F ernanda E mediato
A menina
sem cor
Ilustrações de
Yasmin Mundaca
Copyright © 2017 by Fernanda Emediato 1ª edição – Abril de 2018 Ilustrações: Yasmin Mundaca Diagramação: Alan Maia Revisão: Marcia Benjamim e Hugo Almeida Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Emediato, Fernanda A menina sem cor / Fernanda Emediato. [ilustrações de Yasmin Mundaca]. ‑‑ São Paulo : Jardim dos Livros, 2018. ISBN 978-85-8484-017-5 1. Contos - Literatura infantojuvenil I. Título. 13-04731
CDD: 028.5
Índices para catálogo sistemático 1. Contos : Literatura infantil 028.5 2. Contos : Literatura infantojuvenil 028.5
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CONTEXTUALIZAÇÃO DA OBRA O bom leitor é aquele que dialoga com a obra literária, encontra significado quando lê e, assim, compreende o texto e o relaciona com o mundo à sua volta, construindo e elaborando novos sentidos do que foi lido (ou escutado, no caso de crianças não alfabetizadas). Só assim a leitura pode contribuir de forma expressiva numa sociedade, no exercício da cidadania e no desenvolvimento intelectual. Para isso é preciso que o livro infantil seja agradável e estimule a imaginação infantil. A história A menina sem cor está baseada nos quatro elementos que são os pilares de sustentação da lite‑ ratura infantil: o caráter imaginário, o dramatismo, a técnica do desenvolvimento e a linguagem simples, direta e coloquial. Os contos infantis possibilitam o despertar de diferentes emoções e a ampliação de visões de mundo do leitor infantil. E nesse encontro com a fantasia, a criança entra em contato com seu universo interior, com seus sentimentos mais secretos, confronta medos e desejos escondidos, supera conflitos e alcança o equilíbrio necessário para o crescimento. O conto A menina sem cor é narrado em forma de prosa, é uma história curta, construída com apenas um único conflito e com poucos personagens, para que assim a mensagem chegue mais diretamente ao leitor. A história se passa nos tempos atuais, mostrando os personagens em locais habituais das crianças: escola, casa, parques e cidade. A menina sem cor traz à tona uma questão social e cultural forte e sensível, o preconcei‑ to racial. E não apenas o preconceito da sociedade contra o negro, mas principalmente o autopreconceito. É um livro que pode ajudar na formação do caráter dessas crianças, contribuindo assim para construção de um mundo melhor. A autora Fernanda emediato é produtora, escritora, atriz, contadora de histórias e empresária. Ao longo de 20 anos na vida profissional, acumulou experiência em diversas áreas, como: eventos; assessoria de imprensa; produção editorial; produção gráfica; seleção de casting e marketing digital. E gerenciou, pela Lei Rouanet, o projeto do livro Os sonhos não envelhecem; e, pelo Proac, os projetos dos livros Kafka e a Marca do Corvo, O Vale de Solombra e Paisagem com Neblina, As Vidas e as Mortes de Frankenstein, todos publicados pela Geração Editorial. Sempre priorizou a defesa dos direitos infantis. Desde 2013 visita escolas dentro e fora de São Paulo. Em 2015 criou a campanha social “Você faz, você pode” (https://www. facebook.com/vocefazvocepode/), na qual arrecadou dinheiro através de crownfunding e brinquedos, que foram distribuídos na periferia de São Paulo e também na Fundação Oncocentro de São Paulo (FOSP). Em 2017 contou histórias para as crianças cegas da Fundação Dorina Nowill. Em todas as áreas de seu trabalho, Fernanda Emediato enfatiza a importância da leitura na construção e no crescimento da personalidade das crianças.
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Sylvia queria muito ser mãe. Desde criança
sua brincadeira preferida era brincar com sua bonequinha. Quando cresceu, casou‑se com Sílvio. Mas, depois de muito tentarem, descobriram que não poderiam ter filhos. Adotaram, então, uma menininha que se cha‑ mava Micaela. Todos a chamavam pelo carinhoso apelido de Mica. Livro_A_Menina_sem_Cor_PNLD2018_P.indd 3
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Mica era uma garotinha linda, de cabelos volumosos e negros, sua pele tinha uma cor de chocolate meio amargo; ela era uma menina muito doce e encantadora. Quando fez seis anos, Mica perguntou a seus pais por que ela era diferente deles. Afinal, eles eram brancos como leite. Então explicaram a ela toda a história da adoção. Mica não ficou muito chateada por ser filha adoti‑ va, amava seus pais imensamente; mas desejava de modo profundo ter a mesma cor que eles.
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Na escola, Mica começou a notar que todas as crianças de sua sala eram brancas, e que ela era a única daquela cor diferente.
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Num domingo, quando foi passear no parque, ao olhar todas aquelas pessoas, Micaela notou uma família que exibia a pele mais amarelada e os olhos puxadinhos. Em outra família havia também dois irmãos de pele cor de mel e cabelinhos bem lisos, em forma de tigelinha. Viu também uma mãe e sua filha, ambas bem branquinhas, com olhos azuis e cabelos louros. Mica ficou olhando toda aquela variedade de cor de pele e foi sentindo um desejo enorme de ser de outra cor, qualquer cor, menos a sua. Livro_A_Menina_sem_Cor_PNLD2018_P.indd 9
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Perguntou então à sua mãe: — Mamãe, quando você toma sol, fica com a pele um pouquinho mais escura; eu queria ficar da cor daquela menininha... O que eu posso fazer? Tomar banho de lua?
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— Minha filha! Qual é o problema com sua cor? Você é perfeita do jeito que é. — Mas eu não gosto da minha cor. Na minha escola não tem ninguém dessa cor, aqui no parque também, e aí me sinto diferente. Por que só eu sou assim? — Não é só você que é assim, existem muitas pessoas com a cor igual à sua. Além disso, existem várias e várias cores diferentes, tonalidades diferentes; isto, porque nosso povo é todo misturado por causa das colonizações e imigrações que aconteceram no passado. Mas mesmo depois de muita conversa, Mica não se convenceu, ainda queria ser de outra cor.
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Um dia, no balanço do parque, estava pensando que já que era para ser diferente, que poderia ser azul ou vermelha, ou quem sabe da cor do arco-íris. Nesse momento Mica viu uma garotinha sentada debaixo de uma árvore e ficou embasbacada com a cor dela. Na verdade não era só sua cor, mas tudo nela. A pele era a mais clara que já havia visto; os olhos eram lilases; os cabelos, quase brancos de tão louros; as sobrancelhas e cílios quase não se viam.
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Mica correu em sua direção, descobriu que seu nome era Alice. E antes que a menina pudesse dizer qualquer coisa, começou a fazer elogios à sua cor, como era linda. Disse que queria ser igual a ela, que queria ter os cabelos dela, os olhos dela. Enfim, qualquer coisa sua, desde que fosse igual. Alice sorriu timidamente, nunca havia escutado isso de ninguém.
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As duas conversaram por muito tempo. Alice explicou então para Mica que ela sofria de uma anomalia genética que se caracteriza pela ausência da pigmentação da pele, dos pelos e dos olhos. E era isso que a fazia ser assim, toda branquinha. Alice contou também que por ser albina não podia tomar sol diretamente, que precisava usar protetor solar todos os dias e que, nos dias mais quentes, evitava sair de casa. Explicou também que os albinos eram mais sujeitos a ter problemas de vista, podendo até ficar cegos.
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Na visĂŁo de Alice, Mica tinha muita sorte por ter uma pele mais escura. E, na sua opiniĂŁo, parecia ser muito mais resistente ao sol. Disse que daria tudo para ter a pele dela.
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— E seus cabelos? São tão negros... Se os meus fossem assim, meus laços dourados iriam aparecer muito mais — reclamou Alice. Mica disse que não gostava de ser a única desta cor, que nunca havia visto ninguém assim. Alice começou a gargalhar e então lhe disse: — Então, ou você tem mais problemas nos olhos do que eu, ou quase não sai de casa. — Como assim? Você já viu alguém como eu? — perguntou Mica. — Só todos os dias!
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Alice então pegou Mica pelas mãos, correu com ela até o outro lado do parque e lhe apresentou seus pais, que eram da mesma cor que Mica. — Você também é adotada? — perguntou Mica. — Não, sua boba! Em mi‑ nha família, só eu nasci com esse problema. Na verdade, eu também sou negra, digamos que quando nasci a tinta havia acabado.
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Mica não acreditava no que via. Os pais de Alice eram tão bonitos quanto ela. Tinham os mesmos traços, só que de outra cor. Percebeu então que esta
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histĂłria de cor era tudo uma grande bobagem, que o bom da vida era ter uma famĂlia que a amasse. Fazer novos amigos e ser feliz.
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Fernanda Emediato
Fernanda Emediato foi uma menina livre no seu quintal, a Serra da Cantareira, na Grande São Paulo. Os seus primeiros amigos foram macacos, cachorros, tucanos, quatis, esquilos, cigarras e garante que tinha uma ami‑ guinha especial, uma onça que cismava em aparecer no quintal justamente quando ela estava sozinha. Outro escudeiro fiel era o gato vira-lata Tico. Num ataque de um lobo ele a defendeu e perdeu o rabo na briga. A menina cresceu, formou‑se em publicidade e atualmente é editora‑executiva da Geração Editorial, onde trabalha desde os 15 anos, mas ainda não esqueceu dos amigos especiais e todo fim de semana sobe a serra para encontrá‑los.
Yasmin Mundaca
Yasmin Mundaca nasceu no Chile, mas vive no Brasil desde criança – em Indaiatuba, interior de São Paulo. É ilustradora formada pela Quanta Academia de Artes de São Paulo e tem livros publicados no Brasil e no exterior. Vive desde pequenina entre lápis de cor e desenhos. Cria tudo à moda antiga, usando as mãos, lápis, tinta e papel, sem computador. É definitivamente autora de cada linha, ponto, traço e cor. Yasmin adora ilustrar e, à noite, quando está tudo quieto, gosta de imaginar que seus personagens ganham vida e se di‑ vertem em loucas aventuras.
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