HISTÓRIA DA FILOSOFIA MEDIEVAL E MODERNA

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Apresentação

O Curso de História da Filosofia Medieval e Moderna oferecido pelo CMCF procura apresentar o desenvolvimento do pensamento Ocidental através de uma breve introdução à produção filosófica e teológica que nortearam o mundo naquele momento histórico e forneceu as condições para a construção da sociedade e suas instituições na Europa e que influenciaram a política, a religião, os costumes, a literatura, a formação dos Estados e que ainda norteiam através de valores morais e religiosos os costumes atuais e a própria sociedade ocidental. O Curso começa com os pensadores medievais logo no início do Cristianismo para compreendermos sua importância filosófica e teológica e destacando Santo Agostinho como grande personalidade da Patrística. Na Escolástica veremos as contribuições teológicas e o pensamento de São Tomás de Aquino. A Filosofia da Renascença vem abrir as portas para a mudança de referência no pensamento filosófico abrindo-se para a Ciência e suas ramificações. Tem grande importância para as Artes, a Política, a Religião. E após a Renascença inaugura-se um novo momento, a Filosofia Moderna que trará contribuições importantíssimas para a reorganização das Ciências Humanas e Exatas e da própria política. O Curso de História da Filosofia Medieval e Moderna é um convite à leitura, discussão e busca de conhecimento.

“Dois excessos: excluir a razão, admitir apenas a razão.” Blaise Pascal

Marcelo Wollenhaupt Menna Barreto

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Sumário Apresentação ........................................................................................................................................................... 3 Filosofia Medieval .................................................................................................................................................... 6 Período Patrístico ..................................................................................................................................................... 7 Fílon de Alexandria ................................................................................................................................................... 7 O que é Gnose .......................................................................................................................................................... 8 Justino Mártir (100 – 165) ........................................................................................................................................ 9 “Capítulo XIV. Um apelo de advertência aos gregos” ............................................................................................. 10 “Capítulo XV. Testemunho de Orfeu ao monoteísmo”........................................................................................... 10 Orígenes (184-253)................................................................................................................................................. 11 O problema do Mal em Santo Agostinho ............................................................................................................... 13 DEUS É O BEM ........................................................................................................................................................ 14 A SOLUÇÃO DO PROBLEMA DO MAL NA INTERPRETAÇÃO DE AGOSTINHO .......................................................... 15 O MAL METAFÍSICO-ONTOLÓGICO......................................................................................................................... 15 O MAL É UM SER PARA OS MANIQUEÍSTAS ........................................................................................................... 16 DISTINÇÃO DO MAL METAFÍSICO – MANIQUEÍSTA E AGOSTINIANO ..................................................................... 16 AGOSTINHO – O MAL NÃO É UM SER .................................................................................................................... 17 A liberdade para Santo Agostinho .......................................................................................................................... 17 O PROBLEMA MENTE-CORPO ................................................................................................................................ 18 Filosofia da Escolástica ........................................................................................................................................... 20 Sobre a existência de Deus ..................................................................................................................................... 25 A FILOSOFIA DO RENASCIMENTO ........................................................................................................................... 28 Classificação das ciências ....................................................................................................................................... 31 O método indutivo: a verdadeira interpretação da natureza ................................................................................. 32 MOVIMENTOS FILOSÓFICOS .................................................................................................................................. 33 Humanismo ............................................................................................................................................................ 34 Secularismo ............................................................................................................................................................ 35 Iluminismo.............................................................................................................................................................. 35 A FILOSOFIA MODERNA ......................................................................................................................................... 36 O primeiro pensador modern................................................................................................................................. 37 Teoria do ato de reflex ........................................................................................................................................... 38 Filosofia do século XVII ........................................................................................................................................... 38 Filosofia do século XVIII .......................................................................................................................................... 38 Das leis em suas relações com os diversos seres.................................................................................................... 40 O juiz não pode criar leis ........................................................................................................................................ 40 Caracterização geral da democracia ....................................................................................................................... 40 Corrupção da democracia ...................................................................................................................................... 41 Citações .................................................................................................................................................................. 41 Posições políticas ................................................................................................................................................... 42 Estado e governo.................................................................................................................................................... 42 Prefácio: Os seis livros da república ....................................................................................................................... 43 A filosofia natural e moral de Thomas Hobbes....................................................................................................... 45 “O homem vive livre e em paz no seu estado de natureza” ................................................................................... 46 O problema da causalidade .................................................................................................................................... 47 O problema da indução .......................................................................................................................................... 47 Anti-realismo moral e motivação ........................................................................................................................... 48 Livre-arbítrio vs. indeterminismo ........................................................................................................................... 48 O estado de natureza ............................................................................................................................................. 48 Amor e ódio............................................................................................................................................................ 50 O contrato social .................................................................................................................................................... 50 Liberdade natural ................................................................................................................................................... 51 Transição do estado de natureza para o estado civil.............................................................................................. 51 Liberdade civil ........................................................................................................................................................ 52 4


Filosofia do século XIX ............................................................................................................................................ 53 Escolas e filósofos da filosofia moderna ................................................................................................................. 54 Racionalismo .......................................................................................................................................................... 54 Empirismo .............................................................................................................................................................. 54 Filosofia política ..................................................................................................................................................... 54 Idealismo ................................................................................................................................................................ 54 Um mundo cego e irracional .................................................................................................................................. 55 Viver é sofrer .......................................................................................................................................................... 57 No Nada, há salvação ............................................................................................................................................. 57 Ética........................................................................................................................................................................ 58 As questões de partida do kantismo ...................................................................................................................... 58 A menoridade humana ........................................................................................................................................... 59 Juízos ...................................................................................................................................................................... 60 Juízo analítico ......................................................................................................................................................... 60 Juízo sintético ......................................................................................................................................................... 60 Juízo estético .......................................................................................................................................................... 60 A paz perpétua ....................................................................................................................................................... 62 Metafísica e epistemologia de Kant ....................................................................................................................... 62 Filosofia moral ........................................................................................................................................................ 63 Existencialismo ....................................................................................................................................................... 64 Pragmatismo .......................................................................................................................................................... 64 FONTES ................................................................................................................................................................... 64

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Filosofia Medieval

Patrística Mil anos. Foi esse o período aproximado que denominamos como idade medieval, da queda do império romano no século V até o século XV e o início do renascimento foram desenvolvidas duas correntes filosóficas distintas: A filosofia patrística e a filosofia escolástica, ambas possuíam concepções religiosas, porém com diferentes abordagens. Filosofia Patrística (século I ao VII): a filosofia desenvolvida nessa época teve como objetivo consolidar o papel da igreja e propagar os ideais do cristianismo. Baseadas nas Epístolas de São Paulo e o Evangelho de São João, a escola patrística advogou a favor da igreja e propagou diversos conceitos cristãos como o pecado original, a criação do mundo por Deus, ressurreição de juízo final. Apesar das contribuições ideológicas e em alguns aspectos científicos, especialmente na geometria, aritmética, música, astronomia entre outras, a filosofia patrística e escolástica se diferencia das demais correntes de pensamento pelo fato de não aceitar verdades que poderiam, porventura, contrariar dogmas religiosos e os demais pressupostos cristãos. Pelo seu caráter em alguns aspectos manipulador, a filosofia medieval não costuma receber muita atenção de indivíduos engajados na busca científica da existência humana e do próprio universo.

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Período Patrístico O período denominado “Patrístico” representa um momento significativo para o desenvolvimento do pensamento cristão. A patrística foi sem dúvida, um marco decisivo na evolução da doutrina cristã. O termo “Patrística”, vem da palavra latina pater, “pai”, referente ao pensamento dos pais da igreja. Os ramos teológicos dos pais da igreja de 100 a 310 formam o primeiro período patrístico. De 310 a 451 temos o segundo período, finalizando com a terceira fase que se inicia no Concilio de Calcedônia em 451 até o segundo Concilio de Nicéia em 787. Esse fenômeno ganhou força na história da teologia cristã após o ano 310 devido à cessação da perseguição ao cristianismo logo em 311. Finalizada a perseguição, as discussões teológicas poderiam ser feitas em publico, com o apoio do Estado. Isso possibilitava um avanço nas teologias cristãs, os teólogos após 311 poderiam se dedicar sem se preocupar com a perseguição, não havia mais acossamento do Estado e sim o apoio. Ademais, o universo plural da teologia cristã ganharia mais consistência no mundo intelectual da igreja, com essa junção entre Igreja e Estado a oportunidade do fazer teológico para, até mesmo, justificar as atrocidades do império frontispício aos pagãos ganharia auxilio religioso, mesmo por que, “tudo era em nome de Deus”. É imprescindível a apresentação dos nomes dos teólogos da patrística para melhor familiaridade com o próprio assunto. Os Pais Apostólicos (continuadores diretos dos Apóstolos,c. 80-150): Clemente Romano (Papa São Clemente I), Papias de Hierápolis, Inácio de Antioquia, Policarpo de Esmirna, Pastor de Hermas. Segunda metade do século II: Aristides de Atenas, Justino, Atenágoras de Atenas, Ireneu de Lyon (Irineu de Lião), Teófilo de Antioquia. Século III: Orígenes de Alexandria, Tertuliano de Cartago, Clemente de Alexandria, Cipriano de Cartago (São Cipriano), Hipólito de Roma, Minúcio Félix. Pais Nicenos: Eusébio de Cesareia Atanásio de Alexandria, Cirilo de Jerusalém, Efraím da Síria. Pais Pós Nicenos: João Crisóstomo, Hilário de Poitiers, Ambrósio de Milão, Jerónimo de Strídon, Agostinho de Hipona, Nemésio de Emesa, Evágrio do Ponto, Arnóbio, Lactâncio, Calcídio, Mário Victorino, Macróbio. Os Pais Capadócios: Basílio de Cesareia (Basílio Magno), Gregório de Nazianzo, Gregório de Nissa. Século V: Marciano Capela, Cirilo de Alexandria, Teodoro de Mopsuestia, Papa Leão I, (o Grande). Século VI: Papa Gregório I (o Grande), Boécio. Século VII: Máximo o Confessor, Isidoro de Sevilha. Século VIII: João Damasceno (João de Damasco). Depois do século VIII (só no Oriente) Fócio Simeão, Gregório Palamás e Marco de Efeso. Estes são os nomes que praticamente foram responsáveis em grande parte pela definição das doutrinas cristãs como os conhecemos hoje. Não temos como fugir desta discussão devido a influência das escolas filosóficas gregas nos pais da Igreja. Aliás, a Patrística ganha força devido sua confluência filosófica nas questões relacionadas à Bíblia e as teologias subjacentes.

Fílon de Alexandria (10 a.C - 50 d.C) Fílon foi um dos mais renomados filósofos do judaísmo helênico, interpretou a bíblia utilizando elementos da filosofia de Platão, para ele o Demiurgo de Platão é o Deus criador dos hebreus. Estuda os textos bíblicos exegeticamente e vê neles muito mais do que os significados textuais. Busca nas palavras a autenticidade da mensagem divina. Através dessa interpretação ele vê na Bíblia a doutrina da existência de Deus. As palavras são somente um instrumento para tentar conhecer Deus que por princípio não pode ser expresso por palavras. Através da exegese Fílon revela um significado nas palavras bíblicas que vão além do significado imediato e literal. Este modo de interpretação vai ser muito utilizado pela Patrística. Ele tenta conciliar a filosofia grega e o judaísmo, mas nem os gregos nem os judeus aceitaram muito bem a sua obra, que somente foi reconhecida e aprovada pelos primeiros cristãos. Fílon estava convencido de que a fé judaica e a filosofia grega coincidiam em diversos pontos, em especial na busca da verdade. Para ele existe um Deus único, incorpóreo e que não tem princípio. Deus criou o Logos, que é a atividade intelectiva de Deus, e ao Logos devemos a criação do mundo. O Logos é o que está entre Deus e os homens, é o intermediário da relação entre os dois. O Logos é o ser mais antigo, o primeiro a ser criado por Deus e é também a sua imagem. Deus transcende a tudo o que é conhecido pelo homem, ele vai além dos limites da experiência material. O homem tem por fim voltar a se unir a Deus que é perfeito e do qual nós não temos a capacidade de compreensão. Para se unir a Deus o homem tem que se libertar da sua ligação com o corpo. 7


O homem é constituído por corpo, intelecto e espírito originário de Deus. A inteligência humana pode ser corrompida, e quando é corrompida ela se torna terrena, mas se ela se ligar ao espírito divino ela vai descobrir a verdadeira vida. Segundo Fílon o homem pode levar sua vida de três formas, a primeira é ligada ao corpo como extensão física, essa é a forma mais básica e inferior. A segunda é a dimensão da razão, que é a nossa alma ligada ao intelecto, o homem nessa dimensão utiliza a razão para direcionar sua vida. E a última e superior forma é a ligada ao divino, nessa dimensão a alma e o intelecto tornam-se eternos à medida que estão ligados ao espírito divino. Sentenças: - Para a criatura o melhor momento para encontrar seu criador é quando ela se torna nula. - Devemos viver para Deus e não para nós mesmos.

O que é Gnose O termo gnose deriva do termo grego "gnosis" que significa "conhecimento". É um fenômeno de conhecimento espiritual vivenciado pelos gnósticos (cristãos primitivos sectários do gnosticismo). Para os gnósticos, gnose é um conhecimento que faz parte da essência humana. É um conhecimento intuitivo, diferente do conhecimento científico ou racional. Gnose é o caminho que pode guiar à iluminação mística através do conhecimento pessoal que conduz à salvação. A existência de um Deus transcendente não é questionada pelos gnósticos, pelo contrário, veem no conhecimento divino um caminho para atingir um conhecimento mais profundo da realidade do mundo.O gnosticismo está relacionado com ensinamentos esotéricos da cultura grega e helenística, que expõe aos seus iniciados um caminho de salvação que tem como base o conhecimento de certas verdades ocultas a respeito de Deus, do homem e do mundo.O gnosticismo cristão designa um conjunto de crenças de natureza filosófica e religiosa cujo princípio básico assenta na ideia de que há em cada homem uma essência imortal que transcende o próprio homem. Assim, o homem é visto como um ser divino que caiu na terra de forma desastrosa, e que só pode se libertar dessa condição através de uma verdadeira Revelação. Os traços essenciais da doutrina gnose: a) O objeto específico do conhecimento gnóstico é Deus e as coisas últimas relativas à salvação do homem. Quem éramos e o que nos tornamos; Onde estávamos e onde fomos lançados; Aonde desejamos ir e de onde fomos resgatados; O que é o nascimento e o que é o renascimento. b) Na experiência do gnóstico, a tristeza e a angústia emergem como dados fundamentais, porque revelam um impacto com o negativo e a conseqüente tomada de consciência de uma cisão radical entre o bem e o mal, revelando ademais nossa verdadeira identidade, que consiste na pertença ao bem originário: se o homem sofre o mal, isso significa que ele pertence ao bem. Portanto, o homem provém de outro mundo e a ele deve retornar. Esse mundo é o nosso “exílio” e o outro mundo é a nossa “pátria”. Um dos mais significativos documentos gnósticos afirma: “quem conheceu o mundo, encontrou um cadáver. E o mundo não é digno de quem encontrou um cadáver.” O gnóstico deve tomar consciência de si e, conhecendo-se a si mesmo através de si mesmo, podrá netão retornar à pátria originária. Papel essencial nesse “retorno “ é desempenhado pelo Salvador (Cristo), que é um dos “éons” divinos. c) Os gnósticos dividem o homem em três categorias: 1- Pneumáticos: Nos primeiros, predomina o Espirito (peuma); destinados à salvação. 2- Psíquicos; nos segundos, a alma (psychè); tem a possibilidade de salvação. 3- Hílicos: nos terceiros, a matéria (hylé), destinados à morte.

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d) Este mundo, que ,é mal, não foi feito por Deus, mas sim por um demiurgo mau. Plotino nos diz que: os gnósticos sustentam que o demiurgo desse mundo é mau e que o cosmo é mau. Explica-se assim, o fato de que o Deus do Antigo Testamento, criador deste mundo, fosse identificado com esse “demiurgo mau”, e que se contrapunha ao Deus benigno do Evangelho, que, ao contrario, enviou o Cristo salvador. Cristo é uma entidade divina que veio à terra revestida de um corpo apenas aparente. A interpretação alegórica dos textos sacros permitiria aos gnósticos dobrá-los às suas exigências. e) O sistema gnóstico complica-se particularmente quando tenta explicar a derivação de toda a realidade inteligível da unidade primordial por meio de uma série de “éons” (entidades eternas), que emanam em duplas ( segundo alguns, Cristo seria o último éon), bem como a própria derivação do homem. A propósito disso, o pensamento gnóstico revela-se ainda mais complicado pela presença de narrativas mitológicas e fantásticas de vários gêneros e diversas gêneses. f) A doutrina gnóstica se apresenta como doutrina secreta, revelada por Cristo a poucos discípulos, dirigindo-se especialmente às camadas cultas e refinadas e, portanto, tem caráter aristocrático, em antítese com o autêntico espírito evangélico. O pensamento grego é rico. Desde o século I a filosofia helênica em que se situava os estóicos, os epicuristas, os neopitagóricos, os céticos e os neoplatônicos, dominavam a visão de mundo antigo, distribuída pela cultura greco-romana. Alguns teólogos usavam a filosofia para melhor expressar suas idéias religiosas face ao mundo “pagão”, é obvio que alguns não aceitavam de maneira alguma esse dialogo, a ponto de dizer como Tertuliano: “Que relação tem entre Jerusalém e Atenas?”. Essa critica severa de Tertuliano no século III, fazia parte de uma pequena camada de teólogos que defendiam que o cristianismo deveria manter sua identidade característica, evitando influencias de filósofos gregos que nada conhecia da Igreja da época. O debate foi tenso, podemos dizer que a argumentação mais espessa em defesa do dialogo entre filosofia e teologia foi dada por Agostinho de Hipona (354 – 430). Como mencionamos no tópico anterior, a oficialização do cristianismo como religião do Estado romano possibilitou uma abertura para uma avaliação positiva da cultura clássica. Roma agora era a serva do evangelho, e a teoria desse evangelho precisaria ser convincente para melhor exposição do próprio evangelho.

Justino Mártir (100 – 165) Quem primeiro iniciou esse dialogo foi Justino Mártir (100 – 165), como aponta Paul Tillich em sua obra; Historia do Pensamento Cristão: “Ao falar do cristianismo, dizia: Esta é a única filosofia certa e adequada que encontrei (...) quando Justino dizia que o cristianismo era uma filosofia, precisamos entender o que entendia por filosofia. Nessa época o termo filosofia se referia ao movimento de caráter espiritual oposto a magia e a superstição. Era, pois, natural que Justino se referisse ao cristianismo como a única filosofia certa e adequada, por que não era mágico nem supersticioso”. Na concepção de Justino essa filosofia, que ele chama cristã, era universal, e continha a verdade sobre o significado da existência. Essa verdade foi manifestada no “Logos” que era o fundamento do cristianismo. Sendo assim, Justino expunha sua Téocristologia a partir do “Logos”, não representando Cristo como um completo forasteiro, mas como o cumprimento do melhor do pensamento grego. No século III surge o desafio do neoplatonismo que serviu como influencia para o primeiro sistema teológico elaborado por Orígenes de Alexandria. O que seria neoplatonismo? Em síntese, foi uma corrente filosófica que visava uma revisão do platonismo, foi apresentada por Amonio Saccas e Plotino. Podemos dizer que foi basicamente Platão o grande formador das bases da teologia cristã. Mesmo que o neoplatonismo repense algumas questões filosóficas de Platão, ainda sim toda sua epistemologia é platônica. Por exemplo, Tillich examina cinco elementos fundamentais nessa linha: o primeiro é o conceito de transcendência. As idéias eram para Platão as essências das coisas. Salta-se daí para o mundo idealizado tão apreciado pela religião protestante, por exemplo. Se as idéias e, com elas, a abstração, representam o real, as coisas terrenas perdem seu valor. O segundo elemento destacado por Tillich é, pois, “a desvalorização da existência”. Até hoje a igreja cristã enfrenta problemas relacionados com a compreensão do corpo humano e de seus desejos. O terceiro elemento é a doutrina da “queda da alma da eterna participação no mundo essencial ou espiritual, sua degradação terrena num corpo físico, que procura se livrar da escravidão desse corpo, para finalmente se elevar acima do mundo material”. O quarto elemento é a idéia da providência divina. Tillich nos alerta de que essa idéia recebida ainda hoje pelos cristãos como 9


se tivesse nascida com sua religião, pertencia, na verdade, ao mundo grego antigo e se expressara com clareza nos últimos escritos de Platão. O quinto elemento presente na teologia cristã vem de Aristóteles: “o divino é forma sem matéria, perfeito em si mesmo”. Segundo Tillich, Aristóteles “entendia que Deus, a forma suprema ou ato puro (actus Purus) , como o chamava, move todas as coisas ao ser amado por todas as coisas” e que “a realidade toda deseja se unir à forma suprema, para se livrar das formas inferiores em que vive, na escravidão da matéria”. Esse Deus aristotélico entrou na igreja cristã e exerceu enorme influência principalmente na formulação da teologia medieval. Este último elemento examinaremos com mais pormenores no próximo tópico, onde estaremos apresentando o pensamento da escolástica. A aliança entre teologia e filosofia, como podemos observar, foi feita, porém a filosofia tornou-se religiosa e teológica. O problema que nem Epicuro, Zenão, Platão, Aristóteles e etc, foram cristãos, os teólogos da patrística converteram esses filósofos na evolução da teologia cristã. Submeteram suas filosofias ao julgamento heterônomo das autoridades eclesiásticas e suas reflexões sempre foram policiadas por concílios, sínodos, bispo, autoridades eclesiásticas e pelo Papa. Isso também irá acontecer com os teólogos escolásticos no inicio do século XI. Com tudo isso a uma positividade nessa aliança, a interação criativa da teologia, liturgia e espiritualidades cristãs com a tradição cultural do mundo antigo, sem divida, como aponta Mcgrath “um dos exemplos mais interessantes e férteis de hibridismo cultual da história intelectual da humanidade”. Filósofo cristão e cristão filósofo, como foi acertadamente definido, Justino (nascido em Flávia Neápolis na Samaria, no início do século II) pertence àquela plêiade de pensadores que em cada período da história da Igreja têm tentado uma síntese da provisória sabedoria humana e das inalteráveis afirmações da revelação cristã. “Não temos algum mandamento em Cristo que nos obrigue a crer nas tradições humanas, mas somente naquelas que os bem-aventurados profetas promulgaram, e que Cristo mesmo ensinou, e eu tenho cuidado, de referir todas as coisas às escrituras e pedir a elas os meus argumentos e minhas demonstrações.” (Justino Mártir, em diálogo com Trifão)

“Capítulo XIV. Um apelo de advertência aos gregos” Portanto, é necessário, gregos, que você contemple as coisas que devem ser, e considere o julgamento que é predito por todos, não somente pelos piedosos, mas também por aqueles que são irreligiosos, que vocês não cometam sem investigação se para o erro de vossos pais, nem suponha que, se eles próprios estiveram em erro e vos transmitiram a vossa causa, que aquilo que vos ensinaram é verdadeiro; mas olhando para o perigo de um erro tão terrível, investigue e investigue cuidadosamente as coisas que são, como você diz, mencionadas até pelos seus próprios professores. Pois mesmo a contragosto, eles eram por sua conta forçados a dizer muitas coisas pela consideração divina pela humanidade, especialmente aqueles que estavam no Egito, e lucraram com a piedade de Moisés e seus antepassados.

“Capítulo XV. Testemunho de Orfeu ao monoteísmo” Em todo caso, devemos lembrar-lhe o que Orfeu, que era, como se poderia dizer, seu primeiro professor de politeísmo, ultimamente dirigido a seu filho Musæus, e aos outros auditores legítimos, concernentes ao único Deus.” E ele falou assim: "Eu falo com aqueles que legalmente podem ouvir: Todos os outros, profanos, agora fecham as portas, E, ó musaus! ouça-me a mim Quem é a arte da luz da lua trazendo: As palavras que eu pronuncio agora são verdadeiras; E se você pensou em meus pensamentos anteriores, Não os deixe roubar a vida abençoada,

Mas, em vez disso, volta as profundezas do teu próprio coração Até o lugar onde a luz e o conhecimento habitam. Pegue a palavra divina para guiar seus passos, E andando bem no caminho certo, Olhe para o rei único e universal Um, auto-gerado e único, De quem todas as coisas e nós mesmos somos saltados.

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Todas as coisas estão abertas para o Seu olhar penetrante Enquanto ele mesmo ainda é invisível. Presente em todas as Suas obras, embora ainda invisível, Ele dá aos mortais o mal do bem, Enviando guerras arrepiantes e tristes lacrimosos; E além do grande rei não há nenhum. As nuvens para sempre se estabelecem ao redor do seu trono, E olhos mortais em meros olhos mortais São fracos, para ver Jove reinar sobre todos. Ele se senta estabelecido nos céus de bronze

Ele pisa a terra e estende a mão direita Para todas as extremidades do oceano e ao redor Trema as cadeias montanhosas e os riachos As profundezas também do mar azul e verde. " E novamente, em algum outro lugar ele diz: "Há um Zeus sozinho, um sol, um inferno, Um baco; e em todas as coisas menos um só Deus; Nem de todos estes tão diversos, deixe-me falar ". E quando ele jura ele diz: "Agora eu te conjuro pelo mais alto céu, A obra do grande Deus, o único sábio; E eu te conjuro pela voz do Pai. Que primeiro Ele proferiu quando Ele estabeleceu O mundo inteiro por seu conselho ".

Sobre o seu trono de ouro; sob seus pés

‘O que ele quer dizer com "eu te conjuro pela voz do Pai, que primeiro ele pronunciou?" É a Palavra de Deus que ele aqui nomeia "a voz", pela qual o céu, a terra e toda a criação foram feitos, como as profecias divinas dos homens santos nos ensinam; e estes ele mesmo também prestou alguma atenção no Egito, e entendeu que toda a criação foi feita pela Palavra de Deus; e, portanto, depois que ele diz: "Eu te conjuro pela voz do Pai, a qual primeiro Ele proferiu", ele adiciona isto além disso, "quando pelo Seu conselho Ele estabeleceu o mundo inteiro". Aqui ele chama a palavra "voz", por causa do medidor poético. E isso é assim, é manifesto a partir do fato, que um pouco mais adiante, onde o medidor o permite, ele o chama de "Palavra". Pois ele disse: " Pegue a Palavra divina para guiar seus passos.” ( São Justino, mártir. Discurso do Mártir de Justino aos Gregos)

Orígenes (184-253) Orígenes (184-253) foi aluno de Amônio Saccas e colega de Plotino em Roma. Deu organização e vida à escola catequética de Alexandria, assimiliando os elementos da Paidéia (educação grega) na formação do cristão, segundo o programa proposto por Clemente. Prezava as artes liberais (as 7 ciências básicas da antiguidade: o trivium, que se referia à linguagem, e o quadrivium, que se referia ao conhecimento matemático da natureza) e via nelas uma maneira de o homem se elevar até à filosofia propriamente dita. O modelo axiomático-dedutivo da geometria lhe serviu como parâmetro para construir o conteúdo sistemático da doutrina da fé cristã. No "Perì Archôn" (Dos princípios), Orígenes sistematizou a teologia pela primeira vez, partindo dos princípios da realidade, do conhecimento e da fé, e tirando-lhes as consequências. Orígenes foi também um grande hermeneuta dos escritos sagrados dos cristãos, retomando o método alegórico de interpretação, já iniciado por Filo de Alexandria. Orígenes defendeu a integração entre a investigação da razão e a obediência da fé, diante do racionalismo dos pagãos (como Celso) ou diante do fideísmo dos cristãos (Tertuliano, por exemplo). No "Contra Celso" Orígenes traz à fala a identidade do cristianismo: o cristianismo propõe a excelência da caridade, ali onde o grego põe a excelência da justiça; a redenção como obra da graça sobrenatural na história, ali onde o grego põe a inserção racional na ordem natural do universo; a encarnação de Deus, sua imanência no mundo terreno e seu amor pelos homens, ali onde o grego põe um Deus transcendente, supra-celeste, impessoal e indiferente, amado por todos como fim supremo, mas incapaz ele mesmo de amar; a fé de que a redenção alcança a carne humana e a matéria cósmica, de que essas são, na sua origem, obras da ação criadora de Deus e que serão, no fim, redimidas juntamente com o espírito, ali onde o grego recorre ao espiritualismo que reduz e condena a matéria ao não-ser e à função de origem do mal. Orígenes postulou a liberdade e não a necessidade como o sentido de todas as coisas no universo e na história.  

Na concepção de Orígenes a criação é um ato livre de Deus. A criação procede não da necessidade e sim da liberdade de Deus. 11


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Todos os entes criados são contingentes: são, quando poderiam não ser. “O ser, portanto, não lhes é algo de próprio, mas uma dádiva de Deus” (De Princ. II 9, 2). O motivo da criação de Deus é sua própria bondade. Junto com a contingência, vem também a temporalidade. Todos os seres criados são mutáveis.

Padres latinos Os Padres latinos anteriores a Agostinho foram pouco atraídos, quando não decisivamente hostis, à filosofia grega. Minúcio Félix (?-260), particularmente, condenava a sabedoria grega, acusando-a de ser tão grandiloqüente e pomposa quanto vã, abstrata e superficial. Para ele apenas a doutrina cristã pode ser considerada sabedoria do coração, autêntica e profunda.

Tertuliano (155-220) Para Tertuliano (155-220), Atenas e Jerusalém nada têm em comum: fé em Cristo e Sabedoria humana se contradizem (daqui sua célebre afirmação: credo quia absurdum). Na verdade, a alma é naturaliter christiana e é a cultura filosófica que a afasta da verdade. Tertuliano assumiu, talvez de Sêneca, uma concepção corpórea da realidade e do próprio Deus. “O sangue dos mártires é a semente dos cristãos" “A verdade não enrubesce.” “Mas sois ímpios a tal ponto que procurais a divindade onde não está, que a procurais naqueles que não a possuem. “Um dia, tais coisas foram para nós, também, tema de ridículo. Nós somos de vossa geração e natureza: os homens se tornam, não nascem cristãos!”

Santo Ambrósio (?-397) “Ninguém cura a si próprio ferindo outro”. “Aquele que luta temo que sperar. Onde há luta, há coroa.” “Aquilo que o amor faz, o medo jamais poderá realizar.” “O sábio, para falar, antes medita o que dizer, ou a quem dizer, em que lugar e tempo.” “A natureza criou o direito de comunidade; foi a usurpação que produziu o direito de propriedade.”

Santo Agostinho( 354-430) 12


Foi o maior filósofo da época Patrística, ele defendia a igreja contra os seus adversários pagãos. A vida de Agostinho pode ser dividida em duas partes: Antes da conversão e depois da conversão. De acordo com Jerônimo, seu contemporâneo, Agostinho "restabeleceu a antiga fé". Em seus primeiros anos, Agostinho foi muito influenciado pelo maniqueísmo e, logo depois, pelo neoplatonismo de Plotino. Depois de se converter ao cristianismo e aceitar o batismo (387), Agostinho desenvolveu uma abordagem original à filosofia e teologia, acomodando uma variedade de métodos e perspectivas de uma maneira até então desconhecida. Acreditando que a graça era indispensável para a liberdade humana, ajudou a formular a doutrina do pecado original deu contribuições seminais ao desenvolvimento da doutrina da guerra justa. Quando o Império Romano do Ocidente começou a ruir, Agostinho desenvolveu o conceito de "Igreja Católica" como uma "Cidade de Deus" espiritual (na obra homônima) distinta da cidade terrena e material de mesmo nome. "A Cidade de Deus" estava também intimamente ligada ao segmento da Igreja que aderiu ao conceito da Trindade como postulado pelo Concílio de Niceia e pelo Concílio de Constantinopla.hoje. Na Igreja Católica e na Comunhão Anglicana, Agostinho é venerado como um santo, um proeminente Doutor da Igreja e o patrono dos agostinianos. Sua festa é celebrada no dia de sua morte, 28 de agosto. Muitos protestantes, especialmente os calvinistas, consideram Agostinho como um dos "pais teológicos" da Reforma Protestante por causa de suas doutrinas sobre a salvação e graça divina. Agostinho defendia a ideia de que a Fé e a Razão não sobrevivem sem uma à outra, pois até esse momento o mundo era dividido entre a razão (Filosofia) e a Fé (Igreja). Ele defendia que você não pode ter Fé sem Compreender algo, e não pode Compreender algo sem ter Fé. Agostinho também acreditava na inexistência de um mal, onde só o bem existe. Uma vez que, o mal é constituído pela falta do bem, um exemplo prático seria da luz e da escuridão, na verdade a escuridão não existe, existe é a falta de luz que traz a escuridão. Com essa afirmação podemos compreender que uma pessoa não é maligna por possuir algum mal, mas sim por não possuir o bem. A amizade é um dos elementos mais importantes para descobrir a presença de Deus, entre nós. “O ser amigo nos funde na amizade do ser; os amigos são uma só alma.” “Não existe verdadeira amizade senão entre aqueles que Deus une pela caridade.” “A amizade é uma experiência do absoluto de Deus.” “Podemos e devemos descobrir Deus no espelho da amizade.” “A suspeita é o veneno da amizade.” “Podemos chamar o outro de amigo quando confiamos a ele nossas idéias” “A castidade desabrocha na amizade.”

O problema do Mal em Santo Agostinho Uma das questões que mais intriga o homem é sobre o problema do mal, pois este vai exatamente contra aquilo que o homem mais deseja: a felicidade. Afinal, se o homem, em sua dimensão teleológica, busca a felicidade, por que o mal existe? Santo Agostinho particularmente se inquietava com estas questões. Ele “não tinha idéia clara e nítida da causa do mal”. É interessante lembrar que ele, antes de ser cristão, foi um maniqueísta e o maniqueísmo defendia que havia dois princípios opostos: um deus

bom e outro mal e que, portanto o mal era uma substância. Somente depois, Agostinho vai encontrar uma solução para o problema do mal. Em suas obras O Livre Arbítrio e Confissões Agostinho tenta provar de forma filosófica que Deus não é o criador do mal. Pois, para ele, tornava-se inconcebível o fato de que um ser tão bom pudesse ter criado o mal. Desta forma, o mal é a privação do bem, e não uma entidade em si mesma, já que não é positivo, assim como a cegueira é a privação de 13


luz. O mal também se assemelha às sombras escuras de uma pintura, que não são atrativas, mas que, consideradas como um todo contribuem para a beleza. Portanto, o mal consiste em: Privação e Falta de Percepção. Essa atitude para com o mal surgiu na tentativa de explicar como o mal pode existir em um mundo governado por um Deus todo-bom e todopoderoso.

A concepção que Agostinho tem do mal, está baseada na teoria platônica, assim o mal não é um ser, mas sim a ausência de um outro ser, o bem. O mal é aquilo que “sobraria” quando não existe mais a presença do bem. Deus seria a completa personificação deste bem, portanto não poderia ter criado o mal.

DEUS É O BEM Para Agostinho Deus é o Bem, neste tópico ele aborda um pouco do corruptível e incorruptível que será distinguido no final deste trabalho, pois tanto o que é corruptível e o que é incorruptível estão relacionados ao problema do mal devido as suas substâncias (existência) ou não-substância (nãoexistência). Assim me esforçava por encontrar as outras verdades, do mesmo modo que já tinha descoberto ser melhor o incorruptível que o corruptível. Por conseguinte, confessava que Vós, quem quer que fôsseis, não estáveis sujeito à corrupção. Jamais alma alguma pôde ou poderá conceber alguma coisa melhor do que Vós — sumo e ótimo Bem. (Agostinho, 1980, p. 143) • O conhecer tende à verdade e a verdade se identifica com Deus; a conseqüência é que a maior parte das demonstrações agostinianas da existência de Deus são demonstrações da existência da verdade. Como é possível que nós formemos conceitos imutáveis, se tudo está em devir? Não é talvez porque existem verdades imutáveis que determinam o conhecer, e são para nós critério de julgamento? Agostinho, todavia, não aceita in Toto a gnosiologia platônica, mas recusa sua teoria da reminiscência, substituindo-a com a da iluminação: Deus, como na criação nos torna participantes do ser, também nos torna participantes da verdade sendo ele próprio a fonte da verdade. • A essa prova de existência de Deus como Verdade se acrescentam outras, sem duvida retomadas pela bagagem da teologia clássica: a que da perfeição do mundo remonta ao seu Artífice divino; a baseada sobre o consensus gentium (acordo do povo); a ex gradibus, ou seja, que remonta dos diversos graus de bem presentes no mundo ao Bem em si. • Dessas provas deriva uma concepção de Deus entendido como Ser, Verdade, Bem em forma absolutamente eminente, que se pode exprimir tanto nas formas da teologia negativa, quanto na atribuição a ele de tudo o que existe de positivo no criado, sem os limites do negativo.

• A concepção filosófica de Deus deve ser integrada com o problema teológico por excelência do cristianismo, ou seja, o Dogma da Trindade. Agostinho afirmou a identidade substancial das Três Pessoas. Isso significa que Deus, em sentido absoluto, é tanto o Pai como o Filho e como o Espírito Santo, e que eles são inseparáveis no ser e operam inseparavelmente. Todavia, essas Três Pessoas são distintas, não do ponto de vista da substância, mas do da relação, pelo que o Pai tem o Filho, mas não é o Filho, e o Filho tem o Pai, mas não é o Pai, e o mesmo vale para o Espírito Santo. “Era este o ser incorruptível, indeteriorável, imutável, que antepunha ao que é corruptível sujeito à deterioração e à mudança.” (Agostinho, 1980, p. 140) Um fato ocorrido na vida de Santo Agostinho ilustra bem a respeito dos mistérios de Deus. A história diz que “certo dia, Santo Agostinho, após longo período de trabalho e muito compenetrado na sua angústia, adormeceu no claustro. Teve um sonho revelador: caminhava sobre uma praia deserta, a contemplar o mar e o céu. De repente, avistou um menino que com uma vasilha de madeira indo até a água do mar, enchia a vasilha e voltava, despejando a água num pequenino buraco na areia. Santo Agostinho, perplexo e curioso perguntou ao menino: O que você está fazendo? O menino calmamente olhou para Santo Agostinho e respondeu: Vou colocar toda água do mar neste buraco! Santo Agostinho sorriu e retrucou: Isso é impossível menino, observe quanta água existe no oceano e você quer colocá-la toda neste pequeno buraco! Mais uma vez o menino olhou para Santo Agostinho e de forma firme e corajosa disse: Em verdade vos digo. É mais fácil colocar toda água do oceano neste pequeno buraco do que a inteligência humana compreender os mistérios de Deus!” E num átimo Santo Agostinho acordou. Assustado e desorientado. Acabara de ter uma mensagem divina que acalmaria sua alma conturbada. 14


A SOLUÇÃO DO PROBLEMA DO MAL NA INTERPRETAÇÃO DE AGOSTINHO Ao grande problema do mal, conseguiu Agostinho apresentar uma explicação que se tornou ponto de referência durante séculos e ainda hoje conserva a sua validade. Se tudo provém de Deus, que é o Bem, de onde provém o mal? Depois de ter sido vítima da explicação dualista maniqueísta, que demonstrava o bem como um ser equivalente ao

mal. Ele encontra em Plotino a chave para resolver a questão: o mal não é um ser, mas deficiência e privação de ser. Assim ele aprofunda ainda mais a questão e examina o problema do mal em três níveis: O Mal Metafísico-ontológico; o Mal Moral; e o Mal Físico.

O MAL METAFÍSICO-ONTOLÓGICO O mal metafísico-ontológico está relacionado à hierarquização da criação dos seres por Deus, pois do ponto de vista metafísico-ontológico, não existe mal no cosmos, mas apenas graus inferiores de seres em relação a Deus, graus esses que dependem da finitude do ser criado e dos diferentes níveis dessa finitude. Mas mesmo aquilo que, numa consideração superficial, parece “defeito” e, portanto, poderia parecer mal; na realidade, na ótica do universo, visto em seu conjunto, desaparece. As coisas, as mais ínfimas, revelam-se momentos articulados de um grande conjunto harmônico. Demonstrando que os graus de criação das coisas, a ordem hierárquica e

conseqüentemente o mal metafísico-ontológico não é o verdadeiro mal, mas apenas uma diferença gradual nos seres criados, diferença que os faz serem harmônicos no cosmos. A ordem hierárquica dos seres é considerada um mal devido a possibilidade do homem, pela sua vontade, escolher as criaturas em detrimento do Ser Supremo, o criador; mas ainda assim este não é o mal em si, pois Deus como criador de todas as coisas (substâncias) não pode ter criado o mal. Mas chama-se mal metafísico-ontológico por ser o cumprimento do mal em si, do verdadeiro mal; o mal moral, que será abordado logo abaixo.

O MAL MORAL Antes de abordar o mal moral, deve-se saber que para Agostinho o livre-arbítrio não tem o mesmo sentido nos dias atuais, pois ele acreditava na predestinação. Ocorre que o livre-arbítrio é algo dado aos seres humanos por Deus, ou seja, é predeterminado, porém o mau uso desse livrearbítrio não está na vontade de Deus, mas na vontade do homem. Existe uma linha tênue que separa o livre-arbítrio da vontade, pois o livre-arbítrio implica predestinação por Deus, liberdade posta no homem para cumprir sua própria vontade, e vontade está relacionada à ação moral do homem diante de sua liberdade predestinada. Desta forma, o mal moral consiste no mau uso do livre-arbítrio dado por Deus, todo ser enquanto ser é bom, pois todo ele foi criado por Deus; o mal moral reside na própria vontade do homem que pelo fato de ter o livre-arbítrio escolhe desordenadamente

algum bem. Assim o mal não vem de Deus, mas do próprio homem em sua desordenada vontade. O mal moral é o pecado e depende da nossa má vontade. E a má vontade não tem “causa eficiente” (criadora, formadora), e sim muito mais, “causa deficiente”. Por sua natureza, a vontade deveria tender para o Bem supremo. Pois o livre-arbítrio foi posto no homem para esse fim (telos). Mas, como existem muitos bens criados e finitos, a vontade pode vir a tender a eles e, subvertendo a ordem hierárquica (mal metafísico-ontológico), preferir a criatura a Deus, optando por bens inferiores, em vez dos bens superiores. Sendo assim, o mal deriva do fato de que não há um único bem, mas muitos bens, consistindo precisamente o pecado na escolha incorreta entre esses bens. O mal moral, portanto, é “aversio a Deo” e “conversio ad creaturam”. O fato de se ter recebido de Deus uma vontade livre é para nós, grande bem. O mal é o mau uso desse grande bem.

O MAL FÍSICO Como explana Reale e Antiseri, “O mal físico, como as doenças, os sofrimentos e a morte, tem significado bem preciso para quem reflete na fé: é a conseqüência do pecado original, ou seja, é

conseqüência do mal moral. A corrupção do corpo que pesa sobre a alma não é a causa, mas a pena do primeiro pecado.” (pp. 455 e 456) 15


O mal físico, da mesma forma que o mal metafísico-ontológico, não é o mal em si, mas apenas a conseqüência do mal moral. Pode-se dizer que o mal metafísico-ontológico é o que insinua a má vontade do homem para cometer assim o mal moral e que o mal físico é a conseqüência do cumprimento dessa insinuação. Porém ambos, o mal metafísico e

o mal físico não são o mal em si, o mal moral o é. Apesar de ter-se dito várias vezes em um mal em si, é apenas no sentido de diferenciar o três tipos de mal, pois o mal não pode ser em si, por não ser substância, essa questão será abordada mais a frente.

O MAL É UM SER PARA OS MANIQUEÍSTAS O propósito de abordar o maniqueísmo é que Agostinho foi durante um tempo de sua vida m maniqueu, justamente para tentar resolver sua angústia em relação a existência do mal. Mas se insurgiu veementemente contra seus antigos colegas maniqueus, por declararem que o mal era um ser, doutrina negada por Agostinho. Assim o maniqueísmo é uma filosofia religiosa sincrética e dualística que divide o mundo entre Bem, ou Deus, e Mal, ou o Diabo. A matéria é intrinsecamente má, e o espírito, intrinsecamente bom. Com a popularização do termo, maniqueísta passou a ser um adjetivo para toda doutrina fundada nos dois princípios opostos do Bem e do Mal.

Para os maniqueístas, havia duas divindades supremas a presidir o universo: O princípio do Bem, (A Luz); o princípio do Mal (As Trevas). Como conseqüência moral, afirmavam ter o homem duas almas, cada uma presidida por um desses dois princípios. Logo, o mal é metafísico e ontológico. “A pessoa não é livre nem responsável pelo mal que faz. Este lhe é imposto.” (OLIVEIRA, 2008, p. 15) Desta forma, o mal maniqueísta era uma divindade (ser), mas para Agostinho não poderia ser, pois o único ser é Deus e as coisas criadas por ele que são boas, sendo Deus é o próprio Bem.

DISTINÇÃO DO MAL METAFÍSICO – MANIQUEÍSTA E AGOSTINIANO Se para os maniqueístas a pessoa não era livre nem responsável pelo mal que fazia, mas isso era uma ação de uma das suas duas almas, pode-se concluir que o mal não era responsabilidade humana e que desta forma não existia um mal moral (que para Agostinho é o verdadeiro mal), assim o mal era tido como uma influência da divindade má e portanto era um mal metafísico-ontológico, metafísico por ser uma divindade e ontológico por existir (ser) enquanto tal. Lembre-se que Agostinho explana o mal metafísico-ontológico em outro sentido, metafísico enquanto Deus (Bem) e ontológico em relação aos seres criados por Deus e que isso apesar de parecer mal não era o próprio mal, mas a própria harmonia do cosmos. Desta forma para os maniqueístas existia um ser mal. Por isso eles criam em duas almas, uma boa e uma má e Agostinho em uma alma boa, mas para Agostinho o mal metafísico não podia ser, ou seja, era um não-ser, não era a existência de uma entidade criadora má, pois o único criador é Deus e Deus é o Bem. Mas, então, qual será a causa do mal? Após estabelecer estas dimensões do mal é importante ver qual é sua causa, já que, se Deus fez

tudo bom, e Ele é o próprio Bem, não poderia haver razão para o mal existir. Deixemos que o próprio Santo Agostinho nos diga: “Procurei o que era a maldade e não encontrei uma substância, mas sim uma perversão da vontade desviada da substância suprema […]” (Agostinho, 1980, p. 156) “O pecado, está no abuso da liberdade, mas esta é um bem.” (Agostinho, 1980) A má vontade é, por conseguinte, a causa eficiente de toda obra má, porém nada é causa eficiente da má vontade. Pois quando a vontade, abandonando o superior, se converte às coisas inferiores, torna-se má, não por ser mal o objeto a que se converte, mas por ser má a própria conversão. Portanto, não é causa da vontade má o ser inferior, ela é que é a sua própria causa, por haver apetecido mal e desordenadamente o ser inferior Mas de novo refletia: Quem me criou? Não foi o meu Deus, que é bom, e é também a mesma bondade? Donde me veio, então, o querer eu o mal e não querer o bem? Seria para que houvesse motivo de eu justamente ser castigado? Quem 16


colocou em mim e quem semeou em mim este viveiro de amarguras, sendo eu inteira criação do meu Deus tão amoroso? Se foi o demônio quem me criou, donde é que veio ele? E se, por uma decisão de sua vontade perversa, se transformou de anjo bom em demônio, qual é a origem daquela vontade má com que se mudou em diabo, tendo sido criado anjo perfeito por um Criador tão bom? (Agostinho, 1980, pp. 142 e 143) Agostinho nesta reflexão demonstra que se o próprio demônio (ser mal dos maniqueístas) também

tem uma parcela na criação da sua alma, como então, partindo do pressuposto que Deus criou todas as coisas boas, o demônio se transformou de anjo bom em um ser mal? Ele responde em seu próprio questionamento: “por uma decisão de sua vontade perversa” o que nos faz entender que o mal é moral pelo mau uso da liberdade ou livre-arbítrio, e não uma substância má como causa eficiente de si mesma.

AGOSTINHO – O MAL NÃO É UM SER Agostinho demonstra que Deus, sendo o Bem, é uma substância; e que o mal, sendo a corrupção, não pode de modo algum afetar esta substância por ser ela incorruptível, pois nem pela vontade é ela afetada porque todo o desejo de Deus é bom, não estando sujeito ao mal. Ocorre que diante da sua incorruptibilidade não pode Deus desejar o corruptível. Portanto, logo que vi que o incorruptível se deve preferir ao corruptível, imediatamente Vos deveria ter buscado, e, em seguida, deveria indagar donde vem o mal, isto é, a corrupção, a qual de modo algum pode afetar a vossa substância. É absolutamente certo que de modo nenhum pode a corrupção alterar o nosso Deus, por meio de qualquer vontade, de qualquer necessidade ou de qualquer acontecimento imprevisto, porque Ele é o próprio Deus, porque tudo o que deseja é bom e Ele próprio é o mesmo Bem. Ora, estar sujeito à corrupção não é um bem. (Agostinho, 1980, p. 143) Diante da corrupção do mal, é abordado por Agostinho, que nada pode existir se não estiver

vinculado, conectado a Deus (Bem), pois se as coisas fossem inteiramente privadas do bem, simplesmente deixariam de existir, ou seja, o mal seria possível, não como existência, mas como a própria não-existência por falta de substância, que neste caso é Deus. Examinei todas as outras coisas que estão abaixo de Vós e vi que nem existem absolutamente, nem totalmente deixam de existir. Por um lado existem, pois provêm de Vós; por outro não existem, pois não são aquilo que Vós sois. Ora, só existe verdadeiramente o que permanece imutável. Por isso, “para mim é bom prender-me a Deus”, porque, se não permanecer n’Ele, também não poderei continuar em mim. Se, porém, fossem privadas de todo o bem, deixariam inteiramente de existir. (Agostinho, 1980, p. 153) Desta forma o mal não é substância alguma, pois não está conectado a Deus, que a tudo faz permanecer como substância, assim o mal “é” um não-ser.

A liberdade para Santo Agostinho Santo Agostinho distingue, pois, o conceito de liberdade do conceito de livre-arbítrio. A liberdade "liberta", no sentido de que o ser humano se vê afastado do pecado, vivendo na graça divina, em oposição à escravidão, que consiste no atendimento das paixões. Já o livre-arbítrio é liberdade por excelência, porque é do seu exercício que o ser humano pode escolher em seguir uma vida reta ou pecaminosa. O ser humano tem uma vida reta ou pecaminosa segundo a sua vontade livre. Não se trata, pois, de uma necessidade natural, isto é, da impossibilidade de pecar ou não pecar. Por isso, só faria sentido falar em livre-arbítrio quando coubesse única e exclusivamente ao ser humano decidir, a cada momento, que caminho tomar. Seria totalmente aleatório e imprevisível saber se o ser humano vai ou não-pecar. E se o livrearbítrio é um dom de Deus,

nem Ele pode interferir nessa escolha. O máximo que pode fazer é esperar que o ser humano O busque. Por outro lado, a onisciência divina significa que Ele sabe de tudo que ocorreu no passado, neste exato instante e no futuro. Disso surge o problema: para que Deus saiba o futuro, Ele necessariamente sabe se o ser humano vai ou não-pecar a cada momento. A presciência implica a predestinação. Neste caso, Deus escolhe primeiro os seus eleitos e depois lhes dá os meios para corresponderem a essa eleição. Santo Agostinho amplia a idéia de causa para justificar a existência do livre-arbítrio. Afirma que não existe apenas a causa eficiente dos gregos - relação de causalidade. Existem, ainda, outras causas, como a causa fortuita e a causa voluntária. A vontade divina, dos anjos e demônios, e a dos seres humanos, seriam causas voluntárias. Para ele, a 17


vontade é a causa da ação humana e Deus conhece todas as causas, isto é, conhece previamente a vontade humana. (Agostinho, 1990, p. 202) Assim, Deus é capaz de prever a vontade humana, porque prever não significa forçar o ser humano a ter uma determinada vontade em detrimento de outra. A saída para esse dilema está quando Santo Agostinho afirma que a onisciência de Deus significa que Deus não pode se enganar. Logo, Deus é capaz de saber se o ser humano realmente pecou ou-não, porque Ele sabe aquilo que depende da vontade do ser humano. Santo Agostinho usa a justiça como uma conseqüência do pecado, o que justifica a responsabilização do ser humano pelos abusos que cometeu no exercício de seu livre-arbítrio. Esta responsabilização consiste em suportar as

conseqüências que desse abuso seguem, em face da lei eterna. A justiça, no sentido de dar a cada um o que é seu, tem uma faceta divina, e ser justo é uma das qualidades de Deus. Ele pune quem não segue os seus preceitos. Caso não fosse assim, de nada adiantaria fazer um bom uso do livre-arbítrio e a lei eterna, que prescreve ser melhor a retidão em detrimento do pecado, ficaria invertida, porque a recompensa dos maus seria a própria ausência de punição. No entanto. Santo Agostinho questiona a justiça divina em A Cidade de Deus, pois na queda do Império romano do Ocidente, houve quem atribuísse essa queda ao Cristianismo. Como o Império romano havia adotado o cristianismo como religião oficial, muitos dos males por que passaram, não deveriam ter acontecido!

O PROBLEMA MENTE-CORPO O mundo físico e o espiritual Santo Agostinho, particularmente em suas primeiras obras, enfatiza o contraste entre o espiritual e o físico. Ele tenta persuadir o leitor a se conscientizar que é no âmbito espiritual que se encontra o que se procura no âmbito físico. Isto é, o mundo físico está sujeito ao tempo; já o âmbito espiritual é caracterizado pela eternidade. Em tal âmbito atemporal, não há o risco de perdermos o que ou quem amamos. Segundo Santo Agostinho, esse âmbito espiritual, no qual Deus é a fonte, é a única garantia de alivio duradouro da ansiedade provocada pela natureza transitória do âmbito físico. Segundo os ensinamentos de Santo Agostinho, os conceitos de físico e espiritual são centrais para a resolução do problema do mal. Ele ensina que o mundo físico não é mau e não deveria ser considerado como tal e que o problema que aflige nossa condição como seres humanos não é que estamos presos em um mundo físico, mas que percebemos apenas o material e não estamos

cientes que tal mundo representa apenas uma pequena parte de toda a realidade. Há, portanto, um problema de percepção e vontade. Esse é o erro que Agostinho atribuiu ao pecado original, cometido por Adão. Para Santo Agostinho, os seres humanos têm a tendência de focar apenas no mundo físico, considerando-o o âmbito em que todas as questões morais devem ser resolvidas. Segundo o filósofo, o mundo físico não é por si só um âmbito de perigo moral, mas pode vir a ser se o homem não perceber que representa apenas parte de algo muito maior. O mundo físico se torna um âmbito de perigo moral quando nossas vontades são voltadas para as coisas transitórias. De acordo com Santo Agostinho, tais vontades necessariamente levam à ansiedade. Santo Agostinho ensinava que as pessoas deveriam buscar o âmbito espiritual: deveriam se ligar a Deus – o que as realinharia ao relacionamento moral com o mundo físico. Ele ensinava que o homem deveria apreciar as benesses do mundo físico, mas direcionar sua atenção ao mundo espiritual.

A alma Santo Agostinho acreditava que o ser humano é composto por um corpo e uma alma. Por ser uma entidade espiritual, a alma é superior ao corpo. Portanto, cabe à alma reinar sobre o corpo. Ao lidar com a questão da alma, Santo Agostinho tenta demonstrar que a alma humana, e não Deus, é responsável pela existência do mal moral no mundo. Santo Agostinho acreditava que estar vivo significa ter uma alma, e que a morte é o processo que leva à ausência da alma. Portanto, não apenas

os seres humanos possuem uma alma, mas as plantas e os animais também. Agostinho acreditava que há categorias de corpos e almas e que uma compreensão correta a respeito da alma é necessária para compreender nossa posição moral no mundo. Santo Agostinho apresenta a hierarquia das coisas. Primeiro, há as coisas que meramente existem. Segundo, há as coisas que existem e 18


vivem. Terceiro, há as coisas que existem, vivem e possuem compreensão. A visão de Santo Agostinho se assemelha à de Platão e Aristóteles. Esses filósofos discutem os diferentes níveis de alma em termos de graus de complexidade de suas capacidades. Por exemplo, há almas que têm a capacidade apenas de se alimentar e se reproduzir. Há almas que também são capazes de sentir e de se locomover. Finalmente, há almas que são capazes de pensar racionalmente. A diferença entre a Filosofia Clássica grega e a visão de Santo Agostinho é que nem todos os filósofos clássicos gregos concordavam que a alma continuava a existir após a decomposição do corpo. Santo Agostinho tinha interesse em demonstrar que a alma pode encontrar felicidade ao se desligar de uma relação demasiadamente ligada ao mundo físico. A alma, para Santo Agostinho, “tiene uma naturaleza propria” (Ep., 166, 2, 4), ou seja, é uma criatura, portanto, é mutável por ser criatura (De Trin., IV, 1, 3) e não eterna por ser mutável (De Trin., IV, 18, 24). Não obstante, mesmo não sendo eterna, é imortal (De Trin., II, 9, 15). Sua substância é espiritual, e por isso é invisível (De Trin., II, 8, 14). Apesar da mutabilidade da alma, a sua queda, ou uma sua imperfeição – qualquer que seja – não a fez nem fará perder sua condição incorpórea; o que significa dizer que, para Santo Agostinho, sempre a alma será superior ao corpo, pois nem com as modificações deste ela perderá sua natureza (De lib. arb., III, 5, 16; 9, 28). O espírito, ou como Santo Agostinho mesmo escreveu, a inteligência, é incorpórea, isto é, não faz parte daquilo que acreditava serem os quatro elementos formadores do mundo corpóreo: água, ar, fogo e terra. Acrescente-se a isto ser “a inteligência humana, [a] essência da alma racional, [e] com certeza incorpórea” (De civ. Dei, VIII, 5). Nisto, suas comprovações se angariaram, quase sempre, na demonstração de que as atividades anímicas são irredutíveis à extensão (REINARES, 2004). Importa considerar que, no pensamento agostiniano, a alma possuía uma faculdade que tinha como papel ser o seu “ventre”, a saber: a memória. Por extensão, os sentimentos seriam os seus alimentos (Conf., X, 14, 21). A partir daí, Santo Agostinho afirmou que o homem possuía duas memórias, uma sensitiva, conservadora do objeto perdido, e uma intelectual, portadora da idéia (SANTOS; PINA, 1999). Logo, segundo a filosofia agostiniana, é na memória que o homem se encontra, memória na qual estão contidos céu e terra conforme os tenha armazenado pela percepção, não caindo no esquecimento (Conf., X, 8, 14). A exemplo do pensamento clássico, em que o homem era constituído de duas partes, alma e corpo, Santo Agostinho, ao compará-las, atribuiu à primeira importância maior, tendo em vista estar presente no corpo inteiro: A alma manda ao corpo, e

este imediatamente lhe obedece; a alma dá uma ordem a si mesma, e resiste! Ordena a alma à mão que se mova, e é tão grande a facilidade, que o mandado mal se distingue da execução. E alma é alma, e a mão é o corpo! A alma ordena que a alma queira; e, sendo a mesma alma, não obedece (Conf., VIII, 9, 21). Destarte, pela ação vivificante e norteadora do corpo [“... este corpo é animado por uma alma racional” (De Trin., III, 2, 8)], a alma deve estar presente no todo corpóreo: En efecto, se extiende por todo el cuerpo que anima, pero no por difusión local, sino por atención vital; está entera en todas las partículas del cuerpo, no es menor en las menores ni mayor en las mayores; en ciertas partes está más atenta y en otras lo está menos, pero en todas y cada una de ellas está entera (Ep., 166, 2, 4). Nesta sua definição de homem (spiritus, anima, corpus), demonstrou seu interesse pela definição dada pelos filósofos da Antigüidade Clássica [“Y nos interesa mucho saber que el hombre fue definido por los antiguos sabios...” (De ord., II, 11, 31)], o que o levou a confirmá-la, isto é: o homem é um animal mortal de natureza intelectual, homo est animal rationale mortale. Ao se investigarem as inúmeras obras (se não todas) em que Santo Agostinho se preocupou em definir o que é o homem, fica evidente que, apesar de haver uma diferença entre seus primeiros escritos-diálogos – de sabor predominantemente platônico – e seus tratados da maturidade – cujo teor e inspiração centram-se, sobretudo, nos textos sagrados do cristianismo –, nunca deixou escapar na sua obra aquela sentença aristotélica do homem como animal racional e mortal (FRAILE, 1966. ARTEAGA NATIVIDAD, 1993). Não obstante, atribuiu-lhe uma faculdade nova, especifica de seu pensamento, a saber: o homem possui o livre arbítrio (De civ. Dei, XXII, 1, 2). Mesmo que a alma, por natureza, não seja independente de seu Criador, poderia até contrariá-lo (pelo dito pecado), mas, sob certa pena a pagar (De nat. Boni, 35). Importa considerar que, para Santo Agostinho, uma das diferenças entre alma e corpo é que a primeira é esteticamente definida como mais simples que o segundo, portanto, melhor. Isso não significa dizer que a alma não seja um elemento de natureza de características múltiplas, ou - como definiu mutável; o que fundamenta a diferença entre o homem/criatura e o Criador, conceituado como simples, isto é, imutável (De Trin., VI, 6, 8). A alma, que no seu tratado sobre A Trindade apresentou como denominadora do próprio homem, [“... denominando o conjunto pela parte mais nobre, ou seja, a alma, abrangendo o corpo e a alma o homem todo” (VII, 4, 7)], possuía três características expressivas: a racionalidade, imagem de Deus e a imortalidade. Uma expressiva particularidade da alma apontada por Santo Agostinho foi a sua racionalidade, que separava o homem das coisas existentes, sobretudo dos outros animais. Em face 19


disso, a posse da alma racional era privilégio humano. E, certamente, uma grande coisa é o homem, pois feito à imagem e semelhança de Deus! Não é grande coisa enquanto encarnado num corpo mortal, mas sim enquanto é superior aos animais pela excelência da alma racional (De doc. christ., I, 22, 20). Mesmo que a razão seja passível de mutação “Não é o suplício que faz o mártir, mas a causa.” “A esperança tem duas filhas lindas, a indignação e a coragem; a indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las.” “Ninguém faz bem o que faz contra a vontade, mesmo que seja bom o que faz.”

“Ama e faz o que quiseres. Se calares, calarás com amor; se gritares, gritarás com amor; se corrigires, corrigirás com amor; se perdoares, perdoarás com amor. Se tiveres o amor enraizado em ti, nenhuma coisa senão o amor serão os teus frutos”. “O dom da fala foi concedido aos homens não para que eles enganassem uns aos outros, mas sim para que expressassem seus pensamentos uns aos outros.” “Com o coração se pede. Com o coração se procura. Com o coração se bate e é com o coração que a porta se abre.”

Filosofia da Escolástica

As Artes Liberais

Nesse período(séc. IX ao séc. XV): ocorreu uma retomada de muitos princípios filosóficos gregos. A grande preocupação da igreja era aliar a razão e a ciência aos ideais da igreja católica. Nesse contexto, surgiu a teologia que foi uma ciência que buscava explicar racionalmente a existência de Deus, da alma, do céu e inferno e as relações entre homem, razão e fé. O pensamento denominado de “escolástica” acontece no período medieval. Enquanto que o período Patristico concentrou-se em torno do mundo mediterrâneo tendo como centros de poder Roma e Constantinopla, a escolástica expandiu por “toda” Europa tendo como centros de debates: Inglaterra, Itália, França, Alemanha, Suíça e Espanha. È preciso ter conhecimento que definir períodos históricos é extremante complexo. Definir datas e marcar períodos definitivos pode ser algo difícil, até por que o movimento denominado de “escolástica” pendura até o século XVII na Europa ocidental, por isso teremos cuidado em definir com exatidão quando inicia e termina tal acontecimento, porém podemos encontrar nos séculos, datas, o auge desse período citando seus principais

prenunciadores como Anselmo de Cantuária (1033 – 1109), Tomás de Aquino (1225-74) e Duns Scotus (1265 – 1308). Mas o período da escolástica acontece na Idade Medieval que provavelmente se inicia no ano 600 e, para alguns historiados se encerra no século XVI, para outros como Jacques Le Goff especialista em Idade Média, declara seu fim no século XVIII. Conquanto podemos considerar que a Idade Media que protagonizou a escolástica tendo na situação do mundo por volta do ano 1000 uma diversidade da Europa. Antes disso, alguns acontecimentos fizeram com que a Europa se pintasse ou repintasse por políticas, economias, e sociabilidades diferentes daqueles que figuravam o século IV. Com o desmoronamento do Império Romano por volta do século V, grande mudanças ocorreram entre o Oriente Médio e o mundo ocidental europeu. O Império Romano do Oriente transformou-se no Império Bizantino, numa fusão entre as culturas romana, grega e oriental. Os árabes unificaram-se política e religiosamente através do islamismo maometano, e iniciaram sua expansão pelo Oriente Médio a partir do século VII, enquanto os povos 20


germânicos da Europa Ocidental prevaleciam no cristianismo. Nessa derrocada do Império Romano, provocou sem nenhuma duvida, uma enorme desorganização política e econômica no mundo ocidental que possibilitou a ascensão de outras culturas como a Islâmica, quanto o cristianismo ortodoxo dos bizantinos. Alguns historiados apontam do século V ao X uma “Alta Idade Media” e do século X ao XIV uma “Baixa Idade Media”, mas isso é somente para melhor compreensão do leitor, as vezes dividir os acontecimentos por períodos torna-se pedagógico. O mundo por volta do ano 1000 pode-se ser distinguido por quatro grandes focos de civilização: a Europa ocidental e central, o Império bizantino, o mundo mulçumano, e finalmente, a Índia, a China e o Japão. A Europa Ocidental, principalmente em regiões como França, a Alemanha, os Países Baixos e o norte da Itália tinha um cristianismo centralizado na cidade de Roma e seu bispo conhecido como o “Papa”, motivo também de grande disputa papais a pondo de houver um cisma entre aqueles que baseava o papa de Roma e outro, na cidade de Avignon, e em 1054 o cristianismo do Oriente de separou-se do cristianismo ocidental, Igreja Católica Romana rompe com a Igreja Ortodoxa Grega. No período medieval as realidades políticas, econômicas, sociais e religiosas são completamente diferentes do período denominado de Antigo. Houve, na Idade Media uma descentralização política e um enfraquecimento do poder dos reis. O Estado fragmentou-se em uma serie de pequenas soberanias locais. Com a economia feudal os proprietários feudais exerciam em seus domínios todas as funções de governo. Não podemos esquecer que a sociedade medieval foi formada por três classes sociais: os nobres, que combatiam, os sacerdotes (clero) que mandavam e enchiam sua barrigas da melhor comida, e por fim os camponeses (servos) que eram os trabalhadores. A igreja influía poderosamente nessa sociedade, principalmente após a conversão dos povos bárbaros ao cristianismo. Fazendo uma analise econômica da historia ocidental o historiador Leo Hoberman em sua clássica obra “Historia da riqueza do homem” no

primeiro capitulo; Sacerdotes, Guerreiros e Trabalhadores nos apresenta uma excelente leitura das influências e posses que a Igreja tinha e ortogava na idade media: “A Igreja foi a maior proprietária de terras no período feudal (...) A medida que a Igreja crescia enormemente em riqueza, sua economia apresentava tendências a superar sua importância espiritual (...) O clero e a nobreza constituíam as classes governantes. Controlavam a terra e o poder que delas provinha. A igreja prestava ajuda espiritual, enquanto a nobreza, proteção militar. Em troca exigiam pagamento das classes trabalhadoras, sob a forma de cultivo de terras” Como podemos observar a Igreja foi uma das maiores instituições do feudalismo, com estreitas relações com o poder político do senhor feudal e do Rei. Com sua justificativa e ideologia de construção de um mundo sobeseu poderio, teocêntrico tendo Deus a partir dela mesmo (a Igreja) a ordem era posta, sujeitando os trabalhadores em sua função e obediência. Não se espantem a escolástica surge nesse período. Tratando da educação medieval, o ensino era ministrado nos conventos, mosteiros e catedrais, No século XI, surgiram as Universidades, nas quais existiam quatro cursos: Artes, Medicina, Direito e Teologia. Sendo que o idioma predominante na literatura medieval era o latim. Nesse período a teologia concentrou-se na grande catedral e nas universidades de Paris e de outros locais, tendo como base, em grande parte, os escritos em latim de Agostinho de Hipona e Ambrosio. Entretanto com tais mudanças, tanto na economia, política, social, religiosa e cultural os teólogos cristãos ocidentais tem uma nova preocupação; “em estabelecer a teologia cristã sobre um alicerce totalmente confiável sobre o piso da razão”, era necessário nesse novo cenário uma sistematização e expansão da teologia cristã e a demonstração da inerente racionalidade dessa teologia. Com o a exploração do papel da razão nesse novo fazer teológico surge o que denominamos escolasticismo.

Anselmo de Cantuária (1033- 1109)

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Como todos os escolásticos, Anselmo afirmava que toda a verdade estava, direta ou indiretamente, presente nas Santas Escrituras e na sua interpretação pelos pais da Igreja. Seu fazer teológico achava-se na harmonia entre fé e razão, na articulação da fé com a filosofia. Anselmo dizia que primeiro vem a crença e depois a integibilidade dessa crença, sua clássica frase “Credo ut intelligam” (creio para entender) passou a ser usada pela maioria dos escolásticos. Contribuiu de maneira significativa no debate sobre a existência de Deus, e a interpretação racional da morte de Cristo na cruz. Suas principais obras foram: Monologion (Solilóquio), Proslogion (Colóquio) De Viritate (A verdade), De libertate arbitrii (O livre-arbitrio) e Cur Deus Homo (Por que Deus se fez homem). Proslogion e Cur Deus Homo, talvez seja as duas principais obras que melhor apresenta a teologia Anselminiana. A obra Proslogion, escrita por volta de 1079 é de uma beleza literária admirável. Nessa obra Anselmo se propõem a formular um argumento que levaria a crença na existência de Deus como bem supremo (argumento antológico). Em Cur Deus Homo, procura estabelecer uma demonstração racional da necessidade de Deus em se tornar homem, assim como uma analise dos benefícios resultantes a humanidade, em conseqüência da encarnação e da obediência do filho de Deus.

Pedro Abelardo (1079-1142) O filósofo salientava o papel da disputa, uma vez que quem a vence é capaz de mostrar ao adversário as falhas de suas próprias proposições. Pela técnica da redução ao absurdo, Abelardo buscava retirar as contradições lógicas das hipóteses adversas que desse modo se evidenciavam falsas. Sua redução ao absurdo intentava em persuadir e unir a sutileza da dialética com a eficácia da retórica, podendo assim destruir a ilusão sofistica pela própria hipótese dos mesmos, pois “ninguém pode ser refutado senão a partir do que Heloisa de Argenteuil e Pedro Abelardo concede, nem convencido senão pelo que admite” (1969b, p . 139). Como a autoridade dos sofistas, acreditava Abelardo, deviam ao fato de que “quase todos os homens são psíquicos e poucos são espirituais”, os sofistas deviam ser atingidos por raciocínios e meios humanos, e por isso a dialética é tão louvável quanto uma “espada bem amolada semelhante aquela de que se serve o tirano para destruir e o príncipe para proteger” (1978, p.50). A importância filosófica de Abelardo destaca-se também no seguinte ponto: a melhor e mais verdadeira autoridade está acima de um mero assentimento, pois ela deve ser uma autoridade justificada. Tal assentimento marca uma pedagogia própria do contexto medieval, tendo sido posteriormente retomada e aprofundada por São Tomás de Aquino. Os ouvintes eram colocados diante de questões com seus prós e contras, e, “baseando-se no princípio da verdade, mediante uma discussão dialética de argumentos aparentemente contraditórios, ou seja, perante um mesmo problema, confrontavam-se soluções opostas, para posteriormente discuti-las e resolvê-las, refutando opiniões adversas”.

Mosteiro de São Bento, Subiaco, Itália – construção séc. Vl Apesar de ter muitos significados para o termo “Escolástico”, no primeiro momento o termo vem do latim, depois “Schole” que palavra grega, que significa o lugar onde se aprende. Segundo Earle E. Cairns “o termo escolástico foi aplicado aos professores na corte ou na escola palaciana de Carlos Magno e também aos eruditos medievais que se serviram da filosofia no estudo da religião”. Para Tillich o termo vem de “escola” e significa “filosofia da escola”, trata-se da explicação metodológica da doutrina cristã. Em resumo, o escolasticismo pode ser definido como um movimento medieval, surgido provavelmente 1250 a 1500, que enfatizou a sistematização e a justificação da teologia cristã por meio da razão. Por exemplo: os dados da revelação deveriam ser organizados sistematicamente através do uso da lógica dedutiva de Aristóteles e 22


harmonizados com a filosofia de Aristóteles (Tomas de Aquino). È pedagógico a divisão do período Patrístico para alguns teólogos e historiadores do cristianismo, apresentá-la por fases traz melhor compreensibilidade: A primeira fase ira do século IX ao fim do século XII, caracterizada pela confiança na perfeita harmonia entre fé e razão. A segunda fase ira do século XIII ao princípio do século XIV, caracterizada pela elaboração de grandes sistemas filosóficos, merecendo destaques nas obras de Tomás de Aquino. Nesta fase, considerase que a harmonização entre fé e razão pôde ser parcialmente obtida. E a terceira e ultima fase ira do século XIV até o século XVI, decadência da escolástica, caracterizada pela afirmação das diferenças fundamentais entre fé e razão. A descoberta de Aristóteles no século XIII causou admiração para alguns e insatisfação para outros. Os chamados franciscanos de tradição agostiniana, não aceitavam a cosmologia aristotélica preferindo a visão de mundo platonista. Até, por que, as obras de Aristóteles apresentavam um novo olhar sobre a realidade, e por isso, por algum tempo os escritos metafísicos de Aristóteles foram proibidos, mas esta foi apenas uma medida temporária para ganhar uma pausa para tomar fôlego. A nova perspectiva aristoteliana foi realizada por dominicanos que recusavam a antiga cosmologia platônica adotada nas obras de Agostinho de Hipona. Podemos considerar que; enquanto o pensamento Agostiniano-platonista apresentava ser suficientemente místico, o tomista-aristotelico puxava o sujeito pra baixo (realidade, racionalidade). È indispensável destacar alguns nomes mais influentes da escolástica, em seguida estaremos apresentado uma síntese das teologias dos que considero as principais mentes do pensamento escolástico. Os nomes de Anselmo de Cantuária (1033 – 1093), Abelardo de Paris (1079 – 1142), Bernardo de Claraval (1090 – 1153), Joaquim de Fiori (1132 – 1202), Boaventura (1221 – 1274), Tomas de Aquino (1225 – 1274), Duns Scotus (1265 – 1308) e Guilherme de Ockham (1280 ou 1288 – 1347) formam os principais pensadores escolásticos, entretanto os nomes de Anselmo de Cantuária, Abelardo de Paris, Tomas de Aquino, Duns Scotus e Guilherme de Ockham se destacam e por isso merecem uma atenção especial.

Tomás de Aquino (1225-1274) Segundo a filosofia de Tomás de Aquino (1225-1274), o homem não vive por acaso, a vida humana tem um propósito que é a felicidade, porém o homem precisa conhecer os meios adequados para a sua posse. A felicidade para ele parte do princípio de que as riquezas materiais seriam a falsa noção da felicidade, pois a riqueza não tem consciência existencial em si mesma, e a razão de ser está fora dela mesma. O estado da felicidade parte do estado de espírito em que o homem se encontra. O indivíduo tem que conhecer seu eu interior antes de partir em busca dos meios adequados para a posse da mesma. Contudo, deve-se considerar que o estado da felicidade não é eterno, e uma vez encontrada, nada impede de se perdê-la, para assim então iniciar-se uma nova busca até o fim da vida humana. Em todo momento o homem busca a felicidade, e muitos ligam a felicidade à posse de bem materiais, mas para Tomás de Aquino a ideia de felicidade vai muito além disso. Ela é o guia necessário para a vida (alma) do homem. Na vida corriqueira, com o stress do dia a dia, o homem acaba abrindo mãos dos pequenos detalhes que possivelmente trariam a felicidade, em busca da materialização para supri-la. São Tomás de Aquino 1(1225-

Epistemologia

Aquino acreditava "que para o conhecimento de qualquer verdade, o homem precisa da ajuda divina; que o intelecto pode ser movido por Deus a agir". Porém, ele acreditava também que os seres humanos tinham a capacidade natural de conhecer muitas coisas sem nenhuma revelação divina especial, apesar de revelacões ocorrerem de quando em quando "especialmente em relação àquelas [verdades] pertinentes à fé". Mas esta é a luz dada ao homem por Deus na proporção da natureza humana: "Agora todas as formas concedidas às coisas criadas por Deus tem poder para determinadas ações, que podem realizar na medida de sua própria dotação; e além disto, são impotentes, exceto por meio de uma forma adicionada, como água que só esquenta quando aquecida pelo fogo. E assim a compreensão humana tem uma forma, viz. luz inteligível, que, por si só, é suficiente para conhecer certas coisas inteligíveis, viz. as que se pode aprender através dos sentidos" Ética

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A ética de Tomás de Aquino se baseia no conceito dos "princípios primeiros da ação". Na "Suma", ele escreveu: “

Virtude denota uma certa perfeição de um poder. Agora a perfeição de algo é considerada principalmente em relação à sua finalidade. Mas a finalidade do poder é ato. Por isso diz-se que um poder é perfeito na medida que é determinante para seu ato

— Suma Teológica, Tomás de Aquino

De acordo com ele, "...todos os atos da virtude são prescritos pela lei natural: Como a razão de cada um naturalmente dita que ele aja virtuosamente. Mas se falarmos de atos virtuosos considerados em si mesmos, ou seja, em suas próprias espécies, segue que nem todos os atos virtuosos são prescritos pela lei natural: pois muitas coisas são realizadas virtuosamente, mas cuja natureza não se inclinava para inicialmente; mas que, pelo inquérito da razão, foram percebidas pelos homens como condutivas ao bem estar". A conclusão é que é necessário determinar se estamos falando de atos virtuosos sob o aspecto das virtudes ou como um ato per se, em sua própria espécie. Tomás definiu as quatro virtudes cardinais como sendo prudência, temperança, justiça e coragem (ou "fortaleza"). Segundo ele, elas são naturais, reveladas na natureza e inerentes a todos. Há, porém, três virtudes teológicas: fé, esperança e caridade. Estas, por outro lado, são algo sobrenaturais e distintas das demais em seu objeto: Deus. Segundo o próprio Aquino: “

Agora o objeto das virtudes teológicas é o próprio Deus, que é a última finalidade de tudo e acima do conhecimento da nossa razão. Por outro lado, o objeto das virtudes morais e intelectuais é algo compreensível à razão humana. Por isso, as virtudes teológicas são especificamente distintas das virtudes morais e intelectuais— Suma Teológica, Tomás de Aquino.

Avançando o raciocínio, Tomás distingue quatro tipos de lei que governam os atos humanos: eterna, natural, humana e divina. "Lei eterna" é o decreto divino que governa toda criação, a "lei que é a Razão Suprema e não pode ser compreendida senão como algo imutável e eterno". "Lei natural" é a "participação" humana na "lei eterna" descoberta pela razão e baseada nos "princípios primeiros": "...este é o primeiro preceito da lei, que o bem deve ser feito e promovido e o mal, evitado. Todos os demais preceitos da lei natural se baseiam neste...". Se a lei natural contém vários preceitos ou apenas este, o próprio Aquino esclarece: "todas as inclinações de quaisquer partes da natureza humana, como por exemplo as partes concupiscentes e irascíveis, na medida em que são governadas pela razão, pertencem à lei natural e se reduzem ao primeiro preceito, como afirmando acima: pois os preceitos da lei natural são muitos em si próprios, mas são todos baseados numa fundação comum". O desejo de viver e procriar são considerados por Tomás entre os valores básicos (naturais) do homem, sobre os quais todos os demais valores humanos estão baseados. De acordo com Tomás, todas as tendências humanas estão aparelhadas o "bem" real humano. E no caso destes dois desejos, a natureza humana em questão é o matrimônio, o presente completo de uma pessoa a outra que assegura uma família às crianças e um futuro à humanidade. Para os cristãos, Tomás definia que o amor era "desejar o 'bem' de outro".

Sobre a "lei humana", Aquino conclui "...que, assim como no caso da razão especulativa, na qual tiramos conclusões em várias ciências a partir de princípios não demonstráveis e naturalmente conhecidos, conclusões estas não comunicadas a nós pela natureza, mas adquiridas pelos esforços da razão, é assim também com os preceitos da lei natural, pois a partir de princípios gerais e indemonstráveis, a razão humana precisa avançar para uma determinação mais precisa de certos assuntos. Estas determinações particulares, criadas pela razão humana, são chamadas de leis humanas desde que as outras condições essenciais da lei sejam observadas...", ou seja, a "lei humana" é a lei positiva, a lei natural aplicada pelos governos às sociedades. Leis naturais e humanas não são adequadas sozinhas. A necessidade humana de que seu comportamento seja dirigido fez necessária a existência da "lei divina", que é a lei especificamente revelada nas Escrituras. Segundo Aquino, "O apóstolo diz: «Pois mudado que seja o sacerdócio, é necessário que se faça também mudança da Lei.»(Hebreus 7:12) Mas o sacerdócio tem duas facetas, como afirmado na própria passagem, viz., os sacerdócio levita e o sacerdócio de Cristo. Portanto, a lei divina tem também duas facetas, a Antiga Lei e a Nova Lei". Aquino se refere aos animais como estúpidos e que a ordem natural declarou que eles foram criados para uso humano. Ele negava que os homens tinham qualquer dever de caridade para com os animais por não serem eles "pessoas". Se 24


não fosse assim, seria ilegal utilizá-los como fonte de alimento. Porém, este racional não dava aos homens permissão para serem cruéis com eles, pois "hábitos cruéis podem transbordar para o nosso tratamento dos seres humanos". Ainda tratando de ética e justiça, Aquino deu grandes contribuições para o pensamento

econômico medieval. Ele tratou do conceito de preço justo, normalmente o preço de mercado ou o regulamentado e suficiente para cobrir o custo de produção do vendedor. Ele argumentava que era imoral para os vendedores aumentarem os preços simplesmente por que os compradores estavam em algum momento precisando demais do produto.

Sobre a existência de Deus Ele acreditava também que se poderia demonstrar a existência de Deus. De forma breve na "Suma Teológica" e mais extensivamente na "Suma contra os Gentios", Aquino considera em detalhes seus cinco argumentos para a existência de Deus, amplamente conhecidos como "quinque viae" ("cinco vias"):  Movimento: algumas coisas indubitavelmente mudam sem serem capazes de provocar seu próprio movimento. Como, segundo o racional de Tomás, não pode haver uma cadeia infinita de causas para um movimento, decorre que deve existir um "Primeiro Movimentador", não movido por nada anterior e este seria o que todos entendem como sendo "Deus".  Causa: como no caso do movimento, nada é causa de si próprio e uma cadeia causal infinita seria impossível, deve haver uma "Primeira Causa", conhecida por "Deus". Aquino neste caso baseia-se nas assertivas de Aristóteles sobre os princípios do ser. O conceito de Deus como prima causa ("causa primeira") deriva do conceito aristotélico do "movedor imovível".  Existência do necessário e do desnecessário: nossa experiência inclui coisas que certamente existem, mas que são, aparentemente, desnecessárias. Porém, não é possível que tudo seja desnecessário, pois então, quando nada houver [que seja necessário], nada existiria. Portanto, somos compelidos a supor que existe algo que existe "necessariamente", cuja necessidade deriva de si próprio; na realidade, ele próprio seria a necessidade para que tudo o mais existisse. Este seria Deus.  Gradação: se podemos perceber uma gradação nas coisas no sentido de que algumas são mais quentes, boas etc., deve haver um superlativo que é a coisa mais verdadeira e nobre e, portanto, a que "existe mais completamente". Esta, então, seria Deus.

Tendências ordenadas da natureza: uma direção para as ações em direção a uma finalidade se percebe em todos os corpos governados pela lei natural. As coisas sem consciência tendem a ser guiadas pelos que a tem. A isto chamamos "Deus". Sobre a natureza de Deus, Aquino acreditava que a melhor abordagem, geralmente chamada de via negativa em latim, é considerar o que Deus "não é". Seguindo assim, ele propôs cinco expressões sobre as qualidades divinas:  Deus é simples, sem composição de partes como "corpo" e "alma" ou "matéria" e "forma".  Deus é perfeito, nada Lhe-falta. Ou seja, Deus é diferente dos demais seres por Sua completa realização. Tomás definiu Deus como "Ipse Actus Essendi subsistens" ("subsistente ato de ser").  Deus é infinito. Ou seja, Deus não finito no sentido que os seres criados são física, intelectual e emocionalmente limitados. Esta infinidade deve ser diferenciada da simples infinidade de tamanho ou número.  Deus é imutável, não passível de mudanças de caráter ou essência.  Deus é uno, sem diversificação em si próprio. A unidade de Deus é tal que Sua essência é idêntica à Sua existência. Nas palavras de Tomás, "em si mesma, a proposição 'Deus existe' é necessariamente verdadeira, pois, nela, sujeito e predicado são o mesmo". Quando recebeu sua extrema unção, as últimas palavras de Aquino foram: “Eu te recebo, Resgate pela minha alma. Pelo teu amor estudei e me mantive vigilante, trabalhei, preguei e ensinei...”

Uma pequena observação sobre a biografia de Aquino, é que, seu apelido era “boi quieto”, ele era bastante corpulento. Aquino fora dos momentos de debates acadêmicos e das conversações atinentes a assuntos sérios, era calado, reservado. Além disto não apreciava perder tempo com 25


conversas inúteis. Por isto um de seus colegas o chamou de “o boi mudo”. Conta-se que um de seus professores disse: “Um dia o mugido desse boi será ouvido em todo mundo”. Tomas de Aquino é considerado um dos principais teólogos da escolástica, talvez o maior gênio da escolástica. Foi um trabalhador incansável e um espírito metódico, que se empenhou em ordenar o saber teológico e moral acumulado na Idade Média, sobretudo o que recebeu através de seu mestre Alberto Magno. Como resultado, produziu extensa obra, que apresenta mais de sessenta títulos. As mais importantes são os Comentários Sobre as sentenças, provavelmente redigidos entre 1253 e 1256, em Paris; Os Princípios e o Ente e Essência, da mesma época, a Súmula Contra os Gentios e as Questões Sobre a Alma, compostas, ao que tudo indica, entre 1259 e 1264. Questões diversas, começadas em 1263, e finalmente a Suma Teológica, sua obra mais celebre, apesar de não ter sida concluída. Em todas elas está sempre uma vasta erudição, não haurida diretamente nas fontes, pois Aquino não conhecia nem o hebraico, nem o grego, nem o árabe. Limitado ao latim, conheceu e utilizou, porém inúmeros autores “profanos” ((Eudóxio, Euclides, Hipócrates, Galeno, Ptolomeu), os

filósofos gregos, sobretudo Platão e Aristóteles, os árabes e judeus (AlFarabi, Avempace, Al Ghazali, Avicebrom, Avicena, Averrróis, Israeli), e escolásticos, como Anselmo, Bernardo de Clairvaux e Pedro Lombardo. Mas foi principalmente influenciado por Alberto Magno, seu mestre em Paris. Tomás de Aquino, não acreditava em um mundo das idéias e sob influência do naturalismo aristotélico defenderá a existência de um mundo real, material. Esse mundo seria a criação divina – esta é uma das questões que surge ao seu tempo, a criação. Ele aponta a apreensão do divino através da verdade da razão que não pode ser negada pela verdade revelada da fé, ambas precisam ser idênticas, do contrário a fé ou a razão não foram adequadamente empreendidas. A teologia e a filosofia não se opõem. Fé e razão estão unidas em um único sentido: a perfeição, ou seja, o conhecimento de Deus. Para Tomás de Aquino a verdade e o conhecimento também são alcançados através de um mestre interior, porém, não há a intervenção de uma luz divina para que se dê o conhecimento, ele já existe como potencialidade no interior do ser e cabe a este descobri-lo através do aprendizado, do estudo, da educação religiosa, da pedagogia.

Duns Scotus (1266-1308) Em seus poucos anos em Cambridge, Oxford e Paris, Scotus viveu com brilhantismo e maestria, considerado como o filosofo das sutilezas. Sem duvida, Scotus foi responsável por uma serie de avanços de considerável importância para a teologia cristã. Em sua genialidade teológica e filosófica escreveu uma pluralidade de obras, porém suas principais são: Opus Oxioniense (Obra de Oxford), Quaestiones de Metaphysica (Questões de Metafísica) e De Primo Princípio (Do Primeiro Princípio). Scotus é filho do século XIII, no qual como vimos, viveram tomas de Aquino e Boaventura. É atravessado por duas trajetórias filosófico-teológicas bem definidas: agostiniano-boaventuriana e aristotélico-tomista. E uma única matriz polêmica a provocá-las e animá-las: o ingresso das obras de Aristóteles na universidade de Paris. Nesse contexto, Scotus assume uma postura crítica face aos pressupostos e às principais posições defendidas por ambas as escolas, revelando-se como um pensador original. Destaca-se pelo seu estilo rigoroso em bem discernir, o que lhe possibilitou dissipar inúmeras confusões e esmerar-se na especulação acerca das questões filosóficas e dos mistérios da fé. O Doutor das sutilezas se caracteriza, ainda, por um raciocínio deveras singular capaz de, num cerrado diálogo com seus interlocutores, desconstruir seus argumentos e forjar conceitos e linguagem novos cada vez mais precisos e inclusivos. Com Scotus, talvez o pensamento cristão tenha atingido o mais alto vértice da especulação. Scotus enfatizou a liberdade de Deus. Dizia que as coisas são de modo que são não por que a razão exige, mas por que Deus livremente escolhe. A ênfase de Scotus na liberdade de Deus significa que o papel da razão e da filosofia é necessariamente limitado. È interessante destacar que Scotus ficou famoso como o primeiro advogado da doutrina da imaculada concepção de Maria. Diferente de Aquino que sustentava que Maria tinha a condição de pecadora, Scotus alegava que Cristo, em virtude de sua obra perfeita de redenção, fora capaz de manter Maria livre da mancha do pecado original. Tamanha foi a influência dessa idéia da Immacula (Livre de pecado) de Maria que foi definida como dogma em 1854 pelo Papa Pio IX em sua bula “Inefabilis Deus”. Guilherme de Ockham (1285-1347) 26


Ockham foi o mais influente teólogo dos séculos XIV e XV. Foi conhecido pela “Navalha de Ockham” ou Lei de Economia. Este é o principio de simplicidade, dizia que a explicação mais simples é a melhor ou é fútil multiplicar hipóteses quando algumas vontades bastam. Os assuntos de suas obras rodeavam entre teologia, filosofia e política. Suas principais obras foram: Dialogus, Paris 1478; Quodlibeta septem, Paris 1487; Summa logicae, Paris 1488. Ockham em seus estudos leva o pensamento de Duns Scotus às últimas conseqüências, acentua a separação entre a filosofia e a teologia, entre a razão e a fé, no momento em que se anunciam as primeiras descobertas da ciência moderna. Pra Ockham, demonstrar uma proposição é mostrar sua evidência ou deduzi-la rigorosamente de outra evidente. A essa exigente concepção de prova, acrescenta-se o senso muito vivo do concreto, que faz do ockhamismo um empirismo radical. Na opinião de Ockham, o conhecimento abstrato refere-se às relações entre as idéias, sem nada garantir sobre sua conformidade com o real. Quanto ao conhecimento intuitivo, este dá a evidência imediata, assegurando a verdade e a realidade das proposições. Só a intuição prova a existência das coisas, ponto de partida do conhecimento experimental, que, generalizando o particular, chega ao universal, à lei. É a experiência que permite conhecer as causas das coisas. Não se trata, portanto, de conhecer o universal, mas a evidência do particular. O universal não tem realidade e a inteligência deve ser capaz de apreender o particular. Para Ockham não existem conceitos abstratos ou universais, mas apenas os termos ou nomes cujo sentido seria o de designar indivíduos revelados exclusivamente pela experiência. Provada a impossibilidade de racionalizar a fé, a teologia passa a proceder exclusivamente da crença, e a filosofia, da razão. Assim Ockham abre a modernidade, com a teologia de um lado e a filosofia do outro, ambas separadas, fé e razão não podem andar mais juntas. O termo scholasticus se referia àqueles que ensinavam as sete artes liberais do trivium e do quadrivium:

Lógica, Retórica e Gramática Música, Geometria, Aritmética e Astronomia

Algum tempo depois, passou-se a se chamar escolástico o professor ou mestre de teologia ou filosofia que se dedicava ao ensino nas escolas, os mesmos que mais tarde passaram a ensinar também nas universidades. 27


A FILOSOFIA DO RENASCIMENTO A Filosofia do Renascimento foi o período da História da Filosofia na Europa que está situado entre a Idade Média e o Iluminismo. Ele inclui o século XV; alguns estudiosos estendem o seu começo a década de 1350 e o seu término ao final do século XVI ou ao começo do século XVII, sobrepondo a Reforma e a Idade Moderna. Entre os elementos distintivos da filosofia do renascimento cultural estão o renascimento da educação e civilização clássica e um retorno parcial à autoridade de Platão sobre Aristóteles (que dominou a filosofia medieval). O período foi marcado por transformações em muitas áreas da vida animal que assinalam o final da idade média e o inicio da idade moderna. Apesar dessas transformações serem bem evidentes na cultura, sociedade econômica, política e religião, caracterizando a transição do feudalismo para o capitalismo e significando uma ruptura com as estruturas medievais, o termo é mais habitualmente empregado para descrever seus efeitos nas artes, na filosofia e na ciência.

Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi um filósofo, historiador, poeta, diplomata e músico de origem florentina do Renascimento. É reconhecido como fundador do pensamento e da ciência política moderna,[1] pelo fato de ter escrito sobre o Estado e o governo como realmente são e não como deveriam ser. Desde as primeiras críticas, feitas postumamente pelo cardeal inglês Reginald Pole,[2] as opiniões, muitas vezes contraditórias, acumularam-se, de forma que o adjetivo maquiavélico, criado a partir do seu nome, significa esperteza, astúcia, aleivosia, maldade. Maquiavel viveu a juventude sob o esplendor político da República Florentina durante o governo de Lourenço de Médici e entrou para a política aos 29 anos de idade no cargo de Secretário da Segunda Chancelaria. Nesse cargo, Maquiavel observou o comportamento de grandes nomes da época e a partir dessa experiência retirou alguns postulados para sua obra. Depois de servir em Florença durante catorze anos foi afastado e escreveu suas principais obras. Conseguiu também algumas missões de pequena importância, mas jamais voltou ao seu antigo posto como desejava. Como renascentista, Maquiavel utilizou-se de autores e conceitos da Antiguidade Clássica de maneira nova. Um dos principais autores foi Tito Lívio, além de outros lidos através de traduções latinas, e entre os conceitos apropriados por ele encontram-se o de virtù e o de fortuna.

O Príncipe O "Príncipe" é provavelmente o livro mais conhecido de Maquiavel e foi completamente escrito em 1513, apesar de publicado postumamente, em 1532. Teve origem com a união de Juliano de Médici e do papa Leão X, com a qual Maquiavel viu a possibilidade de um príncipe finalmente unificar a Itália e defendêla contra os estrangeiros, apesar de dedicar a obra a Lourenço II de Médici, mais jovem, de forma a estimulálo a realizar esta empreitada. Outra versão sobre a origem do livro, diz que ele o teria escrito em uma tentativa de obter favores dos Médici, contudo ambas as versões não são excludentes. Está dividido em 26 capítulos. No início ele apresenta os tipos de principado existentes e expõe as características de cada um deles. A partir daí, defende a necessidade do príncipe de basear suas forças em exércitos próprios, não em mercenários e, após tratar do governo propriamente dito e dos motivos por trás da fraqueza dos Estados italianos, conclui a obra fazendo uma exortação a que um novo príncipe conquiste e liberte a Itália.Em uma carta ao amigo Francesco Vettori, datada de 10 de dezembro de 1513, Maquiavel comenta sobre o escrito: “

E como Dante diz que não se faz ciência sem registrar o que se aprende, eu tenho anotado tudo nas conversas que me parece essencial, e compus um pequeno livro chamado "De Principatus", onde investigo profundamente o quanto posso cogitar desse assunto, debatendo o que é um principado, que tipos de principado existem, como são conquistados, mantidos, e como se perdem 28


Em sua obra O Príncipe, defendeu a centralização do poder político e não propriamente o absolutismo. Suas considerações e recomendações aos governantes sobre a melhor maneira de administrar o governo caracterizam a obra como uma teoria do Estado moderno. Ele é, de fato, considerado o "pai da moderna teoria política". Maquiavel defende a idéia de que um estado forte depende de um governante eficaz, e para que ele seja bom, ele deve ter boas habilidades políticas. Para ele, são características relevantes de um bom príncipe, ser bondoso, caridoso, religioso e ter moral. Contudo, Maquiavel argumentava não ser necessário possui-las de fato, o governante devia apenas manter as aparências, pois o governo precisa do apoio e opinião pública; em momentos de crise a população deve ficar contra o governo. Maquiavel se preocupava em manter o Estado, por isso deixa conselhos para o soberano sobre como o fazer. Deste modo, ele apresenta propostas de como dominar nações. No caso de dominação sobre uma cultura diferente, ele apresenta três meios para tal feito. Dominação militar < Colonização < Mudança da capital A dominação militar é vista como o meio menos eficiente, pois assim a nação estrangeira enxergaria o príncipe como um inimigo e não o apoiaria. A colonização tem maior eficácia, porém não é suficiente. Desta maneira, haveria uma mescla entre a cultura da nação dominada e da nação dominadora, beneficiando ambas as partes. Já a transferência da capital seria o meio mais eficaz. Se o príncipe reside na nação que está dominando, ele passa a levar melhorias para o lugar e a ganhar maior aceitação do povo. No caso de dominação de um país de grande extensão, ele propõe duas alternativas: Centralizar burocraticamente < Descentralizar aristocraticamente Maquiavel afirmava que a segunda proposta era mais eficaz, pois ao descentralizar o poder, ele conferiria autoridade a algumas famílias aristocráticas para governar determinadas regiões do país. Dessa forma, ele teria pessoas de sua confiança fiscalizando todo o território e o poder ainda estaria concentrado em suas mãos. Já a primeira alternativa não seria uma boa solução, pois ele apenas criaria instituições burocráticas, mas o poder ainda estaria centralizado em si. Maquiavel ainda propõe explicações para dominar uma sociedade acostumada com suas próprias leis: Destruição < Transferência de capital < Tolerância conservadora Em primeira instância, o príncipe deveria permitir as leis da nação dominada e tolerar as diferenças. Dessa maneira, a tolerância conservadora é vista como a melhor opção. A segunda alternativa também é considerada aceitável em caso de a primeira não demonstrar êxito, já que ao transferir a capital ele passa a levar mais melhorias para o local e a ganhar aceitação do povo. Caso a população não aceite dominação e se revolte, a única alternativa restante seria a destruição daquele povo. Uma leitura apressada ou enviesada de Maquiavel poderia levar-nos a entendê-lo como um defensor da falta de ética na política, em que "os fins justificam os meios". Para entender sua teoria é necessário colocá-lo no contexto da Itália renascentista, em que se lutava contra os particularismos locais. Durante o século XVI, a península Itálica estava dividida em diversos pequenos Estados, entre repúblicas, monarquias, ducados, além dos Estados Papais. As disputas de poder entre esses territórios era constante, a ponto de os governantes contratarem os serviços do condotieri (mercenários) com o intuito de obter conquistas territoriais. Foi muito difundida no século XVI e encontram-se aproximadamente 400 peças que citam Maquiavel, todas vinculando seu nome à maldade, a ardilosidade e a falta de escrúpulos. William Shakespeare, por exemplo, o coloca em uma fala de Ricardo, Duque de Gloucester na sua peça sobre Henrique VI (Henry VI, Part 1, Henry VI, Part 2, Henry VI, Part 3) Conselheiro do povo Uma segunda interpretação diz que ao escrever "O Príncipe", Maquiavel tentava alertar o povo sobre os perigos da tirania, tendo entre seus adeptos, Baruch de Espinoza e Jean-Jacques Rousseau. Este último escreveu "(…) é o que Maquiavel fez ver com evidência. Fingindo dar lições aos reis, deu-as, e grandes, aos povos."Foi defendida recentemente por estudiosos da obra dele como Garret Mattingly. Há os que afirmam ser "O Príncipe" uma sátira dos costumes dos governantes ou que o autor não acreditaria no que escreveu, baseando esta afirmação na preferência que teria Maquiavel pela república como forma de governo. Contudo o autor também faz críticas à república. Pensamento 29


Maquiavel não foi um pensador sistemático. Ele utiliza o empirismo para escrever através de um método indutivo e pensa em seus escritos como conselhos práticos, sendo além disso antiutópico e realista. A teoria não se separa da prática em Maquiavel. Os conceitos desenvolvidos por ele rompem com a tradição medieval teológica e também com a prática, comum durante o Renascimento, de propor estados imaginários perfeitos, os quais os príncipes deveriam ter sempre em mente. A partir da observação da política de seu tempo e da comparação desta com a da Antiguidade vai formular o seu pensamento por acreditar na imutabilidade da natureza humana. Virtù e fortuna Os conceitos de virtù e fortuna são empregados várias vezes por Maquiavel em suas obras. Para ele, a virtù seria a capacidade de adaptação aos acontecimentos políticos que levaria à permanência no poder. A virtùseria como uma barragem que deteria os desígnios do destino. Mas segundo o autor, em geral, os seres humanos tendem a manter a mesma conduta quando esta frutifica e assim acabam perdendo o poder quando a situação muda. A ideia de fortuna em Maquiavel vem da deusa romana da sorte e representa as coisas inevitáveis que acontecem aos seres humanos. Não se pode saber a quem ela vai fazer bens ou males e ela pode tanto levar alguém ao poder como tirá-lo de lá, embora não se manifeste apenas na política. Como sua vontade é desconhecida, não se pode afirmar que ela nunca lhe favorecerá. Ética A ética em Maquiavel se contrapõe à ética cristã herdada por ele da Idade Média. Para a ética cristã, as atitudes dos governantes e os Estados em si estavam subordinados a uma lei superior e a vida humana destinava-se à salvação da alma. Com Maquiavel a finalidade das ações dos governantes passa a ser a manutenção da pátria e o bem geral da comunidade, não o próprio, de forma que uma atitude não pode ser chamada de boa ou má a não ser sob uma perspectiva histórica. Reside aí um ponto de crítica ao pensamento maquiavélico, pois com essa justificativa, o Estado pode praticar todo tipo de violência, seja aos seus cidadãos, seja a outros Estados. Ao mesmo tempo, o julgamento posterior de uma atitude que parecia boa, pode mostrá-la má. Natureza humana “

Mesmo as leis mais bem ordenadas são impotentes diante dos costumes (…)

Para ele, a natureza humana seria essencialmente má e os seres humanos querem obter os máximos ganhos a partir do menor esforço, apenas fazendo o bem quando forçados a isso. A natureza humana também não se alteraria ao longo da história fazendo com que seus contemporâneos agissem da mesma maneira que os antigos romanos e que a história dessa e de outras civilizações servissem de exemplo. Falta-lhe um senso das mudanças históricas. Como consequência, acha inútil imaginar estados utópicos, visto que nunca antes postos em prática e prefere pensar no real. Sem querer com isso dizer que os seres humanos ajam sempre de forma má, pois isso causaria o fim da sociedade, baseada em um acordo entre os cidadãos. Ele quer dizer que o governante não pode esperar o melhor dos homens ou que estes ajam segundo o que se espera deles. O fim justifica os meios ou os fins justificam os meios é uma frase atribuída a Maquiavel. Significa que os governantes devem estar acima da ética dominante para manter ou aumentar seu poder. Popularmente, a frase é também usada como justificativa do emprego de expedientes desonestos ou violentos para a obtenção de determinado fim, supostamente legítimo. Em sua obra, O Príncipe, Nicolau Maquiavel cria um verdadeiro "Manual de Política", sendo interpretado de várias formas, principalmente de maneira injusta e pejorativa. O autor e sua obra passaram a ser vistos como perniciosos, sendo então forjada a expressão "os fins justificam os meios", que não é encontrada em sua obra. Esta expressão significa que não importa qual foi o caminho tomado, desde que o resultado seja vitorioso. Embora a expressão não seja encontrada no texto original, tornou-se uma interpretação popular ou de senso comum, do pensamento maquiavélico, que é uma expressão preconceituosa para se referir ao pensamento maquiaveliano, que é o pensamento de Maquiavel. De fato, Maquiavel nunca disse que os fins justificam os meios. O que ele afirma, em O Príncipe, é que o governante deve agir segundo a ética sempre que possível, a partir do conceito de razão de Estado. necessário para a manutenção do poder. A regra, portanto, é a conquista e a manutenção do poder. A afirmação seria também oposta à doutrina cristã, que diz exatamente o contrário: "Não se pode justificar uma ação má com boa intenção. O fim não justifica os meios. 30


Francis Bacon, 1°. Visconde de Alban, também referido como Bacon de Verulâmio (15611626) Foi um político, filósofo, cientista, ensaísta inglês, barão de Verulam (ou Verulamo ou ainda Verulâmio) e visconde de Saint Alban. É considerado como o fundador da ciência moderna. Como filósofo, destacou-se com uma obra onde a ciência era exaltada como benéfica para o homem. Em suas investigações, ocupou-se especialmente da metodologia científica e do empirismo, sendo muitas vezes chamado de "fundador da ciência moderna". Sua principal obra filosófica é o Novum Organum. Francis Bacon foi um dos mais conhecidos e influentes rosacruzes e também um alquimista, tendo ocupado o posto mais elevado da Ordem Rosacruz, o de Imperator. Estudioso apontam como sendo o real autor dos famosos manifestos rosacruzes, Fama Fraternitatis (1614), Confessio Fraternitatis (1615) e Núpcias Alquímicas de Christian Rozenkreuz (1616). O pensamento filosófico de Bacon representa a tentativa de realizar aquilo que ele mesmo chamou de Instauratio magna (Grande restauração). A realização desse plano compreendia uma série de tratados que, partindo do estado em que se encontrava a ciência da época, acabariam por apresentar um novo método que deveria superar e substituir o de Aristóteles. Esses tratados deveriam apresentar um modo específico de investigação dos fatos, passando, a seguir, para a investigação das leis e retornavam para o mundo dos fatos para nele promover as ações que se revelassem possíveis. Bacon desejava uma reforma completa do conhecimento. A tarefa era, obviamente, gigantesca e o filósofo produziu apenas certo número de tratados. Não obstante, a primeira parte da Instauratio foi concluída. A reforma do conhecimento é justificada em uma crítica à filosofia anterior (especialmente a Escolástica), considerada estéril por não apresentar nenhum resultado prático para a vida do homem. O conhecimento científico, para Bacon, tem por finalidade servir o homem e dar-lhe poder sobre a natureza. A ciência antiga, de origem aristotélica, também é criticada. Demócrito, contudo, era tido em alta conta por Bacon, que o considerava mais importante que Platão e Aristóteles. A ciência deve restabelecer o imperium hominis (império do homem) sobre as coisas. A filosofia verdadeira não é apenas a ciência das coisas divinas e humanas. É também algo prático. Saber é poder. A mentalidade científica somente será alcançada através do expurgo de uma série de preconceitos por Bacon chamados ídolos. O conhecimento, o saber, é apenas um meio vigoroso e seguro de conquistar poder sobre a natureza.

Classificação das ciências Preliminarmente, Bacon propõe a classificação das ciências em três grupos:  Poesia ou ciência da imaginação;  História ou ciência da memória;  Filosofia ou ciência da razão. A história é subdividida em natural e civil e a filosofia é subdividida em filosofia da natureza e em antropologia. Ídolos No que se refere ao Novum Organum, Bacon preocupou-se inicialmente com a análise de falsas noções (ídolos) que se revelam responsáveis pelos erros cometidos pela ciência ou pelos homens que dizem fazer ciência. É um dos aspectos mais fascinantes e de interesse permanente na filosofia de Bacon. Esses ídolos foram classificados em quatro grupos: 1) Idola Tribus (ídolos da tribo): Ocorrem por conta das deficiências do próprio espírito humano e se revelam pela facilidade com que generalizamos com base nos casos favoráveis, omitindo os desfavoráveis. O homem é o padrão das coisas, faz com que todas as percepções dos sentidos e da mente sejam tomadas 31


como verdade, sendo que pertencem apenas ao homem e não ao universo. Dizia que a mente se desfigura da realidade. São assim chamados porque são inerentes à natureza humana, à própria tribo ou raça humana. 2) Idola Specus (ídolos da caverna): De acordo com Bacon, cada pessoa possui sua própria caverna, que interpreta e distorce a luz particular, à qual estão acostumados. Isso quer dizer que, da mesma maneira presente na obra 'República' de Platão, os indivíduos, cada um, possui a sua crença, sua verdade particular, tida como única e indiscutível. Portanto, os ídolos da caverna perturbam o conhecimento, uma vez que mantêm o homem preso em preconceitos e singularidades. 3) Idola Fori (ídolos do foro ou de mercado): Segundo Bacon, os ídolos do foro são os mais perturbadores, já que estes alojam-se no intelecto graças ao pacto de palavras e de nomes. Para os teóricos matemáticos um modo de restaurar a ordem seria através das definições. Porém de acordo com a teoria baconiana, nem mesmo as definições poderiam remediar totalmente esse mal, tratando-se de coisas materiais e naturais posto que as próprias definições constam de palavras e as palavras engendram palavras. Percebe-se portanto, que as palavras possuem certo grau de distorção e erro, sendo que umas possuem maior distorção e erro que outras. 4) Idola Theatri (ídolos do teatro): Os ídolos do teatro têm suas causas nos sistemas filosóficos e em regras falseadas de demonstrações. Os falsos conceitos, são as ideologias, essas são produzidas por engendramentos filosóficos, teológicos, políticos e científicos, todos ilusórios. Os ídolos do teatro, para Bacon, eram os mais perigosos, porque, em sua época, predominava o princípio da autoridade – os livros da antiguidade e os livros sagrados eram considerados a fonte de todo o conhecimento.

O método indutivo: a verdadeira interpretação da natureza A análise do título “Novum Organum” informa 2 questões importantes da obra baconiana: 1. Apresentar um novo arcabouço instrumentário (tradução do grego “Órganon”) para o novo campo da ciência que está para emergir na Idade Moderna 2. Crítica ao sistema lógico aristotélico (Órganon também diz respeito às obras sobre lógica de Aristóteles) o qual foi tradicionalmente usado na ciência, rejeitando ou abafando a filosofia natural cuja base é a experiência. A intensão de Francis Bacon nessa obra não é apresentar um sistema inovador, mas é apontar para as recorrências dos equívocos na filosofia e ciência para, com isso, afastar-se deles; como ele mesmo afirma no prefácio do Novum Organum “Cessam o cuidado e os partidos, ficando a nós reservado o papel de guia apenas”. Tendo em vista a definição de indução, é tácito frisar que o método indutivo é sumamente importante e inerente ao método empírico, o qual Francis Bacon adota, em sua obra “Novum Organum”, para a interpretação da natureza – em contraposição ao método enganoso, danoso, inerte e precário de se fazer ciência, os quais Bacon denomina de antecipações da mente. Segundo o filósofo moderno, praticamente toda a filosofiaanterior a sua pecavam em suas teorias e se dedicavam ao método de antecipações e não ao “verdadeiro método de interpretação da natureza” O filósofo destaca o afastamento da filosofia da verdadeira ciência, uma vez que está presa ao método dedutivo e ao silogismo e, assim, afasta-se da verdade. O método indutivo proposto por Bacon é o único possível para o desenvolvimento saudável da ciência, a qual se encaminhará rumo ao seu progresso – diferentemente das diversas falsidades criadas pela tradição da dedução (ou demonstração), as quais são inúteis e danosas para a ciência e desvia o homem de seu caminho, dizendo mais sobre o homem do que sobre o universo. Bacon apresenta o que seria a verdadeira indução, diferentemente das falaciosas que perpetuam os erros. Crítica o método das antecipações e todo aquele que, de algum modo, submete a experiência à meditação. Atenta para o dever de o observador ater-se apenas aos dados empíricos, os quais devem ser diversificados e amplos. Além disso, destaca a importância dos axiomas médios para chegar ao mais geral, dando uma certa ideia de processo científico, deserdando os “saltos” lógicos diretamente para o axioma geral – por isso ele sublinha a necessidade de um método científico rígido para que o cientista não desvie do seu caminho, assim como aconteceu com Atalanta que se distraiu com as maçãs douradas. A crítica de Bacon vai desde os gregos, passando pelos medievais e chega até sua contemporaneidade, a qual, segundo ele, encontra-se num momento muito mais oportuno e maduro para propor um novo modo de fazer ciência, em relação aos tempos passados. Essa crítica se deve ao fato de que os filósofos naturais não baseavam toda sua ciência nos fatores sensíveis, mas, ao contrário, 32


submetiam os poucos fatos que reuniam da experiência à sua teoria ou à religião ou magia – o que, de acordo com ele, causou a corrupção das ciências. Portanto, a crítica de Bacon se direciona para o fato da desonestidade de tais experimentos que se afirmam empíricos, contudo, na realidade, não estão fundados na empiria, mas na meditação e dedução ou, por vezes, na magia ou superstição - por isso os erros e aberrações criados pela mente humana desnuda e desprotegida dos ídolos. Bacon apresenta, então, os "três tipos (d)as fontes dos erros e das falsas filosofias": a sofística, a empírica e a supersticiosa Respectivamente, Aristóteles, os alquimistas e a arte supersticiosa ou magia. À Aristóteles – exemplo de sofística - a crítica se faz bastante ferrenha. Segundo Bacon, a Física de Aristóteles nada mais era do que evidências empíricas arbitrárias para a comprovação de sua dialética. Portanto, a indução aristotélica “submetia a experiência como a uma escrava para conformá-la às suas opiniões” e, assim, a experiência é inútil em Aristóteles, na visão baconiana. Tal afirmação é de crucial importância, pois as obras aristotélicas (redescobertas e traduzidas na segunda metade da Idade Média) eram tidas como umas das mais notórias no campo da filosofia natural e, por isso, o esforço de Bacon em atentar para o fato de a indução de Aristóteles não ser verdadeira e que ela dificulta o progresso das ciências. Aos escolásticos, grandes leitores de Aristóteles, Bacon critica o abandono total da experiência e a mistura com a religião. Os alquimistas – exemplos da escola empírica -, embora seu ofício tivesse um certo grau de empiria, além de misturarem sua arte com superstição, seus experimentos eram variados e não coletavam um número suficiente dados sensíveis, deixando as descobertas nas mãos do acaso, pois não haviam prescrito um método seguro que garantisse a eficácia (ou desvelasse o fracasso) de suas práticas. E sobre as supersticiosas Bacon nem se dispõe a comentá-las, uma vez que, “só puderam afetar em algo apenas um porção reduzida e bem definida de objetos” Para isso, no entanto, deve-se descrever de modo pormenorizado os fatos observados para, em seguida, confrontá-los com três tábuas que disciplinarão o método indutivo: a tábua da presença (responsável pelo registro de presenças das formas que se investigam), a tábua de ausência (responsável pelo controle de situações nas quais as formas pesquisadas se revelam ausentes) e a tábua da comparação (responsável pelo registro das variações que as referidas formas manifestam). Com isso, seria possível eliminar causas que não se relacionam com o efeito ou com o fenômeno analisado e, pelo registro da presença e variações seria possível chegar à verdadeira causa de um fenômeno. Estas tábuas não apenas dão suporte ao método indutivo mas fazem uma distinção entre a experiência vaga (noções recolhidas ao acaso) e a experiência escriturada (observação metódica e passível de verificações empíricas). Mesmo que a indução fosse conhecida dos antigos, é com Bacon que ela ganha amplitude e eficácia. O método, no entanto, possui pelo menos duas falhas importantes. Em primeiro lugar, Bacon não dá muito valor à hipótese. De acordo com seu método, a simples disposição ordenada dos dados nas três tábuas acabaria por levar à hipótese correta. Isso, contudo, raramente ocorre. Em segundo lugar, Bacon não imaginou a importância da dedução matemática para o avanço das ciências. A origem para isso, talvez, foi o fato de ter estudado em Cambridge, reduto platônico que costumava ligar a matemática ao uso que dela fizera Platão.

Obras Efetivamente, Bacon não realizou nenhum grande progresso nas ciências naturais. Mas foi ele quem primeiro esboçou uma metodologia racional para a atividade científica. Sua teoria dos idola antecipa, pelo menos potencialmente, a moderna Sociologia do Conhecimento. Foi um pioneiro no campo científico e um marco entre o homem da Idade Média e o homem moderno.

MOVIMENTOS FILOSÓFICOS Hermetismo Hermetismo ou hermeticismo é o estudo e prática da filosofia oculta e da magia associados a escritos atribuídos a Hermes Trismegisto, "Hermes Três-Vezes-Grande", uma deidade sincrética que combina aspectos do deus grego Hermes e do deus egípcio Thoth. Os escritos herméticos são uma coleção de 18 obras Gregas, e as principais são o Corpus Hermeticum e a Tábua de Esmeralda, as quais são tradicionalmente atribuídas a Hermes Trismegisto ("Hermes três vezes grande"). Estes escritos contêm os aspectos teórico e filosófico do Hermetismo em seu aspecto teosófico. O bizantino é marcado por uma outra coleção de obras herméticas, que também são relacionadas ao 33


Hermes Trismegisto, e contêm uma tradição hermética popular a qual é composta essencialmente por escritos relacionados a astrologia, magia e Alquimia. Esta versão popular encontra sustentação ou base nos diálogos Herméticos, apesar dele se distanciar da magia. A prática da magia entretanto não está distante das praticas realizadas no antigo Egito, a qual em uma última análise é a fonte de todos os diálogos herméticos, pois o hermetismo lá floresceu, e portanto estabelece uma conexão entre as duas tradições Herméticas: filosófica e magia. O livro Caibalion foi escrito no final do século XIX por três iniciados que registraram as Sete Leis do Hermetismo. Não é um livro oriundo da era pré-cristã como se supõe. O hermetismo consiste, de forma sincrética, no estudo e prática da evolução e expansão da consciência humana até à Consciência divina, penetrando assim nos mais profundos mistérios da Criação, o que ficou conhecido como iniciação, iluminação ou senda no Oriente. Os escritos mais importantes atribuídos a Hermes são a Tábua de Esmeralda e os textos do Corpus Hermeticum. Estas crenças tiveram influência na sabedoria oculta europeia, desde a Renascença, quando foram reavivadas por figuras como Giordano Bruno e Marsilio Ficino. A magia hermética passou por um renascimento no século XIX na Europa Ocidental, onde foi praticada por nomes como os envolvidos na Ordem Hermética do Amanhecer Dourado e Eliphas Levi. No século XX foi estudada por Aleister Crowley, entre outros. Sempre existiram muitas organizações que se intitularam de Sociedade, ou de Ordem Hermética, e também na atualidade. Muitas trazem ensinamentos autênticos, embora algumas atribuam o nome "hermética" a conceitos de grupos ou meras fantasias. Ordens herméticas que ficaram consagradas ao longo dos séculos foram a Ordem dos Cavaleiros Templários, a Maçonaria e a Ordem Rosacruz.

Humanismo Humanismo é a filosofia moral que coloca os humanos como os principais numa escala de importância, no centro do mundo. É uma perspectiva comum a uma grande variedade de posturas éticas que atribuem a maior importância à dignidade, aspirações e capacidades humanas, particularmente a racionalidade. Embora a palavra possa ter diversos sentidos, o significado filosófico essencial destaca-se por contraposição ao apelo ao sobrenatural ou a uma autoridade superior. Desde o século XIX, o humanismo tem sido erroneamente associado ao anticlericalismo, onde na verdade se associa ao antropocentrismo renascentista e o laicismo dos filósofos iluministas. O termo abrange diversos tipos de pensadores não teístas, o humanismo secular e uma das posturas de vida humanista. A primeira organização humanista no Brasil é a Organização Humanista Internacional, fundada sob posturas iluministas, se tornando os herdeiros do iluminismo histórico no país e sendo os responsáveis por desenvolver tal herança, tanto para essa quanto para as gerações seguintes. Os humanistas, como o nome indica, são mais empiristas e menos espirituais; são geralmente associados a cientistas e acadêmicos, embora a filosofia não se limite a esses grupos. Têm preocupação com a ética e afirmam a dignidade do ser humano, recusando explicações transcendentais e preferindo o racionalismo. Geralmente são humanistas os deístas, panteístas, agnósticos, ignósticos ou ainda ateus. 

Humanismo cristão: o humanismo cristão, também chamado de religiosismo, é uma corrente em que a liberdade e o individualismo humanos são partes intrínsecas (naturais), ou pelo menos compatíveis com, a doutrina e a prática cristãs. É uma união filosófica de princípios cristãos e humanistas. Humanismo renascentista: o humanismo renascentista propõe o antropocentrismo. O antropocentrismo era a ideia de "o homem ser o centro do pensamento filosófico", ao contrário do teocentrismo, a ideia de "Deus no centro do pensamento filosófico". O antropocentrismo surgiu a partir do renascimento cultural. Humanismo positivista: o humanismo positivista comtiano afirma o ser humano e rejeita a teologia e a metafísica. A forma mais profunda e coerente do humanismo comtiano é sua vertente religiosa, ou seja, a Religião da Humanidade, que propõe a substituição moral, filosófica, política e epistemológica das entidades supranaturais (os deuses ou as entidades abstratas da metafísica) pela concepção de Humanidade. Além disso, afirma a historicidade do ser humano e a necessidade de uma percepção totalizante do homem, ou seja, que o perceba como afetivo, racional e prático ao mesmo tempo. 34


Humanismo logosófico: o humanismo logosófico propõe, ao ser humano, a realização de um processo de evolução que o leve a superar suas qualidades até alcançar a excelência de sua condição humana. González Pecotche afirma que o humanismo logosófico "parte do próprio ser sensível e pensante, que busca consumar, dentro de si, o processo evolutivo que toda a humanidade deve seguir. Sua realização nesse sentido haverá, depois, de fazer, dele, um exemplo real daquilo que cada integrante da grande família humana pode alcançar". Humanismo marxista: o humanismo marxista é a linha interpretativa de textos de Karl Marx, geralmente oposta ao materialismo dialético de Friedrich Engels e de outras linhas de interpretação que entendem o marxismo como ciência da economia e da história. É baseado nos manuscritos da adolescência de Marx, nos quais ele critica o idealismo hegeliano que apresenta a história da Humanidade como realização do espírito. Para Marx, o Homem é antes de tudo parte da Natureza mas, diferentemente de Feuerbach, considera que o ser humano possui uma característica que lhe é particular, a consciência - que se manifesta como saber. Segundo Salvatore Puledda, em Interpretaciones del Humanismo, "através de sua atividade consciente o ser humano se objetiva no mundo natural, aproximando-o sempre mais de si, fazendo-o cada vez mais parecido com ele: o que antes era simples natureza, agora se transforma em um produto humano. Portanto, se o homem é um ser natural, a natureza é, por sua vez, natureza humanizada, ou seja, transformada conscientemente pelo homem." Humanismo universalista: o humanismo universalista do Movimento Humanista possui como um dos principais valores o de ser internacionalista, aspira uma nação humana universal, porém não quer um mundo uniforme, mas sim um mundo múltiplo, múltiplo em etnias, línguas e costumes; múltiplos nas crenças, no ateísmo e na religiosidade; o humanismo universalista não quer dirigentes nem chefes, nem ninguém que se sinta representante de nada. Outro valor de suma importância pertencente ao humanismo universalista é a não-violência ativa como meio de atuação no mundo. O fundador desta vertente humanista (Mario Rodrigues Luis Cobos) diz: "Nada acima do ser humano e nenhum humano abaixo de outro". Humanistas notórios: Giannozzo Manetti, Marsílio Ficino, Erasmo de Roterdão, Guilherme de Ockham, Carlos Bernardo González Pecotche, Francesco Petrarca, François Rabelais, Giovanni Pico della Mirandola, Thomas More, Andrea Alciato, Auguste Comte.

Secularismo O secularismo é o princípio da separação entre instituições governamentais e instituições religiosas. Em certo sentido, o secularismo pode afirmar o direito de ser livre do jugo do ensinamento religioso, bem como o direito à liberdade da imposição governamental de uma religião sobre o povo dentro de um estado que é neutro em matéria de crença. (ver também Separação Igreja-Estado.) Em outro sentido, refere-se à visão de que as atividades humanas e as decisões, especialmente as políticas, devem ser imparciais em relação à influência religiosa. Alguns estudiosos argumentam que a própria ideia do secularismo tende a mudar. O secularismo desenha suas raízes intelectuais em filósofos gregos e romanos, como Marco Aurélio e Epicuro, polímatas medievais muçulmanos, como Averróis, pensadores iluministas, como Denis Diderot, Voltaire, Bento de Espinoza, John Locke, James Madison, Thomas Jefferson e Thomas Paine e livres-pensadores modernos, agnósticos e ateus, como Bertrand Russell e Robert Ingersoll. Os propósitos e argumentos em apoio ao secularismo variam amplamente. No laicismo europeu, tem-se argumentado que o secularismo é um movimento em direção à modernização, longe de valores religiosos tradicionais (também conhecido como "secularização"). Este tipo de secularismo, em nível social ou filosófico, tem frequentemente ocorrido, mantendo-se uma igreja oficial do Estado ou apoiando oficialmente uma religião. Nos Estados Unidos, alguns argumentam que o Estado seculartem servido, em uma maior medida, para proteger a religião da interferência governamental, enquanto o secularismo em um nível social é menos prevalente. Diferentes países, bem como diferentes movimentos políticos, apoiam o secularismo por razões variadas. Segundo o sociólogo Boaventura de Sousa Santos, atualmente é feita a distinção entre secularismo e secularidade. Secularismo, segundo ele, é mais radical. Implica restringir a religião ao espaço privado exclusivamente. Já a secularidade supõe a permissão das expressões religiosas no espaço público como afirmação da própria liberdade de todos os cidadãos.

Iluminismo 35


O Iluminismo, também conhecido como século das luzes e ilustração, foi um movimento intelectual e filosófico que dominou o mundo das ideias na Europa durante o século XVIII, "O Século da Filosofia". O Iluminismo incluiu uma série de ideias centradas na razão como a principal fonte de autoridade e legitimidade e defendia ideais como liberdade, progresso, tolerância, fraternidade, governo constitucional e separação Igreja-Estado. Na França, as doutrinas centrais dos filósofos do Iluminismo eram a liberdade individual e a tolerância religiosa em oposição a uma monarquia absoluta e aos dogmas fixos da Igreja Católica Romana. O Iluminismo foi marcado por uma ênfase no método científico e no reducionismo, juntamente com o crescente questionamento da ortodoxia religiosa - uma atitude capturada pela frase Sapere aude (em português: "Atreva-se a conhecer" . Os historiadores franceses tradicionalmente colocam o período do Iluminismo entre 1715 (o ano em que Luís XIV morreu) e 1789 (o início da Revolução Francesa). Alguns historiadores recentes, no entanto, defendem o período da década de 1620, com o início da Revolução Científica. Les philosophes (francês para "os filósofos") do período circularam amplamente suas ideias através de encontros em academias científicas, lojas maçônicas, salões literários, cafés e em livros impressos e panfletos. As idéias do Iluminismo minaram a autoridade da monarquia e da Igreja e prepararam o caminho para as revoluções políticas dos séculos XVIII e XIX. Uma variedade de movimentos do século XIX, incluindo o liberalismo e o neoclassicismo, rastreiam a sua herança intelectual ao Iluminismo. Iluminismo é um conceito que sintetiza diversas tradições filosóficas, sociais, políticas, correntes intelectuais e atitudes religiosas. Pode-se falar mesmo em diversos "microiluminismos", diferenciando especificidades temporais, regionais e de matiz religioso, como nos casos de "iluminismo tardio", "iluminismo escocês" e "iluminismo católico". O iluminismo é, para sintetizar, uma atitude geral de pensamento e de ação. Os iluministas admitiam que os seres humanos estão em condição de tornar este mundo um lugar melhor mediante introspecção, livre exercício das capacidades humanas e engajamento político-social. Immanuel Kant, como resposta à questão "O que é o iluminismo?", descreveu, de maneira lapidar, a mencionada atitude: “

O iluminismo representa a saída dos seres humanos de uma tutelagem que estes mesmos se impuseram a si. Tutelados são aqueles que se encontram incapazes de fazer uso da própria razão independentemente da direção de outrem. É-se culpado da própria tutelagem quando esta resulta não de uma deficiência do entendimento mas da falta de resolução e coragem para se fazer uso do entendimento independentemente da direção de outrem. Sapere aude! Tem coragem para fazer uso da tua própria razão! - esse é o lema do iluminismo.

A FILOSOFIA MODERNA A filosofia moderna é toda a filosofia desenvolvida na chamada Era Moderna, entre o século XV (englobando os períodos finais da Renascença) e o século XIX. Tendo em vista o surgimento de novas ciências na época, a filosofia moderna tem como característica marcante o retorno da epistemologia (ramo filosófico que estuda a relação entre o ser humano e o conhecimento) como um dos aspectos centrais do período. Com o forte desenvolvimento de novas ciências como astronomia, matemática e física, os pensamentos e crenças na Europa migraram gradativamente do teocentrismo (Deus como centro do mundo) para o antropocentrismo (o homem como centro do mundo), resultando diretamente na diminuição do poder da Igreja Católica. Essas mudanças de paradigmas, somadas aos grandes eventos da época (Grandes Navegações, fim do feudalismo, Reforma Protestante, etc), produziram o contexto histórico ideal para o surgimento de ideias revolucionárias que se afastaram da filosofia renascentista. Assim, a filosofia moderna consiste em uma combinação de novas abordagens filosóficas com a rejeição de preceitos religiosos antigos. Vale mencionar que não existe consenso sobre o período exato em que a Renascença termina e a filosofia moderna se inicia. Por esse motivo, é comum que determinadas ideias ou filósofos sejam, por vezes, classificados como renascentistas e por outras, como modernos. No entanto, grande parte dos estudiosos atribui o início da filosofia moderna aos pensamentos de René Descartes, no século XVI.

René Descartes (1596– 1650)

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Foi um filósofo, físico e matemático francês. Durante a Idade Moderna, também era conhecido por seu nome latino Renatus Cartesius. Notabilizou-se sobretudo por seu trabalho revolucionário na filosofia e na ciência, mas também obteve reconhecimento matemático por sugerir a fusão da álgebra com a geometria - fato que gerou a geometria analítica e o sistema de coordenadas que hoje leva o seu nome. Por fim, foi também uma das figuras-chave na Revolução Científica. Descartes, por vezes chamado de "o fundador da filosofia moderna" e o "pai da matemática moderna", é considerado um dos pensadores mais importantes e influentes da História do Pensamento Ocidental. Inspirou contemporâneos e várias gerações de filósofos posteriores; boa parte da filosofia escrita a partir de então foi uma reação às suas obras ou a autores supostamente influenciados por ele. Muitos especialistas afirmam que, a partir de Descartes, inaugurou-se o racionalismo da Idade Moderna.Décadas mais tarde, surgiria nas Ilhas Britânicas um movimento filosófico que, de certa forma, seria o seu oposto - o empirismo, com John Locke e David Hume. O pensamento de Descartes é revolucionário para uma sociedade feudalista em que ele nasceu, onde a influência da Igreja ainda era muito forte e quando ainda não existia uma tradição de "produção de conhecimento". Aristóteles tinha deixado um legado intelectual que o clero se encarregava de . Foi um dos precursores do movimento racional-científico, considerado o pai do racionalismo, e defendeu a tese de que a dúvida era o primeiro passo para se chegar ao conhecimento. Descartes viveu em uma época marcada pelas guerras religiosas entre protestantes e católicos na Europa - a Guerra dos Trinta Anos. Viajou muito e viu que sociedades diferentes têm crenças diferentes, mesmo contraditórias. Aquilo que em uma região é tido por verdadeiro também pode ser considerado ridículo, disparatado e falso em outros lugares. Descartes viu que os "costumes", a história de um povo, sua tradição "cultural" influenciam a forma como as pessoas veem e pensam aquilo em que acreditam.

O primeiro pensador modern Descartes é considerado o primeiro filósofo moderno. A sua contribuição à epistemologia é essencial, assim como às ciências naturais por ter estabelecido um método que ajudou no seu desenvolvimento. Descartes criou, em suas obras Discurso sobre o método e Meditações - a primeira escrita em francês, a segunda escrita em latim, língua tradicionalmente utilizada nos textos eruditos de sua época - as bases da ciência contemporânea. O método cartesiano consiste no ceticismo metodológico - que nada tem a ver com a atitude cética: duvida-se de cada ideia que não seja clara e distinta. Ao contrário dos gregos antigos e dos escolásticos, que acreditavam que as coisas existem simplesmente porque "precisam" existir, ou porque assim deve ser etc., Descartes instituiu a dúvida: só se pode dizer que existe aquilo que puder ser provado, sendo o ato de duvidar indubitável. Baseado nisso, Descartes busca provar a existência do próprio eu (que duvida: portanto, é sujeito de algo. Ego cogito ergo sum, "penso, logo existo") e de Deus. Também consiste o método de quatro regras básicas:    

Verificar se existem evidências reais e indubitáveis acerca do fenômeno ou coisa estudada; Analisar, ou seja, dividir ao máximo as coisas, em suas unidades mais simples e estudar essas coisas mais simples; Sintetizar, ou seja, agrupar novamente as unidades estudadas em um todo verdadeiro; Enumerar todas as conclusões e princípios utilizados, a fim de manter a ordem do pensamento.

Em relação à Ciência, Descartes desenvolveu uma filosofia que influenciou muitos, até ser superada pela metodologia de Newton. Ele sustentava, por exemplo, que o universo era pleno e não poderia haver vácuo. Acreditava que a matéria não possuía qualidades secundárias inerentes, mas apenas qualidades primárias de extensão e movimento. Ele dividia a realidade em res cogitans (consciência, mente) e res extensa (matéria). Acreditava também que Deus criou o universo como um perfeito mecanismo de moção vertical e que funcionava deterministicamente sem intervenção desde então. Matemáticos consideram Descartes muito importante por sua descoberta da geometria analítica. Antes de Descartes, a geometria e a álgebra apareciam como ramos completamente separados 37


da matemática. Descartes mostrou como traduzir problemas de geometria para a álgebra, abordando esses problemas através de um sistema de coordenadas. A teoria de Descartes forneceu a base para o cálculo de Isaac Newton e Gottfried Leibniz, e então, para muitos outros da matemática moderna. Isso parece ainda mais incrível tendo em mente que esse trabalho foi intencionado apenas como um exemplo no seu "Discurso Sobre o Método".

Teoria do ato de reflex Pela linha de raciocínio mecânica da anatomia, Descartes observava que alguns robôs, na época criados para entreter as pessoas, tinham seus movimentos realizados através de canos por onde passava água sob pressão, fazendo com que as partes móveis dos robôs (pernas, braços e cabeça) ganhassem movimentos que imitavam o do ser humano. Porém, percebeu que, mesmo parecendo um movimento humano, os robôs apenas se movimentavam por causa da água que circulava em seus tubos, não sendo resultado da ação voluntária da máquina. Assim, o ser humano é algo muito mais complexo do que movimentos, podendo executar ações independente de sua vontade. Essa questão fez com que Descartes elaborasse a idéia do undulatio reflexa, modernamente conhecida como teoria do ato de reflexo, segundo a qual um estímulo externo pode gerar um movimento corporal que não depende da vontade do sujeito, como por exemplo, a perna se mover quando um médico bate no joelho com um pequeno martelo (reflexo patelar). Por essa teoria, o comportamento reflexo não envolve pensamento

Filosofia do século XVII A Filosofia do século XVII é, no ocidente, considerada como a visão do princípio da filosofia moderna, e o distanciamento do pensamento medieval, especialmente da Escolástica. Frequentemente é chamada de "idade da razão" e é considerada a sucessora da renascença e precedente do iluminismo. Alternativamente, ela pode ser vista como uma visão prévia do Iluminismo.

Filosofia do século XVIII O Iluminismo ou filosofia do século XVIII foi, um movimento filosófico do século XVIII na Europa e em alguns países americanos, e nos seus mais distantes períodos também inclui a Idade da razão.O termo pode se referir simplesmente ao movimento intelectual do Iluminismo que defendia a razão como base primária da autoridade. Desenvolvida na França, Grã-Bretanha e Alemanha, o seu círculo de influências também incluíram a Austria, Itália, os Países Baixos, Polônia, Rússia, Escandinávia, Espanha e em fato, toda a Europa. Muitos dos Fundadores dos Estados Unidos foram fortemente influenciados pelas ideias iluministas, principalmente na esfera religiosa (Deísmo) e, paralelamente com o Liberalismo Clássico, na esfera política (que teve grande influência na Carta de diretos, em paralelo com a Declaração de direitos do Homem e do Cidadão). O período do iluminismo geralmente encerra-se entre os anos de 1800, e o começo das Guerras napoleônicas (1804-1815).

Montesquieu (1689-1755)

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 Montesquieu defendia a divisão do poder em três: o Poder Executivo (órgão responsável pela administração do

território e concentrado nas mãos do monarca ou regente); o Poder Legislativo (órgão responsável pela elaboração das leis e representado pelas câmaras de parlamentares); o Poder Judiciário(órgão responsável pela fiscalização do cumprimento das leis e exercido por juízes e magistrados).  Era a favor da Monarquia Parlamentar. Outra importante teoria de Montesquieu trata das relações das formas de Governo e seus princípios, segundo o autor as formas seriam as seguintes:  República - Democracia (Princípio–Patriotismo) *Formas de Governo  Aristocracia(Princípio–Moderação)  Monarquia (Princípio-Honra)  Despotismo(Princípio – Terror) Montesquieu atribuiu mais algumas classificações a estas formas de governo, tais como: *Formas Puras:  Monarquia: Governo de um só (Princípio-Honra)  Aristocracia: Governo de vários  Democracia: Governo do povo (Princípio-Virtude) *Formas Impuras:  Tirania: Corrupção da Monarquia  Oligarquia: Corrupção da Aristocracia  Demagogia: Corrupção da Democracia Montesquieu elaborou uma teoria política, que apareceu na sua obra mais famosa, o O Espírito das Leis (L'Esprit des lois, 1748). "O Espírito das Leis" analisa de maneira extensa e profunda os fatos humanos com um rigoroso esboço de interpretação do mundo histórico, social e político. A pertinência das observações e a preocupação com o método permitem encontrar no seu trabalho elementos que prenunciam uma análise sociológica. Eis algumas das principais ideias de Montesquieu expressas nesta obra tão importante:  As leis escritas ou não, que governam os povos, não são fruto do capricho ou do arbítrio de quem legisla. Ao contrário, decorrem da realidade social e da História concreta própria ao povo considerado. Não existem leis justas ou injustas. O que existe são leis mais ou menos adequadas a um determinado povo e a uma determinada circunstância de época ou lugar. O autor procura estabelecer a relação das leis com as sociedades, ou ainda, com o espírito dessas. O que Montesquieu descreve como espírito geral de uma sociedade aparece como resultante de causas físicas (o clima), causas morais (costumes, religião…) e das máximas de um governo (ARON, R.). Modernamente, seria o que chamamos vulgarmente de uma identidade nacional que se constitui conforme os fatores citados acima. As máximas anteriormente descritas dizem respeito aos, segundo o próprio autor, tipos e conceitos que dariam conta daquilo que as causas não abrangem. Seriam por conseguinte o princípio (o que põe os governos em movimento, o princípio motor em linguagem filosófica, constituído pelas paixões e necessidades dos homens) e a natureza(aquilo que faz um governo ser o que é, determinado pela quantidade daqueles que detêm a soberania) de um governo. Ao procurar descobrir as relações que as leis têm com a natureza e o princípio de cada governo, Montesquieu desenvolve uma alentada teoria de governo que alimenta as ideias fecundas do constitucionalismo, pelo qual se busca distribuir a autoridade por meios legais, de modo a evitar a violência e o abuso de poder de alguns. Tais ideias se encaminham para uma melhor definição da separação dos poderes, ainda hoje uma das pedras angulares do exercício do poder democrático. Montesquieu admirava a constituição inglesa, mesmo sem compreendê-la completamente, e descreveu cuidadosamente a separação dos poderes em Executivo, Judiciário e Legislativo, trabalho que influenciou os elaboradores da Constituição dos Estados Unidos da América. O poder legislativo, convocado pelo executivo, deveria ser separado em duas casas: o corpo dos comuns, composto pelos representantes do povo, e o corpo dos nobres, formado por nobres, hereditário e com a faculdade de impedir (vetar) as decisões do corpo dos comuns. Essas duas casas teriam assembleias e deliberações separadas, assim como interesses e opiniões independentes. Refletindo 39


sobre o abuso do poder real, Montesquieu conclui que "é preciso que o poder limite o poder" daí a necessidade de cada poder manter-se autônomo e constituído por pessoas e grupos diferentes. É bem verdade que a proposta da divisão dos poderes ainda não se encontra em Montesquieu com a força que costumou-se posteriormente a atribuir-lhe. Em outras passagens de sua obra, ele não defende uma separação tão rígida, pois o que ele pretendia de fato era realçar a relação de forças e a necessidade de equilíbrio e harmonia entre os três poderes. Montesquieu não era um revolucionário. Sua opção social ainda era por sua classe de origem, a nobreza. Ele sonhava apenas com a limitação do poder absoluto dos reis, pois era um conservador, que queria a restauração das monarquias medievais e o poder do Estado nas mãos da nobreza. As convicções de Montesquieu refletem-se à sua classe e portanto o aproximam dos ideais de uma aristocracia liberal. Ou seja, ele critica toda a forma de despotismo, mas não aprecia a ideia de o povo assumir o poder. A sua crítica, no entanto, serviu para desencadear a Revolução Americana e instaurar a república burguesa.

Das leis em suas relações com os diversos seres A lei é natural dos seres, própria deles. A lei deriva da natureza das coisas e não do arbítrio (vontade) de um, qual seja a crítica ao sistema hobbesiano. É em virtude disso que devemos ter em mente que o barão de La Brède foi sem dúvida um dos pensadores mais renomados e um articulador de ideias ricas de esplendor e princípios éticos e moraisembasados no cotidiano de sua época, e com conhecimentos úteis para o tempo presente. Montesquieu foi o proclamador do Direito em virtude, e com a sua formação e inteligência propôs divisões para o Direito em sua essência principal, que nada mais é que prender-se à igualdade e liberdade de cada cidadão.

O juiz não pode criar leis Como já foi acima mencionado, "o Espírito das Leis" de Montesquieu defende a divisão do poder público em três poderes, inspirado no sistema político constitucional da Inglaterra quando de sua viagem. Essa separação, segundo o autor, é essencial para que haja a liberdade do cidadão em se sentir seguro perante o Estado e perante outro cidadão, pois se fosse dado a mais de um desses poderes o poder de legislar e ao mesmo tempo julgar essa medida seria extremamente autoritária e arbitrária perante o cidadão que estaria praticamente indefeso, ou seja, estaria a mercê de um juiz legislador. Montesquieu diz claramente que: "Não haverá também liberdade se o poder de julgar não estiver separado do poder legislativo e do executivo, não existe liberdade, pois pode-se temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado apenas estabeleçam leis tirânicas para executá-las tiranicamente". Ainda completa: "O poder de julgar não deve ser outorgado a um senado permanente, mas exercido por pessoas extraídas do corpo do povo, num certo período do ano, de modo prescrito pela lei, para formar um tribunal que dure apenas o tempo necessário.".

Caracterização geral da democracia Como dito anteriormente, Montesquieu compreende a democracia como uma forma de governo republicano. Nesse sentido, o filósofo pensa o governo republicano como " (...) aquele no qual o povo em seu conjunto, ou apenas uma parte do povo, possui o poder soberano". Assim, diferenciando, respectivamente, democracia de aristocracia. O papel do povo no governo republicano democrático se constitui como soberano e súdito ao mesmo tempo. A sua soberania está diretamente ligada ao poder de suas vontades, sufrágio. Em consequência a isso, as leis que regulam esse tipo de governo são primordiais porque regulamentam como, porque e para quem os sufrágios devem ser direcionados. No terceiro capítulo do livro três do espírito das leis Montesquieu afirma que o motor do estado democrático é a virtude, "o amor a república; é um sentimento, e não uma série de conhecimentos ". Assim, compreendendo que quem executa as leis deve sentir-se submetido as próprias leis. Por isso, diferencia a democracia da monarquia. Em um estado monárquico, aqueles que executam as leis se posicionam acima delas. Por essa razão, em um estado democrático as leis devem ser executadas com a finalidade de manutenção do bem comum, caso contrário, tal estado precisará ser dissolvido. Em adição à isso, o autor 40


explica que os indivíduos devem se entregar menos a satisfação dos desejos individuais e focarem na realização das vontades gerais de todos, assim, fortalecendo sua perspectiva democrática. Para o filósofo, o amor à república está diretamente ligado ao amor à democracia e esta, ao amor à igualdade. Por isso, cada indivíduo dentro de um sistema democrático deve possuir as mesmas vantagens, mesmo prazeres e esperanças. Contudo, o amor à igualdade não se restringe a um único modelo de felicidade ou desejo. Nesse sentido, os cidadãos não precisam prestar os mesmos serviços à sociedade, mas deverão executar alguma atividade.

Corrupção da democracia Montesquieu afirma que a corrupção total de qualquer modelo de governo se deve à corrupção de seus princípios basilares. Desse modo, a democracia se corrompe quando o princípio da igualdade é abandonado, violado ou levado ao extremo. Já que, qualquer indivíduo desejaria ser igual àqueles que escolheu para comandá-lo. Portanto, diz Montesquieu: "A partir deste momento, o povo, não podendo suportar o próprio poder que delegou, quer fazer tudo sozinho, deliberar pelo senado, executar pelos magistrados e despojar todos os juízes ". A consequência desse excesso é que os magistrados perdem sua respectiva autoridade, passando a não ser respeitados. Os senadores não são mais respeitados, os velhos também deixam de ser e, consequentemente, também acaba o respeito pelos pais. Somado a isso, a corrupção do povo a partir da igualdade extremada, aumenta quando os magistrados, também corrompidos, escondem sua respectiva corrupção ocultando sua ambição através do elogio da força e grandeza do povo. O principal objetivo do povo corrompido é o ‘tesouro público’, visto que, esse dinheiro servirá para o sustento do luxo e ‘preguiça’ desse mesmo povo. até a eleição pode ser comprada por dinheiro, assim, o povo corre o grave risco de perder mais do que, aparentemente, ganha. As vantagens alcançadas através da liberdade proporcionada pela corrupção pode ser perdida com o surgimento de um tirano que possuirá a reunião de todas as corrupções.

Citações             

A religião é menos um tema de santificação do que um tema de discussões que pertence a todos" "A subtileza do pensamento consiste em descobrir a semelhança das coisas diferentes e a diferença das coisas semelhantes" "Recebemos três educações diferentes: a dos nossos pais, a dos nossos mestres e a do mundo. O que aprendemos nesta última, destrói todas as ideias das duas primeiras" "Nas mulheres jovens, a beleza supre o espírito. Nas velhas, o espírito supre a beleza" "As leis, no sentido mais amplo, são as relações necessárias que derivam da natureza das coisas" "Quando vou a um país, não examino se há boas leis, mas se as que lá existem são executadas, pois boas leis há por toda a parte" "As viagens dão uma grande abertura à mente: saímos do círculo de preconceitos do próprio país e não nos sentimos dispostos a assumir aqueles dos estrangeiros" "Quanto menos os homens pensam, mais eles falam" "A pessoa que fala sem pensar, assemelha-se ao caçador que dispara sem apontar." "Para se tornar verdadeiramente grande, é preciso estar ao lado das pessoas, e não acima delas." "Leis inúteis enfraquecem as leis necessárias." "Defenderei sempre o direito de discordarem de mim." "Só o poder freia o poder." [O Espírito das Leis, Livro XI, Capítulo IV]

Jean Bodin (1530-1596) Teorias de Jean Bodin

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Bodin foi um grande pensador da área da economia e da política. Em sua obra mais emblemática “A República” (dividida em 6 volumes) abordou temas relacionados ao Estado, tipos de governo e de justiça, além do poder e da religião. Idealizou o sistema absolutista e estimulou o desenvolvimento do conceito moderno de soberania (força de coesão social) em sua obra “A República”, na qual defende o conceito de um soberano perpétuo e absoluto inserido no sistema da Monarquia. Além da monarquia, o tipo de governo defendido por ele, refletiu também sobre a democracia e a aristocracia, onde a soberania da primeira seria exercida pelo povo, e da segunda, pela classe dominante. Para o filósofo, a monarquia não podia ser confundida com a tirania, uma vez que se o governo não fosse democrático não poderia ser totalmente absolutista, salientando assim, a importância das liberdades e das propriedades materiais. Nas palavras de Bodin: “O Monarca, desprezando as leis da natureza, abusa das pessoas livres como de escravos, e dos bens dos súditos como dos seus (...) quanto às leis divinas e naturais, todos os princípios da terra estão sujeitos, e não está em seu poder transgredi-las.” Para Bodin, a anarquia seria a pior forma encontrada para a desordem da sociedade e por outro lado, a ordem somente seria conquistada por um Estado forte e soberano. Nesse caso, esse soberano (rei ou príncipe) representaria a imagem de Deus. Em resumo, na teoria que ficou conhecida como o “Direito Divino dos Reis”, Jean Bodin acreditava que a soberania absoluta deveria se concentrar numa só figura.

Posições políticas Jean Bodin apresentou o poder soberano como a condição indispensável para a instituição de uma sociedade política, já que os outros elementos não seriam suficientes para assegurar um Estado soberano. Estes elementos seriam três: 1. A justiça: elemento que diferenciaria a república de uma sociedade comandada por piratas e ladrões, por isso as relações seriam organizadas e justas. 2. A família: Bodin afirmava que esta era a origem da república, afinal o surgimento das sociedades políticas se deu a partir do agrupamento de várias famílias. Além disso, a estrutura familiar servia de exemplo para o desenvolvimento da república devido a suas claras relações de mando e obediência: o comando do marido sobre a esposa, do pai sobre os filhos e do senhor sobre os escravos. Essas relações revelariam que existe uma relação de poder próprio da condição humana. Por isso a imagem do chefe de família é comparável a imagem do poder soberano. 3. A necessidade de existir bens públicos entre as famílias em locais públicos, o que é fundamental para fortalecer os laços entre as famílias, mas sem cair em formas extremas de coletivismo, o que seria contrário ao direito natural de propriedade privada. Mas todas essas características fundamentais seriam insuficientes se não houvesse entre elas algo que assegurasse a união. Para isso era necessário o reconhecimento de uma só autoridade que exerceria o poder, a qual todos estivessem submetidos e que não fosse comandada por ninguém. Esse poder poderia residir em uma pessoa, em algumas ou em todo o povo, o que resulta nos seguintes modelos: monarquia, aristocracia e democracia. Bodin rejeitava a existência de um quarto modelo que viria da mistura dos outros três por meio da partilha da soberania, ele argumenta que isso levaria a destruição da soberania, já que a unidade de comando desapareceria.

Estado e governo 42


Bodin, por rejeitar a mistura dos três modelos, acreditava que existia um problema causado pela confusão entre Estado e governo. Assim, determinou Estado como designação das três maneiras de organização que uma república pode ter, baseada no número de pessoas que detém o poder soberano, ou seja, monarquia, aristocracia e democracia. Já o governo carrega a função de indicar a maneira como o poder é exercido: legítimo, despótico ou tirânico.

Prefácio: Os seis livros da república Bodin almejava uma forma perfeita de governo com a prosperidade material e formação intelectual que geraria um desenvolvimento espiritual dos súditos que, por fim, seria marcado por uma estrutura racional e absoluta. Sendo assim, desenvolvimento da república dependia da consolidação da ordem e da obediência das leis, pois um estado forte, baseados na ética judaico-cristã, necessitava de leis extremamente ordenadas e obedientemente seguidas. Portanto, uma sociedade cívica só existe quando todos os cidadãos são regidos pela mesma lei e, para a construção de um estado, é necessário o domínio de um soberano. Entre os poderes do soberano, legislar, mesmo sem a aprovação popular, seria o mais importante, porque os demais direitos são derivados deles, mas o poder pode ser delegado a magistraturas, desde que não haja uma transferência completa da tomada de decisões, e que todas passem pelo soberano. O príncipe, segundo o autor, ao exercer o governo, deve ser livre de cumprir as leis que estabeleceu, afinal ninguém pode ordenar a si mesmo. Também deve ser imune as leis de seus antecessores. Assim o soberano deve ter o poder de alterar as leis segundo a sua vontade. Apesar de ser soberano, o poder do príncipe não seria totalmente arbitrário e sem limites, estando constantemente sujeito as leis de Deus e da natureza, afinal são leis imutáveis, presentes em todos os povos. São essas leis que Bodin considerava fundamentais e deveriam permanecer acima de qualquer vontade particular, sem que nenhum líder político pudesse altera-las. Essas leis mantinham a sociedade longe do caos completo e, dentre elas, estava a lei Salica de sucessão do trono e a lei que proíbe a alienação dos domínios da coroa. O poder absoluto do soberano tinha limites segundo as leis que expressão a vontade de Deus, o bem da república e da soberania. Para Bodin, o monarca precisa alcançar, por meio da ordem, o estado eficiente que atende à três aspectos básicos: materiais, espirituais e mentais e, para alcançar tais aspectos, o soberano precisa ser absoluto e, também, manter a ordem no seu território. Além disso, o monarca jamais poderia ser combatido pelos seus próprios súditos. Bodin, portanto, visava à paz, à prosperidade, à formação cultural e espiritual em função da felicidade geral. Somente uma monarquia legítima faria um corpo único sólido e forte.

Jacques Bossuet (1627-1704)

Na mesma linha de pensamento estava Jacques Bossuet (1627-1704), teólogo francês e um dos maiores teóricos do absolutismo regido pelo Direito Divino dos Reis. Da mesma forma que Bodin, para Bousset, os reis eram considerados os enviados para exercer o poder de Deus na Terra.

Blaise Pascal (1623- 1662)

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A grande contribuição de Pascal para a filosofia da matemática veio com o seu De l'Esprit géométrique ("Do Espírito Geométrico"), originalmente escrito como um prefácio para um livro de geometria para um dos famosos "Petites écoles de Port-Royal" ("Escolinhas de Port-Royal"). O trabalho ficou inédito até mais de um século após sua morte. Aqui, Pascal estudou a questão da descoberta de verdades, argumentando que o ideal de um tal método seria encontrar todas as proposições sobre as verdades já estabelecidas. Ao mesmo tempo, no entanto, ele alegou que isso era impossível porque tais verdades estabelecidas exigiriam outras verdades para apoiá-las — os primeiros princípios, portanto, não podiam ser alcançadas. Com base nisso, Pascal argumentou que o procedimento utilizado em geometria era tão perfeito quanto possível, com alguns princípios assumidos e outras proposições desenvolvidas a partir deles. No entanto, não havia nenhuma maneira de saber se os princípios assumidos eram, de fato, verdade. Pascal também utilizou o De l'Esprit géométrique para desenvolver uma teoria da definição. Ele distingue entre as definições que são rótulos convencionais definidas pelo escritor e definições que estão dentro da linguagem e compreendidas por todos, pois naturalmente designam seu referente. O segundo tipo seria característica da filosofia do essencialismo. Pascal afirmou que apenas as definições do primeiro tipo são importantes para a ciência e a matemática, argumentando que esses campos devem adotar a filosofia do formalismo, tal como formulado por Descartes. No De l'Art de persuader ("Sobre a Arte da Persuasão"), Pascal estudou de forma mais profunda o método axiomático da geometria, especificamente a questão de como as pessoas vem a ser convencidas dos axiomas sobre os quais conclusões posteriores se baseiam. Pascal concordou com Montaigne que alcançar a certeza nestes axiomas e as conclusões através de métodos humanos é impossível. Ele afirmou que esses princípios só podem ser apreendidos através da intuição, e que este fato ressaltou a necessidade de submissão a Deus na busca de verdades. “O coração tem razões que a própria razão desconhece.” “A justiça sem a força é impotente, a força sem justiça é tirana.” “A consciência é o melhor livro de moral e o que menos se consulta.” “É o coração que sente Deus e não a razão.”

Thomas Hobbes (1588-1679) Foi um matemático, teórico político e filósofo inglês, autor de Leviatã (1651) e Do cidadão (1651). Na obra Leviatã, explanou os seus pontos de vista sobre a natureza humana e sobre a necessidade de um governo e de uma sociedade fortes. No estado natural, embora alguns homens possam ser mais fortes ou mais inteligentes do que outros, nenhum se ergue tão acima dos demais de forma a estar isento do medo de que outro homem lhe possa fazer mal. Por isso, cada um de nós tem direito a tudo e, uma vez que todas as coisas são escassas, existe uma constante guerra de todos contra todos (Bellum omnia omnes). No entanto, os homens têm um desejo, que é também em interesse próprio, de acabar com a guerra e, por isso, formam sociedades através de um contrato social. De acordo com Hobbes, tal sociedade necessita de uma autoridade à qual todos os membros devem render o suficiente da sua liberdade natural, de forma que a autoridade possa assegurar a paz interna e a defesa comum. Este soberano, quer seja um monarca ou uma assembleia (que pode, até mesmo, ser composta de todos, caso em que seria uma democracia), deveria ser o Leviatã, uma autoridade inquestionável. A teoria política do Leviatã mantém, no essencial, as ideias de suas duas obras anteriores, Os elementos da lei e Do cidadão (em que tratou a questão das relações entre Igreja e Estado). Thomas Hobbes defendia a ideia segundo a qual os homens só podem viver em paz se concordarem em submeter-se a um poder absoluto e centralizado. O Estado não pode estar sujeito às leis por ele criadas pois isso seria infringir sua soberania. Para ele, a Igreja cristã e o Estado cristão formavam um mesmo corpo, encabeçado pelo monarca, que teria o direito de interpretar as Escrituras, decidir questões religiosas e presidir o culto. Neste sentido, critica a livre interpretação da Bíblia na Reforma Protestante por, de certa forma, enfraquecer o monarca. Sua filosofia política foi analisada pelo cientista político Richard Tuck como uma resposta para os problemas que o método cartesiano introduziu para a filosofia moral. Hobbes argumenta que só podemos conhecer algo do mundo exterior a partir das impressões sensoriais que temos dele ("Só existe o que meus sentidos percebem"). Esta filosofia é vista como uma tentativa de embasar uma 44


teoria coerente de uma formação social puramente no fato das impressões em si, a partir da tese de que as impressões sensoriais são suficientes para o homem agir no sentido de preservar sua própria vida. A partir desse imperativo, Hobbes constrói toda sua filosofia política. Segundo Hobbes, o ser humano não nasce livre, pois somente podemos nos considerar realmente livres quando somos capazes de avaliar as consequências, boas ou más, das nossas ações. Hobbes ainda escreveu muitos outros livros falando sobre filosofia política e outros assuntos, oferecendo uma descrição da natureza humana como cooperação em interesse próprio. Foi contemporâneo de Descartes e escreveu uma das respostas para a obra Meditações sobre filosofia primeira, deste último.

A filosofia natural e moral de Thomas Hobbes Influenciado por grandes nomes como Francis Bacon e Galileu Galilei, Hobbes refutou a metafísica e buscou a causa e a propriedade das coisas. Assim, o ponto de partida da filosofia de Thomas Hobbes se dá com a física: ele acreditava que a filosofia é a ciência dos corpos, ou seja, tudo possui existência material, e, os corpos se dividiriam em corpos naturais (filosofia natural) e corpos artificiais (filosofia política). Dentre as principais características de seu empirismo, estão o materialismo (concepção de que tudo possui existência material, desprezando, portanto, a existência de seres imateriais) e o mecanicismo (concepção em que os fenômenos são explicados por causas mecânicas, ou seja, força e movimento), sendo estas ideias inerciais e antiteológicas. Em seus livros "Os elementos da lei" e "Leviatã", Hobbes torna evidente o uso da física e suas leis mecânicas como base para explicar fenômenos psíquicos [4] e físicos, chegando até mesmo a comparar o homem com uma máquina, além de fazer analogia à mecânica do homem e à mecânica do relógio: "O que é o coração, senão uma mola; os nervos, senão outras tantas cordas; e as juntas senão outras tantas rodas; imprimindo movimento ao corpo inteiro, tal como foi projetado pelo Artífice?" Porém é apenas em seu livro "De Corpore" que Thomas Hobbes demonstra-nos de forma total e estruturada o conhecimento mecânico da natureza, conhecimento este que se mostra consolidado apenas em "Tractatus opticus". Com isso, Hobbes conclui que o homem tende naturalmente a continuar em movimento, isto é, o valor primordial para cada indivíduo seria a conservação da vida, o crescimento e a afirmação de si mesmo. Assim, a explicação mecanicista que Hobbes dá ao processo de formação das escolhas, paixões e ações humanas fundamenta sua tese para o desejo de poder humano.

John Locke (1632-1704) Escreveu o Ensaio acerca do Entendimento Humano, onde desenvolve sua teoria sobre a origem e a natureza do conhecimento. Um dos objetivos de Locke é a reafirmação da necessidade do Estado e do contrato social e outras bases. Opondo-se à Hobbes, Locke acreditava que se tratando de Estado-natureza, os homens não vivem de forma bárbara ou primitiva. Para ele, há uma vida pacífica explicada pelo reconhecimento dos homens por serem livres e filosofia política de Locke fundamenta-se na noção de governo consentido, pelos governados, da autoridade constituída e o respeito ao direito natural do ser humano - à vida, à liberdade e à propriedade. Influencia, portanto, as modernas revoluções liberais: Revolução Inglesa, Revolução Americana e a fase inicial da Revolução Francesa, oferecendo-lhes uma justificação da revolução e da forma do novo governo. Locke costuma ser incluído entre os empiristas britânicos, ao lado de David Hume e George Berkeley, principalmente por sua obra relativa a questões epistemológicas. Em ciência política, costuma ser classificado na escola do direito natural ou jusnaturalismo.[2] Suas ideias ajudaram a derrubar o absolutismo na Inglaterra. Locke dizia que todos os homens, ao nascer, tinham direitos naturais - direito à vida, à liberdade e à propriedade. Para garantir esses direitos naturais, os homens haviam criado governos. Se esses governos, contudo, não respeitassem a vida, a liberdade e a propriedade, o povo tinha o direito de se revoltar contra eles. A falha do Estado de Natureza levam à tal invasão da propriedade e, devido a tal, cria-se um contrato social para que haja transição do Estado de Natureza à Sociedade Política. As pessoas podiam contestar um governo injusto e não eram obrigadas a aceitar suas decisões. Locke ainda diz que se o governo viola ou deixa de garantir o direito dos indivíduos à propriedade o povo tem o direito a resistência ao governo tirano. O que define a tirania é o exercício do poder para além do direito, visando o interesse e não o bem público ou comum. 45


Outra constante na obra de Locke é do papel dos poderes na organização do Estado, sendo o legislativo o poder supremo, sobrepondo-se ao executivo e federativo. Assim, há no Estado um poder limitado, pois quando esses órgãos criados pelo consentimento do povo falha no atendimento dos fins a que foram concebidos perdem a razão de ser, dando aos cidadãos o direito de revolução. Locke apresenta ainda o trabalho como o fundamento originário da propriedade, tendo o seu valor corrompido com a introdução do ouro e do comércio, gerando a distribuição desproporcional das riquezas entre os homens.

“O homem vive livre e em paz no seu estado de natureza” O contrato social, embora não se trate de um contrato físico histórico, como acontece com qualquer contrato, consistiria na transferência de poder dos indivíduos carecidos de proteção para um conjunto de instituições artificiais e avantajada de meios para punir os que violam a obediência a essas mesmas instituições. De forma generalizada, o contrato social é a relação entre o povo e seu governante. Há alguns pontos de contato entre o pensamento lockiano e hobbesiano. Primeiro na condição natural em que o homem vivia inicialmente e na sua passagem para organização social através do contrato social. Porém, distingue-se por caracterizar esse estado natural do homem como pacífico, sendo o homem nele plenamente livre. Enquanto Hobbes coloca o medo da morte violenta como fonte da organização dos homens, Locke impõe a defesa da propriedade como principal fonte de formação do Estado. Esta propriedade já existia anteriormente à formação do Estado. Dedicou-se também à filosofia política. No Primeiro Tratado sobre o Governo Civil, critica a tradição que afirmava o direito divino dos reis, declarando que a vida política é uma invenção humana, completamente independente das questões divinas. No Segundo Tratado sobre o Governo Civil, expõe sua teoria do Estado liberal e a propriedade privada, onde ele caracteriza a propriedade privada como tudo a que você atribui um valor e tenha conquistado por direito. É algo legítimo e todo indivíduo tem direito a tais conquistas, e assim como Locke sugeriu, o Estado teria uma função primordial de proteger esses direitos. Locke é considerado o protagonista do empirismo, o qual afirma que todo conhecimento e aprendizagem decorre da experiência. Ele apresenta uma crítica às ideias inatas através da teoria da tábula rasa... Com essa teoria Locke afirma que o ser humano nasce uma “folha em branco”, e é moldado pelas experiências, tentativas e erros. Então de acordo com Locke o Empirismo busca compreender as coisas de uma forma metodológica, sistemática e crítica. Esse pensamento apresentado por Locke se assemelha ao do pensador Nicolau Maquiavelquando o mesmo se refere a Verità effetuale (Verdade Efetiva das Coisas), que se trata de analisar as coisas como elas realmente são. No Ensaio acerca do Entendimento Humano (An Essay concerning Human Understanding), de 1690, Locke defende que a experiência é a fonte do conhecimento, que depois se desenvolve por esforço da razão. A tolerância não se aplicava tampouco as camadas que detinham menos recursos econômicos, para às quais Locke defendia algumas medidas severas, tais como:  Direcionar para o trabalho as crianças a partir de três anos, das famílias que não têm condições para alimentá-las.  Supressão das vendas de bebidas não estritamente indispensáveis e das tabernas não necessárias.  Obrigar os mendigos a carregar um distintivo obrigatório, para vigiá-los, por meio de um corpo de espantadores de mendigos, e impedir que possam exercer sua atividade fora das áreas e horários permitidos.  Os que forem surpreendidos a pedir esmolas fora de sua própria paróquia e perto de um porto de mar devem ser embarcados coercitivamente na marinha militar, outros pedintes abusivos devem ser internados em uma casa de trabalhos forçados, na qual o diretor não terá outra remuneração além da renda decorrente do trabalho dos internados.  Os que falsificarem um salvo-conduto para fugir de uma casa de trabalho, devem ser punidos com um corte de orelhas e, na hipótese de reincidência, com a deportação para as plantações, na condição de criminosos.

DAVID HUME (1711-1776)

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O problema da causalidade Hume é conhecido por aplicar o padrão de que não há ideias inatas e que todo o conhecimento vem da experiência rigorosamente ao nexo de causalidade e necessidade. Em vez de tomar a noção de causalidade como normalmente concedido, Hume desafia-nos a considerar o que a experiência nos permite saber sobre causa e efeito. Normalmente, quando um evento provoca um outro evento, a maioria das pessoas pensa que estamos conscientes de uma "causa" em conexão entre os dois que faz com que o segundo siga o primeiro. Hume mostra que a experiência não nos diz muito. De dois eventos, A e B, dizemos que A causa B, quando os dois sempre ocorrem conjuntamente, ou seja, são constantemente conjugados. Sempre quando encontramos A, também encontramos B ligado a ele , e temos a certeza de que este conjunto vai continuar a acontecer. Quando ficamos convencidos de que "A deve trazer B" é equivalente meramente "Devido à sua conjunção constante, estamos psicologicamente certo que B seguirá A", então ficamos com uma noção muito fraca de necessidade. Este tênue sobre a eficácia causal ajuda a dar origem a um problema da indução - que não estamos razoavelmente justificada em fazer qualquer inferência indutiva sobre o mundo. As contribuições mais importantes de Hume à filosofia de causalidade são encontrados no Tratado da Natureza Humana, e Investigação sobre o entendimento Humano, este último, geralmente visto como uma reformulação parcial do primeiro. Ambas as obras começam com o axioma empírico central de Hume conhecido como "o princípio de cópia" ]. Vagamente, ele afirma que todos os componentes de nossos pensamentos provêm de experiência e não existe uma causa entre um evento A e um evento B, consequentemente, Hume nota que, com isso, não estamos justificados racionalmente em projetar para o futuro as regularidades do passado (porque não temos uma prova do princípio de uniformidade).

O problema da indução De fato o termo indução não aparece no argumento de Hume - nem no Tratado da Natureza Humana, nem na Investigação. A preocupação de Hume é com as inferências que se fazem nas conexões causais, as quais, segundo ele, são as únicas conexões "que podem nos levar além das impressões imediatas da memória e dos sentidos" (TNH, 89). No entanto, a diferença entre essas inferências e o que hoje conhecemos como indução é mera questão de terminologia. Hume divide todos os raciocínios em demonstrativos (no sentido de dedutivos), e probabilísticos, referindo-se à generalização, por indução, de um raciocínio do tipo causa-efeito. Todos nós cremos que o passado é um guia confiável para o futuro. Por exemplo: as leis da física descrevem como as órbitas celestes funcionam para a descrição do comportamento planetário até aos dias de hoje. Desse modo presumimos que vão funcionar para a descrição no futuro também. Mas como podemos justificar esta presunção, o princípio da indução? Hume sugeriu duas justificações possíveis e rejeitou ambas. A primeira justificativa é que, por razões de necessidade lógica, o futuro tem de ser semelhante ao passado. Porém, Hume nota que podemos conceber um mundo errático e caótico onde o futuro não tem nada que ver com o passado ou então um mundo tal como o nosso até ao presente, até que em certo ponto as coisas mudam completamente. A segunda justificação, mais modestamente, apela apenas para a segurança passada da indução: sempre funcionou assim, por isso é provável que continue a funcionar. No entanto, como Hume lembrou, esta justificação apenas usa um raciocínio circular, justificando a indução por um apelo que requer a indução para ter efeito. O conhecimento seria, na prática, resultado do hábito e, este, por sua vez, seria derivado de um processo inerente à natureza humana, de associar dois fenômenos independentes, vinculando-os em termos de causalidade, por se terem mostrado de maneira encadeada diante dos nossos sentidos. O argumento de Hume implica a impossibilidade do fazer científico, entendendo-se ciência como saber irrefutável. Já no século XX, Karl Popper retoma o que ele chama de "o problema de Hume". Popper concorda que "o mecanismo psicológico da associação força tais pessoas a acreditarem, por costume ou hábito, que aquilo que aconteceu no passado acontecerá no futuro" mas procura separar o que considera válido daquilo que seria equivocado na proposta de Hume, procurando restaurar o status da ciência como forma de conhecimento racional. Argumentando em favor de um empirismo racionalista crítico, sem o menor espaço para a indução, Popper destaca a característica essencial da ciência, a saber, a falseabilidade, bem como a natureza conjectural do conhecimento científico. 47


Anti-realismo moral e motivação No seu ataque ao papel da razão no julgamento do comportamento, Hume argumentou que o comportamento imoral não é imoral por ser contra a razão. Ele primeiro defendeu que as crenças morais estão intrinsecamente motivantes: se você acredita que matar é errado, você estará motivado "ipso facto" a não matar e em criticar a matança (internalismo moral). Ele lembra-nos em seguida que a razão por si só não motiva ninguém: a razão descobre os factos e a lógica, mas ela depende dos nossos desejos e preferências quanto à percepção daquelas verdades e se isso nos motiva. Consequentemente, a razão por si não produz crenças morais. Hume propôs que a moralidade depende ultimamente do sentimento, sendo o papel da razão apenas o de preparar o caminho para os nossos sensíveis julgamentos por análise da matéria moral em questão. Este argumento contra os fundamentos da moralidade na razão é hoje um dos argumentos pertencentes ao arsenal do antirrealismo moral; o filósofo Humeano John Mackie argumentou que para os factos morais serem factos reais sobre o mundo e ao mesmo tempo, intrinsecamente motivantes, eles teriam de ser factos muito estranhos. Temos pois todos os motivos para desacreditá-los. Para trabalho contemporâneo relevante, ver: "Inventing Right and Wrong", de J.L. Mackie; "Hume's Moral Theory", de Mackie; "Moral Realism and the Foundation of Ethics" de David Brink e "The Moral Problem" de Michael Smith.

Livre-arbítrio vs. indeterminismo Todos nós já notamos o aparente conflito entre o livre-arbítrio e o determinismo: se as nossas acções foram determinadas há milhões de anos, como poderá ser que elas dependam de nós? Mas Hume notou um outro conflito, que torna o problema da livre vontade num denso dilema: a livre-vontade é incompatível com o indeterminismo. Imagine que as suas acções não são determinadas pelos eventos precedentes. Nesse caso, as suas acções serão completamente aleatórias. Em adição, e muito importante para Hume, as ações não são determinadas pelo seu carácter, as suas preferências, os seus valores, etc. Como é que alguém pode ser tido por responsável pelo seu carácter? A livre-vontade parece requerer o determinismo, porque senão o agente e a acção não estariam conectados do modo necessário por acções livremente escolhidas. Sendo assim, quase todos nós acreditamos no livre-arbítrio, a livre vontade parece inconsistente com o determinismo, mas a livre-vontade parece requerer o determinismo. Na visão de Hume, o comportamento humano, como tudo o mais, é causado (causal). Por isso mesmo, se tomamos as pessoas como responsáveis pelas seus atos, devemos focar a recompensa ou a punição de forma a que eles façam aquilo que é moralmente desejável e evitem aquilo que é moralmente repreensível. Jean-Jacques Rousseau, ou simplesmente Rousseau ( 1712 — 1778) Foi um importante filósofo, teórico político, escritor e compositor autodidata genebrino. É considerado um dos principais filósofos do iluminismo e um precursor do romantismo. Para ele, as instituições educativas corrompem o homem e tiram-lhe a liberdade. Para a criação de um novo homem e de uma nova sociedade, seria preciso educar a criança de acordo com a Natureza, desenvolvendo progressivamente seus sentidos e a razão com vistas à liberdade e à capacidade de julgar.

O estado de natureza

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O estado de natureza, tal como concebido por Rousseau, está descrito principalmente em seu livro Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens. A definição da natureza humana é um equilíbrio perfeito entre o que se quer e o que se tem. O homem natural é um ser de sensações, somente. O homem no estado de natureza deseja somente aquilo que o rodeia, porque ele não pensa e, portanto, é desprovido da imaginação necessária para desenvolver um desejo que ele não percebe. Estas são as únicas coisas que ele poderia "representar". Então, os desejos do homem no estado de natureza são os desejos de seu corpo. "Seus desejos não passam de suas necessidades físicas, os únicos bens que ele conhece no universo são a alimentação, uma fêmea e o repouso". Em algumas passagens de suas obras, Rousseau dá à palavra natureza um sentido quase divino e nela encerra uma espécie de absoluto a ser buscado e seguido. Tal sentido deixa transparecer que há uma natureza da natureza, a qual até poderia ser grafada Natureza, com letra maiúscula, por coincidir com o princípio divino. Nesse sentido, haveria uma natureza absoluta (N) que gera a natureza (n) e o estado de natureza. Como força ativa que estabelece e conserva a ordem de tudo quanto existe (seja num sentido metafísico ou no sentido puramente científico atual), seu sentido é substantivo e não meramente qualificativo, que pode ser expresso na locução adjetiva de nature. É a força de onde emana o próprio estado original e visível da ordem existente, o qual chamamos de estado natural. Presente em diversas partes do Emílio, sobretudo nas palavras do vigário saboiano, essa metafísica é expressa de maneira a propiciar uma leitura de que Natureza (N) e natureza (n) são forças criadoras que se complementam e traduzem a manifestação benfazeja de Deus na vida dos homens. (PAIVA, 2007). Além disso, o homem natural não pode prever o futuro ou imaginar coisas além do presente. Em outras palavras, a natureza de si corresponde perfeitamente ao exterior. No Ensaio, Rousseau sugere que o homem natural não é sequer capaz de se distinguir de outro ser humano. Essa distinção requer a habilidade de abstração que lhe falta. O homem natural também ignora o que é comum entre ele e um outro ser humano. Para o homem natural, a humanidade para no pequeno círculo de pessoas com quem ele está no momento. "Eles tiveram a ideia de um pai, filho, irmão, e não de um homem. A cabine continha todos os seus companheiros … Fora eles e suas famílias, não havia mais nada no universo. " (Ensaio, IX) A compaixão não poderia ser relevante fora do pequeno círculo, mas também essa ignorância não permitia a guerra, como os homens não se encontravam com praticamente ninguém. Homens, se quisessem, atacavam em seus encontros, mas estes raramente aconteciam. Até então, Rousseau toma posição contra a teoria do estado de natureza hobbesiano. O homem natural de Rousseau não é um "lobo" para seus companheiros. Mas ele não está inclinado a se juntar a eles em uma relação duradoura e a formar uma sociedade com eles. Ele não sente o desejo. Seus desejos são satisfeitos pela natureza, e a sua inteligência, reduzida apenas às sensações, não pode sequer ter uma ideia do que seria tal associação. O homem tem o instinto natural, e seu instinto é suficiente. Esse instinto é individualista, ele não induz a qualquer vida social. Para viver em sociedade, é preciso a razão ao homem natural. A razão, para Rousseau, é o instrumento que enquadra o homem, nu, ao ambiente social, vestido. Assim como o instinto é o instrumento de adaptação humana à natureza, a razão é o instrumento de adaptação humana a um meio social e jurídico. É justamente a falta de razão que possibilita o homem a viver naturalmente: a razão, ou a imaginação que o permite considerar outro homem como seu alter-ego (ou seja, como um ser humano também), a linguagem e a sociedade, tudo isso constitui a cultura, e não são faculdades do estado de natureza. Mesmo assim, o homem natural já possui todas essas características; ele é anti-social, mas é associável: "não é hostil à sociedade, mas não é inclinável a ela. Foram os germes que se desenvolveram, e podem se tornar as virtudes sociais, tendências sociais, mas eles são apenas potenciais."(Segundo Discurso, Parte I). O homem é sociável, antes mesmo de socializar. Possui um potencial de sociabilidade que somente o contato com algumas forças hostis podem expor. Segundo Rousseau a "Vontade Geral" não é consenso, nem vontade da maioria e muito menos a soma das vontades individuais. Um exemplo seria que cada indivíduo tem pelo menos duas vontades, vontades de longo prazo e as imediatistas, em que uma se sobrepõe a outra, sendo essa a vontade geral. Com isso, todos devem se submeter a ela. Como a sociedade não tem objetivo estabelecido, é auto determinante, a vontade geral não seria constrangida por nada, tendo o "Todo" (sociedade) se submetendo a ela, recebendo cada um parte individual do "Todo". Uma forma de exemplificar tal teoria seria comparála com Locke, pois a vontade geral entra em contradição com Locke, que diz que o homem não deve se submeter a nada, que ele é livre, mas Rousseau enfatiza que todos devem estar sob a vontade geral. Para atingir a vontade geral é necessário que a sociedade reduza a desigualdade social, pois assim as opiniões, conceitos e principalmente vontades seriam mais próximos e estreitos. Como também maior educação na sociedade. Porque Rousseau salienta que a educação deve fazer parte do Estado, já Locke defende a ideia de que cada um tem a educação que deseja , sendo ela baseada na vontade individual de cada um. Pelo ponto de vista legislativo, as leis deveriam ser aprovadas pela religião, sendo utilizadas de forma cívica, 49


tendo o lema e como justificativa que "Um bom cidadão será um bom religioso". Caso haja o descumprimento da vontade geral ou recusa a aceita-lá, o indivíduo será constrangido pelo corpo, ou seja, pelos demais da sociedade, sendo esse indivíduo forçado a ser livre e independente, sem vínculo com os outros. De acordo com Rousseau o Contrato Social tem por fim a vontade geral. Porém, Locke diz o contrário, ele defende a ideia de que o fim deste contrato são as leis , ou seja, o estado de direito. Para ele o conceito de soberania seria a vontade geral, pois a deliberação comunitária torna a comunidade soberana, ou melhor , o conjunto de vontades em comum gera a vontade geral. O legislador tem a função de liberar a vontade da sociedade, podendo ser um legislador ditador ou liberal. Tudo isso porque no Estado de Natureza o indivíduo faz o que deseja, mas quando sai desse estado e entra na sociedade civil, há a necessidade e obrigação de se submeter a vontade geral, ou seja , a vontade popular.

Amor e ódio Não há dúvida alguma de que Rousseau fez soprar um vento revolucionário sobre as ideias de amor e ódio: ele debate a sexualidade como uma experiência fundamental na vida do ser humano, a tomada de consciência da importância dos sentimentos de amor e ódio na construção da sociedade humana e no seu desenvolvimento pessoal, e enfim, essa abertura para o debate moderno sobre a divisão do amor entre amor conjugal e amor passional. Pode-se atribuir a Rousseau a tentativa de estabelecer, na sociedade do século XVIII, uma nova noção: a de que a personalidade do indivíduo, que concerne o tratamento que ele dá aos outros e a sua própria sexualidade, é formada na infância.

O contrato social A obra Do Contrato Social, publicada em 1762, propõe que todos os homens façam um novo contrato social onde se defenda a liberdade do homem baseado na experiência política das antigas civilizações onde predomina o consenso, garantindo os direitos de todos os cidadãos, e se desdobra em quatro livros. No primeiro livro “Onde se indaga como passa o homem do estado natural ao civil e quais são as condições essenciais desse pacto”, composto de nove capítulos. Primeiramente se aborda a liberdade natural, nata, do ser humano, como ele a havia perdido, e como ele haveria de a recuperar. Dessa forma, já no quarto capítulo, Rousseau condena a escravidão, como algo paradoxal ao direito. A conclusão é que, se recuperando a liberdade, o povo é quem escolhe seus representantes e a melhor forma de governo se faz por meio de uma convenção. No início, Jean-Jacques Rousseau questiona porque o homem vive em sociedade e porque se priva de sua liberdade. Vê num rei e seu povo o senhor e seu escravo, pois o interesse de um só homem será sempre o interesse privado. Os homens, para se conservarem, se agregam e formam um conjunto de forças com objetivo único. Essa convenção é formada pelos homens como uma forma de defesa contra aqueles que fazem o mal. É a ocorrência do pacto social. Feito o pacto, pode-se discutir o papel do “soberano”, e como este deveria agir para que a soberania verdadeira, que pertence ao povo, não seja prejudicada. Além de uma forma de defesa, na verdade o principal motivo que leva à passagem do estado natural para o civil é a necessidade de uma liberdade moral, que garante o sentimento de autonomia do homem. No segundo livro Onde se trata da legislação, o autor aborda os aspectos jurídicos do Estado Civil, em doze capítulos. As principais ideias são desenvolvidas a partir de um princípio central, a soberania do povo, que é indivisível. O povo, então, tem interesses, que são nomeados como “vontade geral”, que é o que mais beneficia a sociedade. Evidentemente, o “soberano” tem que agir de acordo com essa vontade, o que representa o limite do poder de tal governante: ele não pode ultrapassar a soberania do povo ou a vontade geral. Mais a frente no livro, a corrupção dos governantes quanto à vontade geral é criticada, garantindo-se o direito de tirar do poder tal governante corrupto. Assim, se esse é o limite, o povo é submisso à lei, porque em última análise, foi ele quem a criou; sendo a lei a condição essencial para a associação civil. A terceira análise rousseauniana, corresponde ao livro terceiro, se refere às possíveis formas de governo, que são a democracia, a aristocracia e a monarquia, e suas características e princípios. A principal conclusão desse livro é a partir do oitavo capítulo, em que tipo de Estado, que forma de governo funciona melhor – para Rousseau, a democracia é boa em cidades pequenas, a aristocracia em Estados médios e a monarquia em Estados grandes. Em contrapartida a essas adequações, no capítulo décimo, o autor mostra como o abuso dos governos pode degenerar o Estado. Ainda, é destacado no capítulo nono que o principal objetivo de uma sociedade política é a preservação e prosperidade dos seus membros. 50


Observando as ideias contidas no livro O Contrato Social, não é difícil entender porque certas pessoas chamam a obra de “a Bíblia da Revolução Francesa”. Foi grande a influência política de suas ideias na França. A inspiração causadora das revoluções se baseiam principalmente no conceito da soberania do povo, mudando o direito da vontade singular do príncipe para a vontade geral do povo.

Liberdade natural Para Rousseau, a liberdade natural caracteriza-se por ações tomadas pelo indivíduo com o objetivo de satisfazer seus instintos, isto é, com o objetivo de satisfazer suas necessidades. O homem neste estado de natureza desconsidera as consequências de suas ações para com os demais, ou seja, não tem a vontade e nem a obrigação de manter o vínculo das relações sociais. Outra característica é a sua total liberdade, desde que tenha forças para colocá-la em prática, obtendo as satisfações de suas necessidades, moldando a natureza. “O homem realmente livre faz tudo que lhe agrada e convém, basta apenas deter os meios e adquirir força suficiente para realizar os seus desejos.”(SAHD,2005, p. 101) Ao perder uma disputa com outros indivíduos o sujeito não consegue exercer a sua liberdade, uma vez que a liberdade nesse estágio se estabelece a partir da correlação de forças entre os indivíduos. Não há regras, instituições ou costumes que se sobrepõem às vontades individuais para a manutenção do “bem coletivo”. Contudo, na concepção de Rousseau, o homem selvagem viveria isolado e por isso, não faz sentido pensar em um bem coletivo. Também não haveria tendência ao conflito entre os indivíduos isolados quando se encontrassem, pois seus simples desejos (necessidades) seriam satisfeitas com pouco esforço, devido à relação de comunhão com a natureza. O isolamento entre os indivíduos só era quebrado para fins de reprodução, pois sendo autossuficientes não tinham outra necessidade para viverem em agrupamentos humanos. Foi a partir do isolamento que o homem adquiriu qualidades como amor de si mesmo e a piedade. Vale ressaltar que, para Rousseau, o homem se completa com a natureza , portanto não é um estado a ser superado, como Locke e Hobbes acreditavam. Rousseau em o Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens, afirma que “a maioria de nossos males é obra nossa e (…) os teríamos evitado quase todos conservando a maneira de viver simples, uniforme e solitária que nos era prescrita pela natureza” (ROUSSEAU apud LEOPOLDI , 2002, p. 160 ) A consciência no estado selvagem não estabelece distinção entre bem ou mal, uma vez que tal distinção é característica do indivíduo da sociedade civil. Para Rousseau, o que faz o indivíduo em estado de natureza parecer bom é, justamente, o fato de conseguir satisfazer suas necessidades sem estabelecer conflitos com outros indivíduos, sem escravizar e não sentindo vontade de impor a sua força a outros para sobreviver e ser feliz.

Transição do estado de natureza para o estado civil A transição do estado de natureza para a ordem civil transforma a liberdade do sujeito, ocorrendo durante um período de “guerra de todos contra todos” que se iniciou com o estabelecimento da propriedade privada e da ausência de instituições políticas e de regras que impedissem a exploração entre as pessoas. Não havia cidadania neste período pré-social (esse período, existente antes do contrato social, se caracterizava por uma vida comum de disputas pela propriedade e pela riqueza). Para evitar as desigualdades, advindas da propriedade privada e do poder que devido a ela as pessoas (ricos proprietários) passam a exercer sobre outras pessoas (pequenos proprietários e despossuídos), é firmado o contrato social. Na transição para a vida em sociedade Rousseau é claro em escrever que: “O que o homem perde pelo contrato social é a liberdade natural e um direito ilimitado a tudo quanto aventura e pode alcançar. O que com ele ganha é a liberdade civil e a propriedade de tudo o que possui.” (ROUSSEAU, 1978, p. 36) Esta perda representa não apenas o desenvolvimento de faculdades racionais e emocionais do indivíduo como também abre os precedentes para toda a violação da liberdade, da segurança e da igualdade entre os sujeitos em coletividade. As principais decorrências do estabelecimento da vida comunitária, segundo Rousseau, se dão tanto no desenvolvimento (da consciência, da afetividade e dos desejos) de cada indivíduo quanto nas novas organizações e ações que se impõem aos sujeitos com advento da vida em sociedade. No que tange ao indivíduo a sua forma de viver é alterada quando a vida coletiva potencializa as suas capacidades intelectuais. Para Rousseau, isso ocorre tanto como causa quanto como efeito do contrato social; os indivíduos têm de ter uma consciência e um amor não apenas de si, como outrora, como também devem pensar nas consequências de seus atos em relação a outros indivíduos e reconhecer a necessidade da convivência com estes outros indivíduos. 51


Em suma o que aparece no Contrato Social como pensamento racional-moral diz respeito às capacidades de compreensão (sensorial e lógica), de formulação racional, de ação (individual e coletiva) e de comunicação dos sujeitos que exercem tais faculdades nas suas relações dentro da ordem civil. A própria ordem civil seria inviável se os sujeitos não possuíssem tais capacidades cognitivas e afetivas e, assim não haveria como estabelecer o contrato social se os indivíduos permanecessem apenas centrados no amor próprio e agindo de forma irrestrita na satisfação de suas necessidades . Se bem que neste ponto o argumento rousseauniano não é totalmente claro quanto às causas e aos efeitos, pois ao mesmo tempo em que é preciso que o homem abandone alguns de seus instintos naturais e aprenda a limitar a sua liberdade em função da sua necessidade do outro, somente a vida em sociedade permite o desenvolvimento de tais capacidades.Ele buscava a liberdade e a igualdade.

Liberdade civil Na resolução do estágio de conflito generalizado é estabelecido o contrato social. Tal contrato é para Rousseau o que forma um povo enquanto tal, sendo precedente a formação do Estado e do governo. Esses são decorrentes da organização e do acordo vigentes na constituição do povo. Aqui Rousseau estabelece um princípio de organização das instituições políticas, no qual a organização de um povo em relação à propriedade, aos direitos e aos deveres de cada indivíduo são estipulados na lei, a partir do contrato social que orienta a constituição do Estado e da legislação. Um dos aspectos normativos do projeto rousseauniano é o de querer demonstrar a lógica dos princípios políticos do Estado e, simultaneamente, medidas utilitárias para a ação política dos indivíduos e do Estado, por exemplo, estipular que a igualdade se dê juridicamente mesmo reconhecendo que o princípio da desigualdade decorrente da propriedade privada ainda se mantém na ordem civil. Assim estipula uma reformulação nas instituições políticas que não dá conta do problema econômico-político, delineado pelo próprio Rousseau, da desigualdade de recursos e de propriedades. Referindo-se a lei, Rousseau não considera as leis vigentes satisfatórias (leis instituídas na monarquia, na aristocracia). Sua intenção é estabelecer um padrão das leis (que seria uma forma de superar as oposições entre indivíduo e Estado), baseado na igualdade, sendo esse critério indispensável para o contrato social. Portanto, a justiça estabelecida na lei deve ter reciprocidade entre os indivíduos, cada um tendo seus direitos e deveres, tanto o soberano quanto os súditos. Por isso, as leis devem representar toda a sociedade, sendo consideradas como vontade geral (não no sentido de uma união das vontades individuais e sim da vontade do corpo político ). Porém, Rousseau não descarta a possibilidade de “guias” para a tomada de decisões, isto é, um Legislador que possua uma “inteligência superior ”. Tal legislador teria uma das tarefas mais exigentes na sociedade: estipular regras e normas que limitam a liberdade de cada indivíduo em nome do bem desses. Para tanto deve ser capaz de exercer tal poder sem beneficiar-se, o legislador não deve tornar-se um governante autoritário afastado do corpo político. “The laws, it seems, have to be made, as well as be executed, by representatives.”(HARRISON, 1995, p. 61). Portanto, as leis estabelecidas no contrato social asseguram a liberdade civil através dos direitos e deveres de cada cidadão no corpo político da sociedade. Mas para isso, cada cidadão deve “doar-se” completamente, submetendo-se ao padrão coletivo. Vale ressaltar que o fator limitante da liberdade civil é a vontade geral, uma vez que ela visa à igualdade (o que torna os indivíduos realmente livres), pois a liberdade no estado civil não se dá apenas pelos interesses particulares, mas também pelos interesses do corpo político. Assim, o contrato social não apenas iguala todos os cidadãos, como também fortalece a liberdade de cada indivíduo, a partir de seus interesses particulares. Uma vez que um dos principais objetivos do contrato social é garantir a segurança e a liberdade de cada indivíduo, ainda que a última seja limitada por normas. “Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens de cada associado com toda a força comum, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si mesmo, permanecendo assim tão livre quanto antes. Esse, o problema fundamental cuja solução o contrato social oferece”. (ROUSSEAU, 1978, p. 32) Contudo o contrato de Rousseau oferece outra solução: a separação nominal jurídica do público e do privado . Tal separação é o que garante a igualdade política a cada pessoa que passa a ser um cidadão de direitos e deveres na esfera pública e com liberdade comercial e livre expressão de ideias, uma vez que é um indivíduo único. Tal princípio de separação, além de ser uma tentativa lógica de equacionar o problema – liberdade e igualdade – é um pesado ataque a ordem política feudal, na qual os laços de sangue e de parentesco determinavam o tratamento político diferenciado e limitavam a participação política de cada cidadão. 52


O Estado, tal como é proposto por Rousseau no Contrato Social, assegura a liberdade de cada cidadão através da independência individual privada e da livre participação política. Sendo que para Robert Nisbet: “Esta predominância do Estado na vida do indivíduo não constitui, entretanto, despotismo; constitui a base necessária da verdadeira liberdade individual.” (NISBET, 1982, p. 158).

Filosofia do século XIX No século XVIII, os filósofos do Iluminismo começaram a exercer um efeito dramático, tendo como ponto de referência o trabalho de filósofos como Immanuel Kant e Jean-Jacques Rousseau, e isso influenciou uma nova geração de pensadores. No final do século XVIII, um movimento conhecido como Romantismo surgiu para reunir o formalismo racional do passado, com uma grande, maior e imediata visão emocional do mundo. Ideias chaves que mostraram essa mudança foram a evolução, como foi proposta por Jean-Baptiste de Lamarck, Erasmus Darwin, e Charles Darwin, que podem agora ser chamada de ordem emergente como o mercado Livre de Adam Smith. Pressões do Igualitarismo, e as mais rápidas mudanças culminaram em um período de revolução e turbulência em que poderiam ser bem visíveis as mudanças da filosofia.

ADAM SMITH (1723-1790) É o pai da economia moderna, e é considerado o mais importante teórico do liberalismo econômico. Autor de Uma investigação sobre a natureza e a causa da riqueza das nações, a sua obra mais conhecida, e que continua sendo usada como referência para gerações de economistas, na qual procurou demonstrar que a riqueza das nações resultava da atuação de indivíduos que, movidos inclusive (e não apenas exclusivamente) pelo seu próprio interesse (self-interest), promoviam o crescimento econômico e a inovação tecnológica. Adam Smith ilustrou bem seu pensamento ao afirmar "não é da benevolência do padeiro, do açougueiro ou do cervejeiro que eu espero que saia o meu jantar, mas sim do empenho deles em promover seu autointeresse". Assim acreditava que a iniciativa privada deveria agir livremente, com pouca ou nenhuma intervenção governamental, sendo defensor do free banking (sistema bancário livre).A competição livre entre os diversos fornecedores levaria não só à queda do preço das mercadorias, mas também a constantes inovações tecnológicas, no afã de baratear o custo de produção e vencer os competidores. Ele analisou a divisão do trabalho como um fator evolucionário poderoso a propulsionar a economia. Uma frase de Adam Smith se tornou famosa: "Assim, o mercador ou comerciante, movido apenas pelo seu próprio interesse (self-interest), é levado por uma "mão invisível" a promover algo que nunca fez parte do interesse dele: o bem-estar da sociedade." Como resultado da atuação dessa "mão invisível", o preço das mercadorias deveria descer e os salários deveriam subir. Um dos aspectos mais importantes ressaltados aqui por Adam Smith é o caráter democrático. A economia, na forma como Smith a via, como era o caso do comércio, tinha como efeito positivo a liberação dos pobres de sua dependência em relação aos ricos. Smith não utilizava a divisão de classes, mas partia de uma estrutura baseada na origem da renda obtida e, nesse sentido, os trabalhadores não seriam a classe inferior, mas a intermediária, pois seriam os parceiros mais diretos no empreendimento econômico, de tal forma que jamais se poderia violar o sagrado direito de propriedade deles sobre seu trabalho. O comércio também é visto como um impulso natural, o que tornaria um traço elementar e "comum a todos os homens", e que faria do trabalhador um ser moral, da mesma forma que os sentimentos morais formavam a base de uma sociedade boa e justa. A noção preponderante em Smith sobre a natureza humana seria a da igualdade, não a política ou econômica, tampouco a sociedade, mas uma igualdade básica entre os homens, os quais, por meio da educação poderão se tornar, inclusive filósofos. A obra Riqueza das Nações popularizou-se pelo uso da expressão da mão invisível do mercado. Segundo Adam Smith os agentes econômicos atuando livremente chegariam a uma situação de eficiência, dispensando assim a ação do Estado para esse efeito. Assim, atuando de forma livre, os mercados seriam regidos como se por uma mão invisível que o regula automaticamente sempre chegando a situação ótima ou de máxima eficiência. Curiosamente a expressão aparece apenas uma vez na obra Riqueza das Nações. Hoje, a teoria da mão invisível tem aplicações em muitos campos da economia. 53


Apesar disso, ele era por vezes tolerante à intervenção estatal nos bancos no combate a pobreza, e na promoção da equidade, se as regulações apoiassem o trabalhador. Também nessa obra, ele se mostra a favor das moedas nacionais, reguladas pelo Estado e que fossem emitidas em função da mais-valia e não em função da dívida. Ele também afirma que o principal problema das relações econômicas da época era a falta de probidade e de pontualidade, o que gerava uma crise de confiança e defendia uma regulação no mercado financeiro.

Escolas e filósofos da filosofia moderna A filosofia moderna, assim como outras fases da filosofia, pode ser dividida em escolas de pensamento que organizam as diferentes correntes filosóficas da época. As principais escolas da filosofia moderna são: racionalismo, empirismo, filosofia política, idealismo, existencialismo e pragmatismo.

Racionalismo Os racionalistas acreditavam que o conhecimento humano não depende de experiências para ser formado, uma vez que existem ideias que ultrapassam as informações absorvidas com as vivências. Assim, o racionalismo aborda os efeitos da intuição e da dedução na formação do conhecimento humano, classificando-as como conhecimentos a priori. Além disso, o racionalismo abrange o chamado Inatismo, teoria filosófica que defende que a mente não nasce como uma “página em branco”, e sim com ideias inatas que nos influenciam durante a vida. Exemplos de filósofos racionalistas modernos: René Descartes, Baruch Spinoza e Immanuel Kant.

Empirismo Os empiristas defendiam que o conhecimento só é criado, exclusivamente, a partir das experiências sensoriais. Por esse motivo, o empirismo é conhecido como a “filosofia da ciência”, pois prioriza o valor das evidências e exige a aplicação do método científico, ou seja, que todas as hipóteses e teorias sejam testadas e observadas antes de serem consideradas conhecimento. Exemplos de filósofos empiristas modernos: John Locke, George Berkeley, David Hume e Francis Bacon.

Filosofia política A filosofia política moderna analisa tópicos relacionados à liberdade, justiça, direitos e leis. Dentro desses temas, os filósofos políticos estudam a razão de ser e a legitimidade dos governos, quais direitos e garantias devem ser protegidos, além de avaliar quais deveres os cidadãos possuem em relação ao Estado. Exemplos de filósofos políticos modernos: Thomas Hobbes, John Locke, Montesquieu, Jean-Jacques Rousseau, Voltaire e Karl Marx.

Idealismo O idealismo é a escola filosófica que entende que a realidade como a conhecemos é fruto da mente humana. Em termos epistemológicos, o idealismo defende que é impossível conhecer qualquer coisa que esteja além das capacidades da mente, e por isso a percepção da realidade sempre será limitada. 54


Exemplos de filósofos idealistas modernos: Arthur Schopenhauer, Hegel e Immanuel Kant.

Arthur Schopenhauer ( 1788 — 1860) Foi um filósofo alemão do século XIX. Ele é mais conhecido pela sua obra principal "O mundo como vontade e representação" (1818), em que ele caracteriza o mundo fenomenal como o produto de uma cega, insaciável e maligna vontade metafísica. A partir do idealismo transcendental de Imannuel Kant, Schopenhauer desenvolveu um sistema metafísico ateu e ético que tem sido descrito como uma manifestação exemplar de pessimismo filosófico. Schopenhauer foi o filósofo que introduziu o pensamento indiano e alguns dos conceitos budistas na metafísicaalemã. Foi fortemente influenciado pela leitura das Upanishads, que foram traduzidas pela primeira vez para o latim no início do século XIX. Schopenhauer acreditava no amor como meta na vida, mas não acreditava que ele tivesse algo a ver com a felicidade. Era apenas a vontade cega e irracional que todos os seres têm de se reproduzirem, dando assim continuidade à vida e, por conseguinte, ao sofrimento. A sensação de felicidade que o amor traz é apenas o interrompimento temporário do querer, a fuga de uma dor imposta pela vontade. Para Schopenhauer, somente o sofrimento é positivo, pois se faz sentir com facilidade, enquanto que aquilo ao qual chamamos felicidade é negativo, pois é a mera interrupção momentânea da dor ou tédio, sendo estes últimos a condição inerente à existência. Considerava esse impulso de reprodução, esse "gênio da espécie", tão forte como o medo da morte, daí que muitos amantes arriscam a vida e a perdem obedecendo a este desejo. Apesar de ser, nos tempos contemporâneos, mais conhecido pela sua obra magna (O Mundo como Vontade e Representação), foi apenas com a publicação de "Parerga e Paralipomena", no final de 1851, que ficou amplamente conhecido e famoso ainda em vida. Nesta obra o filósofo discorre sobre uma multitude de assuntos que vão desde temas relacionados ao ensino universitário, à escrita, à sociedade em que vive, revê conceitos que outrora defendia e providencia inúmeros conselhos aos leitores sobre como levar uma vida o mais isente de sofrimento possível. As ideias de Schopenhauer consistem em uma coletânea de pensamentos ditos pessimistas que dizem respeito à vida humana. Segundo o filósofo, esta é regida pela vontade e, sendo, a vontade, uma espécie de Deus presente em todos os humanos sem exceção, a qual necessita de sobreviver valendo-se do desejo sexual para se reproduzir e multiplicar, e devido ao desejo de sempre querer mais, a vontade acaba levando ao sofrimento humano, pois o homem nunca será satisfeito com uma única coisa. Ainda, uma vez que a Vontade é tida como a coisa-em-si/essência do ser humano, e em razão do fato de o homem ser, do ponto de vista cósmico, não mais que um tipo de ser em meio a vários outros tipos de seres, Schopenhauer, valendo-se de uma razão analógica, sente-se autorizado a estender essa substância primordial (a Vontade) a todos os demais seres, concebendo-a, assim, como essência não só do homem, mas do mundo. Schopenhauer procura uma forma de libertação dessa vontade se baseando em escritos budistas e na filosofia oriental, que diz que a única forma de se libertar da vontade é a total renúncia de todos os desejos, a qual resulta no Nirvana. Vale a pena acrescentar que Schopenhauer também identifica esse mecanismo da libertação da vontade no cristianismo genuíno. De todo modo, a sabedoria religiosa que tem por referência é o budismo.

Um mundo cego e irracional O ponto de partida do pensamento de Schopenhauer encontra-se na filosofia kantiana. Immanuel Kant (1724 – 1804)

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Immanuel Kant estabelecera distinção entre os fenômenos e a coisa em si (que chamou noumenon), isto é, entre o que nos aparece e o que existiria em si mesmo. A coisa-em-si (noumenon) não poderia, segundo Kant, ser objeto de conhecimento científico, como até então pretendera a metafísica clássica. A ciência restringir-se-ia, assim, ao mundo dos fenômenos, e seria constituída pelas formas a priori da sensibilidade (espaço e tempo) e pelas categorias do entendimento (a exemplo da categoria da causalidade). Dessas distinções, Schopenhauer concluiu que o mundo não seria mais do que representações, entendidas por ele, num primeiro momento, como sínteses entre o subjetivo e o objetivo, entre a realidade exterior e a consciência humana. Como afirma em O Mundo Como Vontade e Representação. “

Por mais maciço e imenso que seja este mundo, sua existência depende, em qualquer momento, apenas de um fio único e delgadíssimo: a consciência em que aparece.

Em outra passagem de sua principal obra, Schopenhauer deixa mais clara essa ideia: “

O mundo como representação, isto é; unicamente do ponto de vista de que o consideramos aqui, tem duas metades essenciais, necessárias e inseparáveis. Uma é o objeto; suas formas são o espaço e o tempo, donde a pluralidade. A outra metade é o sujeito; não se encontra colocada no tempo e no espaço, porque existe inteira e indivisa em todo ser que percebe: daí resulta que um só desses seres junto ao objeto completa o mundo como representação, tão perfeitamente quanto todos os milhões de seres semelhantes que existem: mas, também, se esse ser desaparece, o mundo como representação não mais existe.”

Não se pode dizer que essas ideias expressem exatamente o pensamento kantiano, mas, seja como for, Schopenhauer chegou a essas conclusões, partindo do mestre que tanto admirava, bem como, frisa-se, da constatação dessas mesmas verdades na filosofia platônica e na dos Vedas, embora expressas de maneira alegórica e intuitiva, portanto, não do modo conceitual e racional kantiano. De fato, Schopenhauer louva Kant precisamente por haver demonstrado de maneira clara e racional, de uma vez por todas, essas verdades antigas - até então poeticamente manifestas. Schopenhauer, contudo, separa-se, explicitamente, de Kant em um ponto essencial e, a partir daí, constrói uma filosofia original. Para Kant, a coisa-em-si é inacessível ao conhecimento humano, pois encontra-se além dos limites das estruturas do próprio ato cognitivo, entendido como síntese dos dados da intuição sensível, síntese essa realizada pelas categorias a priori do entendimento. Schopenhauer, ao contrário, pretendeu abordar a própria coisa-em-si. Essa coisaem-si, raiz metafísica de toda a realidade, seria a Vontade. Segundo o autor de O Mundo como Vontade e Representação, a experiência interna do indivíduo assegura-lhe mais do que o simples fato de ele ser "um objeto entre outros". A experiência interna também revela ao indivíduo que ele é um ser que se move a si mesmo, um ser ativo cujo comportamento manifesto expressa diretamente sua vontade. Essa consciência interior que cada um possui de si mesmo como vontade seria primitiva e irredutível: A vontade revelar-se-ia imediatamente a todas as pessoas como o emsi e a percepção que as pessoas têm de si mesmas como vontades seria distinta da percepção que as mesmas têm como corpo através da percepção externa mediada pelo princípio de razão. Mas isso não significa que Schopenhauer tinha esposado a tese de que as ações corporais e as ações da vontade constituem duas séries de fatos, entendidas as primeiras como causadoras das segundas. Para Schopenhauer, o corpo humano é apenas objetivação da vontade, tal como aparece sob as condições da percepção externa (mediada pelo aludido princípio de razão). Em outros termos, o que se quer e o que se faz são uma e a mesma coisa, vistos, porém, de perspectivas diferentes. Da mesma forma como nos homens, a vontade seria o princípio fundamental da natureza. Para Schopenhauer, na queda de uma pedra, no crescimento de uma planta ou no puro comportamento instintivo de um animal, afirmam-se tendências, em cuja objetivação se constituem os corpos. Essas diversas tendências não passariam de disfarces sob os quais se oculta uma vontade única, superior, de caráter metafísico (mas entenda-se "metafísica" não no sentido clássico de conhecimento respeitante a algo além e fora da experiência, mas sim do que há de mais primitivo e de íntimo no mundo experienciável) e presente igualmente na planta que nasce e cresce, e nas complexas ações humanas. Essa vontade, para Schopenhauer, é independente da representação e, portanto, não se submete às leis da razão. Ao contrário de Hegel, para quem o real é racional, a filosofia de Schopenhauer sustenta que o real 56


é em si mesmo cego e irracional, enquanto vontade. As formas racionais da consciência não passariam de ilusórias aparências e a essência de todas as coisas seria alheia à razão: “

A consciência é a mera superfície de nossa mente, da qual, como da terra, não conhecemos o interior, mas apenas a crosta.

O inconsciente representa, assim, papel fundamental na filosofia de Schopenhauer. Sob esse aspecto, o autor de O Mundo como Vontade e Representação antecipou-se a alguns dos conceitos mais importantes da psicanálise fundada por Sigmund Freud (1856-1939). O próprio Freud reconheceu a importância das ideias de Schopenhauer; em um de seus escritos, afirma que certas considerações sobre a loucura, encontradas no Mundo como Vontade e Representação, poderiam "rigorosamente, sobrepor-se à doutrina da repressão". Uma palavra ainda sobre o conceito de Vontade. Este é concebido problematicamente por Schopenhauer na medida em que reconhece tomar a vontade pelo fenômeno mais próximo da constituição da coisa-em-si, de modo que, a bem da verdade, Schopenhauer está consciente de que trabalha um tanto quanto metaforicamente com o conceito de vontade, já que, a rigor, sabe que a vontade não é, propriamente, a coisa em si, mas, como quer que seja, ela é o que há de mais semelhante e parecido, no plano da consciência, insiste Schopenhauer, com a coisa em si.

Viver é sofrer No sistema de Schopenhauer, a vontade é a raiz metafísica do mundo e da conduta humana; ao mesmo tempo, é a fonte de todos os sofrimentos. Sua filosofia é, assim, profundamente pessimista, pois a vontade é concebida em seu sistema como algo sem nenhuma meta ou finalidade (ateleológica), um querer irracional e inconsciente. Sendo um mal inerente à existência do homem, ela gera a dor, necessária e inevitavelmente, sendo aquilo que se conhece como felicidade, por conseguinte, apenas a interrupção temporária de um processo de infelicidade e somente a lembrança de um sofrimento passado criaria a ilusão de um bem presente. Para Schopenhauer, o prazer é momento fugaz de ausência de dor e não existe satisfação durável. Todo prazer é ponto de partida de novas aspirações, sempre obstadas e sempre em luta por sua realização: "Viver é sofrer". Nesse sentido, verifica-se como seu pessimismo não é gratuito, dado que suportado por uma antropologia-metafísica-realista de fundo, apresentando-se, deste modo, como apanágio e característica natural desta. Como preconizou Schopenhauer em O Mundo como Vontade e Representação , “

“O maior grilhão do homem é acreditar que nunca esteve agrilhoado.”

Mas, apesar de todo seu profundo realismo-pessimista, a filosofia de Schopenhauer aponta algumas vias para a suspensão da dor. Num primeiro momento, o caminho para a supressão da dor encontra-se na contemplação artística. A contemplação desinteressada das ideias seria um ato de intuição artística e permitiria a contemplação da vontade em si mesma, o que, por sua vez, conduziria ao domínio da própria vontade. Na arte, a relação entre a vontade e a representação inverte-se, a inteligência passa a uma posição superior e assiste à história de sua própria vontade; em outros termos, a inteligência deixa de ser atriz para ser espectadora. A atividade artística revelaria as ideias eternas através de diversos graus, passando sucessivamente pela arquitetura, escultura, pintura, poesia lírica, poesia trágica, e, finalmente, pela música. Em Schopenhauer, pela primeira vez na história da filosofia, a música ocupa o primeiro lugar entre todas as artes. Liberta de toda referência específica aos diversos objetos da vontade, a música poderia exprimir a Vontade em sua essência geral e indiferenciada, constituindo um meio capaz de propor a libertação do homem, em face dos diferentes aspectos assumidos pela Vontade.

No Nada, há salvação A libertação proporcionada pela arte, segundo Schopenhauer, não é, contudo, total e completa. A arte significa apenas um distanciamento relativamente passageiro e não a supressão da Vontade. Para que atinja a libertação, é necessário que o homem ascenda ao nível da conduta ascética, a qual representa uma etapa superior no processo de superação das "dores do mundo". Com efeito, para Schopenhauer, a mais completa forma de salvação para o homem somente pode ser encontrada na renúncia quietista ao mundo e a todas as suas solicitações, na mortificação dos instintos, na autoanulação da vontade e na fuga para o Nada: “

Desviemos um instante os olhos de nossa própria indigência e de nosso limitado horizonte; levemo-los sobre esses homens que venceram o mundo, nos quais a

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vontade, atingindo a perfeitaconsciência de si, se reconheceu em tudo que existe e, livremente, renunciou a si mesma... Então, em vez desse tumulto de aspirações sem fim, em vez dessas passagens constantes do desejo ao medo, da alegria ao sofrimento, em vez dessas esperanças sempre inalcançadas e sempre renascentes, que fazem da vida humana, enquanto animada pela vontade, um sonho interrompido, não perceberemos mais do que esta paz, mais preciosa que todos os tesouros da razão, a calma absoluta do espírito, esta serenidade imperturbável, tal como Rafael e Correggio a pintaram nas figuras de seus santos e cujo brilho deve ser para nós a mais completa e verídica anunciação da boa nova: a vontade desapareceu; subsiste apenas o conhecimento".

Ética Primeiramente, de se dizer que a ética, para Schopenhauer, é a ciência filosófica da vida moral, e, precisamente enquanto saber de natureza científico-filosófica limita-se a dizer o que É, ou seja, a descrever seu objeto - no caso, a realidade moral, caracterizada pela ação desinteressada voltada a respeitar (justiça) e a auxiliar (piedade) o próximo (entendendo-se por próximo não apenas o sujeito-suscetível a sofrimentohumano, mas também o sujeito-suscetível a sofrimento-não-humano). A ética de Schopenhauer não está, contudo, presa à noção de "dever", o que equivale a dizer que não estamos diante de uma ética prescritiva (tal qual, por exemplo, a ética kantiana); Schopenhauer rejeita as formas imperativas de filosofia que são, para ele, formas de coerção - e, dentre outras razões, isso é assaz importante, haja vista colocar Schopenhauer se não numa posição ímpar, então numa posição "alternativa". Sua ética não se apoia em mandamentos, mas, antes, na noção de que a contemplação da verdade é o caminho de acesso ao bem - não obstante reconhecer a necessidade de se traduzir e erigir as coordenadas morais espontâneas e naturais, emanadas da disposição compassiva, em princípios racionais, a fim de se estabelecer uma vida moral efetiva. Para Schopenhauer, o egoísmo, que faz do homem o inimigo do homem, advém da ilusão de vontades independentes que afirmam seus ímpetos individuais. A superação do egoísmo somente seria possível mediante o conhecimento da natureza única universal da Vontade. Como consequência moral do desaparecimento de sua individualidade, o homem pode tornar-se bom; ao espírito de luta contra os semelhantes, segue-se o espírito de simpatia. Libertado da ilusão do egoísmo, o homem atinge o princípio que é o fundamento de toda verdade moral: "Não prejudiques pessoa alguma, sê bom com todos", princípio este em que se nota, na primeira parte, a virtude cardeal da justiça e, na segunda, a outra virtude cardeal, a piedade. Essa ética que descreve a moral como prática da justiça e da piedade fundada na comiseração (reservada, relembre-se, à possibilidade de se fixar racionalmente, em princípios, no espírito do agente), segundo Schopenhauer, encontrou sua mais acabada expressão nos evangelhos, onde "ama a teu próximo como a ti mesmo" constitui o princípio fundamental da conduta. Quanto ao mais, cumpre chamar atenção para o fato de que, malgrado a experiência moral colocar o indivíduo humano em grau de fruir daquela felicidade abnegativa (afinal, o valor da ação moral reside justamente na vontade desinteressada, portanto, na vontade não egoisticamente determinada e, consequentemente, aberta à contemplação), Schopenhauer não propõe a moralidade como "via direta e necessária para a felicidade", ante o fato de a moral constituir-se como tal, para o nosso filósofo, precisamente na medida em que não é expediente comprometido com a felicidade pessoal (aqui, pouco importa se felicidade-satisfação-ilusória ou felicidade-salvação-autêntica). Outra advertência deve ser feita com relação à natureza da ascese do modo como posta por Schopenhauer, porquanto, se ela tem, em mira, imediatamente, a felicidade (mesmo que sob o termo "bem-aventurança"), não há que se falar em natureza moral da ascese, pois uma visa, direta e imediatamente, a proporcionar, ao indivíduo, a felicidade genuína (a ascese), e a outra (a moral), ao "bem do próximo".

As questões de partida do kantismo As questões de partida do kantismo são o problema do conhecimento, e a ciência, tal como existe. A ciência se arranja de juízos que podem ser analíticos e sintéticos. Nos primeiros (o quadrado tem quatro lados e quatro ângulos internos), fundados no princípio de identidade, o predicado aponta um atributo contido no sujeito. Tais juízos independem da experiência, são universais e necessários. Os sintéticos, a posteriori resultam da experiência e sobrepõem ao sujeito no predicado um atributo que nele não se acha previamente contido (o calor dilata os corpos), sendo, por isso, privados e incertos. Uma indagação iminente que o levara à sintetização do pensar: Que juízos constituem a ciência físico matemática? Caso fossem analíticos, a ciência sempre diria o mesmo (e não é assim), e, se fossem 58


sintéticos um hábito sem fundamento (o calor dilata os corpos porque costuma dilatá-los). Os juízos da ciência devem ser, ao mesmo tempo, a priori, quer dizer, universais e necessários, e sintéticos objetivos, fundados na experiência. Trata-se pois, de saber como são possíveis os juízos sintéticos a priori na matemática e na física ("Estética transcendental" e "Analítica transcendental"), e se são possíveis na metafísica("Dialética transcendental", partes da Crítica da razão pura). Para os juízos sintéticos a priori são admissíveis na matemática porque essa ciência se fundamenta no espaço e no tempo, formas a priori da sensibilidade, intuições puras e não conceitos de coisas como objetos. O espaço é a priori, não deriva da experiência, mas é sua condição de possibilidade. Podemos pensar o espaço sem coisas, mas não coisa sem espaço. O espaço é o objeto de intuição e não conceito, pois não podemos ter intuição do objeto de um conceito(pedra, carro, cavalo, etc.), gênero ou espécie. Ora, o espaço não é nem uma coisa nem outra, e só há um espaço (o nada, referindo ao espaço). Na apresentação transcendental do espaço, Kant determina as condições subjetivas ou transcendentais da objetividade. Se o conhecimento é relação, ou relacionamento (do sujeito com o objeto), não, pode conhecer as coisas "em si", mas "para nós". A geometria pura, quando aplicada, coincide totalmente com a experiência, porque o espaço é a forma a priori da sensibilidade externa. O tempo é, também, a priori. Podemos concebê-lo sem acontecimentos, internos ou externos, mas não podemos conceber os acontecimentos fora do tempo. Objeto de intuição, não pode ser conceito. Forma vazia, intuição pura, torna possíveis por exemplo os juízos sintéticos a priori na aritmética, cujas operações (soma, subtração, etc.), ocorrendo sucessivamente, o pressupõem. O tempo é, pois, a forma a priori da sensibilidade interna e externa. Esse privilégio explica a compenetração da geometria e da aritmética. A geometria analítica (Descartes) permite reduzir as figuras a equações e vice-versa. O cálculo infinitesimal (Leibniz) arremata essa compenetração definindo a lei de desenvolvimento de um ponto em qualquer direção do espaço. A matemática é pois, um conjunto de leis a priori, que coincidem com a experiência e a tornam cognoscível. As condições de possibilidade do conhecimento sensível são, portanto, as formas a priori da sensibilidade. Não existe a "coisa em si". Se existisse não se poderia a conhecer enquanto tal, e nada se poderia dizer a seu respeito. Só é possível conhecer coisas extensas no espaço e sucessivas no tempo, enquanto se manifestam, ou aparecem, ou seja, fenômenos. Na "analítica transcendental", Kant analisa a possibilidade dos juízos sintéticos a priori na física. Compreendemos que a natureza é regida por leis matemáticas que ordenam com rigor o comportamento das coisas (o que permite ciências como engenharia, etc., serem possíveis o determinismo com certa regularidade). Não há como saber das coisas com apenas percepções sensíveis, impressões. Há um conhecimento a priori da natureza. A função principal dos juízos da natureza. Ora, a função principal dos juízos é pôr, colocar a realidade e, em seguida, determiná-la. As diversas formas do juízo deverão, portanto, conter as diversas formas da realidade. Essa formas estão estudadas desde Aristóteles, que as classifica de acordo com a quantidade, a qualidade, a relação e a modalidade. Na "Dedução transcendental" das categorias, Kant volta a classificação aristotélica, dando-lhe novo sentido. Assim, à quantidade, correspondem a unidade, a pluralidade e a totalidade; à qualidade, a essência, a negação e a limitação; à relação, a substância, a causalidade e a ação recíproca; à modalidade, a possibilidade, a existência e a necessidade. Tais categorias são as condições de possibilidade dos juízos sintéticos a priori em física. As condições do conhecimento são, enfim, como se acabe de ver, as condições prévias da objetividade. A ciência da natureza postula a existência de objetos, sua consistência e as relações de causa e efeito. Se as categorias universais, particulares e contingentes, devem proceder de nós mesmos, de nosso entendimento. Em tal descoberta consiste a "inversão copernicana", realizada por Kant. Não é o objeto que determina o sujeito, mas o sujeito que determina o objeto. As categorias são conceitos, todavia, puros, a priori, anteriores à experiência e que, por isso, a tornam possível. Em suma, o objeto só se torna cognoscível na medida em que o sujeito que determina o objeto. Em suma, o objeto só se torna cognoscível na medida em que o sujeito cognoscente o reveste das condições de cognoscibilidade. Na "dialética transcendental", finalmente Kant examina a possibilidade dos juízos sintéticos a priori na metafísica. A "coisa em si" (alma, Deus, essência do cosmos, etc.), não nos é dada em experiência alguma. Ora, como chega a razão a formar esses objetos? Sintetizando além da experiência, fazendo a síntese das sínteses, porque aspira ao infinito, ao incondicionado, ao absoluto. Nas célebres, "antinomias", Kant mostra que a razão pura demonstra, "indiferentemente", a finitude e a infinitude do universo, a liberdade e o determinismo, a existência e a inexistência de Deus. Ultrapassando os limites da experiência, aplica arbitrariamente as categorias e pretende conhecer o incognoscível. A metafísica é impossível como ciência, pois não se pode chegar mais, além disso.

A menoridade humana 59


Kant

Kant define a palavra esclarecimento como a saída do homem de sua menoridade. Segundo esse pensador, o homem é responsável por sua saída da menoridade. Kant define essa menoridade como a incapacidade do homem de fazer uso do seu próprio entendimento autonomamente, ou seja, sem a tutela de uma razão alheia. A permanência do homem na menoridade se deve ao fato de ele não ousar pensar. A covardia e a preguiça são as causas que levam os homens a permanecerem na menoridade. Um outro motivo é o comodismo. É bastante cômodo permanecer na área de conforto. É cômodo que existam pessoas e objetos que pensem e façam tudo e tomem decisões em nosso lugar. É mais fácil que alguém o faça, do que fazer determinado esforço, pois já existem outros que podem fazer por mim. Os homens quando permanecem na menoridade, são incapazes de fazer uso das próprias pernas, são incapazes de tomar suas próprias decisões e fazer suas próprias escolhas. Em seu texto "O que é o Iluminismo?", Kant sintetiza seu otimismo iluminista [6] em relação à possibilidade de o homem seguir por sua própria razão, sem deixar enganar pelas crenças, tradições e opiniões alheias. Nele, descreve o processo de ilustração como sendo "a saída do homem de sua menoridade", ou seja, um momento em que o ser humano, como uma criança que cresce e amadurece, se torna consciente da força e inteligência para fundamentar, sob o conhecimento à priori, a sua própria maneira de agir, sem a doutrina ou tutela de outrem. Kant afirma que é difícil para o homem sozinho livrar-se dessa menoridade, pois ela se apossou dele como uma segunda natureza. Aquele que tentar sozinho terá inúmeros impedimentos, pois seus tutores sempre tentarão impedir que ele experimente tal liberdade. Para Kant, são poucos aqueles que conseguem pelo exercício do próprio espíritolibertar-se da menoridade.

Juízos

Juízo analítico É formado quando o predicado repete o conteúdo formal do sujeito, desenvolvendo-o. Thonnard dá o exemplo da frase ”o corpo é uma substância extensa”, que representa uma tautologia e é incapaz de fazer progredir a ciência, pois não é um juízo científico, mas analítico. A frase mencionada, para Kant não passa de um princípio de contradição, que é apenas a regra negativa dos juízos. A conclusão à que chegamos é que Immanuel todo o juízo implicando contradição é errôneo, mas a ausência de contradição não basta para que um juízo seja verdadeiro ou científico, porque, segundo Thonnard, o puro conceito, mesmo analisado, não contém verdade alguma.

Juízo sintético É formado quando o predicado é estranho ao conteúdo formal do sujeito e lhe é atribuído por uma razão diferente da análise desse conteúdo. A frase ” todo ser é inteligível” é um juízo sintético, pois a inteligibilidade é um fato especial da inteligência, que não é necessariamente exigida pela noção de ser. O juízo sintético é àquele que vai enriquecer e avançar a ciência.

Juízo estético O juízo estético é abordado no livro "Crítica da Faculdade do Juízo". De acordo com Kant para se ter uma investigação crítica a respeito do belo, devemos estar orientados pelo poder de julgar. E a indagação básica que move essa investigação crítica a respeito do belo é: existe algum valor universal que conceitue o belo e que reivindique que outras pessoas, a partir da minha apreciação de uma forma bela da natureza ou da arte, confirmem essa posição? Ou então somos obrigados a admitir que todo objeto que julgamos como sendo belo é uma valoração subjetiva? 60


O poder de julgar, pertencendo a todo sujeito, é universal e congraça o julgamento estético, especulativo e prático. Portanto a investigação crítica que Kant se refere diz respeito às possibilidades e limitações das faculdades subjetivas que agem sob princípios formulados e que pertencem à essência do pensamento. Como podemos desnudar o fenômeno que explica o nosso gosto? Se fizermos uma experiência com vários indivíduos e o defrontarmos com um objeto de arte, observaremos que as impressões causadas serão as mais diversas. Então chegaremos à conclusão de que a observação atenta e valorativa daquele objeto, somada as diferentes opiniões que foram apresentadas pelos indivíduos, nos dá respaldo para afirmar que o gosto tem que ser discutido. Para Kant apenas sobre gosto se discute, ao passo que, representa uma reivindicação para tornar universal um juízo subjetivo. A universalidade do juízo estético é detectada por envolver um exercício persuasivo de convencimento de outro sujeito que aquela determinada forma da natureza ou da arte é bela. E, dessa forma, torna aquele valor universal. Os sujeitos têm em comum um princípio de avaliação moral livre que determina a avaliação estética e, portanto, julga o belo como universal. O juízo estético está relacionado ao prazer ou desprazer que o objeto analisado nos imprime e, como se refere Kant, o belo "é o que agrada universalmente, sem relação com qualquer conceito". Essa situação fica bem evidente quando visitamos um museu. Digamos que essa experiência fosse realizada no Museu do Louvre, em Paris, com o quadro Monalisa. Se nos colocarmos como observador, perceberemos que os mais diversos comentários serão tecidos a cerca dessa obra tão famosa. Detendo-nos na análise dos comentários favoráveis notaremos que, ratificando Kant, o belo não está arraigado em nenhum conceito. Pois, dos vários indivíduos que vão apreciar a obra de Leonardo da Vinci, encontraremos desde pessoas especializadas em arte até leigos, como eu ou você, que vão empregar cada qual um conceito, de acordo com a percepção, após a contemplação da Monalisa. Então isso comprova que não existe uma definição exata a cerca do belo, mas sim um sentimento que é universal e necessário. Em sua "Crítica da Faculdade do Juízo", Kant também discorre sobre o Juízo Reflexionante, no tocante à observação da natureza. Kant reconhece que, nas ciências baseadas na observação empírica, existem diversas leis, padrões e comportamentos regulares que não são determinados analiticamente a partir das leis a priori do entendimento. Para garantir a necessidade dessas leis empíricas, ele lança mão do juízo reflexionante, o qual, “comparável à indução científica, [...] procede da diversidade particular das leis a um princípio unificador transcendental”. Esse ideal de organização sistemática nos encaminha a considerar a existência de um propósito maior, que possibilite uma experiência unificada para o entendimento da natureza.Tal raciocínio leva esse filósofo a reconhecer a necessidade de uma ideia de finalidade que englobe toda a natureza enquanto tal (e que, no caso tratado, seria também responsável pela harmonia observável no mundo natural). Note-se que a referida ideia de finalidade atribuída ao mundo natural é apenas um princípio regulador, sem meios de ser comprovada a priori por nosso aparato cognitivo, mas a qual precisamos adotar para resolver nossas questões práticas de conhecimento. Devemos estar sempre conscientes de que se trata de uma pressuposição, mas não de imputação como tal. Em vez de afirmar que existe realmente essa finalidade, afirmaríamos que tudo se passa como se a mesma existisse. É nesses termos que se torna coerente a tese de que nunca poderia haver um “Newton dos Talos de Grama”, pois a Física, definida com base em conceitos puros do entendimento a priori, estaria em um grau de certeza superior aos conhecimentos que necessitam da suposição de um princípio regulador teleológico (visto ser necessário supor que a grama tem como finalidade o seu próprio crescimento). O juízo teleológico terá uma importância primordial na obra kantiana, visto que somente a partir dele será possível intermediar a causalidade natural com a finalidade moral. Enfim, o juízo teleológico conseguirá transitar da ideia de uma harmonia interna ao sujeito transcendental (das faculdades mentais subjetivas, que é a pressuposição para o juízo estético), para uma harmonia que resida na própria natureza. E para falar de uma finalidade em um objeto da natureza, é preciso que esse objeto seja causa final de si mesmo, de maneira que o “nexo das partes seja tal que cada parte pareça determinada pelo todo; e o todo, por seu turno, não seja possível senão pelas partes”. Os principais exemplos dos objetos em questão serão os seres orgânicos, os quais se organizam a si mesmos e, no contexto mais amplo, formam uma harmonia maior: o ambiente natural. Consequencialmente, Kant define dois métodos para se investigar a natureza. Primeiro, o conhecimento discursivo fundado nas causas eficientes e, portanto, no determinismo causal, cujo exemplo é a física; e, em segundo lugar, de um entendimento intuitivo, que inicia por supor finalidades em um ser vivo, ou mesmo na natureza enquanto todo orgânico para, em seguida, investigar suas partes. O juízo teleológico que, como vimos, está ancorado no juízo reflexionante, é imprescindível para o estudo concernente aos fenômenos vitais. Embora não possamos aplicá-lo com o rigor de uma causa eficiente, conforme se faz na física, o juízo em foco deve ser um fio condutor para o cientista da natureza, para que ele compreenda os seres vivos e o ambiente natural. 61


A paz perpétua A paz perpétua trata que o direito cosmopolítico deve circunscrever-se às condições de uma hospitalidade universal. Dessa forma, Kant traz no terceiro artigo definitivo de um tratado de paz perpétua, o fato de que existe um direito cosmopolitano relacionado com os diferentes modos do conflito dos indivíduos intervirem nas relações com outros indivíduos. A pessoa que está em seu território, no seu domínio, pode repelir o visitante se este interfere em seu domínio. No entanto, caso o visitante mantenha-se pacífico, não seria possível hostilizá-lo. Também, não se trata de um direito que obrigatoriamente o visitante poderia exigir daquele que o tem assim, mas sim, de um direito que persiste em todos os homens, o do direito de apresentar-se na sociedade. O direito de cada um na superfície terrestre pode ser limitada no sentido da superfície. Já o indivíduo deve tolerar a presença do outro, sem interferir nele, visto que tal direito persiste a toda espécie humana. Então, o direito da posse comunitária da superfície terrestre pertence a todos aqueles que gozam da condição humana, existindo uma tolerância de todos a fim de que se alcance uma convivência plena. Veja que o ato de hostilidade está presente no ato do direito de hospitalidade. Mesmo que o espaço seja limitado, os indivíduos devem se comportar pacificamente com o intuito de se alcançar a paz de convívio mútuo. O relacionamento entre as pessoas está na construção dos direitos de cada um, sendo indispensável para a compreensão do direito cosmopolítico de modo a garantir as condições necessárias para termos uma hospitalidade universal. Por fim, a não violação do direito cosmopolitano e o direito público da humanidade criará condições para o favorecimento da paz perpétua, proporcionando a esperança de uma possível aproximação do estado pacífico. Crítica Só a crítica pode cortar pela raiz o materialismo, o fatalismo, o ateísmo, a incredulidade dos espíritos Kant, Crítica da fortes, o fanatismo e a superstição, que se podem tornar razão pura, B nocivos a todos e, por último, também o idealismo e XXXIV. o cepticismo, que são sobretudo perigosos para as escolas e dificilmente se propagam no público. Apesar de ter adaptado a ideia de uma filosofia crítica, cujo objectivo primário era "criticar" as limitações das noss as capacidades intelectuais, Kant foi um dos grandes construtores de sistemas, levando a cabo a ideia de crítica nos seus estudos da metafísica, ética e estética. Uma citação famosa - "o céu estrelado sobre mim e a lei moral dentro de mim" - é um resumo dos seus esforços: ele pretendia explicar, numa teoria sistemática, aquelas duas áreas. Isaac Newton tinha desenvolvido a teoria da física sob a qual Kant queria edificar a filosofia. Esta teoria envolvia a assunção de forças naturais de que os homens não se apercebem, mas que são usadas para explicar o movimento de corpos físicos. O seu interesse na ciência também o levou a propor em 1755 que o sistema solar fora criado a partir de uma nuvem de gás na qual os objectos se condensaram devido à gravidade. Esta Hipótese Nebular é amplamente reconhecida como a primeira teoria moderna da formação do sistema solar e é precursora das actuais teorias da formação estelar.

Metafísica e epistemologia de Kant O livro mais lido e mais influente de Kant é a Crítica da Razão Pura (1781). De acordo com o próprio autor, a obra, também conhecida como "primeira crítica", é resultado da leitura de David Hume e do seu despertar do "sono dogmático", a saber: Kant se perguntou como são possíveis juízos sintéticos a priori? Para responder a essa pergunta, Kant escreveu esse livro portentoso, de mais de 800 páginas. Na primeira crítica, Kant vai mostrar que tempo e espaço são formas fundamentais de percepção (formas da sensibilidade) que existem como ferramentas da mente, mas que só podem ser usadas na experiência. Tente imaginar alguma coisa que existe fora do tempo e que não tem extensão no espaço. [ A mente humana não pode produzir tal ideia. Nada pode ser percebido excepto através destas formas, e os limites 62


da física são os limites da estrutura fundamental da mente. Assim, já vemos que não podemos conhecer fora do espaço e do tempo. Mas além das formas da sensibilidade, Kant vai nos dizer que há também o entendimento, que seria uma faculdade da razão. O entendimento nos fornece as categorias com as quais podemos operar as sínteses do diverso da experiência. Assim, como são possíveis juízos sintéticos a priori? São possíveis porque há uma faculdade da razão - o entendimento - que nos fornece categorias a priori - como causa e efeito - que nos permitem emitir juízos sobre o mundo. Contudo, diz Kant, as categorias são próprias do conhecimento da experiência. Elas não podem ser empregadas fora do campo da experiência. Daí porque, na filosofia crítica de Kant, não nos é possível conhecer "a coisa em si", ou aquilo que não está no campo fenomenológico da experiência. Na perspectiva de Kant, há, por isso, o conhecimento a priori de algumas coisas, uma vez que a mente tem que ter estas categorias, de forma a poder compreender a massa sussurrante de experiência crua, não-interpretada que se apresenta às nossas consciências. Em segundo lugar, ela remove o mundo real (a que Kant chamou o mundo numenal ou númeno) da arena da percepção humana. Kant denominou a filosofia crítica de "idealismo transcendental". Apesar da interpretação exacta desta frase ser contenciosa, uma maneira de a compreender é através da comparação de Kant, no segundo prefácio à "Crítica da Razão Pura", da filosofia crítica com a revolução copernicana na astronomia. “ Até aqui, foi assumido que todo o nosso conhecimento deve conformar-se aos objectos. Mas todas as nossas tentativas de estender o nosso conhecimento de objectos pelo estabelecer de qualquer coisa a priori a seu respeito, por meios de conceitos, acabaram, nesta suposição, por falhar. Temos pois, por tentativas, que ver se temos ou não mais sucesso nas tarefas da metafísica, se supusermos que os objectos devem corresponder ao nosso conhecimento.” Tal como Nicolau Copérnico revolucionou a astronomia ao mudar o ponto de vista, a filosofia crítica de Kant pergunta quais as condições a priori para que o nosso conhecimento do mundo se possa concretizar. O idealismo transcendental descreve este método de procurar as condições da possibilidade do nosso conhecimento do mundo. Mas esse idealismo transcendental de Kant deverá ser distinguido de sistemas idealistas, como os de Berkeley. Enquanto Kant acha que os fenómenos dependem das condições da sensibilidade, espaço e tempo, esta tese não é equivalente à dependência-mental no sentido do idealismo de Berkeley. Para Berkeley, uma coisa é um objecto apenas se puder ser percepcionada. Para Kant, a percepção não é o critério da existência dos objectos. Antes, as condições de sensibilidade - espaço e tempo - oferecem as "condições epistémicas", para usar a frase de Henry Allison, requeridas para que conheçamos objectos no mundo dos fenómenos. Kant tinha querido discutir os sistemas metafísicos mas descobriu "o escândalo da filosofia": não se pode definir os termos correctos para um sistema metafísico até que se defina o campo, e não se pode definir o campo até que se tenha definido o limite do campo da física - física, no sentido de discussão do mundo perceptível. Kant afirma, em síntese, que não somos capazes de conhecer inteiramente os objetos reais visto que o nosso conhecimento sobre os objetos reais é apenas fruto do que somos capazes de pensar sobre eles.

Filosofia moral Immanuel Kant desenvolveu a filosofia moral em três obras: "Fundamentação da Metafísica dos Costumes" (1785), 'Crítica da Razão Prática" (1788) e "Crítica do Julgamento" (1790). Nesta área, Kant é provavelmente mais bem conhecido pela teoria sobre uma obrigação moral única e geral, que explica todas as outras obrigações morais que temos: o imperativo categórico. “

Age de tal modo que a máxima da tua ação se possa tornar princípio de uma legislação universal.

O imperativo categórico, em termos gerais, é uma obrigação incondicional, ou uma obrigação que temos independentemente da nossa vontade ou desejos (em contraste com o imperativo hipotético). As nossas obrigações morais podem ser resultantes do imperativo categórico. O imperativo categórico pode ser formulado em três formas, que ele acreditava serem mais ou menos equivalentes (apesar de opinião contrária de muitos comentadores): 63


§ A primeira formulação (a fórmula da lei universal) diz: "Age somente em concordância com aquela máxima através da qual tu possas ao mesmo tempo querer que ela venha a se tornar uma lei universal". § A segunda fórmula (a fórmula da humanidade) diz: "Age por forma a que uses a humanidade, quer na tua pessoa como de qualquer outra, sempre ao mesmo tempo como fim, nunca meramente como meio". § A terceira fórmula (a fórmula da autonomia) é uma síntese das duas prévias. Diz que deveremos agir por forma a que possamos pensar de nós próprios como leis universais legislativas através das nossas máximas. Podemos pensar em nós como tais legisladores autônomos apenas se seguirmos as nossas próprias leis.

Existencialismo O existencialismo é a vertente que adota o indivíduo como ponto de partida para todas as reflexões filosóficas. Assim, os existencialistas nunca deixam de considerar os sentimentos e as experiências humanas para tentar explicar a realidade. Exemplos de filósofos existencialistas modernos: Soren Kierkegaard, Jean-Paul Sartre, Simone de Beauvoir, Friedrich Nietzsche e Martin Heidegger.

Pragmatismo O pragmatismo é o estudo responsável por relacionar teoria com prática. Os filósofos pragmáticos acreditam que diversos métodos e conceitos da ciência moderna devem ser utilizados na filosofia para otimizar a utilização do conhecimento. Exemplos de filósofos pragmáticos modernos: William James, Richard Rorty e Charles Sanders Peirce.

FONTES https://www.portaleducacao.com.br http://moysesteologia.blogspot.com http://www.ppe.uem.br TILLICH, Paul. História do Pensamento Cristão. Trad. Jaci Maraschin – 4º Ed. São Paulo, ASTE, 2007

REALE-ANTISSERI, Giovanni, Dario. HISTÓRIA DA FILOSOFIA. São Paulo, Ed. Paulus, 2004, VV. 1,2,3.

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