A eficiência da Propriedade Intelectual como estímulo à inovação: uma revisão bibliográfica

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Universidade Federal do Rio de J a neiro Instituto de Economia

A eficiência da Propriedade Intelectual como estímulo à inovação: uma revisão bibliográfica TD. 001/2009 Paula Mota S. Nunes Maria da Graça D. Fonseca

Série Textos para Discussão


A eficiência da Propriedade Intelectual como estímulo à inovação: uma revisão bibliográfica

Paula Mota S. Nunes (Economista formada pelo Instituto de Economia, UFRJ)

Maria da Graça D. Fonseca (Instituto de Economia – UFRJ)

Resumo: Esse trabalho pretende analisar o arcabouço teórico econômico sobre a eventual eficiência da propriedade intelectual, em especial das patentes, como estímulo à inovação. Tendo em vista o legado schumpeteriano que trata da importância da inovação tecnológica para o desenvolvimento e tomando como referência as ideias de importantes economistas serão expostos os argumentos a favor do mecanismo de IPR (Intellectual Property Rights) bem como controvérsias sobre o tema.

Palavras-Chaves: IPR, patentes, eficiência econômica, inovação, P&D, efeito spill-over

Março/2009


Introdução Um dos temas recorrentes na literatura econômica sobre Propriedade Industrial reside na importância dos sistemas de proteção intelectual como mecanismo necessário para estimular o processo inovador, garantindo assim, a constante renovação da estrutura capitalista. A partir de uma perspectiva econômica, na visão ortodoxa de importantes economistas como Scherer & Ross, Carlton & Perloff, a proteção à propriedade intelectual - traduzida na criação de poder de mercado - parece ser fundamental para encorajar investimentos em Pesquisa & Desenvolvimento (P&D), estimular inovações e consequentemente ampliar o bem estar da sociedade como um todo. Do outro lado, há autores na literatura, tais como Kenneth Arrow e Arnold Plant que não compartilham a ideia de que o sistema de propriedade intelectual seja necessário ou ainda eficiente para incentivar a introdução de novas técnicas, processos e produtos no mercado. Partindo do pressuposto schumpeteriano sobre ciclos e inovação, em que o sistema capitalista progride por revolucionar constantemente suas estruturas através da introdução de novas firmas, novas tecnologias e produtos, esse artigo pretende analisar as principais contribuições e controvérsias sobre esse tema. O objetivo deste trabalho é apresentar aos alunos de graduação um resumo bibliográfico com as diferentes visões de autores na literatura econômica com relação à eficiência (estática e dinâmica) do sistema de IPR1 no estímulo à inovação. Esse trabalho é dividido em sete seções, além desta introdução e conclusão. Na seção 1 tem-se a apresentação do conceito de propriedade intelectual, já que constitui a base da discussão desse trabalho; a seção 2 trata do papel da inovação na economia capitalista e a seção 3 aborda a necessidade de incentivos para estimular os investimentos em atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Na seção 4 são apresentados os conceitos de eficiência estática e dinâmica que serão importantes para a discussão na seção seguinte a respeito da lógica teórica das patentes. A seção 6 é composta de argumentos que questionam os pressupostos apresentados nas seções anteriores e por fim, a seção 7 trata da discussão entre direito de propriedade intelectual e o fenômeno de spill-over.

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Intellectual Property Rights, ou em português, Direito de Propriedade Intelectual.

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1. A Propriedade Intelectual A propriedade intelectual é um campo de estudo relativamente recente na teoria econômica. Grande parte dos estudos teve início em meados de 1960 com foco em patentes e sua contribuição ao progresso tecnológico (Lévêque, Ménière, 2004). Desde então, o interesse crescente pelo tema foi aprofundado no âmbito da Organização Industrial. Propriedade Intelectual é uma expressão genérica que pretende garantir a inventores ou responsáveis por qualquer produção do intelecto (seja nos domínios industrial, científico, literário e/ou artístico) o direito de auferir, ao menos por um determinado período de tempo, uma recompensa pela própria criação. Segundo as normas estabelecidas pela OMPI - Organização Mundial da Propriedade Intelectual2 - a Propriedade Intelectual abrange duas grandes áreas: Propriedade Industrial (patentes, marcas, desenho industrial, indicações geográficas e proteção de cultivares) e Direito Autoral (obras literárias e artísticas, programas de computador, domínios na Internet e cultura imaterial). Como o debate acerca da Propriedade Intelectual está diretamente relacionado à inovação e à eficiência, torna-se necessário aprofundar sobre esses temas. Para o debate sobre inovação, é imprescindível remeter as contribuições de Joseph Schumpeter, como sendo um líder na abordagem do papel crucial das mudanças tecnológicas sob a trajetória das economias capitalistas. Os conceitos de eficiência sob o prisma econômico também serão expostos a seguir e terão substancial relevância para os argumentos ortodoxos a favor dos mecanismos de proteção intelectual.

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Em inglês WIPO – World Intellectual Property Organization. Segundo definição obtida no Portal do INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial – a OMPI, criada em 1967, é um dos 16 organismos especializados do sistema das Nações Unidas, de caráter intergovernamental, com sede em Genebra, Suíça. Sua função consiste em: 1. Estimular a proteção da Propriedade Intelectual em todo o mundo mediante a cooperação entre os Estados; 2. Assegurar a cooperação administrativa entre as Uniões de propriedade intelectual. 3. Estabelecer e estimular medidas apropriadas para promover, a atividade intelectual criativa e facilitar a transmissão de tecnologia relativa à propriedade industrial para os países em desenvolvimento em vista de acelerar o desenvolvimento econômico, social e cultural. Disponível em: <http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/patente/pasta_acordos/ompi_html>.

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2. O papel da inovação Joseph A. Schumpeter (1883-1950) é reconhecido como um dos maiores economistas do século XX. Sua obra Capitalism, Socialism and Democracy3 publicada em 1942, apresentou suas ideias sobre o processo de "destruição criativa". Schumpeter afirma que o sistema capitalista progride por sua capacidade de revolucionar constantemente sua estrutura econômica: novas firmas, novas tecnologias e novos produtos substituem constantemente os antigos. Com a inovação, a economia capitalista está, de forma natural e saudável, sujeita a ciclos de crescimento e implosão. O processo de destruição criativa promove as empresas inovadoras, que respondem às novas solicitações do mercado, e elimina aquelas sem agilidade para acompanhar as mudanças. Ao mesmo tempo, orienta os agentes econômicos para as novas tecnologias e novas preferências dos clientes; elimina postos de trabalho ao passo que cria novas oportunidades de negócios. Crítico da concepção tradicional do modus operandi do regime de concorrência perfeita, defende que a eficiência dinâmica da concorrência se dá no âmbito extra-preço, através de novas tecnologias, fontes de oferta e melhoria da qualidade dos produtos. Um pouco adiante em sua obra4, dada a importância conferida ao processo inovador, Schumpeter aponta a necessidade de mecanismos de proteção ao investimento do empresário inovador: “Praticamente qualquer investimento provoca, como complemento necessário da ação empresarial, certas ações de salvaguarda como o seguro. O investimento de longo prazo em condições de mudança rápida, especialmente sob condições que mudam ou podem mudar a qualquer momento sob o impacto de novas mercadorias e tecnologias, é como atirar num alvo não apenas indistinto, mas que se move – e aos solavancos. Dessa forma passa a ser necessário recorrer a artifícios protetores, como patentes ou segredos temporários de processos, ou, em alguns casos, contratos de longo prazo assinados por antecipação.” (Schumpeter, 1984, pág 118) Aprofundando a discussão, Schumpeter afirma que inovação precisa de recompensa, daí a economia dinâmica permitir enormes lucros ao inovador. O monopólio temporário – obtido através de mecanismos de IPR - é a forma de permitir que os inovadores ganhem com suas invenções. A desigualdade de curto prazo seria então o preço do progresso no longo prazo. O debate acerca da importância dos Direitos de Propriedade Intelectual – IPRs – como forma de fomentar gastos em P&D,no entanto, é bem mais antigo do que a sugestão de Schumpeter. No entanto, uma grande parte dos economistas e formuladores de políticas públicas compartilha a Versão em português utilizada como referência para esse trabalho: Capitalismo, Socialismo e Democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 1984. 3

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Vide capítulo VIII, com o título em português “Práticas Monopolísticas”.

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ideia schumpeteriana de que sem incentivos e mecanismos de IPRs – em especial, patentes – haveria pouco investimento em P&D e consequentemente um número menor de inovações (Carlton & Perloff, 2000). Esse debate será motivo de discussão no próximo tópico.

3. Incentivos a Investimentos em P&D Conforme apontado por Scherer & Ross (1990), inovações técnicas requerem investimentos e mobilizam esforços: o processo exige um trabalho criativo, de desenvolvimento, teste até a introdução do novo produto ou técnica no mercado. Em um grau crescente, a atividade de criação e desenvolvimento de novos produtos e processos tem sido institucionalizada nas empresas através de laboratórios dedicados a atividades de P&D. No entanto, é válido mencionar que a intensidade com que as empresas investem nessas atividades varia de acordo com a indústria e país. Conforme estudo dos autores, nos Estados Unidos, por exemplo, o setor manufatureiro é responsável por 97% do total de investimentos em P&D e, por conseguinte, o maior gerador de progresso tecnológico. Para avaliar os investimentos em P&D, além da análise do custo financeiro dos projetos é também necessário analisar os riscos envolvidos nesse processo. Nesse sentido, estudos empíricos desenvolvidos por Mansfield (1986) mostram que como uma regra geral, as empresas minimizam o risco técnico da seguinte forma: não começam a investir em um novo produto ou processo, até que as principais incertezas técnicas tenham sido apuradas através de pesquisas com custo mais baixo, conduzidas pela própria empresa ou até mesmo por terceiros. Outros riscos apontados estão em estimativas incorretas acerca da redução de custo que seria obtida com o novo processo e o comportamento da demanda frente ao novo produto. Dessa forma, porque uma empresa estaria disposta a realizar investimentos em P&D, desenvolvendo novos postulados, processos ou produtos se seus concorrentes poderiam se beneficiar ao utilizar essa informação sem nenhum custo adicional? Sem incentivos, o empresário não teria nenhum estímulo para investir em novas pesquisas e o processo de inovação estaria comprometido implicando em perda de bem estar social. Afinal, novos métodos produtivos, aumentam a produtividade e reduzem custos de produção existentes permitindo que a produção cresça com a mesma quantidade de insumo. Além disso, a inovação proporciona um salto de qualidade dos produtos e muitas vezes geram novas demandas. A partir das considerações acima, é intuitivo afirmar que alguma forma de incentivo às inovações se faz necessária. Inclusive, conforme exposto por Andersen (2000), essa é proposição básica de filósofos como Jeremy Bentham [1748-1832] e economistas utilitaristas clássicos, Adam Smith [1723-1790], Jean-Baptiste Say [1767-1832], John Stuart Mill [1806-1873] e John Bates Clark [1847-1938]: o IPR promove a perspectiva de remuneração e isso encoraja a criatividade e avanço tecnológico oferecendo incentivos para inventar, investir em P&D e 6


desenvolver novas ideias. Esses economistas defendem que na medida em que o IPR oferece algum tipo de recompensa (renda, lucro, payoff) para mentes criativas, há um estímulo a capacidade mental e dão a estas capacidades uma direção e oportunidades de desenvolvimento em coisas que sejam úteis. De uma forma geral, a autora descreve que a racionalidade da defesa do IPR como mecanismo de incentivo a inovação, reside em duas asserções: 1. Não haverá invenções, nem exploração econômica da invenção, sem os incentivos adequados (eles devem proporcionar lucros e rendas para valer a pena o risco corrido nos investimentos em P&D). 2. A forma mais barata de a sociedade fornecer estes incentivos é através do sistema de IPR5. Em seus estudos empíricos, Mansfield (1986) constatou que a estimativa de retorno privado dos investimentos em P&D é menor do que o retorno social (nesse caso, entendido como público). A razão para isso é que a essência das inovações está na informação e esta pode ser analisada como um bem público: não-excludente e não-rival. O conceito econômico de não-excludente está na impossibilidade de excluir o consumo de um indivíduo adicional, ou seja, não é possível privar a sua utilização. A informação, por sua vez, também pode ser considerada como um bem não-rival já que seu consumo não reduz a quantidade disponível para outros indivíduos, podendo ser “consumida” simultaneamente. Nesse sentido, as leis de proteção à Propriedade Intelectual ao estabelecerem um direito exclusivo por um período de tempo, tratam os dois problemas. Inicialmente, a proteção legalmente conferida já torna o bem excludente, já que o indivíduo passa a ter que pagar pelo uso da informação, através de royalties. Por outro lado a partir da publicação, todos os consumidores passam a ter acesso a informação. A legislação de Propriedade Intelectual tenta estabelecer um equilíbrio adequado entre incentivos à inovação e difusão dos resultados obtidos. Essa contradição entre uso e incentivo se traduz no trade-off entre eficiência estática e dinâmica, a qual será analisada a seguir.

4. Os conceitos de eficiência Estática e Dinâmica Lévêque & Ménière (2004), expõem de forma clara o conceito econômico de eficiência. A eficiência dinâmica pode ser concebida como o aprimoramento e renovação das técnicas produtivas e de bens de consumo ao longo do tempo. Ela representa o resultado do investimento em P&D.

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Ambas asserções serão posteriormente criticadas por outros economistas, como será visto ao longo desse trabalho.

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A concepção em torno da eficiência estática reside na alocação de recursos que maximiza o excedente social. Esse excedente consiste em parte do lucro do produtor – no gráfico abaixo, medida pela área entre preço e o custo marginal de produção – e do ganho do consumidor – medida pela área entre a curva de demanda e o preço. Abaixo são demonstrados os efeitos da eficiência da proteção patentária. A inovação reduz os custos de produção de c0 para c1. Antes da inovação, a quantidade de bens produzidos q0 era vendida ao preço de p0=c0, assumindo um mercado perfeitamente competitivo e em que o produtor não obtenha lucros extraordinários. Nesse caso, há somente o excedente do consumidor, representado pela área I no gráfico. Com a concessão da patente o preço se manterá em p0 e o excedente do consumidor não será alterado mas o excedente total será maior, já que o produtor se apropriará da área II que representa a redução dos custos de produção gerada pela inovação. Esse excedente é apropriado pelo inventor através da renda obtida com o licenciamento da técnica, estabelecida em r = c0 – c1 por unidade de insumo. Outras empresas continuarão sem obter lucros extraordinários porque sua receita p0 x qo se equivale a seu custo (c1 + r), ou seja, p0 x qo. Após o término de vigência da patente, o preço tende a cair para p1 e a quantidade aumentará para q1. Nesse momento, o total do excedente aumentará novamente, em função do aumento da parcela apropriada pelo consumidor, equivalente a área I + II + III. É válido notar que a redução de preço permitiu que um número maior de consumidores pudesse ter acesso ao produto, e já que a renda extraordinária obtida através do licenciamento da patente não existe mais o lucro do inventor volta a ser zero. Dessa forma, todo o excedente passa a ser do consumidor.

Durante a vigência da patente

Após expiração da patente

$

$

D

D

I

I c0

p0 II

II III

c1

0

c0

p0

q0

c1

p1

Q

0

q0

q1

Q

Fonte: Adaptado de Lévêque & Ménière. The Economics of Patents and Copyright, 2004.

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Richard Posner (1992) é outro defensor da ideia de que o IPR gera eficiência alocativa. A respeito da eficiência estática, ele acrescenta que com o sistema de IPR, as ideias seriam utilizadas e apropriadas pelos inventores mais eficientes, já que faria sentido para aqueles com eficiência menor, vender ou licenciar as mesmas. Seu argumento a respeito da eficiência dinâmica defende que em um mundo sem IPR, a atividade inventiva seria dirigida para invenções/inovações em que houvesse algum segredo tecnológico e que envolvam um mínimo de comprometimento com a inovação. Assim, o sistema de IPR cria incentivos para o uso dos recursos mais eficientemente em torno do planejamento e desenvolvimento dos recursos do conhecimento e a competição entre as inovações também motiva investidores a levar suas pesquisas na direção dos produtos/processos mais competitivos, que usam os recursos de forma mais eficiente (ou em direção a atributos mais desejados dos produtos pelos consumidores).

5. A lógica no uso das Patentes De acordo com Macedo & Barbosa (2000), a patente possui como base os princípios do “Contrato Social” de Rousseau, constituindo um acordo entre o inventor e a sociedade. O Estado concede o monopólio sob a invenção e, em troca, o inventor faz a sua divulgação permitindo à sociedade o acesso ao conhecimento desta. “A patente é um processo legítimo e necessário, assim como o melhor meio para remunerar os investimentos privados, de maneira a garantir a continuidade das invenções e a sua transformação em inovações difundidas e apropriadas” (Fonseca & Vieira, 2004, pág. 2) Dessa forma, a concessão de uma patente confere ao inventor o direito exclusivo da sua invenção durante um período de tempo. Conforme apontado por Fonseca & Vieira (2004), ao conferir o monopólio da exploração, as patentes garantem um novo e exclusivo mercado para os produtos patenteados, desde o momento da aprovação até o seu esgotamento, que pode variar entre 17 e 20 anos. Após esse período, os produtos passam a ser submetidos à pressão competitiva dos substitutos, o que acaba por influir na redução de margem de lucro dos produtos patenteados. Seguindo a linha da economia institucionalista a qual defende que as trocas não ocorrem num ambiente em que os direitos de propriedade são bem especificados e em que as informações relevantes não estão disponíveis sem custo6, Douglas North se destaca como um dos principais defensores dos Direitos de Propriedade Intelectual. A partir da visão de que os agentes incorrem 6

De uma forma geral, esse argumento representa um contraponto à teoria neoclássica a qual supõe que a interação entre os agentes se dá num ambiente harmônico, em que as trocas ocorrem sem atrito – sem custos.

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em custos para especificar seus direitos de propriedade e adquirir informações – ou seja, custos de transação – as instituições passam então a possuir papel decisivo para garantir a melhor forma possível de alocação de recursos. Nesse sentido, North (1990) defende que a única forma de transacionar ativos intangíveis – nesse caso, a informação – é protegendo-os institucional e legalmente, de forma que esses direitos sustentem taxas de retorno que compensem o investimento em P&D. Se o sistema de IPR for eficiente ele reduzirá os custos de troca de conhecimento e informação tecnológica. Os economistas Scherer & Ross (1990) também enfatizam a importância das patentes como mecanismo necessário para estimular a inovação. Partindo-se do pressuposto de que os fundos destinados a pesquisas de P&D possam ser considerados inicialmente como investimentos afundados na estrutura de mercado - sunk investments7 - uma forma de garantir a perpetuidade desses investimentos reside na ideia de que a empresa ou o inventor devem manter a expectativa de que o preço do novo produto a partir da sua comercialização seja alto o suficiente para que o valor presente dos lucros (ou quase-rendas8) exceda o montante dos fundos investido durante a fase de pesquisa e dos gastos com marketing. Ou seja, o inventor precisa ter a expectativa de aumentar sua competitividade e em algum grau obter um poder de monopólio. A patente, ao conferir o direito de venda e/ou licenciamento, permite que o empresário recupere o montante inicialmente investido. Através dos gráficos a seguir, os autores demonstram um comparativo entre dois cenários econômicos e buscam elucidar a lógica do funcionamento das patentes:

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Investimentos irrecuperáveis.

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Segundo Keynes (1992), o conceito de “Quase-renda” é definido pela capacidade do ativo de gerar uma renda, i. e, receita menos custos operacionais. Esta capacidade está diretamente relacionada à demanda efetiva pelo ativo. Quando a firma está em processo de decisão, ela deve considerar a demanda efetiva futura por aquele ativo, ou pelos produtos do ativo, no caso do mesmo ser um ativo de capital cuja operação resultará em produtos destinados à venda.

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Sem a proteção da patente

Com a proteção da patente $/Unidade

$/Unidade B

I

Custo Anual P&D

L P1

M

J

B

K

A

A

P1

X

Z

MC

P2 P3 M

E C W

Y

Z X

MR3

D1 MR1 0

Q1

MC

D3 D2

D1

MR2 Quantidade vendida por Ano

0

Q3 Q2 Q1

Quantidade vendida por Ano

Fonte: Adaptado de Scherer & Ross. Industrial Market Structure and Economics Performance, 1990.

A análise do primeiro cenário com a proteção da patente demonstra como o poder de monopólio gerado pela patente mostra-se necessário para a recuperação dos sunk costs em P&D. Considerando a linha MR1 como a receita marginal derivada da demanda e o custo MC, ao estabelecer o preço em P1, a empresa obterá lucros no montante da área P1AXM. Supondo de que a empresa financia seus gastos através de um empréstimo quitado anualmente e que esse montante equivale a área do retângulo IJKL, os lucros obtidos com o monopólio, deverão pelo menos ser suficientes para cobrir o custo do serviço da dívida. Além disso, a empresa monopolista não é a única ganhadora, afinal há um excedente do consumidor representado pela área BAP1. No segundo cenário não há proteção patentária nem barreiras para imitar o novo produto inserido no mercado. Em função da falta proteção assim que o novo produto entra no mercado, os competidores introduzirão seus produtos substitutos, o que fará com que a demanda se desloque para D2 e o novo preço caia para P2. Dessa forma, a função de receita marginal do inovador será novamente derivada e está representada por MR2, e é possível perceber que os lucros derivados da área P2EYM estão praticamente cobrindo a área correspondente ao custo da dívida anual do investimento em P&D (área IJKL do gráfico à esquerda). Scherer & Ross ainda em sua análise inserem a hipótese de que sendo o custo com a imitação muito baixo – a ideia de free-riding9 nos 9

O free-riding pode ser definido como um comportamento em situações com a presença de bem público, onde o agente consome mais do que a parcela justa de recursos.

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investimentos em P&D incorridos pela empresa inovadora - as firmas estarão realizando lucros extraordinários com o preço P2: como conseqüência, novas firmas serão atraídas para esse mercado e a curva de demanda se deslocará novamente para D3. A nova curva de receita marginal do inventor será agora MR3 e apesar de ainda lucrar, esse montante não será mais suficiente para quitar seu financiamento em P&D. Em suma, caso o inventor pudesse prever esse cenário sem IPR, não haveria incentivo em investir em P&D, já que os custos não seriam recuperados e os consumidores seriam privados de um novo produto, que mesmo em condição de monopólio ainda lhes proporcionava algum excedente. Aprofundando a análise, Scherer & Ross vão além e expõem o trade-off gerado pelos cenários: se houver investimento em P&D e esse culminar em uma inovação que não seja protegida pela patente, a imitação por parte dos concorrentes faria com que o preço caia até o nível competitivo (P0), sem que inventor recupere seu investimento. Nesse caso, o consumidor se apropriaria do excedente P1AXM, anteriormente do produtor e mais adiante, atingindo a produção em QC, o consumidor se apropriaria de mais uma parte de excedente, representada pela área AZX. A conclusão dessa análise é que o poder de monopólio conferido pela patente impõe uma perda de no montante AZX e dessa forma, os sistemas de patentes geram um custo para a sociedade na medida em que privam o consumidor de obter essa parcela do excedente. Entretanto, não havendo patentes, se os inventores já esperam que sua inovação seja rapidamente imitada eliminando seus excedentes, não haverá investimentos em pesquisa, inovação e progresso tecnológico. Novamente o dilema da eficiência já visto anteriormente surge como questão intrínseca ao sistema de patentes. Remetendo aos utilitaristas clássicos, essa discussão sobre monopólio versus eficiência da proteção patentária já foi também muito debatida por teóricos como Jeremy Bentham e Adam Smith. Bentham10, conhecido como defensor da proteção patentária argumentava que o monopólio advindo de um mecanismo de IPR não poderia ser analisado como outras formas de monopólio (e.g. monopólio natural). Adam Smith, que proclamou suas ideias em defesa do livre comércio, admitia que apesar das práticas monopolísticas afetarem a alocação de bens na sociedade, um monopólio temporário em virtude do IPR seria justificado como forma de remunerar o inventor pelos seus gastos e riscos incorridos. Nessa altura e seguindo a linha de argumentação a favor das patentes, é válido destacar outras proposições:

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Baseado em Andersen (2000).

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Patentes aumentam o custo da imitação

Carlton & Perloff (2000) fazem referência ao estudo de Mansfield (1986), onde demonstra que o custo do imitação é maior quando há proteção patentária. Em última instância, a patente no mínimo reduz o tempo de entrada dos concorrentes no mercado. Entre 48 firmas entrevistadas, a estimativa média de aumento do custo da imitação em função das patentes é de 11%, variando conforme a indústria, chegando a 30% no segmento farmacêutico, 10% no químico e reduzindo para 7% no setor de eletrônicos. •

Patentes estimulam a difusão de novas ideias

Além de Carlton & Perloff, outros economistas como Paul David, Trond Olsen, Luis RiveraBatiz e Paul Romer, argumentam que ao prover a proteção patentária para o inventor, a sociedade obtém dois importantes benefícios: maiores incentivos a atividades de pesquisa e aceleração da inovação através da disponibilização pública das invenções11. Segundo Fonseca (2008) a publicação da patente amplia a possibilidade de alguém, que não seu proprietário, usar a informação nela contida e produzir um produto/serviço que venha a competir com a ideia original. Essas situações são comuns, por exemplo, em atividades de pesquisa de códigos genéticos. Até aqui foram expostas as argumentações a favor de patentes e em defesa do IPR como um todo. Entretanto, na comunidade científica e acadêmica são comuns as reações contrárias à proteção conferida por esses mecanismos em função de algumas mazelas causadas pelo comportamento monopolista. Na próxima seção serão expostas as visões de economistas que se opõem ao IPR e as sustentações de seus argumentos.

6. Questionamentos econômicos sobre a eficiência do IPR 6.1. A eficiência do IPR no estímulo à inovação Na literatura econômica, alguns autores criticam a ideia de que o IPR seja necessário para incentivar investimentos em inovações. Economistas como Frank William Taussig [1859-1940] e Arthur Cecil Pigou [1877-1959] argumentavam que IPRs eram supérfluos e desnecessários, já que classificavam a invenção como uma atividade acidental; uma propriedade herdada geneticamente. Posteriormente, segundo Andersen (2000), essas ideias foram amplamente criticadas já que as evidências empíricas sugerem que as inovações são fruto da especialização de cientistas e do seu trabalho árduo em inventar novas ideias.

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Esse debate será aprofundado na seção 8 que trata da relação entre IPR e Spill-Over.

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Kenneth Arrow (1962) é um dos mais famosos críticos sobre os incentivos econômicos criados pelo IPR. Arrow defende que a proteção patentária pode ser insuficiente para estimular investimentos e garantir a criação de novos mercados. Na verdade, o sistema de IPR subremuneraria o autor da invenção e as razões para isso estariam relacionadas a problemas de incerteza, indivisibilidade e apropriabilidade: i.

Incerteza: Arrow argumenta que não há garantia de que os esforços de P&D serão totalmente recompensados, na medida em que existe incerteza e risco associados aos investimentos em P&D que não podem ser inteiramente calculados porque a inovação envolve informações incompletas. Mesmo sob a proteção patentearia, prevalecerá o comportamento de aversão ao risco por parte dos inventores, o que leva ao subinvestimento

ii.

Indivisibilidade: O investimento na produção de conhecimentos também não é tão eficientemente comercializado quanto outras formas de investimento, devido à natureza indivisível das ideias/conhecimento. Segundo Andersen (2000): “(…) uma vez que uma ideia seja compartilhada ou vendida não há mais necessidade de o usuário desta ideia voltar atrás para obter mais conhecimento. Ou seja, as possibilidades de uso de uma ideia ou informação são infinitas e nunca enfrentam retornos decrescentes de escala, o que torna a natureza do mercado de ideias muito diferente do mercado de outros bens ou commodities. (...)” (Andersen, 2000, pág 9)

iii.

Apropriabilidade: Segundo Arrow, o problema da apropriabilidade decorre do fato de que talvez o inventor não consiga ser o indivíduo mais apto a explorar a sua invenção comercialmente garantindo o retorno de seus investimentos (uma vez que há incerteza). A apropriabilidade também inclui problemas relacionados a gerenciamento dos custos de transação dos sistemas de IPR. Andersen (2000) expõe que esses custos não são triviais e podem reduzir a eficiência do IPR como mecanismo de incentivo a inovações12.

Entretanto, vale ressaltar que Arrow não se opõe ao sistema de IPR. Ele acredita que esse mecanismo seja útil quando se trata de criar um mercado de ideias e estimular a atividade inventiva, mas seu principal contraponto é de que há perdas associadas a este processo (Fonseca 2008). De fato, as trocas de conhecimentos e informações são estimuladas pelo IPR, mas esta proteção pode ser relativamente ineficiente no sentido de impedir que o autor da informação, conhecimento ou ideia mantenha o controle econômico da mesma. Assim, o IPR ou a patente é apenas uma barreira parcial pois não há como impedir que as informações se espalhem (efeito spill-over) em função por exemplo, do intercâmbio de funcionários entre empresas. 12

Esse argumento será posteriormente detalhado.

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Outro ponto levantado por Arrow é que a publicação da patente amplia a possibilidade de alguém, que não seu proprietário, usar a informação nela contida e produzir um produto/serviço que venha a competir com a ideia original Além disso, a demanda sobre a informação ou sobre a ideia pode não ser otimamente definida já que o valor da informação para o comprador ideia não é totalmente conhecido até que seja revelado, após a compra (disclosure problem). 6.2. IPR é o mecanismo mais barato para estimular inovações Conforme exposto anteriormente, os autores que defendem o mecanismo de IPR acreditam que além de incentivar a inovação, os custos impostos pelos sistemas de propriedade intelectual são considerados baixos e triviais. Entretanto, há um debate acerca dos custos sociais envolvidos, que não parecem ser irrelevantes. Alguns argumentos merecem destaque: •

Custo de oportunidade do investimento em trajetórias tecnológicas arbitrárias: Arnold Plant (1937) criticava o sistema de patentes, já que em sua concepção o mesmo pode eventualmente incentivar o desenvolvimento de inovações num campo de pesquisas que talvez não seja o mais promissor; desta forma pode desviar o esforço inovador envolvido em trajetórias tecnológicas que poderiam ser mais bem sucedidas.

Custo de Oportunidade em privar outros da solução mais eficiente: Supondo que a invenção seja o resultado de um processo social em que muitos contribuem, Plant (1934) argumenta que a proteção da patente restringe outros a usar a ideia que possuíam antes – perdem a oportunidade de utilizar a mesma ideia que com a patente passa a ser monopolizada.

• Custo da perda de bem-estar em caso de amplo escopo da proteção patentária: Merges e Nelson (1990) afirmam que quanto maior é o escopo da ideia protegida, maior é o custo social para a o resto da sociedade, pois pode haver uma especialização em torno de inovações muito caras em vez de simplesmente imitar (custo menor), como uma forma der evitar a faixa de mercado já monopolizada pelo detentor da patente. Uma alternativa de redução desse custo seria através da imposição de licenças compulsórias13. • Custo de administração para aplicação e manutenção de contratos de patentes e royalties: Andersen (2000) enfatiza que há custos relevantes no processo de obtenção e manutenção dos contratos de patente e royalties, tais como pagamento de taxas públicas, advogados, gerentes de portfólio, burocracia, administração, custos de recorrer disputas jurídicas.

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A licença compulsória também é citada como alternativa ao monopólio por Scherer.

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“Custo do pânico”: Andersen (2000) argumenta que de certa forma, o sistema de patente aumente a apreensão do empresário de que seus competidores estabeleçam barreiras estratégicas. Assim, estes começariam a patentear tudo o que se imagina relevante para garantir o monopólio, e consumiriam recursos financeiros valiosos neste processo.

• Royalties como custos sociais: Esse argumento remete ao ponto colocado anteriormente a respeito da eficiência estática14. A questão é que se o empresário tem que pagar royalties ao inventor do produto que eles produzem, o preço do bem excede o custo marginal (Preço = Custo Marginal + Custo Royalties) e isso reduz o bem estar dos consumidores. Até aqui foram expostos argumentos relacionados à racionalidade do IPR como incentivo à inovação e à alocação de recursos. Entretanto, a apresentação de outro importante debate se faz necessária: trata-se da relação entre o fenômeno de spill-over15 e o mecanismo de proteção aos direitos de propriedade intelectual. O tópico a seguir demonstra algumas das principais contribuições na literatura econômica sobre o tema.

7. IPR e Spill-Over O debate a respeito do aumento de spill-over através da concessão de uma patente ou de um direito autoral (copyright) é também freqüente nos estudos sobre IPR. A racionalidade é que para alguns autores, o IPR facilita a difusão de conhecimento e esforços criativos ajudando a difundir novas tecnologias em ampla escala e aumenta a rapidez das inovações levando ao desenvolvimento tecnológico. Conforme fragmento abaixo, essa posição pode ser assim sintetizada: “ A patente é uma unidade contraditória: protege o inventor mas também o desafia ao facilitar a geração de novas invenções por terceiros, induzindo o próprio titular a prosseguir inventando para se manter à frente de seus competidores. Em outras palavras, a propriedade temporalmente limitada e o interesse público da informação divulgada – razão-de-ser público e privado da patente – é um instrumento de promoção do desenvolvimento tecnológico.” (Macedo & Barbosa, 2000, pág. 20) A seguir serão colocados os argumentos da racionalidade econômica do IPR em incentivar spillover bem como outros autores que questionam a existência desses incentivos. Segundo Andersen (2000), o primeiro grupo defende que o processo de garantia dos direitos de propriedade para inventores pode ser visto como um contrato (com o governo) no qual o inventor 14

Revisar a seção 4 desse trabalho.

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O termo spill-over pode ser traduzido como transbordamento de ideias; informações.

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consente em liberar a informação ou ideia em questão, mediante recompensa. Nesse caso, já que a natureza da informação é não-rival, os direitos de exclusividade permitirão o inventor a explorar a ideia ou apropriá-la como conseqüência exploração do valor do capital intelectual. Essa relação de causa e efeito pode ser vista, por exemplo, na concessão de direitos autorais para a publicação de livros: esse mecanismo proporciona informações imediatas a outros competidores que podem incorporá-las em suas bases próprias de conhecimento, mesmo que não possam comercializá-los. O sistema de IPR permitirá o descolamento de invenções, atuando com um incentivo e que passa fazer parte do acervo de conhecimentos da sociedade Neste caso a proteção não é considerada um privilégio do inventor, mas uma questão de barganha entre a sociedade, que pode ser mediada contratualmente através do Estado. Os economistas neoclássicos Rivera-Batiz & Romer (1991) propõem um modelo de crescimento econômico endógeno onde IPR é responsável por proporcionar spill-overs de informações tecnológicas e acumulação de conhecimento que contribuem para o desenvolvimento. Segundo os autores, os detentores de patentes acabam não conseguindo evitar que haja apropriação de parte do conhecimento associado às patentes (antigos projetos) para novos produtos. O estoque de conhecimento que é disponibilizado pelo IPR pode ser definido como todo o estoque de conhecimentos em torno de uma classe anterior, o que reforça que o sistema de comunicação criado pelo mecanismo de IPR é eficaz em agregar novos conhecimentos e impulsionar o desenvolvimento tecnológico. O modelo anteriormente citado é ainda complementado pelos economistas Olsen e David, citados por Andersen (2000). Estes autores afirmam que as patentes podem levar a um aumento do bem-estar social se houver externalidades de aprendizagem com spill-over. O argumento sustenta que as patentes promovem maior eficiência econômica ao aumentar a velocidade do processo de aprendizado (learning-by-doing) e assim, a difusão tecnológica. 7.1. Os críticos a racionalidade do aumento do spill-over com IPR Economistas como Fritz Machlup e Edith Penrose (1950) fazem contrapontos aos argumentos a favor da racionalidade do spill-over. Seus principais argumentos são: • Seria praticamente impossível manter segredos e o conhecimento se tornaria público mesmo sem o mecanismo de patentes. O competidor ávido por informações buscará obter essas ideias de forma alternativa, como por exemplo, através de engenharia reversa ou espionagem. • Nos casos em que os inventores acreditam que irão ser bem-sucedidos mantendo segredo sobre sua invenção, eles não irão utilizar um método de proteção patentária. Dessa 17


forma, eles acreditam que o empresário só busca a patente quando o segredo não possa ser mantido ou quando acha que seu concorrente está desenvolvendo uma ideia similar. • Já que as patentes somente são concedidas após um estágio avançado da inovação, o sistema de IPR incentiva o segredo durante a fase de desenvolvimento. Se não houvesse a proteção da patente, o inventor tenderia a tornar sua invenção pública o mais rápido possível a fim de assegurar reconhecimento perante o mercado e seus concorrentes. O argumento é que se as ideias fossem publicadas mais cedo, elas estariam disponíveis em intervalos de tempo mais curtos estimulando a inovação de forma mais rápida.

Conclusão O propósito desse trabalho foi apresentar as diferentes visões de autores na literatura econômica com relação à eficiência (estática e dinâmica) do sistema de IPR no estímulo à inovação. Conforme exposto, os defensores do IPR acreditam que ao remunerar o inventor e proporcionar uma barreira à entrada, o sistema amplia os incentivos a inovação e que o aumento da eficiência dinâmica compensa os efeitos negativos da perda de eficiência estática. Em outras palavras, o monopólio advindo da proteção intelectual representa o custo social do sistema para garantir a perpetuidade das inovações e do desenvolvimento tecnológico. Além disso, o estabelecimento de um sistema padrão internacional ajudaria a uniformizar e organizar as bases de conhecimento científico, facilitando a adoção de contratos na compra e na venda de conhecimento e aumentando o transbordamento de novas ideias. Em se tratando especificamente das patentes, segundo a OMPI16, o argumento racional a favor destas é que elas estimulam o desenvolvimento econômico e técnico e promovem o aumento de competitividade a partir da criação de um incentivo financeiro para o inventor em troca da divulgação da sua inovação. Nesse sentido, uma das principais funções do sistema de patentes está na disseminação de informação técnica que pode ser utilizada para fins científicos e experimentais constituindo assim uma base para adaptação e contínuo aprimoramento de novas tecnologias. Do outro lado, os opositores criticam a ideia de que o IPR possa ser a forma mais barata de incentivo à inovação e comercialização do conhecimento ao apontar uma série de custos inerentes a esse processo e que não são usualmente observadas. Da mesma forma, segundo Andersen (2000), há alguns fatores importantes que não são levados em consideração nos modelos teóricos de maximização de lucro, tais como interdependência tecnológica e interação estratégica entre os competidores. 16

Traduzido do site da WIPO. Disponível em < http://www.wipo.int/patent-law/en/developments/research.html>

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De uma forma geral, o debate é importante no sentido de agregar visões às políticas públicas de proteção intelectual e não impede a afirmação de que as iniciativas de organismos governamentais vêm buscando fortalecer medidas de cooperação e incentivo ao progresso técnico e cultural. Entretanto, fica evidente que em se tratando de um bem intangível, o rumo dessas políticas deve ser ainda mais cauteloso: afinal já é de senso comum que o conhecimento e o avanço tecnológico são fundamentais para impulsionar o desenvolvimento econômico de qualquer nação.

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Referências Bibliográficas ANDERSEN, B. If Intellectual Property Rights is the Answer, What is The Question? Revising Patents Controversy. Economics of Innovation and New Technology Review, 2002. (Trabalho aceito para publicação). ARROW, K. Economic Welfare and the Allocation of Resources for Inventions, the Rate and Direction of Inventive Activity: economic and social factors. Princeton/NBER, 1962. BARBOSA, A.L.; MACEDO M.F. Patentes, Pesquisa & Desenvolvimento: um manual de propriedade intelectual. Rio de Janeiro, Editora Fiocruz, 2000. CARLTON, D., PERLOFF, J. Modern Industrial Organization. N. York: Harper Collins, 2a ed., 2000. FONSECA, M. G. D. Discussão sobre a Racionalidade da Proteção Intelectual e Patentária. Curso de Propriedade Intelectual Oferecido ao PPGB. Notas de aula. 65p. Digitado. 2008. INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL. Contém informações institucionais, notícias, publicações e serviços. Disponível em <www.inpi.gov.br>. Acesso em: 4 mar. 2009. KEYNES, J. M. Movimentos Relativos dos Salários Reais e da Produção. reimpresso em A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, São Paulo, Editora Atlas, 1992. LÉVÊQUE, F.; MÉNIÈRE, Y. The Economics of Patents and Copyright. The Berkeley Electronic Press. Paris, 2004. MANSFIELD, E. Patens and Innovation: An empirical study. Management Science, 173-181. 1986 MATCHLUP, F.; PENROSE, E. An Economic Review of the Patent System: Study of the Subcommittee on Patents, Trademarks and Copyrights of the Committee on the Judiciary, US Senate, 85th Congress, 2nd Session, Study Number 15, Washington: United States Government Printing Office, 1-86, 1950. MERGERS, R; NELSON, R. On the Complex Economics of Patent Scope, Columbia Law Review, January, 1990. NORTH, D. Institutions, Institutional Change and Economic Performance, Cambridge, Cambridge University Press, 1990. 20


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