Ciclos anuais no rio Tiquié: pesquisas colaborativas e manejo ambiental no noroeste amazônico

Page 1

Os povos indígenas têm papel chave na governança ambiental e climática da Amazônia – não apenas devido aos direitos territoriais que lhes são assegurados, mas também pela visão de dentro que têm de seus processos ecossistêmicos. Os povos indígenas são os que melhor conhecem a Amazônia, onde estão presentes há milênios e que ajudaram a produzir e reproduzir. Diversos ecossistemas e paisagens amazônicos são produtos de interações persistentes entre as sociedades indígenas e seu meio ambiente. Mais que isso, em suas comunidades, os moradores vivem no dia a dia manejando seu ambiente, nas práticas da agricultura, da pesca, da coleta de frutos, dentre outras atividades.

(Evaristo, abril de 2006).

“Primeiro dia de Verão de Pupunha; nesse dia as frutinhas pahtid¡hka começaram a espocar, alimentando a todos os peixes que comem esses carocinhos.”

(Rogelino, janeiro de 2008).

“Tempo estava nublado e o rio continua secando pouco, e sararoá continuam cantando. Tem muitos ingás que estão florescendo: buu mere, wiri mere, pino mere, botea mere, buí mere. E os daracubis aparecem wõwerã, os que estão com ovos.”

CICLOS ANUAIS NO RIO TIQUIÉ

(Mauro, abril de 2007)

CalendarioTukano_Capa_AF7b.indd 1

O.S.: 325613

(Evaristo, setembro de 2008).

CICLOS ANUAIS NO RIO TIQUIÉ

PESQUISAS COLABORATIVAS E MANEJO AMBIENTAL NO NOROESTE AMAZÔNICO

Alberto Alves Marques, tukano, Santa Luzia Aldo Marques Sampaio, tukano, Santa Luzia Arsênio Rodrigues, bará, Puerto Loro Cornélio Lobo Gonçalves, desana, São Luis Damião Amaro Barbosa, makuna, Buraco de Cobra Dario Azevedo Resende, tuyuka, Igarapé Onça Dionísio Mesquita, bará, Bela Vista Estevão Monteiro Pedrosa, tukano, Cunuri Evaristo Caldas Azevedo, tukano, Pirarara Gabriel Prado Barbosa, makuna, São Pedro Genesio Fernandes Araújo, yuhup, Igarapé Cunuri Germano José Borges Campos, desana, São Sebastião Gilson Pimentel Aguiar, desana, Floresta Ismael Pimentel dos Santos, desana, Santo Antônio Jarbas Goes Pires, hup, Barreira João Batista Marques Meira, tuyuka, Cachoeira Comprida João Bosco Marques Tenório, tuyuka, São Pedro João Paulo Lemos Marinho, tukano, Rio Castanha João Pedro Lima Azevedo, tukano, Pirarara João Teles Meira, tuyuka, Cachoeira Comprida Jodair Resende Marques, tukano, Caruru Joel Pedrosa Paz, desana, Cunuri Jonas Prado Barbosa, makuna, São Pedro José Maria Alcântara, tukano, Matapi José Maria Barbosa Ramos, tuyuka, São Pedro José Caldas Pedrosa, tukano, Cunuri José Pimentel, tukano, Bela Vista Lenildo Aguiar Azevedo, tukano, Pirarara Lucas Alves Bastos, tukano, São Paulo Mateus Gomes Macedo, desana, Duhtura Marcos Monteiro Pedrosa, tukano, Cunuri Marcos Rezende Barbosa, tuyuka, São Pedro Mauro Monteiro Pedrosa, tukano, Cunuri Orlando Massa Moura, tukano, Maracajá Oswaldo Barbosa Alves, tukano, São Paulo Paulo de Abreu Lobo, miriti-tapuya, Iraity Paulo Goes Pires, hup, Igarapé Taracuá Rafael Azevedo, tukano, Acará-Poço Roberval Sobrano Araújo Pedrosa, tukano, Serra de Mucura Rogelino da Cruz Alves Azevedo, tukano, São José Valério Pereira Azevedo, desana, Acará-Poço

ISA FOIRN

“Papai e mamãe foram procurar cunuri no mato. E acharam um aturá cheio. Depois eles cozinharam, tiraram a casca e botaram no rio por um dia e uma noite, daí eles tiraram e comeram. O rio continua vazando, está quase seco. ”

“O rio encheu três palmos e às 17:30h wereã, seãa pihkara, buhtuweã, ahkoarã, ñohsõwia e outros fizeram piracema na beira do rio Tiquié, na foz do igarapé Wam¡ña.”

Tue Aug 23 14:43:19 2016

(Roberval, agosto de 2006)

(Evaristo, outubro de 2006)

formato: 80.081 x 80.081

“Às 17:40h estávamos plantando maniva e, ao mesmo tempo, carregamos lenha para cozinhar manicuera. Meu irmão Adalberto matou um porquinho do mato, esses porcos estavam comendo demais a mandioca na roça dele. Nesse dia o rio parou de encher e as pescadas continuam zoando no fundo do rio. Nesses dias os piuns estão chatos, tem muito, tanto na comunidade como na roça.”

bolacha

(Marcos, fevereiro de 2006)

2

“Nesse mês está caindo muito ucuqui. Raimundo fez dabucuri de ucuqui com os hupda (peora), ofereceram vinte e cinco aturás de ucuqui para as mulheres da comunidade.”

Esses conhecimentos práticos não circulavam por escrito, mas através da oralidade, de geração em geração. Hoje em dia estão sendo retomados e reelaborados em ambientes de pesquisa intercultural – pesquisas colaborativas que constituem uma via para revelar esses saberes e, ao mesmo tempo, aproximá-los de processos de formulação de políticas para a Amazônia. É o caso desse livro, que descreve e analisa uma sequência de três anos no rio Tiquié, noroeste amazônico, mostrando como os ciclos de vida se entrelaçam, como os fenômenos e as atividades de manejo cotidianos são compreendidos.

Arquivo: 325613_codigo-P001-0321.pdf

(Paulo, dezembro de 2005).

“Dia estava muito quente durante a manhã e tarde. Na roça, fui plantar maniva, depois de terminar ainda plantei pimenta. Em seguida fiquei roçando até ao meio dia, quando a minha esposa chegou na roça, para ajudar a queimar a roça, que estava boa para queimar. Tocamos fogo e fomos. No mesmo dia o sr Rafael queimou a roça dele, no igarapé Anta. O nível do rio desceu muito grande. Está fazendo quase uma semana de verão. Esse verão é chamado Mere kuma, Verão de Ingá, uma semana sem chuva.”

SIGNORINI.

“Amanheceu chovendo, parou às nove. Dia inteiro nublado. O rio encheu rápido, houve piracema de araripirá e aracu-três-pintas no Semeña (igarapé Paca)”.

Os Agentes Indígenas de Manejo Ambiental, de diversos povos e comunidades do rio Tiquié, estão envolvidos nas pesquisas sobre os ciclos de vida e seu manejo. Vários deles fazem registros diários por escrito, que constituem a substância desse livro. São eles:

31/08/16 11:05


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.