Cortiços e Espaços Degradados

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CORTIÇOS E ESPAÇOS DEGRADADOS Um histórico de moradia e exclusão social no Centro de São Paulo

Por Gislayne Felix Texeira Leite

São Paulo, 2019



CORTIÇOS E ESPAÇOS DEGRADADOS Um histórico de moradia e exclusão social no Centro de São Paulo

Por Gislayne Felix Texeira Leite

Trabalho Final de Graduação, apresentado a Banca Examinadora do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Anhembi Morumbi, sob a orientação da Profª Dra. Tânia Cristina Bordon Mioto Silva.

Universidade Anhembi Morumbi Escola de Ciências Exatas e Arquitetura Curso de Arquitetura e Urbanismo São Paulo, 2019


CAPA: Mescla de fotografias: Um cortiço em São Paulo e Skyline registrado do terraço do prédio Copan. Autoral.

LEITE, G. F. T. Cortiços e espaços degradados: Um histórico de moradia e exclusão social no Centro de São Paulo / Gislayne Felix Texeira Leite; orientadora Tânia Cristina Bordon Mioto Silva. São Paulo, 2019. Trabalho Final de Graduação (Bacharelado em Arquitetura e Urbanismo) - Escola de Ciências Exatas e Arquitetura - Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Anhembi Morumbi. 1. Cortiço. 2. Vila. 3. Patrimônio. 4. HIS. 5. São Paulo.

Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins únicos de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte. e-mail: gislayne.felix@gmail.com


Em memória ao meu avô materno; aos meus pais, minha irmã; e a todos os filhos da Nação que não fogem à luta.



AGRADECIMENTOS Ao longo desses últimos significativos 5 anos, além de uma formação profissional, tive a oportunidade de uma desafiadora e maravilhosa experiência de transformação pessoal: aprendi a viver sentindo com os olhos. Agradeço a cada um dos professores, com quem tive a oportunidade de aprender e compartilhar conhecimentos. E agradeço especialmente, aqueles que foram mais longe, e que mais do que docentes, se tornaram amigos de alma, de pensamento, e de paixão por esse modo de viver tão fascinante que é a Arquitetura. Deixo assim, nessas folhas, o meu significativo agradecimento: _ ao digníssimo professor e pessoa, José Rollemberg, pelas primeiras aulas de urbanismo da graduação, determinantes para enxergar o que não se vê da paisagem, ainda que esteja em nossa frente. _ a ilustríssima professora, profissional, e pessoa Isabella Sollero, pelas diversas experiências dentro e fora da sala de aula, que com certeza configuram uma boa parcela de tudo que sou hoje, como falo, discuto, critico, penso, enxergo e vivo. Obrigada por tudo. _ a Tânia Mioto, uma pessoa e profissional sem igual, a qual tive o prazer de sua orientação como professora na elaboração desse trabalho, e como amiga, alto astral e com total compreensão nos

meus momentos mais difíceis nesse último ano. Obrigada por tudo. _ Ao Claudio Manetti, meu respeito, admiração, e o meu muito obrigado pelo compartilhamento de experiências, e contribuição com conteúdo para esse trabalho. _ a Thaís Gutto, pessoa e profissional admirável, pelas conversas, debates, companhias, e por sempre acreditar em meu potencial. Firmes e fortes, avante! _ ao querido professor Estêvão, que com sabedoria, atendeu e solucionou as minhas dúvidas de estrutura do projeto. Obrigada! Agradeço também, a todos os que estiveram envolvidos de forma direta ou indireta, no resultado desse trabalho, _ ao Jorge Abou Assali, da Coordenação de Gestão Documental (CGDOC), pela atenciosa recepção às minhas consultas aos processos arquivados _ a Maria Claudia, da área técnica da CDHU, pela atenção e recepção, cedendo parte do seu tempo para uma reunião de esclarecimentos sobre o Programa de Atuação em Cortiços. Obrigada pelo conteúdo! _ a persona incomparável, Paulo Santiago, e toda a equipe do Museu Memória do Bixiga,


MUMBI. Obrigada por terem aberto e continuarem abrindo as portas para mim. Agradeço a confiança. Caminhamos juntos. _ ao professor da FAUSP e arquiteto, Caio Santo Amore, pelo compartilhamento de experiências, conteúdo e atenciosa recepção em visita a universidade. _ ao professor do Mackenzie e arquiteto, Celso Sampaio, ao qual devo o prazer de tê-lo como parceiro de tema de pesquisa, sobre essa realidade intrigante vivida nos Cortiços, e também, pelas contribuições realizadas em conversa no MUMBI. Conte comigo. E um agradecimento mais que especial, a todas as pessoas que viveram comigo, total ou parcialmente, as experiências proporcionadas pelo curso _ a todos da Subprefeitura de Pinheiros, que os considero como família, pela companhia e amizade consolidada durante os dois anos de estágio. Agradecimento especial ao Supervisor do Planejamento Urbano, Flávio Cury, pelo compartilhamento de experiências, seriedade, amizade e confiança em meu potencial. _ a todos os meus amigos de coração, principalmente aos que saem da universidade para a vida, obrigada! _ a minha família, meus pais e minha irmã, minha base, obrigada por tudo, amo vocês.


“Para solucionar o problema dos cortiços, precisamos encarar seus habitantes como pessoas capazes de compreender seus interesses pessoais e lidar com eles, o que certamente são. Precisamos discernir e levar em consideração as forças de recuperação existentes nos próprios cortiços e evoluir a partir delas, o que comprovadamente funciona nas cidades reais” Jane Jacobs



RESUMO Atualmente denominados como Habitação Coletiva Precária de Aluguel (HCPA), os cortiços fazem parte do contexto das transformações urbanas da cidade de São Paulo, desde os seus primeiros relatos em meados do século XIX. A configuração interna de um imóvel encortiçado e o modo coletivo de sobreviver em espaços pequenos e insalubres, representam o modo mais precário de moradia, e denunciam a promiscuidade à qual estão submetidas as classes menos favorecidas sócio-economicamente. São pessoas que mesmo residentes em áreas centrais, se veem excluídas de políticas públicas, vivendo ainda hoje, no século XXI, camufladas em meio a paisagem arquitetônica das casas de época, que chamam a atenção de quem passa ora pelos detalhes construtivos, ora pela falta de manutenção, mas quase nunca para a existência de um complexo problema - multiplicado por 5, 10, 20 famílias -, por detrás das fachadas históricas. São realidades secularmente recorrentes, mais expressivas e impactantes do que os números das pesquisas são capazes de nos mostrar. O déficit habitacional na cidade é recorrente desde a chegada de inúmeros imigrantes na província do café, atraídos pelas “novas boas” da prosperidade econômica, sinônimo de novas oportunidades de vida tanto para os trabalhadores livres quanto à burguesia, crescente no que viria se conformar estruturalmente no centro de São Paulo, concentrador das primeiras e mais completas redes de infraestrutura urbana, se

comparada às demais regiões do Estado. No entanto, a produção que se seguiu com o intuito de sanar o problema habitacional para as famílias de baixa renda, foi acompanhada de inúmeras críticas quanto a qualidade das construções e de sua implantação no território, sob uma política perversa de segregação espacial e exclusão social das áreas mais privilegiadas da cidade, ou seja, próximas das oportunidades de emprego e infraestrutura que se configuram comos os principais motivos para a permanência dos moradores de cortiços em condições subnormais. Este estudo tem como objetivo, através da análise de dados e fatos históricos relacionados a esse tipo de moradia na cidade de São Paulo, compreender como a qualidade arquitetônica de um determinado espaço pode influenciar diretamente no reconhecimento do ser humano sobre si como um cidadão, possuidor de direitos (independente de qualquer valor material), e que diariamente sobrevivem à uma agressão psicológica: a cobrança para alcançar um reconhecimento social, agravada pelas condições físicas do que deveria ser o seu “lar doce lar”. O estudo corresponderá em primeiro momento ao levantamento de índices da Subprefeitura da Sé, e posteriormente, da região do distrito Bela Vista, afim de relacionar o patrimônio construído e sua preservação, voltados ao uso coletivo de espaços e equipamentos em edifícios residenciais; e, em


segundo momento, a uma análise mais profunda ao que tange à legislação regulamentadora dos cortiços (Lei Moura, nº 10.928), vigente até hoje desde 1991; seguindo com uma proposta de intervenção racionalizada - no sentido funcional da palavra - em imóveis que forem julgados interessantes sob um série de quesitos, para receber o projeto, desenvolvido primeiramente em protótipos, visando assim a amplitude de um problema que não limita-se a uma quadra apenas, mas a toda cidade (centro e periferia).

PALAVRAS-CHAVE: Cortiço; Vila; Patrimônio; HIS; São Paulo.

ABSTRACT Currently named as Precarious Collective Housing (HCPA, in portuguese), the high-density rental housing, are part of the context of the urban transformations in the city of Sao Paulo (Brazil), since its first reports in the mid-nineteenth century. The internal configuration of a rundown property and the collective way of surviving in small and unhealthy spaces, represent the most precarious way of housing and denounce the

promiscuity in which the socioeconomically disadvantaged classes are subjected. They are people who, although living at central areas, are excluded from public politics, still living today, in the XXI century, camouflaged in the midst of the architectural landscape of the period houses, which draw the attention of those who pass by now to the constructive details, sometimes to the lack of maintenance, but almost never to see the existence of a complex problem - multiplied by 5, 10, 20 families - behind the historical house


facades. These are age-old, more expressive and shocking realities than the survey numbers are capable of showing us. The housing deficit in the city has been recurrent since the arrival of countless immigrants in the coffee province, attracted by the “new good” of economic prosperity, synonymous with new opportunities for both free workers and the bourgeoisie, growing in what would become structurally in the center of Sao Paulo, concentrator of the first and most complete urban infrastructure networks, when compared to the other regions of the State. However, the production that followed in order to remedy the housing problem for lowincome families was accompanied by innumerable criticisms about the quality of the buildings and their implantation in the territory, under a perverse policy of spatial segregation and social exclusion of the most privileged areas of the city, that is, close to the employment opportunities and infrastructure that are configured as the main reasons for the permanence in sub-normal housing conditions.

The study will correspond firstly to the survey of indices of the Subprefecture of Sé, and later, of the region of the Bela Vista district, in order to relate the built heritage and its preservation, aimed at the collective use of places and equipment in residential buildings; and secondly, to a deeper analysis of the regulatory legislation of the high-density rental housing (“Lei Moura, nº 10.928/1991”) current to date; following a proposal for rationalized intervention in properties that are deemed interesting under a series of requirements, to finally receive the project, developed in prototypes, thus considering the magnitude of a problem that isn’t limited to just one block, but to the whole city (center and periphery).

This study aims, through the analysis of data and historical facts related to this type of housing in the city of Sao Paulo, to understand how the architectural quality of a given space can directly influence the recognition of the human being about himself as a citizen, possessor of rights (independent of any material value), and who daily are survivors of psychological aggression: the charge to achieve social recognition, aggravated by the physical conditions of what should be their “sweet home.”

KEYWORDS: Sub-normal; Social; Housing; Patrimony; Saint Paulo.


LISTA DE FIGURAS FIGURA 1: Jornal Folha de São Paulo. Edição 13/11/1977...............................................................................................................................1 FIGURA 2: Vista parcial do skyline de São Paulo, a partir do terraço do edifício Copan.......................................................................3 FIGURA 3: Imóvel encortiçado na Mooca, SP........................................................................................................................................................6 FIGURA 4: “Cortiço do Snr. Gordinho - a primeira porta é a latrina comun abrindo-se para a rua”. .................................................8 FIGURA 5: “Duas casas. Empreiteiro Português. 1815 - R. Monsenhor Andrade”. ................................................................................ 10 FIGURA 6: “1902 - Travessa do Mercado”. ........................................................................................................................................................... 11 FIGURA 7: “Cortiço, R. Itambé, 15”. ............................................................................................................................................................................ 15 FIGURA 8: “Bêbado em pátio de cortiço”. ........................................................................................................................................................... 15 FIGURA 9: “Navio Parado”, primeiro bloco de habitação de São Paulo, segundo Nabil Bonduki................................................... 16 FIGURA 10: Em primeiro plano “Pombal”; no centro, a entrada do complexo abaixo da passarela............................................. 16 FIGURA 11: O “Vaticano” ao fundo, e a “Geladeira” em primeiro plano.................................................................................................... 16 FIGURA 12: Planta do Complexo de cortiços Vila Barros............................................................................................................................... 16 FIGURA 13: “Territórios de Sociabilidade”........................................................................................................................................................... 16 FIGURA 14: “1896 - R. Maria José”. Acima, elevação da fachada indicada na planta ao lado........................................................... 19 FIGURA 15: “Planta do typo de cortiço urbano”. .............................................................................................................................................. 21 FIGURA 16: “Proposta de casas isoladas”. ........................................................................................................................................................... 22 FIGURA 17: Entrada da Vila Maria Zélia .............................................................................................................................................................. 26 FIGURA 18: Intervenções sem respaudo ao patrimônio............................................................................................................................... 26 FIGURA 19: Descaracterização das casas do projeto original ao longo tempo.................................................................................... 26 FIGURA 20: Cortiços (segundo dados Sehab, 2015) na R. Mauá, distrito República, Sé.................................................................... 27 FIGURA 21 (ao lado): Casa ao fundo desgastada pelo tempo, expõe bandeira do Brasil na janela. Criança a frente, olha a bola que outras crianças brincam na Rua Conde de São Joaquim, distrito Bela Vista................................................................................. 29 FIGURA 22: Vista aérea do complexo de equipamentos da Hospedaria dos Imigrantes. Ao lado, a ferrovia por onde chegavam os imigrantes. Sem data. Autor desconhecido................................................................................................................................................. 34 FIGURA 23: “Estação de Embarque do S.T.C”. Sem data. Autor desconhecido...................................................................................... 34 FIGURA 24: Fachada da Hospedaria dos Imigrantes (HI) após sua segunda reforma, em 1936 (Foto de 1938). Em primeiro plano, funcionários, imigrantes e migrantes. Fotógrafo desconhecido. ................................................................................................ 35 FIGURA 25: Imigrantes e migrantes no pátio interno da Hospedaria, 1930.......................................................................................... 36 FIGURA 26: Imigrantes italianos na HI, 1930.................................................................................................................................................... 36 FIGURA 27: Crianças imigrantes jogando bola no pátio da Hospedaria dos Imigrantes, 1930..................................................... 36 FIGURA 28: ”IMMIGRANTES PROCEDENTE DA BAHIA”, 1936....................................................................................................................... 36 FIGURA 29: Dormitório de camas duplas, 1936.............................................................................................................................................. 36 FIGURA 30: Exposição sobre a Imigração no Brasil, no Museu da Imigração do Brás, antiga Hospedaria dos Imigrantes... 37 FIGURA 31: “Um aspecto de um cortiço e suas crianças.............................................................................................................................. 38 1940 - 1950 . Fotógrafo desconhecido. Acervo Fotográfico do Museu da Cidade de São Paulo”.................................................. 38 FIGURA 32: “Cômodo da casa de cortiço com uma mulher costurando. 1940 - 1950. Fotógrafo desconhecido. Acervo Fotográfico do Museu da Cidade de São Paulo”............................................................................................................................................... 38 FIGURA 33: “Expedição São Paulo 450 Anos. Quarto no interior de cortiço no Bixiga. 2004. Foto Laerte Machado Júnior. Acervo Fotográfico do Museu da Cidade de São Paulo”................................................................................................................................ 38 FIGURA 34: JORNAL “O ESTADO DE S PAULO - PÁGINAS DA EDIÇÃO DE 03 DE JUNHO DE 1911 - PAG 6”................................... 40 FIGURA 35: JORNAL “O ESTADO DE S. PAULO - PÁGINAS DA EDIÇÃO DE 15 DE JULHO DE 1912 - PAG 3”................................... 41 FIGURA 36: Modelo de ficha cadastral usada pelos técnicos nas vistórias para auxiliar na análise de cada cortiço - espaços, locadores e locatários................................................................................................................................................................................................ 43 FIGURA 37: Foto de Desinfector com trajes específicos e equipamentos, utilizados nos imóveis suspeitos de serem propagadores de doenças. ..................................................................................................................................................................................... 43 FIGURA 38: Planta Cadastral dos cortiços identificados no bairro Santa Ifigênia, realizado pelo engenheiro V. Huet de Bacellar, 1892.................................................................................................................................................................................................................................. 44 FIGURA 39: “Notícia do decreto do governo regulando aluguéis publicada no “Diario Carioca” de 21 de agosto de 1942”.48 FIGURA 40 e 41: Maquete e Planta Térrea, do Ed. Japurá, contruído no local do antigo complexo de cortiços da Vila Barros (ver Figuras 7 a 11). Fonte: Arquivo Arq, 2019........................................................................................................................................................... 48 FIGURA 42: Capa da Revista Veja, edição 2629, destacando a proliferação da autoconstrução (sem assistência técnica), na


periferia de São Paulo................................................................................................................................................................................................ 49 FIGURA 43: “Obra de prédio em Heliópolis”. ..................................................................................................................................................... 49 FIGURA 44: Segundo a publicação, cerca de 25% das residências do município de São Paulo (mais de 830 mil), estão em situação irregular. Na foto, “edifício de 5 andares em Heliópolis: renda de 14 mil reais por mês [com aluguel]”*. ................ 49 FIGURA 45: Registro feito em um cortiço no centro de São Paulo em 2009, pelo fotógrafo Fábio Knoll, em parceria com a SEHAB (Secretaria Municipal de Habitação). .................................................................................................................................................... 52 FIGURA 46: Fotografia também em cortiço em 2009, por Fábio Knoll. Na imagem, nota-se objetos e utensílios diversos utilizados para diferentes fins. O fogão à esquerda e a cama à direita, constrastam a - precariedade - multifuncionalidade do espaço............................................................................................................................................................................................................................. 52 FIGURA 47: Foto do Relatório da Comissão de Exame e Inspeção, realizado na Santa Ifigênia, de 1893................................... 53 FIGURA 48: Foto do Código Sanitário do Estado de São Paulo, de 1894................................................................................................ 54 FIGURA 49: O Livro “O Cortiço” é um romance naturalista da Literatura brasileira escrito por Aluísio de Azevedo, em 1890. O autor retrata em detalhes a vida, o cotidiano e a morte de um cortiço no Rio de Janeiro, e expõe as diversidades encontradas nesse tipo precário de habitação coletiva de aluguel................................................................................................................................... 55 FIGURA 50: Padre Louis-Joseph Lebret (1897-1966)...................................................................................................................................... 56 FIGURA 51: O Estado de S. Paulo - 21/11/1971. O PUB foi inspirado na “cidade mais humanda” defendida por Lebret....... 56 FIGURA 52: Trecho encortiçado, na R. Major Diogo........................................................................................................................................ 57 FIGURA 53: Casas encortiçadas na R. Vergueiro............................................................................................................................................... 57 FIGURA 54: Casarão parcialmente encortiçado na Vila Itororó................................................................................................................... 58 FIGURA 55: Área encortiçada na R. Conselheiro Ramalho............................................................................................................................ 58 FIGURA 56: Foto na escala do pedestre. Da direita para esquerda, o segundo imóvel é o Casarão Celso Garcia, e que junto aos imóveis lindeiros contemplariam o projeto de intervenção da SEHAB (coord. do Arq. Cláudio Manetti)................................. 59 FIGURA 57: Maquete do projeto de autoria do Arq.Cláudio Manetti, que viria ser implantado no local do antigo cortiço existente no Casarão Celso Garcia, contemplando além de habitações, uso comercial no térreo............................................... 59 FIGURA 58: Moradia em porão, espaço extremamente insalubre, onde se cozinha, dorme e sobrevive................................... 60 FIGURA 59: Cortiço na “Rua Visconde de Parnaíba, 1939”............................................................................................................................. 60 FIGURA 60: Cortiços remembrados na Rua Tomás de.................................................................................................................................... 61 Lima, 85. Área destinada à implementação do projeto de intervenção “Sé A”, dentro do PAC - CDHU....................................... 61 FIGURA 61: Vista aérea do Conjunto Casarão Celso Garcia.......................................................................................................................... 61 FIGURA 62: Registro da construção de um dos conjuntos residenciais idealizados pelo PAC, destinado à realocação de moradores encortiçados........................................................................................................................................................................................... 62 FIGURA 63: Edifício São Vito, era localizado em frente ao Mercado Municipal, na Av. do Estado. Inaugurado em 1959, foi completamente demolido em 2011.................................................................................................................................................................... 62 FIGURA 64: Localizado na R. Conde de São Joaquim, 85, o edifício amarelo “Bela Vista E”, foi construído pelo PAC - CDHU, sob coordenação da arquiteta Ana Maria Antunes Coelho, em 2009. No local, existia um cortiço, do qual os moradores foram realocados para a nova edificação........................................................................................................................................................................ 63 FIGURA 65: Capa do Livro “Cortiços. A experiência de São Paulo”. Publicado em 2010 pela Prefeitura de São Paulo (SEHAB). 63 FIGURA 66: Capa do caderno para discussão pública.................................................................................................................................... 64 FIGURA 67: Trecho do Diário Oficial da Cidade (DOC) de São Paulo, publicado em 14 de março de 2019, aprovando a contratação do Consórcio Pólis/Peabiru, para a realização do novo Censo de Cortiços................................................................... 64 Figura 68: “Perspectiva de um Falanstério ou Palácio Societário dedicado à Humanidade”, de Charles Fourier. .................... 68 FIGURA 69: Vista aéria dos edifícios Pruitt-Igoe. Percebe-se a disponibilidade de espaços livres sem qualificação, como áreas verdes e equipamentos de lazer............................................................................................................................................................................ 69 FIGURA 70: Implantação do projeto original.................................................................................................................................................... 70 FIGURA 71: O conjunto de edifícios isolados e verticalizados, sob preceitos da Arquitetura Moderna...................................... 70 FIGURA 72: Registro das primeiras demolições do polêmico conjunto habitacional,....................................................................... 71 FIGURA 73: Conjunto COHAB Artur Alvim, construído na década de 1970........................................................................................... 77 FIGURA 74: Conjunto COHAB Cidade Tiradentes, construído na década de 1980.............................................................................. 77 FIGURA 75: Planta modelo da Unidade Apartamento, adotada pela COHAB durante o BNH........................................................ 78 FIGURA 76: Planta modelo da casa/embrião, adotada pela COHAB durante o BNH.......................................................................... 78 FIGURA 77: Vivienda de interesse social no México........................................................................................................................................ 79 FIGURA 78: Bairro residencial planejado em Indaiatuba, interior do Estado de São Paulo, financiado pela Fase 2 do projeto Minha Casa Minha Vida (MCMV). São mais de 3 mil unidades, entre casas, apartamentos e lotes comerciais........................ 79 Fonte: Jornal Nova Metrópole, 2016. Disponível em:< http://jornalnovametropole.com.br/wp/jacitara-viabiliza-maiorprojeto-habitacional-de-sao-paulo/>. Acesso em: 04 de maio de 2019................................................................................................. 79 FIGURA 79: “Complexos habitacionais e favelas em São Bernardo do Campo”, São Paulo............................................................... 81 FIGURA 80: Vista a partir de uma das janelas do edifício Copan. Ao fundo, vê-se o edifício Altino Arantes, que junto ao edifício Mirante do Vale, representam os edifícios mais altos de São Paulo.......................................................................................................... 84 FIGURA 81 : LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO EM RELAÇÃO AO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO (MSP)............................... 86 FIGURA 82: Distritos da Subprefeitura Sé........................................................................................................................................................... 90 FIGURA 83: Densidade Demográfica e Vulnerabilidade Social................................................................................................................... 94 FIGURA 84: PREDOMINÂNCIA DE USOS NÃO RESIDENCIAIS.................................................................................................................100 FIGURA 85: MOBILIDADE.......................................................................................................................................................................................108 FIGURA 86: PARQUES...............................................................................................................................................................................................114


FIGURA 87: EQUIPAMENTOS..................................................................................................................................................................................116 FIGURA 88: ZONEAMENTO - LEI 16.402/2016................................................................................................................................................118 FIGURA 89: ZEIS E ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS..........................................................................................................................................120 FIGURA 90: TERRITÓRIOS DE TRANSFORMAÇÃO...........................................................................................................................................132 FIGURA 91: OUC - OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS......................................................................................................................134 FIGURA 92: MACROÁREAS.....................................................................................................................................................................................136 FIGURA 93: ZEPEC E AE (ÁREA ENVOLTÓRIA)..................................................................................................................................................138 FIGURA 94: Fachada do Edifício União, antigo cortiço localizado no distrito do Bom Retiro........................................................148 FIGURA 95: Situação em que foi encontrado o Edifício União, antes da intervenção. ....................................................................149 FIGURA 96: Registro de uma das reuniões realizadas com os moradores. .........................................................................................149 FIGURA 97: Fachada do edifício reformada a partir de doações e multirão. ......................................................................................150 FIGURA 98: Portão implantado, adquirido com ajuda de custo também por doação. ...................................................................150 FIGURA 99: Cena comum em Cortiços: Pela falta de espaço - ocupado pelos inúmeros cubículos - com insolação e ventilação natural, qualquer espaço torna-se varal, um lugar para secar roupas. Registro feito em um cortiço no centro de São Paulo em 2009, pelo fotógrafo Fábio Knoll, em parceria com a SEHAB (Secretaria Municipal de Habitação). ..........................................152 FIGURA 100: CORTIÇOS REGISTRADOS NA SUBPREFEITURAS SÉ E MOOCA........................................................................................153 FIGURA 101: Distritos da Subprefeitura da Sé e Cortiços (HabitaSampa, 2015).................................................................................156 FIGURA 102: Como um adereço das fachadas dos imóveis de aluguel, são as placas de anúncio com “Aluga-se”. No caso dos cortiços, o “aluguel de quartos” é o mais comum, com uma oferta maior para solteiros e sem filhos. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019............................................................................................................................................................................................................161 FIGURAS 103 e 104: Cortiço na R. dos Gusmões, 132/ R. do Triunfo, 192. Distrito República........................................................164 FIGURA 105: R. Conde de São Joaquim (Bela Vista), onde crianças brincam e pessoas socializam nas calçadas. em um sábado a tarde - provavelmente moradoras dos cortiços próximos ou dos conjuntos habitacionais que foram construídos a partir de intervenções da CDHU, a exemplo do edifício amarelo que aparece na foto. ...................................................................................165 FIGURA 106: Imóveis encortiçados da década de 1940. R. Conde de São Joaquim, 129 e 133/135/137, ambos (edifícios amarelo e azul, respectivamente), em ZEIS-3.................................................................................................................................................166 FIGURA 107: Cortiços na R. Conde de São Joaquim, 198/200 e 208/210 (da direita pra esquerda)............................................166 FIGURA 108: Cortiço interditado, localizado na R. General Couto de Magalhães, 385/387 (distrito República)....................167 FIGURA 109: R. Maria José, 399 (1970). Nota-se uma intervenção na arquitetura original do imóvel (janela)que possui tombamento volumétrico......................................................................................................................................................................................168 FIGURA 110: Cortiço na Al. Barão de Piracicaba, 67/71 (distrito Santa Cecília)...................................................................................168 FIGURA 111: Cortiço na R. Condessa de São Joaquim, 184. Tombamento volumétrico, imóvel de 1949.................................168 FIGURA 112: Cortiços R. Conde de São Joaquim, 315/317 (1950) e 325 (1944). Em ZEU e com porão habitado...................168 FIGURA 113: Estudo em croqui de alguns dos imóveis considerados encortiçados, segundo a fiscalização realizada durante o PAC. ................................................................................................................................................................................................................................169 FIGURA 114: Figuras ilustrativas de etapas para elaboração da metodologia de trabalho...........................................................171 FIGURA 115: Figuras ilustrativas da configuração de lotes definidos para elaboração dos protótipos.....................................174 FIGURA 116: Figuras ilustrativas da configuração de lotes definidos para elaboração dos protótipos.....................................175 FIGURA 117: Figuras ilustrativas de etapas para elaboração da metodologia de trabalho...........................................................178 FIGURA 118: Figuras ilustrativas do estudo de parâmetros da Lei Moura............................................................................................180 FIGURA 119: Figuras ilustrativas do estudo de parâmetros da Lei Moura............................................................................................181 FIGURA 120: Análise de Sequência Fibonacci e Modulor: Instrumentos de estudos do arquiteto Le Corbusier, para configuração das unidades habitacionais em Marselha, França, em meados do séc. XX..........................................................................................183 FIGURA 121 e 122: Registros fotográficos de Benny Lam, durante sua série “Encurralado”. .........................................................186 FIGURA 123, 124 e 125: Registros fotográficos de Benny Lam, durante sua série “Encurralado”. ................................................188 FIGURA 126: Vista aérea da Unidade de Habitação de Marselha, na França........................................................................................189 FIGURA 127: Corte esquemático mostrando a conexão de pavimentos de unidades habitacionais, a fim de se aproveitar melhor o espaço disponível..................................................................................................................................................................................190 FIGURA 128: Desenho de implantação. Disponível em: Archdaily. Março 14, 2016.........................................................................190 FIGURA 129: Implantação do projeto, e corte esquemático, respectivamente..................................................................................190 FIGURA 130: Vista aérea de Havana, e delimitação da área de estudo de Iwo para caracterização de seu objeto de intervenção..................................................................................................................................................................................................................191 FIGURA 131: Diagrama de investição do arquiteto quanto ao porte dos imóveis de intervenção. ...........................................192 FIGURA 132: Diagrama de ilustrando as tipologias de protótipos encontradas a partir das investigações aos imóveis do entorno. .......................................................................................................................................................................................................................192 FIGURA 133: Programa distribuído ao longo do térreo e dos 4 pavimentos do Protótipo 1.........................................................193 FIGURA 134: Uma das organizações de planta sugeridos pelo arquiteto............................................................................................193 FIGURA 135: Sugestão de restauração de fachada, com a pintura a ser definida pelos próprios moradores ou cooperativa responsável. ................................................................................................................................................................................................................194 FIGURA 136: Secção de Protótipo 1. ..................................................................................................................................................................194 FIGURA 137: Módulos habitacionais..................................................................................................................................................................196 FIGURA 138: Malha e estudos de ocupação do solo....................................................................................................................................197 FIGURA 139: Análise de recuos.............................................................................................................................................................................199 FIGURA 140: Diagrama para estudo do programa projetual.....................................................................................................................200 FIGURA 141: Protótipos habitacionais, possíveis combinações e plantas com ocupação sugerida...........................................201


FIGURA 142: Diagrama de unidade habitacional, e perspectiva de projeto em construção.........................................................204 FIGURA 143: DISTRITO BELA VISTA - R. CONDE DE SÃO JOAQUIM..........................................................................................................206 FIGURA 144: LOTES E PERÍMETRO - RUA CONDE DE SÃO JOAQUIM.......................................................................................................207 FIGURA 145: Mapa SARA BRASIL, 1930. S/ESCALA........................................................................................................................................209 FIGURA 146: Foto aérea, 1940. S/ESCALA.........................................................................................................................................................210 FIGURA 147: Mapa VASP CRUZEIRO, 1954. S/ESCALA..................................................................................................................................211 FIGURA 148: Foto aérea, 2000. S/ESCALA.........................................................................................................................................................212 FIGURA 149: Foto aérea, 2004. S/ESCALA.........................................................................................................................................................213 FIGURA 150: Foto aérea, 2019. S/ESCALA.........................................................................................................................................................214 FIGURA 151: Mapa de Cheios e Vazios...............................................................................................................................................................217 FIGURA 152: Mapa Gabarito de Altura..............................................................................................................................................................217 FIGURA 153: Mapa de Zoneamento...................................................................................................................................................................218 FIGURA 154: Mapa de Cortiços.............................................................................................................................................................................218 FIGURA 155: “Estudo para projeto de requalificação urbana - Bela Vista”, da arquiteta Katia Canova.......................................219 FIGURA 156: Perspectiva do empreendimento..............................................................................................................................................221 FIGURA 157: Fotografia do edifício existente, antes da implentação do projeto..............................................................................221 FIGURA 158: Planta pavimento tipo - Bela Vista D (s/escala).....................................................................................................................222 FIGURA 159: Análise de Planta pavimento tipo - Bela Vista D (s/escala)...............................................................................................222 FIGURA 160: Vista frontal do empreendimento.............................................................................................................................................223 FIGURA 161: Fotografia do edifício encortiçado existente, antes da implentação do projeto.....................................................223 FIGURA 162: Análise da fachada - Bela Vista E................................................................................................................................................223 FIGURA 163: Análise da implantação - Bela Vista E.......................................................................................................................................224 FIGURA 164: Planta - Bela Vista E.........................................................................................................................................................................224 FIGURA 165: Análise da planta - Bela Vista E...................................................................................................................................................224 FIGURA 166: Foto do empreendimento construído.....................................................................................................................................225 FIGURA 167: Fotografia da área encortiçada existente, antes da implantação do projeto............................................................225 FIGURA 168: Planta com indicação de UH acessíveis (PNE) - Bela Vista G............................................................................................226 FIGURA 169: Análise da Planta - Bela Vista G...................................................................................................................................................226 FIGURA 170: Planta da implantação - Bela Vista G........................................................................................................................................226 FIGURA 171: Análise da Planta - Bela Vista G...................................................................................................................................................226 FIGURA 172: Ampliação de fachada de intervenção....................................................................................................................................228 FIGURAS 173 e 174: Imagens da fachada dos imóveis escolhidos para aplicação da metodologia com protótipos...........230 FIGURAS 175 e 176: Imagens da fachada dos imóveis escolhidos para aplicação da metodologia com protótipos...........231 FIGURA 177: Fragmento de desenho original da fachada do imóvel 121, datado de 1930..........................................................231 FIGURAS 178 e 179: Redesenho autoral do projeto original da fachada, feito na prancha ao lado, registrada em fotografia de um processo administrativo do ano de 1930, arquivado pela Prefeitura de São Paulo. ...............................................................233 FIGURA 180: Reprodução da fachada em seu estado atual, com as intervenções posteriores à sua construção, já que o desenho original encontrado no processo administrativo, não corresponde ao atual, como se vê na página seguinte... 242


LISTA DE TABELAS TABELA 1: Total investido em Habitação por Segmento, no período de atuação do BNH (1964-1986).....................................74 TABELA 2: Distribuição Percentual das Aplicações.........................................................................................................................................75 TABELA 3: Parâmetros de ocupação, exceto de Quota Ambiental........................................................................................................ 130 TABELA 4: Características de aproveitamento construtivo por Macroárea........................................................................................ 143 TABELA 5: Coeficientes de aproveitamento em ZEIS.................................................................................................................................. 144 TABELA 6: Percentuais de área construída total por usos residenciais e não residenciais em ZEIS........................................... 144 TABELA 7: Cortiços por distrito (2001)*........................................................................................................................................................... 155 TABELA 8: Cortiços por distrito (2019)............................................................................................................................................................. 155 TABELA 9: Renda Média por imóvel (2005)*.................................................................................................................................................. 157 TABELA 10: Qtd. de Cômodos por imóvel (2005)*....................................................................................................................................... 157 TABELA 11: Qtd. de Cortiços por Zoneamento (Lei nº 16.402/2016)................................................................................................... 157 TABELA 12: Cortiços por área de terreno - M² (2015). Total de Imóveis: 552.................................................................................... 157 TABELA 13: Cortiços por área de terreno - M². Área média: 223m². (2005)*....................................................................................... 157 TABELA 14: Profundidade dos imóveis, em metros (2005)*..................................................................................................................... 157 TABELA 15: Imóveis por Faixa de Prioridade (2005)*.................................................................................................................................. 158 TABELA 16: Imóveis encortiçados por ano de construção (2005)*........................................................................................................ 158 TABELA 17: Índice de Adequação (IA) de Vistoria prévia (Vp)................................................................................................................. 158 TABELA 18: Índice de Adequação (IA) de Vistoria recente (Vr)................................................................................................................ 158 TABELA 19: Classificação de Imóveis - Vistoria prévia (Vp)....................................................................................................................... 158 TABELA 20: Classificação de Imóveis - Vistoria recente (Vr)..................................................................................................................... 158 TABELA 21: Índice de adequação (IA) da Vr (2017, 2016 e 2015), em comparação a Vp................................................................ 158 TABELA 22: Imóveis por Tombamento............................................................................................................................................................. 159 TABELA 23: Caracterização dos Imóveis - Salubridade e Tipologia (635 imóveis com 7347 famílias) (2005)*...................... 159


LISTA DE GRÁFICOS GRÁFICO 1: População da Subpref. Sé relação à população MSP, 2010.................................................................................................88 GRÁFICO 3: População total e densidade demográfica, 1980 a 2010.....................................................................................................88 GRÁFICO 2: Área da Subpref. Sé em relação à área do MSP........................................................................................................................88 GRÁFICO 4: Taxa de crescimento populacional, 2000 a 2010.....................................................................................................................92 GRÁFICO 5: IPVS - Proporção da população nos grupos 5 e 6 (maior vulnerabilidade), 2010 IPVS - Índice Paulista de Vulnerabilidade Social..............................................................................................................................................................................................95 GRÁFICO 6: Índice de Desenvolvimento Humano do Município, 2000 e 2010...................................................................................95 GRÁFICO 7: Rendimento Nominal Mensal domiciliar (salários mínimos)..............................................................................................96 GRÁFICO 8: Percentual de participação das faixas etárias de até 14 anos e 60 e mais, 2010.........................................................96 GRÁFICO 9: Empregos formais por setor de atividade, 2012.....................................................................................................................98 GRÁFICO 10: Participação dos empregos formais em relação ao MSP - Exclui Administração Pública................................... 101 GRÁFICO 11: Empregos formais por área líquida (ha) - Exclui Administração Pública................................................................... 101 GRÁFICO 12: População por situação ocupacional, 2010......................................................................................................................... 102 GRÁFICO 13: Distribuição salarial, 2012.......................................................................................................................................................... 102 GRÁFICO 14: Participação do emprego formal por grau de escolaridade, 2012.............................................................................. 103 GRÁFICO 15: Empregos por subsetor de atividade econômica, 2012 - Exclui Administração Pública.................................... 104 GRÁFICO 16: Percentual de trabalhadores que gastam mais de uma hora no deslocamento casa - trabalho, 2010......... 105 GRÁFICO 17: Participação do número de viagens diárias dos residentes por modos de transporte principal, 2007........ 109 GRÁFICO 18: Participação das viagens geradas por residentes segundo destinos, 2007............................................................. 109 GRÁFICO 19: Proporção de domicílios não conectados à rede geral de água e esgoto............................................................... 110 GRÁFICO 20: Ocorrência de alagamentos e pontos de inundação, verão 2013/ 2014.................................................................. 110 GRÁFICO 21: Cobertura vegetal e áreas verdes públicas por habitante, 2014................................................................................. 111 GRÁFICO 22: Percentual da população residente distante a mais de 1 km de parques, 2010.................................................... 112 GRÁFICO 23: População em situação de rua - Para as áreas não centrais, os dados referentes a 2011 não estão desagregados por Distritos e Subprefeituras............................................................................................................................................................................. 121 GRÁFICO 24: Percentual de terrenos vagos, 2014....................................................................................................................................... 123 GRÁFICO 25: Índice de Vacância - Distritos Percentual de domicílios vagos no território............................................................ 123 GRÁFICO 26: Famílias em Cortiços, 2014........................................................................................................................................................ 124 GRÁFICO 27: Participação de domicílios em favelas - Participação dos domicílios sobre o total de domicílios do território.124 GRÁFICO 28: Condição de inadequação domiciliar - Percentual de domicílios com mais de 3 moradores por dormitório.126 GRÁFICO 29: Índice de espaço residencial - Área construída residencial por habitante (m2/ hab).......................................... 126 GRÁFICO 30: Percentual de Área construída por tipo de uso. Subprefeitura Sé e Distritos, 2014............................................. 127 GRÁFICO 31: Unidades Residenciais Verticais lançadas, 2000 a 2013.................................................................................................. 127 GRÁFICO 32: Participação da área por tipo de ZEIS, 2014 - Percentual da área do território ocupada por tipo de ZEIS.. 129


SUMÁRIO RESUMO ABSTRACT LISTA DE FIGURAS LISTA DE TABELAS LISTA DE GRÁFICOS SUMÁRIO INTRODUÇÃO..........................................................................................................................2 1. O CORTIÇO...........................................................................................................................7 1.1 DEFINIÇÕES E CARACTERÍSTICAS GERAIS................................................................................... 7 1.2 TIPOLOGIAS.............................................................................................................................................. 12 1.3 CORTIÇOS VERSUS VILAS OPERÁRIAS........................................................................................... 17 1.4 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: UMA QUESTÃO CULTURAL...................................................... 28 2. A TRANSFORMAÇÃO DA VILA EM METRÓPOLE..............................................................32 2.1 (1870-1930) - IMIGRANTES................................................................................................................. 32 2.2 (1870-1930) - SANITARISMO.............................................................................................................. 39 2.3 (1930 - 1970) - INQUILINATO E PERIFERIZAÇÃO........................................................................ 46 2.4 - POLÍTICAS DE INTERVENÇÃO EM CORTIÇOS - LINHA DO TEMPO.................................. 51 LINHA DO TEMPO......................................................................................................................................... 53 3. A INFLUÊNCIA MODERNISTA NA PRODUÇÃO DE HIS.....................................................66 3.1 UM DESCASO SOCIAL: PRUITT-IGOE (1954-1973).................................................................... 69 3.2 UM DESCASO SOCIAL: BNH (1964-1988)..................................................................................... 72 3.3 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: ERROS E PERSISTÊNCIAS.......................................................... 80 4. O ENTORNO E SUA ESTRUTURA URBANA........................................................................87 4.1 ZOOM 1: SUBPREFEITURA DA SÉ, CENTRO DE SÃO PAULO.................................................. 87 4.1.1 Indicadores Sociais e Demográficos................................................................................. 91 4.1.2 Indicadores Econômicos....................................................................................................... 97 4.1.3 Indicadores de Infraestrutura e Mobilidade.................................................................. 105 4.1.4 Indicadores de Áreas Verdes................................................................................................ 111 4.1.5 Indicadores de Moradia......................................................................................................... 121


4.1.6 Áreas de Incentivo à Transformação Urbana................................................................. 139 4.2 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: OS PRINCIPAIS DESAFIOS........................................................ 145 5. CORTIÇOS EM NÚMEROS (SUB. SÉ)...................................................................................155 5.1 COMPARATIVO DE DADOS: PROGRAMA DE CORTIÇOS E HABITASAMPA...................... 155 5.2 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: DIRETRIZES PROJETUAIS.......................................................... 160 6. APROXIMAÇÃO DA ARQUITETURA...................................................................................171 6.1 METODOLOGIA DE PROJETO - ANÁLISE DE CONDIÇÕES GERAIS..................................... 171 6.2 METODOLOGIA DE PROJETO - UNIDADES HABITACIONAIS (UHs) - ANÁLISE DE PARÂMETROS MÍNIMOS SEGUNDO A LEI MOURA (Nº 10.928/91).......................................................... 176 7. REFERÊNCIAS PROJETUAIS................................................................................................185 7.1 SOBRE O “EVITAR” - “CASAS-CAIXÃO” EM HONG KONG, CHINA........................................ 185 7.2 SOBRE O “SEGUIR” - UNITE D’ HABITACION - LE CORBUSIER............................................... 189 7.3 SOBRE O “SEGUIR” - HABITAÇÃO SOCIAL + TURISMO EM HAVANA, CUBA................... 191 8. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO...........................................................................................197 8.1 PROTÓTIPOS HABITACIONAIS.......................................................................................................... 197 9. SÍTIO DE EXPERIMENTAÇÃO..............................................................................................208 9.1 A RUA CONDE DE SÃO JOAQUIM (DISTRITO BELA VISTA).................................................... 208 9.1.1 Histórico...................................................................................................................................... 208 9.1.2 Levantamento da morfologia atual.................................................................................. 215 9.1.3 “Projeto de Requalificação Urbana - Bela Vista” - PAC................................................. 219 9.2 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: A PERDA DE IDENTIDADE........................................................ 227 10. INTERVENÇÃO...................................................................................................................231 10.1 IMÓVEIS ESCOLHIDOS....................................................................................................................... 231 10.1.1 IMÓVEL ENCORTIÇADO 121 123 127 129 (R. Conde de são joaquim, bela vista sp)................................................................................................................................................................ 235 10.1.2 IMÓVEL ENCORTIÇADO 133 135 137 (R. Conde de são joaquim, bela vista - sp) 244 10.2 PROJETO: APLICAÇÃO DE METODOLOGIA EM CASO REAL................................251 CONCLUSÃO............................................................................................................................265 REFERÊNCIAS..........................................................................................................................267


FIGURA 1: Jornal Folha de São Paulo. Edição 13/11/1977. Fonte: Acervo Folha, 2019.


INTRODUÇÃO

A escolha do tema “cortiços” para desenvolver esse trabalho, se deu primeiramente a partir de uma indignação pessoal sobre as condições precárias às quais são submetidas a população correspondente à faixa mais pobre em nosso país; segundo, porque não se faz jus à nossa Constituição; terceiro, que essa faixa da população é deduzida sob as perspectivas politica e econômica, apenas como mão de obra barata; quarto, que em grandes cidades - como é o caso de São Paulo -, essas pessoas, - principalmente as que se encontram em situação de rua, ou moradores de favelas, por exemplo -, chegam a ser considerados como empecilhos ao desenvolvimento local; e quinto, pela invisibilidade consentida por tamanha precariedade, encontrada não somente nas áreas centrais, como também nas periferias. São todos vítimas de um sistema desigual que se enraizou sob uma visão de ordem: “de-cima-para-baixo”.

Um tempo depois, ao unir minhas indignações quanto à produção de habitação de interesse social no Brasil a uma realidade paralela recentemente descoberta através dos cortiços, despertou-me o interesse em saber quando e como iniciou-se a demanda por moradia social - entende-se social por ser financeiramente acessível - dentro da cidade de São Paulo.

O meu primeiro contato, ou a minha “tomada” de consciência sobre a realidade dos cortiços maquiada pelas belas - mesmo que degradadas - casas na região da Santa Ifigênia, na Sub. Sé -, aconteceu em março de 2018, por meio de um passeio/percurso elaborado pelo coletivo PISA em parceria com o SESC 24 de Maio, chamado “Os cortiços e a cidade”. A cada quadra percorrida do bairro era uma nova descoberta histórica, e uma das questões que mais chamavam a atenção dos demais participantes, era a falta de zelo para com o patrimônio.

No Capítulo 4 (O entorno e sua estrutura urbana), é o segundo momento de investigação, agora em uma unidade administrativa, a Subprefeitura da Sé, composta por diversos índices que permitem a compreensão geral na sua dimensão demográfica, econômica, ambiental, social, legislativa e outras variantes, como índices de educação e moradia. A partir desse estudo, foi capaz compreender quais são as condições que favorecem a permanência da habitação coletiva precária de aluguel nas áreas centrais.

Os Capítulos 1 (O Cortiço), 2 (A transformação da vila em metrópole) e 3 (A influência modernista na produção de HIS), são frutos dessa primeira investigação, com o intuito de identificar o objeto de estudo, suas raízes, condicionantes e variáveis; o contexto histórico inserido; os atores e coadjuvantes; as influências externas que se tomaram ao tentar contornar a falta crescente de moradia; e quais foram os efeitos das decisões públicas e privadas sobre a vida da base e principal parcela da sociedade capitalista: os operários.

Já no Capítulo 5 (Cortiços em números), as


composições e variantes da dimensão dos cortiços são quantificados, estabelecendo parâmetros comparativos aos dados coletados de fontes públicas, em anos anteriores, mas que permitem ter uma noção de onde se concentram esse tipo de moradia, em quais condições físicas, afetando quantas pessoas e conjuntos de famílias, além de parâmetros para a qualificação dos imóveis encortiçados, sob fiscalização pública pautada pelas diretrizes da Lei Moura nº 10.928 de 1991, sendo a única a regulamentar em todo o país, a definição e as condições mínimas aceitáveis de habitabilidade nesses espaços. E concluindo parcialmente, o Capítulo 6 (Estudo do Objeto), compreendendo o terceiro momento investigativo da pesquisa, em um recorte mais aproximado da escala dos lotes, delimitados pelo perímetro da Rua Conde de São Joaquim, no distrito da Bela Vista - um dos únicos que ainda hoje mantém elementos de diversas naturezas, considerados como patrimônio histórico, paralelo a condição da maior concentração de cortiços entre os distritos da Subprefeitura Sé.

lei, a criação de um espaço integrado ao urbano e coerente às dinâmicas sociais encontradas nessas moradias coletivas, que contraditoriamente, são fortalecidas pelas precariedade, mas não suficientes para estimular que cada uma dessas pessoas em situação de vulnerabilidade, reconheçam seus direitos, se sintam incluídas na sociedade e conquistem a tão sonhada dignidade. A metodologia desse trabalho desenvolveuse a partir de pesquisas bibliográficas, trabalhos acadêmicos, visitas na área projetual, à Museus e ao Arquivo Municipal de São Paulo, além da rica contribuição de conversas realizadas com professores arquitetos, profissionais com experiência no assunto, tanto em nível projetual quanto no levantamento socioespacial, e com moradores da região, preocupados com a qualidade de vida dentro dessas habitações precárias. Mídias e sites de arquitetura também serviram de apoio, principalmente como fonte de figuras. Algumas atividades extracurriculares também foram importantes para o processo, como cursos e entrevistas com imigrantes - material não incluso nesse trabalho.

Dessa forma, pretende-se extrair por meio desse - extenso e necessário - levantamento teórico, a base fundamental para o desenvolvimento projetual que será realizado na segunda e última parte desse trabalho, de modo a encontrar soluções alternativas à tipologia habitacional, condicionada pela preexistência, atualmente sem se aproveitar das características arquitetônicas que exaltam o valor patrimonial da construção na paisagem urbana, considerando assim a partir desse fato e das condições mínimas definidas por

FIGURA 2: Vista parcial do skyline de São Paulo, a partir do terraço do edifício Copan. Fotografia: Autoral, 11 de julho de 2016.




1. O CORTIÇO Uma alternativa de moradia?

Definições, tipologias, Cortiços vs Vilas

FIGURA 3: Imóvel encortiçado na Mooca, SP. Fotografia: Autoral (editada), 30 de março de 2019.


OS CORTIÇOS REPRESENTAM A LUTA DE MILHARES DE PESSOAS PELO DIREITO À MORADIA FRENTE A UM DÉFICIT HABITACIONAL CENTENÁRIO NA CIDADE DE SÃO PAULO (LEITE, G. F. T., 2019).

1. O CORTIÇO 1.1 DEFINIÇÕES E CARACTERÍSTICAS GERAIS

Considerado como uma das modalidades de moradia popular mais antigas na cidade de São Paulo – paralelamente às vilas –, os cortiços são referencidos por alguns estudiosos como HCPAs, Habitações Coletivas Precárias de Aluguel (PICCINI, 2004, p.21 e 25), e representam além de um déficit habitacional centenário na cidade, a luta de milhares de pessoas pelo direito à moradia em um espaço dotado de infraestrutura e ofertas de trabalho, frente à resistência da elite paulistana e dos interesses imobiliários. Os primeiros relatos desse tipo de moradia na capital retomam ao fim do século XIX, em torno de 1870, “quando jornais e documentos oficiais apontavam a proliferação dos cortiços na antiga província, em bairros como a Santa Ifigênia e Bela Vista” (LÓPEZ, FRANÇA e COSTA, 2010, p.19). O período dos primeiros registros entre 1870 e 1892, coincidem com o início da transformação de São Paulo em Metrópole. Desde então, os cortiços tiveram diversas denominações de acordo com o período histórico-político. Segundo Piccini (2004, p.22), entre as mais populares estão: “casa de cômodo”, “cabeça-de-porco”¹, “estância”, “zungu”, “pensão”, “hotel”, “hospedaria”, “vila”, “quintal”, “estalagem”, e “fileira de quartos ao longo de um corredor”. Apesar da variedade, todos os nomes se referem a uma “habitação de classes pobres”, e no

1. A nomenclatura foi encontrada recentemente como alternativa à palavra “cortiço”, na tabela quantitativa de domicílios segundo o tipo de residência no ano de 2010, elaborada pela Info Cidade e disponibilizada pela Prefeitura de São Paulo em seu portal online.

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geral, carregam consigo conotações socialmente negativas em relação às condições de moradia (LÓPEZ, FRANÇA e COSTA, 2010, p.20 e 21). Os cortiços se caracterizam por apresentarem condições subnormais² de moradia, como “instalações sanitárias compartilhadas entre vários cômodos, alta densidade de ocupação, circulação e infraestrutura precárias, acesso e uso comum dos espaços não edificados e altíssimos valores de aluguel por m² edificado” (HABITASAMPA 2016, n.p), localizados principalmente em áreas próximas ao centro e em edificações de caráter horizontal (baixo gabarito). Ao longo da história sempre foram imediatamente relacionados aos problemas de higiene, principalmente a partir do ano de 1885 quando a população da cidade de São Paulo sofre com um surto de varíola.

“O médico da Câmera Municipal, Dr. Eulálio da Costa Carvalho, na sessão de 18 de novembro de 1885, expõe o grave problema sanitário que ele considera deveria ser solucionado pelo poder público, o qual necessitaria impor normas para a construção de cortiços, principalmente para ‘aqueles que sirvam à residência comum de muitos indivíduos [...]’. Mostra ele que o crescimento da Capital tem provocado o aumento do número de cortiços e neles são esquecidos ‘todos os conselhos de higiene, quer na construção, quer na conservação deles” (BLAY, 1985, p.61).

2. Abaixo do normal, ou nesse caso, uma situação inferior ao considerado ideal para uma moradia digna.


FIGURA 4: “Cortiço do Snr. Gordinho - a primeira porta é a latrina comum abrindo-se para a rua”. Fonte: CAMPOS, 2002, p.138. Esta cena foi fotografada pelo médico sanitarista Geraldo Horácio de Paula Souza, durante a sua atuação no Serviço Sanitário, entre os anos 1922 e 1927. Na época, as visitas de técnicos de saúde a lugares insalubres, irão acontecer principalmente em decorrência da Reforma do Código Sanitário de 1925, que se concretizava mais pela necessidade de modernizar São Paulo aos moldes do urbanismo Europeu - à favor da burguesia -, do que pelas condições precárias das moradias populares.

Já nessa época, a definição de “cortiços” é exigida por construtores à Câmara Municipal de São Paulo para saber se as suas casas serão classificadas como tal ou se estarão dentro dos padrões aceitáveis exigidos institucionalmente pela cidade em plena urbanização³. No “Relatório de Exame e Inspecção das Habitações Operárias e Cortiços no Distrito de Santa Ephigênia”4 entregue à Câmera pelo Intendente Municipal Cesário

3. “Desde 1871, quem pretendesse construir na cidade tinha que fazer pedido à Câmera Municipal a fim de obter um ‘alinhamento’ da rua onde a construção se faria; havia também um padrão de construção que especificava altura de telhados, portas e janelas, assim como a largura das mesmas” (PINHO, MARCIA, R., 1974, p. 34 apud BLAY, 1985, p. 62)

Ramalho da Silva, em 1893, são apresentados os seguintes conceitos e características, respectivamente: “[...] construções acanhadas, insalubres, repulsivas algumas, onde as forças vivas de trabalho se ajuntam em desmedida, fustigadas pela dificuldade de viver numa quase promiscuidade que a economia lhes impõe, mas que a hygiene repele.” [...]

4. Segundo Bonduki (2017), “é a primeira pesquisa sobre moradia dos trabalhadores paulistanos e mais completa descrição da habitação dos trabalhadores no final do século XIX, em São Paulo”. As leis e relatórios relacionados à higiene serão detalhados mais à frente no Capítulo 2.

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“1º pela má qualidade e impropriedade das construcções; 2º pela falta de capacidade e má distribuição dos aposentos, quasi sempre sem luz e sem a necessidade ventilação; 3º pela carência de prévio saneamento do terreno onde se acham construídos; 4º finalmente pelo desprezo das mais comezinhas regras de hygiene domestica” (SOUZA, 2011, p. 40).

Em 1894, “as leis que regulamentam a edificação distinguem habitação geral e habitação das classes pobres”, definindo os seguintes padrões: desejável e aceitável, e o insalubre e inaceitável, estando os cortiços representados por esse último (DIAS, 1990, p. 73). Até hoje, os cortiços são regulamentados por uma única lei, a nº 10.928 de 1991, conhecida popularmente como Lei Moura5, sancionada a partir do projeto de Lei nº 504/1989, do então vereador Luis Carlos Moura. Nela encontra-se a seguinte definição e características: “Define-se cortiço como a unidade usada como moradia coletiva multifamiliar, apresentando, total ou parcialmente, as seguintes características: a) Constituída por uma ou mais edificações construídas em lote urbano; b) Subdividida em vários cômodos alugados, subalugados ou cedidos a qualquer título; c) Várias funções exercidas no mesmo cômodo; d) Acesso e uso comum dos espaços não edificados e instalações sanitárias; e) Circulação e infraestrutura, no geral precárias; f ) Superlotação de pessoas.”

Apesar das variáveis percebidas na comparação dessa modalidade de moradia quanto a sua precariedade, desde os seus

primeiros registros na história até os dias de hoje serem praticamente nulas, a lei já se encontra defasada e necessita ser revista para o atendimento de questões atuais e que afetam outras esferas além do problema habitacional físico-estrutural (infraestrutura interna e externa), como socio-econômico-culturais (saúde, educação, aluguel, entre outras) das pessoas em situação de encortiçado. De acordo com Piccini, “A qualidade dos cortiços em geral é caracterizada por falta de manutenção do edifício, com infiltração de água de chuva, de esgoto e entupimento das canalizações, curtos-circuitos na rede elétrica já velha e sem manutenção, falta de iluminação e ventilação naturais nos cômodos. Isso, do ponto de vista social, verificamos a coabitação forçada, involuntária e sem privacidade.” (PICCINI, 2004, p. 26).

Como veremos no Capítulo 2, os cortiços na história da cidade de São Paulo nunca foram considerados uma opção digna de moradia, tanto pelo poder público quanto pelos os seus próprios moradores, que se submetem à tal situação de precariedade e exclusão social involuntariamente por necessidades provocadas pelo próprio sistema capitalista, unilateral e segregador.

CONQUANTO O LOCAL SE PRESTE A CONSTRUÇÃO SOLICITADA, CONTUDO INFORMO-VOS QUE SUPLICANTE PRETENDE CONSTRUIR SUAS CASAS COM ENTRADA E QUINTAL COMUN, ALÉM DISSO PELA DISTRIBUIÇÃO SE NOTA QUE FACILMENTE TRANSFORMAR-SE-Á A CASA EM UM VERDADEIRO CORTIÇO. (DIAS, 1989). Relato de um agente público sobre a análise da planta de uma casa.

“ 5. Ver anexos.

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Acesso aos cubículos

Acesso comum

Quintal/Corredor

Rua

Acesso venda/cubículo + valorizado

Cômodos que podiam ser facilmente convertidos em cubículos de aluguel

FIGURA 5: “Duas casas. Empreiteiro Português. 1815 - R. Monsenhor Andrade”. Fonte: DIAS, 1989, p.147. A planta acima foi enviada à prefeitura para que fosse aprovada a sua construção. Segundo a análise dos técnicos, alerta-se que pela configuração dos ambientes - dispostos ao longo de um corredor -, que facilmente tornar-se-ia um cortiço, como relata a citação ao lado. Dias (1989), reproduz em seu livro diversas plantas documentadas no Arquivo Municipal de São Paulo, analisando-as de acordo com as leis vigentes, entre os anos de 1870 e 1914.

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Sobe

Novos acessos previstos Acessos existentes Áreas internas - provavelmente para iluminação e ventilação Cozinha existente (possível cubículo) Possíveis cubículos para aluguel Possível banheiro (único) Rua

Acesso comum

Área privada comum

FIGURA 6: “1902 - Travessa do Mercado”. Fonte: DIAS, 1989, p.148. Nesse caso, segundo Dias, a planta não foi aprovada, pelos mesmos motivos citados anteriormente: compartimentação características dos ambientes, voltados para um único corredor. Nesse caso, há um grande espaço em comum denominado “quintal”, o que caracterizaria o cortiço como tal. Os ambientes são aparentemente muito pequenos. Apenas uma área é identificada como “molhada”, ou seja, aonde ficaria o tanque de lavar roupas ou um banheiro, o que seria em número insuficiente para as incontáveis famílias que viriam aí morar.

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1.2 TIPOLOGIAS

Símbolo da “espoliação da reprodução da força de trabalho, da especulação com a terra urbana e da ausência de políticas habitacionais voltadas aos segmentos sociais de mais baixa renda” (SIMÕES JUNIOR, 1991, p.6), o fenômeno dos cortiços ao longo da história de São Paulo manifestou-se de formas variadas. Devido ao seu alto grau de rentabilidade, os investimentos de especuladores foram desde a construção de barracões no fundo de comércios e casas de periferias até casarões degradados pelo tempo e falta de manutenção, subdivididos no maior número possível de cubículos, o que torna o valor do aluguel injusto se for comparado preço por m² com algumas regiões nobres da cidade. Assim, os cortiços tornam-se um investimento notável e não menos humilhante para quem devido suas baixas condições econômicas são obrigados a submeterse à única moradia acessível, imposta pelo sistema socioeconômico, e capaz de garantir sua sobrevivência apesar das condições sub-humanas de habitação. Em São Paulo, a moradia precária de aluguel surge originalmente nos bairros centrais como Sé, Santa Efigênia, Bela Vista, Consolação, e em bairros operários como Brás e Mooca, vindo aparecer posteriormente, a partir do séc. XIX, em bairros nobres como Campos Elísios e na região

da Paulista (Alameda Santos, R. Oscar Freire), ainda que nunca tenham sido aceitas pela Prefeitura e muito menos pela elite, que procuraram eliminálos das áreas centrais por motivos que alegavam ser “estéticos” e “sanitários”, já que pelo estado crítico em que se vivia nessas moradias, os agentes de saúde não as enquadraram no “padrão higiênico e unifamiliar” prescrito pelo poder público para habitações operárias. Mas, apesar dos esforços, os cortiços nunca se extinguiram por completo, e passaram a viver nessas áreas em condição de clandestinidade (SIMÕES JUNIOR, 1991, p.8 e 11). As primeiras tipologias encontradas e classificadas como cortiços, aparecem no “Relatório de Exame e Inspecção das Habitações Operárias e Cortiços no Distrito de Santa Ephigênia” de 1893, onde se compartilha da promiscuidade da forma de viver “aglomerado, em cubículos e porões anti-higiênicos” (SIMÕES JUNIOR, 1991, p.9), um dos principais fatores apontados para o surgimento e alastramento de doenças e que na época assustavam a elite com os riscos de infecções – motivo pelo qual a atenção pública se volta aos cortiços, sob um levantamento das suas condições de moradia e tipologias construtivas correspondentes. São elas: a) Cortiço de quintal: em geral, ocupa o

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centro do quarteirão, com um pequeno corredor de acesso à rua. Localizando-se quase sempre, em frente ao lote, um prédio com uso comercial; b) Os cortiços improvisados: edificados no fundo de depósitos de materiais de construção, de bares e de oficinas, nas cocheiras e estábulos. Em geral muito precários, construídos com tábuas e cobertos com zinco; c) O cortiço-casinha: como prédio independente e com frente para a rua, também chamado de pensão;

dois andares com o piso inferior abrigando uma atividade de comércio ou serviço e o piso superior encortiçado, antigas vilas operárias e ruas particulares que tiveram suas casinhas encortiçadas, e ainda os prédios de apartamentos encortiçados.

Há também uma classificação da PMSP (Prefeitura Municipal de São Paulo) dos anos 80, que divide os imóveis por categoria e tipo arquitetônico, classificando-os em dois tipos: •

Imóveis adaptados para cortiços construídos originalmente para o uso residencial unifamiliar, multifamiliar ou misto. São edificações de 1 ou 2 pavimentos, eventualmente com porão e quintal, com divisão precária dos cômodos originais em cubículos entre 4m² e 10m². Apresentam superlotação de até 7 pessoas por quarto, com serviços higiênicos e sanitários coletivos externos, alcançando uma média de 50 pessoas para cada 1 ou 2 banheiros e tanques.

Imóveis concebidos como cortiços e construídos especialmente para fins de locação. São lotes com edificações diferenciadas do tipo vila de cômodos, horizontais ou assobradados. São chamados mais comumente “quintal de periferia” ou “avenidas”. São fileiras de quartos no fundo de lotes de uma residência unifamiliar autoconstruída. Frequentemente são espaços de uso misto, comercial e residencial. (Pesquisa; Frente e Verso, 1986 apud PICCINI, 2004, p.24).

d) O hotel-cortiço: com uso de restaurante de dia, servindo a noite de dormitório onde a população operária se aglomera para dormir; e) A casa-de-cômodos: prédios de sobrado convertidos em cortiço por meio de divisões e subdivisões dos primitivos aposentos transformados. (SIMÕES JUNIOR, 1991, p.8; PICCINI, 2004, p. 21 e 22). Os cortiços não eram apenas casas transformadas (encortiçamento), mas também as construídas para esse fim (BLAY, 1985, p.1), e que ainda hoje são encontrados nas condições citadas acima, sendo a mais comum a habitação coletiva composta por inúmeros cômodos distribuídos ao longo de um corredor ou em volta de um pátio. Segundo Simões Junior (1991), são ainda encontrados tipos menos frequentes como comércio na frente do lote com construção encortiçada no fundo, o prédio comercial de 3 a 5 andares que teve seu uso inicial abandonado e se encortiçou, prédios de

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As tipologias de cortiços e suas condições variam de acordo com a área em que se concentram. Nas áreas centrais e intermediárias da cidade, onde grande parte das construções são antigas e o valor da terra vem se desvalorizando ou já desvalorizou (em geral áreas fabris abandonadas, zonas residenciais localizadas fora da direção dos vetores de expansão dos valores imobiliários, áreas ambientalmente deterioradas por tráfego intenso, ruídos, etc...), a presença predominante são de “imóveis adaptados” para cortiços, e que segundo Simões Junior (1991, p.23), afetam parcialmente os bairros do Brás, Pari, Barra Funda, Campos Elíseos; já em áreas periféricas como nos bairros de Pirituba, São Mateus, Vila Prudente e Vila Maria, os “imóveis concebidos” como cortiços são a forma dominante encontrada. A existência e permanência dos cortiços também estão condicionadas não somente ao estado de deterioração, mas também valorização da área, onde a sua presença costuma ser temporária (ao contrário das áreas desvalorizadas) devido ao aumento do valor induzido por planos de renovação urbanística ou empreendimentos imobiliários especulativos - principais indutores da gentrificação -, como pode ser observado, por exemplo, em algumas ruas da Bela Vista, Liberdade, Cambuci, Ponte Pequena, Mooca, Perdizes e Pinheiros. Nesses casos, o imóvel é mantido pelo proprietário como moradia de aluguel, mas sem nenhuma manutenção até que o mesmo seja valorizado e vendido, gerando desapropriações compulsórias (SIMÕES JUNIOR, 1991, p.24).

De forma geral, os cortiços localizam-se e mantém-se em áreas urbanas já consolidadas da cidade, servidas de infraestrutura e oferta de emprego, presentes na cidade de São Paulo em maior número nos bairros mais adensados ao longo dos anos 80, como Liberdade e Bela Vista.

AS CONFIGURAÇÕES VARIADAS DE CORTIÇOS NO TECIDO URBANO ABRIGAM AS MESMAS VIDAS HUMILHADAS EM BUSCA DE DIGNIDADE ATRAVÉS DA SUA FORÇA DE TRABALHO (LEITE, G. F. T., 2019).

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FIGURA 7: “Cortiço, R. Itambé, 15”. Fonte: CAMPOS, 2002, p.139. Esta cena foi fotografada pelo médico sanitarista Geraldo Horácio de Paula Souza, durante a sua atuação no Serviço Sanitário, entre os anos 1922 e 1927. Na foto, percebe-se no canto inferior direito alguns utensílios que provavelmente eram usados para lavagem de roupas. Ao fundo, vê-se roupas estendidas, inclusive é uma cena muito comum nos cortiços até os dias de hoje, seja em um varal, nas janelas ou em varandas.

FIGURA 8: “Bêbado em pátio de cortiço”. Fonte: CAMPOS, 2002, p.138. Esta cena foi fotografada pelo médico sanitarista Geraldo Horácio de Paula Souza, durante a sua atuação no Serviço Sanitário, entre os anos 1922 e 1927. Os pátios de cortiços como esses são um espaço intermediário entre o público e o privado, e fazem a conexão das casas/cubículos (privados) com a rua (pública).

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FIGURA 9: “Navio Parado”, primeiro bloco de habitação de São Paulo, segundo Nabil Bonduki. Fonte: BONDUKI, 2017, p.76.

FIGURA 10: Em primeiro plano “Pombal”; no centro, a entrada do complexo abaixo da passarela. Fonte: BONDUKI, 2017, p.76.

FIGURA 11: O “Vaticano” ao fundo, e a “Geladeira” em primeiro plano. Fonte: BONDUKI, 2017, p.77.

3 1

2

4

1 - “Vaticano”

2 - “Geladeira” 3 - “Navio Parado”

FIGURA 12: Planta do Complexo de cortiços Vila Barros Fonte: BONDUKI, 2017, p.63, 76-77.

4 - “Pombal” FIGURA 13: “Territórios de Sociabilidade” Fonte: BONDUKI, 2017, p.77.

Considerado um dos maiores - e labirínticos - conjuntos de cortiços da cidade de São Paulo (BONDUKI, 2017, p.62), foi implantado pelo Sr. Francisco de Barros, em 1920, entre as ruas Japurá, Santo Amaro e Jacareí (distrito da Bela Vista), composto por prédios independentes, cada qual com suas peculiaridades físicas e sociais. O “Vaticano” foi o primeiro a ser subdividido para locação, transformando-se em um “cortiço-casa de cômodos”. O “Navio Parado” e o “Pombal” foram construídos depois, tal como a “Geladeira” (o mais precário - umidade e superlotação), todos se conectavam por um pátio no meio da quadra, onde os moradores se socializavam e se fortaleciam. Símbolo da produção rentista, o conjunto foi demolido em 1948, para dar lugar ao Conjunto Residencial Japurá (IAPs), fruto da mudança que se previa no formato da produção de habitação social.

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“ 1.3 CORTIÇOS VERSUS VILAS OPERÁRIAS

Representantes das únicas modalidades de moradia popular existentes no século XIX até meados do século XX, o cortiço e a vila, estão mais intrinsecamente relacionados do que se pensa. Apesar das diferenças existentes entre ambos quanto configuração espacial – além de diferirem nas relações de inquilinato em alguns casos, como também na aceitação social –, a vila é o modelo habitacional do qual se originam os cortiços no século XIX. Classificada por Bonduki (2017, n.p) junto aos cortiços – como a “produção rentista da habitação” a partir do contexto capitalista que se intensifica com a industrialização da cidade de São Paulo a partir dos anos 1900, a moradia na forma de vilas operárias encontra suas raízes no período escravocrata, considerada por Blay (1985, p.30) como “sucedâneo da senzala”, que não era exatamente o produto, mas tinha como objetivo – desde o momento que o proprietário destinava parte da sua casa senhorial para esse espaço –, proteger a sua mercadoria: o escravo; e que vai coincidir em condição de subordinação com o papel do operariado e o empresário, que apesar da sua condição de trabalho livre, se vê “escravo” à sua força de trabalho, produto de troca pelo o uso (e não posse) de sua moradia, atribuindo assim à

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AS VILAS REPRESENTAM O MODELO DE MORADIA POPULAR, DEFENDIDA PELO PODER PÚBLICO A SUA REPLICAÇÃO: ERA SALUBRE, DIGNA E UNIFAMILIAR, E CONTRARIAVA OS CORTIÇOS: INSALUBRES, DESUMANOS E CLANDESTINOS. AINDA QUE POR UM DESCUIDO, AMBOS PUDESSEM SE CONFUNDIR.

casa na vila operária “um valor de uso e um valor de troca” (BLAY, 1985, p.11). Portanto, por serem moradias de aluguel, podemos entender a “produção rentista” como a maneira que a habitação social foi pensada em um produto “dentro da teoria das ‘necessidades sociais’, num sistema econômico regido livremente pela procura e oferta.” A moradia é então produzida de acordo com o seu consumo pelos trabalhadores (BLAY, 1985, p.20). Blay (1979, p.78 apud 1985, p.7), identifica as vilas como um “conjunto de casas construídas no interior de um terreno”, com uma entrada que conecta a via interna – para qual as casas estão voltadas – direto a via pública. Essa é uma das características que se assemelham a tipologia de cortiço mais frequente encontrada em São Paulo, onde os cubículos que adentram o quarteirão estão voltados para um pequeno corredor ou para um quintal, e que também fazem o intermédio entre o espaço público e o privado. Bonduki (2017, p. 61 e 62) destaca ainda a importância desse espaço “comum dos empreendimentos rentistas”, que além de circulação, eram onde se desenvolviam as relações sociais e atividades coletivas:


“[...] brincadeiras de crianças, áreas de lavar e secar roupas, rodas de cantorias e batepapo, festas de São João. As reduzidas dimensões das moradias e a identidade étnica reforçavam a sociabilidade e o uso desse espaço público. Já nas vilas de empresas, esse espaço semipúblico é mais controlado pelas regras definidas pelo patrão.”

A transição de vilas para cortiços ou de cortiços para vilas ao longo da urbanização da cidade paulistana era frequente, o que representava a ascensão ou regressão de classes, como uma espécie de “escala social”, o que interferia tanto no valor dos aluguéis quanto na configuração interna das habitações. Segundo Bonduki (2017, p.9), no caso do declínio da classe média ou do trabalhador qualificado, os “Aluguéis decaiam e iam se adequando aos níveis salariais. Também entre os investidores a questão se colocava de forma semelhante: a partir de um certo nível de qualidade, o empreendimento deixava de ser permitido por lei e de obedecer aos padrões municipais e se situava na faixa dos ‘clandestinos’. Isto é, deixava de ser vila e de merecer incentivos e elogios e passava a ser cortiço, condenado e estigmatizado”.

No caso oposto, quando os cortiços viram vilas, a principal mudança que eleva o status da moradia perante a sociedade e ao mercado, é a construção de banheiros individuais. A valorização do imóvel nesse caso é logo convertida pelo proprietário no aumento do aluguel. Essa é a diferença mais marcante entre as vilas e os cortiços, onde os equipamentos hidráulicos na primeira são de uso individual, e no segundo são de uso coletivo (BONDUKI, 2017, p. 61-2) e geralmente em número insuficiente para a quantidade de usuários, fato

esse que depreciava ainda mais a qualidade e descartava os cortiços como opção de moradia pelo poder público. A partir do Relatório Sanitário de 1893, as vilas operárias são consideradas e indicadas pelos sanitaristas como o modelo de moradia popular digna e salubre, recebendo consequentemente incentivos públicos para serem construídas, o que também as difere em relação aos cortiços, malvistos pela sociedade e proibidos dentro do perímetro urbano central da cidade, existindo em clandestinidade, como dito anteriormente. “[...] a capital de São Paulo está hoje em condições de prender a melhor atenção dos poderes públicos neste ponto de vista. [...] A impressão que a autoridade sanitária sente ao penetrar nesses recantos imundos é indescritível, pois fica extasiada diante o fato, sem poder, por falta de uma legislação especial, providenciar radicalmente” (VEIGA, 1894 apud BONDUKI, 2017, p.34).

A falta de controles estatais sobre o valor do aluguel, a segurança de lucro no mercado imobiliário e o grande crescimento e dinamismo econômico da cidade de São Paulo, vieram a calhar junto aos incentivos e vantagens fiscais6 oferecidas pelo poder público a quem construíssem vilas. Durante a “Primeira República” (1889-1930), o excedente econômico na mão dos investidores advindo da economia cafeeira era fonte destinada aos investimentos imobiliários, já que o setor industrial passava por crises de excedente de produção e desproporcional consumo, e a cafeicultura apresentava alto risco devido períodos cíclicos de altos e baixos na produção. Porém vale ressaltar, que a rentabilidade garantida pelo

6. A exemplo das Leis 413 de 1901 e 1.098 de 1908, que isenta de impostos Municipais e concede favores à construção de vilas operárias de acordo com o Padrão Municipal, reforçando a intenção de eliminar os cortiços. (SANCHES, 2015, p. 162; e DIAS, 1989, p. 33).

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Platibanda (influência estilística aos moldes europeus, servia para esconder os telhados, ou esquecer o passado colonial)

Telhado Lembrança da arquitetura colonial

Janelas “altas e amplas, elevadas ao nível do passeio”

Assoalho com ventilação altura mínima de 50 cm

FIGURA 14: “1896 - R. Maria José”. Acima, elevação da fachada indicada na planta ao lado. Fonte:: DIAS, 1989, p.120. A denominação das habitações isoladas como “casa de operário”, segundo Dias (op.cit, p.74), se dá pelo motivo de apresentarem quase sempre as mesmas características arquitetônicas quanto a compartimentação dos ambientes: “a sala voltada para rua; depois os quartos com janelas que se abrem para um corredor lateral; cozinha nos fundos, ligando-se à sala através dos quartos; por vezes, uma latrina nos fundos. As janelas são altas e amplas, elevadas em relação ao nível do passeio”. Em vista das plantas mostradas anteriormente, a configuração da planta ao lado recorda a mesma que facilitam a transformação ao longo do tempo e do interesse do proprietário, em cortiço. Nesse caso em específico, alguns quartos da casa foram transformados em cômodos com outros usos, uma adaptação que ocorrera ao longo do tempo na maioria das casas de classe média em adaptação de novos objetos, móveis e costumes. O uso de platibandas, bem como um tamanho mínimo definido para elevação do assoalho, eram medidas obrigatórias dentro do perímetro urbano7, definidas pelo Código Sanitário da época. Nesse caso específico, estava em vigência o Código Sanitário de 1894, que mantém como base o Código de 18868 e dá outras providências para a construção de habitações, classificadas como “geral” ou “das classes pobres”: “Habitações em geral - implantação - ‘As casas nunca deverão ter maior altura do que a largura das ruas, excepto quando ficarem fora do alinhamento das ruas, ou na hypothese de construção ou reconstrução em ruas estreitas e antigas’; - saneamento do solo - ‘Nenhum edifício ou habitação deverá ser construído em terreno que haja servido para depósito de lixo ou imundices. Para receber construções deverá o solo ser previamente preservado contra a influência do lençol de água subterrâneo, de modo que a humidade não atinja ao interior das habitações, aos alicerces e ao solo dos porões.’ A superfície do solo ocupada por habitações deve ser revestida de camada impermeável e uma faixa de 60 cm; em torno das habitações também deve ser impermeabilizada; - impermeabilização - cozinhas e solo devem ser revestidos de camada lisa e impermeável. As paredes devem ser impermeáveis até 1,50 m acima do chão. - dimensões - as paredes devem ter no mínimo 30 cm de espessura; o soalho deve estar 50 cm acima do solo; ‘os diferentes andares, até 3, deverão ter a altura máxima de 4 m; de 3 m diante essa altura será proporcional à largura e altura total do

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Acessos existentes Ambientes sociais (possível cubículo) Cozinha existente (possível cubículo) Possíveis cubículos para aluguel Banheiro Quintal/Corredor E1

Acesso comum

Rua

prédio e à quantidade de indivíduo, em cada anda, o espaço nunca inferior a 14 m cúbicos livres’; os porões não podem servir de habitação; pé-direito mínimo: 4 m; os aposentos destinados à permanência contínua dos habitantes ou dormitórios devem receber luz direta. Habitações das Classes Pobres O que pretende: - ‘Deve ser terminantemente prohíbida a construção de cortiços, convindo que as municipalidades providenciem para que desapareçam os existentes’; - ‘Não devem ser toleradas as grandes casas subdivididas, que servem de domicílio a grande número de indivíduos’; - ‘As villas operárias deverão ser estabelecidas fora da aglomeração urbana’; - ‘As casas para habitação das classes pobres deverão ser construídas em grupos de 4 a 6, no máximo’; Fixa a área mínima: - nos aposentos de dormir: mínimo de 14 m³ por indivíduo Quanto ao saneamento: - ‘Não deve ser permitida lavagem de roupas no interior destas habitações e, para evitá-lo convém que as municipalidades cuidem do estabelecimento de lavanderias públicas.’” (DIAS, 1989, p. 55-6).

7. Ver Capítulo 2 8. Idem.

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FIGURA 15: “Planta do typo de cortiço urbano”. Fonte: CORDEIRO (org.), 2010. Segundo Bonduki (2017, p. 67), esse foi um modelo de “casinha mínima” proposta para a “produção rentista” pela Comissão de Exame e Inspeção dos Cortiços, em 1893, e que servirá de base para projetos posteriores de vilas operárias. Segundo o Código de 1894, seriam definidas como “habitações insalubres que devem ser saneadas as que: • • • • • • • •

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não obedecem às regras [anteriormente citadas para ‘habitações em geral’ e ‘habitações das classes pobres’]; estiverem sobre solo úmido ou alagadiço; possuírem compartimentos não arejados e iluminados; encontrarem-se com falta de asseio em seu interior; tiverem lixo nos pátios e quintais; tiverem pouco cuidado na conservação das latrinas e esgotos; quando o número de indivíduos for maior que a capacidade calculada por cubação; quando conviverem homens e animais.” (DIAS, 1989, p. 57).


FIGURA 16: “Proposta de casas isoladas”. Fonte: CORDEIRO (org.), 2010. Considerada a primeira proposta de conjunto habitacional de casas isoladas, mas acabou não sendo adotada devido ao pouco aproveitamento do terreno (BONDUKI, 2017, p.67). Abaixo, ampliação dos desenhos técnicos do modelo de casa ideal sugerida pelos técnicos higienistas.

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setor imobiliário só foi possível devido à grande demanda por mão de obra gerada primeiramente pela economia do café e em segundo pelo desenvolvimento industrial da cidade, que atraíram milhares de migrantes e imigrantes em busca de uma vida melhor na capital. As primeiras vilas são construídas “no âmago do surto de urbanização da última década do século XIX, quando a Capital se torna o local para onde afluem quase 200 mil pessoas, principalmente imigrantes italianos” (BLAY, 1985, p.10). Segundo Pestana (1918, n.p), passaram pela Hospedaria dos Imigrantes9 em 1895, 104 mil imigrantes, sendo que 40% desses (o equivalente a 39 mil) permaneceram na cidade. O ano de 1886 marca a chegada em massa de imigrantes relacionadas a produção nas fazendas de café. “De acordo com Cano (1979, n.p), entraram na Província de São Paulo, entre 1886 e 1900, cerca de novecentos mil estrangeiros”, desencadeando a sua primeira crise habitacional. A partir desse momento, o mercado imobiliário em São Paulo irá seguir a lógica do capital privado, e a habitação tornar-se irá uma mercadoria como qualquer outra dentro do sistema capitalista (BONDUKI, p.9 e 25-6). Por trás do projeto das vilas operárias havia também uma lógica perversa, tanto por parte dos empresários quanto por parte da elite dirigente, que planejavam de acordo com as ideias urbanísticas inspiradas em modelos europeus, segregar os espaços, distanciando a população mais pobre dos novos bairros de classe alta, como Campos Elísios – o primeiro loteamento de elite. “Os primeiros indícios de segregação surgem a

9. A Hospedaria dos Imigrantes funcionou onde hoje localizase o Museu da Imigração do Estado de São Paulo, instituição pública vinculada à Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, localizada no bairro da Mooca. Inaugurada em 1888, a extinta Hospedaria teve um papel importante na recepção e alojamento dos imigrantes na cidade. Projetada para

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partir de 1880, com a ’diversificação das funções e o aparecimento, ao lado do velho centro, de bairros operários e de bairros residenciais finos’ (MATOS 1958, p.89 apud BONDUKI, 2017, p. 289).” Os “bairros operários”, chamados assim pela concentração de vilas operárias próximas às fábricas que se instalavam ao longo das ferrovias pela facilidade de escoamento de produtos (como é o caso da Mooca, Brás, Bom Retiro e Luz, que se configuram como tal já a partir do final do séc. XIX), vão ocupar, segundo Blay (1985, p.51), principalmente as “zonas de várzea, inundáveis e insalubres”, enquanto as casas burguesas vão erguer-se nas “zonas altas, tidas como saudáveis e mais caras”, ainda que eventualmente apareçam em pequenos números algumas casas de operários que com o tempo se tornam cortiços. É o caso de bairros como a Paulista, Cerqueira César e Jardins, onde fábricas não se edificam. Segundo Bonduki (2017, p. 29), se as habitações precárias não fossem consideradas como ameaça às condições de higiene da cidade, provavelmente nada se saberiam sobre elas, já que as únicas fontes de informação sobre são os relatórios sanitários realizados pelos técnicos que se preocuparam com a saúde da população: “É muito mais comum encontrar-se um relato de um detalhe da construção de um imponente edifício público ou privado, neoclássico ou eclético, do que uma rápida descrição de habitações populares. [...] Admiravam-se com a pujança da cidade e com as novas fachadas de platibandas e cornijas que ocultávamos semblantes das antigas edificações de influência lusitana. [...] A

receber 3 mil imigrantes, chegou a comportar 10 mil no auge do fluxo migratório. Era a partir da Hospedaria que os imigrantes eram distribuídos para as fontes de trabalho em todo o Estado. (Fonte: Site do Museu da Imigração do Estado de São Paulo. Acesso em: 07 de Março de 2019).


habitação da elite foi descrita em detalhes: sabe-se até mesmo quais flores passaram a ornamentar seus jardins em substituição aos cravos antes tão utilizados. Em contrapartida, um véu negro encobre os alojamentos dos trabalhadores: ninguém os via, ninguém os descrevia.”

Já para as empresas que promoviam as chamadas “vilas operárias de empresa” ou “vila de empresa”, “o gesto filantrópico” de produzir habitação para os seus funcionários, tinham como objetivo – além do lucro –, mantê-los sob integral vigilância, e dessa forma, ter um certo controle sobre a sua vida dentro e fora do ambiente de trabalho. Essa garantia se dava também em tempos de confrontos entre empregador e empregado quando a fábrica era fechada, e que para não perder seus funcionários, os mantinham através do objeto de troca: a casa de vila operária, que “funciona como um verdadeiro laboratório de uma sociedade disciplinar, combinando um saber higienista com um poder que ao mesmo tempo proíbe, pune, reprime e educa.” (ROLNIK, 1981, n.p apud BONDUKI, 2017, p.55). “[...] há uma clara correlação entre a abordagem de problemas habitacionais e a ocorrência de greves. Isto é, nos períodos em que estas ocorriam também o quotidiano da vida operária vinha a debate, e as questões habitacionais eram discutidas.” (BLAY, 1985, p.60).

O investimento nas vilas também foi resultado de determinadas exigências que eram feitas para que os imigrantes permanecessem próximos aos seus trabalhos nas fábricas. Algumas delas, tornavam-se praticamente mini cidades, dispondo de vários equipamentos coletivos como escolas, igrejas, enfermarias, clubes, pequeno comércio, todos administrados e sustentados

A HUMILHAÇÃO IMPOSTA PELO SISTEMA SÓCIO ECONÔMICO CHEGA AO PONTO DE OBRIGAR O OPERÁRIO A ESCOLHER ENTRE ALIMENTAR A SUA FOME OU MORAR BEM. A POSSIBILIDADE DE TER OS DOIS FOGE AOS SEUS MÍSEROS RENDIMENTOS NO MERCADO DE TRABALHO (LEITE, G. F. T., 2019).

pela indústria. Em São Paulo, a predominância do tipo de vila operária é reconhecida como “vila operária particular” ou “vila particular”, produzida por investidores que a destinava ao mercado imobiliário para locação sem vínculo empregatício, como é o caso da “Vila Economizadora”, no bairro da Luz. Ao contrário dessa, a vila de empresa foi menos frequente na capital, sendo a Vila Maria Zélia – implantada no Belenzinho por Jorge Street – uma das mais conhecidas e, que se assemelha em nível de infraestrutura com a oferta de serviços citados no início desse parágrafo. As vilas operárias, modelo de moradia “ideal” segundo higienistas e pelo poder público, no entanto, não foram construídas em número suficiente para todos os funcionários da indústria, sendo que elas eram destinadas à priori aos trabalhadores de maiores cargos e mais qualificados da empresa. Além disso, nem todo

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trabalhador tinha condições financeiras de se mudar para uma casa de vila privada, ao ponto de ter que optar entre comer e morar, como é relatado a seguir no Boletim do Departamento Estadual do Trabalho (1916, p.146): “Na classe pobre, especialmente na classe operária, o aluguel da casa absorve uma boa parte dos limitados ganhos do chefe de família. A exiguidade do salário, comum às grandes indústrias [...] põe o operário entre as portas de um angustioso problema: ou comer pouco e mal, ou morar num cortiço. Em nove casos sobre dez, ele opta pela segunda solução. Obedece ao estômago.” (apud BONDUKI, p.61).

Em 1911, segundo Bonduki (2017, p.61), nos casos em que apenas um membro da família trabalhasse, as despesas do aluguel de uma casa de vila mais os custos básicos como água e luz, poderiam chegar a 50% do salário de um operário adulto, que ganhava em média de 100$000 (cem mil-réis) a 150$000 (cento e cinquenta mil-réis) por mês, para um custo total de 45$000 (quarenta e cinco mil-réis) a 75$000 (setenta e cinco mil-réis) com habitação somados a cerca de 5$000 (cinco mil-réis) das despesas adicionais. Dessa forma, conclui-se que a questão da “escolha” por residir em uma habitação precária de aluguel não é uma alternativa consciente, mas imposta pelo sistema capitalista, sendo o único tipo de alojamento compatível com os míseros rendimentos de grande parcela dos trabalhadores da época. Tanto o cortiço quanto as vilas operárias são símbolos do grave problema habitacional que colocava em discussão o papel da população pobre no sistema de produção e consumo, ora como empecilho à vida saudável (higiênica) da

10. Serão afirmados - e não necessariamente garantidos em lei, anos depois na Constituição da República Federativa Brasileira, de 1988.

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burguesia, ora como vítima dos seus escrupulosos e parasitas projetos econômicos. Raro é uma sequer menção à situação do trabalhador pobre como pessoa perante a sociedade, possuidora de direitos10, o que se discute é o quanto o seu estado físico ou localização afetam “os superiores”.

RARO É UMA SEQUER MENÇÃO À SITUAÇÃO DO TRABALHADOR POBRE, ENCORTIÇADO, COMO PESSOA PERANTE A SOCIEDADE, POSSUIDORA DE DIREITOS. O QUE SE DISCUTE É O QUANTO O SEU ESTADO FÍSICO OU A LOCALIZAÇÃO AFETAM ‘OS SUPERIORES’ (LEITE, G. F. T., 2019).


FIGURA 17: Entrada da Vila Maria Zélia Fotografia Autoral, 13 de abril de 2019.

FIGURA 18: Intervenções sem respaudo ao patrimônio Fotografia Autoral, 13 de abril de 2019.

FIGURA 19: Descaracterização das casas do projeto original ao longo tempo. Fotografia Autoral, 13 de abril de 2019.

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FIGURA 20: Cortiços (segundo dados Sehab, 2015) na R. Mauá, distrito República, Sé. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019. No Centro de São Paulo, mais especificamente nos distritos da Sub. Sé, pude perceber a presença em maioria de cortiços nas seguintes tipologias: de quintal, quando os quartos estão voltados para um estreito corredor que dá acesso à rua; e também “cortiços-casinha” ou “casa-de-cômodos”, quando um sobrado é subdividido em pequenos dormitórios. Verifiquei também que nesses últimos casos, alguns se auto classificam como “hotel”, uma das denominações adotadas para “cortiço”, como citado anteriormente. Observa-se aqui também, a mudança de uso no térreo para comercial, incentivado pelo zoneamento da quadra (ZC - Zona de Centralidade - conforme Lei Municipal nº 16.402/2016 - vigente à época deste trabalho).

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1.4 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: UMA QUESTÃO CULTURAL

Encontrados pela primeira vez há mais de um século na cidade de São Paulo, os cortiços - hoje denominados por alguns estudiosos de Habitações Coletivas Precárias de Aluguel (HCPA) -, representam junto com as vilas, os primeiros formatos de moradia popular na história da cidade após a abolição da escravidão, nas últimas décadas do séc. XIX. Originados - no caso da área central da cidade -, em imóveis adaptados, os cortiços viriam surgir primeiro a partir das vilas, para depois ocupar os casarões das classes de renda média e alta, que irão aos poucos mudar-se para o “centro expandido”. Caracterizado pela sua precariedade, onde são insuficientes a ventilação, iluminação natural; a superlotação em cômodos subdivididos e alugados por altos preços/m²; e o uso coletivo de equipamentos como sanitários e tanques de lavar, em números insuficiente; os cortiços serão o símbolo de uma produção rentista que desconsiderava condições mínimas de habitabilidade nas edificações, em troca de maiores lucros. A alta demanda por um lugar para morar financeiramente acessível ao baixo salário do operário, era o que mantia aquecido o mercado imobiliário da época.

As características, tipologias, e tudo o que se sabe hoje sobre o histórico dos cortiços, se deve - eu diria - às epidemias, que preocuparam as classes dominantes e o poder público, levando-os a fiscalizar as casas operárias, situadas geralmente nas áreas mais baixas da cidade, onde a falta de infraestrutura urbana acentuava ainda mais a precariedade dessas moradias. Foram assim, a partir dos relatórios realizados pelos higienistas, que detalhou-se às condições as quais estavam submetidas a população pobre. Eles criticavam, por exemplo, o fato da casa não ter janela, e atividades (como dormir e cozinhar) que eram realizadas em um mesmo - e minúsculo - espaço, mas não questionavam sob a visão social, qual era o impacto social e psicológico sobre os moradores em consequência dessas condições. Quando feitas, as críticas eram geralmente carregadas de pré-conceitos. Ao longo de pesquisas e mapeamentos, verifica-se que os cortiços vistos como moradias operárias - ora aceita ora repudiada pelo poder público -, vão concentrar-se próximo aos locais de trabalho: fábricas, comércios e serviços; no geral, próximo a completa infraestrutura que se estruturou rapidamente nas áreas centrais, conforme o desenvolvimento econômico e urbano de São Paulo.

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As vilas operárias irão surgir logo no início do séc. XX, e serão construídas com incentívos do Governo, tanto por empresas quanto por investidores privados e médios proprietários, o que no entanto, não impediu que os cortiços continuassem sendo produzidos, já que o formato indicado e considerado pelos sanitaristas como “ideal” aos operários, não era tão rentável quanto àqueles, permanecendo assim ao longo do século resistindo às inúmeras tentativas de serem eliminados.

Assim, a população pobre será vista pelo mercado como potencial consumidora de políticas habitacionais, que em contramão, irão ignorar a participação do futuro morador nas decisões projetuais, generalizar a produção, sem planejamentos e análises de impactos futuros, o que irá refletir-se anos mais tarde em críticas e problemas urbanos, como veremos no Capítulo 3.

Apesar das condições precárias da moradia encontrada nos cortiços, o Poder Público se manterá omisso, fato que agravou e influenciou não somente à inferiorização da qualidade da habitação popular, como também a exclusão social de seus moradores. Em consequência, serão constatadas a falta de autoestima, autocupabilização, e conformidade com a situação de pobreza, em grande parte da população vítima da desigualdade nutrida pelo capitalismo.

FIGURA 21 (ao lado): Casa ao fundo desgastada pelo tempo, expõe bandeira do Brasil na janela. Criança a frente, olha a bola (não aparece na foto) que outras crianças brincam na Rua Conde de São Joaquim, distrito Bela Vista. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019. Pelas condições de manutenção, o emaranhado de fiações em frente a residência, e mais de um acesso dando indícios de ter mais compartimentos e moradores do que se imagina, podemos supor de que se trate de uma HCPA - Habitação Coletiva Precária de Aluguel, ou cortiço. Algumas relações entre a condição de moradia, a bandeira do Brasil e a do menino observando a bola, poderiam ser feitas em outros âmbitos, principalmente social, mas, deixo a cargo do leitor fazer a sua própria interpretação.

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2.

A TRANSFORMAÇÃO DA VILA EM METRÓPOLE

Os Cortiços na urbanização da cidade de São Paulo

Imigrantes; Sanitarismo; Inquilinato e Periferização; e Políticas de Intervenção em Cortiços - Linha do Tempo Séc. XIX - XXI

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2. A TRANSFORMAÇÃO DA VILA EM METRÓPOLE 2.1 (1870-1930) - IMIGRANTES

A agricultura - principalmente a produção de café -, foi a principal fonte econômica para o desenvolvimento urbano de São Paulo, e de igual valor para o aumento das imigrações - que já aconteciam em menor número -, a partir de meados do século XIX. A reformulação da política de atração de mão de obra estrangeira para o Estado, que impulsionou as imigrações, facilitava por exemplo, o “agenciamento de imigrantes na Europa, seu transporte para o Brasil e a contratação posterior por fazendeiros”. Era o início da exploração do “trabalhador livre”, após a abolição da escravidão. Entre os anos de 1855 e 1872, a população estrangeira do chamado “centro comercial” - correspondente hoje a região da Subprefeitura Sé e Mooca (Brás) -, passou de 495 para 1.102 imigrantes, um aumento de quase 45% comparado ao crescimento de 16% da população local, de 6.989 para 8.111 (MOTA, 2007, p.54). Ao longo dos anos, no entanto, o trabalho na lavoura no interior do Estado paulista, acabou sendo abandonado pelos colonos, o que segundo BLAY (1985, p.41) foi incentivado por um conjunto de fatores, como as baixas remunerações que impediam o acúmulo de capital para que os colonos

pudessem garantir propriedade sobre uma terra e assim, tivessem a sua própria produção agrícola; além do surgimento de um promissor mercado de trabalho em expansão na cidade de São Paulo, a partir da chegada das fábricas. Os indícios são de que o fluxo rural-urbano tenha ocorrido desde a última década do século XIX (FAUSTO, 1977, p.18 apud BONDUKI, 2017, p.26). A origem dos imigrantes europeus mais significativa entre os anos de 1886 e 1887, foi a italiana, e que segundo Mota (2007, p.56), foi atraída pelo então presidente da Província, Conde de Parnaíba, a quem também se deve a construção da Hospedaria do Imigrantes no bairro do Brás. Como prova, em 1897 constatou-se na cidade “que o número de italianos era duas vezes maior que a de brasileiros” (MELLO FILHO, 2001, p.65 apud op.cit., p.54). A extinta Hospedaria dos Imigrantes (hoje Museu da Imigração), funcionava como um tipo de “abrigo inicial”, já que os imigrantes que chegavam através do Porto de Santos ao Estado de São Paulo, eram levados para a Hospedaria aonde se estabeleceriam até conseguirem com seu próprio esforço uma nova vida em território estrangeiro, fosse na “lavoura, no interior, ou para a indústria e comércio na Capital”. A infraestrutura

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da edificação oferecia: “dormitórios arejados, refeitório, enfermaria, e lavanderia, permitia o alojamento dos colonos em sua chegada do exterior, para, em seguida, serem enviados às regiões agrícolas do interior paulista (TORRES, 1969, p.118). Tinha capacidade para alojar 2.000 imigrantes em grupos que chegavam a cada quinze dias” (MOTA, 2007, p.56).

[...], as habitações destinadas às classes operárias são numerosas. Existem aí nada menos de sessenta cortiços de todos os tamanhos e feitios onde se agasalha uma população de 1.320 indivíduos de todas as nacionalidades e condições [...] [número] que avultará se uma polícia noturna se aplicar escrupulosamente no exame estatístico do povo que eventual ou permanentemente vêm ocupar os cortiços à noite.

Os imigrantes que vieram para cidade diretamente da Hospedaria ou após o trabalho na lavoura -, foram fundamentais tanto para o avanço econômico do mercado, quanto pelas transformações que ocorreram posteriormente em São Paulo. Diferentemente do escravo, os imigrantes tinham autonomia financeira, e além de garantirem a subsistência também eram consumidores da produção capitalista industrial.

A precariedade da habitação popular e seu adensamento máximo, acabou gerando sérias preocupações por parte do poder público com as epidemias que foram surgindo, causando inúmeras mortes, principalmente dos filhos dos imigrantes, que com poucos recursos e os custos com a moradia como o aluguel, água e luz, uma quantia insuficiente lhe sobravam no fim do mês para garantir uma alimentação adequada aos seus familiares (MOTA, 2007, p.59).

No entanto, a medida que os colonos chegavam à cidade, as condições de moradia que encontravam compatíveis a sua renda eram as piores possíveis, já que a produção habitacional da época era incompatível à demanda. Segundo Rolnik (1981 apud BONDUKI, 2017, p.26), é entre 1886 e 1900 que a cidade “explode”, desencadeando a sua primeira crise habitacional: são quase 200 mil pessoas a mais (principalmente italianos); entre 1890 a 1893. Somente na Região da Santa Ifigênia, o número de habitantes cresceu de 14.025 habitantes para 42.715, fato que de acordo com MOTTA (1984 apud BONDUKI, 2017, p.31), fez com que surgissem diversos tipos de morada, como estalagens, cortiços e habitações operárias, quase todas elas de construção apressada e precária. Na zona afetada

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O impacto e alarde do alastramento dessas doenças por cidades do Estado, para o Governo, poderiam significar a perda de todo um investimento realizado para facilitar e atrair a vinda dos imigrantes para São Paulo. Estas condições foram cruciais para que se estruturasse, entre 1891 e 1893, o serviço sanitário da Província, o que acirrou as relações “entre setores do poder público e proprietários de terra, os empreiteiros de cortiços” (RIBEIRO, 1993 apud SIMONI, 2002, p.139; apud MOTA, 2007, p.58). Apesar de ser um dos mais marcantes, o problema de saúde não foi o único do qual os imigrantes foram vítimas, outras dificuldades sociais como o preconceito racial e cultural, foram e ainda são constantes, ilustrado por Lowrie


FIGURA 22: Vista aérea do complexo de equipamentos da Hospedaria dos Imigrantes. Ao lado, a ferrovia por onde chegavam os imigrantes. Sem data. Autor desconhecido. Fonte: Acervo Digital do Museu da Imigração, 2019.

FIGURA 23: “Estação de Embarque do S.T.C”. Sem data. Autor desconhecido. Fonte: Acervo Digital do Museu da Imigração, 2019.

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FIGURA 24: Fachada da Hospedaria dos Imigrantes (HI) após sua segunda reforma, em 1936 (Foto de 1938). Em primeiro plano, funcionários, imigrantes e migrantes. Fotógrafo desconhecido. Fotografia Autoral, 10 de março de 2019.

com base na classificação da sociedade em 3 grupos: o grupo superior era representado pelos universitários (majoritariamente brasileiros na época), que representavam a elite e, perpetuavam entre si, a continuação de seus bens e traços entre as gerações, como por exemplo a tonalidade branca da pele. As relações com estrangeiros só aconteciam em casos de interesses econômicos ou títulos de prestígio na sociedade (MOTA, 2007, p.59 e 60).

semi-dependente (antigos escravos e classes mais baixas do império) -, fossem modificados, ou seja, através de um processo de embranquecimento dessa população, o que apesar disso muitos dos traços negros africanos, se mantiveram tanto como fator principal de sua formação, quanto como um elemento segregador e excludente, os colocando à margem da sociedade perante uma sociedade que se achava, acima de suas posses, “racialmente superior”.

As imigrações continuaram nos primeiros anos do século XX, mas com uma diversidade maior entre nacionalidades do que se pode verificar até o momento, predominantemente portuguesa, espanhola e italiana. Este fator contribuiu também para que alguns traços dos grupos citados por Lowrie, compostos pela classe mais pobre/ trabalhadora (imigrantes e descendentes) e a

Assim, São Paulo com o tempo, deixou de ser ocupada em sua maioria por imigrantes italianos, mas sem perder as características da respectiva cultura nas habitações modestas dos bairros operários, verificadas principalmente nas construções de distritos como a Bela Vista, Barra Funda, Bom Retiro e Brás (MOTA, 2007, p.61-2).

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FIGURA 25: Imigrantes e migrantes no pátio interno da Hospedaria, 1930. Fotografia Autoral, 10 de março de 2019.

FIGURA 26: Imigrantes italianos na HI, 1930. Fonte: Acervo Digital do Museu da Imigração, 2019.

FIGURA 27: Crianças imigrantes jogando bola no pátio da Hospedaria dos Imigrantes, 1930. Fonte: Acervo Digital do Museu da Imigração, 2019.

FIGURA 28: ”IMMIGRANTES PROCEDENTE DA BAHIA”, 1936 Fonte: Digital do Museu da Imigração, 2019.

FIGURA 29: Dormitório de camas duplas, 1936. Fonte: Acervo Digital do Museu da Imigração, 2019.

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FIGURA 30: Exposição sobre a Imigração no Brasil, no Museu da Imigração do Brás, antiga Hospedaria dos Imigrantes Fotografia Autoral, 10 de março de 2019. Atualmente o Museu da Imigração abriga além da exposição fixa sobre Imigranção no Brasil, expondo objetos, pertences dos imigrantes como passaportes, móveis utilizados na época como camas, exposições temporárias e eventos diversos. No dia 10 de março de 2019, quando foi realizada a visita em que foram registradas essas imagens, acontecia o evento da Imigração Irlandesa no Brasil, e a exposição temporária “Sinta-se em casa”, de onde foi retirado na íntegra o texto abaixo sobre “Habitar”; e as fotografias de época (página ao lado) do cotidiano de imigrantes moradores de cortiços.

HABITAR Uma casa não é só uma casa - paredes, piso, telhado; não se resume à estrutura concreta que abriga. Uma casa se compõe de vivências e hábitos construídos, remanejados, continuados; cada móvel que mantemos ou mudamos de lugar e cada pequeno item que colocamos em um ambiente carregam em si inúmeras expectativas, anseios, memórias. Refletem as possibilidades de um determinado momento da vida, sua realidade econômica e social. Desse modo, os objetos com os quais habitamos uma casa representam a própria materialidade da vida cotidiana, das trajetórias individuais e dos afetos. Produtos e produtores de subjetividades, os artefatos que são trazidos para dentro da casa representam, de certa forma, quem somos. Para o migrante, esses objetos marcam o desejo de pertencer, resistindo à provisoriedade e contrapondo-se à mobilidade. Estão ali para trazer familiaridade e conforto, mas também para fixar sua trajetória, muitas vezes instável, no espaço. Buscando suprir ausências e representar identidades, tanto individuais quanto coletivas, a organização de um espaço privado funciona como a construção de um microcosmos particular. Tanto o corpo quanto a mente se relacionam com esses espaços; esse relacionamento é, por sua vez, parte fundamental da experiência migrante e sua busca pela sempre provisória permanência. (Texto reproduzido da exposição temporária “Sinta-se em casa”, que aconteceu no Museu da Imigração, 2018-2019).

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FIGURA 31: “Um aspecto de um cortiço e suas crianças. 1940 - 1950 . Fotógrafo desconhecido. Acervo Fotográfico do Museu da Cidade de São Paulo”. Fotografia Autoral, 10 de março de 2019.

FIGURA 32: “Cômodo da casa de cortiço com uma mulher costurando. 1940 - 1950. Fotógrafo desconhecido. Acervo Fotográfico do Museu da Cidade de São Paulo”. Fotografia Autoral, 10 de março de 2019.

FIGURA 33: “Expedição São Paulo 450 Anos. Quarto no interior de cortiço no Bixiga. 2004. Foto Laerte Machado Júnior. Acervo Fotográfico do Museu da Cidade de São Paulo”. Fotografia Autoral, 10 de março de 2019.

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2.2 (1870-1930) - SANITARISMO

A explosão demográfica da cidade de São Paulo com a chegada dos imigrantes - como visto anteriormente -, será acompanhada também pela presença de epidemias, doenças como a cólera (1850) e a febre amarela (final do séc. XIX), que afetarão principalmente os trabalhadores da lavoura e os operários das fábricas, moradores dos cortiços, habitações precárias e altamente adensadas, localizados ainda em áreas de várzea - como a Várzea do Carmo e do Vale do Anhangabaú -, sem nenhuma infraestrutura. Segundo Raffard (1977 apud BONDUKI, 2017, p,.27), em 1888 a maioria das habitações não tinham esgoto e somente 500 edifícios estavam ligados à rede de abastecimento. Condições como essas eram uma ameaça à saúde pública. “As epidemias encontraram território fértil nessas localidades devido à ausência de redes de água e de esgotos, habitações insalubres e arruamentos estreitos e mal ventilados, que, segundo as autoridades sanitárias, eram aspectos ligados diretamente à falta de higiene no território urbano” (CAMPOS, 2002, p.38).

As reformas urbanas que irão suceder no início do século XX, no entanto, tinham como força maior a expansão urbana de São Paulo, à desprezo do Poder Público perante a situação de precariedade nos bairros populares. A maior preocupação

11. Henrique Raffard é um dos viajantes que passará por São Paulo, fazendo observações sobre as transformações da Província, a partir dos anos de 1890, elogiando o “incrível desenvolvimento” da cidade e criticando as precárias condições encontradas nos terrenos de várzea, onde se encontravam os bairros operários.

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pública eram com os riscos da elite ser afetada pelos surtos epidêmicos, que se alastravam pelo do Estado, como em Santos e Campinas, cidades por onde os imigrantes chegavam e vendiam sua força de trabalho respectivamente, ou seja, o que estava em risco era o “motor” da economia cafeeira e do desenvolvimento urbano de São Paulo, fato que também preocupava aos cafeicultores e à burguesia paulista. As observações ou reclamações quanto à precariedade da infraestrutura urbana nos bairros operários, são realizadas tanto por viajantes brasileiros11 e estrangeiros que passaram por São Paulo, quanto por moradores e autoridades públicas por meio dos veículos de comunicação da época. Entre as declarações, destacam-se principalmente os elementos arquitetônicos em moldes europeus, símbolos da transformação de uma cidade em ascenção pós período colonial, em contraste com aos visíveis problemas estruturais, que na época se concentram nos bairros Santa Ifigênia, Bom Retiro e Brás. Além de Raffard, outro viajante brasileiro, Moreira Pinto, irá comentar 10 anos depois, sobre os belos prédios, praças aborizadas, o comércio ativo, as belas avenidas (referindo-se principalmente a Av. Paulista), as casas de negócios, os bairros como Campos Elísios e Higienópolis, como também sobre as


águas pluviais empoçadas, as más condições dos terrenos da Várzea do Carmo e do asseio dos bairros populosos (1977 apud BRESCIANI; CORDEIRO org., 2010, p.16). As manifestações por parte dos moradores desses bairros também eram frequentes, fosse por meio de abaixo-assinados ou em críticas publicados pelos jornais operários, aos “preceitos sanitários e estéticos”. Como exemplo, a “A Folha do Braz”, que na sua 3º edição em 1889, enfatiza em seu artigo intitulado “Hygiene do Braz”, a necessidade da atenção pública aos poblemas de higiente do bairro: Que vale a hygiene superficial num bairro essencialmente sujo cujo oceano de pó se concentram os microbios de mil molestias? Que vale a hygiene num bairro cujas ruas empestam-se aos gazes emanados de eternos locadaçaes? Que vale a hygiene num bairro cujas casas na maioria cortiços acoitam innumeras pessoas? (BRESCIANI; CORDEIRO org., 2010, p.18).

Grandes jornais da época também darão destaque às reclamações dos moradores, como o “Estado de São Paulo” com a seção “Queixas e Reclamações”. Em 1910, muitos dos artigos publicados irão conter críticas sobre a destinação dos recursos públicos para obras como a construção do Viaduto Santa Ifigênia, do Theatro Municipal e de grandes avenidas, frente à urgência da resolução dos problemas que enfrentavam. Como podemos observar, a questão sanitária já era um assunto muito discutido pela população, antes mesmo dos técnicos de saúde ou do Poder Público alegarem as más codições com base em estudos técnicos. Em 1851 é criado a Inspetoria de FIGURA 34: JORNAL “O ESTADO DE S PAULO - PÁGINAS DA EDIÇÃO DE 03 DE JUNHO DE 1911 - PAG 6”. Fonte: Acervo Estadão, 2019. No trecho de destaque acima, nota-se como eram persistentes as reclamações sobre a questão da higiene no bairro do Brás, na coluna de “Queixas e Reclamações” do jornal.

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Saúde Pública e em 1877 a Repartição de Obras Públicas, junto a programas de visitas domiciliares pelos técnicos em higiente (inspetores e polícia sanitária), em áreas consideradas críticas. Sobre uma análise dessas ações, Bonduki (2017, p.42) as caracterizam como “autoritarismo sanitário”: “As visitas domiciliares, por sua vez, eram interferências diretas no cotidiano dos moradores, com os inspetores procurando determinar os comportamentos e hábitos de vida e de asseio doméstico. ‘As visitas domiciliares sistemáticas em uma cidade como a de São Paulo pela autoridade sanitária, visando em alguns o estímulo para a manutenção do asseio, em outros impondo sob penas legais, a execução de medidas higiências, só podem ser louvadas’ (VEIGA, 1894)”.

Segundo Bonduki, algumas casas foram interditadas, demolidas e até queimadas, consideradas pelos higienistas como “casas imundas o berço do vício e do crime.” (VEIGA, 1894 apud BONDUKI, 2017, p.42). As açõs sob uma visão elitista, preconceituosa e racista sobre os imigrantes pobres, em nada contribuiu para melhorar as condições precárias em que se encontravam a classe pobre da população, vítimas “das péssimas condições de saúde e moradia, expostos à superexploração, baixos salários, subnutrição, falta de saneamento e de moradias dignas” (BONDUKI, 2017, p.42). Os cortiços serão vistos como um grande mal a ser combatido na cidade, tanto pelas precárias condições em que se aglomeravam a população pobre, como pelos focos de proliferação das moléstias. A partir de 1885, autoridades públicas começam a se manifestar por meio de relatórios sobre as condições inaceitáveis desse tipo de FIGURA 35: JORNAL “O ESTADO DE S. PAULO - PÁGINAS DA EDIÇÃO DE 15 DE JULHO DE 1912 - PAG 3”. Fonte: Acervo Estadão, 2019. Aqui, sob a visão de um colunista da época, é destacada a necessidade de atenção do Poder Público ao aumento da população relacionado às condições de higiene da cidade, onde chega a ser cogitado a inspiração em projetos internacionais na área para serem replicados em São Paulo.

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moradia e normas que ora estabeleciam diretrizes para a sua regulamentação sob parâmetros minimamente aceitáveis, ora os repudiavam e determinavam a sua extinção por completo. É sob esse contexto, que em 1893 é encomendado pela Diretoria de Higiene, o “Relatório da Comissão de Exame e Inspeção das Habitações Operárias e Cortiços no Districto de Santa Ephigênia”, considerada como a mais completa descrição sobre as moradias operárias da época, com base no “Código de Posturas do Município de São Paulo”, elaborado em 1886 pelo engenheiro Luiz Cesar de Amaral Gama. O objetivo desse relatório elaborado pelos higienistas, era de melhorar as condições de drenagem e saneamento, como meio de erradicar as epidemias, onde por meio de visitas dociliares aos posssíveis focos, serão dadas as primeiras definições de cortiço, as tipologias encontradas, e descrito - minunciosamente - o modo de vida das pessoas submetidas a esse tipo de situação. Apesar da atuação ter sido restrita ao distrito da Santa Ifigênia, as condições relatadas podiam ser encontradas igualmente em regiões próximas, como “[...] nos bairros do Bom Retiro, Bexiga e Brás, [onde] casas existem com acomodações para seis ou oito pessoas e que abrigarão, em completa promiscuidade, trinta a quarenta indivíduos. No largo da Memória, na ladeira do Piques, na rua da Consolação e em várias ruas desta florescente capital, são inúmeros os casarões abrigando durante a noite centenas de pessoas sem luz, sem ar, e que fazem durante o dia a cozinha em alcovas escuras, por meio de fogareiros volantes envenenando ainda mais essa atmosfera, já deletéria e perniciosa. A cor escura das paredes,

as elevações do assoalho, os utensílios e roupas esparsos pelo quarto, tudo revela a maior imundice que se pode imaginar. “ (VEIGA, 1894 apud BONDUKI, 2017, p.34).

A escolha do local de análise para a realização desse relatório, no entanto, não foi a toa. De acordo com Bonduki (2017, p.40), o distrito de Santa Ifigênia também era habitado pela classe média e a burguesia cafeeira, além de estar a menos de 500m de distância “do mais aristocrático bairro da época, o Campos Elísios”. Dessas visitas realizadas pelos técnicos higienistas, surgem como produto fichas detalhadas com nome dos proprietários dos imóveis e inquilinos, valores de aluguel, estado físico em que se encontravam os espaços habitados, entre outras questões; foram apresentadas também duas propostas de plantas pelos engenheiros sanitários de “habitações operarias de caracter urbano”, considerada como o padrão mínimo aceitável dentro do perímetro da cidade, e uma planta de “villas operárias” para serem construídas em “terrenos fora da cidade”12; além de uma sugestão de “pré-zoneamento” para configuração do espaço urbano, definindo os lugares aos quais poderiam ser construídas tais habitações: “de preferência, nos subúrbios [...] próximo às ferrovias” e quando dentro do perímetro da cidade, “terrenos ainda desocupados no Bexiga, Bella Cintra, Pacaembu, Pary, Moóca e Cambucy” (1977 apud BRESCIANI; CORDEIRO org., 2010, p.21). Esse “pré-zoneamento” terá como base uma reorganização administrativa definida pela Prefeitura, a partir da Lei municipal nº 64 de

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1893, que divide a cidade de São Paulo em 4 perímetros, em função da cobrança de impostos. São eles:

FIGURA 36: Modelo de ficha cadastral usada pelos técnicos nas vistórias para auxiliar na análise de cada cortiço - espaços, locadores e locatários. Fonte: ARAGÃO e SOUZA, 2018.

“1º Perímetro - formado pelo Triângulo Central - pelo Centro Novo, que ocupa a área entre o Anhangabaú e a praça da República, desde a rua Santo Amaro até a estação da Luz e ainda a área compreendida entre a estação da Luz e a rua 25 de Março e o Triângulo Central. Pertencem a esse perímetro: o largo do Riachuelo, o largo da Memória, o largo da República, o largo dos Protestantes, o largo do General Osório, o largo Municipal, o largo do Paissandu, o largo do Ouvidor, o largo São Francisco, o largo São Bento, o largo do Rosário, o largo do Tesouro, o largo do Palácio, o largo da Sé, o largo de Santa Ifigênia. O 1º perímetro contém a área central que, aos poucos, se torna comercial; 2º Perímetro - formado pela área urbanizada a leste do 1º Perímetro área do bairro de Santa Ifigênia, além da estação da Luz, incluindo a avenida Tiradentes até até a Ponte Grande; área do bairro dos Campos Elíseos. Pertencem a essa área os largos do Arouche, de Santa Cecília e Guaianase. Os impactos sõ mais baratos que no perímetro anterior, porém mais caros que no 3º perímetro, esta é a área das Mansões; 3º Perímetro - formado pela área urbanizada a oeste do 1º perímetro - Brás, ao longe da avenida Rangel Pestanaa; rua Piratininga; Liberdade, área que se expande ao sul, tendo por eixos as ruas Santo Amaro e Piratininga; as ruas do Visconde de COngonhas de Campo, dos Imigrantes e Alta do Bairro do Bom Retiro. Os impostos são aí os mais baratos dentro da área urbana. [...] Essa seria uma área mista, com habitações, comércio e oficinas;

FIGURA 37: Foto de Desinfector com trajes específicos e equipamentos, utilizados nos imóveis suspeitos de serem propagadores de doenças. Fonte: BONDUKI, 2017, p.34.

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4º Perímetro - ‘conta-se pela linha divisória do 2º e 3º e compreende os seguintes bairros: Fazendinha do Carmo e resto do Bom Retiro, Barra Funda, Bexiga,


FIGURA 38: Planta Cadastral dos cortiços identificados no bairro Santa Ifigênia, realizado pelo engenheiro V. Huet de Bacellar, 1892. Fonte: ARAGÃO e SOUZA, 2018.

Palmeiras, Pacaembu, Bella Cintra, Campos do Paraíso, Villa Mariana, Guanabara, Tamandará, Scuvero, Ypiranga, Cambucy, Mooca, Hipódromo, Marco da Meia Légua e Catumby’. O 4º perímetro não pagava impostos urbanos, era uma área que, na época. estava sendo urbanizada.” (DIAS, 1989, p.54).

Os incentivos concedidos pelo Poder Público à construção de casas operárias fora do perímetro urbano, vai evidenciar o sentimento de repulssa às vilas, aos grupos de casa, às moradias das classes mais pobres, no geral. Na Lei nº 498 de 1900, para tal, são oferecidos isenção de impostos municipais e menos rigor nas exigências quanto à qualidade das construções, gabarito e na configuração interna das moradias, resguardando o mínimo de 3 cômodos, incluindo a cozinha (BRESCIANI; CORDEIRO org., 2010, p.23). Em âmbito Estadual, para garantir as condições aceitáveis de higiene nas edificações,

13. Criada em 1913 nos Estados Unidos, a Fundação tem um importante histórico de ações voltadas para o extímulo à saúde pública, por meio do ensino, pesquisas e filantropia. No Brasil, a sua atuação se difundiu graças aos médicos sanitaristas como Geraldo Horácio de Paula Sousa e Carlos Chagas, os primeiros a receberem uma bolsa de estudos na insituição (CAMPOS, 2002).

é criado em 1892, o Serviço Sanitário, em uma atuação conjunta à Fundação Rockefeller13, exercendo um importante papel no controle das doenças vindas com os imigrantes, nas lavouras de café. Já na escala Municipal, a partir de 1893, para analisar o comprimento dos parâmetros mínimos solicitados no relatório para novas construções de casas e alinhamento de lote, a Prefeitura começa a exigir a análise e aprovação de plantas. No ano seguinte, o Estado estabelece o Código Sanitário (1894), contendo definições de dimensões mínimas para construções em geral, considerando ainda os cortiços, identificados por “habitações insalubres”, e as “Villas Operárias”, defendendo a visão higienista da tipologia de habitação idealizada para as classes pobres14. A discussão tanto sobre a organização da cidade quanto sobre os direitos do trabalhador em relação à saúde e moradia, será frequente

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entre sanitaristas, médicos e engenheiros, principalmente após a implantação da Escola Politécnica (1894) e a Escola de Engenharia Mackenzie (1896), que irão defender a construção de “casas econômicas”, a fim de livrar os moradores dos escrúpulos da figura dos locatários na cobrança do aluguel, até o momento, sem parâmetros e respaudos legislativos. A presença do sanitarismo como uma espécie de código de obras para regulamentar os melhoramentos da cidade e a construção de edifícios, vai perdurar mais fortemente até o ano de 1920 - período pós Pimeira Guerra Mundial -, quando a cidade de São Paulo, facilitado pelo grande excedente financeiro gerado pela economia cafeeira, transformar-se-irá em um pólo industrial, a “metrópole do capital”. Assim, aos poucos o foco em saneneamento se perde, voltando-se agora para a circulação, prova disso será o plano urbanístico solicitado no início da década, pelo então prefeito José Pires do Rio ao engenheiro municipal Francisco Prestes Maia (LEME, 1990; RIBEIRO, 1993; apud CAMPOS, 2002, p.XVI). O “Plano de Avenidas” de Prestes Maia - e como o nome sugere -, visava a expansão e a remodelação do sistema viário da cidade de São Paulo, a fim de prepará-la para os impactos gerados pelo desenvolvimento da indústria fordistas. Era o início da Éra em que os automóveis (carros e ônibus), tornariam-se o foco central da estruturação e dos melhoramentos em São Paulo (tomando as atenções sobre o ofuscamento das questões de higiene), e em consequência o pedestre, o operário, e as suas necessidades, ficaram em segundo plano. Será

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redefinida também a função do engenheiro, agora voltada para as obras viárias, redes básicas de infraestrutura e expansão da cidade. Um dos frutos do Plano Urbanístico de Prestes Maia, é a construção da Av. 23 de Maio (inaugurada somente em 1969), um dos primeiros eixos estruturais na cidade, e que na época de sua construção, teve um grande impacto na paisagem urbana: construída na várzea do Rio Itororó, desapropriou diversas casas em trechos das ruas Jaceguai, Conde de São Joaquim, Condessa de São Joaquim e da Liberdade, sob uma visão rodoviarista. Não era somente um Plano considerado “visionário” ao possibilitar o desenvolvimento e o status da cidade, mas também uma forma de destruir cortiços e casebres que ocupavam terrenos em fundo de vale. Mesmo ameaçados de extinção pelo Poder Público, os cortiços permaneceram e se multipliram nas áreas centrais: estimava-se que em 1893, apenas no bairro da Santa Ifigência existissem 60 cortiços com 1.320 moradores; em 1900, um terço das habitações existentes em São Paulo, eram considerados cortiços; nos anos seguintes são citados apenas como “casas de aluguel”; propriamente dito, os cortiços retornarão às estatísticas nos anos 60, a partir de um estudo específico no Plano Urbanístico Básico (PUB), realizado em 1968, apontando que 8,1% da população do município era encortiçada, e que 35% do total das famílias concentravam-se nos bairros Brás e Mooca, e 20,3% no Centro (distritos da atual Subprefeitura da Sé), o equivalente a 45.977 e 26.070 famílias, respectivamente (ROLNIK, 1981; SEMPLA, 1986; PASTERNAK E MAUTNER, 1982; apud PICCINI, 2004 , p.55).


“ A HABITAÇÃO TORNOU-SE MERCADORIA E A CIDADE TORNOU-SE UMA AGLOMERAÇÃO (MEDINA; VALLADARES, 1979, p.156).

2.3 (1930 - 1970) - INQUILINATO E PERIFERIZAÇÃO

“Instrumento de defesa da economia popular; estratégia de destruição da classe produtiva dos rentistas; medida para reduzir o custo da reprodução da força de trabalho; instrumento de política econômica para acelerar o crescimento do setor industrial; forma de legitimação do Estado populista”. (BONDUKI, 2017, p.253).

Essas são o que Bonduki identifica como “as várias facetas da Lei do Inquilinato”, nas diversas versões criadas durante seus 22 anos de existência (1942-1964), passando - desde que foi promulgada pelo governo de Getúlio Vargas na década de 40 - pelas fases de “cunho populista” à instrumento econômico para o setor industrial. Até o ano de aprovação da Lei do Inquilinato, em 1942, o aluguel ou sub-aluguel de cômodos, era realizado sem nenhum contrato de locação ou respaldo legislativo que garantissem tanto os direitos dos inquilinos quanto dos locatários, fato esse que refletiu em variações desmedidas no valor do aluguel, chegando a atingir valores altíssimos ao longo dos anos. Será justamente sobre este contexto que o Estado irá intervir: assim que a lei foi aprovada, os valores dos aluguéis vigentes no ano de 1941 foram congelados, uma medida que tinha a princípio o objetivo de proteger os direitos dos inquilinos, mostrará como resultado um efeito inverso ao provocar com o declínio de

investimentos privados nesse tipo de mercado, o despejo de 15% da população da cidade, após a Segunda Guerra Mundial (SIMÕES JUNIOR, 1991, p.15). Para Villaça (1986, p.22), a real intenção do Estado Novo estava além de uma medida social, visando principalmente o desestímulo da produção rentista no modelo de habitação para locação, condicionando o investimento privado para a comercialização da casa própria. Os anos entre 1920 e 1950, serão marcados principalmente pela expansão da mancha urbana além dos antigos limites da cidade, viabilizada pelos Plano de Avenidas de Prestes Maia e a implantação do transporte coletivo de longo alcance, os ônibus. Além do congelamento dos aluguéis, fatores como o rápido retorno financeiro a partir do financiamento de lotes, induziram o desenvolvimento do mercado capitalista na produção da casa própria, como exemplo, o surgimento das incorporações para o comércio de apartamentos em edifícios verticalizados voltados para as classes de média e alta rendas; e a produção de habitação popular para os trabalhadores assalariados por intermédio dos IAPs (Institutos de Aposentadoria e Pensões) e da Fundação da Casa Popular, sob a produção estatal no período

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pré BNH15 (BONDUKI, 2017, p.217). Inicia-se assim a transição para a casa própria.

sob um enorme desgaste físico - uma atividade que se extendia à jornada de trabalho.

No entanto, paralelas às ações privadas e estatais na promoção de moradias, estão as alternativas precárias e ilegais, como a formação de favelas e loteamentos clandestinos pela venda e compra de lotes em glebas sem infraestrutura básica - ao contrário do estabelecido na Lei de Arruamento. Formava-se assim, a “Cidade Clandestina”, nas franjas da “Cidade Oficial”. (SIMÕES JUNIOR, 1991, p.16).

“Eu tenho envelope de até novecentos cruzero por semana, mas pra eu tirá isso... se eu falar pra senhora a senhora vai se benzê toda; vai dizê: esse cara ‘tá se matando. Sabe por quê? Duas dobra. Sem dormir...’ Eu vivo fazendo isso porque tenho necessidade, muita coisa pra fazê aqui, num é só comer, tem a casa. Então tem de dobrá. Bom... tê num tem, né, a pessoa dobra por livre espontânea vontade; ‘tá me entendendo? Ninguém força. (...)É que o meu objetivo é construir... enquanto eu não fizer a minha casa, sinceramente, a minha cuca num refresca mesmo...” (pedreiro)

Os lotes irregulares são comercializados para aquisição por meio de prestações16 pelos trabalhadores assalariados, que se veem sem alternativas perante os altos valores dos aluguéis nas áreas centrais e as baixas remunerações no mercado de trabalho. Já para aqueles que não tinham condições financeiras para a compra do lote e nem para custear o aluguel em cortiços, “restou” a ocupação da “terra rejeitada pela propriedade privada, como os mangues, alagados ou morros, ou na inexistência destes, pela invasão de terrenos de propriedade pública ou privada“ (VILLAÇA, 1986, p.21). Na compra do lote, o mercado oferecia em alguns casos, o material de construção, ficando a responsabilidade sobre a construção da casa pelo próprio morador e de quem ele conseguisse auxílio (amigos, parentes, vizinhos, por exemplo). Alguns relatos de moradores de favelas no Rio de Janeiro, destacados por Lima (VALLADARES, 1976, p. 74-88), ilustram situações semelhantes à periferia de São Paulo, na busca pela idealizada casa própria, autoconstruída na maioria dos casos,

15. Banco Nacional de Habitação, programa de financiamento habitacional pertencente às Reformas Urbanas, propostas durante o período da ditadura militar (1964-1988).

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A necessidade criada da casa própria no contexto da cidade capitalista, será difundida através da classe dominante como sinônimo de “segurança econômica e social” quando comparada à alternativa da habitação de aluguel, e que para Villaça (1986, p.24), expressa claramente as relações de domínio da burguesia, que tornou a necessidade real no mundo real, sob o pretexto de que A posse de uma casa não só confere mais status como facilita as relações econômicas, abre as portas aos empréstimos e aos crediários e constitui não só uma forma bastante segura de investimento como uma eficaz defesa contra a inflação.

É possível observar também através dos relatos, como as pessoas reagem inconscientemente sob a indução dessa ideologia, ficando evidente a importância que a casa própria têm para a garantia da proteção familiar, principalmente nos momentos de crise financeira.

16. A aquisição de lotes por meio de prestações é regulamentada pelo Decreto de Lei nº 58 em 1937, representando um importante instrumento facilitador para o aquecimento do novo mercado de imobiliário de casa própria.


FIGURA 39: “Notícia do decreto do governo regulando aluguéis publicada no “Diario Carioca” de 21 de agosto de 1942” Fonte: Memorial da Democracia, 2019. FIGURA 40 e 41: Maquete e Planta Térrea, do Ed. Japurá, contruído no local do antigo complexo de cortiços da Vila Barros (ver Figuras 9 a 13). Fonte: Arquivo Arq, 2019. Construído no ano de 1945, o edifício habitacional de 16 andares projetado pelo arquiteto Eduardo Knesse de Melo, é considerado como um marco no período da produção dos IAPs (Institutos de Aposentadoria e Pensões). Sua arquitetura inspirada nos cinco pontos modernistas (planta livre, fachada livre, janela em fita, terraço jardim e pilotis), é considerada uma versão da Unité d’Habitation, do arquiteto naturalizado francês, Le Corbusier. Uma das ideias defendidas pelos arquitetos que compunham os IAPs, seguindo a mesma lógica dos príncípios da Arquitetura Moderna, é a implantação de edificações de conjuntos habitacionais isolados do traçado urbano existente, pois segundo eles: “Bem pouco valeria construir habitações econômicas e as dividir em pequenos lotes, misturados entre construções urbanas existentes, duma outra era, com toda a promiscuidade dos cortiços vizinhos” (PORTO 1938, p.57 apud BONDUKI, 2017, p.159).

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FIGURA 42: Capa da Revista Veja, edição 2629, destacando a proliferação da autoconstrução (sem assistência técnica), na periferia de São Paulo. Fonte: Veja São Paulo, 5 de abr. de 2019.

FIGURA 43: “Obra de prédio em Heliópolis”. Foto: Alezandre Battibugli. Fonte: Veja São Paulo, 5 de abr. de 2019.

FIGURA 44: Segundo a publicação, cerca de 25% das residências do município de São Paulo (mais de 830 mil), estão em situação irregular. Na foto, “edifício de 5 andares em Heliópolis: renda de 14 mil reais por mês [com aluguel]”*. Foto: Alezandre Battibugli. Fonte: Veja São Paulo, 5 de abr. de 2019.

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“Quando eu cheguei aqui [no Rio de Janeiro] fui morá na favela... na casa do meu primo, lá no Acari. Aí eu arrumei esse emprego que eu falei, e eu comprei lá um barraco por quinhentos cruzero. Então, esse barraco foi que eu fui ajeitando ele, fiz um comodozinho de tijolo, e foi esse que eu vendi para comprar aqui... comprar um material, um pouco de material, né. (...) Eu vendi porque lá num era meu, estava sujeito a qualquer momento ser tomado... aí nóis decidimo vim pra esse terreno aqui... que é comprado... é nosso... é mais seguro.” (relato de um eletricista). “Meu sogro deu uma meia-água pra gente morá lá. Dois cômodo, morava eu, ela e as criança lá... num pagava nada. Mas nóis tinha aquela ideia: que num era nosso, que ele podia precisá dos cômodo... sempre isso na cabeça, aquela coisa de pensá assim... que a gente só ‘tá seguro mesmo no que é nosso. Sendo nosso é outra segurança... Aconteça o que for tem seu canto, num tem precisão de saí nunca.’”. (Relato de um armador).

Nesse contexto, onde é crescente a autoconstrução - principalmente pelas classes de rendas média e baixa -, mesmo que construídas na periferia, ou seja, distantes das ofertas de emprego, de infraestrutura básica como creches, escolas e hospitais, a casa própria tem sido mais idealizada pelos moradores do que a opção da moradia de aluguel como uma alternativa habitacional permanente: “É que a gente pagando aluguel, vai pagá 8 ano, 10 ano, 20 ano, e nunca é da gente, nunca é de nossos filho. [...] Já pensou o cara pagá aluguel, o cara dormir e acordar sabendo que aquela casa que ‘tá pagando nunca é dele?’” (carpinteiro)

mais tarde melhora, né. Melhor que pagá aluguel.” (estucador) Em suma, o período de 1920 a 1950 dentro do contexto da garantia da casa própria, seja por iniciativa privada, estatal ou autoconstrução, é marcado pelos seguintes acontecimentos simultâneos: • • • •

• • • •

Desenvolvimento do capital financeiro; Intervenção do Estado tanto na esfera jurídica como econômica para a afirmação do modelo da casa própria; Desenvolvimento da ideologia da casa própria; A indústria da construção civil e os empreendedores imobiliários deixam de atender as crescentes massas populares que se acumulam nas cidades, e seu problema habitacional fica sem solução; Desenvolvimento dos transportes urbanos através dos bondes e com estes desbravam-se amplas fronteiras adequadas a loteamentos; Expansão dos loteamentos “clandestinos”; Desenvolvimento da prática da autoconstrução (mutirão, auto-ajuda ou ajuda mútua); O Estado, inclusive as Prefeituras Municipais, assumem posição totalmente omissa face aos loteamentos ilegais; Declínio da construção de moradias de aluguel para a classe média. (VILLAÇA, 1986, p.22-23).

“[...] Compra, passa um pouco apertado, mas

* Na Figura 44, vemos a habitação autoconstruída tomando rumos parecidos aos casarões no centro de São Paulo: conforme o proprietário vai conseguindo renda com locação de unidades contruídos por ele mesmo, sobre ou sob a sua própria casa, em poucos anos a casa térrea torna-se em sobrado, e posteriormente em um prédio de 5 a 7 andares.

Para quem não consegue a casa própria na Periferia, o aluguel ainda é a solução mais viável, mesmo que na maioria das vezes, as construções apresentem riscos de segurança aos próprios moradores, pela falta de um acompanhamento técnico - engenheiro e/ou arquiteto.

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2.4 - POLÍTICAS DE INTERVENÇÃO EM CORTIÇOS - LINHA DO TEMPO

Como vimos até o momento, os cortiços desde as últimas décadas do século XIX, tem sido objeto de estudo. No primeiro momento, foram realizados relatórios por técnicos levando em consideração questões de higiene, depois o Poder Público buscou entender a dimensão do problema em São Paulo, e junto vieram muitas outras pesquisas de profissionais de diversas áreas (arquitetura, ciências sociais, etc.), interessados em habitação, questões políticas e sociais. Até hoje, as pesquisas sobre esse tipo de coabitação em situações de extrema precaridade, são produzidas - e aqui se inclui esse trabalho. No entando, as pesquisas continuaram, no geral, apenas constatando fatos, sem efetivamente produzirem resultados na prática. Nesse sentido, as manifestações de grupos de moradores, coletivos e movimentos sociais, foram muito importantes para pressionar os gestores públicos mostrando que na realidade, os relatos são muito mais cruéis do que os retratados nos trabalhos acadêmicos. Foi assim, que os primeiros projetos de intervenção em cortiços surgiram na história da cidade, como veremos brevemente nesse capítulo. As primeiras reivindicações populares vão ocorrer em 1975, quando a Pastoral da Igreja procurou amenizar a miséria de inúmeros

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encortiçados em regições do Brás, Mooca, Santa Cecília e Belém (SIMÕES JÚNIOR, 1991, p.33). As ações religiosas (como a Pastoral da Moradia, anos 80) junto ao Movimento dos Encortiçados, ao longo dos anos, exerceram um importante trabalho de pressão nos setores públicos voltados ao bem estar e ao direito à moradia na época. Ao longo dos anos 90, outros coletivos se juntaram ao movimento, como o Sindicato dos Metalúrgicos e a União dos Trabalhadores da Mooca, exigindo além da moradia, equipamentos como creche; e o Movimento de Catadores de Papelão na região central, envolvendo bairros como Luz, Bom Retiro, Glicério e Bela Vista, com coordenação do Centro Gaspar Garcia (SIMÕES JÚNIOR, 1991, p.35). Os movimentos ganharam força, principalmente, na gestão da Luíza Erundina, possibilitando o início de projetos acessíveis com a realização (anos depois) por multirões e assistência técnica. Na “Linha do Tempo” a seguir, estão destacados e brevemente descritos, os principais acontecimentos, estudos, planos, intervenções e projetos políticos relacionados aos cortiços, entre os anos de 1875 a 2019.


FIGURA 45: Registro feito em um cortiço no centro de São Paulo em 2009, pelo fotógrafo Fábio Knoll, em parceria com a SEHAB (Secretaria Municipal de Habitação). Fonte: LÓPEZ; FRANÇA; COSTA (org), 2010.

FIGURA 46: Fotografia também em cortiço no ano de 2009, por Fábio Knoll. Na imagem, nota-se objetos e utensílios diversos utilizados para diferentes fins. O fogão à esquerda e a cama à direita, constrastam a precariedade / multifuncionalidade do espaço. Fonte: LÓPEZ; FRANÇA; COSTA (org), 2010.

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LINHA DO TEMPO

FIGURA 47: Foto do Relatório da Comissão de Exame e Inspeção, realizado na Santa Ifigênia, de 1893 Fonte: CORDEIRO, 2010.

1875

1886

Publicação do Padrão Municipal pela Câmera

Código de Posturas • • • • • • •

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Normas para construção de cortiços Trata da densidade populacional máxima Área mínima de 5m² por cômodo Obrigatoriedade de conter janelas largas Pé-direito de 4 a 4,5 m Necessidade de aterro para evitar alagamentos Entre outras regras.

Normas mais exigentes que as estabelecidas pelo Código de Posturas • É criado o “perímetro de comércio” na área central de São Paulo, aonde estariam proibídas a presença de cortiços e casas de operários • Obrigatoriedade de poço • Um Tanque de lavar roupas para cada grupo seis habitações • Um sanitário com água a cada duas habitações (PASTERNAK, 2016, p. 17; SILVA, 2011; apud SANTO AMORE et. al, p.33-4).


FIGURA 48: Foto do Código Sanitário do Estado de São Paulo, de 1894 Fonte: CORDEIRO, 2010.

1893

1894

Relatatório Municipal da Comissão de Exame e Inspeção • • •

Definição de cortiços, tipologias e suas respectivas características entradas nas inspeções realizadas por inspetores higienistas: Cortiço de quintal; cortiço casinha; casa de cômodos; cortiços improvisados; cortiços avenida; hotel cortiço. Associados às primeiras indústrias e bairros operários, estabelecidos na primeira década do séc. XX. (PASTERNAK, 2016, n.p. apud SANTO AMORE et. al, p.34).

Código Sanitário do Estado de São Paulo • • • •

Exige a demolição de cortiços, pois eram considerados focos de infecção e epidemias Edifício Martinelli transforma-se em um cortiço vertical São tomadas ações de despejo pelas autoridades públicas Moradores despejados mudam-se para cortiços próximos, em piores condições (PASTERNAK, 2016, p. 17. apud SANTO AMORE et. al, p.34).

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FIGURA 49: O Livro “O Cortiço” é um romance naturalista da Literatura brasileira escrito por Aluísio de Azevedo, em 1890. O autor retrata em detalhes a vida, o cotidiano e a morte de um cortiço no Rio de Janeiro, e expõe as diversidades encontradas nesse tipo precário de habitação coletiva de aluguel. Disponível em: <https://www.imaginie.com.br/como-citar-o-cortico-na-redacao/>. Acesso em: 30 de abril de 2019.

• •

55

1896

1937-1940

Definição de Cortiços através da Lei 286 de 1896

Pesquisa de Urbina Telles

“Art.13 - Entende-se por cortiço o conjunto de duas ou mais habitações que se comuniquem com ruas públicas por uma ou mais entradas comuns para servir de residência a mais de uma família. Parágrafo único: cada uma das habitações do cortiço chama-se quarto ou cubículo. Art. 14 – Compreende-se também como cubículos de cortiços os cômodos de casas que não sejam cortiços, mas que estejam divididas em diferentes fogões, e os que forem acrescidos nestas condições”.

Telles irá estudar 291 cortiços no centro de São Paulo, abrangendo os bairros Bela Vista, Brás, Mooca, Pari, Liberdade, Bom Retiro, Santa Cecília, Consolação, Sé, Santa Efigênia e Belém Constata o encortiçamento de casarões anteriormente habitados pelas classes de renda média e alta, e que migraram para áreas mais valorizadas, como Campos Elísios Estima que os cortiços estejam concentrados em maior número na Bela Vista (PASTERNAK, 2016, n.p.; SILVA, 2011; apud SANTO AMORE et. al, p.35).


FIGURA 50: Padre Louis-Joseph Lebret (1897-1966) Disponível em: <https://fgsaraiva.blogspot.com/2014/02/ padre-lebret.html>. Acesso em: 30 de abril de 2019.

FIGURA 51: O Estado de S. Paulo - 21/11/1971. O PUB foi inspirado na “cidade mais humanda” defendida por Lebret Disponível em: <https://acervo.estadao.com.br/noticias/ acervo,planos-urbanisticos-de-sao-paulo-nao-foramadiante,9639,0.htm>. Acesso em: 30 de abril de 2019.

1947-1961

1968

Pesquisa sob direção de Padre Lebret •

Aponta novos processos de estruturação urbana, gerando um empobrecimento cada vez maior nas áreas centrais, a formação de bairros (como os jardins) exclusivos para a classe de renda alta Considera no estudo além da habitação coletiva de aluguel, as favelas crescentes na periferia da cidade, constatando uma população em torno de 700 habitantes, dos quais 90% seriam moradores de cortiços nos bairros centrais. (PICCINI, 1991, p. 55; PASTERNAK, 2016, p. 9; apud SANTO AMORE et. al, p.35).

Plano Urbanístico Básico (PUB) • •

Estuda os cortiços sob parâmetros qualitativos Aponta a existência de 3 tipologias de cortiços: “1. cortiços subdivisões, improvisados ou não, de antigas mansões em decadência; 2. porões subdivididos; e 3. barracos de quintal ou meias águas, que são geralmente pequenos quartos de 3,0 m por 3,0 m com uma porta e uma pequena janela”. Constata que 10,3% das famílias da cidade vivem em cortiços e que a maioria (74,5%) paga aluguel (PASTERNAK, 2016, p. 9 apud SANTO AMORE et. al, p.35-6).

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FIGURA 52: Trecho encortiçado, na R. Major Diogo Fonte: SIMÕES JUNIOR, 1991.

FIGURA 53: Casas encortiçadas na R. Vergueiro Fonte: SIMÕES JUNIOR, 1991.

1975

1979

Estudo dos Cortiços pela Secretaria do Bem-Estar Social (SEBES)

Densificação populacional nos cortiços da Santa Cecília

• • • •

57

A partir de dados de Rendas Imobiliárias, estimouse que 9,3% da população de São Paulo moravam em cortiços Número médio de pessoas por cortiço estudado: 26,9 Área média construída por morador: 3,1 m² Média de 8,7 pessoas por sanitário e 9,8 pessoas por tanque (TEIXEIRA, 1985; PASTERNAK, 2016, p. 11, apud SANTO AMORE et. al, p.36).

Segundo a pesquisadora Margonari, “houve um aumento progressivo da quantidade de pessoas por cortiço: em 1893 havia 20 pessoas por cortiço; em 1968, 19,3; em 1975, 26,9; em 1979, 84,4” (PASTERNAK, 2016, p. 17 apud SANTO AMORE et. al, p.36).


FIGURA 54: Casarão parcialmente encortiçado na Vila Itororó Fonte: SIMÕES JUNIOR, 1991.

FIGURA 55: Área encortiçada na R. Conselheiro Ramalho Fonte: SIMÕES JUNIOR, 1991.

1985

1989

Projeto de Lei nº 504/89; e Plano de Ação Imediata da SEHAB

Livro “Cortiços: frente e verso”, SEMPLA •

Estimativa de 2.700.000 moradores de cortiços na cidade, considerada no entando estimada por considerar a taxa de crescimento equivalente à taxa dos moradores em favelas (SÃO PAULO, 1985; PASTERNAK, 2016, n.p., apud SANTO AMORE et. al, p.37).

Elaborado pelo Vereador Luiz Carlos Moura, o Projeto de Lei nº 504/89, estabeleceu a definição de cortiços e suas condições de habitabilidade, e que são utilizadas até hoje como parâmetros para identificação dessas edificações na cidade O Plano de Ação Imediata realizada pela SEHAB (Secretaria de Habitação), tal como a SEMPLA em 1985, superestimou os dados, e estimou cerca de 88 mil cortiços habitados por 3 milhões de pessoas, no município (PASTERNAK, 2016, p. 11, apud SANTO AMORE et. al, p.38).

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FIGURA 56: Foto na escala do pedestre. Da direita para esquerda, o segundo imóvel é o Casarão Celso Garcia, e que junto aos imóveis lindeiros contemplariam o projeto de intervenção da SEHAB (coord. do Arq. Cláudio Manetti). Fonte: Acervo pessoal Arq. Cláudio Manetti.

FIGURA 57: Maquete do projeto de autoria do Arq. Cláudio Manetti, que viria ser implantado no local do antigo cortiço existente no Casarão Celso Garcia, contemplando além de habitações, uso comercial no térreo. Fonte: Acervo pessoal Arq. Cláudio Manetti.

1989-1992

1991

Início da produção habitacional em mutirão para intervenção em cortiço

Lei Federal nº 10.928/1991, denominada Lei Moura

• •

59

Resultante de negociações entre a gestão da então Prefeita da cidade de São Paulo, Luiza Erundina e movimentos de moradia. Exemplos: Celso Garcia (Brás) e Madre de Deus (Mooca) Projetos realizados pela SEHAB e desenvolvidos por meio de assessoria técnica. Aquisição de imóveis por meio da FUNAPS (Fundo de Atendimento à População Moradora em Habitação Subnormal), com obras viabilizadas somente dez anos depois, no Programa Morar no Centro (gestão Marta Suplicy).

• •

Definem-se mais detalhamente os cortiços e suas características Ficam estabelecidas a partir do seu Decreto Regulamentador nº 33.189/1991, as condições mínimas de habitabilidade; prevê tarifas sociais para o aluguel, e multa ao proprietário que desobedecer as normativas; além de parâmetros que deverão ser utilizados de base para a identificação de imóveis como cortiços e cadastramento pela Prefeitura, como também para elaboração de novos planos de intervenção; válidas até hoje.


FIGURA 58: Moradia em porão, espaço extremamente FIGURA 59: Cortiço na “Rua Visconde de Parnaíba, 1939”. insalubre, onde se cozinha, dorme e sobrevive. Fonte: LÓPEZ; FRANÇA; COSTA (org), 2010. Fonte: LÓPEZ; FRANÇA; COSTA (org), 2010.

1992

1993-1994

Publicação do COE - Código de Obras e Edificações - Lei municipal nº 11.288/92 • • •

Flexibiliza as exigências para programas habitacionais de interesse social Reproduz diretrizes da Lei Moura, como dimensões mínimas para aberturas como janelas, com o intuito de manter um ambiente salubre Estabelece o espaço mínimo de 15 m² por pessoa em uma edificação (bem próximo dos 12 m² encontrados em média em cortiços segundo o Relatório de Progresso de Habi-Centro de 2010 (SILVA, 2011, n.p., apud SANTO AMORE et. al, p.41).

Pesquisa FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) • • •

Considerou duas tipologias de Cortiços, além das definidas pela Lei Moura: Imóveis construídos e Imóveis concebidos, com a finalidade cortiço. Reconhece a existência dessa modalidade de moradia como um negócio altamente rentoso aos proprietários Estima que apenas nos distritos pertencentes à administração da Subprefeitura da Sé, existissem 44 mil famílias encortiçadas (SILVA, 2011, n.p., apud SANTO AMORE et. al, p.42).

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FIGURA 60: Cortiços remembrados na Rua Tomás de Lima, 85. Área destinada à implementação do projeto de intervenção “Sé A”, dentro do PAC - CDHU. Fonte: Relatório Geral do Programa de atuação em cortiços CDHU - PAC, 2012.

FIGURA 61: Vista aérea do Conjunto Casarão Celso Garcia Fonte: Anexo C. O Conjunto Celso Garcia, 2006 DIsponível em:< http://cassiopea.ipt.br/tde_arquivos/2/ TDE-2006-12-07T160243Z-53/Publico/13_AnexoC-a.pdf>.

2000-2001

2000-2004

Identificação de imóveis para o PAC da CDHU e Fundação SEADE

Continuação de projetos idealizados na Gestão Erundina, e Bolsa aluguel

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Considerava a possibilidade de reformar e reutilizar imóveis somados à novas áreas para a construção de habitação, para onde seriam realocados os moradores de cortiços Área de análise: Subprefeitura Mooca (Mooca, Belém, Brás) e Subprefeitura Sé (Barra Funda, Bom Retiro, Bela Vista, Cambuci, Liberdade e Santa Cecília) Dados: Total de 1.648 cortiços identificados (Sub. Mooca - 416, e Sub. Sé - 1.232); e 38.403 habitantes (PASTERNAK, 2016 apud SANTO AMORE et. al, p.43).

• •

• •

Exemplos ações FUNAPS: Imoroty, Vilinha 25 Janeiro, Eiras Garcia e Pedro Facchini Exemplos ações PAR (Programa de Arrendamento Residencial) da CEF (Caixa Econômica Federal): Fernão Sales, Riskala Jorge, “Banespinha” da Celso Garcia, Maria Paula, Hotel São Paulo, Edifício Labor na Brigadeiro Tobias Exemplos ações Prefeitura: Parque do Gato, Olarias e Vila dos Idosos (locação social); e Asdrubal do Nascimento (reforma) Demarcação de ZEIS 3


FIGURA 62: Registro da construção de um dos conjuntos residenciais idealizados pelo PAC, destinado à realocação de moradores encortiçados. Fonte: Relatório Geral do Programa de atuação em cortiços CDHU - PAC, 2012.

FIGURA 63: Edifício São Vito, era localizado em frente ao Mercado Municipal, na Av. do Estado. Inaugurado em 1959, foi completamente demolido em 2011. Fonte: São Paulo in foco, 2013.

2002

2003

Programa de Atuação em Cortiços (PAC) • •

• •

Ação conjunta da Prefeitura e o CDHU, com parceria e financiamento do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) Atuação: Identificação e cadastramento de cortiços, segundo a Lei Moura; desapropriação de imóveis; instrumentos de negociação com residentes e proprietários; demolição e construção de novo edifício residencial Subsídios: Concessão de uso de unidades produzidas pela CDHU; Cartas de Crédito e o Certificado de Concessão de Subsídio (ambos) Requisitos: 2 anos de cortiço; de 1 a 10 s.m

Desocupação do Edifício São Vito Cortiço Vertical • •

25 pavimentos e 600 quitinentes Inicia-se a depredação quando quitinentes começam a ser subdivididas para locação. São encontradas instalações elétricas clandestinas e acúmulo de lixo, em torno dos anos 70 • Dispersão de ex-moradores pelas regiões próximas (Centro de São Paulo) • Sem solução habitacional definitiva (PASTERNAK, 2016, p. 17 apud SANTO AMORE et. al, p.46). • Demolição finalizada em 02 de maio de 2011.

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FIGURA 64: Localizado na R. Conde de São Joaquim, 85, o edifício amarelo “Bela Vista E”, foi construído pelo PAC CDHU, sob coordenação da arquiteta Ana Maria Antunes Coelho, em 2009. No local, existia um cortiço, do qual os moradores foram realocados para a nova edificação. Fonte: Autoral, 30 de março de 2019.

FIGURA 65: Capa do Livro “Cortiços. A experiência de São Paulo”. Publicado em 2010 pela Prefeitura de São Paulo (SEHAB). Fonte: Fonte: LÓPEZ; FRANÇA; COSTA (org), 2010.

2004

2009

Programa de Cortiços – Reabilitação da Moradia Coletiva

Pesquisa SEADE para o Plano Municipal de Habitação

• • • • •

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Criado a partir da aprovação da Resolução nº 15 do Conselho Municipal de Habitação (CMH) Traz considerações quanto aos contratos de locação Exige a criação de um banco de dados para cortiços com 2 classificações, auxiliando seu licenciamento ou intervenção Atenta as autoridades públicas à necessidade de fiscalização in loco Oferece financiamento pelo Fundo Municipal de Habitação, aos proprietários para reformas de adequação às exigências da Lei Moura

• •

Constatou a existência de 127 mil domicílios precários (desconsiderando os cortiços) Estimou a existência total de 80 mil domicílios encortiçados, correspondendo a 1,27% da população total de São Paulo, e 19% das áreas centrais (19.900 pessoas) Área média de 12 m² por cômodo por família, no Centro (SILVA, 2011, p. 17 apud SANTO AMORE et. al, p.47).


FIGURA 66: Capa do caderno para discussão pública Fonte: Plano Municipal de Habitação de São Paulo, 2016.

FIGURA 67: Trecho do Diário Oficial da Cidade (DOC) de São Paulo, publicado em 14 de março de 2019, aprovando a contratação do Consórcio Pólis/Peabiru, para a realização do novo Censo de Cortiços. Fonte: DOC São Paulo, 14 de março de 2019.

2014-2016

2018-2019

PDE Lei municipal nº 16.050/2014 PMH - Caderno para discussão - 2016 • •

Correspondem respectivamente, ao Plano Diretor Estratégico e ao Plano Municipal de Habitação, vigentes até a conclusão dessa pesquisa PDE: Cita os cortiços relacionando-os à necessidade de requalificação e reabilitação de áreas deterioradas e subutilizadas; às ZEIS; e a provisão de HIS para população de baixa renda PMH: Explica como funciona o PAC e quais são os principais desafios a serem enfrentados para traçar estratégias para cada situação.

Solicitação pela Prefeitura de um novo Censo de Cortiços •

A “chamada pública para contratação de serviços técnicos profissionais especializados em pesquisa censitária de cortiços”, foi aberta no início de 2018 pela Prefeitura de São Paulo Em março de 2019, foi divulgada a contratação do Consórcio Pólis/Peabiru, responsáveis pela realização do novo Censo, sob a “Nota de Empenho no valor de R$ 538.580,00, divulgado pela SEHAB, em 09 de abril de 2019.

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3.

A INFLUÊNCIA MODERNISTA NA PRODUÇÃO DE HIS

Casos de descaso social

Imigrantes; Sanitarismo; Inquilinato e Periferização; e Políticas de Intervenção em Cortiços - Linha do Tempo Séc. XIX - XXI

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3. A INFLUÊNCIA MODERNISTA NA PRODUÇÃO DE HIS

A questão da habitação voltada para as classes menos favorecidas - entende-se por elas as chamadas “minorias” na atual sociedade, negros e pobres - sempre foi um problema desde que o homem se viu numa posição de superioridade em relação a cor da sua pele e o acúmulo de bens materiais, mediados pelo capital. Mas, nem sempre a qualidade da moradia dessas classes importava à classe dominante, a ponto de não serem feitas nenhuma modificação ou melhorias no espaço, como era o caso das senzalas durante o período escravocrata no Brasil. A burguesia e o Estado, principalmente após a urbanização das cidades através do desenvolvimento econômico industrial, entre os séculos XIX e meados do XX, trataram a questão da habitação popular com negligência, afastando de si a responsabilidade de encontrarem uma solução adequada e viável financeiramente às classes pobres (VILLAÇA, 1986, n.p). Uma das primeiras manifestações em relação às condições precárias em que se viram os operários na cidade industrial, surgiram na Europa em meados do século XIX, a partir de três críticos intitulados “Socialistas Utópicos”. Segundo Villaça (1986), os pensadores Saint Simon, Fourier e Owen, representavam uma parcela da sociedade que se via indignada com a miséria

urbana, consequência do capitalismo predatório. As péssimas condições de trabalho nas fábricas em jornadas exaustivas e mal remuneradas; os cortiços e as ruas como destino e não opção de moradia para classe empobrecida; além das epidemias que se alastravam principalmente por Londres e Paris; para os críticos representavam o mal, e que somente seria combatido de uma forma: quando as ações humanas fossem guiadas pela razão e conscientização social. “Nas palavras de Engels: ‘Para todos eles, o socialismo é a expressão da verdade absoluta, da razão e da justiça, e é bastante revelá-lo para, graças a sua virtude, conquistar o mundo’” (VILLAÇA, 1968). As vilas operárias - que a partir da Lei 315 de 1897, surgem em São Paulo como alternativa de moradia digna às precárias condições dos cortiços e casas de cômodo existentes no centro da cidade (PICCINI, 2004, p.32) - originaram-se do que são considerados como os primeiros modelos urbanos e, sob um mesmo contexto higienistas que tinha como partido as necessidades da burguesia. Classificados como “pré-urbanistas progressistas” por Françoise Choay (1979 apud JATOBÁ, 2017), Simon, Fourier e Owen, tinham como objetivo a partir da criação de uma cidade do zero, instaurar uma ordem social sobre o caos urbano da cidade industrial. Um dos exemplos, é


o Falanstério de Charles Fourier, onde o ideário é uma vida social mais “humana”. No geral, as propostas já antecipavam alguns fundamentos que mais tarde, no século XX, estariam presentes na arquitetura moderna, como a “separação das funções urbanas, a valorização dos espaços verdes e o funcionalismo que Le Corbusier consagraria nos seus projetos” (JATOBÁ, 2017). Mais do que utópicas - já que algumas não saíram do papel, como a cidade ideal de Fourier -, as propostas não foram suficientes para causarem o impacto que se imaginara na sociedade. Os projetos além de serem pontuais, eram limitados a capacidade de no máximo 2 mil habitantes, o que não atendia totalmente a demanda da época e nem mesmo a que viria nos anos seguintes com as guerras mundiais. A partir de 1930, com a realização dos CIAM’s (Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna), problemas sociais e urbanos que se acentuaram com o acelerado crescimento das cidades – americanas e europeias – junto às primeiras guerras, começaram a ser discutidos por profissionais. O objetivo desses encontros era debater possíveis soluções a partir da produção arquitetônica moderna em 4 esferas da vida urbana: habitação, trabalho, lazer e circulação. A temática da habitação esteve presente logo nos dois primeiros encontros: I CIAM em Frankfurt (1929) e o II CIAM em Bruxelas (1930), e que tiveram como principal linha de raciocínio a habitação mínima e o desenvolvimento racional do lote, respectivamente (CARMAGNANI, 2013), defendidos como meios de viabilizar a produção de moradia em massa com qualidade e a custos reduzidos; outros aspectos como o respeito à

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diversidade e à escala humana, também entraram em debate, incluídos posteriormente na produção da Carta de Atenas, baseada na análise de 33 cidades de diversas localidades, e finalizada no IV CIAM (em Atenas, 1933) com o intuito de orientar em escala universal, o planejamento, recuperação e construção de espaços urbanos (IRAZÁBAL, 2011). No entanto, a partir dos anos 70, a revisão do ideário do urbanismo moderno defendido pelos CIAMs, já com base na avaliação de projetos concebidos sob sua influência, geraram diversas críticas tanto sobre a forma urbana quanto no seu impacto social, como a criação de “espaços de ninguém”, a monotonia da paisagem, monumentalidade dimensional (projetos fora da escala do pedestre), quantificação exagerada das necessidades do homem, o descaso com o histórico dos centros e seu patrimônio construído, a dispersão social, forma urbana pouco atrativa e estética excludente (BRAZ E SILVA, 2010).

AS VILAS REPRESENTAM O MODELO DE MORADIA POPULAR, DEFENDIDA PELO PODER PÚBLICO A SUA REPLICAÇÃO: ERA SALUBRE, DIGNA E UNIFAMILIAR, E CONTRARIAVAM OS CORTIÇOS: INSALUBRES, DESUMANOS E CLANDESTINOS. AINDA QUE POR UM DESCUIDO, AMBOS PUDESSEM SE CONFUNDIR (LEITE, G. F. T., 2019).


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1. Sótão, com quartos para hóspedes; 2. Reservatório hídrico; 3. Aposentos privados; 4. Rue intérieure; 5. Sala de reunião; 6. Sobreloja; 7. Andar térreo com passagem para viaturas; 8. Passadiço coberto. (BENEVOLO, 1981).

Figura 68: “Perspectiva de um Falanstério ou Palácio Societário dedicado à Humanidade”, de Charles Fourier. Fonte: ecosia.org. Acesso em: 03 de abril de 2019. Ao lado, um corte esquemático da edificação, onde é possível identificar parte de sua setorização. Sob um contexto de avanço industrial e do declínio de ações relacionadas à Revolução Francesa quanto a busca pela justiça social, Charles Fourier vê em seu projeto, a formação de uma sociedade igualitária e justa, onde ricos e pobres estariam unidos por um único ideal socialista. Mas, diferentemente do que aconteceu com Robert Owen, que fundou colônias tanto na Inglaterra quanto nos Estados Unidos, Fourier viu o seu projeto ficar no imaginário, uma utopia que não encontrou seu fundador.

O projeto de unidades sociais seria dedicado a minimizar a desigualdade, tendo a Harmonia como um novo patamar a ser alcançado pelo homem, em subtituição à Civilização - ápice da sociedade industrial. Para isso, Fourier havia sistematizado todas as relações entre seus exatos 1620 moradores (810 de cada sexo), desde a diversidade de seus amores e prazeres, até os detalhes dos botões de trajes comuns, o que em tese “impediria o estabelecimento dos padrões individualistas e egoístas” (BARROS, 2016, p.231). Quanto a sua arquitetura, o Falanstério seria um palácio de muitas alas, compreendo “galerias envidraçadas, pátios internos, jardins, galpões, salas comunais, oficinas, hospedarias, áreas lúdicas que incluiriam um Teatro, e até mesmo uma Igreja. [...] Cada ala teria apartamentos de preços diferentes (20 tipos de preço)” (ibid., p.232), sendo que cada proprietário teria a limitação de possuir até 3 unidades. O Falantério seria como uma cidade autossustetável, baseando sua economia na agricultura e na manufatura, em contraponto ao trabalho mecanizado e repetitivo nas indústrias, retomando às atividades romantizadas em período anterior à implantação do sistema capitalista.

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3.1 UM DESCASO SOCIAL: PRUITT-IGOE (1954-1973)

Um dos projetos habitacionais mais emblemáticos inspirados nos princípios citados anteriormente, Pruitt-Igoe foi construído no auge do modernismo na década de 50, em St. Louis, Missouri, nos Estados Unidos. O massivo complexo habitacional é fruto de uma política pública de financiamento para remoção de favelas, cortiços e reconstrução de cidades, motivado pela aprovação de um fundo de investimentos de U$ 1 Bilhão para a realização de projetos com tal finalidade, em 1969 através da Lei Federal da Habitação (Housing Act). Tendo em vista um crescente êxodo da classe rica para os subúrbios, o prefeito de St. Louis, Joseph Darst e o engenheiro Harold Bartholomew, sob o receio do surgimento de favelas nos vazios que surgiam, viram a oportunidade de orientar o crescimento da cidade a partir de um complexo habitacional que atenderia a demanda crescente das classes mais pobres por moradias populares, previsto para ocupar uma área de 238 mil m² em um dos bairros menos povoados da região, o DeSoto-Carr (FIEDERER, 2017). No projeto, de autoria do arquiteto Minoru Yamasaki, foram definidas um total de 2.870 unidades habitacionais, distribuídos em 33 torres de 11 andares, com a capacidade de acomodar até 10.000 residentes, tendo como principal referência para a configuração dos

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FIGURA 69: Vista aéria dos edifícios Pruitt-Igoe. Percebese a disponibilidade de espaços livres sem qualificação: faltam áreas verdes e equipamentos de lazer Disponível em: Archdaily, 19 de maio, 2017.

espaços e arquitetura das torres, a Ville Radieuse de Le Corbusier. Praças, banheiros públicos e equipamentos de lazer, estavam previstos no projeto original, mas por questões orçamentárias, acabaram sendo desconsiderados em sua execução. A racionalização dos custos também se refletiu na comunicação entre os andares: os elevadores paravam somente de 3 em 3 níveis, sendo os demais (para cima ou para baixo) ligados por escadas e corredores - vias elevadas -, a justificativa para tal solução seria a reprodução do estímulo das calçadas nas relações sociais entre os moradores, mas agora, dentro dos edifícios, de forma mais segura para crianças e adultos característica essa que ao longo do tempo surtiu efeito contrário. Além da supressão de equipamentos que seriam essenciais para a manutenção da complexidade social que estaria presente no conjunto, o design do complexo ignorou completamente o contexto que viviam os mais conservadores no Estados Unidos na época. A ideia inicial era que o conjunto estivesse dividido em linhas raciais, o que não foi aprovado pelo fato


FIGURA 70: Implantação do projeto original. Disponível em: Archdaily, 19 de maio, 2017.

FIGURA 71: O conjunto de edifícios isolados e verticalizados, sob preceitos da Arquitetura Moderna. Disponível em: Archdaily, 19 de maio, 2017.

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de a obra ter sido concluída após a decisão de tornar a segregação ilegal, pelo Supremo Tribunal. No entanto, a mentalidade segregacionista persistiu: moradores brancos mudaram-se para outras localidades, seguido dos negros que tinham condições financeiras melhores. O abandono dos apartamentos acontecera em massa: mesmo no auge de sua ocupação, o Pruitt-Igoe teve 9% de vacância, chegando em a 65% dos apartamentos vagos, em 1970, com apenas 600 moradores, tendo permanecido os mais pobres, e em número insuficiente para custear a manutenção do complexo.

filha do Iluminismo, era herdeira de suas ingenuidades congênitas, ingenuidades tão boas e respeitosas que não podem ser contestadas em um livro sobre edifícios. [...] Como a educação racional, saúde racional e desenho racional de calças femininas, este tem erros de uma época que tentava se reinventar totalmente todos os dias em bases racionais” (JENKS, 1977).

O fracasso do projeto derivou-se do conjunto de políticas preconceituosas, patologias sociais e arquitetura ineficiente. Os “espaços de ninguém”, intermediários entre público e privado, passaram a ser cenários de crimes, e o projeto que chegou a ser considerado “O Melhor Edifício de Apartamentos” pela revista Architectural Forum em 1965, teve sua classificação revista, para “fracasso de projeto de habitação pública”. A “morte de uma era modernista”, segundo o crítico de arquitetura Charles Jenks (1977), foi declarada no momento da demolição de todo o complexo que se sucedeu no ano de 1973, 20 anos depois de sua construção (FIEDERER, 2017). “Seu estilo Purista, sua limpa e salubre metáfora de hospital de subúrbio, tentava inspirar virtudes correspondentes em seus habitantes. A boa forma levava ao bom conteúdo, ou pelo menos à boa conduta; o planejamento inteligente de espaço abstrato promoveria um comportamento saudável. [...] Infelizmente, ideias tão simplistas, embasadas nas doutrinas filosóficas do Racionalismo, do Comportamentalismo e do Pragmatismo provaram ser tão irracionais como as próprias filosofias que as geraram. A Arquitetura Moderna,

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FIGURA 72: Registro das primeiras demolições do polêmico conjunto habitacional, Pruitt-Igoe (19541973). Disponível em: Archdaily, 19 de maio, 2017.


3.2 UM DESCASO SOCIAL: BNH (1964-1988)

Eufemismo, é como Villaça (1986) se refere à expressão “Interesse Social” na política habitacional criada no Brasil em 1964, cinco meses depois do golpe militar - período ditatorial da política nacional -, intitulada BNH (Banco Nacional de Habitação). Criado pela Lei nº 4.380/1964, o BNH é um dos produtos da ditadura que se instalou devido às características econômicas, políticas e ideológicas da época, definido em sua emenda como um tipo de “sistema financeiro de habitação de interesse social”, o que nos instiga analisar dentro do significado e abrangência da expressão citada anteriormente [Interesse Social], a partir do que foi produzido, e como influenciou a produção habitacional popular pós ditadura. Diferentemente do que viera acontecendo nos primeiros anos do século XX, onde o mercado de moradia popular era produto exclusivo da iniciativa privada, o Banco Nacional de Habitação representou uma ação mais incisiva da esfera pública federal na produção habitacional, agora como o principal financiador, como expressa o primeiro artigo da Lei: “O Governo Federal, através do Ministério de Planejamento, formulará a política nacional de habitação e de planejamento

territorial, coordenando a ação de órgãos públicos e orientando a iniciativa privada no sentido de estimular a construção de habitações de interesse social e o financiamento da aquisição da casa própria especialmente pelas classes da população de menor renda”.

Destacando também, qual seria a prioridade do programa, em seu Art. 4º “... construção de conjuntos habitacionais destinados a eliminação de favelas, mocambos e outras aglomerações em condições subumanas de habitação”.

Em “condições subumanas de habitação”, estão inclusos os cortiços, mas que não são diretamente citados. Mas, apesar de um teoria contundente em relação ao atendimento das necessidades sociais, como sendo esse o principal motivo para a criação do BNH, alguns discursos políticos destacados por vários autores, revelam a verdadeira intenção por trás da “ação social”, como pode ser observado através da carta de Sandra Cavalcanti encaminhada ao então Presidente Castello Branco, e transcrita por autores como Vasconcelos de Souza, Maura P. Véras e Azevedo e Gama de Andrade: “Aqui vai o trabalho sobre o qual estivemos conversando. Estava destinado a campanha presidencial de Carlos, mas

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nós achamos que a revolução vai necessitar agir rigorosamente junto às massas. Elas estão órfãs e magoadas, de modo que nós vamos ter de nos esforçar para devolver a elas uma certa alegria. Penso que a solução dos problemas de moradia, pelo menos nos grandes centros, atuará de forma amenizadora e balsâmica sobre suas feridas cívicas”.

O Estado tentava se legitimar no poder através das massas populares, reconhecendo anos mais tarde depois da criação do programa, em torno de 1967, a intenção cumulativa e econômica através da ideia de financiamento da casa própria, em detrimento da casa de aluguel. Mario Trindade, citado por Villaça (1986), afirma: “...o problema mais importante não era a casa, era a abertura de oportunidade de emprego para absorvermos as massas de trabalhadores semi especializados, de oportunidades para mobilizarmos os escritórios de engenharia... e dar trabalho às firmas paralisadas na economia brasileira”.

Ficando claro as intenções financeiras, no documento que encaminhou o Plano Nacional de Habitação ao Presidente Castello Branco, conforme diz Vasconcelos de Souza, citada por Azevedo e Gama de Andrade: “É preciso não abandonar a população favelada. Na realidade ela é muito maior do que se vê nas favelas, pois a elas se somam as casas de cômodos, as águas furtadas, os porões etc. Essa gente tem um poder aquisitivo mínimo, mas é gente. Para eles deverá ser mantido esse Fundo de Assistência Social previsto no texto de forma ampla... Se essa faixa de população não for atendida, o Plano ficara falho. Poderá ajudar a construção civil do país a se recuperar; poderá atuar brilhantemente na abertura de frentes de trabalho; poderá

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melhorar as empresas médias e pequenas de produção de material de construção e poderá dar destino melhor à capacidade de poupança dos mais bem aquinhoados. Mas, sem atender a faixa proletária (salário mínimo) terá fracassado no seu objetivo social. Os recursos do Plano serão fatalmente desviados apenas para os que suportarem os ônus da compensação inflacionária a ser instaurada”.

Devido à crise no setor imobiliário, é somente a partir de 1967 que começam a ser registradas as primeiras implementações do programa, financiadas através da criação do Sistema Financeiro Habitacional (SFH), que terá como principal fonte de recursos a contribuição compulsória de 8% do salário do trabalhador ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), criado em 1966 pela Lei nº 5.107, e exclusivo para investimento - até o momento - em habitação; e o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimos (SBPE), correspondente a um fundo de poupanças voluntárias administradas pela Caixa Econômica Federal e bancos privados, a partir de 1967. O fato de se tratar de um “órgão que articula o setor público, como financiador principal, com o setor privado, executor da política habitacional” (ANDRADE, 1976, p.123; VERAS, 1980, p.55 apud VALLADARES, 1983, p.39) era a principal inovação do programa comparado à outras políticas com objetivos semelhantes. Segundo Oliveira (2014, p.38), o subsídio do financiamento deveria ser destinado à três faixas de renda: 1. Segmento popular: famílias com até 5 salários mínimos seriam atendidas pelas COHABs (Companhias de Habitação a nível Municipal ou Estadual);


2. Segmento econômico: famílias de até 6 salários mínimos que seriam atendidas por cooperativas habitacionais “(associações sem fins lucrativos que se formam a partir de categorias profissionais e são intermediárias entre os mutuários e o BNH)”; 3. Segmento médio: para famílias com renda acima de 6 salários mínimos - correspondentes a classe média -, onde atuavam os agentes privados como o SBPE. A conduta do BNH, no entanto, foi guiada pelos “requisitos da acumulação” (VILLAÇA, 1986, p.32), limitando o que deveria ser no início um programa para a promoção de habitações de interesse social, para o atendimento à famílias com renda igual ou superior a 5 salários mínimos, como pode ser visto na tabela abaixo.

Permanecendo por tanto, o desamparo à classe da população mais pobre, que se via impossibilitada de conseguir um financiamento habitacional aprovado, tanto pelas limitações e renda quanto pelo descaso social do programa em prática, já que a produção de unidades acessíveis à três salários mínimos aconteceu em quantidade irrisória perto da dimensão do problema habitacional: de acordo com o Plano Diretor do Município de São Paulo (1985), mais da metade da população local (55%), morava em habitações subnormais no ano 1983: FAVELA 460.000 pessoas ALUGUEL 2.576.000 pessoas (cortiço ou casa precária) CASA PRÓPRIA 2.024.000 pessoas (auto-construída precária) (VILLAÇA, 1986, p.28).

5,0% 28,0% 22,0%

TABELA 1: Total investido em Habitação por Segmento, no período de atuação do BNH (1964-1986) Segmentos de habitação e renda

Mercado Popular

Viabilizadores

Subsídio Financeiro

Porcentagem

Programas Tradicionais ‐ COHABs

1.235.409

27,70%

Programas Alternativos

264.397

5,90%

1.499.806 488.659

33,60%

299.471

6,70%

788.130 1.898.975

17,60% 42,50%

280.418

6,30%

2.179.393 4.467.329

48,80% 100%

Total Cooperativas Mercado Econômico

Outros Programas Total

SBPE Mercado Outros Médio e Alto Programas Total TOTAL SFH

10,90%

Do total de recursos disponíveis para o financiamento de habitações, somente 33,6% foi destinado à moradia popular (3-5 salários mínimos), enquanto que para o mercado médio e alto (acima de 6 salários mínimos), foram destinados quase 50% dos recursos (48,80%). Fonte: ROYER, 2009.

74


Assim como o Pruitt-Igoe, o sucesso ou não do BNH na política habitacional do Brasil no período da Ditadura Militar se deu principalmente pelo contexto histórico, sempre guiado por interesses de mercado: “O BNH buscou evidentemente atingir um mercado com poder aquisitivo que pudesse fazer frente aos preços dos imóveis e às altas taxas de juros e correção monetárias que aumentam anualmente mais do que o aumento do salário mínimo. (CASTILHO, 2015)”.

famílias de baixa renda, como também na baixa qualidade das construções e dimensões mínimas que desconsideravam as necessidades dos futuros moradores - visando baratear a obra sem afetar o lucro -; na implantação dos conjuntos em áreas longínquas do centro das cidades (nas periferias), no geral sem infraestrutura e equipamentos básicos como escolas; além do surgimento das dificuldades no deslocamento, já que agora as oportunidades de trabalho estavam ainda mais distantes do alcance dessa população.

O BNH também atuou em outras frentes, como no desenvolvimento urbano da cidade, sendo até maior o investimento nesse setor do que em moradia, e sobre as mesmas bases de financiamento que essa, como pode ser visto na tabela abaixo. O descaso social refletiu não somente no saldo negativo frente às promessas de atendimento às TABELA 2: Distribuição Percentual das Aplicações

Fonte: GUGLIELMI, 1984, p.61 apud VILLAÇA, 1986, p.36

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“A atuação do BNH mostra que essa política teve êxito enquanto instrumento de dominação ideológica, como geradora de empregos na construção civil e como pirâmide keynesiana, amortecedora de recessões econômicas. Contudo, sua atuação social ficou bastante comprometida: o saldo quantitativo de oferta de habitação continuou irrisório para o mercado popular, ante a demanda de moradias por parte de classes de mais baixa renda. Por seu


modelo empresarial, utilizando-se de mecanismos de financiamento e correção monetária, controles de inadimplência, ao tornar o empreendimento lucrativo, tratou o problema habitacional como ‘investimento-retorno’, mesmo quando dirigido aos setores populacionais. Pelo grande impulso às edificações de luxo, estimulando o mercado superior, a política habitacional evidenciou mais uma vez o descuido para com as classes trabalhadoras. E pela enorme canalização das verbas da habitação para operações urbanas (sistema viário, saneamento, metrô etc)” (VÉRAS, BONDUKI, 1986, p.52, apud OLIVEIRA, 2014, p.40).

Apesar de extinto em 1986, a estrutura do BNH ainda serviu de inspiração para a implementação do Plano Nacional de Habitação, mais de 10 anos depois, na gestão do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Como exemplo, a participação do setor privado na promoção de habitação para a população de até 5 salários mínimos, incluindo ainda subsistemas de HIS (até 3 salários mínimos) e “Habitação de Mercado”, podendo ser financiados também através do FGTS.

[...] o fato é que se trata de um programa feito pelo Governo Federal e pelos empresários. Claro que é louvável um programa que cria empregos e reserva 16 bilhões de reais em subsídios para a população de zero a três salários mínimos, e prevê amplos recursos para a regularização fundiária. Mas não serão os organismos metropolitanos, nem os municipais, que, no final das contas, irão definir qual a melhor localização das novas moradias, dos novos bairros. Está de novo se pensando em coisas muito grandes, em megaconjuntos - o formato preferido das construtoras e empresas imobiliárias, quando há tanto espaço vazio, mal - aproveitado ou passível de retrofit nas áreas centrais das grandes cidades*. É o mercado que vai comprar as terras e definir aonde os conjuntos vão se localizar. É a velha inversão de papéis, o rabo abanando o cachorro. Todos esses investimentos - para lá de bemvindos - vão ser jogados na nossa cultura patrimonialista de administração do solo, por mais que o programa fale que os empreendimentos devem estar inseridos no tecido urbano. (MARICATO, 2009, p.63 apud OLIVEIRA, 2014, p.42-3).

A arquitetura dos conjuntos somada às questões discutidas ainda na fase do BNH, também se repetiram no que viria a ser o principal plano do Governo vigente, o “Minha Casa Minha Vida” em 2009, agora sobre a responsabilidade integral da Caixa Econômica Federal. No entanto, “o que se vê novamente é o problema habitacional brasileiro sendo tratado como meramente produção de casas, sem um planejamento que adeque localização, infraestrutura e padrão de moradia” (OLIVEIRA, 2014, p.42). A produção habitacional para as faixas de alta renda continuaram sendo facilitadas, enquanto os mais pobres eram expulsos para as periferias das cidades.

* Grifo nosso.

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FIGURA 73: Conjunto COHAB Artur Alvim, construído na década de 1970. Fonte: Instituto Bixiga, 2019.

FIGURA 74: Conjunto COHAB Cidade Tiradentes, construído na década de 1980. Fonte: Instituto Bixiga, 2019. A produção de habitação em massa, configurada em grandes conjuntos, que se configurou com a implantação do BNH pela COHAB, apresenta muitas semelhanças aos modelos de conjuntos habitacionais defendidos pelos IAPs (Institutos de Aposentadoria e Pensões), criados na década de 1930. Como por exemplo: a implantação de edificações em conjuntos habitacionais isolados do traçado urbano; a construção de blocos com limite de altura (4/5 andares); e o processo de construção racionalizada, inspirada em princípios modernistas. Mas diferente dos IAPS, os conjuntos da COHAB não apresentavam a mesma qualidade arquitetônica nem a intenção de se articularem à planos urbanos e equipamentos básicos, como escolas, comércios, espaços de lazer (BONDUKI, 2017, p.158-161), gerando déficits na infraestrutura para suprir as superquadras.

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FIGURA 75: Planta modelo da Unidade Apartamento, adotada pela COHAB durante o BNH. Fonte: Instituto Bixiga, 2019.

FIGURA 76: Planta modelo da casa/embrião, adotada pela COHAB durante o BNH. Fonte: Instituto Bixiga, 2019. As plantas adotadas pela COHAB durante o período de vigência do BNH, seguiram em todo o Brasil o modelo de “espaço mínimo”, como pode ser observado nas imagens acima. O objetivo dessa medida era baratear os custos de produção e consequentemente viabilizar o financiamento por valores mais acessíceis. O tamanho da habitação, no entanto, desconsiderava a configuração das famílias, que eram compostas em média de 3 a 5 pessoas, não atendendo em 100% as necessidades, afetando consideravelmente a qualidade de vida da maioria.

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FIGURA 77: Vivienda de interesse social no México. Fonte: Archdaily, 2019.

FIGURA 78: Bairro residencial planejado em Indaiatuba, interior do Estado de São Paulo, financiado pela Fase 2 do projeto Minha Casa Minha Vida (MCMV). São mais de 3 mil unidades, entre casas, apartamentos e lotes comerciais. Fonte: Jornal Nova Metrópole, 2016. Disponível em:< http://jornalnovametropole.com.br/wp/jacitara-viabilizamaior-projeto-habitacional-de-sao-paulo/>. Acesso em: 04 de maio de 2019. Aos projetos habitacionais produzidos em massa, foge o caráter de exclusividade, de pertencimento dos moradores, que são excluídos do processo de definição projetual. São projetos padronizados, que desconsideram a unidade, em um sistema onde “somente a população de alta renda pode ter o privilégio de casa ‘customizada’” (SALINGAROS, et. al., 2019).

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OS CORTIÇOS REPRESENTAM A LUTA DE MILHARES DE PESSOAS PELO DIREITO À MORADIA FRENTE A UM DÉFICIT HABITACIONAL CENTENÁRIO NA CIDADE DE SÃO PAULO (LEITE, G. F. T., 2019).

3.3 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: ERROS E PERSISTÊNCIAS

Os questionamentos levantados sobre a produção moderna de habitação de interesse social neste capítulo, podem ser considerados em inúmeros outros projetos do mesmo gênero em todo o mundo, principalmente nos países latinoamericanos, como é o caso do Brasil e do México. A geometria implantada expressa nos blocos retangulares, edifícios ou casas isoladas, idênticos e repetidos inúmeras vezes cobrindo uma vasta área, remetem a um modelo de arquitetura militar e industrial desenvolvido no período após as Grandes Guerras – e influente na configuração das cidades até os dias de hoje –, sob o mesmo incessante discurso de instituições públicas como o único modelo acessível aos recursos disponíveis para atender a grande demanda habitacional, gerada pelo acelerado desenvolvimento urbano das cidades. Fica subentendido, no entanto, o potencial que a racionalização da geometria dessas habitações têm como uma ferramenta de controle social do poder público sobre a população, onde a aceitação da variação da tipologia construtiva simbolizaria a perda desse controle (a customização segundo a visão política é exclusiva da população de alta renda, e a “igualdade” aos pobres, como elemento unificador), “assim como a entrada de um edifício de apartamentos pode ser facilmente fechada pela polícia, algo que é

impossível em uma disposição aleatória de casas individuais” (SALINGAROS, et. al., 21 Mar 2019). Por meio da chamada “geometria do poder” (ibid, 2019) aplicada na produção de habitação social em massa, é estabelecido não somente um controle psicológico de seus moradores em suas relações sociais (desconfiança e isolamento), como também na realização de atividades urbanas. A segregação entre as esferas pública e privadas, simbolizadas aqui pela rua e o edifício, respectivamente, é literalmente induzida pelos altos muros de concreto dos condomínios, numa vã tentativa de segurança, onde na realidade estão sendo criadas “prisões de alta segurança” – (BOJADSEN, 2015, p.70); e como consequência da ausência dessas atividades e da permeabilidade visual nas ruas, o medo instaurado vai afastando cada vez mais as pessoas do contato social, defendido por Jacobs (2011) como o principal elemento capaz de garantir a segurança pública, ao contrário do que se pensa com o uso de tecnologias como câmeras de vigilância, e policiamento intensivo. É destruída assim, a ideia de comunidade que em outrora possa ter existido, como também é reprimida a necessidade de se manter relações de vizinhança, essencial para um convívio

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FIGURA 79: “Complexos habitacionais e favelas em São Bernardo do Campo”, São Paulo. Fonte: Archdaily, 2019.

saudável em sociedade. O layout urbano criado pela geometria do poder, irá interromper uma sequência preexistente entre os espaços cheios e vazios, essenciais na configuração da cidade ideal, como se encontra geralmente na “geometria orgânica” das favelas, desenvolvidas geralmente como cita Francesco Orsini “sem cercas ou muros, onde a diversidade tipológica fruto da espontaneidade prevalece, e onde a rua é o centro das atividades e dos encontros, está mais próximo do conceito e da experiência da cidade ao permitir uma maior integração entre as esferas pública e privada de espaço, apesar das evidentes limitações estruturais que caracterizam sua formação.” (BOJADSEN, 2015, p.71).

Na produção da habitação social, critica-se principalmente a ideia de um projeto pontual isolado do tecido urbano, onde a partir do pensamento “de-cima-para-baixo” cria-se uma ideologia de padrões de moradia sob uma

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“falsa imagem de modernidade”, divulgada incessantemente pela mídia, onde é excluída a participação dos futuros moradores no processo até o produto final, ou seja, uma moradia limitada com base em necessidades genéricas estabelecidas pelos “fazedores de política” e pelas “elites profissionais” (SALINGAROS, et. al., 18 Mar 2019). Outra questão polêmica dos conjuntos habitacionais de interesse social, é a sua implantação em áreas desprovidas de infraestrutura como água, energia, e equipamentos básicos como escolas, serviços, entre outros; onde até mesmo a disposição e o formato orgânicos dos elementos naturais presente nos terrenos de projeto, como pedras e vegetação, ameaçam a padronização dos conjuntos, sendo esses a princípio eliminados da composição projetual, e algumas vezes incluídos posteriormente de forma pontual seguindo o alinhamento e rigidez das edificações. Atitudes


como essas, que afetam significativamente a qualidade de vida dos usuários, continuam sendo reproduzidas pelos idealizadores desse padrão sem nenhuma consideração à complexidade existente entre as relações sociais e a morfologia urbana. Criam-se assim estruturas monofuncionais e homogêneas, opostas ao necessário para a configuração real de espaços urbanos saudáveis, que para a sua manutenção devem estar conectados aos conglomerados, possibilitando que as pessoas tenham o livre direito de escolha em permanecer no local e/ou possam trabalhar onde conseguirem encontrar trabalho. Nikos A. Salingaros, David Brain, Andrés M. Duany, Michael W. Mehaffy e Ernesto Philibert-Petit, acreditam que a habitação, seja ela social ou geral, deva fazer parte de um processo de desenvolvimento sustentável, coexistindo em um tecido urbano misto, sem a necessidade de segregar ou criar espaços exclusivamente para os pobres. Será que então o próprio elemento “Habitação de Interesse Social” pode induzir uma segregação ao se restringir ao atendimento das classes de renda mais baixas? Os mesmos autores citados anteriormente, defendem que é necessário repensar a forma da “casa de todos — isto é, do urbanismo — de tal forma que a ‘habitação social’ seja submetida a um processo mais geral de criar uma cidade de redes saudáveis” (SALINGAROS, et. al., 18 Mar 2019) e não como é geralmente relacionado como um projetos para os pobres, sendo indispensável que as habitações se conectem com “as redes globais da cidade: ruas principais, o sistema de transporte público, os sistemas políticos e sociais etc.” (idem). Além disso, é preciso que se supere o preconceito em

viver no mesmo espaço que pessoas com rendas diferentes, ou em casos semelhantes ao ocorrido no conjunto habitacional de Pruitt-Igoe, onde o preconceito racial era predominante; o que poderia ser conseguido através do estímulo à percepção de unidade entre os moradores, ou seja, de uma comunidade, onde as interações humanas devem ser motivadas pela configuração do ambiente construído em harmonia ao urbano. Defende-se assim o estímulo à “diversidade, à complexidade, à heterogeneidade física e cultural, como também a animação de suas ruas e o sentido de pertencimento gerado ao lugar por seus próprios moradores” (BOJADSEN, 2015, p.72) como o melhor meio de combater “uma série infinita de periferias sem identidade, sem história e com um futuro incerto” (Ibid., p.71), princípios esses que dificilmente seriam alegados que existem nas periferias de geometria orgânica, por alguma autoridade política, já que representaria uma afronta ao modelo estereotipado de “um tecido urbano progressivo - organizado, uniforme, retangular, modular e estéril” (SALINGAROS, et. al., 13 Mar 2019). Sendo assim uma maneira de afirmar esse controle sobre a população, justamente o momento em que os moradores de assentamentos informais são realocados para os conjuntos construídos pelo governo. “Do ponto de vista da população carente, esses assentamentos, criados por meio de processos de autogestão, se tornaram a única maneira de garantir um lugar onde viver na cidade. Assim, desde os anos 1950, o surgimento dos assentamentos informais vem crescendo, criando áreas geralmente caracterizadas por superlotação, habitações degradadas e entorno précário, baixa cobertura de serviços e ilegalidade da posse; e habitada por comunidades em condições de alta vulnerabilidade, com claras consequências em relação à equidade e exclusão social.” (BOJADSEN, 2015, p.69. Grifo nosso).

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4.

O ENTORNO E SUA ESTRUTURA URBANA

Subprefeitura da Sé, Centro de São Paulo

Recorte de Estudo

FIGURA 80: Vista a partir de uma das janelas do edifício Copan. Ao fundo, vê-se o edifício Altino Arantes, que junto ao edifício Mirante do Vale, representam os edifícios mais altos de São Paulo. Fotografia: Autoral, 11 de julho de 2016.

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FIGURA 81 : LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO EM RELAÇÃO AO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO (MSP) Imagem Satélite: Google Maps Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limite do Município de SP Subprefeitura da Sé

N

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4. O ENTORNO E SUA ESTRUTURA URBANA 4.1 ZOOM 1: SUBPREFEITURA DA SÉ, CENTRO DE SÃO PAULO

Uma das 32 subprefeituras do município de São Paulo17, instituídas pela Lei nº 13.399 de 2002, a Subprefeitura da Sé é composta por oito distritos, sendo eles Bela Vista, Bom Retiro, Cambuci, Consolação, Liberdade, República, Santa Cecília e Sé, localizados no Centro da cidade. Possui uma área total de 26,2 km², e aproximadamente 431.106 habitantes, de acordo com o último censo do IBGE (2010). Segundo a Prefeitura, a divisão administrativa municipal em “Subprefeituras”, consiste em exercer uma gestão autônoma e focal, aumentando em tese a eficiência das ações junto aos instrumentos urbanísticos para o desenvolvimento local, como nas áreas da saúde, assistência social, educação, transportes, habitação, etc. Ao cidadão, a unidade da Subprefeitura da Sé presta serviços de atendimento, recebimento de pedidos e reclamações da população, como também é responsável por solucionar eventuais problemas, planejamento, regulamentação e fiscalização do uso do solo, assistência social e promoção da prática do esporte, lazer e da cultura, como também pela manutenção da infraestrutura urbana e projetos e obras da região18.

17. Aricanduva, Butantã, Campo Limpo, Capela do Socorro, Casa Verde, Cidade Ademar, Cidade Tiradentes, Ermelino Matarazzo, Freguesia/Brasilândia, Guaianases, Ipiranga, Itaim Paulista, Itaquera, Jabaquara, Jaçanã/Tremembé, Lapa, M’Boi Mirim, Mooca, Parelheiros, Penha, Perus/Anhanguera, Pinheiros, Pirituba/Jaraguá, Santana/Tucuruvi, Santo Amaro, São Mateus, São Miguel, Sapopemba, Sé, Vila Maria/Vila Guilherme, Vila Mariana e Vila Prudente.

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Para a escolha do recorte de estudo, foram considerados a sua importância histórica em relação a temática desse trabalho, ao desenvolvimento econômico e urbano de São Paulo, além dos expressivos números em relação aos cortiços: segundo o levantamento mais recente do PAC (Programa de Atuação em Cortiço), 2,35% da população da Subprefeitura Sé se encontra encortiçada, o equivalente a 11.995 pessoas, seguido da Subprefeitura da Mooca, com 7.075 pessoas, correspondente a 2,57% da sua população total19 (LÓPEZ; FRANÇA; COSTA, org. 2010. p. 106). Além desses fatores, chama atenção a configuração do seu tecido urbano, consolidado em praticamente toda a sua extensão, e que é alvo constante da especulação imobiliária e de planos públicos de intervenção urbana, como é o caso da Operação Urbana Centro. Sob a jurisdição da Sub. Sé estão: duas das mais importantes centralidades da cidade - o Centro Antigo e a região da Av. Paulista; os principais eixos viários20, patrimônios e equipamentos de lazer, a sede da Secretaria das Subprefeituras e da Prefeitura Municipal; somados aos graves problemas habitacionais como ocupações irregulares, moradores sem teto, cortiços e imóveis subutilizados, como veremos nos mapas e tabelas a seguir.

18. Portal da Prefeitura de São Paulo. Acesso em 14 de março de 2019. 19. Habi Centro. 20. Do seu viário, aproximadamente 34% é classificado como estrutural (Fonte: Caderno de Propostas dos Planos Regionais das Subprefeituras - Quadro Analítico - Sé).


GRÁFICO 1: População da Subpref. Sé relação à população MSP, 2010

GRÁFICO 2: Área da Subpref. Sé em relação à área do MSP

Sub. Sé 3,8%

Sub. Sé 1,7%

Fonte: IBGE, Censo 2010.

Fonte: IBGE, Censo 2010.

GRÁFICO 3: População total e densidade demográfica, 1980 a 2010

Fonte: IBGE, Censos 1980, 1991, 2000 e 2010.

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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Barra Funda

Bom Retiro

Santa Cecília

Perdizes

República

Consolação

Bela Vista

Jd. Paulista

Liberdade

Moema

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Vila Mariana


Vila Guilherme FIGURA 82: DISTRITOS DA SUBPREFEITURA SÉ Imagem Satélite: Google Maps Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

Pari

Belém

Brás

LEGENDA Subprefeitura da Sé Mooca

Limites Distritos Sé Outros Distritos

Cambuci

N

Ipiranga

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4.1.1 INDICADORES SOCIAIS E DEMOGRÁFICOS

De acordo com o IBGE (2010), a área da Subprefeitura da Sé corresponde a 1,7% e a sua população a quase 4% (Gráficos 1 e 2) da área relativa ao Município de São Paulo (MSP). A partir de 1980, a região central da cidade (representada pelos distritos da Sub. Sé) passou por um processo de evasão de muitos de seus habitantes. Resultante de regras rígidas adotadas pelo Poder Público em 1960, para reduzir o congestionamento tanto de pessoas quanto de veículos particulares devido a insuficiência da infraestrutura pública de mobilidade junto à alta demanda por comércios e serviços na região, em 20 anos (1980-2000), mais de 27% dos seus moradores já tinham migrado para outras regiões (Gráfico 3). Questões como essa evidenciavam o quão desigual era na época a quantidade existente de infraestrutura em relação a sua procura não somente em mobilidade, como também de água e esgoto, principalmente nas áreas de várzea, ocupadas pela população mais pobre. O “esvaziamento do centro”, como é frequentemente relatado nos meios de comunicação, começam a pressionar o Poder Público a pensar em propostas de intervenção, com intuito de salvar as áreas centrais de um processo crescente de decadência

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urbana, social e patrimonial. Alguns exemplos desses projetos e planos são o tamponamento do Vale do Anhangabaú e as operações urbanas Anhangabaú e Centro; além dos que foram promovidos por meio de concursos. O projeto de revitalização do Centro toma maiores proporções somente no começo do século XIX, pensando agora em valorizar as edificações existentes, preservar o patrimônio histórico e valorizar os espaços livres. O resultado de algumas ações combinadas, como novas leis de Zoneamento e incentivos para construções de novos conjuntos habitacionais na região, resultou em um aumento populacional de 57.192 habitantes, em relação ao que tinha sido verificado no período - até então mais baixo -, com 373.914 habitantes no ano 2000, representando em densidade demográfica 37,5% a mais do que foi constatado no Censo de 1980. Em relação aos distritos, as maiores taxas foram: Cambuci (2,6), Bom Retiro (2,5), República (1,8), Santa Cecília (1,6) e Sé (1,6), ficando acima da taxa do município de 0,76%, entre os anos 2000 e 2010 (Gráfico 4). Mas, apesar dos esforços do Poder Público, incluindo planos e metas elaborados nos “Planos Diretores Estratégicos” e das “Leis de Usos e Ocupação do Solo”, que se seguiram até os dias


GRÁFICO 4: Taxa de crescimento populacional, 2000 a 2010

Fonte: IBGE, Censos 2000 e 2010.

de hoje, pouco do que foi realizado no Centro apresentou um impacto significativo na melhora dos espaços e na preservação de seu patrimônio histórico, principalmente quando se trata de habitação. No mapa de “Densidade demográfica e vulnerabilidade social”, percebe-se que o adensamento de habitantes por hectare ocorre principalmente nos distritos da Consolação, Santa Cecília, Bela Vista e República, onde o processo de verticalização nos últimos anos foi mais intenso (ver Gráficos 30 e 31). Outro dado importante neste mapa, principalmente nos distritos do Bom Retiro e Sé, é o IPVS (Índice Paulista de Vulnerabilidade Social)21, no qual a porcentagem da população

21. Indicador com base em diversos fatores determinantes da situação de vulnerabilidade social (renda, escolaridade, saúde, arranjo familiar, possibilidades de inserção no mercado de trabalho, acesso a bens e serviços públicos). 22. Concebido pela ONU (Organização das Nações Unidas) para avaliar a qualidade de vida de uma determinada população considerando três dimensões do desenvolvimento humano: renda, educação e saúde.

que se encontra nos grupos 5 e 6 (de maior vulnerabilidade) é de 7,5% e 2,9%, respectivamente (Gráfico 5). Os números do IDH22 (Índice de Desenvolvimento Humano) dos Distritos da Sub. Sé, entre os anos de 2000 e 2010, ficaram acima da média geral do Município de São Paulo, sendo mais expressivos os índices de “Longevidade” e “Renda” (Gráfico 6). Mas, apesar do alto índice (0,86), ficando atrás apenas das Subprefeituras Lapa (0,91), Pinheiros (0,94) e Vila Mariana (0,94), os números não refletem a realidade. Segundo os dados apresentados pela Prefeitura23: 30% da população da Sub Sé possui nível superior completo e, 28% nível médio completo ou superior incompleto; aproximadamente 11% dos domicílios possuem rendimento nominal mensal superior a 20 salários mínimos e, 18% dos 23. Infocidade: Economia – Domicílios por Faixa de Rendimento, em salários mínimos /2010; elaboração SMDU/ Dipro; IBGE, Censo Demográfico 2010. OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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Bom Retiro

Santa Cecília

República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

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FIGURA 83: DENSIDADE DEMOGRÁFICA E VULNERABILIDADE SOCIAL Dados: GeoSampa Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos IPVS 5.0 Cambuci

6.0

N

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domicílios rendimento nominal mensal superior a 10 salários mínimos e inferior a 20 salários mínimos. Isso significa em sua maioria que: no índice de educação, 42% da população possui no máximo nível médio incompleto; e no índice de renda, quase 70% (65,69%) da população recebe menos que 10 salários mínimos (Gráfico 7).

Já em relação a Faixa Etária, 16,2% dos habitantes da Sub. Sé possuem mais de 60 anos, e 13% possui de 0 a 14 anos (Gráfico 8). Ou seja, existe uma demanda local tanto para escolas quanto para equipamentos assistenciais à melhor idade. Economicamente, 70,8% dos habitantes possui entre 15 a 59 anos, significando que 2/3 da população total pode ser considerada como população em idade ativa no mercado de trabalho.

GRÁFICO 5: IPVS - Proporção da população nos grupos 5 e 6 (maior vulnerabilidade), 2010 IPVS - Índice Paulista de Vulnerabilidade Social

Fonte: Fundação Seade. GRÁFICO 6: Índice de Desenvolvimento Humano do Município, 2000 e 2010

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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Fonte: IPEA/ PNUD/ Fundação João Pinheiro.


GRÁFICO 7: Rendimento Nominal Mensal domiciliar (salários mínimos)

Fonte: IBGE - Censo 2010.

GRÁFICO 8: Percentual de participação das faixas etárias de até 14 anos e 60 e mais, 2010

Fonte: IBGE - Censo 2010. OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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4.1.2 INDICADORES ECONÔMICOS

Apesar dos processos de transformações urbanísticas e o decorrente surgimento de “subcentros”, o centro urbano de uma cidade sempre será reconhecido pelo o seu valor histórico, independente das marcas do tempo nas edificações e da eventual ausência de zeladoria pública. O centro de uma cidade surge e se constrói geralmente em volta de um marco edificado, e se desenvolve conforme as necessidades da população que torna a ocupá-la. Em consequência, são nessas áreas onde se concentram o maior número de equipamentos públicos, de saúde, educação, os principais comércios e serviços, mesmo que os seus limites administrativos se expandam, como é o caso da cidade de São Paulo. As transformações no território paulista começaram a partir da década de 60, como por exemplo, a implantação das linhas de metrô. A facilidade de deslocamento gerada pelos novos sistemas de transporte coletivo, no entanto, influenciou também o deslocamento do desenvolvimento e investimento econômico das áreas centrais para outras regiões, e que junto a outros fatores já citados, contribuiu para a descentralização do capital privado, fato esse que intensifica ainda mais as migrações locais, tendo

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permanecido no Centro, no geral, os moradores de baixa renda: o pouco salário que recebiam nas fábricas ou nos comércios populares, não os permitiam outra alternativa a não ser continuarem habitando espaços precários, próximos ao seu local de trabalho. O custo que se teria com o transporte - caso optassem por morar em regiões mais distantes, na periferia da cidade - poderia ser poupado caso continuassem morando principalmente nos cortiços centrais, condição que manteve essa tipologia de moradia popular ainda marcante em todo o século XX. Ao longo dos anos - apesar dos cenários de baixa -, o Centro conseguiu manter-se como referência em atividades de serviço e de comércio especializado, como as ruas 25 de Março, Santa Ifigênia, José Paulino, por exemplo, garantindo assim não somente o emprego de grande parte dos habitantes dos distritos da Sub. Sé (Gráfico 9), como também a dinâmica da região ativa, mesmo que apenas durante o dia. A Subprefeitura da Sé é responsável por cerca de 17% dos postos de trabalho de São Paulo, o que corresponde a mais 726 mil (538 mil apenas no setor de serviços, um pouco mais de 74% do total - 21% do total da cidade). Apenas nos distritos República e Bela Vista, se encontram quase metade


GRÁFICO 9: Empregos formais por setor de atividade, 2012

Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego - Rais.

dos trabalhos nesse tipo de atividade (45%, e 40% do total da Sub.)24. Além da concentração de outras atividades nos setores financeiro, judiciário, da administração pública e de saúde, tanto no Centro Antigo (distrito Sé e República) como na valorizada região da Av. Paulista (distrito Bela Vista). Outros distritos se destacam em postos de trabalhos formais em atividades industriais, como o Bom Retiro (3,6%) e Cambuci (1,8%), o que representa respectivamente, 31% e 25%, das oportunidades de emprego ofertadas por eles. No total, as atividades industriais correspondem a 8,95% dos trabalhos na Subprefeitura da Sé25.

24. Infocidade: Trabalho - Estabelecimentos e Empregos no Comércio, Serviços, Indústria de Transformação e Construção Civil / 2012; elaboração SMDU/Deinfo; Ministério do Trabalho e Emprego. Relação Anual de Informações Sociais – Rais. 25. Prefeitura de São Paulo. Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano. Caderno de Propostas dos Planos Regionais das Subprefeituras - Quadro Analítico - Sé. 2016, p.7

Um dado econômico importante a ser observado nessa região é, de 67,3% da população empregada, 61,4% recebem até 3 salários mínimos e 4,2% até 1 s.m - o que representa mais de 18 mil pessoas, com base no Censo 2010 do IBGE - (Gráfico 12 e 13), ou seja, 65,6% precisam comprometer o pouco que ganham com moradia (quando suficiente), alimentação, custos adicionais - como contas de água e energia -, o que acaba na maioria das vezes comprometendo não somente a sua qualidade de vida individual, mas de todos os familiares dependentes. Já em nível de escolaridade da população economicamente ativa da Subprefeitura da Sé, segundo o Gráfico 14, 53,7% possui nível

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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Bom Retiro

Santa Cecília

República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

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FIGURA 84: PREDOMINÂNCIA DE USOS NÃO RESIDENCIAIS Dados: GeoSampa Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos

Usos Não Residenciais (TPCL, 2014) Equipamentos públicos Misto comércio, serviços, indústria e armazéns Indústrias e armazéns Sem predominância Misto residencial, indústria e armazéns Mistos comércios, serviços, indústria e armazéns Misto residencial, comércio e serviços Mistos residencial, indústria e armazéns Misto residencial, comércio e serviços Cambuci

N

100


GRÁFICO 10: Participação dos empregos formais em relação ao MSP - Exclui Administração Pública

Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego - Rais.

GRÁFICO 11: Empregos formais por área líquida (ha) - Exclui Administração Pública

Fonte: SMDU/ Deinfo; Ministério do Trabalho e Emprego - Rais.

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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GRÁFICO 12: População por situação ocupacional, 2010

Fonte: IBGE. Censo Demográfico, 2010.

GRÁFICO 13: Distribuição salarial, 2012

Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego - Rais.

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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médio completo. Os maiores níveis de formação educacional se encontram nos distritos Consolação e Bela Vista, com 31,6% e 29,6% respectivamente, lembrando que esses distritos englobam parte da região da Av. Paulista, um dos principais centros econômicos da cidade de São Paulo, e na Consolação o bairro nobre de Higienópolis. Já em níveis mais baixos de formação escolar (fundamental incompleto e analfabetismo), o distrito Cambuci apresenta a maiores taxas, com o total de 18,3% dos seus habitantes - 9,6% a mais comparado a média da Sub. Sé, com 8,7%.

Isso significa que, aproximadamente 78% da população que ocupa um emprego formal na região, não possuem formação especializada em nível superior, ocupando provavelmente cargos de baixa remuneração.

GRÁFICO 14: Participação do emprego formal por grau de escolaridade, 2012

Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego - Rais.

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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GRÁFICO 15: Empregos por subsetor de atividade econômica, 2012 - Exclui Administração Pública

Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego - Rais.

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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4.1.3 INDICADORES DE INFRAESTRUTURA E MOBILIDADE

Em relação a Mobilidade, o Centro de São Paulo apresenta grande vantagem se comparada a outras regiões da cidade, facilitando o acesso e atraindo pessoas de outras localidades em busca de lazer, variedade de serviços e oportunidades de trabalho. A infraestrutura da Subprefeitura da Sé conta com quatro corredores e cinco terminais de ônibus, é atendida por quatro linhas de metrô (1 - Azul; 2 - Verde; 3 - Vermelha; e 4 - amarela), três linhas de trem (7 - Rubi; 8 - Diamante; e 11 - Coral), além de vias exclusivas para bicicletas (Figura 85).

Apesar da grande oferta e diversidade de modais coletivos de alta capacidade, os deslocamentos diários de seus habitantes ocorreram segundo dados, em maior proporção de modo a pé, ou seja, não motorizado (Gráfico 17). As pesquisas de “Origem e Destino” explicam: em sua maioria, os deslocamentos ocorrem dentro do próprio distrito ou vizinhos (Gráfico 18), como é o caso dos distritos Bom Retiro, República e Sé (aonde estão as maiores taxas de emprego formal - ver Gráfico 10). Somente os distritos Liberdade,

GRÁFICO 16: Percentual de trabalhadores que gastam mais de uma hora no deslocamento casa - trabalho, 2010

Fonte: IBGE. Censo Demográfico, 2010. OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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Cambuci e Consolação apresentaram números maiores de viagens motorizadas (coletivo e individual). Assim, pode-se concluir que uma parcela significativa dos residentes da região desenvolve suas atividades próximo às suas moradias. Os números de viagens a pé, no entanto, não correspondem a demanda por espaços qualificados para tal. A maioria das calçadas da Sub. Sé não oferecem segurança, principalmente para o trânsito de pessoas com mobilidade reduzida. As áreas exclusivas para o pedestre, os calçadões, encontram-se somente em torno do Vale do Anhangabaú próximo aos equipamentos de lazer, como praças e teatros nos distritos Sé e República. Quando se trata da infraestrutura, os distritos centrais da cidade de São Paulo não apresentam déficits preocupantes, já que esta foi uma área privilegiada ao longo dos primeiros anos do seu desenvolvimento urbano. Como é possível observar no Gráfico 19, a porcentagem de domicílios não conectados à rede geral de esgoto e água na Sub. Sé, estão abaixo da média do município. Mas entre os anos de 2000 e 2010, os valores tiveram um leve aumento, o que significa que ao longo desses 10 anos parte da qualidade de vida doméstica caiu, principalmente nos distritos Bom Retiro e Bela Vista. As enchentes também são um problema que vêm se agravando ao longo dos anos em todo o município. Na Sub. Sé, três dos distritos que mais sofrem com o problema decorrente do modelo de ocupação da cidade sobre seus rios, coincidem com alguns dos que apresentam as menores áreas de cobertura vegetal: Sé, Bom Retiro e Cambuci.

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Bom Retiro

Santa Cecília

8

7

11 República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

OBS.: As linhas 7- Rubi e 8 - Diamante do trem, são praticamente paralelas, dessa forma as suas representações no mapa ora se cruzam, ora se sobrepõem.

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FIGURA 85: MOBILIDADE Dados: GeoSampa Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos Linha de Trem 7 - Rubi 8 - Diamante 11 - Coral

Metrô Amarela Azul Verde Vermelha

Ônibus Corredores de ônibus Terminal de ônibus Rede cicloviária Cambuci

N

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109

GRÁFICO 18: Participação das viagens geradas por residentes segundo destinos, 2007

GRÁFICO 17: Participação do número de viagens diárias dos residentes por modos de transporte principal, 2007

Fonte: Metrô. Pesquisa Origem e Destino, 2007.

Fonte: Metrô. Pesquisa Origem e Destino, 2007.


GRÁFICO 19: Proporção de domicílios não conectados à rede geral de água e esgoto

Fonte: IBGE - Censo Demográfico, 2000 e 2010. GRÁFICO 20: Ocorrência de alagamentos e pontos de inundação, verão 2013/ 2014

Fonte: SCGE. Sistema de ocorrências AGE; SMSP

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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4.1.4 INDICADORES DE ÁREAS VERDES

Um outro fator que merece atenção na região é a baixa cobertura vegetal e de áreas verdes públicas, com 4,3m²/hab. e 2,5m²/hab., abaixo da média municipal, com 54m²/hab. e 14,1m²/ hab., respectivamente. Segundo a Prefeitura de São Paulo, as menores quantidades de cobertura vegetal se encontram nos distritos Bom Retiro, Cambuci, Liberdade e Sé, principalmente por conta da concentração de edificações e do tecido consolidado.

O Gráfico 21, considera como “Cobertura Vegetal Total” a área de vegetação arbórea e rasteira, identificada pela Secretaria do Verde e Meio Ambiente (SVMA) no território com base em imagem de satélite. Já o “Índice de Parques e Áreas Verdes” representa a área total dos parques municipais e estaduais existentes, além das áreas verdes em praças e canteiros de avenidas.

GRÁFICO 21: Cobertura vegetal e áreas verdes públicas por habitante, 2014

Fonte: SVMA 2 SMSP/ ATOS 3 SMDU; SES/ SISCOR (Sistema de Controle de Resíduos Sólidos Urbanos).

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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GRÁFICO 22: Percentual da população residente distante a mais de 1 km de parques, 2010

Fonte: SVMA. Parques, 2014; IBGE. Censo Demográfico, 2010.

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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Bom Retiro

Santa Cecília

Parque Buenos Aires República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

Parque da Aclimação

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FIGURA 86: PARQUES Dados: GeoSampa Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Parque da Luz

Limites Sub. Sé Distritos Áreas Verdes Parque municipal Praça / Canteiro

Cambuci

N

114


Bom Retiro

Santa Cecília

1

República 7 Consolação

I II 2 3 Bela Vista 4

5

Liberdade

Cemitério I da Consolação II do Araçá Shopping Center 1 Pátio Higienópolis 2 Frei Caneca 3 Center 3 4 Cidade São Paulo 5 Top Center 6 Pátio Paulista 7 Light

115

6


FIGURA 87: EQUIPAMENTOS Dados: GeoSampa Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos Serviços Shopping Center Cemitério Ecopontos, correios, poupa tempo Cultura Teatros, cinemas, museus, espaços culturais, biblioteca Saúde Hospital, UBS, ambulatórios, consultórios de tratamentos específicos (mental, DST, etc) Educação Escolas técnicas, públicas e privadas Esporte Cambuci

Centros esportivos, clubes públicos e privados Abastecimento Sacolão e mercados

N

116


Bom Retiro

Santa Cecília

República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

117


FIGURA 88: ZONEAMENTO - LEI 16.402/2016 Dados: GeoSampa / Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos Praça / Canteiro

Zoneamento (Exceto AC- 1 e 2 e ZEPEC)

Cambuci

ZPR

ZEP

ZPI-2

ZEMP

ZPI-1

ZEM

ZPDS

ZEIS-5

ZPDSr

ZEIS-4

ZOE

ZEIS-3

ZMIS

ZEIS-2

ZMISa

ZEIS-1

ZM

ZDE-2

ZMa

ZDE-1

ZEUP

ZCORa

ZEUPa

ZCOR-3

ZEU

ZCOR-2

ZEUa

ZCOR-1

ZERa

ZC-ZEIS

ZER-2

ZCa

ZER-1

ZC

ZEPAM

N

118


Bom Retiro

Santa Cecília

República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

119


FIGURA 89: ZEIS E ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS Dados: GeoSampa Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos Áreas Verdes Parque municipal Praça / Canteiro Assentamentos Precários Cortiços Loteamentos irregulares Favelas ZEIS ZEIS 1 ZEIS 3 ZEIS 5

Cambuci

N

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4.1.5 INDICADORES DE MORADIA

A questão da moradia e da requalificação dos espaços livres na Subprefeitura Sé, são dois dos principais desafios reconhecidos a serem enfrentados pelo Poder Público. Na área central, o problema de moradia popular na cidade capitalista industrial, tem início com os Cortiços e se acentua ao longo dos anos, principalmente a partir de 1980 quando o número da população residente começa a diminuir e, o

investimento imobiliário e econômico voltamse para o centro expandido (região da Paulista), esvaziando edifícios que aos poucos vão dando lugar às ocupações irregulares comandadas por movimentos de luta à moradia digna. O estado de abandono das edificações históricas, dos prédios modernistas e dos espaços livres no Centro Antigo, não somente desvalorizara o território perante ao mercado, como também

GRÁFICO 23: População em situação de rua - Para as áreas não centrais, os dados referentes a 2011 não estão desagregados por Distritos e Subprefeituras.

Fonte: Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS).

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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agravou problemas sociais: as ruas tornaram-se casa, viraram cenário de prostituição, crimes e consumo ilegal de drogas. Segundo o “Censo da População em Situação de Rua” de março de 2015, somente a Sub. Sé representa 40% da população em situação de rua do município de São Paulo, número expressivo e preocupante tanto na esfera habitacional como social. Em 11 anos - entre os anos de 2000 e 2011 - a população em situação de rua aumentou em aproximadamente 102%, um total a mais de 3.445 pessoas, sendo que desse número 73% estão concentradas apenas no distrito Santa Cecília, o equivalente a 2.517 pessoas (Gráfico 23). Os números são ainda mais desumanos quando comparados à vacância de imóveis na região, como pode ser visto nos Gráfico 24 e 25. A Sub. Sé, no ano 2000, chegou a apresentar o índice de 24,6% de domicílios vagos, já no último censo registado em 2010, esse percentual caiu para 9,5%, número que apesar de estar abaixo da média municipal, ainda significa muito se considerarmos a demanda existente por moradia na região. Os dois distritos que mais apresentaram edificações vazias em 2010, foram justamente os que possuem os maiores atrativos para população de baixa renda: serviços, comércios, equipamentos diversos e, principalmente, oportunidades de emprego, como já foi mostrado anteriormente.

população de baixa renda, essa continua à procura de outros tipos de moradia (mais em relação ao valor do que qualidade) para se manterem próximas de seu sustento. Assim, ora vilão, ora salvação, mas nunca digno à ninguém, os Cortiços ainda no século XXI continuam sendo a última opção de moradia acessível como alternativa à rua. Em 2014, somente no distrito da Bela Vista, foram registradas 1.792 famílias encortiçadas, seguido do distrito Santa Cecília (1.526) e Liberdade (1.376), num total de 6.865 famílias em toda a Sub. Sé, em 2014 (5.130 a menos, do que o registrado pelo Habi Centro em 2010 - será que conquistaram uma moradia digna? será que auto construíram na periferia? ou será que foram para as ruas?). Outra representante de habitação precária na cidade são as favelas, que mesmo sendo encontradas em menor porcentagem na região central, apresentam condições sociais tão críticas quanto às favelas formadas na periferia. Uma das únicas que ainda se encontram no Centro de São Paulo, no distrito Bom Retiro, é a favela do Moinho, frequente em publicações de noticiários relacionadas ao tráfico de armas e drogas.

Mas, enquanto os edifícios permanecem vazios e não são criadas e colocadas em práticas alternativas para que finalmente os destinem para suprir a necessidade de moradia digna para a

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GRÁFICO 24: Percentual de terrenos vagos, 2014

Fonte: Secretaria Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico / TPCL.

GRÁFICO 25: Índice de Vacância - Distritos Percentual de domicílios vagos no território.

Fonte: IBGE. Censos 2000 e 2010.

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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GRÁFICO 26: Famílias em Cortiços, 2014

Fonte: Secretaria Municipal de Habitação (SEHAB).

GRÁFICO 27: Participação de domicílios em favelas - Participação dos domicílios sobre o total de domicílios do território

Fonte: Secretaria Municipal de Habitação (SEHAB).

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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Quando comparamos os dados do gráfico de Condição de inadequação domiciliar (Gráfico 28) com a área construída residencial por habitantes (Gráfico 29), vemos o quanto a distribuição dessa é desigual. No distrito da Bela Vista por exemplo, onde se encontra o maior número de famílias morando em cortiços da Sub. Sé, ou seja, em cubículos geralmente altamente adensados, o percentual é de 3,5 domicílios com mais de 3 moradores por dormitório, sendo que cada habitante deveria ter em tese 51,7m² de espaço residencial (ano dos dados de referência: 2010). A redução ou o aumento da área total residencial construída em cada distrito, está relacionada também com a tendência de verticalização tanto dos serviços quanto das residências, antigamente predominantemente horizontais (de 1 a 3 pavimentos, no máximo), o que vem afetando não somente a paisagem do Centro como também o fluxo de veículos. Em 2014, metade dos distritos da Sub. Sé Sé, Bom Retiro, República e Cambuci - tiveram em área construída o maior percentual em uso não residencial, e índices abaixo de 30% para uso residencial vertical e 7% residencial horizontal

125

(exceto o distrito Cambuci, com 17,7%). Já na outra metade, a maioria das novas edificações verticais foram de uso residencial vertical, onde os números foram mais expressivos nos distritos Santa Cecília (61,9%) e Consolação (60%) - um possível reflexo dos incentivos da Operação Urbana Consorciada (OUC) Água Branca (Ver Figura 91). Mas, apesar das considerações positivas a respeito do potencial de adensamento em comparação à tipologia horizontal, a verticalização na área central enfrenta alguns obstáculos que podem desinteressar o mercado, como o tecido consolidado e terrenos com pequenas dimensões, o que impacta tanto na quantidade de novos lançamentos (Gráfico 31) como na qualidade das unidades residenciais, já que pela proximidade entre as edificações - em terrenos com pouco ou nenhum recuo -, estão sujeitas à insalubridade.


GRÁFICO 28: Condição de inadequação domiciliar - Percentual de domicílios com mais de 3 moradores por dormitório

Fonte: IBGE - Censos 2000 e 2010.

GRÁFICO 29: Índice de espaço residencial - Área construída residencial por habitante (m2/ hab)

Fonte: Secretaria Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico / TPCL

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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GRÁFICO 30: Percentual de Área construída por tipo de uso. Subprefeitura Sé e Distritos, 2014

Fonte: Secretaria Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico / TPCL.

GRÁFICO 31: Unidades Residenciais Verticais lançadas, 2000 a 2013

Fonte: EMBRAESP.

OBS.: Todos os gráficos desta página foram retirados do “Material de apoio para Revisão Participativa dos Planos Regionais das Subprefeituras” elaborado pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em 2016. Foram realizadas algumas modificações pelo autor.

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A ZEIS (Zona Especial de Interesse Social) é um dos principais instrumentos urbanos para aplicação da Função Social da Propriedade26. Instituídas no Município de São Paulo em âmbito de lei no Plano Diretor Estratégico de 2002 (Lei nº 13.430/02), e mais recentemente atualizadas pela Lei nº 16.050, de 2014 (PDE em vigência), as ZEIS têm o objetivo de assegurar o direito à moradia digna com foco na população com renda familiar de até 3 salários mínimos. Na Subprefeitura da Sé, em geral, são encontrados 3 tipos dessas Zonas, são elas: •

ZEIS-1: Presente somente no distrito Liberdade (0,1% da área), esta zona caracteriza-se pela presença de favelas e loteamentos irregulares, habitadas predominantemente por população de baixa renda.

ZEIS-3: Representam 7,7%27 da área da Sub. Sé, sendo mais significativa a porcentagem no distrito Santa Cecília (Gráfico 32). Caracteriza-se pela ocorrência de imóveis ociosos, subutilizados, não utilizados, encortiçados ou deteriorados em regiões dotadas de serviços, equipamentos e infraestrutura.

ZEIS-5: Zonas que contêm lotes ou conjuntos, preferencialmente vazios ou subutilizados, situados em áreas dotadas de serviços, equipamentos e infraestruturas urbanas. Na Sub. Sé, representam 3% da área, em que o distrito Liberdade se destaca, com 8% de sua área, junto à Sé e Bela Vista, com 3,4% e 3,3% respectivamente.

Apesar das ZEIS englobarem grande parte das áreas onde existem moradias precárias na região (Ver Mapa 25), algumas se encontram dispersas pelo território em outras classificações, como em Zonas Mistas (ZM) - a de maior incidência na Subprefeitura Sé, ocupando 31% da território, seguidas das Zonas de Centralidade (ZC) com 19%, e Zonas de Estruturação Urbana (ZEU), com 17%28.

26. Segundo o PDE de 2014, Função Social da Propriedade é quando “um bem imóvel, rural ou urbano, [...] é utilizado de acordo com as necessidades coletivas e não apenas com o interesse de seu proprietário”. 27. Em 2016, a ZEIS-3 chegou a representar 8,3% da área total da Sub. Sé, segundo o “Caderno de Propostas dos Planos Regionais das Subprefeituras - Quadro Analítico - Sé” de 2016, p. 6. 28. Idem.

128


129

GRÁFICO 32: Participação da área por tipo de ZEIS, 2014 - Percentual da área do território ocupada por tipo de ZEIS

Fonte: PDE - Plano Diretor Estratégico., 2014.


ANEXO INTEGRANTE DA LEI Nº 16.402, DE 22 DE MARÇO DE 2016 TABELA 3: Parâmetros de ocupação, exceto de Quota Ambiental.

Fonte: Quadro 3 da *Lei de Zoneamento (Lei nº 16.402/16). Grifo do autor.

NOTAS: NA = Não se aplica (a) Nas zonas inseridas na área de proteção e recuperação aos mananciais aplica-se a legislação estadual pertinente, quando mais restritiva, conforme §2º do artigo 5º desta lei*. (b) Atendidos os requisitos previstos no artigo 83 da Lei nº 16.050, de 31 de Julho de 2014 - PDE, a zona ZEUP passa a recepcionar automaticamente os parâmetros da zona ZEU. (c) Atendidos os requisitos previstos no artigo 83 da Lei nº 16.050, de 31 de Julho de 2014 - PDE, a zona ZEUPa passa a recepcionar automaticamente os parâmetros da zona ZEUa. (d) O CAmáx será igual a 4 nos casos dispostos no §1º do artigo 8º desta lei*. (e) O CAmáx será igual a 4 nos casos dispostos nos §2º do artigo 8º desta lei*. (f ) O CAmáx será igual a 2 nos casos em que o lote for menor que 1.000m² (mil metros quadrados). (g) O CAmáx será igual a 2 nos casos em que o lote for menor que 500m² (quinhentos metros quadrados). (h) O CAmáx será igual a 1 nos casos em que o lote for menor que 1.000m² (mil metros quadrados). (i) O recuo frontal será facultativo quando atendido o disposto nos artigos 67 ou 69 desta lei*. (j) Os recuos laterais e de fundo para altura da edificação superior a 10m (dez metros) serão dispensados conforme disposições 1 estabelecidas nos incisos II e III do artigo 66 desta lei*. (k) Ver artigo 30 desta lei*. (l) Observar as disposições estabelecidas no § 4º do artigo 28 desta lei*. (m) Para áreas contidas nos perímetros de incentivo ao desenvolvimento econômico Jacu-Pêssego e Cupecê, conforme Mapa 11 da Lei nº 16.050, de 31 de Julho de 2014 - PDE, verificar disposições dos artigos 362 e 363 da referida lei quanto ao coeficiente de aproveitamento máximo e outorga onerosa de potencial construtivo adicional.

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Bom Retiro

Santa Cecília

República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

OBS.: A região da Subprefeitura da Sé, como já vimos até o momento, é uma das mais importantes no quesito econômico para a cidade, afetando diretamente o zoneamento local: centros financeiros, equipamentos culturais, comércio popular e especializado, e entre outros, são os motivadores para que a região continue se desenvolvendo, ainda que em ritmo mais lento do que nos primeiros anos do século XX. A diversidade de oportunidades de emprego gerada, é uma das principais justificativas à concentração de habitações baratas e especulativas na região.

131


FIGURA 90: TERRITÓRIOS DE TRANSFORMAÇÃO Dados: GeoSampa / Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (16.402/2016) Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos Assentamentos Precários Cortiços Loteamentos irregulares Favelas ZONAS DE TRANSFORMAÇÃO ZM

ZEM

ZEUP

ZEIS-5

ZEUPa

ZEIS-3

ZEU

ZEIS-1

ZEUa

ZDE-1 ZC

Cambuci

N

132


Bom Retiro

Santa Cecília

República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

OBS.: Nota-se que a concentração de Cortiços encontra-se fora das áreas de alcance das Operações Urbanas, fato esse que impossibilita, por exemplo, a utilização de recursos obtidos com a venda de CEPACs, para melhorias e novos projetos focados em HIS.

133


FIGURA 91: OUC - OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS Dados: GeoSampa Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos Assentamentos Precários Cortiços Loteamentos irregulares Favelas Operações Urbanas Consorciadas (OUC) Centro Água Branca (perímetro estendido)

Cambuci

N

134


Bom Retiro

Santa Cecília

República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

135


FIGURA 92: MACROÁREAS Dados: GeoSampa / Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos Assentamentos Precários Cortiços Loteamentos irregulares Favelas Macroáreas Macroárea de Estruturação Metropolitana Macroárea de Estruturação Consolidada

Cambuci

N

136


Bom Retiro

Santa Cecília

República

Consolação

Bela Vista

Liberdade

OBS.: Pode-se dizer que a região administrativa da Sub. Sé é previlegiada em bens de interesse cultural. Nela, está a maior concentração de todo o patrimônio construído da cidade de São Paulo; o que ainda assim não é suficiente para mantê-los fisicamente íntegros, e muito menos impedir a especulação imobiliária, que vem cada vez mais ocupando o espaço antes pertencente aos casarios do século passado, com prédios “carimbos” que ignoram o contexto de inserção projetual.

137


FIGURA 93: ZEPEC E AE (ÁREA ENVOLTÓRIA) Dados: GeoSampa Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

LEGENDA Limites Sub. Sé Distritos TICP (Territórios de Interesse Cultural e da Paisagem) Cortiços Área Envoltória (AE) ZEPEC-BIR (Bens Imóveis Representativos)

Cambuci

N

138


4.1.6 ÁREAS DE INCENTIVO À TRANSFORMAÇÃO URBANA

O perímetro administrativo da Subprefeitura da Sé abrange os três tipos de territórios do Município de São Paulo, definidos pela Lei 16.050/2014, do Plano Diretor Estratégico da cidade (vigente até o presente momento), compostos por zonas que possuem os seus próprios parâmetros de parcelamento, uso e ocupação. São eles: I. territórios de transformação: caracterizam as áreas em que há incentivo ao adensamento construtivo, populacional, diversidade de atividades e serviços, atrelados à qualificação paisagística e dos espaços livres, de modo a adequar o uso do solo à oferta de transporte coletivo local. Na Sub. Sé, estão representados pelas seguintes zonas: a) ZEU - Zona Eixo de Estruturação de Transformação Urbana; e b) ZEM - Zona Eixo de Estruturação de Transformação Metropolitana. II. territórios de qualificação: são as áreas em que se estimulam a manutenção de atividades não residenciais existentes e o adensamento populacional moderado, incentivando também a diversidade de usos. Caracterizam-se na área de estudo pelas seguintes zonas:

29. Seja pela “orientação perversa do mercado (PINHO, 2000) ou pelo rol de problemas encontrados na documentação de propriedade, e nas esferas jurídicas (DENALDI, cf. nota 22)” (MARICATO, 2001, p.96).

139

a) ZC - Zona de Centralidade; b) ZM - Zona Mista; c) ZEIS-1, 3 e 5 - Zona Especial de Interesse Social 1, 3 e 5; e d) ZDE-1 - Zona de Desenvolvimento Econômico 1. III. territórios de preservação: são as áreas em que se incentiva a preservação de bairros consolidados, com conjuntos urbanos específicos, e que promovam atividades voltadas para a preservação ambiental e cultural. Na Sub. Sé, se caracterizam pela zona: a) ZEPEC - Zona Especial de Preservação Cultural. Como pode ser observado nas Figuras 89, 90 e 93, os assentamentos precários (loteamentos irregulares, favelas e cortiços) estão distribuídos entre as zonas citadas, ou seja, além das áreas demarcadas como ZEIS, um instrumento da Política Habitacional cujo o objetivo é “assegurar o direito à moradia”. Para Maricato (2001, p. 94), junto a HIS (Habitação de Interesse Social), as ZEIS podem ser consideradas como uma “legislação includente” bem sucedida, ainda que pontual e apresentando em muitos casos diversos problemas na sua implantação29. Curiosamente,


este fato pode ser considerado um dos possíveis desafios projetuais a ser enfrentado: como garantir que o direito das famílias de baixa renda à moradia digna em áreas centrais seja garantido em outras zonas que a princípio não possuem o mesmo viés social das ZEIS? Como articular arquitetonicamente os interesses econômicos e habitacionais previstos nos diversos territórios de incentivo à transformação urbana? Além das Zonas Especiais de Interesse Social, existem outros instrumentos urbanísticos que têm como função direcionar as ações tanto na questão da moradia, quanto no desenvolvimento “equilibrado, harmônico e sustentável” da cidade, possibilitando assim a viabilidade das estratégias definidas no PDE. No entanto, vale ressaltar que nenhum dos instrumentos dispensam um controle social, já que a sua potencialidade depende exclusivamente do objetivo e orientação de sua aplicação (Ibid., p. 96). Os “instrumentos de política urbana” são previstos para as escalas nacional, regional, estadual e, predominantemente municipal (o que nos interessa no momento), pelo Estatuto da Cidade30, reforçando o Plano Diretor como “figura central e decisiva” (MARICATO, 2001, p.111) da gestão local. Nesse último caso, são divididos em “Institutos tributários e financeiros” e “Institutos jurídicos e políticos”, destacando-se aqui - além das ZEIS -, os instrumentos de regularização fundiária, usucapião especial de imóvel urbano e a concessão de uso especial para fins de moradia (Função Social da Propriedade); e as Operações Urbanas Consorciadas (OUC).

30. Lei nº 10.257 de 2001: “estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bemestar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.”

Como um instrumento definido pelo Estatuto da Cidade, as Operações Urbanas Consorciadas, tem como objetivo viabilizar projetos públicos com o intuito de promover uma estruturação urbana, por meio principalmente dos chamados PIU - Projetos de Intervenção Urbana, em um perímetro específico da cidade. Na Sub. Sé, encontram-se as OUC Centro (abrange os distritos República e Sé, além do distrito Brás, na Sub. Mooca); e parte do perímetro expandido da OUC Água Branca, abrangendo dentro da área de estudo, partes dos distritos Consolação, Santa Cecília e Bom Retiro. Uma das garantias alegadas pela Prefeitura de São Paulo em relação as OUCs, é que a partir da negociação de CEPACs (Certificados de Potencial Adicional de Construção)31, 25% - no mínimo - do total de recursos arrecadados, devem ser aplicados dentro do perímetro correspondente à ação, em Habitação de Interesse Social, sendo direcionado preferencialmente - segundo o inciso 1º do Art. 142 da Lei 16.050/2016 (PDE) -, para a aquisição de glebas ou lotes. Nesse caso, seriam desfavorecidos os investimentos privados na manutenção de habitações precárias existentes nas áreas centrais, já que devido ao grau de consolidação do tecido urbano, glebas ou terrenos disponíveis para construção, somente seriam encontrados com facilidade nas regiões periféricas, ou seja, longe da infraestrutura necessária para a manutenção da vida da população mais pobre, e em consequência o surgimento de problemas urbanos e sociais, já citados neste trabalho, no capítulo anterior.

31. São títulos mobiliários emitidos pela Prefeitura, utilizados como meio de pagamento de contrapartida para a Outorga Onerosa dentro do perímetro de uma Operação Urbana Consorciada. Cada CEPAC equivale a determinado valor de m² para utilização em área adicional de construção ou em modificação de usos e parâmetros de um terreno ou projeto. (Lei nº 16.050 de 2014 - PDE).

140


Será então possível utilizar esse instrumento urbano [ OUC ] que se propõe na lei, entre outras questões, ao benefício da habitação de interesse social? Para a urbanista Raquel Rolnik, em uma entrevista concedida à revista “Rede Brasil Atual” em 201132, o planejamento e a gestão da cidade de São Paulo pelo Poder Público, estão submissos ao capital imobiliário a uma pressão enorme, concluindo que as operações urbanas na capital tem servido “basicamente para gerar grandes lucros imobiliários, remoção de atividades e populações de menor renda e abertura de grandes frentes de expansão imobiliária para o capital corporativo internacional”, onde “o que está sendo proposto infelizmente não é um adensamento populacional, mas um adensamento construtivo, o que é mais perverso. É um modelo de adensamento de produção de muito metro quadrado de área construída para imóveis para renda média e alta ou espaços de escritórios para alta e média demanda e uma enorme demanda de garagens e estacionamentos. Ou seja, muitos metros quadrados de área construída, muito carro e, perversamente, muito pouca gente. No cômputo geral, me parece que do ponto de vista do uso da cidade, está acontecendo uma diminuição e não aumento da população nos bairros. Embora haja o aumento de congestionamento de carros, aumento de renda e expulsão da população de baixa renda.”

Quando questionada sobre para onde está indo a população de baixa renda, Rolnik destaca um fato que vem ocorrendo desde meados do século XX - a migração dessas pessoas para as regiões periféricas: “Já aparece no censo de 2010 muito forte a migração intrametropolitana. Migração de São Paulo e das áreas centrais de São Paulo para municípios da região metropolitana.

32. “Para Raquel Rolnik, Santa Ifigênia será ‘terra arrasada’ com projeto Nova Luz”. Rede Brasil Atual: 16 de ago. 2011. Entrevista concedida a Susanavier. Disponível em: < https:// www.redebrasilatual.com.br/cidades/2011/08/para-raquelrolnik-prefeitura-de-sp-promove-2018terra-arrasada2019com-projeto-nova-luz>. Acesso em: 10 de abr. 2019.

141

O que está crescendo mesmo é Francisco Morato, é Carapicuíba, Itapevi. Enfim, municípios da ‘franja’ metropolitana. Não é nem Santo André, São Bernardo, Osasco que são o primeiro anel. É o segundo, o terceiro anel da região metropolitana. O que vai agravar enormemente a condição da metrópole.”

Além dos instrumentos urbanísticos citados anteriormente, e dos territórios definidos para orientar as transformações urbanas no Município de São Paulo, há ainda uma divisão em macrozonas e macroáreas, e que segundo o PDE (2014) são “Art. 9º [...] I. áreas homogêneas que orientam, ao nível do território, os objetivos específicos de desenvolvimento urbano e a aplicação dos instrumentos urbanísticos e ambientais”.

A Subprefeitura Sé está inserida nas Macrozonas de Estruturação e Qualificação Urbana, contemplando 2 das 8 macroáreas do município (Figura 92). São elas: • Macroárea de Estruturação Metropolitana Abrange importantes eixos estruturantes da cidade, como planícies fluviais, vias estruturais, sistema ferroviário, rodovias que articulam diferentes municípios e polos de empregos da Região Metropolitana de São Paulo. Tem entre seus objetivos, promover a regularização fundiária de assentamentos precários, manter a população moradora e produzir HIS e HMP (Habitação de Moradia Popular), além da qualificação de espaços livres e a preservação do patrimônio cultural. • Macroárea de Urbanização Consolidada Caracteriza-se por uma saturação do tecido


urbano, com elevada concentração de empregos e serviços, formada principalmente por bairros de caráter residencial que sofreram ao longo do tempo transformações, como a verticalização e atração de usos não residenciais, como comércios e serviços. Um dos seus objetivos é incentivar a fruição pública através de fachadas ativas com atividades compatíveis ao uso residencial, a fim de promover uma diversidade social com o estímulo ao adensamento populacional.

142


143 0,5 (e) 0,5 (e) 0,5 (e) 0,5 (e) 0,5 (e) 0,5 (e) 0,5 (e) 0,5 (e) 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3

1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1

2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2

28 28 28 28 28 28 28 28 28 28 28 28 28 28

Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8 Térreo mais 8

Fonte: Quadro 02A da Lei nº 16.050/14 - Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo.

Arco Tietê Centro Arco Jurubatuba Arco Pinheiros Macroárea de Arco Tamanduateí Estruturação Faria Lima / Águas Espraiadas / Chucri Zaidan Metropolitana Arco Jacu‐Pêssego Avenida Cupecê Arco Leste Noroeste Fernão Dias Macroárea de Urbanização Consolidada Macroárea de Qualificação da Urbanização Macroárea de Redução da Vulnerabilidade Urbana

Básico

Número máximo de pavimentos

NOTA: I. As marcações em laranja correspondem aos parâmetros que são aplicados aos distritos da Sub. Sé. II. Na região de estudo, apenas os distritos Liberdade e Cambuci são afetados pela área de expansão do Arco do Tamanduateí. a) Exceto ZEP, ZEPAM, ZEIS e ZER-1 e demais zonas onde a Lei nº 13.885/2004 definiu parâmetros mais restritivos, até a revisão da LPUOS. b) O coeficiente de aproveitamento máximo poderá ser acrescido em 25% (vinte e cinco por cento) para EHMP e 50% (cinquenta por cento) para EHIS. c) Os coeficientes de aproveitamento máximo, o gabarito de altura da edificação e o número máximo de pavimentos poderão ser ultrapassados nas áreas de abrangência das operações urbanas consorciadas e com a utilização das leis nos 8.006/1974 (hotéis), 13.703/2003 (teatros), 14.242/2006 (hotéis), 15.526/2012 (hospitais e escolas) e nos empreendimentos que se beneficiarem de acréscimo da área computável obtido pela aplicação da Cota de Solidariedade. d) Nos perímetros de incentivo ao desenvolvimento econômico Jacu-Pêssego e Cupecê, o coeficiente de aproveitamento máximo é igual a 4 (quatro), de acordo com o Mapa 11 desta lei e não se aplicam o gabarito da edificação e o número máximo de pavimentos, de acordo com o artigo 364 desta lei. e) As leis específicas de operações urbanas consorciadas poderão estabelecer coeficientes mínimos superiores ao estabelecido neste quadro, até o limite do coeficiente básico.

Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana

Macrozonas

Gabarito da Máximo edificação (m) (b) (c) (d)

Coeficiente de aproveitamento Macroáreas (a) Mínimo

TABELA 4: Características de aproveitamento construtivo por Macroárea


144

HMP (definição segundo a Lei nº16.050 /2014 - PDE) Habitação de Moradia Popular é aquela destinada ao atendimento habitacional de famílias, com até dois sanitários e até uma vaga de garagem, de promoção pública ou privada.

Máximo de 6 salários mínimos

Máximo de 3 salários mínimos

Entre 6 e 10 salários mínimos

HIS 2

HIS 1 HMP

Renda Familiar Mensal

Fonte: Quadro 4 da Lei nº 16.050/14 - Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo.

é aquela destinada ao atendimento habitacional das famílias de baixa renda, de promoção pública ou privada, tendo no máximo um sanitário e uma vaga de garagem, e classificando-se em dois tipos:

HIS (definição segundo a Lei nº16.050/2014 - PDE) Habitação de Interesse Social

ZEIS

Coeficiente de aproveitamento Mínimo Básico Máximo Notas: ZEIS 1 0,5 1 2,5 (a) (a) Em situações especiais, o C.A. máximo poderá ser superado Coeficiente de aproveitamento ZEIS 2 0,5 1 4 até o limite máximo de 4,0 (quatro), de acordo com o plano de ZEIS Mínimo Básico Máximo urbanização de ZEIS aprovado pelo Conselho gestor de ZEIS e ZEIS 3 (b) 0,5 1 4 pela CAEHIS. ZEIS 1 0,5 1 2,5 (a) ZEIS 4 (c ) NA 1 2 (b) Na Operação Urbana Centro o Coeficiente de ZEIS 2 0,5 1 4 Aproveitamento Mínimo é igual a 1 e máximo igual a 6. ZEIS 5 0,5 1 4 (c) Observar a legislação estadual pertinente relativa aos ZEIS 3 (b) 0,5 1 4 Fonte: Quadro 3 Lei nº 16.050/14 - Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo. mananciais. ZEIS 4 (c ) NA 1 2 ZEIS 5 0,5 1 4 Tipo de ZEIS HIS 1 HIS 2 HMP Uso R e nR TABELA 6: Percentuais de área construída total por usos residenciais e não residenciais em ZEIS No máximo 20% ZEIS 1, ZEIS 2, ZEIS 3, ZEIS 4 No mínimo 60% Permitido Mínimo 40% ZEIS 5 Permitido No máximo 40% Tipo de ZEIS HIS 1 HIS 2 HMP Uso R e nR No máximo 20% ZEIS 1, ZEIS 2, ZEIS 3, ZEIS 4 No mínimo 60% Permitido Mínimo 40% ZEIS 5 Permitido No máximo 40%

TABELA 5: Coeficientes de aproveitamento em ZEIS


4.2 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: OS PRINCIPAIS DESAFIOS

A partir dos dados expostos neste Capítulo, pode-se identificar algumas das dificuldades que poderão ser enfrentadas durante a fase projetual, e que estão diretamente relacionadas à qualidade de vida tanto dos moradores locais quanto dos transeuntes. São eles: •

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Requalificar imóveis antigos destinados à locação de moradia precária e que possuem significância histórica quanto ao seu padrão arquitetônico: Segundo dados do PAC (2005), 45 imóveis caracterizados como cortiços possuem tombamento volumétrico, e mais de 400, estão em Área Envoltória, ou seja, no perímetro de tombamento de um outro Bem, onde se exige determinada preocupação quanto a preservação dos imóveis abrangentes. Promover moradia de qualidade para a população com renda igual ou menor a três salários mínimos: quase 70% dos moradores da Sub. Sé possuem renda nessa faixa, sendo a opção mais viável disponível no mercado a moradia de aluguel, infelizmente a qualidade das mesmas na maioria das vezes não atendem o mínimo aceitável ou determinado pela Lei Moura, para se quer considerá-

la como uma opção de moradia. A partir dessa questão, observa-se que existe uma demanda para projetos que visem a Locação Social, de modo a contornar a visão política idealizada que se criou ao longo dos anos sobre o financiamento da casa própria - inacessível na maioria desses casos. •

Requalificação e qualificação dos espaços públicos de convívio: Na dinâmica dos moradores de Cortiços, percebida através das referências teóricas e das andanças pelas ruas dos distritos Bela Vista e Liberdade, a vida comunitária é uma questão presente e importante para as famílias encortiçadas. A calçada é um dos principais espaços públicos não somente para o deslocamento dessas pessoas, como também exerce um papel fundamental na socialização desses moradores - conversas casuais, comemorações informais -, com assentos improvisados, banquinhos das próprias casas, ou cadeiras de plástico dos pequenos comércios próximos, crianças jogando bola na rua, se divertindo do jeito que encontram. Esse contato com a rua, acaba criando vínculos e confianças que são defendidos pela jornalista e escritora


inglesa Jane Jacobs (2011): para ela, é a partir desse contato que se promove a segurança nas ruas, e que aos poucos, com a implementação da verticalização e dos condomínios fechados, vem se perdendo com a ilusão de que câmeras vão substituir os olhos, na função de vigilância do espaço. •

Criar mais áreas permeáveis e/ou sistemas sustentáveis para melhor aproveitamento dos recursos naturais, mitigando eventuais desastres, como enchentes: as regiões centrais da cidade de São Paulo no geral, devido ao alto adensamento construtivo do seu tecido urbano, apresentam poucas áreas permeáveis qualificadas, principalmente quando voltadas para o lazer. A paisagem verde é um dos mais importantes fatores para a manutenção da qualidade de vida, principalmente no meio urbano. Por meio dos índices vistos, é necessário resgatar, ainda que na escala do pedestre, a presença de um paisagismo funcional. Preservar o caráter comunitário da vida nos cortiços e promover usos não residenciais compatíveis, em áreas que careçam de comércios de baixa densidade, voltados para as necessidades básicas e que auxiliem na renda dos moradores locais: é possível produzir uma habitação de qualidade sem perder as relações cotidianas e com a realização de atividades em conjunto, sem afetar a qualidade habitacional. A co-housing ou “habitação compartilhada”, é uma das tendências que vem sendo empregadas em diversos

países, com o intuito de manter as relações de vizinhança defendidas por Jacobs, mesmo nos padrões contemporâneos de habitar, por meio de cozinhas e lavanderias comunitárias e espaços de lazer qualificados. •

Incentivar a manutenção das edificações destinadas a locação de moradias através da autogestão, ou seja, sem a presença do intermediário: a partir do momento que uma pessoa passa a compreender a importância de algo e o quanto isso afeta no seu dia a dia, o mais provável é que surja um sentimento de apropriação e consequente zeladoria por ele, fato esse do qual se pretende tomar partido para garantir - além da “vontade política” de fiscalização da preservação desses espaços - condições melhores de habitabilidade nas moradias de aluguel, por meio da gestão realizada pelos próprios moradores.

Verificar questões mínimas exigidas pela Lei Moura (Lei nº 10.928/91), e a necessidade de ajustá-la às questões atuais tanto de fiscalização, produção habitacional e proteção patrimonial - visto que alguns instrumentos tem apresentado falhas na atuação da preservação do patrimônio construído de São Paulo, como frisou Rolnik em relação às OUCs.

Manter a população residente morando nas áreas centrais, próximas de seus empregos e de toda a infraestrutura oferecida na região, de modo a resistirem à especulação imobiliária, fazendo valer

146


os seus interesses e a teoria encontrada nas legislações da cidade, no sentido de garantir a moradia digna acessível a classe mais baixa e consequentemente reduzir o grande déficit habitacional existente em São Paulo. Um dos exemplos de autogestão de sucesso, é o caso da revitalização de um cortiço por meio de mutirão, localizado no distrito do Bom Retiro, na R. Sólon. Um edifício de oito andares, onde o lixo se acumulava na frente, chamou a atenção da professora de sociologia da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo), Maria Ruth Amaral de Sampaio, em 2003, durante uma de suas andanças pela região, e que a partir de conversas com moradores, decidiu por conta própria, ir atrás de investimentos para a sua intervenção. O edifício, conhecido como “Edifício União” (Figuras 94 a 98), foi abandonado ainda em fase de construção na década de 70, e ocupado nos anos 80, e que de acordo com Sampaio (BOJADSEN, 2015), no momento da sua visita, abrigava mais famílias do que a sua capacidade, algumas morando até mesmo no fosso do elevador em condições muito precárias; além dos visíveis e sérios problemas na rede elétrica, hídrica e estrutural, correndo o risco de desabamento. “Sem paredes divisórias, os oito andares eram grandes vãos-livres. Quem chegava ao local começava a construir apartamentos e quartinhos, conforme a necessidade. As condições de vida eram precárias, com muito lixo e entulho. ‘O pessoal que já estava morando embaixo, em vez de jogar o lixo para baixo, ia levando para cima [andares superiores]. Sem contar que tinha muita

33. CRUZ, Fernanda. “Ocupações: edifício vai de cortiço em ruínas a vencedor de prêmio internacional”. Agência Brasil: 08 de set. 2015. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc. com.br/direitos-humanos/noticia/2015-09/ocupacoes-decortico-em-ruinas-vencedor-de-premio-internacional-de>. Acesso em: 12 de abr. 2019.

147

madeira da própria construção’” diz uma moradora do edifício há mais de 20 anos33. As ajudas começaram por meio de pedidos da própria socióloga, primeiro a um comércio vizinho que estava realizando reformas no imóvel na época, com a doação de tintas e novas janelas de alumínio, a Prefeitura também apresentou ajusta de custos pra quem quisesse mudar para outro local, além de outros auxílios para a aquisição de um portão para a entrada do edifício, oficinas de instalações elétricas, hidráulicas, e até mesmo de reforço estrutural em parceria com profissionais da USP, realizados e aplicados pelos próprios moradores. A ação conjunta e o comprometimento de todos, foram fundamentais tanto para a realização das melhorias quanto para posse do edifício: em 2015, com a ajuda do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos34, foi concedido pela Justiça o usucapião coletivo, o primeiro a um prédio inteiro no país. A solicitação de usucapião já tinha sido realizada duas vezes, sendo a primeira em 2002 e a segunda em 2005, processo que continuou em andamento e somente conseguiu ser aprovado após o reconhecimento das melhorias, conquistando também a regularização do imóvel. Em 2008, o projeto concorreu internacionalmente com outros 133 e foi reconhecido pela London School of Economics and Political Science, com o prêmio Deutsche Bank Urban Age Award, garantindo o valor de US$ 100 mil. Segundo Sampaio, o valor foi aplicado em uma conta “em nome da Associação de Moradores, para ser utilizada em atividades para as quais não se conseguisse nenhum patrocínio” (BOJADSEN, 2015, p.75-6).

34. “É uma organização ecumênica, não governamental, sem fins lucrativos ou econômicos. Desde 1988 atua junto a pessoas de baixa renda que possuem seus direitos violados, conferindo a esta população o papel de protagonista social.” descrição retirada do próprio site da organização. Disponível em: <http://gaspargarcia.org.br/institucional/>. Acesso em: 12 de abr. 2019.


A UNIÃO ENTRE OS MORADORES E O AMOR AO BAIRRO, E A TUDO QUE ELE OFERECE, EVIDENCIAM, COMO DIRIA MAFESSOLI, QUE ‘O LUGAR FAZ O ELO.’” MARIA RUTH AMARAL DE SAMPAIO.

FIGURA 94: Fachada do Edifício União, antigo cortiço localizado no distrito do Bom Retiro. Fonte: Agência Brasil, 2015.

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FIGURA 95: Situação em que foi encontrado o Edifício União, antes da intervenção. Foto: SAMPAIO, 2014. FIGURA 96: Registro de uma das reuniões realizadas com os moradores. Fonte: SAMPAIO, 2014.

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FIGURA 97: Fachada do edifício reformada a partir de doações e multirão. Fonte: SAMPAIO, 2014. FIGURA 98: Portão implantado, adquirido com ajuda de custo também por doação. Fonte: SAMPAIO, 2014.

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5. CORTIÇOS EM NÚMEROS Subprefeitura da Sé

Imigrantes; Sanitarismo; Inquilinato e Periferização; e Políticas de Intervenção em Cortiços - Linha do Tempo Séc. XIX - XXI

FIGURA 99: Cena comum em Cortiços: Pela falta de espaço - ocupado pelos inúmeros cubículos - com insolação e ventilação natural, qualquer espaço torna-se varal, um lugar para secar roupas. Registro feito em um cortiço no centro de São Paulo em 2009, pelo fotógrafo Fábio Knoll, em parceria com a SEHAB (Secretaria Municipal de Habitação). Fonte: LÓPEZ; FRANÇA; COSTA (org), 2010.

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N

LEGENDA Limites Sub. Sé Limites Sub. Mooca Distritos Cortiços

FIGURA 100: CORTIÇOS REGISTRADOS NA SUBPREFEITURAS SÉ E MOOCA Imagem Satélite: Google Maps; Dados: HabitaSampa. Base Cartográfica PMSP: Mapa Digital da Cidade, 2017. Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

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5. CORTIÇOS EM NÚMEROS (SUB. SÉ) 5.1 COMPARATIVO DE DADOS: PROGRAMA DE CORTIÇOS E HABITASAMPA

Para a caracterização dos imóveis selecionados pelo “Programa de Atuação em Cortiços” de 2005, na Subprefeitura da Sé, foi levado em conta o “Índice de Adequação” criado pelos técnicos segundo às vistorias realizadas aos 1320 imóveis mapeados pela CDHU em 2001, de acordo com Nº de Cortiços cadastrados as diretrizes Nº dadeLei Moura. Dentro da “Faixa de porCortiços distrito cadastrados (Sub. Sé) Prioridade”, 635 Imóveis foram como Nº de Cortiços cadastrados por distrito (Sub.classificados Sé) Distrito Qtd. cortiços (TABELA 15). por distrito (Sub. Sé) Distrito Qtd.

Bela Vista 204 Distrito Qtd.199 Bela Vista 204 Liberdade Já ao Bela analisar os dados do 204 HabitaSampa Vista Liberdade 199 Santa Cecília 195 referente às vistorias mais recentes realizadas Liberdade 199 Santa Cecília 195 Bom Retiro 133 dentro do PAC (2015, 2016 e 2017), conclui-se que, SantaRetiro Cecília 195 Bom 133 República 34 dos imóveis encortiçados que 100 apresentaram Bom Retiro 133 República 100 um índice Cambuci de adequação mais alto, 80 paralelo aos República 100 Cambuci 80 Sé 61 estágios das obras de adequação registrados na Cambuci 80 Sé 61 Consolação 2 Vistoria prévia, reduziram o mesmo índice com o Sé 61 Consolação passar dosTotal anos, o que significa que974 é2necessário Consolação 2 Total 974 mais do que uma vistoria ou intimação para que Total 974 Qtd. TABELA Distrito 7: Cortiços por distrito (2001)* Distrito Bela Vista Distrito Bela Vista Liberdade Bela Vista Liberdade Santa Cecília Liberdade Santa Cecília Bom Retiro SantaRetiro Cecília Bom República Bom Retiro República Cambuci República Cambuci Sé Cambuci Sé Consolação Sé Consolação Total Consolação Total Total

Qtd.270 Qtd.278 270 270 278 264 278 264 172 264 172 118 172 118 126 118 126 87 126 87 5 87 5 1320 5 1320 1320

Fonte: Dados: Mapeamento CDHU 2001/Denúncias/ Movimento de Moradia

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se atinja a qualidade de uma moradia digna nesses imóveis. Em contrapartida, 69 imóveis aumentaram o índice e 7 deles o mantiveram, ou seja, não apresentaram melhoras nem pioras nas condições da habitação nesse período. Numericamente, esses dados não são visíveis, já que segundo as Tabelas 17 e 18, todas as faixas de índices apresentaram melhoras. Em questão de porte, os imóveis classificados como “Pequeno” e “Médio” são a maioria, enquanto o número registrado de invasões entre os primeiros anos do PAC (71 imóveis), aumentam 33% em relação às classificações realizadas nas vistorias recentes (106 imóveis - TABELA 21), dado que também pode ser relacionado ao aumento do número de imóveis interditados: de 78 para 106 (TABELAS 19 E 20). Nº de Cortiços cadastrados distritopor (Sub. Sé) (2019) TABELA por 8: Cortiços distrito Distrito Qtd. Bela Vista 204 Liberdade 199 Santa Cecília 195 Bom Retiro 133 República 100 Cambuci 80 Sé 61 Consolação 2 Total 974 Fonte: HabitaSampa - Sistema de Informações para Habitação Social na Cidade de São Paulo. Metadados: atualização 21 de fevereiro de 2019.


FIGURA 101: Distritos da Subprefeitura da Sé e Cortiços (HabitaSampa, 2015) Elaboração: Autoral

2

6

7

5 4

1

Bela Vista

2

Bom Retiro

3

Cambuci

4

Liberdade

5

República

6

Santa Cecília

7

1

4

3

N

Cortiços (por distrito - HabitaSampa)

Mapas s/ escala

Verificando a localização dos cortiços no mapa, percebe-se que estes estão concentrados ainda naqueles que foram os primeiros distritos a terem seus imóveis ocupados pela HCPA - Habitação Coletiva Precária de Aluguel. Relacionando com os dados da Tabela 7, os distritos Bela Vista e Liberdade, apresentam o maior número de imóveis encortiçados, em uma mancha praticamente contínua com os existentes nos distritos República e Sé - nesses dois últimos casos, são encontrados próximos aos limites administrativos, ou seja, em sua totalidade há uma concentração maior de serviços e comércios. Próximo as regiões mais nobres e valorizadas, como é o caso do distrito da Consolação, proximidades da Av. Paulista, Paraíso e Aclimação (Sul e Sudoeste), quase não são encontrados cortiços, fato do qual podemos deduzir a presença de outras classes de renda e edificações que estão mantendo o seu uso e certa vitalidade em geral, ao contrário do que se encontra no Centro da Cidade.

156


Santa Cecília Bom Retiro República Cambuci Sé Consolação Total

do nº

195 133 100 80 61 2 974

TABELA 9: Renda Média imóvel (2005)* Renda Média Renda porpor imóvel Média por imóvel

TABELA 10: Qtd.de decômodos Cômodos porpor imóvel Quantidade (2005)*

imóvel

d.

Até 1 salárioAté mínimo 1 salário mínimo 11% 11%Até 5 16% 183 De 1 a 2 salários De 1 mínimos a 2 salários mínimos 46%De 6 a 10 Distrito Qtd. 46% 38% 264 De 2 a 3 salários De 2 mínimos a 3 salários 31% 31%De 11 a 15 Bela mínimos Vista 270 23% 191 De 3 a 4 salários De 3 mínimos a 4 salários mínimos 7% 7%De 16 a 20 Liberdade 278 11% 131 Mais de 4 salários Mais de mínimos 4 salários mínimos 5% 5%Mais de 20 Santa Cecília 264 12% 114 Total Total 100% 100%Total Bom Retiro 172 100% 97 República 118 25 Sob. Total do Sob. levantamento Total doCambuci levantamento de 2010 de 2010 126 TABELAS 9 e 10. PAC - Programa de Atuação em Cortiços, 2005. 1005 SéFRANÇA, Elisabete; COSTA, Keila 87 Prado (Org.). Cortiços: a experiência de São Paulo. *LÓPEZ, Alonso; Consolação 5 São Paulo: Prefeitura, 2010. 143 p. Cortiços por classe do Total 1320 Cortiços por classe zoneamento Lei nºdo

zoneamento Lei nº 16.402/2016 TABELA 11:16.402/2016 Qtd. declasse Cortiços TABELA 12:Cortiços Cortiçospor porárea áreadede terreno Cortiços por dopor ZONA Qtd. Zoneamento (Lei nº 16.402/2016)35 - M² (2015). Total de Imóveis: 552. zoneamento Lei nº 183 terreno Qtd. ZEUZONA 16.402/2016 M² Qtd. ZEU 183 ZEIS-3 264 ZONA Qtd. 191 21 a 100 59 ZEIS-3 264 ZC ZEU 183 101 a 200 212 ZC 191 ZEM 131 Cortiços131 por área de ZEIS-3 264 ZEM 201 a 300 por área172 ZM 114 Cortiços do terreno (2001) terreno ZC 191 ZM 114 301 a 400 74 ZEIS-5 97 M² 131 Área doaterreno ZEM ZEIS-5 97 Qtd. 401 500 19Imóveis Famílias ZDE-1 25 21 a 100 1005 59 Até<100m² 64 740 ZM 114 ZDE-1 25 500 16 Total 101 a 200 1005 212 De Área 100 amédia 250m² 226,5m² 337 3899 ZEIS-5 97 Total 201 a 300 25 172 De 250 a 500m² 166 1921 ZDE-1 Total 301 a 400 1005 74 De 500 a 750m² 15 174 401 a 500 19 Mais de 750m² 5 58 TABELAS 11 e 12. HabitaSampa - Sistema de Informações para Habitação Social na Cidade de São < 500 21 de fevereiro 16de 2019. Sem informação 48 555 Paulo. Metadados. Atualização Área média 226,5m² Total 635 7347

TABELA 13: Cortiços por área de terreno - M². Cortiços por área do terreno (2001) Área média: 223m². (2005)*

rea de

Qtd. 59 212 172 74 19 16 226,5m²

Área do terreno Até 100m² De 100 a 250m² De 250 a 500m² De 500 a 750m² Mais de 750m² Sem informação Total

Imóveis Famílias 64 740 337 3899 166 1921 15 174 5 58 48 555 635 7347

TABELA 14: Profundidade dos Profundidade imóveis imóveis, em metrosdos (2005)*

M Até 25 De 25 a 30 De 30 a 35 De 35 a 40 Mais de 40m Sem informação Total

Qtd. 193 95 81 54 159 53 635

TABELAS 13 e 14. PAC - Programa de Atuação em Cortiços, 2005. *LÓPEZ, Alonso; FRANÇA, Elisabete; COSTA, Keila Prado (Org.). Cortiços: a experiência de São Paulo. São Paulo: Prefeitura, 2010. 143 p.

35. O valor “Total” está acima do número de cortiços cadastrados no HabitaSampa (2019), pois alguns se encontram em quadras com mais de uma Zona.

157


ZC 191 ZEM 131 ZM 114 ZEIS-5 97 ZDE-1 25 TABELA 15: Imóveis Total por Faixa de Prioridade 1005(2005)* Estágio dos imóveis por Faixa de

De 3 a 4 salários mínimos Mais de 4 salários mínimos Total

7% 5% 100%

Sob. Total do levantamento de 2010 TABELA 16: Imóveis encortiçados por ano de construção (2005)*

Imóvel por ano de construção Prioridade (2005) Índice Imóveis % Ano Imóveis Famílias Percentual (IA) daconforme Índice de adequação (IA) da vistoria prévia Índice (Vp) de adequação Classificação IA De 0 a 0,2 85 15 Décadas 1910/20 38 440conforme6% vistoria prévia (Vp) Classificação IA Variável Imóveis Ruim 412 Décadas 1930/40 275 3182 43% De 0,2 a 0,4 241 36 Variável Imóveis Ruim 412 0.0 138 Regular 527 Décadas 1950/60 138 95 15% 0.0 Regular 1099 527 De 0,4 a 0,6 214 31 0.02 - 0.1 12 Bom 35 Décadas 1970/80 42 486 7% - 0.1 12 Bom 35 0.11-0.5 262 Total 974 De 0,6 a 0,8 77 14 0.02 Décadas 1990/2000262 7 81 1% 0.11-0.5 Total 974 0.51-0.7 332 De 0,8 a 1,0 18 4 Sem informação 332 178 2059 28% 0.51-0.7 0.71-0.89 195 Total 635 7347 100% Total 635 100 0.71-0.89 195 0.90-1.00 35 0.90-1.00 35 Total 974 Total 2005. 974 TABELAS 15 e 16. PAC - Programa de Atuação em Cortiços, *LÓPEZ, Alonso; FRANÇA, Elisabete; COSTA, Keila Prado (Org.). Cortiços: a experiência de São Paulo. São Paulo: Prefeitura, 2010. 143 p.

Classificação da vistoria prévia TABELA 19: de Imóveis Classificação da vistoria prévia Índice de Classificação adequação (IA) da Vistoria prévia (Vp) (Vp) (Vr) vistoria recente Classificação IA Tipo vistoriaconforme recente (Vr) Imóveis Ruim 412 Variável Imóveis Variável Imóveis Tipo Imóveis Grande 170 Regular 527 0.0 80 0.0 80 Grande 170 Médio 303 Bom- 0.1 35 0.02 - 0.1 10 0.02 10 Médio 303 Total 974 0.11-0.5319 92 0.11-0.5 92 Pequeno 0.51-0.7 Pequeno 130 0.51-0.7 130 319 Invasão 104 0.71-0.89Invasão 227 0.71-0.89 227 104 Interditável 0.90-1.0078 195 0.90-1.00 195 Interditável Cortiços974 sem Vr 24078 Cortiços sem Vr Total 240 Total 974 Total 974 Total 974

TABELA de Adequação Índice17: deÍndice adequação (IA) da (IA) de Vistoria prévia (Vp)

TABELA 18: Índice de Adequação Índice de adequação (IA) da(IA) (Vp) de Vistoria recente (Vr)

Outro

Tamanho

Tamanho

vistoriaconforme prévia (Vp) Classificação IA Imóveis RuimVariável 412 0.0 Regular 527 138 0.02 - 0.1 Bom 35 12 0.11-0.5 Total 974 262 0.51-0.7 332 0.71-0.89 195 0.90-1.00 35 Total 974

Outro

IA) da p) óveis 138 12 262 332 195 35 974

TABELAS 17, 18 e 19. HabitaSampa - Sistema de Informações para Habitação Social na Cidade de São Paulo. Metadados:

(Vr)

Tamanho

TABELA 20: Classificação Granderecente Grande 170 de Imóveis - Vistoria

170

Índice de adequação (IA) da Vr

TABELA 21: Índice de adequação (IA) da da vistoria recente (Vr) Médio 303 Médio Classificação303 (2017, 2016 e 2015), em Vr (2017, 2016 e 2015), em comparação Tipo Imóveis comparação a Vp Pequeno 319 a Vp Pequeno 319 Obra de adequação em Situação IA Imóveis Invasão 141 104 Invasão 104 andamento/Cortiço Desfeito 34 Interditável123 78 Reduziram Interditável 78 Obra em andamento/Interdição Aumentaram 69 Interditado 80 Total 974 Total 974 Mantiveram 7 Invasão 106 Total 110da Vr Mudança de Uso 439 Índice de adequação (IA) Índice de adequação (IA) da Vr Sem classificação 85 e 2015), em (2017, 2016 e 2015), em (2017, 2016 Total 974 comparação a Vp comparação a Vp Situação IA Imóveis Situação IA Imóveis Reduziram 34para Reduziram 34 TABELA 20. PAC - Programa de Atuação em Cortiços, 2005. TABELA 21. HabitaSampa - Sistema de Informações Aumentaram 69 Aumentaram 69 *LÓPEZ, Alonso; FRANÇA, Elisabete; COSTA, Keila Prado Habitação Social na Cidade de São Paulo. Metadados: (Org.). Cortiços: a experiência de São Paulo. São Paulo: atualização 217 de fevereiro de 2019. Mantiveram 7 Mantiveram Prefeitura, 2010. 143 p. Total 110 Total 110

Outro

Outro

Tamanho

Classificação da vistoria prévia de 2019.Classificação da vistoria prévia atualização 21 de fevereiro (Vp) (Vp) Tipo Imóveis Tipo Imóveis

158


TABELA 22: Imóveis por Tombamento

Tombamento Tipo Qtd. Volumétrico 95 Total 2 AE 410 Em processo 53 Cancelado 2 Sem tombamento 370 Sem classificação 42 Total 974

TABELA 23: Caracterização dos Imóveis - Salubridade e Tipologia (635 Caracterização dos Imóveis ‐ Salubridade imóveis com 7347 famílias) (2005)*

635 imóveis com 7347 famílias Lei Moura Imóveis Famílias Percentual Com ventilação 209 2418 33% Sem ventilação 426 4929 67% Com iluminação 216 2499 34% Sem iluminação 419 4848 66% Com área mínima 517 5982 81% Sem área mínima 118 1365 19% Com adensamento máximo 530 6132 83% Sem adensamento máximo 105 1215 17% Com revestimento no W.C 172 1990 27% Sem revestimento no W.C 463 5357 73% Com pé direito 499 5773 79% Se pé direito 136 1574 21% Com circulação 487 5635 77% Caracterização dos Imóveis ‐ Tipologia 635 Sem circulação 148 1712 23% imóveis com 7347 famílias

Tipologia Casas com porão habitado Térrea Sobrado + de 3 pavimentos Total

Imóveis Famílias Percentual 12 139 2% 149 1724 23% 435 5033 69% 39 451 6% 635 7347 100%

TABELA 22. HabitaSampa - Sistema de Informações para Habitação Social na Cidade de São Paulo. Metadados. Atualização 21 de fevereiro de 2019. TABELA 23. PAC - Programa de Atuação em Cortiços, 2005. *LÓPEZ, Alonso; FRANÇA, Elisabete; COSTA, Keila Prado (Org.). Cortiços: a experiência de São Paulo. São Paulo: Prefeitura, 2010. 143 p.

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5.2 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: DIRETRIZES PROJETUAIS

Entre os distritos da Sub. Sé, quanto ao número de imoveis encortiçados registrados pelos dados públicos, destacam-se 3: Bela Vista (204), Liberdade (199) e Santa Cecília (195) TABELAS 7 e 8. Esses estabelecem uma área de influência nos distritos República, Sé e Bom Retiro, respectivamente, onde se concentram no geral, a maior concentração de comércios, serviços, equipamentos públicos e emprego. De acordo com os dados levantados pelo PAC (2005), 88% das famílias encortiçadas possuem renda média de 0 a 3 salários mínimos (TABELA 9), que em termos de política pública, estão enquadradas na Habitação de Interesse Social 1, que de acordo com a Tabela 6 (Capítulo 4), corresponde ao atendimento habitacional por iniciativa pública ou privada, com 1 sanitário e 1 garagem, no máximo. A maioria dos imóveis encontram-se em Zeis 3 (Zona Especial de Interesse Social 3), ZC (Zona de Centralidade) e ZEU (Zona de Estruturação Urbana) - Tabela 11 e Figura 90. Ou seja, principalmente nas zonas ZC e ZEU, existe uma potencialidade comercial a ser explorada nos imóveis, e que porventura podem contribuir para a renda dos moradores e diversificação dos usos locais, atendendo demandas pontuais e contribuindo

com a dinâmica nas ruas, principalmente nos períodos de pouco movimento. Em dimensões, prevalece uma área média de 223 m² de terreno, entre 25m (193 imóveis) e mais de 40 m de profundidade (159); e 69% dos imóveis tem entre 2 e 3 pavimentos (TABELAS 13, 14 e 23, respectivamente). Quanto ao índice de adequação - de acordo com as vistorias recentes - mais de 50% dos imóveis encortiçados (dos 635 considerados pelo PAC, 2005) se encontram entre 0 e 0,4, ou seja, 326 encontrados em condições de precariedade extrema. No geral, as características mais expressivas encontradas foram: • 67% sem ventilação adequada; • 66% sem iluminação; • 83% com adensamento máximo; • 73% sem revestimento no banheiro; • 21% - 499 imóveis - 5773 famílias - sem pé direito necessário; • 23% sem circulação - 148 imóveis. Apenas 7 cortiços foram construídos entre a última década de 90 e o início do séc. XXI, e quase metade dos imóveis apontados (313 49% - TABELA 16) construídos entre 1910 e 1940

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PARA SOLUCIONAR O PROBLEMA DOS CORTIÇOS, PRECISAMOS ENCARAR SEUS HABITANTES COMO PESSOAS CAPAZES DE COMPREENDER SEUS INTERESSES PESSOAIS E LIDAR COM ELES, O QUE CERTAMENTE SÃO. PRECISAMOS DISCERNIR E LEVAR EM CONSIDERAÇÃO AS FORÇAS DE RECUPERAÇÃO EXISTENTES NOS PRÓPRIOS CORTIÇOS E EVOLUIR A PARTIR DELAS, O QUE COMPROVADAMENTE FUNCIONA NAS CIDADES REAIS (JACOBS, 2015, p.302).

FIGURA 102: Como um adereço das fachadas dos imóveis de aluguel, são as placas de anúncio com “Aluga-se”. No caso dos cortiços, o “aluguel de quartos” é o mais comum, com uma oferta maior para solteiros e sem filhos. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019.

161


(período inicial da industrialização da cidade de São Paulo e anterior à produção do BNH e início da periferização - período ditatorial da política brasileira). Quanto ao patrimônio, 95 imóveis possuem tombamento volumétrico, 410 se encontram em área envoltória (AE), e 2 possuem tombamento integral. Esses dados mostram não somente a necessidade de preservação do histórico construído, como também estimular a valorização e a qualificação do entorno, de modo que os próprios residentes e usuários do espaço, mantenham a integridade necessária da paisagem urbana. A seleção desses dados direcionam para a escolha do próximo recorte de intervenção, agora “limitados” ao estudo do objeto “cortiço” quanto a sua configuração material e espacial (arquitetônica), e de impacto social. A escolha de 3 imóveis existentes, deverá ser realizada dentro da área com maior concentração de HCPA, ou seja, no distrito da Bela Vista36. Nesta região, serão priorizados àqueles com índices de adequação mais baixos e que apresentem importância construtiva histórica, de modo a desafiar a elaboração do projeto de intervenção em uma edificação antiga, com restrições estabelecidas por órgãos públicos de preservação, como o CONPRESP37 e o CONDEPHAAT38. Até o momento, pudemos perceber que a precariedade característica dos cortiços está relacionada além da falta de manutenção, a como as habitações - a principio - multifamiliares, foram subdivididas em cubículos menores, sem

36. A partir dessa análise local, pretende-se com base na Lei Moura verificar quais são os parâmetros mínimos, como seria possível adotá-los visando a qualificação do imóvel, e/ou contestar os mesmos, a partir de novas medidas projetuais que se adequem as atuais necessidades do espaço e de seus residentes, de modo que, no geral, possam ser replicados em outros cortiços no Centro da cidade (a priori).

as devidas adequações de aberturas (janelas), e equipamentos sanitários, no geral, pela inexistência de espaços qualificados para uma moradia digna, ou seja, que contemple o mínimo necessário para a realização das tarefas diárias de cada um dos membros da família, sem afetar sua a privacidade, saúde física e mental, além de promover o estímulo às relações sociais entre vizinhos, gerando confiança e segurança no uso do espaço, principalmente por crianças. Deverá ser pensado também, como as características do entorno e sua dinâmica podem contribuir para a qualificação desse novo espaço que deverá surgir, de habitar, socializar e produzir. A partir das caminhadas realizadas pela região de estudo, foi possível notar a diferença em que as pessoas residentes desses imóveis precários, se apropriam do espaço público para estabelecerem relações entre vizinhos de cômodo e de lote, uma interação por exemplo, que não se encontra nos bairros de classe média/alta, quando o medo predomina e os muros altos se tornam presente, e as ruas se tornam desertas. Por tanto, existe a necessidade e a ambição projetual de unificar o urbano ao arquitetônico, respeitando as necessidades dos moradores e as dinâmicas locais existentes, de modo que esses permaneçam por livre escolha, qualificando assim a moradia de locação (atualmente a mais acessível à população de baixa renda - até 3 s.m), estimulando uma continuidade do espaço privado ao público, sem interferir na privacidade dos residentes, valorizando assim tanto o patrimônio construído quanto o seu entorno.

37. Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo), responsável pelo tombamento de bens de naturezas diversas, a fim de garantir a sua preservação, na escala do Município de Sp. 38. Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico), responsável pelo tombamento de bens de naturezas diversas, a fim de garantir a sua preservação, na escala do Estado de Sp.

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FIGURAS 103 e 104: Cortiço na R. dos Gusmões, 132/ R. do Triunfo, 192. Distrito República. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019. Situado em uma ZEIS-3, este cortiço foi classificado pela vistoria prévia (04/01/2011) como “invasão”, e índice de adequação 0 (HabitaSampa). Com 400m² de área construída e 260 m² de terreno, tem 26 m de fachada e um pouco mais de 12 m de profundidade. Possui tombamento volumétrico, e está dentro da área afetada pelo “Projeto Nova Luz”. O imóvel, além do seu interesse histórico, possui um grande potencial de transformação, tanto pelo entorno quanto pela sua implantação, de esquina e com cesso à duas ruas, em uma região carente de atenção do Poder Público.

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FIGURA 105: R. Conde de São Joaquim (Bela Vista), onde crianças brincam e pessoas socializam nas calçadas. em um sábado a tarde - provavelmente moradoras dos cortiços próximos ou dos conjuntos habitacionais que foram construídos a partir de intervenções da CDHU, a exemplo do edifício amarelo que aparece na foto. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019. Já citado anteriormente nesse trabalho (Linha do Tempo), o edifício residencial “Bela Vista E”, foi construído em 2009 pela CDHU. Na mesma rua, encontra-se outros condomínios realizados pela companhia, também em substituição à antigos cortiços.

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FIGURA 106: Imóveis encortiçados da década de 1940. R. Conde de São Joaquim, 129 e 133/135/137, ambos (edifícios amarelo e azul, respectivamente), em ZEIS-3. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019. Na última vistoria datada de 28/10/2015, imóvel 129 (amarelo) foi indicado para interdição, devido a precariedade, e ao índice de adequação de 0,45. Segundo dados do HabitaSampa, até a vistoria, não havia água nem energia regulares. Nesse dia em que as fotos foram tiradas, pude observar que a calçada - e até a rua - deixam de ter um caráter apenas de passagem, para servir de espaço de socialização entre moradores, e brincadeiras de crianças. Os pequenos comércios existentes na rua, bares dos próprios moradores ou proprietários - suponho -, contribuem para que as pessoas se sintam a vontade no espaço público (o sentimento de segurança vem do convívio). No geral, essas relações de vizinhança acabam impactando no modo como as pessoas se apropriam do entorno, mesmo esse não sendo o mais adequado para um local de permanência, como podemos ver na foto acima (Figura 106), há lixo na calçada, e mesmo assim, há rapazes conversando e sentados bem ao lado. FIGURA 107: Cortiços na R. Conde de São Joaquim, 198/200 e 208/210 (da direita pra esquerda) Fotografia Autoral, 30 de março de 2019. Também localizados em ZEIS-3, o imóvel à direita, segundo dados do HabitaSampa, teve suas obras de adequação à Lei Moura finalizadas - vistoria recente data de 08/03/2012 -, recebendo por isso o índice 1. Já o edifício ao lado, teve vistoria recente em 30/01/2014, onde foi constatado pelos técnicos que a obra de adequação estava parada. Após vistoria em 18/11 do mesmo ano, o imóvel com índice 0.83, foi retirado do PAC, classificado como “Mudança de Uso”.

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FIGURA 108: Cortiço interditado, localizado na R. General Couto de Magalhães, 385/387 (distrito República) Fotografia Autoral, 30 de março de 2019. Localizado em ZC e AE (área envoltória), o imóvel foi desapropriado por meio da Operação Nova Luz. No momento da foto, como pode ser visto no canto inferior esquerdo, tinham dois policiais em frente a edificação, provavelmente para impedir a reocupação da edificação, que desde a última vistoria registrada (02/08/2017), até 30/03/2019, ainda estava interditado, ou seja, fechado e sem nenhum uso. Segundo os registros, as 34 famílias (102 pessoas) foram atendidas pela CDHU. O imóvel possui tombamento das fachadas e da volumetria, datada de 1934.

167


FIGURA 109: R. Maria José, 399 (1970). Nota-se uma intervenção na arquitetura original do imóvel (janela) que possui tombamento volumétrico. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019.

FIGURA 110: Cortiço na Al. Barão de Piracicaba, 67/71 (distrito Santa Cecília) Fotografia Autoral, 30 de março de 2019.

FIGURA 111: Cortiço na R. Condessa de São Joaquim, 184. Tombamento volumétrico, imóvel de 1949. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019.

FIGURA 112: Cortiços R. Conde de São Joaquim, 315/317 (1950) e 325 (1944). Em ZEU e com porão habitado. Fotografia Autoral, 30 de março de 2019.

168


6.

APROXIMAÇÃO DA ARQUITETURA

Metodologia de projeto e Análise de legislação específica

FIGURA 113: Estudo em croqui de alguns dos imóveis considerados encortiçados, segundo a fiscalização realizada durante o PAC. Desenho autoral, 2019.

169


170


6. APROXIMAÇÃO DA ARQUITETURA 6.1 METODOLOGIA DE PROJETO - ANÁLISE DE CONDIÇÕES GERAIS

A base para a elaboração da metodologia deste projeto, partiu principalmente a partir da análise dos dados citados no capítulo anterior, informações que até o momento dessa pesquisa, configuram as mais atuais em relação aos cortiços da cidade de São Paulo, e sem breve previsão de atualização. E por que analisar dados gerais de uma escala urbana, se o objetivo é se aproximar da arquitetura, na escala do pedestre? O problema dos cortiços vai muito além de um lote, de uma quadra, ou de um distrito. Ao analisar os dados gerais, pode-se ter a oportunidade de traçar condições e problemas semelhantes presentes, em média, nos 635 imóveis encortiçados registrados e fiscalizados durante o Programa de Atuação em Cortiços, da Sehab-SP. Agravantes como ventilação, iluminação e circulação precárias, e adensamento, que estão além do considerado ideal segundo os parâmetros da Lei Moura (analisada mais adiante nesse trabalho). Projetar pensando somente em um caso específico de habitação precária, que na realidade se estende em escala urbana, com sérios déficits que se multiplicam pela cidade por mais de 500 moradias, é não enxergar a raiz do problema. Assim, para chegar até a ideia que será desenvolvida

neste capítulo, concluiu-se parcialmente que para tentar - ao menos -, amenizar a questão centenária dos cortiços, é necessário que seja desenvolvida e por mais pretensiosa que pareça -, uma proposta adaptável e flexível em grande escala (urbana) para experimentação em menor escala (arquitetura). Para chegar em parâmetros mais exatos de definições em áreas genéricas onde pudesse ser desenvolvido um projeto adaptável, ou um protótipo, foi considerado como PRIMEIRO FILTRO, o Índice de Adequação (IA), que também foi estabelecido pelos fiscais atuantes do PAC, para classificação do estado de integridade dos cortiços, que varia de 0 (imóvel passível de interdição) a 1 (imóvel certificado, deixa de ser cortiço). Nesse caso, foram considerados para análise apenas as situações mais críticas encontradas, classificadas entre 0 e 0,49, com habitabilidade precária. Como resultado, 326 imóveis precários em toda a região da Sub. Sé, ou seja, mais de 50% (51,34%), foram delimitados pelo SEGUNDO FILTRO e etapa da análise. Critérios como localização em zoneamento e gabarito predominante, além de dimensões médias (área, testada e profundidade do lote), agregaram o nível de informações para origem do primeiro produto, como se confere nas etapas de construção da metodologia, a seguir.

FIGURA 114: Figuras ilustrativas de etapas para elaboração da metodologia de trabalho Imagens de 1 a 3: Reprodução “The Noun Project” Imagem 4: Autoral, 2019.

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1

• 635 cortiços de 974 imóveis levantados na Sub. Sé (Fonte: PAC, 2005). • 326 imóveis encortiçados localizados (51,34%), encontrados em situação precária, classificados com o IA (Índice de Adequação aos requisitos mínimos de habitabilidade definidos pela Lei Moura), de 0 a 0,49, em uma escala de 0 a 1.

3

• Gabarito predominante de 2 a 3 pavimentos, + porão em alguns casos. • Área Média dos lotes de 223m². • 193/635 imóveis possuem terreno com 25m de profundidade. • 230/635 imóveis possuem terreno com profundidade entre 25 e 40m.

2

Localizados em ZEIS-3 (264 imóveis); ZC (191 imóveis); e ZEU (183 imóveis), predominantemente*.

Problemas comuns e agravantes: • • • •

Ventilação Iluminação Adensamento Circulação

4

• Distrito Bela Vista: • 48 imóveis encortiçados com IA de 0 a 0,49: • Fachada de 5 a 10m: 31 imóveis; Profundidade média: 28, 81m. • Fachada de 10 a 15m: 6 imóveis; Profundidade média: 23,99m. • Fachada de 15 a 20m - 2 imóveis; Profundidade média: 40,93m.

Fonte: Dados - PAC - Programa de Atuação em Cortiços, 2005; * O valor “Total” está acima do número de cortiços cadastrados no HabitaSampa (2019), pois alguns se encontram em quadras com mais de uma Zona.

172


As primeiras etapas de metodologia, principalmente as duas últimas, 3 e 4, permitiram chegar ao TERCEIRO FILTRO de informações, onde o produto gerado foram três configurações médias de dimensões de lotes, obtidos por meio da análise dos dados coletados pelos agentes que participaram do cadastramento dos imóveis encortiçados durante o PAC. Para tal, foram considerados os 290 imóveis encortiçados da Bela Vista (distrito representativo para o desenvolvimento da metodologia desse trabalho)39, onde os lotes classificados como “Pequeno Porte” apresentavam dimensões médias de testada com 7m de comprimento, e profundidade de 20 a 50m; já os de “Médio Porte”, de 8 a 15m, e de 20 a 50m; e “Grande Porte”, de 10 a 18m, e de 30 a 40m, respectivamente40. Aplicando o IA de 0 a 0,49 ao dado anterior, obteve-se o QUARTO FILTRO: de 290 imóveis, 48 foram classificados como extremamente precários, na região da Bela Vista, e desses 39 com dimensões de testada de 5 a 20m de comprimento. Assim, com um número de imóveis mais enxuto para análise, foram obtidos os seguintes dados: • IMÓVEIS: 31 TESTADA: 5 a 10m; PROFUNDIDADE MÉDIA: 29m. • IMÓVEIS: 6 TESTADA: 10 a 15m; PROFUNDIDADE MÉDIA: 24m • IMÓVEIS: 2 TESTADA: 15 a 20m; PROFUNDIDADE MÉDIA: 40m

39. A Bela Vista, além de ser o distrito com a maior concentração de imóveis encortiçados da Subprefeitura da Sé, possui características territoriais e um histórico diretamente relacionado ao surgimento desse tipo de habitação na cidade de São Paulo, além da sua importância e representatividade no patrimônio edificado local.

173

A partir dessas informações, foram escolhidos para estudo definitivo e desenvolvimento dos protótipos para intervenção projetual, três configurações de lotes. São elas: 1º CONFIGURAÇÃO DE LOTE: • TESTADA: 5m • PROFUNDIDADE: 30m 2º CONFIGURAÇÃO DE LOTE: • TESTADA: 10m • PROFUNDIDADE: 25m 3º CONFIGURAÇÃO DE LOTE: • TESTADA: 15m • PROFUNDIDADE: 40m Já na quinta etapa de desenvolvimento da metodologia de projeto, procurou-se analisar os parâmetros urbanísticos pertinentes ao uso, parcelamento e ocupação do solo, da cidade de São Paulo, baseados na Lei nº 16.402/16, já comentada anteriormente nesse trabalho. A ZEIS-3 (Zona Especial de Interesse Social), por ser a predominante em localização dos cortiços no território em questão, e mais restritiva do que a ZC (Zona de Centralidade) e ZEU (Zona Eixo de Estruturação Urbana), foi a escolhida para a determinação dos parâmetros (coeficiente de aproveitamento, taxa de ocupação, recuos e gabarito) a serem seguidos para ocupação projetual nos três lotes.

40. Dentre os 290 cortiços da Bela Vista, 83 foram classificados como “Pequeno Porte”; 61 de “Médio Porte”; e 32 de “Grande Porte”. 12 imóveis foram caracterizados como interditado, e 13 como invasão; os demais não tinham classificação.


5 • LOTE PEQUENO - 150m² (5X30m - TXP)

PARÂMETROS URBANÍSTICOS ZEIS-3 CA MÍNIMO

0,5 (75m²)

CA BÁSICO

1 (150m²)

CA MÁXIMO

2 (300m²) (a)

TO

0,85 (b)

GABARITO MÁX.

NA

RECUOS MÍN. FRENTE

• LOTE MÉDIO - 250m² (10X25m - TXP)

FUNDO E LATERAIS

5m (c) h < 10m = NA h > 10m = 3m (d)

CA MÍNIMO

0,5 (125m²)

CA BÁSICO

1 (250m²)

CA MÁXIMO

2 (500m²) (a)

TO

0,85 (b)

GABARITO MÁX.

NA

RECUOS MÍN. FRENTE FUNDO E LATERAIS FIGURA 115: Figuras ilustrativas da configuração de lotes definidos para elaboração dos protótipos. Autoral, 2019. (a) O CAmáx será igual a 2 nos casos em que o lote for menor que 500m² (quinhentos metros quadrados). Para lotes igual ou maior a 500m², adota-se 4. (b) Para lotes até 500m². Para lotes igual ou maior a 500m², adota-se 0,7.

5m (c) h < 10m = NA h > 10m = 3m (d)

Fonte: Quadro 3 da *Lei de Zoneamento (Lei nº 16.402/16). (c) O recuo frontal será facultativo quando atendido o disposto nos artigos 67 ou 69 desta lei. (d) Os recuos laterais e de fundo para altura da edificação superior a 10m (dez metros) serão dispensados conforme disposições estabelecidas nos incisos II e III do artigo 66 desta lei*.

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• LOTE GRANDE - 600m² (15X40m - TXP)

PARÂMETROS URBANÍSTICOS ZEIS-3 CA MÍNIMO

0,5 (300m²)

CA BÁSICO

1 (600m²)

CA MÁXIMO

4 (2400m²) (a)

TO

0,70 (b)

GABARITO MÁX.

NA

RECUOS MÍN. FRENTE FUNDO E LATERAIS

FIGURA 116: Figuras ilustrativas da configuração de lotes definidos para elaboração dos protótipos. Autoral, 2019. (a) O CAmáx será igual a 2 nos casos em que o lote for menor que 500m² (quinhentos metros quadrados). Para lotes igual ou maior a 500m², adota-se 4. (b) Para lotes até 500m². Para lotes igual ou maior a 500m², adota-se 0,7.

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5m (c) h < 10m = NA h > 10m = 3m (d)

Fonte: Quadro 3 da *Lei de Zoneamento (Lei nº 16.402/16). (c) O recuo frontal será facultativo quando atendido o disposto nos artigos 67 ou 69 desta lei. (d) Os recuos laterais e de fundo para altura da edificação superior a 10m (dez metros) serão dispensados conforme disposições estabelecidas nos incisos II e III do artigo 66 desta lei*.


6.2 METODOLOGIA DE PROJETO - UNIDADES HABITACIONAIS (UHs) - ANÁLISE DE PARÂMETROS MÍNIMOS SEGUNDO A LEI MOURA (Nº 10.928/91)

Como se viu no Capítulo 3, os requisitos básicos de habitabilidade são discutidos desde meados do século XIX, com o início da sociedade industrial: como suprir a demanda crescente por habitação em massa e em um curto espaço de tempo? Apesar da preocupação, no entanto, percebeu-se nas primeiras análises de socialistas da época, e arquitetos já no século XX, que as medidas propostas como soluções para tal questão, eram genéricas, e não consideravam a diversidade do público alvo na configuração das plantas habitacionais. Tornava-se assim necessário considerar, além do contexto histórico e urbano para quem seriam os espaços mínimos, projetados por quem não iria habitá-los. O questionamento das condições de habitação nos cortiços, ao longo da história desde o conhecimento de sua existência, e apesar dos relatórios de higiene realizados pelo poder público no fim do século XIX, somente vieram a ser estudadas na tentativa de torná-las minimamente aceitáveis, em 8 de janeiro de 1991, com a promulgação pelo vereador Luiz Carlos Moura da Lei Municipal nº 10.928/91 - popularmente intitulada como Lei Moura -, na gestão de Luiza Erundina de Sousa, então Prefeita do Município de São Paulo. Nessa lei, conceitua-se a definição política de cortiços e estabelecem-se parâmetros

e outras providências, na tentativa de qualificar e tornar digno o modo de vida dos moradores de imóveis encortiçados. O estudo da Lei a ser desenvolvido nesse trabalho de conclusão de curso, vem de encontro a uma análise que, comparada a todas as pesquisas realizadas para a sua concretização, não se viu igual além das citações ao que se estabelece na própria legislação. A elaboração de plantas e ilustrações esquemáticas, serviram para entender como na prática, as dimensões e outros requisitos mínimos, aconteceriam na realidade, em um espaço ocupado com móveis e pertences pessoais, ao mesmo tempo que são destinados à circulação, privacidade e afazeres cotidianos diversos. Segundo a Lei, as exigências mínimas de habitabilidade nos cortiços estabelecidas, se sobrepõem a qualquer outra norma aplicável, configurando-se assim, como o principal instrumento regulatório em escala Municipal. Apesar deste fato, a Lei Moura não está isenta de críticas, principalmente por estar vigente há mais de 25 anos, sem praticamente uma revisão - apesar das exigências em outras legislações ediflícias como códigos de obras, que no entanto, não se voltam especificamente para os problemas enfrentados nas HCPAs.

176


Em relação ao espaço habitado, a normativa considera o mínimo de 5m² para uma pessoa, possibilitando que para 2 pessoas, a área mínima total construída seja de 8m², ou seja, 2 metros a menos da metade do primeiro, desconsiderando questões como dimensões de estrutura, elementos de vedação, entre outros.

antes de trabalhar e antes de dormir, além do seu estado de higiene, como se percebe em alguns depoimentos de moradores dos cortiços visitados por Lúcio Kowarick (2013), e que expressam claramente o que o autor classifica de “humilhação, promiscuidade e subalternidade”: “PLACA NA PORTA DO BANHEIRO: 5 minutos” (KOWARICK, 2013, p.56).

Uma das principais características dos cortiços, o compartilhamento de instalações sanitárias dos imóveis, é reforçado pela Lei, que exige o mínimo de 1 conjunto sanitário e 1 tanque, para cada 20 pessoas. Questiona-se nesse caso, e é visível no registro do fotógrafo Fábio Knoll (Figura 45) durante as visitas in loco realizadas no PAC, que as condições desses espaços tendem ser as mais precárias, configurando como uma das principais reclamações dos moradores de cortiços, tanto pela fila de espera que tende a se “amontoar”

1

• Área mínima da Uh: Não inferior a 5m², com uma dimensão menor não inferior a 2m. Adensamento máximo: 1 pessoa. • Para o adensamento de 2 pessoas, mínimo de 8m² considerando toda a área construída da edificação.

177

[...] “Viver em um cortiço significa falta de privacidade, filas nos banheiros, espaço diminuto, brigas, bebedeiras, algazarras. Tudo se condensa na palavra ‘confusão’. Confusão significa desordem, falta de controle, falta de respeito, processos que levam ao desarranjo na vida cotidiana: [...] ‘Moro em cortiço porque não dá pra morar em outro lugar. A gente tem até vergonha de morar em lugar muito pobre, tem gente que tem até vergonha de chamar alguém para vir na sua casa: tem os banheiros.” (Ibid, p.69).

2

• 1 Conjunto de pia, vaso sanitário e chuveiro, para cada 20 pessoas. • Banheiro revestido até 2m de altura. • 1 Tanque para cada 20 pessoas.


O pé direito dos cortiços também são um dos principais agravantes desse tipo de habitação. Espaços onde geralmente se cozinha, dorme e convive, e onde facilmente pela precariedade dos acabamentos de pisos e paredes, e a falta de ventilação, tornam-se insalubres. As moradias em porões, aonde é mais fácil encontrar um pé direito insuficiente, é a mais precária, “são imundos, mal iluminados, sem ventilação e janela externa: a sensação é de abafamento e sufocação” (Ibid, p.57). As definições mínimas por Lei quanto à altura do pé direito, iluminação e ventilação, visam acabar com problemas como esse; já a circulação exigida, ainda era anterior a ABNT NBR 9050 (2015), sobre acessibilidade, e considera como mínimo para circulação de cadeirantes, 90 centímetros.

3

Para efeitos da Lei, a Prefeitura se julga responsável pela fiscalização e tomada das medidas necessárias para que as exigências citadas sejam cumpridas, culpando e cobrando daqueles que se identificarem como “proprietário, o locatário-sublocador, terceiros que tomem o lugar destes e/ou o responsável pela exploração do cortiço” (Art. 2 da Lei nº 10.928/1991). Sabe-se na prática, através do Relatório da Experiência em Cortiços de São Paulo realizado por Antonio López (2010), que houveram casos de sucesso na aplicação da Lei Moura, entre 2005 e 2010, período de vigência do PAC. Apesar desse fato, se faz necessária uma análise dos parâmetros mínimos exigidos, já que o sucesso ou não das medidas aplicadas, dependem de cada caso.

4

• Pé direito mínimo de 2.30m.

• Iluminação = 1/7 da área de piso.

• Circulação mínima de 80 cm.

• Ventilação = 1/2 da área da Iluminação.

FIGURA 117: Figuras ilustrativas de etapas para elaboração da metodologia de trabalho Imagens: Reprodução “The Noun Project”

178


Em continuidade aos estudos, foram geradas duas plantas conforme a configuração mínima da Lei: 5m² para uma pessoa, e 8m² para duas pessoas, ambos com a menor medida de 2m41.

• UH 5m² (2x2,50m)

A partir da inserção de móveis, no geral, tamanho padrão de mercado (considerando que os móveis planejados seriam financeiramente inviáveis), pode-se fazer uma relação dos espaços disponíveis tanto entre os móveis, quanto para circulação, ficando em alguns casos, menor do que os 80cm exigidos pela Lei. A setorização de cada um dos modelos de UHs, confirma o que tem sido descrito até o momento em relação a um espaço multifuncional, onde as dinâmicas cotidianas acontecem sem delimitações físicas, determinadas unicamente pela localização e função de cada um dos móveis: fogão e geladeira, para cozinhar; cama para dormir (as vezes até para refeições); mesa (quando há espaço), para refeições e apoio de afazeres. Pode-se dizer que é um espaço que não oferece refúgio, onde todas as emoções e sensações acontecem entre quatro paredes, no sentido literal da expressão. Características semelhantes a essas, tem sido cada vez mais presentes na nova aposta do mercado imobiliário: os apartamentos Studios. Seriam esses uma “gourmetização” dos cortiços? Espaços reduzidos (menos de 30m²), multifuncionais, e por que não um comércio igualmente especulativo e rentável? Fica a questão para ser refletida, e como uma possível extensão desse trabalho.

41. As dimensões e quantidades das aberturas (portas e janelas), também levaram em conta as exigências mínimas da Lei.

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5m² (2x2.50m) Máx. 1 pessoa


Descansar Tarefas diĂĄrias Cozinhar Circular

FIGURA 118: Figuras ilustrativas do estudo de parâmetros da Lei Moura. Autoral, 2019.

180


• UH 8m² (2x4m)

8m² (2x4m) Máx. 2 pessoas

FIGURA 119: Figuras ilustrativas do estudo de parâmetros da Lei Moura. Autoral, 2019.

181


• UH 8m² (3,20x2,50m)

8m² (3.20x2.50m) Máx. 2 pessoas

Descansar Tarefas diárias Cozinhar Circular 182


7. REFERÊNCIAS PROJETUAIS Sobre o “Evitar” e o “Seguir”

FIGURA 120: Análise de Sequência Fibonacci e Modulor: Instrumentos de estudos do arquiteto Le Corbusier, para configuração das unidades habitacionais em Marselha, França, em meados do séc. XX.

183


184


7. REFERÊNCIAS PROJETUAIS 7.1 SOBRE O “EVITAR” - “CASAS-CAIXÃO” EM HONG KONG, CHINA

Também conhecidos como “cubículos”, as “casas-caixão”, são um tipo de moradia precária de aluguel em Hong Kong, que se assemelha em muito aos cortiços existentes na cidade de São Paulo: uma alternativa à rua às classes pobres. Em cenários tristes e humilhantes, a cidade de paisagem verticalizada, com pouco espaço livre para novas construções e mercado imobiliário especulativo, esconde atrás das paredes dos altos prédios, longe do glamour do seu centro financeiro, apartamentos subdivididos ilegalmente, e que dão lugar à inúmeras histórias de vida (lutas, sofrimento, e muito trabalho), que se cruzam desmotivadas pelo meio em que vivem. Tal como os cortiços, as dimensões mínimas do que se chama de habitação, em torno de 4,5m² (até 30m²), multiplicam-se verticalmente pelo território, por aproximadamente 200 mil famílias, sendo 40 mil crianças, onde muitas das vezes mal se consegue ficar de pé42. Um comércio rentável para quem se aproveita do espaço considerável de um apartamento, frente a grande demanda por moradia, proprietários dividem e alugam cômodos, onde se acomodam inúmeras beliches, custando o que seria aqui no Brasil, quase o valor de um salário mínimo43.

42. “A vida nos ‘cubículos-caixões’ de Hong Kong, por Sarah Stacke. Disponível em:<DIsponível em:< https:// www.nationalgeographicbrasil.com/fotografia/2017/08/ cubiculos-caixao-casa-apertada-caixotes-hong-kongchina>. Acesso em: janeiro, 2019.

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Tanto lá quanto aqui no Brasil, são problemas vizinhos e ao mesmo tempo invisíveis aos olhos da maioria, camuflados pela paisagem de prosperidade econômica - de poucos -, e que custamos a perceber, a tentar encontrar soluções para resolver. As “casas-caixão”, tão sufocantes quanto os porões de cortiços, são reflexos da tamanha perversidade imobiliária, e que se abomina nesse trabalho. São condições subnormais, e que com muito custo se acredita na sua veracidade por tamanha promiscuidade e injustiça social. No caso de Hong Kong, Benny Lam, um fotógrafo local, transforma a fotografia em um instrumento de denúncia, com o objetivo de mostrar condições precárias de habitabilidade na região, em uma série intitulada “Encurralado”. “Vocês podem se perguntar por que deveríamos nos importar, já que essas pessoas não são parte de nossas vidas. [...] Elas são exatamente as pessoas que entram em nossas vidas todos os dias: estão os servindo como garçons nos restaurantes onde vocês comem, são os seguranças nos shoppings onde vocês perambulam, ou faxineiros e entregadores nas ruas onde vocês trafegam. A única diferença entre nós e eles é a moradia. Isso é uma questão de dignidade humana.”, relatou Benny em uma rede social.

43. Os aluguéis de cada beliche, ou caixotes, custam cerca de HK$ 2000, mais de R$ 800,00. O salário mínimo até a finalização desse trabalho (11/2019), é de R$ 998,00.


FIGURA 121 e 122: Registros fotográficos de Benny Lam, durante sua série “Encurralado”. Fonte: National Geographic. DIsponível em:< https://www.nationalgeographicbrasil.com/fotografia/2017/08/cubiculoscaixao-casa-apertada-caixotes-hong-kong-china>. Acesso em: janeiro, 2019.

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FIGURA 123, 124 e 125: Registros fotográficos de Benny Lam, durante sua série “Encurralado”. Fonte: National Geographic. DIsponível em:< https://www.nationalgeographicbrasil.com/fotografia/2017/08/cubiculoscaixao-casa-apertada-caixotes-hong-kong-china>. Acesso em: janeiro, 2019.

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7.2 SOBRE O “SEGUIR” - UNITE D’ HABITACION - LE CORBUSIER

O projeto “Unite d’ habitacion”, em português livre “Unidade de habitação” de Marselha, França, construído em 1952, é um dos mais emblemáticos do arquiteto francês Le Corbusier, tanto pelo porte da construção, quanto pelas soluções de planta adotadas para as habitações. Projetado para suprir o déficit habitacional que afetou em grande escala a Europa após a Segunda Guerra Mundial, o conjunto de habitação coletiva de alta densidade, foi o primeiro do arquiteto com um programa voltado para a vida comunitária, onde os espaços comuns deveriam ser compartilhados por cerca de 1.600 moradores. Com 18 andares, 165m de comprimento e 56 de altura, a “Cidade Radieuse” elevada por pilotis, oferece em seu terraço, opções de lazer e compras, com comércios, piscina, um ginário, pista de corrida e creche, além de um hotel com acomodações distribuídas ao longo do projeto. Em estilo brutalista, e volumetricamente inspirada em um navio a vapor, na edificação estão visíveis os 5 pontos da arquitetura defendidos pelo arquiteto. São eles: fachada livre, janelas em fita, pilotis, terraço jardim e planta livre. Já para a concepção interna das unidades FIGURA 126: Vista aérea da Unidade de Habitação de Marselha, na França. Disponível em: Archdaily. Abrill 10, 2012.

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habitacionais, Le Corbusier adotou uma abordagem até então inovadora, onde a racionalização do espaço44, foi um produto de análises das proporções humanas através do sistema de “Modulor”, somadas às análises de operações matemáticas segundo as sequências de Fibonacci. As fileiras de habitações localizadas nas extremidades ao longo do edifício conectadas por meio de um corredor central; e com volumes interligados por andares e pavimentos de pédireito alto, possibilitou ao arquiteto explorar questões como ventilação cruzada, que flui por toda a residência.

FIGURA 128: Desenho de implantação. Disponível em: Archdaily. Março 14, 2016.

A Unite d’ habitacion é um exemplo de projeto de habitação coletiva, onde principalmente as necessidades do habitar do homem, independente da época em que se vive, foram tomadas como partidos projetual, assim como deveria ser em todos os projetos destinados a um usuário.

UH-A

UH-B

Circulação

FIGURA 127: Corte esquemático mostrando a conexão de pavimentos de unidades habitacionais, a fim de se aproveitar melhor o espaço disponível. Disponível em: archidialog.com. Novembro de 2011. Edição: Autoral.

FIGURA 129: Implantação do projeto, esquemático, respectivamente. Disponíveis em: Archdaily. Março 14, 2016. Edição: Autoral.

e

corte

44. Entende-se aqui o termo “racionalização” como planejamento das habitações, de acordo com as funções básicas a serem realizadas pelos seus futuros moradores.

190


7.3 SOBRE O “SEGUIR” - HABITAÇÃO SOCIAL + TURISMO EM HAVANA, CUBA

Como consequência política, após a revolução de 1959 liderada por Fidel Castro, os moradores do Centro Histórico começaram a ver a arquitetura da capital Havana ruir ao longo dos anos, em consequência à troca de foco do governo na região para às áreas agrícolas. Tendo em vista esse problema, tanto em relação ao déficit habitacional local quanto a todo patrimônio arquitetônico e um crescente potencial turístico de Cuba, o arquiteto Iwo Borkowicz em 2016, foi destaque entre os três primeiros colocados no “Prêmio de Arquitetura de Jovens Talentos de 2016”, com uma proposta de revitalizar esses imóveis abandonados, suprir a demanda por habitação, e incentivar um desenvolvimento sustentável da região. “De acordo com um estudo de 2010, o país carecia de cerca de 500 mil unidades de habitação para satisfazer adequadamente as necessidades da população, mas devido ao colapso dos edifícios, este número é estimado entre 600.000 e 1 milhão. Só Havana tem mais de 100.000 pessoas sem um apartamento para morar. Em outras palavras, habitação adequada está no alto da lista das necessidades do povo cubano.” (ZILLIACUS, 2017). FIGURA 130: Vista aérea de Havana, e delimitação da área de estudo de Iwo (Figura 132) para caracterização de seu objeto de intervenção. Fonte: Archdaily, 6 Janeiro, 2017.

191

O ambicioso plano, desenvolvido com base nas suas próprias experiências locais com viagens,


PEQUENO

Protótipo 3 Protótipo 5

MÉDIO

Protótipo 4

GRANDE

FIGURA 131: Diagrama de investição do arquiteto quanto ao porte dos imóveis de intervenção. Fonte: Archdaily, 6 Janeiro, 2017.

pesquisas de mercado e demanda turística para o aluguel de acomodações, o arquiteto aproximando-se da escala da cidade a partir da análise de 12 quadras, propõe 6 protótipos habitacionais para intervenção. São eles: • Protótipos 1 e 3: projetados para terrenos com edificações existentes de até um andar, em condições precárias, sem a possibilidade de reutilização de partes da estrutura, ou seja, uma intervenção a partir da etapa zero; • Protótipo 2: em condições de existência Protótipo 1 semelhantes aos casos 1 e 3, mas que possibilitam o uso de sua volumetria Protótipo 2 existente mais um anexo projetado; • Protótipo 4: Lotes vazios de esquina, parcialmente construídos, sendo necessária também uma intervenção do zero; • Protótipo 5: Lotes de meio de quadra Protótipos que confrontam os limites de fundo e Terrenos vagos conectam às ruas paralelas; Edifícios de 1 • Protótipo 6: Módulos destinados ao uso andar de serviços e/ou comercial, para pequenas empresas.

FIGURA 132: Diagrama ilustrando as tipologias de protótipos encontradas a partir das investigações do Arquiteto Iwo Borkowicz aos imóveis do entorno. Fonte: Archdaily, 6 Janeiro, 2017.

192


FIGURA 133: Programa distribuído ao longo do térreo e dos 4 pavimentos do Protótipo 1. Fonte: Archdaily, 6 Janeiro, 2017.

Coletivo Habitação Acomodações Turismo Comércio Acesso Público

Toda estrutura, infraestrutura e materialidade dos protótipos, foram desenvolvidas de modo a terem como partido as condições climáticas e a cultura local. O programa do projeto, permite que se criem espaços de acesso público e privado, combinando áreas de uso coletivo, habitação e acomodações destinadas a locação turística, e fonte de renda aos próprios moradores, contribuindo financeiramente ao pagamento do financiamento de cada unidade habitacional, com a quitação prevista segundo o arquiteto, em até 10 anos. Cada um dos edifícios é isoladamente concebidos de um tecido urbano, possibilitando a adaptação de cada uma das propostas, conforme seja sua aplicação nos casos reais citados anteriormente. Uma das principais preocupações de Iwo com sua proposta, além de sanar o déficit habitacional e a demanda turística local por acomodações, é a flexibilidade da configuração de cada residência, preocupado em manter todas as fachadas voltadas para pátios centrais ou secundários, para que recebam iluminação e ventilação naturais.

FIGURA 134: Uma das organizações de planta sugerida pelo arquiteto. Fonte: Archdaily, 6 Janeiro, 2017.

193


FIGURA 135: Sugestão de restauração de fachada, com a pintura a ser definida pelos próprios moradores ou cooperativa responsável. Fonte: Archdaily, 6 Janeiro, 2017.

FIGURA 136: Secção de Protótipo 1. Fonte: Archdaily, 6 Janeiro, 2017.

194


8. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO Protótipos Habitacionais

195


FIGURA 137: Mรณdulos habitacionais. Autoral, 2019.

196


8. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO 8.1 PROTÓTIPOS HABITACIONAIS

“Pretensiosa”, no primeiro momento, é como pode ser vista a proposta de intervenção desse trabalho, já que se pretende resolver - no mínimo amenizar -, um problema político, urbano, habitacional e social, que está há tanto tempo estagnada na paisagem e no cotidiano de muitos dos moradores da Cidade de São Paulo. Nesse contexto, como criar uma proposta válida não apenas para um caso específico, mas sim para uma parte considerável dos cortiços - e por que não todos - em condições de extrema precariedade? O uso de protótipos como resposta a essa questão, pareceu de imediato o melhor meio de se estudar e propor configurações projetuais que pudessem ser adaptáveis de acordo com cada situação, sem que fosse necessário em cada um dos casos, repensar uma solução do zero, tendo aqui como partido um sistema construtivo racionalizado, flexível e modular. Considerando como base para o desenvolvimento dos protótipos as três configurações de lotes definidas sob a metodologia apresentada no Capítulo 6 (5x30; 10x25; e 15x40, testada e profundidade, respectivamente), foi definida uma malha de 1x1m, tendo como

FIGURA 138: Malha e estudos de ocupação do solo. Autoral, 2019.

197

princípio o espaço mínimo necessário para uma circulação acessível, e uma margem de ocupação para outros elementos como estrutura e vedação. A partir dessa condicionantes, foram pensados de modo a estimular o percurso ao longo de todo o projeto, os eixos de circulação, e que somadas as áreas permeáveis mínimas 15% nas três situações, delimitaram os espaços disponíveis para implantação das unidades habitacionais. • LOTE 5X30M


• LOTE 10X25M

• LOTE 15X40M

198


FIGURA 139: Análise de recuos. Autoral, 2019.

ZEIS-3 RECUOS RECUOS MÍN. FRENTE FUNDO E LATERAIS

5m (c) h < 10m = NA h > 10m = 3m (d)

RECUOS ADOTADOS FRENTE

3m (c)

FUNDO E LATERAIS

1m (lateral) 2m (fundo)

GABARITO ADOT. 10m Fonte: Quadro 3 da *Lei de Zoneamento (Lei nº 16.402/16). (c) O recuo frontal será facultativo quando atendido o disposto nos artigos 67 ou 69 desta lei. (d) Os recuos laterais e de fundo para altura da edificação superior a 10m (dez metros) serão dispensados conforme disposições estabelecidas nos incisos II e III do artigo 66 desta lei.

Ainda sobre essa primeira análise, foram considerados os parâmetros urbanísticos da ZEIS3, quanto aos recuos de frente, fundos e laterais, e gabarito, considerando relatividades da própria Lei de Zoneamento (Lei nº 16.402/16), para melhor aproveitamento das áreas em questão. A adoção de um gabarito máximo de 10 metros, por exemplo, possibilita a ausência de recuos obrigatórios em alguns casos, de acordo com o artigo 66 da referida Lei. O programa projetual idealizado, foi distribuído em térreo mais três pavimentos, sob as seguintes premissas: •

Tomar como partido dos cortiços, a vida coletiva, tornando o compartilhamento de atividades, como cozinhar, integrantes aos

“Art. 66. Os recuos laterais e de fundo ficam dispensados: I - quando a altura da edificação for menor ou igual a 10m (dez metros), medida em relação ao perfil natural do terreno [...], exceto em ZDE-2, ZPI-1 e ZPI-2. II - em terrenos que tenham declividade com área igual ou

199

• • • • •

momentos de sociabilidade e lazer dos moradores; Potencializar a fachada e a relação públicoprivada do projeto, hoje pouco exploradas onde já acontecem; Produzir para consumir, produzir para render, a partir do incentivo à agricultura urbana, com práticas coletivas de cultivo; Passeio e visadas de modo a conectarem moradores e usuários do espaço, ao contexto inserido; Voltar todas as faces úteis das habitações para uma área possível de se receber ventilação e insolação; Incluir o conjunto sanitário como equipamento indispensável de uso exclusivamente independente e único a cada UH.

menor a 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) ou frente menor ou igual que 10m (dez metros).” "Art. 69. Não será exigido recuo mínimo de frente quando, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) da face de quadra em que se situa o imóvel esteja ocupada por edificações no alinhamento do logradouro [...]."


Possibilidade de fachada ativa

Circulação comum

3º PAV. Unidades Habitacionais

Circulação vertical

Sanitários

Lavanderia coletiva

Cozinha coletiva

Horta coletiva

2º PAV.

1º PAV.

TÉRREO FIGURA 140: Diagrama para estudo do programa projetual. Autoral, 2019.

Com base nos espaços disponíveis no modelo de 5x30m, obteve-se o espaço total de 4x5m (área útil de 14m² incluindo banheiro (3.54m²), mínimos para acomodação de no máximo duas pessoas, com a possibilidade de uso de divisórias internas conforme for necessário privacidade. Para estudo da funcionalidade espacial, foi estabelecido um zoneamento interno, classificado em Zonas e Margens, onde: •

As “Zonas” se caracterizam como as áreas internas, nesse caso, com no mínimo 90 cm de largura,para uso privado e adjacente a uma parede com contato exterior;

As “Margens”, representam as áreas entre as zonas, e não possuem tamanho definido, possibilitando uma flexibilidade maior para organização interna.

A aplicação de uma malha interna, possibilita uma infinidade de soluções quanto a disposição dos móveis e eletros, e a realização de funções dentro da habitação, de acordo com a necessidade de cada morador. Pensar a habitação como um suporte e não como a chave estrutural de um sistema, permitindo flexibilidade, e redução de custos com adaptações internas quando necessário, proporciona ao residente o poder de decisão, sem comprometer a essência do projeto. Segundo N. J. Habraken (2000, p. 18, em tradução livre), “apenas quando os indivíduos puderem tomar suas próprias decisões sobre a planta e o funcionamento de sua moradia, é

200


• PROTÓTIPOS

que realmente será possível dizer que sua casa é a expressão de sua identidade”. Além de proporcionar autonomia ao morador ao escolher como o interior de sua habitação corresponderá às suas necessidades, foi preciso considerar a diversidade existente na composição familiar dos residentes do projeto. Surgem assim, a partir da combinação e conexão de suportes individuais (espaço útil moradia + banheiro), mais três módulos, podendo atender famílias de 1 a 4 pessoas, no mínimo, relativos somente à compartimentação interna. Surgindo assim, plantas com 25m², 28m² e 39m². É importante também frisar, que a racionalização do espaço nessa proposta, vem de encontro ao seu melhor aproveitamento de acordo com as necessidades básicas humanas, numa certa margem de custos mais acessíveis ao público alvo de moradores de cortiços. Para cada um dos três lotes, foram testadas conexões diferentes entre os módulos habitacionais, tanto horizontal quanto verticalmente, limitando as conexões a um térreo e um pavimento + um módulo horizontal, permitindo assim, a otimização da área construída para ocupação de outras famílias. O suporte e materialidade estrutural (pensado junto à malha de 1mx1m) e de vedação do módulo, foram determinados pela necessidade de um espaço flexível, personalizável, sustentável e acessível. Além de repensar as metragens mínimas da UH por pessoa, exigidas pela Lei Moura, também foram definidas novas áreas destinadas à ventilação e iluminação de cada cômodo.

FIGURA 141: Protótipos habitacionais, possíveis combinações e plantas com ocupação sugerida. Autoral, 2019.

201

1

UH

2 UH

3 UH

BW

BW

UH

BW

UH

BW

UH


14m² Máx. 2 pessoas

28m²

25m²

202


4 UH

UH

BW

BW

UH

UH

OPÇÃO DE TÉRREO COMERCIAL

39m²

• MATERIALIDADE

a

ESTRUTURA MISTA • • • •

b

• •

203

Pilares e vigas metálicas + laje de concreto; Estrutura mais leve, rápida, e econômica (soma de fatores); Fácil adaptação de uso/desmontagem. Caixilhos metálicos

VEDAÇÃO EM SOLO CIMENTO • •

c

Solução sustentável e acessível; Opção para autoconstrução/mutirão e assistência técnica; Facilita passagem de tubulações de hidráulica e elétrica; Fácil execução e com capacidade estrutural.

COMPARTIMENTOS EM PLACAS OSB • • •

d

Material resistente e custo acessível; Evita mofo; Ideal para compartimentos flexíveis.

ILUMINAÇÃO E VENTILAÇÃO • • •

Área Social: Ilum.: 1/3 da área de piso; Vent.: 3/4 de Ilum. Quartos: Ilum.: 3/4 da área de piso; Vent.: 3/4 de Ilum. Banheiro: Ilum.: 1/8 da área de piso; Vent.: 1/2 de Ilum.


FIGURA 142: Diagrama de unidade habitacional, e perspectiva de projeto em construção. Autoral, 2019.

a

c d b 204


9. SÍTIO DE EXPERIMENTAÇÃO Rua Conde de São Joaquim, Bela Vista - SP

205


Sé FIGURA 143: DISTRITO BELA VISTA - R. CONDE DE SÃO JOAQUIM Imagem Satélite: Google Maps Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral República Consolação

Bela Vista

Liberdade

Jd. Paulista

LEGENDA Limites Sub. Sé

N

Distritos Perímetro Rua Conde de São Joaquim

Vila Mariana

206


FIGURA 144: LOTES E PERÍMETRO - RUA CONDE DE SÃO JOAQUIM Imagem Satélite: Google Maps Projeção UTM/23S. SIRGAS 2000. Elaboração: Autoral

República

Bela Vista

Liberdade

N

LEGENDA Distritos

207

Perímetro R. Conde de São Joaquim (Via e Lotes)


9. SÍTIO DE EXPERIMENTAÇÃO 9.1 A RUA CONDE DE SÃO JOAQUIM (DISTRITO BELA VISTA) 9.1.1 Histórico Localizada na Bela Vista, o distrito que concentra o maior número de imóveis encortiçados da Subprefeitura Sé (como pudemos ver no Capítulo anterior), a Rua Conde de São Joaquim possui uma privilegiado acesso tanto aos distritos lindeiros (República, Sé, Liberdade e Consolação), quanto às regiões Norte e Sul de São Paulo. Igualmente e paralela à Avenida 23 de Maio (principal eixo arterial da cidade), a R. Conde de São Joaquim teve seu traçado implantado em área de várzea do riacho Vale Itororó. Dentro do histórico de ocupação da cidade de São Paulo, durante o período de industrialização no início do século XX, vimos que essas áreas baixas, facilmente alagáveis, eram mal vistas e desvalorizadas para localizar moradia das classes mais abastadas, fosse pela falta de infraestrutura urbana na época, como, no geral, pela paisagem precária; em contraponto, essa desvalorização era o que tornava acessível a terra ou a locação de uma moradia aos trabalhadores, configurando-se principalmente nessas áreas os bairros operários. A partir da análise da Figura 145, ilustrada pelo mapa SARA Brasil de 1930, é possível perceber como as condições naturais do terreno e do entorno (topografia, corpo hídrico, etc) - refletidas até hoje -, influenciaram o início do parcelamento e a ocupação do solo na época: os maiores terrenos,

com edificações isoladas e com mais áreas livres (dimensões de fachada maiores, quase equivalente ao comprimento do terreno), estavam voltados diretamente para as vias principais, e em áreas mais elevada; já nas áreas baixas, são encontrados lotes menores e mais alongados, esses por sua vez, resididos pela classe menos favorecida socioeconomicamente, representada pelos imigrantes, e migrantes ao longo dos anos. Tais características de ocupação, atualmente ainda estão preservadas - até certo ponto - nas edificações que perduram precariamente - desde as décadas de 30/40. Ainda quanto ao seu traçado, a Rua Conde de São Joaquim está transversalmente situada ao Viaduto Jaceguai, esse que quando implantado, gerou desapropriações e demolições de alguns imóveis daquela, para viabilizar vias mais largas (os chamados “melhoramentos viários”) - vê-se aqui mais um exemplo de como o foco do Poder Público na circulação, alterou a paisagem urbana. A via (composta por 2 quarteirões), recebeu o nome de um imigrante português: Joaquim Lopes Lebre (1834-1909), que veio para o Brasil no fim da década de 40. Joaquim ficou conhecido pelos projetos que realizava em prol de comunidades, como escolas e hospitais, tendo sido nomeado como “Conde” pelo Reino de Portugal, em 1890.

208


FIGURA 145: Mapa SARA BRASIL, 1930. S/ESCALA. Fonte: GEOSAMPA, 2019. LEGENDA Limites terrenos no perímetro da R. Conde de São Joaquim

209

N


FIGURA 146: Foto aérea, 1940. S/ESCALA. Fonte: GEOSAMPA, 2019.

N

LEGENDA Limites terrenos (Ref. 1930) no perímetro da R. Conde de São Joaquim Lotes com pouco ou nenhum recuo lateral (não foram identificadas divisórias pela foto)

Lotes tipo Chácara

Edificações acrescidas em fundo de lote

O perímetro da Rua Conde de São Joaquim, já em 1930, estava praticamente loteado, com apenas alguns terrenos vazios (do qual se deduz que a maioria existente até hoje datam de anos anteriores). Localizados em área de várzea, a maioria são estreitos e profundos, influenciando diretamente na configuração interna das edificações (construções lineares - cômodos ao longo de corredores) e na disposição das construções: sem recuos, praticamente geminadas às edificações vizinhas, características que até hoje se mantém nos imóveis remanescentes. As edificações em lotes maiores localizavam-se já distantes das áreas mais baixas. Com espaços livres maiores e casas isoladas - sinônimo de salubridade -, elas geralmente pertenciam às classes mais abastadas. A partir das imagens, quanto a ocupação dos terrenos, verifica-se que os espaços livres - nos mais estreitos - se concentram no fundo dos lotes, e que serão destinados ao longo dos anos para a construção de outros cômodos, principalmente para locação e sublocação (cortiços).

210


FIGURA 147: Mapa VASP CRUZEIRO, 1954. S/ESCALA. Fonte: GEOSAMPA, 2019.

N

LEGENDA Limites terrenos no perímetro da R. Conde de São Joaquim

D

Demolido (Lote)

A

Acrescido (edificação)

M

Modificado (edificação)

U

Unificado (Lote)

C

Construído (edificação)

S

Separado (lote)

Passados mais de 20 anos em relação a data do primeiro mapa apresentado (SARA BRASIL1930, FIGURA 145), percebemos algumas alterações no parcelamento dos lotes: alguns foram demolidos, outros foram modificados - tiveram acréscimos de área construída, remembraram ou desmembraram em lotes menores, ainda sem a preocupação de recuos laterais, para o “melhor” aproveitamento dos terrenos estreitos (FIGURA 147). Saindo do séc. XX entrando no séc. XXI (FIGURA 148), as mudanças na paisagem são mais drásticas. A verticalização se intensifica: já não há mais espaço disponível que permita a construção de moradias horizontais. Assim, muitos dos imóveis e suas características arquitetônicas de épocas passadas, passam a ser substituídas por prédios, a princípio, sem nenhum valor estético ou preocupação com a dinâmica do entorno. Multiplicam-se sem personalidade, e aos poucos o histórico construído que se mantém, passa a desvalorizar-se com a falta de interesse dos proprietários em preservá-lo. O uso coletivo desses imóveis em situação precária, também contribui para a invisibilidade dos mesmos dentro da cidade e perante à sociedade.

211


FIGURA 148: Foto aérea, 2000. S/ESCALA. Fonte: GEOSAMPA, 2019.

N

LEGENDA Limites terrenos (Ref. 1930) no perímetro da R. Conde de São Joaquim Verticalização (novas construções / acréscimos / modificações)

Desapropriação (melhoramento viário)

212


FIGURA 149: Foto aérea, 2004. S/ESCALA. Fonte: GEOSAMPA, 2019. LEGENDA Limites terrenos (Ref. 1930) no perímetro da R. Conde de São Joaquim Cortiços

213

Desapropriação (melhoramento viário)

N


FIGURA 150: Foto aérea, 2019. S/ESCALA. Fonte: Google Earth, 2019.

N

LEGENDA Limites terrenos (Ref. 1930) no perímetro da R. Conde de São Joaquim Projeto Residencial CDHU (PAC)

Projeto Institucional

A Rua Conde de São Joaquim é conhecida pelos inúmeros cortiços (FIGURA 149) que nela se encontram (a boa localização - entende-se “boa” pela privilegiada oferta de infraestrutura básica e urbana -, favorece a concentração dessa tipologia de moradia coletiva no Centro de São Paulo). Tal fato - além das reivindicações de moradores e associações de luta por moradia digna -, chamou a atenção da gestão pública voltada para os programas sociais de habitação, possibilitando a partir de uma ação conjunta entre SEHAB e CDHU dentro do Programa de Atuação em Cortiços (PAC) de 2002, a elaboração de projetos visando a erradicação de moradias classificadas com altos índices de precariedade, e a regularização de outras em acordo com a Lei Moura - levantamentos realizados através de fiscalizações. Além do atendimento à demanda habitacional nesse perímetro, segundo a Prefeitura de São Paulo, o objetivo do projeto é promover a requalificação da rua, estimulando o comércio local e implantando mais áreas verdes/permeáveis, atualmente em quantidade insuficiente na região, como já vimos nesse trabalho. Adiante, veremos os 3 projetos executados e entregues aos moradores dos cortiços existentes nas áreas correspondentes e outras, como a Vila Itororó.

214


9.1.2 Levantamento da morfologia atual As características arquitetônicas, a implantação das edificações, o comprimento dos lotes, o traçado urbano no geral e entre outras questões encontradas nas construções localizadas na Rua Conde de São Joaquim, refletem muito do que pode ser encontrado em praticamente todo o distrito da Bela Vista, um dos poucos que ainda preservam tanto o seu patrimônio construído, quanto seus costumes e práticas culturais, o histórico de todas as transformações estruturais de São Paulo, de pequena província em uma moderna e grande cidade. Considerando essa importância local, tanto histórica e urbanística do bairro, o Poder Público declarou em 2002, o tombamento de seus elementos estruturais constituintes, como ruas, praças, escadarias, largos... além de imóveis isolados e conjuntos arquitetônicos, estabelecidos e identificados na Resolução nº 22/2002, sob a competência do CONPRESP. Ao longo da via, por exemplo, encontram-se listados os imóveis nº 231 e 233, classificados em Nível de Preservação 3 (NP3), o que significa a “Preservação parcial do bem tombado. Quando se tratar de imóvel deverão ser mantidas as características externas, a ambiência e a coerência com o imóvel vizinho classificado como NP1 e NP2, bem como deverá estar prevista a possibilidade

45. No caso do município de São Paulo, deverão ser previamente aprovadas pelo Departamento do Patrimônio Histórico e pelo CONPRESP, de acordo com a Lei nº 10.032/85. 46. Nível de Preservação 1 (NP1): Preservação integral do bem tombado. Quando se tratar de imóvel, todas as características arquitetônicas da edificação, externas e internas, deverão ser preservadas.

215

de recuperação das características arquitetônicas originais” (CONPRESP, 2002).

A maioria dos imóveis não tombados na Bela Vista, estão inseridos em Área Envoltória de um Bem tombado. Nesses casos, segundo o órgão municipal de preservação, reformas que impliquem na modificação da construção, seja em aumento de área, reforma ou demolição, devem passar antes pela análise do mesmo45, a fim de garantir que essas mudanças irão ocorrer de modo a condizer com esses imóveis listados em qualquer Nível de Preservação (1, 2 ou 3)46. Assim, faz-se necessário que acima do reconhecimento público, exista uma rigorosa e constante fiscalização dessas ações frente ao patrimônio, estimulando - em conjunto a conscientização da sociedade civil sobre a importância desses bens, garantindo assim uma mobilização espontânea, capaz de fiscalizar e manter a integridade do Bem, sem que haja à priori, interferências burocráticas. Com a modernização da construção civil junto às novas necessidades tanto no morar quanto no habitar, a manutenção do patrimônio construído tem encontrado mais incisivamente um obstáculo - além do próprio desinteresse dos proprietários

Nível de Preservação 2 (NP2): Preservação parcial do bem tombado. Quando se tratar de imóvel todas as características arquitetônicas externas da edificação deverão ser preservadas, existindo a possibilidade de preservação de algumas partes internas, a serem definidas na resolução.


e a “falta de recursos” do Poder Público: a especulação imobiliária. É nesse cenário que podemos perceber mais claramente, a ineficiência de normativas que não são colocadas em prática, contradizendo o que teoricamente é defendido nas inúmeras resoluções de tombamento, além dos instrumentos de apoio, como o Plano Diretor Estratégico. À ela [a especulação imobiliária] estão ameaçados tanto os elementos de interesse arquitetônico, quanto cultural, ambiental, afetivo e/ou turístico, podendo colocar abaixo em pouco tempo, um testemunho de técnicas, práticas, conhecimentos, desenvolvidos há anos, substituídas por edificações desconectadas, capazes de serem construídas em qualquer lugar por não carregarem nenhuma identidade local, perdendo-se assim o que jamais poderá ser recuperado sem cometer um falso histórico47. Um exemplo recente do que foi dito anteriormente é o caso da Vila Operária da Rua João Migliari, no bairro do Tatuapé. Construída no período de industrialização da cidade de São Paulo, abriga hoje diversas famílias de baixa renda, em uma região cada vez mais atraente aos grandes empreendimentos de uso misto (comercial + residencial), voltados para a classes média alta e alta. Na terceira semana de fevereiro desse ano (2019), foi demolida a primeira parte da Vila, sob manifestações de moradores e pessoas que reconhecem o valor histórico e a importância da sua manutenção para a dinâmica local: muitos comércios existentes nas proximidades da Vila, existem para suprir as necessidades dessas famílias, ou seja, as consequências são de uma gentrificação generalizada (CHICONI; MENDONÇA, 2019).

O projeto intitulado “Eixo Platina”, foi desenvolvido pela construtora Porte Engenharia, e estimulado pelo zoneamento local de transformação urbana (ZEU). A Vila não possui proteção por órgãos de preservação, mas nem por isso se encontrava com má conservação, até o momento ela vinha sobrevivendo sendo útil a que lhe deu um uso e lhe aferiu um sentido, que era o de habitar. A legislação existente, no entanto, não foi suficiente para recorrer da sua demolição, e a perca da memória edificada “anda em passos largos” para dar lugar a mais uma tipologia de condomínio segregador e excludente. A seguir, foram realizados estudos sobre a configuração atual do tecido urbano no perímetro imediato ao parcelamento e ocupação do solo na R. Conde de São Joaquim, considerando a mais, uma margem de 100m para cada lado a partir do eixo da via, de modo a analisar como as edificações do entorno interferem na dinâmica dos lotes de interesse nessa pesquisa, tanto sobre a sua arquitetura, quanto às questões de salubridade e aeração dos mesmos, por exemplo. Em todos os mapas foi utilizado como parâmetro o perímetro dos lotes em 1930, possibilitando que seja realizada uma comparação às modificações que ocorreram posteriormente no tecido urbano local. Além disso, foram registrados também o gabarito das edificações, os imóveis modificados pela verticalização ou pelos melhoramentos viários, e os imóveis tidos como encortiçados existentes nesse trecho, de acordo com os dados do HabitaSampa (2019).

47. Em Arquitetura, remete às construções em estilos não vigentes na época de sua edificação, ou seja, não representa em técnica e histórico, o que aparentemente representa.

216


LEGENDA N

Limite dos terrenos no perímetro da R. Conde de São Joaquim, em 1930 Cheio (área construída) Área permeável

0 20 50

100

200 m

FIGURA 151: Mapa de Cheios e Vazios Fonte: Autoral. Planta Base: GEOSAMPA, 2019.

LEGENDA Limite dos terrenos no perímetro da R. Conde de São Joaquim, em 1930 Área permeável 1 a 2 pavs. 3 a 4 pavs. N

5 pavs. 6 a 8 pavs. +8 pavs.

0 20 50

217

100

200 m

FIGURA 152: Mapa Gabarito de Altura Fonte: Autoral. Planta Base: GEOSAMPA, 2019.


LEGENDA Limite dos terrenos no perímetro da R. Conde de São Joaquim, em 1930 Área permeável

N

ZEU ZEIS-3 Cortiços

0 20 50

100

200 m

FIGURA 153: Mapa de Zoneamento Fonte: Autoral. Planta Base: GEOSAMPA, 2019.

LEGENDA Limite dos terrenos no perímetro da R. Conde de São Joaquim, em 1930 Área permeável N

Cortiços Intervenção / Demolição de cortiços Imóveis degradados / merecem atenção

0 20 50

100

200 m

FIGURA 154: Mapa de Cortiços Fonte: Autoral. Planta Base: GEOSAMPA, 2019.

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9.1.3 “Projeto de Requalificação Urbana - Bela Vista” - PAC

FIGURA 155: “Estudo para projeto de requalificação urbana - Bela Vista”, da arquiteta Katia Canova. Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012.

Os três projetos habitacionais desenvolvidos pela CDHU e arquitetos parceiros, previstos para serem entregues entre 2008 e 2009, já estão construídos e sendo habitados pelas famílias que foram realocadas, fossem de cortiços demolidos existentes anteriormente no local, ou de outras situações precárias, como a situação dos antigos moradores da Vila Itororó.

arquitetonicamente o registro histórico que as antigas construções traziam em suas fachadas, pensadas em outra época, com outras técnicas e influências, geralmente, de outras culturas, substituídas pelo “moderno” retângulo com janelas, cada vez mais vertical, pela falta de espaço em lugares adensados como é o Centro de São Paulo.

Apesar de teoricamente e praticamente (de modo simplista), sanarem a necessidade de moradia digna dessas pessoas, as edificações construídas em sua maioria do zero (exceto o Bela Vista D, como veremos a seguir), descaracterizaram

Ganha-se, no entanto, uma nova disposição dos edifícios no terreno, permitindo que a implantação conduza a um projeto salubre, diferente das condições que ainda se encontram em vários dos casarios da R. Conde de São Joaquim.

219


Seria possível preservar o histórico edificado e ao mesmo tempo inovar, atendendo as necessidades dos futuros moradores, estimulando o contato entre o espaço público e privado, em uma única construção? Poderíamos, nesse caso, classificá-lo como um Retrofit? São questões importantes que se pautam não somente nesse trabalho, mas por arquitetos, profissionais e pessoas preocupadas, que veem a cada dia que passa em São Paulo, o patrimônio histórico da cidade sendo “engolido” pela especulação imobiliária, como vem acontecendo com a Vila Operária da Rua João Migliari, no bairro do Tatuapé, Zona Norte de São Paulo (CHICONI; MENDONÇA, 2019). Entre as condições necessárias para se manter “viva” uma cidade, Jane Jacobs (2011) considera a diversidade, obtida entre outras possibilidades, através da combinação de edificações com “idades e estados de conservação variados” (ibid, p.207), considerando principalmente os mais simples, de baixo valor e até mesmo deteriorados. Acredito em partes que ela tenha razão, já que o saber e conhecer em experiências concretas (além dos livros de histórias), tem um potencial de gerar uma consciência capaz de melhorar o convívio com o patrimônio construído, mas acredito também, que em muitos casos, ou ao menos como se tem visto em São Paulo, a deterioração desses imóveis, têm influenciado outros a se manterem assim, e aos poucos sumirem da paisagem centenária da cidade. Por tanto, a diversidade tanto é indispensável, quanto é a preservação para uma cidade manter-se viva, dinâmica e saudável.

220


BELA VISTA D

FIGURA 156: Perspectiva do empreendimento Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012. NOME DO EMPREENDIMENTO Bela Vista D ENDEREÇO R. Conde de São Joaquim, 163 PROJETO Aflalo & Gasperini ANO PROJETO 2008

Desenvolvido em edificação existente, o projeto de requalificação é composto por dois blocos (A e B), com 59 apartamentos, compostos por duas tipologias: “19 unidades com um dormitório e área de 36m² e 48 apartamentos com dois dormitórios e área de 48m²”. As visadas dos apartamentos são voltadas tanto para a rua de acesso, quanto para a paralela (vista posterior - Av. 23 de Maio), ficando as laterais sem nenhuma abertura, também pela ausência de recuos laterais. Através do conteúdo coletado, não foi possível identificar a presença de espaços destinados ao desenvolvimento de atividades coletivas, nem a disponibilidade de estacionamentos. O acesso vertical é feito tanto por escadas quanto por elevadores, localizados no core da edificação. Um pequeno hall une os dois blocos e dão acesso às UHs.

FIGURA 157: Fotografia do edifício existente, antes da implentação do projeto Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012.

221


FIGURA 158: Planta pavimento tipo - Bela Vista D (s/escala) Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012.

FIGURA 159: Análise de Planta pavimento tipo - Bela Vista D (s/escala) Fonte: Autoral, 2019.

222


BELA VISTA E FIGURA 160: Vista frontal do empreendimento Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012. NOME DO EMPREENDIMENTO Bela Vista E ENDEREÇO R. Conde de São Joaquim, 85 PROJETO Ana Maria Antunes Coelho, arquiteta (CDHU) ANO PROJETO | ENTREGA 2009 | 2017

Ocupando uma área de 585m², o empreendimento Bela Vista E, entregue em 2017, foi construído no local de um cortiço de 1949 semelhante aos existentes ainda hoje na região -, de onde as famílias residentes foram realocadas para o novo projeto. Composto de 7 pavimentos, com acessos por meio de escadas em níveis diferentes, o edifício em escala mais aproximada ao do pedestre, têm 31 apartamentos e duas tipologias de unidades habitacionais: “14 unidades de 42m² com um dormitório e 17 unidades de 02 dormitórios com 60m²”. Construído em ZEIS 3, a edificação possui recuos laterais de no mínimo 2.50 m. O acesso é restrito aos moradores, controlado por uma portaria à esquerda do acesso principal. Também dispõe de vaga de estacionamento, incluindo uma específica para PNE (Portadores de Necessidades Especiais).

FIGURA 161: Fotografia do edifício encortiçado existente, antes da implentação do projeto Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012.

A circulação vertical acontece no centro do projeto, organizando as UHs ao redor de um espaço comum aos moradores. No térreo (nível da R. Conde de São Joaquim), há espaços destinados ao convívio coletivo, como área para realização de eventos.

FIGURA 162: Análise da fachada - Bela Vista E Fonte: Autoral, 2019.

223


FIGURA 163: Análise da implantação Bela Vista E Fonte: Autoral, 2019.

FIGURA 164: Planta - Bela Vista E Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012.

FIGURA 165: Análise da planta - Bela Vista E Fonte: Autoral, 2019.

224


BELA VISTA G Beneficiando 104 famílias, o empreendimento residencial Bela Vista G, foi construído (tal como o Bela Vista E), no lugar de um cortiço com construções muito precárias, como pode ser observado na Figura 167.

FIGURA 166: Foto do empreendimento construído Fotografia Autoral, 30 de março de 2019. NOME DO EMPREENDIMENTO Bela Vista G ENDEREÇO R. Conde de São Joaquim, 140 PROJETO Luiz Gustavo Della Noce e Alberto Bunduki, arquitetos (CDHU) ANO PROJETO | ENTREGA 2009 | 2017

Composto por 2 torres de 15 andares com acessos independentes e condomínio de acesso restrito aos moradores, possui 26 apartamentos com 69,24m² e 1 dormitório; 52 com 105m² e 2 dormitórios; e 26 com 112,93m² e 3 dormitórios; oferecendo também unidades habitacionais adaptadas para PNEs. As unidades foram destinadas tanto aos antigos moradores do cortiço demolido, quanto ao público em geral, sendo que 78 das habitações são exclusivamente de interesse social, segundo a Prefeitura; e as demais voltadas para a habitação de mercado popular (HMP), que compreendem famílias com até 10 salários mínimos. A implantação do projeto conta com espaços para o desenvolvimento de atividades coletivas e de lazer, com áreas permeáveis. A circulação vertical é feita tanto por escadas quanto por elevadores; e as visadas dos apartamentos acontecem em todas as fachadas. Dentre os projetos, esse é o que apresenta uma inclinação melhor na preocupação da qualidade de vida através da configuração dos espaços, apesar de se assemelhar aos demais, pela falta de conexão com a dinâmica da rua, isolando as práticas sociais dentro do condomínio e reforçando, apesar das tentativas, o caráter individual. FIGURA 167: Fotografia da área encortiçada existente, antes da implantação do projeto Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012.

225


FIGURA 168: Planta com indicação de UH acessíveis (PNE) - Bela Vista G Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012.

FIGURA 170: Planta da implantação Bela Vista G Fonte: Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços CDHU - PAC, 2012.

FIGURA 169: Análise da Planta - Bela Vista G Fonte: Autoral, 2019.

FIGURA 171: Análise da Planta - Bela Vista G Fonte: Autoral, 2019.

226


9.2 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO: A PERDA DE IDENTIDADE

A partir da análise dos mapas e da sucessão de transformações espaciais ao longo do tempo, foi possível perceber que o tecido urbano na região da Rua Conde de São Joaquim, sofreu alterações pontuais, sendo as mais visíveis e significativas, a criação de grandes eixos viários (configurando barreiras urbanas) e a verticalização de edificações, modificando consequentemente o parcelamento do solo. No geral, os limites dos lotes desde 1930, encontram-se ainda hoje, onde são perceptíveis da construção inicial, a ausência de recuos laterais, imóveis predominantemente estreitos e profundos, além do baixo gabarito (1 a 2 pavimentos). Condicionada pela localização e sua característica geomorfológica (em área de várzea), a ocupação ao longo da via no decorrer dos anos, se manteve. A predominância de cortiços caracterizados pelas condições de vulnerabilidade social -, foi a principal condicionante na definição do Zoneamento (Lei nº 16.402/16) em metade do perímetro ocupado na Rua Conde de São Joaquim, classificado como ZEIS, o que teoricamente garante a permanência das famílias de baixa renda residentes na região, apesar das transformações urbanas. No entanto, os outros 50%, estão situados em ZEU, uma Zona de Estruturação Urbana, onde a qualquer momento o patrimônio construído

227

datado no geral, do século XX e suas marcas do tempo (elementos arquitetônicos do estilo neoclássico/eclético) nas fachadas dos pequenos imóveis, estão ameaçadas a desaparecer. Com base nesse rico e, ao mesmo tempo, precário contexto urbano, a Prefeitura de São Paulo, a partir do Programa de Atuação em Cortiços (PAC), desenvolveu projetos com o intuito de incentivar a valorização da região, por meio da construção de novos empreendimentos residenciais, em substituição às moradias classificadas como extremamente precárias. Apesar de servirem basicamente ao que se pretende, que é a garantia da moradia digna, os três projetos propostos e construídos pela CDHU, analisados nesse trabalho, reproduzem o mesmo modelo de conjunto habitacional, sem nenhuma relação com o patrimônio do entorno (principalmente por estarem em AE - Área Envoltória de um patrimônio tombado). Perde-se assim, consequentemente, a continuidade entre as relações sociais desenvolvidas na esfera pública e privada, onde essa última, passará a desenvolver-se entre muros, em áreas de lazer restritas aos moradores. Tenta-se manter a ideia de espaços coletivos, mas se negam à rua, no momento que as unidades habitacionais


são isoladas do tecido urbano. Longe do que pode parecer uma espécie de culto à promiscuidade dos cortiços, o que se defende aqui é reflexão sobre o valor que têm o desenvolvimento de atividades e o uso dos espaços em coletividade, tanto para a manutenção das relações entre os moradores, quanto para a segurança e preservação do entorno, de onde se busca em essência, promover a qualidade habitacional em sua totalidade. Há exemplos projetuais que foram colocados em prática, que comprovam a importância de se cultivar a interação interpessoal. Na apresentação desse trabalho, serão acrescentados à explicação, análise de dois dos imóveis encortiçados existentes hoje ao longo da R. Conde de São Joaquim, possibilitando ampliar a análise dos detalhes construtivos e particularidades de cada um, e a importância de preservá-los para manter tanto o histórico da cidade, quanto a diversidade da paisagem urbana. E por fim, como uma das respostas às indagações feitas ao longo deste trabalho, o projeto final, apresentando possibilidades aplicáveis para a garantia da moradia digna à população de baixa renda, qualificando os espaços internos e estimulando as relações público-privadas com a edificação-entorno.

228


229


10. INTERVENÇÃO IMÓVEIS ESCOLHIDOS/ÁREA DE INTERVENÇÃO E PROJETO

FIGURA 172: Ampliação parcial de uma das fachadas de intervenção. Fonte: Autoral, 2019

230


10. INTERVENÇÃO 10.1 IMÓVEIS ESCOLHIDOS

Além da escolha de um local para implantação dos protótipos e de toda metodologia projetual desenvolvida até o momento, um dos maiores desafios previstos desde o início desse trabalho, era a sua aplicação em um imóvel existente, com suas condições reais de implantação, topografia, e arquitetura, somada a responsabilidade de lidar com edificações datadas do século passado, com suas peculiaridades construtivas, carregadas de valor histórico e patrimonial para a cidade da São Paulo. Outra questão muito importante, seria como lidar com os moradores, já pressionados pela realidade vivida nos cortiços - retratada ao longo dessa pesquisa -, e de fazê-los pertencentes a um local, que por intermédio de um projeto urbanoarquitetônico (não se separam), pudessem se sentir abraçados, em casa. Na prática, tive a sorte de conseguir junto ao Arquivo Geral da Prefeitura, acesso a processos administrativos antigos, que continham alguns desenhos técnicos - necessários para aprovação da construção dos imóveis - realizados a mão pelos arquitetos/engenheiros responsáveis pelo projeto de dois imóveis localizados na R. Conde de São Joaquim, ambos vizinhos e pertencentes a um mesmo proprietário; fatores determinantes

231

para a definição do local de intervenção, agora, já na escala do pedestre. Construídos em meados do século XX, ao visualizar os imóveis da rua, percebe-se a preocupação com a simetria e harmonia de sua composição, através de elementos característicos da arquitetura eclética, como o uso de frontões, pilastras, ornamentos e avanços de beirais, hoje sobreviventes às intervenções realizadas ao longo de sua ocupação, pixações, no geral, à falta de manutenção. Ainda que não sejam tombados pela legislação municipal, os imóveis 121/3/7/9 e 133/5/7 (dois imóveis e tantas numerações), estão dentro de área envoltória, o que significa que a manutenção de suas características arquitetônicas é - deveria ser - importante para que se conte a história do desenvolvimento local, de seu povo, cultura e costumes. A beleza que ainda se preserva nesses imóveis e chama a atenção de quem passa pela rua, no entanto, é atribuída a um outro contexto quando analisados de outros ângulos, principalmente pelo o que representa a seus habitantes, ou seja, uma realidade camuflada pela “ordem clássica” das fachadas.


• RUA CONDE DE SÃO JOAQUIM |121 123 127 129

ANO DE CONSTRUÇÃO

1944

ÁREA CONSTRUÍDA

650m²

ZONEAMENTO

ZEIS-3

CLASSIFICAÇÃO

GRANDE PORTE

VISTORIA RECENTE (PAC)

28-10-2015

ÍNDICE DE VR

0,38

TESTADA | PROF. DO LOTE 10m | 25,40m AE (RES. SC 12/84 SO CONDEPHAAT)

TOMBAMENTO

Dados: HabitaSampa, 2019.

• RUA CONDE DE SÃO JOAQUIM | 133 135 137

ANO DE CONSTRUÇÃO

1949

ÁREA CONSTRUÍDA

650m²

ZONEAMENTO

ZEIS-3

CLASSIFICAÇÃO

MÉDIO PORTE

VISTORIA RECENTE (PAC)

28-10-2015

ÍNDICE DE VR

0,66

TESTADA | PROF. DO LOTE 9,40 m | 24,26 m MORADORES | CÔMODOS 18; 14; 18 | 8; 6 ; 7 TOMBAMENTO FIGURAS 173 e 174: Imagens da fachada dos imóveis escolhidos para aplicação da metodologia com protótipos. Fonte: Google Street View, 2018.

AE (RES. SC 12/84 SO CONDEPHAAT) Dados: HabitaSampa, 2019.

232


Mas o que se quer dizer com “desordem”? Nesse caso, a desordem representa o desencontro entre as dinâmicas que aconteceram e as que acontecem atualmente nesses imóveis, para um espaço que precisou ser reorganizado, e não repensando, para abrigar uma determinada demanda por moradia para qual não foram planejados. Ao analisar imagens do lado posterior dos lotes, é possível ver parte dessa “desordem” que uma ocupação forçada de uma edificação gera tanto aos moradores quanto a sua própria estrutura. Não se pôde saber ao certo por meio dos documentos antigos acessados, como se deu a ocupação desses dois imóveis nos primeiros anos após construção, e nem quando começaram a ter seus cômodos alugados, até o ponto de serem classificados como cortiços. Mas supõem-se pela configuração das plantas, que a intenção do proprietário era de destiná-los à moradia de duas ou mais famílias, fossem parentes ou não. Veremos nas próximas páginas o redesenho autoral das plantas e demais desenhos originais, necessário para melhor compreensão da configuração e escala dos espaços de intervenção. Nesse processo em alguns casos, nem todas as medidas ou representações gráficas foram espressas devido a dificuldade de interpretação dos desenhos originais, e que por vezes além de confusos, pareciam estarem equivocados com as demais plantas do processo. As cotas existentes nesses desenhos foram as medidas mais exatas possíveis para a realização do redesenho, já que o Arquivo Geral de Processos não dispunha de escaner, o que ajudaria a para manter a escala dos mesmos na imagem.

FIGURAS 175 e 176: Imagens da fachada dos imóveis escolhidos para aplicação da metodologia com protótipos. Fonte: Google Street View, 2018.

233

FIGURA 177: Fragmento de desenho original da fachada do imóvel 121, datado de 1930. Fonte: Fotografia autoral, documento do Arquivo Geral de Processos.


234


10.1.1 IMÓVEL ENCORTIÇADO 121 123 127 129 (R. CONDE DE SÃO JOAQUIM, BELA VISTA - SP)

FIGURAS 178 e 179: Redesenho autoral do projeto original da fachada (fotografia ao lado - projeto disponível em um processo administrativo do ano de 1930, arquivado pela Prefeitura de São Paulo). Fonte: Autoral; e fotografia do arquivo pessoal, de um documento público em posse do Arquivo Geral de Processos.

235


236


-7.49

-7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 -7.49 -7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 Porão 3

Porão 3

-7Po.4rã9o 3

-4.34

Porão 2

PLANTA 3º SUBSOLO Redesenho autoral, 2019.

237

PLANTA 2º SUBSOLO Redesenho autoral, 2019.


238


1

2

3

4

5

6

A

B

C

-7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 -7.49 -7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 Porão 3

-7Po.4rã9o 3

D

E

+1.96

Piso Intermediário

F

-1.19

Porão 1

+0.10

Térreo

G +0.00

Calçada

PLANTA 1º SUBSOLO Redesenho autoral, 2019.

239

PLANTA TÉRREO E PISO INTERMEDIÁRIO Redesenho autoral, 2019.


-7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 -7.49 -7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 Porão 3

-7Po.4rã9o 3

+7.81

Pav Superior 2

+5.16

Pav Superior 1

PLANTA 1º PAV. SUPERIOR Redesenho autoral, 2019.

PLANTA 2º PAV. SUPERIOR Redesenho autoral, 2019.

240


241


-7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 -7.49 -7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 Porão 3

-7Po.4rã9o 3

+11.00

Cobertura

PLANTA COBERTURA Redesenho autoral, 2019.

242


1

2

3

4

5

6

7

8

PNT

CORTE AA Redesenho autoral, 2019.

243


10.1.2 IMÓVEL ENCORTIÇADO 133 135 137 (R. CONDE DE SÃO JOAQUIM, BELA VISTA - SP)

FIGURA 180: Reprodução da fachada em seu estado atual, com as intervenções posteriores à sua construção, já que o desenho original encontrado no processo administrativo, não corresponde ao atual, como se vê na página seguinte. Fonte: Autoral, 2019.

244


245


246


1

2

3 4

A

15

6 27

3 48

5

6 7

8

A -4.55

Porão 2

B

B -1.90

Porão 1

-4.55

Porão 2

-4.55

Porão 2

C -7.49 -7.49 Porão 3

Porão 3 -7.49 -7.49 Porão 3

C

Porão 3

-7Po.4rã9o 3

D

Planta 2º Subsolo Redesenho autoral, 2019.

247

D

E

E

F

F

G

G

Planta 1º Subsolo Redesenho autoral, 2019.

-1.90

Porão 1


-7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 -7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3

-7Po.4rã9o 3

+1.25

Piso intermediário

+1.25

Piso intermediário

+1.25

Piso intermediário

+4.40

Piso Superior

0.00

Calçada

+4.40

Piso Superior

0.00

Calçada

0.00

Calçada

Planta Térreo e Piso Intermediário Redesenho autoral, 2019.

Planta PAv. Superior Redesenho autoral, 2019.

248


1

1

PNT

2

2

3

3

4

4

5

6

5

6

7

78

8

PNT

CORTE AA Redesenho autoral, 2019.

249


Vista com lotes lindeiros, e projeto original do imóvel 121. Desenho autoral com dimensões aproximadas, 2019.

BAR & PENSÃO DOS AMIGOS

Vista com lotes lindeiros, e representação o estado atual do imóvel 121. Desenho autoral com dimensões aproximadas, 2019.

BAR & PENSÃO DOS AMIGOS

250


10.2 PROJETO: APLICAÇÃO DA METODOLOGIA EM CASO REAL

Após esse extenso estudo, é chegado o momento onde a metodologia de projeto deverá ser adaptada a um caso real de imóvel encortiçado em condições precárias, na cidade de São Paulo, mais especificamente, na R. Conde de São Joaquim, Bela Vista, configurando um local representativo experimental à aplicação dos protótipos habitacionais desenvolvidos48. Para as primeiras definições projetuais, tomouse como partido a implantação das construções existentes, de modo a investigar a possibilidade de reutilização da estrutura, sobre a expectativa de redução das cargas do projeto, adotando uma nova estrutura, de materialidade mais leve, como é o caso da metálica, além da extinção de um único bloco maciço sobre a fundação, de modo a distribuir as cagas por toda a área de intervenção. Assim, traçou-se em planta, os limites dos patamares na topografia e a localização dos eixos estruturais, e depois, se sobrepôs a malha de 1mx1m, para auxiliar na configuração dos espaços destinados a circulação, ventilação, e a todo o programa proposto: áreas externas comuns, espaço para comércio/serviço, equipamentos de uso coletivo, como cozinha, hortas e lavanderia, além das próprias unidades habitacionais.

48. Por ser uma área representativa, os estudos locais não foram aprofundados, já que nesse trabalho a intervenção com protótipos tem como objetivo o impacto positivo de sua aplicação em escala urbana, ou seja, adaptável a cada situação e contexto de inserção.

251

A materialidade projetual (estrutura, vedação, cores, caixilhos, etc.) foi basicamente pré determinada pelas seguintes condicionantes: • • • •

Facilidade de uso e confecção em caso de construção em regime de mutirão e assistência técnica; Custo, resistência e manutenção; Sustentabilidade (geração e reciclagem de resíduos); Adaptabilidade às dinâmicas da cidade e à diversidade dos moradores de habitações coletivas, flexibilizando os espaços e possíveis mudanças de uso no futuro; Distinção entre os materiais já aplicados nas construções anteriores, a fim de se evitar um falso histórico, deixando perceptível a intervenção posterior.

A escolha por um átrio no projeto, entorno do qual se organizam as UHs, retomam uma das configurações mais comuns dos cortiços de pátio, e representa tanto uma solução construtiva, de modo a aproveitar as condições locais de ventilação e insolação, quanto simbólica, já que a importância de definir um ponto visual comum aos moradores, geram a sensação de unidade e de direitos iguais, quando todos compartilham das


dinâmicas cotidianas: da janela da cozinha ou do quarto, podem se observar as crianças brincando no pátio, ou até mesmo as roupas secando no varal, enquanto a previsão de chuva ainda não acerta. De modo a exaltar e tentar explorar da melhor forma os benefícios da vida em comunidade, procurou-se manter e propor espaços onde atividades pudessem ser realizadas em conjunto, e que gerassem de algum modo, um produto a ser compartilhado por todos ou pela maioria, sem que a privacidade e as necessidades básicas de cada um fossem comprometidas (principal questionamentos dos moradores de cortiços). Assim, ainda que o programa ofereça uma cozinha coletiva, o morador tem a opção de fazer suas próprias refeições diárias em sua residência, tornando assim o ato de cozinhar coletivamente, mais um meio de se socializar e entreter com os vizinhos, estabelecendo laços de amizade e confiança, tidos como raros e importantes na superação de eventuais problemas pessoais ou decisões coletivas. A horta, sugerida no terraço do projeto para melhor aproveitamento das condições climáticas, torna-se um produto tanto para consumo próprio, como uma possibilidade de agregar a renda dos moradores, dependendo de como for acordado entre eles; podendo até mesmo, servir a programas de educação alimentar orgânica e sustentável aos jovens e crianças, ao abrir a participação dos vizinhos na sua manutenção. A relação do espaço projetado “semi-privado”, com a rua, é uma outra questão importante

que se explorou com a adoção de recuo frontal, tratamento de fachada, e espaço para comércios e serviços, onde outras relações podem ser estabelecidas com o contexto inserido, já que nas condições atuais dos cortiços, a rua, o sentar na calçada para conversar com os vizinhos, funciona como um refúgio às precárias condições de seus lares. Entende-se que, o desenho urbano, em sua menor escala, a da calçada, interfere diretamente em como as pessoas, sejam elas residentes locais ou transeuntes, se relacionam com ele e entre si, possibilitando uma infinidade de significações, e valores atribuídos: para sentir segurança, se acolhe o espaço e não se fecha para ele. O desenvolvimento prévio dos protótipos, que têm como função justamente a definição de condições sugeridas a serem adaptadas, foi crucial para o resultado final desse projeto, sob a consciência de que mesmo o arquiteto como um “progenitor” do espaço construído, não lhe confere o total controle sobre como sua obra será usada e reusada, ainda que determine em planta para que serve ou como se usa, cada um dos ambientes de sua edificação. Projetar com consciência, é tomar partido das dinâmicas sociais, praticamente imprevisíveis a longo prazo, mas que podem ter o suporte necessário para que se desenvolvam da melhor forma. Nesse projeto, por exemplo, se questionou durante as inúmeras orientações realizadas ao longo desses últimos 5 meses, a necessidade de contínuas passarelas para conexão entre as habitações - justamente a questão sobre limitar as possibilidades projetuais -, quando pode surgir a necessidade de mudar uma porta de lugar para

252


uma nova organização interna da habitação, e entre N motivos, casos comuns em espaços tão dinâmicos como são os cortiços. Logo, se não são encontrados suportes planejados e previamente desenvolvidos, eles serão criados em condições que podem ser boas, adaptáveis e confiáveis, ou ao contrário. É uma realidade onde o arquiteto dificilmente conseguirá ter o controle de toda e qualquer situação, pós ocupação, seja qual for a natureza do projeto.

-3.79

-3.79

uhs

uhs

-3.84

-3.84

circulação

circulação

-3.84

-3.84

lavanderia coletiva

lavanderia coletiva

-1.17

-1.17

uhs

uhs

-1.22

-1.22

circulação

circulação

-1.22

-1.22

coz. coletiva

coz. coletiva

-1.22

-1.22

serviço/ comércio

serviço/ comércio

+0.10

+0.10

área comum

área comum

i = 8,50%

+0.00

i = 8,50%

i = 8,50%

i = 8,50%

+0.00

calçada

calçada

sinalização tátil

sinalização tátil

cx d'água

+1.40

lavanderia coletiva

+0.00

+0.00

faixa elevada

faixa elevada cx d'água

Unidades Habitacionais

UH 1 UH 2 UH 3 UH 4 UH 5

UH 6 UH 7 UH 8 UH 9

FIGURA: Setorização de Tipologias Habitacionais e Projetual. De cima para baixo, na fileira da direita, as plantas do 2º e 1º Subsolos; Térreo e Piso intermediário; 1º e 2º Pav. Superiores. Fonte: Autoral, 2019.

253

Setorização Projetual

UHs Atrio Circulação Vertical Lavanderia coletiva Cozinha coletiva Comércio/ Serviço Horta Coletiva Áreas comuns Mirante

cx d'água

+1.40

horta coletiva

+1.40

circulação

-1.45

área comum

+1.45

área comum

+3.54

cobertura lavanderia

+5.16

área comum

cx d'água

+5.16

+5.16

circulação

cx d'água

+5.16

circulação

área comum

+5.16

mirante


1

2

4

3

1

2

56 4

3

7 56

8 7

9 8

9

-7.49

desnível permeável

-7.49

A

desnível permeável

A B B C C D

-7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 -7.49 -7.49 Porão 3

D

Porão 3

-7Po.4rã9o 3

E E F G

F G

-6.46 pátio

-6.46 pátio

-6.41 uhs

-6.41 uhs

H I

H I

J J

-6.46

área descoberta

-6.46

área descoberta

-6.46

lavanderia coletiva

-6.46

lavanderia coletiva

PLANTA 2º SUBSOLO Projeto Autoral, 2019.

254


1

2

3

4

56

7

8

9

-7.49

desnível permeável

A

B

C

D

-7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 -7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3

-3.79 uhs

-7.49 3

E

-6.46

Porão

F G

pátio

-6.41 uhs

H I

-6.46

área descoberta

J

-3.84

circulação

-6.46

lavanderia coletiva

-3.84

lavanderia coletiva

PLANTA 1º SUBSOLO Projeto Autoral, 2019.

255


1

2

3

4

56

7

8

9

-7.49

desnível permeável

A

B

C

-1.17 uhs

D

-6.46

E F G

pátio

-6.41 uhs

H I J

-6.46

área descoberta

-1.22

circulação

-6.46 lavanderia -1.22 coletiva

coz. coletiva

-1.22

serviço/ comércio

+0.10

área comum i = 8,50%

+0.00

i = 8,50%

calçada sinalização tátil

PLANTA TÉRREO E PISO INTERMEDIÁRIO Projeto Autoral, 2019.

+0.00

faixa elevada

256


1

2

3

4

56

7

8

9

-7.49

desnível permeável

A

cx d'água

B

+1.40

lavanderia coletiva

C

D

cx d'água

-7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 -7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3

-7Po.4rã9o 3

E F G

-6.46 pátio

cx d'água

-6.41 uhs

+1.40

horta coletiva

H I

-6.46

área descoberta

J

+1.40

circulação

-6.46

lavanderia coletiva

+1.45

área comum

PLANTA 1º PAV. SUPERIOR Projeto Autoral, 2019.

257

-1.45

área comum


1

2

3

4

56

7

8

9

-7.49

desnível permeável

A

B +3.54

cobertura lavanderia

C

D

-7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3 -7.49 -7.49 Porão 3 Porão 3

-7Po.4rã9o 3

E F G

-6.46 pátio

-6.41 uhs

H I J

-6.46

área descoberta

-6.46

lavanderia coletiva

+5.16

área comum

cx d'água

+5.16

+5.16

circulação

cx d'água

+5.16

circulação

área comum

+5.16

mirante

PLANTA 2º PAV. SUPERIOR Projeto Autoral, 2019.

258


A decisão por manter as fachadas praticamente sem grandes alterações, se deve pela importância da preservação dos elementos arquitetônicos originais das construções, pertencentes ao patrimônio cultural local, ainda que não sejam exclusivamente reconhecidos por lei. Parte da história da cidade, está contada em cada um dos elementos que compõem esse cenário, somados agora a mais uma intervenção, e outras histórias a serem escritas. A falta de cor nas paredes, sugere que os próprios moradores façam a sua contribuição, e dessa forma, se apropriem do seu lugar de moradia.

VISTA COM INTERVENÇÃO NAS FACHADAS Projeto Autoral, 2019.

259


1

2

3

4

5

7

6

8

9

10

9 5 CORTE AA E PLANTA REFERÊNCIA Projeto Autoral, 2019.

1

2

3

260


As janelas em seu formato original, acompanham a formatação do projeto que se insere logo após as fachadas, respeitando a sua existência, ao mesmo tempo que criam-se vazios, com a ausência de outras. As visadas geradas para a rua, é tomada como partido para a criação de um mirante para a rua, ou seja, uma outra conexão entre espaços públicos/privados, ainda que não seja no mesmo nível da rua. Os tijolos de solo-cimento usados para criar guarda-corpos na fachada, mantém a mesma linguagem da materialidade das habitações, se destacando assim dos demais existentes. Espera-se que com a escolha de não vedá-la completamente, os transeuntes se sintam convidados a darem uma espiadela, e por que não, adentrar ao projeto, para usufruir do comércio, da vista para as árvores do átrio, ou para passar o tempo em um dos bancos dispostos ao longo dos espaços de circulação/ permanência. As passarelas que se comunicam horizontalmente com todos os espaços, estão apoiadas sobre vigas metálicas, em um sistema estruturalmente leve, com base e guarda corpos de chapas metálicas perfuradas, de modo a não prejudicarem a iluminação e ventilação das unidades habitacionais.

ILUSTRAÇÕES Projeto Autoral, 2019.

261


262


ILUSTRAÇÕES Projeto Autoral, 2019.

263


264


CONCLUSÃO Ao finalizar este trabalho, com base nas pesquisas, análises e experiências, pode-se afirmar que a tamanha importância e proporção que a cidade de São Paulo ganhou perante o cenário econômico nacional, foi e continua sendo a reação sobre alicerces apoiados nas horas dispendidas de trabalho das classes sociais mais vulneráveis, onde se lucra para comer e/ou para morar, em muitos casos. São pessoas vítimas de explorações diversas dia após dia, camufladas pela paisagem cinza de pedras. Escondidas, invisíveis, pelo tempo que resiste nas fachadas dos antigos casarios, estão famílias das mais diversas composições, origens, culturas, crenças, idiomas. Mas, que se unificam por um sonho em comum, de terem o seus direitos reconhecidos, de terem o direito a um espaço digno para habitar e chamar de lar. O cortiço, somente pela sua denominação, carrega consigo esteriótipos que se mantiveram ao longo dos anos, sobre condições tão semelhantes às primeiras encontradas em casas compartilhadas por operários, no início do séc. XX. Viu a “Vila” se transformar e “Metrópole”, sem praticamente sair do lugar. Mas hoje, têm sua existência quando aliadas às construções do século passado, ameaçados pela especulação imobiliária. De 1870, quando surgiram os primeiros relatos da existência dos cortiços, até 2019 presente momento desse trabalho -, poucas ações efetivas foram realizadas a fim de se planejar e

265

colocar em prática soluções que resolvessem ou amenizassem os problemas sociais que assolam inúmeras das famílias residentes principalmente na região central da cidade de São Paulo, ainda que possam existir condições relativamente melhores na Periferia, a facilidade de morar próxima a equipamentos de saúde, educação, comércios, e principalmente oportunidades de trabalho, praticamente obrigam essas pessoas a permanecerem em condições precárias de habitabilidade, poupando tempo e dinheiro que destinariam aos grandes deslocamentos. A partir desse complexo cenário, para a concepção projetual, se tomou partido de diversos desafios de uma escala urbana, a ser questionada com um projeto arquitetônico, ao mesmo tempo que se via a necessidade de preservar parte da história construída dos imóveis encortiçados e manter as famílias residentes, mas agora em uma condição digna de habitabilidade. A metodologia desenvolvida, os produtos e resultados de aplicação dos protótipos, parecem promissores quando são entendidos como uma proposta passível de ser adaptada, tanto ao tecido urbano quanto às necessidades de cada um dos usuários dentro de suas unidades habitacionais. Tendo como principal partido de projeto as necessidades básicas do homem, assim como fez Le Corbusier, para se chegar o mais próximo de um desenho do espaço ideal, funcional, confortável e receptível.


Concluindo assim, a “pretensiosa” proposta desse trabalho, a não extinção dos cortiços, mas a sua ressignificação, onde a essência dos cortiços da vida coletiva busca ser potencializada com a sugestão de espaços onde o convívio e o lazer possam estreitar laços vizinhos, gerar confiança, e consequente segurança de viver em um lugar que, em nenhum momento, comprometa os direitos e a dignidade de cada um dos moradores, somados ao reforço das relações com o entorno, entre público e privado, na escala da rua, visto como importante para a manutenção tanto das relações sociais, quanto da própria edificação. Há muita vida nos cortiços.

ILUSTRAÇÕES Projeto Autoral, 2019.

266


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