Four, Sue Storm não poupa esforços para persuadir o relutante Ben Grimm a pilotar o foguete desenvolvido por seu amigo Reed Richards. “Ben, nós temos que tentar! A não ser que você queira que os comunistas cheguem na frente”.Devido ao sucesso outros quadrinhistas como Steve Ditko, Don Heck, Gene Colan, John Buscema e John Romita, desenvolveria a infinidade de heróis da Marvel que estão em destaque até os dias de hoje (2006). Dentre os mais conhecidos estão Homem- aranha, Hulk, Thor, Homem de ferro, X-men, entre outros. 20


A década de 70 surgem os Quadrinhos underground sendo vendidos em head shops e de mão em mão. Crumb, os Freak Brothers de Gilbert Shelton , S. Clay Wilson, Victor Moscoso, Bill Griffin estão entre os mais conhecidos. Do outro lado do oceano, alguns desenhistas franceses -- Moebius, Phillipe Druillet, Jean Pierre Dionnet, e Bernard Farkas --, reunidos sob a efígie Les humanöides associées, criam em 1974 uma revista histórica, Métal Hurlant, que chega aos EUA em 1977 como Heavy Metal. Fantasia, ficção científica, viagens psicodélicas, rock’n’roll, corpos nus, novas diagramações e literatura são parte do confuso mix que fez o sucesso da revista. Da Itália vem grandes quadrinhos, como Ken Parker, de Berardi e Milazzo, Corto Maltese, de Hugo Pratt, e O Clic, de Milo Manara. Nos anos 80, os americanos criaram a “graphic novel” (ou romance gráfico) direcionado para o público adulto. O grande destaque e carro chefe dessa nova linha foi à história de um Batman sombrio, amargurado e violento, o cavaleiro das trevas de Frank Miller decretava a maioridade no mundo dos super-heróis.

Os quadrinhos tem ganhado importante atenção nos últimos anos por fornecerem material para ser explorados por outras indústrias, como bonecos, filmes, material escolar e video games. O personagem Spawn (acima) por exemplo, já foi adaptado para todos estes segmentos

Violência, insanidade, sensualidade e dúvidas existênciais passaram a habitar os quadrinhos, vindo dentre estas obras Elektra Assassina de Frank Miller, Watchmen de David Gibbons e Alan Moore, Sandman de Neil Gaiman entre outros. 21


A partir da década de 90, os grandes desenhistas das historias em quadrinhos da atualidade saíram das duas maiores editoras de quadrinhos – a Marvel Comics e a DC Comics – e fundaram a Image Comics (os heróis eram Savage Dragon de Erik Larsen, WildC.A.T.S. e Gen 13 de Jim Lee, Spawn de Todd McFarlane, Cyberforce, Strykeforce, e The Darkness de Marc Silvestri). Este momento trouxe dois marcos para as histórias em quadrinhos americanas, a primeira era a colorização computadorizada e a influência dos Mangás (quadrinhos japoneses) na caracterização dos personagens. Os desenhistas americanos começaram a sofrer influência dos Mangás em seu traço. Porém, após o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001 as duas torres gêmeas dos EUA afetou o mercado de quadrinhos americano que decidiram fazer um resgate ao estilo da arte dos pioneiros dos quadrinhos da Era de Prata e da década de 80. Dentre os artistas estavam Jack Kirby, John Romita, Steve Dikto, Sal Buscema, John Byrne e George Perez. Não só a arte dos quadrinhos, mas também os roteiristas e editores decidiram fazer esse resgate também das origens dos personagens. É fato que nos EUA bem como em outros países devido ao avanço tecnolóvhos de Hellblazer, Hellboy de Mike Mignola, e Homem- aranha, Hulk, Superman, Batman, Demolidor, Elektra, Liga Extraordinária, Do Inferno, V de Vingança, Estrada para 22


Perdição, Quarteto Fantástico, Spawn, X-men que se firmam, expandem e propagam ainda mais esse meio de comunicação de massa. Atualmente, os quadrinhos possuem influência ainda maior, a medida que sua aproximação com o cinema torna seu conteúdo mais visível, rentável e popular, e novas tecnologias, como o iPad, prometem reposicionar o mercado dos quadrinhos, conquistando novos fãs e fazendo com que antigos fãs retomem seu antigo hábito. Apesar disto, há ainda muito que se construir no sentido do reconhecimento dos quadrinhos como uma forma legítima de expressão artística; a nona arte.

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Se abordamos as histórias em quadrinhos com o olhar do design editorial, veremos que os dois campos possuem muitos aspectos em comum, de forma que ambas áreas podem beneficiar uma a outra

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IMAGEM DE UM QUADRINHO - texto falando sobre o processo de composição do quadrinho


O DESIGN GRÁFICO E OS QUADRINHOS Este trabalho tem o intuito de estabelecer um paralelo entre o design editorial e produção de histórias em quadrinhos através da explicitação das suas semelhanças estruturais, possibilitando desta forma, uma abordagem do design (e dos designers) a um meio que é tido normalmente como restrito a ilustradores. Tal abordagem se torna possível à medida que olhamos para os elementos do quadrinho como estruturas de significação que funcionam de acordo com um propósito, contar uma história específica para determinado público. Tal definição, por si só, já torna as histórias em quadrinhos mais próximas do design, onde temos a configuração da forma que ocorre devido a uma determinada função.

Muitas vezes desenhistas, dentro das histórias em quadrinhos, se ocupam de funções típicas do designer, como a criação de símbolos e uniformes para heróis

Tanto no design editorial quanto nos quadrinhos, temos o direcionamento sendo sustentado pela idéia central do projeto, em que os elementos funcionam como facilitadores para as resoluções futuramente aplicadas. Essa percepção resume uma forma básica de plano a seguir, mas sem se colocar como uma única forma de ser realizada, visto que mesmo com uma prédefinição de objetivo o caminho a ser traçado se torna tortuoso. O numero de opções e combinações aplicáveis a um mesmo fim é crescente, e durante surgirão bifurcações e diferentes variáveis.

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O formato das histórias em quadrinhos em geral possui pouca variação em relação às proporções, (normalmente em torno de 70%, sofrendo algumas variações para se adequar ao formato econômico) sendo as maiores diferenças em relação ao tamanho

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FORMATO Determinar o formato da peça editorial pode ser considerado como um primeiro passo, todavia por se tratar de um sistema maleável onde esta é uma das peças, ele pode ser reposicionado em um momento a fim de ser ajustado para a melhoria do todo. Entre opções geométricas ou baseadas nos corpo interno seu propósito final é, em conjunto com o resto, passar o recado. Ou seja, para suas dimensões deve se considerar a facilidade de manuseio, o volume de informações e respectivas escalas, tudo isso agregando um diferencial para a peça. Estas definições se fazem extremamente importantes durante o processo ao direcionar para o alvo final, a fim de aperfeiçoar a interpretação. Ao escolher o tamanho e proporções de um impresso, várias informações devem ser levadas em consideração, as dimensões e suas relações podem variar indefinidamente, entretanto, podemos notar que algumas destas relações são mais recorrentes que outras; e para poder escolher é preciso antes conhecer. Ao escolher o tamanho o principal aspecto a ser levado em conta é o conteúdo. Além disso, temos outros aspectos não tão óbvios que valem a pena ser destacados, como o formato

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de impressão, de modo a minimizar/evitar desperdícios. Outra especificação importante é o contexto de uso, se a peça final será feita para se carregar no bolso ou na mochila, se será lida no ônibus ou na sala de estar. Levando em conta essas considerações pode-se ter uma idéia geral das dimensões totais do projeto. Para definir as dimensões é preciso definir também as proporções da página. Mais importante que escolher intuitivamente ou apenas decorar tabelas, é entender como são estruturadas as relações entre os números, as suas características históricas e as possíveis conexões desses dados com o seu projeto. As proporções orgânicas, mecânicas e musicais são um bom exemplo disto. Pode não ser difícil distingui-las visualmente, mas a análise aprofundada história e da estrutura de cada uma delas já pode servir como um bom norteador para a configuração do projeto. Outro critério importante na escolha das proporções da página é a relação entre o formato fechado e o formato aberto. Uma das mais notórias proporções é a seção áurea, que pode ser originada pela relação matemática a/b = b/(a+b) onde a<b. A seção áurea possui relação direta com a seqüência de Fibonacci, seqüência de números em que o um número é gerado pela soma dos dois números anteriores a ele. Ambas relações 28


numéricas são padrões clássicos de equilíbrio e organização, e podem ser bastante úteis na composição dos elementos. Nos quadrinhos não poderia ser diferente, de forma que o formato diz muito sobre a publicação; formatos maiores sugerem um maior trabalho no tratamento dado às imagens, enquanto formatos menores sugerem uma maior mobilidade, um fator que pode ser muito importante nos quadrinhos, considerando-se o contexto de leitura. A produção de quadrinhos em séries de período determinado fez com que se estabelecessem alguns formatos padrões, que se firmaram na indústria por facilitar o trabalho de produção, tanto por parte de desenhistas quanto por parte de impressores. Nada impede, entretanto, que em publicações avulsas como as graphic novels, a mesma teoria proveniente do design editorial possa ser aplicada nos quadrinhos, apenas levando em conta algumas situações específicas dos quadrinhos já citadas, funcionando como um importante diferencial.

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A impressão das histórias em quadrinhos, em seus primórdios, era de péssima qualidade, de forma que se podia enxergar os pontos de retícula a olho nú. Atualmente a qualidade de impressão evolui muito, mas a retícula permaneceu como um aspecto histórico representativo dos quadrinhos, sobretudo devido à obra de artistas como Roy Licheinstein, que utilizavam a retícula e os quadrinhos como parte de sua própria linguagem

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MATERIAIS E PROCESSOS Tradicionalmente, temos que antes do processo analisar qual será o suporte do projeto acarretará varias especificações, as quais a impressão deve seguir. Consideram-se métodos de impressão os quais são capazes de uma reprodução única ou em maior quantidade de uma imagem específica. A escolha de cada para certo projeto provém da sua adequação a tal, levando em conta a sua tiragem que vai de pequena até altíssima, o preço unitário, a fidelidade de impressão e outros fatores.

Justamente por serem uma alternativa pouco utilizada no mercado de quadrinhos, as inovações em diferentes materiais e processos podem ser utilizadas como um grande diferencial

Devido à necessidade de altas tiragens a preços unitários baixos e com uma fidelidade de cor no mínimo razoável, as histórias em quadrinhos são impressas em offset, em papel apergaminhado no miolo e em couchê, supremo ou similar na capa. A maior variação entre as publicações periódicas está na capa, podendo ser maleável ou flexível. Entretanto, em publicações especiais, sejam elas reedições de antigos clássicos ou graphic novels possuem diferenciações nos processos e materiais, embora estas diferenciações se limitem à capa e à encadernação, dando à revista um caráter mais nobre, desde acabamentos para a proteção do material, até para aumentar a valorização de seu aspecto visual. Todas estas combinações novamente deverão ser norteadas pela idéia central.

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A divisão da página em quadros é um processo análogo à composição de grids no design editorial

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GRID Em um projeto editorial, a construção da forma deverá se orientar pela necessidade do mesmo, aonde é preciso avaliar para cada demanda em particular se a presença do elemento base, a grade, constitui um agente facilitador ou não para o que foi pensado como solução. A variante que determinará seu esquema de divisões ou mesmo a ausência de módulos será o conteúdo em conjunto com idéia a ser transmitida. A estruturação de uma grade para um projeto de design da sustentação a todo o processo de diagramação, este aplicado corretamente potencializa a funcionalidade do todo. Neste processo, sua adequação é determinada pela função dos elementos que serão encaixados nos espaços, e, além disso, estes últimos devem dialogar entre si, harmonizando o resultado e tornando-o coerente com o material, dessa forma otimizando a comunicação com o leitor. E possível segmentá-lo em margem, guias, zonas espaciais, marcadores, módulos e colunas. Estas partes, todavia, não obrigatoriamente são proporcionais ou mesmo estão presentes.

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Uma mesma história pode contar com diferentes estruturações dos quadros. No exemplo do lado oposto, temos um grid bastante rígido nas cenas em que o conteúdo se passa na televisão, enquanto as cenas em locações externas possuem um grid bastante dinâmico e descontruído, condizentes com o ambiente que representam. É importante notar como que a página funciona como um todo, à medida que os próprio requadros onde a fala do narrador se encontra seguem o layout da diagramação da página, dando mais ênfase a ela.

Existem alguns padrões básicos de grid, são estes: modular, hierárquico, de colunas e retangular, dentro destes ainda e possível varias interferências e combinações. Contudo, por ser tratar apenas de um molde, este não deve se destacar ou sobrepor à informação. Estruturas mais simples funcionam quando comportam itens que possuem grande carga de significado, produzindo um equilíbrio na composição final. Em contraposição, disposições mais complexas podem hierarquizar informações que antes eram semelhantes, facilitando a identificação destes. Quando definido o grid funciona como um suporte estático com dimensões planejadas aonde será arranjado os dados. Devido a sua capacidade de receber diferentes componentes em uma mesmo malha, ele proporciona uma organização que otimiza o tempo gasto na sistematização destes gerando um padrão gráfico de fácil identificação. Opera como ferramenta facilitadora que deve ser usada com cautela, não se direcionando a layouts comuns que provocam monotonia ótica e por conseqüência desinteresse do leitor. Mesmo sendo um sistema rígido, ultrapassar as regras estabelecidas em certos momen-

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tos se faz necessário e cabível como uma solução para este ultimo problema. A segmentação dos módulos, e preenchimento de espaços irregulares, proporciona uma variação e movimento que recuperam a atenção do olhar. Estas manipulações mantendo-se dentro do núcleo não destituindo a composição da unidade já formada. No interior de um sistema, existe uma “liberdade limitada”, na qual o designer não possui a amplitude total do espaço para trabalhar. Em certos momentos abdicarse do grid pode ser um fator positivo que acrescentará ao projeto. Os conteúdos textuais e imagéticos podem compor formas de uma organização visual própria. De maneira que, suas disposições combinam possibilidades espontâneas e naturais. Ao serem forçados para dentro de linhas, estes elementos dinâmicos perdem sua característica inicial, danificando a composição. Estes podem ser pinturas, grafismos, tipografias entre outros, ao perceber que a incontáveis detalhes pode-se atribuir um movimento ótico. Com a possibilidade de desestruturação da malha, o numero de variações e infinito, já que para tal não existem regras, ou seja, uma constante renovação de interposições. As linhas podem se deslocar a eixos an35


gulares e as informações podem ser postas em zonas não convencionas. Por ser ilimitado, o espaço gráfico se torna tridimensional e de texturas diferentes. A diagramação desenrolará a partir de outro ponto, onde o manejo é feito em corpos tipográficos ou em contraste de cor, diferindo da primeira vertente onde este se concentrava nas disposições das linhas de base. A valorização e regida por um aspecto marcante do material, e entorno deste o projeto tomará forma. Nesta gama de novas perspectivas ainda se encontra outro recurso, a construção aleatória onde componentes são dispostos de maneira intuitiva. Transparecem características subjetivas que se contextualizam no período de criação, proporcionando um aspecto único e de assimilação para quem esta a par de tal tópico. Estes novas saídas só são praticáveis e eficientes quando existem referenciais suficientes que decodificam estas mensagens. A aplicação dessa desestruturação traz novas soluções para a qualidade visual dos conteúdos, agregando mais valor que destacará de maneira original o projeto. Na mesma proporção em que pode ser eficiente, a fragmentação do grid corre o risco de acarretar um resultado negativo. A ausência de barreiras

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nessa transgressão eleva a chance de um produto final não-funcional. Seu sucesso depende de vários fatores instáveis, entre estes a já citada capacidade compressão pelo leitor que oscila em época, classe e outros. Em sua estruturação ou desestruturação existem perigos. Para o primeiro a possibilidade de monotonia, prisão e limitação de recursos. Entretanto aplicado corretamente, produz um padrão gráfico unificando os elementos, sintetiza o tempo gasto e de maneira simplificada é inteligível. No segundo, o alto risco de algo visualmente não compreensível, sem identificação e não comunicativo. Já positivo, permite inúmeras soluções, não se prende ao banal e por isso de destaca. Cada projeto demanda uma diferente abordagem e somente a partir de seu destrinchamento cabe definir qual será sua vertente. Não é correto se prender em certos conceitos, porém eles somente podem ser reformulados após seu total conhecimento e dominação. Todo o discurso feito acima sobre grid pode ser aplicado aos quadrinhos se levarmos em consideração à disposição dos quadros, ao invés de apenas texto e imagem, na página. As histórias em quadrinhos tem este nome por uma razão, os quadros são os elementos bási37


cos de sua estruturação, e a sua disposição na página é o passo primordial ao se fazer quadrinhos, respondendo diretamente pelo tempo, o ritmo e pela compreensão do leitor, além de possuir forte influência nos elementos que se configurarão em seu interior. A divisão da página em quadros pode ser feita através de um grid, assim como nos livros. A página resultante, entretanto, resultará numa estrutura bastante simplificada, muitas vezes monótona, mas que se torna adequada à públicos como o infantil, cujo processo de alfabetização, não só na linguagem dos quadrinhos, mas na língua em geral, está apenas começando. Mesmo com a utilização do grid, nos quadrinhos deve-se tomar bastante cuidado para que ele não atue como uma camisa de força, pois freqüentemente o conteúdo a ser transmitido requer certas especificidades que fogem da norma estabelecida por um sistema rígido. A desconstrução do grid, portanto, se torna uma das principais ferramentas na criação de quadrinhos para se estabelecer significados, a medida que a narrativa expõe um certo padrão, por mais simples que seja, as quebras são utilizadas para gerar significados, que devem ser sempre pensados conforme o seu objetivo. Um 38


grid mais livre, ou até mesmo a sua ausência não querem dizer aleatoriedade, muito pelo contrário, significa que os elementos devem ser pensados individualmente, ao invés de simplesmente colocá-los em um molde. Mesmo trabalhando de maneira mais livre em relação à malha presente nos quadrinhos, é importante estabelecer um parâmetro na configuração dos quadros e sua significação, sua altura, largura, espaçamento e relação destes itens com o espaço e o tempo; somente desta forma poderá se estabelecer um ritmo narrativo à leitura, que se torna então agradável ao usuário. Resolvida a diagramação, temos ainda a própria forma dos quadros, que além de poderem ser usadas como forma de significação, devem ser pensadas de maneira integrada ao conteúdo que nela será inserida. É importante ressaltar que as próprias margens do quadro, assim como o grid, não devem ser consideradas limites intransponíveis, podendo ser alterada sempre que o conteúdo pedir.

Os quadros não representam um limite intransponível ao conteúdo, podendo ser transgredidos para realçar determinadas emoções

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A tipografia pode ser usada como recurso de identificação dos personagens, funcionando como um reforço à sua personalidade, como neste exemplo de Batman, Asilo Arkham, onde para cada personagem temos um tipo diferente de tratamento dado à tipografia. Além disso, temos ainda a utilização dos balões diferenciados, com o objetivo de representar uma fala que vem do telefone e onomatopéias, que utilizam o traço da tipografia para representar um som

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TIPOGRAFIA Dentro da proposição estipulada, a tipografia, no design editorial, atua juntamente ao propósito, delineando o estilo. Nele estão expostos famílias para selecionar e misturar. Não aleatoriamente, mas em composições onde há interação das características de cada família. Elas suportarão o conteúdo textual e junto com os aspectos imagéticos, transmitir o discurso ali presente. Mais uma vez nos encontramos nos corredores com prateleiras inacabáveis de soluções. Mesmo com estas famílias definidas, variantes como o peso do tipo, sua largura e disposição podem transformar a cara do projeto final. Os blocos de texto surgirão daí e como uma nova ramificação seu movimento e localização na mancha gráfica influenciarão na compreensão e funcionalidade dos elementos em questão. Diante de uma extensa quantidade de blocos devem-se priorizar opções convidativas que exprimam o significado buscado.

O requadro é um importante recurso no uso da tipografia nos quadrinhos, como neste exemplo, em que se usa a aparência de papel rasgado a uma caligrafia manual para dar ao narrador um aspecto de diário

Nesse aspecto, a escolha da tipografia é um dos aspectos decisivos de um projeto editorial, e sua escolha deve ser cautelosa, atentando-se não somente a critérios técnicos como legibilidade e leiturabilidade, mas também aspectos

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históricos, como contexto e propósito de criação, além da maneira como foi utilizada ao longo do tempo. O caracter histórico, por sua vez, é bastante interessante na hora de combinar tipos, visto que uma família tipográfica, como toda família, sempre possui parentes, podendo se dar bem com uns, e mal com outros. A importância da tipografia nos quadrinhos é menor que em projetos de design editorial, mas continua sendo fundamental para o projeto como um todo. Mesmo com as ilustrações, muito do entendimento do leitor ocorrerá por meio da tipografia; que deve portanto ser escolhidas levando em conta os mesmos padrões do design editorial, como estilo, legibilidade, variações de peso e seu tamanho. Há algumas peculiaridades no tratamento da tipografia nos quadrinhos que devem ser observadas cautelosamente. O fato da tipografia usualmente vir em balões ou caixas especiais para ela que ocupam um espaço reduzido do quadro faz com que a economia de espaço seja um fator importante, mas sem que a legibilidade seja sacrificada para isto. As caixas e balões, por sua vez, são um fator que, embora não necessariamente tipográfico, possuem grande influência na maneira como o texto é percebido nos 42


quadrinhos. Assim como os próprios quadrinhos, seu tamanho e traçado podem sugerir determinadas intenções na fala. Um exemplo clássico disto é o conhecido balão de pensamento. Os balões devem ser pensados sobretudo levando em conta o sentido de leitura e a sequência das falas, fator que é crucial para o entendimento correto das ações, e que se torna especialmente difícil em situações como diálogos entre personagens. Outro fator intrínseco aos quadrinhos está na integração entre a ilustração e a tipografia, razão pela qual muitas vezes as letras são desenhadas manualmente, ou então com tipografias que tenham um traço vernacular marcante. Outro recurso interessante dos quadrinhos está no uso de diferentes tipografias para diferentes personagens ou para situações de variação na voz do personagem, onde características do desenho da tipografia são usadas de maneira a complementar o que as ilustrações e os textos nos transmitem, além, é claro, das onomatopéias, que buscam traduzir sinestesicamente o som por elas expressado em uma única forma escrita e desenhada. A tipografia nos quadrinhos é de tamanha importância que frequentemente delega-se um profissional para cuidar especificamente dela.

HQ A escrita nos quadrinhosé muitas vezes feita a mão, mas fontes que simulam este tipo de escrita são por vezes usadas devido à sua praticidade. Foi este contexto de uso, inclusive, que inspirou a criação da infame Comic Sans

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Devido à necessidade de representar uma grande diversidade de elementos, o desenho de histórias em quadrinhos precisa estar sempre aliado a uma boa pesquisa, de forma a representar os elementos de forma adequada. Neste exemplo, podemos ver as referencias de arquitetura, automoveis e vestuário usadas para recriar um ambiente dos anos oitenta. Tudo isso representado de acordo com o estilo de desenho mais sombrio, que muito diz sobre a tom da narrativa

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ILUSTRAÇÕES No design editorial temos a ilustração atuando como espelho do conteúdo, em conjunto com as manchas textuais a escolha imagética também adiciona importantes aspectos á peça. Tanto a imagem aparente, o que é percebido em primeira instância, quanto seu método compositivo reproduzem o pensamento presente naquele contexto. Buscando envolvimento visual do leitor ao destacar certos pontos e obscurecer outros. A interconexão desta com o resto pode ocorrer de várias formas e cabe ao autor do projeto definir qual atende melhor. A questão é, dentre tantos efeitos, ferramentas, desde ilustração à colagem, e ingredientes qual produzirá melhor resultado. Nos quadrinhos, a ilustração assume importância ainda maior, visto que ela é das partes mais importantes do conteúdo, não apenas o seu espelho, e por tanto, todos os seus aspectos devem ser analisados segundo a proposta da história para que sua mensagem possa ser transmitida da maneira mais adequada possível. A ilustração assume um papel similar ao da tipografia no design editorial, sendo um dos mais destacados elementos

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da história. A ilustração é essencial no caráter de atrair o leitor, visto que ela dita muito da tônica do conteúdo. Nos quadrinhos, a ilustratação não é meramente ilustrativa, devendo ser escolhida com atenção, pois será um fator determinante do seu sucesso ou fracasso.

A representação do tempo ocorre através da relação entre quadro e imagem. Neste exemplo, temos a fragmentação do tempo, que foi usada para destacar a importância e dramaticidade da ação

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O primeiro aspecto da ilustração a ser considerado é o traço; limpo ou sujo, realista ou simplificado, o traço da ilustração pode dizer muito sobre o conteúdo e sobre seu público. Em revistas infantis, temos tipicamente um traço mais simplificado, colorido e arredondado, similares à todo o universo da infância, cujos brinquedos e demais produtos relacionados seguem a mesma linguagem. Quadrinhos mais adultos, por sua vez, possuem traços mais realistas, ou então com uma distorção diferenciada, que ao invés de simplificar e deixar mais amigável procura realizar justamente o seu oposto. As distorções no desenho de quadrinhos são um assunto à parte. Uma breve e atenciosa olhada nos quadrinhos de super-heróis nos revela que, apesar dos traços realistas, temos na verdade uma realidade exagerada, com músculos de dar inveja a alterofilistas. Os quadrinhos, assim como o mundo da moda, por exemplo, moldam a realidade de acordo com os seus valores, e justamente


por isso muitas vezes servem como um ótimo reflexo de nossa sociedade, como já foi ressaltado no prefácio deste livro, em aspectos como a relação entre os superheróis e vilões a guerra e a política. Outro aspecto essencial está na definição da paleta de cores. As cores trazem consigo valores emocionais e comportamentais, que ajudaram a configurar o tom da narrativa desenvolvida. Assim como no editorial, as cores devem ser escolhidas como um conjunto, de maneira a promover contrastes e equilíbrios através da manipulação dos seus valores de matiz, brilho e saturação, podendo assim ser usada como elemento para contribuir na significação dos elementos de acordo com o propósito narrativo. Analisando o estilo do traço com a paleta de cores, temos ainda a escolha do tipo de colorização; cor chapada, aquarela, guache, óleo; que assim como o traço ajuda na comunicação com o conteúdo e o público. Um aspecto fundamental na definição das cores e de sua temática está na quantidade de nanquim (tinta preta usada na arte final dos quadrinhos) que o desenho carregará. O traço da ilustração pode ser inclusive variável, remetendo a diversos contextos e significados. 47


Neste contexto, é sempre bom contar com referências de diferentes estilos e épocas e suas respectivas conotações. As referências, por sinal, são um grande aliado na construção de quadrinhos, visto que muitas vezes as históriasretratam diversos aspectos da vida cotidiana, desde representação de povos à construção de ambientes internos ou até mesmo a construção de cidades inteiras, como a famosa Gotham City. As referências servem de base para que se possa ilustrar todos estes aspectos, e podem vir dos mais variados campos possíveis, como a arquitetura, fotografia, moda, antropologia e história. A pesquisa de refrências bem elaborada é fundamental para que se possa estabelecer a configuração daquilo que será representado. Após escolher como desenhar, o próximo aspecto a ser considerado é o que desenhar. A escolha do que inserir no quadro é bastante próxima do cinema, que também possui uma forte relação com quadrinhos devido à sua característica de narrativa seqüencial em planos, razão pela qual os quadrinhos são usados em pré-produção de cinema, nos storyboards. O enquadramento escolhido, quais elementos serão mostrados, e qual a perspectiva da cena são alguns dos elementos básicos do desenho

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que estará inserido no quadrinho. É importante neste momento se ter bem claro o que exatamente tem de ser contado pelos quadrinhos, para que se possa de forma sintética passar o conteúdo ao leitor. Muitas vezes uma ação que duraria vários minutos pode ser resumida em um único quadro, ou o contrário, uma ação que duraria segundos pode ser fragmentada em uma página inteira. É desta relação entre quadros planos e sequências que ocorre a articulação entre os quadrinhos e o tempo, já citada quando na seção grid, e é um dos principais fatores na configuração do ritmo de leitura e da dramaticidade das ações. Além de pensar cada quadrinho individualmente, é preciso pensar como se articulará a seqüência de quadrinhos dentro da página e a sequência de páginas dentro da revista. É esta seqüência das cenas mostradas que nos leva à definição de quadrinhos como arte sequencial. Nesse aspecto, é importante observar a relação entre a maneira como a diagramação estabelece determinados padrões para que se possa, a partir deles, desconstruí-los para gerar significados, mas sem que essa desconstrução seja responsável por causar um desequilíbrio.

O enquadramento e as sombras pode nos dizer muito sobre a história, a ponto de conseguirmos identificar o personagem acima como vilão sem precisar recorrer a nenhuma outra informação

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REFERÊNCIAL BIBLIOGRÁFICO MCCLOUD, Scott. Desvendando os Quadrinhos. 1a edição. São Paulo, Makron Books 1995 EISNER, Will. Quadrinhos e Arte Sequencial. 3a edição. São Paulo, Martins Fontes 1999 HENDRICKSON, Janis. Licheinstein. 1a edição. Alemanha, Taschen 2001 BRINGHURST, Robert. Elementos do Estilo Tipográfico. 3a edição. São Paulo, Cosac Naif 2005 FAWCET-TANG, Roger. O Livro e o Designer I. 1a edição. São Paulo, Rosari 2007 HASLAM, Andrew. O Livro e o Designer II. 1a edição. São Paulo, Rosari 2007

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