Personalidades IPT - Ary Torres

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Ary Torres Ary Frederico Torres foi engenheiro civil, pesquisador, educador e empreendedor. Seu nome, já conhecido dos paulistanos por designar uma das principais pontes da cidade, marca a autoria de inúmeros feitos, entre eles a criação do IPT, em 1934.

Ary Torres 1900 †1973

Seu trabalho foi essencial para o desenvolvimento da construção civil no País. Em sua trajetória profissional, dedicou-se à pesquisa do concreto, sem a qual não teriam sido construídos os primeiros aranha-céus de concreto armado de São Paulo e do Rio de Janeiro. Empreendedor, Ary Torres foi fundador e presidente de importantes instituições brasileiras, como a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), a Associação Brasileira de Metais (ABM), a Cia. Siderúrgica Nacional (CSN) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE). Defendia as políticas nacionais de infraestrutura e industrialização, enfatizando a importância da educação, da pesquisa tecnológica e da autonomia dos institutos de pesquisa. Circulava com facilidade entre o meio acadêmico, empresarial e político, articulando-os com rara habilidade. Esta capacidade de negociação transformou o pequeno Gabinete de Resistência de Materiais (GRM) em IPT, um instituto com autonomia para responder aos desafios da indústria e do desenvolvimento. Permaneceu na superintendência do Instituto até 1939.


vida Na década de 1900 tiveram início as atividades do Gabinete de Resistência dos Materiais (GRM), da Escola Politécnica de São Paulo, local em que se institucionalizou a pesquisa tecnológica voltada para a construção, numa cidade em vertiginoso crescimento. É nesse momento que nasce Ary Frederico Torres, em 01 de outubro de 1900, em Porto Alegre - RS, filho de Christiano Torres e Isabel de Magalhães Torres. Seu pai era comerciante e tinha uma casa de exportação e importação de produtos agrícolas e manufaturados, a C.Torres & Cia, que era a maior exportadora de fumo em folha do sul do Brasil.

Determinado a cursar engenharia, frequentou o curso preliminar da Escola Politécnica de São Paulo em 1918. Ganhou o prêmio Cesário Mota como aluno de maior distinção, passando a cursar Engenharia Civil no ano seguinte. Por ter sido o melhor aluno da turma, ganhou uma viagem para se especializar no exterior. No último ano da Escola, junto com um colega, abriu uma pequena empresa de terraplanagem. Ao se formar, em 1923, casou-se com a paulista Aparecida Bittencourt, da cidade de Limeira - SP, com quem teve três filhos, José Roberto, Maria Helena e Heloísa. A urbanização paulistana foi um fator importante para a consolidação da industrialização, polarizando as atividades econômicas ligadas à construção e formando a indústria cimenteira. Entretanto, essas empresas necessitavam de apoio técnico e de mão-de-obra qualificada. Para atender às demandas da indústria química e de materiais de construção, Ramos de Azevedo, diretor da Escola Politécnica, estudava, com um grupo de professores, a possibilidade da instalação de um instituto de tecnologia.

Déc. 1920 - Familia Torres - Ary é o primeiro da esq. para a dir. na segunda fila Caçula de uma família de oito filhos, em 1911, acompanhando seus pais em viagem à Europa, pediu para estudar no Instituto Dr. Schmidt St. Gall, na Suíça - uma instituição de renome internacional. Seus pais o deixaram no Instituto e continuaram a viagem, correspondendo-se com o filho por cartões postais.

A personalidade de Ary F. Torres era multiforme, o que o fez distinguir-se enormemente mesmo fora do campo técnico. Jornal O Globo, Rio de Janeiro, 2 de abril de 1973

Em 1925, Ary deixa a empresa da qual era sócio e parte para a Europa com a incumbência de se especializar e estudar a criação de um instituto tecnológico. Visitou laboratórios de pesquisas na Alemanha, Áustria, Bélgica, França, Itália e Suíça, trabalhando como assistente em Zurique, no Laboratório de Ensaio de Materiais (Eidgenossische Materialprufungs-anstalt), atual Eidgenössischen Technischen HochschulenBereich (ETH), por cerca de um ano. De volta ao Brasil, em 1926, apresentou um relatório dos trabalhos realizados durante a viagem, que foi apreciado pela Congregação da Poli. Ary foi indicado para assumir a direção do GRM e, como diretor do Gabinete, trabalhou para concretizar o seu grande projeto: a criação do Instituto de Pesquisas Tecnológicas, em 1934.

Déc. 1920 - Ary (segunda fila, 2º da dir. para esq) em festa familiar Ao retornar para o Brasil, em 1913, ingressou no Ginásio Júlio de Castilhos, em Porto Alegre. No ano seguinte veio a São Paulo para estudar no Colégio Anglo-Brasileiro, finalizando o curso em 1917.

1911 - Turma de Ary no Institut Dr. Schmidt, na Suíça, onde estudou durante dois anos

Déc. 1960 - Ary, a esposa Aparecida e os netos

Déc. 1950 - Ary e a esposa Aparecida Bittencourt

Após cinco anos na direção do novo Instituto, Ary demite-se em 1939 para atuar em outras áreas, como Secretário da Viação e Obras Públicas do Estado de São Paulo, Vice-Presidente da Cia. Siderúrgica Nacional (CSN), professor da Escola Politécnica, fundador e presidente da Cia. Brasileira de Material Ferroviário (Cobrasma) e da Brassinter, entre outras. Mesmo ausente do Instituto, sempre referenciava o IPT nas suas atividades.


GRM Além de diretor, Ary continuava a exercer a função de pesquisador. Especialista em materiais de construção, publicou o Boletim nº 1 - “O Método Racional de Dosagem dos Concretos”, obra pioneira para a indústria de construção civil, ajudando o setor a melhorar a qualidade do produto, tanto na economia como na obtenção da resistência adequada ao seu uso. Ary mostrou que, para certa quantidade de cimento, o excesso de água diminuía a resistência do concreto. Esse trabalho o tornou conhecido no País, abriu as portas do laboratório para os engenheiros civis que desejavam se especializar na tecnologia dos materiais de construção, multiplicando a demanda por esses ensaios. 1899 - Fachada do Gabinete de Resistência de Materiais (GRM) no bairro Bom Retiro - é o 1º prédio à esq. ao lado a Escola Politécnica O crescimento dos centros urbanos e da indústria cimenteira nos anos 1920 trouxeram ao GRM o desafio de atender à crescente demanda por ensaios e auxílio técnico. Na época, o Gabinete era apenas um laboratório de aulas práticas e atendia de modo rudimentar às indústrias nascentes. O relatório apresentado por Ary Torres à Congregação da Escola, em 1926, sugeria a ampliação e remodelação do Gabinete, valorizando a pesquisa tecnológica e a colaboração com as indústrias existentes, além da especialização dos técnicos.

O projeto de ampliar o GRM foi aceito pelo Governo Estadual de Carlos de Campos, sendo aprovado pelo Decreto 4167 de janeiro de 1927, que estabelecia autonomia à instituição para cobrar taxas por serviços prestados e regime de dedicação integral. Ary Torres e Ramos de Azevedo fazem um apelo às companhias ferroviárias Paulista, Mogiana e Sorocabana para conseguir verbas para ampliação dos prédios, modernizar os equipamentos e atualizar a biblioteca.

O relatório foi aprovado pelos engenheiros Silva Freire e Mário Whately, que indicaram Ary para o cargo de diretor do GRM. Assim que assumiu o cargo, Ary Torres convidou o engenheiro Adriano Marchini, da Diretoria de Obras Públicas de São Paulo, para sua assessoria. Pouco depois, inicia a reforma do espaço.

Ary tinha preocupação constante com a formação e a especialização de equipes técnicas no País Dr. Alberto Pereira de Castro (2007) O gabinete continuou com a função didática, mas priorizou a pesquisa, tanto a de interesse geral e de iniciativa dos pesquisadores, quanto a solicitada pela indústria.

1928 - Ensaio de areia para uso em concreto Em setembro de 1927, Ary vai para a Europa encomendar e acompanhar a confecção dos equipamentos. Ciente da carência brasileira na área de metalurgia, aproveitou a viagem para frequentar o curso de metalurgia e e metalografia microscópica com o professor Leon Guillet, no laboratório da Usina de Dion Bouton, em Paris (França). Ao retornar, um ano depois, iniciou a reorganização do GRM, que passa a ser conhecido como LEM, e transmitiu sua orientação sobre metalografia a Hubertus Colpaert, que se dedicou com afinco a essa especialidade.

Nunca se ouvia Ary Torres elevar o tom de voz, mas sabia exigir de modo inapelável Déc. 1930 - Preparação de base de medida para ensaio de módulo de elasticidade em corpo de prova de concreto

Déc. 1920 - Ary (na segunda fila, quinto da esq. para dir) e os professores da Poli

Discurso do Dr. Francisco de Assis Basílio em 27/09/1973

1927 - Ary (3º da dir. para esq) e equipe dos pesquisadores do GRM

Déc. 1950 - Encontro de ex-alunos da Poli Ary é o 9º da 1ª fila, da dir. p/ esq.


LEM Faremos tudo para que esse número chegue à centena de milhares; trabalhem com amor pela tecnologia brasileira, pois esta será um dos fatores para o progresso do Brasil

Déc. 1920 - Fachada da entrada principal do Laboratório de Ensaios de Materiais (LEM)

Palavras proferida por Ary Torres aos funcionários do LEM na comemoração do Certificado Oficial nº 1000, em 2 de abril de 1927

O Gabinete modernizou-se, ganhou autonomia e reviu suas prioridades. Espontaneamente, começou a ser conhecido pelo público como Laboratório de Ensaios de Materiais, designação oficializada em 1931.

Em 1930, licenciou-se do cargo de diretor por dez meses, para cuidar dos negócios da empresa da família - a C. Torres & Cia., da qual era sócio, deixando Adriano Marchini como substituto.

Rômulo de Lemos Romano, João Luiz Meiller e Hubertus Colpaert passaram a trabalhar, em 1927, como assistentes-alunos, em atividades voltadas para a urbanização de São Paulo. Nesse ano, é expedido o Certificado Oficial nº 1000, que Ary comemora com os seus funcionários, após um ano na direção do Laboratório.

Em 1932, ausentou-se novamente do LEM para assumir a direção de sua empresa no sul. Com a Revolução de 1932, o Laboratório dedicouse à fabricação de equipamentos bélicos, sob a coordenação de Adriano Marchini, que seria seu substituto a partir de 1939.

1933 - Visita do Pres. da Argentina, Agustín P. Justo Rolón, ao LEM 1929 - Ensaio para nova adutora da usina da Light, em Cubatão Em 1929, trabalhavam no LEM 16 pessoas, das quais seis eram engenheiros. Dois deles eram do exterior, contratados por Ary para dar suporte técnico a sua equipe – Adolfh Voelmy, do ETH de Zurique, para os estudos de armação do concreto e para a Seção de Metais, e o suíço Gian Caprez para orientar os estudos das madeiras brasileiras.

Mais do que máquinas e as verbas, é importante o elemento humano, e esse não se improvisa Ary Torres Palestra no Sindicato dos Engenheiros da Bahia, em 1940

Déc. 1930 - Estudo de fundação de concreto

1929 - Equipe de colaboradores do LEM - Ary na 1ª fila, ao centro

Déc. 1930 - Prova de carga em laje

Déc. 1930 - Ensaio de ruptura de concreto


IPT Quando deixou o IPT, em 1939, o Instituto contava com uma equipe de 121 colaboradores, alocados em 12 Seções Técnicas: Aglomerantes e Concreto; Ensaios Mecânicos de Metais; Metalografia; Fundição; Ensaios Mecânicos de Madeiras; Estruturas e Preservação das Madeiras; Verificação de Estruturas; Mecânicas dos Solos; Metrologia; Química; Geologia e Minas; Documentação, Normas e Especificações.

Déc. 1930 - Fachada do prédio do IPT no bairro do Bom Retiro A partir de 1930, o processo de urbanização acelerou-se e a política industrializante do governo Vargas propiciou o surgimento de novos setores, como a siderurgia. Em 1933, os serviços prestados pelo Laboratório de Ensaios de Materiais já tinham ultrapassado as previsões e conquistado a confiança dos industriais. Ary então pleiteou a ampliação do campo de atuação do LEM para além dos materiais de construção: idealizou um laboratório industrial dinâmico, com mais recursos e autonomia, gerido por um Conselho que representasse a Escola Politécnica e as classes técnicas industriais. Com o apoio da Poli e dos industriais paulistas, Ary solicitou ao interventor federal Armando Salles de Oliveira a transformação do LEM em Instituto de Pesquisas Tecnológicas. Em 3 de abril de 1934, criou-se o IPT, com mais autonomia e uma nova estrutura institucional. Ary contou novamente com o apoio dos industriais para as reformas e aquisição de equipamentos para as novas seções.

1939 - Despedida de Ary, cinco anos após a fundação do IPT Nos 13 anos em que dirigiu o IPT, Ary Torres permaneceu efetivamente no Instituto durante 9 anos – período marcado por intensa dedicação. Sua habilidade no diálogo com o governo estadual, a academia e a indústria, bem como a experiência internacional, viabilizaram os sucessivos investimentos e ampliações do GRM até que ele se tornasse IPT, garantindo a autonomia e as parcerias que abriram caminhos para o desenvolvimento do Instituto.

Jamais, em minha vida de administrador, encontrei alguém que superasse o meu ilustre amigo na competência, nas virtudes de tato e de firmeza como negociador Presidente Juscelino Kubitschek, em 1961.

Déc. 1930 - Laboratório de Ensaios Mecânicos

Déc. 1930 - Montagem de escoras para sustentação de fôrma de madeira para aplicação de concreto

Déc. 1930 - Execução de molhagem (cura) de concreto

Déc. 1930 - Ensaio de resistência à compressão do concreto


empreendedor Além da superintendência do IPT, Ary exercia outras atividades. Destacou-se no campo empresarial, científico e político, tecendo uma trajetória múltipla que deixou profundas marcas no desenvolvimento brasileiro. Uma de suas principais preocupações era a necessidade de normas técnicas para o desenvolvimento científico e industrial. Em 1934, participou da criação do Instituto Nacional de Metrologia, com o objetivo de substituir a obsoleta legislação de pesos e medidas vigente desde o Império. A nova legislação metrológica seria implementada em 1939. Em 1937, Ary Torres e Paulo de Sá organizaram a primeira reunião dos Laboratórios Nacionais, ocasião em que foi adotada a primeira especificação e métodos de ensaios para o cimento Portland. Essas reuniões deram origem à Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), da qual foi o primeiro presidente três anos depois. Preocupado com a formação de profissionais e pesquisadores dentro e fora do IPT, ingressou também na carreira docente. Em 1942, assumiu a cátedra de Materiais de Construção na Escola Politécnica. 1962 - Ary (quarto da esq. para dir) em visita à Casa Branca, nos EUA, durante a missão do Programa Aliança para o Progresso Destaca-se também sua habilidade como articulador político. Em 1940, foi convidado a participar da Comissão Executiva do Plano Siderúrgico Nacional juntamente com Guilherme Guinle e o tenente-coronel Edmundo Soares Macedo. No final de 1942, em vista das dificuldades econômicas decorrentes da II Guerra Mundial, o governo Vargas cria a Coordenação de Mobilização Econômica (CME). Ary assume a chefia do Setor da Produção Industrial da CME, destacando a importância do desenvolvimento de uma indústria de bens de capital no Brasil. Em 1944 participou do Conselho Nacional de Política Econômica e Industrial, ao lado de Roberto Simonsen. Nos inícios dos anos 1950, a indústria brasileira centrava-se na produção de bens perecíveis e semiduráveis, iniciando uma fase de industrialização via capital estrangeiro. A presença norte-americana começa a ser cada vez mais visível em nossa economia. 1956 - Ary na cerimônia de fundação da empresa Brassinter Como empresário, Ary fundou e ocupou cargos de chefia em algumas das maiores corporações do Brasil. Em 1936, instalou a empresa americana Tubize Chatillon Corporation em São Paulo, sob a denominação de Cia. Nitro Química do Brasil, em associação com as Indústrias Votorantim, e assumiu a direção da Associação Brasileira de Cimento Portland no Rio de Janeiro. Foi também um dos fundadores e vice-presidente, em 1941, da Cia. Siderúrgica Nacional (CSN), em Volta Redonda (RJ). Com a colaboração do IPT, instalou na cidade a primeira usina brasileira de concreto pré-misturado, para a construção da CSN. A Cia Brasileira de Material Ferroviário (COBRASMA) e a Brassinter também foram fundadas e dirigidas por Ary Torres, contando sempre com pesquisadores do IPT. Assume também a presidência da Associação Brasileira de Metais (ABM) em 1954.

1941 - Ary é empossado vice-presidente da CSN por Edmundo Macedo Soares

Ary representou o Brasil em 1951 na Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, que visava aplicar uma considerável soma de capital norteamericano no setor energético e viário. A comissão fundou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (futuro BNDES), do qual foi o primeiro presidente. Em 1960, é convidado pelo Presidente da República, Juscelino Kubitschek, para a Missão de Estudos e Planejamento da Economia do Rio Grande do Sul, intermediando o Governo Federal junto ao governador do RS, Leonel Brizola, que pressionava JK por auxílio financeiro para seu estado. Ary encerrou a missão com sucesso, em 1961. No mesmo ano, integrou a comissão da Aliança para o Progresso, programa lançado pelo presidente americano John F. Kennedy, com o objetivo de promover o desenvolvimento econômico mediante a colaboração financeira e técnica em toda a América Latina.

1941 - Ary (ao centro) no evento de inauguração da CSN

Déc. 1950 - Ary e o pres. da República, Juscelino Kubitschek, em visita à Poli


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