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JORNAL-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINTER - ANO VII - NÚMERO 43– CURITIBA, JUNHO/JULHO DE 2015 Arte: Jabes Venâncio

Conheça a luta das famílias pela importação de medicamentos derivados da maconha págs.6, 7 e 8

Foto: Divulgação

pág.3 e 4

Veja a trajetória do jornalista e crítico de cinema Marden Machado.

Foto: Divulgação

pág.5

Usuárias de aplicativos para táxis reclamam de assédio dos motoristas.

Foto: Amanda Souza

pág. 9

Marcha das Vadias em Curitiba. Tudo sobre a história do movimento.


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OPINIÃO Ao Leitor Nesta edição, a equipe do Marco Zero se dedicou a assuntos variados. Você vai perceber que a questão da saúde está bastante evidente nesse exemplar. Trouxemos também um perfil do jornalista Marden Machado, curitibano crítico de cinema que dá dicas para quem quer seguir nessa carreira e que também revela quais seus filmes favoritos. O destaque fica por conta da polêmica do uso de substâncias derivadas da maconha, como o canabidiol, para o tratamento de problemas de saúde de adultos e crianças, como o pequeno Miguel. No ensaio fotográfico, uma língua que não verbaliza. É isso mesmo. O enfoque das imagens são as Libras, língua de sinais, utilizada pelos deficientes auditivos, que estão também no editorial ao lado. Isso e muito mais nessa edição do Marco Zero. Se delicie com esse exemplar!

Equipe Marco Zero

O Marco Zero Na Praça Tiradentes, bem em frente à Catedral, está o Marco Zero de Curitiba, que oficialmente é tido como o local onde nasceu a cidade, além de ser o ponto de marcação de medidas de distâncias de Curitiba em relação a outros municípios. Ao jornal Marco Zero foi concedido este nome, por conter notícias e reportagens voltadas para o público da região central da capital paranaense.

Jovens de sucesso

Deficientes auditivos que saem do mundo de cuidados para conquistar o mercado de trabalho Reprodução

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Estudantes, prostitutas, empresários, intelectuais, usuários de drogas. Na altura do Centro Histórico de Curitiba, a Saldanha Marinho é uma rua bem democrática, frequentada por todos os tipos de público. Reduto das artes, da vida boêmia e da boa gastronomia, diverge opiniões.

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eficiência auditiva, que também é conhecida como hipoacusia ou surdez, é a “incapacidade parcial ou total de audição. Pode ser de nascença ou causada posteriormente por doenças. No passado costumava-se achar que a surdez era acompanhada por algum tipo de déficit de inteligência. No entanto, com a inclusão dos surdos no processo educativo, compreendeu-se que eles, em sua maioria, não tinham a possibilidade de desenvolver a inteligência em virtude dos poucos estímulos que recebiam e que isto era devido à dificuldade de comunicação entre surdos e ouvintes”. Esta definição está no portal Deficiente On line e revela que precisam ser tratados como iguais e que a comunicação entre surdos e ouvintes tem que ser um caminho de duas mãos. Aos poucos, os jovens que são deficientes auditivos estão demonstrando que são tão, ou mais, capazes que uma pessoa que pode ouvir bilateralmente. No Brasil, há dois casos de jovens com este tipo de deficiência que ganharam destaque na mídia: Rafael, que se tornou o primeiro professor de matemática do Instituto Federal do Espírito Santo; e a jovem Annanda, que ganhou o direito de aprender a dirigir no estado do Rio Grande do Sul com o auxílio de um intérprete de Libras. Ambos estão muito fe-

Ambos estão felizes por mostrar que no universo tudo é possível o r ê mio Sa ngu 18 p e

Isabela Collares

Virgília

Annanda Ayres ganhou na Justiça o direito de aprender a dirigir com apoio de uma intérprete de libras

lizes por demonstrar aos outros deficientes e às demais pessoas que o impossível só existe dentro de nossas cabeças e que no universo tudo é possível: basta querer aprender para poder realizar. E o mercado de trabalho está dando cada vez mais oportunidade às pessoas com deficiência auditiva, além de outros tipos de necessidades especiais. Empresas da área de prestação de serviços treinam estas pessoas para realizarem tarefas de grande dificuldade intelectual e/ ou que necessita pequena habilidade manual. Isto depende das necessidades do empregador e das habilidades do futuro empregado. De acordo com o último Censo realizado no país, em 2010, há 28.305 pessoas com algum grau de deficiência auditiva no Brasil. Essa minoria, que vive isolada em seus mundos pessoais, está cada vez mais ganhando espaço na sociedade e deixando de serem vistos como um “gueto” de pessoas que precisam de grandes cuidados especiais pela sua dificuldade particular. E, também, os ouvintes estão procurando comunicar-se com estas pessoas para demonstrarem que elas fazem parte das comunidades em que vivem e que têm muito a contribuir para a melhoria da qualidade de vida de todos.

O jornal Marco Zero é uma publicação feita pelos alunos do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Internacional Uninter Coordenadora do Curso de Jornalismo: Nívea Canalli Bona Professor responsável: Roberto Nicolato

Diagramação: Maria Heloisa de Miranda

Essa minoria que vive isolada em seus mundos está, cada vez mais, ganhando espaço na sociedade Estes jovens poderiam, como a grande maioria de seus pares, estar “encostados” e acomodados numa bela aposentadoria especial fornecida pela Previdência Social e sendo tratados como “incapazes” pela sociedade. No entanto, resolveram, cada um à sua maneira, demonstrar que são muito mais capazes do que muitas pessoas. Rafael, para não perder as aulas da faculdade, ensinou à sua colega Jenifer Stofel o sistema de Libras muito pacientemente. Já Ananda entrou na Justiça para conseguir uma liminar para que pudesse aprender a dirigir um automóvel. Estes jovens, ao saírem de seus mundinhos, mostraram que são tão capazes quanto as pessoas ouvintes. Eles são exemplos de perseverança e persistência para todos nós. Uninter - Campus Tiradentes Rua Saldanha Marinho 131 80410-150 |Centro- Curitiba PR

Projeto Gráfico: Cíntia Silva e Letícia Ferreira

E-mail comunicacaosocial@uninter.com.br

Telefones 2102-3336 e 2102-3380.

Como bom curitibano que sou, gosto de passear pela Saldanha MariCarlos Alberto nho e encontrar Camorim, der- os amigos num tradicional resmatologista taurante árabe, bem pertinho da Tiradentes. É uma rua simpática, mas que requer mais segurança. Considero uma rua charmosa, mas perigosa. Tenho receio de transitar por Manuela Fatu- ela na altura da Doutor Muricy. ch, pedagoga É um reduto forte de uso e tráfico de drogas em qualquer hora do dia. Gostaria de poder andar por ela, mas sem o receio da falta de segurança. Passo com frequência pela Saldanha. Gosto do comércio, das opções de Robson Bueno, compra. Tenho representante simpatia pela rua, mas é triste comercial ver a naturalidade como o uso e o tráfico de drogas é tolerado A Saldanha Marinho é um convite a Curitiba de antigamente. Os paralelepípeManoel Colla- dos, os casarões res, historiador do século XIX, a antiga sinagoga, a belíssima arquitetura do museu da Imagem e do Som (...) vale um passeio que deve ser feito sem pressa.


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PERFIL

Um apaixonado pela sétima arte Aficcionado por filmes desde criança, o jornalista Marden Machado fez disso sua profissão. Conheça um pouco mais deste prestigiado crítico de cinema Roberto Oliveira

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le está sempre em evidência no cenário cultural curitibano. Seja no rádio, na TV, na internet ou pessoalmente, promovendo eventos relacionados à Sétima Arte, Marden Machado já deixou sua marca em Curitiba. Já faz 23 anos que este jornalista pós-graduado em Cinema e em Comunicação Política, nascido em Teresina (PI), se estabeleceu na capital paranaense, onde consolidou sua carreira profissional. Atualmente faz participações regulares na Rádio CBN Curitiba e no programa Light News da Rádio Transamérica Light, além do Caldo de Cultura, da UFPR TV. No ano passado, o jornalista lançou o livro Cinemarden - Um Guia [Possível] de Filmes, onde propõe a experiência de assistir a mais de 200 filmes em um período de um ano, devidamente comentados e aprovados por ele. Marden assiste a, no mínimo, um filme por dia, escreve sobre o que viu e o resultado pode ser conferido em seu blog, www.cinemarden. com.br, que com isso é diariamente atualizado. Marco Zero: Como surgiu sua paixão pelo cinema? Marden Machado: Desde muito pequeno eu gostava de ver filmes na TV. Meu pai sempre me levava ao cinema também. Mas foi a partir dos 13 anos que percebi que não era só diversão, era algo que me interessava mais. A partir daí comecei a procurar saber como é que os filmes eram feitos, qual era a importância do trabalho de um diretor, quais eram as obras importantes que eu precisaria assistir para ter um entendimento maior daquilo. E passei a escrever sobre filmes por volta dos 17 anos, por conta de uma ‘provocação’ de um amigo meu. Na saída do colé-

Desde então eu nunca mais parei. Foi o que me motivou a fazer jornalismo e me aprofundar na área

gio, comecei a falar para os meus amigos sobre um filme que ia estrear na cidade na semana seguinte e que eu já tinha visto fora, em uma viagem que tinha feito. Era O Império Contra-Ataca (hoje também conhecido como o Episódio V de Star Wars), e comecei a falar, falar, falar... e um dos meus amigos – que na época trabalhava como editor do caderno de cultura do jornal da cidade – gostou muito do que eu disse e me ‘desafiou’. Era uma terça-feira, e o filme ia estrear na sexta. Então ele disse: “Você conseguiria escrever tudo isso que falou sobre o filme e me entregar um texto datilografado de três laudas até quinta? Se conseguir, publico na edição de domingo do jornal.” Eu nem sabia o que era lauda, ele me explicou e respondi: “Acho que consigo.” Ali mesmo comecei o texto, e terminei no escritório do meu pai, que tinha uma máquina de escrever. Entreguei na quinta e, no domingo, o texto foi publicado. Não era bem uma crítica, era mais uma matéria informativa sobre o filme, com detalhes da produção, escalação de elenco... A partir daí nunca mais parei de escrever, e foi o que me motivou a fazer Jornalismo, e cada vez mais me aprofundar nessa área.

Como é a administração do tempo na rotina de assistir a filmes e escrever ou falar sobre eles? As distribuidoras organizam, em algumas salas de cinema dos shoppings, sessões fechadas, pela manhã, em horários que não interfiram na programação normal das seções. São as chamadas cabines, somente para os profissionais que atuam nessa área (é um grupo pequeno em Curitiba, pouco mais de 20 pessoas), para poderem ver os filmes cerca de uma semana antes da estreia. Então, quando o filme entra em cartaz, já o teremos visto previamente. Sobre o tempo, depende da tua própria relação com ele, é uma questão de organização. Há até aquele ditado: “Se você quer que algo seja feito, entregue para quem está bem atarefado, ele vai dar um jeito de fazer.” Aquele que está desocupado nunca vai cumprir o prazo. Então é uma questão muito pessoal de saber aproveitar o tempo. Eu durmo pouco, acordo cedo, e procuro ver ao menos um filme por dia. Sempre assisto um bem cedinho

Arquivo pessoal

Marden Machado é uma das referências no cenário cultural da cidade

pela manhã, quando o telefone e a campainha ainda não tocam e posso vê-lo bem concentrado. Essa é a rotina que estabeleci.

que não se vê em outros países do mundo.

Hollywood há anos vive um período de reciclagem de ideias que A produção audiovisual no Bra- deram certo, com adaptações, sil é centrada principalmente no refilmagens e continuações. Aineixo Rio-São Paulo. O que você da há espaço no grande circuito destacaria fora desse eixo? E a para ideias originais? Por outro lado, os filmes de super-heróis, produção no Paraná? gênero que gaSempre denhou impulso a fendo que o A indústria partir dos anos Brasil tem um 2000, além de dos mais diver- hollywoodiana arrecadarem alsificados pólos é extremamente tas bilheterias, de produção cara; ideias também tem audiovisual do mundo. Os EUA originais são mais ganho muitos elogios da crípossuem um dos arriscadas tica, como foi o maiores volumes caso de Batman de produção, mas – O Cavaleiro se concentra basicamente em dois pólos: Nova das Trevas. Seria uma nova tenYork e Los Angeles, que ficam nos dência conciliar entretenimento dois extremos do país, nas costas com conteúdo no cinema? A indústria hollywoodiana é Leste e Oeste. Hoje, no Brasil, além do eixo Rio-São Paulo, você extremamente cara, e que depentem diversos pólos de produção de de retorno financeiro seguro. por todo o país. Em Curitiba, te- Não por acaso eles investirem em mos o Marco Jorge, o Heloi Pires continuações, refilmagens e adapFerreira, Paulo Biscaia Filho, Aly tações, pois já pressupõem que o Muritiba, uma galera extensa pro- risco será menor, já que há um púduzindo continuamente audiovi- blico consumidor à espera. A ideia sual. Apesar da visibilidade maior original é sempre mais arriscada. ainda ser das produções que vêm Sobre os filmes de super-heróis, do eixo Rio-São Paulo, os filmes essa tem sido uma aposta segura mais criativos, polêmicos e insti- que tem rendido um bom produto gantes produzidos no Brasil são os final. Mas você percebe que aqueque vêm dos pólos fora desse eixo, les que se destacam mais são os com cada um tratando de ques- filmes dirigidos por fãs dos pertões bem próprias da sua região, o sonagens originais. Normalmente,

quando é um diretor contratado, que não tem nenhuma afinidade com aquele material, o projeto não funciona na tela. Não é o caso do Christopher Nolan que fez um ótimo trabalho com o Batman, assim como toda a equipe de criação que está por trás dos filmes da Marvel Studios. Pode acontecer de determinada cena ou detalhe de um filme despertar no público ou no crítico uma interpretação que, na verdade, talvez não tenha passado pela mente do realizador? Claro. Isso vale para qualquer obra. Um diretor quando lança um filme, um escritor quando lança um livro, ele faz um recorte da visão que ele tem daquele assunto. Pode ser que coincida com a minha ou não. Pela bagagem e repertório de cada um, é possível ver aquilo de uma outra maneira, mas é aí que está a riqueza de uma obra de arte. Quando ela se permite várias leituras e interpretações, isso só a enriquece. Sempre há grandes filmes obscuros que passam despercebidos do grande público. Quais você citaria que, em sua opinião, mereceriam ser descobertos? No meu blog, todo dia comento sobre um filme. Falo dos gran-


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PERFIL Os melhores filmes de todos os tempos Confira abaixo a lista com as principais produções cinematográficas pelos olhos de Marden Machado:

Estrangeiros A Felicidade Não Se Compra (EUA, 1946) Frank Capra Cidadão Kane (EUA, 1941) Orson Welles Janela Indiscreta (EUA, 1954) Alfred Hitchcock

Marden: para ser crítico de cinema é preciso ver filmes, ler sobre eles, conhecer as etapas de produção

des sucessos, claro, mas sempre tenho essa preocupação de destacar obras que estejam esquecidas. Muitos filmes ‘passaram batido’ nas salas de cinema, como O Grande Hotel Budapeste (vencedor de quatro Oscars este ano), do Wes Anderson. O longa anterior do mesmo diretor é um exemplo ainda mais clássico dessa constatação, que é o Moonrise Kingdom, um filme belíssimo que passou despercebido nas salas de cinema. Quando saiu em DVD, escrevi sobre ele, justamente para as pessoas descobrirem essa pequena jóia que está escondida na locadora, que em condições normais ninguém alugaria. Até porque a distribuidora nacional sequer traduziu o título, e manteve o original! Então, uma das preocupações que tenho com esse trabalho é o de dar destaque a essas obras que também são interessantes, para que as pessoas possam ter um leque maior de opções. Não ficar só naquele feijão com arroz básico e, de repente, ter um molho diferente, um tempero melhor nessa dieta cinematográfica. Quais filmes você citaria como os melhores de todos os tempos? O meu filme favorito é A Felicidade Não Se Compra, do Frank Capra. Gosto muito também daqueles que sempre estão nas listas de melhores de todos os tempos, bem como muitas obras nacionais (veja no box). Os trabalhos dessa nova geração de cineas-

tas mexicanos: Alfonso Cuarón, Alejandro González Iñárritu e Guilhermo Del Toro também têm merecido destaque ultimamente. Filme bom sempre tem em todo lugar. É só saber garimpar.

Brasileiros Rio 40 Graus (1955) Nelson Pereira dos Santos Memórias do Cárcere (1984) Nelson Pereira dos Santos

Um Corpo Que Cai (EUA, 1958) Alfred Hitchcock

Deus e o Diabo Na Terra do Sol (1964) Glauber Rocha

2001: Uma Odisseia No Espaço (Inglaterra, 1968) Stanley Kubrick

Terra Em Transe (1967) Glauber Rocha

Os Incompreendidos (França, 1959) Francois Truffaut Acossado (França, 1960) Jean-Luc Godard Amacord (Itália, 1973) Frederico Fellini Morangos Silvestres (Suécia, 1957) Ingmar Bergman Era Uma Vez em Tókio (Japão, 1953) Yasujiro Ozu

O Som Ao Redor (2012) Kleber Mendonça Filho Paranaense O Sal da Terra (2008) Helói Pires Ferrreira Curitibano Estômago (2007) Marcos Jorge

Suas palavras de incentivo para quem deseja trilhar por este segmento do jornalismo, e se tornar um crítico de cinema: Não só ver muitos filmes, mas ler sobre eles, sobre as etapas de produção, as carreiras dos grandes cineastas... É preciso ter bagagem, repertório, elementos para poder traçar paralelos. É necessário entender o contexto de uma obra, com quem ou com o que ela dialoga. Qual a sua importância, o que ela quer dizer, qual mensagem ela quer transmitir. E não ler só sobre cinema, mas sobretudo história, pintura, arquitetura, artes em geral. Tudo isso lhe dará bons elementos para você criar essas pontes e construir a sua carreira.

Uma das preocupações que tenho é dar destaque as obras interessantes, para abrir um leque de opções além do básico

“Estômago” tem cenas na Saldanha Marinho O longa metragem dirigido por Marcos Jorge é um drama. Na trama, Raimundo Nonato interpretado por João Miguel, representa os diversos brasileiros que saem das cidades periféricas e vem para os grandes centros para tentar uma oportunidade que os faça mudar de vida. As gravações do longa foram realizadas durante cinco semanas em Curitiba, e o restaurante onde a maior parte do drama se desenvolve fica na Saldanha Marinho. Há também cenas gravadas em São Paulo na composição. Todo o material foi levado para a Itália onde a montagem foi feita. O filme demonstra a ascensão e queda de Nonato, e é denominado como “uma fábula nada infantil sobre poder, sexo e culinária” pelos próprios autores. A história é baseada no conto “Presos pelo estômago” de Lusa Silvestre. Exibido internacionalmente, Estômago foi indicado e ganhou diversos prêmios de cinema. Entre eles: Melhor Filme pelo Público, Melhor Diretor, Melhor Ator e Prêmio Especial do Júri no Festival do Rio, no ano de estreia; na Holanda, indicado no Festival Internacional de Rotterdam, o longa ganhou o prêmio Lions Award.


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SEGURANÇA

Fui de táxi, e você não sabe... Taxistas usam dados de aplicativos para assediar passageiras em Curitiba Filipe Borba

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final da noite ainda era distante, mas a publicitária Isabelle Imay decidiu que já havia curtido demais naquela madrugada. Contendo o cansaço, ela pediu um táxi pelo aplicativo 99táxis. Já passavam das quatro horas da manhã quando o veículo que a levaria para casa chegou ao bar Soviet, na região do bairro Batel. O trajeto durou menos de 20 minutos e transcorreu sem complicações, porém, o que a publicitária não imaginava, é que teria dor de cabeça por causa dessa corrida, nas 24 horas seguintes a ela. Ao chegar em casa, o aparelho celular de Isabelle começou a receber mensagens de um número desconhecido. “Fiquei confusa. Perguntei quem era e ele se identificou como o taxista que havia me trazido pra casa. No começo achei aquilo engraçado, mas percebi que ele tinha violado a segurança do aplicativo e fiquei muito indignada” comentou Isabelle. O taxista continuou a

No começo achei engraçado, mas percebi que ele tinha violado a segurança do aplicativo e fiquei indignada Isabelle Imay enviar mensagens e Isabelle chegou a bloqueá-lo no aplicativo Whatsapp. “Não achei que a coisa se tornaria tão séria, então não dei muita bola. No dia seguinte recebi mais sms’s perguntando por que eu o tinha bloqueado no Whatsapp e me convidando pra sair, insistindo. Foi aí que percebi que o assunto tinha se tornado mais sério.” A situação pela qual Isabelle passou, se torna cada vez mais recorrente nas grandes cidades brasileiras, onde o uso dos aplicativos chamadores de táxi vem crescendo progressivamente. Quando um passageiro faz uma chamada e o taxista aceita fazer a corrida, os dados - tanto do motorista quanto do passageiro - ficam arquivados na memória interna do celular dos dois. É possível acessar as in-

Os smartphones são a principal ferramenta para esses novos aplicativos que simplificam a rotina das pessoas

Os aplicativos facilitam o serviço, apresentam interface amigável e intuitiva e oferecem facilidades que você não tem quando aciona uma central como, por exemplo, saber por onde o táxi está vindo

formações de localização (saída e chegada da corrida), data, hora, nome completo e telefone do passageiro e também do motorista. Em posse disso, algumas pessoas aproveitam o contato disponível do passageiro e mandam mensagens de texto obscenas e às vezes, ligam assediando os clientes. Alex Sandro Carlos Martins, taxista há mais de 15 anos, costuma trabalhar à noite e afirma que não são todos os colegas que agem dessa maneira, mas que em toda profissão existem pessoas dispostas a levar as coisas de “outra forma”. Sobre o assunto assédio dentro das rodas de conversas dos taxistas, quando estão entre uma corrida e outra, ele diz: “Nunca ouvi ninguém falando de casos desse tipo. Talvez, o cara nem fale que fez porque não seria legal”. O taxista acredita que esses casos de assédio podem inibir as pessoas de usarem os aplicativos. Dando um outro panorama para a relação passageiro-taxista, Alex conta que tem gente que leva a profissão a sério mesmo e não tem conversa. Mas, em contrapartida, “existem uns caras solteiros, que não tem família, nem namorada... Conhecem uma pessoa descompromissada e pode rolar algo. Mas aí é na casualidade”. Casualidades à parte, o as-

sédio que Isabelle sofreu ficou impune. A publicitária não procurou a polícia para denunciar o caso, pois excluiu de seu telefone parte das mensagens do taxista assediador. “Não pude fazer um boletim de ocorrência porque não tinha todas as mensagens, então fiquei imobilizada” explica. E acrescenta que foi apenas por desinformação e inocência que não guardou as mensagens que provavam a violação de

Nunca ouvi nunguém falando de casos assim... Talvez porque o taxista saiba que não é legal

segurança do aplicativo. Mas a 99taxis tomou providências a respeito. “A empresa entrou em contato comigo via facebook, depois que eu postei no meu mural um texto de indignação. Também responderam um e-mail que havia mandado e me ligaram. Pediram desculpas várias vezes e me disseram que bloqueariam o taxista do aplicativo para que ele não pudesse mais fazer corridas via o 99taxis”, conta. Além disso, ela afirma que a empresa lhe deu suporte, atenção e levou a sério sua denúncia. “Mesmo que eu não tenha feito o boletim, fico feliz que tenha podido, ao menos, retirá-lo da lista de taxistas do aplicativo, para que nenhuma outra usuária sofra com esse tipo de comportamento.”, completa.

Alex Martins

O serviço a um toque de distância Os APP possuem uma interface amigável com o usuário e por meio deles, que se conectam no GPS do smartphone, é possível chamar um táxi e verificar quais veículos estão próximos de você. Tudo sem a interferência de terceiros. O contato é direto entre o passageiro e o taxista, e permite que você acompanhe o trajeto do táxi

enquanto espera a chegada do mesmo Até as centrais telefônicas do setor estão caminhando para essa conversão digital e também desenvolveram seus aplicativos, dada a adesão do público. Os apps desse gênero mais utilizados são: o 99Taxis, EasyTaxi e TaxiJá. Também tem o Appa, que é mais utilizado por grandes empresas.


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ESPECIAL

Canabidiol reduz crises

Miguel Inocente sofre com convulsões ocasionadas pela epilepsia refratári Arquivo pessoal

Heloisa Miranda

Pedro Hey

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caminho para reduzir as crises convulsivas de Miguel Bubbi Inocente foi longo e difícil. Desde 1 ano e 8 meses de vida, até os 5 anos de idade, Priscila Inocente buscava soluções para tratar a epilepsia refratária do filho. Mais de 20 medicamentos foram utilizados e nenhum deles atingiu os objetivos esperados. Em busca de alternativas para melhorar a vida do filho, a família decidiu apostar no canabidiol (CBD). O canabidiol constava na lista de substâncias proibidas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) até o início deste ano, quando foi reclassificada para a categoria de medicamento controlado. A mudança se deu principalmente pela pressão exercida pela militância de pessoas que necessitavam da substância para tratar filhos ou familiares doentes. Os dias de luta de algumas famílias nessa condição foram retratados no documentário “Ilegal”. [ver box 1] No entanto, a reclassificação é apenas o começo. Mais de 700 famílias brasileiras dependem do CBD para garantir o controle, ou ao menos, a diminuição das crises e pretendem importá-lo legalmente. O assunto é recente, e por isso ainda não existem pesquisas que mostrem os resultados da Heloisa Miranda

Miguel já frequenta a escola

A família curte um dia de sol no parque Barigui; Miguel leva uma vida mais tranquila depois do CBD

utilização do CBD por um longo período de tempo. Apesar disso, sabe-se que o extrato da canabis não causa efeitos alucinógenos como o THC (substância também encontrada na maconha). Para Priscila, o fato de não existirem dados concretos sobre a utilização do extrato não assusta. “Uma vez, uma médica me questionou sobre os efeitos a longo prazo do uso do CBD. Eu respondi que outros medicamentos são estudados, testados e mesmo assim tem consequências graves. Meu filho quase teve falência renal e hepática, por conta de uma medicação autorizada, que foi estudada, que foi testada” relembra.

Diagnóstico O desenvolvimento de Miguel, ainda bebê, era normal. Quando começou a desenvolver a linguagem, a família percebeu que algo não estava bem. “Ele falava palavras, mas não conseguia formar frases”, explica Priscila. A mãe também observava que enquanto brincava, ele tinha “tremeliques” e ficava “meio fora do ar”. Ela levou a informação a uma médica, que aconselhou a família a procurar um neurologista. Depois de ser internado para exames, Miguel foi diagnosticado com epilepsia refratária. A criança sofre com crises convulsivas que não se enquadram em nenhuma outra síndrome. Priscila explica que, comparado a outras

crianças que têm problemas similares, Miguel demonstrava crises muito mais singulares: “Parecia um arrepio, mas acontecia muitas vezes por dia”. O tratamento começou com as medicações comuns, usadas em casos de epilepsia, mas as convulsões foram piorando. “O que era um tremelique virou uma coisa mais forte, mais intensa, até que ele teve crises de voar. Ele era arremessado, caía de cabeça no chão. A impressão que dava era que alguém estava empurrando ele”, relembra Priscila. O quadro era assustador, diversas vezes o menino ficou machucado após as crises, que chegavam a acontecer até 30 vezes por dia. Hoje, um pouco mais tranquila, a mãe até ri da situação: “Ele não tinha um galo, tinha um galinheiro na cabeça”. Ainda hoje a família não sabe exatamente o que causa as convulsões, e aguarda liberação por parte do plano de saúde para realização de um exame genético

As pesquisas precisam acontecer e as pessoas devem estar abertas para que essa questão Priscila Inocente

detalhado. Há dois anos Miguel perdeu completamente a habilidade de falar. Mas para a alegria da mãe, este ano durante uma atividade escolar, a criança disse a palavra “não”. Priscila sabe que a melhora que o filho vem apresentando é consequência do tratamento com o canabidiol. E aguarda ansiosa as próximas conquistas de Miguel.

A decisão Utilizar o CBD não foi uma decisão sem planejamento. A família, já cansada dos tratamentos ineficazes, buscava soluções. As medicações convencionais já não surtiam o efeito, e a cabeça estava aberta para experimentar o que pudesse colaborar. Com aspesquisas, os pais descobriram o caso de Charlotte Figi, que utilizava o extrato de Cannabis como tratamento para crises convulsivas desde 2011. O caso apresentava bons resultados e gerou grande repercussão na mídia internacional. Então, os pais de Miguel procuraram artigos e pesquisas relacionadas ao CBD e levaram como proposta à médica que o acompanhava. Priscila conta que a pretensão do casal em tratar o filho com CBD surpreendeu a profissional. Na época, o canabidiol ainda constava na lista de substâncias proibidas da Anvisa. “A proposta foi nossa, a médica também estranhou, mas com as pesquisas e bus-

cas, ela foi se informando também e aí receitou para o Miguel. A própria família ficou assustada com a ideia, mas sempre deu apoio e estimulou a tentativa”, afirma ela. Em maio do ano passado a decisão de utilizar o CBD foi tomada em definitivo, a família resolveu importar a substância. Na primeira vez, uma amiga que viajou para os Estados Unidos trouxe para a família. Muitos estados americanos adotam o uso irrestrito de maconha medicinal (e substâncias derivadas) para tratamentos diversos. Na segunda vez, a mãe dessa mesma amiga voltava de Portugal e trouxe o remédio dentro de uma embalagem de xampu esterilizada. “Na época, se eu fosse pega, seria tráfico internacional de drogas”, comenta Priscila, que não se arrepende. “É o que faz bem para o meu filho, é o que dá qualidade de vida para a minha família”. A mais recente importação de CBD feita por ela foi de maneira legal, com a autorização da Anvisa.

As dificuldades Apesar da reclassificação da substância na lista da Anvisa, as dificuldades para importar a medicação continuam. No caso de Miguel, o extrato utilizado, importado dos Estados Unidos, não tem registro de medicamento na FDA (FoodandDrugAdministration), que é o órgão competente para controlar o uso e a qualidade de remédios no país. Priscila buscou saber o que poderia ser feito nesse caso, e foi informada pela Anvisa de que sem a liberação da FDA não seria possível fazer a importação. Ela precisou juntar laudos, relatórios, as planilhas que utilizava para controlar o número de crises diárias de Miguel, depoimentos dos médicos que acompanhavam a criança para provar que aquele extrato, apesar de não estar registrado no órgão competente, era o que fazia efeito no seu filho. Somado a isso, a família precisou cumprir a burocracia, exigida pela própria Anvisa, para importar o CBD. “Buscamos os extratos com maior concentração, porque quanto maior a concentração menor é a dose. Eu achei o Apothecary em um portal de compras na internet e foi o que teve melhor resultado com o Miguel.


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s epiléticas em crianças

ia e as crises são reduzidas com uso de medicamento derivado da maconha Eles iriam me proibir? Se é o que mente mil reais. Em uma tentatifaz efeito?”, questiona Priscila. va desesperada, a mãe conta que Em razão desta falta de regula- já fez o extrato em casa, mas sem mentação e fiscalização dos extra- as devidas ferramentas é difícil tos, um dos riscos que as famílias mensurar a qualidade do resulcorrem neste processo de impor- tado. “O extrato descarboxilatação é justamente trazer substân- do, que é uma pasta, é bastante cias que não tem os canabinóides simples de fazer. Com uma flor da planta, álcool necessários ou de cereal e uma suficientes para panela elétrica o tratamento. Alguns pro- O que eu desejo é você faz”, relata. Ela acredita que, dutos são ven- que ele se cure e se alguma emdidos no mercado, em sites se não for possível presa brasileira realmente tivesse principalmente, que não sofra interesse em procomo extrato Priscila Inocente duzir o extrato, de canabidiol os valores seriam sem ao menos apresentar a substância na sua muito menores e o CBD seria muito mais acessível às famílias. composição. Uma pesquisa da Uni “Não há pesquisa, porque ninguém faz. As pessoas versidade de São Paulo (USP) têm preconceito, é maconha, en- mostra que o custo total de uma tão é droga. Não vêem o outro caixa de medicamento feito a lado da questão. As pesquisas partir de CBD sintético custaria, precisam acontecer, e as pesso- em média, sete reais. as precisam estar abertas para que ela aconteça. Assim foi com a morfina.” desabafa Priscila, “Não existem pesquisas que estuda agronomia e pretende desenvolver pesquisas com a extensas sobre os efeitos do uso do CBD”, essa costuma ser a justificaCannabis. tiva dos médicos para não receitar o derivado. Até a mudança de classificação do CBD, o profissional que Para arcar com os gas- receitasse o uso do Canabidiol em tos de importação do medica- tratamentos medicinais corria o rismento foi preciso vender o carro co de ter o seu registro profissional da família. O preço do extrato (CRM) cassado. Mais ainda, por ser importado é exorbitante. Segun- uma substância que é extraída da do a mãe, um vidro de Apothe- maconha, o CBD é estigmatizado. cary, remédio usado por Miguel, Muitas pessoas ainda acreditam que custa 120 dólares e dura apenas qualquer relação com “droga” é noum mês. Além do CBD, Prisci- civa, esquecendo-se de que os medila precisa ainda comprar outras camentos tem a mesma origem. medicações que totalizam um gasto mensal de aproximada- O futuro

O preconceito

Os custos

Heloisa Miranda

Priscila com o extrato de CBD ministrado a Miguel

A expectativa da família é de que Miguel siga evoluindo e se desenvolvendo, tarefa com a qual o CBD vem colaborando. A escola que o pequeno frequenta tem estimulado seu desenvolvimento psicomotor, visto que aos seis anos Miguel age como uma criança de quatro. Priscila finaliza a entrevista com fé de que a vida do seu filho vai melhorar: “Se ele tiver uma carreira, vou ficar feliz, se for empacotador no mercado e estiver feliz, eu também estarei. O que eu desejo é que ele se cure, e se não for possível, que ele não sofra. Que possa se defender, e tenha uma vida digna”, finaliza.

Quem disse que a erva é do diabo? E para que serve o THC medicinal?

Extrato de CBD importado legalmente através da Anvisa

O

Brasil está entre os países mais atrasados nas questões relacionadas à maconha medicinal. Só recentemente a Anvisa reclassificou o canabidiol (CBD), substância extraída da maconha, de categoria proibida para droga controlada. Enquadrado na lista C1 da Portaria 344/98, o CBD se tornou uma droga lícita, criando a possibilidade de importação de forma controlada através de pedido excepcional. Além da questão normativa, a sensação de ilegalidade, obstáculo para que médicos pudessem receitar e para que famílias pudessem importar o CBD, começa a ser superada. Diversos fatores influenciaram nesta histórica posição retrógrada adotada pelo Brasil: o lobby farmacêutico, o poder do tráfico de drogas, a cegueira e o fanatismo religioso. Muitas razões poderiam justificar esta situação, mas é o preconceito que está presente na sociedade que realmente dificulta a aceitação desta nova realidade científica. É a ciência dizendo que um derivado da maconha é saudável. É bom para criancinhas com epilepsia. O uso do CBD reduz brutalmente a freqüência de crises convulsivas em bebês e crianças que, em função da doença, não conseguem ter uma vida normal. Mas a Cannabis (nome científico para maconha) tem propriedades medicinais que vão além do CBD. Um caso que pode ser até mais controverso e delicado entra na pauta da saúde brasileira. Com a reclassificação do canabidiol, portas se abrem para a aceitação e o uso, de forma ampla, mas controlada, da maconha medicinal no Brasil. E dentro deste pacote de mudan-

ças, da adoção da maconha medicinal como tratamento possível e eficaz, está o THC.

O caso do THC Diferentemente do CBD, o THC tem propriedades psicoativas, ou seja, na linguagem popular de quem fuma maconha, é a substância que “dá o barato”. Mas isso não significa que o indivíduo que usa o THC de forma medicamentosa terá prejuízos psíquicos. Ao contrário, os efeitos de uma droga (ou um remédio) são previstos e calculados pelos médicos que a prescrevem. Na medida em que se conhece a eficiência de um remédio para qualquer tratamento, é dever ético do profissional de medicina prescrever o melhor para o paciente. A grande luta a ser travada pelo THC medicinal ainda está por vir. Como esta substância também remete ao uso recreativo da droga, o paradigma a ser quebrado é muito mais resistente. Além do mais, assim como o canabidiol, o THC enfrentará uma grave deturpação de competências criada pela lei brasileira. Na lei 11.343/06, que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad), entre outras ações, está previsto que as drogas ilícitas serão definidas por “portaria”, ou na letra da lei, em “listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União”. Transfere-se o que seria de competência do Legislativo para o Executivo, ou pior, para o Serviço de Vigilância Sanitária, que é órgão de segundo escalão do Ministério da Saúde. Assim, cabe à Anvisa regulamentar o que deveria ser, em teoria, legislado e amplamente debatido pelos deputados em Brasília.

Pesquisas e estudos são realizados em todo o mundo com o intuito de descobrir todas as propriedades medicinais da maconha e do THC. Entre as descobertas, estão desde o alívio de dores e a diminuição de náuseas e vômitos em tratamentos quimioterápicos, até a aplicação em casos de esclerose múltipla, ou mesmo para ser usado simplesmente como um estimulante do apetite. Indícios de aplicação do THC para o auxílio no tratamento do câncer e da Aids também fazem parte destas pesquisas. No Brasil, o psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, que é doutor em Psiquiatria e Psicologia Médica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), foi responsável por um estudo com dependentes de crack. Presas ao vício, estas pessoas se voluntariaram para tratar a dependência física do crack através do uso de cannabis. Ao final do tratamento, 68% dos pacientes abandonaram o uso de crack e, pouco tempo depois, também deixaram de usar maconha. O estudo foi publicado na conceituada revista científica norte-americana Journal of Psychoactive Drugs, em 1999. Para Diogo Busse, que está à frente da Diretoria de Política Sobre Drogas da Prefeitura de Curitiba, uma das figuras importantes na luta pela adoção da maconha medicinal no Brasil e pela humanização dos tratamentos de dependência química, é preciso “iniciar uma mudança cultural para repensar a questão das drogas. Nós reproduzimos, há muitos anos, uma cultura que acredita que vamos resolver os problemas com repressão, com a polícia. Mas os problemas são muito mais complexos”. Segundo o diretor, a realidade brasileira ainda está distante da nova tendência mundial de uso e incorporação consciente da maconha medicinal (e até recreativa) na sociedade. A mudança passa pela descriminalização e legalização, pelo controle, mas, sobretudo, pela vitória da perspectiva humanista da medicina e da sociedade do século XXI em relação às posturas retrógradas e preconceituosas que criamos ao longo da história de proibição e repressão maquiavélicas.


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SAÚDE

“Estava lá quando mudaram, pulei de alegria” Confira a entrevista com Katiele Fischer, mãe que lutou pelo direito ao CBD Ana Eloiza

Luz

Heloisa Miranda

O caso de Miguel Inocente, que você viu nas páginas anteriores não é isolado. Segundo a Anvisa, atualmente mais de 700 famílias se encontram na mesma situação. Uma delas, que está bastante em evidência, é a família Fischer, de Brasília, no Distrito Federal. Eles são os protagonistas do longametragem “Ilegal” (ver box), que deu visibilidade à rotina dessas crianças que não podem esperar e pela pressão política, acelerou o processo de reclassificação do canabidiol pelo órgão regulador. Na entrevista abaixo, Katiele, que é paisagista, fala das dificuldades para importar o CBD, de como se tornou ativista da causa e de sua participação no documentário. Quando foi a primeira convulsão da Anny? Como foi a medicalização?

Ela começou com as crises quando tinha 45 dias, e a gente não tinha um diagnóstico. Ninguém sabia dizer porquê ela convulsionava. Só conseguimos o diagnóstico quando ela tinha quatro anos. Até então eram tratamentos paliativos. Perdi a conta de

A Anny tinha 60 crises por semana; em dias ruins chegava a 80 quantos remédios usamos. Quando acabaram as possibilidades medicamentosas, a gente foi para a cirurgia de implantação DNS - como se fosse um marca-passo que fica disparando correntes elétricas para tentar estabilizar a atividade do cérebro. Infelizmente para a Anny não funcionou. Melhorou um pouco, principalmente a parte das internações, mas mesmo assim ela tinha 60 crises por semana. Em semanas ruins, chegava a 80. Para ela não tinha mais opção. E como você chegou ao CBD? Quando a gente conseguiu o diagnóstico, fomos atrás de pessoas que tivessem a mesma vivência, porque a gente nunca tinha ouvido falar em CDKL5. Encontramos um grupo de apoio a parentes que funciona no mundo todo, lá tinha um pai, o Justin, que postava os resultados do CBD no tratamento da filha Charlotte Figi. A Margarete, que também está no filme, me ligou e explicou o que era, ela já tinha encomendado e a gente foi atrás também. Começamos a trazer de maneira clandes-

Filme mostra luta de Anny e Katiele O documentário produzido por meio de financiamento coletivo na internet causa impacto. A fala preocupada de uma das protagonistas do curta metragem permanece na mente do espectador ao longo de todo o vídeo “Já que por lei eu não posso ter uma coisa que beneficia tanto a minha filha, então eu sou uma traficante. A palavra é essa, traficar”, afima Katiele Fischer. Ilegal foi lançado em outubro de 2014 e apresenta a luta de algumas famílias pelo direito de importar o canabidiol (CBD). A iniciativa deu visibilidade ao tema e chamou atenção para a burocracia da Anvisa para autorizar a importação do medicamento. Partes do vídeo documentário são de arquivo pessoal, que mostram as crises de epilepsia de uma menina chamada Anny

Bortoli Fischer, 5 anos, portadora da síndrome CDKL5, antes da utilização do canabidiol. A produção trata das dificuldades encontradas para importar a substância derivada da flor da cannabis sativa. Ao longo do curta audiências, dificuldades e as opiniões de médicos, psicólogos, e militantes da causa sobre a utilização da maconha medicinal explicitam constantemente que o problema é o preconceito. Serviço: Ilegal 1h30 (2014) Direção: Tarso Araújo Produção: Super Interessante

Foto: Arquivo pessoal

tina, isso em novembro de 2013. Na primeira semana teve uma diminuição no número das crises. Não atribuímos ao CBD porque ela tinha uma oscilação do número de convulsões, achamos que era coincidência. Na segunda semana caiu de novo. Na semana seguinte, ela pegou uma virose, o que aumenta as crises. Com nove semanas de CBD, conseguiu ficar uma semana inteira sem convulsionar. Era uma coisa fantástica! Nunca tinha acontecido e a gente teve certeza de que era o canabidiol que havia trazido esse progresso. Quais melhoras o CBD trouxe? Tivemos, pela primeira vez, um controle das crises e, com isso, vieram os ganhos. Assim, demos uma chance para o cérebro aprender. Ela começou a comer muito melhor, o tônus muscular mudou drasticamente, o aspecto do autismo, que faz parte da síndrome, diminuiu bastante. Era muito raro ela fazer contato visual; hoje eu passo pela sala e ela me olha! Os ganhos são muito sutis, mas se você considerar uma criança extremamente comprometida como a Anny é fantástico a melhora. Hoje, ela segura o pescoço e se colocar ela sentada ela fica. Eu não digo que é a cura para a síndrome, que infelizmente não existe. Mas garante uma qualidade de vida muito melhor para ela, e também para a família toda. Hoje a gente dorme a noite inteira e olha que coisa maravilhosa! Como você se envolveu com a militância? A princípio, a gente se envolveu mais com o Canabidiol. Nossa briga era a importação, já que esperar a produção nacional ia demorar muito, e essas crianças não podem esperar. A importação era o caminho mais fácil de acesso. Não só para a Anny, mas para todas as outras famílias, porque você acaba conhecendo centenas de outras pessoas que estão vivendo a mesma coisa que você. É uma briga por todos. Não que o extrato de maconha vá servir para todas as pessoas, mas é uma chance, mais uma opção. Como surgiu o envolvimento com a questão da reclassificação? Eu tenho um contato nos Estados Unidos que comprava pra mim. Você não pode ligar aqui do Brasil e pedir, porque eles sabem

Katiele: Se considerar o quadro da Anny, a melhora é fantástica!

que é proibido e não mandam. Esse contato recebia, camuflava numa caixa e mandava pra minha casa. Despachava pelos Correios e em dez dias estava na minha porta. Até que a alfândega pegou. Eles mandaram para a Anvisa, que nos enviou um telegrama cobrando satisfações. Quando recebemos o telegrama, nós já estávamos articulando para saber como fazer para trazer para o Brasil legalmente, porque a sensação de você fazer um negócio ilegal é muito ruim... a gente se sentia meio criminoso. A correspondência da Anvisa foi a gota d’água. Ali já entramos com o advogado para manter a liminar e o parecer favorável do juiz logo veio. Nesse período, a Anny ficou sem o CBD e voltou a ter convulsões. E assim tivemos certeza que o extrato é que deixava ela bem.

pois de algum tempo e foi um passo grande. A Anvisa se esforçou e está simplificando o processo, mas mesmo com essa reclassificação ainda é muito difícil, muito penoso, porque os passos são difíceis. Primeiro precisa encontrar um médico com a mente aberta para receitar. Aí, você preenche todos os formulários e manda para a Anvisa, eles te dão autorização e você tem que partir para a importação. Você entra em contato com as empresas, que mandam o remédio. Quando a medicação chega, ela vai para o aeroporto de Viracopos (São Paulo) e fica retida aguardando o desembaraço aduaneiro, porque chega com 60% de imposto em cima da nota fiscal, mais 18% de ICMS e ainda o armazenamento. Infelizmente, é preciso ir lá, para que o imposto seja retirado porque é medicação. Você pode fazer pessoalmente ou por meio de um despachante, que vai cobrar entre Quanto tempo demoR$ 300 R$ rou o processo? 700. Mas a Foi bem rápido. A produção nota fiscal Foi no começo de abril não pode ulque o juiz deu o parecer nacional trapassar três favorável. O mais de- demoraria e essas mil dólares, morado foi conseguir o porque se crianças não relatório do médico. Eu ultrapassar, não queria que ele indi- podem esperar não se concasse o Canabidiol, só segue a isenque ele fizesse um reção desses latório contando a melhora dela, por- dois impostos. Está em torno de U$ que em anos ele não tinha conseguido 200 a U$ 500, uma seringa ou um o controle das crises com as medica- frasco de extrato de CBD de dez ções tradicionais. Mas o parecer do gramas. Só que a dosagem depende juiz foi bem rápido mesmo, pois em do paciente. dois dias já deu setença favorável. Se a Receita Federal fizesse uma simples portaria para as pesQuais as mudanças com a re- soas receberem em casa, facilitava. classificação? Mas infelizmente eles não se mani Eles reclassificaram de- festam. Em resumo: é complicado.


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COMPORTAMENTO

Elas querem respeito aos seus corpos Como o feminino e o masculino são discutidos no evento “Marcha das Vadias” sua segunda edição já estava presente nas principais cidades do Suellen mundo, ainda que com um baixo Mainardes número de participantes. Com corpos expostos, trajados apenas de frases de Thais impacto, a Marcha das Vadias caracteriza-se por ser um moviSouza mento feminista único, talvez, com maior visibilidade nos últimos anos. O topless, frequenteJacqueline mente criticado por feministas Klippel tradicionais, representa uma não-sexualização do corpo feminio início do mês de ju- no, que, segundo o movimento, lho, a região central deve ser livre sem correr o risco da cidade foi toma- de sofrer agressões verbais e / da por centenas de pessoas que ou sexuais. Ao contrário de ouparticipavam da quinta edição tros movimentos, a Marcha das da Marcha das Vadias de Curi- Vadias aceita homens em sua tiba. A concentração aconteceu organização e também defende na praça 19 de dezembro, na re- direitos LGBT – Lésbicas, gays, gião do Centro Cívico, e seguiu bissexuais e transexuais. até a Boca Maldita, protestando Segundo as administradoras contra o machismo, a homofo- da página oficial da Marcha das bia, racismo e outras formas de Vadias de Curitiba no facebook, opressão. o movimento reivindica prin O evento teve origem cipalmente em Toronto, Canaquestões bradá, em 2011 quansileiras, mais do, em uma pales- A Marcha das ainda curitibatra universitária nas e não estão Vadias acredita sobre segurança, alinhadas com o policial Michael que as mulheres, a Slutwalk de Sanguinetti afir- com reinvidicações Toronto. A mou que, caso as marcha foi um mulheres não de- e movimentos movimento sejassem ser estu- sociais, podem que se iniciou pradas, não deveconquistar direitos reivindicando riam trajar-se como a igualdade de “sluts”, termo local gênero, com para referir-se a vadias, vaga- apontamentos principalmente bundas. Tal declaração a respeito da violência que as gerou imediato repúdio, afinal, mulheres brasileiras sofrem, o segundo esta, a culpa de uma direito da mulher dizer não, a agressão sexual seria da vítima, independência feminina e agonão do agressor. Assim surgiu, ra possui pautas sobre a descripela primeira vez, a Slutwalk, minalização do aborto, sobre as a Marcha das Vadias. Por meio mulheres trans, mulheres lésbida internet, o movimento se di- cas e bis, sobre racismo e sobre fundiu pelo globo, sendo que em mulheres com deficiência (mes-

Foto: Amanda Souza

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Jussara Cardoso é a professora Máira Nunes durante a Marcha das Vadias Curitiba 2015

mo não tendo na atual conjuntura ninguém com deficiência na organização). Ana Terra, uma das organizadoras, comenta que a marcha vai às ruas porque entende que as mulheres vivem inseridas em uma sociedade machista, patriarcal onde ainda existem milhares de mulheres que morrem pela violência e pelos abusos sexuais. O movimento utiliza os corpos como forma de manifestação política, pois entende que estes são utilizados de diversas maneiras e, portanto, também podem ser objeto para mostrar reivindicações políticas. Segundo Thayz Athayde, outra organizadora, o movimento entende que os corpos das mulheres são utilizados na mídia de várias maneiras e os utiliza em nome de reivindicações de direitos iguais para todos os gêneros. Segundo as organizadoras, Ana Laura Durigan

A Marcha percorreu a região central da cidade combatendo o machismo, homofobia e outras opressões

Todos pelo feminismo? Mesmo com todos os avanços da corrente feminista, existem algumas ideologias que se opõe ao movimento. Muitos alegam que o feminismo perdeu o sentido, sendo agora um instrumento de manipulação política. Para os discordantes, todos os direitos da mulher já foram adquiridos e a igualdade de gêneros já é uma realidade. Na rede social Facebook, por exemplo, a página “Mulheres contra o feminismo” incentiva as próprias integrantes do gênero feminino a se insurgir contra o movimento que diz lhes representar e já conta com 21 mil curtidas. No site é possível visualizar críticas às principais bandeiras feministas, como a legalização do aborto. Existe ainda um livro chamado “O outro lado do feminismo”, escrito por Suzanne Venker e Phylis Schlafy, sem edição publicada no Brasil, que afirma que o feminismo falhou em sua missão, é baseado em premissas e argumentos falsos e gera uma verdadeira guerra entre os sexos. o evento segue a seguinte lógica: “se um homem pode andar da maneira como quer nas ruas, porque quando uma mulher anda, logo essa atitude é depreciada?”. As participantes creem que seus corpos podem ser instrumentos de transformação da realidade através da reflexão sobre os motivos do movimento existir. A Marcha das Vadias acredita que as mulheres, a partir de reivindicações e de movimentos sociais, podem adquirir novos direitos e tê-los garantidos por lei. Porém, segundo estas, a desconstrução do machismo dentro de uma sociedade só acontecerá a partir da educação, principalmente na estrutura familiar, segundo a porta-voz do movimento. Apesar de muitos avan-

ços, como a Lei Maria da Penha e a recente lei do feminicídio, o movimento feminista ainda tem muito o que reivindicar. Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres brasileiras receberam, em média, 72,9% da média salarial masculina em 2012 e apenas 27% dos cargos de chefia no país são ocupados por mulheres. Há ainda, no Código Penal vigente, o artigo 59 que atenua a pena de um estuprador, por exemplo, se a vítima estava utilizando roupas curtas ou reproduzindo comportamentos provocantes. Para Ana Flávia, participante da última edição da Marcha das Vadias, ainda há muito o que reivindicar com relação aos direitos femininos.


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CIDADE

POESIA FORA DO EIXO

Letras e rimas que preenchem páginas e bordam livros. Mas se a literatura não se limita ao poema, à rima, ao conto, por que há de se limitar aos livros?

Às páginas marcadas

Ana Luiza Cordeiro

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imas que soam doces e se espalham em páginas e mais páginas em bibliotecas, livrarias e sebos. Romances e histórias afáveis que encantam e despertam o imaginário de quem as lê. A literatura se escancara nas mãos de quem, ainda, carrega livros pelas ruas, mas disputa espaço nos jornais, revistas e outras mídias. Se o Brasil já produziu grandes nomes literários, que se consagraram e continuam privilegiando as almas leitoras com suas composições, hoje notamos a cada vez menor produção literária. Por onde andam, então, as inspirações escritoras? Temos um paralelo atual onde há maior facilidade de publicar literatura e colaborar com a manutenção desse mercado, e por outro temos uma acirrada competição de espaços midiáticos onde, talvez, haja cada vez menos respiro para cada segmento. Somada a agitação cotidiana, a falta de tempo e a efemeridade das notícias, produzir jornalismo literário – ou a própria literatura – dentro de um veículo jornalístico fica cada vez menos atrativo. A internet abriu espaços para ter um blog, uma coluna, um espaço próprio para os mais variados assuntos. Por outro lado tem-se, também, a competição e o espaço em canais e mídias. Grandes portais abrem mão do aprofundamento em nome da agilidade e rapidez em dar a notícia. Assim, muitas vezes deixa-se em segundo plano, além dos detalhes, o texto trabalhado, do jogo de palavras, do discurso bem guiado. As palavras que preenchem as linhas não mais encantam, apenas informam e caem na produção técnica do jornalismo. Entre alguns grandes veículos, salvam-se colunas, especiais e cadernos voltados à literatura. São pequenos textos, crônicas, contos e poemas que dão respiro às notícias. Há, também, os que ainda se focam na produção jorna-

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Primeira edição do Nicolau lançada em julho de 1987

Quase 20 anos após sair de circulação, Nicolau ainda tem ressonância lística literária. Textos que entrelaçam fatos, cotidiano e imaginação. Um enredo bem elaborado para fazer da informação uma poética do leitor. A importância de se manter o gênero nos relembra que a informação pode se apresentar de modo mais leve, mais atrativo. Mas ainda há os bons memorandos da literatura. O Jornal Nicolau é um deles. Uma publicação que em 1987, ano de lançamento, visou suprir e enaltecer a demanda literária paranaense. Com a coordenação de Wilson Bueno, Nicolau registrou a história do estado em linhas poéticas, leves, encantadoras. Trouxe páginas de boas rimas, boas narrativas, boas vidas. Nicolau deu poética à história do Paraná. E, mais do que estrofes e poesia impressa, ele deu nome aos bons literatos, entre eles Josely Vianna Baptista, Adélia Maria Lopes, Wilson Bue-

no, e Luiz Antônio Guinski. Segundo Márcio Renato dos Santos, um dos participantes da reedição do fac-similar, “quase 20 anos após sair de circulação, Nicolau ainda tem ressonância”. O público, que o recebeu com grande entusiasmo, torna evidente o que Márcio dos Santos acredita, que “há autores, leitores, editoras, espaço para publicação em jornais, revistas, sites, blogs, etc. em todo o país, em todo o mundo”. Além dos leitores que se cativam e mantêm o encanto pela literatura, há o papel da mídia em trazer essas linhas rítmicas e fascinantes que a literatura proporciona. “A imprensa cultural festejou a iniciativa: da Folha de S. Paulo ao Suplemento Pernambuco, incluindo diversos jornais, revistas e sites brasileiros, houve comemoração pela publicação impressa e pela disponibilização do conteúdo na internet”, segundo Márcio. Nicolau marcou e remarcou o Paraná literário. Não somente, trouxe também reportagens, material jornalístico e resenhas. Ao público, trouxe o encanto das boas letras. E, após quase duas décadas, a reedição nos revela que a literatura não nos escapa, não se invalida, não desencanta.

s dedos se encontram leves e sutis às páginas gravuradas. Era apenas um corpo e dedos cheios de toques. Agora não mais. Tornou-se um corpo com história, com alegria. Eram olhos vagos, perdidos. Agora, ainda que com pouca visão, tornaram-se olhos extasiados, alegres, vislumbrados. Quem mora ou já frequentou estações tubo ou terminais em Curitiba já, ao menos, se deparou com as Tubotecas. Ainda que a curiosidade ou o tempo ou o gosto pela leitura não tenham sido o bastante para aproximar o leitor dos livros, elas estão lá, aos olhos – e ao alcance – de quem se dispor a emprestar um livro, uma história, uma alma literária. “Um projeto lindo, que me proporcionou bons livros. Naqueles dias em que esqueci os meus em casa, me foi muito útil também”, ri Laura, 26. Estudante de letras, apaixonada por livros e frequentadora das Tubotecas, se assim pode-se dizer. Pois como se frequenta um lugar que se espalha pela cidade? Um espaço de livros e histórias? Não se frequenta. O lugar é que te frequenta. Você está lá, esperando seu ônibus e o nicho de livros expostos está lá, apenas está. Cabe ao leitor deixar-se frequentar. São livros dos mais variados gêneros. “Já vi folder, livro didático, jornalzinho de rua e achei até livros novos. Adorei”, diz Rodrigo, 19, um dos que despercebidamente deixou um pedaço dele no caminho dos livros. Pois assim como cada livro carrega uma história, cada história carrega um trechinho dos que o leram. Somas e somas de corpos e almas que leem. Mas nem só de letras desenhadas se fazem as boas

Um projeto lindo, que me proporcionou bons livros Laura histórias. Alice Bruman, 21, começou essa narrativa. Seus dedos longos e magrelos dançam sob as páginas dos livros com relevo. Seus olhos, ainda que com pouca visão, se animam e vibram conforme a história. Alice é deficiente visual e encanta ao contar que já foi frequentada pela Tuboteca. Num desses dias em que caminhava pra casa foi avisada pela irmã que ali ao ladinho delas, naquela espécie de estante no meio do tubo, havia um livro diferente. Não de gravuras, não apenas de histórias. Mas em braile. Alice que sabe da dificuldade em se encontrar livros em que ela mesma possa deixar-se construir a narrativa, achou ali um pouquinho da importância de compartilhar histórias e dificuldade. E ainda diz que o livro a achou. A menina de dedos longos tocou as páginas, teceu sua história com aquele livro. Encantou-se com cada linha. A história? Sobre livros. Ora, que coisa mais afável. Um livro sobre livros. Alice amou. E leu. Releu. Até deixá-lo numa outra Tuboteca a espera de muitos outros leitores que se deixariam frequentar. Mais do que apenas adentrar na história, Alice e seu livro em braile construíram e gravaram um pedacinho nessas almas viajantes de páginas e histórias e linhas – sejam elas escritas ou texturizadas.

As tubotecas estão espalhadas pelas estações tubo da cidade


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CRÔNICA

Roberto Oliveira

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A verdadeira história de um rei em busca do timing certo

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O Discurso do Rei (The King’s Speech). Paris Filmes, drama, Reino Unido, 2010, 1h 58 min. Direção: Tom Hooper. Com: Colin Firth, Geoffrey Rush, Helena Bonham Carter, Guy Pearce, Derek Jacobi, Michael Gambon, Timothy Spall. Drama. Paris Filmes.

Roberto Oliveira

Vem aí o Episódio VII... O site oficial da maior saga do cinema de todos os tempos é uma boa pedida para quem está aguardando ansiosamente pelo próximo filme da série. É só acessar www.starwars.com e clicar em films, onde é possível escolher cada um dos seis episódios anteriores e conferir vídeos com curiosidades e entrevistas. Quanto ao novíssimo longa: Star Wars – Episódio VII: O Despertar da Força, o internauta encontrará galeria de fotos, trailers e, claro, notícias atualizadas sobre esse lançamento, previsto para chegar aos cinemas em Dezembro deste ano. E que a Força esteja com você! O filme “O Discurso do Rei” retrata a importância do rádio sem dúvida está falando muito bem”. O longa não perde a oportunidade de, com isso, traçar uma ácida ironia envolvendo aquele orador impecável e seu discurso tão destrutivo. Alberto assume, portanto, o nome pelo qual passará a ser conhecido, George VI, e seu desempenho ao microfone será posto em prova rapidamente, em seu primeiro discurso oficial como Rei da Inglaterra, missão para a qual, ção da fala. Alberto encontra apoio não só as técnicas, mas o apoio também em sua esposa Elisabeth moral de Logue será imprescindí(Helena Bonham Carter), apoio vel. Quando, enfim, é mostrado o esse que não veio por parte de referido discurso que dá título ao seu pai, o Rei George V (Michael filme, o cinema, como expressão Gambon), que não era tão pacien- de arte, se encarrega de transforte assim com o jovem Príncipe. A má-lo, ao som da Sétima Sinfonia busca, portanto, do futuro Rei pela de Beethoven, em uma sequência conquista da segurança ao execu- cativante, triunfante, apoteótica. O Discurso do Rei gatar um dos dons básicos da vida, a fala, o leva a conhecer o ‘terapeu- nhou quatro Oscars: Melhor Filta vocal’ Lionel Logue (Geoffrey me, Roteiro, Diretor para Tom HoRush). Tem início uma amizade, oper e Ator, merecidamente, para a princípio improvável, mas que, Colin Firth, que reproduziu os tracom o passar do tempo, se mostra vamentos de fala no timing certo autêntica. O inicialmente inseguro para uma representação fidedigna Duque de York, após conhecer o do Rei. Quem assistir ao filme ‘doutor’, vai colocando em prática as técnicas não muito convencionais em DVD vai poder conferir, nos que dele aprende e, mais importante, extras, dois discursos do verdadeiro Rei George VI, realizados passa a acreditar na sua cura. Os anos passam, e cabe em 1939 e 1945, antes e depois ao relutante Duque de York assu- da guerra. É possível sentir um mir a coroa, após a morte do pai e misto de insegurança e confiança a renúncia do irmão mais velho, o em sua voz, e é recompensador Príncipe David (Guy Pearce), que constatar que as técnicas e, prinpreferiu se casar com Wallis - mu- cipalmente, a amizade de Lionel lher divorciada- o que contrapõe Logue tiveram reflexo na postura os princípios da família real. Essa do governante diante dos microtransição ocorre em plena iminên- fones. O Discurso do Rei ilustra, cia da 2ª Guerra Mundial, com a portanto, com uma qualidade técnotícia de que tropas da Alemanha nica impecável e interpretações nazista estão invadindo a Polônia. memoráveis, um período histórico Os discursos indubitavel- importante e curioso da monarquia mente persuasivos que Hitler pro- britânica, mas também versa, com fere à sua nação podem ser vistos extrema humanidade e empatia, nos noticiários exibidos nos cine- sobre a persistência em encontrar mas da época. Em um deles, o jo- formas de amenizar problemas e, vem Rei comenta: “Não entendo o com isso, até superá-los. que este homem está dizendo, mas

Divulgação

na Inglaterra dos anos 1920 que tem início O Discurso do Rei, filme baseado nos dramas reais vividos pelo Rei George VI, que desde muito tempo antes de assumir a coroa britânica, quando ainda era apenas o Príncipe Alberto, também conhecido como o Duque de York, convivia com uma insuportavelmente angustiante gagueira, problema cuja gravidade se evidenciava toda vez que ele precisava falar em público, tarefa da qual ele não tinha como fugir, uma vez que o Duque, desde sempre, era membro da família real. A monarquia britânica estava, pela primeira vez na história, entrando nas casas de seus súditos, por meio do rádio, e cabia ao jovem Príncipe livrar-se de seu inconveniente problema o quanto antes. A gagueira é um distúrbio da fala capaz de comprometer drasticamente a vida social do portador, mesmo que este seja o Rei da Inglaterra. Na mídia, o problema é apresentado sempre em personagens cômicos, dos quais o mais famoso talvez seja o Gaguinho, o porquinho dos desenhos animados da série Looney Tunes da Warner,. A abordagem realística como a deste longa nos faz lembrar, acertadamente, que ser gago não é nem um pouco engraçado. O cerne do filme é o tratamento que o Rei faz com Lionel Logue, um australiano conhecedor de técnicas vocais que ajudou muitos soldados, traumatizados após voltarem da Primeira Guerra Mundial, a recuperarem a articula-

@TÁ NA WEB

A mídia sempre nos apresenta a gagueira como engraçada e o filme nos faz lembrar que ser gago não é nada agradável

Entrevistas e curiosidades sobre o longa podem ser encontrados no site www.starwars.com

Katy Perry na Pedreira Já estão à venda os ingressos para a apresentação em Curitiba de uma das maiores estrelas da música Pop da atualidade, Katy Perry. Responsável por inúmeros hits que desde 2008 invadiram as rádios do mundo inteiro, a pop star continua em turnê, a The Prismatic World Tour, promovendo seu terceiro álbum, Prism, lançado em 2013. Além do show em São Paulo dia 25 de setembro, e no Rock in Rio dia 27, a musa teen soltará a voz na capital paranaense no dia 29 e o local escolhido foi a Pedreira Paulo Leminski. Os valores dos ingressos vão de R$ 170 a R$ 800. Mais informações pelo site www. livepass.com. br. Para quem está na expectativa, a webpage oficial da cantora, www.katyperry.com está recheada de vídeos musicais. Bom espetáculo (sem dúvida será)! Cartaz utilizado para a divulgação dos shows da cantora no Brasil


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MARCO

ZERO

Número 43 – Junho/Julho de 2015

ENSAIO FOTOGRÁFICO

Uma língua para ser vista

A linguagem é todo o sistema que permite a comu-

nicação. Mas, muita gente pensa que ela é viabilizada somente pela oralidade e desconhece que comunicação é simbólica. Ou seja, pode ser por meio de signos que representam a realidade e se realiza por meio de desenhos, escrita, sons, cores e no caso dos surdos – os sinais. A Libras é uma língua brasileira de modalidade visual espacial e utiliza-se da visão, de elementos corporais para dar sentido às palavras. Um idioma que viabiliza a representação de qualquer elemento da realidade e confere legitimidade à comunidade surda. A expressão “surdo-mudo” é simplória e equi-

vocada. Os surdos não são mudos, rompem o silêncio e falam por meio das mãos. Abra os olhos e veja.

Surdo sim, mudo não...

André Rodrigues


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