O QUE É DEPENDÊNCIA QUÍMICA A dependência química é definida como um conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos, que se desenvolvem após o uso repetido de determinada substância. Pode estar relacionada a uma substância psicoativa específica (por exemplo: cigarro, álcool ou cocaína), a uma classe de substâncias (opioides) ou a um conjunto mais vasto de diferentes substâncias.
Luiz Guimarães, psiquiatra
“Trata-se de um transtorno mental, uma doença crônica, onde diversos fatores podem contribuir para o seu desenvolvimento, incluindo a quantidade e a frequência de uso da substância, a condição de saúde do indivíduo e aspectos genéticos, psicossociais e ambientais.”
PROGRAMA DE TRATAMENTO O Programa de Tratamento da Dependência Química da Holiste (PDQ) é realizado durante o período de internação psiquiátrica e baseado na combinação da abordagem psiquiátrica e psicoterápica, com escuta individualizada do paciente (e seus familiares) e a participação ativa em grupos terapêuticos. Cada uma dessas fases corresponde a um momento particular do amplo percurso do tratamento. Em todo o processo, são trabalhados objetivos específicos de cada fase, alinhados com os eixos centrais que norteiam o tratamento: Biológico, Psicológico e Social.
CARACTERÍSTICAS DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA Antes de tudo, é preciso diferenciar o comportamento de “Abuso” da “Dependência Química”. Abuso é um padrão de uso de uma ou mais substâncias em grandes doses, podendo provocar algum sofrimento no indivíduo, trazer prejuízo ao seu funcionamento social/ocupacional. A despeito das consequências negativas, o abusador persiste no uso. Já a dependência química vai além destes fatores, ficando caracterizada quando o consumo das substâncias é constante e foge ao controle do indivíduo, passando a desempenhar um papel invasivo, central e desestabilizador em sua vida. Sinais da dependência: • Forte desejo ou compulsão para consumir a substância. • Dificuldades em controlar o comportamento de consumo. • Estado de abstinência fisiológico quando o uso cessa ou é reduzido. • Tolerância à substância usada, de tal forma em que doses cada vez maiores sejam necessárias para alcançar os efeitos originalmente produzidos. • Abandono progressivo de outros interesses em favor do uso da substância.
Ueliton Pereira, psicólogo
“Quando falamos de dependência, é porque houve um aumento de um consumo, um descontrole desse uso. As pessoas acabam perdendo o rumo de sua vida, acabam perdendo sua autonomia, e vivem com a droga como se fosse uma bengala. Há um uso dependente da substância. Mas nosso foco não é a substância e sim a pessoa. Nós tratamos o sujeito que faz uso da substância, mas que perdeu o controle da vida.”
1. Desintoxicação: Primeira fase do tratamento, consiste na estabilização do quadro fisiológico e emocional. O foco, aqui, é acolher o paciente (contenção emocional e medicamentosa) e auxiliá-lo a como lidar com a abstinência. Nesse momento, a ação do indivíduo está voltada para a relação com seu próprio corpo, o que exercita a leitura e a identificação dos sinais de abstinência da substância, assim como dos sinais da própria fissura. O que provoca a passagem da desintoxicação para a segunda fase, de motivação, é a mudança de estado que permite ao adicto se afastar - ao menos parcial e/ou temporariamente - da demanda compulsiva e imediatista pela droga, na qual ficou preso, e que é própria do comportamento adictivo.
2. Motivação: Esta fase inicia-se quando os efeitos fisiológicos e emocionais agudos - produzidos pela abstinência do uso das substâncias - começam a ceder, possibilitando o desenvolvimento de um trabalho terapêutico de adesão ao tratamento. Nessa fase, o indivíduo já não se concentra tanto no próprio corpo, pois começa a se interessar pelo trabalho mental de leitura e interpretação dos sinais da fissura. Assim, o indivíduo começa a calcular e antecipar as consequências dos seus atos, do mal-estar provocado pelo uso da substância, por mais compulsivos que eles sejam. Deixando para trás o imediatismo da compulsão, o indivíduo é capaz de manter aberto um novo espaço de interlocução com o próximo, habilitando-o para a próxima fase do tratamento.
3. Reabilitação: Com a maior adesão ao tratamento por parte do paciente, inicia-se uma mudança de foco, buscando construir uma rede de apoio que o auxilie a lidar com a dependência. A terceira fase do processo privilegia o aspecto ambiental ou “social”. O objetivo é trabalhar a reconstrução da rede de relações nas quais o indivíduo pode se sustentar e encarar novos desafios. Estabelecida essa rede de suporte, o paciente estará capacitado para prosseguir com a manutenção do tratamento.
4. Manutenção: No último aspecto do programa, trabalhamos a responsabilização do indivíduo na retomada de sua vida, nas decisões e nas consequências que isto implica. O foco do trabalho terapêutico é a criação de estratégias de prevenção de recaídas, aumentando o intervalo de tempo entre a vontade de usar a substância e a decisão de fazê-lo, abrindo a possibilidade de escolha por outro comportamento que não o uso da droga. Durante esta fase, o indivíduo investe tempo e energia em vários e novos objetivos, exercitando um modo de convivência longe dos antigos vínculos e hábitos adictivos, livre das marcas do passado.
O PAPEL DA FAMÍLIA NO TRATAMENTO Na maioria dos casos, quem procura pelo tratamento é a família, de forma direta ou indireta, pressionando o dependente a tomar a atitude que ele não conseguiria por conta própria. A família tende a ficar refém da situação, sendo levada a ocupar o lugar de cúmplice ou de empecilho. No primeiro caso, produzindo um estreitamento do vínculo conhecido como codependência; no segundo, um afastamento vincular que leva ao isolamento. Esses dois aspectos - aparentemente contraditórios, para os quais a família é convocada – não necessariamente se excluem, se intercalando em boa parte dos casos. Isso nos leva a desenvolver um trabalho de parceria com a família, que deverá se prolongar ao longo de cada fase do tratamento, através de atendimentos realizados com a presença do paciente ou exclusivamente com os familiares.
Pablo Sauce, psicólogo e coordenador do PDQ
“A dependência é uma doença, mas se só ficarmos nisso o paciente se encobre, se esconde atrás do diagnóstico. Como responsabilizar o sujeito pelos atos que ele comete em função de sua decisão pelo uso de uma droga? Como torná-lo responsável pelas suas escolhas e próprio processo de recuperação? Esse é o objetivo do tratamento. A gente não entra em julgamentos morais, na questão de se é para ele usar ou não determinada substância, essa decisão é do indivíduo; mas trabalhamos a responsabilização por qualquer que seja a sua escolha e as consequências dela”.
Responsável técnico: Dr. Luiz Fernando Pedroso | CRM 11711 | RQE 11158