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Os Dez Mandamentos Êxodo 20:1-21 IPCci Pr. Jorge Luiz Patrocinio, Ph. D. Introdução Após a fala preliminar de Deus com Moisés e o povo e a preparação através da santificação, Deus se dá a conhecer a Moisés e o povo todas as Suas ordenanças a respeito dos dois direcionamentos da vida humana na terra: vertical e horizontal. Deus tinha andado com o homem no jardim do Éden e feito homem e mulher andar em comunhão um com o outro. O pecado, no entanto, afetou essas duas dimensões da vida: O homem perdeu sua comunhão com Deus e levantou-se contra o seu semelhante. A escravidão do Egito-uma clara figura da desavença humanapassou a ser também a figura de um conceito espiritual de distanciamento de Deus. Todas as ordenanças descritas no Sinai que vai de Êxodo 20 por todo o restante do Livro até Número 10:11 quando a nuvem se levanta em direção a que seria a última parada do deserto antes da terra prometida (Cades Barnéia) foram dadas para que este povo pudesse viver em paz com Deus e consigo mesmo. O Capítulo 20 de Êxodo merece análise criteriosa. O acontecimento no versículo 24 do capítulo anterior dá prosseguimento no versículo 18 do capítulo 20. É bem provável que os dez mandamentos do versículo 1 a 17 só tenha sido entregue ao povo mais tarde. No capítulo 32 há o acontecimento do bezerro de ouro e a quebra das tábuas. Somente no capítulo 34 de Êxodo encontramos as segundas tábuas da Lei.
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Isso implica em dizer que ao escrever o livro de Êxodo, Moisés relata os escritos das tábuas da Lei aqui no capítulo 20 dentro do contexto do povo presenciando o poder e a manifestação de Deus no Monte. A Lei visava restaurar, em definitivo, esses dois relacionamentos. A porção de Êxodo 20:1 a 21 retrata o conteúdo substancioso, conteúdo total e ao mesmo tempo embrionário de toda a Lei que nos capítulos seguintes vai ser detalhada para cada situação. Toda a vida foi oferecida de forma embrionária com o potencial de alcançar a cada momento novos limites. Em Gênesis 1:11 Deus disse: “Produza a terra relva, ervas que dêem sementes e árvores frutíferas que dêem fruto segunda a sua espécia, cuja semente esteja nele...” Isso nos afirma que as frutas foram criadas com sementes dentro delas. Essas sementes traziam o potencial da fruta que iria infinitamente além de si mesma. Os Dez Mandamentos também foram entregues com este potencial de ir muito além de si mesmos. E eles foram escritos propositalmente em duas tábuas que Moisés apresentaria ao povo. Porque as duas tábuas da Lei? Porque as duas tábuas retratam as ordenanças das duas direções que o homem deveria se relacionar e que haviam sido afetadas após o Éden: A primeira Tábua da Lei, que engloba os quatro primeiros Mandamentos e que estão descritos do versículo 3 a 11, nos remete as nossas obrigações para adorarmos a Deus:
Não terás outros deuses diante de Mim; Não farás para ti imagem de escultura; Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão; Lembra-te do dia do sábado para o santificar;
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A segunda Tábua da Lei nos fala diretamente sobre as nossas obrigações civis contra o nosso semelhante:
Honra teu pai e tua mãe; Não matarás; Não adulterarás; Não furtarás; Não dirás falso testemunho contra o teu próximo; Não cobiçarás os bens de teu próximo.
O reformador francês João Calvino, em seu livro teológico para a vida, as Institutas da Religião Cristã (2.8.11) descreve as duas tábuas da seguinte forma: “Concordemente na primeira Tábua, Deus nos instrui em piedade e nas obrigações apropriadas da religião, pelos quais nós adoramos a sua Majestade. A segunda Tábua descreve, conforme o nosso temor a Seu nome, como devemos nos conduzir na sociedade humana. Desta maneira o Senhor, como relatado pelo Evangelista, sumariza toda a Lei sob essas duas cabeças: “Devemos amar o Senhor nosso Deus de todo o nosso coração e com toda a nossa alma e força” e “devemos amar o próximo como a nós mesmos” (Lucas 10:27 e Mt. 22:37-39). Você pode ver que as duas partes que a Lei consiste, uma nos direciona para Deus e a outra Ela aplica aos homens.” Retornando a idéia de “vida em potencial” esses mandamentos também traziam em si um potencial de expandir-se além de si mesmos. Por exemplo: Quando Deus disse “não matarás”, estava implícito neste mandamento “toda variante de pecado e atentado à vida.” Em outras palavras, não podemos matar em nenhum aspecto: físico, emocional, relacional e espiritual. Outro exemplo que Jesus expandiu foi o 7º mandamento – “Não adulterarás”- que se expandia em não somente “não tocar” a mulher (ou marido) do próximo (a), mas também não desejá-la.
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Perante esta exposição esclarecedora duas perguntas se levantam para nós nesta noite: (1) Porque Deus deu uma Lei com um conceito tão elevado, santo e sublime? (2) Como cumprir uma Lei que por sua perfeição e sua amplitude esbarram e entram em rota de colisão direta com a finitude e pecado do homem? Aqui nos parece haver um paradoxo; isto é, Deus nos dá uma ordem que sabe que não conseguiremos cumprir. São essas duas perguntas que nos ateremos neste momento:
1. Porque Deus deu um conceito de Lei tão elevado, santo e sublime? O próprio Moisés começa a responder esta pergunta no versículo 20: “Respondeu Moisés: Não temais; Deus veio para vos provar e para que o seu temor esteja diante de vós, a fim de que não pequeis.” Devemos notar que o encontro de Deus e o homem pós-edênico apresenta um questionamento: Como compreender o encontro do Todo-Poderoso Deus, santo, justo e verdadeiro e o finito, pecador e imperfeito homem sem que haja nenhuma arbitrariedade? Deus não poderia vir ao homem e não exigir deste homem perfeição. Deus não poderia ser arbitrário à Sua própria justiça e santidade, relacionando-se com este homem permitindo que este se mantivesse na posição declarada de pecado e imperfeição. Deus deu um conceito perfeito de Lei perfeita porque nada menos do que a perfeição poderia ser aceito por Ele. Deus disse “sede santos porque eu sou santo” porque nada menos do que a santidade e perfeição poderiam ser aceitas com satisfação diante dEle.
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E porque esta Lei foi tão elevada e perfeita? É preciso que lembremos o que o apóstolo Paulo nos fala em Romanos 7:12: “A Lei é santa; e o Mandamento, santo, e justo e bom.” Não há nenhum problema com a Lei e os Dez Mandamentos e nem tão pouco com Deus e Suas ordenanças. Deus manifestou Seu desejo de que o homem andasse com Ele de uma forma natural à Sua natureza santa, justa e verdadeira. Mas nós chegamos a este pondo com um peso muito grande nas costas, pois a Lei é santa, justa e verdadeira. Deus é eterno, imutável, santo e justo. E Ele nos chama a andar com Ele. Nos encontramos aqui num grande dilema, numa grande dificuldade. E aqui a segunda pergunta é colocada em pauta:
2. Como cumprir a Lei de Deus (Lei esta impossível de ser cumprida)? Aqui não é Moisés que fala e sim o próprio povo de Israel. No versículo 19 “disseram a Moisés: Fala-nos tu, e te ouviremos; porém não fale Deus conosco, para que não morramos.” Até aquele momento o povo resmungava diante de Moisés a cada obstáculo no caminho, mas quando “todo o povo presenciou os trovões, e os relâmpagos, e o clangor da trombeta, e o monte fumegante; e o povo, observando, estremeceu e ficou de longe.” O povo então disse a Moisés: Seja o nosso mediador diante de Deus. Veja esta expressão: “O povo ficou de longe.” A perfeição da Lei e a santidade, justiça, retidão e poder de Deus não permitiram que o homem se aproximasse. E o caminho desta obediência se tornou uma rua sem saída.
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Vimos no capítulo 19 que Deus mesmo chamou Moisés e o colocou como mediador de sua presença; mas agora o próprio povo reconhece a necessidade deste mediador. A busca da obediência a Deus sem um Mediador é uma rua sem saída que leva ao legalismo ou ao desespero: Ao legalismo porque exteriormente a pessoa tenta viver uma perfeição diante dos outros. Ao desespero porque ela reconhece para si, no interior, a sua impossibilidade de satisfazer a Lei. E o apóstolo Paulo em Romanos 7:10-12 conclui: “E eu, nalgum tempo, vivia sem lei, mas, vindo o mandamento, reviveu o pecado, e eu morri. E o mandamento que era para vida, achei eu que me era para morte. Porque o pecado, tomando ocasião pelo mandamento, me enganou, e por ele me matou.” E somente um caminho – o único caminho- se mostrou para nós: Romanos 10:4 proclama: “Porque o fim da lei é Cristo para justiça de todo aquele que crê.” 1 Timóteo 2:5-6 “Porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem. O qual se deu a si mesmo em preço de redenção por todos, para servir de testemunho a seu tempo.” Por isso Paulo diz: “Se com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Visto que com o coração se crê para a justiça, e com a boca se faz confissão para a salvação. Porque a Escritura diz: Todo aquele que nele crer não será confundido. Porquanto não há diferença entre judeu e grego; porque um mesmo é o Senhor de todos, rico para com todos os que o invocam. Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.” (Romanos 10:9-13)
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Só há, portanto, uma forma de cumprirmos a Lei santa, justa e perfeita; a saber, reconhecendo o Senhor Jesus como o nosso único salvador, o nosso mediador. Aceitando o Seu cumprimento da Lei em nosso lugar e entregando a nossa vida inteiramente a Ele. As duas escolhas são postas diante de ti- os dois caminhos: O caminho a perfeição da Lei que leva o homem ao legalismo, ou ao desespero, ou o caminho de Cristo que leva o homem a prática do amor. Mas agora em Cristo não precisamos mais cumprir a Lei? Aqui uma terceira pergunta precisa ser respondida:
3. Como a obediência da Lei acontece na prática para nós que vivemos em Cristo? Aqui lançamos mão de uma história que se encontra em Marcos 10:17-22: “E, pondo-se a caminho, correu para ele um homem, o qual se ajoelhou diante dele, e lhe perguntou: Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna? E Jesus lhe disse: Por que me chamas bom? Ninguém há bom senão um, que é Deus. Tu sabes os mandamentos: Não adulterarás; não matarás; não furtarás; não dirás falso testemunho; não defraudarás alguém; honra a teu pai e a tua mãe. Ele, porém, respondendo, lhe disse: Mestre, tudo isso guardei desde a minha mocidade. E Jesus, olhando para ele, o amou e lhe disse: Falta-te uma coisa: vai, vende tudo quanto tens, e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, toma a cruz, e segue-me. Mas ele, pesaroso desta palavra, retirou-se triste; porque possuía muitas propriedades.” Jesus resumiu os dez mandamentos da seguinte forma:
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“... O primeiro de todos os mandamentos é: Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento, e de todas as tuas forças; este é o primeiro mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que estes.” (Mc.12:29-31) A ordem dos fatores é importante. Nas duas Tábuas da Lei, amar a Deus e amar ao próximo são mandamentos que se completam. Neste encontro com o Jovem rico Jesus inverteu a ordem das duas Tábuas da Lei, pois ao invés de começar perguntando ao jovem sobre sua devoção a Deus, Jesus foi direto aos 6 mandamentos em direção ao próximo. E o jovem não conseguiu dar o passo adiante porque ele estava preocupado em cumprir suas obrigações com o próximo. Marcos diz que “Jesus fitando-o o amou e disse.” Neste momento Jesus estava trazendo o valor maior do reino de Deus. Aquele jovem deveria amar a Deus sobre todas as coisas para seguir a Jesus. Em João 13:34-35 Jesus diz aos Seus discípulos em particular Jesus disse: “Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis. Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros.”
Conclusão Os dez Mandamentos são santo, justo e verdadeiro. O erro não está na perfeição deles e nem em Deus. Mas, por causa do nosso pecado, se tentarmos subir o monte Sinai dos dez Mandamentos nos encontraremos numa estrada de solidão, estresse e legalismo. Há somente uma forma: Depender completamente do nosso Mediador que subiu o Calvário para oferecer-se por nós.
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O que devemos fazer é viver essa nova, ampliada e possível dimensão dos Mandamentos; a saber, “amar a Deus sobre todas as coisas e ao nosso próximo como a nós mesmos.”