Tipotipos

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ENTREVISTA TIPOGRAFIA ELLEN VERNACULAR LUPTON

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NOTA DA EDITORA É com muito orgulho que apresentamos a primeira edição da revistas Tipotipos, realizada pelo departamento de artes e design da PUC-rio. A Tipotipos busca criar um diálogo entre as novas tendências na tipografia mundial e as expressões tipográficas da cultura brasileira. Queremos criar uma comunidade colaborativa e engajada, por isso estamos abertos para o envio de textos, referências e críticas para nossa plataforma online. www.tipotipos.com


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1.

TIPOGRAFIA VERNACULAR A REVOLUÇÃO SILENCIOSA DAS LETRAS DO COTIDIANO Vera Dones

p.05

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ENTREVISTA COM ELLEN LUPTON Stephania Padovani

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3.

ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS DO COMPUTER CLUBHOUSE Natalie Rusk, Mitchel Resnick e Stina Cooke

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TIPOGRAFIA VERNACULAR A REVOLUÇÃO SILENCIOSA DAS LETRAS DO COTIDIANO

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Vera Dones

MENSAGENS DE AMOR PINTADAS À MÃO PELO IRMÃO RAMOS. LETRA COMPOSTA POR CERCA DE 80 CARACTERES EM CAIXA-ALTA, TENDO ALGUMAS VARIAÇÕES EM DETERMINADOS CARACTERES, A FONTE É UMA TENTATIVA DO PROJETO DE LEVANTAR VERBA PARA COLABORAR COM O TRABALHO DO ARTISTA

A indústria cultural vem reordenando elementos retirados da cultura popular e erudita, hibridizando e compondo novos conjuntos. O termo cultura popular não designa um conjunto coerente e homogêneo de atividades, pelo contrário, sua característica é a heterogeneidade, a ambigüidade e a contradição, não somente nos aspectos formais, mas também em termos de valores e interesses que veicula. Assim, comparadas com a cultura erudita, as manifestações populares são, de certa forma, dispersas, elaboradas geralmente com desconhecimento de sua produção anterior e de outras manifestações similares. A perda de confiança nos projetos da modernidade revelou uma nova sensibilidade que descobre a espontaneidade, a comunalidade e a autenticidade das culturas populares. A valorização das pessoas comuns e de seu entorno, vistas no passado como vulgares e primitivas, vem marcando a visualidade atual. A comunicação gráfica se volta para o local, o regional e o popular em meio a outras propostas “globais”, construindo seu espaço em meio às novas tecnologias. As implicações dessas mudanças são especialmente interessantes, pois explicitam o vínculo entre o pósmodernismo e a cultura popular. Neste artigo apresento, primeiramente, um resumo histórico da tipografia ocidental moderna, sua passagem ao pós-moderno, para então comentarmos a estética tipográfica vernacular, o processo de criação de letristas na região metropolitana de Porto Alegre, e como o imaginário da cultura popular serve de inspiração à criação dos designers gráficos.


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TIPOGRAFIA:

das origens modernas ao pós-moderno Uma grande parte do conhecimento atual sobre tipografia procede de um corpus teórico e prático que tem origem nos primeiros trinta anos do século XX, através de artistas e teóricos como Marinetti, Van Doesburg, Jan Tschichold, Paul Renner, László MoholyNagy, Josef Albers, El Lissistzky, Kurt Schwitters, Armin Hofmann, Max Schmid, Walter Dexel, entre outros. Mesmo apresentando posições diferentes e até mesmo opostas, é possível encontrar entre eles, vários pontos em comum. Todos de alguma forma rejeitaram os padrões de “bom gosto” romântico e ornamental promovido pelo Vitorianismo e pela Art Nouveau, em nome de uma tipografia direta e impactante, que tirasse partido de meios técnicos de impressão e fosse mais direcionada à comunicação. O objetivo era restringir o número de variáveis gráficas para fins de economia e legibilidade.

Ainda que, os elementos de base dos layouts adotados pelos primeiros modernistas, abusassem de contrastes fortes e disposições assimétricas, barras horizontais e verticais, a maioria das vezes utilizadas para hierarquizar a informação. Quanto a essa questão, Cauduro (2002) acredita que a busca da eficiência na comunicação se manifestou através de uma estética simples e econômica. Nestes termos:

(…) a comunicação seria realizada o mais eficazmente possível pelo design, supunham eles, quanto mais direta, simples e repetitiva fosse a forma das mensagens. Obviamente, na concepção dos modernistas a comunicação se resumia basicamente à “transmissão” de informações, isto é, à duplicação pelo receptor dos conteúdos simbólicos - grifo no texto original (denotados) das mensagens formuladas pelo emissor, através de signos gráficos (Cauduro, 2002, 5).


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polarizações entre a forma e o conteúdo. Os anos cinquenta foram protagonizados pelo Estilo Internacional ou Escola Suíça, que retomou os princípios da Bauhaus e do Neoplasticismo, impondo uma drástica redução do conteúdo tipográfico. Seguindo pela estrada dos Utilizava-se elementos pioneiros, na década de quarenta, simples e repetitivos, designers e diretores de arte nortebuscando a ordem, o rigor americanos como Paul Rand, e a forma depurada em Ray Eames e Herbert Matter vista de uma claridade na continuaram apontando na direção comunicação. A valorização da funcionalidade e insistiram dos espaços em branco na necessidade da comunicação na composição, tornoutipográfica /visual que evidenciasse a se elemento essencial de integração entre beleza e utilidade. uma filosofia redutora Todos exploravam as técnicas que que, liderada por Emil sua época lhes oferecia – collages, Ruder e Joseph Müllerfotogramas, fotografias recortadas. Brockmann, produziu Paul Rand mudou a maneira que as uma design racional palavras e as imagens se combinam, onde a subjetividade de forma a conseguir passar uma do autor era silenciada única idéia. Como diretor de arte em favor do emissor e em agências de propaganda, ele receptor. Extremamente foi um dos pioneiros da Nova normatizadores, estes Publicidade, segundo a qual, o designers instituíram a leitor deveria ter um papel ativo, grade de construção como suscitando sua curiosidade, para base para qualquer projeto em seguida completar a mensagem. gráfico, propunham uma Segundo Hollis (2002), Paul Rand comunicação funcional e seus colegas defendiam o design baseada na economia, que além da informação factual com a tipografia contemplasse uma apresentação clara enquadrada dentro de e objetiva, buscando soluções para as


10 normas estritas. As fontes Universe Helvetica foram legítimas representantes deste período, neutras e perfeitamente legíveis. Todos os “construtivistas” suíços, como Richard Hollis (2002) prefere chamá-los, dividiam o princípio das soluções minimalistas com número limitado de meios gráficos. Müller-Brockmann adotava uma atitude construtivista ao colocar os caracteres dentro de uma construção geométrica plana e concreta. Ele transformava radicalmente as proporções nos enquadramentos fechados e inclinados das fotografias em preto e branco, acompanhadas por slogans em caracteres coloridos. Enquanto que Emil Ruder reafirmava os critérios que marcaram a modernidade defendendo os princípios da neutralidade e legibilidade tipográfica: “uma tipografia que não se pode ler é um produto inútil”. Entretanto, não podemos esquecer que a Escola Suíça se desenvolveu num contexto dominado pelo nascimento e consolidação

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de novas técnicas como a fotocomposição, que trouxe limpeza, flexibilidade e maior rapidez no campo tipográfico. Naquela época, já se falava em perda de qualidade da tipografia, em virtude de uma suposta falta de minúcias de seu uso. Alguns designers estavam encantados pelas facilidades oferecidas pelo novo sistema – manipulação das entrelinhas e kernings, mescla de corpos e caracteres -, deixando para segundo plano o conceito tradicional de legibilidade. No mercado gráfico dos anos 60, os computadores eram usados em grande parte para a fotocomposição, mas a seu lado surgem as folhas de letras transferíveis (Letraset, Mecanorma,

ESBOÇO DEMOSTRANDO O SENTIDO E OS PASSOS PARA O DESEHO DE TIPOGRAFIA VERNACULAR


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entre outras) que facilitavam ainda mais a experimentação com os tipos. Essa década assistiu às mudanças tecnológicas e o aparecimento da cultura pop jovem e dos hippies, interessados na moda e na música, com atitudes de crítica e protesto expressa na mídia underground. Eles contribuíram para a construção de uma mentalidade mais aberta no meio onde transitavam os desenhistas. Começou-se quebrando a pureza e a funcionalidade do design, experimentavamse novas formas de utilização da tipografia, buscando, as vezes, uma relação mais direta com a fotografia. Descobriuse o poder comunicativo, emocional e conceitual das letras, através de jogos interpretativos com sentido de humor. Nos Estados Unidos, figuras como Reid Miles, Herb Lubalin, Alan Fletcher, Colin Forbes, Bob Gill e Willi Fleckhaus, destacaram-se através de propostas alternativas direcionadas à cultura pop,

enquanto a Escola Suíça continuava defendendo soluções na linha de ordem e claridade na comunicação gráfica. Uma das primeiras insurreições contra o International Style da Escola Suíça foi liderada pelo também suíço Wolfgang Weingart, cabeça de um estilo que ficou conhecido como New Wave, uma revisão dos estritos pontos de vista daquela escola. Através da alegoria “as fontes são imagens que falam” (SchwemerScheddin, 1991), Weingart pretendia falar da desconstrução do pensamento moderno, questionando as soluções econômicas e contidas daquela escola. Voz alternativa dentro da Escola de Desenho da Basiléia, Wolfang Weingart defendeu o enfoque experimental na tipografia. Suas experimentações tipográficas contribuíram para a criação de um novo cenário no campo da comunicação gráfica. Sinalizando uma mudança

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do papel do designer, que deixou de apresentar as mensagens em códigos claros e transparentes para produzir, por “estratégias visuais sutis, uma leitura polissêmica dos traços impressos” (Cauduro, 2001, p. 102). A passagem do racionalismo à intuição representou mudança de atitude e um processo de revisão importante. Sobre esse tema, Ellen Lupton observa:

A grade tipográfica deixa de ser uma tela transparente, reveladora de mensagens evidentes, escurecendo-se em véu opaco para transformar-se em terreno de jogo formal, no lugar da expressão de mensagens didáticas (Lupton, 1999, 52). É importante destacarmos a importância, para o design gráfico, do conhecimento produzido nos campos da filosofia, da sociologia e semiótica a partir dos anos 70, desencadeando a grande virada na imagística visual do Ocidente.

AS ESCOLAS NORTE AMERICANAS DA DESCONSTRUÇÃO Desde os anos 70, uma nova postura foi assumida por algumas escolas norte americanas de arte, design e arquitetura, entre elas Cal Arts e Cranbrook Academy of Arts. Em seus programas teóricos foram incorporados textos de Barthes, Foucault, Baudrillard e Derrida (Miller, 1989), servindo como ponto de partida conceitual para

a inversão do modelo moderno daquelas escolas. O pós-estruturalismo havia chegado às escolas de design. Os textos de Derrida invadiram os estudos literários, estendendose à arquitetura e às artes visuais, para então chegar ao design através da Cranbrook Academy, constituindo-se em rico material de reflexão e sustentação teórica para os projetos gráficos daquela


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escola. Assim, o design tipográfico pós-moderno inicia-se como uma extensão da teoria pósestruturalista. No artigo intitulado The academy of deconstructed design (1991), escrito para a revista Eye, Ellen Lupton atribui à escola Cranbrook de Detroit os primeiros passos no caminho do design pós-estruturalista, atestando sua contribuição no alargamento das fronteiras do design gráfico. O campo teórico pós-estruturalista oferecia aos designers a oportunidade de explorar os aspectos subjetivos em seus projetos, funcionando, invariavelmente, como comentários sobre um determinado assunto, onde as imagens poderiam ser “lidas” e interpretadas, tanto quanto “vistas” (Lupton, 1991, 53). Os estudantes começaram a desconstruir a dinâmica da linguagem visual e compreendê-la como um filtro para as respostas do público. Daquela escola saíram Jeffery Keedy, David Frej, Edward Fella, Allen Hori, P. Scott Makela, Joan Dobkin, Scott Zukowski, Glen Suoko, entre outros. As pesquisas semânticas da Cranbrook, nos anos 80, aplicadas ao design gráfico manifestam-se de maneira flagrante. No cartaz “Typography as Discourse” (fig. 1), Allen Hori (1989) teve por base um diagrama sobre as teorias de comunicação apresentadas num curso de Katherine McCoy (diretora e mentora daquela escola). Sobre esse cartaz Ellen Lupton observa:

CARTAZ CRIADO POR ALLEN HORAN

“Esse tipo de trabalho encanta ou exaspera, segundo o grau de paciência do leitor – e pelo fato dos designers da Cranbrook, freqüentemente, dirigirem seus projetos a outros designers, que já estariam preparados para tal esforço” (Lupton, 1991, 55).


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Como podemos observar, no cartaz “Loaf” (fig. 2) de Scott Zukowiski (1986) e outras peças produzidas no fim dos anos 80, os signos visuais e verbais são explorados através de seus múltiplos significados e não somente pelos motivos estéticos. São peças gráficas pouco requintadas, visualmente mais cruas. A teoria da desconstrução contribuiu para desafiar o pensamento rígido, os esquemas visuais, a obsessão pela regularidade e a precisão do design moderno, demonstrando a importância da ambigüidade aos olhos de destinatários capazes de negociar suas complexidades.

a possibilidade de gerar, processar e exibir páginas com desenhos, fotos e tipos gráficos. Além de alterar radicalmente o mundo do design gráfico, os microcomputadores abriram infinitas possibilidades para a criação de novas fontes. Se antes, para desenhá-las, necessitava-se de vários meses e um profundo conhecimento tipográfico, atualmente, precisa-se somente de alguns dias, e qualquer designer, com um software adequado, estará capacitado para fazê-lo. Na primeira década do computador pessoal (PC), nasceu toda uma geração de designers que fizeram da tipografia o eixo de seus A história da tipografia trabalhos, como Neville contemporânea foi marcada pelo Brody, Eric Spiekermann, aparecimento dos microcomputadores David Carson, Rudy pessoais e seus aplicativos gráficos Vanderlans e Zuzana Licko. em 1984. Numa combinação do tipo A dupla Vanderlans e Apple Macintosh-Aldus PageMaker, os Licko encontraram no novos microcomputadores ofereciam Macintosh um poderoso

EMIGRE: TECNOLOGIA E EXCENTRICIDADES TIPOGRÁFICAS


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instrumento criativo com linguagem própria. Já desde seu início, compreenderam que essa ferramenta oferecia muita liberdade no trabalho. Tornando possível um dos projetos editoriais mais interessantes das últimas décadas: a revista Emigre. Nascida em 1984, em Berkeley (Califórnia), junto com a fundição digital Emigre Graphics, encabeçada por Zuzana Licko . A empresa passou a divulgar e comercializar fontes desenhadas pela proprietária, além de outras criadas por jovens designers de todas as partes do mundo. Emigre disponibiliza e divulga fontes que exploram a mistura de elementos vernaculares com a tecnologia digital, além de cultivar projetos experimentais. Em sua lista estão Barry Deck, Jonathan Barnbrook, Jeffery Keedy, Christian

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Schwartz, Miles Newlyn, John Downer, Frank Heine e a própria Zuzana Licko (figura 3), entre outros. Dessa forma, eles conseguem colocar no mercado do design gráfico um acervo cada vez maior fontes, além das idiossincráticas, geralmente desprezadas pelos grandes fornecedores. Em se tratando de legibilidade da tipografia aplicada ao design gráfico, vale notar que, numa perspectiva moderna, a legibilidade é tida como o resultado de uma série de atributos e critérios fixos aplicados ao texto, com base em normas criadas a partir de pesquisas óticasfuncionais, as “regras” tipográficas. Esses referenciais não consideram as conotações culturais dos caracteres, e tampouco vêm o design como parte de uma cultura cada vez mais complexa e diversa. Parte-se do princípio que a tipografia e o design gráfico têm como objetivo a comunicação com públicos bem precisos. Um dos primeiros exemplos de fontes consideradas como signos a serem interpretados foram produzidos por Neville Brody para a revista The Face,

na metade dos anos 80. Se analisarmos esta questão dentro de um determinado contexto histórico, as normas de legibilidade mudam conforme a época. Baskerville é, sem dúvida, uma fonte de fácil


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leitura, poderíamos considerá-la uma verdadeira representante das fontes clássicas. Entretanto, na época em que surgiu, em 1757, a Baskerville foi muito criticada por sua ilegibilidade, ao ponto de ser acusada de causar fadiga em seus leitores (Dauppe, 1991). Essa pretensa dificuldade de leitura adveio de suas serifas mais finas, em conseqüência de uma aquisição tecnológica da época, o papel tornou-se mais fino e liso. O que parece legível hoje, talvez fosse totalmente indecifrável em outros tempos. As fontes desenhadas por Neville Brody, Barry Deck, Zuzana Licko, são testemunhas da complexidade e diversidade do mundo em que vivemos, suas criações asseguram a identidade, o tom e a voz de cada projeto. O debate da tipografia pós-moderna vai de encontro à neutralidade da comunicação gráfica e dos padrões defendidos pela escola modernista. Se observarmos a fonte Template Gothic (fig. 4) de Barry Deck, veremos como as fontes podem servir para representar um mundo imperfeito, conforme nota seu autor: “fontes imperfeitas para um mundo imperfeito”.

FONTES DA EMIGRE CRIADAS POR ZUZANA LICKO E BARRY DECK


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APRENDENDO COM O COTIDIANO

realizadas com letristas em Novo Hamburgo, podemos perceber que: a) Em sua maioria, os letristas entrevistados são autodidatas, criam o A paisagem verbal-visual criada desenho de suas letras, pelas placas, faixas e luminosos de ou, buscam inspiração em fachadas na região metropolitana fontes do computador; b) de Porto Alegre demonstra um Raramente vêem relação processo complexo de apropriações entre os estilos das letras e circulação de estereótipos e de com o tema abordado; referências culturais. A função c) Não existem critérios destes meios é informar, esclarecer para combinação entre aos públicos sobre determinados diferentes estilos de conteúdos, envolvendo o uso de letras; d) Diferenciam diferentes linguagens e recursos gráficos. Alguns letreiros das fachadas os títulos dos textos pelo se destacam pelos estilos comerciais, uso de caixa-alta e baixa, respectivamente. ornamentais, irônicos e casuais. O As placas e letreiros problema consiste em saber se existe comerciais que registramos um vocabulário específico entre os letristas, os seus autores. E como eles nesta pesquisa foram pintados à mão livre, às resolvem as questões entre forma e vezes, diretamente nas função. De acordo com Kim & Kim (1993), paredes dos prédios, ou, em pequenas placas a maneira que os grupos culturais colocadas na frente do são tipograficamente reconhecidos “comércio”. A maioria deles depende de valores conotativos e exibe adornos ou detalhes denotativos das formas das letras, curiosos, revelam destreza considerando que elas devem do letrista pelo uso seguro ser analisadas dentro de uma dos pincéis. Percebemos determinada ambiência cultural que, determinadas envolvendo determinadas práticas letras apresentam e conhecimentos evidenciados não somente pelo ‘o que’ está escrito, mas particularidades em suas serifas, nas proporções, ‘como’ está escrito. no sombreamento, nas Com base em entrevistas

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18 finalizações dos traços, etc. Quando às repetições de determinados detalhes acontecem em número suficiente, reconheceremos, nas mesmas, um “modelo reduzido”. Algumas características reforçam a expressividade e autenticidade dessas peças. Vemos ainda, a identificação da natureza do “negócio” por determinados signos figurativos, garantindo o reconhecimento de propriedades que o cliente pretende comunicar (na figura 5, o desenho do pincel reforça seu enunciado), “a comunicação por imagens resulta mais ampla e imediata, garantindo ao receptor uma imediata relação ao referente” (Eco, 1979). A comunicação gráfica engloba atualmente uma grande variedade estilística e tecnológica em seus processos de produção. Ao investigarmos a profissão do letrista ou cartazista e as técnicas tradicionais do desenho e pintura manual de letras, entendemos ser

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DIFERENTES PLACAS E LETREIROS COMERCIAIS NA CIDADE DE NOVO HAMBURGO

importante superar padrões elitistas ditados pelo gosto e por modelos prontos, e reconhecer a necessidade de preservar-se um conhecimento que corre o risco de cair no esquecimento. São profissionais que transitam e convivem com o design gráfico oficial, e devem, portanto, ser inseridos e reconhecidos na comunicação gráfica atual.


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LUPTON, Ellen. The academy

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STEPHANIA PADOVANI

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ENTREVISTA COM ELLEN

Dra. Ellen Lupton é escritora, curadora e designer gráfica. É diretora do programa de MFA em Design Gráfico no Maryland Institute College of Art (MICA) em Baltimore, onde também atua como diretora do Center for Design Thinking. Como curadora de design contemporâneo na Cooper-Hewitt, National Design Museum desde 1992, produziu inúmeras exposições e livros. Recentemente, ela se concentrou em trazer a consciência do design para públicos mais amplos. Seu livro Thinking with Type (2004) é um guia básico de tipografia dirigido a todos que trabalham com palavras. D.I.Y .: Design It Yourself (2006), em coautoria com seus alunos de pós-graduação no MICA, explica os processos de design para um público geral. Seu projeto mais recente, D.I.Y. Kids (outubro de 2007), em coautoria com Julia Lupton, é um livro de design infantil ilustrado com arte infantil. Lupton recebeu em 2007 a Medalha de Ouro AIGA, uma das maiores honrarias concedidas a um designer gráfico ou educador de design nos EUA.


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Quando, onde, como e por que surgiu seu interesse pelo design da informação? Eu estou apaixonada por esse conteúdo. Sou um tipo específico de designer, que usa tipografia, layout, instalações e assim por diante para chamar a atenção para o conteúdo, seja esse conteúdo um texto em um livro ou uma obra de arte em um museu. Para mim, o meio não é a mensagem; a mensagem é a mensagem, e o design é uma ferramenta para enfatizar e aprimorar essa mensagem. Isso é o que me torna um designer de informação. Muitos designers gráficos se concentram na forma, e eu amo esses designers e amo seu trabalho; na verdade, dediquei grande parte da minha carreira a estudar e apresentar o trabalho de designers de vanguarda e progressistas. Para mim, pessoalmente, uso o design como um ato de enquadrar e encenar o conteúdo, não como um fim em si mesmo. Você poderia historicizar seus interesses / projetos? Estudei arte e design na Cooper Union School of Art na cidade de Nova York no início dos anos 80. Sempre tive interesse em escrever e interpretar design e, quando terminei a faculdade, me tornei curador de uma galeria e coleção da faculdade. Mais tarde, torneime curador do Cooper-Hewitt, National Design Museum, o único museu nos EUA dedicado exclusivamente ao design histórico e contemporâneo. Ocupei esse cargo desde 1993. Além do meu trabalho em museus,

“Para mim, pessoalmente, uso o design como um ato de enquadrar e encenar o conteúdo, não como um fim em si mesmo.”


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eu produzo livros por conta própria e com meus alunos no Maryland Institute College of Art, onde sou diretor do programa de MFA em Design Gráfico. Em todas essas funções curador, educador, autor - uso o design como uma ferramenta para fornecer informações. Recentemente, concentrei-me em compartilhar as técnicas de design thinking e produção com um público mais amplo e não profissional (D.I.Y.). “Pensar com tipos” é referência em diversos cursos de Design no Brasil, até por ser mais crítico que a maioria dos livros de tipografia que temos à disposição. Como você acha que sua abordagem em relação à educação tipográfica difere da tradicional? A tipografia tem uma rica tradição intelectual. É também uma arte prática e está muito viva e em evolução na sociedade global de hoje. Criei Thinking with Type porque vi a necessidade de um livro que combine conhecimento prático com investigação intelectual. Os leitores responderam bem a esta abordagem. Estou muito orgulhosa da bela edição criada pela CosacNaify no Brasil.

“A tipografia tem uma rica tradição intelectual. É também uma arte prática e está muito viva e em evolução na sociedade global de hoje.”


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“O design também não é mais um clube masculino exclusivo.” As novas tecnologias trouxeram mais liberdade ao designer gráfico para criar, manipular, distorcer, animar e desconstruir fontes. O que você acha que são as implicações disso? As ferramentas às quais temos acesso agora revolucionaram nosso campo. Isso é uma coisa espetacular. Quando eu era estudante na era das trevas, antes da “editoração eletrônica”, nossas ferramentas eram lentas, caras, inflexíveis e tóxicas. Algumas pessoas lamentam o declínio da qualidade na era do software, mas, no geral, a qualidade é muito melhor agora e muito mais pessoas têm acesso aos processos de design. Claro, há um monte de porcaria, mas o melhor material sendo produzido hoje é absolutamente fantástico, e há muito mais design de ponta em geral do que há vinte anos atrás. O design também não é mais um clube masculino exclusivo.


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“Nosso livro mostra como projetar e inventar estruturas observando o comportamento dos materiais e fazendo experiências com eles.”

Os praticantes costumam reclamar que a academia não produz um conhecimento diretamente aplicável à sua realidade. Você acha que os profissionais de design da informação estão se beneficiando do conhecimento “gerado” pela pesquisa nesta área? Eu não presto atenção a muitas pesquisas acadêmicas. Estou mais interessada nos blogs e no jornalismo cotidiano.


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A partir da sua produção fica claro que você tem interesse em levar design para um público mais amplo. Quais você acha que são os benefícios dessa prática? Você também poderia mencionar algumas de suas iniciativas para explicar o design ao público em geral? O design é uma ferramenta libertadora. Ele permite que as pessoas criem e distribuam conteúdo, geralmente em uma escala local onde a publicação não acontecia. A sociedade democrática é aprimorada quando mais pessoas têm acesso à mídia. Quanto mais as pessoas entenderem o design, mais respeito terão por ele no nível mais alto. Quando os jovens aprendem a tocar um instrumento musical, eles ganham uma apreciação pela música para o resto da vida, mesmo que não se tornem músicos profissionais. Hoje, os instrumentos de educação criativa incluem software de edição de vídeo, software de blog, software de publicação, Photoshop e muito mais. Aprender a tocar esses instrumentos dá poder às pessoas e também as ajuda a compreender a arte e a complexidade por trás da mídia contemporânea. Sim, qualquer um pode experimentálo, mas poucos vão dedicar a vida a ele (e ingressar no Photoshop Symphony). Meus projetos nessa área incluem o livro D.I.Y .: Design It Yourself, lf, escrito com meus alunos de pós-graduação no MICA, e D.I.Y. Kids, criado com minha irmã e nossos filhos (2007). Também tenho dois livros próximos nessa área: Publicação independente: Como projetar e publicar seu próprio livro (2008) e Projetar sua vida (2009).


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Origem e princípios básicos do Computer Clubhouse Natalie Rusk, Mitchel Resnick e Stina Cooke A tecnologia passou por uma grande mudança desde o início do nosso primeiro ComputerClubhouse, há 15 anos. Naquela época, ninguém andava carregando telefones celulares. A maioria das pessoas nunca tinha ouvido falar sobre Internet. Os sites mais conhecidos atualmente - como Google, Yahoo e YouTube - ainda não existiam. Embora as tecnologias tenham mudado radicalmente, as motivações e necessidades que levaram à criação do programa Computer Clubhouse permaneceram as mesmas e continuam impulsionando o programa nos dias de hoje. Por isso, achamos interessante refletir novamente sobre as ideias e questões que nos levaram a iniciar o primeiro Clubhouse. Neste capítulo, vamos contar a história da origem do primeiro Computer Clubhouse e abordar os quatro princípios básicos que orientaram o desenvolvimento do programa Clubhouse desde o seu lançamento, em 1993.


30 COMO O COMPUTER CLUBHOUSE COMEÇOU

O primeiro Computer Clubhouse foi criado em resposta a um grupo de crianças que estavam entrando escondidas em um museu. Durante uma semana de férias escolares, em dezembro de 1989, o Museu do Computador, no centro de Boston, ofereceu uma oficina sobre robótica para famílias, usando materiais LEGOLogo emprestados do MIT Media Lab. Qualquer pessoa podia participar dessa oficina. No segundo dia do evento, um grupo de quatro crianças apareceu; elas conversavam entre si em uma combinação de inglês e espanhol. Um dos meninos do grupo, com cerca de 11 anos, pegou um pequeno motor cinza LEGO. Foi mostrado a ele como conectá-lo em uma fonte de energia para ligá-lo. O motor começou a girar e ele ficou super animado e começou a chamar seus amigos para verem também: “Míra, míra! Vejam isso!” As crianças começaram a construir um

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carro usando materiais LEGO e criaram um programa no computador para controlar os movimentos dele. Elas voltaram ao museu dia após dia, ansiosas para aprender mais. Depois de brincarem com o carro por um tempo, elas construíram e programaram um guindaste para suspendê-lo. Ao final da semana, a oficina de robótica foi encerrada, e os materiais LEGO-Logo foram devolvidos para o MIT. Na semana seguinte, tudo estava muito quieto no museu. Às 15h00, as portas do grande elevador do museu se abriram. Dentro dele estavam o menino e seus amigos, que perguntaram: “LEGO-Logo?” Explicamos que não tínhamos mais os materiais disponíveis, e eles andaram um pouco pelo museu olhando as exposições. Mas, as exposições de museus costumam ser desenvolvidas para uma interação de curto prazo, e não oferecem oportunidades de criação livre. Assim, as crianças ficaram desapontadas. Algumas semanas depois, um administrador do museu enviou um e-mail aos funcionários, alertando sobre um grupo de crianças que estava se escondendo no museu e pedindo que avisassem os seguranças caso elas fosem vistas. No final das contas, eram as mesmas crianças que tinham participado com tanta empolgação da oficina de robótica. Mas, agora, como estavam à toa no museu, elas começaram a ter problemas com os seguranças. Perguntamos a algumas pessoas se havia algum centro de atividades extracurriculares local do qual essas crianças pudessem fazer parte, mas não havia nenhum na região central. Também tentamos descobrir quais programas de aprendizagem baseados em tecnologia estavam disponíveis para os jovens na grande região de Boston. Encontramos


ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS DO COMPUTER CLUBHOUSE

centros comunitários de tecnologia que ofereciam oportunidades para as crianças brincarem com jogos educativos ou assistirem a aulas sobre habilidades básicas de computação, mas não havia nenhum programa que oferecesse oportunidades para os jovens desenvolverem seus próprios projetos criativos. As crianças que se escondiam no museu queriam algo diferente. Elas estavam ansiosas para conhecer novas tecnologias. Esse era um grupo de crianças que queria continuar voltando ao museu para trabalhar em projetos que sabíamos que eram valiosos educacionalmente (Resnick, 2006). Elas estavam procurando, mas não havia aonde ir.

A CRIAÇÃO DO MODELO DO COMPUTER CLUBHOUSE

31 experimentais. Reunimos consultores de grupos de pesquisa universitários e de programas comunitários para jovens, conversamos com os jovens da região e criamos um conselho consultivo de jovens. A partir dessas discussões, surgiram as ideias e os planos para o primeiro Computer Clubhouse. Logo no início, identificamos quatro princípios básicos (Resnick e Rusk, 1996a). Nós aplicamos esses princípios para a criação do primeiro Computer Clubhouse, no Museu do Computador. No entanto, eles continuaram desempenhando papel importante conforme a rede do Clubhouse foi sendo ampliada para mais de cem unidades nos últimos 15 anos.

Assim, começamos a explorar a possibilidade de criar um novo tipo de centro de aprendizagem que abordasse as necessidades e os interesses desses e de outros jovens da região. Nossa meta era criar um espaço de aprendizagem no qual os jovens tivessem não só a tecnologia computacional mais recente, mas também o acesso a pessoas que poderiam inspirá-los Princípio 1: Apoiar a e apoiá-los no desenvolvimento de aprendizagem por projetos criativos baseados em seus interesses. Ao desenvolvermos nossos meio de experiências planos, nos baseamos nas ideias criativas mais recentes de pesquisadores e profissionais da educação, e também Qual foi o segredo para o em nossas próprias experiências sucesso da oficina LEGOtrabalhando em projetos educativos Logo que despertou a ideia


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do primeiro Computer Clubhouse? Na nossa opinião, um fator fundamental foi a maneira como osparticipantes foram ativamente envolvidos na elaboração, criação e invenção das coisas. Muitas iniciativas educacionais tentam transmitir ou fornecer informações para os aprendizes. O Computer Clubhouse, no entanto, baseiase em um modelo diferente de aprendizagem e ensino, no qual o foco está na construção, e não na instrução. De fato, a abordagem de aprendizagem do Clubhouse baseia-se em uma filosofia educacional conhecida como construcionismo, desenvolvida pelo professor do MIT Seymour Papert (1993a). O construcionismo é baseado em dois tipos de construção. Primeiramente, ele afirma que a aprendizagem é um processo ativo, no qual as pessoas constroem o conhecimento ativamente a partir de suas experiências no mundo. As pessoas não têm ideias (em inglês, get), elas as criam (em inglês, make). Esse aspecto de construção vem da teoria construtivista de desenvolvimento do conhecimento, de Jean Piaget. Ao conceito de Piaget, Papert acrescentou outro tipo de construção, afirmando que as pessoas constroem novos conhecimentos com uma eficiência significativa quando estão envolvidas no desenvolvimento de produtos com significado pessoal para elas. Os aprendizes podem criar uma escultura, escrever

“Nos Clubhouses, os jovens não aprendem apenas a usar essas ferramentas, eles aprendem a expressar a si mesmos por meio delas”

um poema, compor uma música ou programar uma animação, mas o importante é que eles estejam ativamente envolvidos na criação de algo importante para si ou para as pessoas ao redor deles. Essas ideias são a base da abordagem de aprendizagem do Clubhouse. Nos Clubhouses, os jovens não apenas interagem com as tecnologias, mas também desenvolvem projetos e criam coisas usando as tecnologias. Em vez de apenas assistir ao que já está pronto na Web, os membros do Clubhouse criam suas próprias animações e vídeos. Em vez de jogar no computador, eles criam seus próprios jogos de computador (veja também o Capítulo 3). As atividades nos Clubhouses variam muito, desde a criação de invenções robóticas até a coreografia de dançarinos virtuais e a composição de letras de músicas.


ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS DO COMPUTER CLUBHOUSE

No entanto, todas essas atividades tão diferentes têm uma estrutura comum: envolver os jovens por meio da criação. Para apoiar essas atividades, os Clubhouses oferecem diversas ferramentas de criação, inclusive ferramentas digitais para gravação e edição de músicas, publicação na Web, programação e animação, edição de imagens e vídeos, design e renderização de modelos tridimensionais, além de criação e controle de máquinas robóticas. Em geral, os membros do Clubhouse evoluem rapidamente das ferramentas básicas para as ferramentas profissionais de software. À medida que trabalham com elas, eles adquirem mais confiança e autonomia técnica. Por exemplo, um jovem pode começar criando

33 imagens com um programa simples de desenho, como o KidPix, e depois mudar para o Photoshop e explorar manipulações mais avançadas de imagem e efeitos visuais para, em seguida, aprender a usar o Scratch ou o Flash para animar suas criações. Nos Clubhouses, os jovens não aprendem apenas a usar essas ferramentas, eles aprendem a expressar a si mesmos por meio delas. Eles não aprendem apenas

os detalhes técnicos, mas também a heurística de ser um bom designer: como conceitualizar um projeto, como usar os materiais disponíveis, como persistir e encontrar alternativas quando nem tudo dá certo, e como enxergar um projeto pela visão de outras pessoas. Em resumo, eles aprendem a administrar um projeto complexo, do início ao fim. Quando os membros do Clubhouse trabalham em projetos criativos, eles passam pelo que chamamos de espiral do design criativo (Figura 1.1). Nesse processo, eles imaginam o que querem fazer, criam um projeto baseado em suas ideias, testam alternativas, compartilham suas ideias e criações com outras pessoas e refletem sobre suas experiências. E tudo isso os leva a imaginar novas ideias e novos projetos. À medida que os jovens passam por esse processo repetidas vezes, eles aprendem a desenvolver suas próprias ideias, testar limites, resolver problemas, obter opiniões de outras pessoas e criar novas ideias baseadas em suas experiências.


34 Frequentemente os jovens começam com um projeto relativamente simples, por exemplo, tirando fotos de si mesmos e colocando-as em um cenário. Esse tipo de projeto inicial envolve os participantes na espiral do processo criativo durante uma ou duas tardes. Por exemplo, eles podem começar imaginando qual cena querem criar, depois tiram uma foto de si mesmos, fazem a montagem dessa foto em um cenário (como um evento esportivo, ou um lugar preferido), testam alguns efeitos visuais, imprimem e mostram para outras pessoas, e, por fim, discutem ideias para outros projetos. Depois de um pouco de reflexão, eles podem optar por acrescentar outros personagens à cena e continuar com a próxima repetição da espiral. À medida que os jovens conhecem melhor as diversas ferramentas e aspectos do processo de criação, eles costumam desenvolver planos mais complexos e que

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demandam mais tempo (por exemplo, uma animação stopmotion, um modelo 3D sofisticado ou uma coleção de músicas para um álbum). Normalmente, esses projetos se tornam complexos e envolvem mais pessoas trabalhando juntas em equipe.

Princípio 2: Ajudar os participantes a se construir algo baseado em seus próprios interesses Nos cursos de licenciatura, geralmente o foco está nos métodos de ensino, e não nas motivações da aprendizagem. Muitos cursos para educadores enfatizam como e o que ensinar, mas raramente analisam por que os alunos podem querer aprender. Quando o problema da motivação é abordado, costumase dar ênfase a motivadores e incentivos extrínsecos, como notas e prêmios baseados em desempenho. Por que isso acontece? Muitos acreditam que aprender é algo necessariamente tedioso. Para motivar os alunos a aprender, alguns educadores imaginam que precisam oferecer recompensas ou transformar o assunto em uma competição, dando prêmios àqueles que tiverem as melhores notas. No entanto, se você observar o que acontece fora da escola, encontrará muitos exemplos de pessoas aprendendo — e aprendendo muito bem, diga-se de passagem — sem ganhar recompensas explícitas. Os jovens que parecem ter períodos curtos de atenção na escola costumam demonstrar uma excelente


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concentração nos projetos pelos quais realmente se interessam. Eles podem passar horas aprendendo a tocar guitarra ou a fazer manobras de skate. Na verdade, muitos dos designers, cientistas e outros profissionais bem-sucedidos relacionam seu envolvimento e sucesso no trabalho a um interesse da infância. Claramente, os interesses dos jovens são uma excelente fonte inexplorada. Quando eles se interessam por aquilo em que estão trabalhando, a dinâmica do ensino muda. Em vez de serem “empurrados” para aprender, os jovens trabalham por conta própria e buscam ideias e orientações. Além de ficarem mais motivados, eles também desenvolvem um entendimento mais profundo, além de conexões mais ricas com o conhecimento. Em princípio, alguns interesses dos jovens podem parecer triviais ou superficiais, mas eles podem criar redes maiores de conhecimento relacionadas a esses interesses. O desejo de conhecer mais a fundo um determinado assunto pode levar a conexões com outros assuntos e disciplinas. O desafio da educação é encontrar maneiras de ajudar os jovens a fazer essas conexões e desenvolvê-las de forma mais completa. Por exemplo, o interesse em andar de bicicleta pode levar a investigações sobre marchas, a física do equilíbrio, a evolução dos veículos ao longo do tempo ou os efeitos ambientais dos diferentes meios de transporte. Os Clubhouses são criados para ajudar os jovens a explorar seus interesses. Os jovens de famílias de maior renda costumam ter mais oportunidades de buscar seus interesses (por exemplo, aulas de música e acampamentos especializados), e aqueles que normalmente

35 vêm aos Computer Clubhouses têm poucas oportunidades como essas. Muitos deles não têm recursos nem suporte para identificar e explorar possíveis áreas de interesse, deixados sozinhos para desenvolver algo a partir delas. Os participantes do Clubhouse são incentivados a fazer suas próprias escolhas. O simples fato de ir até um Clubhouse envolve uma escolha: todos os jovens que participam dos Clubhouses escolheram estar lá, e eles podem ir e voltar quando quiserem. Quando entram em um Clubhouse, os participantes passam a confrontar continuamente escolhas sobre o que fazer, como fazer e com quem trabalhar. A equipe do Clubhouse e os mentores ajudam esses jovens a adquirir experiência com uma aprendizagem autodirecionada, ajudandoos a reconhecer, confiar, desenvolver e aprofundar seus próprios interesses e talentos.


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Ajudar os jovens a desenvolver seus interesses não significa apenas deixá-los fazer o que quiserem. Eles precisam ter a liberdade de seguir suas ideias, mas também precisam de apoio para transformá-las em realidade. Nas paredes, prateleiras e discos rígidos dos Clubhouses existem grandes coleções de exemplos de projetos, criados para dar aos participantes uma noção do que é possível fazer, e também diversos pontos de partida para eles darem os primeiros passos. Em um canto de cada Clubhouse há uma biblioteca com livros, revistas e manuais com ainda mais ideias de projetos (e um sofá para tornar a leitura mais confortável). Muitos jovens começam imitando um exemplo de projeto, depois trabalham em variações do mesmo tema e logo acabam desenvolvendo um caminho pessoal, com base em seus próprios interesses. Essa abordagem só funciona quando o ambiente suporta uma grande diversidade de projetos e caminhos possíveis. Os jovens têm uma grande variedade de interesses, por isso os Clubhouses precisam oferecer diversas atividades para atender a esses interesses. O computador tem um papel fundamental nesse caso. Ele é um tipo de “máquina universal”, compatível com projetos criativos de diversos domínios: música, arte, ciências e matemática. Em um mesmo momento, uma dupla de jovens pode estar usando um computador para criar uma animação gráfica, enquanto no computador ao lado, outro participante pode estar usando um computador semelhante para programar uma construção robótica. Geralmente, os projetos do Clubhouse exigem conhecimento em vários domínios.

Por exemplo, a criação de um clipe musical envolve a gravação da música no estúdio, a filmagem e a edição do vídeo, a elaboração da capa para o CD e a criação de um site na Web para o grupo. Esse tipo de projeto permite que membros do Clubhouse com interesses diferentes trabalhem juntos e aprendam novas habilidades uns com os outros. Às vezes, as pessoas não interpretam este princípio básico corretamente. Quando escutam que os Clubhouses incentivam os jovens a se basearem em seus próprios interesses, elas imaginam que os adultos precisam sair do caminho e deixar os membros do Clubhouse fazerem tudo sozinhos. Por exemplo, uma vez ouvimos alguém se oferecer para organizar uma oficina para os membros do Clubhouse, para ensiná-los a criar revistas em quadrinhos animadas. Inicialmente, outra pessoa ignorou a ideia, explicando o seguinte: “Nós não fazemos


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oficinas no Clubhouse, deixamos os participantes seguirem seus próprios interesses.” Mas não é isso que este princípio básico quer dizer. É importante que os jovens tenham liberdade para escolher o que explorar, mas eles geralmente precisam de muita ajuda para identificar e buscar seus interesses. Não apoiaríamos a ideia de um Clubhouse organizar uma oficina imperativa, em que todos os membros do Clubhouse fossem obrigados a aprender sobre revistas em quadrinhos animadas. Mas, contanto que os membros tenham a liberdade de optar por participar ou não, achamos uma excelente ideia oferecer oficinas para eles. Essas oficinas podem ajudá-los a descobrir por quais áreas eles têm (ou não) interesse, e a aprender novas habilidades que serão úteis no desenvolvimento de seus interesses.

”O espaço do Clubhouse foi criado para dar a sensação de um estúdio de design criativo, uma combinação de estúdios de arte, música, vídeo e laboratório de robótica.”

Princípio 3: Cultivar uma comunidade emergente de aprendizes Um laboratório de informática comum para 30 crianças costuma ter 30 computadores sobre mesas dispostas em linhas retas e voltadas para a frente da sala. Essa configuração foi criada para que as crianças pudessem ver o professor na frente da sala e trabalhar sozinhas. Por outro lado, desenvolvemos o espaço do Clubhouse com a meta clara de incentivar e apoiar a colaboração.

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Em um típico Computer Clubhouse, cada mesa com um computador tem duas ou três cadeiras para facilitar o trabalho em equipe. As mesas são dispostas em pequenos grupos ao longo das laterais da sala, liberando espaço para circulação. Todas as cadeiras nos Clubhouses têm rodinhas, assim os participantes podem interagir entre si com mais facilidade, deslizando pela sala para ver o que estão fazendo em outro computador. No centro de cada Clubhouse há uma grande mesa verde sem computadores. Essa mesa funciona como uma área comum, onde as pessoas podem se reunir para compartilhar ideias e trabalhar em planos, desenhos, trabalhos manuais e na construção de projetos - ou apenas para fazer um lanchinho e bater papo. O espaço do Clubhouse foi criado para dar a sensação de um estúdio de design criativo, uma combinação de estúdios de arte, música, vídeo e laboratório de robótica. Algumas das escolhas para a composição do espaço podem parecer irrelevantes (ou até mesmo extravagantes), mas descobrimos que o design do espaço influencia significativamente os comportamentos e as atividades dos participantes. Tão logo os jovens entram no Clubhouse, a configuração do espaço sugere várias possibilidades. Eles têm à disposição ferramentas e exemplos que podem despertar seu interesse e imaginação. Em um novo Computer Clubhouse, o diretor comentou surpreso que o comportamento dos jovens mudou radicalmente para melhor quando a iluminação em trilho foi instalada. Além disso, muitos membros da equipe do Clubhouse notaram que as cadeiras com rodinhas, embora muitas vezes seja um fator de distração,

tornavam mais fácil e mais provável de os participantes compartilharem e colaborarem uns com os outros. Nos Clubhouses, os projetos não são entidades fixas, eles crescem e evoluem ao longo do tempo. Da mesma maneira, ninguém é obrigado a trabalhar sempre em uma equipe específica; as comunidades surgem naturalmente com o tempo. As equipes de criação são formadas de maneira informal, unindo-se em torno dos interesses comuns. As comunidades são dinâmicas e flexíveis, evoluindo para atender às necessidades do projeto e também dos participantes (Resnick, 1996). Para favorecer essas colaborações em constante desenvolvimento, os Computer Clubhouses recrutam uma equipe de mentores adultos culturalmente diversificada, isto é, profissionais e alunos universitários das áreas de arte, música, ciências e tecnologia. Os mentores atuam como tutores, catalisadores e consultores, trazendo novas ideias de projetos para seus Clubhouses. A maioria deles dedica seu tempo de forma voluntária (veja também


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“Nos Clubhouses, os jovens também têm a chance de ver os adultos aprendendo.”

o Capítulo 8). Em um dia normal, o Clubhouse conta com dois ou três mentores. Por exemplo, engenheiros podem trabalhar em projetos de robótica com os participantes do Clubhouse, artistas podem ajudar em projetos de imagens e animação, e programadores podem se envolver em jogos interativos. Para os jovens que nunca interagiram com um adulto envolvido em carreiras acadêmicas ou profissionais, essa oportunidade é fundamental para que eles consigam se imaginar seguindo caminhos profissionais semelhantes. Dessa maneira, os Clubhouses oferecem mais do que apenas acesso à tecnologia. Os jovens de famílias de baixa renda precisam não apenas ter acesso às novas tecnologias, mas também às pessoas que sabem usá-las de maneiras interessantes e criativas. Os Clubhouses aproveitam um recurso local inexplorado, oferecendo uma nova forma de as pessoas da comunidade compartilharem suas

39 habilidades com os jovens do local. Ao envolver mentores, os Clubhouses fornecem aos jovens das áreas mais desfavorecidas da cidade uma oportunidade rara de ver os adultos trabalhando em projetos. Os mentores vão além de apenas oferecer apoio ou ajuda; muitos deles trabalham em seus próprios projetos e incentivam os jovens do Clubhouse a fazer parte deles. John Holt (1977) afirmou que as crianças aprendem melhor com os adultos que trabalham em coisas pelas quais se interessam: “Eu não vou pintar quadros na esperança de que, ao me verem, as crianças vão se interessar por pintura. Deixem que as pessoas que já gostam de pintar pintem onde as crianças possam vê-las” (p. 5). Nos Clubhouses, os jovens também têm a chance de ver os adultos aprendendo. Na sociedade de hoje, que está sempre passando por mudanças, talvez a habilidade mais importante de todas seja a de aprender


40 coisas novas. Pode parecer óbvio que os jovens, para se tornarem bons aprendizes, devem observar os adultos aprendendo. Entretanto, raramente isso é o que acontece nas escolas. Normalmente, os professores evitam situações em que os alunos os vejam aprendendo. Eles não querem que os alunos percebam qualquer falta de conhecimento da parte deles. Nos Clubhouses, os jovens podem ver os adultos em pleno processo de aprendizagem. Para alguns participantes do Clubhouse, isso acaba sendo um verdadeiro choque. Um dia, muitos deles ficaram perplexos quando um membro da equipe do Clubhouse, depois de depurar um problema complexo de programação, comemorou: “Eu acabei de aprender uma coisa!” Por exemplo, dois alunos de pós-graduação de uma universidade local decidiram começar um novo projeto de robótica em um dos Clubhouses da região

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de Boston. Durante vários dias, eles trabalharam sozinhos; nenhum dos jovens parecia especialmente interessado. Mas, à medida que o projeto começou a tomar forma, alguns deles começaram a prestar mais atenção. Um dos jovens decidiu construir uma nova estrutura para encaixar no topo do robô, outro viu o projeto como uma oportunidade de aprender sobre programação. Depois de um mês, havia uma pequena equipe de pessoas trabalhando em vários robôs. Alguns jovens se envolveram completamente, trabalhando no projeto todos os dias. Outros, contribuíam de tempos em tempos, entrando e saindo da equipe do projeto. O processo permitiu que diferentes jovens colaborassem em diferentes níveis e momentos, em um processo que alguns pesquisadores chamam de participação periférica legítima (Lave & Wenger, 1991). À medida que os jovens se familiarizam com as tecnologias nos Clubhouses, eles também começam a agir como mentores. Com o tempo, eles começam a assumir mais funções de mentoria, ajudando a apresentar aos novos participantes os equipamentos, projetos e ideias do Clubhouse.

Princípio 4: Criar um Ambiente de Respeito e Confiança Quando visitantes entram em um Clubhouse, eles geralmente se impressionam com as criações artísticas e com as habilidades técnicas dos participantes. Da mesma maneira, eles são surpreendidos pelo modo como os jovens do Clubhouse interagem uns com os outros. A abordagem do Clubhouse prioriza o desenvolvimento de uma cultura de respeito e confiança. Esses valores não só fazem do Clubhouse um lugar convidativo para passar


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Um deles explicou por que gostava mais do Clubhouse do que da escola: “Aqui ninguém fica no nosso pé.” Mas essa liberdade traz consigo altos padrões e altas expectativas. A equipe e os mentores do Clubhouse não saem simplesmente distribuindo elogios para aumentar a autoestima dos participantes. A relação deles com os jovens está mais para a de colegas que dão feedbacks sinceros e os estimulam a considerar novas possibilidades. Eles estão sempre perguntando: “O que você poderia Em vários ambientes e situações, eles relutam fazer agora? Você tem em fazer isso por medo de serem julgados ou outras ideias?” Muitos até ridicularizados. Nos Clubhouses, a meta jovens do Clubhouse é fazer com que os participantes se sintam estão aprendendo não só seguros para experimentar e explorar. Ninguém sobre novas habilidades deve ser criticado por cometer erros ou por ter computacionais, mas ideias “bobas”. Os jovens terão o tempo de que também sobre novos estilos precisarem para brincar com suas ideias, pois de interação. Eles são sabe-se que as ideias (e as pessoas) precisam tratados com respeito e de tempo para serem desenvolvidas. Uma confiança, e espera-se que nova participante de um Clubhouse passou eles façam o mesmo com as semanas manipulando algumas imagens, sem outras pessoas. parar. Então, como um bebê que demora para começar a falar, mas que de repente começa a formular frases completas, ela começou a usar essas imagens para criar animações gráficas espetaculares. Os participantes do Clubhouse têm muita liberdade e também muitas opções.

o tempo, mas também são essenciais para permitir que os jovens testem novas ideias, assumam riscos, sigam seus interesses e desenvolvam familiaridade com novas tecnologias. Na realidade, nenhum dos outros princípios básicos pode ser posto em prática sem um ambiente de respeito e confiança. A palavra “respeito” assume muitos aspectos nos Clubhouses: respeito pelas pessoas, pelas ideias e pelas ferramentas e equipamentos. Os mentores e as equipes definem o clima do ambiente, tratando os jovens do Clubhouse com respeito. Logo no início, os participantes têm acesso a equipamentos caros e são incentivados a desenvolver suas próprias ideias. “Você está dizendo que eu posso usar isso?” é uma pergunta comum de se ouvir dos jovens na primeira vez que eles vão a um Clubhouse e exploram os recursos e opções disponíveis. No entanto, mesmo com todas essas opções, eles não aproveitarão as oportunidades se não se sentirem “seguros” para testar ideias novas.


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Experiência com graffitis: modos de resistência e educação informal Viver a rua, acessar o quantum experimental e poético que, de modo fugaz, se produz por instantes nas suas intersecções sensíveis. Ativar corpos, corpos que devido aos modos formatadores, operantes na atualidade, muitas vezes vegetam inativos. Produzimos saberes a partir das intervenções com o corpo da cidade, partindo das inscrições urbanas como os graffitis, práticas promotoras de experiências estéticas no espaço urbano, em meio aos “gritos” públicos que tentam quebrar o gesso de uma contemporaneidade privada, trancafiada em modelos. Inscrições urbanas, intervenções gráfico-visuais presentes

GRAFFITI DA DUPLA OS GÊMEOS


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pelo espaço urbano, os graffitis são intervenções artísticas que tem no espaço urbano sua matéria de criação. Colocada como espaço da margina lidade, a rua é muitas vezes demonizada. Um submundo. A rua é penalizada por uma cultura que marginaliza os espaços para que se possam criar áreas delimitadas, vendidas como seguras e intermediadas por consumo e padronizações. Cultura que transforma tudo em capital, em monetização e consumo. Vende-se segurança, entregue em forma de isolamento e aprisionamento, “parecem estar em jogo aí enunciados muito semelhantes aos que motivaram as instituições disciplinares, porém, agora, ao invés de isolar o outro, usa-se outra estratégia: ilhar-se.” (COSTA; MIZOGUCHI; FONSECA, 2004, p.175). Trocam-se praças e parques públicos por shopping centers e grandes condomínios, muitas

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vezes mesclados. Espaços padronizados em que figuram grandes marcas, redes de franquias que conseguem padronizar o que se come, o que se veste e o que se pensa; “o cidadão faz seu esquadrinhamento e frequenta tais locais onde a população é economicamente homogeneizada e onde acredita estar mais seguro” ( COSTA; MIZOGUCHI; FONSECA, 2004, p.175). Vende-se o estilo de vida do momento, o desejo de tê -lo, a ideia de uma essência que se torna aprisionamento. Os espaços públicos ficam sujeitos a diversos tipos de controle, das câmeras de monitoramento aos modos de subjetivação, capazes de fazer o sujeito se autocontrolar. Na Sociedade de Controle segundo os estudos de Gilles Deleuze (1992), rarefeito, o controle passa a estar em toda parte. Com tanta segurança eliminam-se as multiplicidades, as possibilidades de novas singularidades. O olho do “grande irmão”, como disse George Orwell (2005), está em toda parte, tornando difícil escapar de representações, escapar de sermos algo para além do esperado, de não conferir o papel que nos é delegado. Sim, seguimos uma “trajetória sócioprofissional pré-determinada” (GUATTARI, 1992, p. 178) como nos alerta Felix Guattari (1992), mas, se novas formas de controle são inventadas a cada dia, novas for mas de “resistência” (DELEUZE, 1988, 1992, 1999) também devem surgir. Este artigo nasce de um projeto de investigação em educação junto ao espaço urbano, corpo em mutação no qual se ergue formas de resistência. Resistir, criar novos modos de existência e novas formas de vida que escapam às formatações. Resistir aos mais variados


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modos de produção de subjetividade, para favorecer singularidades e colocar as variáveis em estado de variação contínua. Sem especificar nem celebrar aspectos técnicos de suas composições, a escrita trazida aqui chega por um olhar atento aos processos subjetivos promovidos pelas experiências com graffitis. Não se trata de “o que são” os graffitis, mas de “qual seu modo de funcionamento”, do que eles podem ou do que nós podemos com eles. Temos como objetivos problematizar a experiência com alguns graffitis quanto à capacidade de produzir determinadas subjetividades, resistindo àquelas que agem na direção da reprodução e da afirmação de uma estrutura estabelecida e oficializada. E destacar os modos de subjetivação que favorecem forças inventivas capazes de produzirem rupturas, destacando alguns graffitis que colaborem para uma educação potencializadora capaz de ensinar segundo princípios de informalidade e pautado pela capacidade intensificadora da “vontade de potência” dos indivíduos. Utilizado em pesquisas de campo voltadas para o estudo da subjetividade, escolhemos o método cartográfico para esta ação, com ele buscamos compartilhar experiências que escapassem de uma abordagem explicativa e determinista, dando vasão ao trânsito pelas ruas da cidade de Pelotas/ RS. Dentre os motivos dessa escolha pela cartografia, dois se destacam: a orientação da linha de pesquisa com a qual a investigação esteve envolvida e o amálgama com o movimento urbano que ela faz. Pois se tem as ruas como um campo problemático, sendo mapa, território de passagem e implicação geográfica; é de onde se retira a matéria que dá

consistência ao que se escreve. A cartografia é tomada junto ao aprendizado com a cidade – muros, casas, edifícios, ruas, praças, pessoas, animais, graffitis, sonoridades, cheiros, caminhadas – tudo constituindo um território que permite colocar os corpos em deslocamentos. Dentro do projeto de pesquisa, o processo cartográfico produziu registros a partir de entrevistas com inscritores urbanos, artistas “marginais”, e participação em oficinas de graffiti-stencil-lambee-cia. Destaca-se também o acompanhamento de pichadores, quando em saída de campo, eventuais “rolés” marcados por uma experimentação de adrenalina na ação que envolve o corpo empírico, como prática de guerrilha para e com a cidade. Queremos aqui compartilhar experiências que nos permitiram acessar fluxos capazes de criar, modificar ou destruir mundos, num


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sentido nietzschiano, em que tais ações abram caminhos para o novo, para a realização de um grau de elevação da potência. Para evidenciar que há no graffiti algo capaz de produzir sentido para um “estar-na-cidade”, utilizamos o conceito de “diferença”. Trata-se de um modo de pensar, ou seja, é um exercício do pensamento que produz multiplicidades, no sentido da capacidade de se multiplicar, criar movimentos, devires, criar “um grande coletivo de singularidades que se descobre quando desconstruímos o senso comum” (AIRES, 2013, p.87). Segundo Tomas Tadeu da Silva: “mais do que um desvio da norma, a diferença é um movimento sem lei” (SILVA, 2002, p.66), que não tem nada a ver com o “diferente”. O mesmo autor nos fala de [há] dois apontamentos sobre esta “diferença”, âmbito do cará ter de ilegalidade e das tentativas de legalização de certas práticas.

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O primeiro é que “a diferença não pede tolerância, respeito ou boa-vontade. A diferença, desrespeitosamente, simplesmente difere” (SILVA, 2002, p. 66), ou seja, em sua condição de diferença os graffitis não estão a pedir espaço, “inclusão” ou aclamar uma identidade, eles estão a produzir diferença, invenção, e a nos fazer buscar o que se passa entre nós e eles, a compor com eles de modo a produzir um outro, que já não é mais nós ou ele, mas algo novo. O segundo diz que “mais que um desvio da norma, a diferença é um movimento sem lei” (SILVA, 2002, p. 66), esses termos dão a dimensão do quanto ser “ilegal” é o que move muitas das inscrições urbanas, não apenas uma ilegalidade jurídica, mas uma busca pela liberação, ou libertação, de qualquer normatização que venha de uma suposta lei urbana que queira impor-se. Por que desviar-se de uma norma? Porque há o desejo pela busca de uma abertura a múltiplas conexões, esta não obedece a um centro e encontra no desvio a força para produzir multiplicidade e agir como agente desestabilizador dos modos de habitar a cidade que não produzem “diferença”. Para Suely Rolnik, “todas as entradas são boas desde que as saídas sejam múltiplas” (ROLNIK, 1989, p.66), essa abertura não segue o rumo das identidades que diz o que “é” algo, para ocupar-se com o que fazer com este algo, produzir diferença, fazer conexões, composições com a multiplicidade.


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Problematizando os graffitis como práticas estéticas que envolvem a coletividade na produção de diferença, pergunta-se: como eles nos educam de modo informal? Como inventam nosso cotidiano? Quando potencializam a produção de novos modos de subjetivação? Pensamos as experiências com graffitis a partir do conceito de “potência” (NIETZSCHE, 1983, 2002, 2005), acompanhando o modo como elas ocorrem quando favorecem graus de potência, são movimentos de criação que resistem a um poder estagnante, um poder que define e serializa as subjetividades. Esse conceito de potência trata de uma busca pelo distanciamento da dicotomia “bom e mau”. Vontade de potência é precisamente vontade de vida, sua condição fundamental. Capacidade de agir no conjunto de forças, capacidade de ser, de construir ou destruir, movimentar, promover composições. O que está em jogo é nossa capacidade de criar movimento na vida, para além de julgamentos morais. Em seu livro “Genealogia da moral”, Nietzsche (2002) descreve o momento da consolidação do conceito de bom e mau e como estes são limitadores quando impostos/aceitos como verdades, pois são modos de ser baseados numa moral, numa conduta dominante que não pode ser considerada única ou suprema. A vontade de

“Para além de bem ou mal, justo ou injusto, o que está em jogo é este impulso que movimenta a criação.”

potência e a desconstrução andam juntas, pois não aceitam conservadorismos, tratase da superação de si, da força que permite construir realidade, agir sobre ela, e não apenas aceitá-la como estabelecida.Nietzsche (2002) tratou justamente sobre o confrontar o estabelecido, as verdades metafísicas, e levar a encontrar na vontade de potência uma processualidade capaz de geração e manutenção da vida, uma vontade que não é saciável, mas que está sempre em busca de mais. “É como se fosse uma vontade do organismo em que todo o corpo quer viver, é um aspecto primitivo onde não se pode escolher, que se manifesta quando encontra obstáculos e resistências” (LIMA, 2006, p. 10). Para além de bem ou mal, justo ou injusto, o que está em jogo é este impulso que movimenta a criação.


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Investigamos os graffitis tentando enxergar além da venda moral e seus filtros dicotômicos de certo e errado, do “bem comum” que, segundo Nietzsche (1983), no “comum” perde seu valor, pois aqui se trata de se estar de acordo com muitas pessoas. O problema disso é justamente nos aprisionarmos nos modelos e, nesse aprisionamento permitirmos que determinado poder, na forma de Estado ou outra personificação do poder, não nos deixe criar outras formas de viver, não nos permita viver nossa potência. Destacar os conceitos de bom e mau em sua dicotomia resulta como uma linha de duas pontas, uma relação binária que abre um “meio”, um lugar para pensar os graffitis em condição de existência, de devir, elemento potencializador na malha urbana da qual eles participam e que podem imprimir velocidade a vida. Então, ser um bom ou um mau graffiti não está em questão, não

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se busca julgamentos estéticos ou morais, importa é “quando” ele potencializa viver e produzir diferença, quando ele participa de uma produção de saberes que não obedece a um sistema educacional fechado e formal. Daí saberemos quando então ele propõe um encontro ativo, potente, sendo uma questão de contingência, de conveniência, de funcionamento. Segundo Garcia (2005), “criou-se um discurso de que o saber veiculado pela educação formal é crítico, por ser racional, científico, por ter referências e ser pautado no conhecimento científico” (GARCIA, 2005, p. 20), permitindo, a partir deste discurso, negar os saberes não sistematizados. O envolver-se com os graffitis permite uma aposta: há uma educação que ocorre para além dos espaços formais, rompendo com a crença de que apenas os conhecimentos sistematizados em currículos escolares, àqueles que frequentam salas de aulas, são capazes de oferecer uma formação “séria” e empreendedora. Segundo Cynthia Farina (2008), podemos dizer que educação formal está contida na complexa configuração de formas de funcionamento do subjetivo, no processo de formação de subjetividade. Esse processo “dá-se em uma multiplicidade de espaços que atravessam uns aos outros. Nesse sentido, a formação inclui a educação formal, mas é maior e menor que esta, ao mesmo tempo” (FARINA, 2008, p. 130).


48 Neste artigo compartilhamos experiências vivenciadas justamente nestes outros espaços que se estendem para além de uma educação formal, espaços em que a educação se dá de maneira mais difusa e espontânea, e que, por isso ocupa uma “educação informal”, conforme Garcia (2005), espaços não sistematizados, sem uma definição e legitimação prévia de conteúdos e que, para Almerindo Afonso, “abrange todas as possibilidades educativas no decurso da vida do indivíduo, constituindo um processo permanente e não organizado” (AFONSO, 1989, p. 78). Trata-se de experiência solta, imaginativa, sem professor e sem aluno, sem compromissos acadêmicos. A vida dando “lições”, lições da vida que percorrem a cidade. Como objeto de estudo as experiências com os graffitis configuram-se como experiências estéticas no sentido que nos diz Farina (2009), “uma

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experiência que altera as formas de ver e de dizer de um território de existência. E que, por isso, pode alterar suas formas de entender o que lhe acontece” (FARINA, 2009, p. 137). Podemos pensar que essa alteração e entendimento contribuem para um processo que pode capacitar o sujeito a agir sobre este campo de forças tornando-o criador de um território existencial, dentre os múltiplos mundos que se entrecruzam na relação de si com o outro. Ao invés de habitar o mundo, um mundo “comum” a todos, resultado de processos totalizantes e padronizadores, permite-se ao homem-animal “ter” um mundo, um território, e não se apropriar de um sem construí-lo. A educação estética tomada em sua dimensão pedagógica, ou seja, uma educação perceptiva informal que produz saberes, lança a experiência com os graffitis para o âmbito da arte. Ao falar sobre práticas estéticas, sobre a dimensão pedagógica da arte, Cynthia Farina (2008, p.4-5) diz: “[...] as práticas estéticas atuais parecem tratar-se como dispositivos de desnaturalização, como lentes de aumento sobre os modos de vida dos sujeitos [...]. Existe uma vontade sua de lidar e interferir na percepção, no conhecimento e nos modos de vida dos sujeitos”. Dispostos pelas ruas, muros e paredes da cidade, os graffitis podem produzir saberes de uma ordem que apela à liberdade e a possibilidade de invenção, cuja capacidade de imprevisibilidade aumenta a potência de criar outros modos de ser e viver cotidianamente, de “educar-se”. Nestes caminhos trilhados nos é permitido explorar as múltiplas dimensões de um “aprender” como nos fala Sílvio Gallo (2012), algo para além da tradição ocidental em que “a educação tem sido pensada em matriz platônica, que afirma o aprender como recognição”


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(GALLO, 2012, p. 1). Aprender não estaria assentado na emissão de signos (ensinar), mas no encontrarse com estes signos. Nesse sentido, a possibilidade de um aprendizado estaria mais relacionada ao tornar-se sensível a este universo de signos. Entendemos por tornar-se sensível a evocação de uma sensibilidade possível, quando discutimos e atuamos na formação da percepção, “pois é a partir do que somos capazes ou não de perceber que produzimos conhecimento sobre nós mesmos e sobre o real” (FARINA, 2010, p. 3). Gallo (2012) chama atenção ainda para a impossibilidade de se aprender especificamente o que se ensina, de uma transmissão de signos, mas que, por outro lado, “qualquer relação, com pessoas ou com coisas, possui o potencial de mobilizar em nós um aprendizado, ainda que ele seja obscuro, isso é, algo de que não temos consciência durante o processo” (GALLO, 2012, p. 3).

“Aos poucos, fomos entendendo que precisamos de cidades como corpos em abertura...”

Com os graffitis podemos pensar nesse processo de aprendizado. E a ideia de cartografar tais processos vem com o desejo de dar a ver as transformações ocorrendo na subjetividade, junto aos aprendizados que vamos colecionando. Mobiliza-se um modo de aprender quando um graffiti se mostra capaz de liberar forças que configuram, desconfiguram e reconfiguram um território. Segundo Gallo, “não há métodos para aprender, não há como planejar o aprendizado” (2012, p. 5), mas podemos colocar no processo de aprender não só com sensibilidade aos signos, mas também, “emitindo signos sem que tenhamos controle em relação ao que será feito com eles, por aqueles que os encontrarem” (GALLO, 2012, p. 9) e “atentos ao processo, mais do que ao produto” (GALLO, 2012. p. 10). Diante desse modo de aprender sem um planejamento prévio seguimos passeando pela cidade, sempre sensíveis aos seus signos e na perspectiva de uma construção de muitas outras cidades por vir. Procuramos trabalhar com


50 a ideia da cidade como um corpo em mutação. Com ele, outros corpos se misturam, corpos que compõem juntos, que formam juntos outros corpos a partir da experiência, corpos humanos e não-humanos. Não se trata apenas do corpo empírico, este viciado em seu movimento e sua forma, mas de um corpo de afeto, que afeta e é afetado, o “corpo espectral” como nos diz José Gil (2004): [...] não se confunda com a presença, esbatida ou informe, ou o quer que seja, do corpo próprio. Pelo contrário, o corpo espectral é suscetível de múltiplas quaseformas: corresponde aos investimentos afetivos da linguagem que não aparecem no corpo físico visível a que se imprimiu a desfasagem original [...]. Não são formas, mas formas de forças, quer dizer dos investimentos inconscientes que compõem no corpo espectral (GIL, 2004, p.22).

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O autor ainda nos fala de quando “os corpos se abrem” permitindo o contágio, permitindo que o corpo espectral se dissolva nas forças que se conectam com as forças do outro. Foi buscando compartilhar a experiência deste contágio, dos encontros com a cidade e as forças que nela circulam, atraem e repelem os corpos, que nos aventuramos a escrever sobre os graffitis. Aos poucos, fomos entendendo que precisamos de cidades como corpos em abertura, que não estejam apenas planejadas para a velocidade, levando consigo apenas roteiros pré-estabelecidos e lembranças enclausuradas em lojas de souvenires. Precisamos de cidades que, em algum gueto, algum canto escondido, alguma fresta se abra; construindo a cidade com a multiplicidade de outros mundos, “para permitir que se sinta o corpo da cidade em uma relação que não a da indiferença e da impessoalidade do passante em direção à sua prisão domiciliar” (COSTA; MIZOGUCHI; FONSECA, 2004, p.188). Dar passagem a um devir que esteja conectado e atento à lógica capitalística de produção de subjetividade, mas, para com ela sermos capazes de produzir outros saberes, outros modos de viver.

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Editora-Chefe Vanessa Gomes Edititor Assistente Rômulo Matteoni Produção e Projeto Gráfico Giovana Romano Capa Giovana Romano

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