TEXTO DE GONÇALO BRITO "Os livros dizem-nos algo. Os filmes mostram-nos alguma coisa. Mas os videojogos deixam-nos fazer coisas", diz Dan Houser, um dos pais de Grand Theft Auto (GTA). É uma frase que resume na perfeição o espírito da sua obra: se existem jogos que de facto nos deixam fazer coisas, muitas coisas, são os da série GTA. O conceito não é complexo, mas a sua execução é brilhante. Tudo acontece numa cidade virtual, normalmente uma sátira a uma localidade norte-americana, como Nova Iorque, ou Los Angeles. A ideia é transmitir ao jogador a sensação de que este está num sítio real, logo, a cidade é sempre um organismo vivo, repleta de transeuntes que lá vão fazendo a sua vida, a pé, de avião, de barco ou de carro e mota, enfrentando as típicas filas de trânsito automóvel. A autenticidade é arrepiante, especialmente porque todos os habitantes aparentam ter de facto uma vida própria e estar absolutamente indiferentes à nossa presença – pelo menos enquanto não interferirmos. Polícias perseguem ladrões e resolvem acidentes de trânsito, casais discutem nos jardins, ambulâncias acodem os doentes, carros de bombeiros apagam os fogos ocasionais… Tudo é orquestrado para envolver o jogador e o sugar para dentro de um imprevisível mundo de pixéis. Esse é um dos principais factores para o sucesso de GTA: pode-se interagir com praticamente tudo o que se vê. A questão não é “o que posso fazer?”, mas sim “o que quero fazer?”. Ajudar o criminoso, ou o polícia? Puxar um desgraçado para fora do seu carro para conduzir a viatura por cima do passeio e atropelar toda a gente? Força. Roubar um tanque de guerra do museu e espalhar o caos pela cidade? Porque não? Furtar um helicóptero para um inspirador passeio por cima da cidade? Claro. Visitar as “meninas”? Obrigatório. Pegar num Táxi e ser taxista, ou num carro da polícia e ser vigilante? Um pouco choninhas, mas sim, é possível. Quase não existem limites para o que se pode fazer em GTA, nem uma ordem específica de acontecimentos: é como um parque de diversões para adolescentes e adultos. É claro que, por muito que tudo isto seja divertido, um videojogo não é digno desse nome se não oferecer objectivos concretos. Embora opcionais, os jogos GTA oferecem uma quantidade generosa de missões que apelam directamente ao espírito competitivo do ser humano. O jogador assume sempre o papel de um zé-ninguém criminoso que pretende subir na vida a qualquer custo. Para o efeito realiza tarefas tão díspares como servir de chauffeur, cobrar dívidas difíceis, participar em corridas de carros, assassinar inimigos… enfim todos os chavões que se consigam lembrar dos filmes de acção norte-americanos. Realizar trabalhos criminosos rende dinheiro, e o enriquecimento é sinónimo de crescente estatuto social e de melhores carros, casas e mulheres. A única real contrapartida são as forças de lei, que aumentam o seu
MAIS DO QUE UM VIDEOJOGO SOBRE O SUBMUNDO DO CRIME ONDE O ROUBO, O CONSUMO DE DROGAS ILEGAIS, A VIOLÊNCIA E A PROSTITUIÇÃO ESTÃO NA ORDEM DO DIA, GRAND THEFT AUTO É O SÍMBOLO DE UMA GERAÇÃO GLOBAL, ALIMENTADA DESDE OS ANOS 80 PELA CULTURA POP NORTE-AMERICANA. 62 / MAXMEN / MAIO 2009
JUNHO 2009 / MAXMEN / 63