O Custo do Insustentavel

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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

As fotos neste relatório foram compartilhadas por seus autores na rede social Instagram™ e retratam o dia a dia das pessoas e como elas se relacionam com as cidades e os meios de transporte. Através de imagens, os participantes dessa rede crescente expressam sua paixão pelas cidades e transformam o registro do cotidiano em um grande projeto artístico coletivo, de abrangência sem precedentes. Mosaico de um mundo cada vez mais conectado, onde a capacidade de divulgar ideias e talentos incríveis que em outros tempos permaneceriam anônimos descortina-se para uma parcela enorme da população. Este é um projeto artísitco sem fins comerciais, onde a ILATS buscou reunir imagens significativas da relação dos autores com seu micro-habitat, do cuidado com que buscam registrar seus meios de transporte diários, expressando plasticamente seus sentimentos e suas visões críticas. Os autores estão identificados com seus @usernames para o devido crédito. Se você também usa o Instagram™

O CUSTO DO

INSUSTENTÁVEL

não deixe de segui-los.

INICIATIVA LATINOAMERICANA PARA EL TRANSPORTE SOSTENIBLE - ILATS INICIATIVA LATINO-AMERICANA PARA O TRANSPORTE SUSTENTÁVEL - ILATS www.ilats.net Texto: Luiz Antonio Cortez Ferreira Projeto Editorial: Joseli Maniassi

Publicado em junho de 2012, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável RIO+20.

INICIATIVA LATINOAMERICANA PARA EL TRANSPORTE SOSTENIBLE INICIATIVA LATINO-AMERICANA PARA O TRANSPORTE SUSTENTÁVEL


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

Com o propósito de contribuir efetivamente para um meio ambiente mais equilibrado, agora e no futuro, através do rápido avanço e desenvolvimento de sistemas de transporte sustentável em toda a América Latina, foi lançada a Iniciativa Latino-Americana para o Transporte Sustentável – ILATS. Entidade sem fins lucrativos, reúne associações, entidades ambientalistas, operadores, indústria, órgãos de governo, parlamentares, bancos de fomento, organizações internacionais e a sociedade civil em geral em torno do objetivo comum. Focada principalmente na mobilidade urbana e em suas relações com o planejamento territorial e o meio ambiente urbano, suas metas principais são: a defesa do meio ambiente saudável, da equidade social e da qualidade de vida das populações presentes e futuras; a promoção de políticas públicas de longo prazo voltadas ao desenvolvimento equilibrado e sustentável das cidades; a promoção da educação cidadã para o planejamento urbano e territorial; a promoção do planejamento integrado entre uso do solo e transporte; a promoção e defesa do transporte sustentável, promovendo a criação de mecanismos internacionais de incentivo e financiamento de projetos de sistemas de transporte sustentável, o desenvolvimento e capacitação de técnicos e agentes públicos, o fomento de políticas públicas e de estratégias de longo prazo; enfim, a defesa do transporte público de alta qualidade. Instagram @luicortez


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

“Transporte e mobilidade são condições prévias essenciais para o desenvolvimento sustentável.

As ausências de infraestrutura

adequada de transportes e de oferta de serviços a preços acessíveis ainda representam uma ampla lacuna em muitos países em desenvolvimento, particularmente em áreas rurais. Ao mesmo tempo, a crescente urbanização e motorização vêm resultando em congestionamentos sem precedentes, desperdício de energia, crescentes emissões veiculares e deterioração da qualidade do ar em muitas cidades, tanto em países industrializados quanto em países em desenvolvimento, provocando graves impactos negativos na saúde pública, degradando as condições de vida e acelerando as mudanças climáticas. É necessário intervir, estabelecendo políticas apropriadas que suportem a criação de sistemas de transporte financeiramente acessíveis, economicamente viáveis, socialmente aceitáveis e ambientalmente adequados. Políticas de incentivo e investimentos precisam ser focadas na melhoria e expansão de sistemas integrados de transporte público, em particular nas áreas urbanas e entre estas, e em facilitar a mobilidade em áreas rurais. As políticas destinadas a promover a sustentabilidade devem promover melhorias de eficiência em todo o sistema, buscar evitar ou reduzir transporte e viagens onde possível e encorajar a mudança para modos de transporte de alta eficiência e baixo carbono. Planejamento integrado do transporte urbano e do rural, assim como políticas regulatórias e fiscais de incentivo, combinadas com o desenvolvimento de novas tecnologias e com maior cooperação internacional são fatores-chave para assegurar que o setor de transportes atinja os requisitos do desenvolvimento sustentável.” Conselho Econômico e Social das Nações Unidas Comissão sobre o Desenvolvimento Sustentável (UN-CSD, 2010)

Instagram @niggaonthesampa


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

TRÊS PASSOS PARA PROMOVER UMA RÁPIDA MUDANÇA PARA O TRANSPORTE SUSTENTÁVEL DE ALTA EFICIÊNCIA E BAIXO CARBONO.

de saúde e de seguridade social, perda de vidas, perda de produtividade, perdas patrimoniais e degradação de recursos ambientais. O agravamento dos eventos climáticos extremos também onera os orçamentos de defesa civil e de recuperação da infraestrutura e benfeitorias. A implantação de sistemas de transporte eficientes depende da adequada capacidade técnica e de gestão dos agentes públicos, além da disponibilidade de recursos para investimentos em infraestrutura e equipamentos. Seja pela somatória dos

ABORDAGEM POR CO-BENEFÍCIOS PARA A

recursos familiares investidos na aquisição

CRIAÇÃO DE NOVOS INSTRUMENTOS DE INCENTIVO

de automóveis, motocicletas e vagas de

À EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E MITIGAÇÃO DE

estacionamento, seja pela participação de

EMISSÕES DE GASES DE EFEITO ESTUFA NO SETOR

recursos de empreendedores privados nos mais

DE TRANSPORTES.

diversos modais de transporte, verifica-se que a participação dos investimentos privados é bastante expressiva. No entanto, a participação

A.

FUNDAMENTOS

privada dá-se de forma difusa, utilizando (via de regra) a infraestrutura existente e, na ausência

A ampla disponibilidade de transporte, seja de

de políticas públicas efetivas, com baixa a

mercadorias ou pessoas, é elemento essencial

muito baixa propensão a promover mudanças

para a manutenção e multiplicação das relações

significativas nas práticas comuns.

econômicas e sociais, podendo constituir

Promover o transporte sustentável de baixo

uma importante ferramenta no combate

carbono é variável essencial na equação do

às desigualdades regionais e à pobreza, na

desenvolvimento sustentável. Nos países menos

promoção do desenvolvimento econômico e da

desenvolvidos ou em desenvolvimento, a

inclusão social.

promoção do transporte sustentável exige uma

Especialmente nos países menos desenvolvidos

forte ação inicial, capaz de alterar o business

e nas economias em desenvolvimento, o setor

as usual, saltando etapas para rapidamente

de transportes, seja de cargas ou passageiros,

atingir um patamar de eficiência compatível

caracteriza-se por indicadores de eficiência muito

com os requisitos do desenvolvimento

abaixo dos desejáveis, resultando em custos

sustentável. Agindo isoladamente, é difícil que

inadequadamente elevados que reduzem a

cada país consiga romper as barreiras que os

competitividade da produção local e oneram os já

impedem de promover esse salto de eficiência,

precários orçamentos familiares. Além dos custos

mas uma ação internacional solidária

diretos, expressivas externalidades são impostas

pode alavancar resultados com muito mais

à sociedade na forma de custos de tratamento

efetividade e rapidez. Instagram @leocostanza


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

B.

PROPOSTA PARA A CONFERÊNCIA DAS

NAÇÕES UNIDAS SOBRE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL - RIO+20 A Iniciativa Latino-Americana para o Transporte

• destinando recursos para promover a

Sustentável – ILATS encaminha este Pleito

adoção de políticas públicas integradas

às Nações participantes da Conferência

e de longo prazo que incentivem o

das Nações Unidas sobre Desenvolvimento

transporte sustentável;

Sustentável - RIO+20, instando-as a reconhecer que o transporte sustentável é essencial para o

• priorizando recursos e condições mais

desenvolvimento sustentável. Solicita às Nações

favoráveis de financiamento para

que esse reconhecimento seja explicitamente

projetos que promovam benefícios

registrado no documento “O Futuro que

sociais e ambientais concretos;

Queremos” através de três pontos: • criando fundos garantidores para ajudar 1. Que seja reconhecida a importância do transporte sustentável como peça

as nações a superar barreiras para a tomada de empréstimos;

essencial do desenvolvimento sustentável, por meio da criação de um Objetivo de

• reconhecendo que parte dos recursos

Desenvolvimento Sustentável específico,

comprometidos com a mitigação

renovando o compromisso das nações em

de impactos e de externalidades

promover a implantação de sistemas de

serão liberados em consequência da

transporte integrados, eficientes, seguros,

implantação de projetos de transporte

inclusivos, universalmente acessíveis e de

sustentável e criando mecanismos para

baixo impacto ambiental, que contribuam

incorporá-los às fontes de financiamento

para o desenvolvimento sustentável com

e garantia desses mesmos projetos;

um saldo positivo de externalidades. • promovendo condições para uma maior 2. Que seja criado um programa das Nações

participação de capitais privados nos

Unidas para a promoção do transporte

investimentos em infraestrutura de

sustentável.

transportes;

3. Que sejam criados mecanismos financeiros

• criando indicadores e critérios de

efetivos e duradouros para incentivar a rápida

avaliação de projetos que permitam

disseminação de sistemas de transporte

identificar e priorizar aqueles que

sustentável e para ampliar a resiliência e

efetivamente contribuam para o

eficiência dos sistemas existentes:

desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro, em 19 de junho de 2012. Instagram @_danimoreno


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

O transporte é uma atividade essencial à vida em sociedade e a demanda por transporte cresce rapidamente à medida que as relações econômicas

UMA ANÁLISE DOS IMPACTOS DAS

e sociais se tornam mais complexas e intensivas.

EXTERNALIDADES DO TRANSPORTE.

As interações sociais e econômicas dependem da habilidade de mover pessoas e bens, superando

1. INTRODUÇÃO

as distâncias que de outra forma impediriam essas interações. “Sistemas de mobilidade eficientes

O Secretário Geral da Organização das Nações

são facilitadores essenciais do desenvolvimento

Unidas – ONU, Ban Ki-moon, apresentou à

econômico”, conforme KAHN RIBEIRO et al. (2007, p.

Assembleia Geral em 25 de janeiro de 2012

328), afirmando que “desenvolvimento econômico

sua agenda de plano de ação, destacando a

e transporte estão inextricavelmente conectados.

aceleração exponencial da complexidade das

O desenvolvimento aumenta a demanda por

relações sociais e econômicas entre as nações,

transporte, enquanto a disponibilidade de

que vêm acompanhadas de rápidas alterações

transporte estimula ainda mais desenvolvimento ao

demográficas, juntas desenhando uma nova

permitir o comércio e a especialização econômica.

geografia física e humana profundamente

A industrialização e a crescente especialização

inter-relacionada. Para fazer frente aos desafios

fomentam a necessidade de grandes volumes de

impostos por essa realidade, gerenciando os

deslocamentos de bens e materiais a distâncias

riscos, promovendo a equidade e assegurando

substanciais, enquanto a globalização acelerada faz

que as presentes e futuras gerações possam

aumentar fortemente esses fluxos”. Crescem, assim,

beneficiar-se das oportunidades que se

os fluxos de bens e pessoas, tanto localmente

descortinam, o Secretário Geral propõe uma

quanto a grandes distâncias, demandando modos

agenda de ações que recomenda, no que se refere

mais rápidos de deslocamento e resultando em um

à promoção do desenvolvimento sustentável, a

uso mais intensivo de energia para sua realização.

Reconhecer o setor de transportes como prioritário e adotar metas e compromissos de ações específicas

mobilização do sistema das Nações Unidas para apoiar estratégias e iniciativas abordando os

O modelo de desenvolvimento consolidado ao

elementos fundamentais do desenvolvimento

longo do século XX baseia-se fortemente no uso de

sustentável, dentre os quais foi incluído o

combustíveis fósseis – petróleo, gás natural e carvão

transporte. Dessa forma, a ONU demonstrou

– e na transferência de recursos naturais para manter

compreender a importância fundamental

os níveis de atividade econômica. Produtos agrícolas,

do setor de transportes, seja de cargas ou

madeira, minério e outras commodities (produtos

passageiros, nesse contexto de crescente

não-especializados) originárias dos países em

complexidade e inter-relacionamento. A agenda

desenvolvimento são utilizados em quantidades cada

propõe o direcionamento de esforços através

vez maiores para manter os padrões de consumo e de

de ações concretas para promoção da eficiência

conforto das populações dos países desenvolvidos.

econômica, da equidade social e da preservação

Essa população dos países economicamente afluentes

ambiental através da implantação de sistemas

representa hoje cerca de 1,2 bilhões do total de 7

de transporte sustentável, destacando, ainda, os

bilhões de pessoas no globo, mas deverá permanecer

crescentes problemas de congestionamentos e

inalterada enquanto a população mundial crescerá

poluição em todo o mundo, particularmente em

para 9,1 bilhões em 2050 (ONU, 2005: POP/918. In:

áreas urbanas (KI-MOON, 2012, p.5).

CORTEZ FERREIRA, 2007).

Instagram @danijusan


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

O transporte é uma atividade essencial

A criação de infraestrutura de transporte adequada é uma questão crítica para os países em desenvolvimento. Infraestruturas inadequadas tendem a impedir ou limitar o desenvolvimento econômico e social, perpetuando a pobreza nos países menos desenvolvidos e retardando os

à vida em sociedade e a demanda

avanços sociais nas economias em desenvolvimento. Por sua vez, ao atingir níveis mais avançados de desenvolvimento os países vêm-se à frente de novos problemas, como o crescimento dos congestionamentos, dos acidentes de trânsito e da poluição ambiental, aumentando custos e

por transporte cresce rapidamente à

impactando seriamente a saúde e qualidade de vida da população (JICA, 2007, p. 10). Esses três problemas - congestionamentos, acidentes e poluição – têm impacto imediato e ocupam a agenda da sociedade, da imprensa e, por consequência, dos formuladores de políticas públicas, fazendo com que

medida que as relações econômicas

muitos releguem as providências relacionadas às mudanças climáticas para um segundo plano. Os derivados de petróleo – recurso fóssil – respondem por 95% da energia total utilizada pelo setor de

e sociais se tornam mais complexas

transportes em todo o mundo. Em 2004 o setor foi responsável por 23% das emissões mundiais de gases de efeito estufa (GEE) provenientes do uso de energia, com cerca de três quartos dessa parcela oriundos do transporte rodoviário1. Ao longo da última década, as emissões de GEE dos transportes cresceram a

e intensivas. As interações sociais e

taxas mais elevadas que as de qualquer outro setor que utiliza energia (KAHN RIBEIRO et al., 2007, p. 325). As evidências disponíveis mostram claramente que as mudanças climáticas decorrentes do aumento

econômicas dependem da habilidade

da concentração de gases de efeito estufa na troposfera constituem o maior problema ambiental da atualidade. Suas consequências já superam os cenários mais pessimistas de previsões científicas elaboradas há menos de uma década e a aceleração da velocidade dessas mudanças deixa clara a ameaça

de mover pessoas e bens, superando

real que o aquecimento global representa para o desenvolvimento digno da humanidade. Os efeitos das mudanças climáticas serão sentidos especialmente em duas vertentes: a quebra da

as distâncias que de outra forma

produção agrícola e industrial, redução da disponibilidade hídrica e destruição da infraestrutura, provocadas pelos fenômenos meteorológicos extremos – furacões, inundações, secas e desertificação – e os impactos gravíssimos que serão provocados pela elevação do nível dos oceanos, inundando

impediriam essas interações.

regiões litorâneas e ameaçando instalações portuárias e cidades à beira-mar, juntamente com toda sua infraestrutura, incluídos os sistemas de transporte. Desses efeitos resultarão graves riscos à saúde da população, seja pela disseminação de doenças, pelos acidentes no curso de tais fenômenos extremos,

“Sistemas de mobilidade eficientes

pela carência de alimentação adequada e de água potável, ou pelas migrações forçadas de enormes contingentes de desabrigados. “As mudanças climáticas podem ser fruto das atividades humanas e, paradoxalmente, ter o

são facilitadores essenciais do

próprio homem como um dos alvos preferenciais dos impactos dos desequilíbrios ambientais por ele causados. Enredados na trama de vilão e vítima, sofrerão os homens, notadamente aqueles que vivem nas cidades, as consequências das inundações, dos deslizamentos de terra,

desenvolvimento econômico”.

do recrudescimento de doenças veiculadas por insetos, da carência de água e alimentos e dos deslocamentos de grande número de pessoas. A vulnerabilidade ambiental dos grandes centros urbanos é mais acentuada nas megacidades dos países em desenvolvimento, que experimentaram crescimento muitas vezes caótico, criando cinturões de pobreza onde a 1 Neste documento, o termo “transporte rodoviário” é utilizado para designar o transporte motorizado por caminhões, ônibus, utilitários leves, automóveis, triciclos, motocicletas e similares, em usos urbanos e interurbanos.


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

qualidade dos serviços ambientais é precária. Ilhas de calor, moradias situadas em áreas críticas de declividade ou de enchentes, transporte e saneamento básico precários são a regra na periferia das grandes cidades do mundo em desenvolvimento, aumentando a vulnerabilidade dos mais desfavorecidos às mudanças climáticas e criando as bases da desigualdade socioeconômica e ambiental.” INSTITUTO SAÚDE E SUSTENTABILIDADE (ISS et al., 2011) À medida que os efeitos sobre a saúde da população forem se agravando, os orçamentos públicos certamente serão onerados por crescentes gastos nos setores de saúde, seguridade social e defesa civil, comprometendo ainda mais os recursos orçamentários disponíveis para investimento no setor de transportes. Resulta imperativo, portanto, que medidas apropriadas de mitigação e adaptação sejam implantadas imediatamente. Este documento apresenta um panorama do setor de transportes utilizando como exemplo dados da situação atual no Brasil, analisa as emissões de GEE e de contaminantes atmosféricos locais do setor de transportes, as externalidades decorrentes de acidentes e perda de produtividade. O objetivo é demonstrar a importância de uma análise abrangente dos co-benefícios na seleção das medidas e políticas públicas a serem priorizadas e dos mecanismos a serem criados para incentivar nos países menos desenvolvidos e nas economias em desenvolvimento uma rápida mudança de patamar no setor de transportes, para sistemas mais eficientes, seguros e de baixa emissão de poluentes. Os sistemas de transporte têm como característica depender de dois elementos distintos: os veículos e a infraestrutura necessária para permitir a operação desses veículos (vias, locais de embarque/ desembarque ou carga/descarga, aeroportos, portos, instalações de estacionamento e manutenção, etc.). Diferentemente dos veículos – seja uma bicicleta, automóvel, trem, avião intercontinental ou um navio de grande porte – cujos custos são relativamente baixos para serem absorvidos por investidores privados ou indivíduos, as instalações de infraestrutura, em especial rodovias e ferrovias, exigem investimentos muito elevados para sua implantação (principalmente em áreas urbanas). Como regra geral, sua alta intensidade de capital resulta na impossibilidade de serem viabilizadas pelos mecanismos de mercado. Dessa forma, é necessária a intervenção dos governos, investindo na criação da infraestrutura necessária para a circulação de cargas e pessoas. A baixa disponibilidade de recursos para investimento, usualmente aliada a limitações na capacidade de gestão, muito grave nos países menos desenvolvidos, mas ainda significativa nas economias em desenvolvimento, provocou um expressivo déficit de infraestrutura de transportes nesses países, agravado a partir da metade do Séc. XX. Em muitos casos, nem mesmo a infraestrutura existente é mantida de forma adequada, impedindo sua utilização a plena capacidade. Os resultados mais palpáveis são: a baixa produtividade; o acréscimo dos custos de transporte, com impactos cada vez mais globais; a ampliação da inequidade pela falta de capacidade de pagamento da população, dificultando os deslocamentos diários e o acesso a oportunidades; a sobrecarga da infraestrutura existente, provocando congestionamentos, desperdício de tempo e combustíveis; graves impactos sobre a saúde das populações em decorrência da poluição; o crescimento da participação dos modos individuais na divisão modal do transporte de passageiros e de caminhões no transporte de cargas, ampliando os acidentes de trânsito, agravando a poluição e o desperdício de energia e recursos naturais.

Instagram @luicortez


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

Considerando que os impactos provocados por

92% das emissões de CO2 do transporte (CETESB,

sistemas de transporte ineficientes estendem-se

2011, p. XXVII e 106-109).

além de fronteiras nacionais, em uma realidade geoeconômica inédita, de profunda e crescente

Juntamente com o crescimento das emissões

inter-relação entre as nações, fica claro que deve

antrópicas de gases de efeito estufa, o século XX

ser do interesse de todos promover a eficiência

assistiu a um explosivo crescimento da utilização

e a sustentabilidade ambiental dos sistemas de

de automóveis. O primeiro automóvel movido à

transporte, de forma a reduzir custos e reduzir

gasolina foi vendido nos Estados Unidos em 1896.

drasticamente a utilização de recursos naturais.

Em 2000, a taxa de motorização americana era de

As ações de promoção do desenvolvimento

771 veículos por 1.000 habitantes, mais que um

sustentável e de mitigação e adaptação aos efeitos

veículo por motorista habilitado, enquanto no

das mudanças climáticas deverão, forçosamente,

restante do mundo era de 89 veículos por 1.000

passar a um novo patamar, de ação solidária sob

pessoas – a mesma dos EUA em 1920. Mas desde

estratégias conjuntas de longo prazo.

1950 a taxa de crescimento da frota no restante do mundo é mais que o dobro da taxa americana.

2. PANORAMA DAS EMISSÕES DO SETOR DE

A China, em 2000, já era o quarto maior mercado

TRANSPORTES

de novos automóveis no mundo, atrás apenas dos EUA, Japão e Alemanha. Os 6,1 bilhões de pessoas

Responsável por 23% do total mundial de emissões

na Terra em 2000 possuíam 735 milhões de

de CO2 do setor energético, em 2004 o setor de

veículos. Em 2010 a frota mundial atingiu 1 bilhão

transportes emitiu 6.300.000 GgCO2, sendo que

de veículos, representando 1 veículo para cada

o transporte rodoviário foi responsável por 74%

6,75 pessoas (148 por 1.000). Somente na China

dessa emissão. Os países em desenvolvimento

foram acrescidos 16,8 milhões de novos veículos

(não-OECD) responderam por 36% do total,

em 2010, quase metade dos novos veículos

parcela que deverá crescer rapidamente para 46%

no mundo, colocando-a na segunda posição

até 2030 se forem mantidas as tendências atuais

do mercado. Se a mesma taxa de motorização

(KAHN RIBEIRO et al., 2007, p. 325).

americana fosse aplicada a todo o mundo, seriam 4,7 bilhões de veículos, praticamente

No Brasil, em 2005 o setor de transportes foi

todos queimando combustíveis fósseis. Apenas

responsável por 43% das emissões de CO2

para estacioná-los seria necessária uma área

do setor energético e 8,1% do total do país,

equivalente à Inglaterra ou à Grécia. Mantida a

totalizando a emissão de 133.431 GgCO2, dos

atual tendência de crescimento da frota, serão

quais 92% pelo transporte rodoviário. As emissões

cinco bilhões de veículos em 2100. A esse respeito,

de CO2 do transporte rodoviário cresceram 72,1%

SHOUP (2005) pergunta: “Poderá o mundo suprir

entre 1990 e 2005, enquanto o total de emissões

todo o combustível necessário para mover cinco

de CO2 no Brasil cresceu 65,2% (MCT, 2010, p.

bilhões de veículos? Os humanos serão capazes

140-141). As emissões do setor de transportes

de respirar a fumaça expelida por cinco bilhões de

no Estado de São Paulo em 2005 totalizaram

canos de escapamento? Onde esses cinco bilhões

36.820 GgCO2, representando 47% das emissões

de veículos poderão estacionar?” Da mesma

de CO2 do setor de energia e 41,4% do total de

maneira, podemos perguntar: Que dizer das

88.844 GgCO2 emitidos no estado. O transporte

emissões de gases de efeito estufa?

rodoviário totalizou 33.767 GgCO2, representando

Instagram @luicortez


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

GRÁFICO 1 TOTAL DE VEÍCULOS MOTORIZADOS NO MUNDO 800

TOTAL

Milhões de Veículos 600 Motorizados

DEMAIS PAÍSES

400 200

EUA

0 1900

1910

1920

1930

1940

1950

1960

1970

1980

1990

2000

Fonte: Shoup. 2005: The High Cost of Free Parking, p.6

É nesse cenário alarmante que fica clara a necessidade de uma mudança radical no estilo de vida das populações mais favorecidas. Especialmente, fica claro que esse modelo baseado nos automóveis não pode ser o objetivo a ser almejado por todos, não pode ser o parâmetro a ser perseguido pelos países em desenvolvimento. O atual padrão de consumo de energia e de recursos naturais é insustentável até mesmo para a pequena parcela da humanidade que dele usufrui, que dizer da ideia de aplicá-lo a todos. Junto com grandes avanços tecnológicos que possam permitir um crescimento brutal na eficiência da utilização dos recursos não-renováveis, será necessária também uma mudança de atitudes, uma mudança de comportamentos. Nesse mesmo cenário o transporte público tem sua grande oportunidade, pois pode representar um enorme ganho de eficiência em comparação aos automóveis. Políticas públicas bem focadas e a conscientização e mobilização dos operadores e da indústria são fundamentais, de forma a garantir a canalização de investimentos maciços na expansão e melhoria dos sistemas coletivos. Entretanto, tal oportunidade pode rapidamente transformar-se em ameaça. Não apenas o setor ainda é amplamente dependente dos combustíveis fósseis, como é também dependente da capacidade de pagamento da população, da existência de um ambiente regulatório favorável e da disponibilidade de uma infraestrutura minimamente adequada para poder operar de forma eficiente. Fatores que poderão evoluir de forma muito negativa caso o aquecimento global não seja controlado e seus impactos não sejam mitigados a tempo (CORTEZ FERREIRA, 2007).

GRÁFICO 2 EMISSÕES GLOBAIS DE CO2 - COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS

2004

30

Bilhões de 25 Toneladas de CO2 20 15 10 5 0 1900

1910

1920

Fonte: WRI - World Resources Institute

1930

1940

1950

1960

1970

1980

1990

2000

Instagram @luicortez


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O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

FIGURA 1 - EMISSÕES DE GEE: ALEMANHA, 1990 - 2003

As emissões de gases de efeito estufa pelo setor de transportes estão crescendo mais rápido que as de qualquer outro setor. Ainda mais, o crescimento das emissões do setor de transportes está anulando os efeitos dos esforços empreendidos por outros setores da economia para reduzir suas emissões (UITP, 2007). Dada sua característica dispersa, o setor de transportes é de difícil controle e o estabelecimento de metas é muito mais complexo, se comparado a outros setores da economia. Por essa razão, o setor de transportes ficou fora das metas de emissões atribuídas internamente pelos países do Anexo B do Protocolo de Kyoto, para o primeiro período de compromisso (2008–2012).

VARIAÇÕES RELATIVAS AO NÍVEL DE 1990

0 -5 -10 -15 % -20 -25 -30 -35 -40 1990

A tabela a seguir ilustra a situação das emissões de GEE dos Estados Unidos, UE-15 e Japão, em 1990 e

-14,7 -18,2 -33,5 1992

1994

1996

GEE TOTAL SEM LULUCF

1998 CO2

2000

2002

à direita indica as metas de redução preconizadas pelo Protocolo de Kyoto.

Processos Industriais

-20,7

Transporte

- Todos os setores GEE � - Transporte +4,7%

2003, permitindo a comparação entre as variações de emissões totais e do setor de transportes. A coluna

VARIAÇÃO GEE POR SETOR (%) 1990-2003

OUTROS GASES

4,7

Energia (sem transporte)

-20,5

Energia (com transporte)

-16,4

Resíduos -60,9 Agricultura

Fonte: http://unfccc.int

1990

2003

Variação

Estados Unidos

6.082,51

6.893,81

13,3%

Transportes

1.494,39

1.810,59

21,2%

UE-15

4.237,98

4.179,61

-1,4%

704,68

872,31

23,8%

1.187,25

1.339,13

12,8%

Transportes

-50

-40

-30

-20

-10

0

10

VARIAÇÕES RELATIVAS AO NÍVEL DE 1990

EMISSÕES DE GEE EM MILHÕES DE TONELADAS DE CO2

Japão

-60

FIGURA 2 - EMISSÕES DE GEE: ESPANHA, 1990 – 2003

TABELA 1

Transportes

-19,9

-70

215,88

259,89

Meta 20008-2012

-8%

-7%

50

45,3 41,7

40 30

27,2

% 20 10

Meta Kyoto = +15%

0 -10 1990

-6%

variação 1990-2003

1992

1994

GHG TOTAL SEM LULUCF

1996

1998 CO2

2000

2002

OUTROS GASES

VARIAÇÃO GHGS POR SETOR (%) 1990-2003 Resíduo Agricultura

20,4%

Transporte +70,5%

http://ghg.unfccc.int/tables/a1wo_luluc_p.html (sem LULUCF) http://ghg.unfcc.int/tables/a3_transport_p.html 20/5/2006

61,0 15,8

Processos Industriais

25,7

Transporte

70,5

Energia (sem transporte)

Fonte: http://unfccc.int

30,4

Energia (com transporte) 0

47,1 25

50

Fica patente que o setor de transportes não estava participando do esforço de redução de emissões,

Ao final da década 2000-2010 os resultados de políticas de melhoria da eficiência energética dos

mesmo no caso da União Europeia (UE-15). As figuras a seguir ilustram a situação na mesma data para

veículos já se faziam sentir, apontando uma redução nas emissões do setor de transportes nesses países,

a Alemanha e Espanha, ambas participantes do grupo UE-15. Neste caso, a meta de redução do grupo

propiciada também pelos impactos da grave crise econômica que se abateu sobre os países da OECD no

UE-15 (-7%) foi distribuída pela União Europeia entre cada um dos países que compõe o grupo, tendo

final da década. Entretanto, esse ganho de eficiência será pouco a pouco suplantado pelo crescimento da

resultado em metas bastante distintas conforme o país (no exemplo, Alemanha -21% e Espanha +15%).

frota e das distâncias percorridas, a menos que medidas complementares sejam colocadas em marcha.

75

100


24

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

3. IMPACTOS À SAÚDE HUMANA

mudanças climáticas), um grupo de pesquisadores e profissionais reuniu-se em São Paulo em abril

A extrema complexidade dos modelos de

de 2011 para elaborar um documento – Carta de

avaliação de cenários de oscilação do regime

Recomendações em Saúde - São Paulo, C40 2011 –

climático em razão do aumento das concentrações

sobre os efeitos à saúde e as práticas que poderão

de GEE na atmosfera, associados às limitações

contribuir de modo mais efetivo para mitigar o

do conhecimento disponível sobre suas

efeito estufa enquanto promovem, também, a

consequências, dificultam o estabelecimento

melhora da saúde humana (ISS et al., 2011). No

de estimativas aprofundadas e cientificamente

documento estão listadas evidências científicas

aceitáveis quantificando com precisão os

e extensa bibliografia, apontando os efeitos

impactos das mudanças climáticas para a saúde

negativos da poluição do ar, do uso de energia, da

das populações. Especialmente, os efeitos sobre

ausência de saneamento adequado, da carência de

a saúde poderão ser alavancados em razão da

alimentos, de práticas inadequadas na produção

gravidade e extensão dos impactos das mudanças

agropecuária, da contaminação do solo e das

climáticas sobre o desenvolvimento econômico,

águas, do planejamento urbano inadequado e dos

pela extensão da destruição da infraestrutura já

sistemas de transporte ineficientes. As evidências

implantada, pela gravidade do desabastecimento

relacionadas também apontam co-benefícios à

ou encarecimento do preço dos alimentos, pelas

saúde de medidas para mitigar as emissões de

dificuldades de acesso ao saneamento básico,

GEE. Outros co-benefícios são: a ampliação da

acesso à água adequada ao consumo humano,

eficiência econômica, ganhos de produtividade

pelo maior ou menor contingente de refugiados

no trabalho e na educação, redução de custos

climáticos; em suma, pela extensão da ruptura que

com tratamentos de saúde, redução de custos de

possa ocorrer nas relações econômicas e sociais

seguridade social e a ampliação da disponibilidade

em razão das alterações no clima. Além disso,

de recursos orçamentários para investimentos em

também a frequência e severidade dos eventos

programas diversos.

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catastróficos influirão na saúde das populações de maneiras distintas.

Em que pesem as dificuldades ressaltadas no início deste capítulo para o desenvolvimento de modelos

Não temos certeza quanto à extensão das

estimativos abrangentes dos impactos das

mudanças climáticas, mas sabemos que estão

mudanças climáticas sobre a saúde da população,

relacionadas à saúde da população. Diversos

um grande número de estudos apresentam

estudos disponíveis comprovam as associações

evidências importantes que permitem antever

entre condições climáticas e ambientais com

suas conseqüências e justificam a importância

o aumento na mortalidade e na incidência de

de medidas imediatas de mitigação, sem que se

doenças, usualmente moduladas pelas condições

descuide das providências de adaptação. Dentre

socioeconômicas dos afetados.

aqueles arrolados no documento publicado pelo INSTITUTO SAÚDE E SUSTENTABILIDADE (ISS et al.,

Reunidos por iniciativa do Instituto Saúde e

2011), destacamos:

Sustentabilidade, da Faculdade de Medicina da USP, da Coordenadoria do Quadrilátero Saúde/

Foram analisados os poluentes e as variáveis

Direito da USP e do Comitê Gestor Local do C40

meteorológicas para identificar como seu efeito

(Rede C40 de grandes cidades para enfrentar as

conjunto influencia nas doenças respiratórias.


26

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

Verificou‐se que quando se soma o efeito dos

incidência de infarto do miocárdio, especialmente

poluentes com o frio, os habitantes poderão ficar

na onda de calor que assolou a Europa em 2005.

vulneráveis durante quase uma semana.

Os efeitos da elevação da temperatura podem, em parte, ser explicados pelo aumento da

Ficou demonstrado, também, que os poluentes

exposição ao ozônio, pois a incidência do infarto

e as variáveis meteorológicas explicam 70%

do miocárdio elevou‐se em 5% pelo aumento

do aumento das internações por doenças

de 5 mcg/m3 diários de concentração de ozônio

respiratórias. As doenças do trato respiratório

(RUIDAVETS, 2005; ACETTA, 2008; MICHELOZZI,

superior revelaram uma associação quando se

2009. In: ISS et al., 2011).

consolida uma condição de frio e alta umidade (frio úmido) com os poluentes SO2 e CO. Nas

Um evento meteorológico extremo matou 32

internações por doenças do trato inferior (asma,

pessoas idosas por causa do forte calor ocorrido

bronquite etc.), a associação do frio úmido com o

em fevereiro de 2010, em Santos‐SP. Neste

PM10 e O3 mostrou‐se responsável pelas internações

episódio, a temperatura atingiu 39ºC e a umidade

(COELHO‐ZANOTTI, 2010. In: ISS et al., 2011).

21%, condição meteorológica atípica (NOBRE, 2010. In: ISS et al., 2011). Episódios extremos de

Yusuf et al. relataram a respeito do efeito das

temperatura provocam alterações de mecanismos

variáveis meteorológicas sobre infecções virais

de regulação endócrina, de arquitetura do

respiratórias com um padrão bimodal, ativas em

sono, de pressão arterial e do nível de estresse,

altas e baixas temperaturas (YUSUF, 2007. In: ISS

atingindo principalmente pessoas acima de 65

et al., 2011). Epistaxe, sangramentos da região

anos e abaixo dos 5 anos de idade. A umidade

anterior do nariz, se associam ao aumento do

relativa abaixo de 30% por 11 dias consecutivos

número de infecções de vias aéreas superiores,

(evento climático extremo) em São Paulo mostrou

principalmente em meses secos (OKAFOR, 1984.

que o risco de morte por doenças cardiovasculares

In: ISS et al., 2011).

aumentou de 0,26% para 0,64% e o risco relativo de 0,45 para 0,92. Este resultado foi significativo,

O contexto geográfico também influi na

pois as análises foram feitas controlando os efeitos

morbidade por pneumonia, sobretudo de

dos poluentes, ou seja, foi medido o efeito isolado

crianças menores de cinco anos e idosos, devido

do parâmetro umidade relativa do ar (COELHO-

a fatores socioeconômicos e ambientais, como

ZANOTTI, 2011A. In: ISS et al., 2011).

poluição do ar, sazonalidade e as variações térmicas e da umidade relativa do ar, que são

A análise espacial do Índice de Breteau mostra

agravadas por condições de habitação precária

aumento dos números de dengue no verão,

(SECRETARIA MUNICIPAL DO VERDE E DO

principalmente no sudeste brasileiro. As noites

MEIO AMBIENTE, 2009. In: ISS et al., 2011). A

mais quentes por causa das mudanças climáticas

comparação de dados de distribuição espacial

favorecem a chance de transmissão de dengue

das ilhas de calor e de mortalidade indicou

em todas as estações do ano (RIBEIRO, 2005.

relação entre maior risco de morte por doenças

In: ISS et al., 2011). Níveis de pólen e outros

cardiovasculares e respiratórias e áreas de ilhas

aeroalérgenos também são mais elevados no

de calor mais intensas (RIBEIRO, 2005. In: ISS et al.,

calor extremo. Estes podem provocar asma, que

2011). Vários estudos demonstram a associação

afeta cerca de 300 milhões de pessoas no mundo

entre ondas de calor, estresse térmico e maior

(WHO, 2010. In: ISS et al., 2011).

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28

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

Mais de um bilhão de pessoas não têm acesso à água potável no mundo. A falta de água potável será um dos fatores cruciais para o aumento das doenças. As mudanças nos padrões do clima põem em risco a qualidade e quantidade da água em muitos países, onde os lençóis freáticos já estão superutilizados e subalimentados.

As inundações estão aumentando em freqüência

principalmente nesses locais (NOBRE, 2010. In:

e intensidade, contaminando as fontes de água,

ISS et al., 2011). Dentre os acidentes naturais que

aumentando o risco de doenças transmitidas pela

ocorrem no Brasil, os escorregamentos são os

água e aumentando a proliferação de insetos

que causam o maior número de mortes. Dados

transmissores de doenças, como os mosquitos.

levantados pelo Núcleo de Monitoramento de

Também causam afogamentos e lesões físicas,

Riscos Geológicos do IPT - Instituto de Pesquisas

destroem casas e prejudicam o fornecimento

Tecnológicas do Estado de São Paulo mostraram

de serviços médicos e de saúde. Ainda como

um total de 2.246 mortes por escorregamentos

efeito de médio prazo, após a enchente pode

no Brasil, no período de 1988 a 2009 (NOBRE,

haver o crescimento de fungos que resultam em

2010. In: ISS et al., 2011).

aumento de manifestações alérgicas, ou doenças respiratórias resultantes de superpopulação

Mais de um bilhão de pessoas não têm acesso

nos abrigos de emergência ou em moradias

à água potável no mundo (HAINES, 2004. In: ISS

inadequadas. Já os efeitos de longo prazo

et al., 2011). A falta de água potável será um dos

incluem um aumento de suicídios, alcoolismo

fatores cruciais para o aumento das doenças.

e desordens comportamentais e psicológicas,

As mudanças nos padrões do clima põem em

especialmente em crianças (HAINES, 2004. In: ISS

risco a qualidade e quantidade da água em

et al., 2011). As doenças mentais e a depressão

muitos países, onde os lençóis freáticos já estão

podem ocorrer em escala maior após desastres,

superutilizados e subalimentados (WHO, 2009.

por perdas de entes queridos, de propriedades e

In: ISS et al., 2011). A falta de água potável pode

convulsões sociais. Por exemplo, após o Furacão

comprometer a higiene e aumentar o risco de

Andrew, casos de estresse pós‐traumático foram

doenças diarreicas, que matam 2,2 milhões

relatados até dois anos depois do incidente.

de pessoas a cada ano. Em casos extremos, a

Estudo feito para cidade de São Paulo mostra

escassez de água leva à seca e à fome. Até os

que a partir do 14° dia, se estendendo até o

anos 2090, é provável que as alterações climáticas

18° após a ocorrência de um temporal com

ampliem a área afetada pela seca, dupliquem a

inundação e enchentes, há um pico no número

frequência das secas extremas e aumentem em seis

de internações por leptospirose. Variações de

vezes a sua duração (WHO, 2009. In: ISS et al., 2011).

precipitação de chuva entre 20 a 140 mm em São Paulo aumentam o número de internações entre 15,6% e 142%. Para cada 20 mm de precipitação,

4. IMPORTÂNCIA DOS CO-BENEFÍCIOS DO

há um aumento não linear de 31,5% na taxa de

TRANSPORTE SUSTENTÁVEL DE BAIXO

internação por leptospirose, principalmente

CARBONO PARA A SAÚDE HUMANA

nas áreas mais pobres e vulneráveis (COELHO‐ ZANOTTI, 2011B. In: ISS et al., 2011).

Os sistemas de transporte, urbanos e de longa distância, provocam grandes danos à saúde,

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A cidade São Paulo tem aproximadamente

diretamente por acidentes ou pela poluição

30% de sua população vivendo em favelas

ambiental, seja em decorrência da emissão de

e habitações precárias, que ocupam quase

contaminantes atmosféricos, de níveis de ruídos

sempre áreas inadequadas para o assentamento

elevados, ou da contaminação do solo e águas

habitacional. Concentrações significativas

por resíduos e por vazamentos de combustíveis.

de áreas de escorregamentos ocorrem


30

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

ACIDENTES

Comparativamente, os modos de transporte

No que se refere aos acidentes de trânsito, em

coletivo são muito mais seguros, com as taxas de

2008 o total de óbitos no Brasil superou 38 mil

óbitos de ocupantes de ônibus (incluindo ônibus

vidas perdidas, atingindo a taxa de 20,2 óbitos

urbanos e rodoviários) oscilando entre 0,1 e 0,2

por 100 mil habitantes. Em relação a 1998, houve

óbitos por 100 mil hab. no mesmo período. Raras

um aumento de 23,9% no número absoluto de

são as ocorrências envolvendo passageiros de

mortos em acidentes de trânsito, enquanto a taxa

sistemas metroferroviários.

subiu 5,7%. Dentre as Unidades da Federação, em 2008 a taxa mais elevada foi alcançada em Tocantins: 35,6 óbitos por 100 mil hab., seguido

EFICIÊNCIA E REDUÇÃO DAS EMISSÕES DE GEE

por Mato Grosso: 35,5; a taxa mais baixa foi

Da mesma forma, as emissões por passageiro-km

registrada no Amazonas: 11,2. Em São Paulo

são inferiores no transporte coletivo, comparadas

a taxa atingiu 18,3. Nesse mesmo período, os

aos autos e motos. Estudo feito anualmente pelo

óbitos de motociclistas no país passaram de

Metrô de São Paulo apontou, em 2010, que as

3,4% do total em 1998 para 23,4% em 2008.

emissões de GEE para transportar um passageiro

Em número absoluto, cresceu de 1.047 para

pela distância de um quilômetro representaram

8.939 óbitos/ano, uma variação de 753,8% e

apenas 4g de CO2eq. Comparadas com outros

a taxa de óbitos de motociclistas por 100 mil

modos de transporte motorizado, as emissões

habitantes passou de 0,6 para 4,7 - alta de 628,5%

de GEE por passageiro-km no Metrô foram quase

em dez anos (WAISELFISZ, 2011). Note-se que

30 vezes inferiores às dos automóveis e 12,5

taxas tão elevadas e crescentes indicam que as

menos que dos ônibus em São Paulo (METRÔ DE

motocicletas representam uma genuína tragédia

SÃO PAULO, 2011). Note-se que a utilização do

em termos de saúde pública.

etanol favorece a redução das emissões médias de GEE dos automóveis na Região Metropolitana

SEGUNDO DADOS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, O

de São Paulo, onde o estudo foi realizado. Essa

TRÂNSITO CAUSOU MAIS DE 40 MIL MORTES NO

comparação seria ainda mais favorável aos

BRASIL EM 2010. DESSE TOTAL, 10 MIL MORTES

sistemas coletivos não fosse pela existência dos

FORAM CAUSADAS POR ACIDENTES COM MOTO,

veículos flex e se a frota utilizasse apenas gasolina

90% HOMENS NA FAIXA DE 18 A 29 ANOS.

pura, sem adição de etanol anidro.

Conforme WAISELFISZ (2011), “Em 1970, as 62 mil

Confirmando a explosão no uso de motocicletas,

motocicletas registradas no país representavam

o Inventário de Emissões Antrópicas de GEE do

apenas 2,4% do total de veículos motorizados.

Estado de São Paulo (CETESB, 2011) apontou

Para 2010 já podiam ser contadas 16,5 milhões

um rápido crescimento nas emissões de GEE

de unidades, representando 25,5% dos veículos

por esses veículos: em 1990 as motocicletas

motorizados.” Do total de motociclistas mortos,

totalizaram a emissão de 183 GgCO2eq,

90% eram homens, especialmente na faixa de 18

demorando catorze anos para dobrar esse valor,

a 29 anos. “A vulnerabilidade dos motociclistas

atingindo 391 GgCO2eq em 2004. Em apenas

é de tal nível que sua letalidade em acidentes

quatro anos as emissões dobraram novamente,

chega a ser 14 vezes maior que a dos ocupantes

atingindo 798 GgCO2eq em 2008. No mesmo

de automóvel” (RODRIGUES, 2010, LIN, 2003. In:

período 1990 - 2008 as emissões dos automóveis

WAISELFISZ, 2011).

passaram de 7.030 para 10.894 GgCO2eq.

No Metrô de São Paulo em 2010 as emissões de GEE para transportar um passageiro pela distância de um quilômetro representaram apenas 4g de CO2eq, quase 30 vezes inferiores às dos automóveis e 12,5 vezes menos que dos ônibus.

foto Claudio Sumida WMATA Washington, D.C.


32

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

Fica patente que a adoção de políticas públicas

do setor de transportes os co-benefícios à saúde

hospitalares por causas respiratórias. Também

que incentivem a expansão e modernização dos

serão tão importantes que não poderão deixar de

já foi verificada a associação entre exposições

sistemas estruturais e promovam a ampliação

ser considerados na formulação das estratégias.

de longo prazo ao ozônio e mortalidade por complicações cardiovasculares, cardiopulmonares

do uso dos transportes coletivos terão o duplo efeito de mitigar emissões de GEE e reduzir os

OZÔNIO: VILÃO LOCAL E GLOBAL

e respiratórias. Efeitos crônicos relacionados ao

impactos à saúde. Para serem efetivas, devem

Alguns desses contaminantes nocivos à saúde

ozônio incluem evidências de déficit na função

vir acompanhadas de medidas de desincentivo

podem ter, também, um papel significativo no

pulmonar em crianças, incremento na incidência

ao uso do transporte individual e de controle do

efeito estufa, mas somente mais recentemente é

de asma e danos à função pulmonar. Ainda que

risco associado de acidentes, buscando reduzir

que estudos detalhados vêm sendo conduzidos.

sua associação com a morbidade esteja mais bem

drástica e rapidamente a tragédia associada às

No caso do ozônio, os estudos avaliando sua

evidenciada e seja suficiente para determinar a

motocicletas no país.

interação com o efeito estufa se intensificaram

importância do controle das emissões de seus

nesta década e as evidências apontam para

precursores, estudos mais recentes apontam para

NO TRANSPORTE DE CARGA, AS MAIORES

uma importância maior do que anteriormente

importantes efeitos da exposição de longo prazo

REDUÇÕES DE EMISSÃO SÃO OBTIDAS PELA

se acreditava no que diz respeito ao seu

na mortalidade. Desta forma, os co-benefícios de

ADOÇÃO DO TRANSPORTE HIDROVIÁRIO,

potencial de interação com o sistema climático,

reduções da concentração de ozônio troposférico

SEGUIDO PELO FERROVIÁRIO, MODAIS QUE

especialmente em decorrência do aumento de

podem ser maiores que os previamente

DEVEM SER FORTEMENTE INCENTIVADOS.

suas concentrações na tropopausa, no limite

estimados (SMITH et al., 2009).

NO ESTADO DE SÃO PAULO, AS EMISSÕES DO

entre a troposfera e a estratosfera. Ainda que as

TRANSPORTE DE CARGAS ATINGIRAM EM 2008

evidências disponíveis sejam demasiado recentes

POLUIÇÃO DO AR E SAÚDE

17.828 GgCO2eq (CAMINHÕES, COMERCIAIS

para que as conclusões a respeito tenham

Grande parte das emissões de contaminantes

LEVES, FERROVIÁRIO E AQUAVIÁRIO),

convergido, fica claro que o controle das emissões

nos centros urbanos são provenientes de

ENQUANTO O TRANSPORTE DE PASSAGEIROS

de precursores de O3 pode trazer benefícios à

fontes móveis, impactando a saúde, reduzindo

FOI RESPONSÁVEL PELA EMISSÃO DE 19.151

saúde e, também, contribuir para a mitigação do

a produtividade no estudo e trabalho e

GgCO2eq (AUTOMÓVEIS, MOTOCICLETAS,

efeito estufa, mesmo tendo um tempo de vida

agravando os custos de tratamento de saúde e

ÔNIBUS E GNV) (CETESB, 2011). ESSES

muito curto, de horas a dias.

seguridade social. No centros urbanos, a poluição atmosférica provoca cerca de 1,2 milhões de

NÚMEROS DEMONSTRAM A IMPORTÂNCIA DE FOCAR AÇÕES TAMBÉM PARA O TRANSPORTE

Os principais precursores do ozônio, que é

mortes todos os anos. (WHO, 2009. In: ISS et al.,

DE CARGAS QUANDO DA FORMULAÇÃO DE

formado por reações fotoquímicas na presença

2011). Estimativas globais atribuem aos efeitos

POLÍTICAS DE MITIGAÇÃO DE EMISSÕES DE

de radiação ultravioleta solar, são os óxidos de

da poluição do ar cerca de 3% dos óbitos por

GEE E DE COMBATE À POLUIÇÃO, PARA QUE

nitrogênio e compostos orgânicos voláteis, além

doenças cardiopulmonares, 5% dos cânceres de

OS RESULTADOS PRETENDIDOS POSSAM SER

do metano. Reduzir o consumo de combustíveis

pulmão e 3% dos óbitos em crianças até cinco

ATINGIDOS PLENAMENTE.

por medidas de mitigação de GEE contribui,

anos de idade (1 a 3% por infecções respiratórias),

portanto, para a redução das emissões de

totalizando 800 mil óbitos prematuros e 6,4

As evidências disponíveis quanto aos impactos

precursores do ozônio troposférico. A exposição

milhões de anos de vida perdidos por morte

da poluição veicular para a saúde humana são

das vias aéreas ao O3 causa danos ao sistema

prematura a cada ano (COHEN, 2005; LOPEZ,

contundentes e suficientes já há muitos anos

respiratório, induzindo a inflamação de células

2006. In: ISS et al., 2011). A poluição atmosférica

para demonstrar a importância do controle das

que podem contribuir para a formação ou

é responsável por 310.000 mortes prematuras na

emissões veiculares. As estratégias de mitigação

exacerbação de doenças pulmonares existentes.

Europa anualmente, o que leva a um custo entre

de emissões de GEE no setor de transportes tem o

Seus efeitos sobre a mortalidade estão bem

€ 427 e € 790 bilhões. (LOW EMISSIONS ZONES IN

potencial de contribuir, também, para a redução

demonstrados para exposições de curto

EUROPE, 2011. In: ISS et al., 2011).

de acidentes de trânsito e para a redução das

prazo, além de sua associação à elevação da

emissões de contaminantes atmosféricos. No caso

morbidade, exacerbação da asma e de admissões

Instagram @russellekirkovics


34

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

Estima‐se que os níveis atuais de poluição

mortalidade a cada elevação de 10 mcg/m³ na

da cidade de São Paulo promovam

concentração de material particulado – média de

aproximadamente 4.000 mortes/ano prematuras

1% em adultos (0,5% a 1,6%), 1,6% em crianças

e uma redução de 1,5 anos de vida, devido

abaixo de cinco anos (0,34% a 3%) e de 2% em

a três desfechos: câncer do pulmão e vias

idosos (acima de 65 anos) (POPE, 2004. In: ISS et

aéreas superiores; arritmias e infarto agudo do

al., 2011). Entre as crianças e os adolescentes, o

miocárdio; e bronquite crônica e asma, com um

impacto da poluição é maior entre as crianças

custo financeiro que, dependendo da métrica,

com menos de 2 anos e entre os adolescentes

pode variar entre centenas de milhões a mais de

com mais de 13 anos de idade. (BRAGA, 2001.

um bilhão de dólares por ano.

In: ISS et al., 2011). Estudos demonstram

Nos centros urbanos a poluição atmosférica, proveniente predominantemente dos veículos, provoca 1,2 milhões de mortes a cada ano.

alterações relacionadas à poluição também no VIVER EM SÃO PAULO CORRESPONDE A FUMAR

período fetal: mortes fetais tardias (PEREIRA,

QUATRO CIGARROS DIARIAMENTE EM VIRTUDE

1998. In: ISS et al., 2011) e diminuição do peso

DAS PARTÍCULAS EM SUSPENSÃO NO AR

de nascimento. (GOUVEIA, 2004. In: ISS et al.,

(SALDIVA & VORMITTAG, 2010. In: ISS et al., 2011)

2011) Após o nascimento, nos primeiros 28 dias de vida, a mortalidade neonatal também é

Estudos na cidade de São Paulo mostram a

influenciada pelos poluentes. (LIN, 2004. In: ISS et

associação de poluentes com o aumento no

al., 2011). Analisando‐se 66 mil mulheres nos EUA

número de atendimentos de idosos em pronto‐

expostas à poluição, no período pós‐menopausa,

socorro por doenças respiratórias, (MARTINS,

observou‐se aumento de 24% de risco para

2002. In: ISS et al., 2011) por arritmia cardíaca

qualquer evento e aumento de 76% de risco

(SANTOS, 2008. In: ISS et al., 2011) e doença

de morte por evento cardiovascular. (MILLER,

isquêmica do coração. (LIN, 2003. In: ISS et al.,

2007. In: ISS et al., 2011). Os únicos estudos de

2011). Confirmando os efeitos da exposição

exposição a longo prazo ao sulfato e mortalidade

à poluição veicular nas vias públicas, estudo

são provenientes dos EUA. O mais extenso é

com controladores de tráfego da Companhia

baseado no Câncer Prevention Study II (CPS II) da

de Engenharia de Tráfego da PMSP apontou

American Cancer Society. Os investigadores deste

alterações da pressão arterial e marcadores

estudo, que incluiu mais de 500.000 participantes,

inflamatórios sanguíneos em dias mais

relataram um aumento da mortalidade por todas

poluídos. (SANTOS, 2005. In: ISS et al., 2011).

as causas naturais, doenças cardiopulmonares e

A poluição atmosférica tem sido associada à

cardiovasculares, e câncer de pulmão, associada

diminuição da função pulmonar, absenteísmo

à exposição a longo prazo. O estudo Harvard

escolar, decréscimo nas taxas do pico do fluxo

Six‐Cities apresentou resultados semelhantes.

respiratório em crianças normais e aumento no

(DOCKERY, 1993, SMITH, 2009. In: ISS et al., 2011).

uso de medicamentos por crianças ou adultos com asma. (MARTINS, 2002. In: ISS et al., 2011).

A poluição também contribui de maneira

Estudos prospectivos estimam que a exposição

perversa para agravar a inequidade social:

por períodos prolongados a níveis elevados de

mesmo entre crianças, adolescentes e idosos, os

material particulado apresentam risco elevado

efeitos dos poluentes podem ser modulados pela

de óbito, muito superior ao risco em situações

condição socioeconômica daqueles que estão

de variações agudas. (BROOK, 2010. In: ISS et

expostos. (MARTINS, 2004. In: ISS et al., 2011).

al., 2011). Observa‐se o aumento do risco de

sxc.hu André Montejorge


36

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

Por sua vez, o controle das emissões veiculares e

condições meteorológicas do período. A partir

o investimento em modos de transporte público

dos níveis de concentração de MP10 obtidos

de baixo carbono produzem efeitos positivos

nos dias pré e pós-eventos, foi estabelecida a

imediatos, com relevantes benefícios econômicos. A

associação com indicadores de mortalidade

implantação do Programa de Controle de Poluição

por doenças cardiovasculares e respiratórias no

do Ar por Veículos Automotores ‐ PROCONVE

segmento de idosos com 60 a 64 anos e mais

reduziu em 30% a poluição do ar na RMSP entre

de 65 anos de idade. As mortes excedentes à

1996 e 2005, prevenindo 50 mil mortes no período

média diária, ocorridas nos períodos de 72 horas

e economizando US$ 4,5 bilhões por conta dos

das paralizações, foram convertidas em valor

gastos evitados com saúde, além da diminuição

monetário. O resultado estima que os benefícios

do consumo de energia e redução das emissões de

obtidos com base na mortalidade evitada de

GEE. (MIRAGLIA, 2010. In: ISS et al., 2011).

idosos graças à redução nas emissões de MP10 pela utilização do Metrô no lugar de veículos

Em estudo realizado para avaliar os custos de

a combustão interna atingem de US$ 36 a 50

saúde decorrentes do uso de combustíveis

milhões ao ano (BASTOS, 2009. In: SALDIVA et al.,

fósseis em seis cidades: Mumbai (Índia), Shanghai

2010; BASTOS, 2010. In: ISS et al., 2011). Outros

(China), Bangkok (Tailândia), Cracóvia (Polônia),

co-benefícios do Metrô também são expressivos.

Manila (Filipinas) e Santiago (Chile), foram

A redução dos tempos de deslocamentos graças

utilizadas funções dose-resposta para estimar

ao Metrô, em 2010, permitiu um ganho de mais

os impactos na saúde e técnicas de valoração

de 575 milhões de horas. A utilização do Metrô

de custo de doenças e disposição a pagar para

resultou na redução de 13 mil acidentes de

avaliação dos custos de saúde. Os resultados

trânsito em 2010, evitando custos de tratamento

obtidos foram (em US$): Mumbai, 150 milhões;

de saúde estimados em R$ 138 milhões. (METRO

Shanghai, 730 milhões; Bangkok, 491 milhões;

DE SÃO PAULO, 2010A; METRO DE SÃO PAULO,

Cracóvia, 87 milhões; Manila, 389 milhões; e

2010B. In: ISS et al., 2011).

Santiago, 780 milhões ao ano (LVOVSKY et al., 2000. In: SALDIVA et al., 2010, p. 169).

TRANSPORTE ATIVO Tanto em termos de redução de emissões de GEE

Com o propósito de mensurar os benefícios

quanto em benefícios à saúde resultantes do

da operação do Metrô de São Paulo para

incremento de atividade física, o transporte ativo

a redução da emissão de poluentes e a

– não motorizado, por bicicletas ou a pé – merece

consequente redução dos custos de saúde

posição de destaque como medida de mitigação. O

pública, BASTOS (2009) examinou as variações

incremento da atividade física moderada associado

nas concentrações médias diárias de partículas

ao aumento das distâncias percorridas a pé ou

finas inaláveis (MP10) em São Paulo, analisando

por bicicleta levam a grandes benefícios à saúde.

as oscilações provocadas por interrupções no

O UK National Health Service (NHS) gasta cerca

serviço metroviário em dias úteis (em razão

de US$5.000,00 por minuto em tratamento de

de greves). Os resultados mostraram que o

doenças que poderiam ser evitadas por atividade

Metrô contribui para reduzir a concentração de

física regular. A redução dessas despesas ajudaria

poluentes atmosféricos, especialmente o material

a compensar os custos de implementação de

particulado, podendo atingir reduções de cerca

políticas de transporte ativo (DOBDON 2009 citado

de 75% nas concentrações, dependendo das

em HAINES 2009. In: ISS et al., 2011).

foto Claudio Sumida


38

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

Os principais ganhos resultam da redução na

MELHORIAS NA SEGURANÇA, CONVENIÊNCIA E

incidência de doenças cardíacas isquêmicas,

CONFORTO PARA CAMINHAR E PEDALAR SERÃO

problemas cerebrovasculares, depressão,

ESSENCIAIS PARA QUE A MUDANÇA MODAL

demência e diabetes. Um estudo de cenários

POSSA TER SUCESSO, E QUE DEVEM SER

comparativos para medidas de redução

ACOMPANHADAS POR MEDIDAS PARA REDUZIR

de emissões de GEE no transporte urbano

A ATRATIVIDADE DO USO DE AUTOMÓVEIS E

de passageiros (WOODCOCK et al., 2009)

MOTOS (WOODCOCK ET AL., 2009).

desenvolvido para Londres (Reino Unido) e Délhi (Índia) apontou importantes conclusões

Além das medidas necessárias para evitar o

no que se refere à contribuição do transporte

crescimento dos acidentes envolvendo ciclistas

ativo. Os cenários modelaram os efeitos sobre

e pedestres, o incentivo ao transporte ativo deve

as emissões de CO2 e a saúde, avaliando a

considerar os efeitos nocivos da atividade física

atividade física, poluição do ar em áreas externas

em situações de alta concentração de poluentes.

(outdoor) e lesões por acidentes de trânsito.

A atividade física deve ser evitada próxima às vias

Foram considerados, para o horizonte 2030 e

de congestionamento e locais muito poluídos.

para as duas cidades, um cenário tendencial

A relação do tráfego como fator de risco para

(business-as-usual), um cenário de adoção

infarto é maior em ciclistas do que naqueles

de veículos de baixa emissão, um cenário de

que usaram carros, sugerindo uma interação

incremento do transporte ativo e um quarto

entre atividade física e exposição à poluição

cenário combinando veículos de baixa emissão

atmosférica relacionada ao tráfego (PETERS,

com transporte ativo. Os resultados obtidos para

2004. In: ISS et al., 2011). Em outro estudo, o

Londres e Delhi indicaram que a combinação de

esforço físico ao ar livre mostrou ser um fator

redução das distâncias percorridas por transporte

predisponente para infarto maior do que se

motorizado e o incremento vigoroso do transporte

realizado em ambiente fechado (LANKI, 2006. In:

ativo, combinado com a adoção de tecnologias

ISS et al., 2011). Assim, até que os co-benefícios

veiculares mais eficientes (quarto cenário) ofereceu

de redução das emissões de poluentes possam

os melhores resultados de redução de emissões

ser obtidos, as etapas iniciais de implantação

de CO2, benefícios à saúde e também redução nas

de infraestrutura para o transporte ativo devem

emissões de material particulado. Isoladamente, os

evitar a solução intuitiva de acompanhar o

benefícios da adoção de veículos mais eficientes

traçado dos corredores de tráfego mais densos,

foram pequenos e amplamente superados pelos

buscando trajetos alternativos favoráveis tanto

benefícios decorrentes da implantação do cenário

no aspecto da concentração de poluentes,

apenas transporte ativo. Mesmo considerando

especialmente particulados, quanto da segurança

que os acidentes de trânsito envolvendo ciclistas

viária, evitando a competição direta com grandes

tendem a diminuir quando o uso de bicicletas

fluxos de veículos motorizados.

aumenta consideravelmente, ao invés de crescer linearmente, e que a redução na utilização de automóveis e motos poderia favorecer a redução de acidentes com ciclistas e com pedestres, o estudo adverte que o crescimento do transporte ativo exporá mais pessoas ao risco remanescente. Instagram @leocostanza


40

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

PROMOVENDO O TRANSPORTE SUSTENTÁVEL DE BAIXO CARBONO.

As linhas de ação para mitigação das emissões de GEE no setor de transportes podem ser reunidas em quatro vertentes, melhor detalhadas logo a seguir: 1. substituição de combustíveis fósseis: ampla adoção de biocombustíveis ou outras fontes de energia renovável em parcela

MEDIDAS DE MITIGAÇÃO, CUSTOS DE

muito significativa da frota, abandonando

IMPLEMENTAÇÃO E POLÍTICAS INTEGRADAS

o uso de combustíveis fósseis; 2. racionalização e mudança modal:

No que diz respeito ao estabelecimento de

a redução das emissões através da

políticas públicas com o objetivo de a ampla

migração para modais de transporte

disseminação de sistemas de transporte de

menos poluentes e através da

baixo carbono, muitos são os obstáculos a

racionalização e aumento da eficiência

serem superados. Responsável por uma parcela

dos sistemas existentes;

importante das emissões globais, próxima aos

3. aprimoramento tecnológico: aumento da

15% das emissões de CO2 equivalente, o setor

eficiência dos veículos no que se refere ao

tem como característica a enorme dispersão

consumo de energia e emissões de GEE;

de atores (stakeholders) e de abrangência

4. gestão da demanda: redução da

geográfica de atividades, além de estar

quilometragem total percorrida pelos

intimamente relacionado com a economia e

veículos através de melhor controle e

as características de distribuição territorial das

ordenamento das atividades no território.

atividades em cada região, apresentando assim enorme variabilidade. Para efeito desta análise,

SUBSTITUIÇÃO DE COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS

deixamos de lado as emissões dos subsetores aeronáutico e marítimo, por operarem em

No que se refere à possibilidade de substituição

grande parte em espaços internacionais

de combustíveis fósseis por biocombustíveis,

(especialmente o segundo), e focar nas

é inegável que o Brasil se encontra em posição

possibilidades e obstáculos à mitigação das

privilegiada. A tecnologia desenvolvida em

emissões do transporte rodoviário no Brasil, em

mais de trinta anos de utilização comercial

razão de sua relevância frente aos demais.

do etanol de cana-de-açúcar permitiu que o combustível seja produzido a preços

Como já foi demonstrado no capítulo anterior,

competitivos com os derivados de petróleo,

a promoção do transporte de baixo carbono

especialmente se o preço do óleo superar US$

resulta em co-benefícios expressivos, razão

50.00 por barril (o preço nas bombas pode ser

pela qual a implantação de medidas de redução

afetado por outros fatores além do preço do

de emissões de GEE no transporte representa

barril de petróleo), ao mesmo tempo em que

parcela muito importante na definição

a tecnologia dos motores evoluiu, permitindo

de políticas para promoção do transporte

a ampla oferta de veículos flex. Da maneira

sustentável. Em vista disso, focamos este

como é produzido no Brasil, o etanol de cana-

capítulo primordialmente nas medidas de

de-açúcar permite reduções significativas nas

mitigação de emissões de GEE no setor.

emissões de GEE se comparadas à gasolina e

Instagram @luicortez


42

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

diesel, numa análise poço-às-rodas (well-to-

cada abastecimento pelo combustível que irá

wheels), ou seja, considerando as emissões na

utilizar, tornando, assim, a decisão pelo etanol

produção, distribuição e consumo. Essa redução

totalmente dependente da flutuação dos preços

tem sido estimada em cerca de 80 a 85% (KAHN

do combustível nas bombas. Adicionalmente,

RIBEIRO et al., 2007, p. 343-344) e já existe

estudos preliminares em desenvolvimento

tecnologia disponível para ganhos ainda maiores,

pelo Comitê Gestor da PEMC (Política Estadual

decorrentes da adoção de práticas de plantio

de Mudanças Climáticas) no Estado de São

mais modernas, de equipamentos mais eficientes

Paulo indicam que a ampla adoção do etanol

nas usinas e da cogeração de energia elétrica para

será retardada pela lenta renovação da frota3,

ser distribuída a outros consumidores, medidas

apontando a importância do estabelecimento de

que ainda não foram adotadas por todos os

programas de renovação da frota para a obtenção

produtores. A adoção de incentivos financeiros

de resultados mais imediatos. A imposição de

através da redução da alíquota do ICMS no

padrões de emissão de GEE mais restritivos

Estado de São Paulo tem contribuído para

aos veículos importados, atingíveis seja pela

manter os preços finais ao consumidor do etanol

adoção das tecnologias flex ou híbrida, também

inferiores aos praticados em outros estados e

será fundamental para uma política de redução

quase sempre competitivos em relação aos da

significativa do uso de combustíveis fósseis

gasolina, reduzindo o impacto das flutuações

(CG-PEMC, 2010).

de disponibilidade do etanol. Este exemplo demonstra a viabilidade de políticas públicas de

A substituição do diesel para veículos pesados

incentivo econômico-financeiro à ampla adoção

apresenta, ainda, grandes barreiras tecnológicas.

de biocombustíveis.

As reduções de emissões de GEE “well-to-wheels” obtidas com o biodiesel produzido com as

Instagram @luicortez

Entretanto, as barreiras para a substituição

tecnologias comercialmente disponíveis no

massiva dos derivados de petróleo no transporte

momento estão longe de serem tão expressivas

rodoviário também são expressivas. Para os

quanto as do etanol de cana-de-açúcar. Também

veículos leves, dois grandes avanços já foram

os motores ciclo diesel para veículos pesados

estabelecidos no Brasil: a mistura de etanol

ainda não se encontram comercialmente

anidro à gasolina, em proporções entre 20 e

disponíveis para permitir a ampla utilização

25%, permite a redução das emissões de toda

de etanol ou biodiesel e seu ciclo de

a frota, mesmo para veículos que não são flex2;

desenvolvimento ainda deverá demandar alguns

e o amplo desenvolvimento da tecnologia

anos. A tecnologia disponível permite propor

flex, que já se tornou padrão de mercado para

a adoção de misturas de até 10% de biodiesel

os novos veículos de produção nacional. Dois

ao diesel fóssil, mas passos maiores que esse

pontos destacam-se aqui: o grande crescimento

exigirão medidas concretas de incentivo e tempo

das importações de veículos, dos quais apenas

de maturação. Se as políticas forem implantadas

uma pequena parcela possui motores flex,

com sucesso, estimativas preliminares indicam

trará dificuldades à implantação de políticas

que a ampla substituição da gasolina por

de substituição da gasolina; adicionalmente, a

etanol, a adoção do etanol nas frotas de ônibus

tecnologia flex permite ao consumidor optar a

metropolitanos e do Município de São Paulo,

2 veículos flex são aqueles cujos motores a combustão interna podem funcionar com qualquer proporção na mistura de etanol e gasolina, podendo chegar a utilizar 100% de etanol.

3 a disponibilidade de veículos flex é recente e grande parte da frota antiga de veículos leves somente pode ser abastecida com gasolina.


44

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

juntamente com a adição de 10% de biodiesel

que seja promovido o aumento da produtividade

do transporte por caminhões para ferrovias,

ao diesel fóssil, poderão propiciar a redução da

da pecuária e a consequente liberação de

hidrovias ou dutovias. No caso dos passageiros,

emissão de 25.000 GgCO2 no Estado de São Paulo

terras atualmente dedicadas à pastagem

pela substituição de viagens realizadas em

em 2020, num cenário business as usual

para a expansão do plantio. Para aumentar a

transporte motorizado individual (autos e motos)

(CG-PEMC, 2010).

produtividade da pecuária, “o Cenário de Baixo

por viagens em transporte coletivo (ônibus,

Carbono considerou três opções: (i) promover a

trens ou metrô) ou por viagens não motorizadas

Outros aspectos importantes a serem

recuperação de áreas degradadas de pastagem,

(a pé ou em bicicleta). Cabe destacar que os

observados ao definir a implantação de políticas

(ii) estimular a adoção de sistemas produtivos

maiores ganhos de eficiência são obtidos quando

de substituição ampla dos combustíveis

que envolvam confinamento de gado para

se promove a ampliação das redes estruturais

fósseis por biocombustíveis são: a garantia de

engorda e (iii) encorajar a adoção de sistemas de

de transporte público, que operam em vias

disponibilidade, especialmente nas entressafras,

lavoura-pecuária. O aumento da taxa de lotação

exclusivas. Graças aos ganhos de velocidade,

a estabilidade de preços e os impactos de sua

resultante da recuperação de áreas degradadas,

regularidade, confiabilidade e segurança, esses

produção sobre a produção de alimentos e o

combinado a sistemas integrados mais intensivos

sistemas apresentam grande potencial para atrair

desmatamento. Estudo publicado pelo Banco

de lavoura-pecuária e confinamento de gado

passageiros de outros modais. Adicionalmente,

Mundial (GOUVELLO et al., 2010) analisa a

para engorda refletem-se em acentuada redução

quando utilizam tração elétrica, promovem

demanda futura por terras para a expansão da

na demanda por terra, projetada para ser de

importante redução das emissões de ruídos e

produção agropecuária e de biocombustíveis.

aproximadamente 138 milhões de ha no Cenário

poluentes. A tração elétrica também permite

Referido a 2006 e considerando um Cenário de

de Baixo Carbono, em comparação com 207

a operação de longos trechos em subterrâneo,

Referência e um Cenário de Baixo Carbono para

milhões de hectares no Cenário de Referência

contribuindo para a liberação de espaço urbano

o horizonte de 2030, a expansão da produção

para o ano de 2030” (GOUVELLO et al., 2010).

na superfície.

agropecuária para atender as necessidades

Estas evidências sublinham a importância

previstas para 2030 exigirá 16,8 milhões de ha de

fundamental de uma abordagem integrada das

A RACIONALIZAÇÃO DOS SISTEMAS DE

terras adicionais; a eliminação de carvão vegetal

políticas públicas no estabelecimento das ações

TRANSPORTE EXISTENTES E A SUBSTITUIÇÃO

não renovável em 2017 e participação de 46%

de mitigação de emissões de GEE. Atuando de

POR MODOS MAIS EFICIENTES, ALÉM DE

de carvão vegetal renovável para a produção

maneira integrada na agropecuária, na produção

CONTRIBUIR PARA A REDUÇÃO DAS EMISSÕES

de ferro e aço em 2030 exigirá mais 2,7 milhões

de biocombustíveis e no setor de transportes,

DE GEE, APORTAM TAMBÉM GRANDES

de ha; a recuperação do passivo ambiental no

o Brasil poderá suprir com etanol 80% de suas

BENEFÍCIOS ADICIONAIS NO CONTROLE DAS

que diz respeito às “reservas legais” de florestas,

necessidades de combustível para veículos leves

EMISSÕES DE CONTAMINANTES ATMOSFÉRICOS,

calculadas em 44.3 milhões de ha em 2030,

e ainda exportar o equivalente a 2% da demanda

NA REDUÇÃO DO CONSUMO DE ENERGIA E DOS

exigirá 44,3 milhões de ha; finalmente, a expansão

mundial projetada para 2030, poderá manter a

CUSTOS DE TRANSPORTE.

da cana-de-açúcar, para aumentar a substituição

expansão da produção agropecuária e recuperar

da gasolina pelo etanol até atingir a marca de

as reservas legais, sem que seja necessário

As ações de racionalização e aumento da

80% no mercado interno e permitir ao Brasil

recorrer ao desmatamento, ou seja, “zerando”

eficiência também devem ser promovidas,

responder, na forma de etanol, pelo fornecimento

o desmatamento, que é hoje responsável pela

especialmente para o transporte de cargas.

de 2% da demanda global estimada de gasolina

principal parcela das emissões de GEE do país.

Estimativa desenvolvida pela SLT4 verificou que

em todo o mundo até 2030 exigirá 6,4 milhões de

existe grande contribuição potencial advinda

ha adicionais de área plantada de cana-de-açúcar,

SUBSTITUIÇÃO MODAL

totalizando uma demanda de 70,4 milhões de

da racionalização dos sistemas de transporte de carga, particularmente do rodoviário: hoje em

hectares adicionais de terras até 2030. O mesmo

A linha de ação da substituição modal pode

48% dos deslocamentos os caminhões circulam

estudo confirmou que é possível atender essa

ser desenvolvida tanto para o transporte

vazios, correspondendo a 34% da quilometragem

demanda por terras adicionais sem que seja

de passageiros quanto para o transporte de

percorrida, enquanto na Europa esse índice é de

necessário recorrer ao desmatamento, contanto

Instagram @luicortez

cargas. No caso da carga, pela substituição

4 Secretaria de Logística e Transportes do Estado de São Paulo.


46

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

22-24% e nos EUA de 16-18% (CG-PEMC, 2010).

da avaliação dessas políticas. Ao analisar

Como já foi evidenciado no capítulo anterior, o

especificamente a realidade brasileira, o estudo

transporte ativo (não motorizado) pode trazer

publicado pelo Banco Mundial apresenta

grandes benefícios à saúde da população.

conclusões que são bastante semelhantes

Também pode promover reduções significativas

a resultados já evidenciados em estudos

nas emissões de poluentes (sejam contaminantes

internacionais, demonstrando que os custos de

locais ou gases de feito estufa) e nos custos

implantação da infraestrutura necessária para

diretos (out-of-pocket) de transporte. Seu

que seja promovida uma ampla substituição

potencial de crescimento no Brasil é amplo, ainda

modal são significativamente elevados, seja

que em parte das grandes e médias cidades as

para a carga ou para o transporte de passageiros

barreiras a serem superadas sejam consideráveis.

(GOUVELLO et al., 2010). Quando cotejados os

Para que o transporte ativo tenha sucesso, o

investimentos necessários com as emissões de

primeiro ponto a ser investigado refere-se às

GEE evitadas, resulta sempre uma intensidade

medidas necessárias para evitar que a ampliação

de capital desfavorável ao setor de transportes.

da letalidade e danos à saúde decorrentes de

Isso evidencia a relevância da inclusão das

acidentes e da exposição à poluição atmosférica

externalidades do transporte sustentável,

venham a superar os benefícios. A segunda linha

amplamente positivas, nas análises que irão

de investigação deve ater-se aos investimentos

subsidiar os processos de decisão de políticas de

e às medidas institucionais necessárias para

mitigação.

viabilizar uma migração ampla das viagens motorizadas, especialmente aquelas de curta

APRIMORAMENTO TECNOLÓGICO DOS VEÍCULOS

distância, para o transporte ativo. Neste caso,

E REDUÇÃO DE CONGESTIONAMENTOS

há que se investigar os impactos e as possíveis sinergias com o transporte coletivo, lembrando

As medidas de promoção do aprimoramento

que este deverá ter capacidade ociosa suficiente

tecnológico dos veículos, resultando no aumento

para absorver a demanda nas ocorrências de

da eficiência dos veículos no que se refere ao

condições climáticas adversas, situação em que

consumo de energia e emissões de GEE, devem

seu próprio desempenho operacional também

ser rapidamente implementadas. De fato, alguns

é degradado. O aprofundamento dessas duas

países, como é o caso dos EUA, têm conduzido

linhas de investigação é fundamental para que se

suas ações de mitigação de emissões no setor

estabeleçam bases confiáveis para a construção das

de transportes cada vez mais nesse sentido.

políticas públicas de incentivo ao transporte ativo.

Aprovada em 2007, a lei Energy Independence and Security Act (U.S. Congress, 2007. In: EWING

Os co-benefícios decorrentes da promoção de

et al., 2008) estabelece limite para o consumo de

políticas de racionalização e substituição modal

combustível de novos veículos de passageiros,

para a mitigação de emissões de GEE são tão

que deverão percorrer não menos que 35

expressivos, seja por sua contribuição para a

milhas por galão a partir de 2020 (equivalente

melhora das condições de saúde da população,

a 14,9 km/l). Esse limite deverá promover

seja por sua contribuição ao desenvolvimento

uma redução média de 34% no consumo por

econômico, que não podem deixar de ser

quilômetro rodado para toda a frota em 2030.

considerados no desenvolvimento das análises

Não há proposta equivalente em discussão

e estudos de viabilidade econômica quando

aprofundada no Brasil, onde apenas a ideia da

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48

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

adoção de um selo de eficiência energética

anos da análise, de 2010 a 2050. Esse incremento

para os veículos, a exemplo do já adotado para

não ocorre imediatamente, entretanto; no

eletrodomésticos e lâmpadas, foi amplamente

curto prazo, a melhoria das condições viárias

considerada até o momento. No caso brasileiro

irá reduzir os congestionamentos e atrasos e,

os resultados de limites mandatórios de emissão

como consequência, o consumo de combustível.

para veículos se farão sentir mais lentamente que

Apenas quando a demanda induzida começar a

nos EUA, dado o ritmo mais lento da renovação

consumir o incremento de capacidade viária após

da frota de veículos. Ainda assim, sua rápida

2030 é que as emissões de GEE deverão crescer,

implantação poderá evitar que a frota de veículos

juntamente com a quilometragem total percorrida.”

novos movidos exclusivamente à gasolina

(CAMBRIDGE SYSTEMATICS, 2009, p. 43).

(sem tecnologia flex) e sem nenhum controle de emissões de GEE cresça demasiadamente,

CONTROLE DA QUILOMETRAGEM TOTAL

incentivada pelo rápido crescimento das

PERCORRIDA

importações. Os ganhos de eficiência e a consequente redução A perda de eficiência resultante de

de emissões, decorrentes do aprimoramento

congestionamentos também contribui para o

tecnológico dos veículos, serão rapidamente

aumento das emissões de GEE e contaminantes. O

obliterados pelo crescimento da quilometragem

consumo de combustível cresce em consequência

total percorrida pela frota de automóveis. Esse

do tempo parado em ponto morto com os

crescimento é provocado: pela ampliação da

motores operando e da frequente aceleração

frota, pelo crescimento do uso dos automóveis

e desaceleração. Investimentos no aumento

em viagens antes realizadas a pé ou por

da capacidade viária e no aprimoramento da

transporte coletivo e pelo crescimento da distância

operação do trânsito significam um imediato

média percorrida em cada viagem, consequência

ganho de eficiência e consequente redução

do espraiamento das atividades no território.

de emissões. No entanto, os ganhos obtidos, resultado do aumento da velocidade média dos

Analisando o caso dos EUA, EWING et al.

veículos pela redução dos congestionamentos,

(2008) identificou que o rápido crescimento

não se restringem à redução das emissões.

da quilometragem percorrida fará com que as

São acompanhados pela redução dos tempos

emissões de GEE de automóveis e utilitários

de viagem e redução dos custos diretos com

leves permaneçam estáveis, correspondendo em

combustível, resultando em maior atratividade e

2030 aos mesmos níveis encontrados em 2005,

incentivo ao uso de automóveis e caminhões. No

a despeito dos ganhos decorrentes do aumento

longo prazo terminam por provocar o resultado

de eficiência e da adição de biocombustível

oposto, trazendo o incremento das emissões.

à gasolina impostos pela legislação vigente.

Estudo realizado nos EUA avaliando diversas

Desde 1980 a quilometragem percorrida pelos

estratégias de redução de emissões no setor de

americanos cresceu três vezes mais rápido que

transportes apontou: “Expansão da capacidade

a população e cerca de duas vezes mais rápido

viária e alívio de congestionamentos são as

que a frota. O tempo de viagem nas áreas

Instagram @luicortez

únicas duas estratégias analisadas pelo estudo

metropolitanas tem crescido constantemente

afluente do Rio Negro,

Moving Cooler que resultam em um incremento

ao longo das décadas e muitos americanos

periferia de Manaus AM

das emissões de GEE durante o período de 40

atualmente gastam mais tempo na somatória


50

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

das viagens residência-trabalho que usufruindo

aumenta o uso do transporte individual. Grandes

implantação de uma rede de terminais logísticos

criteriosamente considerados quando

de férias. Da mesma maneira, a área consumida

distâncias, grande fluxo de veículos e grandes

multimodais e a revisão da estrutura de

da definição das estratégias e políticas

para novos loteamentos imobiliários vem

congestionamentos, agravando o consumo

recolhimento tributário, associadas a medidas

públicas de mitigação, tanto do setor quanto

crescendo a taxas quase três vezes mais rápidas

de combustível e aumentando as emissões de

complementares de incentivo, apontam para

intersetoriais. Outro co-benefício de extrema

que o crescimento populacional. A ocupação de

GEE. Reverter esse quadro demandará tempo

resultados efetivos na redução das viagens

importância, não mencionado anteriormente

áreas rurais pelo espraiamento das áreas urbanas

e um enorme esforço de gestão, mas a tarefa

vazias e para uma maior racionalização de

neste documento, é a contribuição aportada

provocou o aumento das emissões de CO2 por

precisa ser enfrentada. Como ressalta EWING

todo o transporte de cargas, com inegáveis

por sistemas de transportes mais eficientes

automóveis, ao mesmo tempo em que reduziu as

et al. (2008, p. 134) “o planejamento criterioso

benefícios econômicos e ambientais.

à conservação de energia e à preservação

áreas plantadas disponíveis para a absorção de

é crucial para a implantação de reformas no

de recursos naturais, recursos finitos cuja

CO2 (EWING et al., 2008).

uso do solo e no transporte a nível regional. [...]

utilização precisa ser otimizada.

Uso do solo e transporte definem um ao outro;

CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE A MITIGAÇÃO

O fenômeno de espraiamento das manchas

nenhum pode ser totalmente compreendido

DE EMISSÕES NO SETOR

urbanas vem ocorrendo a passos acelerados

ou racionalizado isoladamente”. Por sua vez, “a

também no Brasil, marcadamente junto

redução das emissões de CO2 no transporte é

A análise das evidências apresentadas

implantar apenas ações isoladas que prometem

às grandes cidades. Buscando condições

como uma banqueta apoiada em três pernas:

nesta resenha permite destacar dois pontos

resultados imediatos, como as soluções de

financeiramente mais favoráveis para reduzir

uma relacionada à eficiência no consumo de

fundamentais:

aprimoramento tecnológico dos veículos, de

os custos com moradia, muitas famílias buscam

combustível, outra no combustível – fóssil

• primeiro, sublinhar a importância da

ampliação da capacidade viária, ou de adoção

novas áreas de ocupação urbana, localizadas cada

ou renovável – e a terceira na quantidade de

implementação de medidas integradas,

de biocombustíveis por meio de incentivos

vez mais distantes dos centros metropolitanos.

quilômetros percorridos. As iniciativas de energia

inclusive de caráter intersetorial, seja para

econômico-financeiros. Estas podem ser

Inicialmente circunscrito predominantemente à

e clima a nível federal e estadual [nos EUA] têm

garantir a persistência dos resultados

importantes, mas devem vir acompanhadas de

população de baixa renda, levando à criação de

pendurado suas esperanças em controlar as

obtidos, seja para alavancar os resultados

ações de mais longo prazo. Como ressalta OWEN

extensos cinturões periféricos de urbanização

duas primeiras pernas da banqueta. Mas uma

com o aproveitamento das sinergias que

(2009, p. 99) “No longo prazo, dependência do

precária, o fenômeno da expulsão dos grandes

banqueta não pode parar em pé apoiada apenas

se possam criar entre as diversas medidas.

automóvel ainda é dependência do automóvel.

centros atinge agora as classes média e média-

em duas pernas” (2008, p.3).

Isso significará um grande esforço de

Aumentar a eficiência e reduzir o consumo dos

aprimoramento de gestão, exigindo a

automóveis pode, no curto prazo, de alguma

alta, incentivado pelas facilidades para a compra

Na definição das estratégias de mitigação para o setor, é preciso resistir à tentação de

de automóveis. Desse padrão de ocupação

DESDE 1980 A QUILOMETRAGEM

implementação de políticas públicas

forma reduzir o ritmo em que o mundo exaure

espraiada e pouco densa do solo, que se

PERCORRIDA PELOS AMERICANOS

integradas e duradouras, haja vista que os

sua disponibilidade de petróleo, mas, ao final,

desenvolve ao longo dos eixos rodoviários e

CRESCEU TRÊS VEZES MAIS RÁPIDO QUE

resultados somente poderão ser obtidos no

tornar o uso de automóveis mais barato apenas

que é agravado em seus impactos pela quase

A POPULAÇÃO E CERCA DE DUAS VEZES

longo prazo, o que exige que as medidas

encoraja as pessoas a dirigirem mais. Carros

ausência de planejamento territorial, resulta uma

MAIS RÁPIDO QUE A FROTA. O TEMPO DE

sejam permanentes e consistentes;

melhores, isoladamente, não importa quantos

enorme dependência do uso do automóvel para

VIAGEM NAS ÁREAS METROPOLITANAS TEM

a efetivação de todas as atividades cotidianas

CRESCIDO CONSTANTEMENTE AO LONGO

volume de investimentos necessários para

poderão reduzir a pegada de carbono da

das famílias. Essa mesma ausência de densidade

DAS DÉCADAS E MUITOS AMERICANOS

a implantação de medidas de redução de

humanidade”.

torna financeiramente inviável a oferta de

ATUALMENTE GASTAM MAIS TEMPO NA

emissões de GEE no setor de transportes,

transporte público adequado, consolidando

SOMATÓRIA DAS VIAGENS RESIDÊNCIA-

vis-à-vis os resultados de mitigação obtidos,

Transporte e uso do solo são absolutamente

um ciclo vicioso de dependência total do

TRABALHO QUE USUFRUINDO DE FÉRIAS.

e considerando, também, que os benefícios

interdependentes. O adensamento urbano

à saúde e qualidade de vida da população,

permite grandes ganhos de eficiência.

transporte individual. A segregação das funções

• segundo, considerando o expressivo

quilômetros possam percorrer por litro, não

urbanas – habitação em condomínios fechados

No que se refere à redução da quilometragem

juntamente com os benefícios econômicos,

Apesar disso, a ideia de reunir quase toda a

exclusivamente residenciais, escolas, comércio,

percorrida por veículos de carga, um resultado

podem ser muito superiores que aqueles

população mundial (as projeções indicam

serviços e empregos em locais distantes, não raro

mais rápido pode ser obtido no transporte inter-

diretamente relacionados à mitigação das

algo em torno de 12 bilhões de pessoas no

em outros municípios – inviabiliza o transporte

regional com medidas para aumentar a ocupação

emissões de GEE, é imperativo que tais co-

final do século) em densas aglomerações

ativo, torna ineficiente o transporte coletivo e

e reduzir as viagens com caminhões vazios. A

benefícios (externalidades positivas) sejam

urbanas encontra severa resistência naqueles


52

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

que defendem a imagem idílica de pequenos

USO DO SOLO E TRANSPORTE DEFINEM UM

as mudanças no uso do solo e os investimentos

atmosfera, as ações de mitigação das emissões

grupos vivendo quase isoladamente em

AO OUTRO. NENHUM PODE SER TOTALMENTE

em aprimoramento e ampliação das opções

de GEE promoverão a equidade social, a redução

meio à natureza. Intuitivamente, muitos

COMPREENDIDO OU RACIONALIZADO

de transporte podem aumentar a eficiência e

de custos de tratamento de saúde, o incremento

ambientalistas apegam-se à noção de que

ISOLADAMENTE.

a qualidade de todas as viagens, reduzindo as

da produtividade e da qualidade de vida.

distâncias percorridas ou substituindo as viagens

Em resumo, promoverão o desenvolvimento

famílias vivendo em habitações isoladas, em áreas semi-rurais de muito baixa densidade,

As evidências disponíveis são significativas para

motorizadas pelo transporte ativo, reduzindo

sustentável e contribuirão para evitar que esse

representam um impacto ambiental menor

indicar que o planejamento territorial deve

dessa forma as emissões de GEE. As reduções

desenvolvimento seja inviabilizado por mudanças

e que esse modelo de ocupação do território

priorizar o assentamento populacional em áreas

mais notáveis para essas estratégias foram

demasiadamente acentuadas no regime climático.

é mais sustentável, devendo, portanto, ser

urbanas adensadas, permitindo o crescimento

obtidas nas décadas mais distantes analisadas,

defendido e generalizado. Para embasar essa

populacional e o desenvolvimento econômico

de 2030 em diante. Trata-se de estratégias que

A formulação das estratégias e políticas

noção intuitiva, um ranking de indicadores

sem exaurir a disponibilidade de áreas para a

irão requerer mudanças nas políticas públicas

públicas de mitigação de emissões de GEE deve

como consumo de energia, consumo de água,

agropecuária e para a recuperação da cobertura

em curso e na legislação vigente, junto com

considerar sempre as externalidades positivas

geração de lixo e tantos outros certamente

florestal, garantindo a permanência dos serviços

investimentos significativos em razão dos

que serão potencialmente geradas por ações

colocará as grandes metrópoles no topo da lista,

ambientais e a preservação da biodiversidade.

custos de capital para expansão dos serviços de

de mitigação no setor de transportes, de forma

se forem considerados os valores absolutos. Em

No que diz respeito ao transporte, não há como

transporte público, mas essas estratégias poderão

a obter uma análise mais adequada dos custos

OWEN (2009, p. 14) essa noção é contestada:

garantir, em longo prazo, o controle das emissões

assegurar reduções significativas das emissões

e benefícios envolvidos. Sem a adoção de

“A população de Nova York é treze vezes maior

de GEE do setor sem a implantação integrada de

de GEE em 2050, na faixa entre 9 e 15%, sem

medidas intersetoriais integradas, dificilmente

que a de todo o estado de Vermont e, assim, os

políticas de ordenamento territorial, local e regional,

recorrer a medidas simultâneas de penalização

será possível lograr reduções significativas

dados de consumo em qualquer categoria farão

para contenção do espraiamento urbano.

financeira para gestão da demanda”. Note-se que

e consistentes no longo prazo. O setor de

esse resultado é extremamente positivo, pois a

transportes tem participação importante nas

a cidade parecer avassaladora em qualquer comparação direta. É o consumo per capita

As medidas de resultado imediato devem ser

implementação de medidas demasiadamente

emissões de GEE e a eficácia das ações de mitigação

que conta, no entanto, e por esse critério os

acompanhadas daquelas de mais longo prazo,

agressivas de gestão da demanda pela imposição

será ainda mais expressiva em razão dos co-

habitantes de Vermont usam mais água que

como a implantação de infraestrutura de

de penalizações financeiras (como a criação de

benefícios à saúde e à preservação ambiental que

os nova-iorquinos. Eles também consomem

transporte que permita a mudança modal, tanto

taxas de carbono, elevação de alíquotas, pedágios

resultarão de sua adequada implantação.

três vezes e meia mais gasolina – 545 galões

de passageiros como da carga, e medidas que

urbanos e outros esquemas de cobrança) pode

por pessoa por ano, versus 146 para todos os

promovam a redução da quilometragem total

gerar problemas de equidade pela elevação

habitantes da cidade de Nova York e apenas 90

percorrida pelos veículos. Referindo-se ao uso

dos custos de transporte e impactar de maneira

para os habitantes de Manhattan – resultando

do solo a ao incremento das opções de modos

negativa o desenvolvimento da economia. Dessa

que, dentre os cinquenta estados, o pastoral

de transporte no capítulo de conclusões de seu

maneira, a formulação das políticas de redução

Vermont fique na 11ª posição em consumo de

estudo, CAMBRIDGE SYSTEMATICS (2009, p. 83)

de emissões fica menos pressionada a adotar

gasolina per capita, enquanto o estado de Nova

afirma que “enquanto algumas das estratégias do

medidas agressivas de penalização para gestão

York, inteiramente graças à cidade de Nova

estudo Moving Cooler podem ser implementadas

da demanda.

York, ocupa a última e mais baixa posição. Os

rapidamente, outras requerem muitos anos para

habitantes de Vermont também consomem

serem colocadas em prática. Esta observação

Conforme foi apresentado no anteriormente, os

acima de quatro vezes mais eletricidade que os

é particularmente verdadeira para medidas

benefícios para a saúde humana decorrentes da

moradores da cidade de Nova York, têm uma

integradas que envolvam mudanças no padrão de

implantação de medidas de redução das emissões

pegada de carbono maior e geram mais lixo

ocupação territorial para aumentar a densidade

de GEE pelo setor de transportes são muito

sólido, não importa quantos se dediquem a

e reduzir as distâncias percorridas ou reduzir a

importantes, graças à redução da poluição e dos

compostar seus resíduos orgânicos no quintal

necessidade de recorrer a modos motorizados.

acidentes. Ao proporcionar simultaneamente a

de suas casas”.

A análise demonstrou que, ao longo do tempo,

redução das concentrações de contaminantes na


54

O CUSTO DO INSUSTENTÁVEL

CONCLUSÃO TRANSPORTE E MOBILIDADE SUSTENTÁVEL SÃO ESSENCIAIS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. Ao longo deste relatório apresentamos diversas evidências dos impactos econômicos, sociais e ambientais provocados pelo transporte. De um lado, o transporte é essencial para a vida em sociedade e para o desenvolvimento econômico. Por outro, as externalidades negativas decorrentes da adoção de modelos pouco eficientes impõe um pesado ônus à sociedade e aos governos, além de contribuir para o esgotamento de recursos naturais não renováveis e para a degradação ambiental. Os atuais níveis de acidentes, poluição, congestionamentos e ineficiência são inaceitáveis, pois contribuem para a perpetuação das desigualdades sociais e econômicas. A promoção do desenvolvimento sustentável depende da ampla disponibilidade de sistemas de transporte energeticamente eficientes, seguros, acessíveis, abrangentes e capazes de suprir as necessidades de deslocamento de pessoas e mercadorias com velocidade, confiabilidade e economia. Além disso, devem ser ambientalmente amigáveis, ou seja, demandar poucos recursos naturais e gerar cada vez menos impactos negativos. Transporte e mobilidade sustentável são condições prévias essenciais para o desenvolvimento sustentável. Eis o grande desafio que se coloca para as nações LatinoAmericanas neste início de século 21: promover uma rápida mudança em seus sistemas de transporte, implantado políticas públicas integradas e duradouras que permitam um salto de qualidade em direção ao transporte e ao desenvolvimento sustentável. Instagram @luicortez


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Texto Luiz Antonio Cortez Ferreira Projeto Editorial Joseli Maniassi Fotos da capa @ja2d @leocostanza @luicortez @niggaonthesampa Cláudio Sumida Impressão EPR Gráfica e Editora Ltda. Tiragem desta edição 1.500 exemplares 1ª edição em Setembro de 2012

INICIATIVA LATINOAMERICANA PARA EL TRANSPORTE SOSTENIBLE - ILATS INICIATIVA LATINO-AMERICANA PARA O TRANSPORTE SUSTENTÁVEL - ILATS Rua do Paraíso, 67 - 2º andar - 04103-000 - São Paulo - SP - Brasil ilats@ilats.net www.ilats.net

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