O Infinito de Íris por Claudia Maria

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Dedico esta história aos meus pais, que me deram uma infância tão boa e feliz e todas as oportunidades. Aos meus filhos Íris, Iam e Vittoria, que são a minha inspiração e alegria, e ao Roberto, que me incentiva todos os dias em tudo que faço com seu amor. A todos vocês e as crianças de coração que lerem esse livro. Todo o meu amor.


Esta histรณria comeรงa de uma forma muito diferente da maioria que jรก ouvimos contar, mas foi assim mesmo que aconteceu...


... Íris se despede de seus amigos e segue por um caminho entre o mar e a encosta verde de uma estrada que a levaria a outras paisagens. Seus amigos, Dois Irmãos, sugeriram que fosse pelo grande túnel que passa por dentro deles. Como ainda estava no começo da estrada, deu meia volta, atendendo aos dois, e seguiu pelo túnel.


Impressionada com o tamanho do túnel, lembrou-se de quando seu avô contava, que na verdade, o túnel era uma imensa cobra de duas cabeças.


Que perigo caso uma das bocas se fechasse... Sentiu medo. Passou apressada para alcançar o outro lado. A boca estava aberta. Correu! Já do lado de fora, Íris sentiu um grande alívio! Viu então um lindo lugar chamado São Conrado. Os Dois Irmãos recomendaram: - Vá direto falar com o Imperador, pois ele irá desvendar muitos mistérios de seu imenso reinado!


ÍRIS E A PRINCESA BONITA

Para chegar até o Imperador, foi primeiro falar com Bonita, a jovem princesa querida por todos na Cidade do Rio de Janeiro, especialmente pelos Dois Irmãos.


Era simples chegar até a Princesa Bonita. Uma estrada de muitas curvas, muitas árvores e bela vista, tudo em volta fazia seu nome “Pedra Bonita” muito justo. Íris ficou encantada quando estava com a Princesa Bonita à sua frente. Ela usava fitas e laços coloridos que voavam enfeitando tudo, do céu até a praia. Desfaziam-se em outros laços e fitas coloridas que tornavam a enfeitar o céu. Íris pensou: - Bonita é uma princesa feliz!.


O Imperador nunca fecha os seus olhos para a Princesa Bonita, vigiando-a o tempo todo, por ser grande o movimento ao seu redor.


Íris não conseguia conter seu entusiasmo. Estava curiosa com as surpresas que lhe seriam reveladas. Mesmo assim, brincou muito com Princesa Bonita, subindo e descendo por suas fitas e laços até a praia por inúmeras vezes, tantas que não podia mais contar. Quando anoiteceu, abrigou-se na praia onde não sentiria tanto frio durante seu sono.


O ENCONTRO

O sol acordou a pequena Íris com seus primeiros raios, como um carinho de mãe.


A menina levantou-se e saudou o lindo dia que começava. Reparou que muitos patos selvagens vinham das ilhas, e isso era forte indício de chuva para mais tarde. Tomou uma água de coco e seguiu ao encontro do Imperador, que já a observava lá de cima. Chegar até ele não era tão simples, precisava pegar a trilha certa pela floresta. Íris começou a andar e logo sentiu que estava acompanhada, pensou:


- A montanha é sonora! A variedade de cantos de pássaros e insetos tornava a caminhada fácil e muito rápida. De repente, uma cobra cruzou seu caminho... Ela não se assustou, pois sabia que não era venenosa, era uma cobra verde que se misturava com as folhas e só estava ali se aquecendo ao sol. Íris sabia da mágica desse lugar, onde sempre era dia aos olhos do Imperador. Quando já estava no topo, bem próxima de seu destino, toda a montanha ficou coberta por uma nuvem cinza. Por alguns momentos ela não pode ver um palmo à sua frente, mas logo ouviu a voz firme, forte e amigável do Imperador:


- Muito bem, pequena Íris, muito bem! Você é uma menina de muita coragem! - Obrigada, majestade! – Respondeu Íris à procura do rosto do Imperador.


A nuvem se dissipou e agora podia vê-lo. Tinha aparência de alguém completamente do bem. Um olhar firme, franco e dócil ao mesmo tempo. Uma voz enérgica e decidida, como a dos grandes reis, mas um tom preocupado de quem toma muitas decisões e procura as melhores soluções.

O Imperador tornou a falar com ela, depois de um momento em silêncio, observando a visitante: -Pequena Íris, muitos vêm a mim, mas poucos conseguem me ouvir.


-Você que tem nome de deusa, certamente também trabalha para unir o visível ao invisível, os mortais aos deuses... - Ah, senhor! - Interrompeu a menina respeitosamente. – Muito me honra vosso discurso, mas sou só uma menina, que desde que era menor do que sou agora, olha para as montanhas, escuta seus sons, adora suas cores e o jeito como sempre abraçam o mar. Entendo pouco de deuses, só converso mesmo com as montanhas, com as plantas, algumas pedras e mais nada...


-Conte-me sua história, Íris! – Pediu o Imperador. Ela sentou-se à mesa do Imperador sem cerimônia. Sabia que ele precisava conhecê-la melhor e assim confiar mais nela. Contou-lhe, então: - Nasci no Bairro das Laranjeiras, numa Rua chamada Pires de Almeida, número 26, apartamento 202, telefone 225-3773... O Imperador a interrompeu, nervoso: - Menina, vá aos fatos! Não precisamos de números! Se precisássemos, ficarias espantada com os que posso citar. Tens idéias de há quanto tempo estou aqui?


Números não são importantes! O importante são histórias - a voz do Imperador ecoou na montanha.


O INFINITO Íris parou. Pensou em outra maneira de contar sua história, dessa vez pra valer: - Cresci aos pés do Corcovado, e desde muito pequena me acostumei com a presença do Cristo Redentor, ali tão pertinho de mim.


Caminhava pelas estradas e trilhas que vão ao encontro dele, junto com meus primos e o velho Tio Raphael, “Grande Figura”. Meu tio só tomava água de garrafão, daqueles que tem palha ao redor e que antes guardava vinho, para depois guardar água. Ele nos buscava na escola para juntos seguirmos até a Bica da Rainha, onde enchíamos os garrafões com aquela água pura.


Íris tomou fôlego e continuou: - Minha rua era muito legal! Tinha 2 pracinhas com 4 enormes amendoeiras que escondiam até 5 crianças no pique 123. Olhou para o Imperador e disse séria: -Só esses números Majestade, por favor! E continuou a contar: - O senhor me lembra em alguma coisa o meu tio. Talvez o modo como toma conta da Princesa Bonita, da cidade do Rio de Janeiro... Talvez esse olhar... Então, brincávamos sempre com os olhos de meu Tio Raphael sobre nós.


Ele ficava na janela ouvindo seu radinho enquanto a garotada se esbaldava nas brincadeiras. Pique 123, queimado, polĂ­cia e ladrĂŁo... mas o que eu mais gostava era de andar de bicicleta.


...Girava, girava, girava em torno das pracinhas, logo me dei conta que estava no

INFINITO.

Foi quando comecei a brincar com o invisĂ­vel. A primeira vez foi um susto danado.


Chovia, minhas primas e eu fomos tomar banho de chuva. De repente, um arco-íris se formou e rapidamente corremos em sua direção. Subimos a ladeira da minha rua e fomos até o Redondo, uma pequena praça no final da rua sem saída, cercada por árvores e mato. Era no Redondo onde havia as festas juninas, com fogueira, quadrilha, barraquinha e cadeia. O Imperador se inquietou. Queria mesmo era saber do primeiro contato com o invisível. Íris continuou contando, empolgada:


-Eu vi um o arco-íris naquele dia de chuva... Vi também uma linda moça, com lindos cabelos cor de mel, vestido esvoaçante e lindas grandes asas descendo pelo arco-íris suavemente, tão leve que as cores se misturavam num brilho difícil de acreditar... Íris não sabia, mas naquele dia de chuva sua vida se transformara, o encontro com a deusa a tornara uma pessoa especial, capaz de enxergar além do que os olhos admitem ver. Íris havia aprendido um truque: Andar de bicicleta no infinito lhe abria um portal - BRINCAR – GIRAR – BRINCAR – GIRAR - Desenhando o infinito em sua bicicleta cada vez mais rápido, mais rápido...


Íris buscou mais lembranças e continuou a contar sua história ao Imperador: - Um dia no trânsito, passeando com meu pai, vi um adesivo no carro à minha frente dizendo assim:


Esta frase nunca mais saiu da minha cabeça. Foi o que fiz. Além de olhar, passei a amar, sentir e até conversar com elas. Já estava acostumada a estar atenta aos pássaros, podia desenhar com perfeição as diferentes nuvens que se formavam no céu, afinal, fazia longas viagens de carro com meus pais.


Como não havia vídeogames, mini-games, MP3, eu prestava atenção no caminho, inventando histórias e conversas, de acordo com a paisagem que mudava muito de uma região para outra. Pontes, rios, bichos, casas, pequenas cidades, estradas, postes, fios, mais rios, bois, ovelhas e nuvens que formavam mais ovelhas, castelos, anjos, nuvens... Nessas viagens eu sempre cantava muito. Meus pais adoravam me ouvir e também cantar.


De repente, começou a chover. O anúncio dos patos selvagens logo que acordara na praia, agora se concretizou: - Abrigue-se sem demora, antes que a chuva aperte mais e mais! – disse o Imperador. Mas, continuaram a conversar: - Estou honrado em conhecê-la. Amanhã irás em meu nome conhecer ilustres figuras desta cidade. Muitas pessoas que aqui moram nem mesmo ouviram falar delas. Tu, que nascestes aos pés do Corcovado, conheces o belo brinquedo chamado Pão de Açúcar? - Sim! Adoro esse brinquedo! – respondeu Íris. - Sabes por que tem esse nome? - Não Majestade, desconheço. Será que é por ter a forma de pão doce como dizem? - Sim, Íris. Mas o que realmente fazia lembrar um pão doce não era o formato, mas o creme de açúcar, que era o guano. Sabe o que é guano? - Não Majestade!


- Quando os portugueses descobriram o Brasil, havia uma enorme quantidade de pássaros marinhos, gaivotas e albatrozes morando ali, e faziam suas necessidades... você sabe... isso era o guano, que formou uma camada branca em cima do morro, fazendo lembrar um pão doce com creme de açúcar!


-Hum! Pão doce com creme de açúcar? – pensou ela, com fome. A chuva apertou, e o Imperador deu uma ordem: -Mas vá menina, corre! Amanhã você conhecerá o Gigante e ele a apresentará à velha. - Um gigante, Majestade? -Sim. Agora vá! Vá! A chuva está cada vez mais forte! - Obrigada Imperador. Adeus! Íris correu para a trilha. Sob as árvores ainda não chovia tanto, especialmente embaixo de uma folha de inhame, um guardachuva perfeito.


O GIGANTE DORMINDO Era mesmo só uma nuvem, logo a chuva parou. Ansiosa, desceu rapidinho a Pedra da Gávea, onde estava com o Imperador. -Amanhã vou me encontrar com o tal Gigante. – pensou. Ela lembrava da paisagem linda que viu lá de cima. Muitas praias, muito verde, lagoas, montanhas abraçando o mar e uma construção que anunciava a chegada de muita gente à Barra da Tijuca, dois únicos prédios em formato cilíndrico. - Estranho, muito estranho.... – observou Íris. Não havia nem sombra de gigante. - Esse Imperador.... Bem, na sua posição, certamente não inventaria um gigante...


Continuou caminhando. Percebeu que já andara a noite toda e o dia também. O sol já estava se pondo e ela precisava descansar. Estava exausta e nada de Gigante.

Resolveu parar em um lugar chamado “Recreio dos Bandeirantes” (quando o Brasil foi desbravado por Bandeirantes, esses bravos homens paravam para descansar e encher seus cantis de água exatamente onde Íris se encontrava, por isso esse nome).


Então, disse a si mesma: - Se foi bom para eles, será bom para mim também! Deitou-se e fechou os olhos. Estava muito cansada, mas abriu os olhos novamente, pois pensou ter visto algo: - UAU!!! Aquilo ali enorme dormindo é um gigante?!?!


Levantou-se no susto, no pulo, esfregou os olhos e pensou: - Deve ser o cansaço... O Imperador estava certo. Havia um gigante na cidade e poucos sabiam dele. Íris agora sabia. Ela correu na direção dele. Queria acordá-lo, apresentar-se a ele, falar do Imperador, mas parou e pensou: - Como poderia acordar alguém tão grande? –


E depois, ele poderia n達o gostar... Era Perigoso? Ponderou e resolveu fazer o mesmo: dormir.


O GUARDIÃO E A BRUXA

Íris dormiu profundamente... No meio da noite, como num sonho, sentiu que alguém tocava seu ombro suavemente para acordá-la. Abriu os olhos e viu o Gigante à sua frente.


Não era um sonho. Não se assustou e nem teve medo. Observou-o com cuidado enquanto levantava cuidadosamente da relva onde dormia. Ele parecia dócil, sorridente e de aparência forte e jovem, muito jovem. Já em pé, Íris apresentou-se: - Boa noite! Meu nome é Íris. - Oi! O meu é... é... – Tentou dizer, mas estava tão sem graça... - Gigante! O Imperador me falou! - completou ela. Os dois riram um pouco e ele perguntou: - Gostaria de participar da nossa reunião hoje? - Que reunião? Bem... Não importa, é claro que gostaria. Agora?


Íris estava muito curiosa com o que viria a acontecer. Dormiu... sonhou... e de repente tudo tão era real, como as conversas com seus outros amigos Dois Irmãos, Bonita e o Imperador. Queria entender como uma montanha tão grande, poderia estar ali, à sua frente, como um enorme gigante falante. Ele percebeu e a tirou daquele pensamento, dizendo muito sério: - Assim você estraga tudo! Continue usando sua imaginação, Íris! Continue livre ou o Portal se fechará. Confie em mim!!! Com o dedo indicador, o Gigante delicadamente colocou-a sobre seus ombros e partiram a caminho da reunião.


Toda cidade dormia. Tudo ao redor era tranqüilo. O céu estava coberto de estrelas, e assim tão alta nos ombros do Gigante, Íris quase podia tocá-las. Desse lado da cidade a natureza ainda predominava, havia muitas praias ainda livres de poluição e muitos morros cobertos pela mata. Íris estava adorando aquela “Cacunda” (como as crianças falam quando se sentam nos ombros dos altos adultos). Não muito longe dali, uma fumaça subia vindo de um enorme clarão, e ela perguntou ao amigo do que se tratava. O Gigante então lhe contou:


- É para lá que estamos indo. Hoje a reunião com a Velha será muito importante! - A-ha! O “Nariz da Velha”! O Imperador também falou sobre ela. Mas quem é ela? Podemos confiar nela e no seu nariz? O Gigante, rindo, disse-lhe: -Se podemos confiar? Isso você vai me dizer depois... -Íris já podia ver na enorme clareira, no meio da fumaça, uma velha bruxa muito feia mexendo um caldeirão em meio a uma fogueira.

Seu grande nariz, de muito bom faro, fez com que ela se virasse na direção deles quando ainda estavam longe de chegar. Acenou, e o Gigante respondeu erguendo sua mão.


Quando chegaram, Íris constatou que a Velha também era “beeem” grande. Sua figura, apesar de velha, nariguda e bem encarquilhada, não era a de uma pessoa má. Dizem que o lugar onde mora é dos mais quentes da cidade do Rio de Janeiro, o que é muito compreensível, já que seu caldeirão está sempre aceso. Íris se perguntava o que mais iria acontecer... O Gigante a apresentou à Velha e tudo se repetiu como antes: Os espantos, as perguntas de sempre, mas desta vez houve algo mais, pois parecia que Íris atingira o objetivo de sua viagem.


A REUNIÃO

Íris viu que muitos chegavam para a reunião e se acomodavam em torno do caldeirão.


Estavam ali: os Dois Irmãos, o Corcovado (o corcunda que carrega o Cristo Redentor), Bonita, os Cabritos, o Cockrane, entre outros. Ah! Estava também o mais ilustre: o Imperador. Era uma grande reunião. Dava para perceber que não se tratava de uma festa, e sim, de um grande encontro para decidirem como continuariam a manter a Cidade Maravilhosa, cheia de encantos mil, hoje tão ameaçada de perder seus encantos, maravilhosa. Íris tentava compreender melhor por que todos pareciam preocupados e alguns até exaltados.


-Mais

fitas e laços coloridos e assim enfeito mais a cidade! - solução boa para uma mocinha como Bonita!

-Dou força e fé ao povo da cidade do Rio de Janeiro! - disse admirado o Corcovado, o Corcunda que carrega o Cristo Redentor.

-Plantar no coração dos que nos rodeiam, o valor da igualdade e a alegria de viver sem violência, é um primeiro passo! -justa proposta dos Dois Irmãos. -Vou despoluir as praias, rios e lagoas! projeto arrojado... só podia ser do Almirante Cockrane!

A reunião não tinha fim.


Ă?ris ouvia a todos muito atentamente. Nunca poderia imaginar que hĂĄ noites, enquanto todos dormem, em que os morros da cidade se levantam e se reĂşnem para pensar em como manter a cidade do Rio de Janeiro linda e harmoniosa, como sempre foi... E pensou:


-Como é vasto o infinito quando nele se viaja! Então, observando aquelas ilustres “figuras da cidade”, muito sérias no que faziam, unidas, ocupadas em ensinar a cidade a se manter bela e a viver em paz, distanciou-se um pouco e encontrou também uma solução: - Vou dizer de todas as maneiras possíveis: Olhe mais o céu, os pássaros, os rios, os peixes, o mar...


OLHE MAIS PRAS MONTANHAS!

...e o sol nasceu na cidade do Rio de Janeiro. Naquele dia, “deu praia”!


Agradeço a Taïs, pessoa diferenciada desde que nasceu, que tirou o livro da gaveta. E a Vanessa que, de maneira sensível, cuidou do “Português”.


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