A Crítica Cinematográfica na Internet Brasileira dos Anos 20001 Hiago Leal Lopes LIMA2 Vanderlei Dias de SOUZA3 Faculdade Paulus de Tecnologia e Comunicação, São Paulo, SP
RESUMO
Desde o seu surgimento, a crítica das mais diversas expressões culturais conquistou um importante papel no campo das artes como mediadora entre a obra e público trazendo informação e conhecimento para que a apreciação de uma peça teatral, quadro, etc fosse implementada com dados e interpretações. A crítica cinematográfica, em especial, alcançou o status de prestigiada avaliadora da sétima arte a partir das décadas de 40 e 50 quando o próprio cinema passou a ser considerado algo além de entretenimento de massa. Com o advento da internet e o enfraquecimento dos veículos impressos especializados, viu-se na web a possibilidade de fazer o debate sobre cinema ser algo além de críticas e resenhas miúdas nos jornais, revistas e canais de televisão. Contudo, o espaço na internet se mostrou muito mais propício ao resumo e à síntese, fazendo novamente com que a velocidade e a pouca profundidade sejam as regras vigentes para os principais portais. Este paper pretende avaliar como são feitas as críticas cinematográficas na Internet brasileira dos anos 2000, baseando-se majoritariamente nos portais: Omelete, Cinema com Rapadura e Cinema em Cena.
PALAVRAS-CHAVE: crítica; cinema; internet; Brasil; jornalismo cultural. 1
Trabalho submetido à disciplina de Tópicos Avançados Específicos II do 7º semestre de Jornalismo da FAPCOM. Estudante do 7º Semestre do Curso de Jornalismo da Faculdade Paulus de Tecnologia de Comunicação - FAPCOM, email: hiagoleal@hotmail.com. 3 Orientador do trabalho. Professor Vanderlei Dias de Souza 2
INTRODUÇÃO: O cinema nasceu no “Grand Café”, no dia 28 de dezembro de 1895, na capital francesa Paris. A data em questão, marca a primeira exibição pública dos filmes dos irmãos Auguste e Louis Lumière. Na ocasião estava presente o ator e mágico Georges Méliès, que perguntou onde poderia adquirir aquele aparelho diferente. Este, logo elevaria a sétima arte para outro patamar mais criativo e inventivo com suas técnicas inovadoras e diferenciadas aplicadas em produções, hoje consagradas, como “Viagem à Lua”. As primeiras obras eram curtas, com menos de vinte minutos de duração, em preto e branco e mudas. As tecnologias que tornariam possível agregar cores, sons e sensação de tridimensionalidade à película ainda estavam longe de aparecer, quase tão distantes quanto as primeiras publicações que tratassem o cinema como expressão artística. Inicialmente a ideia predominante era de que o cinema se tratava apenas de entretenimento e seria, portanto, uma forma de expressão menor que o teatro e a literatura, por exemplo. Intelectuais do início do século XX não viam a possibilidade de que a nova mídia pudesse ser considerada uma nova estrela na constelação das artes.
Burch cita a seguinte passagem, retirada de um periódico: "[O cinema] é o maior divertimento da multidão. Mas ele não é, ele não pode ser artístico... lhe falta o verbo, e isso é tudo!"(ibid.,p. 49). O cinema encontrava-se então reduzido ao "gueto" popular, restrito à condição de simples entretenimento ou, ainda, de "irmão pobre" do teatro. (MASCARELLO, 2006)
Já em meados dos anos 1920 é possível observar uma reconfiguração do status do cinema. O desenvolvimento de uma cultura de cineclubes, salas especializadas, a priori na França, conquistava o público. No lugar de coberturas pelos jornais como espetáculo ou eventos sociais, ganhou publicações próprias a exemplo de Le Film, em 1917, cujo editor-chefe era Louis Delluc, teatrólogo e romancista que desgostava do cinema e foi posteriormente considerado inventor da crítica cinematográfica. Outro importante precursor do estudo do cinema e um dos primeiros teóricos foi o italiano Ricciotto Canudo. Ele é o autor de Manifeste des spt arts, em 1922 e criador de uma revista, no mesmo ano, chamada La Gazette dês Sept Arts. Estava, então, criado
o vínculo entre a produção jornalística impressa, em jornais e revistas e o cinema, que futuramente levariam a estudos, análises e críticas cinematográficas.
O PAPEL DA CRÍTICA DE CINEMA
No campo das artes houve uma popularização dos movimentos no decorrer do século XVIII. Artistas, como os pintores da época, passaram a se profissionalizar, o público cresceu gradualmente e, ao lado destes, o crítico desenvolveu-se como um orientador da burguesia. Os críticos eram vistos como figuras capazes de traduzir os códigos das obras e desvendar mensagens escondidas. Estes críticos pioneiros eram exegetas geralmente ligados à tradição literária, preocupados em descobrir o sentido congelado nas obras num processo de desocultamento que lhes garantia a posição de tradutores da verdade. Etimologicamente (do verbo grego krino), a palavra crítica está ligada à ideia de escolha, de separação, separar o “trigo do joio”, o belo do feio, o bom do mau. Os críticos por sua vez, seriam operadores de tal caracterização, ajuizando valores sobre a obra. (GOMES, 2006)
Conforme o mencionado na introdução o cinema teve de passar por um processo de legitimação e assim também foi a crítica de cinematográfica. Este fator é um dos responsáveis pelos poucos registros dos primeiros filmes. A cobertura até o começo dos anos 1930 não tinha a função de realizar uma análise detalhada interpretativa ou explicativa, muito pelo contrário. Entre fins do século XIX e início do século XX estes espetáculos eram considerados como “notícias de valor” e os repórteres tinham a função de cobri-los como qualquer outra notícia. Na verdade, a então chamada crítica era um mistura de reportagem que descrevia o evento em termos factuais e de resenha que aconselhava o leitor sobre o valor do filme. Segundo Bywater (1989, p. 5-6), a ênfase era colocada na palavra valor uma vez que os resenhistas/jornalistas deveriam informar se valeria ou não a pena gastar certa quantia de dinheiro pelo visionamento da película, critério, aliás, vigente até os dias de hoje pelos críticos. (GOMES, 2006)
A mudança de postura definitiva da análise fílmica deu-se posteriormente à Segunda Guerra Mundial principalmente por revistas especializadas na tríade de países França, Inglaterra e Estados Unidos. Os periódicos mais relevantes eram Cahiers Du Cinéma. Positif e Cinéthique (França), Screen, Sequence, Sight and Soud e Movie
(Inglaterra), e Film Quartely, Film Culture e Artforum (Estados Unidos). (GOMES, 2006). André Bazin, hoje um pilar dos estudos cinematográficos, esteve por muito tempo à frente da revista Cahiers Du Cinéma, seu trabalho como editor e escritos da publicação é de grande importância para o período. É com Bazin que a análise fílmica passa a considerar a existência de um autor por traz dos filmes, mesmo sendo eles de constituição coletiva. Tema, gênero e autor entram no balaio da investigação cinematográfica e a crítica ganha os contornos de avaliação moderna adotada tanto nos cadernos de cultura dos jornais, como nos veículos especializados na área. Longe de ser um consenso, o escritor francês propõe uma concepção do que seria o trabalho do crítico.
A função do crítico não é trazer numa bandeja de prata uma verdade que não existe, mas prolongar o máximo possível na inteligência e na sensibilidade dos que o leem, o impacto da obra de arte. (BAZIN, 1991)
Tal interpretação ecoa nos escrito do autor brasileiro Luiz Geraldo de Miranda Leão, renomado crítico fora do eixo Rio-São Paulo e membro fundador da Academia Cearense de Língua Portuguesa.
Não cabe, é claro, ao analista desnudar o enredo de um filme, mas atuar como mediador entre a realização e o espectador, indicando-lhe o quanto o realizador pretendeu dizer e a forma como o fez através do seu veículo específico. (LEÃO, 2006)
Nos mais diversificados veículos o crítico exerce essa dita função de “prolongar o impacto da obra” e ser o “mediador entre a realização e o espectador” sempre se adequando a ótica da mídia na qual ele está inserido. Nos jornais as notas são pontuais, curtas e objetivas, nas revistas tratam principalmente dos blockbusters sem, geralmente, detalhar dados que não se refiram às celebridades, e quando não se trata de veículos específicos o costume é relegar os filmes a notas no final das publicações com dicas das obras em cartaz ou lançamentos em DVD/Bluray. Na televisão seu espaço está restrito a
canais televisivos como a TV Cultura, o Futura e o Telecine Cult, nos quais há, logo antes da veicularem de um filme em programas específicos, a apresentação de um pequeno retrospecto de aspectos da película.
A TRANSIÇÃO DOS MEIOS IMPRESSOS PARA A INTERNET
A web, como a conhecemos hoje, começou a se desenvolver a partir de 1995. Os jornais e revistas, maiores vertentes do jornalismo cultural, bem como de uma de suas ramificações que é a crítica cinematográfica, logo buscaram criar suas próprias páginas na rede. Comunmente separada em três fases distintas o jornalismo online, eletrônico, digital, ou seja qual for sua denominação, não passava de “transposição de uma ou duas das principais matérias de algumas editorias” para o ambiente digital, conforme aponta o trabalho “Um mapeamento de características e tendências no jornalismo online brasileiro”, da FACOM/UFBA, de 2002. O processo evolutivo foi gradativo. Atualizava-se o material a cada 24 horas, depois tentou atender à necessidade de atualização constante com sessões de “últimas notícias”. O passo seguinte foi a adoção de características próprias da rede como interatividade, hipertextualidade e multimidialidade, para citar apenas algumas. Em paralelo a isto a web 2.0 surgia e logo se expandiria. A produção independente de conteúdo foi ganhando cada vez mais espaço nas redes através dos blogs gratuitos que poderiam ser criados em sites como Blogspot e Wordpress. O público no universo digital também é produtor de conteúdo e dentre seus principais interesses encontra-se o cinema. Em uma pesquisa no buscador Google, em 2014, com as palavras “blog” e “cinema” são encontrados aproximadamente 171 milhões de resultados. Pela aparente não existência de uma limitação de caracteres como ocorre nos jornais, revistas e demais conteúdos impressos, ou presença de um tempo determinado de fala dos críticos em canais de televisão, vislumbrava-se um campo vasto para produção de conteúdo sem amarras e com capacidade de aprofundamento na internet.
Enquanto veículos da mídia clássica (jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão) dedicam cada vez menos espaço para a crítica, privilegiando notícias sobre os lançamentos da semana (logo esquecidos na semana
seguinte) e sobre a vida das celebridades do negócio do cinema, novos modelos e tendências de crítica cinematográfica têm surgido no ciberespaço. A Internet mostra-se um meio onde a atividade pode resgatar parte de sua função social original, que era a resistência cultural. (CARNEIRO, 2009)
Contudo, logo ficou claro que a prática vigente seria outra. O resumo, a síntese, e o recorte se destacaram. A produção para a internet, também conhecida como webwriting segue, geralmente, alguns preceitos pré-estabelecidos. Existe, inclusive, uma cartilha do governo brasileiro disponível no site do “Governo Eletrônico” e organizada pelo Ministério do Planejamento, em uso desde 2010 pelos sites da união. Entre os especialistas consultados para realização do material encontram-se figuras como Bruno Rodrigues, autor brasileiro conhecido por livros sobre Webwriting nos quais mescla conceitos do jornalismo às ideias publicitárias do tratamento do público como clientes e da informação como um produto.
Imagine a chamada como um produto exposto em uma vitrine, por onde o possível consumidor passa com toda a pressa. É desta forma que o usuário se comporta ao acessar uma página web, seja apenas para conhecê-lo ou com um objetivo já bem definido. A chamada é a “isca” que tem como objetivo fazê-lo desviar do caminho e acessar o site. (RODRIGUES, 2006)
Este e outros aspectos presentes no texto de Bruno Rodrigues são um retrato do que acontece na internet brasileira como um todo e especificamente nos sites voltados à crítica, análise e notícias sobre cinema, abordados no capítulo seguinte.
CARACTERÍSTICAS DE IMPORTANTES SITES DE CINEMA NO BRASIL
Analisados: Omelete, Cinema com Rapadura, e Cinema em Cena
A variedade de sites, blogs e portais que tratam de cinema e suas vertentes como os grandes diretores, blockbusters, celebridades, a indústria de Hollywood, entre outros, é bastante extensa no Brasil. Boa parte do conteúdo é produzido por cinéfilos, ou seja, os amantes do cinema, que realizam esta atividade sem necessariamente ter uma remuneração. Porém, com o tempo, é comum que estes veículos se profissionalizem e
passem a ser patrocinados como foi o caso do site Contracampo, mantido no ar oito anos até começar a ter algum tipo de renda, vinda de edital público (Petrobrás) e do Ministério da Cultura (Lei Rouanet).
Contracampo consolida-se, na esfera da internet de língua portuguesa, como representante modelar de “revista de cinema” virtual, como o evidenciam a posição referencial que passou a ocupar como interlocutora privilegiada tanto da academia quanto dos espaços públicos de debate das questões cinematográficas e a constituição de uma editora própria para a publicação de livros especializados em cinema, protagonismo este que se dá em consonância com a notória ascensão profissional de seus membros – hoje prestigiados professores universitários, consultores da área de cinema ou realizadores. (CALEIRO, 2010)
Entre as principais características do site Contracampo estão a liberdade de estruturação das críticas. Não são delimitados espaço ou método utilizado para analisar um filme. Não há restrição quanto ao número de parágrafos ou o tamanho deles, permitindo que se necessário possam haver textos longuíssimos ou curtos avaliado um filme integralmente ou de maneira fragmentada com o foco em um aspecto da narrativa conforme o interesse do autor do texto. Por outro lado, a presença de uma terminologia técnica e uma linguagem rebuscada, características pouco comuns no jornalismo, podem afastar o público geral, deixando o acesso do site majoritariamente direcionado a um nicho de pessoas que não só se interessam por filmes, mas pelo fazer cinematográfico, sua linguagem e suas implicações. Tais características possivelmente são as responsáveis pelo pouco apelo do site no ambiente digital e conhecimento restrito entre o público da internet brasileira, mesmo que bem quisto no meio acadêmico. Sob uma ótica mais mercadológica para garantir cliques e por consequência patrocínio o portal Adoro Cinema adotou características presentes no conhecido catálogo virtual de filmes Internet Movie Database (IMDb). Tal como no endereço norte-americano nascido em 1990 o ponto forte do site brasileiro iniciado em 2000 é apresentar informações como: trailers, notícias e principalmente fichas técnicas de filmes e celebridades com curiosidades, parcerias, frases mais marcantes, entre outros,
que quando tratam de cinema nacional possuem até mesmo mais chance de acerto que o IMDb. Outro ponto em comum é a possibilidade de utilização dos sites como redes sociais nas quais o usuário pode escrever suas próprias críticas sobre filmes e disponibilizá-las, como uma espécie de produção de conteúdo colaborativo que conta com mais de 80 mil críticas escritas pelo público, conforme consta nas informações do próprio site. O Adoro Cinema também realiza uma série de clippings de críticas de respeitados veículos de comunicação sobre cinema no Brasil, dentre os quais constam: O Globo, Omelete, Cinema com Rapadura, Gazeta do Povo, Rubens Ewald, e mais. A média da nota conferida no sistema de estrelas que vai de um a cinco permite que o site crie uma nota da opinião da imprensa para que o público tenha uma noção geral de como o filme é visto pela crítica especializada. Mas os usuários também avaliam as obras com o mesmo método e o resultado é contabilizado pelo endereço para uma média comparativa da opinião do público. Tal característica também está presente no reconhecido site norte-americano que data de 1998, chamado Rotten Tomatoes, que em tradução literal significa tomates podres. O endereço faz médias da opinião da mídia especializada e do público, todavia com um número muito superior de veículos utilizados para a contagem e de diferentes países. Diferentemente do Contracampo, o Adoro Cinema é bastante lembrado pelo público e chegou a constar entre os melhores sites de cinema brasileiros em diferentes anos, segundo a premiação iBest, da internet brasileira, descontinuada em 2008. O site Omelete, integrante do portal OUL também foi um dos vencedores. Nele, há as editorias de vídeos, games, música, outros, mas o assunto principal é da editoria de cinema, no qual a produção mais importante é de notícias sobre bastidores, lançamentos, celebridades, polêmicas, etc. Com o slogan “Entretenimento levado a sério” o Omelete é um site especializado em cultura pop e nerd no que diz respeito a abordagem frequente de quadrinhos e filmes de heróis, por exemplo. Criado pelo designer gráfico Érico Borgo e pelo publicitário Marcelo Forlani as críticas do site, sobre os filmes de maior destaque, são feitas pelos dois e por alguns outros colaboradores mais importantes.
Com pouco mais de 2.500 caracteres, geralmente, as críticas levam em consideração aspectos da produção, o desempenho dos atores, direção, roteiro, revalando simbolismos e buscando chamar a atenção do leitor como a indicar se o filme avaliado merece ou não ser assistido, perceptível na crítica do blockbuster recente Hércules.
Hércules é instável, mas suficientemente interessante. Faz uma boa releitura de um tema já amplamente explorado no cinema, o questionamento da fé acreditar em uma força intangível ou em si mesmo - mas não empolga no nivel que os produtores imaginavam. O trabalho mais difícil de Hércules não será um leão, um javali ou a limpeza de um estábulo, mas definitivamente ser lembrado como Dwayne Johnson esperava. (BORGO, 2014)
Um ponto de destaque é a presença de integrantes do site em festivais importantes de cinema como Toronto, no entanto o cinema nacional não possui o mesmo acompanhamento, o que acontece também com o Cinema com Rapadura. Apesar do nome cômico que indica a procedência do site do Ceará, região onde o doce rapadura é bastante consumido, o profissionalismo é levado a sério. Com o slogan “Assistir é apenas o começo” as críticas do site, voltado exclusivamente ao cinema com notícias bastidores, colunas variadas e outras matérias, são produzidas por membros da equipe que, caso não sejam formados em jornalismo ou cinema especificamente, possuem alguma especialização na área. Não que seja necessário, mas este tipo de atributo concede ao trabalho dos críticos maior credibilidade. Também com a visão de destacar o cinema sob a visão do “vale ou não a pena assistir”, dedica mais espaço para as críticas que chegam a ter o dobro de tamanho do Omelete, possibilitando mais reflexão e profundidade. O linguajar é ligeiramente rebuscado sem afetar a leitura do público leigo, dado perceptível pelo número de comentários que os textos possuem. Análises como a de A Árvore da Vida, de Terrence Mallick, vencedor da Palma de Ouro em Cannes, no ano de 2011, trazem tanto a acessibilidade para o público como a densidade de uma análise profunda, que leva em conta, inclusive, aspectos psicológicos da trama para a avaliação opinativa e argumentativa proposta.
Contando com uma fotografia irretocável, ótimos efeitos especiais e embalado pela belíssima trilha sonora de Alexandre Desplat (reforçada por composições clássicas, tais como “Vltava”, de Bedřich Smetana), “A Árvore da Vida” é uma obra repleta de simbolismos e significados. Trata-se não apenas de um filme, mas do poderoso retrato de um artista sobre a própria natureza da vida. Recomendado. (SIQUEIRA, 2011)
O Cinema em Cena, site do mineiro Pablo Villaça, foi um dos primeiro voltado exclusivamente à sétima arte na web brasileira e é o mais antigo em atividade, ainda que sujeito a fechamento pela dificuldade em manter-se com as publicidades existentes. Villaça se destaca na crítica também por conta da sua atuação internacional. Único membro latino-americano e de língua portuguesa da Online Film Critics Society (OFCS) e único brasileiro citado no site Rotten Tomatoes mantém o Cinema em Cena em funcionamento desde 1997 com matérias, notícias, críticas e cobertura de diversos festivais de cinema pelo Brasil, ponto de destaque e pouco presente nos maiores sites voltados ou com foco na sétima arte no país. A maior parte das críticas é produzida pelo criador do site que mesmo com uma cobertura vasta não poupa esforços em seus escritos, semelhantes ao do Cinema com Rapadura no que diz respeito a esmiuçar temas e não delimitar um espaço para as análises.
O Som ao Redor também é uma narrativa sobre a perda de nossas raízes ou, no mínimo, da triste destruição de nossa história. “A casa em que tu morou vai ser derrubada”, diz João à namorada, em certo instante – uma fala literal, mas que poderia perfeitamente surgir como metáfora. E, assim, quando a garota visita o lugar no qual passou parte da infância e entra no antigo quarto, sentimos a perda iminente de um aposento que, mesmo comum, assume contornos de um museu particular. (VILLAÇA, 2013)
O texto sobre premiado filme brasileiro “O Som ao Redor” é um exemplo da dedicação do site Cinema em Cena e de seus autores, mas apesar deste formato que permite “prolongar o impacto da obra” ser o mais indicado para se discutir cinema é o aspecto veloz e raso que se sobressai.
MUITO LONGO, NÃO LI
A internet é um ambiente que busca, boa parte das vezes, condensar a informação com resumos, notas rápidas, infográficos, vídeos, etc. Para tanto surgem aos montes siglas que vão muito além do “vc”, abreviação de você. O título deste capítulo, por exemplo, refere-se a uma expressão norte-americana, sobre a qual o colunista do jornal Folha de São Paulo, Ronaldo Lemos, escreveu:
Experimente mandar uma mensagem muito grande para alguém com menos de 25 anos. Você se arrisca a receber uma resposta de apenas quatro letras: tl;dr. Trata-se da abreviação de too long; didn’t read (“muito longo; não li”). Expressão que indica a falta de tempo (e de atenção) generalizada que tomou conta da internet. O recado é algo como: se você não sabe escrever mensagens curtas, não merece ser lido. (LEMOS, 2013)
É curioso ou até mesmo irônico que o mesmo site de jornal que disponibilizou a coluna acima seja o responsável por uma polêmica ligada à síntese. Um ano antes, em um tweet, o escritor brasileiro Paulo Coelho, com mais de 15 milhões de seguidores na rede social, afirma: “Um dos livros que fez esse mal à humanidade foi ‘Ulysses’, que é só estilo. Não tem nada ali. Se você disseca ‘Ulysses’, dá um tuíte.”. O comentário foi criticado internacionalmente e a Folha de São Paulo aproveitou o destaque para convidar sete autores para reduzir o livro em questão em, no máximo 140 caracteres. Tal atitude, ainda mais partida de um veículo de comunicação de destaque, é um reflexo da efemeridade que se faz constante no ambiente digital. Em entrevista ao jornal mineiro O Tempo, na qual Pablo Villaça indica o possível fim do site Cinema em Cena, também são feitas duras críticas a este aspecto.
A regra na internet hoje é dois ou três parágrafos, e deveria ser o contrário porque nosso diferencial era o oposto. Criaram uma sigla para isso: tldr, “too long, didn’t read” (muito longo, não li). Acho sintomático e triste porque não é a questão de ser mal escrito ou enfadonho, mas simplesmente porque é longo. Aqueles artigos e entrevistas com aprofundamento que líamos antigamente hoje estão cada vez mais raros. O que importa é a fofoca, o
imediatismo sem edição, cheio de erros de português e de apuração. (VILLAÇA, 2014)
O mundo moderno exige velocidade, mas isso não significa que a reflexão e a profundidade devem ser deixadas de lado. O cinema como formador cultural e social é algo que deve ser discutido e abordado não apenas para que o público entenda um simbolismo específico ou identifique uma corrente cinematográfica a qual o filme pertence, mas para que ele trate o cinema como uma arte que vai além do mero entretenimento. Uma sociedade mais crítica e seleta que avalie com profundidade e exerça seu papel de público consciente em relação aos filmes é preferível no lugar do incentivo a conteúdos rasos incapazes de contribuir como formação cultural e intelectual.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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GOMES, Regina. Crítica de Cinema: História e influência sobre o leitor. Universidade do Sul de Santa Catarina, Santa Catarina, 2006. Crítica Cultural, volume 1, número 2, julho/dezembro, de 2006.
BAZIN, André. O Cinema: Ensaios. São Paulo, SP. Editora: Brasiliense, 1991
LEÃO, Aurora Miranda. Analisando cinema: críticas de L.G. Miranda Leão. São Paulo, SP. Editora: Imprensa oficial, 2006
Grupo de pesquisa em Jornalismo Online (FACOM/UFBA). Um mapeamento de características e tendências no jornalismo online brasileiro. Universidade Federal da Bahia.
2002.
Consulta
realizada
no
endereço
eletrônico:
http://www.facom.ufba.br/jol/pdf/2002_palacios_mapeamentojol.pdf
CARREIRO, Rodrigo. História de uma crise: a crítica de cinema na esfera pública virtual. Universidade Federal de Pernambuco. Pernambuco, 2009. Contemporanea Revista de Comunicação e Cultura, volume 2, número 2, de 2009.
RODRIGUES, Bruno. Webwriting - Redação & Informação para a Web. Rio de Janeiro, RJ. Editora: Brasport Livros e Multimídia Ltda, 2006
CALEIRO, Maurício. Internet e o Novo Jornalismo Cultural: A Crítica de Cinema em Contracampo. Universidade Federal do Maranhão. Maranhão, 2010, Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo
BORGO, Érico. Omelete. Críticas de filmes. Disponível em: <http://omelete.uol.com.br/hercules/cinema/hercules-critica/#.VDwSuPldVJt>. Acesso em: 11/10/2014
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Acesso em: 11/10/2014
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