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Ficha Técnica Título À Descoberta do Cacau Autoria CIDAC e Lina Afonso, a partir do original da ORCADES e da CRDP Poitou-Charentes Edição e Revisão IMVF – Instituto Marquês de Valle Flôr Design Diogo Lencastre Impressão Armazém Papéis do Sado Lda ISBN 978-989-95775-4-1 Lisboa, Julho de 2008 Este texto pode ser citado e divulgado, desde que citada a fonte.
Esta edição, revista e aumentada a partir do original “Á la découverte… du cacao”, produzido pelas organizações francesas ORCADES e CRDP PoitouCharentes, faz parte da produção de materiais no âmbito do projecto “Comércio Justo: Interdependência Sul/Norte”. Este projecto (2006-2008) é dinamizado pelo Instituto Marquês de Valle Flôr (IMVF - www.imvf.org) e pelo Centro de Informação e Documentação Amílcar Cabral (CIDAC - www.cidac.pt), em parceria com 5 organizações nacionais de Comércio Justo: Aventura Marão Clube (www.aventuramaraoclube.com), Cores do Globo (www.coresdoglobo. org), Mó de Vida (www.modevida.com), Planeta Sul (www.planetasul.org) e Reviravolta (www.reviravolta.comercio-justo.org). Co-financiamento:
Apoio:
Esta publicação foi produzida com o apoio da União Europeia. O conteúdo desta publicação é da exclusiva responsabilidade do IMVF e não pode, em caso algum, ser considerada como expressão das posições da União Europeia
Índice Introdução..................................................................................................................................................................5 1. Explorar o filme.................................................................................................................................................9 1.1 Apresentação do país........................................................................................................................9 1.2 As personagens do filme.............................................................................................................11 1.3 Texto das entrevistas e dos comentários do filme....................................................13 1.4 Informações complementares sobre cada sequência............................................19 1.5 Grelhas de leitura..............................................................................................................................21 2. Actividades pedagógicas.......................................................................................................................23 2.1 O cultivo do cacau............................................................................................................................23 2.2 A população da Costa do Marfim..........................................................................................25 2.3 Medir o desenvolvimento humano......................................................................................28 2.4 O cacau e o chocolate no mundo..........................................................................................31 2.5 A palavra aos produtores da Costa do Marfim.............................................................34 2.6 À procura de um chocolate mais justo..............................................................................36 3. Fichas informativas.....................................................................................................................................39 3.1 O cacau.....................................................................................................................................................39 – História do cacau.........................................................................................................................39 – A planta..............................................................................................................................................39 – Cultura................................................................................................................................................40 – Modo de produção....................................................................................................................41 – Colheita e secagem...................................................................................................................41 – Transformação: fabrico da pasta de cacau................................................................42 – Valor nutritivo do chocolate................................................................................................42 – Consumo de chocolate...........................................................................................................43 3. 2 O comércio mundial do cacau.................................................................................................44 – Breve sumário................................................................................................................................44 – Produção e exportação de cacau no mundo..........................................................45 – Importação de cacau................................................................................................................49 – Acordo Internacional do Cacau de 2001....................................................................51 – O sector do cacau na Costa do Marfim........................................................................52 – O cacau de Comércio Justo..................................................................................................55 – O cacau biológico.......................................................................................................................58 4. Para saber mais..............................................................................................................................................61
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introdução Este livro é uma ferramenta pedagógica que acompanha o filme-documentário “À Descoberta do Cacau”, filmado na Costa do Marfim em 19961, fornecendo não só pistas sobre como explorar o conteúdo do filme, mas também informações e elementos de reflexão que permitem complementar e aprofundar o mesmo. Para tal, este livro é composto por três partes principais: 1. informações várias sobre o filme, incluindo enquadramento geral do país de produção, informações sobre as personagens e sobre as sequências do filme; 2. actividades pedagógicas relacionadas com a produção e o comércio do cacau; 3. fichas informativas sobre o cacau e o seu mercado mundial. Este documento é dirigido tanto a crianças e jovens como às/aos suas/ seus professoras/es. As actividades propostas podem relacionar-se com uma ou várias disciplinas, podendo ser adaptadas em função da turma ou grupo à qual se destinam, do tempo disponível e também em função das noções já anteriormente abordadas. As actividades podem ser realizadas independentemente do filme. “À Descoberta do Cacau” permite às crianças e aos jovens: – Descobrir a vida quotidiana de trabalhadores/as ou empresários/as agrícolas nos países em desenvolvimento (condições de trabalho e modo de vida); – Perceber as dificuldades que os/as produtores/as têm que enfrentar; – Identificar as etapas do cultivo e da transformação do cacau; – Identificar diferentes estruturas de produção e diferentes redes de comercialização do cacau; Filme da ORCADES e da CRDP Poitou-Charentes, com a duração de 13 minutos, para o qual obtivemos autorização de legendagem e reprodução.
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– Tomar conhecimento dos esforços despendidos pelas populações para melhorar as suas condições de trabalho e o seu nível de vida; – Olhar com espírito crítico para as condições de venda destes produtos aos países industrializados. Mais globalmente, questionar-se sobre os modelos de desenvolvimento dos países do Norte e do Sul2. O filme está dividido em quatro sequências: – Sequência 1 – apresentação geral de informações sobre o lugar das filmagens, as principais actividades económicas da região e também as actividades das crianças; – Sequência 2 – cultura e colheita – mostra as diferentes etapas da cultura até à colheita e as condições de trabalho nas plantações (estatuto dos empregados, horário, ambiente...); – Sequência 3 – preparação e acondicionamento – permite descobrir as diferentes operações de transformação e embalagem do cacau; – Sequência 4 – transporte e comercialização – dá informação sobre as condições de venda do cacau e sobre os problemas encontrados pelos donos das plantações ou trabalhadores agrícolas, propondo algumas alternativas para melhorar as condições de trabalho e a remuneração dos produtores. Embora o filme não seja recente, o panorama actual da produção mundial de frutos tropicais não difere muito da realidade de 1996. De facto, os países produtores, as condições de produção, a remuneração das/os trabalhadoras/es, a importância desta produção para o desenvolvimento dos países do Sul e a relação com os países compradores do Norte, em pouco se alterou. Por este motivo, dada a qualidade do filme, apostámos na sua legendagem e na edição deste livro que o acompanha. Tal como esta introdução inclui excertos do texto original e novos conteúdos, também o resto do livro é constituído por partes adaptadas do O conceito “países do Sul” e “países do Norte” tem por base não a estrita localização geográfica dos países (no hemisfério sul ou norte) mas sim o nível de desenvolvimento económico desses países. Assim, “países do Sul” refere-se ao grupo de países economicamente menos desenvolvidos e países em desenvolvimento, localizados na sua grande maioria em África, Ásia e América Latina.
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texto original, com autoria da ORCADES e da CRDP Poitou-Charentes, a que se juntam partes construídas de raiz pelo CIDAC. Do texto original conservámos o capítulo 1; a actividade pedagógica 2.1, que agrega duas actividades do original; a actividade pedagógica 2.4, que foi alargada; e as fichas informativas do ponto 3.1. A actividade 2.5 baseia o seu nome, o texto de trabalho e as perguntas de análise nas fichas informativas do ponto 3.3 do original. Todos os textos foram revistos e actualizados. Fazemos ainda destaque para a actividade pedagógica 2.6, construída a partir de uma ideia do IMVF.
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1. explorar o filme 1.1 Apresentação do país Costa do Marfim Organização constitucional: República Regime: presidencial Capital: Yamoussoukro, capital política; Abidjan, capital económica Data de independência: 1960 Superfície (km²): 322.462 (duas vezes Portugal) Moeda: franco CFA (1 euro = 656 francos CFA) Língua oficial: Francês Línguas nacionais: Baoulé, Bété, Dioula, Sénoufo Chefe de Estado: Laurent Gbagbo (desde Outubro de 2000) População: 18.800.000 (2007) (1) Densidade (Habitantes/km²): 58,3 Crescimento demográfico anual: 2% (2007) (2) População urbana: 46 % (2007) (1) Taxa de Alfabetização: 50,9 % - homens 57,9%, mulheres 43,6% (2003) (2) PIB: US$ 29,05 biliões (2007) (2) PIB per capita (US$ por habitante): 1.545,2 (2007) Inflação anual: 3,2% (2007) (2) Taxa de crescimento económico anual: 1,2% (2007) (2) Dívida externa: US$ 11,96 biliões em 2007 (2), 41,2% do PIB Fonte: (1) UNFPA, United Nations Population Fund- www.unfpa.org/swp/2007/spanish/notes/indicators.html (2) Index Mundi- www.indexmundi.com/pt
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MALI
BURKINA FASO
GUINÉ COSTA DO MARFIM
Daloa
LIBÉRIA
Yamoussoukro
GANA
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1.2 As personagens do filme Kevin Guehi Kore Kevin é um rapaz de doze anos que vive na aldeia de Loboguiguia, perto da cidade de Daloa, na Costa do Marfim. Durante o ano lectivo Kevin vai à escola na aldeia vizinha. Durante as férias ajuda o pai, tios e tias na colheita do cacau e na secagem das sementes de cacau – e por vezes vai ao mercado vender vinho de palma. Nos tempos livres brinca com os amigos, passeia na floresta onde caça aves, toma banho na ribeira e visita o seu amigo Benjamin Lago que tem um palmeiral. E, claro, não falta a nenhuma das festas na aldeia. Kevin tem muitos irmãos, irmãs, primos e primas. No filme Kevin faz-nos descobrir a sua região, as suas actividades e os seus passatempos. Benjamin Guehi Benjamin é o pai de Kevin. É o chefe da família alargada – que agrupa todos os seus irmãos e irmãs – desde que o seu pai morreu. A tradição dita que o mais velho dos filhos passa a ser o chefe da família após a morte do pai (o “velho”). Foi o “velho” que em tempos criou a plantação de café e cacau onde havia floresta virgem. No meio da plantação construiu um acampamento com casas para as suas quatro mulheres e os seus filhos. Agora Benjamin é responsável pela plantação mas a produção de algumas parcelas pertence a alguns dos seus irmãos. Isto permite-lhes rendimentos para as suas necessidades e, sobretudo, para pagar os estudos dos seus filhos.
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Benjamin Lago Benjamin Lago tem 36 anos, é agricultor e vive em Loboguiguia. Nasceu nesta aldeia onde goza da confiança de todos os habitantes, sobretudo a do chefe da aldeia. Ele tira das palmeiras um vinho chamado “blanco”, muito bom.
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1.3 Texto das entrevistas e dos comentários do filme Comentários “off” sobre o país A Costa do Marfim é um país do ocidente Africano povoado com 18,8 milhões de habitantes3. Tem costa atlântica e é cercada por cinco países: Libéria, Guiné, Mali, Burkina Faso e Gana. Neste documentário, produzido perto da vila de Daloa, vamos descobrir o cultivo do cacau graças a Kevin Gehi Kore, um rapaz de doze anos, Benjamin Gehi, seu pai, cultivador de cacau e Benjamin Lago, um agricultor. Sequência 1: Apresentação geral Benjamin Lago A nossa aldeia chama-se Loboguiguia. Situa-se a 15km de Daloa, no centro oeste da Costa do Marfim. É composta por três grandes famílias. Esta aldeia tem 300 habitantes, de várias etnias. Há os Djula e também os Baulé. Há os Senufo que vieram comprar floresta para constituir a sua plantação. Há os Webé, os Guere e os Tula. Vivemos em perfeita harmonia. As várias actividades económicas da região dependem da exploração da madeira, do café e do cacau. As culturas de subsistência são a banana, o arroz, o feijão, o inhame e a mandioca que consumimos todos os dias.
Valores actualizados a 2007.
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Kevin Guehi Chamo-me Kevin Guehi Kore. Vivo na aldeia de Loboguiguia, na Costa do Marfim. Por todo o lado ainda há floresta tropical. Passeio por lá muitas vezes com o meu irmão. Caçamos pássaros e grelhamo-los. Por vezes visitamos o Benjamin que tem uma plantação de palmeiras. Do extracto de palmeira faz um vinho a que chamamos “blanco”. É mesmo muito bom. Com os meus irmãos e amigos vamos ao rio para pescar e tomar banho. Sequência 2: O acampamento e a colheita Kevin Guehi A plantação de cacau da nossa família está a 8 km da aldeia. No meio da plantação está o que chamamos de acampamento. É aí que moramos. Benjamin Guehi O acampamento foi criado pelo meu pai na floresta virgem. Mais tarde vieram os seus irmãos e passou a ser um grande acampamento. Eram os pais dos meus avós que possuíam esta terra. O último proprietário dessas plantações era o meu pai, que acaba de morrer. O meu pai teve 13 filhos, 10 rapazes e 3 raparigas. Tinha 4 mulheres. Em África, as diferentes mulheres e os seus filhos não vivem na mesma casa. O nosso pai deixou-nos construir as nossas casas à volta da sua, no acampamento. Assim, cada mulher pode viver com as suas filhas e os seus filhos numa casa. Nesta terra só cultivamos café e cacau. Tem uma superfície entre 6 a 7 hectares. Para ter uma boa colheita é preciso limpar cuidadosamente a plantação. Isto significa que temos de cortar as ervas daninhas e podar as árvores. E também é preciso fazer tratamentos.
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O cacaueiro começa a produzir a partir dos três anos. Quando os frutos do cacau estão maduros, convidam-se todos os irmãos, não só os que vivem no acampamento mas também os da aldeia e os melhores amigos. Eles vêm ajudar a fazer a colheita. Os frutos podem ser colhidos com a catana [faca grande muito utilizada no mato] mas mais frequentemente com uma faca de poda. Antigamente colhiam-se com catanas e facas. Quando todos os frutos estão colhidos, as mulheres e os rapazes apanham-nos para os transportar até ao local onde serão partidos para extracção das sementes. Pode haver 20 a 30 sementes por fruto. Depois põem-se no que chamamos um forno, para elas fermentarem durante 2 ou 3 dias. Não temos mão-de-obra paga. Somos nós, os proprietários, que tratamos dos campos com os nossos filhos. Quando forem crescidos serão eles que farão sozinhos os trabalhos da plantação. Kevin Guehi Ajudamos muitas vezes os nossos tios e os irmãos mais velhos na colheita do cacau e na extracção das sementes. Nós, as crianças, gostamos de beber o sumo que corre das sementes dos frutos do cacau.
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Sequência 3: O transporte e a secagem Benjamin Guehi Quando as sementes já fermentaram o suficiente, retiram-se as folhas de bananeira que cobriam o forno. Transportam-se as sementes até ao acampamento porque debaixo dos cacaueiros está demasiado húmido. Espalham-se no chão num local soalheiro para as deixar secar. Ao fim de 3 ou 4 dias, quando as sementes estão bem secas, fazem-se montinhos para as pôr nos sacos. Estes sacos são transportados para um lugar de armazenamento. Quando se tem um carro transportam-se os sacos até a aldeia, se não o transporte é feito pelas mulheres. Depois a produção pode ser vendida. Kevin Guehi À tarde ajudamos os pais a apanhar as sementes secas e a pô-las nos sacos. À volta do acampamento há muitas árvores de fruto. A noz de coco é a minha fruta preferida.
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Sequência 4: O mercado e a comercialização Kevin Guehi Domingo é dia de mercado. Muitas pessoas vêm dos acampamentos e das aldeias vizinhas para vender ou comprar produtos. Benjamin Lago O cacau é uma cultura muito importante para os agricultores. É um produto de exportação muito apreciado na Europa. Assim o produtor ganha dinheiro em certos períodos do ano, ao vender a sua produção. O cacau fornece meios financeiros aos produtores4. É com este dinheiro que podem mandar os filhos para a escola, sustentar as suas mulheres e construir-lhes casas. O preço do cacau é fixado pelo governo; não é o produtor que determina o preço ao qual o seu produto deve ser comprado. Em 1996 o cacau era vendido pelo produtor a 320 francos CFA por quilo5 (0,49€). É um preço baixo em relação ao preço a que é vendido aos Europeus. O produtor enfrenta várias dificuldades: trabalha só com catanas, não recebe ajudas nem do Governo nem de ninguém. Tem que trabalhar muito para conseguir uma plantação e, para além disso, uma plantação nova só produz a partir do terceiro ano.
Para mais informação sobre os benefícios que os produtores obtêm do cacau ver o capítulo 3. 2 - O comércio mundial do cacau.
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Em 2005/06 o quilo do cacau valia 342 francos CFA (0,52€).
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Comentário “off” sobre a formação Algumas organizações dão cursos de formação aos pequenos produtores para que possam melhorar a manutenção das suas plantações e aumentar assim os seus rendimentos. Outro objectivo dessas formações é ajudar os produtores a organizarem a sua produção para a comercializarem a um preço mais vantajoso. Benjamin Lago Uma cooperativa reúne toda a produção dos agricultores que são membros da cooperativa. As sementes são assim vendidas directamente às fábricas ou a exportadores. O dinheiro que a cooperativa recolhe é distribuído pelos produtores. Quando não existe nenhuma cooperativa na aldeia, o produtor é obrigado a vender o seu cacau aos Sírios ou aos Libaneses ou a compradores ambulantes, isto é, aos Dioulas. Estes impõem os seus preços e os produtores são obrigados a aceitar. O cacau é um produto muito importante porque permite fabricar o chocolate que é consumido pelos Europeus. Para nós tirarmos mais benefícios desta cultura pedimos ao governo para criar mais fábricas de transformação. Assim, o futuro seria melhor para todos nós.
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1.4 Informações complementares sobre cada sequência Damos aqui algumas informações complementares sobre o filme para, eventualmente, responder a pedidos de informação das crianças e dos jovens sobre as actividades e histórias incluídas no vídeo. Sequência 1: Apresentação geral – No primeiro plano vemos frutos de cacau nas árvores. – Aldeões deslocam-se essencialmente a pé. Algumas pessoas têm bicicletas. Para ir para a aldeia vizinha ou para a cidade as pessoas utilizam os transportes colectivos. – Após a sequência sobre as madeiras, vê-se a operação de secagem do cacau: o cacau é remexido com a ajuda dos pés. – Uma mulher prepara o “foutou” de bananas6, alimentação de base, acompanhado com um molho confeccionado com óleo de palma, hortaliças e, por vezes, peixe ou carne. Ela esmaga a banana-pão cozida. – Kevin é entrevistado no acampamento. Por detrás vê-se o espaço onde secam as sementes de cacau e duas construções feitas com terra e ervas secas. – O “blanco” (vinho de palmeira) é retirado duma palmeira que foi abatida. Para retirar o vinho, aquece-se uma parte do tronco para provocar a saída do líquido. É possível obter dois litros de vinho por dia. Quando está fresca, a bebida não é alcoolizada. Torna-se ligeiramente alcoolizada depois da fermentação. Benjamin tem um palmeiral. Actualmente tem oito árvores abatidas que lhe dão vinho. Essa produção fornece-lhe um pequeno rendimento.
Prato tradicional na Costa do Marfim feito com banana-pão e mandioca.
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Sequência 2: O acampamento e a colheita – A limpeza das árvores divide-se em várias operações: retirar os frutos estragados, corte da madeira seca e dos ramos supérfluos. – Depois de partir os frutos, uma mulher separa as sementes umas das outras e retira alguns bocados não aproveitáveis. – Chama-se “forno” ao local onde as sementes são colocadas em monte para fermentar durante alguns dias. Este “forno” é feito com folhas de bananeira. Sequência 3: O transporte e a secagem – A secagem dura vários dias; é preciso colocar as sementes ao abrigo da chuva todas as noites. Sequência 4: O mercado e a comercialização – Nesta região os cursos de formação dos agricultores são dados pela INADES (Instituto Africano para o Desenvolvimento Económico e Social). Geralmente a formação é sobre as actividades de cultivo e os meios de comercialização dos produtos. – As cooperativas juntam os agricultores, que se organizam para vender a sua produção em conjunto e a um melhor preço, evitando ter de recorrer aos intermediários. Frequentemente conseguem comprar um meio de transporte e um armazém para guardar os produtos dos agricultores da cooperativa. – As sementes dos frutos recentemente colhidos podem ser chupadas pelas crianças, que gostam do sabor açucarado da polpa na qual estão envolvidas.
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1.5 Grelhas de leitura Grelha de leitura da sequência 1 Localização geográfica – Em que continente se situa a Costa do Marfim? – Perto de que cidade foi realizado o filme? – Como se chama a aldeia onde se desenrola a acção? – Em que tipo de zona vive o Kevin: estepe, savana, zona desértica ou floresta tropical? – Quais são os elementos da paisagem que justificam a tua resposta? – Quantos habitantes tem esta aldeia? – Quais as suas etnias? Actividades económicas – Quais são as actividades económicas da zona? – Quais são os produtos cultivados para a alimentação local? – Quais as actividades das meninas e das mulheres? Alimentação e lazer – Que operações estão envolvidas na preparação da refeição? – Qual é a bebida tradicional? De qual árvore é extraída? – Como é que Kevin e os seus amigos ocupam os tempos livres? Grelha de leitura da sequência 2 Plantação – Onde se situa a plantação? – Como se chama o local onde vivem os membros da família? – Quando foi feito este local? – Qual era o tipo de vegetação antes da criação da plantação? – Qual a superfície da plantação? – Que culturas se praticam na plantação? Trabalhos agrícolas – Quais as operações de cultivo e de colheita do cacau?
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– O que é que se faz com os frutos colhidos? Quais as etapas da transformação? – Quais são os instrumentos usados para a colheita? – O que é que fazem as crianças na plantação? – De que bebida gostam as crianças? – Como se dividem as tarefas entre homens e mulheres? Grelha de leitura da sequência 3 Transformação das sementes – O que fazem as mulheres quando as sementes de cacau já fermentaram? – Quais são as diferentes tarefas feitas no acampamento? – Como é transportada a produção destinada à venda? O acampamento – Que árvores existem à volta do acampamento? – Qual o fruto preferido de Kevin? Grelha de leitura da sequência 4 Mercado – Descreve algumas características do mercado. – Que tipo de recipientes são usados? – Em que é que são embalados os produtos? Venda do cacau – O que é que fazem os agricultores com o dinheiro da venda das sementes? – Qual o preço do cacau vendido pelos produtores? Quem fixa este preço? – Quem compra a produção? – Qual é a vantagem duma cooperativa? Perspectivas de melhoria – Para que servem os cursos de formação que os agricultores recebem? – O que é que os produtores esperam do governo?
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2. actividades pedagógicas 2.1 O cultivo do cacau Objectivos • Saber enumerar as diferentes etapas da cultura do cacau, incluindo o processo de produção e de transformação. • Reflectir sobre as dificuldades e os aspectos positivos/gratificantes envolvidos no cultivo do cacau, o que permite perceber melhor o trabalho de produção agrícola e valorizá-lo. Instruções 1. Dividir as/os alunas/os em pequenos grupos. Entregar a cada grupo uma folha com as instruções que se seguem7. 2. Com a ajuda do filme “À Descoberta do Cacau”, ordenem as etapas da produção e da transformação do cacau por ordem cronológica. As diferentes etapas são: a. Quebra dos frutos b. Secagem c. Transporte até ao mercado d. Poda e. Colheita f. Tratamento dos cacaueiros g. Transporte das sementes fermentadas h. Arranque das ervas daninhas i. Fermentação j. Transporte dos frutos 3. Escolham uma etapa (actividade). Desenhem um cartaz (numa folha grande) que represente essa actividade. Se cada aluna/o tiver um exemplar do livro poderá dispensar o uso de folhas.
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24 à descoberta do cacau
4. Façam um segundo cartaz onde escrevem, por tópicos, os aspectos difíceis e os aspectos positivos / gratificantes dessa actividade. Podem usar o seguinte esquema para o registo:
Actividade [escrever o nome da actividade]
Aspectos difíceis
Aspectos positivos / gratificantes
5. Em plenário: mostrar os cartazes de cada grupo e comentar. Sugestão para orientar a discussão em plenário, por partes: a) Pedir a cada grupo para mostrar o seu desenho sem comentar e pedir aos restantes grupos para dizerem o que vêem (de que actividade se trata?, que pormenores chamam a vossa atenção?, porquê?); b) Pedir a cada grupo para apresentar o cartaz com os aspectos difíceis e os aspectos positivos / gratificantes; c) Fazer a relação entre os diferentes aspectos apontados pelos diferentes grupos. Perguntar aos/às alunos/as o que pensam sobre esta realidade do trabalho agrícola; d) Perguntar se a agricultura em Portugal também envolve estes aspectos? Quais as diferenças e quais as semelhanças? Porquê? E o que sentem face a estas diferenças? Se possível, incentivar os/as alunos/as a fazerem pequenas entrevistas a agricultoras e agricultores para obterem a informação para responder a estas perguntas. Neste caso, este ponto do debate seria feito numa aula/ sessão posterior. O guião da entrevista pode ser preparado em conjunto.
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2.2 A população da Costa do Marfim Objectivo Analisar e reflectir sobre a evolução de alguns dados demográficos e económicos da Costa do Marfim, por comparação com Portugal. Instruções 1. Dividir a turma/ o grupo em 5 grupos. Cada grupo vai trabalhar sobre um índice demográfico ou económico específico, apresentando a sua análise num gráfico. Os 5 dados são: a) a população (número total de habitantes); b) a esperança de vida à nascença; c) a alfabetização entre adultos; d) a escolarização bruta (combinada nos níveis de ensino primário, secundário e superior); e) e o Produto Interno Bruto per capita (em Poder de Paridade de Compra) 2. Entregar a cada grupo, respectivamente, uma folha com as instruções e os quadros que se seguem8: A. Utilizando os dados do quadro seguinte, construam um gráfico com a curva de evolução da população da Costa do Marfim e de Portugal. Utilizem a seguinte escala: no eixo horizontal, 10 anos; no eixo vertical, 1 milhão de habitantes. Depois acrescentem ao gráfico a previsão do número de habitantes em 2020 (prolongando a curva com pontinhos), assumindo que a actual taxa anual de crescimento da população se mantém: 2% para a Costa do Marfim e 0,4% para Portugal.
Dados retirados de vários Relatórios de Desenvolvimento Humano do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP – United Nations Development Programme).
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Evolução da população (milhões de habitantes) Anos 1920 Costa do Marfim 1,5 6,1 Portugal(1) (1)
1950 2,2 8,5
1970 5,5 8,6
1980 8,3 9,8
1990 11,8 9,9
2000 14,8 10,2
2005 18,2 10,5
Fonte: Instituto Nacional de Estatística, Recenseamentos Gerais da População
B. Utilizando os dados do quadro seguinte, construam um gráfico com a curva de evolução da esperança de vida à nascença da Costa do Marfim e de Portugal. Evolução da esperança de vida à nascença (anos) Anos Costa do Marfim Portugal
1990 53,4 74,0
2000 47,8 75,7
2005 47,4 77,7
C. Utilizando os dados do quadro seguinte, construam um gráfico com a curva de evolução da alfabetização entre adultos da Costa do Marfim e de Portugal. Evolução da alfabetização entre adultos (% referente à população com 15 anos e mais) Anos Costa do Marfim Portugal
1990 53,8 85,0
2000 46,8 92,2
2005 48,7 93,8
D. Utilizando os dados do quadro seguinte, construam um gráfico com a curva de evolução da escolarização bruta (combinada nos níveis de ensino primário, secundário e superior) da Costa do Marfim e de Portugal.
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Evolução da escolarização bruta combinada nos níveis de ensino primário, secundário e superior (%) (1) Anos Costa do Marfim Portugal
2000 39,0 93,0
2005 39,6 89,8
As taxas de escolarização bruta são calculadas dividindo-se o número de estudantes inscritos nos níveis de ensino primário, secundário e superior pela população total em cada grupo em idade escolar teoricamente relacionada com cada um daqueles níveis. Note-se que as taxas de escolarização bruta combinada não reflectem a qualidade dos resultados educativos. A taxa de escolarização bruta combinada mede a escolarização no país em estudo, e por isso exclui estudantes que estudem no estrangeiro da taxa de escolarização do seu próprio país.
(1)
E. Utilizando os dados do quadro seguinte, construam um gráfico com a curva de evolução do Produto Interno Bruto per capita (em Poder de Paridade de Compra) da Costa do Marfim e de Portugal. Evolução do Produto Interno Bruto per capita, em Poder de Paridade de Compra (US$) Anos Costa do Marfim Portugal
1990 1.324 8.770
2000 1.630 17.290
2005 1.648 20.410
3. Pedir a cada grupo para apresentar o seu gráfico. Manter os gráficos expostos, para no final fazer uma discussão em plenário sobre a leitura conjunta dos gráficos. Sugestão Para os anos lectivos a partir do 7º, complementar esta actividade com a actividade seguinte.
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2.3 Medir o desenvolvimento humano Objectivo Saber o que é o Índice de Desenvolvimento Humano e conhecer os valores de vários países, incluindo a Costa do Marfim e Portugal. Instruções 1. Referir que esta actividade se baseia num índice que permite medir o desenvolvimento humano dos países: o Índice de Desenvolvimento Humano. Começar por fazer uma breve chuva-de-ideias perguntando ao grupo/ à turma o que acham que é importante para medir o desenvolvimento humano de um país (podem-se ir registando no quadro as ideias das/os participantes). 2. Introduzir o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)9, referindo que: a) é um índice composto, que tem em conta não só indicadores demográficos mas também indicadores económicos; b) engloba três dimensões básicas de desenvolvimento humano: uma vida longa e saudável, acesso à educação e condições de vida condignas. Estas dimensões básicas são medidas pela esperança de vida à nascença, a alfabetização entre os adultos e a escolarização bruta combinada nos níveis de ensino primário, secundário e superior, bem como o Produto Interno Bruto per capita em Poder de Paridade de Compra (PPC) em dólares americanos (PPC US$), respectivamente. Aqui, fazer a ponte com a actividade 3.2, caso tenha optado por a realizar em primeiro lugar. c) embora o conceito de desenvolvimento humano tenha uma dimensão mais ampla do que um único índice possa medir, o IDH representa uma alternativa poderosa ao PIB per capita enquanto Dados retirados do Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008 do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP – United Nations Development Programme) - http://hdr.undp.org/en/ reports/global/hdr2007-2008/chapters/portuguese/
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2. actividades pedagógicas 29
medida sumária do bem-estar humano. É um ponto de partida útil para obtermos uma informação rica que agrega diferentes aspectos do desenvolvimento humano. d) permite a comparação entre países. Os países são ordenados segundo o valor do seu IDH; a listagem mundial inclui 175 países10. e) Sugestão: pode optar por não dar estes esclarecimentos sobre o IDH, mas antes pedir às/aos participantes para descobrirem o que é o IDH, por exemplo através da consulta da internet ou da biblioteca11. 3. Desenhar no quadro ou numa folha de flip-chart a seguinte tabela: Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em 2005
País Costa do Marfim EUA Espanha Portugal Brasil Equador Indonésia Gana Moçambique
IDH 0,432 0,951 0,949 0,897 0,800 0,772 0,728 0,553 0,384
posição no ranking mundial 166 12 13 29 70 89 107 135 172
4. Em plenário, fazer a discussão sobre os dados da tabela, incentivando a participação de todos/as. Informação adicional sobre o IDH Os países são classificados em um de três grupos consoante o seu IDH: – países com desenvolvimento humano elevado para um IDH igual ou superior a 0,8000; A listagem mundial inclui 175 Estados-membros das Nações Unidas (aqueles cujo IDH pode ser calculado), Hong Kong (uma Região Administrativa Especial da China) e Autoridade Palestiniana.
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Caso a biblioteca escolar não tenha estes relatórios anuais+, seria uma boa oportunidade para propor a sua aquisição.
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30 à descoberta do cacau
– países com desenvolvimento humano médio para um IDH entre 0,5000 e 0,799; – e países com desenvolvimento humano baixo para um IDH inferior a 0,500. Sugestões – Antes de desenhar a tabela, escrever o nome dos países num canto do quadro, de forma aleatória. Dar cerca de 10 minutos para que os/ as participantes, em pares, os ordenem por ordem decrescente (do país com o desenvolvido humano mais elevado para o país com o desenvolvimento humano mais baixo). Só depois desenhar a tabela com os valores, altura em que os palpites serão confrontados com os valores reais. Pode perguntar se havia muitas diferenças (e quais) entre o que pensavam e a realidade. – Pode incentivar os/as participantes a escolherem outros países com os quais gostariam de comparar e pedir-lhes para, durante esta actividade ou como trabalho posterior, pesquisarem na internet ou numa biblioteca o valor de IDH correspondente. Poderá fazer fotocópias das listas do Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008 e distribuí-las para consulta. – Antes de fazer esta actividade, fazer a actividade anterior.
2. actividades pedagógicas 31
2.4 O cacau e o chocolate no mundo Objectivo Através do exemplo do chocolate, analisar o papel dos países e das respectivas zonas geográficas no comércio internacional, assim como reflectir sobre quem beneficia e quem é prejudicado. Instruções 1. Dar a cada participante uma fotocópia do mapa-mundo e pedir-lhes para assinalar os países produtores de cacau com um “P” (ou uma cor) e os países consumidores de cacau com um “C” (ou outra cor), de acordo com os dois quadros seguintes12: Principais países produtores de cacau Países Costa do Marfim Gana Indonésia Nigéria Camarões Brasil Equador Malásia
Em % da produção mundial 38 21 13 5 5 4 3 1
Principais países consumidores de cacau Países EUA Alemanha França Grã-Bretanha Rússia Japão Itália Espanha Brasil
Em % do consumo mundial 32.7 11.6 10.3 9.2 7.7 6.4 4.6 3.8 3.7
Nota: Nos países consumidores de cacau os compradores são as empresas de transformação das sementes de cacau e os fabricantes de chocolate. Secretariado da UNCTAD (United Nations Conference on Trade and Development) segundo estatísticas da Organização Internacional do Cacau, 2005-2006, boletim trimestral de estatísticas do cacau.
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32 à descoberta do cacau
2. Desenhar uma tablete de chocolate e a seguinte tabela no quadro (sem a coluna dos valores reais): Palpites
valores reais(1)
Produtores de cacau Exportadores de cacau Produtores de outros ingredientes Fabricantes de chocolate Comerciantes TOTAL antes de IVA Estado (IVA 20%) Total (preço de venda ao público)
0,10 €
-----
0,19 € 0,63 € 0,35 € 1,25 € 0,25 € 1,50 €
Com base na cadeia do chocolate e nos valores da repartição de riqueza propostas em “The Chocolate Industry: Who benefits? Fair Trade versus Mass production Institute for Citizenship”, 2004 – www. citizen.org.uk/Democracy/pdf/34.pdf
(1)
3. Referir que para este chocolate chegar até nós tem um percurso a fazer: a cadeia produtiva do chocolate. Desde as plantações de cacau até às lojas em Portugal, os vários actores são: a. produtores de cacau (neste exemplo, da África Ocidental) b. exportadores (que compram o cacau aos produtores) c. produtores de outros ingredientes (leite, açucar e gordura vegetal) d. fabricantes de chocolate (que importam o cacau e compram os outros ingredientes) e. comerciantes em Portugal 4. Referir que existe um sexto actor que fica com parte do valor pelo qual compramos o chocolate – o Estado, através do imposto sobre o consumo (IVA). E salientar que este é apenas um exemplo duma cadeia de produção do chocolate. 5. Referir que nós podemos comprar este chocolate a 1,50€ no supermercado (trata-se de um chocolate de leite comum, de qualidade média). Descontando 20% de IVA que fica para o Estado, temos 1,25€. Pedir aos/às participantes para darem palpites sobre quanto é que acham que cada actor recebe destes 1,25€ e registar esses palpites no quadro. Se necessário, dar uns minutos para as/os participantes poderem fazer alguns cálculos.
2. actividades pedagógicas 33
6. Por fim, anuncie os valores reais que cada actor recebe de acordo com este exemplo em concreto, acrescentando na tabela a coluna dos valores reais. 7. Desconstrução: faça um debate em plenário sobre esta actividade. Sugestões de orientação do debate: a) O que pensam dos valores reais? b) Quem são os principais prejudicados? Quem são os principais beneficiados? Pode reforçar esta ideia apresentando, em percentagem, a parte que cabe em conjunto aos produtores e aos exportadores do preço de venda ao público, ou seja, do preço pago pelo/a consumidor/a: 6,8%. Outro indicador interessante é o peso das matérias-primas (cacau e outros ingredientes) no preço final: apenas cerca de 20%. c) Esta situação aplica-se apenas ao chocolate ou também a outros produtos? Quais? d) Que conclusões podemos tirar sobre o comércio internacional? Fazer a ponte com a produção de matérias-primas, a transformação dos produtos e o consumo dos produtos acabados e com o mapa-mundo onde marcaram os países produtores e os países consumidores. e) A situação deveria mudar? f ) Como se poderá mudar a situação? Como cada um/a pode contribuir para mudar a situação? g) Ao debaterem alternativas, procurar chegar ao conceito de consumo responsável (em que o Comércio Justo é um exemplo).
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2.5 A palavra aos produtores da Costa do Marfim Objectivo Conhecer e reflectir sobre as principais reivindicações e propostas das organizações de produtores de cacau da Costa do Marfim, que é próxima da realidade de outros países da África Ocidental. Instruções 1. Começar por fazer uma chuva-de-ideias: perguntar ao grupo/ à turma quais acham que são os problemas / as queixas dos produtores de cacau da Costa do Marfim. Registar as ideias numa parte do quadro. 2. Dividir a turma/o grupo em pequenos grupos. 3. Distribuir por cada grupo uma cópia do texto abaixo13 (para facilitar a leitura individual, pode ser útil dar uma cópia a cada participante). Pedir para, num primeiro momento, lerem o texto. Depois, com base no que leram, cada grupo deve resumir as ideias principais (por tópicos) preenchendo a seguinte tabela: Limitações
Propostas
Justificação das propostas
Notas: - Limitações refere-se às principais limitações que os produtores encontram quando querem vender a sua produção e melhorar a sua rentabilidade. - Propostas refere-se ao que a UNECACI propõe para melhorar a situação dos produtores de uma forma sustentável. 4. Em plenário, pedir a um grupo de cada vez que partilhe essas ideias, indo registando no quadro. No final, depois de todos os grupos terem falado, dar um espaço para comentar as várias ideias. Fazer a comparação entre as ideias iniciais que saíram da chuva-de-ideias. Se cada participante tiver um exemplar do livro poderá dispensar o uso de fotocópias.
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2. actividades pedagógicas 35
As reivindicações e os projectos das organizações14 Entrevista com Boidou Kouamé, presidente do conselho de administração da UNECACI (União Nacional das Empresas Cooperativas Agrícolas da Costa do Marfim). “As nossas reivindicações são simples: primeiro é necessário suprimir os intermediários [desnecessários]; mas é sobretudo necessário que o Estado apoie a produção, a comercialização e crie uma verdadeira política agrícola. O esforço é sempre nosso: somos nós que produzimos e essa é a maior participação! Por isso devemos produzir e conhecer toda a cadeia de produção. Em Paris disseram que o nosso trabalho é plantar e que era mais fácil plantar do que exportar. Mas nós queremos controlar a cadeia duma ponta à outra. Se num primeiro tempo tivermos o monopólio da comercialização interna, já será um primeiro passo. Se controlarmos a comercialização interna, poderemos pensar em ter uma fábrica para tratar o produto. Pensamos também nas outras produções. Não devemos restringir-nos ao café e ao cacau mas preocupar-nos com a diversificação. Interessamo-nos também com a transformação dos produtos alimentares. Mas para isso é necessário que o governo inicie uma política de consumo aqui, no nosso país e também na sub-região. Devemos trabalhar para desenvolver os mercados em África em vez de procurar primeiro vender aos países industrializados.”
Recolhida por Denis Pesche e publicada na “Lettre du Réseau Gao”, Paris, Janeiro 1994.
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36 à descoberta do cacau
2.6 À procura de um chocolate mais justo Objectivos – Através da história real de um jovem, conhecer e reflectir sobre o tráfico de crianças e o trabalho escravo. – Analisar e reflectir sobre o papel dos fabricantes de chocolate nas condições de vida das comunidades de produtores de cacau. Instruções 1. Dividir o grupo/a turma em 4 grupos. Dar o texto um ao grupo 1 e 2 e o texto dois ao grupo 3 e 4 (textos no final desta actividade). 2. Referir que vão simular um noticiário televisivo e que cada grupo será responsável por um bloco de notícias de 3 minutos no máximo. Pedir a cada grupo para ler o texto e preparar uma pequena encenação do seu bloco de notícias (dar pelo menos 15 minutos para esta tarefa), referente aos seguintes tópicos: a) Grupo 1: pequena notícia sobre o tráfico de crianças e jovens e o trabalho escravo nas plantações de cacau da Costa do Marfim; b) Grupo 2: pequena entrevista ao Mohammed sobre a sua experiência na Costa do Marfim; c) Grupo 3: pequena notícia sobre as iniciativas dos fabricantes de chocolate visando a produção sustentável do cacau; d) Grupo 4: pequena entrevista a uma organização de Comércio Justo (CJ) do Norte ou uma organização de Direitos Humanos sobre as iniciativas dos fabricantes de chocolate. 3. Organizar a sala de forma a ter o espaço do noticiário e o espaço dos espectadores; os espectadores são os restantes grupos, que enquanto convidados da emissão em directo do estúdio de televisão deverão manter silêncio absoluto. Um grupo de cada vez apresenta a sua notícia, de forma consecutiva como na televisão. O professor/animador, pode desempenhar o papel de apresentador, chamando ao palco cada grupo para apresentar a notícia sobre o assunto x.
2. actividades pedagógicas 37
4. Faça um debate em plenário sobre esta actividade. Sugestões de orientação do debate: a) O que pensam sobre cada notícia? Porquê? b) Quais as diferenças entre as várias notícias? c) Este tipo de notícias é parecido com as notícias que vêem nos noticiários televisivos? Porquê? d) Acham que deviam ser diferentes? De que forma? e) Acham que os consumidores e as consumidoras têm conhecimento da realidade nas plantações de cacau? f ) Agora que têm esta informação, o que vai mudar? O que podemos fazer enquanto consumidoras/es? Sugestões – Nesta sessão ou numa sessão posterior, complementar o debate final com informação sobre as condições de trabalho na Costa de Marfim e as iniciativas do governo deste país e das organizações internacionais, constantes neste livro no capítulo “O sector do cacau na Costa do Marfim”. – Numa sessão posterior, fazer a simulação de um debate (televisivo ou não) entre os diferentes actores envolvidos: o dono de uma plantação de cacau na Costa de Marfim, o Mohammed, um/uma representante de uma grande marca de chocolate e uma/um representante de uma organização de Comércio Justo do Norte. Do debate devem sair propostas de cada um dos actores sobre como melhorar a situação actual. Estas podem ser registadas num documento a assinar por todos/as. Texto 1: A história de Mohammed15 “Mohammed é de uma vila pobre perto da região de Koulikoro, no Mali. A escola mais próxima fica a 10 kms, portanto ele nunca frequentou nenhuma escola. Sem muitas opções para conseguir um emprego, deixou a vila com 16 anos e foi para a cidade mais próxima, Sikesso, para encontrar alguma for Tradução e adaptação de um texto do documento “Chocolate - Sweet but bitter. The whole story behind the product”, NEWS! (Network of European Worldshops – Rede Europeia das Lojas do Mundo), Alemanha, Janeiro 2005.
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ma de ganhar dinheiro. Pouco depois da sua chegada a Sikesso, um homem abordou-o dizendo que o podia ajudar a ganhar muito dinheiro na Costa do Marfim se ele estivesse interessado em ir com ele. Mohammed concordou em ir com o homem e foi levado para uma cidade desconhecida na Costa do Marfim. Ele não teve qualquer hipótese de escolher para onde ia e não fazia ideia de que seria colocado numa plantação de cacau. Passou cerca de 3 anos a trabalhar no cultivo do cacau em condições muito difíceis. Recebia muito pouca comida, nenhuns cuidados médicos e se não trabalhasse de acordo com as expectativas do dono, batiam-lhe. Apesar das longas horas de trabalho pesado, Mohammed nunca recebeu nenhum pagamento. Finalmente um dia Mohammed conseguiu fugir e pedir ajuda num consulado do Mali na cidade mais próxima. Um mês depois regressava ao seu país, onde viria a trabalhar para uma organização que luta contra o tráfico infantil e apoia as suas vítimas.” Texto 2: Os gigantes do chocolate atentos aos consumidores16 “Os fabricantes de chocolate no Norte lançaram uma série de programas visando o apoio à produção sustentável de cacau e a negócios mais justos para os agricultores. Pressionadas pela crítica às condições dos produtores e desejosas de proteger o abastecimento deste importante sector, as principais marcas estão a competir na apresentação de uma imagem melhor. Recentemente, o gigante na área da confeitaria do Reino Unido Cadbury anunciou uma iniciativa visando aumentar os rendimentos e a produção dos agricultores, oferecendo micro-financiamento e investindo em desenvolvimento comunitário. A parceria, desenvolvida com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), concentra-se no Gana, mas irá também beneficiar produtores nas Caraíbas. Entretanto as marcas rivais, incluindo a Mars e a Nestlé, também se comprometeram com iniciativas de cacau sustentável. O programa Good Inside Cocoa, lançado pela organização sem fins lucrativos holandesa UTZ Certified, pretende combater problemas ambientais e humanitários como o trabalho infantil, a desflorestação e os salários baixos e lançou um sistema de rastreio para todos os agricultores na Costa do Marfim.” Excerto de um artigo da revista Esporo, Nº 135, Junho 2008 – http://spore.cta.int
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39 à descoberta do cacau
3. fichas informativas 3.1 O cacau História do cacau Segundo uma lenda mexicana, o cacaueiro foi descoberto nos campos sagrados dos filhos do sol por Quetzalcoati, rei sagrado dos Tolteques. Foi por isso que o grande botânico Lineu lhe deu o nome de theobroma cacau (do grego teos, deus, e broma, alimento) alimento dos deuses. Os Maias, e depois os Astecas, cultivavam o cacaueiro e chamavam ao seu fruto cacauhait do qual tiravam uma bebida chamada tchocolati. As sementes de cacau, muito apreciadas, serviam de moeda de troca. Cristóvão Colombo, na sua primeira viagem à América, foi o primeiro europeu a provar uma bebida feita à base de cacau. Em 1524, o explorador Hernan Cortes enviou sementes de cacau do México para Carlos I, rei de Espanha. Mas só no fim de Século XVI é que os navios mercantis transportaram sementes para a Espanha. Mais tarde o cacau foi introduzido na Itália e na Alemanha. Em França, foi Ana de Áustria, filha do rei de Espanha, Filipe III, e mulher de Luís XIII, que difundiu o consumo de cacau na corte. Em 1770 foi criada a primeira empresa industrial em França, chamada “Companhia dos chocolates e chás Pelletier e Cia”. Em 1819, J.L. Cailler criou a primeira chocolataria suíça. O chocolate tornou-se produto de consumo corrente no início do Século XX. A planta O cacaueiro é uma árvore de tamanho pequeno, 7 metros em média (nas plantações). É originário das florestas tropicais húmidas da América Central e da América do Sul. Produz a partir da idade de três anos e dá a sua maior produção aos 10 anos, entre 50 e 100 frutos.
40 à descoberta do cacau
O fruto do cacaueiro é o cacau, que pesa entre 200 gramas e 1 quilo; contém de 30 a 40 grainhas chamadas sementes de cacau. Os frutos crescem no tronco e nos ramos maiores. Quando estão maduros ficam amarelos ou vermelho-alaranjados. A fava de cacau é rica em matéria gorda (50 a 55% de manteiga de cacau). Cultura O cacaueiro cresce nas regiões que têm uma forte pluviosidade ao longo de todo o ano (no mínimo 1250 mm/ano) e nas quais a temperatura média é da ordem dos 25º C. Na Costa do Marfim, o cacaueiro foi plantado nas regiões de floresta com clima quente e húmido. A área de cultivo do cacaueiro estende-se entre os 15º de latitude norte e os 15º de latitude sul. A árvore precisa de sombra para o seu crescimento, a qual é habitualmente fornecida por bananeiras cultivadas em associação com os cacaueiros. Para obter uma colheita de boa qualidade é necessário cuidar regularmente da plantação. Cada fase da cultura deve ser correctamente executada: luta contra as doenças e insectos, colheita quando os frutos atingem a maturidade, boa fermentação das sementes, secagem sem bolor, escolha das sementes. As operações de manutenção das árvores são de três tipos: arranque das ervas, poda e tratamentos fitossanitários. Quando as árvores são jovens é preciso arrancar as ervas das plantações. Numa plantação adulta as folhas mortas cobrem o chão e impedem o crescimento de outra vegetação. A poda efectua-se durante o crescimento inicial da árvore e depois regularmente de 2 em 2 meses. É também necessário fazer tratamentos para proteger a árvore ou os frutos contra os insectos e diversas doenças da planta ou do fruto. Os pequenos roedores, esquilos ou macacos, podem provocar perdas importantes.
3. fichas informativas 41
Modo de produção Em 1900, mais de 80% do cacau produzido a nível mundial provinha da América Latina. A África só produzia 15% da produção mundial. Hoje é a África o maior produtor. Estima-se entre 5 e 6 milhões o número de produtores de cacau em todo o mundo, o que representa 40 a 50 milhões de pessoas que dependem do cacau para a sua subsistência17. 70% do cacau mundial cresce em pequenas plantações familiares. Algumas operações, como por exemplo a fermentação e a secagem das sementes, necessitam de muita mão-de-obra. Na Ásia, o cacaueiro é sobretudo cultivado em grandes plantações, muitas vezes implantadas nas terras das florestas tropicais. Desde 1970 que países como a Indonésia e a Malásia produzem cacau em grandes plantações com meios financeiros importantes e que desenvolvem as suas próprias pesquisas agronómicas. Na América Latina, o cacaueiro é cultivado por pequenos produtores e em grandes plantações. Colheita e secagem Os frutos do cacau são colhidos à mão e transportados para o local onde são partidos. Isto faz-se abrindo o fruto no sentido do seu comprimento para retirar as sementes de cor branca. Geralmente a abertura do fruto faz-se com a ajuda da catana. As sementes são colocadas em cima de folhas de bananeira e cobertas com outras folhas para permitir a sua fermentação. Esta operação permite retirar a polpa que cobre as sementes, impedir a germinação e favorecer o desenvolvimento de substâncias que, depois da torrefacção, ajudam a obter o aroma característico do cacau. Uma vez fermentadas, as sementes secam durante vários dias ao sol. A sua taxa de humidade reduz-se e adquirem a cor castanha. Quando estão bem secas, as sementes são postas em sacos de juta. O produtor pode então vender a sua produção. Dados da Fundação Mundial do Cacau (World Cocoa Foundation) – www.worldcocoafoundation.org
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42 à descoberta do cacau
Transformação: fabrico da pasta de cacau As sementes são limpas, escolhidas e torradas. A torrefacção permite desenvolver o seu aroma. Depois são descortiçadas (tirar a casca), trituradas e de-germinadas. O produto obtido é moído até obter uma pasta gordurosa: a pasta de cacau. Desta pasta obtêm-se então 2 produtos: a manteiga de cacau (a parte da gordura) e o pó de cacau. Para fazer chocolate, mistura-se a pasta de cacau quente com açúcar, manteiga de cacau e ingredientes diversos (aromas, avelãs, amêndoas...). O chocolate branco é feito só com manteiga de cacau e açúcar. Etapas do fabrico dos produtos derivados do cacau Actividades artesanais na plantação
Actividades Industriais
colheita dos frutos
800 kg de frutos de cacau
abertura dos frutos fermentação
200 kg de sementes de cacau frescas
secagem
100 kg de sementes secas
limpeza e escolha torrefacção
94 kg de sementes torradas
trituração descasque moagem
83 kg de pasta de cacau
prensagem
manteiga de cacau cacau em pó
Valor nutritivo do chocolate O chocolate contém 64% de glícidos, 22% de lípidos (manteiga de cacau), 6% de proteínas e 4% de sais minerais (potássio, fósforo, magnésio, ferro). O seu valor energético é de 500 calorias por 100 gramas de chocolate. O chocolate é um estimulante porque contém um pouco de cafeína.
3. fichas informativas 43
Consumo de chocolate O chocolate é o principal produto feito com cacau. Os países produtores consomem uma quantidade muito pequena de chocolate, com excepção do Brasil. Entre os maiores consumidores de chocolate por habitante18, estão a Alemanha (11,1 kg), a Suiça (10,8), a Áustria (10,1), a Bélgica (9,5) e a Grã-Bretanha (9,4). Em Portugal as pessoas comem em média 2,8 Kg por ano, valor acima da média do Japão ou do Brasil. Nos últimos dez anos vários factores contribuíram para o aumento do consumo de cacau: preços mais baixos no mercado mundial, aumentos de rendimento e actividade promocional. Houve um forte aumento do consumo nos mercados tradicionais dos EUA e Europa Ocidental, assim como uma expansão na Europa de Leste e nos novos mercados asiáticos. As preocupações sobre a obesidade são uma verdadeira ameaça ao consumo de produtos de chocolate nos mercados já consolidados, uma vez que o chocolate tem um elevado nível calórico. No entanto, é preciso ter em conta que nós não consumimos o cacau puro mas sim o chocolate, que tem vários outros ingredientes menos saudáveis, como o açúcar ou gorduras animais, sendo importante fazer um consumo moderado e uma escolha crítica do produto19. Como resultado destas preocupações com a saúde e respondendo às necessidades das/os consumidoras/es, a indústria do chocolate tem apostado em produtos com mais qualidade e mais saudáveis, como a oferta de chocolate preto com elevada percentagem de cacau. Por outro lado, pesquisas recentes sobre os atributos nutricionais do cacau e do chocolate demonstraram que alguns dos componentes do cacau são benéficos para a saúde20. ”Assessment of the movements of global supply and demand”, Organização Internacional do Cacau, Comité de Mercado, Fevereiro 2007 (Tabela 13).
18
Para uma reflexão sobre este tema ver o artigo sobre nutrição “Chocolate & Cocoa: ‘Healthy’ Benefits or Negative Health Effects?” - www.acu-cell.com/choc.html
19
Para mais informação ver “Inventory of Health and Nutritional Attributes of Cocoa and Chocolate, December 2005”, da Organização Internacional do Cacau (ICCO em Inglês - Internacional Cocoa Organisation) - www.icco.org/Attachment.aspx?Id=ll131507
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44 à descoberta do cacau
3.2 O comércio mundial do cacau Breve sumário O cacau é o segundo produto alimentar mais vendido no mundo. Em 2005/06 a produção mundial de cacau foi de 3.674,5 milhões de toneladas, das quais cerca de 70% foram produzidas em África. As pequenas plantações familiares são responsáveis por cerca de 70% da produção mundial, estimando-se que o número total de agricultores seja de 5 a 6 milhões. O cacau é utilizado sobretudo para fabricar chocolate e outros doces, a maioria dos quais são fabricados na Europa, que importa o cacau sobretudo no seu estado bruto (sementes de cacau). A Costa do Marfim é de longe o maior produtor mundial, sendo responsável por cerca de 40% da produção mundial. Seguem-se o Gana e a Indonésia. Como mercadoria agrícola, também o preço do cacau é fixado na bolsa de valores, dependendo da flutuação económica mundial, o que prejudica os agricultores. Embora a exportação de cacau tenha uma grande importância para a economia de países como a Costa do Marfim, o cultivo do cacau continua a ser caracterizado em vários países por más condições laborais e o nível de desenvolvimento económico e social das comunidades rurais é muito baixo. Outra característica do comércio convencional é a repartição desequilibrada da riqueza: os produtores recebem menos de 5% do preço da venda de um chocolate. Para fazer face a estas problemáticas, as organizações de Comércio Justo propõem uma alternativa de comercialização que permite às agricultoras e aos agricultores viver dignamente do seu trabalho. Uma outra alternativa ao comércio convencional é a agricultora biológica. Embora a produção biológica e a produção de comércio justo continue a ter uma fatia muito pequena do mercado de cacau, cada vez mais consumidoras e consumidores querem ter a garantia que, ao comprarem por exemplo
3. fichas informativas 45
um chocolate, este foi produzido respeitando o ambiente assim como os direitos humanos dos trabalhadores e das trabalhadoras. Produção e exportação de cacau no mundo A seguir ao café, o cacau é o produto alimentar mais vendido no mundo. É produzido exclusivamente nos países economicamente menos desenvolvidos e nos países em desenvolvimento21, sendo que mais de 90% da produção se destina à exportação, na grande maioria para os países desenvolvidos. Em 2005/06 a produção mundial atingiu 3.674,5 milhões de toneladas. O cacau é na grande maioria cultivado por pequenos agricultores, que são responsáveis por cerca de 70% da produção mundial de cacau. Como vimos anteriormente, estima-se que o número de agricultores de cacau a nível mundial seja de 5 a 6 milhões e que o número de pessoas que dependem do cacau para a sua sobrevivência seja de 40 a 50 milhões. Para estas pessoas, o cacau tem um papel económico muito importante, permitindo-lhes ter dinheiro, nomeadamente para comprar comida. No período de 10 anos que decorreu de 1997/98 a 2006/07 a produção mundial do cacau e a moagem de cacau registaram uma evolução com altos e baixos22. As flutuações dos níveis de produção deveram-se sobretudo a factores climáticos. No geral, a produção mundial de cacau aumentou em média 2,7% ao ano nesse período. A fatia de África na produção mundial aumentou de 66% na segunda metade da década de 90 para 71% em 2006/07, com um aumento médio anual ligeiramente superior à média mundial (3%). Já nas Américas a produção diminuiu uma média de 1% ao ano.
Países em desenvolvimento, também designados países emergentes ou países de desenvolvimento médio, agrupados no “G-20”, incluem países como o México, o Brasil, a África do Sul, o Egipto, a China e a Índia.
21
“Assessment of the movements of global supply and demand”, Organização Internacional do Cacau, Comité de Mercado, Fevereiro 2007.
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46 à descoberta do cacau
Produção mundial de cacau em 2005/0623 (em milhares de toneladas) País Costa do Marfim Gana Indonésia Nigéria Camarões Brasil Equador Togo Outros países Total mundial
Quantidade 1.407,80 740,50 500,00 180,00 168,60 161,60 115,30 72,00 328,70 3.674,50
Proporção da produção mundial (em %) 38 20 14 5 5 4 3 2 9 100
A Costa do Marfim é claramente o principal produtor de cacau, com cerca de 38% do total produzido no mundo. Seguem-se o Gana com 20% e a Indonésia com 14%. No conjunto, estes três países são responsáveis por mais de 70% da produção de cacau. Isto significa que nos últimos anos a concentração geográfica da produção aumentou, reforçando a liderança do continente Africano. O cultivo do cacau assenta em um de dois modelos: o “cacau de sombra” e o “cacau de sol aberto”24. O primeiro é cultivado nas florestas entre as árvores nativas e cresce à sua sombra, evitando a destruição total das florestas e salvaguardando a biodiversidade; por isso também é chamado de agro-florestação. O segundo implica o desbastar das florestas para plantação exclusiva dos cacaueiros, que crescem sem sombras. Para manter elevados níveis de produção neste modelo são utilizados fertilizantes químicos. Por outro lado, o facto de haver muito sol é propício ao “Assessment of the movements of global supply and demand”, Organização Internacional do Cacau, Comité de Mercado, Fevereiro 2007 (Tabela 3).
23
“Ecological, economic and social perspectives on cocoa production worldwide”, Margaret Franzen e Monique Borgerhoff Mulder, 2007, disponível na página da Fundação Mundial de Cacau em www. worldcocoafoundation.org/info-center/document-research-center/documents/Franzen2007.pdf
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3. fichas informativas 47
crescimento de ervas daninhas, o que leva a um maior uso de herbicidas. Estima-se que são usados 32 tipos comuns de pesticidas na produção de cacau, alguns dos quais estão proibidos nos países consumidores; o uso inadequado destes químicos prejudica não só o ambiente mas também a saúde das pessoas que trabalham no campo. É por isso muito importante ter em conta não só os ganhos económicos a curto prazo mas também a sustentabilidade ecológica a longo prazo. A maior parte dos pequenos agricultores cultivam o cacau de sombra, embora as novas regiões produtoras, como a Indonésia, cultivem cada vez mais o cacau de sol aberto. Exportações mundiais de cacau por grandes zonas geográficas em 2004/0525 (em milhares de toneladas) Zona Geográfica África Américas Ásia e Oceania Total mundial
Quantidade 2.397,00 219,00 507,00 3.123,00
Proporção das exportações mundiais (em %) 76,95 6,69 16,36 100,00
A realidade quanto às exportações de cacau espelha a mesma situação. Os países africanos são responsáveis por 77% das exportações mundiais, seguidos de longe da Ásia e Oceânia (16%) e das Américas (7%). A Costa do Marfim sozinha exportou em 2004/05 cerca de 1.300.000 toneladas de cacau, o que representa uma fatia de 46% do mercado mundial. Os cinco principais exportadores – Costa do Marfim, Gana, Nigéria, Camarões e Indonésia – concentram 90% das exportações. É importante notar que o valor das exportações engloba não só as sementes de cacau mas também os seus produtos transformados: pasta de cacau, manteiga de cacau e cacau em pó. As fábricas compram o cacau em sementes (designado por consumo primário do cacau) e transformam-no “Assessment of the movements of global supply and demand”, Organização Internacional do Cacau, Comité de Mercado, Fevereiro 2007 (Tabela 5).
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nos outros produtos (fabrico industrial) consoante a procura. A maioria desta transformação é feita na Europa, se bem que a Ásia tem aumentado significativamente a sua importância nesta fase da cadeia produtiva. Sempre que há maior oferta de sementes de cacau do que procura dos produtos transformados acima referidos, os stocks internacionais de sementes de cacau aumentam. Isto tem por consequência a queda dos preços. Por outro lado, quando a procura dos produtos transformados aumenta, também a procura primária por sementes de cacau aumenta, levando ao aumento dos preços. Além disto, os preços do cacau, como os preços de outros produtos agrícolas fixados na bolsa de valores, estão sujeitos às variações especulativas das bolsas. Entre 1993/94 e 2005/06 o preço internacional do cacau variou muito26. Em 1993/94 era de 1.370 dólares por tonelada, subiu até os 1.711 dólares em 1997/98 para atingir o valor mínimo destes doze anos em 1999/00 com 919 dólares. Em 2005/06 a tonelada do cacau valia 1.557 dólares no mercado internacional. O peso das exportações de cacau no total das exportações não é igual para todos os países. A Gana e a Costa do Marfim são os países mais dependentes face às exportações de cacau, representando estas, respectivamente, 38% e 31% do valor total das suas exportações (valores de 2004). Estes níveis de dependência de um único produto podem ser perigosos em caso de queda dos preços, impedindo o pagamento da dívida do país e dos seus juros. Para os Camarões a percentagem é de 10%. Nos casos do Brasil, Equador, Indonésia e Nigéria, em que a percentagem é inferior a 2%, não se regista dependência. Outro aspecto fundamental quanto à importância das exportações para o rendimento dos países é o grau de transformação dos produtos no país de origem. Sabemos que, quanto maior for este grau, maior é o valor acrescentado que fica no país, logo, maior é o contributo desta indústria para o rendimento, o emprego e os ganhos de exportação desse país. Nos últimos anos tem-se verificado o aumento da transformação das se “Assessment of the movements of global supply and demand”, Organização Internacional do Cacau, Comité de Mercado, Fevereiro 2007.
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mentes de cacau na origem, o que resulta numa proporção ligeiramente superior de produtos transformados de cacau em relação às exportações totais de cacau na maioria dos países produtores. Por exemplo, no caso da Costa do Marfim, a percentagem de produtos de cacau no total de exportações de cacau passou de apenas 5% em 1995 para 23% em 2004. Para o mesmo período, o valor aumentou de 5% para 8% no caso da Gana e de 9% para 16% no caso da Indonésia. A realidade do Brasil é muito diferente, tendo partido de um valor de 77% em 1995 e alcançado praticamente os 100% em 2004. O aumento da transformação na origem resulta em especial de dois factores. Primeiro, nalguns países, o apoio de políticas do governo que favorecem a exportação de produtos semi-acabados de valor acrescentado relativamente às sementes de cacau. Depois, um maior envolvimento das empresas multinacionais nas actividades iniciais da cadeia de produção, incluindo marketing interno, expedição marítima e transformação local do cacau nos países produtores, levaram a investimentos consideráveis na capacidade de transformação do cacau na origem, em especial na África Ocidental e na Ásia. A Costa do Marfim substituiu a Alemanha enquanto terceiro país transformador de cacau do mundo em 1998/99, enquanto que a Malásia reforçou a sua posição de líder Asiático. Importação de cacau Grande parte das importações dizem respeito a sementes do cacau para depois serem transformadas em pasta, manteiga ou pó de cacau e em produtos finais, tais como chocolate e outras sobremesas. No passado e no presente, a Europa é de longe a principal região para a transformação do cacau, embora tenha diminuído o seu peso de 47% para 42%. Também a percentagem da transformação mundial feita nas Américas decresceu de 28% para 25%. Por outro lado, a moagem feita em África aumentou 5%, resultando num aumento da sua fatia de 11% para 14%. O aumento mais significativo da indústria transformadora deu-se na Ásia e Oceânia, com mais 7%, em especial devido ao crescimento da indústria
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na Indonésia e na Malásia. Esta região passou assim de 13% em 1997 para 19% em 2006/07. Apesar destas alterações, a maior parte da transformação do cacau é feita nos países importadores próximos das principais regiões consumidoras de cacau na Europa e América do Norte, mantendo a Holanda e os EUA a sua posição de liderança mundial. Durante os anos 90, a maior utilização dos navios de carga, as economias de escala resultantes da transformação de elevados volumes e um maior nível de integração vertical nas empresas de transformação de cacau e produção de chocolate, motivaram a expansão de instalações fabris para a transformação de cacau perto de portos nos países importadores. Em termos de países específicos, a tabela seguinte destaca os principais importadores27: Para além da Malásia e dos EUA, os principais países importadores são da União Europeia. O valor da Malásia refere-se apenas à importação do cacau em sementes; para os outros países os valores são a soma das importações das sementes e dos produtos acabados de cacau. Em relação ao consumo de cacau é interessante referir a Directiva n.º 2000/36/CE28 do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece as normas relativas aos produtos de cacau e de chocolate destinados à alimentação humana. Segundo esta Directiva, é permitido aos fabricantes de chocolate substituir até 5% da manteiga de cacau por outras gorduras vegetais (devendo a rotulagem incluir a referência “contém outras gorduras vegetais além da manteiga de cacau”). Até esta data, a União Europeia proibia o uso de substitutos da manteiga de cacau, com a excepção de alguns países Europeus. Tanto a indústria das gorduras vegetais como a indústria do chocolate fizeram muita pressão sobre a União Europeia para que todos os países pudessem utilizar a norma dos 5%; os primeiros na esperança de um Dados da FAO – Food and Agriculture Organization of the United Nations.
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Disponível no site EURLex da União Europeia – http://eur-lex.europa.eu
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novo mercado, os segundos para terem matérias-primas mais baratas. Mais ainda, a possibilidade de usar outras gorduras que não a manteiga do cacau reduz a dependência da indústria do chocolate face ao cacau e reforça o seu controlo sobre o sector. O problema com o uso de outras gorduras é que se pode traduzir numa redução da procura de cacau e na consequente diminuição do preço no mercado internacional, o que prejudicará os produtores. Além das questões de qualidade e nutrição que esta substituição pode levantar. Acordo Internacional do Cacau de 2001 A Organização Internacional do Cacau (ICCO em Inglês: International Cocoa Organisation) agrupa tanto os países exportadores como os importadores de cacau. Foi fundada em 1973 para pôr em prática o primeiro Acordo Internacional do Cacau, estabelecido em 1972 em Genebra durante uma Conferência do Cacau das Nações Unidas. Desde então foram feitas várias revisões que resultaram em Acordos sucessores (1975, 1980, 1986, 1993 e 2001), vigorando actualmente o Acordo Internacional do Cacau de 200129. De forma muito resumida, os objectivos deste Acordo são: – Promover a cooperação internacional na economia mundial do cacau; – Contribuir para o reforço das economias nacionais do cacau dos países membros da ICCO; – Contribuir para um desenvolvimento equilibrado da economia mundial do cacau em linha com os interesses dos países membros através de, nomeadamente: promoção de uma economia do cacau sustentável; promoção de pesquisas e implementação dos seus resultados; promoção da transparência através da recolha, análise e disseminação de estatísticas relevantes; promover o consumo de chocolate e outros produtos à base de cacau.
www.icco.org/about/agreement.aspx
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O Acordo engloba todos os 42 países membros da ICCO, onde se inclui Portugal, e uma organização inter-governamental (a União Europeia). Estão assim representados quase 85% da produção mundial de cacau e mais de 60% do consumo. O sector do cacau na Costa do Marfim Como na história da maioria dos países do Sul, a Costa do Marfim herdou do período colonial o papel de exportador de produtos agrícolas tropicais. Além do marfim que deu o nome a este país, antes da colonização, a Costa do Marfim tinha menos a oferecer ao comércio do que o seu país vizinho, o Gana. Assim, quando os franceses chegaram à região, na década de 1880, acharam muito simples utilizar as grandes extensões de densa floresta tropical, de terras férteis, para a produção agrícola. A Costa do Marfim tornou-se assim num fornecedor do mercado francês, com colheitas voltadas para a venda e para o lucro (agricultura capitalista). As autoridades coloniais começaram a cultura do cacau em 1912. Esta situação não mudou muito depois da independência do país em 1960, continuando as receitas do cacau a ser um motor de desenvolvimento do país. Actualmente a Costa do Marfim produz cerca de 40% do cacau mundial, liderando a produção mundial com praticamente o dobro da produção do país que ocupa o segundo lugar, o Gana. O cacau é plantado tanto em grande escala nas plantações como por pequenos agricultores individuais, embora a maioria da produção seja feita em pequenas plantações familiares, não mecanizadas, onde a colheita envolve o trabalho de toda a família. A dimensão média destas pequenas plantações varia entre 1 e 3 hectares. A produção do cacau sustenta mais de 1 milhão de pequenos produtores que cultivam ao mesmo tempo café e produtos para a sua alimentação (arroz, inhame, bananas, etc.). A produção de cacau neste país aumentou muito no espaço de 45 anos. Em 1960, ano da independência, o país produzia 85.000 toneladas de se-
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mentes; em 1995 produzia 884.000 e em 2005/06 1.407.800. Este cultivo tem influenciado fortemente as florestas tropicais do país. A floresta tropical húmida da Costa do Marfim diminuiu de 12 milhões para 2,6 milhões de hectares hoje em dia enquanto as áreas com cultivo de cacau cresceram de 500.000 hectares em 1975 para 2,4 milhões de hectares em 200030. Com a finalidade de melhor controlar a comercialização da sua produção e de conseguir receitas maiores, os produtores de cacau da Costa do Marfim uniram-se em cooperativas (Agrupamentos de Vocação Cooperativa). As primeiras cooperativas apareceram em 1966 e a primeira união de cooperativas nos anos 70. Em 1992 formaram uma união a nível nacional, a UNECACI (União Nacional das Empresas Cooperativas Agrícolas da Costa do Marfim). Para a defesa dos interesses dos produtores de cacau são também importantes os sindicatos, sendo o principal o Anaproci (Associação Nacional dos Produtores de Café e Cacau). Embora várias cooperativas da Costa do Marfim obtenham recursos dos exportadores para a compra de matérias-primas e outros materiais necessários à produção, muitas organizações ainda dependem do dinheiro do Fundo de Garantia das Cooperativas Café-Cacau31 (FGCCC). Administrado por produtores, exportadores, banqueiros e governo, o FGCCC fornece garantias para empréstimos bancários a grupos de agricultores. Em termos das condições de trabalho, o cultivo do cacau em várias partes do mundo, incluindo a Costa do Marfim, tem sido infelizmente caracterizado por exploração do trabalho infantil e más condições laborais. No entanto, o governo da Costa do Marfim está comprometido em melhorar esta situação, trabalhando em cooperação com pelo menos duas iniciativas contra a exploração laboral: a ICI - International Cocoa Initiative32 Para saber mais sobre o impacto ambiental da produção do cacau na Costa do Marfim ver “Cocoa Trade in Cote d’Ivoire (COCOA)”, Trade and Environment Database (TED), http://www.american.edu/ TED/cocoa.htm
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Mais informação em www.fgccc-ci.com
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Fundada em 2002 com o objectivo de eliminar as piores formas de trabalho infantil e de trabalho escravo no cultivo e transformação das sementes de cacau. A ICI é uma parceria entre empresas da indústria do chocolate, Organizações Não-Governamentais e representantes dos produtores (sindicatos). www.cocoainitiative.org
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(Iniciativa Internacional do Cacau) e a CLMS - Child Labour Monitoring System33 (Sistema de Monitorização do Trabalho Infantil). Este comprometimento é essencial para responder às exigências de alguns países e de cada vez mais consumidoras e consumidores que querem ter a garantia que, ao comprarem por exemplo um chocolate, este foi produzido respeitando os direitos humanos dos trabalhadores e das trabalhadoras. A ICI estabeleceu uma certificação para as condições laborais no cultivo do cacau, que de uma forma mais ampla pretende melhorar o desenvolvimento económico e social das comunidades rurais e a gestão do meio ambiente. O relatório de certificação para a Costa do Marfim de 200834, sobre as condições nas comunidades de agricultores de cacau, fornece informação sobre as práticas laborais em plantações que representam mais que 50% da produção nacional. São descritas várias áreas problemáticas, tais como crianças que não recebem educação e/ou participam em tarefas agrícolas perigosas, bem como agricultores adultos que dizem não ter liberdade para deixar a plantação. A ICI está a trabalhar em 104 comunidades rurais da Costa do Marfim, implementando programas comunitários para mudar as práticas laborais e apoiando a protecção social a vítimas de exploração. A Fundação Internacional do Cacau35 (World Cocoa Foundation) também tem um papel importante na melhoria da qualidade de vida nas plantações de cacau da África Ocidental. Criada em 2000, a fundação apoia e gere múltiplos programas que ajudam as agricultoras e os agricultores a ganhar mais pelas suas colheitas de cacau, assim como promove o uso de condições laborais seguras e responsáveis.
www.cacao.ci
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Para ver o relatório completo visite a página do CLMS: www.cacao.ci/commun/documents/RapportFinalEIDExtension20072008_en.pdf
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Mais informação em www.worldcocoafoundation.org
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O cacau de Comércio Justo A produção do cacau tem uma importância crucial para a economia dos principais países produtores, mas infelizmente os produtores e as produtoras recebem muito pouco destes benefícios. De acordo com a Associação Europeia de Comércio Justo36 (European Fair Trade Association), os agricultores recebem apenas 5% das receitas do chocolate, enquanto as empresas comerciais e a indústria do chocolate recebem cerca de 70%. Isto significa que, para um chocolate vendido a 1 Euro, os produtores ficam apenas com 5 cêntimos, enquanto as empresas ficam com 70 cêntimos - 14 vezes mais! Como vimos em “O sector do cacau na Costa do Marfim”, os proprietários das plantações de maior dimensão recorrem à exploração do trabalho infantil e inclusive ao trabalho escravo para obterem mais rendimentos. Na África Ocidental esta mão-de-obra chega à Costa do Marfim e ao Gana dos países vizinhos mais pobres: Mali, Burkina Faso, Benin e Togo. Quanto às pequenas plantações familiares, que não têm dinheiro para pagar trabalhadores assalariados, dependem do trabalho de toda a família, incluindo as crianças, o que implica muitas vezes que estas não podem ir à escola. Em 2001 a Organização Internacional do Trabalho (International Labour Organization37) denunciou o uso de crianças escravas em muitas plantações da Costa do Marfim. Uma investigação feita pelo Instituto Internacional de Agricultura Tropical38 em várias plantações da África Ocidental encontrou cerca de 284.000 crianças entre os 9 e os 12 anos a trabalhar em condições perigosas. Provavelmente cerca de 12.000 encontravamse nas plantações em resultado de tráfico infantil. Tanto as crianças como as pessoas adultas são forçadas a trabalhar durante muitas horas por dia, colhendo e processando os frutos de cacau.
www.european-fair-trade-association.org
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www.ilo.org
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“Child Labor in the Cocoa Sector of West Africa”, International Institute of Tropical Agriculture, Agosto 2002 – www.iita.org
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A comercialização do cacau no circuito do Comércio Justo, em oposição, permite às agricultoras e aos agricultores ganhar a vida de forma digna nomeadamente através do pagamento de um preço mínimo. Desde 1994 que o preço mínimo do Comércio Justo para a tonelada de cacau é de 1600 dólares; o preço do cacau na bolsa de Nova Iorque entre 1994 e 2007 oscilou muito, encontrando-se muitas vezes abaixo dos 1500 por tonelada e atingindo o valor mínimo de 714 dólares em Novembro de 2000. Para além deste preço base, as importadoras de Comércio Justo pagam um prémio por tonelada (150 dólares) para financiar projectos de carácter social e económico, tais como educação, serviços médicos, melhor maquinaria ou empréstimos aos membros da organização de produtores. Para o cacau ecológico acrescenta-se um segundo prémio de 200 dólares por tonelada. O Comércio Justo apresenta-se portanto como uma alternativa comercial que tem em conta as realidades económicas e sociais dos países produtores e que coloca a dignidade das trabalhadoras e dos trabalhadores acima do lucro. Ao optarem por comprar produtos de Comércio Justo, os consumidores e as consumidoras têm a possibilidade de exprimir a sua opinião e marcar uma posição política, praticando um consumo responsável e demonstrando que são contra as injustiças criadas pelo sistema de comércio convencional. Os únicos dados disponíveis sobre a venda de cacau do Comércio Justo referem-se ao cacau com certificação da FLO - Organização Internacional de Certificação do Comércio Justo (Fair Trade Labelling Organization39). Segundo esta, as vendas de cacau de Comércio Justo foram de 4.201 toneladas em 2004, subindo para as 7.306 toneladas em 2007 – são volumes modestos, representando menos de 0,1% do mercado total de cacau. Actualmente estas vendas abrangem 34 organizações de produtores (cooperativas, associações, federações, uniões de cooperativas), duas delas da Costa do Marfim. O fornecimento de cacau de Comércio Justo www.fairtrade.net
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é dominado por dois países, a República Dominicana com cerca de 50% do total mundial, seguida do Gana com cerca de 45% (valores de 2003). Também segundo a FLO, em 2003 o cacau e produtos feitos com cacau (tais como o chocolate) eram vendidos no mercado do Comércio Justo em 16 países, mas 80% das vendas totais concentravam-se em 5 países: a Grã-Bretanha (35%), a Itália (13%), a Alemanha (13%), a Suíça (10%) e a França (9%). Desde 2004 que se pode encontrar chocolate e outros produtos feitos com cacau do Comércio Justo no Japão, Austrália, Nova Zelândia e México. Importa referir que muitos produtos de Comércio Justo não são certificados pela FLO. É o caso de muitos dos produtos à venda nas Lojas de Comércio Justo. De facto, entre os princípios defendidos pelo Comércio Justo está uma relação de parceria a longo prazo entre os vários actores, assente na transparência e na confiança. Desta forma, o cumprimento dos critérios é assegurado pelas próprias organizações importadoras de Comércio Justo que mantêm uma relação de proximidade com os produtores. Se por um lado a certificação da FLO permite a identificação rápida do produto e a sua venda nos supermercados, por outro implica elevados custos adicionais para as organizações de produtores e permite a empresas multinacionais, que praticam um comércio largamente assente na exploração laboral e dos recursos ambientais, apresentaremse como responsáveis. Além disto, o processo de certificação é feito por pessoas totalmente estranhas às organizações de produtores, de forma pontual e num espaço de tempo muito curto, sendo questionável a sua eficácia em concluir se uma organização cumpre ou não efectivamente um conjunto alargado de critérios. Por último, é importante ter em conta que o chocolate é composto por vários ingredientes para além do cacau, uns apenas produzidos nos países do Sul e outros, como por exemplo o leite, produzidos nos países do Norte. Segundo a certificação FLO, um produto elaborado (isto é, com mais de 1 ingrediente, como o chocolate ou bolachas) é considerado de Comércio Justo se, quando há ingredientes necessários à sua produção
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no circuito do Comércio Justo, se tem sistematicamente recurso a estes, e quando os outros ingredientes que integram a sua elaboração não excedem 50% do total. No entanto, para várias organizações de Comércio Justo40, que apostam numa maior interligação entre o Sul e o Norte e que defendem os critérios do Comércio Justo para todos os intervenientes da cadeia produtiva (desde a produção, à transformação, distribuição e comercialização), este critério da FLO não faz muito sentido. Na sua perspectiva, os critérios de Comércio Justo devem ser aplicados tanto aos produtores dos países do Sul como aos produtores dos países do Norte. A título de exemplo, num chocolate de Comércio Justo tanto o cacau como o leite devem ser produzidos de forma social e ambientalmente responsável; e tanto a organização de produtores na Costa do Marfim como os produtores de leite e a fábrica de chocolates na Bélgica devem colocar o bem-estar social acima do lucro. Todas estas questões demonstram que o movimento do Comércio Justo é um movimento plural em que diferentes organizações têm diferentes abordagens. Trata-se de questões complexas para as quais não há respostas fáceis. Não nos podemos esquecer que o comércio internacional é complexo, assim como é complexo um processo ao mesmo tempo social, económico e político que o pretende transformar. Uma certeza podemos ter: para fazermos um consumo responsável há que fazer uma análise crítica da realidade e das informações que nos são disponibilizadas e muitas vezes procurar soluções caso a caso. De qualquer forma, estar consciente das injustiças praticadas e procurar alternativas é um primeiro passo muito importante! O cacau biológico O mercado para alimentos de produção biológica (também designado por cultivo orgânico), tem crescido bastante nos últimos anos, em especial devido às crescentes preocupações dos consumidores com a se Para mais informação sobre uma visão alternativa do Comércio Justo ver a Rede Espaço por Um Comércio Justo: www.espaciocomerciojusto.org
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gurança alimentar. Como resultado, a produção biológica de alimentos está a crescer em todos os continentes. Muito deste crescimento dá-se em países do Sul, onde os agricultores são atraídos pelos preços mais altos para estes produtos. Pela mesma razão, muitos governos aconselham os agricultores a mudarem para uma agricultura biológica. A agricultura biológica defende o uso de métodos agronómicos, mecânicos e biológicos que permitam reforçar o ecossistema do terreno agrícola como um todo. Portanto, a produção biológica promove e potencia a biodiversidade, os ciclos biológicos e a actividade biológica dos solos. O uso de fertilizantes sintéticos e pesticidas e de Organismos Geneticamente Modificados (OGM) é proibido. Os alimentos são mais saudáveis, os agricultores não estão expostos a químicos e o meio ambiente é respeitado, o que por sua vez permite que os solos se mantenham férteis e produtivos (agricultura sustentável). A procura por chocolate biológico também tem aumentado muito. Já faz alguns anos que os produtos de chocolate biológico começaram a ser vendidos nos supermercados; inclusive, os líderes da grande distribuição lançaram os seus próprios produtos biológicos. No entanto, a proporção de cacau biológico no mercado de cacau continua pequena. A Europa é de longe a principal importadora de sementes de cacau biológicas e a principal fabricante de produtos de cacau e de chocolate certificados. Uma parte destes produtos é exportada, em especial para os EUA. A produção de sementes de cacau biológicas nos últimos anos foi estimada em 15.500 toneladas e a exportação em 11.170 toneladas41. Isto significa que o mercado biológico representa menos do que 0,5% do mercado total de cacau. Mesmo assim, o cacau orgânico tem um peso superior ao do cacau de Comércio Justo. Por outro lado, cerca de 10% das sementes de cacau biológicas são, adicionalmente, de Comércio Justo. A maior parte dos países que produzem cacau biológico estão localizados na América do Sul, que é responsável por mais de 70% da produção “A study on the market for Organic Cocoa”, Comité Executivo da Organização Internacional do Cacau, Julho 2006 – www.icco.org/Attachment.aspx?Id=hkb32738
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de cacau biológico do mundo ainda que detenha apenas 13% do mercado convencional de cacau. À semelhança do cacau com certificação do Comércio Justo, as sementes de cacau com certificação biológica recebem um prémio sobre o preço por tonelada; este valor não é fixo e está sujeito às flutuações do mercado, variando habitualmente entre os 100 e os 300 dólares. A República Dominicana é o maior produtor mundial de cacau orgânico, que na sua maioria também é de Comércio Justo. Apenas uma pequena parte deste cacau é transformado pelas cooperativas de produtores, como é o caso da CONACADO42 (Confederação Nacional Dominicana de Agricultores de Cacau). Esta cooperativa foi fundada em 1988 como resposta aos baixos preços de cacau no mercado internacional e para apoiar pequenos agricultores de cacau, de forma a que estes possam melhorar as suas condições de trabalho e de vida. A cooperativa tem por objectivos, entre outros, diminuir a dependência de intermediários através da exportação directa e prestar assistência técnica para melhorar a qualidade do cacau produzido. Outros países produtores de cacau, como os Camarões, a Costa do Marfim e a Indonésia, têm muita da sua produção em processo de conversão para uma produção de modo biológico. É importante ter em conta que a oferta de cacau biológico se depara com muitas dificuldades para responder à crescente procura. Ao nível dos produtores, para além dos elevados custos de certificação (feitos por organismos estrangeiros) e a falta de conhecimento sobre os canais do mercado de produtos biológicos, há que melhorar a consistência e qualidade do fornecimento.
http://conacado.com.do
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4. para saber mais Para aprofundar os temas deste caderno, podem consultar a bibliografia e as páginas da Internet referidas nas notas ao longo do texto. Reunimos aqui as principais e mais algumas de interesse. Sobre Produção, Comércio e Consumo do Cacau – Cacao.ci, CLMS – Child Labour Monitoring System (Sistema de Monitorização do Trabalho Infantil) – www.cacao.ci – “Child Labor in the Cocoa Sector of West Africa”, International Institute of Tropical Agriculture, Agosto 2002 – www.iita.org – FAO – Food and Agriculture Organization of the United Nations – www.fao. org – “Fair Trade Year Book 2001”, EFTA - European Fair Trade Association, 2001 – www.european-fair-trade-association.org/efta/Doc/yb01-en.pdf – Fundação Mundial do Cacau – www.worldcocoafoundation.org; especialmente “Ecological, economic and social perspectives on cocoa production worldwide”, Margaret Franzen e Monique Borgerhoff Mulder, 2007; e «Modeling farmers’ decisions on child labor and schooling in the cocoa sector: a multinomial logit analysis in Côte d’Ivoire”, Guy B. Nkamleu, Anne Kielland, Dezembro 2005 – ICI - International Cocoa Initiative (Iniciativa Internacional do Cacau) – www. cocoainitiative.org – Impacto ambiental da produção do cacau na Costa do Marfim - “Cocoa Trade in Cote d’Ivoire (COCOA)”, Trade and Environment Database (TED) – www. american.edu/TED/cocoa.htm – Info Comm – página com informação sobre o mercado de mercadorias das Nações Unidas (UNCTAD – United Nations Conference on Trade and Development) – http://r0.unctad.org/infocomm/anglais/cocoa/sitemap.htm – Organização Internacional do Cacau (ICCO) – www.icco.org: Acordo Internacional do Cacau de 2001; “Assessment of the movements of global supply and demand”, Fevereiro 2007; “A study on the market for Organic Cocoa”, Julho 2006; “Facts and figures on Fair-Trade cocoa”, Junho 2005; e ainda “Inventory of Health and Nutritional Attributes of Cocoa and Chocolate, December 2005”;
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– ORCADES - www.orcades.org – Organização Internacional do Trabalho (International Labour Organization) – www.ilo.org – “Chocolate & Cocoa: ‘Healthy’ Benefits or Negative Health Effects?” - www. acu-cell.com/choc.html Sobre Comércio Justo – CIDAC – Centro de Informação e Documentação Amílcar Cabral – www. cidac.pt – “Comércio Justo: Interdependência Sul/Norte – Actividades Pedagógicas”, CIDAC e IMVF, Janeiro 2008, disponível em papel no IMVF (www.imvf.org) e no Centro de Documentação do CIDAC e disponível em formato digital na página do CIDAC (www.cidac.pt/RecCJ.html) – Cores do Globo – www.coresdoglobo.org – EFTA -Associação Europeia de Comércio Justo (European Fair Trade Association) – www.european-fair-trade-association.org – FLO – Organização Internacional de Certificação de Comércio Justo (Fair Trade Labelling Organization) – www.fairtrade.net – IFAT – Associação Internacional de Comércio Justo (International Fair Trade Association) – www.ifat.org – Mó de Vida – www.modevida.com – NEWS – Rede Europeia de Lojas de Comércio Justo - www.worldshops.org/ – Rede Espaço por um Comércio Justo – www.espaciocomerciojusto.org – Reviravolta – www.reviravolta.comercio-justo.org Sobre Costa do Marfim – Index Mundi- www.indexmundi.com/pt – Governo da Costa do Marfim - www.gouv.ci – Links sobre a Costa do Marfim, na página do Centro de Estudos Africanos da Universidade da Pensilvânia – www.africa.upenn.edu/Country_Specific/ Cote.html – «Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008» do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP – United Nations Development Programme) - http://hdr.undp.org/en/reports/global/hdr2007-2008/ chapters/portuguese/ – UNFPA - United Nations Population Fund - www.unfpa.org/swp/2007/ spanish/notes/indicators.html