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2
3
AGRADECIMENTOS A MEUS PAIS E FAMÍLIA PELO APOIO INCONDICIONAL; AOS AMIGOS PROFESSORES PELA DEDICAÇÃO EM ENSINAR DENTRO E FORA DAS SALAS DE AULA; AOS ‚AMIGOS IRMÃOS‛ PELO COMPANHEIRISMO E POR SE TORNAREM UMA SEGUNDA FAMÍLIA; A DEUS POR TUDO.
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ÍNDICE INTRODUÇÃO
5
O PLANEJAMENTO DO TERRITÓRIO
8
A URBANIZAÇÃO DO TERRITÓRIO
9
A RELAÇÃO CIDADE-CAMPO E A REVISÃO DO CONCEITO DE RURAL
12
O PAPEL DA PEQUENA CIDADE E UMA LEITURA REGIONAL DO CENTRO DO BRASIL 20
O POVO E SUA CULTURA
56
DO CAIPIRA AO SERTANEJO
57
IDENTIDADE CULTURAL E CIDADANIA
63
QUALIDADE DE VIDA
67
DIRETRIZES E INTERVENÇÕES
72
DIRETRIZES PARA A CIDADE
77
CÓRREGOS MONTE ALEGRE E MARIA ELIAS
79
MONTE ALEGRE DE MINAS E SEU PAPEL NA REDE DE CIDADES
21
RODOVIA
83
A POSSIBILIDADE DE REEQUILIBRIO NA REDE DE CIDADES DA REGIÃO
26
LARGO DA PRAÇA
85
A HISTÓRIA DE MONTE ALEGRE DE MINAS PELA HISTÓRIA DE SEUS ESPAÇOS 30
MIRANTE DA SERRINHA
91
DIRETRIZES PARA O MUNICÍPIO
93
EVOLUÇÃO TERRITORIAL DO MUNICÍPIO DE MONTE ALEGRE E ENTORNO
BEXIGUENTO
95
ESCOLAS RURAIS
99
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
119
OUTRAS REFERÊNCIAS
121
31
ARRAIAL DE SÃO FRANCISCO DAS CHAGAS DE MONTE ALEGRE (FINAL DO SÉC.XIX) 33 OS PRIMEIROS ANOS DA CIDADE DE MONTE ALEGRE (PRIMEIRA METADE DO SÉC. XX) 36 MONTE ALEGRE APÓS A INDUSTRIALIZAÇÃO DO BRASIL (SEGUNDA METADE DO SÉC. XX) 41 MONTE ALEGRE ATUAL (PRIMEIRAS DÉCADAS DO SÉC. XXI)
49
5
INTRODUÇÃO ‚Estaríamos, agora, deixando a fase da mera urbanização da sociedade, para entrar em outra, na qual defrontamos a urbanização do território. A chamada urbanização da sociedade foi o resultado da difusão, na sociedade, de variáveis e nexos relativos à modernização do presente, com reflexos na cidade. A urbanização do território é a difusão mais ampla no espaço das variáveis e dos nexos modernos. Trata-se, na verdade, de metáforas, pois o urbano também mudou de figura e as diferenças atuais entre a cidade e o campo são diversas das que reconhecíamos há alguns decênios.3‛
‚A evidência de um processo de urbanização difusa que avança para áreas cujas características são muito indefinidas, nem propriamente urbanas nem tampouco rurais, aponta para a presença de uma forma de ocupação do território que vem sendo descrita como um tipo específico de suburbanização sem limites. Um grande conjunto de dados e análises confirma que a partir das duas últimas décadas do século XX um ciclo iniciado no século XVIII, de contínua dissolução da organização específica e dos limites físicos dos dois universos – o urbano e o rural – chegou a seu término.1‛
Milton Santos
A partir do momento em que se evidencia essa organização do espaço, com urbanizações difusas, e que, muita das vezes se mesclam com o rural, o urbanismo, enquanto disciplina, começa a estudar o território de forma ampla, pegando o termo da geografia.
Regina Meyer
O conceito de oposição entre cidade e campo que dominou alguns pensamentos modernos a respeito do território já não é aplicável atualmente. A cidade contemporânea ‚já não depende desse binômio entre o rural e o urbano‛, ela incorpora vários tipos de ocupação e sistemas produtivos, ‚onde convivem o rural, o urbano, o suburbano, mas também o “terrain-vague‛ e as grandes infraestruturas2‛.
O Brasil está repleto de municípios onde há a mescla de elementos rurais e urbanos, tanto em suas sedes quanto em seus distritos. Urbanizações difusas se dissolvem no território, ligadas por uma rede rodoviária, e as cidades menores em população têm o limite campo-cidade muito tênue. Em um contexto recente em que a questão urbana e a qualidade das cidades brasileiras estão sendo tão comentadas, após as manifestações populares de 2013, faz-se necessário que a
1
MEYER. Regina. O Urbanismo: entre a cidade e o território. in Cienc. Cult. vol.58 n°1 São Paulo Jan./Mar. 2006 2
Editorial do Jornal dos Arquitectos n°231 – Cidade. Ordem dos Arquitectos. 2008. Portugal.
3
6
SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994.
situação dos menores municípios brasileiros em população, que somados correspondem à maior parte do território nacional, também seja discutida. O presente trabalho procura estudar o papel da cidade pequena no território, sua função na rede de cidades e o perfil sociocultural de sua população, a fim de entender a cidade de Monte Alegre de Minas e propor um planejamento amplo que a encare enquanto parte do território e não como fato isolado. O trabalho se organiza em cinco capítulos, que discutem: a necessidade de se pensar o planejamento do território e a questão da revisão das relações cidade-campo; o papel de Monte Alegre, enquanto cidade pequena, na região em que se insere; a apresentação do município de Monte Alegre através da história de seus espaços; uma leitura sociocultural do município que expõe a identidade cultural da população e suas carências; e, por fim, as diretrizes e intervenções projetuais para a cidade e município, como resposta ao estudo supracitado. Através de uma leitura territorial, econômica e sociocultural de Monte Alegre de Minas, propõe-se uma série de intervenções e diretrizes tanto para o espaço urbano quanto para o espaço rural do município. Devido à ocupação difusa da população, onde 26% das pessoas não vivem na cidade sede do município4, as diretrizes e propostas buscam criar condições que melhorem a qualidade de vida em todo o território de Monte Alegre, principalmente no âmbito educacional, de formação, e no acesso a serviços de saúde e lazer.
4
IBGE 2010.
7
8 A cidade de Monte Alegre de Minas, a rodovia que a corta e a รกrea rural que a envolve. Fonte: Imagem do Autor.
O PLANEJAMENTO DO TERRITÓRIO 9
A URBANIZAÇÃO DO TERRITÓRIO
‚A questão do planejamento envolve também, para uma hipótese de uma cidade mais virtuosa, mais fácil de realisar, a exigência de um planejamento urbano, que pressupõe, para ter êxito, de um planejamento territorial amplo, continental.‛5 Paulo Mendes da Rocha
A ocupação do território pelo homem sofreu fortes mudanças ao longo do século passado, principalmente de 1950 até hoje. A população mundial ultrapassou nesta última década a marca de sete bilhões de pessoas, sendo que em 2012 foi registrado que mais da metade dessa população vive em cidades8. Nessa mesma época a América Latina passou por uma transição urbana, despontando como a região mais urbanizada do mundo, mesmo sendo uma das menos povoadas em relação ao seu território, com 80% de sua população vivendo em aglomerados urbanos9. O Brasil destaca-se na região com uma população urbana de 84% do total10. Essa ‚explosão urbana‛ aconteceu em um curto intervalo de tempo, o que levou a um crescimento abrupto e sem planejamento das cidades brasileiras, devido, principalmente, ao êxodo rural e às migrações oriundas de regiões mais pobres.
É impossível pensar o planejamento de qualquer cidade como algo isolado. As cidades são interdependentes entre si e estão organizadas em uma espécie de rede, onde os centros urbanos formam um ‚conjunto funcionalmente articulado‛, com suas dinâmicas territoriais internas e regionais6. Portanto, o planejamento deve considerar uma visão holística do território, atento para as relações da cidade com a região que a circunda e para a dinâmica do espaço interno de seu município. Monte Alegre de Minas, objeto deste trabalho, deve ser entendido como parte da dinâmica territorial de sua região, e, sobretudo, deve ser abordado enquanto município, tendo em vista a inclusão da parte rural do território, onde reside 26% de sua população7. Entender a relação cidade-campo é fundamental para entender cidades pequenas como Monte Alegre de Minas.
O geógrafo Milton Santos aponta que, nesse rápido crescimento da população e das cidades brasileiras no século XX, as grandes 8
50,7% da população mundial (3,6 bilhões de pessoas) vivem em cidades, em 2012, segundo Organização das Nações Unidas, in Time to think Urban. ONUHabitat (2013) 9 Organização das Nações Unidas. Estado de las ciudades de America Latina y el Caribe: rumbo a una nueva transición urbana. ONU-Habitat (2012). 10 IBGE – censo 2010 (Brasil – população total: 190.755.799 hab./ pop. urbana: 160.925.792 hab./ pop. rural: 29.830.007 hab.)
5
Trecho transcrito de entrevista dada pelo arquiteto ao programa televisivo Roda Viva, TV Cultura, veiculado no dia 10 de junho de 2013. 6 CORRÊA, Roberto Lobato. Estudo sobre a Rede Urbana. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 2004. 7 IBGE – censo 2010 (Monte Alegre de Minas – população total: 19.619 hab./ pop. urbana: 14.506 hab./ pop. rural: 5.113 hab.)
10
cidades receberam alto número de pessoas pobres, que eram acomodadas muitas vezes em condições sub-humanas. As cidades intermediárias tornaram-se o ‚lócus do trabalho intelectual‛, atraindo um fluxo crescente de pessoas da classe média, e as cidades locais, pequenas e em sua maioria ligadas ao campo, repeliram os mais pobres e se mecanizaram, transformadas pelo agronegócio11.
em uma área agrícola, em uma região voltada para o agronegócio. Na análise de Milton Santos, cidades locais como Monte Alegre ‚mudaram de conteúdo‛ durante o último século. A cidade que antes era dos notáveis, onde as personalidades eram ‚o padre, o tabelião, a professora primária, o juiz, o promotor, o telegrafista‛, passa a ser uma cidade econômica, ‚lócus da regulação do que se faz no campo‛, onde é extremamente necessário ‚o agrônomo (que antes vivia nas capitais), o veterinário, o bancário, o piloto agrícola, o especialista em adubos, o responsável pelos comércios especializados‛, ou seja, o consumo produtivo rural não se adapta às cidades locais, mas pelo contrário, as adapta. Parte dos trabalhadores do campo, especializados e não especializados, vivem na área urbana, onde também se concentra os serviços e produtos para a produção agrícola. Esses fatores fizeram com que uma cidade local como Monte Alegre de Minas deixasse de ser a ‚cidade no campo‛ para ser a ‚cidade do campo‛ 14.
‚Ao longo do século, mas, sobretudo nos períodos mais recentes, o processo brasileiro de urbanização revela uma crescente associação com o da pobreza, cujo lócus passa a ser, cada vez mais, a cidade, sobretudo a grande cidade. O campo brasileiro moderno repele os pobres, e os trabalhadores da agricultura capitalizada vivem cada vez mais nos espaços urbanos.12‛ Milton Santos
Milton Santos deduz também que a separação tradicional entre um Brasil urbano e um Brasil rural já não é satisfatória, e que há hoje no país ‚uma verdadeira distinção entre um Brasil urbano (incluindo áreas agrícolas) e um Brasil agrícola (incluindo áreas urbanas)‛ 13. Monte Alegre de Minas é uma cidade local, inserida 11
SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994. Idem. 13 Ibidem. 12
14
11
Ibidem.
12 O centro de Monte Alegre de Minas visto a partir do cerrado, em uma รกrea vazia da cidade. Fonte: Imagem do Autor.
A RELAÇÃO CIDADE-CAMPO E A REVISÃO DO CONCEITO DE RURAL
O escritor britânico Raymond Williams, em análise do quanto os termos ‚cidade‛ e ‚campo‛ representam na ‚vivência das comunidades humanas‛, ressalta que ‚o termo inglês country pode significar tanto ‘país’ quanto ‘campo’; the country pode ser toda a sociedade ou só sua parte rural.18‛ A partir dessa análise etimológica ele observa a ligação existente entre a terra, fonte de subsistência, e as realizações humanas das quais a cidade faz parte, onde, apesar da cidade ser uma ‚forma distinta‛ de ocupação, ela é indissociável do campo.
As cidades pequenas no Brasil, aquelas que possuem até 100.000 habitantes, correspondem a 95% do número total de municípios e concentram 45,3% da população total do país15. Cidades com menos de 20.000 habitantes, como Monte Alegre de Minas, que possui 19.619 hab., somam 73% do total de municípios brasileiros16. Estas cidades são tidas como ‚cidades locais‛ porque são referência para seu próprio território, ou seja, para a parte rural de seu município17. Há uma inter-relação entre mundo rural e mundo urbano. As cidades locais brasileiras são, em sua maioria, cidades ligadas à agricultura, com uma parcela significativa da população vivendo na zona rural. Monte Alegre de Minas possui 26% de sua população (5.113 hab.) vivendo na área rural do município.
‚A dicotomia rural-urbano torna-se uma fonte de reflexão em torno dos mecanismos de transformação do território que nos levam hoje a compreender melhor a natureza distinta destas realidades e a sua importante e necessária complementaridade. Cidade e campo passaram então a ser pensados como sistemas integrados, parte de um mesmo processo de transformação.‛19
Por ser uma cidade local, o planejamento em Monte Alegre de Minas deve levar em consideração seu papel e sua dependência regional, estudando como a cidade se insere na rede de cidades, e, sobretudo, deve pensar seu território de forma ampla, levando em consideração a área rural do município e as relações existentes entre a cidade e o campo.
Pedro Pacheco
18
WILLIAMS, Raymond. O Campo e a Cidade na História e na Literatura. 1ª Ed. São Paulo: Ed. Companhia das Letras, 1989. 19 PACHECO, Pedro. Rural-Urbano in Tema e Programa Turma F, Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, 2011.
15
IBGE- censo 2010. 16 Idem. 17 SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994.
13
O conceito de ruralidade e a relação cidade-campo estão sendo discutidos e revistos em várias partes do mundo a fim de obter-se um desenvolvimento territorial mais justo e igualitário. Nos países da União Europeia, onde o território rural acolhe mais de 56% da população total20, a ruralidade passa a ser vista como ‚uma construção social‛, em detrimento da ‚imagem de interior do país‛ tida anteriormente21. Pensa-se no acesso a serviços, educação e mobilidade dessa parcela significativa da população e a importância cultural dessa parte do território é levada em consideração juntamente com seu peso econômico, visto que, para além da visão da paisagem como patrimônio, a produção de vinho, azeite, queijos e outros produtos de relevância econômica e cultural desses países dependem muito do rural22. Essa visão de que o mundo rural extrapola a dimensão agrícola e produtiva e abarca valores de patrimônio e de paisagem ecológica e cultural, permite novas abordagens e possibilidades de ‚reequilibrar as relações entre os grandes núcleos urbanos e os territórios diversificadamente povoados que os circundam‛ 23.
Casa na área rural de Monte Alegre. Fonte: Foto do Autor. Na América Latina e em outras regiões em desenvolvimento como o sudeste asiático a principal questão é a inclusão social da parcela da população que vive no campo. A concentração da maior parte dos habitantes em áreas urbanas e a diminuição da população rural deixa pouco assistida ou esquecida a parte rural do território quanto ao direcionamento de políticas públicas. O rural acaba tornando-se preocupação apenas das políticas agrárias e não de um conjunto de políticas que disponibilize bens e serviços básicos. A definição equivocada do que é ruralidade prejudica o acesso da população rural a esses bens e serviços e favorece o êxodo rural, o que é prejudicial tanto para o campo quanto para a cidade. A população que emigra do campo para os grandes centros urbanos, em parte significativa é pobre e está a procura de melhores condições de vida, porém, em vários casos irá se alojar em condições precárias nas cidades grandes e médias.
20
União Europeia – Política de Desenvolvimento Rural 2007-2013 in http://ec.europa.eu/agriculture/rurdev/index_pt.htm 21 Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 3: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>. 22 Idem. 23 PACHECO, Pedro. Rural-Urbano in Tema e Programa Turma F, Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, 2011.
14
‚O mundo rural está constituído por um conjunto de territórios rurais, entendidos como um continuum rural-urbano integrado e funcional, que configuram e estruturam um país, uma região e o mundo. (...) O principal desafio consiste na inclusão dos territórios rurais e seus habitantes na dinâmica de crescimento e bem estar da economia e da sociedade.‛ 24
sociedade civil para ‚discutir o futuro do rural no país por meio de uma reconceitualização da área rural‛ 27. Os debatedores deste evento chamaram a atenção para o real tamanho da população residente no campo, que é maior do que as estatísticas oficiais apontam, e para a importância do agronegócio na balança comercial brasileira. Foi discutida também a visão desatualizada que se tem do rural e a deficiência das políticas públicas para esta parte da população.
Byron Miranda Abaunza25
Legalmente, a definição (ou a não definição) de rural no Brasil data do final da década de 1930, pelo decreto-lei 311, de 2 de março de 1938, que define área rural simplesmente como o que não é urbano. Define-se o urbano como uma ocupação aglomerada, dotada de serviços, e o rural é identificado por oposição ou exclusão às áreas consideradas urbanas. Desse modo, todo espaço de um município que não corresponder à área urbana e seus distritos é tida como rural, ou seja, legalmente o espaço rural é como um resíduo do urbano, ‚aquilo que sobra das cidades, compreendidas como lócus central das ações do estado‛ 28. Porém, a definição contemporânea das áreas rurais leva em consideração ‚as distintas formas de relacionamento dessas áreas
No Brasil, o conceito de ruralidade está sendo discutido no Congresso Nacional desde 2011, sendo que em março de 2013, o evento ‚Repensando o conceito de ruralidade no Brasil: implicações para as políticas públicas‛ 26 reuniu representantes do governo, acadêmicos e representantes de instituições da 24
Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 2: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>. 25 Gerente do Programa de Agricultura, Territórios e Bem Estar Rural do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). É nicaraguense, doutor em filosofia, especialista em desenvolvimento organizacional e humano, agrônomo e especialista em desenvolvimento rural. 26 Atualmente dois projetos de lei tramitam no Congresso Nacional sobre o assunto. No Senado, o PLS 258/2010 do Senador Antonio C. Valadares, do PSB de Sergipe, e na Câmara o PL 54/2011 do Deputado Assis do Couto, do PT do Paraná. Ambos utilizaram a proposta elaborada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, colegiado pertencente a estrutura do Ministério do Desenvolvimento Agrário e composto por representantes de governos e sociedade civil.
27
Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 4: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>. 28 Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 3: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>.
15
com os centros urbanos, com os quais mantêm relações diferenciadas de interdependência e complementaridade‛ 29.
O contestável dado de que o Brasil é majoritariamente urbano deixou por décadas a maior parte do território sem políticas de planejamento, o que esta mudando recentemente, com o início do debate em torno do desenvolvimento rural e territorial. O coordenador-geral de gestão estratégica do Ministério do Planejamento, Leandro Freitas Couto, diz que o grande desafio para desenvolver o país é a ‚inserção do território no planejamento‛ 32, aplicando as políticas públicas no território em sua totalidade, a fim de se ter um desenvolvimento mais igualitário. A embaixadora do México no Brasil, socióloga Beatriz Paredes, ressaltou a importância de mudar o paradigma cultural e investir em educação no campo como forma de conter o êxodo rural e equilibrar a ocupação do território, levando acesso à educação e qualidade de vida à população rural. Ela afirma que ‚construir uma nova ruralidade é indispensável para o mundo, ainda mais para o Brasil, que continuará sendo um país agrícola. Este estudo vai reorientar os investimentos públicos no rural‛ 33.
Considerar urbana toda sede de município e de distrito, independente de suas características, coloca o Brasil entre os países com mais alta taxa de urbanização, sendo que a maioria dos municípios (73% do total30) apresenta menos de 20 mil habitantes, e muitos destes possuem características econômicas, culturais e sociais que giram em torno do rural. ‚De um total de 5.507 sedes de município existentes em 2000, havia 1.176 com menos de 2 mil habitantes, 3.887 com menos de 10 mil, e 4.642 com menos de 20 mil, todas com estatuto legal de cidade idêntico ao que é atribuído aos inconfundíveis núcleos que formam as regiões metropolitanas, ou que constituem evidentes centros urbanos regionais. E todas as pessoas que residem em sedes, inclusive em ínfimas sedes distritais, são oficialmente contadas como urbanas, alimentando esse disparate segundo o qual o grau de urbanização do Brasil teria atingido 81,2% em 2000.31‛
‚Penso que ser desenvolvido significa viver com os fatores necessários que te permitam desenvolver plenamente sua condição humana, no campo ou na cidade. Porém, tem-se o preconceito generalizado que compara desenvolvimento com modernidade urbana e
José Eli da Veiga 29
32
Idem. IBGE 2010. 31 VEIGA, José Eli da. Cidades Imaginárias: o Brasil é menos urbano do que se calcula. Autores Associados, Campinas-SP, 2003.
No evento “Repensando o conceito de ruralidade no Brasil: implicações para as políticas públicas” do dia 22 de março de 2013, que aconteceu no Senado Federal. 33 Ibidem 24.
30
16
que equipara a vida no campo com atraso. Temos que nos livrar dessas concepções porque não correspondem nem com a verdade, nem com o bem-estar. O problema é quando há pobreza. Quando há pobreza, seja no campo ou na cidade, o povo não vive bem. É um problema de pobreza, não de ruralidade ou de urbanidade. Penso que é necessário estimular políticas que criem oportunidades de geração de renda rural e treinamento e formação de jovens em áreas rurais.34‛
O consultor do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura, Humberto de Oliveira, diz que o Brasil possui estados inteiros rurais, e que é necessário repensar o orçamento e as políticas públicas para auxiliar os 70% dos municípios brasileiros que tem menos de vinte mil habitantes. Para ele o meio rural não precisa apenas de políticas agrícolas e agrárias, mas sim, de um conjunto de investimentos em diversas áreas. Segundo Oliveira, não se pode ter um sistema de educação que expulse as pessoas de seu local de origem35. ‚É necessário rediscutir o conceito de rural, considerando-o não como setor, mas como espaço onde estão presentes cidade e campo de mais de 85% dos municípios e cerca de 30% da população do país, onde se realizam atividades econômicas dos setores primário, secundário e terciário, onde se produzem alimentos e energia, onde se guarda um imenso patrimônio cultural, onde ficam as reservas florestais e a água, onde estão presentes trabalhadores e empresários da indústria, agricultura, turismo e comércio. Nesse rural são demandadas políticas públicas de educação, saúde, habitação, cidadania, esporte, lazer, cultura, comunicações, segurança, meio
Beatriz Paredes
Transporte público rural de Monte Alegre. Fonte: Foto do Autor. 34
Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 5: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>.
35
Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 4: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>.
17
ambiente, além agrárias.‛ 36
de
políticas
agrícolas
e
inserção social que toma força nas últimas décadas, mas que ainda está no início.
Humberto de Oliveira
A atual classificação do que é população urbana e rural no país, apresentada pelo IBGE, coloca o Brasil entre os países mais urbanizados do mundo e gera uma distorção que impacta negativamente o meio rural e as pequenas cidades brasileiras, levando à interpretação de que, já que a população nessas áreas diminui progressivamente, as políticas públicas devem ser voltadas com prioridade para as regiões metropolitanas e as médias e grandes cidades. A inexistência de uma política de desenvolvimento territorial que tenha como premissa uma visão atualizada do rural, vendo-o como espaço e não como setor, exclui uma parcela significativa da população brasileira do planejamento governamental. Os investimentos em planejamento e em políticas públicas estão concentrados nas áreas mais adensadas, com população acima de 100 mil habitantes, sendo o rural encarado apenas como setor econômico primário (agricultura, pecuária, pesca e extrativismo) e não como espaço rural 37. Há políticas sociais voltadas para o campo, como o ‚luz para todos‛ e o ‚programa nacional de habitação rural‛, que são recentes e acompanham a discussão da qualidade de vida no campo e da
Um dos limites do urbano com o rural. Fonte: Foto do Autor. A visão do rural como setor, em detrimento do rural enquanto território habitado é responsável por deixar em segundo plano, quando não esquecidos, os pequenos municípios brasileiros. A maioria das ações governamentais voltadas para os municípios priorizam os que possuem população acima de 50 mil habitantes ‚quando 89% dos municípios do país possuem população igual ou inferior a esse número‛38. A falta de um planejamento territorial que leve em consideração os pequenos municípios e a população rural do país, aliada à
36
Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 1: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>. 37 Idem.
38
18
Idem.
concentração de políticas e equipamentos públicos nos grandes centros urbanos, favorecem o êxodo rural e a migração de parte da população para esses grandes centros. Essas migrações, que são motivadas pela escassez de oportunidades e acesso a serviços nas pequenas cidades e no campo, não são benéficas para nenhuma parte do território, pois geram cidades grandes inviáveis, congestionadas e repletas de ocupações sem planejamento; cidades médias que repetem os mesmos erros cometidos nas grandes cidades; e cidades pequenas desoladas e estagnadas, sem recursos e sem capital humano. Toda a população, independente de onde viva, deve ter acesso a todos os serviços públicos e à infraestrutura, o que é garantido pela Constituição. Uma abordagem adequada para as pequenas cidades e para o meio rural é a abordagem territorial do espaço, ‚que consiste em prover o território e não obrigatoriamente cada um dos municípios, tanto de infraestruturas e serviços públicos necessários e de qualidade como de outros investimentos para o desenvolvimento do território como um todo, beneficiando toda a sua população‛ 39. Para isso o planejamento de um município deve considerar o papel que ele desempenha no lugar onde está inserido. Sendo assim, a abordagem da cidade de Monte Alegre de Minas deve entender o papel que ela desempenha na região, suas dependências, influências e inter-relações na rede de cidades.
39
Idem.
19 Um dos limites do urbano com o rural. Fonte: Foto do Autor.
20 Imagem de satĂŠlite da cidade de Monte Alegre de Minas e seu entorno rural imediato. Fonte: Google Earth
O PAPEL DA PEQUENA CIDADE E UMA LEITURA REGIONAL DO CENTRO DO BRASIL 21
MONTE ALEGRE DE MINAS E SEU PAPEL NA REDE DE CIDADES
Essa fluidez do território acarretou em uma divisão interurbana do trabalho e na distribuição de funções produtivas entre as cidades, em que as cidades pequenas estão, em sua maioria, associadas à produção no campo. Os agentes reguladores da produção agrícola estão situados nas cidades locais, é nelas que se encontram o estoque dos meios de consumo, o capital de giro e a mão de obra da produção no campo. São elas também os polos de difusão de mensagens e ordens para essa produção, o que faz com que, hoje, todos os dados da regulação agrícola aconteçam no urbano.
‚A ideia de que a cidade é uma totalidade menor, dependente, ao mesmo tempo, de uma lógica local, de uma lógica nacional e de uma lógica mundial, foi raramente utilizada com base em uma metodologia consequente [no planejamento urbano].‛ 40 Milton Santos
Monte Alegre de Minas desempenha este papel regulador para a produção agrícola que acontece no território de seu município. Além disso, a especialização da produtividade é notada em Monte Alegre, principalmente na segunda metade do século passado, quando a cidade era considerada a maior produtora de abacaxi no Brasil. Para o geógrafo Roberto Lobato Corrêa43, essa identidade funcional observada em cidades pequenas afirma o caráter de lugar. Hoje, Monte Alegre diversificou sua produção agrícola, não sustentando mais a alcunha de ‚maior produtora nacional de abacaxi‛, tendo sua produção mais balanceada e diversificada, com o aumento da pecuária e de outros cultivos, como o da soja.
As cidades, cada vez mais, organizam-se em rede. Há uma relação de interdependência entre elas e uma divisão territorial do trabalho, onde as cidades se especializam produtivamente e trocam bens de consumo e capital humano entre si41. Para Milton Santos42, a integração do território, que já ocorria, evoluiu por meio da revolução técnico-científica, tornando o espaço mais fluido. A evolução das comunicações e dos meios de transporte construíram as bases de uma verdadeira fluidez do território, permitindo que a informação, os fatores de produção, o trabalho, os produtos, o capital e as pessoas possam ter grande mobilidade.
O triângulo mineiro, e o centro do Brasil como um todo, é uma região majoritariamente agrícola. Para Milton Santos, hoje, ‚as
40
SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994. 41 CORRÊA, Roberto Lobato. Estudo sobre a Rede Urbana. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 2004. 42 Idem.
43
22
Idem 37.
dependem, segundo graus diversos, dessas atividades.‛46
regiões agrícolas (e não rurais) contém cidades; as regiões urbanas contém atividades rurais‛44, e nesta situação socioeconômica, as cidades adaptaram-se às demandas produtivas do mundo rural e das atividades agrícolas. No triângulo mineiro, nota-se que o conjunto dos pequenos municípios como Monte Alegre são responsáveis pela maior parte da produção agrícola e que as cidades maiores, principalmente Uberlândia, são responsáveis pelo processamento e pela distribuição dessa produção. Um exemplo são as granjas de suínos ou de aves que criam animais na área rural de Monte Alegre e em outros municípios da região, e cujo beneficiamento e distribuição dessa produção acontece nos grandes frigoríficos localizados em Uberlândia, como o conglomerado BR Foods. Outro exemplo é a produção do fertilizante organomineral que foi desenvolvido e testado pela Faculdade de Agronomia da Universidade Federal de Uberlândia45, e é produzido em uma fábrica no município de Monte Alegre, reutilizando o refugo da produção sucroalcooleira de usinas da região.
Milton Santos
Na rede urbana, a influência que as cidades exercem umas nas outras ultrapassa os limites estaduais e nacionais. Ao analisar o Triângulo Mineiro constata-se que a região é influenciada por São Paulo e Brasília, além de Belo Horizonte. Uberlândia destaca-se como principal capital regional, fortemente influenciada por São Paulo (uma metrópole global), enquanto Uberaba assume o papel de capital regional secundária, sob influência de Belo Horizonte (uma metrópole nacional). As cidades de Ituiutaba, Frutal, Patos de Minas, Patrocínio, Araxá e Monte Carmelo desempenham papel de centros sub-regionais, que influenciam as cidades menores da região e são influenciadas por Uberlândia, Uberaba, São Paulo e Belo Horizonte47. Monte Alegre de Minas é uma cidade local, situada entre Uberlândia e Ituiutaba, a capital regional e um centro sub-regional, respectivamente. Por ser limítrofe com esses dois importantes polos regionais, Monte Alegre é bastante dependente e influenciada por essas duas cidades.
‚A região agrícola tem sua unidade devida à inter-relação entre o mundo rural e mundo urbano, representado este por cidades que abrigam atividades diretamente ligadas às atividades agrícolas circundantes e que
O geógrafo Roberto Lobato Corrêa destaca que, com a construção de rodovias que possibilitam um rápido acesso e circulação entre
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Idem 36. O fertilizante foi testado e aprimorado pela Faculdade de Agronomia da UFU, em pesquisa do Prof. Gaspar Kordörfer. 45
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SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994. Instituto Geográfico e Cartográfico (IGC). São Paulo. 2003.
os centros urbanos, e com a evolução dos meios de transporte e das comunicações, houve uma perda de centralidade por parte das cidades pequenas48. Estas cidades locais dependem cada vez mais das cidades maiores e das capitais regionais quanto ao acesso a bens e a serviços mais específicos. Monte Alegre de Minas estabelece relações de interdependência e complementaridade com as cidades próximas e é dependente das cidades maiores da região, principalmente Uberlândia, Ituiutaba, e a cidade goiana de Itumbiara, as quais se têm acesso a partir das rodovias BR-365 e BR-153, importantes vias de integração nacional. Estas cidades maiores desempenham o papel de polos regionais, concentrando universidades, complexos hospitalares e outros serviços e comércio mais específicos. Parte da população de Monte Alegre e de outras cidades pequenas da região migra para Uberlândia e outras cidades maiores a fim de estudar e trabalhar. Boa parte dessa população migrante que deixa as cidades pequenas é composta por jovens. Estes jovens migrantes buscam qualificação profissional, melhores empregos e raramente retornam para suas cidades-natal em idade economicamente ativa, ou seja, quando estes migrantes retornam para suas cidades de origem (quando retornam), em sua maioria, já estão aposentados.
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CORRÊA, Roberto Lobato. Estudo sobre a Rede Urbana. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 2004.
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MAPA DE REGIÕES DE INFLUÊNCIA DAS CIDADES (ÁREA CENTRO-SUL)
Fonte: Caracterização e tendências da rede urbana do Brasil. Brasília: IPEA; Rio de Janeiro: IBGE; Campinas: UNICAMP/IE/NESUR. 2v. (Coleção pesquisas, 3), 1999. 25
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A POSSIBILIDADE DE REEQUILIBRIO NA REDE DE CIDADES DA REGIÃO
mineiro, recentemente viu surgir o assentamento irregular do ‚Triângulo do Glória‛. Outro fator observado pelo documento51 é que a mancha urbana das cidades latino-americanas segue em expansão, apesar da desaceleração demográfica. Esse crescimento disperso provocado pela especulação imobiliária produz cidades pouco densas, com centros subaproveitados e grande segregação física e social. Esse fator é observado em todas as cidades do triângulo mineiro, especialmente em Uberlândia, maior cidade da região.
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Segundo relatório da ONU-Habitat apresentado em 2012 , as cidades médias e pequenas da América Latina, onde reside a maior parte da população urbana na região, cresceram em ritmo mais elevado que as grandes cidades, o que aponta um possível reequilíbrio das redes de cidades latino-americanas. O relatório50 cita que houve uma desaceleração no crescimento demográfico da região e que este crescimento populacional é estável e permanecerá em torno de menos de 1% ao ano. O êxodo migratório do campo para a cidade perdeu peso e as migrações agora acontecem entre as cidades, o que gera um crescimento populacional nas cidades médias e a conformação de megarregiões e corredores urbanos.
Segundo o relatório, é indispensável promover políticas de coesão territorial que garantam o desenvolvimento equitativo de todas as cidades e sua articulação no âmbito regional. Para o Diretor Executivo da ONU-Habitat, Joan Clos, a América Latina esta a ponto de viver uma nova transição urbana, em que um salto qualitativo é possível, porém, há a necessidade de uma profunda reflexão sobre os modelos de crescimento urbano promovidos até hoje, que estão marcados por um alto grau de insustentabilidade, em que, apesar de esforços positivos em algumas cidades, boa parte delas crescem com urbanizações de baixa qualidade, centradas em si mesmas, sem um planejamento regional e sem a criação de espaços de socialização que não estejam totalmente dedicados ao consumo. A região deve centrar-se em um planejamento territorial que vise a igualdade de acesso a bens e serviços por toda a população.
O crescimento populacional das cidades médias através das migrações interurbanas constitui um desafio para o poder público e para o planejamento, pois, sem o apoio técnico e político adequado, é provável que aconteça a multiplicação de assentamentos precários nestas cidades, com as mesmas consequências já vistas nas grandes cidades. Uberlândia, que é a cidade que mais cresceu e recebeu migrantes no triângulo 49
Organização das Nações Unidas. Estado de las ciudades de America Latina y el Caribe: rumbo a una nueva transición urbana. ONU-Habitat (2012). 50 Idem.
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Idem.
‚Há a necessidade de uma abordagem holística para o desenvolvimento urbano e de assentamentos humanos, que preveja habitação acessível e infraestrutura, e priorize a atualização e regeneração urbana. É importante ressaltar o compromisso no sentido de melhorar a qualidade dos assentamentos humanos, incluindo a vida e o trabalho, tanto urbano quanto rural, no contexto da erradicação da pobreza, de modo que todas as pessoas tenham acesso a serviços básicos, habitação e mobilidade.52‛ Joan Clos
Conjunto habitacional do “Minha Casa Minha Vida” no limite da cidade. Ao fundo plantação de eucalipto. Fonte: Foto do Autor. O que se vê mais usualmente no Brasil são loteamentos populares e comerciais sendo feitos desconexos da malha urbana, promovendo cidades espraiadas e beneficiando a especulação imobiliária. Bem como, na maioria das cidades brasileiras, a mobilidade é ineficiente e a área rural é vista de forma secundária, o que não garante igualdade de acesso a bens e serviços para a população como um todo.
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Para um desenvolvimento mais igualitário, o Triângulo Mineiro deve desenvolver seus municípios encarando o território como um continuum urbano-rural interdependente que forma a rede urbana. Os equipamentos públicos devem ser distribuídos de maneira uniforme e o transporte e mobilidade devem ser facilitados, afim de que haja uma maior integração entre as cidades e para que os habitantes das cidades menores possam ter acesso aos serviços oferecidos nas cidades maiores da região.
Idem.
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29 Conjunto habitacional do â&#x20AC;&#x153;Minha Casa Minha Vidaâ&#x20AC;? no limite da cidade de Monte Alegre de Minas. Fonte: Foto do Autor.
30 Comemoração do centenário de Monte Alegre de Minas, na Praça Nicanor Parreira, em frente à Igreja Matriz, no ano de 1970. Fonte: Arquivo pessoal de Fabio Antonio Arantes.
A HISTÓRIA DE MONTE ALEGRE DE MINAS PELA HISTÓRIA DE SEUS ESPAÇOS 31
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‚Monte Alegre é um lugarzinho simpático de aspecto realmente risonho. Terá seus 400 ou 500 habitantes, algumas casas bastante boas, caiadas e de telhas. A Matriz é sumamente tosca. Diverti-me em lhe tirar uma vista. Muito pobrezinha com as suas torres e sua única porta a que dá acesso uma escadinha. O interior também de pobreza extrema, está bem de acordo com o movimento quase nulo do lugarejo de que é o mais importante edifício e a que animam as poucas tropas de cargueiros que por ali transitam. "53
pudessem tomar posse. Por ser rota de passagem para o centro do Brasil, surgiram pelo caminho, ao longo dessas trilhas, paradas e pequenas vilas que viriam a formar as primeiras cidades da região. A cidade de Monte Alegre de Minas é uma das primeiras cidades a se formar no triângulo mineiro e tem sua ocupação datada no começo do século XIX. Entre as décadas de 1810 e 1820, a comitiva de José Antônio Pereira, proveniente da Vila de Barbacena, na província de Minas Gerais, parte a procura de terras férteis no interior do Brasil, as quais pudesse tomar posse. Seu objetivo era chegar a terras da então província de Mato Grosso. No decorrer do percurso um integrante da comitiva adoece e o grupo é obrigado a parar. A expedição para entre os vales de dois córregos e é feita a promessa de que, se o integrante enfermo fosse curado, erguerse-ia uma capela em devoção a São Francisco, santo no qual o grupo era devoto. A partir de então, a comitiva estabelece morada nesta área, o integrante doente é curado e a capela em devoção a São Francisco é erguida. Os córregos dentre os quais a comitiva se fixou são os córregos Monte Alegre e Maria Elias, e a Capela de São Francisco das Chagas viria a ser a Igreja Matriz do futuro Arraial de São Francisco das Chagas de Monte Alegre.
Visconde de Taunay54
O triângulo mineiro começou a ser explorado no século XVII, como território de passagem entre o litoral de São Paulo e o interior do Brasil, como acesso às áreas onde hoje se localizam os estados de Goiás e Mato Grosso. As bandeiras e expedições que passavam pelo território do atual triângulo mineiro procuravam primeiramente minérios e posteriormente terras férteis às quais 53
Depoimento de Visconde de Taunay sobre Monte Alegre em decorrência da passagem das tropas brasileiras combatentes na Guerra do Paraguai pelo então Arraial, em 1865. IN Cartas da Campanha de Mato Grosso .Ed. Melhoramentos. 1921. Pág.96
Por estar localizada no meio de uma das rotas que levava ao interior do país, logo outras famílias se fixaram ao redor da Capela de São Francisco, formando o Arraial de São Francisco das Chagas de Monte Alegre, que levou esse nome devido ao santo
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Alfredo Maria Adriano d’Escragnolle Taunay, aristocrata carioca de família francesa, tinha o título de Visconde junto ao Império Brasileiro. Foi um nobre, escritor, engenheiro militar, político, historiador e sociólogo brasileiro. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras.
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padroeiro da capela e ao fato de, na parte mais alta da área, chamada de Serrinha, serem realizadas a maioria das festas, terços e reuniões comunitárias da época.
soldados permaneceram até a morte, sendo então, enterrados no mesmo local, denominado a partir dessa ocasião de Cemitério dos Bexiguentos, em alusão à doença que os abateu.
Em 1865, em decorrência da Guerra do Paraguai, chega ao Arraial uma coluna do Exército Brasileiro com o intuito de recrutar homens para compor reforços à tropa dos chamados Voluntários da Pátria, em que a província de Minas Gerais apresentou maior contingente. Alguns homens de São Francisco das Chagas de Monte Alegre partem com a tropa para lutar na Guerra do Paraguai. Nesse episódio, o Visconde de Taunay, que acompanhava essa coluna do Exército Imperial que passou por Monte Alegre, descreve o lugarejo como um ‚lugarzinho simpático‛ de ‚400 ou 500 habitantes‛, com algumas casas caiadas e com telhas, e com uma igreja simples.
Há o desmembramento do município de Monte Alegre em 1870, elevando o Arraial à categoria de Vila, e em 1872 acontece a primeira instalação da Câmara Municipal. É também em 1872 que alguns Voluntários da Pátria retornam a Monte Alegre, vitoriosos na Guerra do Paraguai, e fixam morada na Vila. Nessa mesma época, José Antônio Pereira, fundador do Arraial e quem mandou construir a Capela de São Francisco que originou a Matriz, reúne sua família e trilha o caminho percorrido pelos soldados, com o intuito de encontrar terras férteis e desabitadas. A comitiva de Pereira vai para a província de Mato Grosso e estabelece-se na Serra do Maracujá, de novo entre dois córregos, fundando outro arraial. Este novo arraial fundado por José Antonio Pereira tornarse-ia Campo Grande, atual capital do estado de Mato Grosso do Sul.
Após forçosa retirada das tropas brasileiras do território paraguaio, em que os soldados sofriam com uma epidemia de várias doenças, fato conhecido como a Retirada de Laguna, chega ao Arraial de Monte Alegre, por volta de 1867, cerca de seis soldados brasileiros abatidos pela varíola. Na época, esta doença era chamada de bexiga por causa das bolhas que apareciam no corpo dos infectados, e ainda não tinha tratamento e cura55. Por ser uma doença infecciosa, os soldados doentes não puderam se hospedar no Arraial, alojando-se a cerca de cinco quilômetros do povoado, às margens do córrego Monte Alegre. Neste lugar estes 55
A varíola não tem cura até hoje, porém a doença foi erradicada pela vacinação.
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Na primeira metade do século XX, a Vila de Monte Alegre expandiu-se em torno da Igreja Matriz de São Francisco das Chagas e consolidou-se enquanto cidade. O traçado urbano das primeiras vias e quadras seguiram o alinhamento dos Córregos Maria Elias e Monte Alegre e convergiram para o largo e adro da Igreja.
Fioravante Blarazinni, Francisco Ramella e Eduardo Boroni para remodelarem a fachada do templo, que adquire características neogóticas, as quais são preservadas até hoje. A nave da Igreja é reconstruída e ampliada na década de 1920.
São desse período os prédios de arquitetura eclética projetados pelo arquiteto prático italiano Luiz Bianchi e construídos pelo construtor português Joaquim Cruz, ambos radicados na cidade. Dentre as construções destacam-se os prédios públicos do Antigo Fórum, do Grupo Escolar, da Cadeia e do reservatório público de água. O prédio do Antigo Fórum foi construído de frente para o largo da Igreja, antigo Largo Rui Barbosa, em 1922, e funcionou como paço municipal até 1936, quando o legislativo e o executivo foram transferidos para outro prédio. O Grupo Escolar Tancredo Martins foi inaugurado em 1928 também no Largo Rui Barbosa, entre a Igreja e o Fórum, e mantém seu funcionamento como escola até a atualidade. O prédio do antigo reservatório público de água foi construído entre 1915 e 1916, servindo de reservatório para o primeiro sistema de abastecimento de água da cidade, tendo esse uso até 1970. O prédio antigo da Cadeia é da década de 1920 e atualmente é de propriedade privada. Prédio do antigo Fórum na déc. de 1940. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
A Igreja Matriz foi amplamente modificada na primeira metade do século XX. Em 1900 o pároco contrata os construtores europeus
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Praça Getulio Vargas adotando o nome de Praça Nicanor Parreira, ambos em homenagem a ex-prefeitos da cidade.
Prédio do antigo Reservatório de Água na déc. de 1920. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
O primeiro cemitério localizava-se ao lado do largo lateral da igreja. No início do século XX um novo cemitério é construído do outro lado do Córrego Monte Alegre devido à pequena capacidade do antigo cemitério. Na década de 1930, os corpos sepultados no antigo cemitério começam a ser transferidos para o novo a fim de se extinguir os trabalhos no antigo, que foi fechado posteriormente e teve sua área ocupada com construções.
Reforma da nave da igreja na déc. de 1920. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
O espaço público existente em torno da Igreja começou a ser modificado nessa época. Primeiramente esses espaços livres eram um largo e o adro que abrigavam viajantes e tropeiros, e não tinham pavimentação. No início do século XX é construído um jardim público no adro da Igreja, que posteriormente transformouse na Praça Getúlio Vargas, que era dividida ao meio por uma rua, sendo que em sua parte inferior localizava-se um coreto. O Largo Rui Barbosa, localizado na lateral da Igreja, permanece como largo de terra batida tendo ao centro um poste de iluminação pública. Esses espaços serão modificados posteriormente, na década de 1960, quando também mudam de nome, com o Largo Rui Barbosa passando a se chamar Praça Luis Dutra Alvim e a
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continua até hoje e uma nova igreja foi construída somente na década de 1990, em outro local.
Praça em frente à Igreja na déc. de 1940. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura. Após a abolição dos escravos, em 1888, manteve-se a tradição na cidade de celebrar o dia 13 de maio56 com a festa de congados e moçambiques, sendo inclusive feriado municipal. No início do século XX foi construída uma igreja em devoção a Nossa Senhora do Rosário no final da Rua São Francisco, em um largo do outro lado do Córrego Maria Elias. A procissão e desfile dos congados percorriam a Rua São Francisco, entre as duas igrejas. Porém, a Igreja do Rosário foi demolida na década de 1940, a mando do pároco Oscar Bitner, de origem alemã. Não se sabe ao certo o motivo que levou à demolição da Igreja. A festa do congado
Antiga Igreja do Rosário, que foi demolida na déc. de 1940. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura. O Padre Oscar Bitner foi uma figura emblemática na história da cidade, sendo lembrado até hoje como uma lenda urbana. Oscar Bitner fugiu da Alemanha nazista e exilou-se no Brasil, onde fez seminário em Uberaba, e veio para Monte Alegre como pároco. Quando o Brasil entrou na II Guerra, em apoio aos Aliados57 e contra os países do Eixo, aos quais incluía a Alemanha, houve a
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Em comemoração à assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel, em 13 de maio de 1888.
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União Soviética, Reino Unido e Estados Unidos
possibilidade de alistamento militar dos brasileiros. Para que houvesse o alistamento militar era necessário um ‚certificado de batismo‛ fornecido pela Igreja. Em Monte Alegre esse documento era lavrado pelo pároco Bitner, o qual se recusou a fornecê-lo para fins militares. Essa situação gerou revolta na população, principalmente nas famílias mais poderosas e influentes, que eram as que queriam os documentos para o alistamento. Dessa forma, o padre que fugiu da Alemanha de Hitler foi acusado de ser um espião nazista, que possuía rádios de comunicação em sua residência e que tinha contato com o governo alemão. Oscar Bitner teve seus bens retidos e suas propriedades revistadas pela polícia política mineira. A investigação não encontrou nada que o condenasse, classificando-o inclusive como antinazista por ter como caseiros em sua fazenda uma família de poloneses judeus. O padre então deixa a cidade, que tinha em sua classe mais rica um ambiente hostil para sua permanência. A saída de Oscar Bitner de Monte Alegre gerou uma lenda urbana na qual se diz que o pároco rogou uma praga na cidade, onde nada prosperaria, e em que o local permaneceria estagnado.
Entrada do primeiro carro na cidade, em 1912. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
A expansão urbana da cidade só aconteceria a partir da década de 1950, com a construção das rodovias que integraram o país e com a construção de Brasília, em 1960.
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Vista aérea de Monte Alegre na déc. de 1940. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
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71, antigo nome das atuais BR-153 e BR-365, respectivamente59. Com a construção dessas duas rodovias no município, e tendo a BR-71, atual 365, passando pelo perímetro urbano, Monte Alegre terá seu primeiro momento de expansão, com a criação de novos loteamentos.
‚Sinto-me feliz ao inaugurar o trecho da rodovia BR-14 e BR-71. Estamos avançando sobre o Brasil, conquistando o seu território e plantando no planalto o centro mais enérgico no progresso do Brasil, com a construção de Brasília. Aos meus amigos de Monte Alegre, cujo desenvolvimento se vai acelerar, o abraço de Juscelino Kubistchek.58‛
São criados então, novos bairros que ligam o centro da cidade à rodovia e surgem outros nas margens da rodovia, do lado oposto ao centro, caracterizando a primeira expansão urbana da cidade. A segunda expansão urbana só se daria na década de 1980, com loteamentos financiados pelo Banco Nacional de Habitação na parte norte da cidade.
Juscelino Kubistchek
O Brasil começou a sua industrialização com o presidente Getulio Vargas, porém, o crescimento industrial só ganhou maior dimensão após a administração de Juscelino Kubistchek, que adotou medidas para o desenvolvimento na área de energia e de transporte, permitindo a vinda de indústrias multinacionais e integrando o território brasileiro.
No encontro das atuais BR-365 e BR-153, no município de Monte Alegre de Minas, surge o Trevão, localidade que, além de ser referência para os caminhoneiros, por ser um posto de combustível, loja e restaurante, também possui algumas casas, tendo inclusive uma escola rural que atende aos moradores da localidade e aos agricultores da região.
No governo JK são construídas várias rodovias no Brasil, com o intuito de integrar as regiões do país e interliga-las com a nova capital em construção, Brasília. É então que, em 1958, como parte do plano de metas de seu governo, Juscelino inaugura o trecho que corta o município de Monte Alegre das rodovias BR-14 e BR-
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Presidente Juscelino, em carta à população montealegrense, devido à inauguração das rodovias que cortam o município, em 14 de novembro de 1958.
O primeiro sistema de numeração de rodovias federais no Brasil foi criado no final dos anos 40 e durou até 1964.
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Em 1966, o arquiteto João Jorge Coury, residente em Uberlândia, é convidado para remodelar a Praça Getulio Vargas, em frente à Igreja Matriz. Assim como em outras praças projetadas por este arquiteto na região neste mesmo período, a praça, que após a reforma passou a se chamar Praça Nicanor Parreira, ganha características do urbanismo moderno. Os bancos coletivos e o espaço central livre para a população marcaram o projeto. Coury une as duas partes da praça, fechando a rua que a cortava ao meio. O coreto é demolido e é prevista a construção de uma concha acústica, a qual não foi executada. No decorrer dos anos, a Praça Nicanor Parreira passa por intervenções que a descaracterizam, como por exemplo, a construção de um palanque em cima das fundações da concha acústica, que obstruiu a visão da igreja para a perspectiva da rua que é uma das entradas da cidade e a colocação de bancos individuais. A praça de características modernas perdura descaracterizada até 2007, quando é completamente destruída para a construção de uma nova praça. O Largo Rui Barbosa, na lateral da Igreja Matriz, é remodelado na década de 1940, e posteriormente em 1960, passando a se chamar Praça Luis Dutra Alvim, esta praça passa por várias reformas, executadas e projetadas por órgãos da prefeitura, até que é totalmente demolida em 2007, para ser novamente remodelada.
Praça Nicanor Parreira na década de 1970. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
Pça. Nicanor Parreira, em 1970, no dia do centenário da cidade. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
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Com o centenário da Retirada de Laguna, na Guerra do Paraguai, para crianças. Mais recentemente a escola está abandonada, a e no início do governo militar no Brasil, são construídos inúmeros represa já não é utilizada para lazer e foi construído um museu no memoriais e monumentos aos retirantes e aos voluntários da local da antiga casa dos zeladores do monumento. O museu pátria. Monte Alegre de Minas, por onde uma coluna do Exército construído em 2009 encontra-se abandonado e não chegou a ser Imperial se hospedou e onde morreram alguns soldados retirantes inaugurado. de Laguna, não estava previsto como parte das honrarias, o que foi reivindicado pelo historiador e artista montealegrense Alaor Mendonça. O historiador reivindicou junto ao governo militar, estadual e federal, a construção de um monumento no Cemitério dos Bexiguentos, o que foi atendido e teve inauguração em 1967. O Monumento aos Retirantes de Laguna conta com um cercado de concreto e dois obeliscos em volta das estacas de aroeira originais do cemitério; e com planos de concreto que sustentam um cruzeiro, um mapa com o trajeto dos soldados, e textos explicando o fato histórico e prestando homenagens aos soldados ali enterrados. O Monumento passou por várias fases, sendo abandonado, sendo encarado como área de lazer e como espaço de homenagem. Foi construída posteriormente, uma represa Praça Luis Dutra Alvim na década de 1970. a qual se podia usar pedalinhos e canoas, Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura. e uma escola agrícola de tempo integral
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Durante o ‚milagre econômico‛ da ditadura militar brasileira, Monte Alegre de Minas passa por mais algumas mudanças. Os prefeitos da época, ligados ao partido ARENA e apoiados pelos militares, fizeram algumas obras que iriam reorganizar a cidade. São elas, a nova sede do Fórum, o Estádio Popular do time local Triângulo Esporte Clube, o Parque de Exposições e a canalização do Córrego Monte Alegre.
construído em 1978, próximo também à rodovia. O atual prédio da Câmara, Prefeitura e Rodoviária são construídos na década de 1970 e a canalização do Córrego Monte Alegre acontece em 1980, com a implantação da Avenida Tancredo Neves em suas margens.
Fórum. Fonte: Foto do Autor. Monumento aos Retirantes de Laguna na década de 1990. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
Com a construção de novos edifícios públicos, alguns prédios antigos passam por mudanças de uso, chegando a sofrer algumas descaracterizações. O antigo Fórum, de arquitetura eclética, tem suas esquadrias originais trocadas por basculantes, que alteraram a fachada e os vãos do edifício. O prédio é abandonado durante alguns anos e depois se torna sede de várias secretarias da prefeitura, sendo agora sede da Secretaria de Educação. A antiga
O novo prédio do Fórum é inaugurado em 1979 em uma praça localizada onde havia o antigo campo do time local Triangulo Esporte Clube. A sede do time é então transferida para a entrada da cidade, próximo à BR-365. O Parque de Exposições é
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Caixa D’água ficou abandonada de 1970 a 1993, quando se torna sede da banda municipal. Em 1997 o prédio da antiga Caixa D’água é então reformado para abrigar a Biblioteca Municipal e atualmente o prédio passou por outra reforma para que seja instalado o Museu da Musica em seu interior, que irá contar a história da Banda Municipal e de outros grupos musicais na cidade. Com o trafego na rodovia que corta a cidade, parte da população que vive nas bordas da BR-365 viu a oportunidade de poder vender produtos para os que por ali passam. Dessa maneira espalhou-se pela área vendedores em carros e em barracas improvisadas, o que se via até a pouco tempo, antes da duplicação da rodovia. Devido ao número de vendedores, foi feito um conjunto de casas na década de 1970, onde as pessoas pudessem viver e vender produtos nas margens da pista, a esse conjunto deu-se o nome de Barracas.
Barracas. Fonte: Foto do Autor.
Na década de 1980, foi patrocinada pelo Banco Nacional de Habitação, a construção de um conjunto habitacional na região norte da cidade. Esse conjunto foi construído longe da área central e desconexo com a malha urbana existente, gerando um loteamento entre o conjunto e a área central, chamado Bairro Paloma.
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Igreja do Rosário. Fonte: Foto de Gláucio Henrique Chaves.
Prédio do Antigo Fórum em 2010. Fonte: Foto de Elisa Azevedo Ribeiro.
Prédio da Antiga “Caixa D’água” em 2009. Na época, Biblioteca Municipal. Fonte: Foto de Hércules Ramalho. Foram construídas, na década de 1990, a nova Igreja do Rosário, em local diferente da primeira, e a Capela do Divino Pai Eterno, na região da Serrinha, que deu nome à cidade. Há relatos de que na região da Serrinha, onde havia festas populares e religiosas, existiam sempre capelas feitas com madeira e palha, que serviam para as celebrações das Festas de Reis e outros eventos religiosos. Essas capelas tinham caráter efêmero por causa das festas, e na década de 1990 foi construída uma capela de alvenaria, com um mirante para a cidade, onde até hoje são realizadas festas e quermesses.
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Capela do Divino Pai Eterno, na Serrinha, onde tambĂŠm ĂŠ um mirante. Fonte: Foto do Autor.
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Nas últimas décadas, com as mudanças sociais pelas quais o Brasil passou e por ações federais como o Programa de Aceleração do Crescimento e o Minha Casa Minha Vida, Monte Alegre passa por mais algumas transformações.
A nova avenida em construção nas margens do Córrego Maria Elias, encontrará a avenida marginal do Córrego Monte Alegre60, e sairá desse encontro um novo acesso da cidade para a rodovia BR-365. Outro acesso está sendo construído com a prorrogação da avenida marginal do Córrego Monte Alegre até a rodovia. A prefeitura está sendo transferida para um novo prédio, às margens da BR-365, onde também está acontecendo um novo loteamento. Novos loteamentos estão surgindo nas margens da cidade, tendo inclusive, loteamentos sociais promovidos pelo programa federal Minha Casa Minha Vida. Este crescimento urbano disperso gera uma cidade pouco densa e com vazios, o que contribui para a especulação imobiliária e para um mau gasto dos recursos públicos, que tem que bancar os gastos com iluminação e saneamento público de áreas vazias. Com o recente PAC 2, vieram recursos para a construção da Estação de Tratamento de Água e para a Estação de Tratamento de Esgoto, ambos em construção. Esses equipamentos melhorarão a água fornecida à população e pretendem tirar o despejo de esgoto dos córregos Monte Alegre e Maria Elias.
Obras da duplicação da BR-365, em Monte Alegre de Minas. Fonte: Foto do Autor.
Outras alterações recentes foram a criação do Museu Municipal, no Monumento dos Retirantes de Laguna e a remodelação de algumas praças da cidade.
As rodovias que cortam o município passam por duplicação, como parte das medidas do PAC, estando em obras no perímetro urbano até hoje. Com a duplicação, os acessos à rodovia são repensados, tendo inclusive a canalização e urbanização do Córrego Maria Elias, que estava no fundo dos lotes anteriormente.
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Avenida Tancredo Neves.
demolida, não restando nem a vegetação, nem a pavimentação de mosaico português. O mesmo aconteceu com a Praça Luis Dutra Alvim. As duas praças foram então, unidas, calçadas com bloco intertravado de concreto, e foi construído um coreto como o que existia antes da década de 1960. Com esta reforma, que segundo a prefeitura, retoma elementos do que a praça foi antigamente, a praça foi tombada como patrimônio municipal.
Construção da avenida marginal ao Córrego Maria Elias, em 2013. Fonte: Foto do Autor. Algumas praças foram remodeladas na primeira década dos anos 2000, dentre elas, as praças em torno da Igreja Matriz, a Praça Nicanor Parreira e Luis Dutra Alvim. Por ser a Igreja e seu entorno o marco zero da ocupação do município, essas praças, carregadas de significado e de importância pelo imaginário coletivo, sofreram muitas transformações desde que eram o adro e um largo de terra batida. Porém, no ano de 2007, as duas praças foram destruídas para a construção de uma nova, que as uniu. A Praça Nicanor Parreira, projetada por Coury e de caráter moderno pós-Brasília estava descaracterizada e foi completamente
Museu do Monumento aos Retirantes de Laguna, em 2013. Fonte: Foto do Autor.
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Vista aérea das praças ao redor da Matriz em 2009. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura. Prédio onde será o Museu da Música. Biblioteca funciona em anexo, nos fundos. Fonte: Foto do Autor.
O Monumento aos Retirantes de Laguna foi reformado, adotando as cores da última gestão municipal61, e foi construído o Museu Histórico e Artístico onde antes se localizava a casa dos zeladores do monumento, reaproveitando a alvenaria pré-existente. Os zeladores foram transferidos para a antiga escola primária desativada, permanecendo lá até hoje. O Museu, construído em 2009, nunca foi inaugurado e encontra-se abandonado, pois é inadequado para exposições. O acervo que se pretendia expor no museu é todo documental e fotográfico, e a área de exposição feita em vidro e acrílico danificaria os documentos, que ficariam expostos ao sol.
61
Há uma série de planos para novos equipamentos culturais na cidade, alguns já em construção. Está sendo construído um Centro de Convenções que será a sede do Departamento de Cultura e contará com área para exposição e auditório. A antiga Caixa D’água, que abrigava a Biblioteca Municipal, será o Museu da Música, que contará a história da Banda Municipal e de outros grupos na cidade, sendo a Biblioteca transferida para um anexo nos fundos do edifício. Com a inauguração da nova prefeitura, será reorganizada a distribuição das Secretarias na cidade, e o prédio eclético do Antigo Fórum será a Oficina Cultural, onde se realizará cursos e exposições.
Gestão Dr. Último Bittencourt de Freitas (2005-2012)
53
Desde sempre, as alterações no espaço urbano de Monte Alegre aconteceram sem que houvesse um planejamento geral. A cidade, assim como todas as cidades da região, não contou com um projeto ou planejamento, o que se viu foi um urbanismo vernacular em que o núcleo urbano se desenvolveu em torno da Igreja, situada na meia encosta de um vale, e voltada para o curso d’água62. O crescimento urbano de Monte Alegre não contou, e ainda não conta com um planejamento geral. A cidade ainda não possui Plano Diretor ou Plano de Ordenamento do Território, que não são obrigatórios para cidades de até 20 mil habitantes, e vê seu desenvolvimento urbano recente acontecer de forma desconexa e arbitrária.
Situação atual do Museu no Monumento aos Retirantes de Laguna. Fonte: Foto do Autor.
Monumento aos Retirantes de Laguna em 2013. Da esquerda para a direita: Museu, Cemitério e Monumento visto lateralmente. Fonte: Foto do Autor. 62
VALE. Marília Maria Brasileiro Teixeira. In Mesa Redonda: As praças em Uberlândia – processos históricos. No dia 24 de junho de 2013, em evento na Universidade Federal de Uberlândia.
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Comparação da Praça Nicanor Parreira na década de 1970 e em 2013. Fonte: Foto de André Bianchi.
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56 Festa de congados e moรงambiques de Monte Alegre de Minas. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
O POVO E SUA CULTURA 57
DO CAIPIRA AO SERTANEJO
tradicionais muito marcados e é fruto da evolução histórica do grupo social radicado na chamada ‚paulistânia‛, área definida pelo historiador Alfredo Ellis Júnior, e que se refere a São Paulo, e a grande parte dos estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná, e no qual o Triângulo Mineiro está inserido. A paulistânia compreende a área que de certa forma começou a ser povoada pelos bandeirantes provenientes do litoral de São Paulo65.
‚O caipira é um dos tipos do homem rural brasileiro. Conforme a região do Brasil, o homem rural típico tem uma designação diferente. Há a tendência de se chamar qualquer pessoa de cultura rústica ou qualquer pessoa do interior de caipira, mas aí já num sentido meio pejorativo, meio jocoso, de dizer que a pessoa não tem hábitos civilizados. Não é nesse sentido que o devemos usar em um contexto como o nosso.63‛
Os bandeirantes encontraram ouro em Minas Gerais e em outros lugares do centro do país. Com o fim do ciclo do ouro, quando já não se encontrava mais o metal com a mesma facilidade de antes, há uma grande diáspora, onde os bandeirantes e colonos ocupam o restante do território mineiro e do centro do Brasil com uma vida rural. Isso criou a cultura caipira. O bandeirante que se sedentarizou, que se estabeleceu em um lugar, tornou-se o caipira. Houve os que se tornaram grandes fazendeiros e exportadores, sobretudo nas proximidades das maiores vilas e cidades, e houve os que se estabeleceram em áreas mais isoladas do território, no rural, com uma produção de subsistência.
Antonio Candido de Mello e Souza
Etimologicamente o termo caipira provém do tupi ka’apira, que significa ‚cortador de mato‛ e ka’apora, que significa ‚habitante do mato‛, estes foram os nomes dados pelos índios aos colonizadores e bandeirantes, brancos e mestiços, no sudeste e centro do Brasil64. O termo é utilizado até hoje, às vezes de forma pejorativa, para se referir às pessoas rústicas e sem instrução. Porém, caipira é a denominação dada ao morador do campo, que tem valores
Os bandeirantes inicialmente eram: portugueses, descendentes de portugueses, caboclos (mestiços de índio com branco) e alguns índios (escravos e aliados). Boa parte dos bandeirantes era composta de mestiços, que chegaram a falar durante algum
63
SOUZA. Antonio Candido de Mello (2009), “Os Caipiras”. in Intérpretes do Brasil, dirigido por Isa Grinspum Ferraz, em 2009. 64 FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. Segunda edição. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1986.
65
RIBEIRO, Darcy. O Povo Brasileiro: A formação e o sentido de Brasil. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
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tempo ‚língua geral‛, que era uma mistura das línguas portuguesa e tupi, o que foi proibido posteriormente por Portugal. Com a vinda dos escravos da África, há um novo intercâmbio de culturas, havendo assimilações de influências de ambas as partes. A cultura caipira, portanto, é uma fusão da cultura portuguesa, das culturas indígenas locais e da cultura africana, havendo uma indiferenciação entre a influência de cada uma dessas culturas66.
caracterizarem-se como festas católicas. Em Monte Alegre de Minas e em muitas cidades da região, as festas de congadas e moçambiques persistem até a atualidade, festejando Nossa Senhora do Rosário, e após 1888, a abolição dos escravos. Um fator importante para a formação da cultura caipira foi o isolamento. A área controlada pelos bandeirantes era muito grande, o território era vasto e pouco povoado, e eles eram nômades. O nomadismo e o isolamento são herdados pelos caipiras e são características muito próprias do homem caipira do século XIX68. O fundador de Monte Alegre de Minas, José Antônio Pereira, é um exemplo. Mineiro de Barbacena, procurou terras devolutas para cultivar, estabelecendo-se onde é hoje Monte Alegre. Com o aumento de sua família e com a chegada de outras pessoas nas proximidades, parte para nova procura de terras, povoando a área que posteriormente daria origem a Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. O caipira do século XIX tomava posse de uma área despovoada, desmatava, construía seu rancho, fazia sua plantação, permanecia durante um tempo e partia para fazer a mesma coisa em outro local a fim de aproveitar de uma área com recursos inexplorados e com o solo virgem. Era uma cultura extremamente móvel.
O caipira constrói sua casa com técnicas que mesclavam o saber português e o saber indígena, com os materiais que tinha a disposição. Sua dieta baseava-se na pesca, na caça e em plantações, assemelhando-se muito com a dieta indígena, chegando eles a consumir animais silvestres como tatu e jacaré, porém, também com muita influência portuguesa e africana, com o cultivo e consumo de espécies trazidas pelos colonizadores. A própria língua falada é uma mescla entre palavras indígenas, termos africanos e a língua portuguesa, por vezes, utilizando termos lusitanos arcaicos. Quando o caipira usa palavras como ‚pregunta‛, ‚causo‛ e ‚despois‛, ele está usando termos da língua portuguesa culta falada na região das minas no século XVII.67 A cultura caipira enriquece-se com a cultura africana, pela presença, entre outras coisas, das congadas, moçambiques e batuques, que por sua vez, também tem influência portuguesa, por 66
Idem. SOUZA. Antonio Candido de Mello (2009), “Os Caipiras”. in Intérpretes do Brasil, dirigido por Isa Grinspum Ferraz, em 2009. 67
68
59
Idem.
O caipira se sedentarizou em parte, porque antes era muito móvel, e estava fora da economia de mercado também em termos, visto que ele vendia seus produtos nas feiras das vilas. Ainda não havia supermercados, havia feiras e vendas, e não tinham produtos industrializados, e sim, manufaturados e artesanais. A sociedade pré-industrial era autossuficiente em sua produção e consumo69. A industrialização muda fortemente o mundo caipira, transformando seu modo de produção e a maneira de ser e agir. A partir do momento em que ele fica mais subordinado ao mercado, que ele tem que comprar bens de consumo para os quais ele não tem dinheiro, ‚que a mulher quer uma bacia de lata, que ele quer um despertador e que a filha quer um relógio‛, por exemplo, seu tempo acaba. O tempo que antes era gasto com a pescaria, com a caça, com as festas e celebrações religiosas que comemoravam os santos populares e a colheita, agora é gasto com o aumento de sua produção, no intuito de se ganhar mais dinheiro70. Alguns caipiras então se veem obrigados a mudar para a cidade grande a procura de emprego, o que coincide com o crescimento urbano brasileiro. Na cidade ele acaba marginalizado, trabalhando como servente de pedreiro, porteiro, soldado; e morando na periferia ou em favelas.
69 70
60 Congado de Monte Alegre de Minas. Fonte: Foto de Fabio Martins.
Idem. Idem.
As pequenas cidades, como Monte Alegre, passam por fortes mudanças. Com a construção de rodovias e a revolução das comunicações, o território torna-se mais coeso, há a chegada de hábitos e produtos estrangeiros e a cultura caipira é discriminada, vista como atrasada. Acontece neste momento o que Milton Santos define como uma ‚mudança de conteúdo‛ nas cidades pequenas. A cidade que antes era ‚a cidade no campo‛, onde os notáveis eram a professora, o padre, o tabelião; passa a ser a ‚cidade do campo‛, lugar do agrônomo, do veterinário, do bancário e de todos os envolvidos na produção agrícola que se modernizava e industrializava. ‚(...) não seria demais lembrar que o acelerado processo de urbanização do país, nas ultimas décadas, tem consistido, fundamentalmente, na transferência das populações rurais para as cidades. E que as fronteiras entre o rural e o urbano certamente são mais tênues, do ponto de vista cultural, que as demarcatórias físicas entre o campo e a cidade.71‛
Folia de Reis em Monte Alegre. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura. Sempre houve uma relação entre a cultura caipira e a cultura urbana. Não há uma divisão drástica entre essas duas culturas, há um continuum e as influências são mutuas. O caipira influencia o urbano e vice-versa. A cultura caipira original, pré-industrialização, esta extinta, mas seu legado e sua influência persistem72. Seu folclore, festas religiosas, celebrações, culinária, música e danças são preservados, sendo alguns inclusive patrimônios tombados, o que é o caso do queijo minas e da congada. A cultura caipira
Abram Szajman
71
SZAJMAN. Abram, no Editorial da Exposição: “Caipiras, Capiaus: Pau-a-Pique”, promovida pelo Centro de Lazer SESC Fábrica da Pompéia, em 1984, na cidade de São Paulo.
72
SOUZA. Antonio Candido de Mello (2009), “Os Caipiras”. in Intérpretes do Brasil, dirigido por Isa Grinspum Ferraz, em 2009.
61
tradicional esta aos poucos saindo da marginalização e está se tornando patrimônio, sendo encarada como folclore. Após a industrialização o Brasil caipira se urbaniza. As migrações, os transportes e as telecomunicações fizeram com que a cultura caipira entrasse em contato com outras influencias e se ‚urbanizasse‛. Essa urbanização alterou o estilo de vida do habitante da paulistânia. Os caipiras entraram na economia de mercado e tornaram-se consumidores dos produtos industrializados como eletrodomésticos e automóveis. Viram também a cultura caipira adquirir influencias do urbano e do mundo globalizado, gerando um outro tipo cultural. A cultura caipira toma contato, através dos meios de comunicação, com influências estrangeiras, como os cowboys estadunidenses, e passa a assimilar outros temas. A música popular da região, por exemplo, que antes cantava causos da roça e passagens religiosas, passou a contar historias de amor, que eram mais assimiláveis na cidade, e a falar mais recentemente, de mudanças socioeconômicas e da aquisição de bens de consumo, como os carros ‚Dodge RAM‛ e ‚Camaro Amarelo‛. As festas de reis e de santos populares que reuniam as comunidades caipiras ainda existem, mas são tidas como folclore, e o que se tornou a principal festa que agrega as pessoas das comunidades do centro do país foi a festa de exposição agropecuária. Folia de Reis em Monte Alegre Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
62
‚Caipira‛, durante um período, podia ser interpretado como um termo pejorativo, sinônimo de atraso. Seus remanescentes culturais originaram a cultura sertaneja contemporânea, que caracteriza boa parte da paulistânia, do Brasil central produtor agrícola. Esse sertanejo contemporâneo é preferência de 58% dos ouvintes de rádio no país, segundo o Ibope73. A difusão da cultura fonográfica sertaneja coincidiu com a explosão do agronegócio no Brasil, e pode ser natural que um setor econômico tão poderoso tenha seu correlato na indústria cultural. Há inclusive, uma padronização no consumo cultural de algumas pequenas cidades do centro do país, como Monte Alegre, onde o sertanejo é consumido com unanimidade. Fazendo uma analogia com o agronegócio, a monocultura, que estende plantações de um tipo vegetal em campos gigantescos, é o que se tem de mais contrário à ideia de diversidade. Talvez essa característica do agronegócio reflita em seu correlato da indústria cultural, principalmente nas cidades menores, onde a cultura sertaneja ás vezes é monopolizante. Inauguração do Parque de Exposições Agropecuária, em 1978. Fonte: Arquivo pessoal de Fabio Antonio Arantes.
Paralelamente a isso há uma preocupação em se valorizar as características locais, e atualmente a cultura caipira tradicional passa por um resgate e revalorização, a fim de fortalecer a identidade cultural de sua região de origem. 73
Estudo Tribos Musicais, Ibope Media (Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística), 2013.
63
IDENTIDADE CULTURAL E CIDADANIA
organizar-se em rede. Ao mesmo tempo em que o mundo se globaliza e se torna mais cosmopolita, surgem movimentos que reforçam as identidades locais, e que asseguram a permanência de singularidades culturais, a fim de que tradições não se percam. Isso acontece como uma reafirmação de identidade cultural, com o intuito de se garantir o sentimento de pertencimento e a cidadania.
‚Nosso mundo, e nossa vida, vêm sendo moldados pelas tendências conflitantes da globalização e da identidade. A revolução da tecnologia da informação e a reestruturação do capitalismo introduziram uma nova forma de sociedade, a sociedade em rede. (...) Entretanto, isso não é tudo. Juntamente com a revolução tecnológica, a transformação do capitalismo e a derrocada do estadismo, vivenciamos no ultimo quarto de século o avanço de expressões poderosas de identidade coletiva que desafiam a globalização e o cosmopolitismo em função da singularidade cultural e do controle das pessoas sobre suas próprias vidas e ambientes. Essas expressões encerram acepções múltiplas, são altamente diversificadas e seguem os contornos pertinentes a cada cultura, bem como às fontes históricas da formação de cada identidade.74‛
Quanto mais a tradição perde espaço e quanto mais a vida cotidiana reconstitui-se ‚em termos da interação dialética entre o local e o global‛, mais os indivíduos são forçados a escolher e negociar opções de estilos de vida em meio a tantas possibilidades. Isso pode gerar a construção de uma identidade, capaz de redefinir a posição do indivíduo na sociedade75. A atual revalorização da cultura caipira é um projeto de recriação de uma identidade. A valorização da história local, de seus bens culturais materiais e imateriais é peça chave na busca de uma redefinição da posição de uma comunidade na sociedade, que pretende reforçar seu sentimento de cidadania.
Manuel Castells
Em Monte Alegre de Minas, assim como em toda a região, a cultura caipira está sendo encarada como patrimônio. Algumas de suas manifestações e bens estão sendo tombados e há uma preocupação em conservar as tradições, como a produção de
Após a globalização, com os avanços dos meios de comunicação e dos transportes, as culturas de todo o mundo foram expostas a uma gama maior de influências e a sociedade global passou a 74
75
CASTELLS, Manuel. Vol. II: O poder da identidade. São Paulo: Paz e terra, 1999.
64
Idem.
queijo minas e de cachaça, que são tidas como patrimônio mineiro. As festas e celebrações tradicionais locais também são valorizadas, documentadas e tombadas, para que não se percam. A Festa em louvor a Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, marcada pela presença dos grupos de congado e moçambique, faz parte do grupo de bens tombados em Monte Alegre. Outras festas importantes registradas são a Folia de Reis e as festas religiosas que acontecem nas capelas rurais do município, como as procissões para capelas dedicadas a Nossa Senhora Aparecida e a Nossa Senhora da Abadia. Episódios históricos marcantes, como a morte dos soldados retirantes de Laguna no município de Monte Alegre, quando voltavam da Guerra do Paraguai, também são valorizados, visto que este episódio específico ajuda a contar a história da cidade. O fato histórico é relembrado com um monumento no lugar dos túmulos dos soldados e onde recentemente foi construído um museu. Essa rememoração e revalorização dos fatos históricos às vezes esbarra na questão de ‚o que preservar‛ e ‚como preservar‛, além de entrar também em discussão a maneira como a história será contada. O museu construído recentemente no Monumento aos Retirantes de Laguna permanece fechado e está abandonado, ou seja, a vontade de se valorizar o local prevaleceu sem que se fosse pensado a maneira como o bem seria preservado e como a história seria contada.
65 Congado de Monte Alegre de Minas. Fonte: Foto do Autor.
No espaço urbano, as construções e espaços também são valorizados, havendo o tombamento de construções significativas, tanto histórico, quanto artisticamente, com o intuito de se preservar a memória local. Porém, essa valorização do que se preservar é relativa, e pode ocorrer de os responsáveis pela avaliação de bens culturais a serem protegidos divergirem suas opiniões entre si e com a comunidade. Tal fato é ilustrado, em Monte Alegre, com o caso da destruição da praça moderna no entorno da Igreja Matriz para a construção de outra nova, a qual foi tombada como patrimônio municipal, fato este, já citado neste trabalho.
A história do Brasil, e mais especificamente das regiões mais centrais de seu território, é recente. A ocupação de Monte Alegre, que data do início do século XIX, é recente historicamente, assim como a história de toda a região. A modernidade acelerou o processo de transformação na cidade e ainda há remanescentes da ideia de que o novo é sempre melhor. Juntamente a isso, somam-se as mudanças de desejo político e a vontade de marcar gestões administrativas, fatos corriqueiros em nosso sistema político. Procissão de N.S. da Abadia, na zona rural de Monte Alegre. Fonte: Acervo do Depto. de Cultura.
A comunidade local vê com bons olhos a preservação dos bens culturais que a dão identidade, e inclusive, almejam essa preservação. A valorização da identidade cultural é um fenômeno que está em voga em todo o mundo e está fortemente ligada à construção de cidadania, devendo ser encarada como um projeto contínuo.
Capela de N.S. da Abadia, na zona rural de Monte Alegre de Minas. Fonte: Acervo do Depto. de Cultura.
66
67 Festa de congados e moรงambiques no dia 13 de maio. Fonte: Foto do Autor.
QUALIDADE DE VIDA
O Triângulo Mineiro apresenta a maioria de seus municípios com alto índice de desenvolvimento humano, porém ainda há algumas cidades com o IDHM mediano, o que é o caso de Monte Alegre de Minas77, onde todos os fatores que avaliam o índice de desenvolvimento humano municipal, que são educação, longevidade e renda, apresentaram pontuações medianas.
Acesso a serviços como educação, saúde e lazer, aliados à garantia de emprego, são indicadores de qualidade de vida. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) divulgou em julho de 2013 o índice que mede o desenvolvimento humano nos municípios brasileiros, o IDHM76.
Comparando as pontuações obtidas por Monte Alegre com as de municípios da região que apresentaram alto índice de desenvolvimento humano, nota-se que a diferenciação se dá pela educação. A longevidade e a renda no triângulo mineiro são homogêneas entre os municípios, porém as taxas de escolaridade e de percentual da população em idade escolar frequentando as aulas são baixas em Monte Alegre de Minas e em outros municípios da região que também apresentaram IDHM medianos.
O estudo mostra que de 1991 até hoje, uma parcela significativa dos municípios brasileiros que apresentavam situação de muito baixo desenvolvimento humano, melhoraram seus índices, porém, o desenvolvimento humano ainda não é homogêneo em todo o país. Atualmente 74% dos municípios brasileiros (4.122 deles) se encontram nas faixas de médio e alto desenvolvimento humano, enquanto cerca de 25% deles (1.431 municípios) estão nas faixas de baixo e muito baixo desenvolvimento humano, sendo que ainda há uma diferenciação entre o desenvolvimento da região centro sul do país, que é mais desenvolvida, e a região norte e nordeste, que apresentam piores índices de IDHM. Apenas 0,8% dos municípios brasileiros (44 deles) possuem Muito Alto Desenvolvimento Humano, dentre os quais o Distrito Federal faz parte e o restante esta distribuído no centro-sul do Brasil.
Antiga escola agrícola, no Bexiguentos, hoje desativada.. Fonte: Foto do Autor.
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Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. In Série Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 2013. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
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O IDHM, que varia de 0 a 1, é de 0,674 em Monte Alegre de Minas.
Escola Rural no povoado de Garcias. Fonte: Foto do Autor e uma disponibiliza também o ensino médio78. Das quinze escolas do município, apenas duas, localizadas na área urbana, disponibilizam atividades de tempo integral, como cursos de arte, música e esportes após o término das aulas. Há um grande índice de evasão escolar, o que explica o baixo número de jovens que completam o ensino médio antes dos 20 anos. É disponibilizado por uma das escolas públicas da cidade, o programa chamado Educação de Jovens e Adultos, que atende atualmente a 147 alunos79 que querem terminar seus estudos, o ensino fundamental e médio, em um tempo menor que o sistema regular. Também são
Entre os dados relativos à educação em Monte Alegre, os fatos que mais preocupam são os de que apenas 36,13% da população maior de 18 anos possui ensino fundamental completo, o que indica baixa escolaridade da população adulta; e somente 33,62% da população de 18 a 20 anos possui ensino médio completo, caracterizando jovens mal preparados para o mercado de trabalho. Monte Alegre possui onze escolas urbanas, públicas e particulares, que atendem atualmente a 3.366 alunos da préescola ao ensino médio. Há também quatro escolas rurais, distribuídas em quatro pontos do município, onde estão matriculados 393 alunos, as quais três são de ensino fundamental
78
Dados fornecidos pela Secretaria de Educação de Monte Alegre de Minas, em 2013. 79 Idem.
69
oferecidos pelo Departamento de Cultura, cursos de dança, arte, teatro, música e capoeira para os que se interessarem, e há apresentações e mostras culturais esporadicamente80. Desse modo, constata-se que apesar de haver vagas nas escolas e o acesso à cultura estar melhorando, a evasão escolar ainda é grande, talvez, pela maneira como essas vagas estão distribuídas no município e como as escolas se apresentam à comunidade, visto que apenas uma das escolas no município é de tempo integral e as escolas rurais, em sua maioria, são apenas de ensino fundamental e de meio período. Outro fator que pode contribuir com a evasão escolar é a renda da população, tendo em vista que a renda per capita em Monte Alegre é de 619 reais81, pouco menos que um salário mínimo, e que os jovens às vezes precisem trabalhar para contribuir com a renda familiar.
Cinema na Praça, em 2013. Evento em parceria entre o Departamento de Cultura e a TV Integração. Fonte: Foto do Autor 80
Dados fornecidos pelo Departamento de Cultura de Monte Alegre de Minas, em 2013. 81 Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. In Série Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 2013. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
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O Bexiguento, área do Monumento aos Retirantes de Laguna, sendo usado de forma recreativa pela população Fonte: Foto do Autor
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DIRETRIZES E INTERVENÇÕES 73
Tomando por base a análise territorial, econômica e sociocultural de Monte Alegre de Minas, propõem-se para este trabalho, diretrizes e propostas de intervenção que melhorem a qualidade de vida da população, possibilitando maior acesso a educação e cultura; espaços públicos de qualidade; espaço rural integrado e com bons equipamentos; mobilidade facilitada no município; bem como, uma cidade coesa e densa.
transporte municipal, para que a população possa estar mais bem assistida em relação à educação, cultura e lazer.
‚Desenho urbano e desenho de edifícios não são mais que dois momentos de uma mesma disciplina: a arquitetura, intervindo em diferentes momentos e com distintos processos (plano e projeto), mas com um único instrumento fundamental: o desenho. E será especificado por um especialista – o arquiteto – que pode intervir a diferentes níveis e dimensões espaciais, mas com um objetivo comum: o domínio da forma do território e da cidade como estruturas físicas. Porque é nessas estruturas físicas que vivem os cidadãos e é a estrutura física o que resta das cidades na sua evolução e transformação no tempo.84‛ José Ressano Garcia Lamas
Essa resposta projetual e de planejamento que será mostrada a seguir vem a calhar com o resultado da pesquisa sobre Monte Alegre, que percebeu um município com poucos espaços públicos de qualidade, com uma mobilidade municipal pouco facilitada, e, sobretudo, com um Índice de Desenvolvimento Humano Municipal mediano, devido aos baixos índices educacionais apresentados pela população82. Como abordado anteriormente e seguindo a afirmação de que ‚a cidade é um território que organiza territórios83‛ as intervenções e diretrizes buscarão prover a cidade de Monte Alegre de espaços qualificados e equipamentos que atendam toda a população municipal, urbana e rural. De encontro a isso, também serão propostos equipamentos locais na zona rural atrelados ao
82
De acordo com: Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. In Série Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 2013. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. 83 MEYER. Regina apud RONCAYOLO. Marcel. O Urbanismo: entre a cidade e o território. in Cienc. Cult. Vol. 58 n°1: São Paulo Já./Mar. 2006.
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LAMAS. José M. Ressano Garcia. Morfologia Urbana e Desenho da Cidade. Fundação Calouste Gulbenkian – Fundação para a Ciência e a Tecnologia – Ministério da Ciência e do Ensino Superior de Portugal. Lisboa, 2004.
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DIRETRIZES PARA A CIDADE
As diretrizes para a cidade de Monte Alegre visam o controle de crescimento de sua área urbana, a proteção de seu patrimônio e a criação de espaços públicos e equipamentos de educação e cultura de qualidade.
Permitir meios seguros de travessia da rodovia que corta a cidade, e arborização da área a fim de amenizar os efeitos da poluição sonora e do ar para a população que vive às suas margens; Preservação de edifícios e lugares históricos, utilizando-os para fins culturais compatíveis com as edificações, evitando descaracterizações desnecessárias.
São elas:
Definição do perímetro urbano, a fim de evitar a especulação imobiliária na cidade e a criação de loteamentos desconexos, com o intuito de que a cidade cresça de forma coesa e densa, evitando inclusive, gastos desnecessários de dinheiro público com o custeio de áreas vazias; Ampliação da proteção ao núcleo histórico da cidade85, definindo-o como área onde os edifícios devem obedecer ao gabarito de até dois pavimentos; Arborização das margens dos córregos Monte Alegre e Maria Elias, definindo-os como espaços públicos de qualidade para a prática de atividades físicas ao ar livre, pois já são utilizados para estes fins; Remoção completa do despejo de esgoto nos córregos Monte Alegre e Maria Elias86.
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O núcleo histórico de Monte Alegre já é protegido, porém, a restrição construtiva na área ainda não é clara.
Tem-se o projeto da construção da Estação de Tratamento de Esgoto, porém, esta obra ainda não foi concluída.
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CÓRREGOS MONTE ALEGRE E MARIA ELIAS
As espécies que se pretende utilizar na arborização da área são espécies nativas do cerrado, como o pequizeiro, o ipê e a quaresmeira. Também será usado o buriti, que é comum em fundos de vale.
Os dois córregos urbanos, que têm papel histórico na formação da cidade ainda recebem boa parte do esgoto doméstico de Monte Alegre. O Córrego Monte Alegre foi canalizado no final da década de 1970 e possui vias marginais desde a década de 1940. O Córrego Maria Elias está sendo urbanizado recentemente, com vias marginais, pois antes ele se encontrava no fundo de lotes. Ambos os córregos servem hoje como espaço para a prática de atividades físicas, como caminhada, corrida e ciclismo, mesmo tendo vias marginais mal arborizadas, e com a poluição das águas que gera mau cheiro em tempos de chuva. Os estudos e diretrizes para as margens dos córregos visam melhorar a ambiência urbana da área e adequá-la para a prática de exercícios ao ar livre, que já acontecem no local. Bem como, a retirada total do despejo de esgoto nos córregos. O estudo de intervenção para o Córrego Monte Alegre cria plataformas que avançam para o interior do córrego, criando nichos com bancos, onde também se podem praticar exercícios. As calçadas são requalificadas com piso drenante e algumas vagas de estacionamento são substituídas por canteiros para a arborização da via.
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O Córrego Maria Elias estava, até a pouco tempo, no fundo de lotes. Atualmente a área está em obras, com a construção de vias marginais ao veio d’água. Por ter acabadas apenas as faixas de rolamento de automóveis e considerando que Monte Alegre ainda não tem restrições urbanísticas para a área, a intervenção no Córrego Maria Elias também entra no âmbito de diretrizes legais. As propostas para a área são:
Afastamento frontal dos lotes lindeiros à via de cinco metros, com arborização; Praças e largos no afunilamento das quadras; Mantenimento da vegetação existente nos lotes e reposição das mesmas, caso haja cortes, visto que se trata de um fundo de vale; Preferência da prefeitura na aquisição dos lotes que fazem fundos com construções históricas, a fim de se propor equipamentos públicos que tenham saída para dois lados da quadra.
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RODOVIA As diretrizes para a área da Rodovia têm o intuito de amenizar seu efeito de barreira na área urbana, criando passagens que interliguem os dois lados da cidade. Hoje há apenas uma passagem entre os dois lados da rodovia, que acontece em um túnel para veículos, sendo que, no restante da extensão em que a BR-365 corta a área urbana, os pedestres e ciclistas a atravessam em nível, tendo risco de atropelamento. A diretriz para esta área é, portanto, a locação de passarelas que possibilitem a travessia segura para pedestres e ciclistas. Bem como, a arborização das bordas da rodovia, com o intuito de amenizar a poluição sonora e do ar para os moradores de suas bordas. A BR-365 está passando por obras de duplicação no trecho que passa pela cidade de Monte Alegre. Há a intenção de se instalar passarelas para pedestres ao término dessas obras, porém, ainda não há projeto de locação dessas passarelas, segundo a Prefeitura Municipal, e as obras de duplicação encontram-se atrasadas.
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LARGO DA PRAÇA Na evolução urbana de Monte Alegre, o antigo Largo Rui Barbosa deu origem à atual Praça Luis Dutra Alvim. A delimitação desta praça deixou um espaço amplo em frente a prédios históricos como a Escola Tancredo Martins, o prédio do antigo Fórum e o antigo Hotel do Commercio, este espaço é usado como estacionamento e há uma via de mão única com duas faixas. Não havendo a necessidade de a via ser tão larga neste local e tendo em vista os edifícios históricos de seu entorno, propõe-se para a área um calçamento amplo, como um espaço público contiguo à praça. Solução esta, similar à adotada pelo arquiteto Ricardo Pereira na Praça Rui Barbosa, em Uberlândia. Tal solução visa qualificar o espaço público do local, bem como, valorizar as construções históricas da área.
Acima: situação atual da área; Abaixo: proposta de criação de calçamento.
Praça Rui Barbosa, em Uberlândia. Fonte: Foto de Ricardo Pereira. 86
Situação atual da área.
Estudo de requalificação do espaço.
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Juntamente com a requalificação do espaço, propõe-se a valorização dos edifícios de seu entorno. De acordo com documentação fotográfica, é possível recuperar os vãos originais do prédio do antigo Fórum, onde está prevista a instalação da Oficina Cultural. Essa medida recuperaria o valor artístico original do edifício. O prédio do Hotel do Commercio, que é um edifício comercial, passaria por uma restauração e adequação de programação visual dos estabelecimentos ali sediados, a fim de recuperar a noção de unidade do edifício.
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O tráfego de veículos não é alterado com o alargamento das calçadas e os sentidos das ruas permanecem iguais, apenas são retiradas algumas vagas de estacionamento e uma das faixas de rodagem, aumentando a área para os pedestres e diminuindo a área para veículos. O calçamento do largo é feito com blocos intertravados de concreto, que é o material utilizado no piso da praça à qual ele fica em frente, dando a idéia de conjunto e de continuidade do espaço. É utilizado também no calçamento, faixas de mosaico português com um padrão de desenho similar ao que havia na praça em frente à Igreja Matriz, e que foi destruído em 2007.
Antigo calçamento da Praça Nicanor Parreira, em frente à Igreja Matriz. Fonte: Acervo do Depto. de Cultura.
ESCOLA TANCREDO MARTINS “HOTEL DO COMMERCIO” “ANTIGO FÓRUM”
IGREJA MATRIZ Planta do Largo.
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MIRANTE DA SERRINHA ESTRADA DA SERRINHA
Na região da Serrinha, área importante para o município, pois foi a que deu origem ao nome Monte Alegre, há uma capela onde acontecem festas religiosas populares, e há alguns bancos, sendo a área um mirante que avista a cidade e o cerrado que a circunda. A intervenção neste espaço é a simples demarcação de um platô, através de arrimos de pedra, onde se possa observar a paisagem com maior comodidade, em uma área plana que acompanha uma cota mais alta do terreno. O platô encaixa-se no desnível do terreno através dos arrimos que se elevam.
CAPELA DO DIVINO PAI ETERNO
As preexistências do lugar, como as cruzes de missões, os santos e inclusive os bancos que ali já existiam, são deixados como estão, pois fazem parte da memória do lugar.
92 Planta do Mirante.
Acima: situação atual da área Abaixo: estudo de intervenção.
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DIRETRIZES PARA O MUNICÍPIO As diretrizes para o município de Monte Alegre são com o intuito de integrar o território; promover ainda mais a inclusão da população rural a serviços de educação, saúde, cultura e cidadania; e valorizar o patrimônio cultural rural. São elas:
Transporte municipal rural claro e institucionalizado, com equipamentos e pontos de espera de qualidade; Escolas rurais como equipamentos comunitários, que estejam abertas à comunidade com serviços culturais, de esporte e de saúde, para além da educação; Acesso ao Monumento aos Retirantes de Laguna por meio das margens do córrego Monte Alegre87; requalificação do monumento e da escola primária agrícola que funcionou no local e que está desativada; Maior proteção ao patrimônio rural, como capelas e casarões de interesse histórico, artístico e cultural, bem como de sua paisagem cultural circundante.
Na página ao lado: exemplos do patrimônio rural de Monte Alegre. Das capelas e casarões mostrados, apenas a Capela de Nossa Senhora da Abadia tem proteção, com tombamento. Alguns desses bens estão sofrendo descaracterizações recentes, como a Capela de Nossa Senhora Aparecida com a implantação da cobertura metálica lateral.
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O acesso ao Monumento é feito somente pela rodovia BR-365. Não há uma estrada ou via local que ligue a cidade ao monumento, o que dificulta seu acesso e o torna perigoso para ciclistas e pedestres. O monumento dista 4Km da cidade e é acessado por ciclistas frequentemente.
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Casar達o sede de fazenda. Fonte: Foto do Autor.
Capela rural de Nossa Senhora Aparecida. Fonte: Foto do Autor.
Capela rural de Nossa Senhora da Abadia. Fonte: Arquivo do Deptp. de Cultura
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Casar達o sede de fazenda. Fonte: Foto de Roselaine Silva.
BEXIGUENTO
não foi levado em conta o valor histórico do lugar enquanto paisagem onde o fato histórico ocorreu. Os acréscimos e alterações no lugar só vêm a alterar a paisagem, com intervenções pesadas e, às vezes, sem funcionalidade.
O Monumento aos Retirantes de Laguna já passou por várias fases desde a década de 1960, quando foi inaugurado. Antes de 1967 havia no local apenas a marcação das sepulturas dos soldados ali enterrados, feita com estacas de aroeira, juntamente com um cruzeiro, também de madeira. Era o chamado Cemitério dos Bexiguentos.
Tendo em vista o valor do bem enquanto lugar que sediou um fato histórico, a paisagem circundante deve ser respeitada. O Museu, tal qual esta definido hoje, deve ser removido, e o monumento deve ser pintado de branco, como era originalmente, em sua inauguração.
Com a inauguração do monumento, mantiveram-se as estacas de aroeira originais e construiu-se em volta um cercado de alvenaria com dois obeliscos pequenos e três planos de concreto, com uma cruz, mapas e placas em homenagem aos soldados. Da construção do monumento até hoje, o lugar já foi encarado como área de lazer, quando foi construída a represa; como lugar de homenagens militares; e já ficou abandonado durante alguns anos. Recentemente foi construído na área, próximo ao Monumento, um Museu, que reaproveitou as paredes da antiga casa dos zeladores do lugar. O Museu encontra-se abandonado por causas técnicas, não sendo possível fazer exposição por conta da incidência do sol em seu interior, fato já descrito neste trabalho. Outra alteração freqüente no Monumento é em relação às suas cores, pois toda administração municipal muda as cores do lugar de acordo com as cores do mandato.
Há a necessidade de um acesso ao Monumento por uma via local, visto que o acesso hoje só é realizado pela rodovia, o que é perigoso para ciclistas. A escola primária em tempo integral, que atendia jovens da cidade ensinando-os a plantar e a fazer atividades agrícolas, e que hoje esta abandonada, deve ser reativada.
A maioria dessas alterações buscou, de certa forma, valorizar o local, visto sua importância histórica para o município e relação com a história nacional. Porém, em todas as intervenções no local, 96
O acesso ao Monumento é feito somente pela rodovia BR-365. Não há uma estrada ou via local que ligue a cidade ao monumento, o que dificulta seu acesso e o torna perigoso para ciclistas e pedestres. O monumento dista 4Km da cidade e é acessado por ciclistas frequentemente. A nova estrada margearia o Córrego Monte Alegre, respeitando o afastamento da mata ciliar e chegaria ao monumento pelo traçado da antiga pista de pouso de aviões de pequeno porte, hoje desativada.
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Situação atual do Monumento aos Retirantes de Laguna, com Museu à direita da foto. Fonte: Foto do Autor.
Museu da Luz, Portugal. Fonte: www.museudaluz.org.pt
O Museu, tal qual está inserido no local hoje, é pesado para o lugar, descaracterizando a paisagem que serviu de palco para o fato histórico e deixando em segundo plano o próprio monumento e cemitério. O Museu foi construído reaproveitando as paredes da antiga casa dos zeladores e é inapto, tecnicamente, para exposições, devido à incidência de luz solar em seu interior. Um bom exemplo de construção que respeita a paisagem circundante é o Museu da Luz, no vilarejo de Luz, em Portugal, dos arquitetos Pedro Pacheco e Marie Clément. O Museu da Luz foi construído semienterrado para não interferir bruscamente na paisagem, respeitando seu entorno. Ele está ao lado de uma igreja do século XV e de um cemitério, não competindo visualmente com nenhum dos dois.
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Escola antiga de Qinmo, China. Fonte: www.rufwork.org
Antiga escola agrícola primária de Monte Alegre, hoje desativada. Fonte: Foto do Autor. Durante a década de 1990, funcionou no Bexiguento uma escola primária de tempo integral que ensinava técnicas de cultivo às crianças da cidade. Essa escola foi desativada e atualmente esta abandonada e servindo em parte como casa para os zeladores do local. A escola pode ser reativada, tendo em vista o serviço social que desempenhava e pode ter como exemplo projetos de escolas chinesas desenvolvidas pelo grupo Rural Urban Framework88, que também trabalham ensinando técnicas de cultivo.
Escola Primária de Mulan, China. Fonte: www.rufwork.org
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O Rural Urban Framework é um grupo de pesquisa e design que aborda a transformação rural-urbano da China através de projetos de edifícios, pesquisa, exibições e publicações. Eles trabalham como um grupo sem fins lucrativos em colaboração com o governo chinês e universidades. O trabalho é conduzido com a Faculdade de Arquitetura da Universidade de Hong Kong.
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ESCOLAS RURAIS
aplicação de conceitos pedagógicos ao espaço, criando novas centralidades no município. Elas ‚abrem-se e chamam a participação da comunidade, afirmando-se como fóruns onde cultura, lazer, desporto e saúde dão uma nova dimensão à noção de espaço educativo‛91. Fazem parte do programa dessas escolas, espaços educativos, culturais e inclusive salas de atendimento médico que podem ser utilizados pelos habitantes da região.
Monte Alegre possui quatro escolas rurais que atendem, em conjunto, 393 alunos89. Todas as escolas são de ensino fundamental, com exceção de uma, localizada no distrito de Garcias, que também possui ensino médio. Visto os baixos índices em educação obtidos pelo município de Monte Alegre na avaliação do IDHM 201390, já citado neste trabalho, e os altos índices de evasão escolar, uma alternativa seria abrir as atuais escolas à comunidade, tornando-as escolas que também funcionem como equipamentos comunitários de cultura, esporte e saúde.
As escolas chinesas do grupo Rural Urban Framework reaproveitam partes das escolas pré-existentes e formam escolas que também são espaços comunitários e de convívio da comunidade rural local. Seus trabalhos também visam o ensino de técnicas agrícolas na escola, que aprimore o trabalho dos agricultores, para que eles dependam menos do dinheiro mandado por parentes que trabalham nas fábricas das cidades.
Exemplos a serem seguidos são os Complexos Escolares de Óbidos, em Portugal, e escolas chinesas projetadas pelo grupo Rural Urban Framework.
Tanto no exemplo chinês quanto no exemplo português, as escolas rurais funcionam como centros comunitários cujo uso extrapola a educação escolar. A aplicação desses conceitos nas escolas rurais de Monte Alegre melhoraria a educação no município e permitiria acesso mais facilitado a serviços de cultura, lazer e saúde à população rural, diminuindo também a evasão escolar.
As escolas de Óbidos distribuem-se em três complexos, que atendem à população das vilas, aldeias e pequenas propriedades rurais que formam o município português. Essas escolas estão distribuídas pelo território de Óbidos e foram desenvolvidas com a 89
Dado fornecido pela Secretaria de Educação de Monte Alegre de Minas, de acordo com as matrículas do ano letivo de 2013. 90 Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. In Série Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 2013. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. O IDHM, que varia de 0 a 1, é de 0,674 em Monte Alegre de Minas.
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Texto de Claudio Sat, autor do projeto das escolas, publicado em www.mdc.arq.br
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Complexo Escolar do Furadouro, em Óbidos, Portugal Fonte: Câmara Municipal de Óbidos
Escola Rural José Cabral, em Monte Alegre. Fonte: Foto do Autor
Escola Nova de Qinmo, China. Fonte: www.rufwork.org
Escola Rural Fernando Vilela, em Monte Alegre. Fonte: Foto de João Edson Arantes
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O município de Monte Alegre de Minas conta com 14 escolas, sendo que, dez delas situam-se na cidade e outras quatro estão espalhadas pelo município. Das quatro escolas rurais, cada uma delas atende uma parcela do município, tendo sua área de influência em um dos extremos do território municipal. A cidade, localizada na parte central, atende mais facilmente a população rural que vive em sua proximidade, em um curto raio de distancia, após isso é mais fácil o aluno se deslocar até uma das escolas rurais. Essas escolas rurais não atendem apenas pessoas do município de Monte Alegre, alguns alunos são moradores da zona rural dos municípios vizinhos.
Alunos do 1° Ano da Escola Rural Fernando Vilela. Fonte: Foto do Autor 103
A escola passou por reforma e ampliação recente. Houve a cobertura da quadra de esportes, o aumento do número de salas e a construção de um posto de saúde contiguo à escola. Pode-se afirmar que esta é uma das escolas em melhores condições dentre as escolas rurais de Monte Alegre.
ESCOLA JOSÉ CABRAL Fica localizada no povoado de Garcias e é a que tem o maior número de alunos dentre as escolas rurais, possuindo turmas do 1° ano do ensino fundamental, até o 3° ano do ensino médio. Boa parte dos alunos desta escola mora no povoado ou em fazendas da região, das quais os pais são produtores rurais e proprietários da terra. Por conta disso, a rotatividade de alunos é menor em comparação com outras escolas rurais, havendo menos transferência de alunos devido à mudança de emprego dos pais, o que é frequente nas outras escolas. É também a escola que mais possui ex-alunos ingressantes em cursos de ensino superior. Por estar no extremo norte do município, os alunos e a população do entorno podem ter mais relação com as cidades de Canápolis, Centralina, Tupaciguara e Itumbiara do que com a cidade de Monte Alegre, por questões de proximidade e acessibilidade. Há uma horta que fornece alimentos para a merenda escolar, porém os alunos não participam de seu cultivo. A refeição é servida no horário do recreio e o turno de aulas é das 09h às 13:30h. A maior parte dos professores mora na cidade de Monte Alegre e se deslocam para o povoado através de uma van. Os alunos da área rural próxima também se deslocam para a escola através de vans. O horário das aulas é compatível com o horário do transporte para que os alunos não tenham que acordar tão cedo.
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alguns alunos chegam a ficar de duas a três horas dentro das vans no trajeto casa-escola.
ESCOLA FERNANDO VILELA Escola próxima aos municípios de Uberlândia e Tupaciguara, situada às margens da rodovia BR-365. Atende a parte leste do município de Monte Alegre e a proximidade rural dos municípios vizinhos.
Assim que os alunos chegam à escola acontece o almoço. Depois disso há dois períodos de aula separados por um intervalo de recreio. Essa escola também possui horta, porém, os alunos não participam de seu cultivo.
Há uma alta taxa de transferência e rotatividade de alunos. Parte significativa dos pais dos estudantes trabalha em fazendas da região como empregados, e a mudança de emprego significa a mudança de escola dos filhos, já que alguns deles vivem nas fazendas onde trabalham. A inconstância desses trabalhos é grande devido à sazonalidade das colheitas e ao curto espaço de tempo de contrato nessas fazendas e empresas.
O espaço físico foi reformado e ampliado recentemente. A quadra de esportes é coberta e a biblioteca ganhou um espaço para vídeo. A escola atual está melhor que antes da reforma, mesmo havendo alguns problemas de ventilação e iluminação no espaço.
Alguns estudantes são filhos de migrantes de outros estados, principalmente vindos do nordeste do país, e há alguns outros cujos pais são proprietários da fazenda onde moram. Por morarem próximo à cidade de Uberlândia, muitos deles consomem produtos e cultura que os estudantes de outras escolas rurais não têm acesso com tanta facilidade. Essa diversidade na origem das famílias dos alunos e a proximidade que a região tem com um centro urbano de grande porte diferenciam esta escola rural das demais do município. O turno de aulas é das 11h às 15:20h para que os alunos não tenham que acordar de madrugada para pegar o transporte, pois
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ESCOLA EDUARDO MARQUÊS É a menor entre as quatro escolas rurais do município em relação ao número de alunos. Foram 55 alunos no ano letivo de 2013, divididos do 1° ao 5° ano. É também a escola que esta localizada na parte mais rural, na área sul do município de Monte Alegre. O turno das aulas é das 10h às 14:30h. Há o horário do almoço dividido por turma, o intervalo do recreio no meio do turno escolar e um lanche ao término das aulas. O lanche no final do turno escolar acontece devido a alguns alunos demorarem a chegar em casa, cerca de duas a três horas de transporte. Uma parcela dos alunos são filhos de pequenos produtores rurais, e boa parte deles são filhos de funcionários de fazendas e de granjas. Há algumas transferências de alunos, mas não significa uma alta rotatividade de estudantes, devido, supostamente, à maior estabilidade de emprego nos tipos de trabalho rural desta região do município. Há uma horta cultivada por uma das professoras e por algumas funcionárias da escola, onde há uma pequena participação dos alunos. A escola será reformada no início deste ano de 2014. A quadra será coberta e as salas de aula receberão forro e mudança de piso. Esta reforma melhorará o conforto térmico e acústico da escola, mas não mudará significativamente sua tipologia.
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Situada às margens da rodovia BR-153, é a segunda maior escola rural do município, com 110 alunos no ano letivo de 2013, em turmas do 1° ao 9° ano. Fica próxima ao encontro das rodovias BR-153 e BR-365, local conhecido como Trevão. A escola atende as pessoas que moram ali e reúne alunos da área rural próxima, dos municípios de Monte Alegre, Canápolis, Ituiutaba e Prata.
Com a duplicação da BR-365 e da BR-153, a rotatória que hoje há no encontro dessas duas rodovias será substituída por um viaduto, e a área onde a escola está situada será desapropriada para a construção da duplicação e das alças de acesso ao pontilhão. A escola e algumas das casas serão removidas. As casas, que são de propriedade do posto, ainda não têm plano de realocação e a escola será realocada para outro terreno nas proximidades, que ainda está incerto quanto à localização.
Os alunos são provenientes de famílias de pequenos produtores rurais do entorno, sendo alguns filhos de empregados de fazendas da região, e outros filhos de moradores da área do Trevão, que são os funcionários do posto de gasolina, restaurante e comércio ou pessoas desempregadas que moram na localidade.
Visto a realidade complexa dos moradores deste local e o caso de realocação da escola, escolheu-se trabalhar com este lugar para a proposição de uma escola rural, que também exerça um papel comunitário de equipamento sociocultural para a população do entorno.
Por ter acesso facilitado pelas rodovias, o transporte é mais ágil e as aulas começam às 7h, estendendo-se até as 11:30h. A merenda escolar é servida na hora do recreio e a escola não possui horta.
As outras escolas rurais do município passaram ou estão passando por reformas recentes que mantêm a mesma tipologia pré-existente. Dessa forma, a escola do Trevo foi escolhida como área de intervenção por possibilitar o exercício do projeto a partir do zero, podendo-se criar um modelo de escola que poderá ser seguido pelas demais.
ESCOLA NICANOR PARREIRA
A falta de lazer e/ou ocupação no local favorece a precocidade dos jovens dali em relação ao sexo e ao uso de drogas ilícitas. Estes fatores, aliados ao alto movimento gerado pelo trafego nas duas rodovias e ao baixo nível econômico da população, visto que alguns deles são desempregados, também favorece o aparecimento de casos de prostituição e de aliciamento de menores no local.
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PLANTA ESQUEMÁTICA DA ATUAL ESCOLA NICANOR PARREIRA [s/ escala]
N
Casas vizinhas à Escola Fonte: Foto do Autor
1 – Entrada 2 – Sala de Aula 3 – Diretoria 4 – Biblioteca 5 – Sala dos Professores 6 – Supervisão 7 – Banheiro dos Alunos 8 – Varanda e Refeitório 9 – Cozinha 10 – Despensa e Serviço 11 – Barzinho 12 - Quadra
112 Foto tirada em frente à Escola, onde se vê as casas vizinhas com o Posto e Rodovias ao fundo. Fonte: Foto do Autor
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‚Na minha opinião (com base na minha pesquisa sobre o assunto), os centros comunitários [rurais] permitiriam colocar fim à decadência da maravilhosa vida campesina e a restauraria com força total, já que esta nova organização daria uma vida moderna e cheia de vitalidade ao campo, de onde muitos fugiram, atraídos pelas vantagens duvidosas da cidade.92‛
Com a duplicação das rodovias e a passagem da BR-153 em um viaduto sobre a BR-365, a Escola será removida para outro lugar, que ainda é incerto devido às negociações entre o DNIT, a Prefeitura Municipal, o Posto Trevão e a Construtora. Dentre os terrenos onde se especula ser o local de realocação da Escola, escolheu-se para este trabalho, uma gleba ao lado do Posto, em direção à cidade de Monte Alegre. Este terreno é uma das possibilidades de implantação da nova escola e foi escolhido para o projeto neste trabalho por sua facilidade de acesso e proximidade com o comércio existente no local, visto que a escola também desempenhará papel de equipamento comunitário de cultura, saúde e esporte.
Le Corbusier
Área escolhida para o projeto
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LE CORBUSIER. “El corazon como punto de reunion de las artes”. ROGERS, E.N., SERT, J.L., e TYRWHITT, J. El corazón de La ciudad: para uma vida más humana de La comunidad. Barcelona: Hoelpi, 1955, PP.41-52.
Análise de implantação e insolação em maquete de estudo
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PROPOSTA PARA NOVA ESCOLA NICANOR PARREIRA 1 – SAGUÃO DE ENTRADA 2 – SALAS DE AULA 3 – ADMINISTRAÇÃO 4 – MÉDICO/DENTISTA 5 – QUADRA POLIESPORTIVA 6 – HORTA E POMAR 7 – REFEITÓRIO 8 – BIBLIOTECA E SALA MULTIMÍDIA
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O programa proposta de proporcionar forneça mais isso.
de usos da escola busca vincular o projeto a uma ensino condizente com a população atendida, e a essas pessoas um equipamento público que que somente educação, em um ambiente favorável a
em nível organizacional, às especificidades da vida rural de cada região. Espaços assim são fomentados por programas federais como o PRONACAMPO (Programa Nacional de Educação no Campo), que ‚constitui um conjunto de ações voltadas ao acesso e à permanência na escola, à aprendizagem e à valorização do universo cultural das populações do campo95‛.
‚Reconheçamos, entretanto, que nenhum outro elemento é tão fundamental, no complexo da situação educacional, depois do professor, quanto o prédio e suas instalações.93‛
A escola conta também com quadra esportiva e área de atendimento medico que atendem a população do entorno. ‚A valorização social da escola como agrupamento unitário e ponto focal de uma comunidade, levando-a a um uso intensivo, estaria, no mínimo, a duplicar o seu valor de uso e, na mesma proporção, a reduzir o seu valor de custo96‛
Anísio Teixeira
A escola atualmente já cede espaço para cursos realizados pelo SENAR (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), de bordado e pintura. O que se pretende é a ampliação da oferta desses cursos, com a possibilidade do aprendizado de cultivo e de técnicas agrícolas em aulas oferecidas tanto para os alunos, quanto para seus pais. Para isso, o projeto da nova escola conta com área para horta e pomar, além de uma sala multimídia, que pode abrigar aulas e palestras.
Hélio Duarte
A possibilidade de se ocorrer esse tipo de formação no ambiente de uma escola rural vai de encontro com a Lei de Diretrizes94, que defende a adequação da escola, tanto em nível curricular quanto 93
TEIXEIRA, Anísio.Um Presságio de Progresso In Revista Habitat n° 4, de 1951. Lei de Diretrizes: Lei n° 9394, de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. O texto faz referência ao seu Artigo 28 que trata das adaptações do ensino às peculiaridades da vida rural. 94
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PRONACAMPO: Decreto n° 7352/2010. DUARTE, Helio. Considerações sobre Arquitetura e Educação In Revista Acrópole n°210, de 1956. 96
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A solução projetual dada à escola visa um espaço de qualidade e de baixo custo construtivo e de manutenção. Os materiais utilizados foram, basicamente, tijolo cerâmico ‚baiano‛, aparente e com reboco; e arrimos de concreto aparente. Onde o tijolo cerâmico é aparente há uma seqüência de aberturas criadas pela paginação das fiadas dos blocos, o que permite a ventilação. Os espaços se articulam com o pátio, e este se abre para a área de cultivo de hortaliças e árvores frutíferas.
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O conjunto de diretrizes e intervenções proposto neste trabalho para o município de Monte Alegre de Minas tem o objetivo de proporcionar espaços públicos de qualidade, bem como, acesso facilitado à educação e cultura para a população, incluindo também, sua parcela rural, que por vezes é encarada de forma secundária. Espaços públicos de qualidade e acesso à cultura melhoram a qualidade de vida de qualquer população. Em Monte Alegre de Minas, onde o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal é mediano, as medidas aqui propostas trariam melhoras efetivas.
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OUTRAS REFERÊNCIAS As transformações ocorridas recentemente nas relações cidade-campo inspiraram obras de artistas contemporâneos que ajudam a ilustrar e a refletir sobre o tema. A dupla de artistas nórdicos Michael Elmgreen e Ingar Dragset fez a instalação de arte permanente ‚Prada Store‛ nas proximidades do vilarejo de Marfa, no Texas (E.U.A.). A instalação de uma loja fictícia da marca de acessórios de luxo Prada na beira de uma rodovia, no meio do deserto, leva à reflexão sobre a acelerada transformação da paisagem e à forte influência da vida urbana no mundo rural, ás vezes perversa. Já a artista húngara radicada em Nova York, Agnes Denes, faz uma instalação de arte temporária, em que ela planta uma lavoura de trigo de dois hectares em uma área vazia de Manhathan, próxima a Wall Street e onde hoje se localiza o Battery Park. Nesta instalação, chamada "Wheatfield - A Confrontation" (Campo de Trigo – Um Confronto), a artista chama a atenção para ‚os valores e as prioridades deslocadas‛. Com a ajuda de voluntários, Agnes limpou um terreno antes poluído e o usou para plantação, em uma das áreas urbanas mais valorizadas e adensadas do mundo. Estas obras levam à reflexão, através de várias interpretações, tanto da influência do urbano no campo, quanto do rural na cidade.
Instalação de arte temporária Confrontation”, de Agnes Denes.
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“Weatfield
–
A
123 Instalação de arte permanente “Prada Store”, de Michael Elmgreen e Ingar Dragset
124 Marfa, Texas (E.U.A.)
125 Monte Alegre de Minas, Minas Gerais
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