5ª edição "Médicos Portugueses pelo Mundo" Frankfurt, Alemanha

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Médicos Portugueses pelo Mundo Entrevista a um médico português a exercer ou especializar-se no estrangeiro Nome: Cristian Rodrigues Gonçalves
 Idade: 32

Faculdade em que se licenciou: FMUL
 Cidade atual: Frankfurt am Main Especialidade: Medicina Interna + Cardiologia

Antes de mais muito obrigado pelo convite para esta entrevista. É com todo o gosto que partilho a minha experiência com vocês e com os restantes alunos, colegas internos e especialistas.

HS! - Quais foram os principais motivos que a levaram a deixar o nosso país e envergar p o r u m a a v e n t u r a p r o fi s s i o n a l n o estrangeiro? Cristian Rodrigues Gonçalves - Não houve um motivo específico, mas como estão a ver, neste momento, o futuro para os médicos no “nosso” país está por um fio. E deste modo pensei “por que não tentar exercer os meus conhecimentos e capacidades no estrangeiro?”.

HS! Porquê a Alemanha e porquê Frankfurt? CRG - A Alemanha foi a minha escolha pois eu nasci cá. Frequentei a escola alemã até à terceira classe e o resto dos meus estudos foram todos feitos em Portugal. No entanto, o Alemão nunca foi esquecido e deste modo foi uma vantagem que acabei por tirar partido.

HS! - Como foi todo o processo de candidatura e seleção e quais as suas habilitações mais valorizadas nesse processo?

CRG - A primeira etapa de todas é ter a capacidade de decisão. Isto é, quando nos decidimos candidatar ao internato no estrangeiro tem de ser de forma consciente, uma vez que implica tempo, gastos monetários e uma mudança de estilo de vida. Relativamente às habilitações, são valorizados candidatos que tenham realizado voluntariado e que pertenceram a agrupamentos, independentemente do forro. No que respeita às publicações, elas são importantes mas não essenciais e a tese de mestrado poderá ser importante se realizada na área a que se candidatam.

HS! Quais são os documentos necessários e como é concedido o reconhecimento do diploma na Alemanha? CRG - Carta de Curso/Diploma • Certificado de Nascimento ou se forem portugueses, optem pelo certificado internacional, evitando o custo da tradução. Se forem alemães, apresentem o stammes buch; • Registo Criminal português e alemão (tem de ter menos de 1 Mês de validade); • Cartão de cidadão; • Declaração da Ordem dos Médicos a certificar o título de médico ou o Certificate of Good Standing (só necessário se alguma vez exerceram a profissão de médico em Portugal); • Declaração da Faculdade, certificado com as notas e


declaração que o curso foi tirado segundo o art. n º36 e que corresponde ao processo de Bolonha; • Anmeldung (isto é, têm de estar registados na cidade, ou seja, ter uma morada fixa na Alemanha, para isso têm de ir ao Bürgeramt); • Certificado de B2/C1 em alemão; • Currículo vitae o Foto (fato e gravata); • Carta de apresentação, na qual se apresentam, motivos pelos quais escolhem uma especialidade, motivos porque escolhem aquele hospital, quais os vossos pontos fortes, o que ganhariam com a vossa contratação enquanto internos; • Atestado Medico (eu fui à minha médica de família aqui na Alemanha);

Tudo tem de estar traduzido. Sai mais barato se o fizerem na Alemanha do que em Portugal. Têm de ser tradutores reconhecidos, e em Portugal são só os que surgem na lista do consulado alemão. Um pequeno aparte que penso ser importante frisar, o Título de Mestre não tem equivalência aqui na Alemanha, ou seja, no meu caso pedi reconhecimento, e foime dado um título que na Alemanha não equivale a nada.

HS! – Foi necessário tirar, previamente, um curso de Alemão? CRG - Como já referi na questão anterior é necessário um certificado B2/C1 de Alemão, logo é necessário frequentar um curso de alemão.

HS! – É necessário realizar um exame de acesso à especialidade, tal como existe em Portugal? CRG - Não. Aqui não há nenhum exame de acesso. Para aqueles que se formaram na A l e m a n h a , n o fi m d o c u r s o , e x i s t e o “Staatsexam” (composto por parte escrita e oral). Apenas aqueles que tiverem aprovação neste exame concluem o curso de medicina e são considerados médicos. Os portugueses que se queiram candidatar à especialidade na Alemanha não precisam do Staatsexam, uma

vez que, o curso de Medicina português é reconhecido na Alemanha.

HS! - Quais os desafios e dificuldades que encontrou neste processo de mudança? CRG - A língua, o processo de candidatura, o pedido da Approbation, por vezes alguns dos colegas (mas em Portugal também temos bons e maus colegas). Mas provavelmente a maior dificuldade que nós encontramos é o estar longe dos amigos e da família. Tudo o resto são pequenices. A Approbacion é um documento que diz que se é médico, igual aos que estudaram aqui na Alemanha quando passam o Staatsexam. E só com isso podem ser médicos na Alemanha. O processo não é difícil, mas requer paciência. Eu iniciei o processo em Fevereiro/Marco e tive a Approbation em Maio. O importante é fazer tudo com tempo, pois a Approbation demora sempre algum tempo a chegar, e sem ela não podem trabalhar, nem fazer a inscrição na Landesärztekammer (Ordem dos Médicos). Contudo sugiro que enquanto esperam pelo resultado da Approbation comecem já a decidir que especialidade pretendem, em que hospital querem trabalhar e enviar logo currículos. Se o chefe de departamento estiver interessado, marca uma entrevista mesmo sem ainda ter o dito papel com a aprovação.

HS! - Acha que a sua formação médica a preparou adequadamente para este desafio ou sente algum tipo de lacunas perante os colegas formados na Alemanha? CRG - Muito sinceramente, não. Isto é, em termos teóricos sim, estamos muito acima dos nossos colegas alemães, no entanto em termos práticos não estamos minimamente preparados. Mas tudo isso se adquire com bastante rapidez.

HS! - Que diferenças encontra entre a sua especialidade na Alemanha e a praticada no nosso país?


CRG - Na Alemanha, e no meu caso, são os médicos que fazem tudo. Desde colheita de sangue, ECG, leitura dos mesmos, Ecos… etc. Não existem técnicos ou enfermeiros que façam isso.

HS! - Qual a impressão que os profissionais e os doentes alemães têm sobre os médicos formados em Portugal? CRG - Em termos gerais gostam de nós, e cada vez somos mais aqui na Alemanha. Mas… e claro há sempre um mas, a língua é muito importante. Reitero que é importante “dominar” minimamente a língua alemã.

HS! - Quais as principais diferenças que salienta entre o nosso serviço nacional de saúde e o Alemão? CRG - Em Portugal o serviço nacional está a ser destruído pelos seguros privados. Está a tornar se um sistema cada vez mais parecido com o alemão.

HS! - Tem algum conselho para dar aos colegas que pensem emigrar para a Alemanha, nomeadamente para Frankfurt? CRG - Devem estar descontraídos. O importante é tomarem a decisão de vir. Não virem iludidos que aqui é tudo fácil e dado, pois não o é. Tem de haver um esforço e não esperem um mar de rosas. Mas tudo é possível!

Em termos práticos deixo algumas dicas:

- Devem enviar a bewerbung (candidatura), diretamente para o Chefe de Serviço ou departamento da especialidade que querem fazer. Por exemplo, por vezes, se quiserem Cardiologia, Reumatologia, Endocrinologia, Gastro (etc) têm de enviar o currículo para o Chefe de Medicina Interna.

- Podem-se candidatar a qualquer especialidade. No entanto, existem especialidades para as quais o acesso é difícil. A título de exemplo, para cirurgia plástica, alguns hospitais não aceitam candidatos sem

nenhum experiência em cirurgia na Alemanha. Em relação à Cardiologia, nem todos os hospitais tem a possibilidade de ter internos desta especialidade. Assim sendo, eles determinaram que para seres cardiologista tens dois caminhos: medicina Interna (5 anos) + Cardiologia (3 anos) e então és especialista em Medicina Interna/Cardiologia ou então Medicina Interna (3 anos) + Cardiologia (3 anos) e então és especialista de Cardiologia.

- Podem-se candidatar todos os dias do ano, pois não existem datas específicas (como em Portugal – uma vez ao ano). Podem candidatarse quantas vezes entenderem, independentemente de estar já numa especialidade. Isto é, tendo entrado em cirurgia em Janeiro, em Abril podem concorrer a medicina inter na e em Junho a outra especialidade. Há facilidade de mudança, claro que em termos de currículo mudar varias vezes no mesmo ano demonstra instabilidade por parte do concorrente relativamente ao hospital.

HS! - Qual o ordenado médio, carga horária mínima semanal e qual o período de férias de um médico na Alemanha? CRG - Pelo menos 42 horas por semana (contar sempre com horas extra, que em alguns hospitais são pagas noutros não). Há uma tabela salarial: no primeiro ano o ordenado anda à volta dos 2400 euros (sem urgências). Relativamente as férias todos tem 30 dias/ano.

HS! - Como classificaria o nível de vida em Frankfurt e na Alemanha em geral? Por exemplo quanto custa alugar e manter uma casa? E que outras despesas poderia citar a título de exemplo? CRG - Relativamente a esta pergunta, a resposta é difícil. Pois, na minha opinião existe gastar e gastar e isso depende de cada um. Mas com o ordenado ganho dá para alugar casa, viver desafogado, viajar e ainda poupar algum. Isto claro não se tratando de uma


pessoa que goste de ir todos os dias às compras, digo roupa ou jóias.

Caso se fale de um casal, com ambos a trabalhar, conseguem com todo o tipo de gastos, poupar quase um ordenado completo.

HS! - Quais as suas perspetivas no futuro? Pensa voltar a Portugal? E porquê? CRG - As perspetivas são boas, mas claro que nós é que fazemos o nosso futuro. Aqui a boa relação com os chefes é muito importante, pois o nosso contrato depende deles. Se penso voltar a Portugal? À partida não. Quando emigramos, é natural conhecermos pessoas novas e até refazermos a vida com pessoas de outras nacionalidades. Depois, naturalmente pensamos em casar e ter filhos e vamo-nos estabelecendo. Para voltar teria de haver uma oferta muito acima da que me é dada aqui.

Exmo. Dr. Cristian Gonçalves, em nome da equipa do HajaSaúde!, agradecemos imenso o tempo dispêndio e desejamos-lhe os maiores sucessos pessoais e profissionais nesta sua etapa.


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