OdeMágico Oz
ILUSTRAÇÃO: W. W. DENSLOW
tradução: Luis Reyes Gil
Copyright © Editora Magia dos Livros
Título original: The Wonderful Wizard of Oz
Fonte: www.gutenberg.org
Todos os direitos reservados pela Editora Magia dos Livros. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, seja por meios mecânicos, eletrônicos, seja via cópia xerográfica, sem a autorização prévia da Editora.
edição geral
Sonia Junqueira
ilustrações
W. W. Denslow
revisão
Maria Theresa Tavares
capa e diagramação
Carol Oliveira
informações paratextuais
Dafne Barbosa Cortez
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Baum, L. Frank, 1856-1919
O mágico de Oz [livro eletrônico] / L. Frank Baum ; ilustração W. W. Denslow ; tradução Luis Reyes Gil. -- 1. ed. -- Belo Horizonte, MG : Magia dos Livros, 2021.
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Título original: The wonderful wizard of Oz
ISBN 978-65-993976-9-1
1. Ficção - Literatura infantojuvenil I. Denslow, W. W. II. Título.
Índices para catálogo sistemático:
1. Ficção : Literatura infantil 028.5
2. Ficção : Literatura infantojuvenil 028.5
Henrique Ribeiro Soares - Bibliotecário - CRB-8/9314
Rua Senador Teixeira da Costa, 180
Bairro Floramar . 31742-063
Belo Horizonte . MG
Introdução I. O ciclone.............................................. 6 II. O encontro com os Munchkins............ 12 III. Como Dorothy salvou o Espantalho... 22 IV. A estrada pela floresta ........................ 32 V. O resgate do Homem de Lata.............. 40 VI. O Leão Covarde.................................. 50 VII. A viagem até o Grande Oz.................. 58 VIII. O campo das papoulas mortíferas....... 66 IX. A Rainha dos Ratinhos........................ 76 X. O Guardião dos Portões....................... 84 XI. A maravilhosa cidade de Oz 94 XII. À procura da Bruxa Má 108 XIII. O resgate.......................................... 122 XIV. Os Macacos Alados......................... 128 XV. Quem era o verdadeiro Oz, o Terrível 136 XVI. As artes mágicas do Grande Charlatão 148 XVII. O balão sobe aos céus...................... 154 XVIII. A partida para o Sul........................ 160 XIX. Atacados pelas Árvores Guerreiras... 168 XX. O gracioso País de Porcelana.......... 174 XXI. O Leão se torna o Rei dos Animais.. XXII. O País dos Quadlings............. 188 XXIII. Glinda, a Bruxa Boa, atende ao desejo de Dorothy.............. 194 XXIV. Em casa de novo.................... 202 Informações paratextuais.......... 204
INTRODUÇÃO
Folclore, lendas, mitos e contos de fadas têm acompanhado a infância através dos tempos, e todo jovem saudável tem um amor autêntico e espontâneo por histórias fantásticas, maravilhosas e claramente irreais. As fadas de Grimm e Andersen têm dado maior felicidade aos corações infantis do que todas as demais criações humanas.
No entanto, o conto de fadas antigo, depois de atender a várias gerações, pode agora ser classificado como “histórico” nas bibliotecas infantis; então, chegou a hora de termos uma nova série de histórias maravilhosas, nas quais os estereótipos de duendes, anões e fadas fiquem de fora, com todos os horríveis incidentes de arrepiar, concebidos por seus autores para destacar em cada conto uma moral intimidante. A educação moderna já inclui a moralidade; portanto, a criança de hoje procura apenas entretenimento em seus contos mágicos e dispensa de boa vontade todos os incidentes desagradáveis.
Tendo isso em mente, a história de O Mágico de Oz foi escrita com o único intuito de deliciar as crianças. Ela pretende ser um conto de fadas moderno, no qual o encantamento e a alegria sejam preservados e os desgostos e pesadelos fiquem de fora.
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L. Frank Baum
Chicago, abril, 1900.
ciclone CAPÍTULO
I
Dorothy vivia no meio das imensas pradarias do Kansas, junto com seu Tio Henry, fazendeiro, e sua Tia Em, a mulher dele. A casa era pequena, porque a madeira para construí-la teve que ser trazida de carroça de muito longe. Eram quatro paredes, um assoalho e um telhado, formando um único cômodo, com um fogão enferrujado, um guarda-louça, uma mesa, três ou quatro cadeiras e as camas. Tio Henry e Tia Em dormiam numa cama grande num canto, e Dorothy numa cama menor, no canto oposto. Não havia sótão nem porão, só um pequeno buraco cavado no chão, que eles chamavam de abrigo do ciclone, onde a família podia se proteger quando havia um daqueles grandes tufões, capazes de arrasar qualquer edifício que encontrasse pela frente. Para entrar no abrigo, abria-se um alçapão no meio do piso e descia-se por uma escada até um buraco pequeno e escuro.
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Quando Dorothy ia até a porta e olhava em volta, via apenas uma grande pradaria cinzenta, onde quer que olhasse.
Nenhuma árvore, nenhuma casa interrompia aquela vasta área de terra plana que se estendia até o horizonte em todas as direções. O Sol esturricava a terra arada e a transformava num tapete cinzento, cortado por inúmeras rachaduras. A grama não era mais verde, pois o Sol queimara as pontas de suas longas folhas deixando-as com a mesma cor triste que se via por toda parte. A casa tinha sido pintada uma vez, mas o Sol também produziu bolhas na tinta, que foi lavada pelas chuvas; portanto, era tão cinzenta e sem graça quanto o resto.
Quando Tia Em foi morar lá, era recém-casada, jovem e bonita, mas o Sol e o vento também a haviam transformado. Ela não tinha mais aquele brilho nos olhos, agora cinza-opacos; nem o vermelho de suas faces e lábios, agora esmaecidos. Foi ficando magra e abatida, e nunca sorria. Quando Dorothy, que era órfã, chegou, Tia Em ficava tão surpresa com as risadas da menina que soltava um grito e punha a mão no coração toda vez que a voz doce de Dorothy chegava aos seus ouvidos. E olhava para a garotinha e se admirava por ela ser capaz de encontrar motivos para rir.
Tio Henry nunca ria. Trabalhava duro da manhã à noite e não sabia o que era alegria. Era melancólico também, desde a longa barba até as botas rústicas; estava sempre sério e solene, e raramente falava.
Era Totó que fazia Dorothy rir, e foi quem evitou que ela crescesse tão triste quanto todo o resto que a rodeava. Totó não era triste; era um cachorro preto, de pelo comprido e sedoso, com olhinhos escuros que piscavam alegres, um de cada lado do focinho miúdo e engraçado. Totó brincava o dia inteiro, e Dorothy brincava com ele e o amava de paixão. Naquele dia, porém, não brincaram. Tio Henry sentou no degrau da porta e olhou preocupado para o céu, ainda mais cinzento que de costume. Dorothy ficou em pé junto
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à porta com Totó no colo, também olhando para o céu. Tia Em lavava a louça.
Lá longe, ao norte, o vento deu um longo uivo, e Tio Henry e Dorothy viram que o capim mais alto ondulava diante da tempestade que se aproximava. E do sul vinha agora, pelo ar, um assobio agudo, e, ao pousarem os olhos naquela direção, viram também ondas de relva vindo dali.
De repente, Tio Henry se levantou.
– Em, tem um ciclone chegando – gritou para a mulher. – Vou dar uma olhada na criação. – E correu até o cercado onde ficavam as vacas e os cavalos.
Tia Em largou o que estava fazendo e veio até a porta. Bastou um olhar rápido para sentir que o perigo era iminente.
– Depressa, Dorothy! – gritou. – Entre no abrigo, corra!
Totó pulou do colo de Dorothy e foi se esconder debaixo da cama, e a menina correu atrás para tentar pegá-lo. Tia Em, assustadíssima, abriu o alçapão no assoalho e desceu pela escada até o pequeno buraco escuro. Depois que conseguiu finalmente pegar Totó, Dorothy foi atrás da tia. Mas quando estava na metade do caminho, o vento fez um grande zunido e a casa balançou tanto que ela se desequilibrou e caiu sentada no chão.
Então aconteceu uma coisa muito estranha.
A casa girou duas ou três vezes e começou a se erguer lentamente no ar. Dorothy sentiu como se estivesse subindo de balão.
Os ventos do norte e do sul se encontraram no lugar exato em que estava a casa, e ali tinha se formado o centro do ciclone. No interior de um ciclone, o ar geralmente fica parado, mas a grande pressão do vento sobre todos os lados da casa fazia com que subisse cada vez mais, até alcançar o topo do redemoinho; lá ficou e foi levada embora por quilômetros e quilômetros, com a mesma facilidade com que uma pluma é levada pelo vento.
Ficou tudo escuro, e o vento uivava assustador em volta dela, mas Dorothy sentiu que viajava até com certo conforto.
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Depois dos primeiros giros e de umas poucas vezes em que a casa ficou muito inclinada, ela teve a sensação de estar sendo suavemente embalada, como um bebê no berço.
Totó não gostou nada daquilo. Corria por todo o cômodo, ora aqui, ora ali, latindo alto; mas Dorothy sentou bem quietinha no chão e esperou, para ver o que ia acontecer.
Uma hora, Totó chegou perto demais do alçapão aberto e caiu pelo buraco. No início, a garotinha achou que havia perdido seu cãozinho, mas em seguida viu uma das orelhas dele despontando pela abertura, pois a forte pressão do ar o mantinha grudado na casa, evitando que caísse. Ela se arrastou até lá, pegou Totó pela orelha, puxou-o para dentro do cômodo de novo e fechou a porta do alçapão para evitar novos acidentes. As horas foram passando e aos poucos Dorothy se recuperou do susto; mas se sentia muito sozinha, e o vento uivava tão alto que quase ficou surda. Primeiro, teve receio de se arrebentar toda quando a casa caísse; mas conforme as horas passavam e nada de terrível acontecia, parou de se preocupar e decidiu esperar calmamente e ver o que o futuro lhe reservava. Por fim, arrastou-se por aquele chão instável até sua cama, e deitou; Totó a acompanhou e ficou deitado ao lado dela. Apesar do balanço da casa e do zunido do vento, a menina logo fechou os olhos e caiu num sono profundo.
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encontro com os Munchkins CAPÍTULO II
Dorothy foi acordada por um choque
tão repentino e tão forte que se não estivesse deitada numa cama macia teria se machucado. Do jeito que foi, o impacto a fez perder o fôlego e ficar tentando entender o que tinha acontecido; Totó encostou seu pequeno focinho frio no rosto dela e deu um ganido aflito. Dorothy sentou-se na cama e percebeu que a casa não estava mais se mexendo e que não era mais noite, pois os raios do Sol entravam pela janela e inundavam o pequeno cômodo. Saltou da cama e foi correndo abrir a porta, com Totó nos calcanhares.
A garotinha deu um grito de espanto e olhou em volta, arregalando cada vez mais os olhos diante daquela visão maravilhosa. O ciclone tinha feito a casa pousar muito suavemente – para os padrões de um ciclone –no meio de um lugar belíssimo. Havia gramados encantadores por toda parte, árvores majestosas
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que exibiam exuberantes e deliciosos frutos, vários canteiros de lindas flores e pássaros de plumagens coloridas e exóticas que cantavam e esvoaçavam pelas árvores e arbustos. Um pouco mais ao longe, um pequeno rio, com águas cristalinas que corriam entre margens verdejantes, murmurava sons que encheram de gratidão o coração daquela garotinha, que há tanto tempo vivia naquelas pradarias secas e tristes. Enquanto apreciava encantada aquele cenário incomum e magnífico, apareceu um grupo de pessoas, as mais estranhas que ela já vira na vida. Não eram tão grandes quanto os adultos que estava acostumada a ver, nem muito pequenas. Tinham mais ou menos a altura de Dorothy, que era uma criança bem crescida para a idade dela, mas pareciam bem mais velhas. Eram três homens e uma mulher, vestidos de um jeito bem esquisito. Usavam chapéus redondos altos, pontiagudos, de uns trinta centímetros, com sininhos em volta das abas que produziam um tilintar suave conforme se moviam. Os chapéus dos homens eram azuis; o da pequena mulher era branco, e ela vestia uma túnica também branca que descia pregueada dos ombros. O vestido era salpicado de estrelinhas que brilhavam como diamantes à luz do Sol. Os homens vestiam-se de azul, mesma cor de seus chapéus, e calçavam botas bem engraxadas, com uma larga borda azul no alto do cano. Dorothy achou que os homens deviam ser tão velhos quanto Tio Henry, pois dois deles tinham barba. Mas a pequena mulher sem dúvida era muito mais velha. Tinha o rosto bem enrugado, o cabelo quase todo branco e andava com o corpo bastante enrijecido. Quando estavam chegando perto da casa, viram Dorothy em pé junto à porta e pararam para cochichar algo, como se tivessem receio de se aproximar mais. Mas a velhinha continuou andando até Dorothy, fez uma profunda reverência e disse, com voz doce: – Seja bem-vinda, nobre feiticeira, ao País dos Munchkins. Somos muito gratos por ter matado a Bruxa Má do Leste e libertado nosso povo da escravidão.
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Dorothy ouviu com surpresa aquelas palavras. Que história era aquela de chamá-la de feiticeira e dizer que havia matado a Bruxa Má do Leste? Dorothy era uma garota ingênua, inofensiva, que havia sido carregada por um ciclone por vários quilômetros, e nunca matara nada nem ninguém na vida.
Mas a pequena mulher evidentemente estava à espera da resposta dela; portanto, Dorothy disse, um pouco hesitante:
– É muita bondade sua, mas deve haver algum engano. Eu não matei ninguém.
– É, mas, de qualquer modo, a sua casa fez isso por você – retrucou a velhinha, rindo –, então dá na mesma. Olhe só! – continuou ela, apontando para o canto da casa. – Veja esses dois pés saindo de debaixo desse bloco de madeira.
Dorothy olhou e deu um gritinho de susto. De fato, ali, bem debaixo da ponta da grande viga sobre a qual se apoiava a casa, dois pés se projetavam para fora, calçando pontudos sapatos brilhantes.
– Ah, coitada! Coitadinha! – gritou Dorothy, torcendo os dedos das mãos. – A casa deve ter caído em cima dela. O que a gente poderia fazer?
– Não há o que fazer – disse a pequena mulher, tranquila.
– Mas quem era ela? – perguntou Dorothy.
– Como eu disse, era a Bruxa Má do Leste – respondeu a mulher. – Ela manteve todos os Munchkins escravos por muitos anos, fazendo-os trabalhar para ela dia e noite. Agora estão livres, e são muito gratos a você por esse favor.
– Quem são os Munchkins? – indagou Dorothy.
– As pessoas que vivem na Terra do Leste, que era governada pela Bruxa Má.
– Você é Munchkin também? – perguntou Dorothy.
– Não, mas sou amiga deles, apesar de viver na Terra do Norte. Quando viram que a Bruxa do Leste havia morrido, os Munchkins mandaram um mensageiro me procurar, e eu vim na mesma hora. Sou a Bruxa do Norte.
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– Nossa! – gritou Dorothy. – Você é uma bruxa de verdade?
– Sim, claro – respondeu a pequena mulher. – Mas sou uma bruxa boa, e as pessoas me adoram. Não sou tão poderosa quanto a Bruxa Má que governava aqui, senão eu mesma já teria libertado o povo.
– Mas pensei que todas as bruxas fossem más – disse a garota, meio assustada por ter na sua frente uma bruxa de verdade.
– Oh, não, isso é um tremendo equívoco. Existem apenas quatro bruxas em toda a Terra de Oz, e duas delas, a do Norte e a do Sul, são bruxas boas. Sei que isso é verdade, porque sou uma delas, e não poderia estar errada. As do Leste e do Oeste eram, de fato, bruxas más; mas agora que você matou uma delas, há apenas uma Bruxa Má em toda a Terra de Oz, a Bruxa do Oeste.
– Mas – disse Dorothy, depois de refletir alguns instantes – Tia Em me contou que as bruxas foram todas mortas há muitos anos.
– Quem é Tia Em? – indagou a velhinha.
– É a minha tia, que mora no Kansas, de onde eu venho.
A Bruxa do Norte ficou um tempo pensativa, com a cabeça baixa e os olhos fixos no chão. Então ergueu o olhar e disse:
– Não sei onde fica o Kansas, pois nunca ouvi alguém mencionar esse país. Mas, me diga, é um país civilizado?
– Ah, sem dúvida – replicou Dorothy.
– Então, está explicado. Nos países civilizados, acredito que não restaram mais bruxas, nem magos, nem feiticeiras ou mágicos. Mas, você sabe, a Terra de Oz nunca foi civilizada, pois vivemos isolados do resto do mundo. Portanto, aqui ainda temos bruxas e mágicos entre nós.
– Quem são os mágicos? – perguntou Dorothy.
– O próprio Oz é o Grande Mágico – respondeu a Bruxa, baixando a voz num sussurro. – Ele é mais poderoso do que todos nós juntos. Mora na Cidade das Esmeraldas.
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Dorothy ia fazer outra pergunta, mas, nesse instante, os Munchkins, que até então tinham ficado em silêncio, deram um grito e apontaram para o canto da casa onde a Bruxa Má estivera deitada.
– O que foi? – perguntou a velhinha. Então olhou e começou a rir. Os pés da Bruxa morta haviam desaparecido, e restavam apenas os sapatos brilhantes dela.
– Ela era tão velha – explicou a Bruxa do Norte – que secou rapidinho ao sol. Sumiu de vez, mas os sapatos brilhantes ficaram, e agora são seus, pode ficar com eles e usá-los.
– Abaixou-se, pegou os sapatos e, depois de sacudir a poeira, entregou-os a Dorothy.
– A Bruxa do Leste tinha o maior orgulho desses sapatos brilhantes – disse um dos Munchkins. – Eles têm algum poder mágico, só que nunca descobrimos qual é.
Dorothy levou os sapatos para dentro da casa e colocou-os em cima da mesa. Então voltou e se dirigiu aos Munchkins, dizendo:
– Estou ansiosa para encontrar de novo minha tia e meu tio, pois com certeza devem estar preocupados comigo. Vocês me ajudariam a achar o caminho de volta?
Os Munchkins e a Bruxa se entreolharam, depois olharam para Dorothy e então abanaram a cabeça.
– A leste, não muito longe daqui – disse um deles –, há um grande deserto, e ninguém conseguiu atravessá-lo e sair vivo.
– É a mesma coisa ao sul – disse o outro –, pois já estive lá e vi. O Sul é o País dos Quadlings.
– E eu fui informado – interveio o terceiro homem –que a oeste é a mesma coisa. E aquele país, onde moram os Winkies, é governado pela Bruxa Má do Oeste, que transforma em escravo qualquer um que cruze no caminho dela.
– O Norte é o meu lar – disse a velha senhora – e na sua fronteira fica o mesmo grande deserto que rodeia toda a Terra de Oz. Portanto, minha querida, receio que terá que viver conosco.
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Ao ouvir isso, Dorothy começou a soluçar, pois se sentia muito sozinha no meio daquelas pessoas estranhas. Suas lágrimas comoveram os bondosos Munchkins, que na mesma hora puxaram seus lenços e começaram também a chorar. Quanto à velhinha, tirou o chapéu, equilibrou-o invertido sobre a ponta do nariz e contou “um, dois, três” com voz solene. Na mesma hora, o chapéu se transformou numa lousa, onde estava escrito a giz, em letras grandes e brancas:
Deixe a dorothy ir para a cidade das esmeraldas
A velhinha tirou a lousa de cima do nariz e, depois de ler o que estava escrito, perguntou:
– Seu nome é Dorothy, minha querida?
– Sim – respondeu a criança, erguendo o olhar e secando as lágrimas.
– Então você deve ir para a Cidade das Esmeraldas. Talvez Oz possa ajudá-la.
– Onde fica essa cidade? – perguntou Dorothy.
– Fica bem no centro do país e é governada por Oz, o Grande Mágico de quem lhe falei.
– Ele é um homem bom? – indagou a menina, preocupada.
– É um bom mágico. Se é um homem ou não, não sei dizer, pois nunca o vi.
– Como faço para chegar lá? – perguntou Dorothy.
– Vai ter que andar bastante. É uma longa jornada, por um país às vezes agradável, outras vezes sombrio e terrível. Mas vou usar todas as artes mágicas que conheço para protegê-la dos perigos.
– Você não poderia vir comigo? – suplicou a garota, que começava a ver a velhinha como sua única amiga.
– Não, não posso fazer isso, mas posso lhe dar um beijo, e ninguém ousará maltratar uma pessoa que tenha sido beijada pela Bruxa do Norte.
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Ela chegou perto de Dorothy e lhe deu um suave beijo na testa. No lugar em que seus lábios tocaram a menina, ficou uma marca redonda e brilhante, como Dorothy descobriria mais tarde.
– A estrada para a Cidade das Esmeraldas é calçada com pedras amarelas – disse a Bruxa –, então não há o que errar.
Quando encontrar Oz, não tenha medo dele, conte-lhe sua história e peça ajuda. Adeus, minha querida.
Os três Munchkins fizeram uma reverência profunda e lhe desejaram uma viagem agradável; em seguida, foram embora pelo meio das árvores. A Bruxa deu um pequeno aceno amistoso para Dorothy, rodopiou três vezes sobre o calcanhar esquerdo e desapareceu de vez, para grande surpresa do pequeno Totó, que latiu bem alto depois que ela já tinha ido embora – enquanto ele a via por perto, teve medo até de rosnar.
Mas Dorothy, que sabia que a mulher era bruxa, já esperava que fosse desaparecer exatamente desse jeito, e não se surpreendeu nem um pouco.
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Como Dorothy salvou o
Espantalho CAPÍTULO III
Ao ficar sozinha, Dorothy começou a sentir fome. Então, foi até o guarda-louça, cortou um pedaço de pão e passou manteiga. Deu um pouco para Totó, pegou um balde da prateleira e foi com ele até o pequeno regato para enchê-lo com aquela água cristalina e cintilante. Totó correu para as árvores e ficou latindo para os pássaros pousados ali. Quando foi buscá-lo, Dorothy viu frutas tão atraentes nos galhos das árvores que pegou algumas, e foi exatamente o que precisava para completar seu café da manhã.
Em seguida, os dois voltaram para a casa. Tomaram bastante água fresquinha e límpida, e a menina começou os preparativos para a viagem à Cidade das Esmeraldas.
Além daquele que trazia no corpo, Dorothy tinha só mais um vestido, que por acaso estava limpo e dependurado num cabide ao lado da cama dela. Era de algodão, xadrezinho branco
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e azul; mesmo com o azul um pouco desbotado depois de muitas lavagens, ainda era um vestido bonitinho. A garota tomou um banho caprichado, colocou o vestido limpo e amarrou seu chapeuzinho cor de rosa na cabeça. Pegou uma cestinha e encheu com os pães do guarda-louça, cobrindo com um pano branco. Então, olhou para os pés e viu que seus sapatos estavam num estado lastimável.
– Com certeza não aguentam uma longa viagem, Totó – disse. E o cachorrinho olhou para o rosto de Dorothy com seus olhinhos pretos e abanou o rabo, para mostrar que tinha entendido.
Nisso, ela viu em cima da mesa os sapatos brilhantes que haviam pertencido à Bruxa do Leste.
– Será que servem no meu pé? – disse para Totó. – Seriam ideais para uma longa caminhada, pois nunca se gastam.
Tirou os sapatos velhos de couro e experimentou os prateados, que serviram como se tivessem sido feitos para ela.
Por fim, pegou a cestinha.
– Vamos, Totó? Estamos indo para a Cidade das Esmeraldas perguntar ao Grande Oz como fazemos para voltar ao Kansas.
Dorothy fechou a porta, trancou e guardou a chave com cuidado no bolso do vestido. E assim, com Totó trotando comportado atrás dela, começou sua jornada.
Havia várias estradas por ali, mas ela não demorou a encontrar a que era calçada com pedras amarelas. Em pouco tempo, já seguia por ela, animada, em direção à Cidade das Esmeraldas, com seus sapatos brilhantes tilintando alegremente naquele piso amarelo duro. O Sol brilhava forte, os pássaros cantavam docemente, e Dorothy não se sentia tão mal quanto vocês poderiam imaginar que se sentiria uma garota que havia sido de repente varrida de seu próprio país e colocada no meio de uma terra estranha.
Conforme caminhava, ficava surpresa ao ver o quanto aquele país era bonito. Havia cercas bem construídas junto
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à estrada, pintadas de um azul vistoso, e, atrás delas, muitos campos de cereais e hortaliças. Sem dúvida, os Munchkins eram bons agricultores, capazes de cuidar de grandes plantações. De vez em quando, passava por alguma casa, as pessoas saíam para olhar e faziam uma profunda reverência, pois todos sabiam que havia sido por meio dela que a Bruxa Má fora destruída, libertando-os da escravidão. As casas dos Munchkins eram moradias estranhas, redondas, cobertas por uma grande cúpula. Todas pintadas de azul, pois no país do Leste o azul era a cor favorita.
Ao anoitecer, sentindo-se já cansada da longa caminhada e começando a pensar onde poderia passar a noite, Dorothy chegou a uma casa bem maior que as outras. No gramado da frente, vários homens e mulheres dançavam. Cinco pequenos violinistas tocavam bem alto, as pessoas riam e cantavam, e perto dali havia uma grande mesa cheia de frutas e nozes deliciosas, tortas e bolos e muitas outras coisas boas de comer.
As pessoas receberam Dorothy muito bem e a convidaram a comer e passar a noite ali, pois era a casa de um dos Munchkins mais ricos do país, e seus amigos estavam lá reunidos celebrando com ele o fato de terem se libertado da escravidão da Bruxa Má.
Dorothy comeu uma ceia farta, tendo sido servida pelo próprio Munchkin rico, que se chamava Boq. Depois sentou-se num banco e ficou assistindo às pessoas dançarem.
Quando viu os sapatos brilhantes nos pés dela, Boq comentou:
– Você deve ser uma grande feiticeira.
– Por quê? – perguntou a garota.
– Porque está usando sapatos brilhantes e porque matou a Bruxa Má. Além disso, usa a cor branca na sua roupa, só as bruxas e feiticeiras usam branco.
– Meu vestido é xadrez, azul e branco – disse Dorothy, alisando as pregas da roupa.
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– É gentil de sua parte usar uma roupa como esta – disse Boq. – O azul é a cor dos Munchkins, e o branco é a cor das bruxas. Com isso, sabemos que você é uma bruxa amiga. Dorothy não soube o que dizer, pois todo mundo parecia achar que ela era uma bruxa, e ela sabia muito bem que era apenas uma garotinha comum, que por acaso havia sido trazida por um ciclone a uma cidade estranha.
Quando Dorothy cansou de assistir às danças, Boq a levou para dentro e lhe deu um quarto com uma linda cama. Os lençóis eram de tecido azul, e Dorothy dormiu profundamente até de manhã, com Totó enrolado em cima de um tapete azul ao lado da cama.
Ela tomou um bom café da manhã e ficou vendo um minúsculo bebê Munchkin brincar com Totó, puxando o rabo dele, dando gritinhos e rindo de um jeito que Dorothy achou muito divertido. Totó despertava muita curiosidade naquelas pessoas, que nunca tinham visto um cachorro.
– Quanto falta para chegar à Cidade das Esmeraldas? – a garota perguntou.
– Não sei – respondeu Boq, sério. – Nunca estive lá. É melhor as pessoas ficarem longe de Oz, a não ser que tenham coisas para resolver com ele. Mas a viagem até a Cidade das Esmeraldas é longa, e irá tomar-lhe vários dias. Nosso país é bom e agradável, mas você terá que passar também por alguns lugares hostis e perigosos antes de chegar ao final da sua jornada.
Isso deixou Dorothy um pouco preocupada, mas ela sabia que apenas o Grande Oz poderia ajudá-la a voltar ao Kansas, então juntou coragem e decidiu não desistir.
Despediu-se de seus amigos e retomou a viagem pela estrada de pedras amarelas. Depois de andar vários quilômetros, parou para descansar. Subiu em uma cerca junto à estrada e ficou sentada ali. Havia um grande milharal atrás da cerca e, não muito longe dali, um espantalho, colocado bem alto numa estaca, para manter os pássaros afastados do milho maduro.
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Dorothy apoiou o queixo na mão e ficou olhando para o espantalho, pensativa. A cabeça dele era um saquinho recheado de palha, com olhos, nariz e boca pintados para representar o rosto. Um velho chapéu pontiagudo, que devia ter sido de algum Munchkin, fora enfiado na sua cabeça, e o resto de sua figura era um terno azul, puído e desbotado, também preenchido de palha. Nos pés, tinha botas velhas com a borda azul, como as que todos os homens usavam naquele país, e ficava acima dos pés de milho, erguido por uma estaca presa às costas. Enquanto Dorothy observava, séria, aquele estranho rosto pintado, teve uma surpresa ao ver um dos olhos dele piscar lentamente para ela. De início, achou que estava imaginando coisas, pois no Kansas os espantalhos jamais piscavam os olhos, mas a figura logo em seguida fez um aceno amistoso com a cabeça. Dorothy então saltou da cerca e foi até ele, com Totó correndo em volta da estaca e latindo.
– Bom-dia – disse o Espantalho, com voz bem rouca.
– Você fala?! – espantou-se a garota.
– Com certeza – respondeu o Espantalho. – Como vai?
– Vou muito bem, obrigada – disse Dorothy educadamente. – E você, como vai?
– Não estou me sentindo muito bem – disse o Espantalho, com um meio sorriso. – É chato demais ficar dependurado aqui em cima noite e dia para assustar os corvos.
– Você não consegue descer? – perguntou Dorothy.
– Não, essa estaca está grudada nas minhas costas. Se você fizer o favor de me soltar dela, ficarei muito agradecido.
Dorothy estendeu os dois braços e levantou o Espantalho, até ele se soltar da estaca; por ser recheado de palha, era bem leve.
– Eu lhe agradeço muito – disse o Espantalho, ao ser colocado no chão. – Já me sinto um novo homem.
Dorothy ficou confusa ao ouvir isso, pois era esquisito ouvir um homem de palha falar e vê-lo fazer reverências e andar do lado dela.
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– Quem são vocês? – perguntou o Espantalho depois de ter se espreguiçado e bocejado. – E estão indo para onde?
– Meu nome é Dorothy – disse a garota – e estou indo para a Cidade das Esmeraldas, para pedir ao Grande Oz que me mande de volta para o Kansas.
– Onde fica a Cidade das Esmeraldas? – indagou. – E quem é Oz?
– Nossa, você não sabe?! – respondeu ela, surpresa.
– Na verdade, não. Não sei de nada. Veja, eu sou empalhado, portanto não tenho cérebro – respondeu com tristeza.
– Puxa! – disse Dorothy. – Sinto muito por você.
– Você acha – perguntou ele – que se eu for à Cidade das Esmeraldas com você o Oz poderá me dar um cérebro?
– Não sei dizer – respondeu ela –, mas você pode vir comigo, se quiser. Se Oz não lhe der nenhum cérebro, você não ficará pior do que está agora.
– Isso é verdade – disse o Espantalho. – Veja bem –continuou em tom confidencial –, não me incomodo de ter pernas, braços e corpo de palha, porque isso evita que eu me machuque. Se alguém pisa no meu pé ou me enfia um alfinete, nem ligo, porque não sinto nada. Mas não gosto que as pessoas digam que eu sou um tonto, e se minha cabeça continuar recheada de palha em vez de ter um cérebro, como você tem, como é que vou conseguir aprender alguma coisa algum dia?
– Entendo como se sente – disse a garotinha, que de fato sentia compaixão por ele. – Se você vier comigo vou pedir a Oz que faça tudo o que ele puder por você.
– Obrigado – respondeu o homem de palha, agradecido. Saíram caminhando até a estrada. Dorothy ajudou-o a pular a cerca, e eles retomaram o caminho pela estrada de pedras amarelas em direção à Cidade das Esmeraldas.
No início, Totó não gostou desse acréscimo ao grupo. Ficava cheirando o homem empalhado como se suspeitasse
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que havia algum ninho de ratos nele, e com frequência rosnava de modo pouco amistoso para o Espantalho.
– Não se preocupe com Totó – disse Dorothy ao seu novo amigo –, ele nunca morde.
– Oh, eu não tenho medo – replicou o Espantalho. – Ele não consegue machucar a minha palha. Por favor, deixe eu carregar essa cesta pra você. Não é incômodo nenhum, porque eu não me canso nunca. Vou lhe contar um segredo... – continuou ele, enquanto caminhava – só tem uma coisa no mundo da qual eu tenho medo.
– O que é? – perguntou Dorothy. – O fazendeiro Munchkin, que fez você?
– Não – respondeu o Espantalho. – Tenho medo de fósforo aceso.
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A estrada pela floresta
CAPÍTULO IV
Algumas horas mais tarde, a estrada começou a ficar mais acidentada, e era difícil caminhar, a ponto de o Espantalho tropeçar várias vezes nas pedras amarelas, que agora eram muito irregulares. De fato, às vezes viam pedras quebradas ou faltando, deixando buracos que Totó saltava e Dorothy contornava. Mas o Espantalho, como não tinha cérebro, andava sempre em frente e, portanto, pisava nos buracos e caía de cara nas pedras duras. Mas ele nunca se machucava, e Dorothy punha-o em pé de novo, e ele ria com ela do seu desajeitamento.
As fazendas, ali, não eram nem de longe tão bem cuidadas quanto as anteriores. Havia menos casas e menos árvores frutíferas, e quanto mais eles avançavam, mais lúgubre e solitário ficava o país.
Ao meio-dia, sentaram-se à beira da estrada, perto de um pequeno riacho, e Dorothy abriu a cesta e tirou um pouco de pão. Ofereceu um pedaço ao Espantalho, mas ele recusou.
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– Nunca tenho fome – disse –, o que é uma sorte, porque minha boca é só pintada, e se eu abrisse um buraco nela para poder comer, a palha da qual sou recheado iria escapar, estragando o formato da minha cabeça.
Dorothy viu na hora que isso era verdade, então apenas assentiu e continuou comendo seu pão.
– Conte-me alguma coisa sobre você e o país de onde você vem – disse o Espantalho quando ela terminou seu almoço. Então a menina lhe contou tudo sobre o Kansas, sobre como tudo era desolado e como tinha sido carregada pelo ciclone até aquela estranha Terra de Oz.
O Espantalho ouviu com atenção e disse:
– Não consigo entender por que você deseja deixar este belo país e voltar para esse lugar árido e triste que chama de Kansas.
– Isso é porque você não tem cérebro – respondeu a menina. – Não importa o quanto nosso lar seja feio e triste: nós, pessoas de carne e osso, sempre preferimos viver nele e não em qualquer outro lugar, mesmo que seja muito bonito. Não há lugar como o nosso lar.
O Espantalho suspirou.
– Claro que eu não consigo entender isso – disse ele. – Se a cabeça de vocês fosse recheada de palha como a minha, provavelmente vocês morariam em lugares bonitos, e não haveria ninguém no Kansas. Sorte do Kansas que vocês têm cérebro.
– Você não quer me contar alguma história, enquanto estamos aqui descansando? – pediu a criança.
O Espantalho olhou-a envergonhado e respondeu:
– Sabe, eu existo há tão pouco tempo que, na realidade, não sei nada de nada. Fui feito anteontem. Portanto, o que aconteceu no mundo antes disso é totalmente desconhecido para mim. Felizmente, quando o fazendeiro fez minha cabeça, uma das primeiras coisas que pintou foram minhas orelhas, então ouvi tudo o que estava acontecendo naquela hora. Tinha
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outro Munchkin com ele, e a primeira coisa que eu ouvi o fazendeiro dizer foi: “O que você achou dessas orelhas?”. “Não ficaram muito bem desenhadas”, – respondeu o outro. “Não importa”, disse o fazendeiro, “são orelhas do mesmo jeito”, o que era bem verdade. “Agora vou fazer os olhos”, disse o fazendeiro. Então ele pintou meu olho direito e assim que ficou pronto me vi olhando para ele e para tudo à minha volta com muita curiosidade, porque foi minha primeira visão do mundo. “Ficou um olho muito bonito”, observou o Munchkin que estava com o fazendeiro. “O azul é a cor perfeita para os olhos”. “Acho que vou fazer o outro olho um pouco maior”, disse o fazendeiro. E quando o segundo olho ficou pronto eu conseguia ver muito melhor do que antes. Depois, ele pintou meu nariz e minha boca. Mas eu não falava, porque naquela época não sabia para que servia a boca. Eu me diverti vendo os dois fazendo meu corpo, meus braços e pernas; e quando finalmente prenderam minha cabeça no lugar, fiquei muito orgulhoso, porque achei que era um homem tão bom quanto os outros. “Esse nosso amigo aqui vai assustar os corvos
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direitinho”, disse o fazendeiro, “ficou muito parecido com um homem”. “Bem, ele é um homem”, disse o outro, e eu concordei com isso. O fazendeiro me pôs debaixo do braço, me carregou até o milharal e me prendeu a uma estaca alta, onde você me encontrou. E logo depois ele e o amigo foram embora e me deixaram sozinho... – e o Espantalho continuou: – Eu não gostei de ser abandonado daquele jeito. Então tentei andar atrás deles. Mas meus pés não conseguiam encostar no chão, e fui obrigado a ficar naquela estaca. Era uma vida muito solitária, porque eu não tinha nada em que pensar, já que tinha sido feito há tão pouco tempo. Muitos corvos e outros pássaros voavam até o milharal, mas assim que me viam iam embora, achando que eu era um Munchkin; e gostei disso, fazia eu me sentir uma pessoa importante. Pouco depois, um velho corvo voou até perto de onde eu estava e, depois de me examinar com atenção, empoleirou-se no meu ombro e disse:
“Tô aqui pensando: Será que esse fazendeiro imagina que vai me enganar desse jeito tão tosco? Qualquer corvo com bom senso percebe que você é apenas um boneco recheado de palha”. Então ele pulou até meus pés e comeu todo o milho que quis. Os outros pássaros, vendo que eu não fazia nada, vieram comer o milho também, e não demorou muito e já havia um grande bando reunido à minha volta. Fiquei triste com isso, porque mostrou que eu não era um espantalho tão bom assim; mas o velho corvo me confortou, dizendo: “Se você pelo menos tivesse cérebro, seria um homem tão bom quanto qualquer um deles, até melhor do que alguns. Cérebro é a única coisa que vale a pena ter neste mundo, não importa se você é corvo ou homem”. Depois que os corvos foram embora, fiquei pensando muito nisso, e decidi que tentaria de todo jeito conseguir um cérebro. Por sorte você apareceu e me tirou daquela estaca, e, pelo que diz, tenho certeza de que o Grande Oz vai me dar um cérebro assim que chegarmos à Cidade das Esmeraldas.
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– É o que eu espero – disse Dorothy, bem séria –, pois você parece muito ansioso em ter um.
– Ah, sem dúvida; fico muito ansioso – retrucou o Espantalho. – A gente se sente mal quando sabe que é um tonto.
– Bem – disse a garota –, vamos embora. – E passou a cesta para o Espantalho.
Agora não havia mais cercas junto à estrada, e a região era rústica e sem plantações. Ao anoitecer, chegaram a uma grande floresta, com árvores que eram tão altas e ficavam tão perto umas das outras que seus galhos se entrelaçavam sobre a estrada de pedras amarelas, ficando quase escuro embaixo delas, pois os galhos bloqueavam o restante da luz do dia; mas os viajantes não pararam e seguiram pela floresta.
– Se a estrada entrou na floresta, uma hora vai ter que sair dela – disse o Espantalho. – E como a Cidade das Esmeraldas fica na outra ponta dessa estrada, temos que ir para onde quer que ela nos leve.
– Isso qualquer um sabe – disse Dorothy.
– Com certeza... e é unicamente por essa razão que eu sei disso – retrucou o Espantalho. – Se fosse preciso cérebro para saber, eu nunca saberia.
Depois de mais ou menos uma hora, a luz foi indo embora e eles começaram a tropeçar toda hora. Dorothy não conseguia enxergar nada, mas Totó sim, pois alguns cães enxergam muito bem no escuro; e o Espantalho declarou que estava vendo tão bem quanto de dia. Então ela agarrou o braço dele e conseguiram avançar.
– Se você enxergar alguma casa ou algum lugar onde a gente possa passar a noite – disse ela –, por favor, avise; é muito desconfortável andar no escuro.
Logo depois o Espantalho parou.
– Estou vendo uma cabana à nossa direita – disse ele –, feita de toras e galhos. Vamos até lá?
– Sim, claro – respondeu a menina. – Estou exausta.
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Então, o Espantalho a conduziu por entre as árvores até a cabana, e Dorothy entrou e encontrou uma cama de folhas secas num canto. Deitou na mesma hora e, com Totó ao lado dela, caiu num sono profundo. O Espantalho, que nunca ficava cansado, ficou em pé no canto oposto, esperando pacientemente a manhã chegar.
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CAPÍTULO
O resgate do Homem de Lata
V
Quando Dorothy acordou, o Sol brilhava através das árvores e já fazia tempo que Totó estava lá fora perseguindo passarinhos e esquilos. Ela sentou na cama e olhou em volta. Ali estava o Espantalho, ainda em pé no seu canto, com a maior paciência, esperando ela acordar.
– Precisamos sair e arrumar água – disse ela.
– Para que você quer água? – ele perguntou.
– Para lavar o rosto da poeira da estrada, e para tomar, senão o pão seco vai grudar na minha garganta.
– Parece meio incômodo ser feito de carne e osso – disse o Espantalho pensativo –, porque você precisa dormir, comer e beber. Por outro lado, você tem um cérebro para poder pensar direito, e isso compensa todos esses outros incômodos.
Eles saíram da cabana e foram andando pelas árvores até que encontraram um
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pequeno riacho de água limpa, onde Dorothy bebeu, se banhou e tomou seu café da manhã. Ela viu que quase não havia mais pão na cestinha, e sentiu-se grata pelo Espantalho não precisar comer nada, pois o que havia mal dava para ela e para Totó naquele dia.
Quando terminou a refeição e estava se preparando para voltar à estrada de pedras amarelas, levou o maior susto ao ouvir alguém gemendo alto perto dali.
– O que foi isso? – perguntou, receosa.
– Nem imagino – respondeu o Espantalho –, mas podemos ir lá ver.
No mesmo instante, ouviram outro gemido, e o som parecia vir de algum ponto atrás deles. Viraram-se e deram alguns passos pela floresta, até que Dorothy viu algo brilhando, iluminado por um raio de sol filtrado entre as árvores. Correu até o lugar mas parou de repente, com um grito de surpresa.
Uma árvore grande havia sido parcialmente cortada, e em pé ao lado dela, com um machado erguido nas mãos, viram um homem todo feito de lata. Sua cabeça, braços e pernas se uniam ao corpo por juntas, mas ele permanecia totalmente imóvel, como se não conseguisse se mexer.
Dorothy olhou para ele perplexa, e o Espantalho também, enquanto Totó latia com insistência e chegou a dar uma dentada na perna de lata, machucando um pouco os dentes.
– Foi você que gemeu? – perguntou Dorothy.
– Sim – respondeu o Homem de Lata –, fui eu. Faz mais de um ano que estou aqui gemendo, sem que ninguém tenha ouvido ou decidido me ajudar.
– O que posso fazer por você? – indagou ela delicadamente, comovida pela voz triste do homem.
– Pegue uma latinha de óleo e lubrifique minhas juntas – pediu ele. – Estão tão enferrujadas que não consigo movimentá-las nem um pouco; se eu for bem lubrificado, vou ficar bom de novo num instante. Vocês vão encontrar uma latinha de óleo na prateleira da minha cabana.
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Dorothy correu até a cabana, pegou a latinha de óleo e, ao voltar, perguntou, ansiosa:
– Onde ficam suas juntas?
– Lubrifique primeiro meu pescoço – indicou o Homem de Lata. Então ela lubrificou, e como estava muito enferrujado, o Espantalho segurou a cabeça de lata e girou-a devagar, para um lado e para o outro, até que ela voltou a funcionar direito e o homem foi capaz de mexer a cabeça de novo.
– Agora lubrifique as juntas dos meus braços – disse ele. Dorothy fez o que ele pediu, e o Espantalho foi dobrando os braços com cuidado, até ficarem livres de ferrugem e voltarem a funcionar como se fossem novos.
O Homem de Lata, que também era conhecido como Lenhador de Lata, deu um suspiro de satisfação e abaixou seu machado, deixando-o encostado na árvore.
– Isso é um grande alívio – disse ele. – Fiquei segurando esse machado no alto desde que enferrujei, e estou feliz por finalmente poder abaixá-lo. Agora, se vocês lubrificarem as juntas das minhas pernas, ficarei totalmente bom de novo.
Então untaram suas pernas até que ele conseguiu movimentá-las com liberdade; e ele não se cansava de agradecer por ter sido libertado, pois parecia alguém muito educado e muito grato.
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– Eu talvez ficasse aqui em pé para sempre se vocês não tivessem aparecido – disse ele –, portanto, com certeza vocês salvaram minha vida. Como é que vieram parar aqui?
– Estamos indo para a Cidade das Esmeraldas, ver o Grande Oz – respondeu ela. – E paramos na sua cabana para passar a noite.
– Por que querem ver Oz? – perguntou.
– Quero que ele me mande de volta para o Kansas, e o Espantalho quer um cérebro – respondeu ela.
Por um momento, o Homem de Lata pareceu mergulhado em pensamentos, então disse:
– Você acha que Oz poderia me dar um coração?
– Imagino que sim – respondeu Dorothy. – Para ele, seria tão fácil quanto dar um cérebro ao Espantalho.
– É verdade – retrucou o Homem de Lata. – Bem, se vocês me permitem, vou acompanhar o grupo, irei também à Cidade das Esmeraldas para pedir a Oz que me ajude.
– Venha! – disse o Espantalho animado, e Dorothy acrescentou que adoraria a sua companhia. Assim, o Homem de Lata colocou seu machado no ombro e todos atravessaram a floresta até chegarem à estrada calçada com pedras amarelas.
O Homem de Lata pediu que Dorothy guardasse a latinha de óleo na cesta.
– Sabe – disse ele –, se de repente eu tomar chuva e enferrujar de novo, vou precisar muito dessa latinha.
Foi muita sorte esse novo companheiro se juntar ao grupo, pois logo depois de retomarem a jornada chegaram a um lugar onde as árvores e galhos ficavam tão densos sobre a estrada que os viajantes não conseguiam passar. Mas o Homem de Lata pôs mãos à obra com seu machado e cortou tudo tão bem que logo abriu uma passagem para o grupo.
Enquanto andavam, Dorothy estava tão concentrada que não percebeu quando o Espantalho tropeçou num buraco e
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rolou pela encosta da estrada. Na verdade, ele precisou gritar e chamá-la para que ela viesse ajudá-lo a levantar.
– Por que você não desviou do buraco? – perguntou o Homem de Lata.
– É que minha cabeça não ajuda muito – disse o Espantalho de bom humor. – Ela é recheada de palha, sabe, e é por isso que estou indo até Oz pedir que me arrume um cérebro.
– Ah, entendi – disse o lenhador. – Bom, de qualquer modo, um cérebro não é a melhor coisa do mundo.
– Você tem cérebro? – indagou o Espantalho.
– Não, minha cabeça é bem vazia – ele respondeu. – Mas já tive cérebro, e também coração; por isso, como já experimentei os dois, prefiro muito mais ter um coração.
– Por quê? – perguntou o Espantalho.
– Vou lhe contar minha história e então você entenderá.
Assim, enquanto caminhavam pela floresta, o Homem de Lata contou a seguinte história:
– Eu nasci filho de um lenhador que cortava árvores na floresta e vendia a madeira. Quando virei adulto, também me tornei lenhador, e depois que meu pai morreu cuidei de minha velha mãe até ela morrer. Então decidi não viver mais sozinho e me casar.
Havia uma garota Munchkin que era tão linda que logo me apaixonei por ela perdidamente. Ela prometeu se casar comigo assim que eu ganhasse dinheiro suficiente para construir uma casa melhor para ela; então comecei a trabalhar como um doido. Mas a moça vivia com uma velha senhora que não aceitava que ela se casasse, pois era muito preguiçosa e queria a moça junto dela, cozinhando e fazendo o serviço de casa. Então a velha senhora procurou a Bruxa Má do Leste e prometeu-lhe dois carneiros e uma vaca se ela conseguisse evitar nosso casamento. Nessa mesma hora, a Bruxa Má enfeitiçou meu machado, e quando eu estava longe, trabalhando duro e
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cortando muitas árvores, ansioso para conseguir minha nova casa e casar o mais rápido possível, o machado escapuliu da minha mão e cortou minha perna esquerda.
Isso de início me pareceu uma grande tragédia, pois sabia que com uma perna só um homem não podia trabalhar direito como lenhador. Então procurei um funileiro e pedi que me fizesse uma perna nova de lata. A perna funcionou muito bem, depois que me acostumei com ela. Mas minha ação enfureceu a Bruxa Má do Leste, pois ela prometera à velha senhora que eu não iria me casar com a bela moça Munchkin. Quando comecei a cortar lenha de novo, meu machado escapuliu outra vez e cortou minha perna direita. Fui de novo ao funileiro e ele mais uma vez providenciou uma perna de lata para mim. Depois, o machado enfeitiçado cortou meus braços, primeiro um, depois o outro; mas nada disso me intimidou e mandei substituí-los por braços de lata. A Bruxa Má então fez com que meu machado escapulisse e cortasse minha cabeça, e de início pensei que esse fosse meu fim. Mas o funileiro apareceu na minha casa e fez uma nova cabeça de lata para mim.
Pensei então que havia vencido a Bruxa Má, e trabalhei mais intensamente do que nunca; mas não imaginava o quanto minha inimiga podia ser cruel. Ela concebeu uma nova maneira de matar meu amor pela bela donzela Munchkin e fez meu machado escapulir de novo e cortar meu corpo, dividindo-me em duas metades. Uma vez mais o funileiro veio em meu auxílio e me fez um corpo de lata, prendeu nele meus braços e pernas de lata por meio de juntas e eu conseguia me deslocar tão bem quanto antes. Mas, infelizmente, não tinha mais coração e, portanto, perdi todo o meu amor pela moça Munchkin e não me preocupei mais em casar com ela. Suponho que ainda esteja vivendo com a velha senhora, esperando que eu vá procurá-la um dia.
Meu corpo brilhava ao sol, e eu me sentia muito orgulhoso disso e não me preocupava mais se meu machado escapulia,
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pois ele não podia mais me cortar. Havia um só perigo: que minhas juntas enferrujassem, mas eu guardava uma latinha de óleo na minha cabana e tinha o cuidado de me lubrificar sempre que preciso. Um dia, porém, esqueci de fazer isso e, ao ser pego numa tempestade, antes que me desse conta do perigo, minhas juntas já haviam enferrujado, e fiquei lá em pé no bosque até vocês chegarem para me ajudar. Foi um sofrimento terrível, mas durante o ano em que permaneci lá tive tempo para chegar à conclusão de que a minha maior perda havia sido a do meu coração. Enquanto estive apaixonado fui o homem mais feliz do mundo; mas ninguém pode amar sem um coração, e por isso estou decidido a pedir ao Oz que me dê um. Se ele me der, vou voltar e procurar a moça Munchkin e me casar com ela.
Tanto Dorothy quanto o Espantalho ouviram com muito interesse a história do Homem de Lata, e agora sabiam por que ele estava tão ansioso para conseguir um coração novo.
– Seja como for – disse o Espantalho –, vou pedir um cérebro em vez de um coração; porque um tonto, mesmo tendo coração, não sabe o que fazer com ele.
– Eu vou pedir um coração – replicou o Homem de Lata –, porque um cérebro não faz a pessoa feliz, e a felicidade é a melhor coisa deste mundo.
Dorothy não comentou nada, pois ficou confusa, sem saber qual dos seus dois amigos tinha razão, e concluiu que se ela conseguisse voltar para o Kansas e para a Tia Em, não faria muita diferença o lenhador ficar sem cérebro e o Espantalho sem coração, ou os dois conseguirem o que queriam.
O que mais a preocupava era que o pão estava quase acabando, e a próxima refeição que ela e Totó fariam deixaria a cesta vazia. Está certo que nem o Homem de Lata nem o Espantalho comiam, mas ela não era feita de lata nem de palha, e só podia continuar viva se comesse alguma coisa.
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CAPÍTULO VI
O Leão Covarde
Durante todo esse tempo, Dorothy e seus companheiros vinham andando por bosques densos. A estrada ainda era calçada de pedras amarelas, mas estas estavam agora muito mais cobertas por galhos secos e pelas folhas mortas das árvores, e andar por ali deixara de ser algo prazeroso.
Havia poucos pássaros nessa parte da floresta, porque eles amam campos abertos onde o sol bate forte. Mas volta e meia ela ouvia o rugido profundo de algum animal selvagem escondido entre as árvores. Eram sons que faziam o coração da garotinha bater acelerado, pois ela não imaginava quem os produzia; mas Totó sabia e andava grudado em Dorothy, sem se atrever a latir de volta.
– Quanto falta ainda para sairmos da floresta? – a menina perguntou ao Homem de Lata.
– Não sei dizer – foi a resposta –, porque nunca estive na Cidade das Esmeraldas.
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Mas meu pai esteve lá uma vez, quando eu era menino, e disse que a viagem era longa e por um país muito perigoso, embora mais perto da cidade onde mora Oz o lugar fosse muito bonito. Mas eu não fico com medo, desde que esteja com a minha latinha de óleo; também, nada pode machucar o Espantalho, e você traz na testa a marca do beijo da Bruxa Boa, e isso irá protegê-la de todo mal.
– E o Totó? – disse a menina, ansiosa. – O que irá protegê-lo?
– Nós mesmos vamos protegê-lo se ele ficar em perigo –respondeu o Homem de Lata.
Assim que acabou de dizer isso, ouviu-se dentro floresta um rugido terrível, e no instante seguinte um grande leão saltou no meio da estrada. Com um golpe da pata, fez o Espantalho rolar várias vezes e parar à beira do caminho; depois deu um golpe no Homem de Lata com suas garras afiadas. Mas, para surpresa do leão, isso não causou nem um arranhão na lata, mesmo derrubando o lenhador, que ficou lá deitado, imóvel.
O pequeno Totó, agora com um inimigo pela frente, correu latindo na direção do leão, e a grande fera já abria a boca para mordê-lo quando Dorothy, temendo que Totó fosse morto e sem ligar para o perigo, avançou correndo e acertou um tapa no nariz do leão com toda a força, gritando:
– Você nem ouse morder o Totó! Devia ter vergonha, uma fera enorme, querendo morder um pobre cãozinho!
– Eu não mordi – disse o Leão, esfregando a pata no nariz, no lugar em que Dorothy o acertara.
– Não mordeu, mas tentou – ela retrucou. – Você não passa de um grande covarde.
– Eu sei – disse o Leão, abaixando a cabeça, envergonhado. – Sempre soube disso. Mas como posso evitar?
– Não sei. E pensar que você acertou um homem recheado de palha como o pobre do Espantalho!
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– Ele é recheado de palha? – perguntou o Leão, surpreso, vendo-a pegar o Espantalho, colocá-lo de novo em pé e dar-lhe uns tapinhas para ajeitar seu formato de novo.
– Claro que é recheado de palha! – respondeu Dorothy, ainda irritada.
– É por isso que ele caiu com tanta facilidade – observou o Leão. – Fiquei impressionado quando o vi rolando daquele jeito. O outro também é empalhado?
– Não – disse Dorothy –, é feito de lata. – E foi ajudar também o lenhador a ficar em pé.
– Então é por isso que ele quase fez minhas garras perderem o fio – disse o Leão. – Quando elas arranharam a lata senti um arrepio na espinha. E que animal é esse que você trata com tanto carinho?
– Meu cachorrinho, o Totó – respondeu Dorothy.
– É de lata ou de palha? – perguntou o Leão.
– Nenhum dos dois. Ele é um... um... um cachorro de carne – disse a garota.
– Ah, sei! É um animal muito interessante, e reparando bem é pequenino, não? E ninguém pensaria em morder uma coisinha tão pequena, exceto um covarde como eu – prosseguiu o Leão com ar triste.
– E por que você é covarde? – perguntou Dorothy, olhando admirada para a grande fera, pois ele era grande como um cavalo pequeno.
– É um mistério – retrucou o Leão. – Acho que já nasci assim. Todos os outros animais da floresta, naturalmente, esperam que eu seja corajoso, pois o Leão é considerado por todos o Rei dos Animais. Aprendi que se rugisse bem alto toda criatura viva se assustaria e sairia do meu caminho. Mas sempre que encontrava um homem, ficava muito assustado; então, simplesmente rugia, e ele saía correndo o mais rápido possível. Se alguma vez um elefante, tigre ou urso tivesse me enfrentado, eu teria fugido correndo... de tão covarde que sou;
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mas assim que me ouvem rugir, todos procuram se afastar, e eu, é claro, os deixo ir embora.
– Mas isso não está certo. O Rei dos Animais não pode ser um covarde – disse o Espantalho.
– Eu sei – replicou o Leão, enxugando uma lágrima dos olhos com a ponta da sua cauda. – É essa a minha grande tristeza, o que torna minha vida tão infeliz. Só que toda vez que sinto algum perigo, meu coração dispara na hora.
– Será que você não tem alguma doença do coração? –disse o Homem de Lata.
– Pode ser – disse o Leão.
– Nesse caso – continuou o lenhador –, deveria ficar contente, pois provaria que tem um coração. Quanto a mim, não tenho coração, por isso, não poderia mesmo ter doença cardíaca nenhuma.
– No meu caso – disse o Leão pensativo –, se não tivesse coração talvez não fosse covarde.
– Você tem cérebro? – perguntou o Espantalho.
– Acho que tenho. Nunca olhei pra ver – respondeu o Leão.
– Estou indo até o Grande Oz pedir que me dê um cérebro –disse o Espantalho –, porque minha cabeça está recheada de palha.
– E eu estou indo pedir que me dê um coração – disse o Homem de Lata.
– E eu vou pedir que ele me mande com Totó de volta para o Kansas – acrescentou Dorothy.
– Vocês acham que Oz poderia me dar coragem? – perguntou o Leão Covarde.
– Acho que para ele seria tão fácil quanto me dar um cérebro – disse o Espantalho.
– Ou me dar um coração – disse o lenhador.
– Ou me mandar de volta para o Kansas – disse Dorothy.
– Então, se vocês não se incomodarem, vou acompanhá-los – disse o Leão –, porque para mim é simplesmente insuportável viver sem um pouco de coragem.
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– Você é muito bem-vindo – respondeu Dorothy –, pois irá ajudar a manter longe as outras feras selvagens. E acho que elas devem ser mais covardes ainda, já que deixam você assustá-las tão facilmente.
– E são mesmo – disse o Leão –, mas isso não me torna mais corajoso, e como eu no fundo sei que sou covarde, continuo infeliz.
Assim, mais uma vez o pequeno grupo retomou sua jornada, com o Leão agora caminhando a passos largos e majestosos ao lado de Dorothy. Totó, de início, não aprovou o novo companheiro, pois não conseguia esquecer que quase havia sido triturado pelas grandes mandíbulas do Leão. Mas depois de um tempo, ficou mais à vontade, e agora ele e o Leão Covarde já eram bons amigos.
No restante do dia, não houve mais aventuras que rompessem a paz da jornada. Uma hora, porém, o Homem de Lata pisou num besouro que rastejava pela estrada e matou o coitadinho. Isso o deixou muito triste, pois ele sempre tomava o maior cuidado para não fazer mal a nenhum ser vivo; por isso, continuou andando o caminho todo derramando lágrimas de tristeza e arrependimento. Essas lágrimas escorreram lentamente do seu rosto e chegaram às dobradiças do seu queixo, e ali criaram ferrugem. Uma hora, Dorothy perguntou-lhe alguma coisa, mas o Homem de Lata não conseguia mais abrir a boca, pois seus maxilares haviam enferrujado e grudado bem firme. Ele ficou muito assustado com isso e fazia vários gestos pedindo que Dorothy o ajudasse, mas ela não conseguia entender nada. O Leão também ficou sem saber qual era o problema. Mas o Espantalho pegou a latinha de óleo da cesta de Dorothy e lubrificou os maxilares do Homem de Lata, e com isso, depois de alguns momentos, ele já conseguia falar tão bem quanto antes.
– Isso vai me servir de lição – disse ele –, para que eu preste mais atenção onde piso. Porque se eu matar outro besouro
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ou inseto com certeza vou chorar de novo, e chorar enferruja meus maxilares, e aí fico sem poder falar.
A partir de então, o lenhador caminhou com muita atenção, sem tirar os olhos da estrada, e quando via alguma formiguinha dava um passo maior para não a machucar. Ele sabia muito bem que não tinha coração, portanto tomava muito cuidado para nunca ser cruel ou insensível com ninguém. – Vocês, que possuem um coração – disse ele –, podem se guiar por ele, e nunca fazem mal aos outros; mas eu não tenho, portanto preciso tomar mais cuidado. Quando Oz me der um coração, com certeza não vou ter que me preocupar tanto.
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A viagem até o Grande Oz
CAPÍTULO
VII
Naquela noite, acamparam na floresta debaixo de uma grande árvore, pois não havia casas por perto. A árvore funcionou como uma cobertura densa para protegê-los do orvalho, e o Homem de Lata cortou com seu machado uma grande pilha de madeira, com ela Dorothy fez uma fogueira esplêndida, que a aqueceu e a fez se sentir menos sozinha. Ela e Totó comeram sua última porção de pão; agora ela não sabia o que iriam comer no café da manhã.
– Se quiser – disse o Leão –, posso entrar na floresta e matar um cervo, para você assá-lo na fogueira, já que vocês têm esse gosto tão peculiar de preferir comida cozida. Dá um café da manhã excelente.
– Não, por favor, não – implorou o Homem de Lata. – Eu com certeza choraria muito se você matasse um pobre cervo, e então meus maxilares enferrujariam de novo.
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Mas o Leão enveredou pela floresta e foi providenciar seu jantar, que nunca ninguém soube o que foi, pois na volta não comentou nada. Já o Espantalho encontrou uma árvore cheia de nozes e encheu a cesta de Dorothy, para que a menina não passasse mais fome por um bom tempo. Ela achou isso muito atencioso da parte dele, mas riu muito da pobre criatura com seu jeito desengonçado de pegar nozes. Suas mãos almofadadas eram muito toscas e as nozes muito pequenas, ele derrubava quase tantas quanto conseguia colocar dentro na cesta. Mas ele não se importava em demorar na tarefa, pois assim podia ficar mais tempo longe do fogo, já que tinha medo que alguma fagulha incendiasse sua palha. Manteve, portanto, boa distância das chamas e só chegou perto delas para cobrir Dorothy com folhas secas quando ela deitou para dormir. A menina ficou bem abrigada e quentinha e dormiu um sono profundo até o amanhecer.
Quando o dia clareou, a garota lavou o rosto em um riacho e depois retomaram todos a viagem à Cidade das Esmeraldas.
Aquele seria um dia cheio para os viajantes. Ainda não fazia uma hora que estavam a caminho quando viram diante deles um grande fosso cortando a estrada e dividindo a floresta até onde a vista conseguia alcançar, tanto à direita quanto à esquerda. Era um fosso muito largo, e quando foram até a beirada para olhar dentro viram que era também muito profundo, com muitas rochas grandes e escarpadas lá embaixo. As encostas do fosso eram tão íngremes que nenhum deles conseguiria descer por elas, e por um momento parecia que a jornada tinha se encerrado.
– O que vamos fazer? – perguntou Dorothy desesperançada.
– Não tenho a mais vaga ideia – disse o Homem de Lata, e o Leão abanou sua juba desalinhada e pareceu pensativo.
Mas o Espantalho disse:
– Bem, não sabemos voar, é claro. Tampouco é possível descer pela encosta do fosso. Portanto, se também não podemos saltar sobre o fosso, temos que parar aqui mesmo onde estamos.
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– Acho que posso saltar até o outro lado – disse o Leão Covarde, depois de avaliar a distância com cuidado em sua mente.
– Então está resolvido – respondeu o Espantalho –, porque você pode saltar e carregar todos nós nas costas, um por vez.
– Bem, vou tentar – disse o Leão. – Quem vai primeiro?
– Eu – disse o Espantalho –, porque se no meio do fosso você descobrir que não é capaz de saltá-lo, se for a Dorothy que estiver nas suas costas ela morrerá nas rochas lá embaixo, e se for o Homem de Lata ele ficará muito amassado. Mas se for eu, não haverá problema, porque as quedas não me fazem mal nenhum.
– Eu mesmo estou com o maior medo de cair – disse o Leão Covarde –, mas acho que não há outro remédio a não ser tentar. Suba nas minhas costas e vamos ver o que acontece.
O Espantalho sentou nas costas do Leão, e a grande fera foi até a beirada do fosso e se agachou.
– Por que você não vem correndo e pula? – perguntou o Espantalho.
– Porque não é assim que nós Leões fazemos isso – ele replicou. Então, com um forte impulso, projetou-se no ar e pousou do outro lado a salvo. Todos adoraram ver a facilidade com que fez isso, e depois que o Espantalho desceu de suas costas o Leão saltou o fosso de volta.
Dorothy quis ser a próxima; pegou Totó no colo e montou nas costas do Leão, segurando firme na sua juba com uma das mãos. No instante seguinte, sentiu como se estivesse voando; e então, não deu tempo nem de pensar e já estava a salvo do outro lado. O Leão voltou uma terceira vez e transportou o Homem de Lata, e então todos ficaram um tempo sentados para que a fera descansasse, pois, com os grandes saltos, tinha perdido o fôlego e ficara ofegante como um cachorro grande que corre por muito tempo.
A essa altura, notaram que a floresta era bem mais densa do lado em que estavam, e mais escura e sinistra. Depois que o Leão descansou, retomaram o caminho pela estrada de pedras amare-
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las; iam em silêncio, cada um se perguntando se iriam mesmo conseguir chegar ao final daqueles bosques e ver de novo a luz brilhante do sol. Seu desconforto aumentou quando começaram a ouvir barulhos estranhos nas profundezas da floresta, e o Leão cochichou que era naquela parte do país que viviam os Kalidahs.
– O que são Kalidahs? – perguntou a menina.
– São feras monstruosas com corpo de urso e cabeça de tigre – respondeu o Leão –, e garras tão compridas e afiadas que são capazes de me rasgar em dois com a mesma facilidade com que eu poderia matar Totó. Estou com muito medo dos Kalidahs.
– Não me surpreende que esteja – respondeu Dorothy. –Devem ser feras pavorosas.
O Leão ia responder quando se depararam com outro abismo bloqueando a estrada. Mas esse era tão largo e profundo que o Leão já viu de cara que não seria capaz de saltá-lo. Então, sentaram-se para pensar no que fazer, e depois de pensar bastante o Espantalho disse:
– Veja, temos ali aquela grande árvore, perto da vala. Se o Homem de Lata puder derrubá-la, fazendo com que a parte alta dela caia apoiada do outro lado, será fácil atravessar andando pelo tronco.
– Essa foi uma ideia e tanto! – disse o Leão. – Dá quase para suspeitar que você tem cérebro em vez de palha dentro da cabeça.
O lenhador pôs mãos à obra na mesma hora; seu machado era tão afiado que num instante a árvore já estava quase cortada por inteiro. Então, o Leão usou toda a sua força para empurrar o tronco para a frente com suas fortes patas dianteiras, e aos poucos a grande árvore tombou e caiu com um estrondo sobre o fosso, com seus galhos mais altos apoiados sobre o outro lado.
Mal haviam começado a cruzar aquela estranha ponte quando um rugido agudo fez todos levantarem a cabeça e, para seu horror, viram duas grandes bestas com corpo de urso e cabeça de tigre correndo em sua direção.
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– São os Kalidahs! – disse o Leão Covarde, começando a tremer.
– Depressa! – gritou o Espantalho. – Vamos cruzar depressa. Então Dorothy foi primeiro, com Totó no colo, o Homem de Lata atrás dela e depois o Espantalho. O Leão, embora com certeza estivesse com medo, virou-se para encarar os Kalidahs, e então deu um rugido tão forte e terrível que fez Dorothy soltar um berro e o Espantalho cair de costas. Até as bestas ferozes pararam de repente e olharam para ele abismadas. Mas os Kalidahs, vendo que eram maiores que o Leão e que eram dois contra um, avançaram de novo. O Leão atravessou o fosso pela árvore e então virou-se para ver o que as feras iriam fazer em seguida. Sem se deter um só instante, as ferozes bestas também vinham cruzando o fosso pela árvore. O Leão então disse para Dorothy:
– Estamos perdidos. Eles certamente vão nos triturar com suas garras afiadas. Mas fique bem grudada atrás de mim; vou lutar com eles durante o tempo em que conseguir me manter vivo.
– Espere um pouco! – gritou o Espantalho. Ele estivera pensando no que fazer e então pediu ao lenhador que cortasse fora a ponta da árvore apoiada no lado do fosso em que estavam. O Homem de Lata começou a dar machadadas na mesma hora, e quando os dois Kalidahs estavam quase concluindo a travessia, a árvore caiu com estrondo no fundo do fosso, e levou junto aqueles brutamontes raivosos e horríveis, que acabaram despedaçados ao se espatifarem contra as rochas escarpadas do fundo.
– Bem – disse o Leão Covarde, respirando fundo de alívio –, pelo jeito vamos conseguir viver mais um pouco, e fico feliz com isso, pois deve ser muito desconfortável não estar mais vivo. Essas criaturas me assustaram tanto que meu coração ainda está batendo forte.
– Ah, meu Deus – disse o Homem de Lata com tristeza –, como eu adoraria ter um coração batendo forte...
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Essa aventura deixou os viajantes mais ansiosos do que nunca para sair daquela floresta, e eles andavam tão depressa que Dorothy se cansou e precisou montar na garupa do Leão. Para sua grande alegria, conforme avançavam, as árvores foram ficando menos densas, e à tarde chegaram à margem de um rio bem largo, de correnteza rápida. Do outro lado, podiam ver a estrada de pedras amarelas seguindo por uma linda região, com prados verdes pontuados por flores coloridas e a estrada toda ladeada por árvores cheias de deliciosas frutas. Ficaram muito animados ao ver aquele lindo lugar diante deles.
– E como faremos para atravessar o rio? – perguntou Dorothy.
– Isso é muito fácil – respondeu o Espantalho. – É só o Homem de Lata construir uma balsa de troncos, e então iremos flutuando até a outra margem.
O lenhador então pegou seu machado e começou a derrubar algumas árvores pequenas para fazer uma balsa, e enquanto se ocupava disso o Espantalho descobriu na margem do rio uma árvore cheia de deliciosas frutas. Isso deixou Dorothy encantada, pois não comera nada o dia inteiro, a não ser nozes, e pôde então fazer uma boa refeição à base de frutas maduras.
Só que demora tempo para fazer uma balsa, mesmo alguém habilidoso e incansável como o Homem de Lata, e quando a noite veio o trabalho ainda não tinha sido terminado. Então acharam um lugar aconchegante sob as árvores, onde dormiram muito bem até de manhã; e Dorothy sonhou com a Cidade das Esmeraldas e com o bom Mágico de Oz, que logo haveria de ajudá-la a voltar para casa.
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O campo das papoulas mortíferas
CAPÍTULO VIII
Opequeno grupo de viajantes acordou na manhã seguinte refeito e cheio de esperança, e Dorothy teve um café da manhã de princesa, com os pêssegos e ameixas das árvores à margem do rio. Deixavam para trás a floresta sinistra, que conseguiram atravessar, apesar de todas as peripécias; mas agora tinham diante deles um país adorável e ensolarado, que parecia convidá-los a entrar na Cidade das Esmeraldas. No entanto, ainda havia um rio largo separando-os daquela linda terra. Faltava pouco para terminarem de construir a balsa, e depois que o Homem de Lata cortou mais algumas toras e prendeu-as com pinos de madeira, estavam prontos para partir. Dorothy sentou-se no meio, com Totó no colo. Quando o Leão Covarde, grande e pesado, entrou na balsa, ela se inclinou
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perigosamente; mas o Espantalho e o Homem de Lata ficaram do lado oposto para reequilibrá-la, cada um com uma vara comprida para empurrá-la pela água.
Foram muito bem no início, mas, ao chegarem ao meio do rio, a correnteza rápida começou a levar a balsa embora rio abaixo, cada vez mais longe da estrada de pedras amarelas. E a água foi ficando tão funda que as longas varas não conseguiam mais tocar o leito do rio.
– Isso não é nada bom – disse o Homem de Lata –, porque se não conseguirmos alcançar a outra margem seremos levados até o país da Bruxa Má do Oeste, e ela irá nos enfeitiçar e nos tornar seus escravos.
– E então não vou conseguir meu cérebro – disse o Espantalho.
– E eu não vou conseguir coragem – disse o Leão Covarde.
– E eu vou ficar sem meu coração – disse o Homem de Lata.
– E eu nunca mais vou poder voltar ao Kansas – disse Dorothy.
– Não há dúvida, temos mesmo que conseguir chegar à Cidade das Esmeraldas – continuou o Espantalho, e nessa hora empurrou sua longa vara com tanta força que ela ficou presa na lama do fundo do rio. Então, antes que tivesse tempo de puxá-la de volta, ou de largá-la, a balsa continuou, levada pela correnteza, e o pobre Espantalho ficou para trás, agarrado na vara no meio do rio.
– Adeus! – gritou ele, e todos os outros sentiram pena de deixá-lo lá. Na verdade, o Homem de Lata até começou a chorar, mas felizmente lembrou que isso poderia enferrujá-lo, e então secou logo as lágrimas no avental de Dorothy.
O Espantalho, é claro, ficara numa situação terrível.
“Estou pior agora do que quando Dorothy me encontrou”, pensou ele. “Antes, vivia preso numa estaca no meio de um milharal, onde pelo menos podia fingir que espantava corvos.
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Mas um Espantalho grudado numa vara no meio de um rio com certeza é algo totalmente inútil. Acho que no final das contas vou acabar não conseguindo meu cérebro!”
A balsa continuou flutuando rio abaixo, e o coitado do Espantalho ia ficando cada vez mais longe. Então o Leão disse:
– Precisamos fazer algo para nos salvar. Acho que consigo nadar até a margem e ir puxando a balsa atrás de mim; é só vocês segurarem firme na ponta da minha cauda.
Ele então saltou na água, e o Homem de Lata agarrou firme na sua cauda. O Leão começou a nadar com todas as suas forças em direção à margem. Não foi fácil, mesmo para alguém grande e forte como ele; mas pouco a pouco foram vencendo a correnteza, com a contribuição de Dorothy, que ajudava a empurrar a balsa até a margem com a longa vara do Homem de Lata.
Estavam todos exaustos quando chegaram finalmente à margem e pisaram na linda grama verde. E sabiam também que a correnteza os deixara muito longe da estrada de pedras amarelas que levava à Cidade das Esmeraldas.
– O que faremos agora? – perguntou o Homem de Lata, enquanto o Leão deitava na grama para se secar ao sol.
– Temos que arrumar um jeito de voltar para a estrada – disse Dorothy.
– O melhor plano é andar pela margem do rio até chegar lá de novo – observou o Leão.
Assim, depois do descanso, Dorothy pegou sua cesta e seguiram pela margem gramada, de volta ao ponto de onde a correnteza os arrastara. Era um caminho lindo, com muitas flores e árvores frutíferas, alegradas pelo Sol. Não fosse a tristeza pelo destino do pobre Espantalho, poderiam até estar felizes.
Caminhavam o mais rápido possível, e Dorothy parou apenas uma vez para pegar uma flor encantadora. Depois de um tempo, o Homem de Lata gritou: – Vejam!
Então todos olharam para o rio e viram o Espantalho ainda encarapitado na vara lá no meio, triste e solitário.
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– O que será que poderíamos fazer para salvá-lo? – perguntou Dorothy.
O Leão e o lenhador abanaram a cabeça, pois não sabiam o que fazer. Sentaram então todos na margem do rio, olhando na maior tristeza para o Espantalho, até que uma cegonha passou por ali voando, e ao vê-los parou para descansar à beira d’água.
– Quem são vocês e para onde vão? – perguntou a Cegonha.
– Eu sou Dorothy – respondeu a menina – e esses são os meus amigos, o Homem de Lata e o Leão Covarde; estamos indo para a Cidade das Esmeraldas.
– Mas o caminho não é esse – disse a Cegonha, inclinando seu longo pescoço e examinando detidamente aquele estranho grupo.
– Eu sei – retrucou Dorothy –, mas perdemos o Espantalho, e estamos aqui tentando achar um jeito de resgatá-lo.
– Onde está ele? – perguntou a Cegonha.
– Lá no meio do rio – respondeu a garotinha.
– Se não fosse tão grande e pesado eu iria lá e o traria de volta – disse a Cegonha.
– Ele não é nem um pouco pesado – disse Dorothy animada. – É recheado de palha; e se você o trouxer de volta, vamos ficar infinitamente gratos.
– Bem, posso tentar – disse a Cegonha –, mas se sentir que é pesado demais, vou ter que soltá-lo de novo no rio.
A grande ave levantou voo e atravessou a água até onde estava o Espantalho encarapitado na vara. Então, com suas grandes garras, a Cegonha agarrou-o pelo braço e carregou-o pelos ares até a margem, onde estavam sentados Dorothy, o Leão, o Homem de Lata e Totó.
Ao ver-se rodeado de novo por seus amigos, o Espantalho ficou tão feliz que abraçou todos, até o Leão e Totó, e quando saíram andando juntos pôs-se a cantar na maior alegria.
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– Fiquei com medo de ser esquecido para sempre lá no meio do rio – disse ele –, mas essa bondosa Cegonha me salvou, e se um dia eu conseguir um cérebro vou encontrá-la de novo e retribuir a sua bondade.
– Está tudo certo – disse a Cegonha, que voava junto deles. – Eu sempre gosto de ajudar quando vejo alguém em apuros. Mas agora preciso ir embora, porque meus filhotes estão esperando eu voltar para o ninho. Espero que encontrem a Cidade das Esmeraldas e que Oz os ajude.
– Obrigada – replicou Dorothy, e então a bondosa Cegonha saiu voando e logo a perderam de vista.
Continuaram caminhando, ouvindo o canto daqueles pássaros de belas cores e apreciando as lindas flores, que agora eram tantas que cobriam o chão como um tapete. Havia flores grandes, amarelas, brancas, azuis e roxas, junto de grandes extensões de papoulas vermelhas, de cor tão brilhante que quase ofuscavam os olhos de Dorothy.
– Elas não são lindas? – perguntou a menina, sentindo o aroma denso daquelas flores de cores vivas.
– Acho que sim – respondeu o Espantalho. – Quando eu tiver cérebro, provavelmente vou gostar ainda mais delas.
– E se eu pelo menos tivesse um coração, com certeza iria amá-las muito – acrescentou o Homem de Lata.
– Sempre gostei de flores – disse o Leão. – Elas parecem tão indefesas e frágeis. Mas nunca vi flores de cores tão vivas como estas na floresta.
A partir de certo ponto, passaram a ver cada vez mais e mais daquelas grandes papoulas vermelhas, e cada vez menos das outras flores. De uma hora para outra, estavam no meio de uma extensa campina de papoulas. Como todos sabem, quando há muitas dessas flores juntas seu aroma é tão poderoso que quem o respira cai adormecido, e se a pessoa não for carregada para longe do aroma das flores, dormirá para sempre. Mas Dorothy não sabia disso, e não conseguia ir embora nem ficar
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longe daquelas lindas flores vermelhas espalhadas por todos os lados; então seus olhos começaram a ficar pesados e ela sentiu vontade de sentar para descansar e dormir. Mas o Homem de Lata não permitiu.
– Precisamos nos apressar e voltar para a estrada das pedras amarelas antes que escureça – disse ele; e o Espantalho concordou. Então continuaram andando, mas uma hora Dorothy não resistiu mais. Os olhos dela se fecharam contra a sua vontade e ela esqueceu onde estava e caiu no meio das papoulas, totalmente adormecida.
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– O que faremos agora? – perguntou o Homem de Lata.
– Se a deixarmos aqui ela morrerá – disse o Leão. – O aroma das flores está matando todos nós. Eu mesmo mal consigo ficar de olho aberto, e o cachorro já caiu no sono.
Era verdade; Totó dormia deitado ao lado da sua dona.
Mas o Espantalho e o Homem de Lata, como não eram feitos de carne e osso, nem se incomodaram com o aroma das flores.
– Corra o mais rápido que puder – disse o Espantalho para o Leão. – Saia desse canteiro de flores mortífero o quanto antes. Vamos trazer a garotinha conosco, mas você é muito grande, se cair no sono não teremos como carregá-lo.
Então o Leão espantou o sono e avançou o mais rápido que pôde. Num instante já tinha sumido de vista.
– Vamos fazer uma cadeirinha com as mãos e carregar a menina – disse o Espantalho. Então puseram Totó no colo de Dorothy, fizeram uma cadeirinha com as mãos e carregaram a garota adormecida pelo campo florido.
Andaram e andaram, e parecia que aquele tapete de flores mortíferas em volta deles não ia acabar nunca. Acompanharam a curva do rio, e por fim reencontraram seu amigo Leão, dormindo um sono pesado no meio das papoulas. As flores mostraram-se poderosas até mesmo contra aquele animal imenso, que finalmente sucumbiu e caiu, quando faltava bem pouco para a campina de papoulas dar lugar àquela relva macia que se estendia em lindos campos verdes diante deles.
– Não temos como ajudá-lo de nenhum jeito – disse o Homem de Lata, com tristeza –, ele é pesado demais para erguer. Vamos ter que deixá-lo aqui, dormindo para sempre, e talvez ele sonhe que finalmente encontrou coragem.
– Fico triste – disse o Espantalho. – O Leão era um bom companheiro, mesmo sendo muito covarde. Mas vamos embora.
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Eles carregaram a garota adormecida até um lugar lindo junto ao rio, longe o suficiente das papoulas para evitar que respirasse mais daquele aroma venenoso das flores, e ali a deitaram delicadamente na relva macia e esperaram que a brisa fresca a acordasse.
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A Rainha dos Ratinhos
CAPÍTULO IX
Não devemos estar muito longe da estrada das pedras amarelas agora – observou o Espantalho, em pé ao lado da menina –, porque já voltamos andando quase a mesma distância que fomos arrastados pela correnteza. O Homem de Lata ia responder quando ouviu um rosnado grave, e ao virar a cabeça (que deslizava maravilhosamente bem sobre as juntas) viu um animal estranho vindo aos saltos pela relva na direção deles. Era um grande gato-do-mato amarelo, e o lenhador achou que o bicho devia estar caçando algo, pois vinha com as orelhas deitadas rente à cabeça e a boca escancarada, mostrando duas fileiras de dentes ameaçadores, e seus olhos brilhavam como bolas de fogo. Ao chegar mais perto, o Homem de Lata viu que correndo à frente da fera havia um pequeno rato do campo cinza, e mesmo não tendo coração sabia que era uma coisa feia um gato-do-mato tentar matar uma criatura tão bonita e inofensiva.
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Então, o lenhador ergueu seu machado e, quando o gatodo-mato passou correndo por ele, deu-lhe um golpe certeiro que arrancou a cabeça da fera, fazendo os dois pedaços do animal rolarem a seus pés.
O rato do campo, agora livre de seu inimigo, parou de repente; e então foi andando devagar até o Homem de Lata e disse, com voz bem agudinha:
– Oh, muito obrigado! Agradeço muito ter salvado minha vida.
– Ah, o que é isso, não foi nada – retrucou o lenhador.
– Sabe, eu não tenho coração, por isso tento ajudar todos aqueles que podem precisar de um amigo, mesmo que seja um simples ratinho.
– Simples ratinho! – gritou o bichinho, indignado. – Pois saiba que sou uma rainha! A Rainha de todos os ratos do campo!
– Nossa, é mesmo? – disse o Homem de Lata, fazendo uma reverência.
– Portanto, você acabou de realizar uma grande façanha, um feito muito corajoso, ao salvar minha vida – acrescentou a Rainha.
Nessa hora, vários ratinhos chegaram correndo, o máximo que suas perninhas permitiam, e quando viram sua Rainha exclamaram:
– Oh, Majestade, pensamos que iria ser morta! Como conseguiu escapar do grande gato-do-mato? – Todos fizeram uma reverência tão profunda à pequena Rainha que quase deram uma cambalhota para a frente.
– Este homem engraçado, feito de lata – ela respondeu.
– Ele matou o gato-do-mato e salvou minha vida. Portanto, de agora em diante, todos vocês devem servi-lo e atender aos seus mínimos desejos.
– Faremos isso! – gritaram os ratinhos, num coro estridente. E então saíram correndo em todas as direções, pois Totó acordara de seu sono e ao ver todos aqueles ratinhos em volta dele deu um latido de satisfação e saltou bem no meio do bando. Totó
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adorava caçar ratos quando estava no Kansas, e não via nenhum mal nisso. Mas o Homem de Lata pegou o cachorro no colo e segurou-o bem firme, gritando para os ratinhos:
– Voltem aqui! Voltem! Totó não vai lhes fazer mal.
Ouvindo isso, a Rainha dos Ratinhos espichou a cabeça para fora de um tufo de grama e perguntou, hesitante:
– Tem certeza que ele não vai morder nenhum de nós?
– Eu não vou deixar – disse o lenhador –, não tenham medo.
Um por um, os ratinhos foram voltando, e Totó não latiu mais, embora tentasse algumas vezes escapar dos braços do Homem de Lata. Até pensou em lhe dar uma boa mordida, mas desistiu porque já sabia muito bem que ele era feito de lata. Finalmente, um dos ratinhos maiores falou:
– Há algo que possamos fazer como retribuição por ter salvado a vida da nossa Rainha?
– Nada que eu saiba – respondeu o lenhador; mas o Espantalho, que vinha tentando pensar, mas sem sucesso por causa de sua cabeça recheada de palha, disse:
– Ah, sim! Vocês poderiam salvar nosso amigo, o Leão Covarde, que está adormecido no campo de papoulas.
– Um Leão! – gritou a pequena Rainha. – De jeito nenhum! Ele iria comer todos nós.
– Não, não – disse o Espantalho. – Esse Leão é covarde.
– Verdade? – perguntou a Rainha.
– Ele mesmo admite – respondeu o Espantalho –, e nunca iria machucar ninguém que fosse nosso amigo. Se nos ajudarem, prometo que ele será bonzinho com todos vocês.
– Está bem – disse a Rainha –, vamos acreditar em você. Mas o que devemos fazer?
– Esses ratinhos que a chamam de Rainha – perguntou o Espantalho – e que se dispõem a obedecer-lhe, eles são muitos?
– Ah, sim! Milhares e milhares – ela respondeu.
– Então reúna todos aqui o mais rápido possível, e diga para cada um trazer um pedaço comprido de barbante.
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A Rainha virou-se para os ratinhos que a acompanhavam e mandou-os reunir todo o seu povo imediatamente. Assim que ouviram as ordens, saíram correndo em todas as direções. – Agora – disse o Espantalho ao Homem de Lata –, vá até aquelas árvores junto à margem do rio e faça uma carreta para transportar o Leão.
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Na mesma hora, o lenhador foi até as árvores e começou a trabalhar; e não demorou a montar uma carreta com os troncos das árvores, cujas folhas e galhos ele cortou fora. Ele uniu os troncos com pinos de madeira e fez as quatro rodas com fatias de um grande tronco. Trabalhou tão bem e tão rápido que quando os ratinhos começaram a chegar a carreta já estava pronta. Os ratinhos vieram de todas as direções, e eram milhares: ratos grandes, pequenos e de tamanho médio; e cada um trazia na boca um pedaço de barbante. Foi mais ou menos nessa hora que Dorothy acordou de seu longo sono e abriu os olhos. Ela ficou muito espantada quando se viu deitada na grama com milhares de ratos em volta, olhando para ela tímidos e curiosos. Mas o Espantalho explicou-lhe tudo e, apontando para a pomposa pequena ratinha, disse:
– Permita-me apresentar-lhe Sua Majestade, a Rainha. Dorothy fez um aceno de cabeça cortês e a Rainha retribuiu com uma reverência solene, e depois disso ficaram bem amigas.
O Espantalho e o Homem de Lata começaram então a amarrar os ratinhos à carreta, usando os barbantes que eles haviam trazido. Uma ponta do barbante era presa em volta do pescoço de cada ratinho e a outra à carreta. Esta, é claro, era mil vezes maior que qualquer um dos ratinhos que iriam puxá-la; mas quando todos os ratinhos estavam atrelados, foram capazes de puxá-la com bastante facilidade. O Espantalho e o Homem de Lata até sentaram na carreta, e vieram arrastados rapidamente por seus estranhos cavalinhos até o lugar onde o Leão dormia.
Com muito esforço, porque o Leão era pesado, conseguiram colocá-lo em cima da carreta. Então, a Rainha apressou-se em dar ao seu povo a ordem de começar a puxar, pois tinha receio de que os ratos acabassem também adormecendo se ficassem muito tempo cheirando o perfume das papoulas. No começo, aquelas pequenas criaturas, embora em grande número, mal conseguiam tirar do lugar aquela carreta com
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carga pesada; mas o Homem de Lata e o Espantalho ajudaram a empurrá-la por trás, e correu tudo muito bem. Em pouco tempo, conseguiram tirar o Leão do canteiro de papoulas e trazê-lo para os campos gramados, onde ele respirou ar fresco de novo, em vez do aroma venenoso daquelas flores.
Dorothy veio encontrá-los e agradeceu aos ratinhos, emocionada por terem salvado seu companheiro da morte. Ela tinha ficado muito amiga daquele grande leão e estava feliz por ele ter sido salvo.
Então os ratinhos foram desatrelados da carreta e saíram correndo pela grama para as suas casas. A Rainha dos Ratinhos foi a última a ir embora.
– Se precisarem de nós de novo – disse ela – vão até o campo e chamem. Nós iremos ouvi-los e viremos ajudá-los. Adeus!
– Adeus! – responderam todos, e a Rainha foi embora correndo, enquanto Dorothy segurava Totó bem forte, para que não corresse atrás dela e a assustasse.
Depois disso, sentaram-se ao lado do Leão para esperar que acordasse; e o Espantalho trouxe para Dorothy algumas frutas de uma árvore próxima, que ela comeu como jantar.
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CAPÍTULO X
O Guardião dos Portões
OLeão Covarde ainda demorou a acordar, pois passara muito tempo deitado entre as papoulas, respirando sua fragrância mortífera; mas quando abriu os olhos e rolou para fora da carreta, alegrou-se ao ver que estava vivo.
– Corri o mais que pude – disse ele, sentando e bocejando –, mas o aroma das flores era muito forte. Como vocês conseguiram me tirar de lá?
Eles então contaram sobre os ratos do campo, que haviam sido generosos em salvá-lo da morte; o Leão Covarde então riu e disse:
– Eu sempre me achei grandão e terrível; e, vejam só, estas flores tão pequeninas quase conseguiram me matar, e animais pequenos como esses ratinhos salvaram minha vida. Como tudo isso é estranho! Mas, companheiros, o que vamos fazer agora?
– Temos que continuar andando até encontrarmos de novo a estrada das pedras amarelas
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– disse Dorothy –, e depois seguir viagem até a Cidade das Esmeraldas.
Agora, com o Leão já totalmente recuperado e sentindo-se outra vez ele mesmo, retomaram a jornada, desfrutando com muita alegria daquela caminhada pela relva macia e fresca. Em pouco tempo já estavam de novo na estrada das pedras amarelas, rumo à Cidade das Esmeraldas, onde morava o Grande Oz.
A estrada agora era plana e bem pavimentada, com uma linda paisagem, e os viajantes ficaram felizes por terem deixado a floresta para trás e, com ela, os vários perigos que haviam enfrentado em suas sinistras sombras. De novo, viam cercas à beira da estrada, mas agora pintadas de verde. A certa altura, viram uma primeira casinha, certamente de algum fazendeiro, também pintada de verde. Passaram por várias dessas casas ao
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longo da tarde, e às vezes algumas pessoas vinham até a porta e olhavam para eles como se quisessem perguntar alguma coisa; mas ninguém ousava chegar perto ou falar com o grupo, por causa do grande Leão, que lhes metia muito medo. Todas as pessoas vestiam roupas de uma bela cor verde-esmeralda e usavam chapéus pontiagudos, como os dos Munchkins.
– Esta deve ser a Terra de Oz – disse Dorothy –, e com certeza estamos chegando à Cidade das Esmeraldas.
– Sim – respondeu o Espantalho. – Aqui tudo é verde, e lá no País dos Munchkins a cor favorita é o azul. Mas as pessoas daqui não parecem ser tão amigáveis como os Munchkins, e receio que a gente não consiga arrumar um lugar para passar a noite.
– Eu gostaria de comer alguma coisa além de frutas – disse a menina –, e com certeza o Totó está morrendo de fome. Vamos parar na próxima casa e falar com as pessoas.
Assim, quando chegaram a uma casa de fazenda de tamanho razoável, Dorothy caminhou decidida até lá e chamou.
Uma mulher abriu a porta, apenas o suficiente para poder olhar para fora, e disse:
– O que você quer, menina, e o que faz esse Leão enorme do seu lado?
– Queremos passar a noite com vocês, se nos permitirem –respondeu Dorothy. – O Leão é meu amigo e companheiro de viagem, e não vai machucar ninguém por nada deste mundo.
– É manso? – perguntou a mulher, abrindo a porta um pouco mais.
– É manso, sim – disse a menina –, e é muito covarde também. Vai sentir mais medo da senhora do que a senhora dele.
– Bem – disse a mulher, depois de refletir um pouco e de dar mais uma olhada no Leão –, já que é assim, podem entrar; vou dar-lhes algo de comer e um lugar para dormir.
Então, entraram todos na casa, onde havia, além da mulher, duas crianças e um homem. O homem tinha machucado a perna, e estava deitado em um sofá, num canto. Todos ficaram
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muito surpresos ao ver um grupo tão estranho; e enquanto a mulher se ocupava de arrumar a mesa, o homem perguntou:
– Para onde estão indo?
– Para a Cidade das Esmeraldas – disse Dorothy. –Queremos ver o Grande Oz.
– É mesmo?! – exclamou o homem. – Têm certeza de que Oz irá recebê-los?
– E por que não o faria? – ela retrucou.
– Bem, dizem que ele nunca recebe ninguém. Já estive várias vezes na Cidade das Esmeraldas, é um lugar muito bonito, cheio de coisas maravilhosas; mas nunca me deixaram ver o Grande Oz, e tampouco conheço nenhuma criatura viva que o tenha visto.
– Ele nunca aparece em público? – perguntou o Espantalho.
– Nunca. Fica sentado, dia após dia, na grande Sala do Trono do seu palácio, e mesmo aqueles que o servem nunca estiveram cara a cara com ele.
– Como ele é? – perguntou a menina.
– Difícil dizer – observou o homem, pensativo. – Veja bem, Oz é um Grande Mágico, e pode assumir a forma que quiser. Assim, alguns dizem que parece um pássaro, outros dizem que é como um elefante; e outros ainda o descrevem como um gato. Para algumas pessoas ele se mostra como uma bela fada, ou como um duende, ou sob qualquer outra forma que lhe agrade. Mas quem é o verdadeiro Oz, em sua forma própria, nenhuma criatura viva pode dizer.
– Isso é bem estranho – disse Dorothy –, mas devemos tentar vê-lo, seja qual for a forma que assuma, senão nossa viagem terá sido em vão.
– Por que vocês querem tanto ver o terrível Oz? – perguntou o homem.
– Eu quero que ele me dê um cérebro – disse o Espantalho, ansioso.
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– Ah, isso para ele é fácil – declarou o homem. – Ele tem cérebro de sobra.
– E eu quero que ele me dê um coração – disse o Homem de Lata.
– Isso também não é problema pra ele – continuou o homem –, porque Oz tem uma vasta coleção de corações, de todos os tamanhos e formatos.
– E eu quero que ele me dê coragem – disse o Leão Covarde.
– Oz guarda um grande vaso cheio de coragem em sua Sala do Trono – disse o homem –, que ele mantém coberto por uma travessa de ouro, para evitar que transborde. Vai ficar contente em poder lhe dar um pouco.
– E eu quero que me mande de volta para o Kansas –disse Dorothy.
– Onde fica o Kansas? – perguntou o homem, surpreso.
– Eu não sei – replicou Dorothy, triste –, mas é onde eu moro, e tenho certeza de que fica em algum lugar.
– É muito provável. Bem, Oz pode fazer qualquer coisa; portanto, suponho que irá encontrar o Kansas para você. Mas, primeiro, vocês têm que conseguir vê-lo, e isso será uma tarefa difícil, porque o Grande Mágico não gosta de ver ninguém, e costuma fazer as coisas apenas do seu jeito. Mas e você, o que quer? – continuou ele, falando com Totó. O cachorrinho apenas abanou o rabo, porque, embora seja estranho dizer isso, ele não era capaz de falar.
A mulher anunciou que o jantar estava pronto. Eles se juntaram em volta da mesa e Dorothy saboreou um mingau delicioso e um prato de ovos mexidos, além de pão bem quentinho, e adorou a refeição. O Leão comeu um pouco de mingau, mas não gostou, comentou que aveia era comida de cavalo, e não de Leão. O Espantalho e o Homem de Lata não comeram nada. Totó comeu um pouco de tudo, e estava feliz por ver comida de novo.
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A mulher ofereceu então uma cama para Dorothy, e Totó deitou ao lado dela, enquanto o Leão guardava a porta do quarto para que ela não fosse incomodada. O Espantalho e o Homem de Lata ficaram em pé num canto, quietos a noite inteira, embora, é claro, nunca dormissem.
Na manhã seguinte, assim que o Sol apareceu, retomaram a jornada, e logo viram bem diante deles um lindo clarão verde no céu.
– Deve ser a Cidade das Esmeraldas – disse Dorothy. Conforme andavam, o clarão verde ia ficando cada vez mais brilhante, e parecia que finalmente haviam chegado ao seu destino. Mas já era de tarde quando se depararam com o grande muro verde que cercava a cidade. Um muro alto e sólido, de um verde vivo.
À frente deles, no final da estrada de pedras amarelas, viram um grande portão, todo incrustado de esmeraldas, tão reluzentes ao sol que até os olhos pintados do Espantalho ficaram ofuscados por seu brilho.
Junto ao portão havia uma campainha. Dorothy apertou o botão e ouviu o tilintar de sinos lá dentro. Então, o grande portão se abriu devagar, e eles entraram numa sala alta com arcos, cujas paredes cintilavam com inúmeras esmeraldas.
Diante deles, viram um homem mais ou menos da mesma altura de um Munchkin. Vestia-se de verde da cabeça aos pés, e até sua pele tinha um tom esverdeado. Ao lado dele havia uma grande caixa verde.
O homem, ao ver Dorothy e seus companheiros, perguntou:
– O que vocês desejam aqui na Cidade das Esmeraldas?
– Viemos ver o Grande Oz – disse Dorothy.
O homem ficou tão surpreso com essa resposta que até se sentou para pensar um pouco.
– Faz muitos anos que ninguém me pede para ver Oz – disse ele, abanando a cabeça perplexo. – Ele é poderoso e
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terrível, e se vocês vêm trazendo algum pedido fútil ou estúpido, que possa interromper as sábias reflexões do Grande Mágico, ele pode ficar furioso e destruir todos vocês em um segundo.
– Mas não é um pedido estúpido, nem fútil – respondeu o Espantalho –, é bem importante. E disseram que Oz é um mágico boa gente.
– De fato, é – disse o homem verde –, e ele governa a Cidade das Esmeraldas muito bem, com muita sabedoria. Mas com aqueles que não são honestos ou que o procuram por mera curiosidade ele se mostra terrível, e são pouquíssimos aqueles que ousaram pedir para ver seu rosto. Eu sou o Guardião dos Portões e, como vocês estão pedindo para ver o Grande Oz, é meu dever conduzi-los ao seu palácio. Mas primeiro precisam colocar os óculos.
– Por quê? – perguntou Dorothy.
– Porque se não usarem óculos serão cegados pelo brilho e esplendor da Cidade das Esmeraldas. Mesmo os moradores da Cidade têm que usá-los, noite e dia. São óculos que ficam fixos, fechados a chave, porque Oz ordenou que fosse feito assim quando a cidade foi construída, e eu guardo a única chave capaz de abri-los.
Ele abriu a grande caixa e Dorothy viu que estava cheia de óculos, de todos os tamanhos e formatos. Todos de lentes verdes. O Guardião dos Portões escolheu um par que se ajustasse bem a Dorothy e colocou-o nela. Os óculos tinham duas alças de ouro que se juntavam atrás da cabeça, e eram fechadas a chave. Essa chave ficava guardada na ponta de uma correntinha que o Guardião dos Portões usava em volta do pescoço. Depois que os óculos foram colocados, Dorothy não podia mais tirá-los, mesmo que quisesse; mas, é claro, ela não queria ser cegada pelo esplendor da Cidade das Esmeraldas, então nem reclamou.
Em seguida o homenzinho verde colocou óculos também no Espantalho, no Homem de Lata e no Leão, e até em Totó; e
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todos os óculos foram bem trancados à chave. O Guardião dos Portões também colocou seus óculos e disse que iria levá-los até o palácio. Tirou uma grande chave dourada de um prego da parede, abriu outro portão e foram todos atrás dele pelas ruas da Cidade das Esmeraldas.
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CAPÍTULO XI
A maravilhosa cidade de Oz
No início, mesmo com os olhos protegidos pelos óculos verdes, Dorothy e seus amigos ficaram deslumbrados pelo brilho daquela maravilhosa cidade. As ruas abrigavam dos dois lados casas de mármore verde, cravejadas por toda parte de esmeraldas cintilantes. As calçadas eram do mesmo mármore verde, e onde as lajotas do piso se juntavam havia fileiras de esmeraldas, bem perto umas das outras, cintilando ao sol. As vidraças das janelas eram verdes, o céu tinha um tom esverdeado e até os raios do Sol eram verdes.
Havia muitas pessoas, homens, mulheres e crianças, andando por ali, todas vestidas de verde e com tom de pele esverdeado. Olhavam curiosas para Dorothy e para aquele seu grupo tão estranho e variado, e as crianças corriam e se escondiam atrás das mãe s quando viam o Leão; mas ninguém falou com eles. Havia muitas lojas na rua, e Dorothy viu que tudo que vendiam
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era verde. Doces e pipocas verdes, sapatos verdes, chapéus e roupas verdes de todo tipo. Numa das lojas, um homem vendia limonada verde, e Dorothy viu algumas crianças comprando e pagando com moedinhas verdes.
Parecia não haver cavalos ou animais de nenhum tipo; os homens carregavam suas coisas para cima e para baixo em carrinhos verdes, que eles mesmos puxavam. Todos pareciam felizes, satisfeitos e prósperos.
O Guardião dos Portões foi guiando-os pelas ruas até chegarem a um grande edifício, bem no meio da cidade, que era o Palácio de Oz, o Grande Mágico. Havia um soldado na porta, de uniforme verde e com uma longa barba verde.
– São forasteiros – disse o Guardião dos Portões – e pedem para ver o Grande Oz.
– Entrem – respondeu o soldado – e levem sua mensagem. Entraram então pelos portões do palácio e foram conduzidos a uma grande sala com um tapete verde e uma linda mobília verde com esmeraldas incrustadas. O soldado fez todos limparem os pés em um capacho verde antes de entrarem na sala, e quando se sentaram, disse, amavelmente:
– Por favor, fiquem à vontade enquanto vou até a porta da Sala do Trono e digo a Oz que vocês estão aqui.
Tiveram que esperar um longo tempo até o soldado voltar. Quando ele finalmente voltou, Dorothy perguntou:
– Você viu Oz?
– Oh, não – respondeu o soldado –, eu nunca o vi. Mas falei com ele, que estava sentado atrás de seu biombo, e passei sua mensagem. Ele disse que irá recebê-los, se desejarem; mas que atenderá um por vez, e apenas um por dia. Portanto, como terão que permanecer no palácio por vários dias, vou mostrar-lhes os quartos onde poderão descansar da viagem com todo o conforto.
– Obrigada – disse a menina –, é muito gentil da parte de Oz.
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O soldado então soprou um apito verde e, na mesma hora, uma jovem com um lindo vestido de seda verde entrou na sala. Tinha cabelo e olhos verdes muito bonitos, e fez uma profunda reverência a Dorothy dizendo:
– Siga-me, vou lhe mostrar seu quarto.
Então, Dorothy despediu-se de seus amigos, com exceção de Totó, que ela pegou no colo, e acompanhou a moça verde por sete passagens e três lances de escadas, até que chegaram a um quarto na frente do palácio. Era o quartinho mais lindo do mundo, com uma cama confortável e macia, coberta por lençóis de seda verde e por uma colcha verde de veludo. Havia uma pequena fonte no meio do quarto, de onde um jato de perfume verde era borrifado no ar e caía numa bacia de mármore também verde, lindamente esculpida. Flores verdes magníficas enfeitavam as janelas, e havia uma prateleira com uma fileira de livrinhos verdes. Quando Dorothy teve tempo de folheá-los, descobriu que eram cheios de curiosas gravuras verdes, muito engraçadas, que a fizeram rir muito.
Dentro de um guarda-roupa, encontrou muitos vestidos verdes, de seda e veludo; e todos ficavam muito bem nela.
– Sinta-se perfeitamente em casa – disse a moça verde –, e se precisar de alguma coisa, é só tocar a campainha. Oz mandará chamá-la amanhã de manhã.
Ela deixou Dorothy sozinha e voltou para cuidar dos outros. Conduziu-os também aos seus aposentos, e cada um deles viu-se alojado em alguma parte muito agradável do palácio. É claro que, no caso do Espantalho, essa gentileza foi algo supérfluo, porque quando ele se viu sozinho em seu quarto ficou como um tonto, em pé, no mesmo lugar, no corredor de entrada, esperando a manhã chegar. Deitar não iria fazê-lo descansar, e ele tampouco era capaz de fechar os olhos. Então, ele passou a noite toda olhando para uma pequena aranha que tecia sua teia num canto do quarto, como se aquele não fosse um dos aposentos mais maravilhosos do mundo. O Homem
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de Lata deitou na cama por força do hábito, pois ainda lembrava de quando era feito de carne e osso, mas, como não era capaz de dormir, passou a noite mexendo suas juntas para lá e para cá, garantindo que continuassem funcionando bem. O Leão teria preferido uma cama de folhas secas na floresta, e não gostou de ficar trancado num quarto, mas tinha bom senso suficiente para não se preocupar com isso, então pulou na cama, se enroscou como um gato, ronronou e logo depois já estava dormindo.
Na manhã seguinte, depois do café da manhã, a moça verde veio buscar Dorothy, e a fez usar um dos vestidos mais lindos, de cetim verde com brocados. Dorothy vestiu também um aventalzinho verde de seda e amarrou uma fita verde em volta do pescoço de Totó, e foram para a Sala do Trono do Grande Oz. Primeiro, passaram por uma grande sala, cheia de damas e cavalheiros da corte, todos muito elegantes. Essas pessoas não faziam nada a não ser conversar, mas iam lá toda manhã e ficavam esperando do lado de fora da Sala do Trono, embora nunca tivessem permissão para ver Oz. Quando Dorothy entrou, olharam-na com curiosidade, e um deles cochichou para ela:
– Você veio realmente olhar o rosto do terrível Oz?
– Claro – respondeu a menina –, desde que ele me receba.
– Ah, com certeza irá recebê-la – disse o soldado que havia levado sua mensagem ao Mágico –, embora ele não goste que venham pedir para vê-lo. Na verdade, de início, ele ficou irritado e disse para mandá-la embora para o lugar de onde você tinha vindo. Depois me perguntou como você era, e quando mencionei seus sapatos brilhantes, ficou muito interessado. Em seguida, falei da marca que você tem na testa, e então ele decidiu admiti-la à sua presença.
Naquele instante soou uma campainha, e a moça verde disse a Dorothy:
– Esse é o sinal. Você deve entrar na Sala do Trono sozinha.
A moça abriu uma portinha e Dorothy entrou decidida, e viu-se em um lugar maravilhoso. Era uma sala grande, re-
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donda, com um teto alto em arco, e tanto as paredes quanto o teto e o chão eram recobertos por grandes esmeraldas, muito próximas umas das outras. No centro do teto havia uma grande luz, brilhante como o Sol, que fazia as esmeraldas cintilarem de maneira deslumbrante.
Mas o que mais chamou a atenção de Dorothy foi o grande trono de mármore verde que ficava no meio da sala. Tinha a forma de uma cadeira e reluzia com pedras preciosas, como todo o resto. No centro da cadeira havia uma cabeça enorme, sem corpo para sustentá-la e sem braços nem pernas. A cabeça não tinha cabelo, mas tinha olhos, nariz e boca, e era maior do que a cabeça do maior dos gigantes.
Enquanto Dorothy admirava aquilo com espanto e medo, os olhos da cabeça giraram lentamente e se voltaram para ela, firmes e fixos. Então, a boca se mexeu e Dorothy ouviu uma voz que disse:
– Sou Oz, o Grande e Terrível. Quem é você e por que veio me procurar?
Não era uma voz tão terrível como ela esperava que fosse sair daquela cabeça enorme, então criou coragem e respondeu:
– Sou Dorothy, a Pequena e Humilde. Vim procurá-lo para pedir ajuda.
Os olhos ficaram um minuto inteiro fitando-a, pensativos. Então, a voz disse:
– Onde você conseguiu esses sapatos brilhantes?
– Eram da Bruxa Má do Leste, e fiquei com eles depois que a minha casa caiu em cima dela e a matou – respondeu a menina.
– E onde arranjou essa marca na sua testa? – continuou a voz.
– É onde a Bruxa Boa do Norte me beijou quando se despediu de mim e me mandou procurá-lo – disse a menina. De novo, os olhos se fixaram nela, firmes, e viram que estava dizendo a verdade. Então, Oz perguntou:
– O que você deseja que eu faça?
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– Que me mande de volta para o Kansas, onde estão minha Tia Em e meu Tio Henry – respondeu ela, séria. – Não gosto do seu país, embora seja muito bonito. E tenho certeza de que a Tia Em deve estar terrivelmente preocupada por eu estar ausente há tanto tempo.
Os olhos piscaram três vezes e então olharam para o teto e depois para o chão e ficaram revirando de um jeito tão bizarro que pareciam querer reparar em cada detalhe da sala. Finalmente, eles pararam e fitaram Dorothy de novo.
– Por que eu deveria fazer isso por você? – perguntou Oz.
– Porque você é forte e eu sou fraca; porque você é o Grande Mágico e eu sou só uma garotinha.
– Mas você foi forte o suficiente para matar a Bruxa Má do Leste – disse Oz.
– Foi sem querer – retrucou Dorothy com simplicidade –, não tive como evitar.
– Bem – disse a cabeça –, vou lhe dar minha resposta. Você não tem o direito de esperar que eu mande você de volta para o Kansas a não ser que faça algo por mim em troca. Neste país todo mundo tem que pagar por tudo o que recebe. Se você quer que eu use meus poderes mágicos para mandá-la de volta para casa, deve fazer algo por mim primeiro. Se me ajudar, ajudarei você.
– O que eu tenho que fazer? – perguntou a menina.
– Matar a Bruxa Má do Oeste – respondeu Oz.
– Mas eu não posso! – exclamou Dorothy, muito surpresa.
– Você matou a Bruxa do Leste e está usando os sapatos brilhantes dela, que têm um feitiço poderoso. Agora sobrou apenas uma Bruxa Má em toda esta terra, e quando me disser que ela está morta, mandarei você de volta para o Kansas. Antes disso, não. A garotinha começou a chorar, estava muito decepcionada; os olhos então piscaram de novo e se voltaram para ela ansiosos, como se o Grande Oz achasse que ela poderia ajudá-lo se quisesse.
– Nunca matei ninguém de propósito – disse Dorothy, soluçando. – Mesmo que quisesse fazê-lo, como poderia matar
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a Bruxa Má? Se você, que é o Grande e Terrível, não foi capaz de matá-la, como espera que eu consiga?
– Não sei – disse a cabeça –, mas a minha resposta é essa, e até que a Bruxa Má morra, você não verá seu tio e sua tia de novo. Lembre-se que ela é má... tremendamente má; e que precisa ser morta. Agora vá, e não peça para me ver de novo antes de ter cumprido sua tarefa.
Na maior tristeza, Dorothy saiu da Sala do Trono e voltou para onde o Leão, o Espantalho e o Homem de Lata a esperavam para ouvir o que Oz havia dito.
– Perdi as esperanças – disse ela muito triste –, porque Oz não vai me mandar pra casa a não ser que eu mate a Bruxa Má do Oeste; e isso eu não vou fazer jamais.
Seus amigos ficaram aborrecidos, mas não podiam fazer nada para ajudá-la; então, Dorothy foi para seu quarto, deitou na cama e chorou até adormecer.
Na manhã seguinte, o soldado da barba verde foi até o Espantalho e disse:
– Venha comigo. Oz mandou chamá-lo.
O Espantalho seguiu-o e foi recebido na grande Sala do Trono, onde viu, sentada no trono de esmeraldas, uma dama lindíssima. Usava um vestido de gaze de seda verde e, sobre os cachos verdes esvoaçantes de seu cabelo, ostentava uma coroa de joias. Dos seus ombros saíam asas, de cores fantásticas e tão leves que tremulavam até mesmo sob a mais leve brisa.
Depois que o Espantalho fez sua reverência diante daquela linda criatura, do melhor jeito que seu recheio de palha permitiu, ela olhou-o com doçura e disse:
– Sou Oz, o Grande e Terrível. Quem é você, e por que veio me procurar?
O Espantalho, que esperava ver a grande cabeça da qual Dorothy lhe falara, ficou muito impressionado, mas respondeu com convicção.
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– Sou apenas um Espantalho, recheado de palha. Portanto, não tenho cérebro, e vim procurá-lo para suplicar que coloque um cérebro na minha cabeça no lugar da palha, assim poderei me tornar um homem como outro qualquer.
– E por que deveria fazer isso por você? – perguntou a dama.
– Porque você é sábia e poderosa, e ninguém mais pode me ajudar – respondeu o Espantalho.
– Nunca concedo favores sem receber algo em troca –disse Oz –, mas posso lhe prometer o seguinte: se você matar a Bruxa Má do Oeste para mim, eu lhe darei um ótimo cérebro, tão bom que você será o homem mais sábio da Terra de Oz.
– Achei que tivesse pedido à Dorothy para matar a Bruxa – disse o Espantalho, surpreso.
– Sim, fiz isso. Mas não me importa quem vai matá-la. Enquanto ela não for morta não vou atender ao seu desejo. Agora vá, e não me procure de novo até que se torne merecedor do cérebro que tanto deseja ter.
O Espantalho voltou triste para os seus amigos e contou o que Oz havia lhe dito; e Dorothy se surpreendeu quando ele disse que o Grande Mágico não era uma cabeça, como ela tinha visto, mas uma linda dama.
– Não importa – disse o Espantalho. – Acho que ela precisa de um coração tanto quanto o Homem de Lata.
Na manhã seguinte, o soldado da barba verde veio buscar o Homem de Lata e disse:
– Oz mandou buscá-lo. Siga-me.
O Homem de Lata acompanhou-o e chegou à grande Sala do Trono. Não sabia se iria ver Oz como uma linda dama ou como uma cabeça, mas esperava que fosse a linda dama.
– Porque – disse a si mesmo – se for a cabeça, com certeza não vou ganhar um coração, pois uma cabeça não tem coração e portanto não poderá sentir nada por mim. Mas se for a linda dama, vou implorar bastante para que me dê um coração, porque dizem que todas as mulheres têm um coração muito bondoso.
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Só que quando o Homem de Lata entrou na grande Sala do Trono não viu nem a cabeça nem a dama, pois Oz havia assumido a forma da mais terrível besta. Era quase do tamanho de um elefante, e o trono verde não parecia suficientemente forte para suportar seu peso. A besta tinha a cabeça como a de um rinoceronte, só que com cinco olhos. Do seu corpo saíam cinco longos braços, e tinha também cinco pernas compridas e finas. Os pelos eram densos, grossos como lã e cobriam todas as suas partes. Era impossível imaginar um monstro de aspecto mais pavoroso. Foi muita sorte o Homem de Lata não ter coração naquela hora, pois teria batido forte e acelerado de tanto terror. Mas como era feito só de lata, o lenhador não sentiu medo nenhum, embora tenha ficado muito desapontado.
– Sou Oz, o Grande e Terrível – disse a besta, com uma voz que era um grande rugido. – Quem é você, e por que veio me procurar?
– Sou um lenhador, feito de lata; portanto, não tenho coração e não sou capaz de amar. Então, peço que me dê um coração para que eu possa ser como os outros homens.
– E por que eu deveria fazer isso? – perguntou a besta.
– Porque eu pedi, e só você pode atender ao meu pedido – respondeu o lenhador.
Oz rugiu baixinho ao ouvir isso, mas disse, irritado:
– Se você quer mesmo um coração, deve fazer por merecê-lo.
– Como?
– Ajude Dorothy a matar a Bruxa Má do Oeste – retrucou a besta. – Quando a Bruxa estiver morta, venha me procurar e lhe darei o maior, mais bondoso e mais amoroso coração de toda a Terra de Oz.
Então, o Homem de Lata voltou desanimado até onde estavam seus amigos para contar-lhes da terrível besta que havia visto. Todos ficaram muito impressionados com as várias formas que o Grande Mágico podia assumir, e o Leão disse:
– Se quando eu for vê-lo encontrar uma besta, vou dar o meu rugido mais poderoso, e ele vai ficar tão assustado que me dará
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tudo o que lhe pedir. E se for a linda dama, vou fingir que pulo em cima dela, e assim a obrigarei a atender meu pedido. E se for a grande cabeça, ficará à minha mercê, porque vou fazê-la rolar pela sala inteira, até que prometa dar a todos nós o que desejamos. Portanto, alegrem-se, meus amigos, porque tudo vai se acertar logo.
Na manhã seguinte, o soldado da barba verde levou o Leão até a grande Sala do Trono e pediu que fosse à presença de Oz.
O Leão entrou decidido pela porta e, ao olhar em volta, surpreendeu-se ao ver que diante do trono havia uma bola de fogo, tão ameaçadora e brilhante que ele mal podia sustentar o olhar. A primeira coisa que lhe passou pela cabeça foi que Oz havia se queimado por acidente e se incendiado; mas quando tentou se aproximar, o calor era tão intenso que chamuscou seus bigodes, e ele recuou, tremendo, até a porta.
Então uma voz grave e pausada veio da bola de fogo e proferiu as seguintes palavras:
– Sou Oz, o Grande e Terrível. Quem é você, e por que veio me procurar?
E o Leão respondeu:
– Sou o Leão Covarde, tenho medo de tudo. Vim implorar que me dê coragem, para que eu possa me tornar realmente o Rei dos Animais, que é como os homens me chamam.
– E por que deveria lhe dar coragem? – perguntou Oz.
– Porque de todos os mágicos você é o maior, e o único com poder de atender ao meu pedido – respondeu o Leão.
A bola de fogo ardeu intensamente por um tempo, e a voz disse:
– Traga-me a prova de que a Bruxa Má está morta, e então lhe darei coragem. Mas enquanto ela viver, você continuará covarde.
O Leão ficou irritadíssimo com essas palavras, mas não podia retrucar e, enquanto estava em pé, em silêncio, olhando para a bola de fogo, esta ficou tão quente que ele virou as costas e saiu correndo da sala. Ficou contente ao ver seus amigos esperando por ele e contou como havia sido sua terrível entrevista com o Mágico.
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– O que faremos agora? – perguntou Dorothy desanimada.
– Só temos uma coisa a fazer – respondeu o Leão. – Ir à Terra dos Winkies, procurar a Bruxa Má e destruí-la.
– Mas e se não der certo? – disse a menina.
– Então nunca vou conseguir ter coragem – declarou o Leão.
– E eu nunca terei um cérebro – acrescentou o Espantalho.
– E eu nunca terei um coração – disse o Homem de Lata.
– E eu nunca mais vou ver Tia Em e Tio Henry – disse Dorothy, começando a chorar.
– Cuidado! – gritou a moça verde. – As lágrimas vão cair no seu vestido de seda verde e podem manchá-lo.
Então Dorothy secou os olhos e disse:
– Acho que a gente deve tentar; mas com certeza não quero matar ninguém, mesmo que seja para ver Tia Em de novo.
– Eu vou com vocês; mas também sou covarde demais para matar a Bruxa – disse o Leão.
– Também irei – declarou o Espantalho –, embora ache que não vou ajudar muito, sou muito tonto.
– E eu não tenho fibra nem para machucar uma Bruxa – observou o Homem de Lata –, mas se vocês forem, com certeza irei junto.
Portanto, decidiram iniciar sua viagem na manhã seguinte, e o lenhador afiou seu machado numa pedra verde de amolar e providenciou que suas juntas fossem devidamente lubrificadas. O Espantalho recheou seu corpo com palha nova e Dorothy pintou os olhos dele de novo para que pudesse enxergar melhor. A moça verde, que foi muito boa com eles, encheu a cesta de Dorothy de coisas boas de comer, e amarrou um sininho no pescoço de Totó com uma fita verde.
Eles foram para a cama bem cedo e dormiram muito bem até o dia raiar, quando foram acordados pelo canto de um galo verde que vivia no quintal dos fundos do palácio, e pelo cacarejar de uma galinha que havia botado um ovo. Verde.
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CAPÍTULO XII
À procura da Bruxa Má
Osoldado da barba verde conduziu-os pelas ruas da Cidade das Esmeraldas até o alojamento onde morava o Guardião dos Portões. O guarda destravou seus óculos e colocouos de volta na sua grande caixa verde, e então, educadamente, abriu o portão para nossos amigos.
– Qual é a estrada que leva até a Bruxa Má do Oeste? – perguntou Dorothy.
– Não existe estrada – respondeu o Guardião dos Portões. – Ninguém nunca vai para lá.
– Então como faremos para encontrar a Bruxa? – indagou a menina.
– É fácil – respondeu o homem –, porque quando ela descobrir que estão no País dos Winkies, irá procurá-los e fazê-los seus escravos.
– Talvez não – disse o Espantalho –, porque temos intenção de eliminá-la.
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– Ah, então é diferente – disse o Guardião dos Portões. –Ninguém conseguiu eliminá-la até hoje, e foi por isso, é claro, que eu disse que ela iria escravizá-los, como ela fez com todos os demais. Mas cuidado, porque ela é má e feroz, e talvez não permita que a eliminem. Seja como for, para ir até lá é só seguir para oeste, onde o Sol se põe, e a encontrarão. Não há como errar. Eles agradeceram, despediram-se do Guardião e rumaram para oeste, caminhando por campos de relva macia, pontuados aqui e ali por tufos de margaridas e ranúnculos. Dorothy ainda estava com o lindo vestido verde de seda que usara no palácio, mas agora, para surpresa dela, viu que não era mais verde, e sim todo branco. A fita em volta do pescoço de Totó também perdera a cor verde e era agora toda branca, como o vestido de Dorothy.
Logo deixaram para trás a Cidade das Esmeraldas. Conforme avançavam, o terreno foi ficando mais difícil e montanhoso, sem fazendas nem casas, já que no País do Oeste não se cultivava a terra.
À tarde, o sol bateu forte no rosto deles, pois não havia árvores para fazer sombra. Assim, antes do anoitecer, Dorothy, Totó e o Leão já estavam exaustos. Deitaram na grama e adormeceram, com o Homem de Lata e o Espantalho montando guarda.
Bem, a Bruxa Má do Oeste tinha um olho só, mas era um olho poderoso como um telescópio, capaz de enxergar tudo. Quando ela sentou-se junto à porta do seu castelo e deu uma olhada em volta, viu Dorothy deitada, dormindo, rodeada por seus amigos. Embora estivessem muito longe, a Bruxa Má ficou com raiva de vê-los em seu país; então, soprou um apito de prata que pendia de seu pescoço.
Na mesma hora, um bando de lobos que vieram correndo de todas as direções, juntou-se ao redor dela. Tinham pernas compridas, olhos ameaçadores e dentes afiados.
– Vão até onde estão aquelas pessoas – disse a Bruxa – e destrocem-nas.
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– Não vai escravizá-las? – perguntou o líder dos lobos.
– Não – respondeu ela –, uma delas é de lata, a outra é de palha; e tem ainda uma menina e um Leão. Nenhuma delas presta para trabalhar, então façam picadinho de todos.
– Está certo – disse o lobo, e partiu a toda velocidade, seguido pelos outros.
A sorte foi que o Espantalho e o Homem de Lata estavam bem acordados e ouviram os lobos chegando.
– Pode deixar comigo – disse o lenhador. – Fique atrás de mim e irei dando cabo deles à medida que vierem.
O Homem de Lata pegou seu machado, que por precaução deixara bem amolado, e, quando o líder dos lobos chegou, brandiu-o e decepou-lhe a cabeça. O lobo morreu na hora. Mal ele ergueu de novo o machado e outro lobo o atacou, mas também foi abatido pelo gume afiado da sua arma. Eram quarenta lobos, e quarenta vezes a cena se repetiu; portanto, no final, o lenhador tinha diante dele uma pilha de lobos mortos. Em seguida, descansou o machado e sentou-se ao lado do Espantalho, que disse:
– Lutou muito bem, amigo.
Continuaram montando guarda enquanto Dorothy dormia. Na manhã seguinte, a garotinha acordou e ficou muito assustada ao ver aquela enorme pilha de lobos peludos, mas o Homem de Lata explicou o que havia acontecido. Ela agradeceu-lhe por tê-los salvado e se sentou para tomar o café da manhã. Em seguida, retomaram a viagem.
Naquela mesma manhã, a Bruxa Má foi até a porta do seu castelo e vasculhou o horizonte com seu único olho, capaz de enxergar muito longe. Viu então seus lobos todos mortos, e os forasteiros seguindo viagem pelo seu país. Isso a deixou mais furiosa ainda, e ela soprou seu apito de prata duas vezes. Imediatamente, um grande bando de corvos selvagens foi até ela voando, e eram tantos que escureceram o céu.
A Bruxa Má disse para o Corvo Rei:
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– Voem imediatamente até onde estão os forasteiros, biquem seus olhos e façam-nos em pedaços.
Os corvos selvagens voaram num grande bando até Dorothy e seus companheiros. Quando a garotinha viu os corvos se aproximando ficou com muito medo, mas o Espantalho disse:
– Deixem essa batalha comigo; deitem aqui do meu lado e não sofrerão nada.
Então deitaram-se no chão, com exceção do Espantalho, que ficou em pé com os braços estendidos. Quando os corvos o viram, se assustaram, como sempre ocorre com os corvos ao verem espantalhos, e não ousaram chegar mais perto. Mas o Corvo Rei disse:
– É apenas um boneco de palha. Vou bicar os olhos dele e arrancá-los.
O Corvo Rei voou até o Espantalho, mas este o pegou pela cabeça e torceu-lhe o pescoço, matando-o. E então outro corvo voou para cima dele, e o Espantalho também lhe torceu o pescoço. Eram quarenta corvos, e quarenta vezes o Espantalho repetiu a cena, até que, no final, estavam todos deitados ao lado dele, mortos. O Espantalho então mandou seus companheiros levantarem, e seguiram viagem de novo.
Quando a Bruxa Má olhou outra vez e viu todos os seus corvos mortos e empilhados, ficou terrivelmente furiosa, e soprou três vezes o seu apito de prata.
Logo em seguida, ouviu-se um grande zumbido no ar, e um enxame de abelhas negras voou até ela.
– Procurem os forasteiros e matem todos a ferroadas! – ordenou a Bruxa, e as abelhas deram meia-volta e voaram imediatamente até o local onde Dorothy e seus amigos seguiam caminhando. Mas o Homem de Lata viu o enxame se aproximando, e o Espantalho já decidira o que fazer.
– Tire toda a minha palha e jogue em cima da garotinha, do cachorro e do Leão – disse para o lenhador –, assim as abelhas não conseguirão picá-los. – Foi o que fez o companheiro;
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assim que Dorothy se deitou pertinho do Leão, com Totó nos braços dela, cobriu os três totalmente de palha.
As abelhas chegaram e não encontraram ninguém para picar, exceto o Homem de Lata. Mas quando voaram para cima dele, arrebentaram todos os seus ferrões contra a lata, e não machucaram o lenhador nem um pouco. E como abelhas não sobrevivem sem ferrões, foi o fim das abelhas negras, que morreram todas e ficaram espalhadas em volta dele, como montinhos de carvão esfarelado.
Então, Dorothy e o Leão se levantaram, e a menina ajudou o Homem de Lata a colocar a palha de volta no Espantalho, até deixá-lo do jeito de sempre. Assim, retomaram sua jornada uma vez mais.
A Bruxa Má ficou tão furiosa quando viu todas as suas abelhas negras mortas, parecendo montinhos de carvão esfarelado, que sapateou, arrancou os cabelos e rangeu os dentes de raiva. Chamou então uma dúzia de seus escravos Winkies e deu-lhes lanças afiadas, ordenando que fossem até os forasteiros para destroçá-los.
Os Winkies não eram pessoas corajosas, mas tinham que fazer o que lhes era mandado. Então, foram caminhando até perto de Dorothy. O Leão, porém, deu um grande rugido e partiu na direção deles, e os coitados dos Winkies ficaram tão assustados que fugiram correndo o mais rápido que puderam. Quando voltaram ao castelo, a Bruxa Má deu-lhes uma surra de cinta e mandou-os de volta ao trabalho. Então, sentou para pensar o que faria em seguida. Não conseguia entender por que todos os seus planos para destruir os forasteiros haviam falhado. Mas ela era uma bruxa não apenas perversa, mas também poderosa, e logo concebeu outro plano.
Ela guardava no seu armário um gorro de ouro, com um diadema de diamantes e rubis em volta. Esse gorro de ouro tinha propriedades mágicas. Quem fosse seu dono poderia invocar três vezes os Macacos Alados, que obedeceriam a
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qualquer ordem que lhes fosse dada. Mas ninguém poderia dar mais de três ordens àquelas estranhas criaturas. A Bruxa Má já havia usado duas vezes o feitiço do gorro. A primeira vez foi quando escravizou os Winkies e se tornou rainha do país deles; os Macacos Alados a ajudaram nisso. A segunda vez foi quando lutou contra o Grande Oz, expulsando-o do País do Oeste; também contou com a ajuda dos Macacos Alados para isso. Ela só poderia usar o gorro de ouro mais uma vez, e por isso deixou para fazê-lo apenas quando todos os seus outros poderes tivessem se esgotado. Mas agora que seus lobos ferozes e seus corvos selvagens e suas abelhas negras haviam sido eliminados, e seus escravos haviam sido postos para correr, viu que só havia um jeito de destruir Dorothy e seus amigos. A Bruxa Má pegou o gorro de ouro de seu armário e colocou-o na cabeça. Em seguida, ficou em pé, apoiada no pé esquerdo, e disse devagar:
Ep-pe, pep-pe, kak-ke!
Depois, apoiada sobre o pé direito, disse:
Hil-lo, hol-lo, hel-lo!
Em seguida, apoiada nos dois pés, gritou bem alto:
Ziz-zy, zuz-zy, zik!
O feitiço começou a agir. O céu escureceu, e ouviu-se um som grave e ribombante. Seguiu-se uma grande bateção de asas, um alarido de vozes e risadas, e o sol despontou no céu escuro e mostrou a Bruxa Má rodeada por uma multidão de macacos, cada um com um par de imensas e poderosas asas nas costas.
Um deles, bem maior que os outros, parecia ser o líder. Ele voou para perto da Bruxa e disse:
– Você nos chamou pela terceira e última vez. Quais são as ordens?
– Encontrem os forasteiros que estão nas minhas terras e destruam todos, exceto o Leão – disse a Bruxa Má. – Tragam a fera para mim, pois pretendo colocar-lhe arreios, como se fosse um cavalo, e botá-lo para trabalhar.
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– Suas ordens serão obedecidas – disse o líder. Então, com muitas vozes e ruídos, os Macacos Alados voaram para o lugar onde Dorothy e seus amigos prosseguiam em sua caminhada.
Alguns dos Macacos agarraram o Homem de Lata e o carregaram pelos ares até um lugar densamente recoberto por rochas escarpadas. Ali deixaram cair o pobre lenhador, que despencou de grande altura sobre as rochas e ficou tão amassado e estropiado que não conseguia se mexer, sequer gemer. Alguns outros Macacos pegaram o Espantalho e, com seus dedos compridos, puxaram toda a palha para fora de seu corpo e da sua cabeça. Fizeram então um pequeno fardo com seu chapéu, botas e roupas e atiraram nos galhos mais altos de uma árvore.
Os demais Macacos jogaram cordas grossas em cima do Leão e deram várias voltas em torno do seu corpo, do seu focinho e das pernas, de modo que ele ficou incapaz de morder ou arranhar ou mesmo de se debater. Ergueram-no e levaram-no voando até o castelo da Bruxa, onde foi deixado num pequeno pátio cercado por uma grade de ferro alta, para que não escapasse.
Mas não fizeram nada com Dorothy. Ela ficou lá, com Totó nos braços, vendo o triste destino de seus companheiros e pensando que logo seria sua vez. O líder dos Macacos Alados voou até onde ela estava, com seus braços longos e peludos estendidos e seu rosto pavoroso, com um sorriso arreganhado, terrível; mas quando viu na testa da menina a marca do beijo da Bruxa Boa, parou na mesma hora, fez sinal para que os outros não a tocassem e disse:
– Não podemos machucar essa garotinha – avisou aos demais –, pois é protegida pelo Poder do Bem, que é maior que o Poder do Mal. Tudo o que podemos fazer é carregá-la até o castelo da Bruxa Má.
Assim, com cuidado e delicadeza, puseram Dorothy nos braços e a carregaram rapidamente pelos ares até o castelo,
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onde a deixaram no degrau da porta de entrada. Então, o líder disse para a Bruxa:
– Nós obedecemos às suas ordens até onde fomos capazes. O Homem de Lata e o Espantalho estão destruídos, e o Leão está amarrado no seu pátio. Quanto à garotinha, não ousamos fazer-lhe mal, nem ao cãozinho que ela carrega no colo. Bruxa, seu poder sobre nosso bando agora terminou, e nunca mais irá nos ver.
Então, todos os Macacos Alados, em meio a muitas risadas, alarido e barulho, saíram voando e, num piscar de olhos, já não foram mais vistos.
A Bruxa Má ficou ao mesmo tempo surpresa e preocupada quando viu a marca na testa de Dorothy, pois sabia muito bem que nem os Macacos Alados nem ela ousariam machucar a menina, de nenhum jeito. Ela olhou para os pés de Dorothy e começou a tremer de medo ao ver os sapatos brilhantes, pois sabia o feitiço poderoso que eles guardavam. De início, a Bruxa foi tentada a fugir de Dorothy, mas encarou os olhos da menina e viu a alma simples que havia atrás deles, e também que a garotinha não sabia o poder maravilhoso que os sapatos brilhantes lhe conferiam. Então, a Bruxa Má riu para si mesma e pensou: “Eu ainda posso torná-la minha escrava, pois ela não sabe como usar seu poder”. Então, dirigiu-se a Dorothy, de maneira ríspida e severa:
– Venha comigo e ouça bem tudo o que eu lhe digo, senão acabo com você, do jeito que fiz com o Homem de Lata e o Espantalho.
Dorothy seguiu-a pelos belos aposentos do castelo até que chegaram à cozinha, onde a Bruxa ordenou que lavasse a louça e as panelas, varresse o chão e mantivesse o fogo alimentado com lenha.
Humildemente, Dorothy começou a trabalhar, e resolveu fazer isso o melhor possível; pois já estava feliz só por não ter sido morta pela Bruxa Má.
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Com Dorothy muito ocupada trabalhando, a Bruxa decidiu ir até o pátio para atrelar arreios no Leão Covarde, tratando-o como se fosse um cavalo; imaginou que seria divertido fazê-lo puxar sua carruagem sempre que ela fosse sair. Mas quando abriu o portão, o Leão deu um rugido muito alto e saltou na direção dela com tamanha ferocidade que a Bruxa ficou com medo, voltou atrás correndo e fechou o portão de novo.
– Já que não posso colocar arreios em você – disse a Bruxa para o Leão, falando através das barras do portão –, vou matá-lo de fome. Você só vai comer se fizer o que eu mandar.
Depois disso, portanto, ela parou de dar comida ao Leão prisioneiro; mas vinha todo meio-dia até o portão e perguntava:
– Que tal, está pronto para ser atrelado com arreios como um cavalo?
E o Leão respondia:
– Não. E se você entrar neste pátio vou devorá-la.
A razão pela qual o Leão não tinha necessidade de atender ao desejo da Bruxa era que toda noite, enquanto a mulher dormia, Dorothy pegava comida do armário e levava para ele. Depois de comer, ele deitava em sua cama de palha e Dorothy deitava ao lado dele, descansava a cabeça na sua juba macia e peluda, e ficavam falando de seus problemas e tentando planejar algum jeito de fugir. Mas não conseguiam achar uma maneira de sair do castelo, guardado constantemente pelos Winkies amarelos, escravos da Bruxa Má, que tinham medo demais dela para não fazerem o que mandava.
A menina tinha que trabalhar duro durante o dia, e com frequência a Bruxa ameaçava bater nela com aquele velho guarda-chuva que carregava o dia inteiro. Mas, na verdade, não ousava bater em Dorothy por causa da marca em sua testa.
A menina não sabia disso, e tinha muito medo, por ela e por seu cãozinho, Totó. Uma vez a Bruxa acertou Totó com seu guarda-chuva e o valente cachorrinho partiu pra cima dela e deu-lhe uma mordida na perna. A Bruxa não sangrou onde
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levou a mordida, pois era tão má que o sangue dela havia secado há muitos anos.
A vida de Dorothy ficou muito triste quando ela compreendeu que seria muito difícil voltar para o Kansas e para a Tia Em. Às vezes chorava amargamente horas a fio, com Totó sentado a seus pés, olhando para o seu rosto e ganindo baixinho para mostrar o quanto lamentava a sorte da sua pequena dona. Na realidade, para Totó não fazia muita diferença estar no Kansas ou na Terra de Oz, desde que Dorothy estivesse com ele; mas sabia que a garotinha se sentia infeliz, e isso o fazia sentir-se infeliz também.
A Bruxa Má queria muito ficar com os sapatos brilhantes que a menina usava. Suas abelhas, seus corvos e seus lobos estavam agora todos empilhados e secando ao sol, e ela esgotara todo o poder do seu gorro de ouro; mas se pelo menos pudesse pegar os sapatos brilhantes, eles lhe dariam mais poder do que todas as outras coisas que havia perdido. Ela observava Dorothy com muita atenção, para ver se ela alguma vez tirava os sapatos, imaginando que talvez pudesse roubá-los. Mas a menina tinha tanto apreço por seus lindos sapatinhos que nunca ficava descalça, a não ser à noite e quando tomava banho. A Bruxa tinha muito medo de escuro e não ousava entrar no quarto de Dorothy à noite para pegar os sapatos, e seu horror à água era maior ainda que o medo de escuro, por isso não chegava nem perto de Dorothy quando ela estava no banho. Na verdade, a velha Bruxa nunca tocara em água, nem deixara jamais que a água tocasse nela de maneira nenhuma.
Mas a malvada criatura era também muito esperta e, finalmente, concebeu um jeito de conseguir o que queria. Colocou uma barra de ferro no meio do chão da cozinha, e depois, por meio de suas artes de feitiçaria, tornou o ferro invisível aos olhos humanos. Assim, quando Dorothy entrou na cozinha, não viu a barra, tropeçou nela e caiu estendida no chão. Não se machucou, mas, na queda, um de seus sapatos
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brilhantes saiu do pé; e antes que pudesse pegá-lo, a Bruxa já tinha passado a mão nele e o calçado no seu pé esquelético.
A malvada ficou exultante com o sucesso da sua manobra, pois com um dos pés daqueles sapatos já contava com metade do poder mágico deles, que Dorothy, além disso, não poderia usar contra ela, mesmo que soubesse como.
A garotinha, ao ver que havia perdido um de seus lindos sapatos, ficou brava e disse à Bruxa:
– Devolva aqui meu sapato!
– Não senhora – retrucou a Bruxa. – Agora é meu, não é mais seu.
– Você é uma criatura muito perversa! – gritou Dorothy.
– Não tem o direito de tirar meu sapato de mim.
– Não importa, vou ficar com ele assim mesmo – disse a Bruxa, rindo na cara dela –, e algum dia desses acabo pegando o outro também.
Isso deixou Dorothy tão furiosa que ela pegou um balde de água que estava ali perto e despejou em cima da Bruxa, deixando-a molhada da cabeça aos pés.
Na mesma hora a malvada deu um berro de pânico, e depois, enquanto Dorothy olhava para ela assustada, a Bruxa começou a encolher e desaparecer.
– Veja só o que você fez! – ela gritou. – Em um minuto eu vou derreter inteira.
– Eu sinto muito, juro – disse Dorothy, que se assustou de verdade ao ver a Bruxa derretendo que nem açúcar mascavo diante de seus olhos.
– Você não sabia que a água acabaria comigo? – perguntou a Bruxa chorosa, desesperada.
– É claro que não – respondeu Dorothy. – Como poderia saber?
– Pois é isso, em alguns minutos eu vou derreter e sumir, e você ficará com o castelo todo para você. Eu sempre fui uma pessoa má, mas nunca imaginaria que uma garotinha como
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você seria capaz de me derreter e colocar um fim nas minhas maldades. Veja só! E lá vou eu!
Com essas palavras, a Bruxa se desfez numa massa disforme, marrom, e começou a se esparramar pelas tábuas lisas de madeira do chão da cozinha. Vendo que a Bruxa havia de fato derretido e sumido, Dorothy pegou outro balde de água e jogou em cima daquela sujeira. Em seguida, varreu tudo para fora da porta. Então, pegou de volta o outro sapato prateado, que era tudo o que sobrara da velha mulher, limpou-o, secou-o bem com um pano e calçou-o no pé de novo. Livre finalmente para fazer o que quisesse, foi correndo até o pátio para contar ao Leão que a Bruxa Má do Oeste havia chegado ao fim, e que não eram mais prisioneiros numa terra estranha.
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O resgate CAPÍTULO XIII
OLeão Covarde ficou muito contente ao saber que a Bruxa Má havia sido derretida por um balde d’água, e Dorothy foi logo destrancando o portão da prisão e libertandoo. Entraram juntos no castelo, e o primeiro ato de Dorothy foi chamar todos os Winkies e comunicar-lhes que não eram mais escravos.
Os Winkies amarelos ficaram eufóricos, pois fazia anos que eram obrigados pela Bruxa Má a trabalhar duro, e eram tratados por ela com muita crueldade. Então decretaram feriado, no próprio dia e naquela data dali em diante, e passaram o resto do dia festejando, comendo e dançando.
– Ah, se nossos amigos, o Espantalho e o Homem de Lata, estivessem conosco agora – disse o Leão –, eu ficaria ainda mais feliz.
– Você acha que ainda seria possível resgatálos? – perguntou a menina esperançosa.
– Podemos tentar – respondeu o Leão. Então, chamaram os Winkies amarelos e perguntaram se poderiam ajudá-los a resgatar
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seus amigos, e os Winkies disseram que teriam o maior prazer em fazer por Dorothy tudo o que estivesse ao seu alcance, pois ela os libertara da escravidão. Ela escolheu alguns Winkies que pareciam ser os mais sabidos e partiram. Viajaram naquele dia e em parte do dia seguinte até chegarem à planície rochosa onde o Homem de Lata continuava deitado, todo amassado e retorcido. Seu machado estava perto dele, mas a lâmina já estava enferrujada e o cabo, partido ao meio.
Os Winkies o ergueram com cuidado e o carregaram de volta ao Castelo Amarelo, e Dorothy derramou algumas lágrimas ao ver a triste condição de seu velho amigo. O Leão também a acompanhava, sério e tristonho. Quando chegaram ao castelo, Dorothy perguntou aos Winkies:
– Tem algum bom funileiro aqui?
– Tem, sim. Alguns de nós somos excelentes funileiros – disseram.
– Então vão chamá-los, por favor – disse ela. E quando os funileiros chegaram, trazendo todas as suas ferramentas dentro de cestas, ela indagou:
– Vocês teriam como desamassar essas pancadas no Homem de Lata, endireitá-lo de novo e soldar todas as partes que se soltaram?
Os funileiros examinaram detidamente o lenhador e responderam que era possível consertá-lo e deixá-lo tão bom quanto antes. Se instalaram numa das grandes salas do castelo e puseram mãos à obra, trabalhando três dias e quatro noites seguidas, martelando, desentortando, curvando, soldando, polindo e dando marteladas nas pernas, no corpo e na cabeça do Homem de Lata, até que finalmente ele recuperou a antiga forma, e suas juntas voltaram a funcionar tão bem quanto antes. Na verdade, viam-se agora vários remendos na lata, mas os funileiros tinham feito um bom trabalho, e como o lenhador não era um homem vaidoso, não se incomodou nem um pouco com aqueles remendos.
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Quando ele por fim entrou andando no quarto de Dorothy para agradecer-lhe por tê-lo resgatado, estava tão feliz que chorava de alegria, e Dorothy precisou enxugar cada uma das lágrimas do rosto dele com muito cuidado com seu avental, para que não rolassem até as juntas e as enferrujassem de novo. E a menina derramava à
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vontade lágrimas de alegria por ter encontrado de novo seu velho amigo, e eram lágrimas que não precisavam ser enxugadas. Quanto ao Leão, limpava suas lágrimas com tanta frequência com a ponta da sua cauda que ela ficou totalmente encharcada, e ele teve que ir lá fora no pátio e segurá-la ao sol para que secasse.
– Ah, se o Espantalho também estivesse conosco agora –disse o Homem de Lata, depois que Dorothy terminou de contar tudo o que havia acontecido –, eu ficaria mais feliz ainda.
– Devíamos tentar encontrá-lo também – sugeriu a menina. Então, chamou os Winkies para ajudá-la, e eles andaram e andaram, aquele dia inteiro e parte do dia seguinte, até encontrarem aquela árvore alta em cujos galhos os Macacos Alados haviam jogado as roupas do Espantalho.
Era uma árvore muito alta, e o tronco era tão liso que ninguém conseguia escalá-lo; mas o lenhador disse na mesma hora:
– Vou derrubá-la já, e então poderemos pegar as roupas do Espantalho.
Enquanto os funileiros tinham ficado consertando o lenhador, outro Winkie, que era ourives, havia feito um cabo de machado novo, todinho em ouro, que ele encaixou no machado do Homem de Lata, no lugar daquele velho cabo quebrado. E outros Winkies haviam polido a lâmina e removido toda a ferrugem, deixando-a brilhante como se fosse de prata lustrada.
Mal terminou de falar, o Homem de Lata já começou a cortar a árvore, e em pouco tempo ela foi derrubada com um estrondo, e as roupas do Espantalho caíram dos galhos e rolaram pelo chão. Dorothy pegou-as e pediu que os Winkies as levassem de volta para o castelo, onde foram recheadas com uma palha nova, limpinha, e vejam só! Lá estava o Espantalho de novo, tão bem quanto antes, e não parava de agradecer a todos por terem se preocupado em resgatá-lo.
Agora que estavam todos reunidos mais uma vez, Dorothy e seus amigos passaram vários dias no Castelo Amarelo, onde tinham tudo o que precisavam para uma estadia confortável.
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Alguns dias depois, porém, a menina pensou de novo na Tia Em e disse:
– Precisamos procurar Oz e cobrar o cumprimento da sua promessa.
– Sim – disse o Homem de Lata. – Finalmente vou conseguir um coração.
– E eu vou arrumar um cérebro – acrescentou o Espantalho, animadíssimo.
– E eu vou conseguir coragem – disse o Leão, pensativo.
– E eu vou poder voltar ao Kansas! – gritou Dorothy, batendo palmas. – Nossa, vamos logo para a Cidade das Esmeraldas, amanhã mesmo!
E ficou decidido assim. No dia seguinte, reuniram todos os Winkies e se despediram deles. Os Winkies lamentaram que eles tivessem que ir embora, e tinham se afeiçoado tanto ao Homem de Lata que pediram que ficasse ali como governante deles e da Terra Amarela do Oeste. Vendo que estavam todos determinados a ir embora, os Winkies deram um colar de ouro de presente a Totó e outro ao Leão; presentearam Dorothy com um lindo bracelete de diamantes incrustados; para o Espantalho deram uma bengala com castão dourado, para evitar que tropeçasse tanto; e para o lenhador, uma latinha de óleo prateada, com incrustações em ouro e pedras preciosas. Em retribuição, cada um dos viajantes dedicou aos Winkies um belo discurso de agradecimento, e todos trocaram muitos apertos de mão, até seus braços ficarem doloridos. Dorothy foi até o armário da Bruxa e encheu sua cesta de comida para a viagem, e então viu o gorro de ouro guardado. Experimentou colocá-lo na cabeça e viu que servia direitinho. Não sabia nada sobre a magia do gorro de ouro, mas achou-o bonito e então decidiu colocá-lo e guardar seu chapeuzinho de sol na cesta. Bem preparados para a viagem, tomaram o caminho da Cidade das Esmeraldas; e os Winkies deram três vivas e desejaram-lhes uma excelente viagem.
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CAPÍTULO XIV
Os Macacos Alados
Você deve lembrar que não havia estrada, nem sequer uma trilha, entre o castelo da Bruxa Má e a Cidade das Esmeraldas. Os quatro viajantes haviam partido em busca da Bruxa, mas foi ela que os viu chegar e mandou os Macacos Alados trazê-los. Agora, para voltar, tinham que achar o caminho pelos grandes campos de ranúnculos e margaridas amarelas, algo bem mais difícil do que a ida, quando haviam sido carregados. Sabiam, é claro, que tinham que seguir sempre para o leste, na direção do sol nascente; e partiram na direção certa. Mas, ao meio-dia, quando o Sol ficava sobre suas cabeças, não sabiam mais o que era leste e o que era oeste, e foi por isso que acabaram se perdendo naqueles grandes campos. Mas continuaram andando, e à noite a Lua apareceu brilhante. Então, deitaram em meio ao doce perfume das flores amarelas e dormiram muito bem até de manhã, todos exceto o Espantalho e o Homem de Lata.
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Na manhã seguinte, o Sol estava encoberto por nuvens, mas eles partiram mesmo assim, como se tivessem certeza da direção a seguir.
– Se andarmos bastante – disse Dorothy –, com certeza em algum momento chegaremos a algum lugar.
Mas os dias foram passando e eles não viam nada além daqueles campos. O Espantalho começou a resmungar um pouco.
– Tenho quase certeza de que perdemos nosso rumo –disse ele –, e se não acharmos de novo a tempo de chegar à Cidade das Esmeraldas, não vou conseguir meu cérebro nunca.
– Nem eu meu coração – emendou o Homem de Lata. –Mal posso esperar para chegar a Oz, e vocês devem concordar comigo que essa viagem já está ficando longa demais.
– E vocês precisam entender – disse o Leão Covarde, lamentando-se – que eu não tenho coragem suficiente para ficar assim, vagando à toa, sem nunca chegar a lugar algum. Então foi Dorothy que perdeu o ânimo. Ela se sentou na grama e olhou para os companheiros, e eles também se sentaram e olharam para ela, e Totó descobriu que estava tão cansado que, pela primeira vez na vida, deixara de tentar caçar uma borboleta que passara voando pela sua cabeça; pôs a língua para fora e ficou ofegante, olhando para Dorothy, como se perguntasse: “E agora, o que faremos?”.
– E se a gente chamasse os ratos do campo? – sugeriu ela. – Eles certamente poderiam nos indicar o caminho para a Cidade das Esmeraldas.
– Mas é claro! – gritou o Espantalho. – Por que não pensamos nisso antes?
Dorothy soprou o pequeno apito que carregava no pescoço desde que a Rainha dos Ratinhos lhe dera. Em poucos minutos ouviram as batidinhas das pequenas patas, e vários daqueles ratinhos cinza vieram correndo até ela. Entre eles, a própria Rainha, que perguntou, com sua vozinha esganiçada:
– O que posso fazer para ajudar meus amigos?
– Nós perdemos o caminho – disse Dorothy. – Poderia nos dizer em que direção fica a Cidade das Esmeraldas?
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– Claro – respondeu a Rainha. – Mas fica bem longe, porque vocês andaram na direção oposta o tempo todo. – De repente, ela notou o gorro de ouro de Dorothy e disse: – Por que você não usa a magia do gorro e chama os Macacos Alados para ajudá-la? Eles poderão carregar vocês para a cidade de Oz em menos de uma hora.
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– Eu não sabia que era um gorro encantado – respondeu Dorothy, surpresa. – Qual é a frase mágica?
– Está escrito dentro do gorro de ouro – respondeu a Rainha dos Ratinhos. – Mas se você for chamar os Macacos Alados teremos que ir embora antes, porque eles gostam de fazer pequenas maldades e se divertem muito aprontando conosco.
– Será que não vão me machucar? – perguntou a menina preocupada.
– Não, não. Eles têm que obedecer a pessoa que usa o gorro. Adeus! – E sumiu rapidamente, com todos os ratinhos se apressando atrás dela.
Dorothy olhou dentro do gorro de ouro e viu algumas palavras escritas no forro. Essa deve ser a fórmula mágica, pensou, e então leu as instruções com atenção e colocou o Gorro de volta na cabeça.
– Ep-pe, pep-pe, kak-ke! – disse ela, em pé, apoiando-se sobre o pé esquerdo.
– O que você disse? – perguntou o Espantalho, que não sabia o que ela estava tentando fazer.
– Hil-lo, hol-lo, hel-lo! – Dorothy continuou, agora apoiada sobre o pé direito.
– Alô! – respondeu o Homem de Lata, tranquilo.
– Ziz-zy, zuz-zy, zik! – disse Dorothy, apoiando-se agora sobre os dois pés. Isso concluiu a fórmula mágica do feitiço, e então ouviram uma algazarra de vozes e uma bateção de asas, conforme o bando dos Macacos Alados chegava voando na direção deles.
O Rei fez uma reverência profunda diante de Dorothy e perguntou:
– Quais são as ordens?
– Queremos ir para a Cidade das Esmeraldas – disse a menina –, mas perdemos o caminho.
– Podemos carregar vocês até lá – retrucou o Rei, e nem bem terminara de falar dois Macacos já pegaram Dorothy nos braços e voaram embora com ela. Outros pegaram o Espantalho, o Homem de Lata e o Leão, e um Macaquinho
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pegou Totó e também foi voando atrás dos outros, embora o cãozinho tentasse de todo jeito mordê-lo.
O Espantalho e o Homem de Lata ficaram bastante assustados no começo, lembrando do quanto haviam sido maltratados pelos Macacos Alados; mas viram que agora eles não tinham intenção de lhes fazer nenhum mal, então viajaram pelos ares mais tranquilos, e se divertiram olhando os belos jardins e bosques embaixo deles.
Dorothy achou agradável viajar entre dois dos maiores Macacos, um deles o próprio Rei. Eles fizeram uma cadeirinha cruzando as mãos e tomavam o maior cuidado para não machucar a menina.
– Por que vocês têm que obedecer ao feitiço do gorro de ouro? – perguntou ela.
– É uma longa história – respondeu o Rei, com um sorriso ambíguo –, mas como temos uma longa viagem pela frente, vou matar o tempo contando, se desejar.
– Gostaria muito de ouvir – disse ela.
– Houve um tempo – começou o líder – em que éramos um povo livre, e vivíamos felizes na grande floresta, voando de galho em galho, comendo nozes e frutas, e fazendo o que nos dava vontade sem precisar chamar ninguém de senhor. Talvez alguns de nós exagerássemos um pouco nas travessuras às vezes, voando baixo para puxar o rabo de animais que não têm asas, perseguindo pássaros e atirando nozes nas pessoas que caminhavam pela floresta. Mas éramos despreocupados e felizes e nos divertíamos muito, desfrutando de cada minuto do dia. Isso foi há muitos anos, bem antes de Oz chegar das nuvens para governar nossa terra. Morava aqui na época, um pouco mais longe, ao norte, uma linda princesa, que era também uma feiticeira poderosa. Ela usava toda a sua magia para ajudar as pessoas, e nunca se soube que tivesse feito mal a alguém que fosse bom. Seu nome era Gayelette, e vivia num lindo palácio feito de grandes blocos de rubi. Todos a amavam, mas sua grande tristeza era não encontrar alguém que pudesse amar, pois todos os homens
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eram muito estúpidos e feios para se casarem com uma mulher tão bonita e sábia. Finalmente, porém, ela encontrou um rapaz bonito, forte e muito sábio para a idade dele. Gayelette decidiu que quando ele crescesse e se tornasse um homem adulto seria seu marido, e levou-o para o Palácio de Rubi e usou todos os seus poderes mágicos para torná-lo tão forte, bom e adorável quanto uma mulher poderia desejar. Quando ele ficou adulto, todos achavam Quelala, era esse o seu nome, o melhor e mais sábio homem de toda aquela terra, e sua beleza era tão impressionante que Gayelette o amava de paixão, e se apressou em deixar tudo pronto para o casamento.
Meu avô, nessa época, era o rei dos Macacos Alados, e morava na floresta perto do palácio de Gayelette; e o velho adorava pregar peças nos outros. Um dia, pouco antes do casamento, meu avô voava com seu bando quando viu Quelala caminhando à beira do rio. Estava muito bem trajado com uma bela roupa de seda cor-de-rosa e veludo púrpura, e meu avô resolveu aprontar uma brincadeira com ele. Ao seu comando, o bando fez um voo rasante, pegou Quelala pelos braços e levou-o pelos ares até o meio do rio, onde o deixaram cair dentro d’água.
“E aí, rapaz? Vamos nadar, vamos nadar!”, gritava meu avô. “Veremos se a água mancha ou não sua roupa!” Quelala era muito esperto, nadava bem, e apesar de toda a sua fortuna não tinha virado um rapaz mimado e preguiçoso. Riu assim que voltou à superfície da água e nadou até a margem. Mas quando Gayelette saiu do palácio e foi correndo ao seu encontro, viu que a seda e o veludo da roupa dele haviam sido estragados pela água do rio. A princesa ficou furiosa, e sabia, é claro, quem tinha sido o autor da brincadeira. Então, mandou trazer todos os Macacos Alados à sua presença, e disse que para começar eles deveriam ter suas asas amarradas e ser tratados do mesmo jeito que haviam tratado Quelala, isto é, atirados no rio. Mas meu avô suplicou muito que ela não fizesse isso, pois sabia que os Macacos iriam se afogar se fossem jogados com suas asas amarradas, e Quelala também intercedeu em favor deles.
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Gayelette finalmente decidiu poupá-los, com a condição de que os Macacos Alados deveriam, a partir de então, atender três pedidos do detentor do gorro de ouro. Esse gorro havia sido presente de casamento da princesa para Quelala, e dizem que custou metade de seu reino. É claro que meu avô e todos os outros Macacos concordaram na hora com essa condição, e foi assim que passamos a ser escravos por três vezes do dono do gorro de ouro, não importava quem fosse.
– E o que foi feito deles? – perguntou Dorothy, que acompanhara a história com muito interesse.
– Quelala, o primeiro dono do gorro de ouro – respondeu o Macaco –, foi o primeiro que exigiu que cumpríssemos seus desejos. Como sua noiva não podia nos ver nem pintados, depois de se casar convocou todos nós para um encontro com ele na floresta e nos mandou ficar sempre em um lugar onde a princesa nunca pudesse colocar seus olhos num Macaco Alado, o que achamos ótimo, pois todos tínhamos medo dela. Isso foi tudo o que tivemos que fazer até que o gorro de ouro caiu nas mãos da Bruxa Má do Oeste, que nos obrigou a escravizar os Winkies, e depois a expulsar o próprio Oz do País do Oeste. Agora, o gorro de ouro pertence a vocês, que têm por três vezes o direito de nos fazer cumprir seus desejos.
Assim que o Macaco Rei terminou sua história, Dorothy olhou para baixo e viu os muros verdes e reluzentes da Cidade das Esmeraldas. Admirou-se com a rapidez com que aqueles Macacos voavam, e estava feliz com o término da viagem. As estranhas criaturas desceram com os viajantes e, com toda a delicadeza, deixaram-nos diante do portão da cidade. O rei fez uma profunda reverência a Dorothy e saiu voando a toda velocidade, seguido por todos do seu bando.
– Foi uma ótima viagem – disse a garotinha.
– Sim, e um jeito de sair rapidinho da nossa encrenca – replicou o Leão. – A sorte foi você ter trazido esse gorro maravilhoso com você!
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Quem era o verdadeiro Oz, o Terrível
CAPÍTULO
XV
Os quatro viajantes foram até o grande portão da Cidade das Esmeraldas e tocaram a campainha. Depois de tocarem várias vezes, o portão foi aberto, pelo mesmo Guardião dos Portões que já haviam conhecido de antes.
– O quê?! Vocês de novo por aqui?! –perguntou ele, surpreso.
– Pois não está nos vendo? – respondeu o Espantalho.
– Mas pensei que tinham ido encontrar a Bruxa Má do Oeste.
– E encontramos – disse o Espantalho.
– E ela deixou vocês irem embora? – perguntou o homem, mal acreditando.
– Ela não teve como impedir, foi derretida – explicou o Espantalho.
– Derretida! Bem, essa é realmente uma notícia muito boa – disse o homem. – Quem a derreteu?
– A Dorothy – disse o Leão, sério.
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– Minha nossa! – exclamou o homem, e fez uma profunda reverência à menina.
Então, levou-os ao seu pequeno alojamento e colocou óculos travados à chave em todas, como havia feito da primeira vez. Em seguida, atravessaram o portão e entraram na Cidade das Esmeraldas. Quando as pessoas souberam pelo Guardião dos Portões que Dorothy havia derretido a Bruxa Má do Oeste, juntaram-se em volta dos viajantes, seguindo-os em grande cortejo até o Palácio de Oz.
Quem montava guarda diante da porta ainda era o soldado da barba verde, que os deixou passar na hora, e foram recebidos de novo pela linda moça verde, que levou cada um imediatamente ao seu antigo quarto, para que descansassem até que o Grande Oz estivesse disponível para recebê-los.
O soldado já levara a Oz a notícia de que Dorothy e os outros viajantes estavam de volta, depois de terem eliminado a Bruxa Má; mas Oz não comentou nada. Imaginavam que o Grande Mágico iria chamá-los na mesma hora, mas ele não fez isso. E não tiveram notícia de Oz no dia seguinte, nem no outro, nem no outro. A espera era cansativa e desgastante, e acabaram ficando magoados com Oz, por tratá-los com tamanha indiferença, depois de tê-los enviado para sofrer tantos contratempos, incluindo a escravidão. Então, o Espantalho finalmente pediu que a moça verde levasse outro recado a Oz: se ele não os recebesse imediatamente, iriam pedir ajuda aos Macacos Alados, para ver se desse jeito ele iria cumprir suas promessas ou não. O Mágico ficou tão assustado ao receber essa mensagem que mandou-os vir à Sala do Trono na manhã seguinte, às nove horas e quatro minutos. Ele já havia se deparado uma vez com os Macacos Alados na Terra do Oeste, e não queria encontrá-los de novo.
Os quatro viajantes passaram a noite em claro, cada um pensando no presente que Oz prometera lhe dar. Dorothy caiu no sono apenas uma vez, e então sonhou que estava no
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Kansas, onde Tia Em lhe dizia o quanto estava feliz por ter sua garotinha de novo em casa.
Exatamente às nove da manhã seguinte, o soldado da barba verde veio chamá-los, e quatro minutos mais tarde entravam todos na Sala do Trono do Grande Oz.
Cada um, é claro, esperava ver o Mágico na forma que ele havia assumido antes, e tiveram uma surpresa quando olharam e não viram ninguém na sala. Ficaram perto da porta, juntinhos um do outro, porque a quietude da sala vazia era mais assustadora ainda do que quaisquer formas que já tivessem visto Oz assumir.
Então ouviram uma voz solene, que parecia vir de algum lugar no alto da grande cúpula, dizendo:
– Sou Oz, o Grande e Terrível. Por que vieram me procurar?
Vasculharam com o olhar todos os cantos da sala, e, como não viram ninguém, Dorothy perguntou:
– Onde você está?
– Estou por toda parte – respondeu a voz –, mas para os olhos dos comuns mortais sou invisível. Agora irei me sentar no meu trono, para que vocês possam conversar comigo. – De fato, parecia que naquela hora a voz saía diretamente do próprio trono; então foram até lá e ficaram enfileirados. Dorothy disse:
– Viemos cobrar nossa promessa, Grande Oz.
– Que promessa? – perguntou Oz.
– Você prometeu me mandar de volta para o Kansas quando a Bruxa Má fosse eliminada – disse a menina.
– E prometeu me dar um cérebro – disse o Espantalho.
– E me dar um coração – disse o Homem de Lata.
– E me dar coragem – disse o Leão Covarde.
– A Bruxa Má foi mesmo eliminada? – perguntou a voz, e Dorothy achou que nessa hora a voz do Mágico havia tremido um pouco.
– Sim – respondeu ela. – Eu a derreti com um balde de água.
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– Minha nossa! – disse a voz – Que eficiência! Bem, me procurem amanhã, porque preciso de tempo para pensar nisso melhor.
– Você já teve tempo de sobra – disse o Homem de Lata, irritado.
– Não vamos esperar nem mais um dia – disse o Espantalho.
– Você precisa cumprir suas promessas! – exclamou Dorothy.
O Leão achou que seria uma boa ideia assustar o Mágico, então deu um rugido enorme, bem alto, tão feroz e apavorante que Totó, em pânico, correu para longe e acabou derrubando o biombo que ficava num canto da sala. O biombo caiu fazendo um barulhão, e quando olharam naquela direção ficaram admiradíssimos, pois viram, em pé, exatamente no lugar que era encoberto pelo biombo, um velho baixinho, careca e de rosto enrugado, que parecia estar tão surpreso quanto eles. O Homem de Lata correu na direção do homenzinho com o machado erguido e gritou:
– Quem é você?
– Sou Oz, o Grande e Terrível – disse o homenzinho, com voz trêmula. – Mas não me agrida, por favor, farei tudo o que quiserem.
Nossos amigos olharam para ele, surpresos e decepcionados.
– Eu achava que Oz era uma grande Cabeça – disse Dorothy.
– E eu, que Oz era uma linda dama – disse o Espantalho.
– E eu achava que Oz era uma besta terrível – disse o Homem de Lata.
– E eu, que Oz era uma bola de fogo! – exclamou o Leão.
– Não, não, vocês estão todos equivocados – disse o homenzinho, humildemente. – Eu estava só fingindo.
– Fingindo! – gritou Dorothy. – Você não é um grande mágico?
– Shh, querida – disse ele. – Não fale alto desse jeito, podem ouvi-la, e então estarei perdido. Todos aqui acreditam que eu sou um grande mágico.
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– E você não é? – perguntou ela.
– Longe disso, minha cara; sou apenas um homem comum.
– Homem comum? Não exatamente... – disse o Espantalho, em tom bem sério. – Você é um charlatão.
– Isso mesmo! – declarou o homenzinho, esfregando as mãos como se isso o deixasse envaidecido. – Sou um charlatão.
– Mas isso é terrível – disse o Homem de Lata. – Como vou fazer para arrumar um coração?
– E eu, a minha coragem? – perguntou o Leão.
– E eu, o meu cérebro? – gemeu o Espantalho, limpando as lágrimas dos olhos com a manga do casaco.
– Meus queridos amigos – disse Oz –, peço que deixem de lado essas ninharias. Pensem na minha situação, e na terrível encrenca em que eu me meti agora que fui descoberto.
– Por quê? Ninguém mais sabe que você é um charlatão?
– perguntou Dorothy.
– Ninguém, só vocês quatro... e eu – respondeu Oz. –Venho enganando todo mundo há tanto tempo que achei que nunca seria descoberto. Meu grande erro foi deixá-los entrar na Sala do Trono. Em geral, não sou visto nem por meus súditos, e por isso eles acreditam que sou alguém terrível.
– Mas eu não estou entendendo – disse Dorothy, confusa. – Como é que você apareceu para mim como uma grande cabeça?
– Esse foi um dos meus truques – respondeu Oz. – Venham aqui, por favor, vou lhes mostrar como funciona.
Oz foi até uma saleta atrás da Sala do Trono, e todos o seguiram. Apontou para um canto, onde estava a grande cabeça, feita de papel de várias grossuras e com o rosto cuidadosamente pintado.
– Eu faço a cabeça pender do teto por um fio de arame –disse Oz. – Então fico atrás do biombo e puxo uns fios, fazendo com que os olhos se mexam e a boca abra e feche.
– Mas e a voz? – indagou ela.
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– Ah, eu sou ventríloquo – disse o homenzinho. – Posso projetar o som da minha voz onde quiser, e foi por isso que você acreditou que ela estava saindo da cabeça. Vejam as outras coisas que usei para iludi-los. – Ele mostrou então ao Espantalho o vestido e a máscara que havia usado quando se fez passar pela bela dama. E o Homem de Lata viu que a terrível besta nada mais era do que um monte de peles costuradas umas às outras, com umas ripas para mantê-las estendidas. Quanto à bola de fogo, o falso mágico também a fazia pender do teto. Era, na realidade, uma bola de algodão, só que ele a embebia de querosene para que ardesse em grandes chamas.
– Na realidade – disse o Espantalho –, você deveria era ter vergonha de ser tão charlatão.
– Eu tenho, sim, pode estar certo – respondeu o homenzinho constrangido. – Mas era a única coisa que eu podia fazer. Sentem-se, por favor, há cadeiras de sobra; vou lhes contar minha história.
Então se sentaram e o ouviram narrar os seguintes fatos.
– Nasci em Omaha...
– Nossa, isso não é muito longe do Kansas! – gritou Dorothy.
– Não, mas fica bem longe daqui – disse ele, balançando a cabeça e olhando para ela, melancólico. – Quando cresci, virei ventríloquo, e fui muito bem treinado nisso por um grande mestre. Posso imitar qualquer tipo de pássaro ou animal. – Então, deu um miado, tão parecido com o miado de um gatinho que Totó pôs as orelhas em pé e ficou procurando um gato por todo lado. – Depois de um tempo – continuou Oz –, cansei disso e me tornei balonista.
– O que é isso? – perguntou Dorothy.
– Balonista é a pessoa que sobe num balão nos dias de circo, anunciando o espetáculo e atraindo as pessoas, para que elas paguem ingresso e vão ver o circo – explicou.
– Ah, sei – disse ela.
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– Bem, um dia eu subi de balão, mas as cordas ficaram emaranhadas e não consegui mais descer. O balão foi embora, subiu acima das nuvens, bem alto, e foi levado por uma corrente de ar a quilômetros e quilômetros de distância. Durante um dia e uma noite, viajei pelos ares, e na manhã do segundo dia acordei e vi o balão flutuando acima de um lugar estranho e muito bonito.
O balão foi descendo devagar e eu não me machuquei. Mas de repente estava no meio de pessoas estranhas que, ao me verem descer das nuvens, imaginaram que eu fosse um grande mágico. Claro, achei melhor deixar que continuassem a me ver dessa forma, pois disseram que tinham medo de mim e prometeram fazer qualquer coisa que eu desejasse.
Só para me divertir e manter aquelas pessoas ocupadas, mandei que construíssem uma cidade e também um palácio para mim; e fizeram isso de bom grado e com muito esmero. Então pensei, já que o lugar era tão verde e tão bonito, que deveria chamá-lo de Cidade das Esmeraldas; e para que o nome ficasse mais adequado coloquei óculos verdes em todas as pessoas, assim tudo o que elas vissem ficaria dessa cor.
– Quer dizer que nem todas as coisas aqui são verdes? –perguntou Dorothy.
– Não mais do que em qualquer outra cidade – replicou Oz –, mas quando você está de óculos verdes, claro, tudo o que você vê lhe parece verde. A Cidade das Esmeraldas foi construída há muitos anos, porque eu era jovem quando o balão me trouxe aqui, e agora já sou velho. Mas meu povo vem usando óculos verdes há tanto tempo que a maioria acha que realmente se trata de uma cidade de esmeraldas, e sem dúvida é um lugar bonito, com muitas joias e metais preciosos, e todas as coisas boas que alguém precisa para se sentir feliz. Eu tenho sido bom para o povo, e eles gostam de mim; mas desde que o palácio foi construído, eu me tranquei aqui e não vejo ninguém.
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Um dos meus maiores medos era das Bruxas, pois, embora eu não tenha quaisquer poderes mágicos, logo descobri que as Bruxas eram realmente capazes de fazer coisas fantásticas. Havia quatro Bruxas neste país, e elas governavam as pessoas que viviam nas Terras do Norte e do Sul, do Leste e do Oeste. Felizmente, as Bruxas do Norte e do Sul eram boas, e eu sabia que elas não me fariam mal, mas as Bruxas do Leste e do Oeste eram terrivelmente malvadas, e se não acreditassem que eu era mais poderoso que elas, certamente teriam me destruído. Com isso, vivi muitos anos com um medo mortal; portanto, vocês já podem imaginar como fiquei contente quando soube que sua casa havia caído em cima da Bruxa Má do Leste. Quando vocês vieram me ver, eu me dispus a prometer qualquer coisa que vocês quisessem só para me livrar da outra Bruxa; mas agora que vocês a derreteram, sinto dizer que não tenho como cumprir minhas promessas.
– Acho que você é um homem muito mau – disse Dorothy.
– Não, não, minha querida; na realidade sou um homem muito bom, mas sou um mágico medíocre, preciso admitir isso.
– Você não é capaz de me dar um cérebro? – perguntou o Espantalho.
– Você não precisa de um cérebro. Você vem aprendendo uma coisa nova a cada dia. Um bebê tem cérebro, mas ele não sabe muita coisa. A experiência é a única coisa que traz conhecimento, e quanto mais tempo você vive mais experiência você adquire, com certeza.
– Tudo isso pode ser verdade – disse o Espantalho –, mas eu vou me sentir muito infeliz se você não me der um cérebro.
O falso Mágico olhou para ele detidamente.
– Muito bem – disse ele, suspirando –, eu não sou lá um mágico muito bom, como já disse; mas se vier aqui amanhã de manhã, vou encher sua cabeça de miolos. Mas não sou capaz de dizer de que modo você deve usá-los; vai ter que descobrir isso por sua conta.
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– Ah, muito obrigado, mas muito obrigado mesmo! –gritou o Espantalho. – Eu vou achar um jeito de usar meus miolos direito, pode ter certeza!
– Mas e quanto à minha coragem? – perguntou o Leão, ansioso.
– Você já tem muita coragem, não duvido disso nem um pouco – respondeu Oz. – Você só precisa confiar mais em você. Não existe criatura viva que não sinta medo diante do perigo. A verdadeira coragem está em enfrentar o perigo mesmo quando você tem medo, e esse tipo de coragem você tem de sobra.
– Talvez tenha, mas fico apavorado do mesmo jeito –disse o Leão. – Eu vou me sentir realmente muito infeliz a não ser que você me dê o tipo de coragem que faz as pessoas esquecerem que estão com medo.
– Muito bem, eu vou lhe dar esse tipo de coragem amanhã – respondeu Oz.
– E quanto ao meu coração? – perguntou o Homem de Lata.
– Bem, quanto a isso – respondeu Oz –, acho que é um equívoco você querer um coração. É o que faz a maioria das pessoas se sentirem infelizes. Se pelo menos você tivesse consciência disso, saberia que é um cara de sorte por não ter coração.
– Acho que é uma questão de opinião – disse o Homem de Lata. – Mas serei capaz de suportar toda a infelicidade do mundo sem reclamar desde que você me dê um coração.
– Muito bem – respondeu Oz humildemente. – Venha me ver amanhã e terá seu coração. Eu venho fazendo esse papel de mágico há tantos anos que posso muito bem continuar a desempenhá-lo um pouco mais.
– E eu – disse Dorothy –, como faço para voltar ao Kansas?
– Vamos ter que refletir um pouco mais sobre isso – respondeu o homenzinho. – Preciso de uns dois ou três dias para pensar no assunto e vou tentar achar um jeito de fazer você
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atravessar o deserto. Enquanto isso, vocês serão tratados como meus hóspedes, e durante sua estadia no palácio meu povo irá servi-los e atender aos seus mínimos desejos. Eu só peço a vocês uma coisa, como retribuição pela minha ajuda... seja lá como ela venha a se revelar. Que vocês mantenham meu segredo e não digam a ninguém que eu sou um charlatão. Eles concordaram em não dizer nada do que haviam descoberto, e voltaram para os seus quartos muito animados. Até mesmo Dorothy tinha a esperança de que o Grande e Terrível Charlatão, que foi como passou a chamá-lo, encontraria um jeito de mandá-la de volta para o Kansas. E se ele fizesse isso, ela estava disposta a perdoar-lhe tudo.
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As artes mágicas do Grande Charlatão
CAPÍTULO XVI
Na manhã seguinte, o Espantalho disse aos seus amigos:
– Podem me dar os parabéns. Estou indo ver o Oz e ele finalmente vai me dar um cérebro. Quando eu voltar, serei igualzinho a todos os demais homens.
– Eu sempre gostei de você assim, do jeito que é – disse Dorothy, com simplicidade.
– Bondade sua gostar de um Espantalho – respondeu ele. – Mas com certeza você vai me dar mais valor quando ouvir os esplêndidos pensamentos que meu novo cérebro irá produzir. – Então despediu-se deles, animado, e foi para a Sala do Trono. Bateu à porta.
– Entre – disse Oz.
O Espantalho entrou e viu o homenzinho sentado, junto à janela, mergulhado em pensamentos.
– Vim por causa do meu cérebro – lembrou o Espantalho, um pouco inquieto.
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– Ah, sim; sente-se nesta cadeira, por favor – respondeu Oz. – Você vai me desculpar, mas vou ter que remover a sua cabeça, pois preciso fazer isso para poder colocar seu cérebro no lugar certo.
– Não tem problema – disse o Espantalho. – Pode tirar minha cabeça fora, desde que ela fique melhor quando a puser de novo no lugar.
Então o mágico desprendeu a cabeça do Espantalho e tirou de dentro toda a palha. Em seguida, foi até a saleta do fundo e pegou uma boa porção de folhas secas, e misturou-as com uma porção de alfinetes e agulhas. Sacudiu tudo bastante e encheu o alto da cabeça do Espantalho com aquela mistura, completando o resto do espaço com palha, para que ficasse tudo assentado no lugar.
Quando prendeu de novo a cabeça do Espantalho no corpo disse:
– A partir de agora você será um grande homem, porque eu lhe dei um cérebro “novinho em folha”.
O Espantalho ficou muito satisfeito e orgulhoso ao ver seu maior desejo atendido; e, depois de agradecer muito a Oz, voltou ao encontro de seus amigos.
Dorothy olhou para ele muito curiosa. Vinha com a cabeça bastante inchada na parte de cima, por causa do cérebro novo.
– Como você se sente? – perguntou ela.
– Eu me sinto realmente mais sabido – respondeu, sério.
– Depois que me acostumar com meu cérebro, acho que vou saber muitas coisas.
– Por que tem agulhas e alfinetes saindo pra fora da sua cabeça? – perguntou o Homem de Lata.
– É pra mostrar que ele tem um intelecto afiado – observou o Leão.
– Bem, vou lá falar com Oz para pegar meu coração – disse o Homem de Lata. Então foi até a Sala do Trono e bateu à porta.
– Entre! – gritou Oz.
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O lenhador entrou e disse:
– Vim buscar meu coração.
– Muito bem – respondeu o homenzinho. – Mas vou ter que abrir um buraco no seu peito, para poder colocar o coração no lugar certo. Espero que não doa muito.
– Não vai doer, não – respondeu o lenhador. – Eu não sinto nada.
Então Oz pegou uma tesoura de cortar metal e abriu um pequeno quadrado do lado esquerdo do peito do Homem de Lata. Em seguida, foi até um gaveteiro e pegou um coração muito bonito, todo ele feito de seda e recheado de serragem.
– Não é uma beleza? – perguntou.
– Ah, sim, muito bonito! – respondeu o Homem de Lata, que ficou imensamente satisfeito. – Mas é um coração bondoso?
– Muito bondoso! – respondeu Oz. Ele colocou o coração no peito do lenhador e então recolocou no lugar o quadradinho de lata, soldando-o com precisão em todo o seu contorno.
– Pronto – disse. – Agora você tem um coração que qualquer homem se orgulharia de possuir. Desculpe por esse remendo no seu peito, mas realmente não havia outro jeito.
– Não me incomodo com o remendo! – Exclamou o Homem de Lata feliz da vida. – Sou muito grato a você, e nunca esquecerei da sua bondade.
– Não foi nada – respondeu Oz.
Então, o Homem de Lata voltou ao encontro de seus amigos, que lhe desejaram tudo de bom em sua nova fase.
O Leão foi o próximo a ir até a Sala do Trono e bateu à porta.
– Entre – disse Oz.
– Vim buscar minha coragem – anunciou o Leão, entrando na sala.
– Muito bem – respondeu o homenzinho; – Vou lá pegar. Ele abriu um guarda-louça, esticou o braço até uma prateleira bem alta e pegou uma garrafa verde, quadrada, despejando seu conteúdo num prato verde e dourado, com belos entalhes.
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Depois de colocar o prato na frente do Leão Covarde, que cheirou e pareceu não gostar muito, o mágico disse:
– Tome.
– O que é? – perguntou o Leão.
– Bom – respondeu Oz –, se estivesse dentro de você, seria sua coragem. Como você, é claro, já sabe, a coragem fica sempre dentro da pessoa; então isso aqui não pode realmente ser chamado de coragem enquanto você não tiver tomado. Portanto, aconselho você a beber tudo o mais rápido possível.
O Leão não pensou duas vezes e tomou tudo, limpando o prato.
– Como se sente? – perguntou Oz.
– Cheio de coragem – respondeu o Leão, que voltou feliz para encontrar seus amigos e contar-lhes a boa novidade.
Quando ficou sozinho, Oz sorriu de satisfação ao lembrar como havia sido fácil dar ao Espantalho, ao Homem de Lata e ao Leão exatamente o que eles desejavam.
– Como eu poderia evitar ser um charlatão – disse ele –quando todas essas pessoas me obrigam a fazer coisas que todos sabem que são impossíveis? Foi muito fácil fazer a felicidade do Espantalho, do Leão e do Homem de Lata, porque eles imaginam que sou capaz de fazer qualquer coisa. Mas será preciso mais do que imaginação para levar Dorothy de volta ao Kansas, e com certeza não tenho ideia de como isso pode ser feito.
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O balão sobe aos céus
CAPÍTULO XVII
Durante três dias, Dorothy não teve nenhuma notícia de Oz. Foram dias tristes para a garotinha, embora seus amigos estivessem muito felizes. O Espantalho contou que sua cabeça produzia pensamentos maravilhosos, mas que não diria quais eram porque sabia que ninguém mais, só ele, seria capaz de entendê-los. Quando o Homem de Lata andava, sentia seu coração chacoalhando dentro do peito, e disse a Dorothy que percebia tratar-se de um coração mais bondoso e gentil do que aquele que tivera quando era de carne e osso. O Leão afirmava que agora não tinha medo de nada neste mundo, e que enfrentaria de bom grado um exército ou uma dezena daqueles ferozes Kalidahs.
Ou seja, todos do pequeno grupo estavam satisfeitos, exceto Dorothy, que desejava mais do que nunca voltar para o Kansas.
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No quarto dia, para sua grande alegria, Oz mandou chamála, e, quando ela entrou na Sala do Trono, o Mágico a recebeu de maneira muito gentil:
– Sente-se, minha querida; acho que descobri uma maneira de tirá-la deste país.
– E voltar para o Kansas? – perguntou ela, ansiosa.
– Bem, quanto ao Kansas não tenho tanta certeza – disse Oz, –, porque não faço a menor ideia de onde fica. Mas o mais importante é atravessar o deserto; feito isso, será fácil achar o caminho de casa.
– E como vou fazer para cruzar o deserto? – indagou a menina.
– Bem, vou lhe dizer o que pensei – disse o homenzinho.
– Veja bem, quando cheguei a este país, foi num balão. Você também veio pelos ares, carregada por um ciclone. Então, acredito que a melhor maneira de conseguir atravessar o deserto é pelo ar. Considerando que produzir um ciclone é algo bem acima dos meus poderes, andei pensando e repensando, e acredito que sou capaz de construir um balão.
– Como? – perguntou Dorothy.
– Veja – disse Oz –, um balão é feito de seda, recoberta de cola para não deixar o gás escapar. Eu tenho seda de sobra aqui no palácio, por isso não vai ser problema construir o balão. Só que neste país inteiro não existe gás para preenchê-lo e fazê-lo subir.
– Mas se ele não subir – observou Dorothy – não terá nenhuma utilidade para nós.
– Certo – respondeu Oz. – Mas há outra maneira de fazê-lo flutuar, que é enchê-lo de ar quente. O ar quente não é tão bom quanto o gás, porque se o ar esfria demais o balão pode acabar descendo no meio do deserto, e então nós estaremos perdidos.
– Nós?! – exclamou a menina. – Você viria comigo?
– Sim, é claro – respondeu Oz. – Estou cansado de ser charlatão. Se as pessoas descobrirem que não sou um mágico,
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ficarão chateadas comigo por eu tê-las enganado. Então tenho que ficar trancado nesse quarto o dia todo, e isso cansa. Prefiro voltar para o Kansas com você e trabalhar de novo num circo.
– Eu adoraria ter a sua companhia – disse Dorothy.
– Obrigado – ele respondeu. – Bom, se você me ajudar a costurar as peças de seda, podemos começar já a construir nosso balão.
Dorothy pegou agulha e linha e com a mesma rapidez que Oz cortava as tiras de seda no tamanho certo a menina ia costurando direitinho umas às outras. Primeiro fizeram uma tira de seda verde-claro, depois uma verde-escuro, e em seguida uma verde-esmeralda. Porque Oz quis se esmerar e fazer o balão com diferentes tons de verde. Demorou três dias para costurar todas as tiras, mas quando ficou pronto eles tinham em mãos um grande saco de seda verde, com mais de seis metros de comprimento.
Então Oz cobriu a parte de dentro com uma camada fina de cola, para evitar que o ar vazasse, e depois disso anunciou que o balão estava pronto.
– Mas precisamos de um cesto para viajar dentro dele –disse Oz. Então mandou o soldado da barba verde buscar um grande cesto de roupa, e prendeu-o com várias cordas à parte de baixo do balão.
Quando tudo ficou pronto, Oz anunciou ao seu povo que iria fazer uma visita a um grande mágico irmão dele que vivia nas nuvens. A notícia correu depressa por toda a cidade e todos vieram ver aquela atração maravilhosa.
Oz mandou colocar o balão na frente do palácio, e as pessoas o admiravam com muita curiosidade. O Homem de Lata cortou uma pilha grande de lenha e fez uma fogueira, e Oz segurou a boca do balão acima do fogo para que o ar quente da fogueira entrasse naquele grande saco de seda. Pouco a pouco, o balão foi enchendo e começou a flutuar no ar, até que finalmente o cesto mal encostava no chão.
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Então, Oz entrou no cesto e disse a todas as pessoas em alto e bom som:
– Estou saindo para fazer uma visita. Enquanto estiver fora, o Espantalho irá governá-los. Ordeno que o obedeçam como obedeceriam a mim.
Agora o balão puxava com força e esticava a corda que o prendia ao chão, pois o ar dentro dele estava quente, ficando mais leve que o ar de fora do balão e fazendo força para se erguer nos céus.
– Venha, Dorothy! – gritou o mágico. – Apresse-se, senão o balão vai embora.
– Não consigo encontrar Totó em lugar nenhum – respondeu Dorothy, que não queria ir sem o cãozinho. Totó havia corrido para o meio da multidão para latir para um gatinho, mas Dorothy, por fim, conseguiu encontrá-lo. Então pegou-o no colo e correu para o balão.
Estava a apenas alguns passos dele, Oz estendia os braços para fora do cesto para ajudá-la a subir, só que, de repente: Crac! As cordas arrebentaram, e o balão subiu sem Dorothy.
– Volte aqui! – gritou a menina. – Eu quero ir também!
– Não consigo voltar, minha querida! – Gritava Oz da cesta. – Adeus!
– Adeus! – gritou todo mundo, e todos os olhares voltaram-se para cima, onde o mágico ia subindo no balão, cada vez mais alto em direção ao céu.
E esta foi a última vez que viram Oz, o Maravilhoso Mágico, se bem que ele deve ter chegado a salvo em Omaha e, pelo que se sabe, vive muito bem ali agora. Mas as pessoas continuaram a se lembrar dele com carinho e comentavam:
– Oz sempre foi nosso amigo. Quando estava aqui, construiu para nós esta linda Cidade das Esmeraldas, e agora que foi embora deixou o Sábio Espantalho para nos governar.
Mesmo assim, por vários dias, todos eles lamentaram a perda do Maravilhoso Mágico, e não se conformavam com isso.
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A partida para o Sul
CAPÍTULO XVIII
Dorothy chorou amargamente quando viu perdida a sua esperança de voltar para o Kansas; mas, pensando bem, talvez até tivesse sido bom não ter subido naquele balão. A menina também estava triste com a partida de Oz, assim como seus companheiros.
O Homem de Lata chegou perto dela e disse:
– Na verdade, eu seria ingrato se não lamentasse a ida do homem que me deu este adorado coração. Gostaria de chorar um pouco pela partida de Oz, isso se você tiver a gentileza de ir limpando minhas lágrimas, para que eu não enferruje.
– Faço isso com prazer – respondeu ela, e já arrumou logo uma toalha. Então, o Homem de Lata chorou vários minutos, enquanto ela observava com atenção as lágrimas e ia secando-as. Quando ele terminou de chorar, agradeceu a gentileza dela e lubrificou ele mesmo suas juntas com sua latinha de óleo cravejada de pedrinhas preciosas, para evitar futuros contratempos.
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O Espantalho era agora o governante da Cidade das Esmeraldas, e embora não fosse um mágico, as pessoas tinham orgulho dele. Diziam:
– Afinal, não há outra cidade no mundo inteiro que seja governada por um homem recheado de palha.
E, pelo que se sabe, estavam bem certas a respeito disso.
Na manhã seguinte à partida de Oz no balão, os quatro viajantes se reuniram na Sala do Trono para discutir a situação. O Espantalho sentou-se no grande trono e os outros ficaram respeitosamente em pé diante dele.
– Até que nos saímos bem – disse o novo governante –, pois este palácio e a Cidade das Esmeraldas agora nos pertencem, e podemos proceder como acharmos melhor. Quando me lembro que, não faz muito tempo, eu estava grudado a uma estaca no meio de um milharal, e que agora governo esta bela cidade, fico bem satisfeito com o meu destino.
– Eu também – disse o Homem de Lata –, estou bem satisfeito com meu coração novo; e, na realidade, esta era a única coisa que eu desejava no mundo.
– Quanto a mim, estou contente em saber que sou tão corajoso quanto qualquer animal que já tenha vivido, ou mais ainda – disse o Leão, com modéstia.
– Se Dorothy pelo menos estivesse feliz morando aqui na Cidade das Esmeraldas – continuou o Espantalho – então estaríamos todos contentes.
– Mas eu não quero ficar aqui! – gritou Dorothy. – Quero ir para o Kansas, morar com Tia Em e Tio Henry.
– Bem, o que podemos fazer a respeito disso? – indagou o lenhador.
O Espantalho decidiu pensar no assunto, e pensou com tanta intensidade que os alfinetes e agulhas começaram a saltar para fora de seu cérebro. Finalmente, disse:
– Por que não chamamos os Macacos Alados e pedimos que carreguem você até o outro lado do deserto?
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– Não tinha pensado nisso! – disse Dorothy, eufórica. – É isso mesmo. Vou já procurar meu gorro de ouro.
Quando chegou com ele na Sala do Trono, pronunciou as palavras mágicas e logo um bando de Macacos Alados entrou voando por uma janela e parou ao lado dela.
– Esta é a segunda vez que você nos chama – disse o Macaco Rei, fazendo uma reverência à menina. – O que deseja?
– Quero que vocês me transportem voando para o Kansas – disse Dorothy.
Mas o Macaco Rei abanou a cabeça negativamente.
– Não será possível – disse ele. – Nós pertencemos a este país apenas, não podemos sair dele. Nunca se teve notícia até hoje de algum Macaco Alado no Kansas, e suponho que isso nunca acontecerá, pois lá não é o lugar deles. Teremos o maior prazer em servi-la em qualquer coisa que estiver ao nosso alcance, mas não podemos atravessar o deserto. Adeus.
E, com outra reverência, o Macaco Rei bateu asas e saiu pela janela, seguido por todo o seu bando. Dorothy estava a ponto de chorar de tanta decepção.
– Desperdicei à toa um dos feitiços do gorro de ouro – disse ela –, pois os Macacos Alados não podem me ajudar.
– É uma pena, sem dúvida! – disse o Homem de Lata, com seu coração mole.
O Espantalho pôs-se a pensar de novo, e sua cabeça ficou inchada de um jeito tão horrível que Dorothy teve receio de que fosse estourar.
– Vamos chamar o soldado da barba verde – disse ele. –Quem sabe ele nos dá algum conselho. Então o soldado foi chamado e entrou na Sala do Trono timidamente, pois, enquanto Oz reinou, ele nunca tivera permissão de ir além da porta.
– Esta garotinha – disse o Espantalho ao soldado – quer atravessar o deserto. Como ela poderia fazer isso?
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– Não sei dizer – respondeu o soldado –, pois nunca ninguém cruzou o deserto, a não ser o próprio Oz.
– Então não há ninguém que possa me ajudar? – perguntou Dorothy, séria.
– Talvez Glinda – sugeriu o soldado.
– Quem é Glinda? – indagou o Espantalho.
– A Bruxa do Sul. É a mais poderosa de todas as bruxas, e governa os Quadlings. Além disso, seu castelo fica à beira do deserto, então ela talvez saiba de alguma maneira de atravessá-lo.
– Glinda é uma Bruxa Boa, não é? – perguntou a menina.
– Os Quadlings dizem que sim – respondeu o soldado –, e ela é boa com todos. Ouvi dizer que Glinda é uma mulher muito bonita, que sabe como se manter jovem apesar de já ter vivido muitos anos.
– Como posso chegar ao castelo dela? – perguntou Dorothy.
– A estrada vai sempre para o Sul – respondeu ele –, mas é cheia de perigos para os viajantes. Há muitas feras selvagens nos bosques, além de uma raça de homens estranhos que não gostam de forasteiros em seu país. É por isso que nenhum dos Quadlings jamais veio até a Cidade das Esmeraldas.
O soldado então foi embora, e o Espantalho disse:
– Pelo visto, apesar dos perigos, a melhor coisa que Dorothy pode fazer é viajar até a Terra do Sul e pedir ajuda a Glinda. Porque se Dorothy continuar aqui, é claro, jamais voltará para o Kansas.
– Você deve ter andado pensando de novo – observou o Homem de Lata.
– Sim, andei pensando – disse o Espantalho.
– Eu irei com Dorothy – declarou o Leão –, pois já estou cansado da cidade e com saudade da floresta e do campo. Na realidade, como vocês sabem, sou um animal selvagem. Além disso, Dorothy vai precisar de alguém que a proteja.
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– Isso é verdade – concordou o lenhador. – E meu machado talvez lhe seja útil; então também irei com ela até a Terra do Sul.
– Quando partiremos? – perguntou o Espantalho.
– Você também vai? – perguntaram, surpresos.
– É claro. Se não fosse por Dorothy, eu nunca teria arrumado um cérebro. Ela me tirou da estaca no milharal e me trouxe até a Cidade das Esmeraldas. Portanto, devo toda a minha boa sorte a ela, e nunca irei abandoná-la até que ela consiga voltar para o Kansas de uma vez por todas.
– Obrigada – agradeceu Dorothy. – Vocês todos são muito bons comigo. Mas eu gostaria de partir o quanto antes.
– Podemos partir amanhã cedo – completou o Espantalho. – Então vamos nos aprontar, pois a viagem será longa.
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Atacados pelas Árvores
Guerreiras
CAPÍTULO XIX
Na manhã seguinte, Dorothy deu um beijo de despedida na moça verde, e todos trocaram cumprimentos com o soldado da barba verde, que os acompanhou até o portão. Quando o Guardião do Portão os viu indo embora, pensou que com certeza estavam saindo da linda cidade para se meter de novo em encrencas. Mas destravou seus óculos, colocando-os de volta na caixa verde, e desejou-lhes uma boa viagem.
– Você agora é nosso governante – disse ele ao Espantalho –, portanto, volte o quanto antes.
– Com certeza farei isso, se me for possível – retrucou o Espantalho. – Mas primeiro tenho que ajudar Dorothy a chegar em casa.
E a menina, ao se despedir pela última vez do afável Guardião, disse:
– Fui muito bem tratada em sua linda cidade, e todos foram muito bons comigo. Não sei expressar o quanto me sinto agradecida por isso.
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– Nem precisa, minha querida – ele respondeu. –Adoraríamos que pudesse ficar aqui conosco, mas se o seu desejo é voltar para o Kansas, espero que encontre uma maneira. – Ele abriu o portão que dava para o muro externo, e eles partiram para mais uma viagem.
O Sol brilhava intenso quando nossos amigos voltaram seus rostos na direção da Terra do Sul. Caminhavam animados, rindo e conversando. Dorothy sentia-se de novo esperançosa de poder voltar para casa, e o Espantalho e o Homem de Lata estavam contentes em poder ajudar a menina. Quanto ao Leão, deliciava-se ao sentir de novo o cheiro de ar fresco, e balançava o rabo de um lado para o outro, de puro contentamento por estar de novo no campo. Totó, por sua vez, corria no meio deles todos, caçando mariposas e borboletas e latindo feliz o tempo inteiro.
– A vida na cidade não combina de jeito nenhum comigo – observou o Leão, enquanto andavam a passo rápido. – Perdi peso enquanto morei ali, e agora não vejo a hora de poder mostrar às outras feras como fiquei corajoso.
Então, viraram-se para dar uma última olhada na Cidade das Esmeraldas. Tudo o que podiam ver era uma massa de torres e pináculos atrás dos muros verdes e, bem acima do resto, as agulhas e a cúpula do Palácio de Oz.
– Pensando bem, Oz não foi um mágico tão ruim assim – disse o Homem de Lata, sentindo seu coração chacoalhar dentro do peito.
– E ele soube me dar um cérebro, e um cérebro dos bons – afirmou o Espantalho.
– Se Oz tivesse bebido uma dose da mesma coragem que ele me fez tomar – acrescentou o Leão –, teria sido um homem muito corajoso.
Dorothy não disse nada. Oz não cumprira a sua promessa, mas fizera o melhor possível, então ela o perdoava. Como ele mesmo disse, era um bom homem, mesmo sendo um péssimo mágico.
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O primeiro dia de viagem foi pelos campos verdes de lindas flores coloridas que se estendiam por todos os lados em volta da Cidade das Esmeraldas. Aquela noite, dormiram na grama, tendo como coberta apenas as estrelas; e descansaram muito bem.
De manhã, seguiram viagem até chegar a um bosque denso. Não havia jeito de contorná-lo, pois parecia se estender à direita e à esquerda até onde a vista alcançava; e, além disso, eles não ousavam mudar a direção de sua viagem por medo de se perder. Então, ficaram procurando algum lugar por onde fosse mais fácil entrar na floresta.
O Espantalho, que encabeçava o grupo, finalmente descobriu uma grande árvore, cujos longos galhos se projetavam tanto que formavam um vão, por baixo do qual o grupo poderia passar. Então, avançou em direção à árvore, mas assim que ficou debaixo dos primeiros galhos estes se curvaram e se enroscaram em volta dele, e no instante seguinte ele foi levantado do chão e arremessado de cabeça no meio de seus companheiros de viagem.
Isso não machucou o Espantalho, mas causou-lhe muita surpresa, e ele parecia bastante confuso quando Dorothy o levantou do chão.
– Aqui há outro vão entre as árvores! – Chamou o Leão.
– Deixe-me ir primeiro – disse o Espantalho –, porque, se for arremessado de novo, não vou me machucar. – Ele caminhou até a outra árvore, conforme anunciara, e os galhos dela na mesma hora o agarraram e o atiraram de volta outra vez.
– Isso é estranho – considerou Dorothy. – O que devemos fazer?
– Parece que as árvores decidiram lutar conosco e interromper nossa viagem – observou o Leão.
– Vamos ver o que acontece comigo – disse o Homem de Lata, e colocando o machado no ombro, marchou em direção à primeira árvore, aquela que havia tratado o Espantalho de modo tão rude. Quando um grande galho curvou-se para agarrá-lo, o lenhador acertou-lhe uma machadada furiosa, cortando-o em dois. Na mesma hora, a árvore começou a sacudir
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todos os seus galhos, como se sentisse dor, e o lenhador passou tranquilamente por baixo dela.
– Venham! – gritou para os outros. – Depressa! – Todos correram e passaram por de baixo dos galhos da árvore sem se machucar, exceto Totó, que foi pego por um galho pequeno, que o sacudiu até ele uivar. Mas o Homem de Lata prontamente decepou o galho e libertou o cãozinho.
As demais árvores da floresta não fizeram nada para impedir a passagem do grupo, então concluíram que apenas as árvores da primeira fileira tinham essa capacidade de curvar seus galhos, e que provavelmente eram os policiais da floresta, que tinham o maravilhoso poder de manter os forasteiros fora dela.
Os quatro viajantes caminharam em paz pelas árvores até chegarem ao lado oposto do bosque. Então, para sua surpresa, viram-se diante de um muro muito alto, que parecia feito de porcelana branca. Era liso como a superfície de um prato, e mais alto do que todos eles.
– O que faremos agora? – perguntou Dorothy.
– Vou construir uma escada – disse o Homem de Lata –, porque com certeza é o caso de passar para o lado de lá do muro.
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O gracioso País de Porcelana
CAPÍTULO XX
Enquanto o Homem de Lata construía uma escada com a madeira que ia encontrando pela floresta, Dorothy deitou e dormiu, pois estava exausta da longa caminhada. O Leão também se enroscou e pegou no sono, e Totó deitou do lado dele.
O Espantalho observava o Homem de Lata trabalhando e disse:
– Não consigo entender por que esse muro está aí, e tampouco tenho ideia de que material é feito.
– Dê um descanso ao seu cérebro e não se preocupe com o muro – respondeu o lenhador. – Depois que passarmos por cima dele saberemos o que há do outro lado. Após um tempo, a escada ficou pronta. Parecia meio desengonçada, mas o Homem de Lata assegurou que era forte e que iria cumprir com seu propósito. O Espantalho acordou Dorothy, o Leão e Totó, e avisou que a escada estava pronta.
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Ele subiu primeiro na escada, mas com tamanha falta de jeito que Dorothy teve que acompanhá-lo bem de perto, atrás dele, para evitar que levasse um tombo. Quando chegou ao alto do muro e olhou do outro lado, o Espantalho exclamou:
– Minha nossa!
– Vá em frente – disse Dorothy.
Então o Espantalho subiu mais uns degraus e sentou no alto do muro, e Dorothy chegou ao alto, olhou e gritou:
– Minha nossa! – igual o Espantalho havia feito.
Então Totó chegou e na mesma hora começou a latir, mas Dorothy o mandou ficar quieto.
O Leão foi o próximo a subir a escada, e o Homem de Lata veio por último; e tanto um quanto o outro gritaram:
“Minha nossa!”, assim que viram o que havia do outro lado. Quando ficaram todos sentados em cima do muro, enfileirados, vislumbraram uma cena muito estranha.
Estendia-se à frente deles uma grande planície, mas o solo era de um piso liso, branco e brilhante, como o fundo de uma grande travessa de louça. Havia espalhadas por ali várias casas, todas de porcelana e pintadas em cores vivas. As casas eram bem pequenas, a maior devia chegar no máximo até a cintura de Dorothy. Também havia uns celeiros pequenos muito bonitos, com cercas de porcelana em volta; e várias vacas, carneiros, cavalos, porcos e galinhas, todos de porcelana, agrupados por ali.
Mas o mais estranho de tudo eram os habitantes daquele curioso país. Eram camponesas, ordenhadoras e pastoras, com corpetes em cores vivas e aventais cheios de pontinhos dourados; e princesas com suntuosos mantos prateados, dourados e roxos; e pastores com calções até os joelhos, listrados de rosa, amarelo e azul, com fivelas douradas nos sapatos; e príncipes com coroas de pedras preciosas na cabeça, vestindo robes de arminho e gibões de cetim; e palhaços divertidos com roupas cheias de babados, círculos vermelhos pintados nas bochechas
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e chapéus em forma de cone, bem altos. E, o mais estranho de tudo, as pessoas todas eram feitas de porcelana, até mesmo suas roupas, e eram tão pequenas que a mais alta delas não chegava aos joelhos de Dorothy.
De início, o máximo que fizeram foi dar uma mera olhada nos viajantes. A não ser um cãozinho roxo de porcelana, com a cabeça exageradamente grande, que veio até o muro e latiu para eles com uma vozinha bem miúda, e depois saiu correndo.
– Como faremos agora para descer? – perguntou Dorothy. Eles viram que a escada era pesada demais e não dava para puxá-la para cima, então o Espantalho se jogou de cima do muro e ficou caído no chão, e os outros saltaram em cima dele, para não machucar os pés no chão duro. Claro, todos tomaram cuidado para não cair em cima da cabeça do Espantalho, pois poderiam ferir os pés nos alfinetes e agulhas. Quando todos desceram a salvo, puseram o Espantalho em pé, com o corpo bastante achatado, e deram uns tapinhas na palha para devolver-lhe outra vez seu formato.
– Temos que atravessar este lugar esquisito para chegar do outro lado – disse Dorothy –, pois não seria prudente seguir por qualquer outra direção que não seja o sul.
Começaram a andar por aquele país de pessoas de porcelana, e a primeira coisa que encontraram foi uma camponesa de porcelana ordenhando uma vaca de porcelana. Quando se aproximaram, a vaca de repente deu um coice e derrubou o banquinho, o balde e até a própria ordenhadora, e tudo aquilo caiu no chão de porcelana retinindo com estardalhaço.
Dorothy ficou chocada ao ver que a vaca perdera uma de suas pernas, e que o balde estava feito em caquinhos, e a coitada da camponesa com o cotovelo trincado.
– Pronto! – gritou a camponesa com raiva. – Vejam só o estrago que vocês fizeram! Minha vaca quebrou a perna, vou ter que levá-la à oficina de consertos e pedir para colar no lugar de novo. Que história é essa de virem aqui assustar minha vaca?
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– Eu sinto muito – respondeu Dorothy. – Por favor, perdoe-nos.
Mas a linda camponesa estava irritada demais para responder o que fosse. Pegou a perna no maior mau-humor e levou a vaca embora, e a coitada foi mancando com três patas. Conforme se afastava, a camponesa ainda lançou alguns olhares de reprovação por cima do ombro para aqueles forasteiros desajeitados, segurando seu cotovelo trincado junto ao corpo.
Dorothy ficou muito chateada com esse incidente.
– Precisamos ter muito cuidado aqui – disse o lenhador de bom coração –, senão vamos machucar essas pessoinhas lindas e elas nunca vão se recuperar disso.
Um pouco mais adiante, Dorothy encontrou uma princesa lindamente vestida, que parou de uma vez quando viu os forasteiros e em seguida fugiu correndo.
Dorothy queria ver a princesa mais de perto e correu atrás dela. Mas a menina de porcelana gritou:
– Não corra atrás de mim! Pare de me perseguir!
Ela tinha uma vozinha tão assustada que Dorothy parou e quis saber:
– Por que não?
– Porque – respondeu a princesa, parando também a uma distância segura – se eu correr posso cair e me quebrar inteira.
– Mas você não pode ser consertada? – perguntou a garota.
– Posso, sim; mas, sabe, ninguém fica bonito como antes depois de consertado – respondeu a princesa.
– Suponho que não – disse Dorothy.
– Veja, aquele lá é o Senhor Coringa, um dos nossos palhaços – continuou a jovem de porcelana. – Ele vive tentando se equilibrar de cabeça para baixo. Já se quebrou tantas vezes que foi consertado em mais de cem lugares, e agora não dá mais pra dizer que seja bonito. Ele vem vindo, você poderá ver por si mesma.
De fato, um palhacinho bem divertido veio andando na direção deles, e Dorothy pôde ver que apesar de suas roupas
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vistosas, nas cores vermelho, amarelo e verde, ele estava todo coberto de rachaduras, que se espalhavam em todas as direções e mostravam claramente que havia sido colado em muitos lugares.
O Palhaço enfiou as mãos nos bolsos, e depois de inflar as bochechas e fazer acenos de cabeça muito marotos, disse:
– Minha querida senhora, por que tanto olha agora pra este doido Coringa? Será que nunca me viu? ou então seu juízo sumiu da sua insana moringa?
– Fique quieto, senhor! – ordenou a princesa. – Não está vendo que são forasteiros, e que devem ser tratados com respeito?
– Bem, mas isso é respeito, eu suspeito, é só o meu jeito – continuou o Coringa, e na mesma hora ficou de cabeça pra baixo.
– Não ligue para o Coringa – disse a princesa para Dorothy. – A cabeça dele trincou tantas vezes que ele ficou assim, meio pancada.
– Ah, eu não me importo nem um pouco – disse Dorothy. – Mas você é tão linda – continuou ela –, que eu tenho certeza de que poderia amá-la muito. Você não gostaria que eu a levasse comigo para o Kansas, para enfeitar a cornija da lareira da Tia Em? Eu poderia carregá-la na minha cestinha.
– Isso me deixaria muito infeliz – respondeu a princesa de porcelana. – Sabe, no nosso país vivemos muito bem, e eu posso andar por aí à vontade e conversar com todo mundo. Mas assim que qualquer um de nós é levado embora daqui, nossas juntas enrijecem, e só conseguimos ficar em pé, duros, a fim de parecermos bonitos e enfeitar o lugar. É claro, isso é
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tudo o que se espera de nós quando estamos em prateleiras, armários e mesinhas de sala de jantar, mas nossa vida é muito mais agradável aqui, no nosso próprio país.
– Eu não quero deixar você infeliz por nada desse mundo! – exclamou Dorothy. – Então vou apenas me despedir de você. Adeus.
– Adeus – respondeu a princesa.
Continuaram andando com muito cuidado pelo País de Porcelana. Os pequenos animais e todas as pessoas logo se afastavam de seu caminho, com medo de que os forasteiros pudessem quebrá-los, e depois de mais ou menos uma hora os viajantes haviam atravessado o país e se depararam com outro muro de porcelana.
Só que este não era tão alto quanto o primeiro, e, subindo nas costas do Leão, todos conseguiram chegar ao alto dele e pular do outro lado. O Leão ficou por último, então tomou impulso e saltou o muro; mas ao fazer isso, bateu com o rabo numa igrejinha de porcelana, fazendo-a em pedaços.
– Ah, que coisa mais triste – comentou Dorothy –, mas ainda assim acho que tivemos sorte em não causar maiores danos a essas pessoas, a não ser quebrar a perna de uma vaca e destruir uma igreja. E todos eles quebram tão fácil!
– De fato – concordou o Espantalho –, e eu me sinto grato por ser de palha e não sofrer danos com tanta facilidade. Vejo que há coisas piores no mundo do que ser um espantalho.
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O Leão se torna o Rei dos Animais
CAPÍTULO XXI
Depois que pularam o muro de porcelana, nossos amigos se viram num lugar bastante desagradável, cheio de brejos e pântanos e coberto de capim alto, grosso e áspero. Era difícil caminhar sem cair em buracos lamacentos, pois a relva era tão densa que encobria os buracos. Mesmo assim, escolhendo com cuidado onde pisar, conseguiram avançar sem problemas até alcançar chão firme. Mas aqui a região parecia ainda mais selvagem, e depois de uma longa e cansativa caminhada por um mato rasteiro, entraram em outra floresta, com árvores imensas e antiquíssimas como jamais haviam visto.
– Esta floresta é uma maravilha – declarou o Leão, olhando em volta extasiado. – Nunca vi lugar mais bonito que este.
– A mim parece um pouco sinistro –disse o Espantalho.
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– De maneira nenhuma – respondeu o Leão. – Gostaria de viver aqui minha vida inteira. Sintam as folhas secas macias debaixo dos pés e como o musgo que adere a essas velhas árvores é denso e verde. Com certeza, nenhuma fera selvagem poderia desejar um lar mais agradável.
– E é bem provável que haja feras selvagens na floresta neste momento – disse Dorothy.
– Suponho que sim – retrucou o Leão –, mas não estou vendo nenhuma.
Andaram pela floresta até que ela ficou escura demais para continuarem. Dorothy, Totó e o Leão se deitaram para dormir, enquanto o Homem de Lata e o Espantalho ficaram montando guarda, como de costume.
Quando amanheceu, retomaram a caminhada. Não tinham avançado muito quando ouviram um som abafado, como se fosse o rosnado de vários animais selvagens. Totó ganiu um pouquinho, mas os outros não se assustaram, seguindo pela trilha já bastante percorrida, até que chegaram a uma clareira no bosque, onde estavam reunidas centenas de animais de todos os tipos. Havia tigres e elefantes, ursos e lobos, raposas e todos os outros que são estudados nas aulas de história natural,* e por um momento Dorothy ficou com medo. Mas o Leão explicou que se tratava apenas de uma reunião dos animais, e avaliou que pelos seus rosnados e grunhidos estavam tentando resolver algum grande problema.
Enquanto o Leão falava, os animais começaram a perceber sua presença, e de repente a grande assembleia ficou em silêncio, como num passe de mágica. O maior dos tigres chegou até o Leão, fez uma reverência e disse:
– Seja bem-vindo, ó Rei dos Animais! Chegou em boa hora, para combater nosso inimigo e, uma vez mais, trazer paz a todos os animais da floresta.
* Atualmente, seriam, genericamente, as aulas de Ciências. (N.E.)
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– Qual é o problema que preocupa vocês? – perguntou o Leão, tranquilo.
– Estamos todos sendo ameaçados – respondeu o tigre –por um inimigo feroz, que ultimamente tem invadido nossa floresta. É um monstro dos mais terríveis, uma espécie de grande aranha, com corpo tão grande quanto o do elefante e pernas compridas como um tronco de árvore. O monstro tem oito longas pernas, e se arrasta pela floresta, agarrando os animais com uma dessas pernas, levando-os à boca e comendo-os com a mesma facilidade com que uma aranha come uma mosca. Nenhum de nós estará a salvo enquanto essa feroz criatura estiver viva. Então convocamos esta reunião, para decidir como cuidar de nós, e agora você chegou.
O Leão ficou pensativo por um momento.
– Há outros leões nesta floresta? – perguntou.
– Não; havia alguns, mas o monstro comeu todos. Além disso, nenhum deles era tão grande e tão corajoso quanto você.
– Se eu acabar com o seu inimigo, vocês irão me reverenciar e me obedecer como Rei da Floresta? – indagou o Leão.
– Com certeza, faremos isso de boa vontade – respondeu o tigre; e todos os outros animais deram um rugido poderoso:
– Sim, faremos isso!
– Onde está agora a tal aranha? – perguntou o Leão.
– Ali, entre aquelas árvores de carvalho – disse o tigre, apontando com a pata dianteira.
– Cuide bem desses meus amigos – disse o Leão; – Vou lá enfrentar imediatamente este monstro.
Despediu-se de seus companheiros e marchou confiante para lutar contra o inimigo.
A grande aranha estava deitada, dormindo, quando o Leão chegou, e era tão horrorosa que seu adversário até torceu o nariz de nojo. Suas pernas eram quase tão longas quanto o tigre havia dito, e tinha o corpo coberto com pelos pretos, duros. Sua boca era enorme, com uma fileira de dentes afiados, cada um com
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um palmo e meio de comprimento; mas sua cabeça se juntava ao corpo atarracado por um pescoço fino como a cintura de uma vespa. Isso deu ao Leão uma dica sobre a melhor maneira de atacar aquela criatura, e como ele sabia que era melhor atacá-la enquanto dormia do que esperar que acordasse, deu um grande salto e caiu bem em cima das costas do monstro. Então, com um poderoso golpe de sua pesada pata, armada de garras muito afiadas, arrancou a cabeça da aranha. Depois que saltou de volta ao chão, ficou observando o monstro até que suas longas patas pararam de estrebuchar, o que confirmou que estava bem morto.
O Leão voltou à clareira onde os animais da floresta o aguardavam e disse, orgulhoso:
– Não precisam mais ter medo do seu inimigo. Então os animais todos fizeram uma reverência ao Leão, tratando-o já como seu rei, e ele prometeu voltar e reinar sobre eles todos assim que Dorothy estivesse a salvo a caminho do Kansas.
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CAPÍTULO XXII
O País dos Quadlings
Os quatro viajantes atravessaram o resto da floresta em segurança e quando saíram daquele ambiente sombrio viram uma montanha muito alta e íngreme, coberta de cima a baixo por grandes blocos de pedra.
– Vai ser uma escalada difícil – disse o Espantalho –, mas temos que passar pela montanha, não há outro jeito.
Ele foi na frente, abrindo caminho, e os outros o seguiram. Estavam quase chegando à primeira grande pedra quando ouviram uma voz rude gritar bem alto:
– Alto, para trás!
– Quem é você? – perguntou o Espantalho. Uma cabeça surgiu por cima da pedra e a mesma voz disse:
– Essa montanha nos pertence, e não permitiremos que ninguém passe por ela.
– Mas temos que passar – disse o Espantalho. – Estamos indo para o País dos Quadlings.
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– Mas não devem! – respondeu a voz, e de detrás da pedra saiu o homem mais estranho que os viajantes já haviam visto na vida.
Era baixo e atarracado e tinha uma cabeça enorme, achatada no alto e assentada sobre um pescoço bem grosso e cheio de rugas. Só que não tinha braços, e ao ver isso o Espantalho não teve mais medo, pois achou que uma criatura assim indefesa jamais poderia evitar que eles escalassem a montanha. E disse:
– Sinto muito não fazer como você gostaria, mas temos que passar pela sua montanha, quer você goste ou não – e avançou, decidido.
Tão rápido quanto um raio, a cabeça do homem disparou para frente, e o pescoço veio junto, esticando-se o suficiente para permitir que o topo achatado da cabeça atingisse em cheio o Espantalho, mandando-o montanha abaixo, aos trambolhões. Quase tão rápido quanto se projetou, a cabeça voltou para junto do corpo, e o homem deu uma risada cruel e disse:
– Não é tão fácil quanto vocês pensam!
Um coro de risadas insolentes veio das demais pedras, e Dorothy viu centenas de Cabeças de Martelo sem braços por toda a encosta, uma atrás de cada pedra.
O Leão ficou furioso com aquelas risadas diante do tombo do Espantalho, e depois de dar um rugido em alto volume que ecoou como um trovão, disparou montanha acima.
Mais uma vez uma cabeça projetou-se a toda velocidade e mandou o grande Leão também montanha abaixo, rolando como se tivesse sido atingido por uma bala de canhão.
Dorothy desceu correndo e ajudou o Espantalho a ficar em pé de novo. O Leão foi até ela, cheio de machucados e arranhões, e disse:
– Não adianta tentar lutar com pessoas que têm cabeças que martelam desse jeito, é impossível enfrentá-las.
– O que podemos fazer, então? – disse ela.
– Chamar os Macacos Alados – sugeriu o Homem de Lata. – Você ainda tem direito a mais um pedido de ajuda.
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– Boa ideia – respondeu ela, e colocando o gorro de ouro pronunciou as palavras mágicas. Os Macacos chegaram na mesma hora, como sempre, e em poucos instantes o bando inteiro estava diante dela.
– Quais são as ordens? – indagou o Macaco Rei, com uma profunda reverência.
– Carreguem-nos por cima desta montanha até o País dos Quadlings – respondeu a menina.
– Faremos isso – disse o Rei, e na mesma hora os Macacos Alados pegaram os quatro viajantes e mais Totó, e os levaram embora voando. Quando passaram por cima da montanha, os Cabeças de Martelo berraram de indignação, e lançaram suas cabeças no ar, mas não conseguiram atingir os Macacos Alados, que carregaram Dorothy e seus companheiros por cima da montanha até o outro lado, deixando-os no magnífico País dos Quadlings.
– Esta foi a última vez que você nos chamou – disse o líder a Dorothy. – Portanto, adeus e boa sorte.
– Adeus, e muito obrigada – respondeu a menina; e os Macacos subiram aos céus e sumiram de vista num piscar de olhos.
O País dos Quadlings parecia próspero e feliz. Campos e mais campos de trigo maduro, com estradas bem pavimentadas entre eles, lindos regatos murmurantes e sólidas pontes para atravessá-los. As cercas, casas e pontes eram todas pintadas de vermelho, não mais amarelas como no País dos Winkies, nem azuis, como no País dos Munchkins. Os Quadlings, baixinhos e gordos, pareciam de bom trato, e vestiam-se todos de vermelho, contrastando com o verde da grama e o amarelo dos campos de cereais.
Os Macacos deixaram os quatro viajantes perto de uma casa de fazenda, e eles andaram até lá e bateram à porta. Quem abriu foi a mulher do fazendeiro, e quando Dorothy pediu algo de comer a mulher ofereceu-lhes uma boa refeição, com três tipos de bolo e quatro tipos de biscoitos, além de uma tijelinha de leite para Totó.
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– O castelo de Glinda fica longe daqui? – perguntou a menina.
– Não muito longe – respondeu a mulher. – Pela estrada do sul vocês logo chegarão lá.
Assim, agradeceram à boa mulher e continuaram, já refeitos, seguindo pelos campos e cruzando belas pontes, até que apareceu diante deles um castelo muito bonito. Diante dos portões havia três moças, vestidas em belos uniformes vermelhos com enfeites dourados; quando Dorothy se aproximou, uma delas perguntou:
– Por que vocês vieram ao País do Sul?
– Para ver a Bruxa Boa que governa este país – respondeu ela. – Você nos levaria até ela?
– Deixe-me pegar seus nomes e vou perguntar a Glinda se ela pode recebê-los. – Todos disseram quem eram e a soldadinha entrou no castelo. Alguns instantes mais tarde, voltou para dizer que Dorothy e os outros seriam recebidos sem demora.
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Glinda, a Bruxa Boa, atende ao desejo de Dorothy
CAPÍTULO XXIII
Mas antes de irem ver Glinda, foram levados a uma sala do castelo, onde Dorothy lavou o rosto e penteou os cabelos, o Leão sacudiu a poeira da juba, o Espantalho ajeitou o formato de seu corpo dando alguns tapinhas na palha, e o lenhador poliu sua lata e lubrificou suas juntas.
Quando ficaram mais apresentáveis, seguiram a soldadinha até uma grande sala onde a Bruxa Glinda estava sentada num trono de rubis.
Aos olhos dos nossos amigos, ela pareceu uma mulher bonita e jovem. Seu cabelo era de um ruivo intenso e caía em cachos sobre os ombros. Seu vestido era de um branco imaculado e ela tinha olhos azuis, que olhavam com expressão bondosa para a garotinha.
– O que posso fazer por você, minha menina? – perguntou.
Dorothy contou à Bruxa toda a sua história: como o ciclone a levara até a Terra de Oz, como
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conhecera seus companheiros e as maravilhosas aventuras que haviam vivido juntos.
– Meu maior desejo agora – acrescentou – é voltar para o Kansas, pois Tia Em com certeza deve estar achando que alguma coisa terrível aconteceu comigo e que talvez isso a obrigue até a vestir luto; e a não ser que a colheita deste ano seja melhor que a do ano passado, não sei como o Tio Henry irá se arranjar.
Glinda inclinou-se para frente e beijou o rosto doce da adorável garotinha.
– Que o seu bom coração seja abençoado – disse. – Com certeza posso lhe sugerir uma maneira de voltar para o Kansas.
– E acrescentou: – Mas para isso você terá que me dar o seu gorro de ouro.
– Com o maior prazer! – exclamou Dorothy. – Na realidade, ele não me serve mais para nada, agora, e quando você ficar com ele, poderá pedir aos Macacos Alados que cumpram três vezes os seus desejos.
– E eu acho que vou precisar de seus serviços exatamente três vezes – respondeu Glinda, sorrindo.
Dorothy lhe deu o gorro de ouro, e a Bruxa disse ao Espantalho:
– O que você fará depois que Dorothy for embora?
– Vou voltar para a Cidade das Esmeraldas – respondeu ele –, pois Oz fez de mim seu governante, e as pessoas de lá gostam de mim. A única coisa que me preocupa é como vou fazer para cruzar de volta a montanha das Cabeças de Martelo.
– Com ajuda do gorro de ouro posso ordenar que os Macacos Alados o carreguem até os portões da Cidade das Esmeraldas – disse Glinda –, pois seria uma pena privar seu povo de um governante tão maravilhoso.
– Sou realmente maravilhoso? – perguntou o Espantalho.
– Pelo menos é fora do comum – respondeu Glinda. Virando-se para o Homem de Lata, perguntou: – O que será feito de você depois que Dorothy sair deste país?
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Ele se apoiou e seu machado e ficou pensativo por um momento. Então disse:
– Os Winkies foram muito bondosos comigo, e queriam que eu governasse seu país depois que a Bruxa Má morreu. Eu gosto dos Winkies, e se pudesse voltar para o País do Oeste, acho que não há coisa que eu gostaria mais de fazer do que governá-los para sempre.
– Minha segunda ordem para os Macacos Alados – disse Glinda – será que o levem em segurança até a Terra dos Winkies. Seu cérebro visto de fora não parece tão grande quanto o do Espantalho, mas você, na realidade, é mais brilhante do que ele... especialmente depois de um bom polimento na sua lata, e tenho certeza de que irá governar bem os Winkies, com muita sabedoria. – Então a Bruxa olhou para o Leão, enorme e descabelado, e perguntou: – Quando Dorothy tiver voltado para o seu lar, o que será de você?
– Para lá da montanha dos Cabeças de Martelo – respondeu ele – existe uma grande floresta, muito antiga, e todos os animais que vivem ali me elegeram o rei deles. Se eu tivesse como voltar para aquela floresta, teria uma vida muito feliz ali.
– Minha terceira ordem aos Macacos Alados – disse Glinda – será que o carreguem até a sua floresta. Então, depois de ter utilizado os poderes do gorro de ouro, irei devolvê-lo ao Rei dos Macacos, e então ele e seu bando serão livres para sempre.
O Espantalho, o Homem de Lata e o Leão agradeceram muito à Bruxa Boa por sua bondade; e Dorothy exclamou: – Você com certeza é muito boa, e muito bonita! Mas ainda não me disse como vou fazer para voltar ao Kansas.
– Seus sapatos brilhantes irão transportá-la através do deserto – respondeu Glinda. – Se você tivesse conhecimento do poder que eles têm, já poderia ter voltado para a sua Tia Em desde o primeiro dia em que chegou a este país.
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– Mas então eu não teria conseguido o meu maravilhoso cérebro! – gritou o Espantalho. – E teria passado a vida inteira no milharal daquele fazendeiro.
– E eu talvez não tivesse conseguido esse meu magnífico coração – disse o Homem de Lata. – E teria ficado lá na floresta, em pé, enferrujado, até que o mundo acabasse.
– E eu talvez tivesse vivido a vida inteira como um covarde – declarou o Leão. – E nenhum animal em toda a floresta teria jamais dito algo de bom a meu respeito.
– Tudo isso é verdade – disse Dorothy –, e estou feliz por ter sido útil a esses bons amigos. Mas agora que cada um de vocês já tem aquilo que mais desejou, e cada um de vocês está feliz e tem, além disso, um reino para governar, eu gostaria de poder voltar finalmente para o Kansas.
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– Os sapatos brilhantes – disse a Bruxa Boa – têm poderes maravilhosos. E uma das coisas mais interessantes a respeito deles é que podem levar você a qualquer lugar do mundo em três passos, e cada um desses passos demora um piscar de olhos. Tudo o que você tem a fazer é bater os calcanhares três vezes, os dois pés ao mesmo tempo, e ordenar que os sapatos a levem aonde você quiser ir.
– Nesse caso – disse a menina feliz da vida –, vou pedir já que me levem de volta ao Kansas.
Colocou os braços em volta do pescoço do Leão e deu-lhe um beijo, e mais uns tapinhas carinhosos na sua cabeça enorme. Depois, beijou o Homem de Lata, que chorava de um jeito perigosíssimo para as suas juntas. Em vez de beijar o rosto pintado do Espantalho, acolheu o seu corpo macio e recheado num longo abraço. E viu então que ela mesma chorava, por causa dessa despedida triste de seus amados companheiros.
Glinda, a Bondosa, desceu de seu trono de rubis para dar um beijo de despedida na garotinha, e Dorothy agradeceu por toda a bondade que ela havia demonstrado para com ela e seus amigos.
Dorothy então pegou Totó solenemente em seus braços, e depois de um último adeus bateu os calcanhares de seus sapatos três vezes ao mesmo tempo, dizendo:
– Levem-me para casa, para a Tia Em!
Instantaneamente ela rodopiou pelos ares, tão rápido que tudo o que conseguiu ver ou sentir foi o vento assobiando em seus ouvidos.
Os sapatos de prata só tiveram que dar três passos, e Dorothy parou tão de repente que acabou rolando pela grama várias vezes antes de descobrir onde estava.
Após alguns instantes, parou sentada e olhou em volta.
– Minha nossa! – gritou.
Estava sentada no meio da ampla pradaria do Kansas, e bem diante dela viu a nova casa da fazenda que o Tio Henry
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construíra depois que o ciclone levou embora sua velha casa. Tio Henry estava ordenhando as vacas no estábulo, e Totó já saltara dos braços dela e corria em direção ao celeiro, latindo enlouquecido.
Dorothy ficou em pé e descobriu que estava só de meias. Os sapatos brilhantes haviam caído dos seus pés enquanto ela voava pelos ares, e se perderam para sempre no deserto.
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Em casa de novo
Tia Em estava saindo de casa para regar os repolhos quando ergueu os olhos e viu Dorothy correndo na sua direção.
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CAPÍTULO XXIV
– Minha menina querida! –ela gritou, apertando a garotinha em seus braços e cobrindo seu rosto de beijos. – De que parte do mundo você está vindo?
– Da Terra de Oz! – disse Dorothy, séria. – E o Totó está aqui também. Ah, Tia Em! Como me sinto feliz por estar de volta à minha casa!
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Informações paratextuais
Caro(a) estudante,
O Mágico de Oz é a narrativa mais consagrada e importante de toda a obra do famoso escritor estadunidense L. Frank Baum. Ilustrado pelo também genial W. W. Denslow, o livro apresenta as aventuras da menina Dorothy, que é arrastada por um ciclone, dentro de sua casa, junto de seu cãozinho Totó. Após algum tempo, a humilde residência onde a órfã vivia com seus tios aterrissa na Terra de Oz.
Dorothy e Totó são, então, recepcionados pela Bruxa Boa do Norte e por alguns Munchkins que estão felizes porque a casa da menina havia caído em cima da Bruxa Má do Leste, matando-a e livrando todos de sua maldade. A garotinha fica fascinada com aquele lugar, mas preocupa-se com os tios e começa a tentar voltar para o Kansas, sua terra, dando início a uma longa viagem em busca da Cidade das Esmeraldas, onde vive o Mágico de Oz, o único que poderia ajudá-la, de acordo com a Bruxa Boa do Norte. No caminho, a protagonista encontrará novos amigos e companheiros de viagem: o Espantalho, o Homem de Lata e o Leão Covarde. Eles vão acompanhá-la e ajudá-la em sua aventura, e também têm pedidos para o Mágico de Oz.
Estudante, esta é uma aventura cheia de representações simbólicas sobre a importância de se confiar mais em seu potencial. A obra de Baum e de Denslow tem mais de um século de sucesso entre leitores e expectadores, contando com várias versões feitas para o teatro e o cinema.
Vamos saber um pouco mais sobre o autor, o ilustrador e o tradutor?
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O AUTOR
Lyman Frank Baum nasceu na norte-americana Chittenango, em 15 de maio de 1856. Ao longo de sua vida, atuou em várias profissões: além de escritor, também foi editor, ator, roteirista, produtor de cinema e teosofista. Destacou-se em várias dessas carreiras, mas foi como escritor que Baum se consagrou e permanece na vida e na memória das pessoas até a atualidade. Entre suas obras literárias, a que mais recebe destaque é justamente O Mágico de Oz, esta que você tem em mãos. Descendente de origem germânica, seu pai era um rico homem de negócios que fez fortuna nos campos de petróleo da Pensilvânia. Frank cresceu na grande residência em estilo vitoriana de seus pais, da qual sempre se recordou como uma espécie de paraíso, referenciando-a indiretamente nos cenários das narrativas que produziu. Na infância, o autor teve aulas em casa, junto de seus irmãos, mas na adolescência, por ser de índole mais sonhadora, foi levado a um colégio com educação mais austera – a Academia Militar de Peekskill. Seus pais mal imaginavam que o perfil sonhador e criativo do garoto o acompanharia por toda a vida e seria primordial no exercício de suas profissões.
O ILUSTRADOR
William Wallace Denslow nasceu na Filadélfia, nos Estados Unidos, em 5 de maio de 1856. Foi ilustrador e caricaturista, e ficou famoso pelos desenhos produzidos para as primeiras edições dos livros de L. Frank Baum sobre a maravilhosa Terra de Oz, como a que você tem em mãos. As ilustrações de Denslow tinham um forte caráter reflexivo e somavam muito à obra de Baum. Em 1902, os dois trabalharam em conjunto na adaptação da obra para o teatro, e nessa época se desentenderam: Frank não quis que o ilustrador fizesse as imagens dos seus próximos livros. Apesar desse rompimento,
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a fama alcançada pelo desenhista e a renda ganha com o trabalho para O Mágico de Oz lhe renderam o suficiente para a compra de uma ilha na costa das Bermudas. Ali, ele teria se coroado Rei Denslow I. Seu fim, no entanto, não é próspero: a fortuna acabou e ele morreu de pneumonia e no esquecimento dos fãs em maio de 1915.
O TRADUTOR
Como O Mágico de Oz foi escrito por um escritor estadunidense, a versão original foi produzida na língua inglesa. Após um grande sucesso imediato, o livro foi traduzido para vários idiomas. Para o português brasileiro, nossa língua materna, essa clássica narrativa já passou pelas mãos de vários tradutores, e esta versão foi traduzida pelo grande Luis Reyes Gil . Ele trabalha na tradução de obras produzidas originalmente em inglês, espanhol e catalão. É considerado, atualmente, um dos principais nomes em seu ofício no Brasil. Além do clássico O Mágico de Oz, de Baum, Gil já traduziu obras de outros grandes escritores, como Juan Carlos Onetti, Antonio Skármeta, Chesterton, Truman Capote (cartas), George R. R. Martin, David Peace, Michael Dobbs, Mercè Rodoreda e Alberto Manguel.
Vamos entender um pouco mais sobre o gênero textual novela?
Estudante, o gênero textual novela é diferente das novelas televisivas que talvez você conheça. O gênero textual novela é um texto escrito em prosa, ou seja, em parágrafos, organizados nos cinco momentos da narrativa – situação inicial, complicação, desenvolvimento da complicação, clímax e desfecho. Sua extensão e a complexidade de seus personagens e de seu enredo caracterizam-se por serem, geralmente, maiores que as do conto e menores que as do romance.
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Uma novela pode apresentar vários temas. Esta que você tem em mãos é fantástica e se aproxima bastante dos clássicos contos de fadas dos Irmãos Grimm e de Andersen. A intenção do autor ao produzi-la foi, como declara na introdução, inaugurar um texto que se aproxima dos contos de fadas no que se refere ao universo da fantasia, mas com elementos modernos para agradar às crianças leitoras de 1900, ano de sua primeira publicação. O sucesso ele conseguiu – não só na época, como até hoje.
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Este livro foi composto com tipografia Electra LT Std.