O papel dos Espaços Livres na Cidade do México: Transformações e Permanências | Pesquisa IC 2018

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O papel dos Espaços Livres na Cidade do México: Transformações e Permanências Gislayne Felix Texeira Leite 04 jun. 2018

Resumo Dentro do contexto de uma das maiores cidades das Américas, a Cidade do México, pretende-se identificar nesta pesquisa de Iniciação Científica, as características e importância dos espaços livres e suas relações com a esfera pública tanto na estruturação e consolidação do tecido urbano quanto nas funções atribuídas pelo o uso cotidiano – do núcleo urbanizado da cidade até as áreas periféricas. Para tal, foi utilizado como base de pesquisa o processo de desenvolvimento e estruturação urbana da Cidade do México, incluindo seus respectivos acontecimentos históricos, da cidade colonial até os dias de hoje em três escalas diferentes: Capital; município conurbado e povoado, inseridos na região metropolitana. Palavras-chave: Espaços Livres, Paisagem Urbana, Esfera Pública, Cidade do México, Tecido Urbano.

The Role of Free Spaces in Mexico City: Transformations and Permanencies Gislayne Felix Texeira Leite 04 jun. 2018

Abstract Within the context of one of the largest cities in the Americas, Mexico City, we intend to identify in this research of Scientific Initiation the characteristics and importance of free spaces and their relations with the public sphere, both in the structuring and consolidation of the urban fabric and in the functions attributed by the daily use - from the urbanized nucleus of the city to the peripheral areas. To this end, the process of urban development and structuring of Mexico City, including its historical events, from the colonial city to the present day was used as a research base in three different scales: Capital; municipality and populated, inserted in the metropolitan region. Keywords: Free spaces, Urban landscape, Public sphere, Mexico City, Urban.


1. INTRODUÇÃO A compreensão conceitual e formal do sistema de espaços livres deve anteceder a consolidação de qualquer assentamento urbano. O sistema de espaços livres (SEL) é o que constitui a forma urbana somada às edificações, é este o palco das relações público e privado, legais e ilegais, acolhedoras ou excludentes de uma cidade (LEFÈBVRE, 1974). Dessa forma, é fundamental considerar o sistema de espaços livres de forma prioritária e integrada para a formação de um espaço metropolitano mais propício às práticas sociais, à esfera pública e à conservação ambiental. O principal objeto de análise dessa pesquisa é a configuração dos espaços livres na Cidade do México e, de que forma os fatos históricos na capital influenciaram a paisagem urbana dos municípios conurbados, utilizando como base de estudo acontecimentos históricos pré-coloniais e coloniais, as mudanças provenientes da Revolução Industrial e, dados sociais e econômicos recentes das áreas escolhidas para o estudo em questão.


2. DESENVOLVIMENTO 2.1 A CIDADE DO MÉXICO E O SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES (SEL) Com pouco mais de 119 milhões de habitantes, o México ou Estados Unidos do México (nome oficial), está organizado em 32 estados além da capital, Cidade do México, onde fica concentrada a sede dos três poderes (executivo, legislativo e judicial). Situada numa região de altitudes elevadas, acima de 2 mil metros, a Cidade do México foi erguida sobre ruínas de Tenochtitlán, nome atribuído à então cidade criada no século XIV pelos índios astecas, antes da invasão europeia. Configura-se hoje, como a segunda maior cidade da América Latina: conta com aproximadamente 9 milhões de habitantes (INEGI, 2015), em comparação aos 12,4 milhões da cidade de São Paulo (2016); e a região metropolitana com cerca de 21,5 milhões, apresentando a maior densidade populacional do país.

FIGURA 1:

Limites administrativos da Cidade do México.

Fonte: Google Earth. Acesso: 18 mar. 2018.


FIGURA 2: A Zona Metropolitana do Vale do México (ZMVM) é constituída por todo o Distrito Federal (com 16 delegações) e a totalidade ou parte de 17 municípios do Estado do México. O limite aproximado do ZMVM é indicado por linha grossa. A linha pontilhada mostra a localização do ZMVM na Bacia do México e os limites de outros estados - México, Hidalgo, Tlaxcala e Puebla - que o vale cobre parcialmente. Fonte: https://www.nap.edu/read/4937/chapter/15#128. Acesso: 18 Mar de 2018.

Como todas as cidades latino-americanas, a Cidade do México nasceu à serviço das relações internacionais com os países mais evoluídos (SANTOS, 1982), principalmente o vizinho Estados Unidos. Percebe-se assim que a atual estrutura interna urbana da cidade é fruto dos “efeitos de dominação”, o que segundo Milton Santos (1982) é a causa dos desequilíbrios sociais e econômicos que modificaram as relações da cidade com a sua própria estrutura interna dotados de uma transcrição espacial. O sistema de espaços livres (SEL) é o que constitui a forma urbana somado às edificações. São estes o palco das relações público e privados, legais e ilegais, acolhedores ou excludentes de uma cidade. É produto social e, ao mesmo tempo, condição para o processo social (LEFÈBVRE, 1974). Segundo Miranda Magnoli (1982) definem-se espaços livres como todo espaço “livre de edificação”, urbano ou não, permeáveis ou pavimentados, públicos ou privados. Como todo um sistema, os espaços livres se caracterizam como um objeto complexo que dialoga com uma rede de possibilidades, diversidades e multiplicidades que transformam e alteram a sua estrutura, resumindo-se em um processo sempre em movimento (MORIN, 2008). O espaço é considerado assim uma instância social, da mesma maneira que são instâncias sociais a economia, a cultura e a política. (SANTOS, 1985)


A organização do espaço na Cidade do México tal como as demais cidades latino-americanas se deu anteriormente à revolução dos transportes e da Revolução Industrial, isto é, em um cenário em que a engrenagem das atividades comerciais girava principalmente por meios não mecânicos e consequentemente com produtividade limitada. As décadas de 60 e 70 foram marcadas pela presença da mão de obra estrangeira nas fábricas, principalmente a manufatureira com os franceses, por exemplo. Tanto os migrantes internos quanto os externos tiveram papel fundamental para a conformação dos assentamentos em áreas periféricas, como foi o caso das zonas denominadas dormitório Papalotla, Atenco e Chiconcuac, a aproximadamente 40km da capital, tendo como principal motivador a localização das fábricas distantes do centro da cidade e próximo às redes de escoamento de produto. Esses deslocamentos interferiram drasticamente na maneira como os espaços da cidade foram ocupados e na sua paisagem urbana, produto não somente derivado da escassez de moradia, mas também do sistema econômico e político. 2.2 AS INFLUÊNCIAS COLONIAIS NO PROCESSO DE URBANIZAÇÃO DA CIDADE DO MÉXICO: CONFIGURAÇÃO DA PAISAGEM URBANA E PRODUÇÃO DOS ESPAÇOS LIVRES ATÉ MEADOS DO SÉC. XIX (PRIMEIRO RECORTE) A cidade antiga, Mexico-Tenochtitlan, assim denominada pelo seu fundador Tenoch em 1325, consolidou-se como território na bacia do México aos redores do Lago Texcoco – hoje praticamente inexistente já que a proporção atingida pelo atual limite da Cidade do México ocupa grande parte da sua superfície. A ilha foi povoada em diversos pontos por mexicas, povos migrantes de tribos indígenas, sob o poder do Império Asteca, notável em todo mundo por suas conquistas em grande parte da Mesoamérica. Como entidade independente social, política e econômica, a cidade floresceu com base na cobrança de impostos, o que contribuiu para que os povos submetidos aos Astecas se unissem aos espanhóis – futuros colonos - para pôr fim à dominação tenochca.


Após a derrubada do Império Mexica e tomada do México pelos espanhóis em 1519, iniciaram-se os registros cartográficos da Nova Espanha¹ para que fosse reconhecido por toda a Europa. Esta é uma das primeiras imagens que se tem de Tenochtitlán – a capital, enviada nas cartas de Hernán Cortés a Carlos V então Rei da Espanha, em 1524. Segundo HINOJOSA BALIÑO (2009), O mapa teria sido feito com base em um indígena, refletindo o ponto de vista dos habitantes.

FIGURA 3: A Grande Tenochitilán, 1524. Disponível em:<http://www.codigodiez.mx/textosciberinfinito/tenochtitlanen1519.html>.

Na cidade pré-hispânica, o povo asteca já ensaiava técnicas de planejamento urbano e expansão de território. A partir de uma organização macro espacial foi estabelecida uma malha viária que possibilitava o crescimento orgânico e contínuo da cidade, setorizada, porém pelo traçado de ruas ortogonais e canais: o centro provido de infraestrutura e dos principais equipamentos públicos ficou destinado à ocupação da elite militar, religiosa e aos comerciantes; já o interior das quadras viárias urbanas, distantes das vias e dos serviços principais, era onde se concentravam a população artesã e os escravos. 1. México-Tenochtitlan era considerada “laboratório cultural do Ocidente”, onde as novidades do urbanismo barroco que se espalhavam pela França inspirado na Antiguidade Clássica e no Renascimento Italiano de Brunelleschi e Alberti (1485) – uso da perspectiva, geometria regular nas formas urbanas; entre outros - trazidas pelos espanhóis, eram colocadas em prática nos primeiros planos urbanísticos da cidade, expandindo de certa forma as reformas que também aconteciam na Espanha. Sendo assim, falar sobre a influência francesa é falar sobre a influência que exerceu toda a Europa sobre o México, em um dado momento em que o urbanismo se embebia da atmosfera cultural francesa.


A chegada dos espanhóis, porém, encerrou não somente a hegemonia do Império Asteca, como também destruiu grande parte do centro e seus templos, substituindo-os por edifícios neoclássicos, impondo uma nova cultura e religião. O modelo de desenvolvimento urbano através do ganho de território das águas foi mantido e intensificado, tornando inevitável o aterramento do lago Texcoco, onde encontra-se hoje a grande metrópole mexicana.

FIGURA 4: Mapa da Cidade do México realizado em Flandres (região norte da Bélgica), 1572 inspirado no mapa de 1524. Disponível em:< https://www.geografiainfinita.com/2016/12/evolucion-de-la-ciudad-de-mexico-atraves-de-los-mapas/>.


No mapa acima, datado de 1572, mais ou menos três décadas após a conquista de Hernán Cortez sobre a capital asteca, é possível observar a disposição das casas no miolo de suas respectivas quadras em torno dos principais eixos viários, os quais conectam os extremos do recente e em expansão assentamento até o centro da cidade, onde está localizada a Iglesia Mayor junto a uma praça conhecida hoje como Praça da Constituição, além de equipamentos políticos e comerciais. Nota-se também, o crescimento urbano sobre as águas do lago Texcoco em torno do núcleo histórico existente. Conforme a Cidade do México crescia, surgiam novas necessidades e com isso novos planos urbanos. Tal como outras cidades conquistadas pelos europeus, o planejamento da paisagem, um dos pontos mais característicos da colonização, refletia as medidas políticas tomadas para o controle do território, como por exemplo questões de higienização (saneamento urbano) e ao mesmo tempo de segregação do espaço. A criação do seguinte mapa “Plano General de la Ciudad de México” pelo Tenente Coronel de Dragones Don Diego García Conde, no ano de 1793, serviu como base para os planos da cidade durante várias décadas e é um importante instrumento para entender a evolução da capital mexicana. Na imagem abaixo, nota-se que a configuração da ocupação urbana ainda permanece radial a Praça da Constituição junto a Catedral. Surgem, ao longo dos eixos viários, espaços livres em menor escala e que servem como respiros entre edificações e quadras adensadas, tornando-se novos pontos de referência e partido de vias. Do lado superior esquerdo, a tendência crescente de novos traçados viários e consequentes parcelamentos para novas construções e expansão do tecido urbano existente, com construções pontuais avançando sobre áreas rurais. Mantendo-se ainda à oeste, porém inferior da imagem, há o contraste de uma via mais larga em comparação às demais, configurando uma nova percepção de espaço.


FIGURA 5: Mapa de México do Diego García Conde, datado em 1793. Disponível em: <https://www.geografiainfinita.com/2016/12/ evolucion-de-la-ciudad-de-mexico-a-traves-de-losmapas/>

O século XIX foi o período em que o traçado urbano da Cidade do México sofreu fortes influências do urbanismo barroco com raízes francesas. Diferentemente da arquitetura barroca marcada pelo desequilíbrio, exagero e desordem, no urbanismo barroco se prezam a perspectiva, espaços amplos e regulares. A influência francesa sobre a configuração dos espaços livres urbanos tanto na Europa quanto na Cidade do México, é marcante. Ideias urbanísticas desenvolvidas na França, passaram antes pelo Paseo del Prado em Madrid – exemplo mais claro do urbanismo francês na Espanha no século XVIII. Já na Nova Espanha, elas são aplicadas pela primeira vez na criação de um espaço livre inspirado nas práticas dos virreyes² de se exercitarem, iniciadas pelo então virrey Antonio María de Bucareli³. O posteriormente denominado Paseo de Bucareli é uma ampla avenida em linha reta que une, através de um eixo diagonal, a estatueta do Ejido de la Acordada4 com a garita de Benlén5. 2. Virreyes, virrey - vice-rei era o representante do rei em uma região que pertencia ao reino. Era, portanto, o título que detinha a pessoa que exercia as prerrogativas do monarca em uma colônia. A figura do vice-rei pode ser encontrada no período colonial do continente americano. 3. Antonio María Bucareli y Ursúa, nasceu em 24 de janeiro de 1717 em Servilla. Serviu como Capitão Geral de Cuba de 1766 a 1771 e vice-rei da Nova Espanha de 1771 a 1779. Considerado pelos historiadores um dos melhores vice-reis do México, Bucareli projetou o Paseo que leva em seu nome - Paseo de Bucareli, um ano antes de sua morte, em 9 de abril de 1779 na capital, Cidade do México. 4. Ejido é a porção de terra para uso público que não é trabalhada e que permite estabelecer as eras ou coletar o gado. O ejido pode ser de propriedade de um município ou de um estado. 5. Garita - sentinela


No geral, o Paseo de Bucareli era um espaço livre público na paisagem da cidade e que buscava privilegiar, através da larga perspectiva, os pontos mais importantes da cidade, sendo acompanhado em todo o seu traçado por árvores, estátuas e fontes d’água. Pela primeira vez na história da Cidade do México, uma avenida importante rompe com a ortogonalidade do traçado pré-colonial, não se ajustando assim aos padrões Norte-Sul e Leste-Oeste, estando ligeiramente voltada para Sudoeste. A diagonalidade é um elemento marcante nas avenidas barrocas da Europa, um aspecto único que as diferenciam das demais ruas, evidenciando a hierarquia deste espaço livre no traçado viário.

FIGURA 6: Vista parcial do mapa feito por Casimiro Castro. Trata-se de uma versão atualizada, posterior a 1855, aonde é possível observar a configuração de alguns dos principais espaços livres da época, e que apesar de serem públicos, foram criados para a prática de atividades realizadas pela burguesia, como as caminhadas. Além disso, esses espaços carregavam grande simbologia com estátuas e fontes, como sinal de pertencimento e da presença espanhola na Nova Colônia.

Disponível em: http:// mexicomaxico.org/reforma/reformaglor.htm#libertad


1. O Paseo de Bucareli, também chamado Paseo Nuevo. 2. A estátua de Caballito, Carlos IV, de Manuel Tolsá. 3. A Praça de Touros no Paseo Nuevo. 4. O traçado diagonal do Paseo de la Empeara, depois Paseo de la Reforma. 5. O gazebo central, junto a Fonte da Liberdade. 6. O mirante do Sul, com uma fonte menor pequena e que ainda existe na Plaza de Loreto. 7. La Garita de Belén. 8. O Aqueduto de Chapultepec, ainda existe em partes. 9. A Fábrica de Tabaco, ainda existe como biblioteca, na Ciudadela. 10. Plazuela, uma pequena praça entre as ruas e a estátua de Vicente Guerrero, hoje San Fernando.

O mestre Ignácio Castera6, responsável pela execução do projeto do Paseo de Bucarelli, intermediou posteriormente dois outros projetos semelhantes: Paseo de Revillagigedo7 e Paseo de Azanza8, em homenagem a dois importantes virreyes9. No conjunto, as três avenidas (Paseo de Bucareli, de Revillagigedo e de Azanza), reordenaram a geometria dos subúrbios, considerados irregulares, e delimitam a cidade tal como os bulevares de Paris, configurando um importante papel no sistema de espaços livres. Os planos urbanísticos criados nesta época focaram no desenvolvimento das partes sul e oeste da Cidade do México: A inauguração da Real Fábrica de Puros y Cigarros em 1807, conhecida posteriormente como La Ciudadela, a oeste e fora dos limites urbanizados da cidade, foi o estopim para a expansão da cidade e reordenação do território. A disponibilidade de terras despovoadas e relativamente planas nessas regiões, foram os principais atrativos para os urbanistas da época. Ignacio Castera comandou a construção de La Ciudadela e as intervenções locais, autor do “Plano Ichnographico de la ciudad de México que demonstra el reglamento general de sus calles (1794)”. Apesar de não ter sido executado, o plano tinha como proposta básica a regularização dos bairros

6. Ignacio de Castera Obadias e Peralta (Cidade do México, 1750-1811) foi um arquiteto e urbanista de origem crioula com uma atividade construtiva importante para a última metade do século XVIII, na Cidade do México. 7. Paseo de Revillagigedo é composto por dois segmentos, o primeiro dos quais é uma diagonal mais pronunciada que a de Bucareli; a segunda, no entanto, é acompanhada pelo canal Viga e é separado da cidade ao sul. 8. Em 1800, Ignacio Castera foi o responsável pelo esboço do terceiro Paseo de Influência francesa: o Paseo de Azanza, em homenagem ao vice-rei José Miguel de Azanza. Este passeio nasce no extremo sul de Bucareli e constitui também uma diagonal no sentido oposto ao segundo (isto é, do noroeste para o sudeste). 9. Revillagigedo e Miguel de Azanza, respectivamente.


que rodeavam a Cidade do México, propondo a prolongação retilínea de todo o traçado viário de forma concêntrica a partir da Plaza Mayor. O projeto de Castera era considerado neoclássico por sua racionalidade e geometria, mas também tinha o intuito de controlar a população por meio da regularização dos espaços públicos livres: uma cidade ortogonal seria ideal para ser administrada e controlada pelas autoridades civis (tal como o Barão Haussmann em seu plano urbanístico de cunho político e militar para Paris (1853-1870), em que o objetivo era impedir as barricadas e rebeliões populares). Apesar da parceria com os virreyes, no século XVIII para a construção dos Paseos, Castera decide manter a centralidade da cidade em torno da Plaza Mayor, centralidade essa reforçada por quatro grandes praças localizadas nas quatro esquinas do quadrado, como pode ser observado na imagem a seguir.

FIGURA 7: La Plaza Mayor. Plano Ichnographico de laciudad de México que demustra el reglamento general de sus calles (1794), de Ignácio Castera. O plano é o retrato de uma cidade ideal, de planta quadrada e tecido ortogonal, cujo centro está localizado na praça real com uma estátua. Disponível em:<https://www.geografiainfinita.com/2016/12/ evolucion-de-la-ciudad-de-mexico-atraves-de-los-mapas/>


La Plaza Mayor (A Praça Maior), atual Praça da Constituição ou popularmente conhecida como Zócalo, é considerada o centro de origem pré-hispânico e colonial. A partir dela foram traçadas as primeiras vias pelos astecas, aproveitadas pelos espanhóis e continuadas ao longo dos planos urbanos criados para a expansão da cidade. A Praça Maior era o principal espaço público da cidade, lugar de vivência não apenas da burguesia mas de todos que ali residiam e usufruíam dos serviços básicos, já que ao seu entorno estavam localizados os principais templos na época pré-hispânica - substituídos após a colonização por edifícios de uso público, serviços e comércios, como a prefeitura, a casada moeda e o Mercado del Parián (demolido em 1843) -; além da Catedral Metropolitana da Cidade do México, projeto de Claudio de Arciniega, iniciado em 1573 e finalizado 218 anos depois, em tonos do ano de 1791.

FIGURA 8: A Praça Maior na segunda metade do século XVIII. Esta imagem de autor anônimo, mostra alguns detalhes de como era a Praça Maior depois de 1760 e pouco antes de ser celebrada a coroação do Rei Carlos IV9 em dezembro de 1789. Disponível em: < http://mexicomaxico.org/zocalo/zocalo.htm#carlos>


Na imagem anterior é possível destacar, além dos equipamentos públicos 10, a dinâmica e o modo como a praça e seus usos são apropriados pela população. As atividades comerciais realizadas ao ar livre misturam-se ao fluxo cotidiano nos edifícios lindeiros a Praça Maior. Nesse sentido, a "Pracialidade" do espaço é qualificada como tal não somente pelos eventos que nela ocorrem, como também pelo sistema de objetos que a configuram (QUEIROGA, 2001 apud LEMOS, I. S., 2018). O contraste entre a esfera pública e a privada possibilita uma variedade de práticas. A praça, espaço livre público, ou seja, desprovidos de qualquer clausura comum a todos, torna-se o palco e, junto a

outras

atividades simultâneas, um sistema impulsor do ápice das relações sociais, resumindo-se à festa: “As criações urbanas mais eminentes, as obras mais belas da vida urbana (belas, como se diz, porque são antes obras que produtos) datam de épocas anteriores à industrialização. (...) A própria cidade é uma obra, e esta característica contrasta com a orientação irreversível na direção do dinheiro, na direção do comércio, na direção das trocas, na direção dos produtos. Com efeito, a obra é valor de uso e o produto é valor de troca. O uso principal da cidade, isto é, das ruas e das praças, dos edifícios e dos

monumentos,

é

a

festa

(que

consome

improdutivamente, sem nenhuma outra vantagem além do prazer e do prestígio, enormes riquezas em objetos e dinheiro).” (LEFEBVRE, 2004).

Entende-se assim o espaço público como o lugar de encontro, aberto para o livre exercício da vida em sociedade. Representa o lugar idôneo para o desenvolvimento de atividades esportivas, recreativas, artísticas-culturais, e em geral para o uso e desfrute da comunidade 24 horas por dia (SEDESOL 2010: 7 apud FONSECA RODRÍGUEZ, 2015).

10. Las Casas del Cabildo, mais tarde conhecidas como Prefeitura, aparecem primeiramente marcadas na imagem da Plaza Mayor do ano de 1628 e, foram radicalmente destruídas e queimadas durante o Mutiny da Fome de 1692, incluindo as instalações de a Alhóndiga e o Carnicería. Por esta razão, estes edifícios foram completamente reconstruídos por instruções do vice-rei Fernando de Alencaster, iniciando as obras em 1714 e concluindo no ano de 1722.


FIGURA 9: A Praça Maior da Cidade do México em 1793 sem o mercado ambulante, uma vez que foi reformada pelo então Virrey de Revillagigedo. A direita está o Palácio Virreinal, a esquerda o Mercado del Parián e ao fundo a Catedral Metropolitana finalizada. A imagem original está no Arquivo Geral das Índias em Servilla. Disponível em: < http://mexicomaxico.org/zocalo/zocalo.htm#carlos>.

No final do século XVIII com a chegada do virrey Vicente Güemez Pacheco de Padilla Horcasitas y Aquayo ao México, algumas medidas foram tomadas para melhoramentos na paisagem urbana, o que resultou em abertura de vias, limpeza e “embelezamento” da Cidade do México. No caso da Praça Maior, a mudança foi a retirada do mercado ambulante, o que gerou resistência tanto na população quanto nos órgãos municipais. Nessa época, a Cidade do México teve o seu plano urbano considerado um dos melhores do início do século XIX, mantendo sua malha ortogonal e grandes construções, recebendo o nome de “Cidade dos Palácios”. Em 1810, a Nova Espanha conquistou a sua independência. Já em 1824, decidido em congresso, tornou-se Distrito Federal, ou seja, uma unidade independente dos demais estados e pertencente a nenhum outro, onde se localizariam os poderes executivo, legislativo e judiciário.


A cidade continuou seu crescimento em larga escala. Em 1864, Maximiliano de Habsburgo-Lorena, a convite de Napoleão III, tornou-se Imperador do México em seu segundo império. Junto com a sua esposa eram protegidos pelo exército francês, e conhecidos pelas suas “manias de construir” pois por onde estiveram fizeram algum tipo de intervenção. Maximiliano era um entusiasta dos planos urbanísticos de Haussmann para Paris. Entre os planos urbanísticos propostos por ele para a Cidade do México, está o traçado do Paseo del Emperador, mais tarde conhecido como El Paseo de la Reforma, representante clássico do urbanismo barroco, tal como o Paseo de Revillagigedo e Paseo de Azanza, parte do sonho da elite mexicana.

FIGURA 10: Traçado do Paseo de la Reforma. Plano Geral da Cidade do México, 1866. Disponível em: http://revistabicentenario.com.mx/index.php/archivos/tag/ avenida/

El Paseo de la Reforma é uma avenida retilínea e foi criada com o objetivo de ligar o centro da Cidade do México ao Castelo de Chapultepec, localizado no alto da colina de mesmo nome, à uma altura de 2.325 metros acima do nível do mar em que Maximiliano e sua esposa estiveram durante o seu império. Na imagem abaixo percebe- se os elementos decorativos como estátuas e fontes que foram selecionados para estarem dispostos ao longo da maior parte da avenida.


FIGURA 11: Desenvolvimento do Paseo http://mexicomaxico.org/caballito/caballito.htm>

de

la

Reforma.

Disponível

em:

Chapultepec ao converter-se em uma residência imperial em 1865, rompe a concepção urbana que havia prevalecido desde a fundação de Tenochtitlán: O caráter central da cidade mexicana e da cidade colonial enfrenta nesse momento a existência de um segundo núcleo urbano, restando para este apenas o simbolismo de poder. Esta dualidade interfere diretamente no deslocamento das elites do centro para as novas colônias conquistadas à oeste da cidade. Assim, antes mesmo de terminar o século, a cidade se vê passar por uma expansão urbana, que acontecerá principalmente ao longo da avenida Paseo de la Reforma. A configuração dos espaços livres públicos da Cidade do México, do período pré-hispânico até o Porfiriato11 (1877-1910), lugares de múltiplas dimensões, livres e abertos, espaços de transição, de uso coletivo comum ou compartilhado (BELLET, 2009 apud FONSECA RODRÍGUEZ, 2015), sofreu mudanças em sua identidade: influenciada pela modernização ocidental a partir dos ambiciosos planos de expandir as reformas urbanas hispânicas, uma potencial Nova Espanha aos olhos dos colonos e de uma burguesia em ascensão. Como por exemplo, a Plaza Mayor e suas atividades modificadas por planos higienistas que não levavam em consideração a sua multifuncionalidade e a dinâmica provocada pelo uso cotidiano e espontânea da população, tornando-se espaços direcionados ao patriotismo espanhol.

11. O Porfiriato ou Porfirismo na história do México, é o período de 30 anos durante o qual governou o país o general Porfirio Diaz intermitentemente de 1876 a 1911, quando Porfírio Díaz renunciou à presidência por força da Revolução Mexicana liderada por Francisco I. Madero, Francisco Villa, Emiliano Zapata, Enrique Flores Magón e Ricardo Flores Magón. Foi um período de estabilidade (1876 - 1911) e progresso econômico do país, mas também graves desigualdades sociais, que concluiu com um movimento social que interrompeu as estruturas sociais e políticas econômicas do México.


Com o ganho das terras à oeste e sul, novos espaços livres foram surgindo junto às propriedades privadas urbanas em diversos planos urbanísticos para a Cidade do México, criando novas centralidades e uma nova dinâmica espacial. Enquanto isso, os espaços à leste e norte foram expandindo-se em sua maioria espontaneamente pela parcela da população menos favorecida, excluída dos planos urbanos elaborados na época. Os reflexos dessa expansão irão aparecer após a chegada das indústrias já em meados do século XX, gerando outros cenários de pertencimento – democracia, protestos, manifestações - e gerência – administração pública e privada – afetando diretamente a significação dada pela influência colonial ao espaço livre e a sua forma de apropriação: a exemplo o sistema viário ou os Paseos – espaços públicos de excelência pelos planejadores e símbolos do progresso da elite mexicana – destinados antes ao uso de pessoas, irão tornar-se agora prioridade dos automóveis, grandes barreiras físicas e sociais, e que junto a outros elementos, irão compor um novo cenário da vida contemporânea presente tanto na Região Metropolitana da Cidade do México quanto em outras grandes cidades da América Latina, ainda à mercê dos efeitos de dominação colonial.


2.3 SÉC. XXI: OS REFLEXOS DA EXPANSÃO URBANA DA CDMX NOS ANOS 60, 70 E 80 NA CONFIGURAÇÃO DOS ESPAÇOS DA REGIÃO METROPOLITANA – O CASO DO MUNICÍPIO DE ECATEPEC DE MORELOS (SEGUNDO RECORTE) Ecatepec de Morelos é um dos 125 municípios do Estado do México (EdoMex), localizado a nordeste da Cidade do México (CDMX). Junto as áreas urbanas contínuas das 16 demarcações do Distrito Federal, o município configura parte da primeira faixa de conurbação além dos limites administrativos da capital, entre 1960 e 1970.

FIGURA 12: Localização do Município de Ecatepec de Morelos em diversas escalas (País – México; Estado – Estado do México; Município e entorno imediato). Na imagem satélite acima, é possível perceber como os limites administrativos na realidade não existem, já que a malha urbana é continua – exceto onde o município é interrompido pela Serra de Guadalupe. Fonte: INEGI (2015); red vial 2015 y ONU-Habitat a partir de: clasificación del suelo urbano, suelo forestal y cuerpos de agua, 2015.


FIGURA 13: Expansão da Cidade do México (DF) Legenda 1960 1970 Ecatepec de Morelos Limites DF Limites ZMVM (Zona Metropolitana do Vale do México) Fonte: INEGI, 2007. Mapa base: Google Earth. Intervenção autoral

Ecatepec é um espaço multifacetado, onde se encontra uma pluralidade de uso de solos (agrícola, industrial, habitacional, comercial) em mais de 60 anos de transformação territorial – iniciada a partir de sua integração à Zona Metropolitana da Cidade do México (ZMCM). Historicamente, as atividades realizadas no município de Ecatepec exercem uma forte ligação com a Cidade do México. Devido a sua localização, entre a Cidade de Pachuca e a região nordeste do País em relação ao DF, tornou-se naturalmente um centro de apoio e distribuição de produtos, além do lugar de implantação de diversas fábricas12 e indústrias do setor químico. A demanda por moradias próximas às novas ofertas de emprego, principalmente durante o século XX13, foi um dos fatores principais para configuração do tecido urbano do município – atualmente, 82,91% do uso do território correspondem a área urbana, sendo 43,13% referentes ao uso habitacional (H. Ayuntamiento de Ecatepec de Morelos, 2016).

12. Em 1943, há uma ruptura do modelo de vida rural pré-hispânico no município em consequência da promoção do desenvolvimento industrial e a instalação da fábrica Sosa Texcoco. Até 1950, surgem as primeiras zonas e parques industriais. (M.B. RICÁRDEZ, M.E.CARTILHO, 2011) 13. Em 1980, mais de 50 000 homens trabalhavam nas fábricas instaladas no município. (M.B. RICÁRDEZ, M.E.CARTILHO, 2011)


FIGURA 14: Ecatepec de Morelos. Fonte: http://ecatepec.gob.mx/santa-clara-coatitla/. Na imagem acima, observa-se a densa aglomeração urbana e as tipologias de uso mais marcantes na paisagem do município: as habitações e as indústrias. Em contrastre com a Serra de Guadalupe ao fundo, a urbanização em expansão.

O povoamento massivo do município tem início com os primeiros fracionamentos urbanos em 1951. A formação das colônias de habitação popular pela classe trabalhadora, impulsionou o início da participação do Estado na intervenção territorial. “Essas ações estiveram unidas a uma política estatal que favoreceu a localização industrial no município mediante a construção de estradas, controle salarial e aproveitamento da mão de obra, o que modificou de maneira profunda e em relativamente poucos anos a situação socioeconômica, a estrutura espacial e inclusive a cultura, costumes e o modo de vida familiar dos antigos povos do município.” (tradução livre. RICÁRDEZ, M. B., CARTILHO, M. E., 2011).

Mais tarde, no fim do século XX, a construção de moradias de interesse social é ampliada à responsabilidade de grupos privados do setor imobiliário14, enquanto o Estado diminui a sua participação em ações do gênero.

14.Em 1964, são autorizados fracionamentos solicitados por empresas como as imobiliárias Fraccionadora Ecatepec, AS., Incobusa, entre outras (M.B. RICÁRDEZ, M.E.CARTILHO, 2011).


FIGURA 15: Área urbana de Ecatepec de Morelos. Fonte: INEGI (2015); red vial 2015, Hansen/UMD/Google/USGS/NASA 2013 y ONU-Habitat a partir de: clasificación del suelo urbano, suelo forestal y cuerpos de agua, 2015. No mapa acima, percebe-se a expressividade da área urbana no território (macha vermelha) dentro e próximo aos limites de Ecatepec: sua taxa de urbanização supera a de aglomeração (99,9% e 92,7%, respectivamente), e entre os municípios conurbados a Cidade do México, Ecatepec é um dos mais densos e povoados, com cerca de 1,7 milhões de habitantes (Valdés, 2013 apud ONU-Habitat, 2016).


Entre os anos de 1982 e 2000, com o surgimento de um novo modelo econômico – o neoliberal -, a participação da indústria na economia do município perde a sua força, permanecendo ainda assim a estrutura industrial, principal responsável pela configuração atual da paisagem urbana de Ecatepec. Nos últimos anos, a base econômica está concentrada no comércio seguido pela indústria manufatureira: 74% da População Economicamente Ativa (PEA) está concentrada no setor terciário15, e 23,5% no setor secundário16, enquanto a população concentrada no setor primário6 representa menos de 1%17.

TABELA 1: Estatística Contextual. Fonte: ONU-Habitat a partir de: INEGI (2000), INEGI (2010a), INEGI (2009), INEGI (2010b), INEGI (2010c), CONAPO (2010a), CONAPO (2015), INEGI (2015) e Imagen Landsat18.

15. Atividades econômicas do setor terciário: transporte, governo e outros serviços. 16. Atividades econômicas do setor secundário: mineração, extração de petróleo e gás, indústria manufatureira, eletricidade, água e construção. 17. Atividades econômicas do setor primário: agricultura, pecuária, silvicultura, pesca e caça. 18. ÍNDICE BÁSICO DE LAS CIUDADES PRÓSPERAS CITY PROSPERITY INDEX, CPI. 2016 Informe Final Municipal Ecatepec de Morelos, México. Programa de las Naciones Unidas para los Asentamientos Humanos (ONU-Habitat, Instituto del Fondo Nacional de la Vivienda para los Trabajadores (INFONAVIT) e Secretaría de Desarrollo Agrario, Territorial y Urbano (SEDATU). México, nov. 2016.


Outro fator determinante para a alta porcentagem de ocupação do território é o seu relevo: o municípo de Ecatepec é predominantemente plano (75,53% de sua superfície, como pode ser visto no mapa abaixo), com altitude média de 2.240 m acima do nível do mar. A sudoeste os limites são interrompidos pela Serra de Guadalupe (com aproximadamente 2.900 m acima do nível do mar), que apesar de apresentar declives superiores a 25% - inadequados para o desenvolvimento urbano – a expansão crescente de moradias irregulares tem sido um dos principais problemas do município à proteção ambiental19: A superfície original das Áreas Naturais Protegidas (ANP) Serra de Guadalupe em relação ao município de Ecatepec era de 2.953,00 ha, já em 2012, o número constado foi de 1.741,3 ha, uma perda significativa de 41,03%20.

FIGURA 16: Relevo. Fonte: El Plan de Desarrollo Municipal 2016-2018 Ecatepec de Morelos, Estado do México. H. Ayuntamiento de Ecatepec de Morelos, Estado de México. 22 de mar. 2016.

19. Além da expansão urbana, atividades como a extração ilegal de madeira, incêndios induzidos e o pastoreio, atuam como as maiores causas do desmatamento. 20. O Parque Estadual da Serra de Guadalupe é partilhado entre os municípios de Ecatepec de Morelos, Tlalnepantla, Coacalco, Tultitlán e a delegação Gustavo A. Madero, com o total de 5.306 ha (originalmente eram mais de 6.300 ha).


Desde a década de 1950, o município também vem sofrendo danos ambientais severos devido a ocupação industrial sem estratégias de sustentabilidade, tendo como consequência a contaminação e a sobreexplotação 21 dos aquíferos locais, o manejo inadequado de resíduos sólidos e a deteriorização generalizada do solo e da biodiversidade (ONU-Habitat, 2016). Estudos realizados em 2015 pela ONU-Habitat sobre a qualidade de vida dos cidadãos em Ecatepec de Morelos, mostram que, apesar das distâncias que estes percorrem até áreas livres existentes serem relativamente pequenas – uma das questões mais significantes de incentivo ao uso desses espaços pela população –, a presença de poucas áreas arborizadas no território limitam o potencial de interação social em condições ambientais saudáveis22.

TABELA 2: Índice de Qualidade de Vida. O Índice das Cidades Prósperas (CPI, silga em inglês) é uma medida desenhada pela ONUHabitat para entender, analizar, planificar, tomar ação e observar os efeitos das políticas públicas no bem estão cidadão. Mediante indicadores obtidos a partir de informação confiável apresenta uma radiografía da complexidade urbana; identifica áreas prioritárias para as políticas públicas, traduz o bem estar em um parâmetro medível e acionável; mede o desempenho da cidade e o efeito das políticas públicas no tempo.

21. “exploração excessiva, não-sustentável, em com consequências negativas que, cedo ou tarde, serão prejudiciais do ponto de vista físico/quantitativo, qualitativo, econômico, social ou ambiental” (MMA, Ministério do Meio Ambiente. Biodiversidade). 22. A escassa capacidade de captura do CO2 devido a falta de massa vegetal, responsável pela transformação desse gás em oxigênio, reduz a qualidade do ar.


A partir dessa ferramenta, é possível avaliar a solidez ou a debilidade dos fatores de prosperidade disponíveis na cidade. Os valores resultantes (os que se apresentam nas tabelas e gráficos elaborados pela ONU-Habitat presentes nesta pesquisa) podem agrupar-se em seis escalas de prosperidade que vão desde cidades com fatores de prosperidade muito sólidos, à aquelas em que os fatores se encontram muito débeis (Ver Figura 17). No México, a Iniciativa das Cidades Prósperas (Iniciativa de las Ciudades Prósperas) é o resultado de um compromisso conjunto entre o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat, sigla em espanhol) e o Instituto do Fundo nacional de Moradia para os Trabalhadores (INFONAVIT, sigla em espanhol) com a presença da Secretaria de Desenvolvimento Agrário, Territorial e Urbano (SEDATU, sigla em espanhol), para identificar áreas de interesse compum em torno do crescimento ordenado das cidades e os benefícios que esta gera para seus habitantes. Fonte: ONU-Habitat (2015).

TABELA 3: Escala Global de Prosperidade. Fonte: ONU-Habitat (2015). Resultados Fatores do Estado CPI de Prosperidade Muito sólido Sólido

Nível de intervenção Consolidar políticas urbanas

Moderadamente sólido Fortalecer políticas Moderadamente débil urbanas Débil Priorizar políticas Muito débil urbanas

Ecatepec de Morelos Aglomeração Urbana FIGURA 17: Índice de Qualidade de Vida. Fonte: ONU-Habitat (2015).

GRÁFICO 1: Sub índice de Espaço

Público.

Fonte:

ONU-Habitat (2015). Legenda Ecatepec de Morelos Aglomeração Urbana Média municipal Acessibilidade ao espaço público aberto

Áreas verdes per capita


Como podem ser observadas na Tabela 2 e no Gráfico 1 acima de acordo com a Tabela 3, as porcentagens de espaços públicos e áreas verdes em relação a aglomeração urbana estão abaixo da média: Ecatepec apresenta apenas 47,19% e 15,28% per capita, contra 66,67% e 51,92% da Cidade do México, respectivamente. Em contrapartida, destaca-se na figura “Índice de Qualidade de Vida”, a alta porcentagem do Sub Índice de Educação: Ecatepec de Morelos apresenta 96,16% de Taxa de Alfabetização e 83,01% de média, contra 95,61% e 84,82% da Cidade do México, respectivamente. Além do déficit de áreas verdes no município, há outro aspecto marcante em seu desenvolvimento urbano e social: a pobreza. De acordo com os indicadores elaborados em 2015 também pela ONU-Habitat, a população com renda abaixo da linha assistencial representa 43,59% do total, dado que não difere muito da porcentagem do DF (48,84%). Percebe-se assim o baixo desempenho da economia e da inclusão social, evidenciando a desigualdade econômica (Ecatepec 61,66% vs. Cidade do México 58,01% - coeficiente de Gini23) que se reflete diretamente na precariedade evidente dos assentamentos urbanos.

GRÁFICO

2:

Sub

índice

de

Equidade Econômica. Fonte: ONUHabitat (2015). Legenda Ecatepec de Morelos Aglomeração Urbana Média municipal Coeficiente de Gini

Taxa de Pobreza

23. “O coeficiente de Gini é uma medida de desigualdade desenvolvida pelo estatístico italiano Corrado Gini e publicada no documento “Variabilità e Mutabilità” em 1912. Esse índice é comumente utilizado para calcular a desigualdade de distribuição de renda, mas pode ser usada também para qualquer distribuição, como concentração de terra, riqueza entre outras.” (ENTENDENTENDO O ÍNDICE GINI. Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará – IPECE. Disponível em:< http://www.ipece.ce.gov.br/publicacoes/Entendendo_Indice_GINI.pdf>).


Segundo alguns analistas urbanos, entre eles Hiernaux-Nicolas (1998) e Aguillar e Alvarado (2004), Ecatepec tem sido classificada, junto a uma faixa integrada por diversos municípios do oriente da ZMCM, com nível socioeconômico baixo (apud. RICÁRDEZ, M. B., CARTILHO, M. E., 2011). “Ecatepec cresceu a par de – e fez parte – de uma cidade capitalista espacialmente fragmentada, com uma presença marjoritária de população de baixos recursos que se localizou na região leste da metrópole.” (tradução livre. RICÁRDEZ, M. B., CARTILHO, M. E., 2011).

A desigualdade social tornou-se mais evidente territorialmente falando com a a fragmentação do município de Ecatepec a partir de 1980, quando espaços vazios começaram a surgir com o abandono das “naves” industriais devido ao modelo econômico liberal adotado pelo país na época. Esses espaços se tornaram objeto de atenção para as autoridades municipais na primeira década do século XXI. A exemplo da primeira fábrica instalada em Ecatepec, Sosa Texcoco, que teve o uso do seu terreno convertido: industrial para urbano e comercial. Era necessário que medidas como essa fossem tomadas parar manter a dinâmica urbana da cidade e garantir as necessidades da população em quantidade cada vez mais expressiva no município. Ao contrário do que aconteceu no planejamento colonial da Cidade do México em que a prioridade era a criação de espaços livres para a realização de atividades esportivas (Paseos) e/ou administrativas, comerciais e religiosas (Plazas), tanto dos nobres quanto da população mais pobre, respectivamente, os primeiros espaços de convivência planejados em Ecatepec foram os centros comerciais. Parte da superfície territorial total da área que ocupava a Sosa Texcoco (em torno de 841 ha), foi destinada à criação da Plaza Las Américas. A construção do mall comercial a partir da iniciativa público-privada, gerou expectativas tanto local quanto em municípios vizinhos. Uma série de obras decorreram a partir da sua implantação: um autopista ligando Texcoco a Jarobas, atravessando Texcoco, Nezahualcóyotl, Ecatepec e Zumpango; a construção de um hospital e novos projetos habitacionais voltados para a população metropolitana de classe média – impulsionado pela imobiliária Ara (RICÁRDEZ, M. B., CARTILHO, M. E., 2011).


A consolidação comercial a partir das ações mediadas pela gestão do então governador Arturo Montiel (1999-2005), permitiram uma reestruturação territorial com o surgimento dos primeiros centros comerciais em Ecatepec paralelo ao declive do modelo industrial, ao longo da avenida Central 24. Um dos mais importantes foi Plaza Aragón, que ao decorrer do tempo tornou-se o espaço de consumo preferido da classe média e popular da zona oriente (Nezahualcóyotl y Ecatepec), além da construção de pontes, o recapeamento do asfalto e da implantação de estações de metrô ao longo da avenida Central, como pode ser observado na figura abaixo.

FIGURA 18: Principais Pontos de Interesse de Ecatepec de Morelos. Fonte: RICÁRDEZ, M. B., CARTILHO, M. E., 2011. Construción social del espacio urbano: Ecatepec y Nezahualcóyotl. Dos gigantes del oriente. POLIS 2011, vol. 7, núm. 2, pp. 181-2012.

A fragmentação do território passou a ficar ainda mais acentuada com o surgimento das novas centralidades comerciais, principalmente nas áreas periféricas. O contraste entre o moderno e popular, entre os restaurantes e o comércio ambulante, zonas destinadas à população de classe média rodeadas por casas precárias, em síntese, um espaço composto por uma gama ampla de vastos usos do solo. 24. Restaurantes, bancos, cinemas e espaços de recreação infantil


“Como ápice se pode destacar que a presença de grandes centros comerciais em periferias economicamente pobres, se explica desde a lógica das redes e dos fluxos de concorrência

comercial,

embora

funcione

como

instrumento de exclusão de sua hinterlândia e de baixa produtividade, de acordo som

estudiosos de tais

processos, é “socialmente necessária” (tradução livre. HOYOS, 2000 apud RICÁRDEZ, M. B., CARTILHO, M. E., 2011).

É evidente que as os interesses imobiliários, comerciais e de serviços foram cruciais para a definição de uso para a “reciclagem” dos espaços outrora industriais, já que outros projetos poderiam ter sido previstos e melhor aproveitados levando em consideração melhorias na qualidade de vida local, como centros culturais, artísticos e/ou esportivos para a região. No seguinte mapa, percebe-se que a concentração mais expressiva de espaços públicos está na zona sudeste do município, próximos ao centro comercial distribuídos ao longo da avenida Central, e também aos antigos povos de Tulpetlac, Santa Clara e Xalostoc, ao redor da Via Morelos.


Figura 19: Acessibilidade ao espaço público aberto do município de Ecatepec de Morelos. Fonte: INEGI (2015); red vial 2015 y ONU-Habitat a partir de: clasificación del suelo urbano, suelo forestal y cuerpos de agua, 2015.


2.4 OS ESPAÇOS LIVRES PÚBLICOS DE ECATEPEC - ANÁLISE DO CENÁRIO DO POVOADO SANTA CLARA COATITLA (TERCEIRO RECORTE) Como dito anteriormente, as atividades industriais no município de Ecatepec são muito importantes na caracterização de sua paisagem urbana. A oferta de emprego a partir da instalação de grandes fábricas no município, foi o principal atrativo para a vinda de trabalhadores e futuros moradores, fato que ao decorrer dos anos conferiu a Ecatepec o título do município mais populoso do EdoMex e com a maior taxa de uso do solo destinada à habitação. O município de Ecatepec de Morelos originou-se a partir de sete povoados históricos25, entre eles Santa Clara Coatitla, responsáveis pela grande riqueza cultural e tradicional que identifica os povoados do Município e que durante as décadas de 60 e 70, se viram rodeados de novos desenvolvimentos habitacionais e industriais. O povoado de Santa Clara Coatitla é importante não somente pelas suas características arqueológicas e históricas - estabelecido pela Lei Federal de Monumentos e Zonas Arqueológicos, Artísticos e Históricos - como também está entre as 8 zonas industriais do Município, junto a Esfurzo Nacional, Xalosc, Tulpetlac, Urbana Ixhuatepec, La Viga, Cerro Gordo e Francisco Villa. Devido a sua localização, lindeiro às principais vias estruturantes e ferrovias do muncípio de Ecatepec26, a configuração dos espaços livres ou não, públicos ou privados de Santa Clara, estiveram desde os anos 70, à mercê dos galpões ao longo dos eixos logísticos e dos novos fracionamentos autorizados pelo Estado e ocupações ilegais27.

25. 1 – Guadalupe Victoria; 2 – Santo Tomas Chiconautla; 3 – Santa Ma. Chiconautla; 4 – San Cristóbal Ecatepec; 5 – Santa Ma. Tulpetlac ; 6 – Santa Clara Ciatitla; 7 – San Pedro Xalostoc. 26. Limita-se ao norte, pela rua Miguel Hidalgo Ote.; à leste, pela rua Francisco Javier Mina; ao sul, pela Av. Independência, Av. Morelos, Rua Aztecas; e à oeste, Rua Moctezuma e Priv. Hidalgo. 27. OLIVEIRA, Patrícia E. Proceso De Urbanización En Ecatepec, El Estado Como Agente Promotor. Disponível em:< http://observatoriogeograficoamericalatina.org.mx/egal3/Geografiasocioeconomica/Geografiaur bana/06.pdf>. México.


Legenda Ecatepec de Morelos Santa Clara Coatitla Principais vias Ferrovias

FIGURA 20: Localização do povoado de Santa Clara Coatitla, Ecatepec. Fonte: Google Earth

Legenda Ecatepec de Morelos Santa Clara Coatitla Principais vias Ferrovias

FIGURA 21: Localização aproximada do povoado de Santa Clara Coatitla, Ecatepec. Fonte: Google Earth.


Legenda Principais equipamentos Principais zonas de comércio e serviços Àreas Verdes Povoados históricos e patrimoniais Sítios Arqueológicos Zona Industrial Centro Urbano Rede viária principal FIGURA 22: ESTRUTURA URBANA ATUAL. Fonte: Plan Municipal de Desarrollo Urbano de Ecatepec de Morelos, Estado de México. Ago, 2015. Nas Figuras 20, 21 e 22 acima, observa-se que o povoado de Santa Clara Coatitla está dividido entre uso industrial, situado à direita e que se distribui ao longo da Av. Via Morelos (onde se instalaram as primeiras indústrias de Ecatepec); e à esquerda, ainda com a presença de alguns galpões e fábricas, mas com uso predominante de habitações, serviços e comércios.

A partir da análise de imagens satélites através do software Google Earth comparada aos dados já mencionados até então, foi possível traçar algumas características dos espaços livres do povoado de Santa Clara Coatitla, tal como a relação desses e o possível tipo de apropriação por eles desenvolvido na população. Diferentemente da capital do México, a Cidade do México, a configuração dos espaços livres nos municípios conurbados não tiveram o mesmo “olhar nobre” sobre o planejamento urbano, ou seja, o desenvolvimento da malha urbana nesses lugares se deu pela necessidade de ocupação próxima às demadas de trabalho, por uma classe marjoritarimente pobre. Possivelmente, os únicos espaços livres planejados pelo Estado tenham sido os eixos logísticos, como a Av. Morelos, a Autopista Pachuca e as linhas férreas, que possuem um fim e destinos definidos.


Santa Clara Coatitla, apesar de ser um dos povoados originários de Ecatepec, cedeu ao longo dos anos seus espaços à ocupação habitacional e industrial. Dentro do cenário geral do município de Ecatepec, Santa Clara oferece a seus habitantes escassos espaços livres de qualidade, sejam eles com áreas verdes ou não. Em aproximadamente 314 ha de área, no povoado encontra-se apenas uma área considerada como praça, La Plaza Juaréz, em frente a Igreja histórica de Santa Clara, e que conforme análise, se configura como o maior espaço livre qualificado para o desenvolvimento de atividades e relações públicas (ainda assim, possui área menor que 1 ha).

FIGURA 23: Acessibilidade ao espaço público aberto do município de Ecatepec de Morelos – Santa Clara Coatitla. Fonte: INEGI (2015); red vial 2015 y ONU-Habitat a partir de: clasificación del suelo urbano, suelo forestal y cuerpos de agua, 2015.


Pontos analisados

FIGURA 24:

Limites da Plaza Juaréz, único espaço público aberto do povoado de

Santa Clara Coatitla. Fonte: Google Earth.

FIGURA 25: Acesso lateral à Praça Juaréz. Nota-se à direita inferior a presença de comércio ambulante na calçada. Fonte: Google Earth.


FIGURA 26: Vista para Igreja Santa Clara. Historicamente o surgimento das praças esteve atrelado à construção de Igrejas. Fonte: Google Earth.


FIGURA 27, 28 e 29: Comércios nas calçadas. Em torno da Praça foram avistados diversos tipos de modalidades comerciais, influenciando diretamente nos tipos de apropriação do espaço público pela população (lazer, comprar, trabalhar, transitar). Fonte: Google Earth.


FIGURA 30 e 31: Atividades temporárias. Tendas, feiras, tão são realizadas tanto na própria praça quanto em seu entorno, lembrando as atividades realizadas na Plaza Mayor no século XVIII (Ver Figura 8). Fonte: Google Earth.

FIGURA 32: Acesso posterior à Praça Juaréz. Espaço livre, facilmente acessível por todo o seu perímetro. Fonte: Google Earth.

A partir de imagens do Google Street View foi possível notar e traçar semelhanças da Plaza Juaréz em Santa Clara Coatitla à Plaza Mayor na Cidade do México, analisada anteriormente a partir de uma cena retratada na segunda metade do século XVIII. A praça ao longo dos anos manteve-se como impulsor da prática de atividades diversas no meio urbano tanto na Cidade do México quanto nas regiões conurbadas, principalmente as atividades comerciais, sejam elas realizadas em estabelecimentos fixos, nas calçadas ou ambulantes.


A praça carrega consigo desde seus primórdios a liberdade de ir e vir, de estar e reunir, sem a necessidade de maiores explicações, nela é possível conviver bem com pessoas diferentes entre si podendo ser esses relacionamento duradouros ou não. Retornamos, portanto, ao sentido de “Pracialidade”, o sistema de objetos que a configuram, o contraste entre a vida pública e privada nas relações sociais: “Aparentemente despretensiosos, despropositados e aleatórios, os contatos nas ruas constituem a pequena mudança a partir da qual pode florescer a vida pública exuberante da cidade” (JACOBS, Jane, 2011). A escassez de áreas verdes porém, não impede a apropriação dos espaços livres, mas afeta a qualidade dessas relações como também reduz o fluxo de usuabilidade e atratividade à esses. Excluindo-se os terrenos livres privados e/ou pertencentes às fábricas e indústrias, poucas áreas oferecem tal configuração dentro do povoado. As vias em Santa Clara Coatitla são os principais espaços livres configuradores da malha urbana. São elas que conduzem as pessoas aos seus afazeres cotidianos, seja levar os filhos à escola, ir ao trabalho, ao mercado, e afins. Tal como as raízes rodoviárias e fordistas dos países latino-americanos, as ruas continuam

sendo

seu

principal

motor

das

relações

público-privadas

principalmente porque estão ao alcance das pessoas em suas saídas costumeiras. A paisagem árida das ruas – por vezes sem pavimentação -, contrasta com os muros dos terrenos vazios, das casas geminadas e dos condomínios habitacionais. Nesses últimos, apesar de poucos dentro do povoado, há algumas tentativas de criação de espaços de lazer, sendo o mais visível espaços com quadras de esporte (os maiores espaços livres dentro dos condomíníos habitacionais são destinados às vagas de automóveis), como pode ser visto na imagem a seguir.


Condomínio habitacional Estacionamento Área de Lazer

FIGURA 33: Espaços livres privados em Condomínio Habitacional fechado. Na imagem acima observa-se a desproporção das áreas destinadas ao lazer e ao estacionamento de automóveis dentro do condomínio, sendo que este último possui uma área maior. O espaço destinado ao lazer possui uma quadra esportiva e alguns brinquedos infantis, porém torna-se pouco atrativo devido a paisagem árida. O entorno fabril (lindeiro à importante Via Jose Maria de Morelos) é outro fator que também contribui para a diminuição do fluxo de pessoas fora do “horário de pico”, tornando as ruas pouco movimentadas e mais propícias à sensação de falta de segurança na população. Fonte: Google Earth.

Devido a saturação da ocupação horizontal do solo, a criação de condomínios habitacionais verticais possibilitou a partir do fim do século XX, que mais pessoas ocupassem o mesmo espaço. Porém, uma crescente crítica a esse tipo de ocupação cada vez mais presente em todo o mundo, é a segregação dos espaços. O muro, uma barreira visual aparentemente inofensiva, permite que se criem bolhas de realidades e oportunidades diferentes, mas que não excluem alguns questões do território que todos compartilham, como a segurança pública. Segundo a jornalista e escritora Jane Jacobs (2011), o contato público e a segurança nas ruas possuem relação direta com a segregação e a discriminação racial existentes e cada vez mais crescentes nas grandes cidades cidades.


“Levando em consideração a intensidade do preconceito e do medo que acompanham a discriminação e a encorajam, superar a segregação espacial é também muito difícil se as pessoas se sentem de algum modo inseguras nas ruas. É difícil superar a discriminação espacial onde as pessoas não tenham como manter uma vida

pública

civilizada

sobre

uma

base

pública

fundamentalmente digna e uma vida privada sobre uma base privada” (JACOBS, Jane, 2011). ”É inútil tentar esquivar-se da questão da insegurança urbana tentando tornar mais seguros outros elementos da localidade, como pátios internos ou áreas de recreação cercadas. Por definição, mais uma vez, as ruas da cidade devem ocupar-se de boa parte da incumbência de lidar com desconhecidos, já que é por elas que eles transitam. As ruas devem não apenas resguardar a cidade de estranhos que depredam: devem também proteger os inúmeros desconhecidos pacíficos e bem intencionados que as utilizam, garantindo também a segurança deles. Além do mais, nenhuma pessoa normal pode passar a vida numa redoma, e aí se incluem as crianças. Todos precisam usar as ruas” (JACOBS, Jane, 2011).

Dados do INEGI (2015) mostram que quase 100% (98,42%) das VHP (viviendas particulares habitadas – moradias particulares habitadas, em tradução livre) do município de Ecatepec possuem televisão, além de outros bens e tecnologias de informação e entretenimento, como computador (39,39%) e internet (41,03%), e telefone celular (81,82%), como pode ser visto no gráfico abaixo. Tal expressividade dos dados pode ser relacionada à escassez da oferta de espaços atraentes para a realização de atividades diversas.


Serviço de televisão Internet Telefone móvel Telefone fixo Computador Televisão de plasma Televisor de tubo Algum dispositivo de som Automóvel Microondas Máquina de lavar roupas Refrigerador

GRÁFICO 3: Disponibilidade de bens e tecnologias da informação e da comunicação nas VHP. Fonte: COESPO com base em INEGI, 2015

Com a falta de espaços livres qualificados destinados ao lazer, crianças e jovens no geral, têm se apropriado cada vez mais das tecnologias como forma de entretenimento, sobretudo a televisão e a internet.


3. CONCLUSÃO A partir das informações coletadas, relacionadas e analisadas ao longo dessa pesquisa, foi possível concluir que a configuração dos espaços livres de uma grande cidade como a Cidade do México, está atrelada tanto a sua fundação e aos costumes dos seus povos originários, quanto as influências coloniais, sofrendo transformações a partir do contato com povos estrangeiros que enraizaram suas crenças acima de qualquer cultura existente no território, a princípio, pela fé religiosa. Diferentemente do Brasil – país latino-americano conquistado pelos portugueses –, os países colonizados pelos espanhóis tiveram a oportunidade de desenvolverem a sua estrutura e infraestrutura como um espaço urbano. A partir de planos ambiciosos, a Cidade do México se viu até meados do século XIX, como um laboratório de teste do que vinha sendo produzido na arquitetura e no urbanismo principalmente na França, replicado por outros países da Europa, como a Espanha. O urbanismo barroco ou clássico francês, inspirado principalmente em elementos desenvolvidos e empregados no Renascimento italiano, como a perspectiva, linhas retilíneas e o uso da simetria, foi determinante para o desenho dos espaços da capital Mexicana. Apesar dos planos urbanísticos que se sucederam na Cidade do México enquanto império, grande parte das reformas foram realizadas à Oeste e Sul da cidade, ganhando novas terras sobre o Lago Texcoco e atraindo cada vez mais a classe nobre, com bulevares e a criação de uma segunda centralidade em Chapultepec pelo então Imperador Maximiliano, contrariando assim o que defendiam os Astecas: desenvolver o crescimento da cidade a partir de um único ponto histórico, a Plaza Mayor. A partir da Revolução Industrial no século XVIII e o crescimento populacional crescente, a Cidade do México já independente e configurada como a cidade mais importante economicamente do México, se viu conurbada à outras aglomerações além de seus limites, atraídas pela implantação das novas fábricas e indústrias ao longo dos eixos viários logísticos. A periferia do Distrito Federal foi aos poucos configurada pela grande demanda por emprego e pela ocupação de uma população majoritariamente pobre ao longo dos anos de 1960 a 1990, o que afetou significativamente a paisagem urbana da Região Metropolitana da Cidade do México. A malha urbana foi assim, configurada pela necessidade de geração de renda a partir de produtos principalmente manufaturados, tendo o planejamento habitacional social ficado em segundo plano. Devido a geografia relativamente plana da Cidade do México, a ocupação horizontal por habitações foi facilitada, chegando a saturar-se os espaços livres apropriados a ocupação, o que fizeram surgir outras medidas tomadas pelo


Estado e a iniciativa privada imobiliária a partir do século XX. Apesar dos programas de habitação social que se sucederam - agora verticalizadas - muitas ocupações ilegais ainda configuram até hoje a paisagem urbana principalmente dos municípios conurbados à capital, como é o caso de Ecatepec de Morelos. Ecatepec de Morelos foi um dos primeiros municípios configurados pela expansão urbana da Cidade do México, a partir dos anos 70, e até hoje configura-se como o principal município industrial do Estado do México, como também o mais populoso. Originalmente um território destinado às práticas agrícolas e ejidos, Ecatepec ao longo dos anos cedeu seus espaços às fábricas e mudou a sua base econômica para a industrial. Não diferente do contexto citado anteriormente, o município hoje possui poucos espaços livres, já que mais de 80% da sua área está ocupada pela urbanização, tendo baixa disponibilidade de espaços verdes e, áreas protegidas ambientalmente ameaçadas pela ocupação ilegal, no caso, a Serra de Guadalupe. A partir da definição do recorte de um povoado denominado Santa Clara Coatitla, localizado no município de Ecatepec, foi possível aproximar a análise da oferta de espaços livres, entender como se configuram e qual o provável tipo de apropriação que se sucedem à população local. Dessa forma, foi constatado que a praça apesar de ter perdido seu caráter centralizador ao longo dos anos, ainda se mantém como principal impulsora das relações sociais desenvolvidas na esfera pública, pois são na praça e na rua que as festividades comunitárias acontecem e onde se localizam e desenvolvem-se os principais equipamentos públicos e as atividades comerciais. A paisagem predominantemente árida e a pouca oferta de espaços qualificados destinados principalmente ao lazer, afetam o desenvolvimento das relações públicas, como as pessoas se apropriam desses espaços e consequentemente o quanto se sentem seguras ali, fatos esses que podem ser relacionados ao aumento da presença de equipamentos eletrônicos destinados ao entretenimento nas habitações de Ecatepec. Logo, compreender o Sistema de Espaços Livres (SEL) de uma cidade, é compreender não somente a importância de espaços destinados ao lazer, como também a complexa rede de fatores que estão interligadas ao conceito de bemestar e qualidade de vida proporcionados por um lugar e o conjunto de equipamentos que ele oferece para o equilíbrio entre eles. É indispensável falar sobre as práticas sociais sem antes analisar o entorno em que elas se desenvolvem.


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