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Helena Franco Ruette
Centro Ecocultural
Casa Ecoativa ea
Rede Permacultural
na cidade de São Paulo Trabalho apresentado à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Mackenzie para a conclusão do curso de graduação de Arquitetura e Urbanismo Orientador: Prof. Dr. Jair Oliveira
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Agradecimentos
Resumo
Este trabalho tem como objetivo analisar a dinâmica do coletivo eco-cultural Casa Ecoativa, no caráter ecológico e produtivo - no quesito de potencializador da rede permacultural que expande na cidade de São Paulo. Para isso discorre sobre o histórico da Permacultura no Brasil e no mundo junto a suas maneiras de aplicação assim como um panorama do movimento urbanos com caráter eco-culturais. Paralelamente a isso, faz um estudo sobre como se deu a ocupação das margens da represa Billings interversões artísticas na cidade e sua influência para a mudança desta. Estas análises começam no macro, mostrando de um modo mais geral, e termina no espaço especifico das ocupações artísticas. Partindo desses dois pontos de vista sobre o mesmo objeto de estudo, chega-se a analise de projetos, a fim de estabelecer um estudo para uma proposta projetual buscando suprir as demandas dos viventes destas ocupações e otimizar sua produção.
À Sheila, Marco Aurélio, Francisco, Elisabeth, Maria Luiza, Marco Vinicius, Evandro, Jaime, Kassio, Rafael, Beatriz, Julia, Kassio, Leonardo, Jailson, Melissa, Andressa, Arianne, entre tantos outros. Emaranhado de nomes que formam a rede emotiva responsável pelo meu sustento físico e afetivo durante esses anos. A todos os coletivos aos quais me conectei (principalmente ao Coletivo P’atuá) que me ensinaram que processos de base coletiva tem tanto ou mais força que os individuais. A todos os habitantes universais que caminham no passado, presente e futuro da minha jornada, na busca pela abundância dos meios.
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Palavras-chave: Coletivos urbanos, rede permacultural, bioconstrução, bambu
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Lista de Figuras Figura 01
Figura 02
Figura 03
Figura 19
Figura 20
Figura 21
12 princípios base da permacultura
Tabela de técnicas e materiais de bioconstrução
Processo de construção da bacia de evapotranspiração
Problemas e Potencialidades Macro
Flyer de divulgação (Eixo Cultural da Ilha do Bororé)
Eixo permacultural da cidade de São Paulo
Figura 04
Figura 05
Figura 06
Figura 22
Figura 23
Figura 24
Crescimento do bambu entouceirado
Crescimento do bambu alastrante
Restaurante Humo, em Tulum (México)
Atividade educativa de plantio
Perspectiva da intervenção
Intervenções macro
Figura 07
Figura 08
Figura 09
Figura 25
Figura 26
Figura 27
Casa na Árvore (Colômbia)
Processo de construção da bacia de evapotranspiração
Preparação de massa para taipa de mão
Rota ecoturística da represa Billings
Implantação pelo térreo
Implantação pelo térreo com malha flor da vida
Figura 10
Figura 11
Figura 12
Figura 28
Figura 29
Figura 30
Reconhecimento do território (Quebrada Sustentável)
Sítio Saramandala
Centro de Yoga (México)
Mirante da figueira
Anfiteatro
Loja de produtos Ecoativa
Figura 13
Figura 14
Figura 15
Figura 31
Figura 32
Figura 33
Crescimento da mancha urbana em São Paulo
Mapa com a várzea da represa Billings (Capela do Socorro destacada)
Situação com o terreno da Casa Ecoativa destacada
Comedoria
Oficina de experimentações
Deck
Figura 16
Figura 17
Figura 18
Figura 34
Ilha do Bororé
Parque Municipal do Bororé
Mapa com os pontos e linhas de ônibus
Corte A-A e B-B
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Sumário
4.1.4
C ur so de A profun dam en t o em Bam b u – Gr up o
63
Saraman dal a
4.1.5
C onstr u ção de dom o de bam b u na A l dei a O utro
66
M un do
1 . I N T RO DUÇÃO 2 . MOV I MENTO R EG ENERATIVO:
10 16
2. 1 Perm ac ul t ura c om o c on c ei t o
2. 2 Re de Permap eri fa
28
2. 3 Os c ol e ti vos urbanos
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3 . BA MB U C O MO SO LUÇÃO C O N ST RUTIVA 3. 1 Bi o c onstr uç ão c omo c o nc ei t o
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36
3. 2 B i o c onstr uç ão e seus m at er i ai s
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3. 2. 1 O d e ao B am b u
42
3. 2. 2 M o d o s Po ssí vei s
45
4 . P RO C ESSO DE INDIVIDUAÇÃO E SEUS D E S D O B RAMENTOS
4. 1 I ndi vi duaç ão bi o c onstr uí d a
4. 1. 1
C u r so d e B i o c o nstr u ç ã o e i n tro du ç ã o à
p er macu l tu ra – Gr u p o Sarama n da l a – Sa ra p uí , SP
4. 1. 2 M u ti rão d e Per mac u l tura – Re de Pe r ma p e r i f a
4. 1. 3 C u r so d e D e si g n em Pe r ma c ul t ura ( PD C) :
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C onstr u ção do C en tro de Yo ga
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5 . TE RRI TÓRI O: EN T RE M ARG EN S 5. 1 Ocu p a ç ã o
72
5. 2 C ro n o l o g i a d o s a sp e c t o s fo rm a d o re s d a
o cu p a ç ã o d a re g i ã o q u e c o m p re e n d e a vá r ze a
d a re p re sa B i l l i n g s.
5 . 3 . 1
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4.1.6
78
Graj aú
5 . 3 . 2 Il ha do B ororé
5 . 3 . 3 Le gi sl ação
6 . CEN T RO EC O C U LT U RAL CA SA EC OAT I VA
6. 1 O c o l e t i vo
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81 85
88 90
6 . 1 . 1 Probl emas e Pot en ci al i dade s
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6 . 1 . 2 A ç õ e s cul t urai s
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6 . 1 . 3 Re de Per macul t ural : São Paul o
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6. 2 Pro p o st a d e I nt e r ve n ç ã o
6 . 2 . 1
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In t er v en ç õ e s M acro
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6 . 2 . 2 In t er v en ç õ e s M i cro
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6 . 2 . 3 Espaç os c onstr uí dos c ol e ti vam en t e
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7 . C O N S I DERAÇ ÕES F I N AI S
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8 . BI BLI O G RAF I A
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C asa d a C i d ad e + Per masam pa
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Introdução
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INTRODUÇÃO
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INTRODUÇÃO
Introdução A pesquisa teve como premissa a compressão de conceitos como Permacultura e Bioconstrução, sua distribuição em rede na cidade de São Paulo e o desdobramento e desafios de sua aplicação no contexto urbano. Por meio da análise do coletivo Casa Ecoativa, localizado na zona sul da cidade (mais especificamente na Ilha do Bororé), pude compreender como essas ações locais transformam o contexto no que diz respeito à sustentabilidade no âmbito social, construtivo e econômico. Do século XIX ao XXI, a área central paulistana passou por uma série de transformações urbanas que contribuíram com um processo de segregação espacial. O alto crescimento em um curto período de tempo deslocou boa parte da população para as áreas de borda da cidade, mas as obras de infraestrutura foram mantidas na área central. Em meio a isso, comunidades com inúmeros problemas de saneamento básico foram criadas tanto na periferia da cidade quanto em alguns espaços residuais na área central, ocupando muitas vezes áreas de preservação ambiental ou de alto risco por não terem para onde ir. Esse declarado descaso infraestrutural com as zonas periféricas da cidade geraram tanto pontos de isolamento como de transformações que foram em grande parte guiadas pelo crescente movimento dos coletivos urbanos. Com enfoque cultural e ambiental trabalhados em rede, encontraram junto ao pensamento permacultural a possibilidade de ações de planejamento sustentável, democrático e economicamente viável na busca por uma maior autonomia em relação ao sistema vigente. Nesse sentido, o objetivo do presente trabalho é verificar, através de estudo de caso e pesquisa teórica, como esses conceitos são aplicados pelos coletivos urbanos periféricos - como
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“O objetivo é o de criar um sistema de sentido ecológico e economicamente viável, que forneça para as suas próprias necessidades, que não explore ou polua, e, portanto, sustentável a longo prazo”. “A permacultura usa a qualidade inerente das plantas e animais combinados com as características naturais do terreno e estruturas para produzir um sistema de suporte de vida para cidade ou campo, usando a mais pequena área possível praticável.” Bill Mollison
é o caso da rede Permaperifa, e mais especificamente qual é sua aplicação no coletivo Casa Ecoativa, afim de compreender quais tipos de intervenções contribuiriam com as atividades realizadas por esse movimento crescente. O trabalho é subdividido por 7 capítulos: Introdução; Movimento Regenerativo: (nós) em foco; Bambu como solução construtiva; Processo de individuação e seus desdobramentos; Território: entre margens; Centro Ecocultural Casa Ecoativa; Considerações finais. O segundo capítulo aborda as noções téoricas e práticas da Permacultura, sua lógica sistêmica de planejamento projetual sustentável e sua inserção dentro da nossa realidade urbana por meio de ações coletivas em rede, como é o caso do Permaperifa. O terceiro capítulo introduz o conceito de bioconstrução e suas aplicações materiais possíveis com foco na utilização do bambu como elemento construtivo sustentável, resistente e
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INTRODUÇÃO
flexível (tanto pela sua materialidade quando nos seus diferentes modos de uso). O quarto capítulo sintetiza o conceito de individuação do psicólogo Carl Jung, traçando um paralelo entre o meu processo natural de construção (e entendimento do eu como parte indissociável do que me cerca) e da bioconstrução como processo construtivo que caminha sob a mesma lógica. Isto é, a relação produtiva e não apartada entre o ser humano e a natureza. O quinto capítulo aborda os aspectos formadores da ocupação nas margens da Represa Billings desde seu represamento em 1927, considerando fatores ambientais e sociais sob a ótica de um panorama cronológico com as transformações territoriais que ocorreram até os dias de hoje. Também coloca uma lente de aumento sobre a ocupação do Grajaú e da Ilha do Bororé para a compreensão dos contrastes espaciais gerados pelo represamento da Billings somado a fatores históricos. O sexto capítulo coloca uma lente de aumento sobre a ocupação do Grajaú e da Ilha do Bororé, contrastando os dois territórios para a compreensão dos contrastes de ocupação gerados pelo represamento da Billings somado a fatores históricos. Por fim, o sétimo capitulo discorre sobre a intervenção projetual no terreno que já é base do coletivo Ecoativa. Nele busco justificar a criação de uma rota ecológica para a represa com o posicionamento de marcos urbanos em pontos chave, relacionando minhas decisões projetuais às pré-existências de fluxo e de usos. A justificativa para a pesquisa é a necessidade de nos aprofundarmos na compreensão das dinâmicas, espaços e ati-
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INTRODUÇÃO
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vidades criadas por esses grupos que fazem parte do movimento cada vez mais efervescente, cultural e ambiental na cidade de São Paulo. Por meio dos capítulos, podemos estabelecer conexões entre as ações coletivas, a formação do território e a crescente busca por resoluções sustentáveis em níveis sociais, ambientais e econômicos.sa realidade urbana por meio de ações coletivas em rede, como é o caso do Permaperifa.
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Movimento Regenerativo
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Movimento Regenerativo: A PERMACULTURA COMO C O N C EITO
culturais, produtivas e ambientais. Em seu livro, trouxe 12 con-
ceitos base para que essas ações tivessem estrutura suficiente, para de fato se tornarem um desenho sistêmico e ecológico em
diferentes camadas (não reduzindo assim a abrangência inicial
O conceito de permacultura no mundo foi concebido em meados dos anos 70 pelos ecologistas australianos Bill Mollison e David Holmgren. Inicialmente, surgiu como um método de agricultura permanente que passou para a expansão conceitual e territorial da noção de “cultura permanente” pelo mundo. Nos dias de hoje, se tornou um sistema de design conectado à criação de assentamentos humanos ecológicos, socialmente justos e economicamente viáveis para a construção de uma maneira de ver o mundo cíclica e sustentável (pautado por técnicas e preceitos éticos específicos). A ideia de um sistema regenerativo que trabalha com o meio (e não contra ele) se expandiu da Austrália e para o mundo. Levantou discussões e práticas sobre a regeneração dos sistemas em diferentes âmbitos para diferentes contextos, no anseio de encontrar soluções possíveis para uma realidade que está no seu ápice de desgaste (com clara tendência ao colapso do sistema vigente, caso a humanidade não encontre uma mudança significativa na maneira que sustenta suas ações). Para acompanhar as transformações pelas quais a permacultura passou no decorrer dos anos, Holmgren escreveu em 2002 o livro Permacultura: princípios e caminhos além da sustentabilidade - um olhar mais aprofundado sobre como pode-
do termo).
PRINCÍPIO 01: Observe e interaja “Tomando tempo para nos relacionarmos com a natureza, podemos desenhar soluções que caibam junto à particularidade das situações.” David Holmgren
O primeiro princípio tem como foco principal a observação cuidadosa da natureza antes da ação de intervenção, possibilitando a compreensão da totalidade dos elementos do sistema em que estamos trabalhando. As tentativas de entender e realmente se envolver com a situação que enfrentamos deve, naturalmente, conduzir a uma reflexão profunda que nos permita oferecer uma resposta adequada.
PRINCÍPIO 02: Capte e Armazene Energia “Desenvolva sistemas que coletam recursos abundantes, eles podem ser úteis em tempos de necessidade.” David Holmgren
riam se estruturar as ações projetuais, com base em princípios ecológicos que se estendem a diversas questões socioespaciais,
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O movimento atual por uma arquitetura “verde” e susten-
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tável trabalha com sistemas para captura de recursos abundantes como sol e água, afim de utilizá-los quando necessário. No entanto, muitas vezes se esquece que outros elementos também abundantes podem ser utilizados tanto na constituição material da obra quanto de modo a auxiliar no processo de captura energética (como é o caso da terra para construção civil ou mesmo de dejetos orgânicos para a produção de gás). Todos esses aspectos de armazenamento entram dentro do que seria um espaço verdadeiramente ecológico.
PRINCÍPIO 03: Obtenha um Rendimento “Certifique-se que a recompensa pelo trabalho que está fazendo seja realmente útil”. David Holmgren
É necessário que as trocas de trabalho (sejam elas alimentares, construtivas, energéticas, em escala, entre outras) garantam um sustento imediato dos indivíduos que estão se propondo a realizá-las. A sustentabilidade deve também deve ser pensada economicamente, afim de garantir uma continuação cíclica de trabalho e saúde dos indivíduos dentro do sistema permacultural.
PRINCÍPIO 04: Aplique a autorregulação e aceite o feedback “Precisamos desencorajar atividades inapropriadas
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para garantir que os sistemas funcionem bem.” David Holmgren
Para a manutenção dos sistemas globais (como o da camada de ozônio que possui a capacidade de filtragem da radiação ultravioleta) precisamos compreender que o feedback negativo demora algum tempo para emergir. Por isso, é necessário que ações e atividades inapropriadas que fujam da lógica de vida para um planeta cada vez mais habitável sejam desencorajadas. Na arquitetura, é comum não pensarmos o projeto com base na autorregulação natural. Construímos dentro de uma lógica de curto prazo, o que contribui com a geração de resíduos que só irão criar feedback negativo em algumas gerações. Esse ato de não construir com a lógica cíclica da vida afasta o ser humano do meio natural, criando abismos muitas vezes irreconhecíveis.
PRINCÍPIO 05: Use e Valorize Fontes Renováveis “Utilize da melhor maneira possível a abundância da natureza para reduzir o comportamento consumista e a dependência em recursos não-renováveis.” David Holmgren
Vivemos uma etapa avançada do desenvolvimento industrial e da lógica capitalista, essa sociedade de base consumista, se sustenta pela criação e venda de bens de consumo. Para haver a manutenção da lógica de mercado, a produção frenética é todo tempo atualizada garantindo que o consumidor continue seduzido, esse excesso de produção ultrapassa muitas vezes a procura
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gerando desperdícios e investimentos em tecnologias não renováveis. Essas ações em escala macro contribuem com inúmeros processos que não se sustentam socialmente nem ambientalmente, criando bolhas de dependência. Utilizar a abundância de recursos humanos e materiais possibilita um caminho inverso a dependência mercadológica. Estimulando processos autônomos, de busca pela resiliência dos meios naturais e humanos.
PRINCÍPIO 06: Não produza resíduos “Quando utilizamos todos os recursos disponíveis, nada precisa ser descartado.” David Holmgren
A palavra lixo significa, segundo o dicionário Aurélio, “qualquer material sem valor ou utilidade, ou detrito oriundo de trabalhos domésticos, industriais, etc, que se joga fora”. A noção de que existem recursos dispensáveis ao homem gera toneladas de materiais literalmente dispensáveis que contribuem para o colapso do sistema natural da vida. Se soubéssemos aproveitar todos os recursos disponíveis, conseguiríamos reaplicar todos esses elementos e gerar ainda mais energia produtiva.
PRINCÍPIO 07: Projete desde os padrões aos detalhes “Dando um passo para trás, conseguimos observar padrões da natureza e da sociedade. Essa ação pode funcionar como a espinha dorsal dos nossos projetos,
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incluindo detalhes à medida que avançamos.” David Holmgren
Quando analisamos os padrões naturais existentes no meio que nos circunda, conseguimos perceber lógicas projetuais implícitas que já funcionam muito bem e podem nos auxiliar na construção projetual. A arquitetura biomimética, por exemplo, busca trazer essa observação para o processo criativo do projeto apoiando sua forma e parâmetros de eficiência em padrões geométricos e matemáticos presentes na natureza. Isso garante que os mecanismos utilizados funcionem bem.
PRINCÍPIO 08: Integre, não segregue “Posicionando as coisas certas no lugar certo, uma relação é desenvolvida entre elas criando um apoio mútuo.” David Holmgren
O sistema completo com suas interações sempre terá mais força de ação do que ele separado por partes. Nesse princípio, compreendemos que o trabalho coletivo possui mais energia como sistema do que ações individuais. Esse fortalecimento de laços garante resultados mais completos e complexos. Quando transferimos essa ideia para o projeto arquitetônico, percebemos que a própria noção de arquitetar espaços construídos precisa considerar vários aspectos de um contexto (seja ele de caraterística tectônica ou mental) na busca por um
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resultante físico que caiba ao lugar para qual foi pensado. A ação projetual precisa da noção do múltiplo para uma produção consistente quando isso se soma e interage a outras áreas do conhecimento como geografia, biologia, ciências sociais entre outros. Há um ganho significativo no que diz respeito ao seu nível de complexidade, gerando espaços verdadeiramente habitáveis do ponto de vista da escala humana.
PRINCÍPIO 09: Use soluções pequenas e lentas “Sistemas pequenos e lentos são mais fáceis de manter do que os maiores, utilizando melhor os recursos locais e produzindo resultados mais sustentáveis.” David Holmgren
Quanto maior o sistema, maior será a manutenção necessária para seu funcionamento. O resultado disso são toneladas de energia, materiais e recursos desperdiçados na tentativa de preservar o sistema da deterioração. Facilitando esses processos, podemos projetar espaços que necessitam de menor gasto de energia, podendo nos concentrar em outros esforços.
“A diversidade reduz a vulnerabilidade de uma variedade de ameaças tirando vantagem da natureza única do ambiente em questão.” David Holmgren
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A homogeneidade de pensamento ou de ação gera sistemas enfraquecidos por falta de peculiaridades que somadas criam tensionamentos apoiadores da vida. Um exemplo disso é a nossa grande capacidade de resiliência como espécie, que foi a grande responsável pela perpetuação humana até os dias de hoje (o que não seria possível se nossa genética não fosse diversa e adaptável). A falta de diversidade pode aparecer dentro da lógica arquitetônica de diversas maneiras, que incluem a homogeneidade de estilos vigentes que dependem da utilização de alguns (se não um tipo de) materiais já padronizados - como é o caso do concreto na arquitetura atual. A falta de abertura para o diverso nos aprisiona a estilismos, criando vícios projetuais que não caminham na mesma velocidade que as transformações humanas.
PRINCÍPIO 11: Use as bordas e valorize o marginal “A interface entre as coisas é onde os eventos mais interessantes acontecem. Esses são normalmente os elementos mais valiosos, diversificados e produtivos do sistema.”
PRINCÍPIO 10: Use e valorize a diversidade
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David Holmgren
A borda dos sistemas ou meios é onde os eventos mais espontâneos e diversos acontecem. Por exemplo, o espaço intersticial que permeia o ponto entre limites e cria um estado de tensionamento constante, dando origem a ações criativas e inusitadas. É nesse espaço intermediário de choque que podemos observar soluções diversificadas para problemas cotidianos, que por não
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estarem expostos ao contraste passam despercebidos aos nossos olhos. Na cidade, essas áreas de interesse se localizam nas áreas periféricas que em boa parte são desgastadas pela falta de investimento público. Também são espaços de ascensão de movimentos coletivos no âmbito cultural, educacional, ambiental e artístico (como é o caso dos coletivos urbanos instalados na região do Grajaú ou mesmo a rede Permaperifa). Pensar a borda como a possibilidade de trabalhar recursos abundantes ainda presentes nessas áreas é valorizar a diversidade urbana e contribuir para criar novas formas de solucionar problemas.
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significativas na maneira de conceber projetos intervencionista possibilitando a criação de ambientes mais saudáveis.
PRINCÍPIO 12: Use criativamente e responda às mudanças “Podemos ter um impacto positivo em mudanças inevitáveis se observamos cuidadosamente e então intervirmos no momento certo.” David Holmgren
Os sistemas vivos passam por transformações constantemente e possuem uma lógica complexa com muitas interrelações. Uma leitura precipitada, pode reduzir esses sistemas criando intervenções pouco eficazes, que não compreendem a complexidade dos padrões de transformação. Os projetos arquitetônicos muitas vezes são pensados com pouca aproximação e compreensão da situação local, é costumeiro observarmos intervenções que não integram lógicas básicas do entrono dentro de suas propostas projetuais. Utilizar conscientemente nossa capacidade de observação pode produzir mudanças
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Figura 1 – 12 princípios base de permacultura Fonte: Permacultureprincipies.com
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REDE PERMAPERIFA
A Rede Permaperifa é uma organização que surge a partir da união de vários coletivos da periferia de São Paulo. Para co-criarem ações coletivas na cidade, resolveram se unir na intenção de trocar experiências e estratégias para promover: alimentação saudável, construção ecológica e novos meios possíveis de sustentabilidade (na urgência social e ambiental das periferias de regenerar os espaços naturais e as estruturas humanas). A união de coletivos criou um fórum autônomo e permanente de parcerias, diálogo e práticas solidárias. Por meio de mutirões itinerantes, esse fórum é responsável pela implementação de metodologias e tecnologias ecológicas na periferia de São Paulo. Os coletivos que estruturam a Rede Permaperifa possuem um histórico de múltiplas frentes ligadas à discussão ambiental no Brasil. O trabalho realizado desde os anos 90 pela campanha da Agenda 21 parece ter estruturado espaços mínimos de contato da pauta sobre sustentabilidade nas grandes metrópoles brasileiras, consequentemente abrindo discussão para grupos organizados na periferia. No início do século XXI, o conceito de permacultura recém-chegado no Brasil por intercambistas australianos trilha essa mesma caminhada, primeiro atingindo grupos mais restritos nas áreas centrais da cidade. Depois de algum tempo, chegam nas periferias através dos projetos de educação ambiental, com forte influência do movimento agroecológico que sempre atuou em paralelo no campo pela popularização da pauta ambiental e pela luta por alimentos sem agrotóxicos a preços populares.
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A Rede Permaperifa reflete também um movimento de descontentamento da juventude com as estruturas vigentes, este também presente nos protestos de 2013. Também reflete a necessidade de construir novas estruturas para a gestão política dos bairros e por fim das cidades. Assim, a chegada da permacultura na periferia cria um território existencial para esse sentimento de indignação, canalizando esta revolta numa campanha pró-ativa de gerar de forma autônoma a qualidade de vida. Esta a partir da regeneração do ecossistema do entorno, do cultivo de alimentos agroecológicos, construções de casas ecológicas, manejo da água e produção de energia limpa. Neste cenário começaram a se estruturar os primeiros coletivos da permacultura na periferia que possuíam como característica marcante: a busca por horizontalidade estrutural; a autonomia; a coerência entre o discurso e a prática; o zelo ao espaço das crianças; o zelo ao espaço das mulheres; a capacidade de dialogar com toda a diversidade de públicos e credos que habitam a cidade; a não dependência de patrocínio ou partidos políticos para seu funcionamento; entre outros questionamentos cotidianos. Os encontros se tornaram frequentes, ocorrendo em diversos centros de ação coletiva na periferia da cidade, como Art Horta (ZN e ZO) e Casa Ecoativa (ZS). Colaboram, assim, com a ação pratica e teórica pela regeneração dos espaços de borda da cidade, fortalecendo os grupos individualmente no anseio da manutenção de uma rede consistente que compreenda a urgência da pauta ambiental e social nas periferias metropolitanas.
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COLETIVOS URBANOS Foi na década de 90, no auge do neoliberalismo globalizado, que surgiram em diferentes partes do mundo grupos de pessoas chamados coletivos. Os coletivos se organizam para expor a necessidade da valorização da cultura de questões sócio-ambientais e a insatisfação relacionada às políticas públicas. No geral, coletivos objetivam criar uma compreensão sobre as formas e forças do mundo, permitem uma criação (material e imaterial) sobre um determinado vértice da condição da vida social. “Se os bens públicos oferecidos pelo Estado diminuem ou se transformam em mero instrumento para a acumulação privada (como vem acontecendo com a educação), e se o Estado
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autoritário do território. Não por acaso, o movimento se torna muito presente nos territórios de borda/periféricos, onde o descaso e abandono público delatam esses contrastes urbanos. A região que margeia a represa Billings possui mais de 69 coletivos, segundo o último mapeamento feito pelo coletivo Periferia em Movimento. Esse coletivo trabalha justamente na articulação desses grupos que se localizam nas bordas da cidade. O trabalho que os grupos desenvolvem na região valoriza, estimula e festeja as particularidades culturais locais por meio de atividades artísticas, sócio ambientais, educacionais (entre outras) junto à população local de todas as idades. Garantem coletivamente o direito à cidade que o poder público não fornece ao que está à margem do que é considerado centralidade. “O direito à cidade não é um direito individual exclusivo, mas
deixa de oferece-los, então só há uma resposta possível, que
um direito coletivo concentrado. [...] O direito à cidade deve
é as populações se auto-organizarem para oferecerem seus
ser entendido não como um direito ao que já existe, mas como
próprios comuns.”
um direito de reconstruir e recriar a cidade como um corpo
(Harvey, 2014, p.167)
político socialista com uma imagem totalmente distinta: que
Esses grupos visam a qualidade da relação entre os participantes, normalmente organizada de maneira horizontal. As funções são dadas pela compreensão das diferenças e habilidades de cada um. A partir desse modelo de organização, os coletivos estão pensando criticamente o espaço urbano, questionando as normas que regram condutas individuais e coletivas, rebatendo os preceitos individualistas e violentos do neoliberalismo. Em uma cidade com tantas contradições como São Paulo, o movimento dos coletivos urbanos ganha corpo, trabalhando como uma rede crítica que questiona certas posturas de domínio
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erradique a pobreza e a desigualdade social e cure as feridas da desastrosa degradação ambiental. Para que isso aconteça, a produção das formas destrutivas de urbanização que facilitam a eterna acumulação de capital deve ser interrompida.” (HARVEY, David; Cidades Rebeldes pág. 246)
Dentro desse contexto de abandono público, a sensação de desencanto demonstra que podemos criar novos tipos de relações sociais que fujam da ideia de incapacidade de transformação perante o modo operante vigente, esse aparente mal-estar muitas
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vezes pode ter o efeito desencadeador de mudanças, que irá permitir que a população descontente não aceite mais o que lhe é imposto e observe os pontos de abundancia dentro de uma ideia de território mais ampla, percebendo o poder da coletividade. No momento em que isso ocorre, as pessoas percebem sua força e se permitem criar maneiras possíveis de vivenciar o espaço urbano com base em recursos já existentes.
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talistas e grupos/coletivos atuando de forma política e ativista, numa situação em que a arte e o ambientalismo vem se politizando cada vez mais. Dentro da lógica ativista, os processos de diálogo e de vivências resultam em ações em prol da mudança da realidade, mudanças sociais e macro políticas, o que implica também em um maior compromisso para com essas mudanças.
“[...] há um afeto que vocês devem saber guardar sempre, porque é o motor de qualquer crítica. Trata-se do profundo sentimento de mal estar e desencanto. [...] É a angústia do desencanto que nos une, que faz com que o mesmo sentimento apareça em Túnis e São Paulo, Cairo e Nova York.” (Safatle; Amar uma ideia, 2012: Pg.51)
Uma pessoa descontente e consequentemente com desejo de mudança não significa nada em relação à uma sociedade inteira. Mas quanto este sentimento passa a ser compartilhado por uma grande parcela de indivíduos, encontramos o desejo coletivo que gera e possibilita a vontade de mudança. “Uma fagulha pode incendiar uma pradaria” (TUNG;Mao Tse por VAINER,Carlos; Cidades Rebeldes; Pg.64)
É através de intervenções diretas que o ativismo, seja ele no âmbito artístico, social ou ambiental, abre espaço para a crítica, interação e levantamento de questões, apontando problemas a serem repensados criticamente pelo coletivo Vemos a cada vez um número maior de artistas, ambien-
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Bambu como solução construtiva
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Bambu como solução construtiva BIOCONTRUÇÃO COMO CONCEITO tetura vernacular mundial, algumas delas com centenas de anos de história e experiência, tendo como característica a preferência por materiais do local, como a terra, diminuindo gastos com fabricação e transporte e construindo habitações com custo reduzido e que oferecem excelente conforto térmico.” (SOARES, 1998)
Como o pensamento permacultural sugestiona, para um movimento verdadeiramente ecológico é necessário que observemos o meio ambiente e seus padrões de forma sistêmica e criemos espaços ambientalmente, economicamente e socialmente saudáveis. A bioconstrução como modo possível de composição do espaço físico possui a mesma lógica: tem como premissa a preocupação ecológica da concepção até a ocupação. Combina técnicas milenares com inovação tecnológica, garantindo a sustentabilidade não só do processo construtivo como também do período pós ocupação. O projeto bioconstruído tem como ponto de partida a avaliação local da obra - focando tanto em recursos ambientais como curso d’água, materiais construtivos disponíveis, topografia e outros elementos diversos quanto em recursos humanos. O termo que também é conhecido como bioarquitetura vem sendo utilizado na Alemanha desde os anos 70 e possui uma abordagem transdisciplinar da arquitetura que a integra ao meio
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de maneira mimética. Ressignificando a noção de construção, a bioconstrução busca trabalhar com a natureza local não contra ela. “A bioconstrução define-se como a construção que
“O conceito de bioconstrução engloba diversas técnicas da arqui-
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traça estratégias as quais visam o menor impacto ambiental ou impacto positivo, através de iniciativas sustentáveis, fazendo uso (preferencialmente) de materiais naturais e/ou locais. Deste modo, busca desde o planejamento, execução e utilização, o máximo aproveitamento dos recursos disponíveis com o mínimo impacto. “ (IPOEMA, 2017, web).
Apesar da utilização do termo bioarquitetura ser relativamente recente, é necessário ressaltar que ele nada se diferencia da noção de arquitetura tradicional no que diz respeito à produção de espaços salubres que potencializem o aproveitamento de agentes externos naturais (e consequentemente reduzem o consumo interno de recursos internos artificiais, considerando sempre como foco principal a perspectiva daqueles que irão tomar o espaço construído como habitat). [...] é muito importante que o profissional da área se reconheça e seja reconhecido como arquiteto, dado que não existe uma outra e nova profissão chamada bioarquitetura. O objetivo de tratar sobre o tema do impacto da construção civil pelo foco do projeto é para evoluir a consciência da sociedade a este respeito e não de dividir (polarizar) os profissionais deste meio em dois grupos: os “bios” e os “não-bios”, se criarmos
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um novo nome para este exercício profissional, corremos este risco.
que o precederam; por mais que ele se esforce para
Tomaz Lotufo (2010, web)
ser original, a maior parte de seu trabalho existe em
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alguma tradição.”
Sendo assim, a bioarquitetura como proposta não pretende a criação de um novo profissional, mas sim a discussão permanente de uma arquitetura integrada ao ciclo da vida – focando, assim, em soluções práticas que se apoiam na capacidade de resiliência do mundo e das relações humanas para o desenvolvimento de tecnologias (e maneiras construtivas que irão auxiliar no processo regenerativo do planeta).
BIOCONTRUÇÃO E SEUS MATERIAIS A bioconstrução trabalha pela manutenção do ciclo natural da vida. Sua materialidade busca encontrar um equilíbrio entre a valorização de técnicas vernaculares, (que sempre utilizaram materiais abundantes na terra como taipa de pilão, taipa de mão, bambu, adobe entre outros) e novas tecnologias (como terra ensacada, sistema de viga ripada por compressão de bambu ou mesmo em alguns casos a utilização de materiais reciclados).
FATHY, Hassan (1980, p. 40-41)
Diante da enorme quantidade de técnicas possíveis, encontrei tabelas comparativas do arquiteto Francisco Lima, que por meio de sua experiência profissional sintetizou alguns exemplos de materiais e técnicas mais utilizados nos dias de hoje pela bioconstrução. Por meio das tabelas, podemos observar a grande variedade de materiais, técnicas e maneiras possíveis de utilizarmos elementos abundantes no planeta para a construção civil por meio de processos sustentáveis. O investimento tecnológico unido a modos construtivos tradicionais garantiria alternativas à padronização em diferentes aspectos da arquitetura atual, criando espaços mais interessantes do ponto de vista estético, ecológico, social e econômico.
“A arquitetura ainda é uma das artes mais tradicionais. Um trabalho de arquitetura é feito para ser utilizado, sua forma é em grande parte determinada pelos seus antecedentes [...] o arquiteto deveria respeitar a obra de seus antecessores e a sensibilidade das pessoas não usando sua arquitetura como um meio de propaganda pessoal. Na verdade, nenhum arquiteto pode deixar de utilizar o trabalho dos arquitetos
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Figura 2 – Tabela de técnicas e materiais de bioconstrução Fonte: Francisco Lima
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Figura 3 – Processo de construção da bacia de evapotranspiração Autor: Francisco Lima
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ODE AO BAMBU
[...] é muito importante que o profissional da área se reconheça e seja “Um homem pode acomodar-se em uma casa de bambu sob um teto de bambu, em uma cadeira de bambu a uma mesa de bambu, com um chapéu de bambu em sua cabeça e sandálias de bambu em seus pés. Ele pode, ao mesmo tempo, ter em uma das mãos uma tigela de bambu, na outra mão pauzinhos de bambu, e comer brotos de bambu. Quando ele terminar sua refeição, que foi cozida em fogo de bambu, a mesa pode ser lavada com um tecido de bambu, e ele pode abanar-se a si próprio com um leque de bambu, tirar uma siesta em uma cama de bambu, deitado sobre uma esteira de bambu, com sua cabeça repousando sobre um travesseiro de bambu. Seu filho pode repousar num berço de bambu, brincando com um brinquedo de bambu. Ao levantar-se
Bambu no mundo e no Brasil O bambu é um material ancestral que caminha com a humanidade. Utilizado como matéria prima base de diversos países asiáticos e alguns países da América Latina como Colômbia e Costa Rica, o seu uso democrático é garantido pela abundância com que é encontrado no meio ambiente e por possuir usos tão diversos e uma renovação tão rápida. Em muitos países, são conhecido nomes que remetem à abundância do material - como na Índia, que é chamado de “madeira dos pobres” ou na China, que usa o termo “amigo das pessoas”. “Historicamente o bambu tem acompanhado o ser humano, fornecendo alimento, abrigo, ferramentas, utensílios e uma infinidade de outros itens. Atualmente estima-se que contribua para a subsistência de mais de um bilhão de pessoas. Igualmente importante, ao lado dos usos tradicionais, tem sido o desenvolvimento de usos industriais do bambu.”
ele fumaria um cachimbo de bambu e, com uma caneta de bam-
(SASTRY,1999)
bu, escreveria em papel de bambu, ou transportaria suas coisas
Hoje vem se popularizando pelo crescente estimulo a tecnologias construtivas renováveis, visando a diminuição do uso de sistemas com tempo de renovação muito longo. A madeira, por exemplo, muitas vezes é feita de forma ilegal e predatória, provocando a destruição de matas nativas como a própria Floresta Amazônia que em menos de 50 anos teve quase 20% da sua cobertura florestal destruída.
numa cesta de bambu suspensa por uma vara de bambu, com um guarda-chuva de bambu sobre sua cabeça. Ele pode então fazer uma caminhada sobre uma ponte suspensa de bambu, beber água de uma concha de bambu, e coçar-se com uma raspadeira de bambu.” (GEIL, William Edgar, 1994, pg.268)
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“Durante décadas, para atender à demanda nas estruturas de madeira para coberturas, os principais centros de madeira serrada, localizados nas Regiões Sul e Sudeste,
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MODOS POSSÍVEIS
forneceram o pinho-do-paraná e a peroba-rosa, explorados nas florestas nativas dessas regiões. Com a exaustão dessas florestas, o suprimento de madeiras nativas passou a ser realizado, em parte, por países limítrofes, como o Paraguai, porém, de forma mais significativa, pela Região Amazônica” (FERREIRA,2003)
Houve um grande aumento do uso do bambu para a construção civil, o que levou mais de 30 países a estabelecerem normas para o material. Porém no Brasil, apesar de investigações iniciais, o bambu ainda não possui um registro próprio na Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). A inexistência de normativa é um obstáculo não só na aprovação de obras com o material como diminui a possibilidade de ensaios e experimentações que contribuiriam com o desenvolvimento de tecnologia em bambu no país. Mesmo com pouca ou nenhuma regulação, industrialmente o bambu está se tonando atrativo, como ocorreu com a cultura da plantação de eucalipto a algumas décadas. No entanto, apesar de algumas similaridades como o rápido crescimento, o bambu se contrapõe ao eucalipto em inúmeras questões. Por exemplo, a sua relação com a água (o bambu bombeia água e o eucalipto drena), a questão da biodiversidade animal e vegetal e outros pontos que favorecem o bambu como elemento sustentável e ecologicamente viável de grande leveza, flexibilidade e resistência.
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O bambu é uma gramínea que se desenvolve geralmente em clima tropical e possui crescimento extremamente rápido e cíclico. Algumas espécies crescem até um metro por dia até chegar em sua fase adulta, o que permite que se faça uma colheita anual sem que haja uma modificação estrutural na floresta de bambu (seja ela alastrante ou entouceirada). Por se perpetuar facilmente no meio ambiente e possuir lógicas de tratamentos e encaixes simples (conhecido como “aço vegetal”), possui uma diversidade grande de usos como: móveis e artesanatos, construção civil, painéis (forros, laminados, pisos), bioenergia, instrumentos musicais, etc. Ele se divide em dois grupos: alastrantes e entouceirantes. O primeiro grupo é o mais utilizado para a construção civil por ser mais resistente a esforços de compressão.
Agrupamento entouceirado: Colmos nascem próximos uns aos outros de forma concêntrica. No Brasil, espécies comuns são Dendrocalumos G. (Bambu Gigante) e Bambusa Vulgaris (Taquara). Agrupamento alastrantes: Suas varas nascem separadas, o que facilita na hora do manejo. No Brasil, espécies comuns são Phyllostachys edulis (Mosso) e Angustifolia Kunth (Guadua).
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Pelo seu modo constituinte, se comporta como uma bomba de armazenamento de água cujo funcionamento é dado pelos seus vasos comunicantes. Absorve importantes volumes de água que se alojam tanto no seu sistema rizomático como no seu caule. Assim, contribui com o enriquecimento dos solos, proporciona biodiversidade e a regulagem dos recursos hídricos. A escolha dos colmos para corte deve respeitar algumas regras para que a maturação do material esteja completa, garantindo que todas as suas propriedades mecânicas funcionem bem. Há diferentes tempos de maturação para diferentes usos.
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O tratamento
Figura 4 – Crescimento do bambu entouceirado Fonte: Escritório Bambu Carbono Zero
Figura 5 – Crescimento do bambu alastrante Fonte: Escritório Bambu Carbono Zero
O bambu apresenta problemas de durabilidade quando não submetido a tratamento por possuir quantidade significativa de amido, atraindo fungos e insetos que atrapalham a resistência do material. O processo de tratamento inverte o “gosto” do bambu, reduzindo a quantidade de amido que o torna mais interessante para os insetos. Os processos de tratamento se subdividem em tradicionais e químicos, dependendo da disponibilidade local de recursos. Hoje em dia o tratamento mais usual para bambu no mundo é o químico (realizado pela mistura de sais como ácido bórico e o borax). Devido a um maior interesse, já existem soluções prontas, relativamente baratas e fáceis de serem encontradas no mercado brasileiro e mundial. Alguns métodos tradicionais possíveis são de cura por maturação na mata, imersão em água salgada, ação do fogo ou mesmo por fumaça. Como ponto positivo, são métodos extremamente baratos ou sem custo algum, funcionando bem dentro da lógica local no qual se insere. No entanto, não possui ação significativa no tempo de durabilidade do material e perdem eficiência significativa se apartados de seu contexto, impossibilitando sua realização eficaz em maior escala. Os métodos químicos mais conhecidos de cura são por meio de produtos oleosos, oleossolúveis, hidrossolúveis, autoclave ou método Boucherie. Mais eficientes do ponto de vista da adaptabilidade a qualquer ambiente, aumentam a durabilidade enquanto impedem o ataque de insetos, sendo venenosos aos organismos xilófagos. Não são tóxicos aos homens e animais.
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No entanto, possuem custo e o produto precisa ser deslocado para a obra, o que em determinados casos é impossível pela distância ou dificuldade de acesso. Transformação Estima-se que na China (o país que mais utiliza bambu no mundo) existem mais de 4 mil modos de uso do material. Essas formas são tão diversas que seria impossível datarmos todas elas de uma só vez, por isso focarei no uso do bambu na construção civil, que aparece como elemento desde o aspecto estrutural da obra até os fechamentos, pisos e coberturas. É um material que se adapta a diferentes modos de transformação, podendo ser ripado, enquadrado ou mesmo utilizado na sua forma tubular original. Achei importante exemplificar algumas técnicas possíveis com imagens de obras já realizadas. Assim compreendemos como os diferentes modos de transformação do material são utilizados na composição de uma arquitetura predominantemente realizada em bambu.
O restaurante Humo (concluído em 2017 no
México) é quase todo constituído pelo material. Pila-
res duplos de bambu roliço se conectam à fundação
de concreto por esperas metálicas e sustentam a viga
Figura 6 – Restaurante Humo, em Tulum (México) Fonte: Arquitectura Mixta
de bambu ripado comprimido por braçadeiras – nova técnica que permite que a viga mantenha as caracte-
rísticas mecânicas do bambu (resistência à tração, flexão e torção, ao mesmo tempo sendo flexível) – servindo como base para a cobertura estruturada por
caibros de bambu cobertos por forro (realizado pela técnica de esteiras recoberto por telha de bambu).
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Figura 7 – Casa na Árvore (Colômbia) Fonte: Arquitectura Mixta
A Casa na Árvore (concluída em 2015 na Co-
lômbia) é acessada por uma rampa que está estrutu-
rada por arcos de bambu ripado e comprimido, estes ancorados na fundação de concreto. Os bambus roliços dispostos de modo axial à árvore também contri-
buem com a estruturação da rampa e da edificação, que possui todos os seus fechamentos em bambu, sejam eles em trama ou painéis ripados.
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Processo de individuação e seus desdobramentos INDIVIDUAÇÃO BIOCONTRUÍDA A jornada Carl Jung - o fundador da psicologia analítica e criador dos mais importantes conceitos psicológicos como arquétipo, inconsciente coletivo e personalidade introvertida e extrovertida - dedicou grande parte de seu estudo desenvolvendo o que ele chamou de processo de individuação. Apesar do nome evocar o termo individualismo, o processo que contrapõe o termo é o movimento humano que estimula o indivíduo a despertar o melhor em si alcançando assim o outro, saindo do isolamento e buscando uma vivência coletiva onde possa expressar as características mais interessantes de sua individualidade. “Esse contato mais profundo consigo mesmo logra-se através da jornada da individuação, entendida como um processo de crescimento e realização do si-mesmo, ou, nas próprias palavras de Jung: “... o processo pelo qual um ser torna-se um in-divíduo psicológico, isto é, uma unidade autônoma e indivisível, uma totalidade.” (Jung, 1953, apud Humbert, 1985, p. 116). “A individuação”, segundo escreve Jung, “é uma expressão do processo biológico – simples ou complexo, conforme o caso – pelo qual todo ser vivo se torna aquilo que estava destinado a se tornar desde o início” (Jung, CW 11, apud Stevens, 1993, p. 269).
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A leitura e compreensão do conceito junguiano de individuação me fez perceber que a lógica coletiva só é transformada quando individualmente conseguimos iniciar nossa jornada pessoal ao encontro daquilo que nos parece essencial. Esse retorno à origem se reflete em ações individuais mais conscientes que por sinergia encontram ideais coletivos para se apoiar, criando uma rede de pessoas que interagem e dão vazão às suas dúvidas e anseios propondo nossos arranjos sociais. Contar um pouco da minha experiência como permacultora e bioconstrutora nesse trabalho final de graduação é compreender a relação sistêmica entre meus percursos individuais e a busca coletiva por um mundo possível, pautado pela lógica sustentável do trabalho e das relações com base na abundância do planeta. Assim, também contribuir com a manutenção e geração de recursos que nos guiem gradualmente para uma maneira mais saudável de habitar, viver e experimentar o mundo. CURSO DE BIOCONSTRUÇÃO E INTRODUÇÃO À PERMACULTURA Grupo Saramandala – Sarapuí, SP Data: 3 à 7 de Dezembro de 2016
Local: Sítio Saramandala, Sarapuí - SP
Aprendizado pessoal Com a experiência desse curso (ministrado pelo arquiteto e permacultor Francisco Lima), comecei a adentrar no universo da permacultura - um sistema de planejamento na criação de espaços pensados por uma lógica cíclica e sustentável,
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utilizando tecnologia de matérias naturais para construir esses mesmos ambientes de maneira produtiva, ambientalmente e socialmente consciente. A participação física no canteiro de obra me vez vivenciar (e não só observar) a realização de técnicas construtivas como a do hiperadobe, bambu-a-pique e piso de terra. Também participei da construção de sistemas ecológicos, como a bacia de evapotranspiração. Assim captei todos os detalhes construtivos necessários para a realização de intervenções reais. A possibilidade de ganhar experiência e autonomia construtivas dentro de uma lógica cíclica e ambientalmente saudável me fizeram adentrar cada vez mais no universo da bioconstrução, me conectando a rede de grupos e coletivos que trabalham dentro dessa nova lógica possível. Principais atividades Permacultura em Foco: A observação minuciosa do espaço e da natureza que o cerca nos traz muitas soluções e ideias. Nesta atividade, Peter Webb trouxe sua visão da permacultura na paisagem para criar fluxos de movimentos, ni-
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Figura 8 – Processo de construção da bacia de evapotranspiração Fonte: Ricardo Almeida
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chos de produtividade, umidade, proteção e de produção para harmonizar com as áreas construídas. Bioconstrução: Dinâmica em grupos (ministrada pelo arquiteto Francisco Lima) para reflexão e diálogo sobre os conceitos, princípios e valores da bioconstrução. Palestra sobre contextualização e problematização da indústria da construção civil com apresentação do conceito de bioarquitetura e suas soluções sustentáveis, bem como os principais materiais naturais utilizados na bioconstrução. Atividade Biomimética: O arquiteto nos levou à observação da natureza através do desenho identificando estruturas, texturas, cores e relações. Os participantes foram convidados a identificar elementos na natureza pelo olhar e a traduzir em linguagem de desenho estes elementos, afinando a sensibilidade e criatividade e ampliando a conexão com a natureza. Parede de Bambu-a-Pique: Construção das paredes do corredor da Casa de Barro com bambu e terra, com utilização de garrafas e vidros para iluminação e beleza. Glauco Murta demonstrou e auxiliou como é feita a confecção da ossatura das paredes, criação de mandalas com garrafas de vidro, instalação de peças de vidro inteiras, preparo da argamassa e aplicação, trazendo insights, sanando dúvidas e fazendo conexões.
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Bacia de Evapotranspiração (BET): Instalação do sistema de tratamento das águas escuras da Casa de Barro (esgoto) com o sistema BET. Este sistema é uma alternativa ecológica e limpa para o tratamento das águas, utilizando entulhos, pedras, areia, terra e plantas. Reboco Natural: Mistura de massas com componentes 100% naturais e atóxicos para reboco das paredes internas da Casa de Barro. Aprendemos proporções, consistência, melhor forma de aplicação e acabamentos. Piso Natural de Terra: Instalação de um piso 100% natural com materiais locais e de alta resistência, durabilidade, beleza, baixo custo e mínimo impacto ambiental. MUTIRÃO DE PERMACULTURA - REDE PERMAPERIFA Data: 13 de fevereiro de 2017
Local: Quebrada Sustentável, São Miguel Paulista - SP
Aprendizado Pessoal Uma melhor compreensão do trabalho realizado pela rede Permaperifa, uma organização que surge a partir da união de vários coletivos de permacultura periférica. Surge da necessidade de trabalhar na cidade unidos em sintonia, afim de trocar experiências e estratégias para promover a permacultura na urgência social e ambiental de regenerar a natureza e as
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estruturas humanas (bem como regenerar as relações sociais desgastadas pela lógica competitiva das cidades). Principais Atividades Bioconstrução: Término da casa de ferramentas feita em Taipa - Mão. Produção Agroecológica: Manutenção da horta biodinâmica.
Figura 9 – Preparação de massa para taipa de mão Fonte: Helena Ruette
Sistemas ecológicos: Construção do sistema de tratamento de águas escuras VermiFiltro. CURSO DE DESIGN EM PERMACULTURA (PDC): CASA DA CIDADE + PERMASAMPA Data: 13 de março à 13 de maio de 2017
Local: Casa da Cidade (Vila Madalena) e Quebrada Sustentável (São Miguel Paulista)
Aprendizado Pessoal
Figura 10 – Reconhecimento do território (Quebrada Sustentável) Fonte: Helena Ruette
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Essa foi a quinta edição do PDC urbano promovido em parceria pelo coletivo Permasampa e pela Casa da Cidade. O PDC (Curso de Planejamento Permacultural) é reconhecido internacionalmente e busca capacitar os participantes a planejar territórios com mínimo impacto ambiental e social a partir da gestão sistêmica de recursos naturais energéticos, alimentícios
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e hídricos. A partir do curso, compreendi alguns conceitos base de permacultura urbana como redução dos impactos ambientais das cidades, resiliência e regeneração socioambiental no meio urbano, transição para a economia de baixo carbono, construção de políticas públicas e direito à cidade. Foram três semanas de imersão ao longo de três meses, com aulas à noite e atividades durante todo o sábado. O programa incluiu atividades práticas, visitas de campo e aplicação dos conceitos estudados no projeto de estudo de caso a ser definido. Desde 2015 foram realizadas cinco edições do curso. A primeira turma elaborou propostas de intervenções dentro da lógica permacultural para a própria Casa da Cidade e as seguintes realizaram projetos no Espaço Cultural Jardim Damasceno (Vila Brasilândia). A nossa turma focou as ações no espaço Quebrada Sustentável, no bairro São Miguel Paulista. Principais Atividades Foram inúmeras atividades teóricas e práticas, já que abordamos todos os pontos cruciais da permacultura, da bioconstrução, do saneamento ecológico e da produção agroecológica (focando na regeneração social, cultural e econômica de grupos e indivíduos). Também foram realizadas dinâmicas de grupo que enriqueceram nossa percepção de ação em rede, tão necessária para a produção sob a lógica de planejamento. Essa experiência culminou na apresentação de um plano permacultural para o espaço Quebrada Sustentável na zona leste de São Paulo.
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CURSO DE APROFUNDAMENTO EM BAMBU – GRUPO SARAMANDALA Data: 22 de julho à 31 de julho de 2017 Local: Sítio Saramandala – Sarapuí, SP
Aprendizado Pessoal O curso foi realizado pela comunidade Saramandala em parceria com o arquiteto bioconstrutor Jaime Penã, especializado em arquitetura com bambu. Foi muito importante para me aprofundar na construção com o material e conhecer melhor o espaço que foi criado a partir da vontade de se criar um ambiente autossuficiente, sustentável e regenerativo. Pude estar em contato íntimo com a natureza e seus processos. Nesse processo de aprofundamento, pude ter contato com a técnica em processo de experimentação de viga de bambu ripado compresso por braçadeiras. Assim compreendi melhor a maneira de concepção com base na geometria universal e desenvolvimento de obra do escritório de Jaime Peña (Arquitectura Mixta) que experimenta no canteiro por meio de protótipos em escala 1:1. Esse contato me permitiu transformar plasticamente a maneira que concebia meus projetos e interferiu significativamente na maneira como construí projetualmente meu trabalho final de graduação. Hoje em dia desenvolvo meu trabalho projetual no próprio escritório do grupo de Jaime. Passei a ver arquitetura como concatenação à ação física do aprendizado que pude ter de vivências, cursos e mutirões com a temática da bioconstrução e da permacultura.
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Principais Atividades Palestras: Benefícios da Bioconstrução (arquiteto Francisco Lima) e A arquitetura da Geometria Sagrada e Construindo com Bambu (arquiteto Jaime Peña). Bioconstrução macro: O porquê resgatar antigas formas de construção aliadas com tecnologias modernas; principais técnicas utilizadas; apresentação das estruturas bioconstruídas e permaculturais do Sítio Saramandala. Bambu: Tipos de bambu usados na construção; reconhecer as diferentes etapas de crescimento; usos das diferentes seções da planta; a relação do bambu com a água e o ar; como e quando colher o bambu; o bambu como uma alternativa sustentável à madeira para a construção e a indústria; múltiplos produtos e aplicações para a construção, limpeza, secagem, proteção e conservação do bambu; elementos conectores; dimensionamento de acordo com o uso; construção de estruturas provisórias; construção do domo de bambu. Figura 11 – Sítio Saramandala Autor: Helena Ruette
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Geometria sagrada: Desenho e aplicação da geometria sagrada para a arquitetura com bambu; círculos, esferas, elipses, espirais e elementos não verticais; elementos tecidos e fractais.
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CONSTRUÇÃO DE DOMO DE BAMBU NA ALDEIA OUTRO MUNDO
CONSTRUÇÃO DO CENTRO DE YOGA
Data: 07 de novembro à 04 de dezembro de 2017
Local: Tulum - México
Local: Aldeia Outro Mundo
Aprendizado Pessoal O espaço Aldeia Outro Mundo (no interior do município de Lagoinha/SP) é dedicado a eventos, cursos e vivências que relacionam o universo da música eletrônica trance à permacultura e bioconstrução. Há alguns anos, o espaço do sítio é transformado por meio de práticas permaculturais que são mantidas por voluntários que moram no espaço, alunos de cursos de bioconstrução e grupos frequentadores dos festivais eletrônicos. Fui convidada pelo escritório Arquitectura Mixta para participar da obra como voluntária, onde novamente pude participar ativamente dos processos construtivos no canteiro e compreender um pouco mais sobre a técnica do ripado de bambu. Nessa obra, passei por processos desafiadores como trabalhar com equipe reduzida, compreender que imprevistos são comuns quando trabalhamos com técnicas experimentais, mas que o conhecimento técnico sempre auxilia na tomada de decisões rápidas e eficientes. Principais Atividades Acompanhamento das atividades no canteiro de obra e apoio na distribuição das atividades em equipe.
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Data: 22 de julho à 31 de julho de 2017
Aprendizado Pessoal Obra realizada em Tulum (México) inspirada na casca paraboloide hiperbólico de Felix Candela, pela primeira vez realizado em bambu. Essa técnica, usualmente concebida em concreto armado, apresentou algumas dificuldades no que diz respeito às conexões e tensionamentos. No entanto, o fato de ser uma superfície regrada permitiu que com alguns conectores metálicos o bambu pudesse ser utilizado sem problemas, apresentando qualidades mecânicas similares ao original. Nesse momento, já participando como membro da equipe Arquitectura Mixta, pude vivenciar a técnica com ripamento de bambu em uma obra de escala superior a das anteriores e compreender melhor o desenvolvimento do trabalho com bioconstrução em um escritório de arquitetura. Já possuía experiência com gerenciamento de obras por um estágio anterior e reparei semelhanças entre os processos ao mesmo tempo que senti um envolvimento maior da equipe base do escritório no canteiro. Principais atividades Acompanhamento das atividades no canteiro de obra e apoio no gerenciamento de custos e materiais.
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Figura 12 – Centro de Yoga (México) Fonte: Arquitectura Mixta
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TERRITÓRIO: ENTRE MARGENS
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Território: Entre Margens “Aqui no Brasil, a população trabalhadora não consegue
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entrar na cidade formal. Ela está na periferia, é caracterizada por pessoas excluídas que, ao mesmo tempo, produzem pelas próprias mãos a sua cidade, muitas
Não podemos falar sobre os aspectos de ocupação das margens da represa Billings sem antes passarmos por uma breve análise histórica da urbanização acelerada que a cidade passou durante o século XX. “A cidade de São Paulo cresceu muito rapidamente, fazendo com que classes mais carentes se direcionassem para a periferia, já que áreas centrais se valorizavam, causando especulação imobiliária.” Até meados da década de 50, o Brasil era um país de população predominantemente rural. Nossas principais atividades econômicas estavam associadas à venda de produtos agrícolas como o café. A partir do processo de industrialização, houve um aumento do êxodo rural e em 1970 mais da metade dos brasileiros já se encontrava em áreas urbanas. Esse rápido crescimento gerou uma serie de consequências negativas, que junto à falta de planejamento urbano que acompanhasse essas transformações, culminou em reações que reiteraram ainda mais a desigualdade - como, por exemplo, o processo de favelização e violência urbana, e também questões de cunho ambiental como poluição e enchentes frequentes.
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vezes ilegal, sem transporte público, sem os equipamentos e serviços sociais essenciais, como escolas, museus universidades, saneamento, iluminação pública. É uma periferia de tradição escravista que não tem direito aos benefícios urbanos de uma coletividade e que é jogada para áreas ambientalmente frágeis, como áreas de proteção de mananciais, encostas. Esta população não cabe na cidade, ela não tem direito a uma cidade urbanizada e qualificada.” (MARICATO, Erminia 2013)
Perante essa problemática que aflige as maiores metrópoles do mundo, fica claro que existe a necessidade de compreendermos a cidade como um sistema social, político e ambiental. São Paulo também modifica completamente seu tecido urbano do século XIX ao XXI. A área central paulistana passou por uma série de transformações urbanas que contribuíram com um processo de segregação espacial, expulsando a população pobre e de cortiços das áreas centrais para a periferia. A postura higienista que buscava sanear ¨regiões deterioradas¨, contribuiu com essas leis e normas para esse novo ideal de cidade e também com um primeiro movimento de êxodo da população mais pobre para bairros periféricos. Em meio a isso, comunidades com inúmeros problemas de saneamento
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básico foram criadas tanto na periferia da cidade quanto em alguns espaços residuais na área central, ocupando muitas vezes áreas de preservação ambiental ou de alto risco por não terem para onde ir. “As intervenções urbanísticas na área central de São Paulo nos anos 1910, expulsando seus moradores e demolindo os cortiços para afastá-los do centro, foram outra forma do poder público enfrentar a questão das habitações insalubres. As obras viárias e o embelezamento de São Paulo serviram para sanear ¨regiões deterioradas¨, como o entorno da Sé.” (Rolnik, 1981)
Nesse início do século XX, a cidade já estava se expandindo para as áreas de várzea do rio Tietê e Tamanduateí. As primeiras indústrias começaram a se instalar na cidade e os bairros operários começaram a ser construídos ao longo desse percurso. Com essa rápida expansão, a infraestrutura de saneamento e energia vigente na época já não comportava mais a quantidade de habitantes. A ocupação da represa Billings caminha de certa forma junto a esse enredo. Em 1927, a represa foi construída para possibilitar a geração de energia elétrica em Cubatão na Baixada Santista por meio da utilização da usina de Henry Borden. A partir dos anos 50, começou a receber águas dos rios Tamanduateí, Tietê e Pinheiros. Já naquela época os rios eram contaminados com afluentes sanitários e industriais. Progressivamente, na década de 70, a represa Billings já apresentava sinais de alto grau de poluição.
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Figura 13 – Crescimento da mancha urbana em São Paulo Fonte: mapas isolados CeSAD-FAU USP In: Uemura, 2000
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CRONOLOGIA DOS ASPECTOS FORMADORES DA OCUPAÇÃO DA REGIÃO QUE COMPREENDE A VÁRZEA DA REPRESA BILLINGS. 1927 Foi construída a barragem da Billings. Inicialmente serviria como regularizadora do reservatório da Guarapiranga, que já havia sido represado em 1907 com a finalidade de regular o Rio Pinheiros. E, depois da concessão feita pela companhia Light & Power, para possibilitar a geração de energia elétrica em Cubatão na Baixada Santista, por meio da utilização da usina de Henry Borden. 1940-1960 Foi nesse período que a ocupação das áreas que permeiam a bacia da Represa Billings ganhou intensidade. Uma época de grandes transformações que contribuíram com a modificação da área. Década de 50 A partir da década de 50, as indústrias de base foram instaladas nas áreas de várzea. Também houve um grande movimento de migração da população do campo para as cidades, o que aumentou ainda mais o número de pessoas que iriam morar na RMSP e que não poderiam pagar por moradia na área central. O grande ABC paulista se torna pólo industrial ao mesmo tempo que a área da Represa se desvaloriza, pois em 1955
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ocorre uma interligação do esgoto da RMSP e a represa começa a receber águas dos rios Tamanduateí, Tietê e Pinheiros (naquela época, já contaminados com afluentes sanitários e industriais). Com a desvalorização e proximidade das indústrias, acaba atraindo moradores para a região, que se instalam nas áreas de várzea sem nenhuma infraestrutura. Villaça comenta sobre as transformações urbanas decorrentes da lógica rodoviarista e do movimento industrial: “a crescente motorização, o crescente aprimoramento das rodovias e o declínio das ferrovias, vêm afetando as direções da expansão urbana” e “ A indústria automobilística pode afetar o espaço urbano das metrópoles do país”. (Villaça, 2001 : p.101) Década de 70 Nos anos 70, a ocupação irregular continuou intensamente em meio à autoconstrução e arruamentos em áreas de risco. Os moradores compravam seus lotes de forma ilegal e por meio de longos financiamentos. A situação mudou um pouco na metade da década quando se tornou vigente a Lei de Proteção dos Mananciais e a legislação de zoneamento industrial, que contribuiu dificultando novas indústrias de se instalarem na região. Entretanto, não conteve a ocupação irregular em áreas de proteção e risco. Década de 90 aos dias de hoje No início dos anos 90, foi proibida a transferência de água dos outros rios para a represa, exceto em caso de inunda-
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ções na cidade de São Paulo. Apesar dos avanços em políticas ambientais, a ocupação irregular em áreas protegidas ou de risco continuaram junto ao descarte de dejetos e a falta de saneamento básico em diversos pontos que margeiam a represa. Isso atrapalhou não só a qualidade de vida daqueles que necessitam habitar a margem da Billings, como continuou com a degradação ambiental local já muito desgastada.
INSERÇÃO URBANA GRAJAÚ O bairro do Grajaú, localizado no extremo sul da cidade de São Paulo, é, segunda a prefeitura da capital, o maior de seus distritos com 84 bairros, 106 favelas e mais de 500 mil habitantes. A maior parte da população que se instalou na região veio trazida não só para fugir dos altíssimos aluguéis da região central, mas também para trabalharem no pólo industrial de Santo Amaro - que foi criado a partir dos ano 50, como pudemos observar no histórico de ocupação das áreas de várzeas da represa Billings. “Nas décadas de 50 e 60 o Estado de São Paulo viveu in-
tenso processo de expansão industrial, com importantes alterações no padrão de localização da indústria mais moderna e de maior porte. Na cidade de São Paulo, este processo teve como um de seus aspectos, a ampliação
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e a abundância de água e energia, contribuíram para atrair grande número de estabelecimentos industriais dos setores mais modernos da indústria de transformação. Estes se instalaram ao longo do canal de Jurubatuba, chegando até as proximidades do Largo do Socorro no qual o Grajaú se insere.” (http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/bibliotecas/bibliotecas_bairro/bibliotecas_m_z/malbatahan/index.php?p=5732, 2008)
A rápida transformação e ocupação territorial veio acompanhada de pouca infraestrutura e planejamento, acompanhando o padrão periférico de expansão urbana. Assim, fez com que muitos moradores se instalassem em áreas de risco junto a um movimento de autoconstrução (muitas vezes em lotes ilegais). O território Grajaú O distrito do Grajaú é administrado pela subprefeitura de Capela do Socorro e faz divisa com os distritos de Pedreira, Cidade Dutra e Parelheiros, além dos municípios São Bernardo do Campo e Diadema.
do parque industrial de Santo Amaro, que se consolida como um dos mais importantes pólos de emprego industrial da região metropolitana. A disponibilidade de áreas, as facilidades de transporte, particularmente com a construção do sistema de marginais do rio Pinheiros
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ILHA DO BORORÉ A Ilha do Bororé faz parte da Área de Proteção Ambiental Bororé-Colônia, criada pela lei 14.162/06. Possui inúmeras nascentes, córregos e ribeirões, contribuindo com os recursos hídricos que, segundo a Prefeitura de São Paulo, abastecem 30% da RMSP. Para acessar a Ilha é necessário atravessar a represa Billings por uma balsa ou por Parelheiros (através da avenida Paulo Guilger Reimberg). Apesar de possuir “ilha” no nome, a área na realidade é uma península. Seu histórico é um pouco diferente do resto da região da Capela do Socorro, já que no começo do século XIX, com a política de imigração europeia, muitos alemães desembarcaram no Brasil e alguns terrenos cedidos se localizavam nessa região - incluso o território do Bororé. Muito dessa tradição alemã foi perdida, mas no entanto ainda podemos observar alguns resquícios desse momento histórico como a Capela tombada de São Sebastião. “Em 1800, foram realizadas algumas tentativas de
atrair para o Brasil a imigração europeia. Em 1827 e no ano seguinte desembarcaram em Santos os primeiros grupos de colonos alemães, dentre os quais destacaram-se pouco mais de 120 que aceitaram terras devolutas em Santo Amaro, localizadas em Colônia, na Subprefeitura de Parelheiros e que se espalhou por toda a região sul. Ao contrário das colônias alemãs no sul do Brasil, Figura 14 – Mapa com a várzea da represa Billings (Capela do Socorro destacada) Fonte: Flavia Massimetti
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esta não conseguiu preservar muitos aspectos de sua tradição cultural e quase nada resta dessa experiência colonizadora.”
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Fonte: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/bibliotecas/bibliotecas_bairro/bibliotecas_m_z/malbatahan/index.php?p=5732, 2008
Figura 15 – Situação com o terreno da Casa Ecoativa destacada Fonte: Google Earth (editado por Helena Ruette)
Hoje o Bororé tem uma população de em média 3 mil habitantes, sendo que suas atividades principais giram em torno da produção agrícola e de espaços com enfoque turístico, em alguns casos já com pensamento ecológico agregado. Segundo a Prefeitura, a única maneira de frear a ameaça a essa área de preservação pelo rápido crescimento é focando em práticas agrícolas de pouco impacto e incentivando o eco turismo. “Na APA têm sido incentivadas práticas agrícolas menos agressivas ao meio ambiente, através de programas de capacitação e assistência técnica especializada, valorizando a permacultura, os sistemas agroflorestais e a agricultura orgânica e biodinâmica, livres da utilização de agroquímicos. Devido ao alto potencial de turismo e lazer evidenciado pela presença da represa Billings e de diversos sítios-de-recreio, clubes de campo e pesqueiros. O turismo ecológico, o cicloturismo e o turismo rural sustentável também têm sido incentivados, por serem consideradas atividades que podem gerar renda e contribuir para a sustentabilidade da região.” Fonte: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/bibliotecas/bibliotecas_bairro/bibliotecas_m_z/malbatahan/index.php?p=5732, 2008
Figura 16 – Ilha do Bororé Fonte: APA – Bororé-Colônia Helena Mono.indd 82-83
Figura 17 – Parque Municipal do Bororé Fonte: José Cordeiro 06/06/2018 15:39
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Transporte
LEGISLAÇÃO
O transporte público é reduzido, possuindo somente uma linha de ônibus que sai do Terminal Grajaú e atravessa por balsa até o Bororé. Já que é uma área ainda muito preservada, a ideia é que o acesso seja freado para diminuir a incidência de ocupação irregular na área (uma ação que muitas vezes acaba por isolar a população e não necessariamente o território). Apesar de ser um local muito visitado por quem faz rotas de cicloturismo, o Bororé não possui ciclovia e as calçadas estão todas em péssimo estado.
A área da Ilha do Bororé faz parte da APA (Área de proteção ambiental) Bororé-Colônia, portanto seu território possui uma legislação específica de uso e ocupação que ajudem na proteção de um dos últimos remanescentes de Mata Atlântica da RMSP.
Figura 18 – Mapa com os pontos e linhas de ônibus Fonte: Flavia Massimetti
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“A partir de 1975 a ocupação da região de Capela do Socorro passou a ser legalmente subordinada à Lei de Proteção dos Mananciais e à legislação de zoneamento industrial. Esta última obteve certo êxito no que se refere às restrições à implantação de novas industrias na região e ao controle de expansão das existentes. No entanto, a legislação relativa aos mananciais foi insuficiente para conter o avanço da urbanização e a degradação ambiental.” Fonte: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/bibliotecas/bibliotecas_bairro/bibliotecas_m_z/malbatahan/index.php?p=5732, 2008
Os principais objetivos da APA são: promover o uso sustentável dos recursos naturais; proteger a biodiversidade; proteger os recursos hídricos e os remanescentes da Mata Atlântica; proteger o patrimônio cultural; promover melhoria na qualidade de vida da população; manter o caráter rural da região; evitar o avanço da ocupação urbana nessa área protegida. O terreno onde se situa a Casa Ecoativa é pertencente à empresa de águas e energia EMAE, que cedeu o terreno para uso do coletivo que promove trabalho social na Ilha. A empresa,
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que já não possui mais interesse no terreno devido o estreitamento da Legislação de Mananciais, está em vias de entregar o espaço para a Secretaria do Verde que até então pretende manter as atividades atuais do coletivo. Segundo o Plano Diretor, a área faz parte da Macroárea de Proteção Ambiental e está dentro da ZLT (Zona de Lazer e Turismo) – Áreas destinadas ao uso de lazer, turismo e atividades correlatadas, vinculadas a preservação da natureza, de densidade construtiva baixas.
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Centro Ecocultural Casa Ecoativa O COLETIVO A Casa Ecoativa é um projeto coletivo que se localiza na região da Ilha do Bororé, às margens da represa Billings, e atua como centro Ecocultural na Zona Sul de São Paulo. O coletivo já passou por dois momentos de ocupação: iniciou suas atividades de 1996 a 2008, e retomou suas atividades em 2013 com o momento de efervescência das manifestações e continua até hoje inúmeras atividades e vivências. O espaço possui como objetivo promover ações ecológicas e culturais por meio de atividades comunitárias como oficinas, saraus, mutirões de bioconstrução e plantio, encontros de outros coletivos, entre outros. É um local que além de movimentar diariamente a comunidade local, também recebe visitantes que estão em busca de conhecer um pouco mais sobre o território da Zona Sul, trabalhos coletivos, permacultura, e celebrar com aqueles que promovem o espaço da festa na cidade. PROBLEMAS E POTENCIALIDADES No decorrer do trabalho de pesquisa para o Trabalho Final de Graduação, fiz uma série de analises territoriais que contribuíram com o entendimento geral da área para uma proposta que não fugisse da real necessidade local. Nesse primeiro mapeamento, pude observar quais os principais desafios do Bororé em relação ao todo como: a falta de conexão territorial, uma única balsa com enfoque no trans-
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porte individual, falta de saneamento, falta de ciclovia e calçadas impróprias para pedestres. A análise foi feita com base em conversas com a população local e com os organizadores do coletivo.
Figura 19 – Problemas e Potencialidades Macro Fonte: Helena Ruette
Ainda no que diz respeito ao território Macro, a zona Sul de São Paulo possui inúmeras rotas ecoturísticas pouco mapeadas ou mal delimitadas pela prefeitura de São Paulo. Exceto por algumas iniciativas, como o programa de Turismo Social do SESC (Cidade Inesperada) que cria rotas ecoturísticas e históricas com base nos pontos já existentes como cachoeiras, aldeias indígenas, trilhas para pedestres e ciclistas. AÇÕES CULTURAIS A Ilha e o território do Grajaú, como um todo, possuem várias atividades culturais graças à ação de mais de 60 coletivos urbanos - segundo a última pesquisa feita pelo Coletivo Imargem. Esse coletivo toma frente em projetos que contemplem atividades artísticas, teatrais, musicais, performáticas entre muitas
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outras. Visam trazer atividades que reforçam a festa na rua e a comunicabilidade entre as pessoas, fortalecendo laços de uma maneira criativa, já que quase não existem infraestruturas culturais concedidas pela prefeitura na região. Ações locais e de alguns coletivos parceiros Ecoativa: Sarau de cordas que ocorre quinzenalmente com artistas da Ilha e do Grajaú; eventos culturais de outros coletivos sediados no espaço; capoeira para as crianças; sessões de cinema; fomentação de editais e discussões organizacionais.
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Coletivo Imargem: Uma iniciativa multidisciplinar, criada em 2006 às margens da represa Billings, que propõe um olhar cuidadoso para a paisagem povoada da periferia, fomentando o pensar e agir diante das potencialidades e problemáticas da nossa sociedade, da margem à centralidade da cidade, ampliando os olhares e aguçar as sensibilidades de todos (educadores e participantes) para o espaço urbano.
Escola Aberta Adrião: O programa escola aberta que abre o espaço aos sábados para eventos culturais com os alunos e pais; alguns eventos maiores com exposições artísticas dos alunos no decorrer do ano. TV Grajaú: Encontro de coletivos de audiovisual; comunicação e mídias. Rap-Enter: Espaço dedicado para artes visuais e integradas e composição musical de rap. Expresso Perifa: Artes integradas com enfoque no movimento hip-hop, através de oficinas e encontros.
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Figura 20 – Flyer de divulgação (Eixo Cultural da Ilha do Bororé) Fonte: Coletivo Ecoativa
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REDE PERMACULTURAL: SÃO PAULO A rede de permacultura cresce cada vez mais, se expandindo tanto nas centralidades quanto nas bordas da cidade. É articulada por coletivos ativos que se utilizam da lógica permacultural para ações de transformação social e territorial no sentido alimentar, construtivo e energético. Por estar localizada dentro da região metropolitana de São Paulo, a permacultura urbana possui desafios que não encontraria no campo, como a necessidade de trabalhar com as pré-existências e de compreender sua escala ativa dentro da cidade. No que diz respeito às ações projetuais, é importante compreender a necessidade de aplicarmos noções de sustentabilidade dentro de lutas características da urbe, como o direito universal de habitar e co-criar uma cidade de maneira sadia, salubre, economicamente justa e ambientalmente responsável. Essa junção aos movimentos de luta já existentes traz a pauta ambiental para dentro dos anseios por mudança, estimulando também o cuidado do eu que muitas vezes é deixado de lado. Este surge como ponto de partida do que será criado coletivamente no que diz respeito a políticas macro, estimulando um processo regenerativo que caminha entre micro e macro no anseio da criação de mudanças efetivas sobre o sistema vigente.
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Figura 21 – Eixo permacultural da cidade de São Paulo Fonte: Helena Ruette
Ações locais: Bororé: As ações permaculturais na Ilha conectam alguns agentes da comunidade que estão preocupados em trazer para o dia a dia da população alternativas que melhorem a qualidade de vida (por meio da alimentação saudável, economia solidária, saneamento ecológico entre outras posturas de baixo impacto ambiental e grande potencialidade social). A triangulação prin-
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cipal desse movimento ocorre entre o coletivo Casa Ecoativa, o Sítio Paiquerê (grande produtor de orgânicos da região sul) que também é uma CSA (comunidade que sustenta a agricultura) e a Escola Aberta Adrião Bernardes. Ecoativa: Experimentações e oficinas com materiais locais (bambu e terra); experimento com saneamento ecológico, sistema BET (Bacia de Evapotranspiração) e ciclo de raízes para águas cinzas; programa de educação ambiental pós-escola; feira de alimentos orgânicos todos os sábados com venda local e preparação de cestas que são distribuídas no Grajaú; compostagem; processo de desenvolvimento agroflorestal; transporte por barcos para turismo ecológico. Sítio Paiquerê: Agricultura biodinâmica (sistema oposto à monocultura, feito por cooperação) e orgânica; CSA periférica; os ganhos e tarefas são divididos entre vários pequenos agricultores e o lucro vem de um acordo entra os pagantes; saneamento ecológico; turismo ecológico. Escola Aberta Adrião Bernardes: Programa em andamento de produção de alimentos para a escola, feito pelos alunos; aulas de cuidado com o meio ambiente dentro de matérias escolares como biologia e ciência.
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PROPOSTA DE INTERVENÇÃO
Figura 22 – Atividade educativa de plantio Fonte: Casa Ecoativa
A proposta de intervenção projetual irá servir como base estruturadora das ações atuais e futuras do coletivo, possibilitando ainda mais autonomia para o trabalho com a comunidade. Como parte do ensaio projetual, busquei levar em consideração todo o estudo do território, movimentos coletivos e consequentemente suas ações na cidade afim de garantir a concepção de espaços que façam jus àquele contexto urbano especifico, sem descartar as pré-existências de uso e sua memória.
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Figura 23 – Perspectiva da intervenção Fonte: Helena Ruette
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INTERVENÇÕES MACRO Necessária para a costura territorial e simbólica da rede ecoturística. Irá se constituir por: rota náutica para pedestres locais e turistas, saneamento ecológico, ciclovia e alargamento das calçadas.
Figura 24 – Intervenções macro Fonte: Helena Ruette
O observatório: APA – Bororé-Colônia A represa Billings já possui inúmeros pontos turísticos com enfoque ecológico, cultural e histórico. No entanto, as rotas e percursos existentes não são de conhecimento comum nem aos moradores da região. A falta de demarcação territorial e simbólica dos percursos possíveis dificulta um acesso mais abrangente da população a esses pontos de interesse. A ideia do observatório como marco é trazer legibilidade para o território, sinalizar a população que existem novas possibilidades de vivenciar a região sul da cidade. Os mirantes possibilitam ao observador não só uma nova perspectiva do território (que poderá ser vivenciada por seus vários níveis), mas também
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pontuam a existência de atividades locais, como se guiassem a curiosidade do visitante por sua iconicidade. Marcos urbanos Sua principal característica é a singularidade. Ou seja, possui algum diferencial, seja pelo seu tamanho (podendo ser observado de diversos pontos) ou por estabelecer um contraste com os elementos próximos. No caso da represa Billings, o marco arquitetônico exalta os contrastes de ocupação, relevo e adensamento. A escolha de um marco, segundo Lynch, é feita dentro de um conjunto de possibilidades, prezando a singularidade – algum aspecto único ou memorável no contexto. Assim, quando esse tipo de elemento físico possui forma clara e contrasta com seu plano de fundo, torna-se mais perceptível. “Qualidade de um objeto físico que lhe dá uma alta probabilidade de evocar uma imagem forte em qualquer observador. Refere-se à forma, cor ou arranjo que facilitam a formação de imagens mentais do ambiente fortemente identificadas, poderosamente estruturadas e altamente úteis.” (LYNCH, 1960, p. 9)
As paisagens urbanas usuais, quando vistas sob uma ótica de diferentes pontos de vista, permite ao observador concluir contraposições, afirmações ou indagações sobre ela própria de maneira criativa.
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“Olhar para a cidade pode dar um prazer especial, por
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mais comum que possa ser o panorama. Como obra arquitetônica, a cidade é uma construção no espaço, mas uma construção em grande escala; uma coisa só percebida no decorrer de longos períodos de tempo. O design de uma cidade é, portanto, uma arte temporal, mas raramente pode usar as sequências controladas e limitadas das outras artes temporais, como a música, por exemplo. Em ocasiões diferentes e para pessoas diferentes, as consequências são invertidas, interrompidas, abandonadas e atravessadas. A cidade é vista sob todas as luzes e condições atmosféricas possíveis” (LYNCH, 1960, p. 1.); Figura 25 – Rota ecoturística da represa Billings Fonte: Helena Ruette
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O programa base se apoia nas ações já realizadas pelo Coletivo Ecoativa e vai consistir em espaços como: pavilhão multiuso, sede administrativa, cozinha coletiva, espaço para as crianças, alojamento e píer. Também existirão sistemas ecológicos de saneamento e um observatório que servirá como marco urbano de uma rota turística ecológica da represa Billings. Atualmente o terreno que compreende a Ecoativa se mantém parcialmente fechado, tendo alguns pontos de livre fluxo. O acesso principal se localiza junto à casa administrativa, que está de frente para a rua que é o ponto de chegada da única balsa que conecta o Bororé ao Grajaú. Na proposta, o acesso principal é unicamente para pedestres e se desloca para o píer, dando acesso ao observatório e convidando os visitantes a caminhar pelo terreno - e consequentemente vivenciar as atividades propostas pelo coletivo.
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Flor da vida A origem do estudo geométrico (do Grego medir a terra) remonta aos primórdios, tanto no Egito com estudos astrológicos quanto na Grécia com teoremas de Pitágoras ou com os “elementos” de Euclides. Nota-se, que o grande impulso pelo estudo dessas de razões matemáticas era a observação e explicação das lógicas contidas nos acontecimentos naturais que cercavam o ser humano. A utilização da flor da vida como malha projetual também é um padrão geométrico utilizado há muito tempo, que pode ser encontrado em pinturas, esculturas e planos arquitetônicos. É uma figura composta por círculos múltiplos espaçados uniformemente, em sobreposição, que unidos formam uma flor composta, gerando um padrão geométrico multiplicável por seis como o hexágono. O símbolo continho na flor da vida, serviu como estudo para Leonardo da Vinci que encontrou uma razão matemáti-
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ca entre malha e a teoria dos cinco sólidos platônicos – teoria descrita no décimo terceiro livro de Euclides, assim chamados pois forem estudados pela escola Platonica. O matemático relacionou a noção dos 5 poliedros (cubo, tetraedo, octaedro, dodecaedro e icosaedro) como a base geométrica para encontrar respostas de lógica geométrica para alguns de seus inventos. Alguns escritórios de arquitetura pelo mundo que possuem uma abordagem projetual holística – busca de um entendimento integral dos fenômenos – estão utilizando esse padrão como malha projetual. Pensando nisso, procurei compreender um pouco mais sobre esses processos de trabalho que pensam a composição da forma como parte integrante do todo. Por meio dessa investigação, encontrei relações entre o uso da malha e o pensando permacultural. Principalmente no que diz respeito ao próprio símbolo da permacultura, que tem como base a flor da vida, escolhido para representar seus 12 princípios. Também a utilização da malha projetualmente sob a mesma lógica, isto é criação de uma rede complexa presente nos sistemas que se integra ao todo. Acreditei ser interessante o uso do sistema para a minha intervenção projetual, como modo de inverter a lógica ortogonal modernista durante meu processo de concepção da proposta. E também, para testar o padrão que cabe perfeitamente aos conceitos permaculturais e a materialidade resistente mas flexível do bambu.
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ESPAÇOS CONSTRUÍDOS COLETIVAMENTE
O lúdico
O programa foi desenvolvido com base nas pré-existências de uso e discussões sobre desejos e pretensões de futuras ações. Essas conversas realizadas com integrantes do coletivo me permitiram um envolvimento prévio com a situação local e foi extremamente importante para conseguir inserir dentro da concepção projetual parâmetros permaculturais. Com a observação cuidadosa dos acontecimentos existentes, pude compreender o que simbolicamente precisava ser mantido, para que não houvesse uma descaracterização completa de toda energia trabalhada já há anos pelo coletivo naquele local. Trago aqui algumas perspectivas das intervenções projetuais, com o intuito de compreender espacialmente como elas irão se inserir dentro do plano criado.
A figueira é um marco visual importante para a Casa Ecoativa. Possuindo grande importância simbólica, possui quase 20 metros de altura e chama atenção por seu tronco e seus diferentes níveis. Sua copa majestosa protege do frio e do sol os que visitam o espaço, permitindo a realização de encontros embaixo de sua circunferência. As crianças criam rotas exploratórias por seus galhos, a tornando um ponto de encontro e brincadeiras. A intervenção criada trabalha com esse aspecto lúdico de observação e encontros, abraçando a árvore e criando diferentes pontos de perspectiva possibilitados aos observadores de todas as idades.
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Figura 28 – Mirante da figueira Fonte: Helena Ruette
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O debate Esse espaço atualmente abriga eventos tais como o Sarau de Cordas, atividades com as crianças da comunidade do Bororé e rodas de debate entre coletivos ou visitantes. Para melhor acolher tais encontros, propus um espaço coberto com palco, arquibancada e camarim. A cobertura é estruturada pelo sistema de viga ripada de bambu, sustentada por pilares roliços também do material. Como proposta, o anfiteatro seria a primeira intervenção construída coletivamente pelos integrantes do coletivo e outros grupos interessados, por representar um ponto chave para articulação de novas atividades no espaço.
Figura 29 – Anfiteatro Fonte: Helena Ruette e Kassio Massa
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Renda e autonomia A loja de produtos Ecoativa exerce um papel fundamental no que diz respeito ao desejo por autonomia ou interdependência financeira do coletivo. Nela será possível a venda de produtos cultivados no território da Ilha, tanto no próprio terreno do coletivo quanto nos alimentos produzidos pelo sítio vizinho (Paiquerê). Os produtos vendidos na loja são um incentivo para a produção local, estimulando o empreendedorismo popular da região.
Figura 30 – Loja de produtos Ecoativa Fonte: Helena Ruette e Kassio Massa
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O alimento O espaço que hoje é depósito e refeitório já vem sendo pensado como cozinha coletiva há algum tempo. Para adaptação das novas necessidades, foi pensada uma edificação hexagonal constituída por fechamento de bambu - que irá abrigar a cozinha-escola e o balcão para venda dos alimentos produzidos localmente - coberta por uma casta de bambu em formato de folha, que irá proteger a cozinha-escola e a área de refeitório.
Figura 31 – Comedoria Fonte: Helena Ruette e Kassio Massa
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A experimentação A zona sul da cidade é abundante em florestas de bambu, responsáveis por atrair inúmeros artesãos que trabalham com o material para a região. Projetando com base no princípio permacultural, que valoriza e utiliza da melhor maneira possível os recursos humanos e ambientais locais, não faria sentido uma proposta onde o bambu não entrasse como ponto chave - tanto da materialidade geral da intervenção como modo de experimentação e geração de renda.
Figura 32 – Oficina de experimentações Fonte: Helena Ruette e Kassio Massa
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PROCESSO DE INDIVIDUAÇÃO E SEUS DESDOBRAMENTOS
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O ócio criativo Segundo o sociólogo italiano Domenico de Masi, o ócio criativo é marcado pela união entre estudo e lazer. Pensando junto a essa lógica seria essencial que o projeto para ecoativa contemplasse um espaço democrático com foco no relaxamento e na observação descomprometida do meio. O coletivo que foca suas ações em soluções de cunho social e ambiental, trabalha por meio do estimulo a observação e ao livre pensamento, fará grande proveito de um espaço dedicado a vivencias coletivas e ao de lazer junto a represa.
Figura 33 – Deck Fonte: Helena Ruette e Kassio Massa
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Considerações Finais A metrópole possui inúmeras relações complexas que de um modo geral sofrem problemas estruturais quando não são pensadas segundo a lógica de eterna transformação. No século XX, São Paulo passa um movimento vertiginoso de expansão por falta de planejamento e investimentos concentrados, fragmenta o território por meio de uma ocupação espraiada. Um dos resultados a essas ações foram as ocupações irregulares em áreas de preservação, como é o caso da ocupação dos arredores da represa Billings. Em meio a esse cenário de degradação ambiental e social, surgiram movimentos micropolíticos de luta e resistência para contrabalancear a falta de envolvimento e investimentos públicos nas áreas que margeiam a cidade. Assim, possibilitaram que a discussão sobre a regeneração dos meios naturais e humanos se tornassem pauta em grupos organizados por todas as regiões da capital paulista. O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma análise de como o movimento dos coletivos permaculturais vêm criando redes articuladas na cidade de São Paulo com intuito de trazer a pauta da sustentabilidade para o âmbito social, ambiental e econômico. Os coletivos atuantes buscam um modo de transformar seu entorno próximo gerando ações de ordem regenerativa, com o intento de contribuir com a construção de uma cidade mais saudável. Além disso, o envolvimento com as ações do coletivo Ecoativa na comunidade da Ilha do Bororé me permitiu observar essas dinâmicas presentes da cidade sob uma ótica mais aproximada e precisa. Obtive por meio dessa pesquisa de campo dados mais consistentes sobre a maneira cotidiana que esses
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coletivos se posicionam dentro do enredo urbano. A proposta de intervenção surge como uma concatenação de toda a experiência vivida junto ao coletivo Ecoativa, que somada a uma análise pessoal sobre problemas e potencialidades locais me permitiram uma posição projetual possível para o espaço. A intervenção como proposta não possui a pretensão de ser unicamente física, mas sim de buscar pela construção material um estímulo apoiador dos processos e dinâmicas já realizados pelo coletivo e o alcance de futuros desejos. Todo processo de estudo compreendido nesse trabalho foi realizado com base em pesquisas de campo, leituras, vivências e experiências. Junto a uma investigação sobre os conceitos da permacultura e da bioconstrução, elas me permitiram encontrar respostas mais abrangentes para problemáticas constantes na cidade - que caminham com o movimento pela regeneração dos ecossistemas, sejam eles de cunho alimentar, construtivo, energético ou mesmo sanitário. Nesse sentido, o desafio que se apresenta é o de pensar novas abordagens ou formas de pensar problemas relativos à degradação ambiental e social dos meios urbanos. Espero que o estudo da rede permacultural em São Paulo e consequentemente a proposta do Centro Ecocultural Casa Ecoativa possam motivar pesquisas e propostas, sejam elas no âmbito acadêmico ou profissional.
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Bibliografia
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