Série Na rota dos deslizamentos

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ESPECIAL

DOMINGO 22.2.2009 JORNAL ABC

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Desmoronamentos de terra na região são mais comuns do que se imagina

Cercados pelo perigo Rodeados por morros, montanhas e serras, os vales do Sinos, Caí e Paranhana, a Serra Gaúcha e até mesmo parte do litoral norte são lugares propícios a ocorrência de deslizamentos de terra, como testemunha a história. O ABC Domingo documenta, a partir de hoje, fatos pouco lembrados e que são guardados silenciosamente sob os pés das montanhas. Gabriel Guedes

Basta falar de deslizamento que logo alguém lembra da catástrofe de novembro em Santa Catarina. Junto, surgem indagações como “por que acontece tanto lá e aqui no Rio Grande do Sul não?”. Mas a história existe exatamente para lembrarmos de que não estamos imunes a tragédias iguais. Estamos também na rota das avalanches de terra. Na porção nordeste do Estado – o que inclui a região –, a natureza tratou de erguer os contrafortes da Serra Geral. Uma cadeia de montanhas e serras que atingem mil metros de altitude e onde se concentram os maiores índices de declividade, fator imprescindível para o registro de incidentes como os de Nova Hartz, em 1992, e São Vendelino, no Natal de 2000, entre outros de menores proporções. O geólogo e professor da Unisinos Osmar Coelho afirma que toda a região é propensa. “Todas as encostas aqui têm atividade, mas que pode ser acelerada por ocasião de chuvas intensas”, explica. Ele classifica ainda a área de entorno da Serra predominantemente como de médio e alto riscos para ocupação humana. Um estudo feito pela ONG Araçá-Piranga comprovou, por exemplo, que a área de 3,2 mil hectares que compreende os contrafortes do Morro Ferrabraz – Sapiranga, Araricá, Nova Hartz, Igrejinha, Santa Maria do Herval e Morro Reuter – tem 88,74% de relevo que varia do ondulado a montanhoso e que mais de 30% deste território representa alto risco para a ocupação humana. Para Coelho, só há um jeito de evitar o risco. “É realizar um levantamento indicando as zonas mais íngremes. Locais junto aos morros nunca deveriam ser ocupados. Tem que se combater a ocupação desordenada”, sugere.

Luis Félix/GES

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NA ROTA DOS DESLIZAMENTOS

AS ZONAS DE RISCO NOVA HARTZ Era 12 de fevereiro de 1992 quando o recém criado município sofreu uma enxurrada de aproximadamente uma hora de duração. Houve fortes deslizamentos de terra na localidade de Solitária Alta e Canudos, destruindo mais de 30 casas. Segundo o ex-prefeito Ernani Schmidt, foi o suficiente para que os materiais deslizados das encostas dos morros de Serra Grande – com altitudes de até de 720 metros –, fos-

sem deslocados até a cidade, matando uma menina de 15 anos na Vila Schonardie (Vila Tomate). Depois do episódio, arroios foram dragados e a drenagem melhorada, na tentativa de amenizar os efeitos de uma nova enxurrada, que desde então nunca mais aconteceu. Segundo o coordenador da ONG Araçá-Piranga, Luís Fernando Stumpf, a área é considerada de alto risco para ocupação humana, conforme estudo feito por uma geologa para a entidade. Fotos Gabriel Guedes/GES-Especial

Novo hamburgo

A zona norte hamburguense é a que reúne o maior número de áreas com risco de deslizamento de terra, segundo a Defesa Civil local. Localizados na base de um dos degraus da Serra Geral, o bairro Vila Diehl e adjacências, como o Colina da Mata, Vila Esperança, Momberger e Redentora, são os primeiros a sofrer danos em decorrência de chuvas fortes e da declividade do terreno. Foi o que

São Vendelino

MONTENEGRO Situado numa planície, a preocupação no município se volta para o Morro São João – uma elevação de pouco mais de 130 metros de altitude em meio à cidade. Além de ser uma área de preservação permanente, a ocupação habitacional da base do morro se constitui num risco, mesmo que nunca tenha sido registrado qualquer deslizamento de terra. Segundo o diretor municipal de Habitação, Adriano Mello, há uns 2 anos foram removidas 200 famílias que moravam no sopé do morro. Mas a principal apreensão na cidade são sempre com as cheias do Rio Caí. São Leopoldo De relevo ondulado, o município não conta com o risco iminente de desmoronamentos. A situação considerada mais delicada pela Defesa Civil se relaciona com as casas à beira do Arroio Kruze, nos bairros Santo André e São Miguel, que podem sofrer danos pela erosão. No entanto, em 16 de maio de 2007, um deslizamento com a queda de um muro matou jovem de 17 anos na vila Cohab-Duque, durante um temporal.

O Natal do ano 2000 foi trágico. Uma enxurrada de pouco mais de 2 horas ao final de tarde destruiu sete propriedades rurais na Linha Neis e interrompeu a RS-122, entre a cidade e Farroupilha, por cerca de 6 meses, devido a duas dezenas de deslizamentos. Todos aconteceram em áreas classificadas de alto risco, segundo pesquisa feita na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A RS-446 também foi prejudicada. No município não houve vítimas fatais. Também foram atingidas áreas dos municípios de Alto Feliz e Carlos Barbosa.

aconteceu no dia 16 de maio de 2007, quando um barranco desmoronou e destruiu a garagem de uma casa na Rua Monteiro Lobato, na Redentora. Ninguém se feriu na ocasião. De acordo com o secretário de Segurança e Mobilidade Urbana, Luiz Fernando Farias, que também coordena a Defesa Civil, a região receberá atenção especial em caso de chuva forte, com vigilância feita com o apoio da Guarda Municipal.

Alto Feliz

As comunidades de Sete Colônias e Morro da Canastra, no limite com São Vendelino, também ficaram arrasadas no Natal de 2000. Quatro membros da família Boeni morreram no deslizamento de terra que atingiu as duas casas da propriedade.

Bom Princípio

Em 23 de setembro de 2007, a família Paulus, de Morro Tico-Tico, viu a sua casa vir abaixo. Naquele momento haviam três pessoas, mas que conseguiram se salvar. O terreno dos fundos da residência cedeu com a forte chuva, que causou cheia no Rio Caí.


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