CASA DO POVO REOCUPAÇÃO E PROJETO NO BOM RETIRO
TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO DEZEMBRO DE 2013
CASA DO POVO REOCUPAÇÃO E PROJETO NO BOM RETIRO
ILAN SZKLO PROF. ORIENTADOR ANTONIO CARLOS BAROSSI
Agradecimentos Gostaria, em primeiro lugar, de agradecer à meus pais pela infinita paciência e apoio nesses tantos anos de FAU. A meu orientador, o Barossi, sem o qual este trabalho teria tomado um rumo provavelmente muito diferente (para pior). A Elisa, colega de FAU, pela imensa ajuda na elaboração dos desenhos de levantamento. A todo pessoal do ICIB e os envolvidos na Casa do Povjo pela generosa receptividade, em especial Amanda, Benjamin, Daniel, Fábio, Jairo, Lilian, Mari, Marina, Mila e Paul. Aos colegas arquitetos que me acompanharam por toda essa trajetória até a execução deste trabalho, principalmente Vini, pela enorme ajuda na reta final. Um agradecimento especial a Julia, como não podia ser diferente, sempre presente apesar da distância.
Introdução Numa cidade com a dinâmica da metrópole paulista, a volatilidade dos espaços é uma característica intrínseca, seja pelas constantes demandas sociais, seja pela financeirização dos espaços, seja pela intervenção do estado. Lugares que já apresentaram uma vida cultural em constante ebulição e um intenso convivio social, hoje sofrem de abandonos e espaços ociosos. Essa descrição cabe a quase todos os bairros da região central da nossa cidade, mesmo que nos últimos anos estes tenham sido alvo de um novo interesse por parte da classe média. Este é um fenômeno, aliás, que verificamos em diversas metrópoles ao redor do globo. É neste movimento de retomada dos espaços centrais da cidade que figura a Casa do Povo, antigo reduto da esquerda judaica e progressista do Bom Retiro. O edifício da Rua Três Rios funcionava como um centro cultural abrigando uma série de usos como o TAIB (Teatro de Arte Israelita Brasileiro), o Colégio Scholem Aleichem e a edição do jornal ‘Nossa Voz’. Sendo um lugar de caráter experimental e de formação crítica por excelência, teve sua relevância na
resistência contra a ditadura militar. É um exemplo claro de um espaço que teve uma importância não só para o bairro como para toda a cidade, mas que até há pouco tempo se encontrava subutilizado, praticamente abandonado. Projeto do engenheiro-arquiteto Ernest Mange, é inaugurado em 1953 pelos imigrantes judeus advindos da europa oriental, em memória aos mártires da Segunda Guerra Mundial, rapidamente se convertendo num verdadeiro centro comunitário, formador de jovens com uma postura universal progressista. Teve seu período áureo nos anos 60 e 70 e mesmo com a repressão nunca deixou de ser um centro de formação crítica e política, pelo contrário, as peças encenadas nos subsolos da Casa do Povo, onde estava instalado o TAIB, eram uma das maiores representações de toda aquela cultura e efervescência que se encontrava nas ruas do Bom Retiro nesse período. Em 2013, ao completar 60 anos, o equipamento cultural passa por um processo de retomada de suas atividades e o tema deste trabalho final de graduação dialoga exatamente com essa realidade. Foi como expectador de ‘Bom Retiro - 958 metros’ do grupo Teatro da Vertigem, peça itinerante que se apropria das ruas do bairro de mesmo nome e também de seus espaços degradados, como o TAIB, que surgiu meu interesse e grande curiosidade a respeito dessa edificação até então ‘desconhecida’. A partir de um contato inicial com o ICIB (Instituto Cultural Israelita Brasileiro), associação que ergueu e cuida do espaço até os dias de hoje, deu-se início ao desenvolvimento do trabalho. O local conta com um impressionante acervo contendo diversos tipos de documento, desde contratos da época de sua construção até as atas das assembléias dos associados, desenhos de arquitetura originais do projeto bem como uma biblioteca com 5.000 volumes, sendo 4.000 destes em ídiche, dialeto popular dos judeus do leste europeu. Este rico material foi fundamental para a pesquisa aqui apresentanda. Como síntese de toda as experiências que vivenciei ao longo deste ano e documentadas nesse caderno, procurei repensar a Casa do Povo, seus espaços e seus usos, com um projeto que busca inserir este centro de experimentação na contemporaneidade ao mesmo tempo que reforça seu caráter de monumento vivo.
[capítulo 1]
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AGRADECIMENTOS
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INTRODUÇÃO
Os anos de formação 11
A construção de uma identidade
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O bairro imigrante
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Time do povo
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Educação formal
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Arquitetura eclética
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Novas misturas
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Exceção da exceção
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O Bund
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Um recomeço
[capítulo 2]
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O ikuf
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Vanguarda pedagógica
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Cultura bilíngue
A construção e os anos de proeminência 31
Mange e a Casa do Povo
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Arquitetura do edifício da rua Três Rios
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Palácio dos Soviéticos
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Partido estrutural
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Distribuição das atividades
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Fiel às ideias
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Ansiedade
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O entorno
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A grande inauguração
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Um sala adormecida
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Jovem arquiteto
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O teatro de arte israelita brasileiro
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O teatro popular do sesi
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Diversidade no palco
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Cena teatral paulistana
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Tempos difíceis
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Volta às atividades
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Dura realidade
56
Pluralidade em voz
56
Intenções
[capítulo 3]
[capítulo 4]
A Casa do Povo hoje 67
Um primeiro olhar
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Voltando às origens
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A escolha de um tema
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Lote#2
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Laboratório de Crítica Cultural
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Exposição Oásis
72
Tijuana
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Seminário Casa do Povo 60 anos
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Cidade Em Cena
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Nós Brasil! We Brazil!
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Vem por aí
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Novos desafios
Projeto 81
Levantamento do edifício
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Processo e metodologia
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Estrutura existente
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Definição do programa e área de intervenção
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Propostas de uso e ocupação
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O partido de projeto
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Referências projetuais
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Projeto
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BIBLIOGRAFIA
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CRÉDITOS IMAGENS
[capítulo 1]
Os anos de formação
Fruto da construção do coletivo e para o coletivo, a Casa do Povo e sua história pronlonga-se muito além da edificação situada na movimentada Rua Três Rios. Toda a pesquisa histórica realizada ao longo do ano acabou provando a necessidade de um estudo e uma análise mais abrangente, englobando os diversos contextos e agentes sociais envolvidos na narrativa, não se restringindo somente ao extenso acervo do ICIB. Pode-se afirmar que a presença do instituto transbordava para todo o bairro dado que a maioria das atividades que vieram acontecer em seus espaços representam ou estão diretamente relacionadas com os costumes, as tradições e a cultural da comunidade que o ergueu. Para tanto foi indispensável compreender as origens deste grupo específico de pessoas, na sua grande maioria imigrantes, sua posição política e a relação que construiram com sua nova pátria.
A construção de uma identidade O que viemos a conhecer como a Casa
do Povo ou o Instituto Cultural Israelita Brasileiro é na realidade somente um capítulo de um longo processo pelo qual passou a comunidade judaica no bairro do Bom Retiro. Apesar de extremamente heterogênia, formada por grupos com visões políticas distintas, advinda de toda Europa, Oriente Médio e norte da África, caracterizou-se por ações progressitas e que buscavam auxiliar na integração do novo imigrante. Uma de suas características notáveis era a constante tentativa de se replicar a estrutura e os arranjos sociais de seus países de origem mas de uma forma adaptada buscando sua inserção na sociedade brasileira. A presença judaica no bairro começa a ser notada a partir do fim do século XIX e início do XX, com os primeiros imigrantes instalando-se nos arredores da estação da Luz. Já o período abrangendo a primeira metade do século passado pode ser considerado como os anos de definição e sedimentação de uma identidade judaico-brasileira, com a criação de suas escolas, instituições e sinagogas. Elas tiveram papel fundamental de enfrentamento à ditadura do Estado-Novo, num tempo de nacionalismo exarcebado e práticas restritivas quanto à línguas e culturas estrangeiras. Ao mesmo tempo serviram como base ajudando na transição de uma comu-
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nidade que se considerava imigrante e que agora se afirma como constituida de judeus brasileiros, com suas questões ideológicas e práticas distintas. É o que salienta o historiador Roney Cytrynowicz num estudo sobre as relações entre os judeus e o governo brasileiro, justamente nesse recorte de 1937 a 1945: Com a liberdade religiosa e cultural, social e institucional, e a possibilidade de ascensão social, a população judaica de São Paulo pôde afirmar publicamente e com altivez uma identidade judaica e brasileira, e foram os anos 1930 e 1940 que criaram as condições 1. Roney Cytrynowicz. Além do Estado e da ideologia: imigração judaica, Estado-Novo e Segunda Guerra Mundial. Revista Brasileira de História, v. 22, n. 44, 2002. p. 406.
para um verdadeiro boom de atividades institucionais, sociais, culturais e políticas iniciadas ainda em 1945. 1
Embora na época o discurso oficial do governo se aproximasse do fascismo a sociedade como um todo não correspondia nesta mesma direção e a cultura popular não foi suplantada pela cultura oficial, o que permitiu, como pode se constatar, no florescimento das diversas coletividades que haviam se instalado no Bom Retiro. O contexto e a dinâmica deste que é um dos bairros mais característico da história paulistana também contribuiu, de certa forma, para a integração desses indivíduos das mais diversas origens na sociedade brasileira.
O bairro imigrante Apesar das sucessivas ondas de imigração que aqui se
fixaram, criando raízes e construindo toda essa peculiaridade que notamos até hoje, o bairro do Bom Retiro, como o nome já indica, foi um retiro de fim de semana da população mais abastada de São Paulo durante boa parte de sua história. Foi integrado à cidade provavelmente no começo do século XIX quando a futura metrópole ainda se restringia à colina histórica. Lá se encontravam diversas chácaras e uma delas deu origem a seu nome quando a região começou a ser loteada. Num segundo momento, com a expansão urbana e a chegada da ferrovia, as ocupações de caráter industrial começaram a prevalecer, tanto pela localização estratégica do bairro quanto pela oferta de mão-de-obra dos inúmeros imigrantes que chegavam quase ininterruptamente pela Estrada de Ferro Santos-Jundiaí.
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1 Fábrica da Ford nos anos 20
Por sua proximidade com a várzea do rio Tietê, de onde extraiam grande fonte de matéria-prima, ali se instalaram as primeiras olarias da cidade, sendo a Olaria Manfred de 1860 a mais notória. Foi também o local da primeira fábrica de automóveis do Brasil com a Ford se instalando na rua Solon em 1921. O edifício ainda se encontra no local mas foi gradativamente desativado com a inauguração de uma nova fábrica na Vila Prudente em 1953. Estes são só alguns poucos exemplos pesquisados mas que mostram a importância da região na formação da indústria paulista como um todo.
Time do povo As marcas desse passado industrial também se confundem e se
misturam com os diversos grupos que conviveram nas ruas do Bom Retiro. A história do futebol, por exemplo, também tem suas raízes no bairro. Muitos ingleses, funcionários da ferrovia São Paulo Railway, eram donos de chácaras nas proximidades da Estação da Luz. Ao se mudarem para o Brasil taziam consigo um pouco de sua cultural, obviamente. Antes da urbanização mais acentuada os grandes terrenos das propriedades eram usados inicialmente como campos de críquete e mais tarde, ao final do século XIX, para a prática do futebol. A Chácara
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2 Equipe do Corinthians em 1914
3 Edifício da Faculdade de
Dulley, onde hoje se encontra a Fatec, é dita como o local dos primeiros treinos
Farmácia e Odontologia
do esporte no país. Foi nesse ambiente que nasceu um dos mais tradicionais times
da USP no fim dos anos 50
da cidade, o Sport Club Corinthians Paulista, fundado por cinco operários em 1° 4
de setembro de 1910.
Edifício Paula Souza nos anos 40
Educação formal Além dessas diversas narrativas representativas sobre
a cultura dos imigrantes como também a influencia da indústria, da ferrovia, enfim, do desenvolvimento do capital privado, o Bom Retiro ainda foi fortemente marcado por ter abrigado importantes instituições públicas de ensino. Fundada em 1898 a Escola Livre de Pharmacia de São Paulo se muda, em 1905, para a rua Três Rios no edifício onde hoje funciona a Oficina Cultural Oswald de Andrade. Logo em frente, do outro lado da rua, encontramos o Colégio Santa Inês, uma escola tradicional que iniciou suas atividades no bairro em 1907, com uma proposta de educação formal só para meninas.
Arquitetura eclética Já na atual Praça Fernando Prestes, na saída da esta-
ção Tiradentes da linha azul do Metrô, podemos presenciar dois exemplares da arquitetura de Ramos de Azevedo que atualmente abrigam o Arquivo Histórico Municipal. O edifício Paula Souza, inaugurado em 1899, foi projetado especialmente para abrigar a Escola Politécnica e o edifício Ramos de Azevedo, de 1920, inicialmente abrigou o Gabinete de Eletrotécnica. Com a criação da Universidadade de São Paulo em 1934, e com o andamente das construções de seu campus no Butantã, as diversas instituições foram aos poucos migrando ao passo que já no fim década de 50 muitos desses edifícios históricos se encontravam subutilizados. Não obstante é importante frisar que a dinâmica da vida estudantil universitária, com todas suas manifestações e peculiaridades, integraram durante um bom tempo o cotidiano do Bom Retiro.
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Novas misturas Todas essas mesclas de situações, com suas inúmeras cama-
das e tecidos históricos, são facilmente verificadas bastando um breve passeio pelas calçadas de um dos mais importantes centros de confecção da atualidade. Novas ondas de imigração aconteceram ao longo das últimas décadas com a chegada dos coreanos nos anos 70 e, mais recentemente, dos bolivianos. É interessante notar que essa característica plural com pessoas de diversas origens, religiões e culturas permanece. Quarenta anos atrás uma reportagem descrevia da seguinte forma uma das rua mais famosas desse bairro: Em suma, a Rua da Graça é o centro de um verdadeiro caleidoscópio social, cultural e 2. Shopping News. 15 de março de 1970.
racial. Uma cantina italiana ali serve excelentes massas e uma famosa “charlotte”; num restaurante grego-israelita, especializado em comidas do Mediterrâneo oriental (car-
3. Joana Bahia. A dimensão política do refúgio. Uma análise dos ativistas políticos da Casa do Povo (1940-1960). Trabalho apresentado na 26ª. Reunião Brasileira de Antropologia, realizada entre os dias 01 e 04 de junho de 2008, Porto Seguro, Bahia, Brasil.
neiro, peixes e mariscos, regados a “uzo”, aguardente parecida com o “araque” árabe), ouvem-se curiosos falares gregos, judeus, espanhóis e até franceses. Finalmente, a maior atração: o grande comércio de roupas brancas, confecções e malharias onde os fregueses podem pechinchar à vontade para obter bons preços. 2
Essa grande heterogeneidade sempre conviveu e convive sem grandes conflitos, talvez pelo fato de todos terem um fator em comum: a busca por uma identidade brasileira própria, inserindo-se, por fim, de uma maneira mais justa na sociedade. Ambiente esse mais do que propício e que possibilitou, ao longo das primeiras décadas do século passado, a estruturação e o convívio de uma comunidade que construiu um centro cultural notável, a Casa do Povo.
Exceção da exceção O ICIB, Instituto Cultural Israelita Brasileiro, como já
brevemente mencionado, surgiu na realidade precedendo uma série de clubes e instituições ligadas aos judeus advindos da europa oriental e que tinham fortes relações com o movimento judaico-operário, representado pela organização trabalhista conhecida como Bund. Eram em sua grande maioria ativistas de esquerda e acabaram por se destacar dentro da prórpria comunidade que, apesar de
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compartilhar idéias progressistas, não tinha a mesma visão política. Se viram muitas vezes isolados justamente por essas escolhas e opções mas nunca abandonaram suas convicções. Essa comunidade “diferenciava-se do entorno por sua condição judaica, mas, também no próprio interior da comunidade judaica por sua condição de militantes de esquerda. Talvez por essa dupla idenditade diferenciadora, seus membros detacam-se também por um grande gregarismo.” 3 Para uma melhor compreensão dessa dinâmica interna da comunidade judaica do Bom Retiro bem como do contexto específico desse grupo de indivíduos e sua cultura, sua posição política e seu modo de vida, foi necessário debruçar-me sobre suas origens e as circunstâncias que os trouxeram até aqui. Ao observarmos essa parte de sua história fica muito mais claro o entendimento de como essa comunidade procedeu com suas atividades e como se estruturaram para que estas se realizassem.
O Bund Organização trabalhista fundada em 1897 em Vilna, capital da atual
República da Lituânia, o Bund tinha como objetivo unir todos os judeus operários do Império Russo. Foi um dos membros fundadores presente no primeiro congresso do Partido Operário Social-Democrata Russo em Minsk, em março de 1898. Sua ideologia fundamentalmente se concentrava em dois pilares: a luta pelo fortalecimento da cultura ídiche em face as crescentes correntes fascistas e anti-semitas e a luta universal de classes visando o socialismo. Devido ao primeiro desses pilares os ‘Bundistas’ se colocavam como anti-sionistas, acreditando que a cultura ídiche era a conexão necessária, a peça fundamental para a conservação da identidade judaica, ou como alguns colocam o ‘nacionalismo judaico’. Esta faceta da organização acabava por gerar constantes conflitos com os sociais-democratas russos e poloneses e eventualmente causando diversos rachas. A situação em que se encontrava a União Soviética e o leste europeu nas primeiras décadas do séc. XX, com crescentes perserguições às comunidades judaicas espalhadas por toda parte, acabaram enquadrando o Bund muito mais como um promotor e defensor da cultura ídiche ao redor do mundo do que como um partido ativamente
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5 Econtro da Organização Juvenil Bundista em Varsóvia (junho de 1932)
6 Coro Schaeffer no Teatro Coliseu (1939)
influente. De fato sua participação nas revoltas de 1905 e na Revolução Russa de 1917 são relevantes, ou seja, o partido dos operários judeus gozava de certa pres-
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tígio. Toda via, de certo sua mais importante característica foi a de perpetuar a
Grupo Teatral Dramkraiz
cultural, a língua e os custumes de seu povo, extrapolando fronteiras e garantindo
(1942)
uma sobrevida à esses que foram praticamente dizimados na II Guerra Mundial. Este dado é crucial e acaba por explicar como os imigrantes que vieram ao Brasil originários desse meio político, que acabou se tornando extremamente abrangente, se portavam em relação a suas tradições e sempre tiveram uma prática de fomento à atividades artísticas e modos de expressar sua própria cultura.
Um recomeço Esse grupo peculiar de imigrantes de origem judaica do leste
europeu e da União Soviética começou a chegar ao Brasil em maior volume nos 4. Dina Lida Kinoshita. O ICUF Como Uma Rede de Intelectuais. Revista UNIVERSUM, n. 15, 2000, Universidad de Talca, p. 381.
primeiros anos após a I Guerra Mundial. Uma segunda leva ocorreu na década de 30 com o nazismo ascendendo ao poder na Alemanha. Seu modo de assimilação se deu de uma forma até certo ponto paradoxal mas que pautou quase toda a história da futura Casa do Povo. Buscaram de todas as maneiras preservar sua cultura originária, o ídiche, e ao mesmo tempo apostavam em seu valor como intrumento para o alcance de uma sociedade mais justa, nesse caso, a sociedade brasileira. Esse modus operandi não foi exclusividade dos imigrantes que aqui chegaram e se instalaram no Bom Retiro, “de toda a maneira, apesar das diferenças de integração aos respectivos países, o modo de integração da esquerda judaica é muito semelhante. Como já foi mencionado, a questão cultural era central na medida em que era considerada indispensável para orientar uma prática transformadora da realidade. De modo que, antes do surgimento da indústria cultural, os círculos comunistas e socialistas eram os grandes difusores da cultura nas classes populares .” 4 Nos anos de 1920 nasce o Clube Tsukunft, palavra que significa ‘futuro’ em ídiche, nome comumente utilizado pelos grupos organizados de jovens ligados ao Bund na Europa oriental. Ali passam a acontecer as mais diversas atividades sociais, esportivas e político-culturais. Na década de 30, já melhor estruturado,
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passa a se chamar Yugent Club, ou Clube da Juventude, e começa a expandir suas atividades com o Dramkraiz (Grupo Dramático), importante grupo teatral da comunidade, e o Coro Schaeffer. Nesse mesmo período fundam sua própria biblioteca que hoje conta com mais de 4 mil títulos em ídiche. Na década seguinte, nos anos 40, o clube troca de nome novamente mas, dessa vez, devido a um motivo bem específico. Vigoravam na época a pleno vapor as políticas de Getúlio e a ditadura do Estado-Novo, se voltando contra todo tipo de cultura estangeira. A grande maioria das instituições judaicas passou então a ‘abrasileirar’ seus nomes de forma a conseguir as devidas autorizações por parte do governo. O Yugent Club passou então a se chamar Centro Cultura e Progresso e localizava-se na Rua José Paulino. Essa tendência de caráter nacional e autoritário não foi, nem de longe, como todos sabemos, única e exclusiva do estado brasileiro. Na europa podiamos encontrar diversos comitês, congressos e encontros anti-fascistas que se contrapunham à essas ideias. Os judeus se faziam presentes nestas reuniões e muitos eram ativistas ligados ao Bund.
O ikuf Em junho de 1935 realiza-se em Paris o Congresso dos Escritores Anti-
fascistas com as presenças de Heinrich Mann, Henri Barbusse, Máximo Gorki, 26
8 Reunião no Centro Cultura e Progresso (1940)
Romain Rolland, Bernard Shaw, Sinclair Lewis, André Gide, Selma Lagerloff, Ilya Ehrenburg e vários outros autores. A fração judaica participante desse congresso deu início à preparação de um encontro, realizado em 1937 também em Paris, convocando as comunidades ao redor mundo. O evento foi amplamente divulgado e o senhor M. Kopelman foi o enviado representando a colônia judaica brasileira. Como resultado cria-se o Ydischer Kultur Farband (Asscoiação Cultural Judaica), preocupado em difundir, enriquecer e aprofundar a cultura judaica laica e progressista. Sua primeira resolução foi dar suporte para que todas as comunidades alinhadas com sua ideologia tivessem pelo menos uma casa de cultura, uma escola, um jornal e um teatro. Os resultados foram palpáveis e as propostas discutidas reverberaram aqui pela América do Sul. Nota-se que: 5. Ibidem, p. 384.
O IKUF teve grande atuação na Argentina mas esteve presente também no Uruguai e Brasil. Havia nos estratos populares, fome de cultura. Forjavam-se verdadeiros autodidatas eruditos, para os quais nada do que é humano era indiferente. Possuíam uma presença ativa e militante, adotando uma atitude de entrega às melhores aspirações populares. Num caminho de vai e vem, abraçavam todas as causas condutoras ao enraizamento na nova terra e ao mesmo tempo preservavam os valores político-sociais, humanistas e literários adquiridos em suas terras natais da Europa Oriental. 5
A resposta à essa iniciativa do IKUF não veio de imediato, obviamente, mas gerou prósperos frutos para a comunidade de esquerda do Bom Retiro. Ao fim da guerra em 1945 firmam-se os compromissos para a construção do ICIB Instituto Cultura Israelita Brasileiro, em homenagem aos 6 milhões de mártires do Holocausto, e o edíficio, desde sua concepção, foi imaginado atuando como um monumento vivo. É como salienta a historiadora Lilian Starobinas: A construção do Instituto Cultural Israelita Brasileiro (ICIB), mais conhecido como Casa do Povo, foi a materialização de uma homenagem aos combatentes do fascismo. Ao invés de um memorial estático para contemplação, o ICIB se estruturou como um centro de produção, reflexão e fruição de idéias e linguagens artísticas. 6
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6. Lilian Starobinas. Vanguarda Pedagógica: o legado do Ginásio Israelita Brasileiro Scholem Aleichem. São Paulo, Lettera.doc, p. 10.
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9 Cerimônia de colocação da pedra fundamental do ICIB (1946)
10 Scholem Aleichem em Nova York (1907)
Em 1946 acontece a cerimonia da pedra fundamental e as construções se iniciam. No ano seguinte acontece a 1ª Comemoração do Levante do Gueto de Varsóvia e entra em atividade a escola Scholem Aleichem, entidade que iria habitar a contrução da Rua Três Rios assim que finalizada.
Vanguarda pedagógica O nome dado a escola, em tradução literal, signifi-
ca “a paz esteja convosco”, mas também é o pseudônimo de Sholem Naumovich Rabinovich, um dos maiores escritores e dramaturgos da literatura ídiche. De sua pena saiu a história Tobias O Leiteiro que acabou originando um dos maiores sucessos comerciais dos palcos sobre a cultura judaica, O Violinista no Telhado. Suas peças foram encenadas inúmeras vezes. Jacob Guinsburg, um dos maiores especialistas brasileiros em ídiche descreve essa ligação com a escrita de Scholem: O teatro proletário viu nas peças do autor de Menakhem-Mendl e Dos Groisse G(u)evins (A Sorte Grande) os retratos das condições de existência e das condições socioeconômicas da sociedade judaica, captado por um pensamento progressista. O teatro de tendência nacionalista achou no repertório de Scholem Aleikhem a crítica das deformidades e anomalias que a Diáspora imprimia no modo de subsistência da nação. 7
Nada mais natural do que a escolha dessa importante figura da cultura ídiche como nome de uma escola que desde o início de suas atividades, ainda na Rua Bandeirantes, foi considerada uma escola de vanguarda, uma das primeiras 29
7. Jacob Guinsburg. Aventuras de Uma Língua Errante. São Paulo, Editora Perspectiva, 1996, p. 144.
11 Sala de aula do GIBSA (1969)
12 Fachada da Casa do Povo vista da Rua Três Rios (1969)
construtivistas em São Paulo, alinhada com a visão progressista da comunidade. Com o passar dos anos seu número de alunos e suas instalações cresceram tornando-se o GIBSA, Ginásio Israelita Brasileiro Scholem Aleichem. Através do estímulo de práticas experimentais veio a ter importante papel de resitência durante a ditadura militar. Nunca deixando de acreditar em seu plano pedagógico a entidade acolhia, mesmo sabendo de todos os riscos envolvidos, filhos de presos e perseguidos políticos. As crianças eram inscritas com nomes falsos de modo a tranquilizar as famílias, no entanto a Casa do Povo nunca deixou de ser marcada pelo DOPS (Departamento de Ordem Política Social). Justamente por isso o “trabalho coletivo e o diálogo permanente com a
8. Lilian Starobinas. Vanguarda Pedagógica: o legado do Ginásio Israelita Brasileiro Scholem Aleichem. São Paulo, Lettera.doc, p. 16.
produção cultural reforçavam o contraponto ao nacionalismo incondicional propagado pela ditadura militar a partir de 1964. Educar praticando internamente a liberdade de expressão e estimulando o pensamento crítico confirmava a coerência da escola com suas raízes progressistas, e pavimentava a formação desses jovens para uma participação consciente na vida política do país.” 8 Baseada na ideologia central estimulada pelo IKUF o Scholem difundia, por meio da educação artística e o ensino do ídiche, a cultura judaica laica, ao mesmo tempo ten-
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tando se inserir na sociedade com a comemoração de datas nacionais importantes e o ensino de música brasileira. Infelizmente a escola se viu obrigada a encerrar suas atividades em 1981 por dificuldades financeiras e pela escassez de alunos. Como todos os bairros do centro da cidade de São Paulo, o Bom Retiro na década de 80 já havia iniciado seu processo de esvaziamente e a grande parte da comunidade judaica havia se mudado para bairros mais valorizados como Higienópolis. Seu legado, toda via, é inestimável e facilmente comprovado na figura dos inúmeros ex-alunos e professores que por suas salas e corredores circularam. Só para citar alguns nomes, estão nesse grupo o fotógrafo Bob Wolfenson, a atiz Débora Bloch e o empresário Samuel Seibel, atual dono da Livraria da Vila.
Cultura Bilíngue No ano de 1947, juntamente com o início das atividades
escolares do Scholem Aleichem e reforçando mais uma vez a influência das res-
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13 Nossa Voz primeira edição - 3 de abril de 1947
oluções do IKUF, entra em circulação uma publicação bilíngue ídiche-português, o jornal Unzer Stime (Nossa Voz). A redação e administração do semanário ficavam incialmente na Rua Ribeiro de Lima e os primeiros diretores responsáveis foram Henrique Mendes e Joshepat Teperman. Contava com contribuições vindas do Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Niterói, Santos, Salvador e Recife de entidades irmãs e amigos colaboradores. Por meio dessas parcerias teve uma ampla circulação pelo país apesar de um número não tão expressivo de exemplares. Foi portanto de uma grande relevância para as comunidades progressistas da época não se restringindo à São Paulo e os frequentadores da Casa do Povo. Por seu claro alinhamento político à esquerda o jornal foi descontinuado em 1964 com o golpe militar e o estabelecimento da ditadura no país. Por sorte grande parte de seu acervo foi magnificamente digitalizado pela Biblioteca Nacional e se encontra totalmente disponível à qualquer interessado.
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[capítulo 2]
A construção e os anos de proeminência
Relatou-se no capítulo anterior, de forma razoavelemente sintética, a gama abrangente de atividades que eram promovidas, realizadas, apoiadas e que giravam entorno do Instituto Cultural Israelita Brasileiro, mesmo com a sua futura sede ainda em fase de construção. Esta, por sua vez, foi erguida paulatinamente, num processo demorado e que perdurou por longos seis anos. Mesmo tendo conseguido um empréstimo junto a Caixa Econômica Federal de quatro parcelas de c$ 250.000,00 a maior parte dos gastos foi angariada junto a comunidade. Desde o início foram feitas campanhas de forma a arrecadar as quantias necessárias. A cada mês documentava-se através de uma lista quem contribuiu e com que valor. Haviam desde famílias capazes de ajudar com apenas alguns tijolos até doações mais substanciais. O engajamento era incrível e foi motivo de muita alegria uma vez finalizadas as obras. Toda a concepção arquitetônica, o projeto e a construção do edifício ficaram a cargo do engenheiro-arquiteto Ernest Robert de Carvalho Mange e seu escritório, o Martins, Engel e Mange. Mange e a Casa do Povo Arquiteto, artista plástico e professor da Faculda-
de de Arquitetura da Universidade de São Paulo, Ernest era filho do engenheiro e professor da escola politécnica Roberto Mange. Seu pai era de origem francosuiça e chegou ao Brasil em 1913. Durante a infância estudou na famosa Escola Normal Caetano de Campos situada na Praça da República, hoje sede da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, frequentada por grande parte da elite paulistana. Olavo Setubal e Hélio Bicudo foram alguns de seus colegas de classe. Entre 1940 e 1945 cursa engenharia civil na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e nessa mesma época estagia no escritório de Rino Levi. Foi casado com Sarah Friedman, uma das mais importantes ativistas da Casa do Povo e membro do Partido Comunista Brasileiro. Ela chegou inclusive a ser eleita vereadora em 1947 mas teve seu mandato cassado por determinação do então presidente Eurico Gaspar Dutra. Seu suplente na época, Jânio Quadros, assume sua cadeira na Câmara. Nesse mesmo período, já encarregado e cuidando dos primeiros desenhos para o ICIB, Mange recebe uma bolsa do governo francês e durante os anos de
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14 Corte esquemático da escola Anchieta do Senai na Vila Mariana desenhado por Mange
15 Unité d’Habitation de Berlin projetada por Le Corbusier
1947 e 1948 trabalha na obra da Unité d’Habitation na cidade de Marselha, projeto de Le Corbusier, um dos maiores arquitetos modernos do século XX. Essa experiência, sem sombra de dúvidas, acabou o influenciando profundamente. Já de volta ao Brasil recebe o convite de Hélio Duarte e acaba integran-
16 Edifício E1 no campus
do por dois anos, 1950 e 1951, o convênio escolar paulista, projetando inúmeras
da USP em São Carlos
escolas por São Paulo. Ainda imerso na temática da arquitetura escolar convence
projetado por Mange
seu pai, então diretor do SENAI, a repensar os espaços de ensino da instituição e acaba projentando algumas de suas sedes que se tornam padrão para todos os futuros projetos da entidade. Entre outras atividades exercidades por ele destacam-se a de presidente do conselho estadual de obras públicas de São Paulo, diretor-presidente da EMURB, presidente do Conselho Técnico e Conselho Administrativo da COHAB, primeiro titular da SEHAB e primeiro diretor superintendente e responsável pela elaboração da política cultural do Instituto Itaú Cultural. Percebe-se que Mange foi uma figura de destaque e se empenhou em atividades diversas durante toda vida. Teve um papel expressivo porém pouco divulgado na formação da ‘escola paulista’ de arquitetura, assim como seu projeto para Casa do Povo, que parece receber o mesmo tratamento estando fadado ao esquecimento.
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17 Primeira proposta em estilo Art Déco
18 Primeiro desenho a apresentar uma fachada modernista
Arquitetura do edifício da Rua Três Rios Não é difícil notar, olhando
as fotos da cerimônia de colocação da pedra fundamental, que o terreno já estava
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completamente escavado quando a comunidade o adquiriu. Não se sabe ao certo
Desenvolvimento da
as razões. Talvez conseguiu-se um desconto no valor de compra pela situação que
proposta anterior agora já com a figura do arco
se encontrava. Talvez fosse meramente uma obra da iniciativa pública de saneamento do bairro. Fato é que essa circunstância foi determinante para o partido
20 desenho final muito similar ao que foi executado
do projeto. Outro fator importante e que se relaciona com o primeiro foi terem incluido uma sala de teatro ao programa de necessidades. Estes dois elementos acabaram pautando, a meu ver, todo o raciocínia da distribuição dos diferentes usos e da inserção da edificação em relação ao lote. Outra questão interessante de se mencionar é sobre a estética da edificação. Encontram-se no arquivo do ICIB alguns croquis e estudos de fachada das diferentes versões que foram propostas. A primeira e mais inusitada, de clara influência soviética, apresenta uma fachada no estilo Art déco (16) e tudo indica que foi logo descartada, pois todos os outros estudos já caminham para uma arquitetura de linguagem modernista. Um aspecto que chama a atenção e que procurei recuperar em meu projeto é o caráter do térreo, e sua relação com a rua, presente no último croqui que é provavelmente o estudo final (19) . O fechamento está recuado em relação à projeção do piso superior fazendo da escadaria de entrada uma extensão da calçada. O projeto executado no entanto acabou não indo nessa direção.
Palácio dos Soviéticos Um assunto polêmico, ainda em relação aos parâ-
metros estéticos da arquitetura do escritório Martins, Engel e Mange, é a decisão, num dado momento, de inserir o ‘arco’ da fachada. O primeiro estudo de linhas mais modernas (18) não possui nada que remeta a essa figura. O desenho posterior (19), por sua vez, já apresenta essa figura enigmática que ocupa na proposta somente a área de fachada de um pavimento. É apenas no croqui da versão final (20),
que é muito semelhante ao que foi contruido, que observamos este ‘orna-
mento’ preenchendo a altura de dois pavimentos. Muito se especula so-
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bre o porquê da inclusão desse desenho na fachada. Se compararmos com outras características do edifício, que apresenta inúmeros atributos modernos, não parece fazer muito sentido. Uma hipótese, considerando a óbvia influência de Le Corbusier no trabalho de Mange, é terem tomado como referência o projeto do concurso para o Palácio dos Soviéticos, ocorrido durante os anos de 1931 até 1933. Foram convidadados diversos arquitetos de todas as partes para projetar um novo edifício que abrigasse um congresso e um centro administrativo no local onde haviam demolido a Catedral de Cristo Salvador de Moscou, ao lado do Kremlin. O volume do congresso, no desenho de Corbu, contava com um imenso arco no qual eram atirantadas as vigas da cobertura. As datas não são coincidentes mas dada a temática deste projeto e a semelhança na forma do arco, com suas bases mais largas que vão se estreitando, acredito que explique os motivos desta modificação no desenho da fachada da Casa do Povo.
Partido estrutural O projeto desde sua concepção tirou proveito da situação
do terreno locando o teatro em seu subsolo, amenizando assim possíveis ‘ginásti-
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21 Maquete da proposta de Le Corbusier para o concurso do Palácio dos Soviéticos
cas’ estruturais que seriam necessárias para acomodar uma sala de espetáculos num edifício verticalizado que já se pretendia multiuso. De toda forma esse uso específico gerou certas ‘demandas’ espaciais que se refletem nos outros pavimentos. A necessidade de um espaço livre e desimpedido ocasionou a construção de uma nave central executada por meio de uma série de pórticos, modulados de 3 em 3 metros, que vencem um vão de 15 metros. Essa configuração é replicada nos outros pavimentos que ainda contam com um pé direito generoso de 4,5 metros. Podemos afirmar portanto que todo o partido estrutral da edificação se molda devido a dois parâmetros já mencionados: a especificidade do programa e a situação existente do terreno.
Distribuição das atividades A Casa do Povo conta ainda com mais quatro
pavimentos (térreo + 3). A escola Scholem Aleichem ocupava o térreo e o primeiro pavimento, sendo que este último possuía um anfiteatro para 163 pessoas. Um salão de festas com cozinha se situa no segundo e o último foi desenhado como um terraço de esportes com vestiários e o apartamento do zelador. Esta disposição, no entanto, não se manteve intacta com o passar dos anos. Devido a amplitude e a flexibilidade da estrutura os espaços foram sendo modificados conforme as demandas. Mesmo assim é possível ainda encontrar resquícios do plano original. No primeiro andar, por exemplo, uma das paredes curvas do antigo anfiteatro ainda perdura, fora a disposição das janelas com diferentes alturas de peitoril de forma a acomodar a inclinação do piso com os assentos do anfiteatro. Pelo memorial descritivo entregue pela construtora Martins, Engel e Mange, a área geral contruída é de 4 340 m2. O maior piso é justamente o do teatro que ocupa a projeção do lote por inteiro, resultando em 731m2. A capacidade deste foi pensada para um público de 627 pessoas, sendo 504 abrigadas na platéia e 123 no balcão. A seguir coloco algum dos desenhos originais que ainda se encontram no acervo do ICIB:
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22 2º subsolo | platéia do teatro
23 1º subsolo | balcão do teatro
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24 térreo | escola
25 2º pavimento | salão de festas
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26 Celebração no piso do salão de festas com o edifício da Oficina Cultural Oswald de Andrade ao fundo (1952)
Fiel às ideias É realmente impressionante a forma como se deu a construção 27 Imagem da mesma ce-
do edifício e a importância dada aos desenhos, ao projeto como foi concebido. O
lebração onde notamos
processo foi lento e contava com um trabalho de auxilio dos associados do ICIB
que toda estrutura ainda
de forma a coletar doações, mês a mês, essenciais para o andamento das obras.
está aparente e sem acabamento
Sem essa importante e constante contribuição do coletivo a Casa do Povo nunca teria saido do papel. Apesar de todas as adversidades enfrentadas ao longo de sete
28 Na foto fica claro que
anos de obras surpreende o fato de nunca terem abandonado os planos inicias. O
a estrutura da fachada
edifício como se encontra atualmente é muito fiel à todos os desenhos que ainda
ainda estava sendo
se fazem presentes no acervo e que foram estudados e posteriormente utilizados
escorada
para meu levantamento. Talvez isso venha a comprovar mais uma vez a influência das idéias que afluiram do IKUF, absorvidas pelas comunidades ao redor do globo, como um projeto a longo prazo, não simplesmente como uma ideologia passageira de oposição ao crescente fascismo da época.
Ansiedade Um fato bastante curioso é que o prédio, que viria a abrigar gan-
de parte das atividades da comunidade, não precisou estar acabado ou finalizado para que começasse a ser apropriado. Também presente no acervo podemos observar uma série de fotografias documentando grandes eventos que foram realizados e praticamente ocuparam uma laje inteira da estrutura em construção. É visível, inclusive, que parte dessa estrutura ainda contava com seu escoramento, ou seja, havia sido concretada recentemente.
O entorno A qualidade ‘moderna’ do projeto, por assim dizer, também se fez
notar muito antes da inauguração do prédio em 1953. O contraste com as construções do entorno, estas em grande maioria de aparência eclética, é facilmente constatado tanto pela sua estrutura de fachada livre quanto pela sua escala. Na década de 50 o Bom Retiro ainda era majoritariamente formado por edificações simples, térreas ou sobrados, e principalemente por suas vilas de habitação operária.
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29 Fachada em construção vista da rua três rios (1951)
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A grande inauguração Propagado extensivamente pelo jornal Nossa Voz o
Festa de inauguração da Casa do Povo no piso do
evento de inauguração do Instituto Cultural Israelita Brasileiro, a Casa do Povo,
salão de festas em 8 de
teve presença maciça da comunidade e segundo a publicação compareceram em
agosto de 1953
torno de 6.000 pessoas ao local. Todos os pavimentos ficaram tomados no dia 8 de agosto de 1953. Estes que durante tanto tempo doaram seu tempo ou dinheiro em prol desta causa fizeram questão de se amontoarem para ouvir os discursos de alguns líderes da coletividade e prestigiar a cerimônia. A fala inaugurau coube ao 1º Secretário do ICIB, Sr. Bernardo Lifschitz, seguido por José Sendacz (pai da atual presidente Marina), Bernardo Seibel e Luis Schwartz, representando a juventude. Estavam presentes também mais de 200 de entidades e comunidades de todo o país. As festividades continuaram durante todo o mês de agosto e contaram com uma mostra de pintura, escultura e gravura, torneios esportivos, exibição de filmes, apresentação de peças de teatro, debates e um grandioso baile. Como encerramento deste ciclo de atividades foi realizado um ato cívico em sete de setembro celebrando o aniversário de independência do Brasil.
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31 Anúncio da festa de inauguração publicado no Nossa Voz nº 388, edição do dia 17 de julho de 1953
Uma sala adormecida Logo que inaugurada a Casa do Povo já era um espa-
ço multiuso vibrante, congregando uma série de atividades que antes se encontravam espalhadas belo bairro do Bom Retiro. Isso fica latente bastando uma rápida olhada nesse programa mensal de inauguração. O projeto arquitetônico, como já colocado, também fomentava essa gama variada de atividades. Restava somente um ambiente para que o centro cultural estivesse completo, funcionando com 100% de sua capacidade; uma sala de teatro. Este uso já estava incluso no programa desde o ínicio e como já descrito influenciou na configuração espacial do edifício. No entanto, pela falta de verba e por problemas de drenagem do subsolo a inauguração foi postergada. Este último problema, por sinal, acompanhou a sede do ICIB por vários anos. Uma chuva um pouco mais acentuada era suficiente para encher o fosso da orquestra de água. Aparentemente passava por alí, justamente nesta quadra da Rua Três Rios entre a Prates e a Correia de Melo, um canal que abastecia as fontes do Jardim da Luz. Através de uma pequena pesquisa analisando antigos mapas da cidade de São Paulo encontrei duas imagens, uma de 1895 (32) e outra de 1930 (33), indicando claramente um acúmulo d’água nessa região. Durante os anos seguintes à inauguração em 1953 os subsolos da Casa do Povo permaneceram vazios à espera de um futuro teatro. Esses contratempos começaram a ficar para trás no final da década de 50 quando se retomou a idéia de completar o projeto original de Mange e fazer deste espaço uma sala de espetáculos. Em junho de 1959 o ICIB reuniu a comunidade a fim de expor seus planos e proclamar oficialmente aberta a campanha financeira para obter os fundos necessários à construção.
Jovem arquiteto O espaço já existia e já havia sido pensando para um uso
específico. Seria necessário para viabilizá-lo um projeto de reforma e adequação daquele subsolo. Para a tarefa chamaram um jovem arquiteto, Jorge Wilhem, que trabalhou em colaboração com diversos profissionais. O trabalho não era simples visto que os espaços de apoio e serviço previamente destinados eram extremamente escassos, muito devido as limitações impostas pela estrutura do prédio e
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32 Trecho da planta da cidade de S達o Paulo de 1895 editada por Hugo Bonvicini
33 Trecho da planta da cidade de S達o Paulo de 1930
34 Obras no subsolo do ICIB (1959)
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35 Corte esquemático do projeto de Wilheim para o TAIB
36 Henrique Golombek e a placa comemorativa na cerimônia de inauguração
seu sistema hidráulico. Um dos partidos do projeto foi o aumento das dimensões do palco que passou a ter 10 metros e uma boca de cena de 12 por 7, além de uma sugestiva cortina azul desenhada por Abrahão Sanovicz. Uma nova curva de
37 Vista do público que prestigiou a ocasião
visibilidade foi traçada e o estudo acústico que resultou no icônico forro ondulado de madeira foi realizado pelo arquiteto Igor Sresnewsky. Jorge fez questão que a decoração do espaço, mesmo que singela, incluisse de alguma maneira obras de
38 Público amontoado em frente à antiga bilheteria
arte. Para que isso se concretizasse convidou a pintora Renina Katz, que realizou painéis para os vestíbulos, e Gershon Knispel que pintou dois painéis para a platéia, um inspirado na obra do poeta Scholem Aleichem e outro em Mãe Coragem de Bertholt Brecht. Simbolizavam de uma maneira muito clara a forma de atuação dessa coletividade de visão progressista, sempre mesclando a tradição com o moderno.
O teatro de arte israelita brasileiro Com a conclusão das obras é ofi-
cialmente inaugurado o TAIB, em sessão solene no dia 22 de outubro de 1960, com a presença da orquestra da Força Pública. O presidente de honra do ICIB, Manoel Casoy, foi quem cortou a fita simbólica seguido por Henrique Golombek, presidente do ICIB, que descerrou a placa comemorativa situada no foyer lateral. Da mesma forma quando da inauguração do restante do edifício sete anos antes, o instituto preparou uma séria de atividades culturais a fim de demarcar essa importante conquista do esforço coletivo da comunidade. Houveram apresentações do Côro Schaeffer, sobre a regência do Maestro Ernesto Henisberg, com canções em ídiche, hebraico e português. Sob a direção de Amir Haddad o Grupo Teatral da Juventude do ICIB encenou Menino de Ouro de Cliford Odets. Peças infantis patrocinadas pelo colégio Scholem Aleichem, concertos como o da pianista Anna Stella Schic e o espetáculo em ídiche Hérchele Ostropolier, a cargo do Dramkraiz (Grupo Dramático), também fizeram parte da programação. Durante essa temporada de inauguração ficaram expostas no recinto do teatro gravuras de Knispel sobre a Cruzada Infantil, de Bertholt Brecht.
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39 Fachada do TAIB (1966)
40 Anúncio na Folha de São Paulo em 24 de julho de
O teatro popular do sesi No ano de 1963 o TAIB passa a protagonizar um
papel importante no cenário teatral da cidade de São Paulo acolhendo o recém
1969
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formado TPS. O Sesi (Serviço Social da Indústria), a partir de 1948, havia inicia-
Anúncio na Folha de São
do uma política de fomento à prática teatral dentro das indústrias e para tanto
Paulo em 10 de janeiro de 1971
contratou ensaiadores com o intuito de formar elencos e montar apresentações 42
com grupos operários. Um destes contratados foi Osmar Rodrigues Cruz que em
Anúncio na Folha de São
1951 passou a dirigir um pequeno grupo na empresa Rhodia em Santo André.
Paulo em 21 de setem-
Seu sucesso nessa empreitada o levou à um papel de destaque dentro do Sesi que
bro de 1969
o permitiu expandir as atividades. De forma a popularizar cada vez mais o teatro
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para o operariado propôs a criação de um elenco estável, juntando os esforços de
Anúncio na Folha de São
todos os grupos que haviam sido criados desde 1948. Nasce assim, em 1959, o
Paulo em 4 de maio de 1972
Teatro Experimental do Sesi. O exito foi notável e levou a diretoria do Sesi, convencida do sucesso da iniciativa, a dar apoio irrestrito ao projeto levando-o assim a um novo patamar. Passa a se chamar Teatro Popular do Sesi em 1963 e fundamenta-se em dois pilares muito defendidos por Osmar; a gratuidade dos ingressos
1. Alberto D’Aversa. Depoimentos sobre o TPS. Citado por ZANOTTO, Ilka Marinho. Intervenção no Depoimento de CRUZ, Osmar Rodrigues. Depoimento. DEPOIMENTOS VI. Rio de Janeiro: Serviço Nacional de Teatro, 1982. p. 155-156.
e um elevado nível artístico. Dentre o repertório apresentado pelo grupo nesses anos de TAIB destacam-se Cidade Assassinada (1963) de Antônio Callado, Noites Brancas (1964) de Dostoiévski, Manhãs de Sol (1966) de Oduvaldo Vianna e O Milagre de Annie Sullivan (1967), de William Gibson. Esta última foi um sucesso de crítica e público ficando em cartaz por mais de dois anos com apresentações sempre lotadas. Clássicos da literatura nacional também foram trazidos ao palco do subsolo da Casa do Povo. Senhora, de José de Alencar, foi um grande destaque em 1971 numa bela adaptaçao de Sérgio Viotti. Segundo Alberto D’Aversa, diretor italiano radicado em São Paulo e que foi professor da Escola de Arte Dramática, o Teatro Popular do Sesi: É um organismo que se preocupa em formar espectadores, que se esforça para instaurar um hábito e uma tradição, porque para valorização do teatro, como manifestação de cultura, está empenhado numa obra de educação. 1
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Diversidade no palco Nesse período da década de 60 e 70 a programação
do Teatro de Arte Israelita Brasileiro não se restringiu às produções do TPS. O palco dos subsolos do ICIB era constantemente apropriado como uma extensão natural das atividades que aconteciam nos outros pavimentos do edifício. Datas festivas e cerimônias eram sempre realizadas no teatro, sendo uma das mais tradicionais o aniversário do Levante do Gueto de Varsóvia, lembrado sempre no dia 19 de abril. O Côro Schaeffer tinha apresentações constantes e o Dramkraiz se desenvolveu consideravelmente agora que possuia uma ‘casa’ apropriada para suas produções artísticas. Em 63, sob a direção de Graça Melo, o grupo trouxe à público a peça O Dibuk, um dos maiores clássicos da literatura ídiche escrito por Sch. An-Ski e com tradução de Jacob Guinsburg.
Cena teatral paulistana Afora estas produções concebidas pelos grupos
internos, o TAIB foi constantemente visitado pela maioria das vanguardas teatrais da época. Devido à seu alinhamento político a Casa do Povo tinha relações próximas com o Teatro de Arena e, mais tarde, com o Teatro Oficina. Em diversas ocasiões esses dois grupos puderam mostrar seu talento para os frequentadores do ICIB. O Arena trouxe Os Fuzis da Senhora Carrar em 62, O Melhor Juiz, O Rei de Lope Vega em 63, Arena Canta Bahia com Maria Bethânia e direção de Augusto Boal em 65, O Círculo De Giz Caucasiano de Bertold Brecht e Arena Conta Tiradentes em 67. Já o Teatro Oficina de Zé Celso apresentou Andorra em 64, O Rei da Vela de Oswald de Andrade em 67 e Galileu Galilei de Brecht em 69. Tempos difíceis As primeiras duas décadas após sua inauguração foram de
intensa e constante atividade. O TAIB com sua programação de qualidade teve um papel importante no panorama cultural de São Paulo. Nunca deixou, por outro lado, de cumprir sua função primeira, digamos assim, de difusor da tradição da comunidade que o ergueu e sua expressão mais notória, a língua ídiche. Essa dinâmica começa a mudar a partir do início dos anos 80 resultando de uma confluência de fatores. Em 1977 o Teatro Popular do Sesi deixa essa que foi sua casa
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por pelo menos 15 anos. Ficara pronta sua nova sede num edfício projetado por Rino Levi e localizado na Avenida Paulista. Mesmo não sendo de uso exclusivo do TPS o teatro ganhava muito com a grande circulação de público de suas apresentações gratuitas. Concomitantemente grande parte da comunidade judaica já havia iniciado um movimento de abandono do Bom Retiro. Ao ascender socialmente muitas famílias foram aos poucos deixando o bairro migrante e se mudando para lugares como Higienópolis ou Jardins. Isso se refletiu nas diversas instituições alí presentes e com o ICIB não foi diferente. O encerramento das atividades do Ginásio Israelita Brasileiro Scholem Aleichem em 1981 representa claramente esse contexto.
Volta às atividades O TAIB então passou por períodos de altos e baixos. O
problema de infiltração de água continuava sendo uma questão e a sala chegou a encerrar suas atividades por um breve período. Em 1985 o teatro é reinaugurado
2. Clóvis Garcia. Encenação que valoriza a volta do Taib à atividade. Matéria publicada no Estado de São Paulo em 19 de outubro de 1985.
com a peça Fogo na Terra de Benedito Ruy Barbosa. O autor havia arrendado o 3. Ibidem
espaço e feito uma grande reforma “oferecendo ao público paulistano, um novo teatro, com condições de conforto e segurança”.2 A ocasião também marcou o aniversário de 25 do Teatro de Arte Israelita Brasileiro: A importância da recuperação do Taib, depois de quase um ano fechado e com problemas de instalações, é um fato de destaque na nossa vida teatral, considerando que nos seus 35 anos de existência foi palco de acontecimentos marcantes, que fazem parte da nossa história teatral. 3
Mesmo com as adequações o palco da Casa do Povo não voltou a apresentar toda a dinâmica e efervescência vista nas décadas anteriores. Produções exporádicas continuaram acontecendo até o final dos anos 90, além é claro das já tradicionais datas celebradas pela comunidade. Aos poucos, pela falta de uso, as instalações foram sendo abandonadas inclusive pela falta de verba necessária para
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a gestão e manutenção de um espaço com essas características.
Dura realidade A mudança no perfil dos residentes do Bom Retiro ao longo
dos anos, e consequentemente dos frequentadores do ICIB, acabaram por alterar e forçar uma adaptação na programação oferecida. Desde 1998 se investe no Centro de Convivência Tânia Furmam, focado na terceira idade e mais condizente com os associados que ainda comparecem ao instituto e se mantiveram pelo bairro. A falta de um maior número de atividades, no entanto, acaba por manter diversos espaços do edifício ociosos e bastante degradados com o passar do tempo. O próprio teatro é um bom exemplo.
Pluralidade em voz Não obstante, graças aos ativistas incansáveis que conti-
nuam doando seu tempo para que o prédio permaneça aberto e funcionando, podemos presenciar algumas iniciativas importantes. A mais destacada dentre elas é com certeza o Coral Tradição, sucessor direto do Côro Schaeffer extinto em 1970. O grupo é conduzido pela maestrina Hugueta Sendacz, viúva de José Sendacz, um dos membros fundadores, e mãe de Marina que é a atual presidente do ICIB. É um belíssimo exemplo da pluralidade cultural e do respeito mútuo hoje visível nas ruas do Bom Retiro. Extremamente heterogêneo na sua composição, acolhendo pessoas das mais diversas origens, o coral formado em 1988 canta exclusivamente em ídiche. Hugueta tem o trabalho de sempre transliterar as músicas de forma que todos possam acompanhar a letra, dado que a maioria não entende o ‘jarguão’ dos judeus do leste europeu. Este é mais um exemplo do esforço dessa comunidade em recuperar a sua cultura judaica européia.
Intenções O intuito deste capítulo não foi traçar um panorâma completo
das atividades da Casa do Povo em seus anos mais gloriosos, mas antes, pontuar alguns fatos e acontecimentos que comprovam muito claramente a importância
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que a Casa do Povo adquiriu, em muito pouco tempo diga-se de passagem, no circuito cultural e político da metrópole paulista. Igualmente importante era o seu papel, e o que ela representava, tanto para seus associados como para a comunidade, funcionando como um pólo de difusão de suas tradições e da cultura de seus países de origem, ao mesmo tempo não exitando esforços em se assimilar à sociedade brasileira. Ironicamente, sua queda foi tão rápida quanto sua ascensão.
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[capĂtulo 3]
A Casa do Povo hoje
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O Bom Retiro, muito provavelmente por sua inserção como bairro da região central, não se apresenta e nunca esteve alheio as dinâmicas socias e os conflitos presentes na cidade. O relato que apresento a seguir deixa claro como hoje em São Paulo é necessário um constate esforço para a conquista de espaços mais democráticos. É importante frisar também que minha experiência com relação ao edifício do ICIB e o bairro onde ele se encontra , o fato de eu ter vivenciado no dia-a-dia meu objeto de estudo por assim dizer, foi um balizador tanto da pesquisa histórica quanto do exercício projetual. Acredito que este trânsito constante entre pesquisa, realidade e especulação enriqueceu de diversas formas o conteúdo aqui demonstrado.
Um primeiro olhar Lembro-me de numa breve visita ao Memorial da Re-
sistência lá na Estação Pinacoteca ter lido sobre um edifício de fachada curiosa localizado no Bom Retiro, ligado a comunidade judaica, com sua importância descrita num breve texto. Apesar de pertencer a esta comunidade minha família nunca teve nenhum vínculo com este tradicional bairro paulistano e portanto o que presenciei afixado naquele painél me deixou com uma certa curiosidade. Não fazia a menor idéia da existência de um lugar com uma história tão rica, muito menos de um grupo de judeus comunistas ou de esquerda, enfim. Não muito tempo depois desse ocorrido soube de uma peça de teatro que se passava em parte no abandonado TAIB, e esta seria a oportunidade perfeita para conhecer aquela construção que havia incitado meu interesse. ‘Bom Retiro - 958 metros’, do excelente grupo Teatro da Vertigem dirigido por Antônio Araújo, toma a rua como cenário, apresentando através de um circuito pelo bairro diversas realidades de uma região extremamente heterogênea e diversificada. Fazendo uso de diversos simbolismos a história caminha em sua parte final para a Casa do Povo, muito provavelmente representando a decadência que atingiu a grande parte dos bairros do centro da cidade. 73
A continuação se dá do lado de dentro, e o fim da apresentação é extremamente expressivo muito pelo fato de estarmo num teatro abandonado. Numa edição da revista Sala Preta inteiramente dedicada a esta produção, Vera Pallamin nos descreve essa etapa final do espetáculo: Neste crescendo, chega-se ao Teatro de Arte Israelita Brasileiro (Taib), signo de importância histórica, política e cultural não só do bairro, mas da própria cidade, e que há anos encontra-se morto, abandonado. Deparar-se por um instante com toda a sua ampla fachada em vidro iluminada, em contraste com seus arredores, revelou como num lampejo a chance e o desejo de sua ressurreição. E em nome dessa possibilidade, 1. Vera Pallamin. Revista Sala Preta, vol. 12, n. 2, dez 2012. PPGAC, p. 221. 2. Ibidem, p. 222.
‘958 metros’ ingressa em seu interior, vivificando seus espaços gélidos, danificados e depauperados. 1
Neste mesmo artigo ela reitera essa idéia ou possibilidade, que transparece na performance do Vertigem, de reativar este espaço ‘morto’: O impacto é considerável e a força daquele lugar é de enorme eficácia simbólica. Acreditando na ficção, somos convencidos da chance de seu reavivamento, da possibilidade de tudo aquilo voltar a respirar vida urbana, novamente. 2
Curiosamente, não muito tempo depois desses escritos, um projeto para recuperar a Casa do Povo como centro cultural começava a tomar forma. 74
44 Cartaz de divulgação da peça ‘Bom Retiro - 958 metros’
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Voltando às origens Em 2006 fazia exatos 25 anos do encerramente das
Capa da Revista 18, n. 30, de setembro de 2011,
atividades do Colégio Scholem Aleichem. Esta data marcante sucitou uma reu-
do Centro de Cultura
nião de ex-alunos da instituição no formato de um seminário que visava discutir
Judaica
a experiência pedagógica da escola. À parte todas as discussões sobre educação, o evento trouxe à tona uma outra pauta relevante: a dura realidade em que se encontrava o antigo edfício do ICIB. Essa constatação acabou sendo benéfica no sentido de ter reaproximado estes ex-alunos e ter injetado nova energia na associação. Veio trazer também uma bela parceria. A organização e realização do seminário contou com o apoio do Centro de Cultura Judaica e foi então que Benjamin Seroussi, na época curador da instituição, se interessou fortemente pela história e a arquitetura do edifício projetado por Ernest Mange. Não por acaso é ele a figura central reponsável por essa ‘reativação’ dos espaços da Casa do Povo nesse ano de 2013. Ainda como colaborador do CCJ editou um número da Revista 18 em grande parte dedicado ao edifício que abrigava o TAIB, com um ensaio fotográfico de Bob Wolfenson e artigos sobre o bairro do Bom Retiro.
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46 Sessão do cineclube do Laboratório de Crítica Cultural
A parceria descrita acima começou a efetivar-se concretamente a partir de 2012 quando Seroussi se associa ao ICIB e passa a integrar o conselho deliberativo criado a fim de estruturar essa retomada das atividades. Atualmente ele ainda conta com um grupo de voluntários que também abraçou o projeto e é responsável pelo desenvolvimento e suporte das iniciativas. Estas, como documentadas a seguir, vão desde grupos e coletivos buscando um local para ensaio, artistas interessados numa possível intervenção ou procurando espaços de exposição, e porque não, no meu caso, o edifício como foco de uma pesquisa acadêmica.
A escolha de um tema Ao iniciar o ano letivo de 2013 a necessidade da
escolha de um tema para meu trabalho final de graduação era premente. Mesmo sem muita certeza por alguma motivo meu interesse estava todo voltado para aquele fascinante edifício, aparentemente abandonado, apropriado pelo Teatro da Vertigem na peça já mencionada. Decidi ir visitá-lo e procurei algum possível contato, primeiramente sem sucesso, mas por fim consegui chegar num número que remetia ao ICIB. Inesperadamente obtive uma resposta e logo me colocaram em contato com o Benjamin, a fim de marcarmos um encontro para conversarmos. Logo após a primeira visita tive certeza que tinha encontrado meu objeto de estudo. Expliquei brevemente no que consiste o trabalho final de graduação, não que na FAU haja um padrão, e quais eram minhas primeiras intenções. Sabia que gostaria de fazer um projeto e não ficar só na teoria. Todos da casa desde o começo foram muito receptivos, contribuindo amplamente com o andamento da pesquisa. Por todo apoio e abertura que tive deste grupo de voluntários como também do instituto e seu conselho, presenciei ativamente ao longo do ano todo este processo de retomada. Essa convivência resultou numa troca muito positiva, agregando às duas partes. Compartilhava sempre que tinha oportunidade meus resultados de forma que, aos poucos, íamos preenchendo e completando com novas informações a intricada história dessa Volks Haus. Nas próximas páginas trago inciativas e acontecimentos que foram relevantes para esta retomada das atividades na Casa do Povo, e que pude de alguma forma participar ou presenciar.
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Lote#2 Projeto de residência artística coordernado pelo coreógrafo e bailari-
no Cristian Duarte. É um ambiente de criação e experimentação em dança que promove cruzamentos estéticos, performativos e perceptivos. Subsidiado pelo 13º Programa de Fomento à Dança para a cidade de São Paulo, a residência ocorre desde novembro de 2012 e a princípio se estenderia até agosto desse ano. O grupo, no entanto, ganhou recentemente um novo edital e continuará a ensaiar e se apresentar no local. A inciativa contou ainda com encontros, intervenções e experimentos abertos, os mais importantes acontecendo em março e agosto.
Laboratório de Crítica Cultural Realizado durante todo o primeiro
semestre de 2013, o laboratório buscou organizar um grupo de discussão e dentre sua programação principal contava com um cineclube semanal. Esboçava-se como um espaço informal que visava transitar por diversas áreas e tradições do conhecimento funcionando como um laboratório de experimentação em crítica cultural e processos artísticos. O grupo responsável pelo projeto, não isento de uma posição política, trazia sempre temas relavantes e atuais que podiam ser relacionados, direta ou indiretamente, com os fatos e acontecimentos mais recentes da nossa metrópole. Não por acaso as discussões sobre as jornadas de junho, onda de protestos que tomou conta de São Paulo e da maioria das capitais brasileiras, foram as mais representativas, contanto com um grande número de pessoas.
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47 Cartaz de divulgação da convocatória do coletivo Lote #2
48 Cartaz de divulgação da exposição “Oásis”
Exposição Oásis O projeto foi uma plataforma de intercâmbio interdisci-
plinar entre artistas de São Paulo e Amsterdã, e tinha como ênfase a troca de
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conhecimento e processos de criação. Reuniu artistas que usam em suas práticas
Feira de Arte Impressa
uma gama infinda de materiais e formatos, recorrendo muitas vezes à fontes
do Tijuana
pré-existentes. Seja através de performance, pintura, arquitetura, seja através de filmes e sonoridades, a produção está vinculada ao contexto sócio-cultural, e é a partir dele que as práticas re-contextualizam e questionam o modo como nos relacionamos com o espaço circundante e a indústria cultural contemporânea.
Tijuana A feira é um espaço de apresentação, distribuição e comercialização de
publicações, livros de artista, gravuras, pôsteres, vinis e DVDs. Além desta feira anual de arte impressa, que já ocorre desde 2009, o Tijuana organiza regularmente exposições e lançamentos, além de estabelecer parcerias com outras editoras, projetos e instituições. Inaugurado em 2007, o Tijuana nasceu como uma iniciativa da Galeria Vermelho para criar um espaço expositivo apto a mostrar obras que ficam à margem porque realizadas em formatos incompatíveis com espaços expositivos tradicionais. A feira esse ano aconteceu na Casa do Povo nos dias 27 e 28 de julho. Além de diversas editoras e artistas que exibiram suas publicações, também se realizou uma programação de oficinas e conversas em parceria com a Oficina Cultural Oswald de Andrade.
Seminário Casa do Povo 60 anos Realizado em parceria com a Oficina
Cultural Oswald de Andrade o seminário aconteceu nos dias 23 e 24 de agosto e constitiu uma das ações de preservação da Casa do Povo como patrimônio imaterial do Bom Retiro. Foi uma jornada de reflexão sobre a história da instituição e suas contribuições no campo político, cultural e educacional, por meio de painéis de debates com pesquisadores e depoimentos de participantes dos diferentes grupos acolhidos pela instituição. O evento também foi composto de uma visita guiada por todas instalações do ICIB e uma oficina de planejamento estratégico
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ministrada por Raquel Rolnik. Visou-se esboçar todas as possibilidades de novos percursos para a Casa do Povo. O seminário foi organizado pelo Grupo Memória Casa do Povo com a coordenação de Benjamin Seroussi e Lilian Starobinas e teve como palestrantes convidados Renato Cymbalista, Sarah Feldman, Roney Cytrynowicz, Marcos Ajzenberg, Berta Waldman e Esthér Góes.
NÓS BRASIL! WE BRAZIL!
ESTE JORNAL FOI PUBLICADO NO ÂMBITO DO PROJETO NÓS BRASIL! WE BRAZIL!, A CONTRIBUIÇÃO DA ALEMANHA PARA A X BIENAL DE ARQUITETURA DE SÃO PAULO, CIDADES – MODOS DE FAZER, MODOS DE USAR. 12 DE OUTUBRO A 1 DE DEZEMBRO
Nós Brasil! We Brazil! é um projeto do Goethe-Institut em nome do Ministério Federal Alemão do Transporte, Construção e Desenvolvimento Urbano. Teve a curadoria de Matthias Böttger e do artista / arquiteto convidado Luis Berríos-Negrón. Realizado conjuntamente com os Goethe-Institut em São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Salvador.
O PROJETO WELTSTADT – WHO CREATES THE CITY? É UMA INICIATIVA CONJUNTA DO GOETHE-INSTITUT E DO MINISTÉRIO FEDERAL ALEMÃO DO TRANSPORTE, CONSTRUÇÃO E DESENVOLVIMENTO URBANO. CURADORIA DE MATTHIAS BÖTTGER, ANGELIKA FITZ E TIM RIENIETS. WWW.GOETHE.DE / WELTSTADT
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NÓS BRASIL! WE BRAZIL!
O PROJETO NÓS BRASIL! WE BRAZIL! TEM COMO OBJETIVO COMPREENDER MELHOR A REALIDADE ESPECÍFICA DAS CIDADES BRASILEIRAS CONTEMPORÂNEAS, ASSIM COMO OS DESAFIOS QUE ELAS ENFRENTAM. PRETENDE-SE EXPLORAR O MODO COMO NOVOS GRUPOS E ORGANIZAÇÕES TOMAM A INICIATIVA EM UM CONTEXTO ONDE O PLANEJAMENTO URBANO TRADICIONAL ESTÁ SENDO CADA VEZ MAIS SUPLEMENTADO, INFILTRADO OU ATÉ PARCIALMENTE SUBSTITUÍDO POR NOVOS PROTAGONISTAS E PROCESSOS. O SURGIMENTO DE UMA CHAMADA “NOVA CLASSE MÉDIA” NO BRASIL, AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS E ECONÔMICAS INTENSAS NA ÚLTIMA DÉCADA E O EMBATE DA FINANÇA GLOBAL COM A INFRAESTRUTURA LOCAL LEVANTAM VÁRIAS QUESTÕES: QUEM SÃO OS NOVOS ATORES QUE ESTÃO FAZENDO A CIDADE HOJE? COMO AS CIDADES BRASILEIRAS E OS CIDADÃOS RESPONDERÃO A ESTAS MUDANÇAS? COMO SERÃO AS CIDADES DO BRASIL NO FUTURO?
O FUTURO DA CIDADE INTELIGENTE — CURITIBA
O FUTURO DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO — PORTO ALEGRE
O FUTURO DO ATIVISMO URBANO — SALVADOR
50 Cartaz de divulgação do ciclo de palestras “Cidade em Cena”
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Cidade Em Cena Ciclo de palestras que foi realizado pelo grupo Teatro da
Cartaz de divulgação do Seminário Casa do Povo
Vertigem e que ocorreu nos dias 17, 18 e 19 de setembro no salão do segundo
60 anos
andar da Casa do Povo. O evento contou com convidados reconhecidos em suas respectivas áreas de atuação, como o filósofo e professor Peter Pál Pelbart, a psica-
52 Publicação da Weltstadt
nalista e escritora Maria Rita Kehl e o arquiteto e professor Luiz Recamán.
do projeto “Nós Brasil! We Brazil!”
Nós Brasil! We Brazil! O projeto, organizado pelo Instituo Goethe, é a
contribuição oficial da Alemanha para a X Bienal de Arquitetura de São Paulo, Cidade - Modos De Fazer, Modos De Usar. Teve a curadoria de Matthias Böttger com a colaboração do arquiteto/artista convidado Luis Berrios-Negron, integrante do coletivo “The Anxious Prop”. A ação integrante do projeto internacional “Weltstadt” tem como objetivo aprofundar o entendimento da realidade das cidades brasileiras contemporâneas, bem como dos desafios que as mesmas enfrentam. Foi idealizado em nome do Ministério Federal Alemão do Transporte, Construção e Desenvolvimento Urbano. Particularmente, foi o acontecimento que vivenciei com maior apreço pelo fato de ter sido assistente do Luis nos trabalhos realizados aqui em São Paulo. A inciativa tinha como foco a produção da “Mesa -Y”, um objeto semiótico que fomenta a ação local, inspirado no formato da letra “Y” do alfabeto. A mesa não é um objeto resolvido, por assim dizer. A idéia é que sua presença haja como um catalizador para discussões e todo tipo de atividades. Para tanto ela é fabricada em cada localidade em que é ‘exposta’. Além disso essa forma tríade se propõe como uma abertura de possibilidades, escapadando da dualidade e dos antagonismos presentes na natureza das relações humanas. Tendo passado por outras capitais brasileiras antes de chegar na Casa do Povo (Curitiba, Porta Alegre e Salvador), o “Weltstadt” já havia fabricado três mesas distintas. O conceito para a mesa paulistana foi portanto se utilizar de uma ‘perna’ de cada cidade, apresentando de uma maneira concreta o trabalho desenvolvido nessas outras localidades. Serve também de apoio a todo conteúdo mostrado na publicação que foi desenvolvida para o projeto e se encontra disponível na Casa do Povo.
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Vem por aí Um dos projetos mais ambiciosos para 2014 é a reedição do jornal
“Nossa Voz”, que por seu caráter de esquerda acabou forçado a encerrar suas atividades em 1964 com a instauração da ditadura militar no país. O projeto foi contemplada pelo edital Proac Espaços Independentes e será lançada uma única edição totalmente colaborativa. A Casa do Povo organizará ações com diversos artístas, coletivos e líderes comunitários ao longo de sete meses para por fim, com a participação de todos, gerar o conteúdo que aparecerá nessa edição especial.
Novos desafios Por todo relato aqui desenvolvido percebe-se que o trabalho
desenvolvido pelo grupo encabeçado por Benjamin Seroussi tem surtido efeitos palpáveis. Mesmo assim seu projeto de reativação da instituição como um centro cultural ainda possui alguns enclaves. O maior deles, provavelmente, é a arrecadação de fundos para uma reforma completa da edificação. Apesar de um belo exemplar da obra e da arquitetura de Mange o prédio apresenta alguns de seus pavimentos inabitáveis, dentre eles a cobertura (onde ficava o jardim de infância) e toda a estrutura do teatro. Outros agravantes são o sistema de elétrica e o de hidráulica que estão largamente comprometidos. Pode-se afirmar que o contexto atual impõe um dilema: a estrutura atual da Casa do Povo não está, em teoria, apta a uma ampla utilização de seus espaços mas por outro lado esta mesma ação, a de ocupar, é peça chave para esse programa de reativação, fundamental para a realização integral do projeto de centro cultural que se pretende. Este projeto passou e tem passado por algumas etapas. Um dos primeiros passos, talvez o mais importante, foi ter conseguido o apoio irrestrito da diretoria do ICIB. Não sem alguns percalços, é claro, pensando que há uma constante tarefa em adequar a visão da instituição com os planos da equipe de voluntários. Após quase um ano de trabalho em conjunto as idéias já começam a convergir de forma muito mais natural. No começo, no entanto, havia algumas disparidades entre a opinião de Benjamin, que pensava na Casa do Povo de uma maneira mais progressista e universal em relação ao bairro e a cidade, ao passo que a diretoria,
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muito provavelmente pelas dificuldades dos últimos anos, ainda era apegada na possibilidade do edifício voltar a ser o que era exatamente como em seus anos áureos. Outra questão significativa no processo de reativar a Casa do Povo como centro cultural é pensar em como atualizar suas práticas, como trazê-la para contemporaneidade ao mesmo tempo dialogando com sua história, reforçando sua característica emblemática de monumento vivo. Para tanto, imagina Seroussi, é necessário um trabalho em conjunto com o bairro e a região que caminhe para duas frentes. Primeiramente a instituição deve suprir algumas necessidades de seu entorno de forma que a vizinhança possa se identificar com sua imagem. É necessário trazer as pessoas para dentro da Casa do Povo e tudo o que foi relatado até aqui prova que frutos já foram colhidos nesse sentido. Em segundo lugar procura-se percorrer o caminho inverso, de forma que o centro cultural transborde para seus arredores. É preciso trazer todo a sua história para o presente de maneira a corroborar para que o Bom Retiro e seus moradores possam pensar, discutir e construir um bairro de seu interesse. A intenção principal agora é consolidar um programa de ocupação que preserve a memória do lugar e dialogue com sua história, estimulando o debate, o encontro de pessoas e a criação de práticas experimentais e inovadoras que não estejam alheias a cidade contemporânea em que vivemos. Ao contrário, pautando-se fortemente nessa participação coletiva, a Casa do Povo passa a exercer um papel importante ao fomentar iniciativas que tragam uma agenda política no âmbito do planejamento urbano influenciando, para melhor, este ‘fazer’ cidade.
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[capĂtulo 4]
Projeto
Levantamento do edifício Uma parte essencial da pesquisa desenvolvida
ao longo do primeiro semestre foi a transposição dos desenhos da edificação para um formato digital. O processo se deu de diversas formas. O arquivo do ICIB conta com um vasto material iconográfico contendo inclusive alguns desenhos originais do projeto. Apesar de riquíssimo este acervo não apresentava nenhuma organização e fez-se necessário um levantamente inicial exclusivamente para esse fim. Levantou-se uma série de desenhos de reformas e adaptações e os projetos se mostravam pertencentes a diversos arquitetos. Isso dificultou a construção dos desenhos em certa medida pois algumas informações não eram compatíveis entre um projeto e outro. Estas incompatibilidades na verdade esclarecem de certa forma o fato de que o edifício teve usos diversos ao longo do tempo bem como diferentes divisões de seus espaços internos. Essa situação acaba por demonstrar as inúmeras possibilidades que uma planta livre oferece. 87
Processo e metodologia Considerando que a edificação possui mais de
4.300m2 de área construída, as informações obtidas pelo estudo desse extenso material foram cruciais para a elaboração dos desenhos. A qualidade final dos mesmos seria possivelmente afetada partindo-se do zero, somente através de aferições no local. O processo portanto foi um misto de estudo e análise do acervo iconográfico do ICIB, visitas constantes à Casa do Povo, conversas com frequentadores, funcionários e associados e devidas aferições, ora comprovando ora negando o conteúdo das plantas e cortes encontrados. Toda a construção destes desenhos se pautou inicialmente pela estrutura, tentando-se levantar as medidas dos pilares, altura de vigas, lajes e etc. Deparou-se com outra dificuldade nesse momento: a dimensão dos pilares varia conforme o pavimento. Além disso a caída de algumas prumadas hidráulicas estão embutidas nos pilares da fachada o que torna mais complicado a convenção dessas medidas. As escadas também se configuram como elementos importantes auxiliando na configuração dessas informações e tornando o desenho mais preciso. Em seguida atentou-se para os caixilhos e outros itens relacionados como a altura dos peitoris e as pequenas estuturas de concreto que dão ritmo à fachada. Por fim esboçou-se a disposição atual dos espaços internos do edifício apesar de ter-se constatado as diversas mudanças que este sofreu ao longo dos anos. A escolha se mostra óbvia na medida em que, além de um exercício e uma ferramente de apreensão de todos aspectos construtivos da edificação, a digitalização e o redesenho do edifício servirá como base para a intervenção proposta.
Estrutura existente A Casa do Povo e suas instalações, no estado em que se
encontram, apresentam uma série de problemas, muitos deles relacionados à vacancia dos espaços e a falta de manutenção. Grande parte de sua infra-estrutura se encontra danificada e/ou totalmente defasada em relação as demandas atuais de uso. Outra grave questão é a acessibilidade, principalmente a do teatro, visto a grande quantidade de escadas por todo a edificação. Sua implantação no subsolo ainda acarreta outro desafio: como resolver suas saídas de emergências. Esse tipo
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de questionamento e estas constatações surgiram da minha vivência nos espaços do instituto bem como pela minha relação com os que ali convivem e as várias atividades que pude presenciar ao longo do ano. Antes mesmo da definição de um programa arquitetônico as problemáticas acima colocadas já sucitavam dúvidas e me instigavam a buscar uma solução que as contemplassem.
Definição do programa e área de intervenção Estes dois parâme-
tros, de clara importância como fatores delimitadores de projeto, foram tomando forma ao longo do processo e se colocaram como uma certa dificuldade. Talvez meu convívio permanente com o espaço tenha se colocado como um limitador, impedindo algumas decisões menos conservadoras ou que descaracterizassem por demais o edifício. Por outro lado foi interessante conviver com um desafio de projeto mais calcado na realidade e todas suas imposições. Esse contexto foi um fator importante que pautou a decisão de manter a intervenção estritamente no edifício do ICIB, abdicando de anexar lotes adjacentes e propor uma nova construção, por exemplo. Mesmo assim não foi uma escolha feita logo de início e estas diversas alternativas foram, portanto, estudadas e fizeram parte do processo. Do mesmo modo o programa de usos e necessidades não foi algo definido a priori ou nos primeiros meses de pesquisa. Tudo que observei, participei e presenciei na minha recente experiência na Casa do Povo ajudou de alguma maneira na formatação das diversas hipóteses que se apresentaram. Outra questão sempre presente, que inclusive permeia o trabalho de Benjamin Seroussi e sua equipe, é como conciliar as novas propostas e atividades com a história do prédio e todas as tradições de sua comunidade. Nesse ponto o partido arquitetônico de um futuro projeto de reforma será crucial para definir o sucesso ou o insucesso deste diálogo entre passado e futuro. As perguntas que ficam são sempre as mesmas: como vamos ocupar este espaço? com o que vamos ocupar? Posso afirmar que estas indagações me ‘perseguiram’ durante todo o andamento do trabalho. Tentei, ao fim, mesclar minha experiência com os anseios e as intenções daqueles que fazem parte do projeto de reativação da Casa do Povo.
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Propostas de uso e ocupação Uma idéia se apresentava clara desde o
começo: que tipo de uso poderia-se ‘resgatar’ que conversasse com a trajetória do ICIB e ao mesmo tempo fizesse algum sentido atualmente? Atividades envolvendo a dramaturgia foram algumas das respostas mais recorrentes. Mesmo assim me perguntava qual seria o papel de uma sala de espetáculos tradicional, de palco italiano, para mais de 500 pessoas, no Bom Retiro de hoje? Afora a ressalva sobre o caráter da sala de espetáculos havia ficado claro que o teatro deveria ser recuperado. Outro uso que merecia destaque, ao meu ver, seria o da nova biblioteca. Com mais de 5.000 exemplares, sendo 4.000 destes em ídiche, este acervo deveria ter um espaço adequado e apropriado o que, infelizmente, não vemos atualmente dada as circunstâncias da edificação. Uma das ideias da equipe que busca a reativação da Casa do Povo é criar um projeto de residência artística. É um uso para o espaço interessante e que remete à visão de caráter experimental da comunidade e do antigo centro cultural. Achei totalmente condizente com a proposta projetual que pretendia e tão logo tive a iniciativa de inclui-la no programa. 90
53 Estudo de diferentes implatanções com um anexo
54
O partido de projeto Tudo descrito até aqui foi, durante o processo de
Corte esquemático mostrando a relação entre o
trabalho no ano, pautando as decisões e as intenções projetuais. O estudo da
existente e o anexo
arquitetura pelo levantamente do edifício, a precariedade das instalações de infra -estrutura, acessibilidade, seguranção contra incêndio, relação do existente com a intervenção, vivência do espaço, etc. Procurei me colocar no lugar do arquiteto que, num futuro não tão distante eu espero, será incumbido de lidar e resolver todas estas questões. Daí a decisão primeira de focar exclusivamente no edifício existente. As propostas que consideravam intervir em um ou outro terreno anexo também tinham seu interesse, diga-se de passagem, e poderiam resultar numa total reconfiguração de quadra no Bom Retiro, como um exemplo realmente único. O terreno logo atrás do ICIB é um estacionamento e se colocava quase como obrigatório incluí-lo no projeto. Um novo teatro que poderia se abrir para uma praça de miolo de quadra. Esse foi um dos primeiros esboços e persistiu por algum tempo. Entretanto este ‘pé’ na realidade teve no fim uma grande influência e me levou a abandonar outras possibilidades e trabalhar para resolver todos os questionamentos colados tomando como objeto de intervenção somente a edificação projetada por Mange. Após essa definição o desenvolvimento do trabalhou se dividiu em duas frentes: definir como ficaria o teatro e repensar toda a circulação do prédio, considerando os usos pretendidos, a acessibilidade e etc. Quanto ao subsolos, apesar do grande apreço que todos tem pela sala e pelo projeto do Jorge Wilheim, a intervenção foi mais acentuada em relação aos outros espaços. Acredito que um teatro de caráter experimental tenha uma relação mais notável com a história do Colégio Scholem Aleichem, com sua educação construtivista, e com a Casa do Povo, um lugar de formação crítica por excelência. Não somente, este tipo de ocupação é configurado por uma espaço flexível e que permite diversas organizações, adequando-se melhor às práticas culturais contemporâneas. Para a reconfiguração do teatro com seu palco italiano, platéia e balcão, numa ‘caixa-preta’, foi necessário redesenhar todas as áreas de apoio e serviço, que agora se desenvolvem em três níveis distintos: um piso técnico, um mezanino
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55 Corte esquemático de estudo dos novos mezaninos, o foyer e a circulação vertical
56 Representação esquemática dos volumes do
destinado a pláteia, e a cota mais baixa de projeto, 722.50, onde se encontra o acesso à sala de apresentações. Para a definição dessa cota tomou-se como base o
programa do primeiro
nível mais baixo do teatro existente, onde encontramos o fosso da orquestra. De-
pavimento
cidi nesse sentido sabendo que a estrutura atual da platéia é um ‘caixão perdido’ pois abaixo dela se localizam os dutos do sistema de ventilação de ar.
O nível do piso técnico foi definido pela cota dos sanitários existentes que servem à platéia, prolongando-se a laje de forma a ‘abraçar’ o volume da caixa-preta. Já o mezanino estipulou-se uma cota média entre a platéia e o piso com as áreas técnicas que também abriga os novos camarins. O térreo atualmente abriga a administração, um salão de usos variados, os antigos camarins e o vazio da caixa cênica. Pelas diferentes necessidades técnicas e de espaço de um teatro tradicional e um experimental optou-se por preencher esse vazio de modo a melhor estruturar o programa nesse piso. Os camarins foram reaproveitados e convertidos em dois vestiários para os futuros funcionários. Manteve-se o salão como um espaço de uso variado de forma a continuar abrigando as atividades já realizadas pelo ICIB. O nível logo acima era antigamente todo divido entre algumas das salas do colégio e o espaço de ensaio, um ambiente com as dimensões da exata projeção
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da caixa cênica. Este último uso permaneceu no desenho desse pavimento porém relocado, agregando-se a biblioteca e a nova administração. Com o intuito de preservar a qualidade da planta livre estes espaços foram distribuídos como volumes dentro de um volume, de forma que não se interrompa a percepção espacial do todo.
O piso seguinte é um dos mais bem conservados e onde ocorre a maioria das atividades, não justificando uma intervenção. A cozinha existente foi readequada podendo ser usada como um bar ou café em festas e eventos. Durante o dia-a-dia do instituto servirá aos funcionários. Meio nível acima da cozinha há uma laje onde funcionava um depósito que agora é um local para as refeições. O terraço, onde ficavam as salas do jardim de infância, é onde pretendese instalar os dormitórios destinados ao programa de residência artística. Quatro quartos, uma cozinha coletiva com área de serviço ocupam o que um dia foi a residência do zelador, uma sala de orientação escolar e dois sanitários. As salas de aula foram retiradas aumentando assim a área do terraço e retomando o desenho original do projeto.
93
Um dos aspectos mais importantes do partido do projeto foram as soluções adotadas para as novas circulações verticais. Devido as variações de pé-direito e os meio-níveis tornou-se extremamemente complexo resolver essa circulação dando conta destes parâmetros. Próximo à fachada e a escada existente é onde estão agora dois novos elevadores inseridos exatamente num único módulo de laje entre quatro pilares, não interferindo dessa maneira com nenhuma das vigas existentes. Dependendo do pavimento, de maneira a solucionar os diferentes níveis, as cabines tem acesso ora por um lado ora por outro.
Uma nova escada de emergência que funciona como circulação de serviço para as intalações do teatro foi pensanda como complemento destes novos elevadores. Sua estrutura funciona como uma faixa de serviço localizada ao fundo do lote agregando algumas instalações hidráulicas, como sanitários e vestiários, preservando assim o grande vão livre e seus pórticos de vigas arqueadas. 94
57 Diagrama mostrando a circulação vertical exisente e a proposta
58 Diagrama mostrando a faixa de serviço com a escada de emergência
95
59 Corte transversal do Centro Cultural Fiesp
60 Show numa das salas de concerto do Gaítê
REFERÊNCIAS PROJETUAIS
Lyrique
61 Corte perspectivado do projete de Manuelle Gautrand
Centro Cultural FIESP A proposta de Paulo Mendes da Rocha e a equipe
do escritório MMBB é basicamente uma reoganização espacial a fim de melhor abrigar as atividades culturais que ocorrem no embasamento do Edifício Sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, projetado por Rino Levi e inaugurado em 1979. Através da quebra de algumas lajes a nova conformação espacial se configura por meio de dois níveis terreos, um inferior e outro superior, criando uma maior permeabilidade e diferentes relações com o calçadão da Av. Paulista. A área de intervenção já abrigava precariamente uma Galeria de Exposições, Biblioteca, Teatro-Auditório, e seus Anexos, principalmente Foyer e Café, espaços para eventos e o Jardim de Burle Marx. A Remodelação destas instalações constituiu o programa principal deste projeto. Gaítê Lyrique Projeto de um novo centro voltado à música no coração de
Paris que se apropria de uma antiga edificação do século XIX, apresentando espaços flexíveis que permitem diversas configurações. As soluções adotadas pelo escritório da arquiteta francesa Manuelle Gautrand respeitam a história da edifício e ao mesmo tempo criam espaços compatíveis com os requisitos contemporâneos referentes a apresentações musicais de todo tipo. Em razão dos trabalhos realizados pelo Barão Haussmann que remodelaram toda região central de Paris, o “Théâtre de la Gaîté” mudou-se para a rua Papin em 1862. O novo teatro contava com um palco italiano com um platéia capacitada para receber 1800 espectadores. O local também ficou conhecido como “Gaîté Lyrique” pelo fato de ter recebido inúmeras óperas e operetas. A partir dos anos de 1970 o teatro passou a ter dificuldades com um público cada vez mais reduzido culminando em 1989 com as construção de um parque de atrações que demoliu praticamente toda sua estrutura exceto a fachada, a entrada e o foyer. A proposta de Gautrand justamente mantém esses resíduos históricos mas reconfigura completamente o interi-
96
or criando 3 espaços principais totalmente isolados entre si, num conceito de caixas dentro de caixas. Esse partido foi adotado principalmente visando uma excelência no isolamento acústico pois o espaço é cercado por mais de 100 residências. Os 9500m2 abrigados em 7 pavimentos (5 públicos e 2 privados) contém 3 espaços para apresentações, espaço para exposições, um centro de pesquisa, residências artísticas, área de jogos e uma loja.
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98
62 Corte esquemático de Steven Holl para o projeto da NYU
63
Teatro Dee & Charles Wyly Desenvolvido numa parceria entre o escritó-
Vista das escadas na nova circulação vertical
rio nova-iorquino REX juntamente com Rem Koolhaas e sua equipe do OMA,
do Departamento de
este edifício extremamente versátil se localiza na cidade americana de Dallas no
Filosofia da NYU
estado do Texas. Inaugurado como a nova casa do antigo Arts District Theatre
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(ADT) uma exigência do programa era a possibilidade de um palco flexível que
Vista a partir do palco do
pudesse ser montado em diferentes configurações e que não tomasse muito tem-
Wyly Theater
po. O teatro ganhou sua notoriedade justamente pelo seu caráter experimental apresentando peças com inúmeras conformações de seus espaços, anteriormente instalado num galpão no centro da cidade. Toda a estrutura para essas diversas configurações de platéia e palco (arena, semi-arena, italiano, planta livre, etc) foi incorporada no projeto de 7.700m2 que ainda conta com administração, espaços de ensaio, um café, foyer, auditório, lojas, escritórios, um espaço multi-uso para eventos alem de áreas técnicas e de suporte ao palco.
Departamento de Filosofia da NYU Projeto de Steven Holl para a
renovação dos interiores de um edifício de esquina a fim de abrigar o Departamento de Filosofia da Universidade de Nova Iorque. Um novo eixo de circulação foi criado com uma escada iluminada por uma clarabóia ‘cortando’ o edifício de 6 pavimentos na vertical. Uma textura foi instalada nas janelas viradas para o sul ocasionalmente quebrando a luz do sol em um arco-íris prismático. O nível térreo, utilizado por toda a Universidade, contém um novo auditório de madeira curvilínea em um chão de cortiça. Os pisos de nível superior contem escritórios da faculdade e salas de aula que receberam diferentes tons e texturas de preto e branco.
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situação
implantação
746,70
746,50
existente
0
2
5
6
5
4
3
1 7
2
1 2 3 4
estar dormitório cozinha área de serviço
2
2
2
5 terraço 6 depósito 7 acesso caixa d’água
746.50 | residência artística
0
2
5
741,50
1
744,00
1 copa
744.00 | copa
742,05
742,05
741,50
existente
0
2
5
7
5
6 4 3
3
741,50 1
2
1 2 3 4
salão cozinha depósito sanitário feminino
5 sanitário masculino 6 sanitário acessível feminino 7 sanitário acessível masculino
741.50 | salão
737,90
735,00
737,50
existente
0
2
5
6 8
7
5
4 3
737,50 1
2
1 2 3 4
recepção biblioteca administração espaço leitura / trabalho
5 6 7 8
ensaio depósito figurino sanitário masculino sanitário feminino
737.00 | biblioteca
0
2
5
2
1
2
1 mezanino 2 oficinas
734.75 | oficinas teatro
732,50
732,50
730,20
existente
0
2
5
3
4
2
1
1 2 3 4
salão terraço vestiário masculino vestiário feminino
2
732.50 | térreo
729,65
728,87
727,82
727,82
728,39
728,39
728,97
727,30
728,97
728,50
727,30
730,20
existente
0
2
5
728,50
2
1
3
4
5
6
5
3
4
7
8
728,50
730,20
1 2 3 4
camarim coletivo masculino camarim coletivo feminino camarim masculino camarim feminino
5 6 7 8
sala técnica passarela técnica área técnica bilheteria
728.50 | piso técnico
0
2
5
725,50
3
3
722,50 725,50
725,50 1
2
1 bar / cafĂŠ 2 cozinha 3 mezanino
725.50 | mezanino
724,95
725,04 724,87 722,73
725,72
723,87
724,42
724,35
724,42
725,27
726,59
existente
725,37
725,37
0
2
5
722,50
1
722,50
2
4
3
5
1 foyer 2 sanitário feminino 3 sanitário masculino
4 sanitário acessível feminino 5 sanitário acessível masculino
722.50 | platéia
0
2
5
elevação frontal
0
2
5
corte aa
0
2
5
corte bb
existente
0
2
5
corte cc
existente
0
2
5
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Bibliografia
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Créditos das ilustrações
Ford Motor Company 1 Sport Club Corinthians Paulista 2 FFLCH / CAPH (Centro de Apoio à Pesquisa em História “Sérgio Buarque de Holanda”) 4 Bund Archives of the Jewish Labor Movement | New York 5 Arquivo ICIB 6, 7, 8, 10, 11, 12, 16, 17, 18, 19, 20, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 34, 35, 36, 37, 38
Biblioteca Nacional 13, 31 Revista Acrópole n. 197 (1955) 14 Melissa K. Smith 15 Prefeitura de São Carlos 16 Arquivo do Público do Estado de São Paulo 32, 33 Acervo Folha de São Paulo 40, 41, 42, 43 Teatro da Vertigem 44, 50 Centro de Cultura Judaica 45 Luiza Sigulem 46 Lote#2 47 TeTo Projects 47 Casa do Povo 51 Raumtaktik 52 Ilan Szklo 53, 54, 55, 56, 57 ,58 MMBB Arquitetos Associados 59
Manuelle Gautrand 60 Vincent Fillon 61 Steven Holl 62 Andy Ryan 63 Iwan Baan 64
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