PARI: COSTURANDO LÓGICAS
TERRITORIAIS
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RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 3
| PARI: COSTURANDO LÓGICAS TERRITORIAIS
ARQUITETURA E URBANISMO Trabalho Final de Graduação INSTITUTO FEDERAL DE SÃO PAULO Campus São Paulo Giovanna Rodrigues Cardoso Orientação: Profª. Dra. Maria Cecília Lucchese NOVEMBRO / 2018
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| RESUMO O presente trabalho propõe-se a analisar sócioeconomicamente e físicoambientalmente o território do Pari, antigo bairro fabril e operário de São Paulo que passa por um processo lento de substituição de usos com a expansão do comércio atacadista ao sul. Ao norte, tem-se uma área estagnada, com usos industriais e institucionais que geram conflito por não se integrarem ao convívio da rua, enquanto que na porção central, ilhados em meio a outros usos, concentram-se os usos residenciais. Propõe-se uma intervenção no âmbito do projeto urbano que visa conectar o bairro e reestruturar sua dinâmica territorial, internamente e com o entorno. É necessário compatibilizar as novas mudanças que podem ocorrer na região pela ação do poder público e mercado imobiliário com o contexto local existente e o potencial que apresenta o bairro, a partir da inserção de um projeto chave, do redesenho de vias e criação de espaços públicos e de lazer. Palavras-chave: desenho urbano, bairro industrial, comércio atacadista, Pari, estagnação urbana
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| ABSTRACT This paper proposes to analyze socially, economically, physically and environmentally Pari’s neighborhood, a former factory and working district of São Paulo that passes through a slow process of substitution of land use with the expantion of a wholesale in the south. In the north, there is a stagnant area, with industrial and institutional uses that conflict because they do not integrate to the life on the street, while in the central portion, in the middle of other uses, residential uses are concentrated. It is proposed an intervention in the field of urban design that aims to compatible new changes that may occur in the region by the action of the Public Authority and the real estate market with the existing local context and the potential the neighborhood presents, by the insertion of a key project, the street redesign and criation of public and recriational spaces. Palavras-chave: urban design, industrial neighborhood, wholesale, Pari, urban stagnation
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| SUMÁRIO
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INTRODUÇÃO
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OBJETIVOS E JUSTIFICATIVAS
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PRODUÇÃO DO ESPAÇO CONSTRUÍDO
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3.1 Inserção na cidade 3.2 Histórico de ocupação e formação da paisagem 3.3 Vazios urbanos industriais e o mercado imobiliário
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4 |
APROXIMAÇÃO
37
4.1 De perto 4.2 Leitura técnica
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PLANOS URBANOS E INICIATIVAS
57
5.1 Plano de melhoramentos viários do Arco Tietê 5.2 PIU Setor Central
58 62
6|
HABITANDO O TERRITÓRIO
65
6.1 Apropriações do espaço 6.2 Memória coletiva 6.3 Análise sócio-econômica
66 70 74
7|
REFERÊNCIAS PROJETUAIS
79
7.1 Eixo Pacífico - González Víquez 7.2 Plano Estrutural de Southbank
80 92
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8| COSTURANDO 8.1 Partido do projeto
107
8.2 Objetivos gerais 8.3 Diretrizes e estratégias 8.4 Estratégia urbana 8.5 Macrozoneamento 8.6 Revisão do zoneamento 8.7 Perímetro de qualificação do Canindé 8.8 Perímetro de qualificação da área comercial 8.9 Proposta sistêmica
108 110 112 116 118 122 124 134 138
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
150
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
152
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INTRODUÇÃO
A cidade de São Paulo passou por um processo de metropolização durante o século XX e XXI que modificou as relações antes existentes e moldou a cidade global como conhecemos hoje. Passando de uma cidade industrial para uma cidade de serviços, muitas de suas áreas fabris entraram em processo de obsolescência, sendo abandonadas pelo poder público e esquecidas pelo mercado imobiliário. Zonas industriais, muitas vezes associadas a bairros operários, geram impacto no tecido urbano, na dinâmica e na paisagem construída e diferem do restante da cidade pelas tipologias encontradas, gabarito e traçado do viário. Terrenos vagos, disfunções urbanas e falta de segurança são alguns dos resíduos gerados pela desativação dessas áreas. O presente trabalho propõe-se a analisar o território do Pari, antigo bairro fabril e operário da cidade. Localizado próximo à região central, é pouco adensado, porém dotado de boa infraestrutura de transporte. A investigação parte de questionamentos a respeito do futuro do bairro e dos motivos
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pelos quais este aparenta estar estagnado urbanísticamente, já que poucas mudanças em sua paisagem ocorreram por décadas. A primeira parte da pesquisa busca compreender como este se consolidou ao longo da história, por isso, num primeiro momento será estudado como se deu o processo de ocupação e configuração de sua paisagem. Também são feitos apontamentos sobre os potenciais de mudança do bairro a partir da ação do mercado imobiliário. Além disso, é abordada também a questão humana, analisando-o sócioeconomicamente, como os moradores se relacionam com o espaço e quais as tradições e símbolos que resistem. É feita também uma aproximação a partir de uma leitura de como a área se configura atualmente, em termos de espaços verdes, gabarito, uso do solo e conflitos. Na segunda parte do trabalho são apresentadas referências projetuais com abordagens na escala do bairro, focando em áreas centrais com potencial de mudança através do adensamento e redesenho de espaços públicos.
Como resultado final dessa abordagem teórica, tem-se uma visão do bairro do Pari em termos históricos, sócioeconômicos e físicoambientais, explorando as problemáticas, conflitos e potencialidades identificados dentro do perímetro estabelecido (distrito do Pari e a área da Ponte Pequena). A partir dessa aproximação, o trabalho aborda as questões levantadas delineando diretrizes para o bairro, espacializadas em um plano sistêmico, projetos setoriais e subprojetos.
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PORQUE COSTURAR? OBJETIVOS E JUSTIFICATIVAS
O presente trabalho propõe-se a agir no território do Pari, antigo bairro fabril e operário de São Paulo que, após desativação de seu parque industrial, manteve-se estagnado se comparado ao ritmo de desenvolvimento da cidade de São Paulo. Seu processo de ocupação configurou uma área horizontalizada e pouco adensada, cuja paisagem e características físicas não se apresentam como interessantes para os demais moradores da cidade, ainda que possua boa infraestrutura de transporte e localização central. Surge então uma inquietação pessoal ao observar a rápida mudança da paisagem a partir da ação do mercado imobiliário em outros bairros bem localizados e com histórico industrial, como a Barra Funda, Vila Leopoldina e Mooca. Nestes bairros percebe-se a ação isolada do mercado imobiliário como agente modificador do território, que atua construindo condomínios residenciais isolados do tecido urbano e que priorizam o acesso por transporte individual. Em paralelo, como indutor da ocupação do território, tem-se o Plano Diretor do Município de São Paulo, que prevê uma cidade mais humana e compacta, com adensamento de áreas próximas a eixos de transporte e sistema viário estrutural.
Buscando fugir do modelo resultado da ação isolada do mercado imobiliário e indo ao encontro do Plano Diretor, propõe-se uma reestruturação do bairro a partir de um rearranjo de seu território. Nesse sentido, tem-se como objetivos principais reverter a deterioração das qualidades paisagísticas e ambientais locais; promover o adensamento populacional pelo retorno de população moradora; pensar o território, que é compacto, sob a visão do pedestre; e costurar na região uma lógica territorial, conectando áreas urbanas fragmentadas. O projeto justifica-se no sentido de que possibilitaria a reinserção do Pari na dinâmica urbana da região central, tornando-o um bairro adensado e compacto, com infraestrutura eficiente, integrado ao transporte público e que atenda à demanda de moradia na porção central da cidade. Além disso, a proposta melhoraria a qualidade de vida dos residentes e reafirmaria uma identidade local do bairro ressaltando as manifestações simbólicas existentes.
3 |
PRODUÇÃO DO ESPAÇO CONSTRUÍDO 3.1 Inserção na cidade 3.2 Histórico de ocupação e formação da paisagem 3.3 Vazios urbanos industriais e o mercado imobiliário
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3. 1 |
“LÁ NO PARI” INSERÇÃO NA CIDADE
O Pari, o Canindé e a Ponte Pequena são bairros localizados no centro expandido da cidade de São Paulo, próximos ao centro antigo da cidade e entre os distritos do Bom Retiro e Brás. Apesar da Ponte Pequena pertencer ao distrito do Bom Retiro e, portanto, ser parte da subprefeitura da Sé, o Canindé e o Pari pertencem ao distrito do Pari, que por sua vez faz parte da subprefeitura da Mooca. As três áreas possuem semelhanças com relação aos usos existentes, ocupação e problemáticas. Além disso, a Ponte Pequena, apesar de separada do distrito do Pari pela Av. Cruzeiro do Sul, encontra-se também separada do distrito a que pertence pelo Rio Tamanduateí/Av. do Estado e pela Av. Santos Dumont. É importante destacar que nela está o terminal de ônibus metropolitano e a Estação Armênia da Linha Azul, equipamentos importantes para os bairros vizinhos. Nesse sentido, foi feita a opção por anexar também esta área ao projeto. Para fins deste trabalho, estes três trechos são considerados Pari.
FIGURA 1 - Rua do Pari (Fonte: Blog Casa Latina)
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Município de São Paulo
Região Metropolitana de São Paulo
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Perímetro do Projeto
Centro velho e centro novo Subprefeitura da Sé
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Ponte Pequena
Subprefeitura da Mooca
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AV. CRUZEIRO DO SUL
Distrito do Pari Região Central
/M
RUA OLARIAS
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3. 2|
DO CENTRO À VÁRZEA HISTÓRICO DE OCUPAÇÃO E FORMAÇÃO DA PAISAGEM
Pode-se dizer que a paisagem urbana é definida por processos sociais que agem sobre um território, modificando o ambiente natural de acordo com as necessidades do homem e gerando visuais que são percebidos e interpretados pelo ser humano de diferentes maneiras. A respeito disso, Saraiva (2005 apud GORSKI, 2008, p. 31) diz que a apreciação e compreensão da paisagem estão relacionadas a três componentes que sintetizam espacialmente e temporalmente a relação entre o homem e a paisagem: a componente biofísica e ecológica; a componente social, cultural e econômica; e a componente perceptiva, estética e emocional. Ao observar a cidade, é notável a presença de áreas cuja paisagem pouco se modificou ao longo dos anos. Territórios que muitas vezes passaram por uma desvalorização imobiliária que
FIGURA 2 - Ortofoto, Pari em 1940 (Fonte: Geosampa)
levou a uma manutenção dos usos existentes por décadas. Áreas em que se percebe uma diminuição de população moradora aliada ao esvaziamento de habitações regulares e aumento de habitações subnormais. Também é frequente o aumento da sensação de insegurança e de índices relacionados à violência. To-
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dos estes aspectos são considerados pela urbanista Penha Pacca (2010) como indicadores de que uma área encontra-se em estado de estagnação urbana. O Pari é um dos bairros onde pode-se dizer que ocorre um processo de estagnação, já que em algum momento houve uma “interrupção do curso de sua dinâmica urbana, de sua tendência evolutiva, do caminho que estava sendo percorrido” (PACCA, 2010). Assim, para compreender o bairro do Pari é necessário em um primeiro momento entender como se deu o processo de obsolescência na região, observando a ocupação do território e a modificação de sua paisagem. A região encontra-se entre os rios Tietê e Tamanduateí, o que faz com que tenha grande parte de seu território em planície aluvial. Dessa maneira, apesar de os primeiros indícios de ocupação datarem de 1765, seu efetivo povoamento só se deu com o exponencial crescimento da cidade entre 1870 e a década de 1930, que ocorreu devido à expansão cafeeira, à viação férrea e à imigração europeia. Durante este período, a implantação de ferrovias para o escoamento do café do interior para o porto de Santos, atuou como indutor da ampliação da malha viária da cidade (AMÁDIO, 2004).
FIGURA 3 - Igreja Santo Antônio do Pari (Fonte: Histórias do Pari)
FIGURA 4 - Obras de retificação do Tietê em 1941 (Fonte: Marco Barbosa / Estadão Conteúdo
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A crise mundial de 1929 abalou a economia nacional de exportação e estimulou a expansão industrial, que deveria suprir uma demanda de produção de bens para consumo interno. Neste contexto, por já possuir mão-de-obra imigrante qualificada, infraestrutura e recursos para investimento (provindos da economia cafeeira), São Paulo firmou-se como o maior centro fabril da América Latina.
Pari
Região Central Bairros industriais
Município de São Paulo
Região Metropolitana de São Paulo
Linha Férrea Santos-Jundiaí
LINHA FÉRREA E BAIRROS FABRIS MAPA 01 (Fonte: Própria autoria)
Assim, a cidade passou a estruturar-se à partir de características físicas de seu sítio e das ferrovias, dividindo-se em “lado de cá” e “lado de lá” dos trilhos (VILLAÇA,1998 apud AMÁDIO, 2004). As regiões ao norte e leste da ferrovia que, como o Pari, eram áreas de várzea antes evitadas no arco dos rios Tietê-Tamanduateí, foram os locais onde se estabeleceram zonas de comércio e indústria e bairros operários (AMÁDIO, 2004). A respeito da retificação dos rios, pode-se dizer que foram obras de infraestrutura que impactaram não só na paisagem da cidade, mas também em sua dinâmica de ocupação. As obras no Rio Tamanduateí datam da década de 1850, quando foi construída a Ponte Pequena, que ligava a Rua Pedro Vicente ao Bom Retiro. No caso do Rio Tietê, cuja retificação ocorreu apenas após 1930, esta funcionou
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como incentivo à ocupação das áreas de várzea e propiciou aos que ali adquiriram terras que tivessem lucro com o aumento de seu valor. A ocupação no Pari iniciou-se nos arredores da estação e alfândega seca do Pari (atual Mercado do Pari, pertencente ao distrito do Brás), entreposto da Ferrovia Santos-Jundiaí. Este fator influenciou diretamente os usos que ali se desenvolveram já que nos arredores instalaram-se inicialmente depósitos ligados ao comércio de importação e exportação (AMÁDIO, 2004). No início do século XX a paisagem do restante do bairro era marcada pela existência de olarias, pastos para criação de gado, chácaras e várzeas. O loteamento da área ocorreu entre 1924 e 1930, sendo grande parte do traçado ortogonal, com duas exceções: o Alto do Pari, com vielas de traçado irregular,
sinal da influência de imigrantes que ali fizeram uma vila cuja ocupação e conformação de loteamento se assemelhava a cidades italianas e portuguesas; e o traçado em forma de arco, cujo centro dá início à Av. Carlos de Campos e que gerou quadras com distribuição de lotes mais homogênea. No mesmo período foram criados ordenamentos urbanísticos que orientavam a ocupação dos lotes e determinavam alguns parâmetros:
“Deveriam ter frente para as ruas novas, constantes na planta de “retalhamento”; não deveria ser construído mais de um prédio de habitação por lote, com dois pavimentos no máximo; pé-direito máximo de 3,5 m cada e caixa de ar de 0,5 metro, no máximo, e outros detalhes de construção (acto nº 2.284, de 18 de janeiro de 1924)” (PACCA, 2010, p 44)
FIGURA 5 - Pátio do Pari (Fonte: Arte/Cidade)
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Estes parâmetros ajudam a compreender como se originou na região um perfil horizontalizado, com gabarito limitado a dois pavimentos. Ainda hoje nota-se na paisagem do bairro que as poucas edificações de gabarito alto se destacam no skyline horizontal. O mapa 02 apresenta como se distribuem os diferentes gabaritos pelo território atualmente. No início, em geral os lotes eram pequenos e as construções sem recuo frontal e lateral, quintal ou jardim. De acordo com levantamento realizado pela urbanista Letizia Vitale (2013) em sua tese a respeito da atuação do mercado imobiliário nas áreas industriais da orla ferroviária em São Paulo, o Pari possui uma organização fundiária marcada por lotes menores que 500 m² (56%). Existem também lotes de dimensões maiores relacionados a usos industriais (galpões e fábricas) distribuídos em quadras mistas (lotes grandes e lotes > 500m², 17,3%) e quadras com lotes grandes, entre 2000 e 5000 m² (13,4%). Existem também glebas sem parcelamento, maiores que 5000 m² (13,4%), relacionadas a usos institucionais, em terrenos cedidos pela prefeitura na área de várzea do Tietê. É possível visualizar essa organização no mapa 03. A respeito dos usos, desenvolveu-se na região um misto com trechos comerciais relacionados ao ramo de con-
GABARITO DAS EDIFICAÇÕES MAPA 02 (Fonte: Própria autoria)
1-2 pavimentos
3-5 pavimentos
6-10 pavimentos
+ 10 pavimentos
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fecções, indústrias têxteis e alimentícias (pequenas e médias), com destaque para as fábricas de doce Confiança/ Tostines, Bandeirantes, Neusa e Bela Vista, única ainda ativa (figura 9). Foram construídas também habitações semelhantes entre si, com casas e sobrados geminados. Pode-se dizer que, historicamente, os usos industriais e comerciais decorreram da proximidade com o Brás, por isso é perceptível uma continuidade desses usos no tecido urbano conurbado destes dois bairros, sendo o Canindé e o Alto do Pari as áreas contrastantes nesse sentido. Amádio (2004) destaca que até a década de 1960 estas características territoriais mantiveram-se e que após 1970 os usos industriais entraram em declínio devido a legislações municipais e estaduais que limitavam estas atividades.
ESTRUTURA FUNDIÁRIA MAPA 03 (Fonte: Adaptado de Letizia Vitale)
Quadras sem parcelamento
Quadras com lotes > 2000 m²
Quadras mistas
Quadras com lotes < 500 m²
O bairro entrou em processo de estagnação a partir de 1980 já que não ocorreu uma renovação de usos em grande parte dos imóveis desocupados pela indústria até a última década. Concomitantemente, com o deslocamento do eixo financeiro e de negócios da cidade para fora do Centro, percebe-se um processo de abandono das áreas centrais por parte da população de mais alta renda. Ainda que tenha sido inaugurada a estação Armênia da Linha Azul do Metrô na Ponte Pequena, esta não se configurou como atrativo suficiente para retorno da população.
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Pode-se dizer que a região que mais se modificou desde então foi a parte comercial do Pari, onde surgiu uma nova tipologia: shoppings de comércio popular que aumentaram a quantidade de lojas disponíveis para o público e renovaram a paisagem por terem gabaritos maiores e fachadas com tratamento diferenciado. Na rua Tiers, por exemplo, existem dois shoppings: o Vautier (2010), localizado na antiga fábrica alimentícia da Tostines; e o Vautier Premium (2017), construído no lugar de uma garagem de ônibus (figura 6). É importante observar que estes shoppings, com exceção do Vautier Premium, seguem um modelo mais semelhante a galerias, deixando suas fachadas ativas e seu térreo permeável ao caminho do pedestre. Diferem do Shopping D, localizado no Canindé, que cria uma relação maior com o sistema viário com seu entorno (figura 7). Décio Amádio (2004) aponta que, apesar da dinâmica comercial importante, ocorreu na região um processo de depreciação do uso habitacional e perda das qualidades paisagísticas e ambientais. O bairro apresenta aspectos que desestimulam sua ocupação pelo mercado imobiliário e levaram a um esvaziamento, já que a população no geral não tem interesse na região. Para Vitale (2013), à medida que se perde o uso industrial e não surge uma nova identidade local clara, instala-se uma paisagem do vazio, de não uso.
FIGURA 6 Shopping Vautier (esquerda) e shopping Vautier Premium (direita) (Fonte: Google Street View)
FIGURA 7 Shopping D (Fonte: Sempre materna)
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FIGURA 8 Armazém ocioso na Rua Felisberto de Carvalho, 158 (Fonte: São Paulo Antiga)
FIGURA 9 Fábrica Bela Vista em 1950 (Fonte: UOL Economia)
FIGURA 10 Marginal Tietê e estádio da Portuguesa em construção (direita), 1971 (Fonte: São Paulo Antiga)
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1930
1954 Ponte Grande
Rua das Olarias
Ponte Pequena
Av. Carlos de Campos
Ponte das Bandeiras
Rua das Olarias
Av. Bom Jardim
Ponte Pequena
Av. Carlos de Campos
Ocupação em 1930
Ocupação em 1954
Indústrias em 1930
Indústrias em 1954
Sistema viário de destaque
Sistema viário de destaque
Vias secundárias de destaque
Vias secundárias de destaque
Rio
Rio
Trem da Cantareira
Trem da Cantareira
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Ponte das Bandeiras
Ponte da Av. Cruzeiro do Sul
Manchas de ocupação Av. Bom Jardim
Ponte da Vila Guilherme
Av. Carlos de Campos
Ocupação atual
Indústrias existentes
Shoppings
Sistema viário de destaque
Vias secundárias de destaque
Ocupação e rios em 1930
Rio
Ocupação e rios em 1954
Ocupação e rios atualmente
Metrô Linha Azul
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3. 3 |
ONDE HAVIA INDÚSTRIA
VAZIOS URBANOS INDUSTRIAIS E O MERCADO IMOBILIÁRIO
Como abordado anteriormente, com o declínio das indústrias, a área estagnou, sofreu poucas mudanças em sua paisagem e alguns aspectos relacionados aos seus usos levaram a um esvaziamento da região. Dados da Fundação SEADE indicam que, entre 1996 e 2000 houve uma queda de 15% do número de habitantes no bairro. A partir de 2000 o número de habitantes voltou a crescer e só atingiu o valor de 1996 em 2010. Estas questões levam a um questionamento a respeito do futuro do bairro, já que outras áreas semelhantes que se encontravam estagnadas, como a Barra Funda e a Mooca, receberam empreendimentos imobiliários na última década e, até mesmo no Brás, mais recentemente, surgiram lançamentos habitacionais.
FIGURA 11 - Condomínio Aquarella Pari (Fonte: Imovelweb)
A tabela 2 faz um comparativo entre os distritos do Pari, Brás, Bom Retiro e Barra Funda com relação aos lançamentos imobiliários residenciais verticais. Percebe-se que o Pari apresenta o menor número de lançamentos. O Bom Retiro, distrito vizinho, permanece mais dinâmico que o Pari. Os distritos do
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Brás e da Barra Funda registraram uma grande quantidade de empreendimentos novos em um período recente (20082016), o que indica que estão deixando o processo de obsolescência.
veis abandonados e encortiçados. A área comercial limítrofe ao Brás corresponde aos valores venais mais altos e no restante do território distribuem-se valores médios (vide mapa 4). Este aspecto indica que o Pari ainda encontra-se em estado de estagnação.
Pacca (2010) aponta que há mais de 50 anos não ocorre evolução no valor venal das áreas no Pari, ainda que o bairro tenha recebido uma estação de metrô. Isso vai na contramão do que se viu em outras áreas da cidade com equipamentos como este que, em consonância com o processo de metropolização, tiveram suas áreas valorizadas.
Em paralelo, falando especificamente dos bairros que apresentaram maior atuação do mercado imobiliário, a inserção de novos empreendimentos caracteriza um processo de desestagnação e implica em uma mudança na paisagem, marcada pelas novas tipologias de edificação implantadas. Ao observar os produtos habitacionais mais recentes do mercado, é possível ter uma ideia da nova paisagem produzida na cidade com relação aos bairros de passado fabril.
O Canindé se manteve como área mais desvalorizada devido às enchentes na várzea do Rio Tietê e à presença de imó-
ÁREA (KM²)
1992 - 1999
2000 - 2007
2008 - 2016
TOTAL
NOVAS UN. RES.
Pari
2,90
1
1
4
6
1074
Brás
3,50
2
-
19
21
4304
Bom Retiro
4,00
-
6
8
14
2500
Barra Funda
5,60
6
16
39
61
11552
DISTRITO
TABELA 1 - Lançamentos imobiliários residenciais verticais: série histórica (Fonte: Prefeitura Municipal de São Paulo Infocidade)
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Como dito anteriormente a respeito da organização fundiária, estes bairros estão marcados pela presença de grandes lotes industriais sem uso que são convertidos pelas construtoras em múltiplas torres residenciais com uma grande quantidade de pavimentos situadas no meio do lote e distantes do alinhamento da rua. São condomínios fechados que dispõem de área de lazer (piscina, academia, salão de jogos, salão de festas, quadras, playground) e tipologias com 2 ou 3 dormitórios. Esse tipo de construção reproduz a lógica das ilhas urbanas privadas, cuja intenção, para Bauman (2009), é claramente de dividir, separar mundos. São universos privados voltados para dentro do lote e para sua própria organização, não se relacionando com o entorno e atuando como desintegradores da vida comunitária (CALDEIRA, 1997). É perceptível que este processo ditado pelo mercado tem ritmos diferentes de acordo com o bairro, fato corroborado pela tabela 1. No caso do Pari, percebe-se pela espacialização dos empreendimentos residenciais que a ocupação do território é lenta. O mapa 4 indica os edifícios verticais identificados no Pari e em seu entorno imediato. A tentativa de ocupar o interior do território limitou-se a duas construções anteriores à década de 2000. É possível identificar também empreendimentos que surgiram após 2010,
FIGURA 12 - Aquarella Pari: 2 ou 3 dorm., 55 e 75 m² (Fonte: Construtora PDG)
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localizados na área de várzea e que condizem com o produto vendido pelo mercado imobiliário destacado anteriormente. É importante observar que estes edifícios estão mais relacionados com a Marginal Tietê do que com o interior do bairro, o que indica que, para determinado público alvo, esta via expressa corresponde a um ponto de atração mais forte do que a mobilidade por transporte público que o bairro dispõe. Isso possivelmente indica também que os compradores destes empreendimentos possuem interesse no deslocamento por transporte individual.
2010
1999
2011 2016 2001
Um dos fatores que podem modificar a dinâmica do bairro é a possibilidade da venda de 45% do terreno da Associação Portuguesa de Desportos. O futuro da área segue em aberto já que em leilão ela não recebeu nenhuma oferta, mas já foram realizados estudos para implantação de torres comerciais e shopping no terreno, prevendo também a demolição do estádio. Observando a atuação do mercado imobiliário à partir do mapa 5 e questões relacionadas ao valor venal, atrativos, ocupação fundiária e disponibilidade de terrenos, é possível intuir algumas questões a respeito do futuro do bairro. Em preto estão identificados os lotes de dimensões
VALOR VENAL DO M² DE TERRENO MAPA 04 (Fonte: Embraesp, 1997-2015; SMUL, 2005 Adaptado de SP Urbanismo)
0-450 R$
450-1.011 R$
1.011-1.922 R$
1.922-3.742,4 R$
acima de 3.742,4 R$
Lançamentos residenciais
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MERCADO IMOBILIÁRIO E LEGISLAÇÃO MAPA 05 (Fonte: Geosampa,2018 - adaptado)
Lotes > 500 m²
Zona Mista (ZM)
Zona de Centralidade (ZC)
Zona Eixo de Estruturação da
Transformação Metropolitana (ZEM)
Zona Eixo de Estruturação da
Transformação Metropolitana (ZEMP)
Zona de Desenvolvimento
Econômico (ZDE-1)
Zona Especial de
Interesse Social (ZEIS-3)
Zona de Ocupação Especial (ZOE)
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maiores que 500 m², dimensões estas de fácil incorporação pelo mercado imobiliário já que possibilitam tipologias edilícias verticais. Observando a legislação vigente de zoneamento, uso e ocupação do solo, é possível dizer que em todo o território o coeficiente de aproveitamento [1] básico é 1 e que o coeficiente máximo varia de acordo com a zona [2]. A área com maior valor venal é o eixo comercial do Pari, que corresponde também ao setor com os menores lotes. Isso dificulta a incorporação já que seria necessário um acordo com os proprietários de vários imóveis a fim de conseguir uma área adequada para abrigar um novo empreendimento. Nesse sentido, o que se percebe nos lotes menores é uma renovação dos imóveis (demolição/construção e reforma), mantendo o uso comercial. Nos lotes maiores, percebe-se a atuação do mercado imobiliário com empreendimentos comerciais como shoppings populares, já que este uso é mais valorizado na região que o habitacional. Dessa maneira, pode-se dizer que a vocação comercial do bairro nessa região tende permanecer e intensificar. A paisagem tende a modificar pela renovação dos imóveis e novos tratamentos de fachada que estes recebem, já que a ocupação dos lotes mantém-se no alinhamento da rua.
A área do Canindé, que corresponde ao menor valor venal, possui grande parte de suas glebas não loteadas e com uso institucional, o que impede uma renovação de usos espontânea. As zonas com maior coeficiente de aproveitamento máximo são as ZEIS – 3 (zona especial de interesse social, amarelo) e as ZEM/ZEMP (zona de estruturação metropolitana e prevista, rosa), onde é possível atingir adensamento de 4 vezes a área do terreno. Na ZEM/ZEMP o C.A máximo pode ser atingido utilizando-se de outorga onerosa do direito de construir, enquanto nas ZEIS esta possibilidade é gratuita. Nas demais zonas (ZC, ZDE, ZM), o coeficiente de aproveitamento máximo é estabelecido como 2. Observando o mapa 11 é possível supor que, se aberta a Av. Projetada Canindé-Pari, o eixo da Av. Bom Jardim teria grande potencial de transformação e adensamento a partir da atuação do mercado imobiliário já que a disponibilidade de terrenos de maiores dimensões é grande, o zoneamento (ZEMP) permite construções de maior metragem quadrada e a localização próxima a importantes vias é privilegiada. A área da Ponte Pequena também conta com terrenos de grandes dimensões e possui zoneamento facilitador
Coeficiente de aproveitamento (C.A) é o número que determina a metragem quadrada permitida a ser construída em um lote, a partir de sua multiplicação pela área do lote.
“Na cidade de São Paulo, a construção de edifícios é gratuita até o limite definido pelo Coeficiente Básico de cada zona de uso. No entanto, existe a possibilidade de se construir acima do permitido pelo coeficiente básico até o limite do Coeficiente Máximo de cada zona mediante a Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC). Os recursos da outorga onerosa são direcionados para o Fundo Municipal de Urbanização – FUNDURB – e utilizado na implantação de melhorias na cidade como um todo.” (PMSP, 2009).
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(ZEM). É a área com melhor acesso à equipamentos de transporte, porém ela aglutina em seu entorno aspectos que desestimulam sua ocupação e reduzem seu valor de uso: tráfego intenso de veículos e caminhões da Av. Cruzeiro do Sul e Marginal Tietê; presença de abrigos para pessoas em situação de rua; imóveis abandonados; baixa qualidade do ambiente construído; presença de cortiços; e comércio local pouco dinâmico. Estes aspectos aliados ao fato de que a vida na rua em horários diferenciados limita-se aos eixos comerciais como a Rua Pedro Vicente, influenciam diretamente na sensação de insegurança do pedestre, o que atua também como aspecto negativo. Assim, para que se configurem como áreas de interesse do mercado imobiliário, seria necessário mitigar alguns problemas de seu entorno. É interessante notar que ao sul do Canindé existe uma quantidade razoável de terrenos com mais de 500 m² e que grande parte das quadras é delimitada pelo zoneamento como ZEIS-3, devido à presença de inúmeros cortiços, o que já indica que a produção habitacional ali será direcionada à população de rendas baixas e à realocação dos moradores de áreas precárias, como tem sido feito pela CDHU.
Como dito, para que isso ocorra é necessário que o mercado demonstre interesse na região, o que pode acontecer se esta dinamizar-se e apresentar mais atrativos. Se houver demanda por habitação, usos industriais se tornarão cada vez mais obsoletos, liberando ao mercado lotes maiores, que contornam a problemática dos lotes pequenos já comentada. As porções centrais e a leste do território, delimitadas pelo zoneamento como Zona Mista, podem ser ocupadas tanto por empreendimentos comerciais quanto por habitações, a depender das tendências do mercado. O Alto do Pari é uma das áreas onde a incorporação também encontra dificuldade de atuar. O traçado marcado por vielas dificulta o acesso à região e, por ser considerado área com alta probabilidade de conter manifestações arqueológicas, o perímetro foi tombado pelo DPH. A existência de ZEIS em grande parte do território apresenta um aspecto positivo por levar em conta a população encortiçada e imigrante que, se no bairro ocorrerem mudanças estruturais e aumento drástico do valor venal, pode ser prejudicada com o processo de gentrificação decorrente. A presença de ZEIS também atua como aspecto que limita o interesse de grupos de mais alta renda à região
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por não desejarem a proximidade com estas áreas e poderem, pela existência de áreas mais bem servidas de comércio, serviços e equipamentos culturais, optar por outras regiões. Apesar disso, nota-se que as ZEIS não encontram-se distribuidas e sim concentradas numa porção, o que pode ser prejudicial se configurarem ali guetos.
4 |
APROXIMAÇÃO 4.1 De perto Espaços construídos Uso do solo urbano Equipamentos Mobilidade e sistema viário Vulnerabilidade social Espaços livres e arborização urbana Drenagem 4.2 Leitura técnica
38 39 40 42 44 46 48 51 52
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4. 1 |
DE PERTO DIAGNÓSTICO AO NÍVEL DO BAIRRO
Além das questões referentes à relação do bairro com a cidade, seu histórico de ocupação e formação da paisagem, foi necessária uma leitura pautada em dados que pudessem ser espacializados pelo território. Dessa maneira, foi possível compreender as particularidades dos diferentes setores que compõem a região, elementos estes que foram levados em conta no desenvolvimento da proposta. Os mapas apresentados a seguir correspondem a questões importantes para a compreensão das dinâmicas urbanas do bairro, dentre elas: densidade construtiva, uso do solo, equipamentos, sistema viário e áreas verdes públicas.
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ESPAÇOS CONSTRUÍDOS MAPA 06 (Fonte: Própria autoria)
Área construída
Com relação à ocupação do solo, observa-se uma concentração maior de área edificada nas porções ao sul, se comparado com a região do Canindé ao norte. Isso se dá devido ao padrão de ocupação explicitado anteriormente, que priorizou num primeiro período lotes pequenos e densamente construídos. Posteriormente, à medida que a mancha urbana se aproximou das margens do Rio Tietê, esse padrão foi substituído por grandes terrenos públicos, com maior área permeável e onde se instalaram grandes edificações horizontais relacionadas a usos institucionais.
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É possível identificar pelo mapa 7 que grande parte do território corresponde aos usos relacionados a comércio e serviços, frequentemente associados a armazéns e indústrias de pequeno porte, com destaque para as quadras a sul, próximo ao Brás, e a oeste, na Ponte Pequena. São comuns tipologias com comércio no térreo e sobreloja.
FIGURA 13 - Paisagem marcada por conjuntos de sobrados geminados - Rua Cel. Emidio Piedade (Fonte: Google Street View)
Dentre os usos residenciais que se concentram na parte central do território e a nordeste, as tipologias horizontais predominam e mesclam-se a comércio, serviço, armazéns e indústrias. A tipologia que predomina nestas quadras é de sobrados e casas térreas, no geral seguindo o alinhamento da rua. Na área à norte, que corresponde ao Canindé, identifica-se um misto de usos, com destaque para equipamentos de cultura, esporte e lazer, centros de distribuição e depósitos, além de usos educacionais e especiais.
FIGURA 14 - Armazéns na Rua Pedro Vicente (Fonte: Google Street View)
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USO DO SOLO URBANO MAPA 07 (Fonte: Atualizado de EMPLASA, 2011)
Conjunto habitacional
Habitação irregular
Residencial horizontal
Residencial vertical
Residencial hor. + comércio/serviço
Residencial + comércio/serviço + indústria
Residencial + indústria/armazém
Comércio/serviço + indústria/armazém
Comércio/serviço Shoppings Indústria/armazém
Centros de distribuição/depósitos
Cultura, esporte e lazer
Especial Educacional Institucional Infraestrutura
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EQUIPAMENTOS MAPA 08 (Fonte: própria autoria)
Equipamentos de assistência
Templos religiosos
Terminal de ônibus intermunicipal
Estação de metrô
Estabelecimentos de saúde
Clubes esportivos
Clubes de futebol
Ensino superior
Ensino fundamental/médio
Ensino infantil
Museu Cinema Biblioteca
Casa de shows
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Destaca-se na porção norte da área de estudo uma grande quantidade de equipamentos direcionados à assistência social, como a Casa de Apoio Maria Maria (centro de acolhida para mulheres em situação de rua) e a Casa de Convivência Porto Seguro (serviço especializadao para pessoas em situação de rua), além de um serviço especializado de abordagem social às pessoas em situação de rua e um centro de acolhida à essas pessoas. Existe ainda um centro de desenvolvimento social e produtivo para adolescentes jovens e adultos, associado a serviços de convivência e fortalecimento de vínculos para crianças e adolescentes, ambos geridos pela UNIBES (União Brasileiro Israelita do Bem Estar Social). É possível identificar no território equipamentos relacionados à mobilidade e de interesse metropolitano, como a estação de metrô Armênia e o terminal intermunicipal aliado a esta. Dentre os estabelecimentos de saúde destaca-se a AMA Pari (Atendimento Médico Ambulatorial) e o Hospital filantrópico Nossa Senhora do Pari, que faz atendimento pelo SUS. Os equipamentos esportivos também possuem grande relevância já que estão relacionados à história do bairro,
onde surgiram clubes de futebol de várzea devido à proximidade com o Rio Tietê. Dentre eles estão o Estrela do Pari, o Serra Morena, o Vigor e a Associação Portuguesa de Desportos, a qual ocupa um terreno de mais de 100.000 m². Existem ainda o Clube CMTC (Companhia Municipal de Transportes Coletivos) e a Associação Atlética São Paulo. É um região com equipamentos educacionais que vão desde o ensino infantil ao superior. São 5 escolas públicas, sendo uma creche, uma de ensino infantil, uma de ensino fundamental I e duas de ensino fundamental e médio. Existem ainda 7 escolas particulares, sendo uma destas o Colégio Cruz Azul, da Polícia Militar, que possui importância municipal já que atrai estudantes de toda a cidade. É importante destacar ainda o Instituto Federal de São Paulo, que possui ensino superior, médio e técnico e também tem importância metropolitana. Com relação aos equipamentos culturais, há pouco que se possa citar: a Biblioteca Adelpha Figueiredo, o Museu dos Transportes Públicos, a casa de shows Underground Club e o cinema que se encontra no Shopping D.
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A região conta com uma estação de metrô localizada em seu extremo oeste: a estação Armênia da linha azul, que cruza a cidade no sentido norte-sul. Associado à estação está um terminal de ônibus metropolitano, de onde saem linhas que levam a Guarulhos e Itaquaquecetuba. Assim, pode-se dizer que principalmente nos horários de pico, os arredores da estação concentram uma quantidade grande de pessoas circulando, o que estimula também a existência de estabelecimentos comerciais como de alimentação rápida. Pelas Ruas Pedro Vicente, Av. Cruzeiro do Sul e Av. Carlos de Campos passam linhas de ônibus que conectam a região norte ao restante da cidade. Na porção central do bairro, passa uma linha que liga a Luz ao bairro Cangaíba, na Zona Leste. O bairro tem seus limites territoriais superior e inferior delimitados por vias estruturais de categoria N1 que funcionam como barreiras físicas e isolam-no dos bairros adjacentes: a Marginal Tietê e a Av. do Estado, onde corre o Rio Tamanduateí. Da mesma maneira, as vias estruturais de categoria N3, importantes corredores que conectam a região norte ao restante da cidade, geram um intenso tráfego de carros e ônibus dentro do bairro. Dentre as vias estruturais, a Av. do Estado, a Marginal Tietê e Av. Cruzeiro do Sul são as com maior fluxo de caminhões.
MOBILIDADE MAPA 09 (Fonte: Própria autoria)
Ciclovia
Pontos de ônibus
Linhas de ônibus
Estação Armênia/Terminal Intermunicipal
Estações da Linha Azul do Metrô
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FIGURA 15 Av. do Estado (Fonte: Google Street View)
FIGURA 16 - Rua João Teodoro (Fonte: Google Street View)
SISTEMA VIÁRIO MAPA 10 (Fonte: Própria autoria)
Vias estruturais N1
Vias estruturais N3
Vias coletoras
Devido à grande quantidade de vias estruturais, surgem também vias coletores que as conectam e encontram-se principalmente na parte central do bairro. O que se percebe é que estas vias não possuem porte adequado para as funções que desempenham.
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No tocante à questão da habitação e vulnerabilidade social do território, é possível dizer que a área central do bairro abriga usos residenciais consolidados de características variadas. Na porção sudoeste existe uma grande concentração de cortiços, aspecto característico de bairros centrais com oferta de trabalho e imóveis antigos e degradados. Os moradores desse tipo de tipologia habitacional no geral são pequenas famílias ou indivíduos sós que possuem relação forte com a região por morarem e trabalharem na mesma. Isso faz com que seu deslocamento seja majoritariamente relacionado à mobilidade ativa, ou seja, a pé ou de bicicleta.
FIGURA 17 Condomínio residencial Pari A (Fonte: Google Street View)
Com relação à habitação subnormal, é importante destacar a existência da Favela Santo Antônio do Pari, que data da década de 1940. Segundo Pacca (2010), originalmente abrigou cerca de 900 pessoas e, à medida que estas adquiriram imóveis no bairro, teve uma queda de 50% em seus habitantes (IBGE, 2010). A habitação popular tornou-se mais forte na região à partir dos anos 2000. Destacam-se o Edifício Olarias (Rua Araguaia x Rua Olarias), produto da COHAB e os Edifícios Pari A1 e A2, Pari D, Pari G (Rua Canindé) e Pari F (Rua Hanneman).
FIGURA 18 Edifício Olarias (Fonte: casalatina)
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O Índice Paulista de Vulnerabilidade Social é um dado importante para compreender de uma maneira geral a qualidade de vida da população local. É um indicador de desigualdade social e pobreza, cujo cálculo considera renda, escolaridade, ciclo de vida familiar, além de tipologias de situações de vulnerabilidade social (cortiços, favelas e população em situação de rua.
Favela Santo Antônio do Pari (1945)
Vila dos Idosos (2007)
Edifício Olarias (2000)
ALTO DO PARI
Condomínio residencial Pari G (2008) Condomínio residencial Pari D (2008) Condomínio residencial Pari A (2002)
Condomínio residencial Pari F (2008)
VULNERABILIDADE SOCIAL
Índice Paulista de Vulnerabilidade Social
Vulnerabilidade muito baixa
MAPA 11 (Fonte: Adaptado de HABISP, IPVS 2010, SP Urbanismo)
Vulnerabilidade baixa
Vulnerabilidade média
Cortiços
Vulnerabilidade alta
Áreas residenciais consolidadas
Produção pública de moradia até 2015
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Observando em números a questão das áreas verdes públicas (praças, parques, rotatórias e canteiros), tem-se que o bairro possui um Índice de Áreas Verdes (m²/hab.) de 11,08, o que está acima do recomendado pela OMS (9 m²/hab. Fonte: Infocidade). Porém, o que se percebe é que estas áreas verdes são de baixa qualidade paisagística e não se configuram como espaços verdes públicos acessíveis e de qualidade. Além disso, a densidade populacional da região é baixa, o que significa que este índice pode modificar se houver aumento da população moradora. Muitas das praças possuem pequenas dimensões (J, K e M), poucos ou nenhum equipamento (B, C, I), e, de maneira geral, pouco tratamento paisagístico, apesar de serem bem arborizadas. Em alguns casos, estas áreas verdes são resultado do traçado do sistema viário (B, C, F, J, K, M) e, assim, não foram projetadas para uso direcionado à população. Ainda assim, é comum a instalação de equipamentos como playgrounds e ilhas de exercício, ainda que seu uso seja baixo. As praças de maiores dimensões e com maior variedade de equipamentos são a Kantuta (H), que possui grande importância para o bairro e entorno, e a Praça Pedro Quarto Marini (D), que localiza-se na extremidade norte do bairro, atrai menos usuários e está próxima à Marginal Tietê.
PRAÇA
ÁREA (m²)
A
10.000
B
8.100
C
1.000
D
6.700
E
2.900
F
8.600
G
2.400
H
3.000
I
2.000
J
550
K
300
L
3.700
M
200
MOBILIÁRIO DE ESTAR
BOA ARBORIZAÇÃO
FREQUÊNCIA DE USO
PLAYGROUND/ EQUIP. DE GINÁSTICA
TABELA 2 - Matriz de diagnóstico de áreas verdes públicas (Fonte: própria autoria)
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Campo de Marte
Parque da Juventude
ESPAÇOS LIVRES E ARBORIZAÇÃO URBANA
Parque do Trote
MAPA 12 (Fonte: Própria autoria) Clube Esportivo Tietê
Jardim da Luz
Áreas verdes públicas
Grandes áreas permeáveis
A - Praça Bento de Camargo Barros B - Pç Vereador Oswaldo Teixeira Duo C - Praça Elias Chaiub D - Praça Pedro Quarto Marini Convento da Luz
E - Praça Nossa Senhora da Oliveira F - Praça da Ponte da Vila Guilherme G - Praça Ilo Ottani H - Praça Kantuta I - Praça Lourenço Francolino J - Praça Manoel Henrique Dias K - Praça Antônio Amândio Freire L - Praça Padre Bento M - Praça Eduardo Rudge
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C
G
H
J
FIGURAS 19, 20, 21, 22 e 23 - Praças Elias Chaiub (C), Ilo Ottani (G), Kantuta (H), Manoel Henrique Dias (J) e Padre Bento (L)
L
(Fonte: Google Street View)
A praça Padre Bento (L) possui importância histórica no bairro devido à sua relação com a Igreja Nossa Senhora do Pari e é o ponto central do chamado Largo do Pari. Difere das demais devido à grande quantidade de área pavimentada, bancos e fluxo constante de pessoas. Também aglutina comércio em seu entorno, configurando assim a principal centralidade do bairro do Pari. Com relação à arborização, observa-se que esta se concentra na região ao norte, onde predominam os terrenos de maiores dimensões e com maior taxa de permeabilidade. O viário também recebe árvores de grande porte, com destaque para tipuanas e sibipirunas, ao longo das Avenidas Cruzeiro do Sul e Carlos de Campos. Em paralelo, a região com maior densidade construtiva se apresenta como uma área árida pela falta de vegetação e área permeável. Estes aspectos do território refletem principalmente na questão da qualidade de vida urbana relacionada aos aspectos ecossistêmicos e à captação hídrica pluvial. Os usos existentes, a baixa quantidade de área arborizada e o alto índice de impermeabilidade, por exemplo, levam ao fenômeno conhecido como ilhas de calor, caracterizado pelo aumento da temperatura local, além de uma queda da umidade relativa da região.
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FIGURA 24 - Temperatura aparente da superfície (03/09/1999) (Fonte: Atlas Ambiental do Município de São Paulo, SVMA, 2004 adaptado por SP Urbanismo, 2018)
Por ser um bairro localizado entre os rios Tietê e Tamanduateí, tem-se também a questão da drenagem como questão essencial à dinâmica urbana. São vários os pontos de alagamento que se distribuem pelo bairro e causam transtornos no deslocamento de pessoas e salubridade local.
DRENAGEM E ÁREAS DE INUNDAÇÃO MAPA 13 (Fonte:SP Urbanismo, 2018)
Área sujeita a inundação
Pontos de alagamento
Canal aberto
Canal fechado
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4. 2 |
LEITURA TÉCNICA SÍNTESE DO DIAGNÓSTICO
A leitura apresentada do território foi pautada na coleta de dados, análise de informações, observações in loco e pesquisa a respeito do bairro. Esta metodologia foi essencial para consolidar uma visão geral do Pari, de como este funciona de maneira sistêmica e, numa escala mais próxima, algumas de suas particularidades. Em síntese, percebe-se no perímetro de estudo uma segregação interna de espaços, caracterizada por uma dualidade de padrões de ocupação. O Pari e a Ponte pequena possuem tecido urbano marcado por um traçado regular, com quadras densamente construídas e vias largas com calçadas de 4 metros, 2 faixas de direção e 2 faixas de estacionamento. Corresponde à região que foi ocupada num primeiro momento durante a expansão da cidade e é onde existem usos residenciais e comerciais consolidados. Pelo território se distribuem também armazéns e galpões, classificados como usos industriais.
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MAPA SÍNTESE
MAPA 14 (Fonte: Própria autoria)
Uso do solo
Comércio/serviços Residencial Institucional/clubes Indústria/depósitos
Área residencial consolidada
Edificações notáveis
Terrenos > 500m²
Cortiços
Favela Santo Antônio
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É possível observar uma grande quantidade de lotes de grandes dimensões associados a usos industriais e armazéns no setor ao norte. Isso indica um potencial de transformação da área pela mudança dos usos e adensamento, como apontado anteriormente. Existe ainda uma região com presença de usos comerciais e de serviços, sendo esta a área mais próxima ao Brás e onde se concentra um grande fluxo de pedestres. Isso gera conflitos principalmente na Rua Tiers (via coletora) e na Rua João Teodoro (via estrutural N1), que são importantes para a circulação de veículos na região. Nestas ruas, assim como na R. Victor Hugo e R. Alexandrino Pedroso, o problema se agrava pois ali se concentra uma grande quantidade de vendedores ambulantes, que ocupam as calçadas e a via com seus produtos. Esta atividade é vista com maus olhos pela população moradora, já que se fixou no bairro em poucos anos, mudou a realidade local e, após o fim do horário comercial, deixa nas vias uma grande quantidade de lixo. Essa mudança repentina deve-se muito ao fechamento da Feirinha da Madrugada do Brás, que levou comerciantes a perderem seu ponto de venda e optarem pelo uso das ruas para trabalhar.
Áreas comerciais tendem a ter movimento nas ruas ligado diretamento ao período de funcionamento de seus estabelecimentos. Após esse período ocorre um rápido esvaziamento da área e a transformação da mesma em uma região sem olhos para a rua. Além disso, a mancha do valor venal mais alto relacionada a este uso tende a expandir-se em direção ao centro do bairro à medida que o mesmo ganha força. Isso leva a um conflito, já que os usos habitacionais com o perfil existente no bairro não conversam com o uso comercial e podem ser expulsos paulatinamente. Existem também áreas residenciais consolidadas, onde predominam tipologias habitacionais horizontais, com destaque para o Alto do Pari. Como apontado pelos moradores, um conflito recente é a utilização das pequenas vias e vielas do Alto do Pari como atalho por motoristas que utilizam aplicativos de geolocalização. Um grande potencial é a existência de dois grandes terrenos abandonados que, atualmente, geram um problema de insegurança por serem cercados por muros em todo seu perímetro. Em contraposição às duas áreas apontadas anteriormente, há a área conhecida como Canindé, que tem como principal característica os terrenos de grandes dimensões
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onde existem equipamentos institucionais, muitos deles clubes ou pertencentes à prefeitura. Destaca-se o terreno da Associação Portuguesa de Desportos que, como dito anteriormente, está em processo de leilão e deve ter uma mudança de uso. Os equipamentos direcionados às pessoas em situação de rua geram uma grande concentração destas nos arredores, principalmente durante o dia, com destaque para os canteiros da Av. Cruzeiro do Sul, a Praça Elias Chaiub, a Praça Kantuta e algumas ruas do entorno. Um dos principais problemas encontrados nessa região é a grande quantidade de muros ao longo das calçadas devido ao usos que ocupam grandes lotes e que não se relacionam com a vida na rua. Como consequência, a área do Canindé é a que tem menos pessoas circulando na rua. A nível da cidade, é possível visualizar um setor da área central com potencial de se reestruturar mediante uma reformulação sistêmica que leve em conta aspectos cruciais para uma mudança benéfica para a cidade, como o adensamento populacional direcionado e a colocação do pedestre como elemento que atua ativamente no território. A nível do bairro, tem-se uma região com conflitos internos ligados à diversidade de usos e que, para solicioná-los e poder abrigar
um adensamento populacional, necessita de um projeto que atenda suas especificidades, como a falta de espaços públicos de qualidade e a paisagem degradada.
5 |
PLANOS URBANOS E INICIATIVAS 5.1 Plano de melhoramentos viários do Arco Tietê 5.2 PIU Setor Central
58 62
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5. 1 |
PLANO DE MELHORAMENTOS VIÁRIOS DO ARCO TIETÊ
Dentro das propostas do Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo, tem-se os arcos, que são áreas localizadas entre o centro e a periferia, associadas a aspectos que foram estruturantes para a formação da cidade: os dois principais rios (Pinheiros e Tietê); as ferrovias, que determinaram a localização das industriais durante os séculos XIX e XX; e a presença dos bairros industriais, agora já obsoletos e que, portanto, são espaços potenciais para aproveitamento pela cidade. São tidas como áreas estratégicas que tem o potencial de reduzir deslocamentos extensos ao se tornarem centralidades e atrairem serviços e moradia. O Arco Tietê compreende, na margem sul, parte dos distritos da Lapa, Barra Funda, Santa Cecília, Bom Retiro, Pari, Belém e Brás. Na margem norte estão no perímetro parte dos
FIGURA 25 - Marginal Tietê (Fonte: Google Street View) FIGURA 24 - Marginal Tietê (Portuguesa ao fundo) (Fonte: Google Street View)
distritos de Pirituba, Freguesia do Ó, Limão, Casa Verde, Santana e Vila Guilherme. Para o poder público, este território está apto a abarcar transformações urbanísticas a partir do melhor aproveitamento do solo urbano, que se daria com o aumento da densidade construtiva e demográfica. A proposta leva em con-
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ta a manutenção da população moradora ao mesmo tempo em que busca a inserção de uma nova população. Além disso, incentiva-se a implantação de novas atividades econômicas de importância metropolitana, que levem a um equilíbrio entre as ofertas de habitação e emprego. As premissas de parcelamento, uso e ocupação do solo compreendem os quatro setores prioritários de desenvolvimento urbano (mobilidade, meio ambiente, desenvolvimento econômico e habitação) e estão ligadas a projetos estruturais. Um dos projetos que compõem este plano é o de Melhoramentos Viários, que visa à consolidação e eficiência de um sistema de mobilidade urbana a partir da implantação de infraestruturas que conectem o território nos eixos norte-sul e leste-oeste. Além disso, ao conectar esse sistema de vias, outras estratégias do Plano Diretor são viabilizadas, como a implanta-
BRASILÂNDIA
CACHOEIRINHA MANDAQUI
PIRITUBA
TUCURUVI
FREGUESIA DO Ó
VILA MEDEIROS
SÃO DOMINGO LIMÃO
SANTANA
Nossa Sra do Ó
CASA VERDE VILA MARIA VILA GUILHERME LAPA
BOM RETIRO
BARRA FUNDA
BELÉM
VILA LEOPOLDINA
PARI
ARCO TIETÊ
SANTA CECÍLIA
RIOS FERROVIA
PERDIZES
REPÚBLICA
VIAS A ABRIR JAGUARÉ
VIAS A AMPLIAR C/ DESAP.
ALTO DE PINHEIROS
VIAS A MELHORAR S/ DESAP.
CARRÃO
BRÁS CONSOLAÇÃO
SÉ
MÓOCA CAMBUCI PINHEIROS
JARDIM PAULISTA
LIBERDADE ÁGUA RASA
BUTANTÃ
FIGURA 26 - Mapa de melhoramentos viários em rede do VILA MARIANA Plano Arco Tietê (Fonte: SP Urbanismo)
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ção dos eixos de transformação urbana, assim como seu adensamento a partir das Zonas de Estruturação Metropolitana (ZEM e ZEMP, mapa 4). Priorizando o transporte coletivo de média e alta capacidade, são propostos dois corredores perimetrais que conectem os bairros e as estações de metrô e trem existentes: os apoios urbanos norte e sul. Pensado como uma extensão do corredor formado pelas avenidas Ermano Marchetti e Marquês de São Vicente (zona oeste), o Apoio Urbano Sul segue em direção ao Belém (zona leste) cortando os bairros
do Bom Retiro, Canindé e Pari e conectando-se à Av. Celso Garcia e ao Terminal Aricanduva. Assim, este Apoio torna-se objeto de interesse deste trabalho já que prevê mudanças estruturais na área de estudo.
[3] Conforme lei nº 16.541, inciso XXVIII, de 8 de setembro de 2016 e plantas nºs 26.982/44 a 57.
Alguns trechos deste Apoio são vias já existentes de menor capacidade, onde é proposta uma alteração do alinhamento sendo necessárias desapropriações em alguns pontos. É o caso das Av. Bom Jardim, Av. Pedroso da Silveira, Av. do Estado, Rua Porto Seguro, Rua Azurita e Rua Pedro Vicente [3]. Outros trechos passam por grandes ter-
FIGURA 27 - Abertura de vias nos Apoios Urbanos (Fonte: SP Urbanismo)
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 59
renos, como no caso da conexão entre as avenidas Cruzeiro do Sul e Bom Jardim. Essa abertura já era prevista em 2004 em lei complementar ao Plano Diretor Estratégico (lei nº 13.885/04) como parte do Sistema Viário Estrutural da cidade e percebe-se que sua implantação foi iniciada pela Av. Projetada Canindé-Pari, apesar de o trecho compreender apenas os 200 metros iniciais.
FIGURA 28 - Abertura de vias nos viários de conexão (Fonte: Adaptado de SP Urbanismo)
O Arco Tietê era uma das prioridades da gestão do prefeito Fernado Haddad (PT), porém o texto não chegou a ser apreciado pela Câmara e foi arquivado na gestão de João Doria (PSDB).
Vias a abrir
Vias a ampliar
(com desapropriação)
Vias a melhorar
(sem desapropriação)
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5. 2 |
PIU SETOR CENTRAL
É importante destacar o mais recente Projeto de Intervenção Urbana direcionado à área central da cidade de São Paulo e que engloba integralmente o perímetro do projeto aqui proposto: O PIU Setor Central (Projeto de Intervenção Urbana do Setor Central). Ele foi criado com a intenção de revisar a Operação Urbana Centro (Lei Municipal 12.349 de 06 de junho de 1997) já que esta não contemplava o determinado pelo Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257 de 10 de julho de 2001). O Plano Diretor Estratégico (Lei Municipal nº 16.050 de 31 de julho de 2014) retoma a necessidade de revisão desta lei em seu artigo 382. FIGURA 29 - Mapa do apoio urbano sul inserido no PIU Setor Central (Fonte: SP Urbanismo)
O PIU foi divulgado para consulta pública em julho de 2018, após o desenvolvimento da primeira parte desta pesquisa, onde foi feita a leitura do território, estabelecidos os objetivos, delineadas as diretrizes do projeto e elaborado um estudo de massas. Nesse sentido, o PIU foi importante para reforçar a necessidade de um projeto no Pari, já que esta é uma área atendida por boa infraestrutura e oferta de empregos e que está aquém de seu potencial.
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Além disso, foi essencial para validar grande parde das decisões projetuais já tomadas relacionadas a incremento populacional, adensamento juntamente aos eixos de transporte, melhoria da mobilidade veicular e do pedestre e qualificação dos espaços públicos. O objetivo principal do PIU é pensar num futuro para os bairros do anel central, preparando-os para receber um aumento populacional. Seu perímetro abrange os distritos Cambuci, Bela Vista, Santa Cecília, Bom Retiro, República e Sé (Subprefeitura da Sé), além do Brás e do Pari (Subprefeitura da Mooca). Dentre as diretrizes do Projeto vale destacar a que se refere ao adensamento construtivo e populacional, justificada pela grande concentração de postos de trabalho na área central. Nesse sentido, utilizando os distritos da Liberdade, Bela Vista, Santa Cecília e Consolação como referência de áreas adensadas , verticalizadas e com oferta de emprego, o projeto adota a média de 200 hab/ha para o perímetro de atuação (aumento de 50% na densidade existente). O Pari e o Bom Retiro aparecem em destaque como áreas com potencial de transformação significativo por concentrarem terrenos subaproveitados e terras públicas passíveis de transformação, indicando que devem ser propostos
novos padrões de ocupação para estas áreas. É indicada para o vetor norte a produção habitacional destinada a famílias com filhos pela criação de unidades maiores. O projeto vale-se ainda do Apoio Urbano Sul previsto na Lei Municipal nº 16.401/2016 como elemento capaz de modificar as quadras lindeiras. O terreno onde atualmente existe a Associação Portuguesa de Desportos e os terrenos de propriedade da prefeitura aparecem em destaque como áreas associadas a projetos estratégicos. Também é indicada a necessidade de relacionar estas propriedades e “convertê-las em ativos para a estruturação de parcerias público privadas voltadas para a produção habitacional de rendas combinadas”. Uma crítica que se faz ao PIU é a utilização da premissa de demanda por habitação sem abordar adequadamente a questão da habitação de interesse social. O que se percebe no caso do Pari é um aglomerado de quadras delimitadas como ZEIS na porção ao sul, o que contrasta com a proposta de adensamento ao norte, que não visa este público. Isso pode gerar uma cisão no território e reforçar uma dualidade. É apontado como estratégia a criação de um anel habitacional popular qualificado, porém não fica claro qual abordagem direcionaria a esta configuração.
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HABITANDO O TERRITÓRIO 6.1 Apropriações do espaço 6.2 Memória coletiva 6.3 Análise sócio-econômica
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6. 1 |
ENCONTROS E DESENCONTROS APROPRIAÇÕES DO ESPAÇO
O espaço urbano é produzido em suas diferentes escalas como resultado da materialização do ambiente construído, ação esta ditada por agentes sociais, tais como proprietários fundiários, promotores imobiliários, o poder público e grupos sociais. Corrêa (2011) comenta que estes agentes possuem seus próprios interesses, estratégias e práticas espaciais, além de trazerem consigo contradições e gerarem conflitos. Na escala do objeto de estudo deste trabalho, tem-se o bairro e o distrito do Pari como lugar de relações e trocas entre estes agentes. Para compreender como os habitantes se relacionam com o mesmo, é necessário abordar a questão da imigração, que possui relação intrínseca com o desenvolvimento do bairro, atividades ali realizadas e formas de habitar o território.
FIGURA 30 - Placa na Kantuta (Fonte: Passear e fotografar)
A história da ocupação do bairro por parte dos imigrantes pode ser dividida em três fases. A primeira fase foi marcada pela presença de portugueses e italianos que, como mostrado anteriormente, deixaram marcas na paisagem do Alto do Pari. Estes também contribuíram com a tradição católica do bairro através da construção da Igreja de Santo Antônio do Pari em 1911, a
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partir de doações das colônias. A segunda fase veio a partir de 1950, com o crescimento das indústrias e do comércio e trouxe árabes, espanhóis, judeus, armênios, gregos, chineses e japoneses. Já a terceira fase, que se inicia a partir de 1980, foi caracterizada pela vinda de bolivianos, coreanos, peruanos, paraguaios e também de migrantes nordestinos. A respeito dos portugueses, Pacca (2010) destaca que, dos imigrantes, estes foram os mais numerosos e seus descendentes são os maiores proprietários de imóveis. Os italianos seguem em segundo lugar nestes quesitos. Judeus e árabes também possuem imóveis e têm o hábito de nunca deixá-los vazios, ainda que os aluguem abaixo do preço de mercado, diferentemente dos portugueses. A partir de 1990, os coreanos fixaram-se no bairro e alteraram a paisagem através de grandes reformas nos imóveis e da diversificação das atividades locais. No geral, são comerciantes e abriram ali pontos de comércio e serviço (salões de beleza, restaurantes, etc) que romperam com a estagnação da parte comercial do Pari. É importante notar que a Igreja Presbiteriana Coreana é um importante símbolo da comunidade coreana já que ela financiou a vinda dos imigrantes ao Brasil. Atualmente poucos ainda residem no bairro.
Os bolivianos começaram a vir para o Brasil na década de 1950, porém a imigração massiva que perdura até hoje ocorreu apenas após 1980. Caracterizados pela baixa e média escolaridade, os bolivianos que vêm ao país buscam trabalho e qualidade de vida já que, segundo Alves (2012), em seu país natal a oferta de emprego é escassa e não possibilita a ascensão. Quando chegam no Brasil, a realidade encontrada em São Paulo corresponde muitas vezes a um regime de semiescravidão em confecções irregulares onde muitos moram, comem e dormem. De acordo com dados da Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2010 cerca de 6,2% da população do Pari era composta de imigrantes bolivianos. Com relação à ocupação do território por parte deste grupo, é importante destacar que seus primeiros encontros ocorriam na Praça do Pari, onde há a Igreja de Santo Antônio do Pari. Devido a conflitos com a população local, em 2002 as atividades foram realocadas para uma praça entre as ruas Pedro Vicente e Olarias, que foi batizada então de Praça da Kantuta: “Nessa praça, diferentes grupos hispânicos se reúnem aos domingos para recordar, por meio de comidas típicas, músicas, futebol e barracas de artesanatos com objetos de suas terras, as raízes que ficam a muitos quilômetros de São Paulo.” (ALVES, 2012, pg 236)
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Assim, apesar de durante a semana a praça ser ocupada por outros grupos (no geral, imigrantes haitianos e moradores de rua), pode-se dizer que a Praça da Kantuta é um ponto de encontro importante para a comunidade boliviana, tendo em vista que ali ocorrem atividades sociais que geram uma rede de contatos. Nativos e descendentes “vão à praça para se encontrar, se divertir, degustar comidas típicas, procurar emprego, “paquerar” e viver um pouco dos costumes de seu país” (ALVES, 2012). As quadras de futsal sempre são utilizadas e em dias festivos acontecem apresentações folclóricas. A feira dura das 11h às 19h dos domingos e, de acordo com Alves (2012) recebe em média 2 mil pessoas, sendo 90% bolivianos. Em dias festivos esse número chega a 5 mil. Este grupo possui significativa atuação no bairro e, apesar de décadas habitando-o, ainda existem confli-
FIGURA 31 - Praça da Kantuta (Fonte: mrimagens)
FIGURA 32 - Feira Kantuta (Fonte: cultcultura)
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tos com os demais moradores do bairro. Observando comentários em blogs e páginas relacionadas ao Pari, é possível notar um descontentamento por parte da população, principalmente no que diz respeito à disposição do lixo proveniente das confecções bolivianas em pontos de descarte viciados. Sendo o espaço urbano configurado também pelos conflitos entre os agentes que nele atuam, pela leitura do bairro é possível destacar outros confrontos que nele se dão, como por exemplo, a concentração de pessoas em situação de rua durante o dia próximas aos seis centros de acolhida existentes. De acordo com o Censo da População em Situação de Rua realizado pela Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social, no ano de 2015 o Pari acolhia em seus centros 847 pessoas (sendo 864 vagas disponibilizadas), número que representa aproximadamente 10% do total acolhi-
do pelo município de São Paulo. São 50 moradores que ainda residem nas ruas do bairro, concentrando-se em 18 pontos. O conflito aqui reside no uso dos espaços públicos (ruas e praças) por atividades divergentes: no caso das pessoas em situação de rua, como moradia, sendo este um uso considerado privado; e no caso dos demais moradores do bairro, como espaço de circulação, lazer ao ar livre, contemplação e descanso. De maneira semelhante, identifica-se outro confronto na parte comercial do bairro onde há uma grande concentração de comércio ambulante no leito da rua. Oliveira (2011) aponta que a rua muitas vezes torna-se o local onde muitos encontram uma maneira de sobreviver, seja morando ou vendendo produtos, e “tal forma de apropriação não é vista de forma agradável aos olhos
dos demais “cidadãos”, pois estão modificando a finalidade da utilização do espaço da rua”. A autora comenta ainda que o conflito se extende por estes usos descaracterizarem a finalidade de passagem que se espera de uma rua e comprometerem a estética local. Ademais, estas situações retomam à ideia de que o espaço público, que é do uso de todos, está sendo usado para fins privados por alguns. Esta reação por parte dos moradores do bairro coloca determinados grupos em situação marginalizada.
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6. 2 |
BAIRRO DOCE MEMÓRIA COLETIVA E GENIUS LOCI
Partindo do pressuposto de que, como apontado, a sociedade se molda em um espaço determinado, Carlos (2011) comenta que esta produz, consequentemente, “um espaço que lhe é próprio e que, portanto, tem uma dimensão histórica com especifidades ao longo do tempo”, estando estas relacionadas a um estoque de lembranças eternizados na paisagem e a uma memória coletiva. Esta memória pode ser definida como um conjunto de lembranças construídas socialmente, que possuem dimensão familiar, grupal e, portanto, certo caráter subjetivo. Ela vai além das lembranças isoladas do indivíduo já que se refere a um lugar onde determinado grupo social estabeleceu relações (ABREU, 2011). Nesse sentido, a memória urbana é uma das maneiras de se caracterizar um bairro, já que esta ajuda a compreender quais especificidades, símbolos e significados são importantes para a tradição local.
FIGURA 33 - Antiga fábrica convertida em shopping (Fonte: MJS Corp.)
Wuisang (2014) aponta que contexto espacial, paisagem, objetos, construções e significados simbólicos da paisagem cultural são aspectos que compõem o que seria o genius loci, que no campo da arquitetura e urbanismo tem o sentido de “espírito do lugar”, ou seja, percepções subjetivas inerentes a este que criam uma atmosfera local.
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É possível identificar no Pari que a identidade local está instrínsicamente relacionada a aspectos históricos e histórias contadas, sendo estes alimentados ainda em blogs e redes sociais. O nome de “bairro doce”, por exemplo, ainda resiste na memória de locais e está relacionado ao aroma provindo da grande concentração de fábricas e distribuidoras de doces. Devido ao processo de estagnação que levou a uma manutenção da paisagem do bairro, muitas das lembranças continuam ancoradas em elementos da paisagem, o que as mantém vivas. Além disso, apesar do esvaziamento populacional, percebe-se que uma parte idosa dos moradores mantém-se no bairro e reproduz histórias do lugar, alimentando uma memória afetiva. Com base nos relatos de moradores, é possível identificar que algumas construções possuem valor identitário para o bairro por estarem associadas a memórias. A antiga fábrica de leite União na Rua Rio Bonito, por exemplo, construída à mais de 70 anos e que funcionou até a década de 1990, se encontra agora abandonada, ocupando um lote murado de grandes dimensões onde funciona um estacionamento. Ainda que deteriorada, preserva-se o edifício principal e sua fachada, ambos marcados por detalhes em art decò. Devido ao extenso período de funcionamento, muitos dos moradores locais ainda guardam lembranças,
FIGURA 34 Fábrica de leite União (Fonte: São Paulo Antiga)
FIGURA 35 Caminhão da Bela Vista (Fonte: São Paulo Antiga)
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seja por terem trabalhado no local, consumido seu produto, ou ainda por terem circulado próximo à construção, tendo este edifício como referência na paisagem. Por este motivo, alimenta-se hoje, através de rumores, uma curiosidade e preocupação a respeito do futuro da fábrica. Outro elemento de grande importância para o bairro é a Igreja Santo Antônio do Pari, que além de ser uma construção que se destaca na paisagem, está relacionada a uma tradição católica. Esta imagem é fortalecida pela entidade da Paróquia, que realiza ali missas e comemorações como a festa do dia de comemoração de Santo Antônio (13 de junho), importante acontecimento para o bairro por atraír pessoas de toda a cidade e estar associado a outras atividades que ocupam o território, como procissões e quermesses. Além de construções, algumas atividades também fazem parte da tradição do bairro, como é o caso da prática esportiva do futebol de várzea, que marcou a região pelo surgimento de clubes e campinhos nos terrenos planos próximos ao Rio Tietê. Pacca (2010) aponta que à partir de 1919 foram implantados clubes operários como o Estrela do Pari (antigo Clube União dos Vaqueiros, relacionado à fábrica União) e o Esporte Clube Vigor. Existem ainda o Serra Mo-
rena e a Portuguesa de Desportos, equipamento importante para a comunidade luso-brasileira do bairro e da cidade. São muitos os relatos de jogos entre times de fábrica, crianças brincando em campinhos, famílias participando de festas e encontros na Portuguesa, além dos jogos de domingo de manhã que ainda ocorrem.
FIGURA 36 Festa de Santo Antônio do Pari (Fonte: Apu Gomes/ Folha de São Paulo)
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6. 3 |
POPULAÇÃO = 20.857 hab. Pari (17.299) + setores censitários Ponte Pequena (IBGE 2010)
247 hab./ha República
DENSIDADE POPULACIONAL (IBGE 2010) 84 hab./ha Bom retiro / Brás 43 hab./ha Butantã
155 hab./ha Consolação
ANÁLISE SÓCIO-ECONÔMICA
A área de estudo corresponde ao distrito do Pari em sua totalidade, com 17.299 hab., e a área chamada de Ponte Pequena, com 3.558 hab., totalizando 20.857 hab. conforme o Censo 2010 do IBGE (distrito do Pari + setores censitários da Ponte Pequena). Dentre estes, cerca de 458 pessoas residem na única favela do bairro, distribuídas em 130 domicílios, enquanto que 873 pessoas se encontram nos 69 cortiços existentes (HabitaSampa - Secretaria Municipal de Habitação). A densidade demográfica da área é de 5.242 hab./km², um número pequeno se comparado aos demais distritos da área central como seus vizinhos Brás (8.361 hab./km²) e Bom Retiro (8.473 hab./km²) e à média do município de São Paulo (7.387 hab./km²). Analisando a série histórica de indicadores relacionados à população no distrito do Pari (IBGE, SEMPLA, DIPRO), é possível
74 hab./ha
52 hab./ha Município de São Paulo Pari + Ponte Pequena
perceber que, como todos os distritos da área central, ocorreu ali uma queda no número de habitantes a partir da década de 1960. Essa queda seguiu até os anos 2000 totalizando uma perda de aproximadamente 44% da população. A partir de então, lentamente o bairro volta a ganhar habitantes, sendo a projeção da Fundação SEADE de 18.752 hab no ano de 2018.
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FIGURA 37 Densidade de habitantes por hectare (Fonte: IBGE 2010/ Elaboração: SP Urbanismo 2017)
GRÁFICO 1 População no Pari: série histórica e projeção (2018 SEADE)
GRÁFICO 2 População no município de São Pauloi: série histórica (Fonte: IBGE, SEMPLA, DIPRO)
(Fonte: IBGE, SEMPLA, DIPRO)
2000
FIGURA 38 Densidade de empregos por habitante
1950
1960
1970
1980
1991
2010
MSP
2.152.313
3.667.899
5.924.615
8.493.226
9.646.185
Pari
31.312
33.706
29.914
26.968
21.299
14.824
17299
Sé
30.022
32.343
29.555
32.965
27.186
20.115
23.651
República
35.994
48.346
50.348
60.999
57.797
47.718
56.981
Brás
55.097
48.875
41.006
38.630
33.536
25.158
29.265
TABELA 3 - População dos distritos centrais: série histórica
Bom Retiro
45.880
53.893
45.662
47.588
36.136
26.598
33.892
(Fonte: IBGE, SEMPLA, DIPRO)
10.434.252 11.253.503
(Fonte: RAIS, 2014 Elaboração: SP Urbanismo 2017)
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FAIXA ETÁRIA (anos) (IBGE 2010)
Composição da população
A população jovem corresponde a 45% do total. De acordo com o Censo IBGE 2010, a faixa etária de maior per-
ESCOLARIDADE (METRÔ SP)
centual é abaixo de 15 anos, que corresponde a 19% do total, e 20 a 29 anos, também com 19%. Apenas 7% possuem entre 15 e 19 anos. Com 16% tem-se adultos com 30 a 39 anos, seguidos de 13% da população com 40 a 49 anos. Dos que possuem entre 50 e 59 anos, tem-se 10% e da população com mais de 60 anos, 16%. Se comparado com os índices de São Paulo, pode-se dizer que o Pari possui uma população idosa maior proporcionalmente, já que 12% dos habitantes da cidade possuem mais de 60 anos. Com relação às características étnico-raciais, a maioria da população é branca (60,9%) ou parda (30%). As demais etnias e raças são representadas como 4,6% pretas, 4,1% amarelas e 0,35% indígena.
Escolaridade
Com base em dados da pesquisa Origem-Destino 2007 do Metrô disponibilizados no portal Infocidade, é possível identificar que a maior parte da população possui ensino médio completo ou superior incompleto (26%). Em seguida tem-se a população com ensino fundamental incompleto (4ª
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RENDA MÉDIA DOMICILIAR (IBGE 2010)
a 7ª série), que representa 24% do total. A população com ensino fundamental completo ou ensino médio incompleto atinge a marca de 18%. Cerca de 20% é analfabeta ou cursou até a 3ª série do ensino fundamental, enquanto apenas 12% possui ensino superior completo.
EMPREGO FORMAL/POPULAÇÃO (IBGE 2010)
1,48 empregos/hab
Renda e emprego
O distrito do Pari se caracteriza por possui uma renda média domiciliar de 3 a 10 salários mínimos que corresponde a 47% do total, sendo 25% que recebem entre 5 e 10 salários mínimos e 22% que recebem entre 3 e 5. Os 13% mas ricos que recebem mais de 10 salários mínimos, 6% possuem renda entre 10 e 15 S.M., 3% entre 15 e 20 S.M e 4% mais de 20 S.M. As demais faixas se caracterizam por uma renda domiciliar de menos de 3 salários mínimos: 16% recebem entre 2 a 3 salários mínimos, 16% de 1 a 2 salários mínimos e 8% menos de 1 salário mínimo. De acordo com dados da Relação Anual de Informações Sociais do Ministério do Trabalho e Emprego, a maior parte dos empregos formais gerados no bairro provém do setor de serviços (10.006 empregos), seguido do comércio com 9.155 empregos.
7 |
REFERÊNCIAS PROJETUAIS 7.1 Eixo Pacífico-González Víquez 7.2 Plano Estrutural de Southbank
80 92
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7. 1 |
EIXO PACÍFICO-GONZÁLEZ VÍQUEZ
O plano foi desenvolvido para uma área ao sul do centro histórico de San José, capital da Costa Rica, que é o centro político, econômico e social mais importante do país, com mais de 1 milhão de pessoas. A região de atuação do projeto possui 1,35 km² e se desenvolveu a partir do século XIX, mas se consolidou apenas na segunda metade de século XX, possuindo como limite natural o Rio María Aguilar ao sul. A respeito do histórico de desenvolvimento da cidade de San José, pode-se dizer que ocorreu um processo de expansão da mancha urbana que levou ao surgimento de uma periferia pouco densa e de gabarito baixo. Isso gerou um crescente abandono das áreas centrais, que acabaram por perder sua função econômica e residencial. Fazem parte
FIGURA 39 - Vista aérea da área central (Fonte: San Jose Urban Lab)
dessa área bairros tradicionais como o San Cayetano, La Dolorosa, La Cruz e Cristo Rey, que estão em processo de deterioração e possuem um conjunto arquitetônico de interesse cultural e turístico que é reconhecido pela população local como parte de sua identidade urbana.
FIGURA 40 - Mapa da central a serDO trabalhada RECONSTRUÇÃO DO área ESPAÇO URBANO PARI | 79 (Fonte: San Jose Urban Lab)
É uma área com padrão construtivo horizontal e poucas edificações verticais (máximo 5 pavimentos). Conta com equipamentos de interesse urbano e metropolitano de grande utilização, áreas residenciais estagnadas e usos industriais e institucionais de baixo valor urbanístico. O uso do solo é misto, existindo ao norte um predomínio de áreas comerciais e ao sul de áreas residenciais. É identificada também uma vulnerabilidade aos fenômenos naturais relacionados ao Rio María Aguilar e situação social de pobreza. Possui diversas áreas livres sem infraestrutura adequada que permita seu uso e é, portanto, deficiente em espaços públicos qualificados de lazer. Existe um grande fluxo de pessoas na área em decorrência da existência de pontos de ônibus, o que gera comércio e estabelecimentos como lanchonetes no entorno imediato. A paisagem é marcada pelo constante
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fluxo de carros, o que gera ruído e perda da qualidade ambiental do ar, com exceção da zona residencial ao sul.
FIGURA 41 - Edifícios de diferentes tipologias na rua principal (Fonte: San Jose Urban Lab)
FIGURA 42 - Vazios urbanos com grande potencial de desenvolvimento (Fonte: San Jose Urban Lab)
O trabalho surgiu como parceria entre o Laborató-
rio de Desenho Urbano e o Instituto de Desenho Urbano da Universidade Tecnológica de Viena, através de um programa que reúne profissionais acadêmicos e estudantes de arquitetura e urbanismo e utiliza a metodologia Cidades Emergentes e Sustentáveis (CES), impulsionada pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), para trabalhar estratégias, projetos urbanos e intervenções socioambientais com ênfase no aumento da qualidade de vida. A abordagem projetual foca na revitalização urbana através do desenvolvimento de ferramentas que incluam a sociedade civil nas em dinâmicas de transformação do espaço urbano, garantindo uma melhora progressiva nas condições de vida e qualidade do ambiente. Assim, a metodologia se centra nos processos participativos que incorporam a comunidade e os diferentes agentes da cidade a um projeto comum. Na área em questão está prevista a instalação do novo centro de governo (projeto Cidade Governo) e de uma estação de BRT ou TRP: projetos que trazem consigo o potencial de transformar a área. Por este motivo, os autores do
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projeto consideram a intervenção como uma oportunidade valiosa para a cidade, devendo esta estar associada a objetivos ambiciosos e coerentes. Ao mesmo tempo, a inserção de um projeto como a Cidade Governo tende gerar aumento do valor das propriedades, o que pode acarretar na expulsão da população residente, por isso é importante que a regeneração da região seja coordenada e leve em conta o tecido social presente. O plano Pacífico - González Víquez tem como proposta uma regeneração urbana que fortaleça o vínculo entre as pessoas e sua cidade, configurando uma nova centralidade e respondendo à necessidade de aumento de densidade, diversidade, intensidade de usos e repovoamento da área central, além da criação de novas tipologias de habitação. Tudo isso deve ocorrer em um ambiente urbano que inclua espaços verdes e abertos de alta qualidade articulados a uma melhora na mobilidade do pedestre, à construção de uma cidade na escala humana e ao fortalecimento da identidade socioespacial. A partir da análise de dados quantitativos e qualitativos e de assembléias com a comunidade, foram estabelecidos os objetivos gerais do projeto, como descrito no relatório de divulgação:
• Revitalizar o bairro com tipologias residenciais de uso misto, baseadas em princípios de inclusão social e preservação do patrimônio histórico local; • Consolidar um sistema de espaços verdes com equipamentos culturais, que contenha valores ecológicos e espaços de recreação, cultura e esporte; • Integrar bairros do eixo dentro de um sistema urbano mediante maior conectividade (norte-sul) e acessibilidade intermodal na escala humana; • Fortalecer espaços de ativação cultural com maior senso de comunidade e apropriação local. • Gerar espaços comerciais na escala do bairro que fomentem a produção criativa e negócios locais; • Incentivar a coordenação entre as instituições locais e nacionais, o setor privado e a cidadania
FIGURA 43 - Estratégia urbana (Fonte: San Jose Urban Lab)
Espaço público (bordas) Espaço público (pátios internos) Eixos principais
Corredores de conexão Rio María Águilar Eixo de ativação urbana Cidade Governo
Ciclovia Corredores arborizados Ponto de interesse (cultural, recreativo, civico, produtivo)
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Foi definido um plano de gestão que busca aumentar a participação das comunidades e criar um vínculo com as instituições governamentais, conectando os três projetos propostos: O plano de desenho urbano eixo Pacífico – Gonzáles Víquez; o programa de renovação dos bairros; e o progra-
FIGURA 44 - Projetos estratégicos (Fonte: San Jose Urban Lab)
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ma de espaços públicos abertos, matriz verde e espaços de recreação e esporte. Aqui o foco da análise será no projeto direcionado aos bairros. O plano de desenho urbano do eixo Pacífico – Gonzáles Víquez é o projeto âncora que possui grande potencial de modificar o entorno, por isso é com base nas mudanças previstas à partir dele que se delineiam as propostas dos demais projetos. Foca nas trocas que ocorrem no eixo, e se desenvolve a partir da identificação das estruturas de mobilidade que colaboram com a acessibilidade, a rede de espaços públicos e o habitat urbano do entorno. Busca fortalecer os eixos norte-sul para conectar os bairros ao sul com o centro histórico e o eixo leste-oeste para colaborar na regeneração dos bairros.
FIGURA 45 - Isométrica do projeto integral Cidade Governo (Fonte: San Jose Urban Lab)
O programa de renovação dos bairros articula projetos específicos para La Dolorosa, San Cayetano, La Cruz e Cristo Rey levando em conta suas necessidades particulares e direcionando um processo de repovoamento e adensamento, evitando a gentrificação.
a partir da criação de um sistema que inclua: corredores verdes associados a avenidas com maior cobertura vegetal; o rio María Águilar; parques e praças menores. O objetivo é configurar uma matriz verde de funções sociais e ecológicas a partir dos princípios da ecologia da paisagem e de um enfoque comunitário.
O programa de espaços públicos abertos, matriz verde e espaços de recreação e esporte aponta o pontencial que uma série de espaços abertos tem para reverter a perda de áreas verdes e a degradação dos sistemas naturais
La Dolorosa é caracterizado pela perda de população, falta de atividades e vitalidade, pouca quantidade de espaços públicos e áreas verdes, além de uma sensação de abandono generalizada. Alguns usos industriais se mantiveram no bairro e representam parte importante de sua identidade. Existe uma grande quan-
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tidade de lotes sem uso ou sub-utilizados/com estacionamentos. Os edifícios habitacionais se encontram em grande maioria abandonados e deteriorados. Representa um grande potencial já que funciona como conector entre os bairros do centro e do sul e possui uma estação de trem. O plano estratégico propõe definir áreas onde a circulação de pedestres seja a prioridade, direcionando o fluxo de veículos e estacionamentos para suas margens. Isso pode ser feito com a adoção de um sistema de ruas compartilhadas, que elimina a separação tradicional entre a rua e a calçada. Essa estratégia, aliada ao redesenho das calçadas do interior do bairro com 2,5 m de largura e uma faixa de vegetação de 1 metro, tornaria o ambiente mais seguro para famílias e crianças.
FIGURA 46 - Proposta de renovação urbana e repovoamento de La Dolorosa: modelo de densificação (Fonte: San Jose Urban Lab)
Incentiva-se a criação de mais de 115 mil m² de edifícios habitacionais entre 6 e 8 pavimentos que substituiriam lotes vazios, prédios pequenos e espaços sub-utilizados. Se propõe que a profundidade dos edifícios seja de 14 metros (mínimo 10, máximo 21), sendo que nas bordas do bairro o coeficiente de aproveitamento seria de 2,5 e 3,0 e no centro este número seria 1,5 e 2,0. Nas margens do bairro, nas ruas mais frequentadas e ao redor de praças seriam instalados mais de 30 mil m²
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de comércio, aliados a escritórios e equipamentos de cultura e educação, o que criaria um maior convívio social e incentivaria o uso dos espaços públicos. Os espaços públicos devem se localizar a no máximo 200 m entre si (5 minutos de caminhada), conectando as vias de maior fluxo de pessoas e ciclovias às áreas de uso misto. Em San Cayetano e La Cruz não é possível adotar os mesmos princípios de adensamento urbano já que são bairros ocupados por habitações unifamiliares. Já contam com uma rede de espaços esportivos e de lazer, que devem ser revitalizados através de projetos de acupuntura urbana. Propõe-se a criação de quatro novas centralidades aliadas a espaços já existentes que aumentem a vitalidade e atração dos bairros e configurem espaços sociais de encontro: estádio de baseball, centro cultural, centro cívi-
FIGURA 47 - Projeto de renovação urbana com conservação da escala do bairro em San Cayetano e La Cruz (Fonte: San Jose Urban Lab)
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co e centro empresarial. São propostos também corredores e conexões urbanas e ambientais que conectem essas centralidades. Nas bordas do bairro devem se instalar áreas residenciais e de escritórios com um coeficiente de aproveitamento de 3,5, enquanto que nas áreas centrais, devem se instalar zonas residenciais com C.A de 2,3. Os edifícios em ambas as áreas devem ter térreo com comércio e serviços. Da área disponível, 74% se destinaria à edifícios residenciais e o restante a novos edifícios de escritórios. O bairro operário de Cristo Rey apresenta conflitos relacionados principalmente à sensação de insegurança, já que esta se nutre dos espaços deteriorados e mal desenho dos espaços públicos, ao mesmo tempo em que os afeta, fazendo com que se tornem vazios e violentos e dificultando sua apropriação pela população. Assim, se propõe a criação de uma praça verde urbana numa área potencial de mais de 7 mil m², com o objetivo de fortalecer a vida urbana e a segurança. O fluxo de pessoas é um indicador de que um espaço é seguro e agradável, por isso pretende-se incentivar atividades que atraiam a população e ativem a praça. A praça também funcionaria como catalizador de outros usos, os quais se instalariam em seu entorno.
FIGURA 48 - Projeto renovação urbana Cristo Rey (Fonte: San Jose Urban Lab)
São projetados eixos mais densos que se contrapõem ao restante da área com baixa densidade, onde se instalariam projetos de habitação social de 2 a 4 pavimentos que incorporassem lotes baldios. Já no bairro de Cristo Rei a intervenção se daria pela
conexão dos espaços públicos a uma rede de parques e praças, agregando também novos serviços e equipamentos para o bairro.
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ANÁLISE CRÍTICA A área de San José apresentada possui em seu território uma série de características muito semelhantes ao território do Pari, por ser uma área central de uso misto que passou por um processo de desvalorização e perda da população, com áreas residenciais estagnadas, perfil horizontal e usos industriais e institucionais que não contribuem para um convívio dinâmico em seu entorno. Além disso, também são áreas onde há uma falta de espaços públicos de qualidade e com infraestrutura adequada que permita seu uso. A abordagem dessas problemáticas feita pelo plano de San José prevê uma atuação em diferentes escalas de projeto, que vão desde a proposta de adensamento a partir do planejamento de tipologias edilícias quadra a quadra, até um projeto de praça pensada com base nas problemáticas apontadas pelos moradores, passando ainda por propostas tipologias de ruas.
O ponto de destaque é que a instalação de um projeto que atuaria como catalizador de mudanças devido ao seu porte e uso diferenciado dos existentes na área, que é o Cidade Governo. Além de trazer um novo fluxo de pessoas, este conjunto de edifícios, por se localizar no centro do eixo González-Víquez, permite que a partir dele se desenvolvam propostas estruturais para território, conectando as áreas adjacentes, criando uma matriz verde que ligue parques e praças, direcionando os fluxos que cortam o bairro e apontando diretrizes que priorizem a mobilidade do pedestre dentro do território. Um dos pontos fortes do projeto é a metodologia de diálogo com a comunidade local para estabelecer um programa de necessidades, entender a demanda real e os problemas a serem enfrentados. Esta abordagem torna o projeto mais próximo de seus futuros
usuários e gera um senso de pertencimento e identidade ao bairro, além de aumentar as chances de que esta se aproprie do projeto que será desenvolvido. Outra questão interessante é o cuidado em desenvolver projetos diferentes para cada bairro, buscando a abordagem mais adequada de acordo com o diagnóstico realizado e fazendo com que, ainda que as áreas trabalhadas sejam de poucas quadras, não ocorra uma generalização de propostas. Isso indica também que a leitura do território foi completa, já que conhece-se bem suas particularidades. O Pari, como apresentado no diagnóstico do bairro, possui em seu perímetro áreas com características, demandas, problemáticas e necessidades muito diferentes entre si, o que indica uma necessidade semelhante de desenvolvimento de propostas diferenciadas para cada setor.
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7. 2 | PLANO ESTRUTURAL DE SOUTHBANK
O bairro de Southbank localiza-se na cidade de Melbourne, capital do estado de Victoria, na Austrália. A cidade possui 4.347.955 habitantes distribuídos em 8.806 km² o que indica que é uma cidade pouco povoada, com apenas 493,7 hab/km², um número pequeno se comparado à cidade de São Paulo, que possui mais de 21 milhões de habitantes em uma área de 7.946,84 km² (2691,80 hab/km²). A área trabalhada pelo projeto possui 158 hectares (1,58 km²) e localiza-se na porção central e verticalizada do território, concentrando aproximadamente 9000 pessoas (5.696 hab/km²) Está separada do distrito central de negócios de Melbourne pelo Rio Yarra e da área ao sul pela rodovia West Gate. O bairro possui uma localização estratégica, porém o padrão construtivo, as atividades existentes e sua paisagem não
FIGURA 49 - Southbank e Rio Yarra (Fonte: Ilya Genkin)
estão alinhados com seu potencial. Existe uma tendência de que ele cresça como uma área central para se tornar uma extensão do distrito de negócios adensado e de uso misto localizado na margem oposta do rio. É um importante centro cultural da cidade e abriga uma população de mais de 10.000 pessoas que é etnicamente diversa, com estudantes chineses, malasianos
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e indonésios. Grande parte vive em edifícios verticalizados, sendo 2/3 destes em apartamentos alugados. A população local se desloca para a área central ou para a cidade vizinha (Port Phillip), para ter acesso a serviços e comércio básico. Há uma falta de coesão entre os usos do solo locais, o que gera uma área desconectada, pouco atrativa e difícil de caminhar. A paisagem é marcada por edifícios com usos que não criam relação direta com o pedestre que circula no nível da rua, o que tornou os espaços públicos intimidadores, sem vida, com poucas atividades e vigilância natural. São poucas as áreas públicas acessíveis e de qualidade, sendo menos de 2m² de área por pessoa, o que tende a se tornar um problema maior à medida que cresce a população residente e trabalhadora. Existem espaços qualificados paisagisticamente, mas a maioria dos espaços públicos abertos localiza-se entre vias de alto tráfego. A respeito do zoneamento, pode-se dizer que as zonas residenciais limitam a instalação de comércios e serviços locais. As zonas direcionadas a usos públicos protegem importantes equipamentos, mas falham em promover uma renovação dessas áreas que integre o território. Essas instituições estabelecem-se como elementos isolados, separados do contexto e que não ativam o espaço público.
FIGURA 50 Localização de Southbank (Fonte: Southbank Structural Plan)
FIGURA 51 - Em rosa, Southbank; em branco, o distrito comercial de Melbourne (Fonte: adaptado de Google Maps)
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O plano em questão foi desenvolvido pela AECOM Australia Pty Ltd, uma empresa que realiza atividades de consultoria, engenharia e planejamento nas áreas relacionadas à comunidade, meio ambiente, recursos naturais e infraestrutura. Houve grande contribuição do Grupo de Trabalho de Gerenciamento de Projeto de Southbank, composto pelo Departamento de Planejamento e Desenvolvimento Comunitário, Departamento de Transporte, VicRoads (órgão público responsável pelas rodovias e tráfego), Sustentability Victoria (órgão público estadual que trata de sustentabilidade), Melbourne Water (órgão público estadual que gerencia a qualidade e distribuição da água), CitiPower (concessionária de energia elétrica), South East Water (concessionária de água), Jemena (concessionária de gás, energia elétrica e água).
FIGURA 52 a 57 Paisagem do bairro (Fonte: Southbank Structural Plan)
O Plano Estrutural de Southbank 2010 está alinhado com o Future Melbourne, que é um plano comunitário criado com o intuito de tornar Melbourne uma cidade global próspera, criativa, conectada, ecológica e direcionada às pessoas, de modo que fosse reconhecida como líder mundial em modo de vida sustentável. O plano reconhece que o uso do solo e padrão de desenvolvimento existentes não colaboram com o desenvolvimento de uma cidade acessível, inclusiva e habitável, além de gerar edifícios não sustentáveis.
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O Southbank Structural Plan é uma ação do 2007 Southbank Plan, que delineava oportunidades em pontos chave do território, com o objetivo de melhorar a qualidade dos espaços públicos, organizando-se a partir de 7 projetos, dos quais 6 fazem parte do Southbank Structural Plan. Este por sua vez, foi criado com o objetivo de substituir um plano anterior de 1999, colocando em prática o Future Melbourne Community Plan 2008 e o Municipal Strategic Statement 2010 na escala local, direcionando visões e estratégias para Southbank nos próximos 30 anos. O plano tem como um de seus objetivos prover infraestrutura para um futuro crescimento populacional, buscando abarcar diversas faixas de renda, idade e modelos de habitação. Também é prevista uma revisão de questões relacionadas a transporte e mobilidade; energia, água, esgoto e coleta de lixo; impactos nas mudanças climáticas; políticas de planejamento e tendências de desenvolvimento; espaços públicos; e infraestrutura comunitária. Como consta no material divulgado, o partido do Plano Estrutural de Southbank aponta para o desenvolvimento de um lugar inclusivo, diverso e resiliente, que exemplifique a prosperidade ecológica, comunitária e comercial de um dis-
FIGURA 58 - Área de estudo (Fonte: Southbank Structural Plan)
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trito urbano sustentável, ao mesmo tempo em que fortaleça sua presença como um recinto cultural e artístico de classe mundial no coração de Melbourne. Antes de surgirem propostas, foi realizado um levantamento do bairro, identificando as áreas de acordo com potencial de desenvolvimento e qual porcentagem do território representam: • Desenvolvidas ao máximo (20%) - áreas que se desenvolveram nos últimos 20 anos e que atingiram 20% ou mais das restrições de gabarito, de acordo com a legislação atual. Estão inclusas áreas em construção. • Com limitações ao desenvolvimento (patrimônio - 9%) - patrimônio e edifícios históricos • Potencial de desenvolvimento em curto prazo (até 5 anos - 3%) – áreas vazias e predominantemente não desenvolvidas (sem construção) • Potencial de desenvolvimento a médio/longo prazo (até 30 anos - 29%) – áreas sem restrições, exceto a propriedade da terra e contratos de aluguel e arrendamento FIGURA 59 - Diagnóstico de áreas potenciais (Fonte: Southbank Structural Plan)
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Também foram feitos estudos a respeito do desenvolvimento de Southbank, investigando como seria a área se esta continuasse a se desenvolver sem o plano e como seria se o seguisse. O potencial total de crescimento da área sem o Structural Plan é de aproximadamente 6 milhões de metros quadrados, o que equivale a cerca de 68 mil novas habitações. O potencial total de crescimento da área com o Structural Plan é de aproximadamente 4 milhões de metros quadrados, o que equivale a cerca de 45 mil novas habitações. As consequências da não implantação do plano são uma paisagem urbana sobrecarregada de pessoas com baixos níveis de incidência solar e luz diurna no nível da rua e nos pavimentos inferiores dos edifícios. Perpetuar-se-ia o perfil atual de fachadas inativas e ocorreria um aumento no efeito das ilhas de calor.
FIGURA 60 Desenvolvimento da área sem o Plano (Fonte: Southbank Structural Plan)
FIGURA 61 Desenvolvimento da área com o plano (Fonte: Southbank Structural Plan)
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a.
O “coração urbano”
No caso de um aumento do número de moradores agrava-se o problema da falta de comércio local já que seria maior o deslocamento por transporte individual em busca de serviços nos bairros vizinhos. Propõem-se três novas centralides de atividades locais, onde se concentrarão o novo comércio e se desenvolverá a infraestrutura comunitária e a vida social do bairro. O objetivo é que o tempo de deslocamento de um habitante local seja de no máximo 5 minutos, percorrendo até 400 metros para acessar um comércio, restaurante ou equipamento comunitário. Estes seriam centralidades iniciais já que estas atividades podem se desenvolver em qualquer lugar do bairro e para que se direcione a ocupação destas três áreas prioritárias, são previstos masterplans para cada uma delas. Centralidade Escola Boyd: pequenos comércios, lojas, restaurantes/cafés, serviços locais, equipamentos públicos (biblioteca e centro comunitário).
FIGURA 62 - Centralidade Boyd School (Fonte: Southbank Structural Plan)
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Centralidade Recinto das Artes: localizada próximo ao centro de artes e entretenimento do bairro, com restaurantes, bares e serviços locais que se relacionem ao potencial artístico; abre oportunidade para que se estabeleçam negócios relacionados à economia criativa. Centralidade do “Citylink”: oferece a oportunidade mais significativa para o redesenvolvimento do bairro; tem potencial de se tornar a centralidade econômica e social do bairro. Para que se desenvolva é necessária a remoção de dois viadutos já que existe ali um nó viário com alto fluxo de veículos e a área é o maior espaço vago do bairro. O desenvolvimento de um projeto nesta área traria melhorias em termos de conectividade e acessibilidade, já que esta, juntamente à rodovia, é a maior barreira que impede o movimento no sentido norte-sul. Esta ação levaria ao desenvolvimento das áreas adjacentes, por isso deveria levar em conta os impactos no uso do solo e na capacidade de desenvolvimento.
FIGURA 55 - Centralidades externas e internas (propostas), acima. City Link, abaixo. (Fonte: Southbank Structural Plan)
FIGURA 63 - Centralidade Citylink (Fonte: Southbank Structural Plan)
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b. Conexão com o rio e a cidade central
c. Permeabilidade a pé e e por bicicleta
O plano pretende estabelecer o
bairro como uma extensão natural da cidade e o Rio Yarra como o centro e não sua borda através da criação de acesso fácil e atrativo para o rio e sua outra margem. São identificados estabelecimentos que possuem atratividade regional e que, se evoluírem, podem trazer interesse para outras áreas com potencial de se tornarem atração, como o eixo cultural da rua Sturt. O plano propõe também a transformação das Áreas Mistas e de Uso Público em “Capital City Zones”, já que esta dá peso igual aos usos residenciais e comerciais. A zona residencial deve se tornar zona de uso misto, de modo a permitir a instalação de comércio e serviços.
O objetivo principal é prover
espaços seguros para pedestres e ciclistas, investigando a possibilidade de implantação de estratégias de traffic calming [4] como zonas de 30, 40 e 50 km/h, aumentando a largura da calçada em algumas vias e criando mais faixas de pedestre. Planeja-se também a criação de um sistema de comunicação visual local que direcione os pedestres às principais destinações. É proposto ainda um redesenho de 4 vias que cortam o bairro de norte a sul e de 6 vias que ligam de leste a oeste visando priorizar a circulação de pedestres e ciclistas.
FIGURA 64 - Conexão com o Rio Yarra e sua margem oposta (Fonte: Southbank Structural Plan)
Tratando-se específicamente dos ciclistas, são propostas novas conexões na malha cicloviária, novos pontos de estacionamento de bicicleta nas ruas e um novo sistema municipal de compartilhamento de bicicletas
[4] Traffic calming, também conhecido como moderação de tráfego, consiste em medidas que utilizam o traçado das vias e estruturas físicas para indusir o motorista a uma redução da velocidade. Como consequência tem-se o aumento da segurança de pedestres e ciclistas.
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d.
Paisagem ao nível do olhar (streetscape)
O objetivo é tornar Southbank um bairro mais seguro, amigável e atrativo, estimulando o surgimento de novas formas de construção que tragam uma paisagem urbana viva e característica, não apenas por seu mérito arquitetônico, mas principalmente pela contribuição que deixam às experiência de andar pela cidade. Pretende-se incentivar o predomínio de uma paisagem urbana com edifícios de gabarito médio (20 pavimentos) já que esta altura permite retorno financeiro ao mercado imobiliário ao mesmo tempo que gera um ambiente com vigilância informal e fachadas ativas. Para isso, incentivar-se-ia o desenvolvimento de edifícios sem recuo nos primeiros 30 a 40 metros de altura, sendo os demais pavimentos recuados 10 metros do alinhamento. Dessa maneira, aproxima-se as atividades dos primeiros pavimentos dos edifícios com o que acontece na rua, enquanto que o recuo nos pavimentos superiores traz a visão do céu aos pedestres, assim como a luz do sol. Estabelece-se também que 80% das fachadas voltadas para vias primárias e secundárias devem possuir comércio e serviços voltados para a rua, enquanto que nas vias terciárias esse número é 50%. O térreo deve ter no mínimo 4 metros de pé direito e os demais pavimentos 3,6 m.
FIGURA 65 - Propostas de uso do solo (Fonte: Southbank Structural Plan)
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e.
Espaços públicos e verdes
O primeiro objetivo é melhorar a qualidade da rua, que é o espaço público primário da cidade, e dos acessos às praças e parques existentes. São propostos também novos parques atrativos para o convívio urbano, conectados às atrações vizinhas e com tipologias/escalas diferentes que atendam às necessidades da comunidade. Outro aspecto importante é a conexão entre parques através de uma malha verde, o que pode ser alcançado a partir do plantio de árvores. Como grande parte do território já está ocupada, a criação de novos espaços públicos e abertos de tamanho significativo encontraria dificuldades e involveria a conversão de áreas privadas e de alto custo de aquisição. Por isso, o plano foca nas grandes áreas onde atualmente existe um denso sistema viário, prevendo que este seja enterrado e que o nível da rua seja liberado para usos públicos como parques e praças. Aproveitando a potencialidade da centralidade no Citylink, é proposto ali um parque central. FIGURA 66 - Proposta de áreas verdes e públicas (Fonte: Southbank Structural Plan)
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f. Habitação a preço acessível O Future Melbourne estabece como uma de suas metas que 20% dos novos empreendimentos sejam residenciais a preços acessíveis. Nesse sentido, o bairro pode colaborar permitindo que pessoas de menor renda residam em uma área central provendo habitação social. Para isso, deve-se investigar mecanismo que funcionem nesse sentindo, incluindo a possibilidade de a Cidade de Melbourne atuar como incorporadora entre o mercado imobiliário e associações habitacionais.
FIGURA 67 - Proposta geral para o bairro (Fonte: Southbank Structural Plan)
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ANÁLISE E CRÍTICA
É possível identificar como ponto forte a metodologia utilizada, que apresenta primeiramente um estudo da área, com identificação e espacialização em mapas dos problemas principais a serem abordados e classificação das áreas de acordo com seu potencial de mudança. Esta abordagem permite uma boa compreensão do território. São apresentados também os objetivos e as metas principais pensadas para a área: dois aspectos bem delineados e ilustrados através de perspectivas e mapas. Percebe-se que o plano tem bem definido o que se espera da área em termos de mobilidade, infraestrutura verde, qualidade da paisagem e do ambiente urbano, segurança para pedestres e ciclistas, etc.
Melbourne localiza-se em um país desenvolvido e, portanto, sua realidade difere em diversos sentidos da cidade de São Paulo. Apesar disso, é possível identificar semelhanças físicas entre Southbank e o Pari, como por exemplo a falta de espaços verdes e públicos devido à alta ocupação do território e dos lotes. Este é um desafio em ambas as áreas já que pode ser inviável para o poder público adquirir áreas já consolidades. A abordagem adotada no Plano de Southbank indica para uma boa leitura do território e identificação de áreas associadas ao sistema viário ou que sejam de domínio público, já que assim a conversão em áreas verdes e de lazer seria facilitada. Outra questão é a existência de diversos equipamentos institucionais que não criam relação com seu entorno e atuam como elementos isolados no território, o que assemelha-se à região do Canindé. Apesar
de possuírem tipologias edilícias diferentes, a paisagem urbana se assemelha por ter grandes trechos onde as edificações não criam conexão com a rua, o que torna a experiência de andar pelo bairro monótona e por vezes insegura. Em Southbank são apontadas estratégias relacionadas à novas centralidades e à forma edificatória, incentivando a implantação de edifícios sem recuo e com usos em seu térreo. Outro ponto é a falta de áreas com comércio e serviço básico (mercado, padaria, restaurante, lanchonete, farmácia, etc). Por este motivo, a solução de criar novas centralidades que concentrem comércio e vida social é importante para dinamizar o movimento dentro do bairro, gerar pontos de encontro e permitir que os moradores locais realizem compras sem necessitar se deslocar de transporte individual.
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Nesse sentido, observar as propostas para o território que buscam solucionar as problemáticas semelhantes são uma boa maneira de utilizar o estudo de caso de Southbank como parâmetro de projeto. A metodologia de estudo da área também é um ponto que pode ser incorporado no desenvolvimento de um projeto para o Pari já que a espacialização de dados em camadas facilita a leitura do território e o cruzamento de informações.
8 |
COSTURANDO 8.1 Partido do projeto 8.2 Objetivos gerais 8.3 Diretrizes e estratégias 8.4 Estratégia urbana 8.5 Macrozoneamento 8.6 Revisão do zoneamento 8.7 Perímetro de qualificação do Canindé 8.8 Perímetro de qualificação da área comercial 8.9 Proposta sistêmica
108 110 112 116 118 122 124 134 138
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8. 1 |
PARTIDO DO PROJETO
Mediante uma integração entre políticas públicas e a ação do mercado imobiliário, o projeto visa o desenvolvimento urbano local a partir da reestruturação do bairro, pautada nas vocações regionais. Como apresentado, o Pari, em especial o Canindé, representa uma área da porção central do território desvinculada da dinâmica urbana de seu entorno. Além disso, devido ao seu passado industrial e usos relacionados a esta atividade, percebe-se uma perda de qualidades paisagísticas e ambientais e de população moradora. Apesar de ser um bairro de uso misto, identifica-se também conflitos entre alguns destes usos, o que dificulta a configuração de um território coeso. O projeto justifica-se no sentido de que possibilitaria a reinserção do Pari na dinâmica urbana da região central, tornando-o um bairro adensado e compacto, com infraestrutura eficiente, integrado ao transporte público e que atenda à demanda de moradia na porção central da cidade. Além disso, a proposta melhoraria a qualidade de vida
dos residentes e reafirmaria uma identidade local do bairro ressaltando as manifestações simbólicas existentes. Propõe-se então a formulação de uma estratégia urbana e o desenvolvimento de projetos setoriais e pontuais que articulem questões locais com questões estruturais da cidade. São necessárias ações que integrem a estrutura existente, conectando áreas fragmentadas, revertendo a deterioração das qualidades paisagísticas e ambientais locais e direcionando o bairro a um novo horizonte para que possa abrigar mais pessoas e provê-las infraestrutura e qualidade de vida.
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8. 2 |
OBJETIVOS GERAIS
A partir do diagnóstico e das contribuições dos estudos de caso foi possível identificar as potencialidades e problemáticas do bairro e apontar objetivos gerais que serão seguidos para que a estratégia urbana proposta atinja o partido do projeto: adensar, requalificar, ativar e conectar. A premissa de adensar vem no sentido de aproveitar a disponibilidade de terrenos, infraestrutura de transporte, facilidade de acesso a serviços, postos de trabalho e a baixa densidade populacional do bairro, buscando atender uma demanda habitacional existente para a região central da cidade. Tem-se então o Canindé como setor prioritário de atuação, por este concentrar terrenos de grandes dimensões com usos institucionais em edificações horizontalizadas, uso este que pode ser otimizado em termos de espaço. Nesse sentido, seria possível resignificar a área com a instalação de novos usos e incentivo à produção habitacional. A proposta de requalificar tem como objetivo principal reverter a deterioração das qualidades paisagísticas do bairro, agindo em estruturas consolidadas de modo a melhorar o con-
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vívio nas ruas, a sensação de segurança e o conforto dos usuários. Para atingir este objetivo, estabeleceram-se então três abordagens: um projeto para a área comercial, visando dotar as vias lindeiras aos shoppings de infraestrutura adequada para receber a grande circulação de pessoas já existente; o redesenho de vias estratégicas do bairro, buscando uma melhoria na qualidade das calçadas, arborização e segurança para o pedestre; e o incentivo à reutilização dos galpões e armazéns pela indústria criativa através de incentivo fiscal, aproveitando a vocação e relação do bairro com o comércio têxtil. Além disso, também age em questões ambientais relacionadas a drenagem, que são incorporadas no redesenho de vias.
ADENSAR
REQUALIFICAR
ATIVAR
CONECTAR
A diretriz de ativar tem sua base na identificação de estruturas importantes para o território e seu entorno ou com potencial para tal e transformá-las em pontos nodais estratégicos. São estabelecidos então subprojetos que tem como objetivo ativar centralidades e espaços públicos, conversando com a proposta sistêmica e com a rede de infraestrutura existente e fomentando a apropriação dos mesmos por parte da população. Tendo como objetivo conectar o bairro e valendo-se da leitura cartográfica do território apresentada nos capítulos anteriores, consolida-se uma proposta de integração entre a infraestrutura existente do bairro, os setores prioritários de projeto e os subprojetos.
FIGURA 68 - Diagramas com os objetivos gerais estabelecidos (Fonte: Própria autoria)
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8. 3 |
DIRETRIZES E ESTRATÉGIAS
As diretrizes aqui estabelecidas são resultado da análise feita a partir do diagnóstico do bairro e das contribuições dos estudos de caso. Elas tem o intuito de atingir os objetivos gerais propostos para o projeto e compõem uma estratégia urbana que guiou o desenho urbano desenvolvido na reestruturação da área. As temáticas abordadas são:
•
habitação
• zoneamento • paisagem e território • microdrenagem • espaços públicos • centralidades • patrimônio, identidade e cultura • áreas verdes • sistema viário • microacessibilidade • modais de transporte
PAISAGEM E TERRITÓRIO
Promover adensamento qualificado ao longo dos eixos de transporte e metrô. Incentivar fachada ativa e fruição pública, de modo a trazer vida às vias e aumentar sensação de segurança. Incentivar a reutilização dos armazéns existentes a partir de incentivos fiscais, com novos usos associados à indústria criativa - à semelhança do que ocorre na Vila Leopoldina - resignificando edificações sem utilização e atualizando os usos locais. Os incentivos podem ser isenção ou desconto de IPTU e ISS.
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HABITAÇÃO
ZONEAMENTO
PATRIMÔNIO, IDENTIDADE E CULTURA
Incentivar o adensamento populacional nas ZEM, de modo a atender a demanda por habitação em áreas centralizadas e com boa infraestrutura. Estabelecer que 10% das áreas reparceladas sejam destinadas a HIS e HMP. Promover a regularização urbanística de assentamentos precários, realocando a população moradora de cortiços e da favela a projetos de HIS nas quadras lindeiras.
Desenvolver um zoneamento que siga as premissas estabelecidas nas macrodiretrizes, com destaque para as ZEM e ZEIS.
Reutilizar e integrar estruturas existentes relacionadas ao passado industrial do bairro, abrindo-as ao acesso do público, dando valor à identidade local e mantendo viva a memória urbana associada a essas construções. Integrar os clubes de futebol de várzea ao convívio e paisagem do bairro de maneira benéfica ao entorno. Associar marcos na paisagem a centralidades e espaços públicos.
CENTRALIDADES Qualificar centralidades locais articulando equipamentos, habitação, áreas verdes e de lazer. Estas centralidades podem ser comerciais ou institucionais.
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ÁREAS VERDES
MICRODRENAGEM
ESPAÇOS PÚBLICOS
Melhorar a qualidade ambiental do bairro, com aumento de área verde, permeável e arborizada, buscando a melhoria do microclima e da paisagem. Há também a necessidade de melhorar o acesso a espaços verdes, tendo em vista que a área com maior permeabilidade e arborização corresponde aos grandes terrenos no Canindé, cujos usos limitam o acesso à população.
Melhorar o sistema de escoamento de água, de modo a aumentar a área permeável e mitigar alagamentos que são frequentes na área devido à localização em área de várzea.
Criar espaços públicos atrativos, incentivando o convívio social e tornando-os também pontos de encontro ao associá-los a locais considerados marcos na paisagem. Devem ser pensados de acordo com uma hierarquia, levando em conta os usos do entorno, o raio de alcance de seus usuários e as funções que estes desempenharão (encontro, lazer, atividades físicas, descanso ou contemplação). No caso de espaços já existentes, subutilizados e com potencial, tem-se o desafio do redesenho.
Dentro da premissa de conectar, criar corredores verdes e arborizados que liguem as áreas verdes existentes, trazendo benefícios à fauna e flora local e dinamizando o funcionamento do ecossistema urbano da região central.
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SISTEMA VIÁRIO
MICROACESSIBILIDADE
MODAIS
Conectar as áreas a leste e oeste do bairro, criando uma via estrutural no Canindé. Readequar o sistema viário local a partir da abertura de novas vias de apoio à avenida proposta e nas áreas a serem reparceladas. Implantar vias compartilhadas e pedestrializadas, tendo em vista que atualmente o fluxo de pessoas e comerciantes ambulantes conflita com a circulação de veículos. Implantar mecanismos de controle de tráfego (traffic calming).
Promover modos de locomoção não motorizados através de novas rotas de pedestres e ciclistas, aproveitando a pequena dimensão do bairro (2,9 km²: 1,62 km de norte a sul e 2,5 km de leste a oeste) e sua topografia majoritariamente plana. Adotar medidas de proteção de pedestres nas principais esquinas.
Incorporar transporte municipal à via estrutural proposta, implantando corredor de ônibus através de tipologia de via adequada. Incentivar o deslocamento intermodal conectando equipamentos de transporte existentes (metrô e terminais de ônibus) à nova via proposta
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8. 4 |
ESTRATÉGIA URBANA
A estratégia urbana é guiada pelos objetivos estabelecidos e pelas diretrizes apresentadas anteriormente, que dão um panorama geral da proposta de bairro que se deseja alcançar e direcionam uma proposta em escalas. É essencial uma visão integral do bairro que vá além da premissa inicial de adensar construindo novas habitações. Na escala do bairro tem-se uma abordagem sistêmica que sobrepõe questões pensadas em rede: sistema viário, micro acessibilidade, mobilidade, espaços públicos, infraestrutura verde e sistema de drenagem. Existem também perímetros de qualificação que englobam um conjunto de quadras e são estratégicos para a consolidação de uma nova dinâmica para o bairro por modificarem a área em que agem e seu entorno: o perímetro de qualificação do Canindé e o da área comercial. Por último, são propostos subprojetos, numa escala mais próxima ao usuário. Estes consolidam a integração proposta para a região atuando como pontos nodais do sistema
ao estabelecerem relação com a infraestrutura proposta e a existente. Interagem com usos e equipamentos, buscando potencializar espaços públicos e centralidades importantes para o bairro. É importante destacar que as propostas de desenho para os espaços públicos (praças e parques) apenas delineiam o que se propõe para a área, portanto o nível de detalhe é menor. O elemento estruturador da proposta, que sustenta a premissa de costurar uma lógica territorial é a abertura da Av. Projetada Canindé-Pari, como previsto no Arco Tietê e no PIU Setor Central. Essa estratégia tem como objetivo quebrar a lógica existente que segrega o bairro no sentido leste-oeste e não configura uma conexão entre os usos no sentido norte-sul. Como ação projetual, dar continuidade à Av. Bom Jardim é abrir novas frentes urbanas e incorporar uma área não acessível ao convívio do bairro.
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ESTRATÉGIA URBANA
5
MAPA 15 (Fonte: Própria autoria)
2
4
1
3 9
8
6 7
Vias estruturais existentes
Nova via proposta
Conexões voltadas ao pedestre
Perímetros de qualificação
Subprojetos de espaços públicos
Cruzamentos revistos
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8. 5 |
MACROZONEAMENTO
O macrozoneamento tem o intuito de estabelecer diretrizes espaciais que direcionem uma lógica de desenvolvimento do bairro orientando as ações durante a aplicação das estratégias contidas no plano. Aqui são explicitados então os objetivos desejados para cada macrozona, assim como seus perímetros.
1 2 3 4
1 - Macrozona da adensamento
Seguindo a premissa de adensar, foi estabelecida uma macrozona direcionada a este intuito, que se distribui ao longo da nova via proposta. A ideia é que a nova via alie em seu desenho um corredor de ônibus, se tornando um eixo de transporte. Assim, pautando-se na diretriz do Plano Diretor Estratégico de Desenvolvimento Orientado pelo Transporte Sustentável, promoveria produção habitacional ao longo do eixo leste-oeste proposto. A potencialidade de atingir o objetivo do aumento populacional foi constatada pela disponibilidade de terrenos de grandes dimensões na Ponte Pequena e ao longo da Av.
5
MACROZONEAMENTO MAPA 16 (Fonte:SP Urbanismo, 2018)
1
Zona de adensamento
2
Zona institucional
3
Zona residencial consolidada
4
Zona de contenção
5
Zona comercial
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 117
Bom Jardim. A proposta é que complementarmente haja um reparcelamento das grandes glebas do Canindé, seguindo a LPUOS - Lei de Uso, Parcelamento e Ocupação do Solo - que estabelece percentuais de área pública a serem destinados a áreas verdes, institucionais, sistema viário e áreas sem afetação - estas foram incorporadas ao projeto e já direcionadas ao sistema viário ou áreas verdes, conforme necessidades encontradas. Foi realizada uma estimativa de adensamento populacional de acordo com o projeto proposto. O cálculo foi realizado tendo como base a cota parte máxima estabelecida pela Prefeitura para os eixos de transformação urbana
A B FIGURA 69 Glebas a serem reparceladas e grandes terrenos
C
em terrenos hipotéticos de 1.000m², que seria no valor de 20. O número máximo de habitantes considerado é de 157 pessoas - valor elaborado SMDU/Deinfo de acordo com o Censo IBGE 2010, considerando a média de 3,15 pessoas por domicílio. Assim, foi calculada a área total de terreno disponível para produção habitacional. Este valor foi dividido por 1000 (m² do terreno hipotético) e multiplicado por 157. Prosseguiu-se então com a divisão do número de habitantes calculado pela área do projeto, que é de 328 ha (distrito do Pari + Ponte Pequena). As tabelas a seguir esquematizam o reparcelamentos das glebas A,B e C.
ÁREAS PÚBLICAS
>20.000 m²
>40.000 m²
ÁREA VERDE
5%
10%
ÁREA INSTITUCIONAL
5%
5%
SISTEMA VIÁRIO
NA
15%
ÁREA SEM AFETAÇÃO
20%
10%
TOTAL DE ÁREA PÚBLICA
30%
40%
TABELA 4 - Percentuais de área pública em reparcelamento de grandes glebas (Fonte: LPUOS, Lei nº 16.402, 22/03/2016)
118 | TFG 2018
ÁREAS (m²)
GLEBA A MÍNIMO
ÁREA
TABELA 5 - Destinação de áreas públicas no reparcelamento de glebas
PROJETADO
GLEBA C
PROJETADO
MÍNIMO
PROJETADO
21.500,00
291.287,20
VERDE
5.733,70
5.733,70
29.128,72
31.543,18
1.075,00
1.075,00
INSTITUCIONAL
2.866,85
2.900,00
14.564,36
17.741,72
1.075,00
1.107,00
SISTEMA VIÁRIO
8.600,55
15.668,00 43.693,08
97.528,20
-
5.356,00
SEM AFETAÇÃO
5.733,70
A. PÚBLICA TOTAL
ÁREA COMÉRCIO E SERVIÇOS
22.934,80
-
29.128,72
24.301,70 116.514,88
-
4.300,00
146.813,10
6.450,00
7.538,00
GLEBA A
GLEBA B
GLEBA C
LOTES > 500m²
33.035,30
144.474,10
13.962,00
122.745,80
8.919,53
39.008,01
3.769,74
36.823,74
105.466,09
10.192,26
85.922,06
14.447,41
1.396,20
Não estabelecido
RESIDENCIAL (INCLUINDO HIS)
24.115,77
HIS
3.303,53
ÁREAS (m²)
POPULAÇÃO
DENSIDADE (hab/ha)
COM GLEBAS PARCELADAS
20857 42801
63,6 130,5
COM GLEBAS PARCELADAS E LOTES DE GRANDES DIMENSÕES
62073
189,2
EXISTENTE
TABELA 7 - Estudo de adensamento populacional do projeto
MÍNIMO
57.337,00
ÁREAS (m²)
TABELA 6 - Destinação de áreas privadas no reparcelamento de glebas
GLEBA B
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 119
2 - Macrozona institucional
A delimitação desta zona está diretamente relacionada à existencia de importantes equipamentos institucionais que atraem fluxo de pessoas interna e externamente ao bairro e que devem ser mantidos. Entre eles é importante destacar a Escola da Polícia Militar, o Instituto Federal de São Paulo, a AMA Pari, uma creche, a EMEF Infante D. Henrique e a EMEI Casper Líbero. Espacialmente tem-se a Praça da Kantuta como ponto central entre estes equipamentos. Assim, propõe-se um rearranjo do entorno da Praça, configurando uma centralidade institucional e tornando-a um ponto de encontro. Nesse sentido, deve haver também incentivo à implantação de comércio e serviços locais nas quadras lindeiras à Praça. Buscando diversificar os usos, já que a predominância de usos institucionais no Canindé é tida como pouco dinâmica, propõe-se a oferta de habitação associada também ao parcelamento da gleba B, porém criando uma relação maior com a centralidade da Kantuta, ao invés da centralidade da via projetada. Destaca-se aqui a necessidade de produção de Habitação de Interesse Social com o objetivo de realocar a população moradora da Favela Santo Antônio, provendo moradia digna aos diferentes tipos de família que ali existem.
3 - Macrozona residencial consolidada
Para a área compreendida pelo Alto do Pari e as quadras localizadas entre a Av. Bom Jardim e Av. Carlos de Campos, identifica-se a necessidade de conservar o uso residencial horizontal consolidado. É preciso portanto resguardar a região do avanço do mercado, tanto comercial pelo sul, quanto residencial pelo norte (estruturado pela macrozona de adensamento).
4 - Macrozona de contenção
Correspondendo às quadras adjacentes à macrozona comercial, esta zona de transição tem o intuito principal de mitigar o avanço da mancha de usos comerciais em direção ao interior do bairro, já que o valor venal desse uso é mais vantajoso para o mercado e levaria à substituição de usos residenciais e à consolidação de uma região estritamente comercial.
5 - Macrozona comercial
Tem como objetivo desenvolver a região indo na direção a um perfil de uso misto, de forma a barrar a lógica estritamente comercial que existe. É necessário estabelecer ações que melhorem as condições de circulação de pessoas tendo em vista o alto fluxo de pedestre. Propõe-se a configuração de uma centralidade comercial forte com identidade própria, que seja associada ao bairro e não apenas ao Brás.
120 | TFG 2018
8. 6 |
REVISÃO DO ZONEAMENTO
Entende-se como necessária uma revisão do zoneamento já que a proposta envolve questões relacionadas à reestruturação do bairro e tem o intuito de alterar suas dinâmicas internas relacionadas aos usos do solo e parâmetros urbanísticos como coeficientes da aproveitamento. Indo ao encontro da proposta de adensamento ao longo do novo eixo de transportes proposto e aos equipamentos de mobilidade, as quadras lindeiras à nova Avenida proposta e à Estação/Terminal Armênia devem ser transformadas em ZEM - Zona de Estrurturação Metropolitana, onde o coeficiente de aproveitamento máximo pode chegar a 4 com a aquisição de outorga onerosa. Sobre as Zonas Especiais de Interesse Social, é determinada a realocação das quadras assim zoneadas, tendo em vista a necessidade de desagrupar as ZEIS aglomeradas na região sudoeste e incorporá-las em posições estratégicas do bairro. É uma maneira de trazer ao bairro uma diversidade de faixas de renda de maneira integrada e não segregada, como imposto no zoneamento origi-
nal. Prioriza-se a locação destas quadras na Macrozona de contenção como estratégia para barrar o avanço dos usos comerciais em direção ao centro do bairro. Também são dispostas na Macrozona Comercial, como tentativa de incorporar usos que diferem do estritamente comercial na região e estimular a elaboração de novas tipologias de uso misto com fachada ativa. Na Macrozona de adensamento também são locadas quadras de ZEIS, tendo como premissa que esse tipo de moradia seja visada na disponibilização de novas áreas destinadas a habitação. Vale destacar que os quesitos para a escolha da posição destas quadras levam em conta a localização dos cortiços e da favela, além da disponibilidade de terrenos de maiores dimensões. Ademais, há uma atuação em equipamentos estratégicos: o novo parque proposto ao lado da Marginal Tietê deve se tornar ZEPAM, enquanto o IFSP e o novo equipamento proposto para o terreno da Fábrica União devem se tornar ZOE.
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 121
O projeto prevê também uma redução da área delimitada como ZDE (Zona de Desenvolvimento Econômico) e a permanência de ZM (Zona Mista) nas Macrozonas de Contenção e Residencial Consolidada, já que esta zona possui parâmetros urbanísticos mais restritivos que a ZEM, tornando-as menos interessantes aos olhos do mercado.
FIGURA 70 Zoneamento existente
NOVO ZONEAMENTO MAPA 17 (Fonte:SP Urbanismo, 2018)
Zona Mista (ZM)
Zona Eixo de Estruturação da
Transformação Metropolitana (ZEM)
Zona de Desenvolvimento Econômico (ZDE-1)
Zona Especial de Interesse Social (ZEIS-3)
Zona de Ocupação Especial (ZOE)
122 | TFG 2018
8. 7 |
ONDE NINGUÉM ANDA PERÍMETRO DE QUALIFICAÇÃO DO CANINDÉ
Santuário das Almas
Associação Portuguesa de Desportos
EMEF Infante D. Henrique
Como dito, o projeto se estrutura a partir da abertura da nova via proposta e a área do Canindé é o objeto foco da transformação desejada . Nesse sentido, foi delimitado um perímetro de qualificação onde algumas propostas são estruturadas. A área compreende a parte noroeste do bairro, desde a Rua Pedro Vicente até a Marginal Tietê, englobando integralmente as glebas A e B, maiores que 40.000 m² cada. É proposto um rearranjo dos usos institucionais com o objetivo de otimizar a utilização dos terrenos existentes. Para tal, as instituições destinadas à assistência de pessoas em situação de rua são deslocadas para um terreno menor, onde devem se instalar em edificação mais verticalizada que as anteriores.
Estação Armênia
Fábrica Bela Vista Instituto Federal de São Paulo
Edifício Olarias UBS Pari
Pelo contato do Instituto Federal de São Paulo com as instituições do entorno, foi identificado um interesse por parte da EMEF Infante D. Henrique de se mudar para um terreno com dimensões maiores que contemple de maneira mais adequada o programa de necessidades da escola. Da mesma maneira, o próprio IFSP apresenta uma necessidade
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 123 Clube Escola Serra Morena
Clube Estrela do Pari
EMEI Casper Favela Líbero Santo Antônio
EMEF Infante D. Henrique
Fábrica Bela Vista
3 - Praça Kantuta CMTC
4 - Praça Elias Chaiub IFSP Santuário das Almas 5 - Parque Marginal
Estação Armênia
1 - Conexão Terminal Shopping D
2 - Praça da Rua Porto
Ponte Cruzeiro do Sul
Rio Tamanduateí Av. do Estado
Instituições assistenciais à pessoa em situação de rua Rio Tietê/ Marginal
124 | TFG 2018
de expandir para outros terrenos. Assim, estas duas necessidades foram levadas em conta ao delimitar áreas destinadas a usos institucionais no reparcelamento da gleba B. O terreno do CMTC também é considerado para fins de expansão do IFSP. As diretrizes principais que estruturam a qualificação do Canindé estão ligadas ao sistema viário, modais de transporte, espaços públicos e áreas verdes. A avenida proposta incorporaria em seu canteiro central uma ciclovia com duas faixas e pontos de ônibus que atendam ao corredor de ônibus que ocupa uma das 3 faixas da via (por sentido). A abertura de vias é essencial para a nova dinâmica local. Estas foram traçadas não só no reparcelamento das glebas mas também como ruas auxiliares ao funcionamento da Av. Projetada, facilitando o escoamento do fluxo de veículos para dentro do bairro. O novo desenho teve como premissa conectar vias existentes e criar quadras com dimensões confortáveis ao pedestre (média de 10.000m²).
FIGURA 71 - Diagrama de sistema viário no Canindé
Vias abertas
Vias estruturais existentes
Conexões voltadas ao pedestre
FIGURA 72 - Diagrama de mobilidade no Canindé
Linhas de ônibus existentes
Linhas de ônibus propostas
Pontos de ônibus
Ciclovias
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 125
0
Ciclovia Jardins de chuva Jardins de chuva Ponto de ônibus Arborização
Arborização
1
2
5
10
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AV. PROJETADA CANINDÉ-PARI
Na Macrozona Institucional existe também a intenção de incorporar a favela Santo Antônio ao entorno, já que atualmente se encontra isolada. O acesso à nova via, à Praça da Kantuta (3) e à Rua Pedro Vicente seria facilitado. Aqui, a Kantuta surge como nova centralidade, como indicado anteriormente no tópico da Macrozona Institucional.
FIGURA 73 - Diagrama de espaços públicos no Canindé
Espaços públicos existentes
Espaços públicos propostos
A abertura de novas vias leva também á criação de novas frentes urbanas e de novos espaços públicos, o que facilita o deslocamento não apenas de veículos mas também de pedestres, ativando um local que atualmente não é convidativo nesse sentido. Associada à Av. Projetada, é proposta uma expansão da Praça Elias Chaiub (4) , que atualmente é pequena e está segregada em meio a terrenos murados. No projeto ela é um espaço público que se relaciona com os dois lados da via projetada e surgiria como um largo para o pedestre que caminha na Avenida, incorporando em seu entorno usos comerciais e de serviços como lojas, restaurantes e lanchonetes.
FIGURA 74 - Diagrama de áreas verdes no Canindé
Áreas verdes públicas
Áreas arborizadas privadas
Arborização viária
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 127
IFSP
EMEI Casper Líbero Favela Santo Antônio
Comércio no térreo
AMA
EMEF Infante D. Henrique
Creche Edifício Olarias
FIGURA 75 - Praça Kantuta e entorno
Comércio no térreo
IFSP Expansão do IFSP EMEI Casper Líbero
Favela Santo Antônio
FIGURA 76 - Praça Elias Chaiub e entorno
128 | TFG 2018
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RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 129
No perímetro propõe-se a criação da Praça da Rua Porto (2) tendo em vista a falta de espaços públicos de qualidade na Ponte Pequena. Esta praça atenderia principalmente aos moradores do entorno com equipamentos de lazer (ginástica, playground), espaços de estar e área arborizada.
FIGURA 77 - Referência de projeto para Parque Marginal Praça Colinas de Anhanguera (HUS Arquitetura) (Fonte: Archdaily)
Outro espaço que se torna importante na região é a conexão aberta nos terrenos do Metrô embaixo de seu elevado (1). Atualmente são áreas muradas que tem potencial de conectar o Terminal Metropolitano e a Estação Armênia ao corredor de ônibus da Av. Projetada. O projeto propõe que este espaço de circulação seja associado a usos de interesse dos usuários dos modais de transporte, como lanchonetes, áreas de alimentação e espaços de estar. Também relacionado a áreas verdes, vem a proposta de criação de um parque ao longo da Marginal Tietê (3). A decisão vem da necessidade de se delimitar cerca de 30 mil m² de área verde para a gleba B. Assim, buscando manter a mancha de arborização e a grande quantidade de área permeável já existente na área de várzea, a área mais ao norte foi escolhida como ideal para a criação do Parque. Este seria voltado à prática de esportes, tendo em vista a escassez de equipamentos nesse sentido na região central. Seu raio de abrangência seria na escala da cidade, já que atrairia usuários também da Zona Norte e de bairros vizinhos.
FIGURA 78 - Referência de projeto para Parque Marginal Parque da Juventude (Rosa Kliass) (Fonte: Archdaily)
PRAÇA DA RUA PORTO E CONEXÃO COM O TERMINAL
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130 | TFG 2018
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RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 131
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132 | TFG 2018
8. 8 |
CONEXÃO COM O TERMINAL
ONDE O PARI É QUASE BRÁS
PERÍMETRO DE QUALIFICAÇÃO DA ÁREA COMERCIAL Com o objetivo de detalhar algumas das diretrizes determinadas pela Macrozona Comercial, tem-se o perímetro de qualificação associado à área comercial do Pari com maior concentração de pessoas. Galeria Pagé Brás
Shopping Porto Brás Igreja Santo Antônio do Pari
Shopping Vautier Shopping Vautier Premium
A premissa se baseia no fechamento de parte das ruas Vitor Hugo, Alexandrino Pedroso, Hanneman e Tiers ao acesso de veículos, transformando-as em vias pedestrializadas. As vias em questão foram escolhidas por configurarem um eixo de shoppings populares que atraem uma grande quantidade de pessoas. Assim, o projeto de desenho urbano visa atender a demanda por espaços de estar e descanso dos consumidores que ali circulam. Além das vias pedestrializadas, as ruas Barão de Ladário e Rodrigues Santos foram transformadas em ruas compartilhadas, por atraírem público mas terem em suas quadras lindeiras edifícios habitacionais e acessos a estacionamentos, usos estes que demandam acesso frequente por veículos.
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 133 Rio Tamanduateí/ Av. do Estado
Igreja Santo Antônio do Pari
Shopping Vautier
Shopping Vautier Premium
Shopping Porto Brás
Vias comerciais
6 - Praça Padre Bento
Galeria Pagé Brás
134 | TFG 2018
Esta decisão projetual teve repercussões pelo território, especialmente com relação ao fluxo de veículos, por isso, algumas linhas de ônibus tiveram seu trajeto deslocado para vias próximas.
FIGURA 79 - Diagrama de sistema viário no Canindé
FIGURA 80 - Diagrama de mobilidade no Canindé
Outra mudança importante é a incorporação da Praça Padre Bento ao desenho da via pedestrializada, facilitando a circulação do pedestre ao Largo do Pari e à Igreja Nossa Senhora do Pari.
FIGURA 81 - Diagrama de espaços públicos no Canindé
FIGURA 82 - Diagrama de áreas verdes no Canindé
Vias compartilhadas
Linhas de ônibus existentes
Espaços públicos existentes
Áreas verdes públicas
Conexões voltadas ao pedestre
Linhas de ônibus propostas
Espaços públicos propostos
Arborização viária tipo 1
Pontos de ônibus
Arborização viária tipo 2
Ciclovias
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8. 9 |
PROPOSTA SISTÊMICA 5
Partindo das mudanças propostas nos perímetros de qualificação, surge a necessidade de relacioná-las à infraestrutura existente, estudada a fundo na primeira parte do trabalho. Além disso, foram identificadas áreas potenciais fora desses perímetros onde são propostas intervenções pontuais. Nesse sentido, uma proposta sistêmica se torna importante para a consolidação da estratégia urbana desejada. O primeiro aspecto estruturante da nova lógica territorial está relacionado aos espaços públicos. Dentro do recorte de projeto são identificadas áreas com potencial de se tornarem espaços públicos de qualidade, seja por sua conversão nesse tipo de equipamento ou qualificação através do redesenho. Alguns destes parques e praças foram apresentados anteriormente nos perímetros de qualificação, porém destaca-se ainda outras três
2 4
1 3
9 8
6 7
intervenções. Pela leitura feita do bairro, foi posssível identificar que a área a sudoeste carece de espaços verdes públicos e que a população residente em cortiços e HIS não é atendida nesse sentido. A criação de uma nova praça voltada para a comunidade
ESPAÇOS PÚBLICOS MAPA 18 (Fonte: Própria autoria)
Espaços públicos existentes
Espaços públicos propostos
local se torna então essencial. Dispondo de um terreno de grandes dimensões na extremidade do bairro, é proposta a criação de uma praça que contenha áreas de estar e lazer (playground, equipamentos de ginástica). Esta pode funcionar também como um elemento que atraia pessoas do outro lado do rio, como os moradores da Vila Sá Barbosa e da Vila Economizadora.
Vila Sá Barbosa
Novos prédios
Liceu de Artes e Ofícios
Cortiços
Vila Economizadora
FIGURA 83 Praça da Rua Teodoro
PRAÇA DA RUA TEODORO
138 | TFG 2018
Próximo à área residencial encontra-se o terreno da antiga fábrica de leite União, identificado como marco na paisagem e componente do patrimônio industrial do bairro. A criação de um parque vem como tentativa de gerar um novo espaço de convívio com área adequada e que atenda à população já residente. Propõe-se também a conversão da edificação principal da fábrica em um equipamento voltado à industria criativa, que promova cursos e oficinas relacionados ao tema. A associação dessas duas estratégias gera um novo espaço de ativação cultural, já que o bairro carece de equipamentos nesse sentido. A ideia aqui é potencializar um sentido de comunidade e apropriação por parte dos moradores. Seguindo o eixo da Av. Projetada, surge a praça Ilo Otani no cruzamento com a Av. Carlos de Campos. A proposta é de um projeto que retome o desenho de forma circular deste largo, eliminando algumas vias que o cortam e ampliando a área de circulação destinada ao pedestre. Essa ação projetual, juntamente a um desenho adequado das vias de circulação de pedestre da nova praça, ajuda a incorporar a Biblioteca Adelpha Figueiredo, a Escola Estadual Frei Paulo Luigi e o novo equipamento de assistência social - criado no reparcelamento da gleba C - ao espaço proposto.
Alto do Pari
Antiga Fábrica União
Equipamento de assistência social
Av. Carlos de Campos FIGURA 84 Parque União e entorno E.E Frei Paulo Luigi
Biblioteca Adelpha Figueiredo
FIGURA 85 Praça Ilo Otani e entorno Av. Carlos de Campos
PRAÃ&#x2021;A ILO OTANI
140 | TFG 2018
O projeto trás também a ideia de um sistema de corredores verdes arborizados associados à mobilidade do pedestre, com maior cobertura vegetal e arborização densa. O traçado proposto conecta as áreas verdes públicas de uso recreativo, esportivo e comunitário - existentes e propostas - assim como as áreas verdes privadas. A respeito da arborização das vias, foram estabelecidos dois tipos: o tipo A, com árvores de grande e médio porte, nos corredores principais; e o tipo B, com árvores de pequeno e médio porte. Grande parte das ruas do bairro possui porte e calçadas que comportam o plantio de árvores, com exceção das vielas do Alto do Pari e das ruas já existentes próximas à marginal. Sobre o sistema viário, como já apontado, as principais mudanças são com relação à abertura de vias nas glebas reparceladas. Destaca-se ainda uma preocupação com a otimização do desenho de algumas vias como a Av.Vautier e as ruas residenciais, tendo em vista que o porte das mesmas comporta um projeto que dê mais espaço e conforto ao pedestre. Para o Alto do Pari, área com sistema viário de menor porte que não comporta alto fluxo de veículos, é proposta a implantação de cancelas em 4 pontos estratégicos para barrar o uso das vias como passagem de veículos
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ÁREAS VERDES MAPA 19 (Fonte: Própria autoria)
Áreas verdes públicas
Áreas verdes privadas
Corredores arborizados principais
Corredores arborizados secundários
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 141
Um dos principais aspectos desejados para o território é facilitar a conexão entre a Estação Armênia, a Praça Kantuta e área comercial. Para isso, é proposta uma diferenciação visual entre a Pedro Vicente e as demais vias do bairro, para que esta se destaque como um caminho claro a seguir e se torne uma referência fácil. Portanto, são propostas duas tipologias de paginação de calçada com intertravado: na Pedro Vicente, Olarias e Tiers, predomina o bloco vermelho, enquanto que nas demais vias predomina o bloco cinza. Deve haver uma melhoria nas calçadas na parte inicial da Pedro Vicente (entre a Estação e Av. Cruzeiro do Sul) com a incorporação de baias de estacionamento do lado esquerdo da via. Já na parte próxima ao IFSP propõe-se a conversão em uma via compartilhada, o que conversa com os usos institucionais que também atraem fluxo de pessoas.
SISTEMA VIÁRIO MAPA 20 (Fonte: Própria autoria)
Vias estruturais N1
Vias estruturais N3
Vias abertas
Vias pedestrializadas
Vias compartilhadas
Cruzamentos revistos
A transposição da Av. Cruzeiro do Sul é essencial para o pedestre e, como é feita atualmente, não o prioriza. Ela foi repensada, limitando o acesso à Av. Cruzeiro do Sul sentido bairro para os veículos que estão na Rua Pedro Vicente. Dessa maneira, uma nova faixa de pedestres foi criada, facilitando a travessia. Também foi pensado o cruzamento entre a nova avenida proposta e a Av. Cruzeiro do Sul.
142 | TFG 2018
AV. PROJETADA X AV. CRUZEIRO DO SUL
RUA PEDRO VICENTE X AV. CRUZEIRO DO SUL
Ciclovias
Ciclovias
Fluxo Cruzeiro do Sul
Fluxo Cruzeiro do Sul
Fluxo Av. Projetada
Fluxo Pedro Vicente
Travessia de pedestre
Travessia de pedestre
RECONSTRUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DO PARI | 143
A respeito das estratégias de drenagem, destaca-se a implantação de jardins de chuva no redesenho de vias. Esse tipo de solução consiste em canteiros abaixo do nível da rua destinados a receber a água pluvial proveniente da rua, calçada e em alguns casos de telhados. Cormier e Pellegrino (2008) destacam que o solo geralmente é tratado com compostos que o tornam mais poroso, agindo como uma esponja que suga a água. Os microorganismos presentes no solo atuam removendo poluentes difusos, enquanto as plantas aumentam a evapotranspiração.
FIGURA 86 Esquema de funcionamento de um jardim de chuva
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148 | TFG 2018
9 |
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O bairro do Pari, apesar de estar lentamente saindo do processo de estagnação, pode-se dizer que atualmente este fenômeno se aplica somente à sua área comercial, o que faz com que o restante do bairro ainda permaneça distante aos olhos do mercado imobiliário. É uma área central com boa infraestrutura de transporte, mas existem aspectos em seu território que o desvalorizam, como por exemplo, a paisagem marcada por edificações abandonadas e deterioradas, a baixa quantidade de pessoas circulando na rua, o que gera uma sensação de insegurança e as centralidades acanhadas com baixa diversidade de comércio básico. Tratando-se dos problemas internos identificados a partir de uma visão aproximada, é possível identificar ainda a baixa qualidade dos espaços verdes e públicos e o território fragmentado em diferentes usos que muitas vezes não conversam. A região do Pari já foi identificada em planos urbanos (Arco Tietê e PIU Setor Central) como importante para a cidade por possuir grande potencial de adensamento. É essencial que voltemos nossos olhares mais uma vez para
áreas centrais subutilizadas como esta tendo em vista o aumento do déficit habitacional ao longo dos últimos anos e as grandes distâncias percorridas diariamente em deslocamentos pendulares entre o centro (empregos) e bairro (residências). Assim, para que o bairro possa se desenvolver de uma maneira sustentável, não pautada somente na atuação isolada do mercado imobiliário e se insira na nova dinâmica urbana proposta para a cidade no Plano Diretor Estratégico, é necessário que este passe por uma reestruturação, que é a premissa da proposta aqui apresentada. Daí vem a necessidade de um projeto mais próximo à escala do bairro, levando em conta suas particularidas e otimizando a ocupação do território na direção de um bairro inclusivo, que possa abrigar novas pessoas e atender demandas de espaços públicos e áreas verdes. O Pari é um bairro com características únicas, o que tornou difícil a identificação de estudos de caso em lugares semelhantes. Apesar disso, observando a metodologia de
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projetos de referência em áreas com algumas similaridades, foi possível desenvolver uma proposta em escalas para o recorte de projeto. A seleção de dois perímetros de atuação prioritária foi essencial pois estes são os elementos que alterariam a dinâmica da região na medida desejada, com destaque para o adensamento na região do Canindé. Paralelamente foi desenvolvida uma proposta sistêmica na escala do bairro, pautada em todo o levantamento cartográfico, buscando incorporar as alterações propostas nos perímetros de qualificação com o tecido urbano existente. Dessa maneira, foi possível costurar na região uma lógica territorial, conectando áreas urbanas fragmentadas. Concomitantemente, a proposta em rede tenta resolver questões relacionadas ao sistema viário, zoneamento, habitação, paisagem urbana e áreas verdes. As decisões projetuais visam principalmente reverter a deterioração das qualidades paisagísticas e ambientais locais e pensar o pedestre como um agente ativo no novo bairro. Nesse sentido,
os subprojetos de espaços públicos foram estratégicos por funcionarem como pontos nodais do sistema, ativados pela circulação de pessoas e associação com marcos na paisagem. Essa aproximação complementa de maneira mais detalhada o que um Plano Urbano que abriga vários bairros delineia, como é o caso do PIU Setor Central e do Arco Tietê. A proposta evidencia como o projeto urbano na escala do bairro é um instrumento essencial para sua reestruturação por levar em conta as especificidades de cada local, articulando novos usos e espaços com o tecido existente.
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