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2.1. A INEFICÁCIA DAS RESPOSTAS AOS FLUXOS FINANCEIROS ILÍCITOS E ÀS INJUSTIÇAS FISCAIS Os números dos fluxos financeiros ilícitos, sendo avassaladores, correspondem também a uma estimativa conservadora, pois muitos destes fluxos são de natureza criminosa e, portanto, não passíveis de serem contabilizados nas estatísticas. Estes recursos financeiros circulam ilegalmente com origem em circuitos de corrupção, no tráfico de armas, droga e de seres humanos, na exploração ilegal de recursos naturais, na contrafação e também no branqueamento de capitais, mas dizem também respeito a fluxos injustos que não violam as leis vigentes mas apenas as contornam – como é o caso da saída de lucros e capitais de multinacionais que se localizam nos países em desenvolvimento, o envio de recursos financeiros para paraísos fiscais e outros esquemas que permitem evitar a tributação nos países onde operam, com grandes impactos em países e regiões mais frágeis, pobres e vulneráveis. Nestes países, ao terem como efeito a erosão da base tributária e dos fundos públicos, os fluxos financeiros ilícitos prejudicam a mobilização de recursos essenciais para apoiar os processos de desenvolvimento económico, social, humano e sustentável (GFI, 2020). Por outro lado, a falta de rastreabilidade e de regulação do capital tem contribuído para grandes dificuldades nos países desenvolvidos e em desenvolvimento para taxar o capital e regular a fuga de capitais em tempos de crise – o que aumenta a pressão sobre o consumo e os salários, colocando maior carga sobre os pobres e também sobre grupos sociais alvo de maior exclusão, discriminação ou desigualdade, como as mulheres. Este é, assim, um fenómeno muito complexo para o qual contribui não só a existência de lacunas na lei e as fracas capacidades de governação nos países menos desenvolvidos, mas também questões ligadas à falta de vontade política, concertação internacional incipiente, fraca fiscalização e formação, insuficiência dos mecanismos de inteligência e troca de dados/informação, questões de jurisdição, de gestão de risco e sistemas de controlo, entre outras. A nível global, são necessárias políticas globais coerentes e concertadas, que colmatem as lacunas existentes e permitam respostas mais abrangentes e eficazes. Salienta-se, a este propósito, que têm sido negociados e aplicados conjuntamente uma série de acordos e medidas que vão desde a regulamentação à cooperação judicial e policial entre países, mas ainda com pouca eficácia. A Financial Action Task Force – FATF, criada em 1998 com enfoque no branqueamento de capitais43, o Fórum Global sobre Transparência e Troca de Informação para fins fiscais, criado em 2009, e o Quadro Inclusivo sobre erosão da base tributária e transferência de lucros (Base erosion and profit shifting - BEPS) criado em 2016 numa iniciativa conjunta do G20 e OCDE, têm formulado recomendações e normas relevantes para redução dos fluxos financeiros ilícitos, mas com grandes obstáculos a uma implementação verdadeiramente abrangente e vinculativa. Desde a crise de 2008-9, o impulso para as reformas regulamentares e outras medidas tem sido dado não pela necessidade de um desenvolvimento global mais justo, ético e equitativo, mas pela estabilidade e integridade do sistema financeiro mundial, o que tem levado
Consultar os Marcos das Políticas em anexo.
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