Lugares da memória:
a casa campineira
Anápolis - GO, 2019
Lugares da memória:
a casa campineira Isabela Daniel Alves da Costa
Trabalho apresentado como parte dos requisitos necessários para obteção de nota para o Trabalho Final de Graduação II ao curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Goiás, Campus Henrique Santillo. Orientadora: Profa. Dr. Ana Amélia de Paula Moura Ribeiro e Prof.a Ms. Maryana de Sousa Pinto Projeto Gráfico:Isabela Daniel Alves da Costa, a partir de template cedido por Rodrigo Santa- na Alves.
SUMÁRIO
Motivações.......................................................................................................................... 5
1. Simplicidades esquecidas
............................................................................... 7
1.1 – Patrimônio cultural e sua significação................................................................ 8 1.1.1 Uma questão estilística............................................................................................ 11 1.2 – Arquitetura tradicional goiana: valorização das raízes....................................... 12 1.2.1 Modernidade à vista! A ferrovia............................................................................ 14 1.2.2 Modernidade à vista! A nova capital..................................................................... 16 1.3 – Pelas vias do abandono........................................................................................... 18
2. Campininha de Goiás
................................................................................... 23 2.1 – Uma cidade que virou bairro.................................................................................. 24 2.1.1Adentrando por velhos caminhos.............................................................................28 2.3 – Uma história atual.................................................................................................... 32 2.2.1 Até onde vai Campinas?.......................................................................................... 33 2.2.2 Importantes eixos viários........................................................................................ 36 2.2.3 Patrimônio histórico cultural................................................................................. 37 2.2.4 Edifícios importantes em Campinas...................................................................... 40 2.2.5 Entorno imediato...................................................................................................... 42 2.3 – A casa através do tempo.......................................................................................... 44
3. Bem vindo(a) à Casa Campineira
....................................................... 51 3.1 – Repertórios................................................................................................................ 52 3.1.1 Museu do pão: cultura e lugar................................................................................. 52 3.1.2 Museu de Congonhas: tradição e modernidade................................................... 56 3.2 – Os lugares de encontro e memória......................................................................... 60 3.2.1 A casa campineira: memorial à antiga Campininha............................................ 60 3.2.2 Centro de cultura popular goiana: ode às tradições caipiras........................... ... 61 3.3 – O Programa............................................................................................................... 62 3.4 – Projeto......................................................................................................................... 64 Referências.......................................................................................................................... 68
Motivações
E
ste trabalho é fruto do interesse sobre o estudo da arquitetura popular e tradicional pioneira em Goiás. Tema que me causa grande estima e indagações sobre uma série de questões acerca de sua consolidação e atual condição frente ao seu reconhecimento como patrimônio. A arquitetura consegue concretizar raízes de tempos, memórias e histórias do passado, que muitas vezes, no caso de Goiás é subestimado principalmente por seu caráter “caipira e simplório”. O desejo de estudar as questões da arquitetura tradicional goiana e sua desvalorização como patrimônio nasce do intuito de enaltecer as chamadas “casinhas tradicionais populares”, produzidas pelo saber-fazer enraizado nesta sociedade, que contam assim, muito do árduo caminho de um povo simples, batalhador que merece ter sua história contada e valorizada, assim como sua arquitetura. Ao olhar para Goiânia, foi percebido um remanescente nessa situação de abandono e esquecimento e então foi observado o potencial de relevância arquitetônica e social a ser desenvolvido sobre tal temática. Além de perceber o rico entorno ao qual o objeto de estudo – a preexistencia – está inserido, o núcleo de surgimento urbano da antiga cidade de Campinas, GO. Enfim, é uma singela contribuição ao estudo da arquitetura tradicional e cultura popular goiana. Assim, será abordado o contexto histórico e social anterior a formação de Goiânia, na antiga cidade de Campinas, através da intervenção e restauração em um objeto arquitetônico (residência na Av. Senador Morais Filho) que atualmente se encontra inutilizado. Uma vez que, a edificação revela traços arquitetônicos característicos da cultura de formação goiana do século XIX. Campinas, atualmente bairro de Goiânia, carrega uma história que é anterior a própria capital, e por isso a proposta
de um memorial campineiro, valorizando a cultura popular de suas raízes. Além do novo anexo que acompanhará a preexistência dando suporte cultural ao programa escolhido. A arquitetura tradicional goiana é negligenciada do ponto de vista de relevância arquitetônica e histórica, sofrendo consequentemente com a desvalorização e abandono. Este comportamento precisa ser repensado, visto que a história de um povo e de um lugar, muitas vezes, é contada e registrada pelo ponto de vista de determinadas pessoas que acabam elegendo o que julgam ser mais importante. Este trabalho busca pela valorização histórica da arquitetura popular e das raizes goianas, visto o escasso interesse por tais temáticas, através da restauração de uma das mais antigas residências do bairro. Primeiramente, é necessário entender sobre a produção arquitetônica anterior à criação de Goiânia e consequentemente o processo de desvalorização patrimonial da arquitetura tradicional. O segundo momento, inicia-se com a história da antiga cidade “Campininha das Flores” e a inserção, investigação e análise da preexistencia no local. Por meio do estudo do lugar é feito o reconhecimento da sua localização com suas problemáticas e potencialidades. Por fim, é apresentado a importância da preservação da memória e o intuito da realização de um memorial campineiro, com sua diretrizes programáticas apoiadas pelos estudos de caso: museu do pão e museu de Congonhas. Assim, toda a parte de pesquisa e análise da importância da valorização do patrimônio, da história e análise do lugar, dá suporte para a conceituação projetual a ser desenvolvida enquanto projeto arquitetônico.
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CAPÍTULO I
Simplicidades esquecidas
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1.1 - Patrimônio cultural edificado e sua significação 1. Apesar do enfoque do trabalho no patrimônio cultural edificado é importante mencionar sobre os bens de natureza imaterial incluídos nesse momento pelo IPHAN. O decreto presidencial n 3.551, de 4 de agosto de 2000, institui o registro dos bens culturais de natureza imaterial e cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial
A
trajetória sobre a preservação do patrimonio cultural edificado foi sendo construída através de muito tempo, sendo seu conceito explorado e desenvolvido aos poucos, com um olhar mais minuncioso e sensível, analisando diversos aspectos culturais e históricos. Inicialmente, denominado apenas como “monumento histórico”, prendia-se a edifícios monumentais, ignorando um vasto número de bens. Ao longo do tempo foram expostos muitos conceitos e métodos classificatórios acerca dos padrões de restauro e preservação dos bens em questão, e no Brasil não foi diferente. Desde a década de 1920, o país vem discutindo a questão da preservação patrimonial, um caminho que foi sendo desenvolvido aos poucos, mediante o entendimento da complexidade do tema abordado. Antes, apresentado como monumento nacional, designava sobre a preservação dos monumentos brasileiros, com a primeira lei aprovada em 1933. Assim, resulta mais tarde na criação do SPHAN – Serviço do Patrimônio Artístico e Nacional, em 1936 no qual Gustavo Capanema, então ministro da Edução e Saúde, convida Mário de Andrade a realizar um anteprojeto para a constituição de um órgão federal de proteção ao patrimônio. E em 1937 é criado o Decreto-lei nº 25 de 30 de novembro, já descrito como “proteção do patrimônio histórico e artístico nacional” (ANDRADE, 1997). Com alguns debates internacionais, e principalmente amparado pelas recomendações de Paris (1962) é conferida uma visão mais ampla, apresentando problemas de preservação urbanística, sendo reconhecido a importância do sítio urbano como paisagem a ser preservada. No Brasil o já estabelecido IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 1970, promove a proteção de várias cidades e centros históricos, ampliando seu conceito sobre patrimônio, mas que ainda não 9
contemplava muitos aspectos importantes. Como é exposto em Coelho e Valva (2001,p.12), é a partir da segunda metade do século XX, mais precisamente depois dos anos 1970 que discussões acerca da valorização em relação a importância cultural alcançam questões como o da cultura popular e regional. A noção de monumento histórico compreende a criação arquitetônica isolada, bem como o sítio urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma revolução significativa ou de um acontecimento histórico. Estende-se não só às grandes criações mas também às obras modestas, que tenham adquirido, com o tempo, uma significação cultural.” Carta de Veneza – Art.1, 1964.
Em 1976, é reconhecido a relevância desse patrimônio com a criação do Comitê Internacional da Arquitetura Vernácula pelo ICOMOS - Conselho Internacional de Monumentos e de Sítios. E assim, o debate chega às edificações de valor popular e tradicional que giram entorno da preservação da história e costumes de um povo. Pois, durante muito tempo se escolheu preservar aquilo que julgavam importante na história oficial e elitista de determinada sociedade. É necessário entender a importância de salvaguardar os bens de todas as camadas sociais definidoras de uma história local, inclusive sua produção arquitetônica e o valor da ampliação do conceito sobre patrimônio cultural neste momento. Contudo, o entendimentos sobre as cartas patrimoniais devem ser levados a um olhar crítico, visto que as recomendações muitas vezes obtinham um atraso em suas reais práticas, tendo muitos assuntos
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Fonte: IPHAN, 2019.
com lacunas a serem discutidas. Como exposto em Andrade (1997, p.5), a década de 1980 começa a obordar o conceito de “bem cultural”, amparado pela criação da Secretaria da Cultura, na estrutura de organização do Ministério da Educação e Cultura, “afirmou-se que a compreenssão que o bem cultural deveria ser apreendido no seu sentido mais amplo e abrangente”, reconhecendo os bens até então não consagrados como uma gama importante de comportamentos, fazeres, dinâmicas cotidianas, pluralidade cultural e interação de diferentes culturas¹. E ainda, em âmbito nacional, já em 1996 com a Delaração de Sofia, defendendo o “pluralismo cultural”. Atualmente, pode-se considerar como patrimônio cultural o conjunto de bens, de natureza material e/ou imaterial, que guarda em si referências à identidade, a ação e a memória dos diferentes grupos sociais. Assim, a arquitetura enquanto bem edificado contribui neste acervo, servindo como registros históricos e memoriais de um período e ainda como documento físico, resistindo ao tempo e expondo sobre a cultura daqueles que viveram em sua época.
dos ou restaurados sem o consentimento do IPHAN, sendo que suas redondezas devem ser estudas e delimitadas caso a caso, garantido que novas contruções e/ou reformas não prejudiquem a visibilidade e o destaque do bem tombado. Contudo, é necessário revisar tais práticas, principalmente quanto à educação patrimonial da comunidade. Pois, grande parte da sociedade não possui conhecimento a respeito da preservação e tombamento dos bens, e o que acontece na realidade é um grande receio por parte do proprietário do bem a ser tombado, o que dificulta no processo de preservação dos mesmos. Se o assunto fosse mais discutido e divulgado à população, adversidades como estas não aconteceriam com tanta frequência.
É importante salientar então, que os exemplares populares também possuem técnicas construtivas interessantes e originalidade que registram a memória coletiva de um lugar, valorizando sua cultura. Sendo a discussão entorno dessa valorização de grande relevância, uma vez que atribui fortes características arquitetônicas e históricas com um significado singular e afetivo para uma camada também importante da sociedade. Mas, que infelizmente ainda não detém o reconhecimento merecido, tendo vários de seus exemplares ignorados. Andrade (1997, p.7), relata que os bens imóveis inscritos em quaiquer dos Livros do Tombo, não podem ser destruídos, reforma-
Série “Fundação pró-Memória em extinção”, desenhos de Antonio Luiz Dias de Andrade, Janjão. Fonte: Vitruvius, 2012,
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O reconhecimento entre a comunidade e seu patrimônio é extremamente importante, visto a relevância da construção da população e de suas relações com estes lugares. São estes pricípios que geram o real valor que um bem patrimonial propõe, difundindo de forma edificada seu significação histórica, seus valores culturais e representações de uma comunidade.
2. É discutido mais afundo no capítulo Campininha das Flores: uma cidade que virou bairro. Consultar o documento Área de Tombamento Federal. Traçados Viários dos Núcleos Urbanos e pioneiros de Campinas e Goiânia, 2003.
Afinal, esta é somente uma das questões que cercam o assunto, visto que vários dilemas precisam ser discutidos e repenssados. Como a questão da definição de tombamento, priorizando determinados edifícios frente a outros. O caso do Bairro de Campinas, lugar em que está inserida preexistencia deste trabalho, apresenta inconveniências acerca do processo de tombamento de seu traçado pioneiro e de alguns edifícios. Pois, apesar da ampliação entorno do conceito de patrimônio cultural edificado, reconhecendo as produções tradicionais, a realidade é distinta. No caso citado, foi definido de forma prioritária o tombamento de um traçado pioneiro impreciso2 da antiga cidade e
Fonte: Seplam, 2019.
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dos edifícios considerados oficiais e públicos, cabendo uma crítica quanto a valorização estilística do Art Déco em detrimento dos demais estilos, sendo os exemplares tradicionais e privados esquecidos e menosprezados até o momento. Tais edificações estão categorizados desde 2009 como Prioridade 3 – Bens tombados e de interesse de preservação no Plano de ação do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) Cidades Históricas, e inicialmente possuiam prazo de cumprimento para até 2012, até hoje nada foi feito. Enfim, um grande caminho já foi percorrido e aprimorado, contudo esta discussão não está finalizada, possuindo ainda muitas questões e lacunas a serem preenchidas, discutidas e repensadas.
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Palácio Capanema
Uma questão estilística...
Palácio Monroe
O conceito de patrimônio cultural edificado teve sua trajetória marcada por suas transformações, tendo a história da valorização patrimonial brasileira uma série de situações frente ao enaltecimento ou desprezo por alguns estilos arquitetônicos e algumas práticas bastante criticadas atualmente em detrimento do presente pensamento sobre a abrangência do conceito de preservação de bens históricos e culturais. Seguimos com alguns exemplos.
Fonte: ArchDaily, 2019.
Ministério da Educação e Cultura, também conhecido como edifício Gustavo Capanema, de 1943 (ano de inauguração) localizado no centro da cidade do Rio de Janeiro. Considerado na época um exemplo de boa arquitetura, sob os ares do triunfo da arquitetura modernista, foi tombado em 1948. Poucos anos depois de sua construção.
Fonte: Multi Rj, 2015.
Casa do Pe. Inácio
O palácio Monroe, localizado na Cinelândia, centro da cidade do Rio de Janeiro, foi construído originalmente nos Estados Unidos pelo governo do Brasil e entregue aos cariocas em 1906. Merecedor do prêmio de melhor arquitetura da época, o Grande Prêmio Medalha de Ouro, anos mais tarde, em 1976 viria a ser
Igreja São Francisco de Asis
demolido. Muito se atribui a desvalorização estilística que o ecletismo sofria na época, sendo considerado “colagens de mau gosto”.
Fonte: AETEC, 2018.
Casa do Padre Inácio, localizada em Cotia (SP) foi construída no final do século XVII. Um legítimo exemplar da arquitetura colonial paulista, tombado em 1951 por iniciativa privada quando um grupo de empresários paulistas adquire a construção em 1945 e doa à União, iniciando seu processo de tombamento.
Através dos exemplos citados, é notório que além das questões político-adiministrativas sobre o patrimônio cultural edificado, ao longo da trajetória nacional, diversos impasses de questões estilísticas também moldaram o caráter de afeição ou desprezo pelos imóveis históricos que ajudam a contar de maneira concreta a história do país. Seja pela preferência da produção modernista ou descaso do eclético, ou pelos esforços de se encontrar uma arquitetura verdadeiramente nacional. O patrimônio trilha seus caminhos refetindo assim, sua sociedade em questão.
Fonte: Ouro preto Cultural, 2019.
Igreja São Francisco de Assis, localizada na cidade de Ouro Preto (MG), com início de sua construção em 1766, de estilo barroco e elementos decorativos em Rococó. Diante do cenário de construção da identidade nacional, o barroco é considerado uma produção arquitetônica legítima brasileira. Por sua valorização, a igreja é um dos primeiros bens tombados individualmente em 1938.
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1.2 - Arquitetura tradicional goiana: valorização das raízes 3. O termo tradicional foi escolhido para referir-se à arquitetura originária de um saber-fazer popular e fornecida de determinados materiais característicos. Também denominada por muitos autores como arquitetura vernácula ou local.
A
o falar da arquitetura tradicional3 goiana, o exemplar residencial é o que consegue melhor traduzir a essência referente ao seu povo. Os estudos sobre as casas brasileiras sempre se concentraram em seus nobres e abastados expoentes, contudo a busca pelo entendimento da produção da arquitetura tradicional, reproduzida por um saber-fazer popular e comum das sociedades brasileiras narram importantes histórias sobre as culturas regionais e locais, e neste caso especificamente, a goiana. E é nesse tipo de arquitetura que se expressam de forma mais genuína o caráter de um povo. Em Lemos (1989, p.7), verificamos: [...] “o ato de morar é uma manifestação de caráter cultural e enquanto as técnicas construtivas e os materiais variam com o progresso, o habitar um espaço, além de manter vínculos com a modernidade também está relacionado com os usos e costumes tradicionais da sociedade.”
Ao retomar na história da casa brasileira, nos deparamos em sua base constituída por três culturas diferentes, que moldaram suas feições: a indígena, a portuguesa e a negra. Sendo que, a portuguesa ocupou um lugar de destaque devido sua posição privilegiada desde o início da nação. Foi o português que trouxe e adaptou seus costumes e técnicas construtivas. Em Mello (1985, p.94) apud Váz e Zárate (2003, p.41) relata que: “Com o correr do tempo houve uma natural seleção destas técnicas prevalencendo umas e outras nas diversas regiões do Brasil de acordo com o tipo de solo, a facilidade de obtenção dos materiais e qualidades da mão de obra local.”
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Ao olhar para a província de Goiás, percebe-se um relativo “atraso urbanizador” no que tange a outros territórios brasileiros. Uma vez que, esta região que mais tarde viria a ser o estado de Goiás só obteve estímulo à fundação de vilas e cidades na segunda metade do século XVIII em decorrência da descoberta do ouro no século XVII, cujo processo foi de forma gradual e contínua efetuado por alguns desbravadores da época, os chamados bandeirantes. Principalmente no início do século XVIII, com Bartolomeu Bueno da Silva – o Anhanguera, e a descoberta do ouro e pedras preciosas no interior do Brasil é que núcleos urbanos começaram a ser devidamente formados em Goiás. Assim, juntamente com a chegada da povoação no território, a província herda as características arquitetônicas coloniais das demais regiões já ocupadas (BOAVENTURA, 2007, p.30). A arquitetura tradicional goiana nasce no século XVIII, deste processo simultâneo de ocupação territorial “tardio”, mesclando núcleos urbanos e o estabelecimento de propriedades rurais. A casa urbana e a casa rural, portanto, mantinham uma íntima relação pois tais denominações se circunscreviam em uma mesma relação espacial (OLIVEIRA, 2004). Ainda em Vaz e Zárate (2003, p.59): “Assim, em decorrência dessas peculiaridades histórico-sociais, as casas foram aqui adaptadas às limitações presentes no contexto regional – eram modestas construções sem quaisquer traços de erudição.”
A situação interiorana da região lá pelos oitocentos, refletiu em uma sociedade que continuava com suas caraterísticas e influências coloniais, tendo estabelecido tempo e ritmos
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próprios que iriam perdurar até o início do próximo século. Prevalecia uma arquitetura que seguia as características mesmas e técnicas construtivas coloniais, além de uma organização espacial quase idêntica. A arquitetura tradicional residencial seguiu características bem específicas (por mais de dois séculos) no interior do Brasil e consequentemente em todo Goiás, como o alinhamento de vias, ausência de recuos frontais e laterais e predominância de construções térreas. Consistiam em um volume tímido e prismático em geral. O acesso sempre pela fachada frontal, sendo esta com a presença de aberturas em destaque na composição. A cobertura se dava por telhas canais e composição com planos de dois até quatro águas, geralmente contando ainda com a presença dos beirais. De acordo com Moura (2011, p.28), as casas, no que tange os aspectos construtivos, eram feitas em sua maioria pela estrutura autônoma de madeira (gaiola) formada majoritariamente por esteios, baldrames e frechais. Ainda, as vedações mais utilizadas eram do tipo adobe, e pau a pique ou taipa de mão. A estrutura dos telhados constituía geralmente em duas á quatro águas compostas por pontaletes, cumeeiras, terças, caibros e ripas, além de usualmente utilizarem telhas de barro do tipo capa e bica. Era possível identificar construções mais sofisticadas, no qual wera possível encontrar a presença de forros e esquadrias bem talhadas em madeira.
Todo o contexto do saber-fazer arquitetônico, desde suas técnicas construtivas, materiais utilizados, elementos e aspectos arquitetônicos estão intrinsecamente correlacionados à cultura de um povo, ao seu contexto social, cultural, econômico. Ainda mais especificamente, em seu sentido mais íntimo há a compreensão da estrutura familiar, de seus valores e modo de vida (OLIVEIRA, 2004, p.319). Tal arquitetura tradicional, permaneceu durante muito tempo como a principal expressão construtiva dessa arquitetura “comum e habitual” de uma sociedade interiorana e assim como diziam e eram denominados “caipiras”. Eram feitas a partir de um saber passado de gerações e de conhecimentos pertencentes a memória coletiva desta sociedade difundidos ao longo do tempo, que encontram remanancentes de até o começo do século XX. O cenário deste quadro sertanejo e interiorano começa a se transformar apenas a partir do século XX, passando por algumas circunstâncias, que lentamente iriam mudar este contexto urbano, arquitetônico e social.
Como em Oliveira (2004) e Vaz e Zárate (2003), é importante salientar que o estudo dessa arquitetura abrange o âmbito de produções arquitetônicas comuns e sem autoria, mas que sua análise revela muito sobre o contexto em que estava inserida, quase todas muito modestas. Revela-se, portanto, uma arquitetura que nasce de diversas medidas de uma sociedade ao longo do tempo, sendo vestígios evidentes da arquitetura tradicional goiana. 14
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Modernidade à vista! A ferrovia 4. Vários fatores paralisaram as obras por diversas vezes. Seja por “ ir reg ular idades contratuais e dificuldades financeiras por parte da companhia concessionária, intereses regionais, além da primeira Guerra Mundial que influênciou nos atrasos de importação de trilhos, equipamentos e materiais rodantes (BORGES, 2004).
No início do século 20, mais precisamente em 1912, a modernidade representada pela estrada de ferro chega em terras goianas e começava a ser implantada no sudeste do estado. A chegada da ferrovia significou muito para a sociedade, marcando uma interrupção no modo de vida do sertão goiano, sendo um dos principais elementos responsáveis pelo desenvolvimento da economia agrária na região. Resultando também em consideráveis mudanças nos aspectos sociais, políticos e culturais. Desde o final do século XIX, já se falava na expanssão ferroviária para as terras goianas, tendo os trilhos do Triângulo Mineiro parados desde 1886. Em 1909 foi aprovado a extensão que ligaria a cidade mineira de Araguari à Catalão, começando uma nova etapa para o desenvolvimento do estado, mas que passaria por vários obstáculos econômicos e políticos4 se estendendo até a década de 1950. Ferreira e Coelho (2004) expõe que a arquitetura, assim como o urbanismo das cidades afetadas também obtiveram significativas transformações. Entre elas constatou-se a implementação de redes de esgoto, energia elétrica e iluminação pública, telefonia, alargamento de ruas. Já os edifícios foram lentamente substituídos por construções em alvenaria de tijolo; utilização da telha francesa; cimento queimado; ladrilho hidráulico nas partes mais nobres; e estruturas metálicas para sustentar as coberturas; ocupação de vazios urbanos existentes, e ainda implantação de novos serviços urbanos necessários. A própria arquitetura ferroviária se transformou em núcleos urbanos dinâmicos, no qual o ritmo e modo de vida era guiado pela estação.
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As cidades de Ipameri e Catalão por exemplo, constataram as transformações provenientes da implantação da ferrovia, se tornando importantes centros comerciais e polo irradiadores dos veículos de comunicação, como períodicos, revistas e jornais que “chegavam pelo sudeste goiano” através da estrada de ferro. Assim, “a ferrovia reduziu o tempo e o espaço entre o sertão e o litoral, despertando Goiás do isolamento econômico e cultural”. Contudo, é necesário salientar que tais transformações foram lentas e desiguais e que pouco a pouco é que mudaram o cenário goiano (BORGES, 2004): O trem de ferro, simbolizado pela velha “maria-fumaça”, com sua cauda de aço, penetrava nas entranhas dos sertões e fundava a tradicional sociedade agrária com valores culturais do mundo moderno.
Fonte: Hemeroteca digital, 2019. A CASA “Revista de engenharia, architectura e arte decorativa” do Rio de Janeiro. Difundida por todo o Brasil chega à cidade de Ipameri. Na edição N.48 é respondido um questionamento de um leitor ipamerino na parte de Correspondências.
km 393
Goiânia km 430
Anápolis Silvânia km 321
km 154 Ipameri
Fonte: Flavio R. Cavalcanti. Adaptação da autora, 2019.
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km 0
Araguari
Mapa: principais pontos da estrada de ferro em Goiás.
A Casa
Fonte: Nosso Catalão, 2010. A Informação Goyana “Revista mensal, ilustrada e informativa das possibilidades do Brasil Central” que circulou entre 1917 a 1935 . Foi exportada para a Capital federal, principais estados do país, e até alguns países estrangeiros.
A Informação Goyana
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Modernidade à vista! A nova capit al
A região ainda contaria com outras circunstâncias que transportariam os “ares progressistas” para Goiás. Influênciados principalmente pelo movimento da Marcha para o Oeste e os ideais estadonovista da era Vargas na década de 1930, iniciativas que resultaram na nova capital de Goiás, Goiânia. Pensada para representar o máximo de modernidade, a nova capital se ampara em um forte discurso de transformações progressistas por seu interventor Pedro Ludovico Teixeira. Passando assim, por vários embates políticos e econômicos contrários à ideia, Goiânia que já era gestada desde o final do século XIX, viria a nascer em 1942. Chaul, (2009, p.102) aponta que o decreto assinado em 1932 Pedro Ludovico prometia “uma capital moderna, planejada, coerente com os novos tempos do Goiás que se anunciava.” Goiânia representava uma capital acessível, de vanguarda capaz de irradiar o progresso, diferentemente da antiga Capital que vivia em “decadência, isolada e confinada por tradições”. Assim, “simbolizaria o avesso do atraso” (CHAUL, 2009), e que respaudaria anos mais tarde em outra nova capital, desta vez Brasília.
rio, zoneamento e topografia do terreno. Mais tarde o plano seria reformulado por Armando de Godoy, incluíndo o setor Sul de referências projetuais inglesas amparado no conceito de cidade-jardim de Ebenézer Howard, atitudes estas bastantes higienistas. Todos os ares progressitas, ditaram assim um novo ritmo não só para Goiânia, mas por todo o estado, abandonando as velhas práticas e modo de vida, adentravam na contemporaneidade e assim, costumes, saberes e fazeres comecariam a se perder, inclusive os remanecentes da arquitetura tradicional. Ao analisar a historiografia, percebe-se a importância desta arquitetura, para a formação e construção da sociedade goiana. A arquitetura residencial de bases tradicionais permanece por muito tempo como a principal e maior expressão construtiva no território, ajudando a moldar essa identidade sertaneja que esteve presente e ainda está no âmbito social regional, daí a importância de se discutí-la e preservá-la, sendo uma forma de valorizar suas raízes.
Sua arquitetura também tinha função de edificar a modernidade falada, assim o art déco foi empregado com intuito de ser símbolo do moderno. De forma simples, mas austera traduziria o novo espírito incorporado nas terras goianas, definindo as primeiras edificações oficiais da capital. Assim como seu urbanismo de bases francesas, arrojado e importado, o pâte d’oie. Atílio Correa Lima foi convidado para o desenvolvimento do projeto urbanístico da nova capital de Goiás em 1933. O traçado de Goiânia, partindo da praça cívica baseia-se no desenho barroco de influência da escola francesa (uma das mais prestigiadas na época), onde três eixos se convertem para um ponto principal, além das ruas largas inseridas por todo o centro, priorzando assim o sistema viá17
Tradição e modernidade. Carros de boi na praça cívica. Goiânia, 1936. Fonte: Acervo MIS.
Mapa: estado de Goiás em 1939.
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Fonte: IBGE - RJ, 1939.
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1.3 - Pelas vias do abandono 5. Conforme a lista de Relação dos bens tombados pelo estado de Goiás – SECULT GOIÁS (1980 - 2012) e Relação dos bens em Goiás tombados pelo IPHAN (1938 – 2015).
G
oiás, com a política de modernização instaurada na primeira metade do século XX, adota uma postura de “negação ao passado”. Portanto, a ideia de preservação da história não é amplamente discutida, pois encontrava-se uma sociedade que buscava pela modernidade, durante um período de pensamentos progressistas. Assim, em quase todo o século XX, Goiás se distanciou das políticas de patrimonialização, salvo algumas exceções como as Cidade de Goiás e de Pirenópolis. Grande parte dos tombamentos das cidades goianas ocorreram somente a partir da década de 1980 amparada pela Lei Estadual Nº. 8.915, de 13 de outubro de 19805 no governo de Ary Valadão, marcando assim tardiamente, o início da conscientização de preservação de bens históricos materiais em Goiás. E que do total de aberturas de processos (deferidos ou indeferidos pelo IPHAN), 64% ocorreram somente após a década de 1980. E, até esta data nenhum bem histórico, cultural ou ambiental tinha sido tombado por iniciativa do governo do estado (LIMA, 2017, p.81). Assim, é perceptível verificar a fragilidade da tragetória patrimonial goiana e ao discutir sua arquitetura tradicional, logo é percebido o abandono em que boa parte dos remanescentes se encontram atualmente, sem falar dos inúmeros que não resistiram ao tempo nem ao reconhecimento, sendo demolidos ou padecendo às ações inevitáveis do tempo. Em Lima (2017, p.18) identifica-se “três possibilidades que comprometem a existência/resistência” de um patrimônio. Assim, ele pode ser absorvido pela modernização do território, sendo substituído e transformado pouco a pouco; incorporado à lógica mercadológica e turística ou ainda, simplesmente “esquecido” e negligenciado. Com excessão da Cidade de Goiás (antigo Arraial de Sant’ Anna de 1726) e Pirenópolis (antigo Arraial 19
de Nossa Senhora do Rosário da Meia Ponte de 1729), que adquiriram maior notoriedade, muito por seu pioneirismo na região e fortalecimento de uma economia da mineração do ouro , a última possibilidde dispõe da atual situação de grande parte das edificações que correspondem à pratica tradicional arquitetônica do saber-fazer já discutido. Exerce, portanto, reflexões acerca do abandono do patrimônio, bem como do lugar que se insere diante da comunidade goiana. Os questionamentos acerca de tais condutas podem ser entendidos por apresentarem características (que aqui já foram apresentadas) sem “expressividade”, amparado pela omissão e desconsideração por parte do Poder Público. Uma vez que, muitas ações governamentais visam políticas de patrimonialização que privilegiaram lugares e objetos que sinalizam o papel de elites urbanas e rurais pretéritas como estratégias turísticas (COSTA e SUZUKI, 2012 apud LIMA, 2017). É fixado assim, elevado valor de certos bens em detrimento de outros. Ao observar os edificios tombados, é percebido a proteção de edifícios específicos como igrejas, sedes de fazendas, torres, casas de políticos e outros, sendo os exemplares mais simples completamente renegados. Contudo, apesar da importância da atuação institucional pública nas políticas patrimoniais, a relação da comunidade com seus bens tem também seu lugar de relevância. Visto que, o reconhecimento coletivo se faz importante para a perpetuação da significação do bem e da paisagem em questão. A participação popular é que partilha das vivências e cotidianidades de um lugar. Muitas vezes a preocupação da preservação de um determinado edifício nasce justamente de algum apelo da comunidade, partindo de uma iniciativa local, preocupados geralmente com a situação de descaso e abandono, para assim chegar ao poder público. Pois, é a sociedade local que
simplicidades esquecidas
consolida a significação patrimônio, seja por sua importância histórica, cultural, política ou afetiva. São estas pessoas que vivenciam estes lugares, e portanto, atribuem o real valor de significação para o bem. Pouco se pensa no “patrimônio pelo viés do presente e de como ele pode ser incorporado ao usufruto das ações cotidianas.” (LIMA, 2017, p.109). Uma prática decisiva, pois ao se discutir a preservação de algum bem, é necessário levar em consideração os aspectos atuais que irão afetar diretamente o lugar, o programa e sua arquitetura para que assim, o patrimônio represente bem seus lugares carregados de valores e significados antigos, mas também atuais. Enfim, é necessário estar consciente que a problemática de abandono da arquitetura tradicional goiana, não é provocado apenas pela negação de seu valor e da ausência do Estado, mas também está relacionado à sobreposição dos valores regionais, interioranos e sertanejos, em detrimento da busca por outra identidade, talvez mais imponente ou grandiosa. Há uma falta de envolvimento com a história já negligenciada tempos atrás, que se reflete atualmente no abandono de casas em ruínas.
Seguem alguns exemplares de casas tradicionais encontradas em Goiás, em 26 cidades que se localizam geograficamente de forma disseminada na região do estado, incluindo o objeto de intervenção deste trabalho, um exemplo de casa tradicional no atual bairro de Campinas.
Mapa de Goiás com algumas casas de arquitetura tradicional
“Dessa forma, o patrimônio seria um ente à parte, descolado da vida e do cotidiano das pessoas comuns, mas necessário de se manter por representar a história e a identidade de um povo”, sendo que a “importância da preservação está no fato de que os objetos e lugares dão suporte à memória” (LIMA, 2017, p.196) e exprimem a importância de realocar o patrimônio de forma mais íntima com cada comunidade com o qual se relaciona . Muito mais que tombar, é necessário resignificar esta parte da cultura, construindo uma relação afetiva com estes lugares. É sobre difundir a importância da cultura popular, das tradições, do saber-fazer, e reintroduzir de maneira natural e consciente a apropriação e utilização do patrimônio arquitetônico tradicional. Longe de cultuar uma ode ao passado e um saudosismo inocente, mas sim uma forma de conectar passado e presente, valorizando e incluindo estes edifícios de maneira útil e benéfico à sociedade.
Fonte: autora, 2019.
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simplicidades esquecidas
Figura 2: Cavalcante. Fonte: A beleza de Cavalcante, 2010. Figura 3: Niquelândia. Fonte: Google Maps, 2012. Figura 1: Porangatu. Fonte: Silva, 2017.
Figura 5: Pilar de Goiás. Fonte: Lima, 2017.
Figura 7: Jataí. Fonte: Google maps, 2012. Figura 4: : Crixás. Fonte: Casa de José Seixas, 2008.
Figura 9: Orizona. Fonte: Azevedo, 2019.
Figura 10: Bairro de Campinas, Goiânia. Fonte: Mustafé, 2016.
Figura 8: Palmelo. Fonte: Mapio.net, 2010.
Figura 11: Aparecida de Goiânia. Fonte: Google maps, 2019.
Figura 12: Anápolis. Fonte: Dia online, 2019.
Figura 11: Jaraguá. Fonte: Lima, 2017.
Figura 13: Formosa. Fonte: Sheila Almeida, 2019.
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simplicidades esquecidas
Figura 15: Caldazinha. Fonte: Sheila Almeida, 2018. Figura 14: Maripotaba. Fonte: Sheila Almeida, 2019.
Figura 16: Piracanjuba. Fonte: Sheila Almeida, 2018.
Figura 18: Mossâmedes. Fonte: Sheila Almeida, 2018.
Figura 19: Itauçu. Fonte: Sheila Almeida, 2019.
Figura 17: Hidrolândia. Fonte: Sheila Almeida, 2018.
Figura 22: Lagolândia. Fonte: Minervino Júnior, 2014.
Figura 21: . Fonte: Luziânia. Sheila Almeida, 2018.
Figura 20: Abadiânia. Fonte: Sheila Almeida, 2019.
Figura 24: Trindade. Fonte: Malu Azevedo, 2010.
Figura 23: Bela vista de Goiás. Fonte: belavista.net.
Figura 25: Jesúpolis. Fonte: mapio.net.
Figura 26: Silvânia. Fonte: Glauco Chaves.
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CAPÍTULO II
Campininha de Goiás
Campininha de Goiás
2.1 - Uma cidade que virou bairro 6. A ferrovia só atingiu Goiânia, capital do Estado de Goiás no início dos anos de 1940, somente no final da década de 1950 a linha foi prolongada em dois quilômetros até Campinas de Goiás e aí chegava ao seu ponto final.
C
ampinas atualmente, se destaca por ser um conhecido bairro de comércio popular de Goiânia e núcleo pioneiro de suporte á cidade, entretanto sua história como município é muito anterior a da capital. Campininha das flores, como era conhecida pelos populares, tem seu início ainda no começo do século XIX, em 1810. O povoado surgiu quando o alferes meia-pontense Joaquim Gomes da Silva Geraes de passagem à procura de ouro, se fixou na região, fundando uma fazenda. Desde então, várias famílias de São Paulo, Minas Gerais e de outras regiões da antiga Capitania de Goyas começaram a se estabelecer. Muitos vinham à procura de ouro, mas encontravam apenas algumas minas de ferro (CAMPOS, 1985). É importante reforçar a divergência do interior goiano no século XIX em relação à outras regiões do país, principalmente a sudeste. Além de um atraso de 200 anos em sua “desbravação e povoamento” por parte de bandeirantes e portugueses, naquele momento seu quadro sócio-econômico era bastante precário. Ao contrário de outras capitanias coloniais, a de Goiás foi extremamente pobre em relação ao número de vilas, com apenas uma – Vila Boa (atual Cidade de Goiás e um arraial de maior expressividade, Meia Ponte (atual Pirenópolis). Assim, por todo o território se originava pequenos povoados que lentamente iam crescendo em um ritmo marcado pelo interior do sertão goiano. Campinas, assim, se estabelecera nesses moldes. Em Cunha Mattos (1979, p.32,99) apud Nascimento (2010, p.2), é relatado que por volta de 1824 a região era formada por onze casas e uma ermida dedicada à Nossa Sra. da Conceição. Seus habitantes dedicavam-se a agricultura e a criação de gado, inclusive todo o modo de vida estava relacionado à atividade agropastoril. Durante todo o século XIX, sua descrição se destacou por suas belezas natu24
rais e seu lento desenvolvimento. Sendo que, 70 anos depois seu crescimento não foi tão relevante. O padre redentorista Francisco Wand relatava que em 1894 Campinas possuía “apenas umas 30 casas pobres e mal construídas e a igreja, completamente descuidada [...]”. Ainda, o relato de um viajante em 1890 descreve a situação do lugarejo sob um olhar estrangeiro e bastante pejorativo:
Campininha de Goiás
Campininha das Flores de Santa Conceição
As quatro horas da tarde passamos pelo arraial da Campininha, o lugar mais insignificante que conheci em todo o sul de Goiás. É uma povoação embrionária, todavia dizem-se ser localidade de próspero futuro pelas magníficas terras de suas redondezas. Conquanto o arraial da Campininha ou Campinas seja habitado, creio que a população dormia aquelas horas ou aliás é muito caseira, porque não vi ninguém na rua (LEAL, 1980, p.155 apud OLIVEIRA, 1999, p.36).
O povoado de Campinas, foi elevado à Vila apenas em 1907. Pois anos antes, em 1894, a chegada dos padres redentoristas do sul da Alemanha, que vieram com o intuito com de administrar o Santuário de Trindade em Barro Preto (atual cidade de Trindade), transformaram a região. Eles eram professores, médicos, engenheiros, construtores, juízes e advogados, construíram o primeiro convento e a segunda capela da região. Ainda em Oliveira, (2003) apud Godinho (2018, p.27) é relatado que por volta de 1896, o fluxo comercial entre Minas Gerais e capital de Goiás crescia pela expansão da ferrovia de Araguari, MG; passando preferencialmente pela Campininha6 . Em 1914, já considerada cidade, contava com aproximadamente mil habitantes. Além dos padres alemães, em 1921 chegaram as Irmãs Franciscanas, também vindas da Alemanha. Fundaram, em 1922 o colégio Santa Clara. A atuação dos religiosos ainda trouxe muitas melhorias para a região. Entre elas a instalação da primeira usina hidrelétrica, 1921 em Campinas; a edição do primeiro jornal; a instalação do primeiro telefone entre Campinas e Trindade em 1924 e o relógio na torre da igreja. Ainda, em 1920 foi construída a primeira casa de alvenaria de Campinas, uma novidade, já que a maioria das construções existentes era de adobe (GODINHO, 2018, p.30).
Fase 1: pouso e abrigo casas 1824 - 11 45 pessoas
Fase 2: comerciantes 1844 - 30 casas 400 pessoas
Fase 3: padres redentoristas
1920 - 4.428 habitantes
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Campininha de Goiás
Neste momento, a paisagem urbana da cidade já se alterava e como já dito, na década de 1930 os ares do “progresso” chegavam à região com a instalação da nova capital de Goiás. Goiânia7 mudaria toda a trajetória da Campininha, se utilizando da pequena cidade para sede provisória do governo estadual e apoio das novas construções.
7. Em 1932 foi decretada a mudança para capital nomeando uma comissão para a escolha do lugar. Quatro localidades foram indicadas: Pires do Rio, Bonfim, Batá (Ubatan) e Campinas (SOUZA, 2018).
Considerando que Campinas se acha situada no ponto cêntrico da parte mais povoada do Estado e a sua topografia das mais apropriadas e belas para construção de uma cidade urbanamente moderna, entre um vasto perímetro de terras de ótimas culturas todas cobertas com matas de superior qualidade e que enormemente facilitarão a construção da nova cidade; a Subcomissão é de parecer que a nova Capital seja construída em Campinas ou Bonfim (IBGE, 1942).
A nova capital teve um grande impacto e muitas transformações para Campinas, sendo que o seu traçado foi sendo incorporado ao de Goiânia. Godinho et al (2017, p.2) relata que “a pequena aglomeração de traçado e arquitetura tradicionais hibridizava-se com a com a cidade moderna e planejada”. Até que em 1935 a então cidade se torna um bairro goianiense e começa um processo de intensa modificação da região. Além da especulação imobiliária, muitos exemplares da arquitetura tradicional foram sendo destruídos dando lugar a estabelecimentos comerciais, ainda chegaram à região hotéis e postos de gasolina. A partir de então é compreendido um debate importante socialmente. Onde fica a identidade de toda uma cidade frente a destituição de um lugar? No sentido que o povo, em um momento passa a não ser mais um cidadão campineiro e sim incorporado em um contexto totalmente novo de goianiense. Salientando que são mais de 100 anos de história de um povoado com suas próprias características e que lentamente foram sendo englobadas pela nova e moderna capital. O forte discurso de modernidade se manteve presente, a figura caipira que definia os velhos tempos da região foi deslegitimada e substituída pelos novos ideais. Nascia então uma nova Campinas. Godinho et al (2017, p.13) esclarece que: 26
Para os chamados campineiros, esse bairro não consegue obter da população goianiense, como um todo, o respeito necessário como parte integrante da cidade. Parece apenas haver uma exploração pelas qualidades econômicas do bairro, um chamariz pelos costumes religiosos, um descaso pela vida tradicional que ainda acontece em pontos afastados da agitação comercial.
O processo de mudança de cidade-satélite para bairro de Goiânia também pode explicar a falta de produção de conteúdo de Campinas como cidade. Já que a maioria das análises consideram apenas sua situação atual, ignorando seu passado como município e pioneiro na urbanização da região que mais tarde viria a ser Goiânia. São escassas as informações urbanísticas e arquitetônicas da antiga Campinas enquanto município. A importância de Campinas é muitas vezes relegada a segundo plano no contexto da história urbana de Goiânia. A antiga cidade representou um marco inicial na construção da nova capital, servindo como berço físico para seu surgimento. È ao mesmo tempo história e memória dos primeiros acontecimentos. Simboliza o registro vivo de tempo, das mudanças e transformações, das construções que foram se juntando, criando e recriando o tecido urbano. Ao mesmo tempo em que serviu de suporte para o crescimento da nova capital, foi completamente influenciada pela sua modernidade possível, inserindo-se em uma nova conjuntura temporal (GONÇALVES, 2002).
Campininha de Goiás
Avenida 24 de Outubro (1935). Fonte: Eduardo Bilemjian
Auto Posto Amazonas, Avenida Anhanguera, esquina com José Hermano. Fonte: Acervo Hélio de Oliveira, 2017.
Avenida 24 de outubro, 1940. Fonte: Autor desconhecido. Acervo MIS| GO, 2016.
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Campininha de Goiás
Adentrando por velhos caminhos 8. Portaria n.° 507 de 18 de novembro de 2003. Processo n.° 1500 T/2002. Decreto-Lei n.° 25/1937.
S
egundo Argan (1995, p. 228-229), o valor de uma cidade é o que lhe é atribuído por sua comunidade, não por uma série de análises urbanístico atemporais, pois é sua população que compreende e vivencia o lugar em seu sentido mais íntimo. Ao analisar a Campininha ainda enquanto cidade, conseguimos compreender o lugar de uma forma muito mais íntegra, pois antigos vestígios dizem muito sobre o processo da atual urbanidade a ser analisada posteriormente. Assim, a região que hoje se define pelo quadrilátero pioneiro de Campinas, em meados dos anos de 1900 logo se tornou um pequeno núcleo comercial influenciado pelos edifícios religiosos (a igreja N. S. da Conceição de 1844, mais abaixo a capela São José inaugurada em 1901), o colégio Santa Clara e a antiga Estrada do Boi, atual Av. Sergipe/ Av. Padre Wendell que era a única que ligava à cidade de Trindade (antigo distrito de Barro Preto) e também à antiga capital. Sendo que, obteve uma importância significativa na estruturação do viário na região, caracterizada pelo transporte dos carros-de-boi nos anos de novecentos. Importante lembrar que as vias ainda não eram pavimentadas, e o transporte era marcado majoritariamente pela utilização de cavalos, mulas e carroças.
Campinas são válidas. Contudo, é notório o descaso nos estudos sobre a localidade. Quando em 2003 foi proposto o tombamento viário a nível federal8 , não foi tomado conhecimento suficiente para abranger todo o núcleo pioneiro inicial, suprimindo uma outra parte desta região, depreciando uma parte da memória que também existia. O tombamento do traçado viário privilegia um esboço que conserva edifícios mais importantes, contudo a verdadeira Campininha compreendia um território um pouco maior. A arquitetura popular seguia aos moldes tradicionais, majoritariamente de adobe ou taipa de mão, telhado de quatros águas e estrutura autônoma de madeira e sem recuo frontal, sendo recorrente até um pouco depois dos anos de 1920. Interessante notar que os edifícios que mesclavam residência com algum tipo de estabelecimento comercial possuíam de duas a quatro portas voltadas para a rua. Já os edifícios maiores, como igrejas, conventos e o colégio já apresentavam traços mais modernos, tanto por suas construções em alvenaria, quanto a estilística de traços Art Déco e Eclética, por volta das décadas de 1930 e 1940.
Colégio Santa Clara , década de 1930. Fonte: Colégio Santa Clara (2017).
O traçado urbano da antiga Campininha se caracterizada por uma malha quadriculada, algumas reentrâncias de ruas sem saídas (que ainda permanecem no traçado atual), formava um conjunto de quadras e lotes regulares. Desprezava a setorização específica, sendo que muitos moradores iam se estabelecendo de forma natural na região, alguns abriam pequenas vendas em sua própria moradia, estabelecendo um ritmo bem provinciano. Sendo que, a região mais desenvolvida inicialmente foi a do largo da Igreja Matriz. Algumas diretrizes que tentam salvaguardar esse pequeno núcleo, a antiga Campininha das Flores, dentro do atual grande bairro de 28
Foto 4: Rua Senador Morais Filho em Campinas, 1939. Autor desconhecido. Goiânia - Goiás. Acervo MIS| GO.
Campininha de Goiás
Mapa pioneiro: Projeção da malha urbana da antiga Campininha das Flores sobre a malha urbana de Goiânia
Campinas Centro
Referência traçado de Campinas antes de 1930 e
Localização dos setores em Goiânia
atualmente
preexistência
antigo cemitério de Campinas
sentido Barro Preto (atual Trindade) Igreja matriz
Estra da do
boi (
atual av. Se rgipe colégio Santa ) Clara
córrego Cascavel
praça Joaquim Lúcio
0 25 50
Núcleo pioneiro de Campinas (tombado) Núcleo de Campinas antes 1930 Delimitação de Campinas atualmente
100
Obs: edifícios e lugares anteriores a década de 1930 Fonte: Bezerra, 2013. Adaptação da autora, 2019.
29
Campininha de Goiás
Praça Coronel Joaquim Lúcio Campinas, 1934. Autor desconhecido. Goiânia - Goiás. Acervo MIS| GO.
Posteriormente, na década de 1930 com a já estabelecida cidade de Goiânia, a avenida 24 de outubro passou a ser o principal elo viário entre a região de Campinas e a nova capital. Gonçalves (2002, p.102) apud Godinho (2018, p.45) é relatado que: 9. No início do ano a prefeitura de Goiânia publicou que está desenvolvendo o projeto que abrange a rua do Lazer (rua 8) no setor Central, como primeira medida do projeto. .
Ao longo da avenida surgiam toscas edificações, verdadeiros casarões com telhados coloniais de quatro águas e telha francesa. Eram os primeiros estabelecimentos comerciais, postos de gasolina e residências.
O bairro foi passando por inúmeras mudanças, surgindo um clima de disputa entre campineiros e goianienses devido ao contexto já citado. Foi consolidada também, em meados dos anos de 1940 a praça Joaquim Lúcio como um dos principais lugares de encontros de Campinas, além de várias casas para exibição de filmes como o Cine Campinas; prostíbulos, como o de Maria Branca e diversos bares, que inclusive concorriam com os de Goiânia. Campininha de fato se rendera aos progressos daquele tempo e era considerada uma importante centralidade (Godinho, 2018, p.57). Outra questão importante foi a mudança de nomenclatura de diversas ruas. Inicialmente foi decidido pelo Dr. Pedro Ludovico que todas as avenidas do quadrilátero histórico tivessem o nome dos estados brasileiros, sendo as ruas transversais a estas obtivessem nome de cidades goianas. Contudo, posteriormente, Campinas passou por mais uma transformação e teve algumas nomenclaturas alteradas, o que causou muito aborrecimento por parte dos campineiros. 30
É importante observar o quanto restou da velha Campininha. Ao lançar o olhar atual para sobrepor tempos passados, verificamos que muito pouco restou da antiga província interiorana. Longe de defender uma ingênua paralização do tempo, ao contrário pois as cidades e nesse caso o bairro, precisam se desenvolver de forma natural perante o tempo. Contudo, um olhar um pouco mais atento revela o quanto da alguns dos traços acima analisados na região tentam resistir à sua época e continuar representando memórias e histórias passadas. Ao se tratar da arquitetura tradicional residencial é notado poucos remanescentes, assim como já discutido o processo que assombra todo o território Goiano. E se o tempo da pavimentação asfáltica, que substitui a poeira da estrada de chão, é indicador da introdução de novos princípios urbanísticos e da racionalidade construtiva, é também, potencialmente, indício do amálgama realizado entre o antigo e o novo – é isso o que, de fato, melhor qualifica a identidade urbanística de Campinha das Flores (ARRAIS et al, 2015, p.121).
Alguns projetos foram elaborados como o ReViva Goiânia, de 2017 para revitalização do Centro de Goiânia e da região comercial de Campinas. Algumas ações foram elaboradas como limpeza das fachadas, concessão de benefícios fiscais para a construção de novas moradias e a transformação de prédios abandonados. Contudo, as medidas ainda não fo-
Grande Hotel, 1954. Fonte: OLIVEIRA, 2008.
Campininha de Goiás
Fotografia aérea de Campinas em 1934. Uma das raras imagens do núcleo inicial, antes do início da construção de Goiânia. Fonte: IBGE, 1942.
Praça Joaquim Lúcio, década de 30. Fonte: Eduardo Bilemjian, acervo Eliézer Bilemjian.
Mapa centralidades, núcleo pioneiro de Goiânia Perímetro de Tombamento do traçcado viário de Goiânia.
Campinas
vel Casca o g e r r có
Goiânia
0 100 200 200 Fonte: Autora, 2019.
31
Campininha de Goiás
2.2 - Uma análise atual
10. Seu aniversário é comemorado no dia 8 de julho, com surgimento no ano de 1810. .
ram postas em prática9 .
O
bairro de Campinas que se localiza na região oeste de Goiânia, hoje é um setor consolidado que ao longo de toda sua trajetória de 209 anos10 estabeleceu uma forte relação com o comércio. Desde a época de simples província já apresentava pequenos estabelecimentos que serviam de amparo àqueles de passagem para a antiga capital. Com a construção de Goiânia, os comerciantes tiveram preferência pela Campininha. Atualmente, o comércio na região se caracteriza por uma grande variedade de produtos e serviços oferecidos e foi por muitas décadas o maior centro comercial da região. Além disso, o bairro possui diversas características de diferentes atividades exercidas, locais tradicionais e uma infraestrutura urbana consolidada. A região é responsável por aproximadamente 74% da arrecadação de impostos da cidade, segundo a pesquisa Radiografia Socioeconômica de Goiânia em 2002. Ainda, possui um trânsito considerado como um dos mais intensos da capital. Entre as principais atrações do setor, verifica-se o Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, mais conhecida como Matriz de Campinas. São realizadas novenas durante as terças, recebendo até 25 mil pessoas. Destaca-se, também entre os atrativos do bairro o carinho de seus moradores/torcedores pelo Atlético Goianiense,
Anúncio da venda de lotes no Setor Campinas de Goiânia. Fonte: O Popular, 1946.
32
Campininha de Goiás
Até onde vai Campinas? Em Gonçalves (2002, p.) é possível verificar que além da paisagem urbana como um todo sofrer mudanças significativas, Campinas passou por um processo de expansão, em direção ao Ribeirão Anicuns e aos limites da antiga Avenida Amazonas, atual Avenida Anhanguera a partir da década de 1930. Por sua importância histórica e econômica, já consolidado na década de 1950 muitos bairros foram surgindo nos seus arredores. Os bairros Vila Operária (hoje dividia entre o Setor dos funcionários e Centro-oeste), Fama, Vila Abajá, Vila Santa Helena, Vila São José, Bairro Aeroviário, Vila Aurora, Vila Santa Tereza são al-
guns deles. A Vila Coimbra, concedida como pagamento aos Irmãos Coimbra pelos serviços prestados à construção de Goiânia começou a ser implantada a partir do ano 1947, durante o governo de Jerônimo Coimbra Bueno, e em 1951 já se encontrava habitada.
LEGENDA
Delimitação de Campinas atualmente
“Para nós campineiros, Campinas terminava no lago das rosas. Para frente era Goiânia, de calças curtas, em crescimento” (GOMES, 2002).
Delimitação Campinas década de 1980
Mapa de expansão urbana da região de Campinas entre as décadas de 1930 à 1950
6 7
córrego Cascavel
2
Núcl pione eo ir C am o de pi n a s
Estação C
ampinas
go C
5
Estrada de fe rro - Décad a de 1950
có rre
1
ap im
Pu ba
Expanssão década de 1940
1- Vila Ana Maria 2- Vila Benjamin Gomes 3- Vila Cintra 4- Vila Pará 5- Setor Bonfim 6- Vila Maria 7- Vila Bonfim
Estaç
i ão G o
ân i a
Vila operária a partir de 1938 (atual setor dos Funcionários)
3 Setor Aeroporto década de 1940
4
a guer nhan Av. A nia G oi â e d o oneir eo pi Núcl
Vila Coimbra década de 1940
Campinas Centro
0 100 200 200 Mapa Goiânia
33
Fonte: Godinho, 2018; Brito, 2016. Adaptação autora, 2019.
Campininha de Goiás
LEGENDA Delimitação de Campinas atualmente Preexistência 1- Cemitério Santana 2- Estádio Antônio Accioly 3- Escola técnica de comércio de Campinas 4- Campinas futebol clube 5- Colégio anglo de Campinas 6- Escola Sesi de Campinas 7- Parque Campininha das Flores 8- Terminal rodoviário de Campinas 9- Residencial Campinas del Fiori 10- Cais de Campinas
0 100
200
Aos poucos o vazio entre o setor Central e Campinas foi desaparecendo. O bairro dos funcionários, antiga parte da Vila Operária, se formou entre Campinas e o setor Aeroporto. Este último se formara no final da década de 1940 depois da mudança do aeroporto para a região atual. Ainda, “esses pequenos bairros se referiam a Campinas como se fosse o bairro antigo, sendo simbolicamente incorporados a ele [...] a área de influência do bairro se fortaleceu e se solidificou”, várias outras pequenas vilas e bairros foram surgindo no entorno de Campinas ao longo dos anos, mais tarde foram incorporadas à região (GODINHO, 2018, p.57).
A relação de dependência e pertencimento entre esses bairros e Campinas também contribuiu para compartilharem os mesmos elementos identitários do bairro. Muitas vezes o nome Campinas é aplicado em vários estabelecimento e instituições destes bairros como o Cais e a Rodoviária de Campinas e marcos externos também associados ao setor como o estádio Antônio Accioly, Igreja São José e Cemitério Santana.
Mapa situação atual de Campinas e configurações de bairros adjacentes
200
Vl. Santa Helena
Vl. Irany Vl. Santana
St. São José
4
Vl. Isaura Cj. Padre Pelágio
9 7
Bro. dos Aeroviárioas
Bro. Rodoviários
Grj. Santos Dumont
Centro
Mapa Goiânia
St. Centro Oeste
córrego Cascavel
8
Campinas
Jd. Xavier
Vl. Abajá 5
Av. 2 4
2
3 Vl. Santa Terezza
34
1 St. dos Funcionários
Av. A nhan guer a
6
Vl. Aurora
Fonte: autora, 2019.
de o utub ro
10
St. Coimbra
Campininha de Goiás
1
Cemitério Santana no setor dos Funcionários. Fonte: O Globo, 2017.
2
O Decreto nº 1.198 aprovou a “Planta Urbanística do Setor Campinas”, em 13 de outubro de 1986. Em Souza (2018) é dito que: Para a elaboração do decreto consideraram-se a falta de documentos, as dimensões e confrontações dos lotes de Campinas sem exatidão, assim como a numeração de quadras e dos lotes muitas vezes repetida. Também se levaram em conta incoerências entre documentos de cartórios e documentos da prefeitura, nos quais os lotes não possuíam as mesmas medidas. Para facilitar ao município essa identificação de lotes e quadras, visando lançar impostos corretamente e viabilizar transações imobiliárias, a numeração de quadras e lotes passou por reorganização. Considerou-se ainda a necessidade em delimitar o Setor Campinas, englobando esses pequenos setores que surgiram em seu entorno e partes de quadras limítrofes com outros setores.
Utilizando as análises de Panerai (2006), podemos observar um crescimento contínuo linear entre o setor Central e a região de Campinas, conforme pode-se observar no mapa do entorno de Campinas. O Lago das Rosas foi identificado como uma barreira pois impedia uma ligação direta no sentido oeste da cidade que mais tarde foi preenchido pelo setor Aeroporto. Além disso, a região atua como um polo de crescimento que segundo o autor “Qualquer que seja sua causa ou origem, o polo de crescimento está marcado no tecido como um lugar singular, um local de concentração que indica a acumulação histórica, o valor comercial, a carga simbólica.”
Estádio Antônio Accioly localizado no setor Centro Oeste. Fonte: O Globo, 2018.
10
Cais de Campinas no setor dos Funcionários. Fonte: Google Maps 2013.
8
Terminal rodoviário de Campinas no bairro dos Aeroviários. Fonte: Google Maps 2019.
35
Campininha de Goiás
Importantes eixos viários A Avenida Anhanguera ainda permanece como a principal via de acesso que liga o setor Central e Campinas, pois atravessa grande parte do perímetro urbano da capital. O tráfego na região é estruturado atualmente através das vias arteriais que possuem a maior parte das linhas de ônibus e apresentam os maiores fluxos de pedestres e veículos como as importantes Avenida Sergipe (antiga Estrada do Boi), Avenida 24 de Outubro, importante eixo de comércio popular e Avenida Castelo Branco com um forte comércio atacadista, todas paralelas à Anhanguera (principal eixo estru-
turante da região). Ao analisar o mapa pioneiro pode-se identificar estes eixos na primeira malha urbana da antiga Campininha. Mais acima também é observado Avenida Leste-Oeste, antiga estrada de ferro. Cortando em transversal tais avenidas, ainda podemos verificar as importantes Rua Pouso Alto que faz ligação com os setores Nova Suíça, Jardim América, e Bueno, Rua José Hermano que levam o tráfego norte-sul até a Avenida Perimetral Norte, de onde se tem acesso à GO-060 e 070 e Br-153.
Mapa de estruturação viária
Paisagem edificada Leito carroçável Passeio público
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Av. A nhag uera
Av. Anhaguera. Fonte: Google maps, 2019.
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Av. 24 de outubro. Fonte: Google maps, 2019.
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Preexistência Perímetro do traçado tombado de Campinas
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Fonte: autora, 2019.
Rua José Hermano. Fonte: Google maps, 2019.
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0 100
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Campininha de Goiás
Patrimônio histórico e cultural A região de Campinas possui um importante conjunto patrimonial e cultural, principalmente em seu núcleo pioneiro que possui o traçado viário como patrimônio cultural11 em nível federal e arredores devido ao caráter histórico-político. Apresenta assim, alguns edifícios tombados e alguns ainda conservados em sua arquitetura original. Pode-se se observar edifícios de caráter religioso, culturais e institucionais e majoritariamente art déco. Atuam como pontos de referência e de interesse turístico, pois contam um pouco de toda a trajetória do bairro, até mesmo de quando era um município. “A proposta de tombamento do traçado viário dos núcleos de Campinas e Goiânia, acompanha a arquitetura art déco, o que interpreto como mais uma tendência velada, talvez até então não consciente, de submersão de Campinas em Goiânia” (SILVA, 2003).
Contudo, muitas das edificações sofrem com a negligência do poder público. Falta mais pontos de informações sobre tais bens, e até eventos que possam ser ofertados aos moradores e interessados, visto o potencial de conexão cultural de muitos edifícios que se localizam bem próximos entre si.
Bens tombados - Núcleo Campinas Igreja do antigo seminário dos padres redentoristas (Igreja São José)
Estadual
Sede do Fórum e da Prefeitura de Campinas, atual Agência de Atendimento Campinas e Junta Militar
Estadual
Antigo Convento dos Padres Redentoristas, atual "Centro Cultural Gustav Ritter"
Estadual
Palace Hotel, atual biblioteca Cora Coralina
Federal
Cemitério Nossa Senhora Santana
Municipal
Traçado Viário e Núcleo Pioneiro de Campinas
Federal
Fonte: Seplam, 2012.
37
11. Portaria n.° 507, de 18 de novembro de 2003, e Processo n.°1500 T/2002, Decreto-Lei n° 25/1937.
Campininha de Goiás
Mapa de bens históricos e culturais LEGENDA Bens tombados Bens não tombados Preexistência 1- Cemitério Santana 2- Subprefeitura Campinas 3- Biblioteca Cora Coralina (antigo Palace Hotel) 4- Centro Cultural Gustav Ritter (antigo convento) 5- Capela São José 6- Mercado de Campinas 7- Praça Joaquim Lúcio
10
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4
córrego Cascavel
8
8- Matriz de Campinas 9- Colégio Santa Clara 10- Antigo cemitério, atual praça João Rita Dias
9
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1
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Fonte: Seplam, 2012.
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Campininha de Goiás
1 6
Fonte: Curta mais, 2015.
2
Fonte: Mercado de Campinas, 2019.
7
Fonte: InfoPatrimônio, 2019.
3 Fonte: Dia online, 2018.
8
Fonte: InfoPatrimônio, 2019.
4
Fonte: RMTC, 2018.
9
Fonte: Goiás mais, 2019.
5
Fonte: Curta mais, 2017.
Fonte: Curta mais, 2017.
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Campininha de Goiás
LEGENDA Perímetro do traçado tombado de Campinas Preexistência Equipamentos de saúde (hospitais, clínicas, cais) Equipamentos de educação (privados e públicos; nível fundamental e médio) CMEIs Educação superior 1- SEDUCE 2- Praça do esporte 3- Camelódromo de Campinas 4- Secretaria de segurança pública do Estado 5- 2º Batalhão Bombeiro Militar 6- Shopping Cerrado 7- Cepal Vila Abajá 8- Batalhão Rural da polícia militar de Goiás
Edifícios importantes em Campinas Por seu histórico de centralidade, a região de Campinas possui importantes equipamentos urbanos como hospitais, escolas, CMEIs, secretarias e outros. Por ser dotado de um número expressivo de transporte público, os equipamentos são muito frequentados, apresentando muitas vezes uma estrutura incompatível com a demanda. Apesar da presença da Secretaria de Segurança Pública, a insegurança é frequentemente citada pelos moradores e usuários da região como uma problemática, sendo que a região apresenta um elevado índice de furtos e assaltos.
7
8
6 5 4 2
3
1
0 100 Fonte: autora, 2019.
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Campininha de Goiás
Comércio em Campinas Ao explorar o entorno imediato da preexistência é percebido que o local está inserido em uma região muito interessante culturalmente, por seu valor histórico já discutido anteriormente. Além da presença de edifícios de cunho cultural, pode-se observar duas distintas regiões marcadas pelo limite da av. 24 de outubro. Ao norte um cenário mais residencial, marcado por alguns pontos de maior incidência de atividades comerciais e de serviço. Já na parte ao sul, é quase que completamente marcado pelo uso de estabelecimentos comerciais e de serviços. Campinas se tornou um grande polo de comércio popular, segundo dados da Seplam de 2002, a região contava com 4.789 estabelecimentos, sendo 3.336 de comércio (69,6%) e 875 de serviços (18,27%). Campinas tem ruas destinadas ao comércio de todo tipo de produtos: aviamentos, jóias, artigos para festas, máquinas, couros, material de pesca, casamento e muitos outros (OLIVEIRA, 2016, p.4).
Grande movimentação em Campinas. Fonte: O popular, 2011.
Grande comércio atacadista e varejista. Fonte: O popular, 2011.
+ Evacuação demográfica Devido ao histórico de seu desenvolvimento acelerado e desordenado, problemáticas foram se estabelecendo na região de Campinas. Alguns dados do IBGE identificam que o bairro passa por um processo de evacuação de moradores, visto que o número diminui bastante, o que reforça cada vez mais seu caráter comercial. Em 2002, de acordo com dados da Secretaria de Planejamento do Município de Goiânia, viviam no bairro 13.147 habitantes. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Censo 2010 a população de Campinas diminuiu para 10 918 pessoas. Assim, a maioria dos comerciantes da região não residem no setor, sendo que muitos moradores que “restaram” são campineiros mais antigos e se recusam a deixar o local. Assim, é percebido duas áreas bastante distintas, na parte acima da Av. 24 de outubro se percebe uma região mais calma, com muitas residências, há alguns pontos de atividades econômicas n entorno da quadra do Centro Cultural Gustav Ritter e da Matriz. Já na abaixo da avenida é quase unanime a ocupação de comércio e serviços, sendo uma região muito movimentada e com trânsito intenso. 41
-
Campininha de Goiás
LEGENDA Perímetro do traçado tombado de Campinas
Mapa de análise do entorno
Preexistência Hospital Santa Lucia Equipamentos de educação CMEI Instituições religiosas Ponto de ônibus Residências Atividade comercial Sem uso Edifícios diversos
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1- Ginásio de Campinas 2- Centro cultural Gustav Ritter 3- Igreja Matriz 4- Biblioteca Cora Coralina 5- Cartório Antônio do Prado 6- Praça Coronel Joaquim Lúcio 7- Junta de serviço militar
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Fonte: autora, 2019.
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Campininha de Goiás
Ginásio
Preexistência ponto de ônibus
Avenida Sergipe Fonte: Google maps, 2019.
Entorno Imediato
Ginásio
Preexistência
A preexistência se localiza em frente ao terreno que abriga o atual Ginásio de esportes de Campinas, construído em uma área doada pelos Padres Redentoristas, foi inaugurado em 1986. O edifício está bem degradado, atualmente inutilizado abrigando muitos moradores de ruas e sua praça é frequentemente usada como ponto de uso de droga. Ao observar a vegetação na região, nota-se a escassez de árvores para sombreamento e áreas permeáveis. Se existem poucas na parte mais residencial, na área de intenso comércio é quase que inexistente. Três pontos concentram uma vegetação um pouco mais intensa: a praça Joaquim Lúcio, a praça da Matriz e a praça do ginásio de esportes.
Rua Senador Morais Filho Fonte: Google maps, 2019.
Preexistência
Ainda, muitos fatores prejudicam a caminhabilidade do local, seja por irregularidades e dimensões das calçadas, intensa insolação e falta de sinalização eficiente para os pedestres. Contudo, a região possui muitos pontos de ônibus, se tornando mais acessível neste aspecto. Ainda, foi percebido uma potencialidade de conexão entre os edifícios históricos, e culturais, visto sua aproximação e importânFonte: Google maps, 2019. cia.
43
Avenida Sergipe
Campininha de Goiás
2.3 - A casa através do tempo
O
objeto de intervenção se localiza na esquina entre a avenida Sergipe e a rua Senador Morais Filho, no bairro de Campinas. Construído em 1929, hoje se encontra sob domínio privado. Silva (2010, p,79) expõe a origem da casinha, relatando que a vinda dos padres e freiras germânicos foi um ponto de apoio para a vinda de outras famílias da Alemanha. Assim, em 1920 chega o alemão Carlos (Karl) Steger. Nascido no sul da Alemanha, aos 14 anos Karl Bartolomeo Steger decide vir para o Brasil, com destino a Campinas. Foi recebido pelos padres redentoristas, morando no convento de São José e trabalhando como sapateiro. Logo se tornou referência na fabricação de calçados devido a sua excelente qualidade. Não possuía grandes recursos financeiros, mas sempre mantinha sua grande disposição para o trabalho, assim, além de sapateiro desempenhava outras atividades, como a de serviços na
44
construção civil. Em 1925 se casou com Bárbara da Silva Moraes, neta de Joaquim Lúcio Tavares Júnior. Em 1929 trouxe de São Paulo um Ford28, primeiro automóvel adquirido por um morador da Campininha. No mesmo ano conseguiu construir sua residência (atual objeto de intervenção) e montou um estabelecimento de secos e molhados, sempre foi lembrado com muito carinho pelos campineiros. Contudo, faleceu em 1933 um ano após a precoce morte de sua esposa. Sua residência ainda resiste ao tempo, 90 anos depois, o edifício se encontra em um estado precário de conservação e razoável preservação. Mas, ainda, consiste em um significativo símbolo da região, conhecida pelos campineiros e sempre lembrada como “a casinha” de Campinas. Em visitas de campo e conversas com moradores da região, a casa sempre é lembrada e mencionada. Todos afirmam a sua importância para a memória da antiga Campininha, e em especial os moradores mais antigos, que presam por sua permanência enquanto expressão concreta dos “velhos tempos”.
Campininha de Goiás
O edifício é definido como uma arquitetura tradicional e não possui recuos frontal e lateral (na Av. Sergipe). A casa possui estrutura tradicional independente de madeira, composta por esteios, baldrames, frechais e estrutura do telhado. Originalmente seu piso era de tábuas corridas, mas atualmente é de revestimento cerâmico. A vedação foi feita em quase todo o edifício por adobe e a cobertura composta por telhas do tipo capa e bica. As aberturas são de madeira aroeira. O anexo construído posteriormente é constituído de alvenaria tradicional, telhado com estrutura de madeira, telha canal e esquadrias metálicas. Recentemente foi construído um muro em parte da casa para maior segurança do proprietário que ocupa a residência ao lado. Apesar das patologias identificadas e apresentadas, o edifício consegue exprimir uma leitura clara de seu estilo, possuindo os elementos arquitetônicos originais. O mais comprometido, contudo, é o telhado, em grave estado de deterioração e as portas e janelas das fachadas, com a presença de cupins e danos à madeira. Ainda, as fachadas apresentam alguns descolamentos de reboco e alguns pés de esteio estão comprometidos.
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Atualmente ela está parcialmente ocupada, em entrevista realizada com o atual proprietário do imóvel, foi dito que devido ao grande índice de moradores de rua e usuários de droga, a casa estava sendo frequentemente invadida. Assim, foi proposto que um senhor ocupasse temporariamente o imóvel a fim de evitar tais acontecimentos. A preexistência foi ocupada com o uso de dormitório e sala de televisão e um anexo construído abriga cozinha e banheiro. 1
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Fachada leste
Fachada oeste
PÉ DE ESTEIO COMPROMETIDO INFESTAÇÃO BIOLÓGICA - CUPIM
Fachada nordeste
PÉ DE ESTEIO COMPROMETIDO
Fachada sudoeste Fonte: Autora, 2019.
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Campininha de Goiás
Levantamento cadastral Endereço: R Morais Filho-Sen c/ R Sergipe, Qd. 8 Lt. 9, S Campinas ANEXO CONSTRUÍDO RECENTEMENTE
REFERÊNCIA LOTE
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Fonte: Autora, 2019.
4
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Campininha de Goiás LEVANTAMENTO CADASTRAL LEGENDA Reboco Telha Piso cerâmico 30X30 Soltura do reboco (adobe à vista) Reboco assentado recentemente (argamassa) Umidade descendente Trincas Paredes em adobe
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PLANTA COBERTURA
Paredes em alvenaria
TELHA CAPA E BICA
PARTES DA CUMEEIRA COMPROMETIDA
i: 30%
AUSÊNCIA DE ELETRODUTOS (FIOS A MOSTRA)
CORTE BB 0
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ESTRUTURA COMPROMETIDA DO TELHADO, REVISAR TODO O MADEIRAMENTO E SUBSTITUIR COMPONENTES DANIFICADOS
TELHA CAPA E BICA i: 30%
TELHA CAPA E BICA i: 30%
ANEXO CONSTRUÍDO RECENTEMENTE
CORTE AA 0
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Fonte: Autora, 2019.
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Campininha das Flores 04/06/2019
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04/06/2019 WhatsApp Image 2019-05-18 at 12.06.50 (4).jpeg https://mail.google.com/mail/u/0/?tab=im#inbox/QgrcJHsNpWslwkJqLLQHFDwvHcQmJmhFpKG?projector=1&messagePartId=0.28
Parte da fachada oeste com soltura
1 de reboco. Fonte: autora, 2019.
Fachada oeste com reboco recente 1/1
2 mas parte das esquadrias e pinturas
Presença de cupim na porta e adobe
3 exposto. Fonte: autora, 2019.
https://mail.google.com/mail/u/0/?tab=im#inbox/QgrcJHsNpWslwkJqLLQHFDwvHcQmJmhFpKG?projector=1&messagePartId=0.28
04/06/2019 WhatsApp Image 2019-05-18 at 12.06.49 (10).jpeg https://mail.google.com/mail/u/0/?tab=im#inbox/QgrcJHsNpWslwkJqLLQHFDwvHcQmJmhFpKG?projector=1&messagePartId=0.28 04/06/2019
desgastadas. Fonte: autora, 2019.
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Parte da fachada oeste com soltur de reboco e comprometimento do pé de esteio. Fonte: autora, 2019.
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Vedação no entorno da esquadria um pouco danificada. Fonte: autora, 2019.
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Desgaste na pintura das fachadas externas. Autora, 2019.
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Campininha de Goiás
O restauro O restauro crítico segundo Brandi e Bonelli nega que os monumentos históricos possam ser enquadrados em categorias previamente determinadas ou esquemas e regras pré-concebidas. Cada obra é única em sua conformação e no tempo e exige, por isso, soluções únicas. Tais soluções devem advir de uma atenta análise do monumento, uma indagação baseada na crítica e na história com vistas a determinar sua qualidade estética. Portanto, o restauro não pode ser admitido como atividade empírica, oriundo de exigências práticas, mas como ato cultural fundamentado na história e na estética. Além de reparar todos os pontos de patologias apresentados no levantamento cadastral como a substituição dos pés de esteio comprometidos, averiguação de todas as portas e janelas, tratamento da umidade descendente e revisão de toda a estrutura do telhado e telhas, será proposto a proteção das partes com descolamento do reboco para a proteção da veação em adobe e executar pintura nas paredes. Ainda, todo o revestimento cerâmico do piso será trocado para assoalho de madeira, tal qual era originalmente. O anexo construído recentemente será demolido pois será substiuído devido a nova proposta projetual a ser realizada.
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CAPÍTULO III
Bem vindo(a) à casa campineira
Bem vindo(a) à Casa Campineira
3.1 - Repertórios Museu do pão: cul t ura e lugar
Na intervenção feita no antigo moinho da cidade de Ilópolis em 2007, e posteriormente denominado Museu do Pão, segundo o livro publicado pela Associação dos Amigos dos Moinhos, seguiu rigidamente “as regras do restauro científico, trazendo de volta seus elementos e funções originais e reincorporando-os à vida cotidiana de Ilópolis” (FERRAZ, 2008). Em 2007, a obra do conjunto foi concluída e no ano seguinte, o museu foi inaugurado. Ilópolis se localiza no Vale do Taquari, região serrana da porção central do estado do Rio Grande do Sul, com cerca de 4.098 habitantes segundo censo de 2010. E apresenta uma predominância do povoamento de imigrantes italianos, vindos a partir das últimas décadas do século XIX. Possui forte influência do idioma italiano, as festas do pão, da uva e do vinho e a herança da arquitetura da imigração italiana, que está presente na cidade, sendo os moinhos muito numerosos na região antigamente.
Marcelo Ferraz e Francisco Fanucci. Fonte: Anual Design.
A
o abordar a preservação do patrimônio histórico, algumas questões como o processo de restauração do bem estudado bem como as intevenções em anexo a serem realizadas necessitam de um exercício crítico e sensível a fim de salvaguardar o objeto projetual. Assim, a síntese no processo dialético entre a cultura arquitetônica e cultura do contexto é recorrente e decisiva no trabalho do escritório Brasil Arquitetura, sendo por várias vezes referência no campo de intervenção em preexistências. Como é exposto por Ferraz (2011), “buscamos uma arquitetura criada a partir de profunda conexão com a cultura de cada lugar e seus protagonistas.” 52
Ilópolis Porto alegre
Mapa localização cidade de Ilópolis. Wikipédia. Adaptação autora, 2019.
Bem vindo(a) à Casa Campineira
preexistência
novos anexos
Ilustração Museu do Pão. Fonte: Ferraz, 2008.
Implantação na esquina, forte relação com vias de acesso
O moinho Colognese data do começo de 1930 e foi construído inteiramente em madeira (araucária angustifolia) pelo carpinteiro Garibaldi Bertuol por encomenda de uma família de imigrantes italianos. Após a morte do moleiro no final da década de 1990, o moinho foi abandonado. Em 2004 fundou-se a associação dos amigos dos moinhos do Alto Taquari e foram comprados o moinho e o seu terreno, iniciando o projeto do moinho de Ilópolis com patrocínio da Nestlé Brasil. Antes da retauração
Moinho. Fonte: Pachalski, 2012.
Depois da retauração
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Moinho. Fonte: Pachalski, 2012.
Bem vindo(a) à Casa Campineira
Fonte: Archdaily.
Função de transparência e permeabilidade – visual e física
Fonte: Archdaily.
A estrutura também atua como objeto espoxitivo Estrutura interna do moinho. Fonte: Pachalski, 2012.
Painéis móveis de araucária protegem a fachada do museu e, com o tempo, vão ostentar o mesmo tom dos fechamentos do moinho.
Fonte: Archdaily.
Fonte: Archdaily.
A estratégia do pilar em “árvore” pode ser associada ao modo como se fazia estruturas de madeira na arquitetura da imigração italiana.
O partido do projeto nasceu junto com a museografia. Assim, tudo contribuiu como objeto expositivo: desde a estrutura dos edifícios, os fechamentos, o controle de luz, os passadiços, os materiais empregados, os suportes para exposição, as peças expostas (ferramentas da culinária, documentos, fotografias coletadas na região). A partir desta iniciativa, o projeto ganhou nova força visando a valorização da riqueza cultural e histórica da região. Em relação ao sistema viário existente, uma das vias que margeia o terreno configura o principal acesso para a cidade, conectando– se à sua região central. A partir da visão oferecida pela esquina, a nova edificação ganha destaque, pois o moinho se configura como fundo, aspecto reforçado em função da transparência dos planos verticais da nova edificação, que abriga o programa expositivo.
Localização do museu em Ilópolis. Fonte: Pachalski, 2012.
54
Outro aspecto importante, foi a intenção dos autores em contemplar a cultura local e utilizar aspectos dessa cultura como critério de projeto e de elaboração da forma arquitetônica. Assim, características como simplicidade, austeridade, ornamentação singela, tendência à simetria, emprego de materiais locais (madeira, tijolos e pedra) e predomínio da mão-de-obra familiar e artesanal que são características predominam a arquitetura de imigração italiana.
Bem vindo(a) à Casa Campineira
Fonte: Archdaily.
Planta. Fonte: Pachalski, 2012.
Usos contemporâneos: novos blocos em concreto e vidro dialogam com o velho moinho de madeira.
2 1
Fonte: Archdaily.
4
3
1: volume expositivo 2: oficina de panificação 3: bodega 4: moinho O gradil das passarelas teve seu desenho inspirado em elementos diagonais, semelhante aos peitoris encontrados na região. A construção possui três pavimentos e um porão, que abriga o maquinário. As novas edificações foram implantadas ortogonalmente entre si e paralelas em relação às faces do antigo moinho e do terreno. Elas formam uma figura semelhante a um “L”, que se “encaixa” no moinho. Ainda, possui uma circulação em malha. O organismo como um todo foi pensado de maneira biarticulada, aspecto que é reforçado pela passarela que conecta as novas edificações. E a permeabilidade e acessibilidade do conjunto foram reforçadas pela separação física dos volumes – inclusive entre as duas novas edificações que se tocam apenas através das passarelas em madeira.
O Programa expositivo do Museu do pão está distribuído em uma pequena sala de exposição e em um auditório com capacidade para 35 pessoas. Acomoda o programa expositivo no moinho e ainda uma oficina de panificação. Sobre a materialidade a Araucária caracteriza fundamentalmente o projeto, tanto a preexistência quanto os anexos. Foi utilizada no Moinho e seus mecanismos, nas novas varandas, nos painéis corrediços “brise soleil”, nos capitéis dos pilares. Ainda, marcam presença como símbolo de modernidade, o concreto aparente e os planos de vidro. Corte. Fonte: Pachalski, 2012.
4 pavimentos
Hierarquia
1 pavimento
55
Bem vindo(a) à Casa Campineira
Museu de Congonhas: tradição e modernidade
Formas contemporâneas complementam a paisagem de maneira harmônica
Entrada do museu. Fonte: Archidaily, 2015.
O
museu de Congonhas se localiza junto ao Santuário Bom Jesus de Matozinhos na cidade de Congonhas em Minas Gerais. Foi a proposta vencedora do Concurso promovido pela Unesco em junho de 2005, projetado pelo Gustavo Penna Arquiteto e Associados. O concurso foi realizado pelo Ministério da Cultura em conjunto da Prefeitura de Congonhas e tinha o intuito de criar um centro que reunisse arte, história, tecnologia e fé. Penna (2010) relata que o conjunto arquitetônico do Santuário de Bom Jesus de Matosinhos, convidou a buscar a solução para três questões fundamentais: a implantação neutra, sem competição volumétrica com o conjunto principal; os espaços externos e percursos internos claros, amplos e reverentes e o sentido de contemporaneidade, afirmando no seu tempo uma atitude atemporal de respeito, equilíbrio e harmonia. 56
Gustavo Penna sempre manteve um bom diálogo entre o lugar que seus projetos estão inseridos. No caso do museu, foi uma das principais preocupações e forte diretriz projetual. Por se tratar de um bem tombado, a região também possui uma paisagem muito específica, rodeada de edificações do século 18. Assim, optou por respeitar a topografia em declive no terreno de seu projeto, remetendo ao simbolismo do entorno e ao princípio barroco significado “busca dos céus”. Assim, o projeto como um todo foi pensado para dialogar com o lugar onde foi construído, “como o encontro entre passado e presente, que garante a preservação da história para o futuro” (ARCHDAILY, 2015).
Congonhas Belo horizonte
Mapa localização cidade de Ilópolis. Wikipédia. Adaptação autora, 2019.
Bem vindo(a) à Casa Campineira
Seminário
basílida do bom Jesus de Matosinho
museu de congonhas Romaria
salão comunitário
hotel
Vista do entorno. Fonte: AU17.pini.
O museu ocupa 3.500 m² de área construída e é dividido em três andares: no nível principal estão a recepção e a sala de exposição permanente, uma loja e um café. No nível inferior área de exposição permanente e temporária, biblioteca e área de documentação, setor administrativo e um anfiteatro a céu aberto. No nível subsolo está o Centro de Referência do Barroco e ateliê para o desenvolvimento de trabalhos com pedra.
Vista da igreja para a cidade. Fonte: AU17.pini.
2 pavimentos
subsolo
Corte com setorização. Fonte: Archidaily, 2015.
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Bem vindo(a) à Casa Campineira
A edificação respeita a paisagem, trazendo unidade ao entorno
Museu. Fonte: Archidaily, 2015.
Algumas características no projeto foram pensadas para se harmonizar com sua paisagem secular de entorno. Entre elas, a implantação sem competição volumétrica com o conjunto arquitetônico principal; ritmo e proporção das aberturas; alinhamentos e altimetrias em escala similar ao do resto do conjunto; base da edificação em pedra, remetendo às técnicas construtivas das antigas edificações; parte superior mais leve e fluida e paredes caiadas e pintadas com tinta mineral. Penna afirma que pela proximidade de obras tão importantes como os 12 Profetas, a obra-prima de Aleijadinho e as seis capelas que descrevem a Paixão de Cristo, o projeto teve de ser atemporal, embora sendo ainda, testemunha de seu tempo (ARCHDAILY, 2015).
Museu. Fonte: Archidaily, 2015.
Vista da basílica e escadaria com estátuas Fonte: Wikipédia.
O projeto acompanha o declive natural do terreno
Museu. Fonte: Archidaily, 2015.
Museu. Fonte: Archidaily, 2015.
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Bem vindo(a) à Casa Campineira
Em seu interior, o museu apresenta espaços fluidos e nada fragmentados. “É o próprio barroco traduzido pela contemporaneidade, onde não existe ruptura mas a curva, o caminho para o céu” (PENNA apud ARCHDAILY, 2015). Ainda, as soluções arquitetônicas buscaram oferecer o maior número de recursos de instalações e luminotécnica, para flexibilizar e enriquecer as possibilidades de criação dos cenários museográficos. O acervo inaugurou no país o conceito de Museu de Sítio, ou seja, feito para potencializar a compreensão do lugar onde está inserido, mostrando a dimensão da cidade como obra de arte, lugar do sagrado, representação do patrimônio e como demonstração de fé. Essa demonstração e íntima relação com a religiosidade está presente tanto nos espaços de exposição quanto na biblioteca que referencia temas de fé e devoção, na obra de Aleijadinho e na história e cultura de Congonhas. A tecnologia também se faz presente no museu como a iluminação cênica dos 12 Profetas e das capelas que reproduzem a Paixão de Cristo e o primeiro aplicativo do país de visita virtual a uma cidade, um áudio-guia que o visitante pode baixar no celular e ter toda informação necessária enquanto visita o Santuário. Ainda, possui espaço para a realização de shows acústicos no anfiteatro do Museu (com capacidade para 100 pessoas), como forma de resgate da música colonial mineira e o lançamento de três publicações (uma sobre o acervo do Museu e duas sobre Congonhas).
Exposição. Fonte: Archidaily, 2015.
Exposição. Fonte: Archidaily, 2015.
Anfiteatro. Fonte: Archidaily, 2015.
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Bem vindo(a) à Casa Campineira
3.2 - Os lugares de encontro e memória A casa campineira:
memorial à antiga Campininha
U
“Nós campineiros, não estamos precisando de shopping ou coisa parecida, nós estamos precisando é de preservar nossa memória, restaurando o patrimônio destruído; de resgatar identidade cultural; de edificar e recompor o centro histórico de Campinas; de revitalizar e construir praças, recantos e logradouros públicos; de arborizar nossas principais avenidas e ruas de arte, centros culturais, etc)...” (H.G., JORNAL O POPULAR apud SILVA, 2003).
m memorial constitui geralmente em um espaço público destinado a enaltecer ou homenagear figuras de impacto na sociedade, a recordar marcos físicos e simbólicos, eventos, histórias ou lugares importantes. São lugares da memória, “espaços que brotam para bloquear a ação do esquecimento, fixando um conceito, imortalizando o que pereceu, corporificando o imaterial” (AXT, 2012, p.64). A ideia de elaborar um memorial que acomodasse objetos, documentos e fotografias que fizessem parte da história de Campinas, veio da necessidade de registrar fisicamente a história do povoado de Campininha das Flores. Em Silva (2003, p.8) é relatado que desde 2001 há uma proposta da extinta AMOCAMPI (Associação de Moradores do bairro de Campinas) de criar um espaço que reunisse objetos, documentos, imagens relacionadas à história de Campinas. Já que, foi informa60
do que muitos campineiros detêm de objetos como: fotografias, documentos antigos, vestígios de antigas construções como tijolos da antiga cadeia, documentos históricos do tempo em que a Casa de Câmara funcionava, placas com nomes antigos de ruas e estariam dispostos a doar para o acervo. O memorial serviria então para referências de memória em que se constituiu Campinas, e que muitos julgam estar se perdendo pelo atual contexto do bairro. Trazer o programa do memorial para a casa da esquina da av. Sergipe foi pensada pela sua atual condição de desvalorização, mas ao mesmo tempo de grande estima pelos moradores de Campinas. Assim, além de valorizar a história e memória campineira, o próprio edifício se tornará uma importante peça expositiva, sendo um remanescente da arquitetura tradicional popular de seus habitantes. Além do fato de Campinas ter tido muitos projetos e propostas de revitalização. Consistiam muitas vezes em intervenções externas do poder público contudo, nenhum contemplou a edificação em questão, que preza pela preservação simplicidade da arquitetura tradicional. A preexistência passaria a atuar então como uma âncora da memória.
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Centro de cultura popular goiana ode às tradições caipiras Os Saberes
O
programa cultural foi voltado para complementar o memorial e reestruturar a área do atual ginásio de Campinas que se encontra em estado precário de abandono, assim como sua praça, ponto de constantes reclamações dos moradores. Por ser uma área em frente à preexistência que abrigará o memorial, tem potencial de ser um conector também com a Praça da Matriz, além de estar adjacente à escola de artes Gustav Ritter. O centro cultural será destinado à valorização das tradições populares goianas, fundamentando-se principalmente na cultura caipira, presente na região desde o início da antiga província. A cultura se revela como “sinal evidente da consciência de um povo sobre si próprio, sobre sua identidade e seu destino (GONÇALVES, 2003, p.13).
proposto o Plano Setorial para as Culturas Populares, iniciativa que integra o desenvolvimento do primeiro Plano Nacional de Cultura, proposto pelo Ministério da Cultura e sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que buscava valorizar as culturas populares brasileiras, tendo-as como elemento fundamental para a diversidade cultural do país. Assim, o centro cultural de Campinas tem como objetivo dar suporte às atividades que envolve as tradições goianas, um local de apoio e ponto de encontro que valoriza as raízes. O centro cultural terá seu programa de necessidades apoiado no livros dos registros do Iphan, a fim de acolher os diversos tipos de patrimônio cultural imaterial. O espaço contará com área para produção de artesanato, galerias expositivas, espaços para roda de viola, restaurante de comida goiana, quitandaria a fim de valorizar a prática das tradicionais quitandas, vendas para impulsionar o artesanato e ainda englobará um espaço para a feirinha que ocorre às terças em volta do atual ginásio.O variado programa tem intuito de proporcionar um funcionamento dinâmico em vários períodos do dia e da noite a fim de trazer maior sociabilidade para a região que sofre pela hegemonia do horário comercial.
A cultura popular é expressa através das comunidades que possuem saberes e fazeres intrínsecos em seus modos de viver. A cultura goiana se faz presente no artesanato, nas festas, danças, rituais religiosos, culinária, música, prosas, literatura e outros. Em 2010 foi
As Celebrações
As Formas de Expressão
Os Lugares 61
Fonte: Iphan.
“[...]do povo, do brincante, do devoto, do artesão, da cozinheira e da brincadeira. São tantas e incontáveis, desconhecidas da sociedade e até pouco tempo invisíveis para o Estado” (CÓDULA, 2010 apud ROCHA, 2016, p.4).
FOLIA CAIPIRA PIRA PORA VIOLEIROS MEMÓRIA PORTA, PORTEIRA E PORTÃO CAMPININHA CASINHA CULTURA POPULAR BOLO DE MILHO E CAFÉ ARTESANATO RAÍZES GALINHADA
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3.3. Programa setorização
espaço Coworking adm. CAT (centro de atendimento turista) Núcleo folclórico ateliê cozinha copa sanitários apoio
recepção midiateca exposição campininha sanitários adm. espaço AMOCAMPI Pesquisa área técnica
MEMORIAL
espaço interno apoio
QUITANDARIA
PRODUÇÃO
PREEXISTÊNCIA Área do terreno: 452,99m² Área do programa: 379,99m²
Arte em cerâmica. Fonte: Helena Vasconcelos.
Quitandas. Fonte: Ibom, 2018.
62
Artesanatos. Fonte: Hora extra, 2019.
Catira. Fonte: Mais goiás, 2019.
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cozinha dml apoio vestiários depósito salão bar/cachaçaria área aberta sanitários
galeria rotativa exposição goianidades galeria 2 galeria de esculturas espaço roda de viola
EXPOSIÇÕES
RESTAURANTE TÍPICO
quiosques
VENDAS
ANEXO Área do terreno: 8.420,00m² Área do programa: 1.565,20m²
Violeiros. Fonte: Prefeitura de Anápolis, 2015.
Escritores. Fonte: Curta mais, 2017.
Folia de reis. Fonte: Folha Z.
Comidas típicas. Fonte: Chão goiano, 2018.
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área aberta pátio romaria espaço feira cultural
PRAÇA
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PROPOSTA RESTAURO
5
4
7 1
2 8
3
6
6 9
9
Demolir toda a parte do anexo construído recentemente
Revisão nas esquadrias de madeira e pés de esteio, aplicar tratamento contra umidade 6
1
Demolir parede interna de alvenaria, a fim de voltar com a espacialidade original 2
7
Remoção do aterro e aplicação de assoalho em madeira (paginação contemporânea)
Executar pintura a base de água nas paredes internas 3
8
Revisão na estrutura do telhado e subistituiçao de telhas danificadas
Descascar reboco externo e refazê-lo a base de cal 4
5
9
Exexutar pintura (ocre) á base de água 65
Instalação de vidro fixo nas portas frontais.
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3.4 Concepções projetuais entre o velho e o novo
O
projeto tem como principal intuito respeitar a preexistência em sua escala, simbologia e significação. Assim, os anexos se comportarão como suportes e complemento á paisagem, de forma a emoldurar o cenário, privilegiando a preexistência. Com base em De Gracia (1992), foram analisadas algumas diretrizes para serem aplicadas em relação ao edifício antigo e aos novos anexos:
OS NÍVEIS DE INTERVENÇÃO 2º Nível - A Modificação do Locus: intervenções que não chegam a ter repercussão a nível urbano, mas são capazes de interferir e marcar presença em seu entorno imediato. OS PADRÕES DE ATUAÇÃO 3º Padrão – Continuidade da imagem: São priorizadas as questões plásticas da arquitetura existente e sua relação visual com a nova intervenção. 4º Padrão – Recriação Tipológica: São buscadas citações e referências em situações presentes no contexto de intervenção. AS ATITUDES FRENTE AO CONTEXTO Arquitetura contextual: é estabelecido uma relação de simbiose com o contexto, sem a utilização de recursos de mímeses ou análogos diretas, estabelecendo uma integração ambiental.
Respeitar a topografia e elevar o edifício ao nível da preexistência;
Respeitar o gabarito da preexistência e de seu entorno, adotando formas mais horizontais;
Propor formas que dialogam com as aberturas existentes em ritmo e proporção; Paredes mais grossas em concreto ciclópico remetem à uma arquitetura mais "solidificada", aludindo às formas de arquitetura tradicional (paredes espessas de adobe); Partir de formas mais prismáticas e simples, com volumes que formem uma composi-
Propor a ideia de blocos soltos ligados a um elemento de conexão (conceito de permeabilidade);
Respeitar os fluxos de passagem já fortemente estabelecidos entre a praça da Igreja Matriz e o lote da preexistência;
Respeitar a arborização existentes;
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Bem vindo(a) à Casa Campineira preexistência
áreas para projeto
ZOOM PARA PREEXISTÊNCIA
O UX FL E
R ST DE PE DE
IGREJA
Linha de percurso expositico que liga a ppreexistência ao anexo.
1
RA
U LD O M IGREJA
Implantação do anexo ao fundo da preexistência, criando um pátio intermediário.
2 Os anexos formam diagonais que emolduram a preexistência.
Cobertura como elemento de conexão entre a preexistência e o anexo.
3 Cobertura como elemento de ligação e passagem entre os dois blocos.
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SETORIZAÇÃO
2 PAVIMENTOS ATELIÊ COZINHA GALERIAS
2 PAVIMENTOS MEMORIAL
COWORKING
RESTAURANTE
68
Projeto BLOCO A O pavimento superior abriga um nucleo de pesquisa para pesquisa.
1 2 21
BLOCO B A parte superior comporta a cozinha ateliê, área para galeria rotativa e coworking para produção de artesanatos.
BLOCO A
3
BL OC
4
5
BLOCO C
OB
6 7
Abriga o restaurante típico goian, o espaço para roda de viola e o deck.
18 8
Os blocos são interligaodos pelo pátio romaria que poderá abrigar diversos eventos culturais, o pergolado protege o espaço em uma composição delicada que interliga a escadaria de esculturas, finalizando em frente ao memorial campineiro.
17
14
Legenda
13
12
15
1- Núcleo de pesquisa 2- Curadoria3- Cozinha ateliê 4- Quitandaria 5- sanitários 6- Quiosques 7- Galeria rotativa 8- Coworking 9 - Cozinha 10- Apoio 11- Bar 12- Refeição 13- Sanitários 14- Roda de viola 15- Deck 16- Praça 17- Pátio romaria 18- Escadaria esculturas
11
O BL CO
16
C
10 9
69
Cortes
Corte BB Bloco do subtérreo se alinha ao nível da preexistencia. Acima a pracçã se alinha ao nível superior
Corte CC A materialidade é formada principalmente pelos muros estruturais de concreto ciclópico, que demarcam bem a paisagem e emolduram o espaço de percurso dos dois blocos à preexistência. O fechamento em alvenaria convecional e cobertura metálica de telha trapezoidal sanduíche. . Já a estrutura além das paredes estruturais é complementada por estrutura metálica, tanto nos blocos quanto nas estruturas do pergolado. A cobertura de telha trapezoidal sanduíche ajuda no confotor térmico.
No bloco da preexistência todo o anexo foi elevado ao mesmo nível, garantindo umpercurso cultural amparado pela cobertura que interliga o novo ao antigo.
70
Corte AA
BLOCO A O percurso do memorial passa por dois momentos: midiateca e ação educativa na preexistencia e exposição no anexo. Ainda há a parte que abriga a reserva técnica e a sala AMOCAMPI, destinada a associação de moradores de Campinas a fim de retomar as d cusões acerca do bairro.
5
6
1 2
4
BLO C
3
BLOCO A
OB
8
BLOCO B
7
9
Logo em frente à casa campineira, há outro bloco de exposições que faz parte do percurso cultural.
Aina há área de estacionamento e o espaço para a feira de Campinas, ao centro um átrio se abre dialogando com o espaço acima.
10
Legenda 11
1- Ação educativa 2- Midiateca 3- Recepção 4- Exposição Campininha 5- Reserva técnica 6- Quintal 7- Recepção/Centro de atendimento ao turista 8- Exposição goianidades 9 - Núcleo de apoio folclórico 10- Feira 11- Estacionamento
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Espécies
Choupala
Ipê amarelo
Cróton
Monguba
Jabuticabeira
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Areca Bambu
Gueiroba
Cipó São João
Paisagismo Na escadaria de esculturas as floreiras abrigam alguns pés de jabuticabeiras Na entrada pela avenida sergipe foi colocado ipÊs Amarelos que remetem À paisagem do cerrado
Na escadaria de esculturas as floreiras abrigam alguns pés de jabuticabeiras
Na parte do muro foi colocado as Choupalas para fazer um fundo verde com composição de floreiras mais baixas com a espécie arbustiva Cróton.
Algumas fiadas de Gueirobas marcam alguns caminhos.
Um fundo verde composto por areca-bambu cerca o espaço roda de viola, ainda a trepadeira Cipó de São Jõao foi aididonado ao pergolado.
No atrio so subtérreo foi adidionado as Mongabas, árvore marcante na paisagem goiana.
Um espaço de muro de pedra emolduura o olhar de quem sobe a escadaria principal, o espelho d’água compõe apaisagem tambem Foi respeitado a vegetação natural que cria um bosque , com predomínio de mangueiras que compo~e o mirante do restaurante.
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Corte de pele A ligação entre a estrutura metálica do pergolado é engastada ao muro ciclópico estrutural. Ainda ,o edifício é marcado por portas pivotanes de eixo central. Esc.1/50
Muro concreto ciclópico
Telha trapezoidal sanduíche
Perfil metalon (estrutura pergolado 20x20cm Laje
Conector Eixo para porta pivotante Folha vidro temperado eixo central Perfil em alumínio anodizado preto
Piso cimento queimado Pivô fixação inferior Laje nervurada
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Bem vindo(a) à Casa Campineira
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Bem vindo(a) à Casa Campineira
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