Diretrizes para uma intervenção na Praça do Povo, Niterói - RJ

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Universidade Federal Fluminense Escola de Arquitetura e Urbanismo Graduação em Arquitetura e Urbanismo

Isabella Valentim Velasco Xavier Orientador Werther Holzer

DIRETRIZES PARA UMA INTERVENÇÃO NA PRAÇA DO POVO, NITERÓI- RJ

NITERÓI Dezembro, 2019


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"A vida ĂŠ mais importante do que a arquitetura" Oscar Niemeyer


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O presente trabalho de conclusão de curso busca pensar um futuro alternativo para a Praça do Povo em Niterói projetada por Oscar Niemeyer sobre o Aterro da Praia Grande. Buscou-se uma compreensão do lugar e suas camadas de memória a partir de análises históricas da Praia Grande realizadas por meio de uma revisão bibliográfica além de análises do lugar atualmente. O trabalho traz reflexões quanto as possíveis intervenções sobre áreas de aterro e os ditos vazios urbanos contemporâneos. A justaposição destas análises e reflexões direciona e ancora as diretrizes para uma intervenção paisagística neste trecho da orla central de Niterói.

The present work seeks to think of an alternative future for Praça do Povo Square in Niterói designed by Oscar Niemeyer on the Praia Grande Landfill. It sought an understanding of the place and its memory layers from historical analyzes of Praia Grande through a literature review and site analysis of the present moment. The work reflects on the possible interventions on landfill areas and on the so-called contemporary urban voids. The juxtaposition of these analyzes and reflections directs and anchors the guidelines for a landscape intervention in this stretch of Niterói's central waterfront.


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1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................. p.01 2 JUSTIFICATIVA .............................................................................................................................................. p.02 3 HISTÓRICO DE OCUPAÇÃO DA PRAIA GRANDE .......................................................................................... p.05 4 ANÁLISE DO LUGAR....................................................................................................................................... p.29 5 REFERÊNCIAS .............................................................................................................................................. p.44 6 CONSTRUÇÃO DE UMA PROPOSTA ............................................................................................................. p.54 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................................. p.67 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................................................. p.68






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O presente trabalho de conclusão de curso trata de um trecho simbólico da orla do Centro da cidade de Niterói, a região Norte do Aterro da Praia Grande. O interesse pela área do aterro surgiu a partir de uma inquietação como citadina e estudante de arquitetura e urbanismo para com esta paisagem tão destoante do restante do Centro. Este enorme pedaço de terra criado, que avança sobre a Baía de Guanabara, que mesmo passadas décadas desde sua criação, continua ainda um vazio urbano entre a Baía e o Centro. Com este trabalho, objetivo propor diretrizes para uma intervenção paisagística na Praça do Povo de Niterói, parte do Complexo Cultural do Caminho Niemeyer compreendida entre a Vila de Pescadores da Praia Grande e o terreno onde se planeja construir a Catedral Metropolitana. Para a elaboração dessa proposta foi de suma importância uma investigação histórica crítica que permitiu a compreensão dos conceitos, planos, projetos e processos que modelaram a paisagem do Aterro Norte da Praia Grande e sua atual condição de vazio urbano.


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A área de estudo está sobre um solo antropogênico, criado por uma obra de aterramento marítimo. O fato de ser solo criado torna evidente a impossibilidade ou ao menos a inconveniência de reconstruir ou reestabelecer qualquer condição passada. Antes de tudo, ali era água. Não se poderia portanto, tratar de uma proposta de recuperação e sim de sugestão de novas sínteses sobre esta paisagem. Desta forma, as diretrizes delineadas nesse trabalho buscam agregar valores, tendo em vista a diversificação das relações sociais e ambientais no meio urbano central de Niterói com o objetivo de multiplicar as possibilidades de apropriação deste lugar. Pela natureza transdisciplinar dos projetos de parques, a proposta de implantação de um parque urbano se apresenta como forma de possibilitar esta diversidade desejada. De certa forma, é também um devaneio de um jardim à beira-mar que pudesse ser capaz de transformar a esplanada modernista em lugar arborescente.


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A área de estudo compreende a esplanada de aproximadamente 85.000m², também conhecida como Praça do Povo, ao redor das edificações do Teatro Popular, Fundação Oscar Niemeyer, Memorial Roberto Silveira e a futura Nova Catedral São João Batista, pertencente ao conjunto do Caminho Niemeyer. Essa grande área com edifícios espaçados voltados aos usos cultural, religioso e de lazer é uma área pública, um espaço livre do município onde já existe o uso de lazer seja ele público, privado, espontâneo ou organizado. Hoje o Aterrado Norte pode ser sentido como um vazio urbano, e de acordo com Borde (2006), poderia ser classificado como um: vazio esvaziado, isto é, o vazio que não preexiste, que é produzido, é engendrado também pela racionalidade moderna em nome da qual foram concebidas intervenções urbanas que rasgam as cidades, a partir de meados do século XIX, destituindo-as das suas referências e preparando-as para os novos tempos modernos que viriam (BORDE, 2006, p.8)


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Fig.1 Área de estudo Fonte: Ortofoto Prefeitura Municipal de Niterói

Apesar do nome de praça, na Praça do Povo faltam elementos básicos que garantem o bem-estar e conforto de seus usuários. Não há proteção contra o sol, nem contra a chuva, não há mobiliário de nenhum tipo e suas distâncias são excessivamente longas. Entretanto, mesmo com tantas condições desfavoráveis à permanência, o que se verifica in loco é um


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número significativo de pessoas que optam por passar seu tempo livre ali. Essas apropriações do espaço deixam evidente a demanda por espaços de lazer acessíveis nessa região. Por sua localização central que facilita a acessibilidade, além da proximidade com os terminais de transporte público, a paisagem na qual está inserida, sua história, suas dimensões físicas e seus usos já consolidados, o uso público é a vocação desta área. A praça tem potencial de oferecer opções de lazer não organizado para uma quantidade de pessoas muito mais expressiva do que hoje oferece. A construção e manutenção de espaços públicos nas áreas centrais tem a vantagem da acessibilidade, uma vez que estes espaços têm um potencial de concentração de pessoas, atraindo visitantes de toda uma região. O Centro de Niterói é parte da rota diária de milhares de pessoas, seu vizinho o Terminal Rodoviário Presidente João Goulart é considerado o maior terminal da América Latina com um fluxo médio de 535 mil acessos por dia. A partir dele se estabelecem conexões tanto entre a Região Metropolitana quanto com a Região dos Lagos. Apesar do Centro não ser predominantemente residencial, seu entorno tem bairros onde o uso residencial é bastante forte como São Lourenço, com 9.685 moradores, Ponta d’Areia


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com 6.937, Ingá com 17.220 e São Domingos com 5.727 (PREFEITURA DE NITERÓI, 2015). Uma população que estando relativamente próxima ao Caminho Niemeyer poderia usufruí-lo com mais frequência.

[...] pretendemos contar um pouco da história desse ente composto de terra e pedra (MARTINS, 2006, p.12) Para compreender a conformação atual do território central de Niterói e em específico a área do Aterrado da Praia Grande, é necessário rever os processos de transformação da paisagem para assim entender seu histórico de ocupação urbana, planos, projetos e utopias. Estudar e ter como base a história vinculada à paisagem, povoada de artefatos, permite enxergar além e compreender o lugar não apenas pelas características atuais visíveis. A paisagem está repleta de artefatos. Ela própria é uma composição, e justaposição, de artefatos, que são repositórios de história e também de memória. [...] Aqui a história cumpre o seu papel, a de nos


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informar no momento atual das principais referências que o passado nos legou. (HOLZER, 2016, p.69) Neste trabalho, além de um processo de cidadania, a investigação histórica toma um papel importante como processo metodológico de descoberta e apreensão das diversas camadas da paisagem, inclusive aquelas ocultas. Para esta revisão bibliográfica, foram selecionados trabalhos que abordassem diferentes momentos históricos do Centro de Niterói, desde o início da sua urbanização, no século XIX, passando pelos projetos modernos de remodelação do século XX, até a Niterói do século XXI, marcada pelos traços do arquiteto Oscar Niemeyer e pela mais recente Operação Urbana Consorciada. Como recorte a ser estudado foi determinado a história da orla da Praia Grande. Dentre estes estudos se destacam trabalhos da historiadora Campos (1998), “Riscando o solo: o primeiro plano de edificação para a Vila Real da Praia Grande”, a dissertação em Geografia de Martins (2006), “Nova Niterói: A Orla Sepultada, da utopia à agonia”, dedicada especificamente ao processo de aterramento da Praia Grande e a dissertação em Arquitetura e Urbanismo de Pereira (2006) “Espaço e construção da imagem


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urbana: um estudo de caso -o Caminho Niemeyer em Niterói.” que se dedica ao processo de implantação do complexo cultural do Caminho Niemeyer e a construção da imagem contemporânea de Niterói. A Enseada da Praia Grande delimitava-se ao norte pela Ponta da Armação e em seu outro extremo, pela Ponta do Gragoatá e abrigava uma série de pequenas praias banhadas pela Baía de Guanabara. Até o início da ocupação urbana seu recôncavo era coberto de vegetação de restinga (AMADOR, 1997, p. 236, 239, 240 apud MARTINS, 2006, p.27; 40), também descrito como um “areal”, era recortado por caminhos tortuosos que ligavam o litoral ao interior.

Fundação da Vila Real da Praia Grande Aqui, o solo, assim como os homens, deveria ser riscado, moldado, construído. (CAMPOS, 1998, p.156) Apesar do marco inicial de Niterói ser a fundação da Aldeia de São Lourenço dos Índios no século XVI, foi apenas no século XIX que se deu início a urbanização da área que hoje é


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conhecida como o Centro da cidade. No contexto da visita do Imperador e dos melhoramentos e transformações que o Rio de Janeiro vinha recebendo, Dom João VI, com o desejo de impulsionar o desenvolvimento do lado de cá da Baía de Guanabara, instituiu em 1819 a Vila Real da Praia Grande na Enseada de mesmo nome. O plano de edificação da Vila foi desenhado por Arnaud Julien Pallière e implementado junto com um detalhado código de posturas. (CAMPOS, 1998, p.88) Na ilustração do Plano (Fig. 2), em branco, estão representados os caminhos pela restinga que ligavam a Enseada da Praia Grande à de São Lourenço. Da Rua da Praia, uma das poucas existentes antes do plano de urbanização de 1819, partia o traçado de ruas paralelas e transversais, formando um “tabuleiro de xadrez”. Entretanto, à praia não era atribuído o mesmo valor que atualmente se atribui às orlas. A orla, com seu singelo gradeado, assumia um papel secundário em relação aos outros espaços públicos da Vila como o Passeio Público e o Rossio. Este Plano foi em grande parte implementado e até hoje a malha urbana do Centro mantêm essa estrutura original. Durante o século XIX, a Vila prosperou e não muitos anos depois em 1835 recebeu o título de Cidade Imperial de Nictheroy.


10 Fig.2 Plano Pallière, 1819 Fonte: CAMPOS, 1999

No início do século seguinte, com a volta do título de capital do estado após a Revolta da Armada, Niterói volta a ser objeto de planos urbanos. Logo na primeira década, é lançado o projeto de um conjunto de importantes intervenções para o município que compreendia a construção do novo centro cívico da cidade - a Praça da República, o aterramento do mangue


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da Enseada de São Lourenço e a construção Porto de Niterói, inaugurados em 1927. Este período até 1930 ficou conhecido como Renascença Fluminense, em que aflorava um movimento intelectual regional centrado na capital Niterói. Em um momento em que a nação brasileira se via construindo uma imagem nacional, da mesma forma, o movimento fluminense pretendia redefinir a identidade cultural do estado no cenário nacional por meio do nacionalismo e do discurso modernista (MONTEIRO; REZNIK, 2008, p.11-13). Essa concentração de ideias e vontade de fazer emergir na capital fluminense a paisagem da modernidade tem grande afinidade com os projetos de transformações urbanas que a cidade vivenciaria ainda na primeira metade do século XX. A cidade, a urbes funcionou como um centro congregador, onde se projetavam as políticas públicas e as iniciativas intelectuais de reflexão sobre o estado. A cidade era o retrato da modernização: com o crescimento do comércio e dos setores industriais, com a urbanização, com as inovações tecnológicas. E lá, também, concentrava-se a nata da intelectualidade fluminense; jovens oriundos do interior do estado, que vinham estudar na capital; jornalistas; políticos; e profissionais liberais. Era da cidade, de


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Niterói, que se respiravam os ares de uma modernização para o Estado do Rio. (MONTEIRO; REZNIK, 2008, p.65)

Fig.3 Vista aérea de Niterói Fonte: Holland, S.H., 1930 em Acervo Digital Biblioteca Nacional.


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Contemporâneo a este período e em consonância com as diretrizes do movimento modernista, o arquiteto Attilio Corrêa Lima apresenta sua tese de doutoramento em 1930 ao Instituto de Urbanismo de Paris, intitulada Avant Projet d'Aménagement e d’Extension de la

Ville de Niterói (Fig. 4), um grande projeto urbano de reestruturação de todo o território de Niterói. Apesar de não ter sido o primeiro, o projeto de Attilio é um dos embriões modernos das iniciativas urbanísticas que mais tarde vieram a se concretizar na cidade, dentre elas o aterramento da Praia Grande. Praticamente, em sua tese, previa edificar na área aterrada o novo centro comercial da cidade, a 600 metros do original. Seu ponto de convergência seria uma praça de grandes dimensões (240m x 300m) delimitada por edifícios de 100 metros de altura. Oito vias desembocariam na praça, cuja circulação funcionaria com uma rotatória para otimizar os fluxos dos bairros da zona norte e da zona sul. A principal das avenidas teria 80 metros de largura e em suas bordas palmeiras imperiais dariam a atmosfera monumental ao logradouro. Foi prevista uma outra praça monumental, junto à orla central, para implantar o novo centro cívico da capital, com os prédios do Palácio do Governo e das secretarias do Estado, um grande monumento à fundação da cidade e um desembarcadouro para eventos especiais.


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Todo esse conjunto estaria conectado à praça Martim Afonso por uma larga avenida ladeada de edifícios públicos.

Fig. 4 Recorte do Avant Projet d'Aménagement e d’Extension de la Ville de Niterói Fonte: Attilio Corrêa Lima, 1932


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Neste trecho é possível identificar os princípios modernistas de organização do espaço urbano como setorização, sistema viário como estruturador do território, amplas e monumentais avenidas e a distribuição dos espaços públicos. Para as áreas centrais, o arquiteto apresentou uma “política urbana emoldurada por um caráter triunfalista, com toques de monumentalidade.” (MARTINS, 2006, p.52). O projeto guarda semelhanças com o contemporâneo Plano Agache para o Rio de Janeiro. Sob a mentalidade autoritária-desenvolvimentista, em pleno Estado Novo, o então governador Amaral Peixoto por meio do Decreto-Lei federal n° 2.441, de 23 de julho de 1940 lança o Plano de Remodelação e Urbanização da cidade de Niterói. Neste plano, o aterramento da Praia Grande surgia pela primeira vez como proposta concreta. O Plano também previa o desmonte de morros de áreas centrais para viabilização do aterro além da abertura da Avenida Amaral Peixoto. O lançamento do empreendimento sobre a área aterrada não foi bem sucedido e na segunda metade da década seguinte, em 1957, é lançada uma versão adaptada do original, chamado Loteamento Fluminense.


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Dentre outras questões, a enorme dimensão da área aterrada em comparação ao Centro de Niterói e ao restante da cidade veio a ser uma das principais causas de insucesso das propostas para a Praia Grande. Pelos cálculos de Azevedo, à época, se o empreendimento fosse todo edificado, representaria um aumento populacional e de fluxos que a própria cidade não era nem mesmo capaz de gerar. (AZEVEDO, 2006 apud MARTINS, 2006, p.58 ) O projeto do loteamento Jardim Fluminense não apresentava praticamente nenhuma compatibilidade com a estrutura urbana então oferecida pelo Centro da cidade, nem quanto ao traçado nem quanto ao sistema de circulação. Compreendendo 57 quadras constituídas por 1.140 lotes de dimensões variadas, o loteamento, desse conjunto, destacava áreas para implantação de 7 praças e construção da nova sede da Prefeitura, Teatro Municipal, Centro Cultural, escola e Mercado de Peixe. (MARTINS, 2006, p.58) Os anos consecutivos ao lançamento do projeto foram de especulações, impasses e disputas de interesses públicos e privados sobre a área ainda inexistente. Por décadas, o plano da Nova Niterói que nasceria sobre as águas da Baía permaneceu na prancheta.


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O Aterro da Praia Grande veio a ser enfim executado entre 1971 e 1974 sob a supervisão do último governador do Estado do Rio, Raimundo Padilha. O Ato complementar baixado pelo presidente Emílio Garrastazu Médici, transferia para o Poder Público a missão de finalmente concluir o aterro e realizar a urbanização do que, segundo o então governador, seria “uma verdadeira sala de visitas para Niterói” (MARTINS, 2006, p. 94-95) Com relação a este projeto, Martins descreve que: Pretendendo a reurbanização da área central da cidade, o Poder Público previa uma ocupação bastante megalômana, nos moldes do Aterro do Flamengo, idealizada pelas autoridades locais e obedecendo a uma visão urbanística bem típica da época. Essa parte nova da cidade compreenderia uma área estritamente destinada ao lazer, na qual seriam construídos teatro grego, concha acústica, fontes sonoras e luminosas, playgrounds, restaurantes turísticos, aquários, praças de esporte, planetário, passarelas e auditórios ao ar livre. O aterro contaria, também, com moderna Estação Hidrorrodoviária, além de um bosque com 15 mil espécies vegetais. (MARTINS, 2006, p.59) O completo aterramento da Praia Grande, como o previsto em projeto, jamais foi concluído.


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Da Praia restaram apenas dois trechos com as características originais, um entre a porção Sul e a porção Norte, ao lado da estação de Barcas e o outro ao Norte, onde se formou a Vila de Pescadores da Praia Grande. A relação entre o Centro de Niterói e a Baía de Guanabara havia sido completamente modificada. Quem passasse pela orla marítima de Niterói, na segunda metade dos anos 70, não conseguiria mais admirar a paisagem da Baía de Guanabara ou a passagem de lanchas e aerobarcos. E nem mesmo a visão panorâmica do litoral carioca. (MARTINS, 2006, p.126) Foram muitos os planos traçados para o Aterro da Praia Grande, mas a concretização dos mesmos quando o foram, aconteceu de forma parcial. É de se notar que o Aterro foi idealizado e construído em dois momentos autoritários da história do país, sendo o lançamento do seu primeiro projeto oficial durante o Estado Novo e sua execução no período da ditadura militar. Nesses momentos, desejava-se abrir espaço para permitir emergir a modernidade na vida urbana na cidade. Havia expectativa de que na área aterrada de fato fosse nascer uma nova Niterói, desenvolvida, intelectual, participativa nos cenários estadual


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e nacional e atrativa turisticamente. Nos planos, isso se materializa nas dimensões ambiciosas da área a ser criada, muitas vezes incompatíveis com o restante da cidade, e também nos traçados viários, nos edifícios, na vontade de implantação de um novo centro cívico e na criação de parques e jardins. No aterro, estão impressos todos estes ideais.

Fig. 5 Planos de aterramento da enseada de Niterói Fonte: PMN, SUMA (sem data)


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Com a perda do governo estadual em 1975, Niterói deixou de ser prioridade para os investimentos públicos e o Centro sentiu os reflexos dessa retração por seu esvaziamento e estagnação. Nas décadas que sucederam a conclusão das obras do Aterro da Praia Grande, a maior parte do programa imaginado para a área não foi edificado. O aterrado Norte foi por anos um enorme terreno baldio na frente do Centro. A partir do anos 1980 a área aterrada começa a ser ocupada, ainda que lentamente, a partir da Avenida Rio Branco, antiga Rua da Praia e pela instalação na orla de um conjunto esportivo chamado “Vila Olímpica”, onde hoje é a Praça do Povo. No âmbito do programa CURA (Comunidade Urbana de Renovação Acelerada), firmado por um convênio entre o Banco Nacional da Habitação e a Prefeitura de Niterói, o escritório do urbanista Jaime Lerner é convidado a elaborar um projeto para a cidade. O projeto de Lerner adotava como prioridade a estruturação do sistema viário bem como a requalificação da área central. Deste projeto, foram frutos os terminais Norte e Sul, localizados respectivamente no Aterrado Norte e no Aterrado Sul, onde hoje é a Praça Juscelino Kubitschek. Como soluções para o caótico trânsito da área Central, além dos terminais junto à Estação das Barcas, foram adotados ônibus biarticulados para circulação municipal, definidas áreas de


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estacionamento e também uma hierarquia viária com a separação de pistas para o transporte individual. A ideia era tornar o Centro uma área exclusivamente de pedestres, e com este objetivo, o Aterrado era a área livre disponível para ser ocupada pelos estacionamentos e os terminais. (PREFEITURA NITERÓI, 2006, p.28). Essas intervenções, ao relegar ao aterro os terminais e estacionamentos de apoio, reforçaram a ideia de vazio urbano.

Fig. 6 Terminais de desembarque Norte e Sul – Plano Cura

Fonte: PREFEITURA NITERÓI, 2006, p.28


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O ano de 1989, início do primeiro mandato de Jorge Roberto Silveira na prefeitura, representa um marco na administração municipal. As gestões que sucederam tiveram uma continuidade com relação ao projeto de cidade, de imagem e projeções nos cenários nacional e internacional. O Plano Diretor de 1992 veio como um dos principais instrumentos de planejamento destas transformações urbanas desejadas. No Plano Diretor, a área do Aterro Norte é delimitada como Área de Especial Interesse Urbanístico (AEIU), sendo indicados ali a construção do Terminal Norte; construção de cais de apoio às atividades pesqueiras; instalação da estação de tratamento de esgotos de ToqueToque; consolidação da Vila Olímpica; duplicação da Av. Visconde do Rio Branco; estabelecimento de projeto urbanístico que compatibilize os usos residencial, comercial e de serviços; incentivo à construção de hotéis e de outros meios de hospedagem para apoio às atividades da Área Central de Negócios. Na década de 1990, tem inicio o projeto de remodelação da Avenida Visconde de Rio Branco e o ajuste territorial fundiário da malha urbana projetada sobre a Baía, de acordo com as determinações do Plano Urbanístico do Aterro Norte (PUAN), de 1992. Nesta proposta, as


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ruas do centro “velho” foram prolongadas sobre o aterro, gerando os novos quarteirões, uma superquadra e o terreno para o novo terminal rodoviário. O Terminal João Goulart é construído em substituição aos antigos terminais Norte e Sul, e a Avenida Rio Branco é duplicada, sendo ambas as obras inauguradas em 1994. Objetivando a remodelação contemporânea do Centro, a Prefeitura estabeleceu parcerias com as empresas de ônibus e os proprietários dos terrenos. Deste mesmo objetivo derivou também o desmonte da Vila Olímpica na orla do aterrado, que vinha funcionando precariamente e a busca de novos investimentos para o entorno, como o Shopping Bay Market. (PEREIRA, 2006, p.52) O final década de 1990 foi marcado pela inauguração do Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC), junto com uma série de medidas de incentivo a cultura na cidade. A ideia era de que Niterói estaria recebendo um “banho de civilização”. Utilizando de estratégias de city

marketing, os gestores municipais buscaram promover o turismo na cidade, a fim de destacála da capital, promovendo a autoestima dos cidadãos, da cidade e seu passado. (LUZ, 2009, p.284). O museu foi intencionalmente pensado para se tornar o símbolo da renovação urbana que se pretendia desencadear na cidade.


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O então prefeito Jorge Roberto Silveira havia convidado o arquiteto Oscar Niemeyer para projetar um museu sobre o mirante da Boa Viagem. A obra foi executada com recursos da Prefeitura e assim que foi inaugurada se tornou símbolo da cidade. Poucos meses após a sua inauguração a revista PROJETO publicou uma matéria de destaque com o título “Oscar Niemeyer na Baía de Guanabara: formas puras em contraste com a exuberância da natureza tropical”: Foram seis anos de trabalhosa execução, mas o Museu de Arte Contemporânea de Niterói, RJ, conseguiu superar as condições adversas que, na América Latina, tendem a manter no papel os projetos de construção de espaços dedicados à cultura. Idealizado por um dos paladinos da geração que forjou a modernidade latinoamericana, o MAC, com o uso livre e aberto do espaço urbano, adquire o valor emblemático de purificador das tensões ambientais existentes e aponta o papel regenerador e moralizador que a arte exerce na vida social. (PROJETO DESIGN, 1996, p.34)


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O Caminho Niemeyer No mesmo ano de 1997, no clima da repercussão da inauguração do Museu, é concebido o empreendimento do Caminho Niemeyer, um percurso de 3,5km entre a nova Estação das Barcas e o MAC pontuado com obras do arquiteto formando um eixo cultural à beira mar. Com a lei nº 1604 de 30 de outubro de 1997, é oficialmente criado o Caminho Niemeyer, determinando que toda a faixa da orla marítima compreendida pelo projeto fosse transformada em Área de Especial Interesse Urbanístico, Paisagístico e Turístico ficando proibida a instalação de quaisquer edifícios que não fossem os de interesse do Município ou da Universidade Federal Fluminense. Pereira (2006, p.99) defende a classificação do Caminho Niemeyer como um grande projeto de desenvolvimento urbano (GPDU), por suas características comuns a projetos deste tipo em outras cidades do mundo. Características essas como a vontade de se construir uma imagem de Niterói através da criação de ícones arquitetônicos, neste caso através do nome de Oscar Niemeyer, tendo o turismo como meio de aquecimento econômico, aliado ao discurso da necessidade de revitalização da área central. Desta forma, conclui-se


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que o Caminho não é apenas um projeto turístico-cultural mas principalmente um projeto estratégico de modelagem da imagem da cidade com objetivos de atrair investimentos para a mesma. A revitalização do Centro passou a ser uma constante em nossas análises. É no centro das cidades que está a marca de sua personalidade. No caso de Niterói, desde a Vila Real da Praia Grande até hoje tudo se vincula ao Centro. (TREIGER, 2008 p. 59) No ano de 1999, foi lançada a pedra fundamental que oficializou o início das obras do Caminho. Entretanto, questões fundiárias e conflitos de interesses entre os agentes envolvidos acabaram amesquinhando seu conceito inicial. Ao invés de se alongar pela orla, o Caminho acabou em grande parte concentrado no aterrado Norte. No total o projeto foi apresentado 3 vezes, com mudanças em relação à localização dos edifícios, ao número e programa dos mesmos, às estratégias de financiamento e aos agentes envolvidos. À terceira proposta, posteriormente foram adicionadas as obras da Praça Juscelino Kubitschek sobre o estacionamento subterrâneo, o Espaço BR do Cinema Brasileiro, hoje Reserva Cultural e o Terminal Hidroviário de Charitas, que vieram a ser executados, e também


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projetos que não foram levados adiante como o Oceanário, o Centro de Convenções na Concha Acústica e o Centro de Memória Judaica. Quadro 1 Propostas e Programas para o Caminho Niemeyer Fonte: Isabella Valentim, 2019

A criação do Caminho Niemeyer foi uma inflexão na história do Aterro da Praia Grande. A partir de então, parece ter sido atribuída ao aterro a vocação de receber as obras de


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Niemeyer. Suas grandes áreas livres foram oportunas para os planos grandiosos da Prefeitura. Há 30 anos aquele aterro espera o Caminho Niemeyer. De imediato, o Centro já vai sentir a diferença. Talvez esta seja a obra mais importante do mundo no plano urbanístico e cultural. Se o MAC já atraiu mais de dois milhões de visitantes, imagina o que o Caminho vai representar em turismo para a cidade. (INTERESSE, 2001, p.4 apud PEREIRA, 2006,p.71) O Caminho Niemeyer como produto de marketing urbano privilegiou o interesse turístico e econômico e desconsiderou aspectos sócio-ambientais essenciais para o planejamento de espaços públicos. Em abril de 2001 o Grupo Executivo do Caminho Niemeyer (GECN), formado por empreiteiros niteroienses, assume a gestão das obras e negociações do conjunto. (PEREIRA, 2006, p.67). Por fim, sua construção foi financiada com um misto de investimentos públicos municipais e investimentos privados. A primeira obra a ser inaugurada foi a Praça Juscelino Kubitschek com seu estacionamento subterrâneo em 2003, realizados pela Prefeitura, seguida do Memorial


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Roberto Silveira, realizado com recursos da UNIVERSO, e oficialmente inaugurado em 22 de novembro 2003 em comemoração do aniversário da cidade. O Terminal das Barcas de Charitas, obra da Barcas S/A em 2004, O Teatro Popular, obra da Prefeitura, em 2007, e a sede da Fundação Oscar Niemeyer, obra do Ministério do Turismo junto com a Barcas S/A, em 2010 e o Centro Petrobras de Cinema, em 2012, último inaugurado até o momento. Com a conclusão das obras, Niterói passou a fazer parte de um roteiro de turismo apoiado pela Embratur, por ter um dos conjuntos mais expressivos de obras de Oscar Niemeyer, atrás apenas de Brasília, estando à frente inclusive de Belo Horizonte. De acordo com site oficial do Caminho, o Grupo Executivo continua até hoje gerindo a Praça do Povo e a Praça JK, realizando a curadoria de eventos, exposições, palestras e qualquer atividade que ocorra nestes espaços públicos. Em 2016, o MAC junto com o conjunto do Parque Ibirapuera e a Passarela do Samba foram tombados como patrimônio histórico brasileiro por sua importância para a arquitetura nacional. No total, 27 obras públicas de Oscar Niemeyer são consideradas bens tombados pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Ao completar seu


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centenário, o arquiteto havia levado por escrito ao Ministério da Cultura uma lista das obras de sua autoria que gostaria que viessem a ser tombadas, entre elas estaria o Caminho Niemeyer, que apesar disto não foi considerado pelo Iphan. Recentemente, em 2013, o Centro de Niterói volta ser objeto de grandes projetos urbanos com a Lei Municipal nº 3061 que instituiu a Operação Urbana Consorciada da Área Central (OUC). Sob um diagnóstico de degradação do Centro, de deterioração de seus imóveis e espaços públicos e inspirada em intervenções como a de Puerto Madero em Buenos Aires e do Porto de Barcelona, a Operação intende promover melhorias do ambiente urbano visando a “reestruturação urbana da região central de Niterói, por meio da ampliação, articulação e requalificação dos espaços livres de uso público” (NITERÓI, 2013). O conjunto de investimentos se daria em dois eixos: Requalificação dos espaços públicos com implantação de infraestrutura e Revitalização da Frente Marítima. O primeiro, diz respeito à requalificação de 60 km da malha urbana da área da Operação prevendo também a revitalização de 100 mil m² de praças existentes e a criação de 155 mil m² em


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novas praças. Já a Revitalização da Frente Marítima diz respeito aos 5,5 km de orla, compreendidos desde a Ponta do Gragoatá até a Ponta da Areia orientados por princípios de recuperação e valorização da paisagem com o objetivo de estabelecer uma conexão entre os os diferentes trechos da orla. (ANDREATTA, 2013) Com relação à Frente Marítima, são novamente colocadas as questões de como preencher o vazio do aterrado, como unir essas duas partes do Centro. A então Secretária Municipal de Urbanismo, Verena Andreatta ao apresentar o diagnóstico da orla do Centro, destaca a presença de grandes vazios, identifica uma imagem de degradação e afirma que o Caminho Niemeyer não está integrado nem à trama urbana nem à cidade, chegando inclusive a ser apelidado de “Escondidinho Niemeyer”. (ANDREATTA, 2013) Sendo assim, OUC então prevê um Passeio Litorâneo da Vila de Pescadores até o MAC, uma estação intermodal na Esplanada Araribóia, uma marina para 150 embarcações e a criação de uma nova vila de pescadores onde já existe a atual Vila. Com relação à área de estudo, pouco se altera, mantendo a proposta paisagística de Niemeyer.


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Observa-se que os projetos urbano-paisagísticos para a orla da Praia Grande tem características em comum. São frequentes as ideias de se criar um “novo centro”, de recuperação do prestígio perdido e de uma Niterói atrativa turisticamente. Desde as propostas do início do século XX, à orla aterrada foi frequentemente atribuída a função de “sala de visitas”, voltada para o Rio de Janeiro para quem chega a Niterói. Fig. 7 Projeto OUC Centro Fonte: Divulgação, 2013

Outro empreendimento que prometeu transformar o Aterrado Norte foi o complexo Oscar Niemeyer Monumental. Na mesma época da OUC, é lançado o empreendimento de autoria de


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Niemeyer localizado em uma das quadras do aterro adjacente à Avenida Rio Branco. Seriam 2 torres de 28 andares abrigando mais de 400 salas comerciais, escritórios corporativos e quase 300 unidades hoteleiras. A realização das torres, seria um elemento chave para a revitalização pretendida para o Centro. Assim como nos projetos antecedentes, apostou-se na verticalização, adotando uma projeção de crescimento incompatível com as demandas da cidade. O projeto suscitou polêmicas devido ao desrespeito ao gabarito da área, autorizado por conta da assinatura do arquiteto, além do impacto do empreendimento no trânsito e na paisagem. As torres assim como a maior parte dos propostas da OUC, até o momento não foram executadas. Fig. 8 Torres Monumental Oscar Niemeyer

Fonte: Divulgação, sem data


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Colagem do tempo

Isabella Valentim, 2019


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Apesar do Caminho Niemeyer se estender por toda orla niteroiense da Baía de Guanabara, seu ponto de partida, a Praça do Povo, talvez por sua unidade e atmosfera, frequentemente é referida como o “Caminho Niemeyer”. Assim como o Teatro Popular se tornou metonímia para toda a Praça: “atrás do terminal, lá no Teatro Popular.” A visitação da Praça é aberta ao público apenas de terça a domingo, das 8h às 18h e nos finais de semana de 8h às 20h ou de acordo com a agenda do espaço gerida pelo GECN. A entrada dos visitantes é controlada pela portaria, instalada junto ao pórtico de entrada, onde também se encontra o Centro de Atendimento ao Turista de Niterói, pequena estrutura inspirada na arquitetura de Niemeyer. Para quem vem a pé ou de transporte público seu acesso se dá por uma escadaria nos fundos do Terminal João Goulart ou por uma pequena via na sua lateral. Ao lado da entrada existe um estacionamento municipal pago, que em feriados pode ser gratuito.


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A praça do Povo tem características morfológicas que divergem da praça tradicional. De acordo com Macedo e Sakata, é característico da praça típica estar inserida no tecido urbano, envolvida por edificações que a delimitam e com dimensões não superiores àquelas dos quarteirões do entorno (MACEDO; SAKATA, 2003, p.15), características que não se aplicam à área de estudo. A Praça do Povo portanto, por suas vastas dimensões é mais identificável como esplanada, “planura, planície; terreno plano, largo e descoberto na frente de fortificações ou de um edifício”. (ESPLANADA, 2013) Os esquemas a seguir (Fig. 10) de uma praça típica (superior) e um parque (inferior) demonstram as diferenças entre um e outro. A praça típica está inserida do tecido urbano e envolvida por edificações, enquanto que o parque tem dimensões além das do quarteirão e seu espaço não é mais definido pelas edificações.


38 Fig. 10 Esquemas praça e parque Fonte: MACEDO; SAKATA, 2003, p.15.

Quando vi esta foto, senti como será bonita a entrada da praça, como as formas que compõem o conjunto criaram a monumentalidade procurada. E continuei a examinar a planta geral adotada neste projeto, vendo, satisfeito, ser um dos melhores conjuntos que nesse gênero projetei. (NIEMEYER, 2009, p.36)


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Nesta Praça-esplanada, os vazios são tão monumentais quanto os cheios. Borde ressalta que o vazio modernista diverge de outros tipos de vazios urbanos pela sua concepção, que é intencional, própria do projeto moderno de construir uma nova cidade. No modernismo, o espaço vazio é potencializado de forma a destacar os edifícios, sendo conceitualmente o elemento de ligação entre eles. O vazio modernista seria o lugar onde se desenvolveria a vida social do homem moderno. (BORDE, 2006, p.40). A esplanada árida em concreto é uma decisão projetual recorrente na obra de Niemeyer, longe de ser um resultado acidental, suas funções, dimensões e materialidade são parte dos projetos do arquiteto.

Fig. 11 A Praça do Mar, 1998 Fonte: Fundação Oscar Niemeyer, 1997


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Fig. 12 Mapa de Cheios e Vazios Fonte: Isabella Valentim, 2019


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Arquitetura A arquitetura é o jogo sábio, correto e magnífico dos volumes reunidos sob a luz. Nossos olhos são feitos para ver formas sob a luz; as sombras e os claros revelam as formas, as mais belas formas. Todo mundo está de acordo com isso, a criança, o selvagem e o metafísico. (CORBUSIER, 1977, p.13) A Praça do Povo concebida por Niemeyer é uma esplanada à beira mar onde está disposto um conjunto de volumes, escultóricas arquiteturas brancas de concreto que abrigam equipamentos culturais. O arquiteto-artista colocou mais uma vez em prática seu repertório formal buscando uma implantação com ares monumentais. Apesar de sua arquitetura ter um estilo bastante pessoal, de forte assinatura, Niemeyer parece ter buscado exatamente as formas puras sobre as quais Corbusier manifestava: as formas puras acariciadas pela luz. O Teatro Popular é a edificação que mais se destaca na Praça, é a perspectiva que se tem quando se passa pelo pórtico de entrada. O térreo livre e contínuo com a esplanada


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permite que se atravesse o prédio tendo como fundo a paisagem da Baía de Guanabara. É o único prédio que faz uso da cor, as cores primárias presentes nos azulejos amarelos com desenhos do arquiteto na fachada principal e na boca de cena vermelha. Sua cobertura ondulada, que remete à solução adotada para a igreja da Pampulha, abriga um teatro com a capacidade de 400 pessoas. Uma rampa sinuosa, marca de muitos projetos de Niemeyer, dá acesso à entrada do teatro e, com um jogo de alturas, o arquiteto articula palco, praça, platéia e foyer. A caixa cênica também pode ser utilizada para espetáculos ao ar livre, aproveitando toda a estrutura técnica do teatro com o recurso de uma boca de cena que se abre para a Praça, multiplicando assim, sua capacidade de público. O Memorial Roberto Silveira é a menor edificação da Praça, a cúpula de base elíptica. O prédio é semienterrado, seu acesso é ligeiramente elevado da praça e se dá por uma pequena rampa. O escopo do Memorial é de preservar a memória fluminense e de Roberto Silveira, nele funciona o acervo informatizado da cidade, de consulta aberta ao público além de um espaço para palestras. A Fundação Oscar Niemeyer é a obra mais recente e mais distante do pórtico de entrada. É composta por dois prédios: o principal, uma cúpula espiralada envolvida por um


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espelho d'água e seu anexo. Apesar de ter sido inaugurado em 2010, seu programa de atividades ainda não está em pleno funcionamento. Além de espaços de exposição e salas de aula, no prédio funcionam também instalações do departamento de urbanismo da Prefeitura. Seu acesso, assim como nos outros prédios, também se dá por uma rampa sinuosa que conduz até a cúpula onde estão os salões de exposição, ligada por uma rampa ao segundo prédio. A Catedral Católica de São João Batista que ficará no outro extremo da Praça, com uma cúpula suspensa por três arcos de cerca de 70 metros de altura, será a edificação mais alta do conjunto. Os espaços para seu funcionamento, tanto a nave quanto o anexo cultural administrativo da Arquidiocese de Niterói estarão abaixo do nível da praça, deixando o térreo com vista total para a Baía de Guanabara. Ao redor da cúpula está previsto um espelho d’água e um altar externo, para que também possam ser realizados eventos ao ar livre. Por enquanto no terreno está instalada uma capela provisória, os serviços de terraplanagem e parte das fundações já foram executados mas a obra segue parada.


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Apropriações do lugar Com relação ao projeto da Praça em si, é notável a intenção, seja no discurso quanto na materialização do projeto, de que a experiência visual do conjunto se sobreponha às experiências dos outros sentidos. Mais precisamente, a percepção visual dos edifícios (JANOT, 2008), pois esta foi e continua sendo o maior fator determinante da organização espacial proposta para o lugar. Observa-se a inexistência de um direcionamento de caminhos ou de uma hierarquia de espaços. A rara presença de jardins ou arborização é comum nas obras do arquiteto, onde em geral, os elementos vegetais são intencionalmente suprimidos. Em lugares pertencentes à regiões tropicais, esta característica,

geralmente gera condições desconfortáveis de

temperatura e luminosidade. Se por um lado a experiência do usuário é completamente livre, por outro, o caminhar pela Praça se torna extremamente cansativo. Em visitas de campo em dias de sol, pude perceber a concentração de pessoas nas áreas sombreadas, geradas pela própria edificação. Outra observação foi a da concentração de pessoas no que Gehl define como espaços de transição (GEHL, 2013, p.75). Espaços que são a interface entre as edificações e o espaço público, zonas onde há troca entre interno e o


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externo. Gehl ressalta que estes espaços são frequentemente escolhidos como zonas de permanência, pois oferecem um sentido de organização, conforto e segurança. Em um dia sol, na falta de mobiliário ou arborização, as pessoas buscaram um aparato nos espaços de transição entre as edificações e a praça (Fig. 13). Dentre os prédios do conjunto, o Teatro é aquele que oferece uma transição mais suave, um dos fatores que pode explicar o fato de ser o prédio que concentra a permanência dos visitantes. Das atividades planejadas, além daquelas previstas no programa dos edifícios, como espetáculos de teatro, aulas, palestras e mostras, o GECN também organiza feiras e shows de acesso restrito na área aberta. Para estes eventos geralmente não são utilizadas as edificações de Niemeyer, são armadas grandes estruturas temporárias na Praça. Nestas ocasiões, o uso público da praça fica limitado ou até mesmo restrito aos participantes do evento. No geral, para além das atividades programadas pela agenda oficial, as pessoas buscam a esplanada para realizar piqueniques e contemplar a vista. Existem também grupos organizados que tem como ponto de encontro a Praça. Um dos mais conhecidos é o grupo “Patinar Alegra a Alma” que encontrou na Praça o lugar ideal para praticar a patinação.


46 Fig. 13 12 de outubro, sol das 16h Fonte: Isabella Valentim, 2019


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Estas são formas pelas quais a população não apenas de Niterói mas também de outras cidades vem se apropriando do lugar, são exemplos de atividades de lazer auto organizado, gratuito e acessível. Entretanto, o contraste entre a quantidade de pessoas no vizinho Terminal e a quantidade de pessoas na Praça é um indicativo de desequilíbrio entre estes lugares do Centro.

Entorno Niemeyer, principalmente na última fase de sua carreira, é frequentemente criticado pela falta de relação de suas obras com o entorno urbano no qual estão inseridas. No caso de Niterói não foi diferente, “o Caminho Niemeyer ao invés de se constituir num elemento de agregação urbana para a cidade de Niterói acabou se tornando um fim em si mesmo” (JANOT, 2008) A caracterização de uso do solo cruzada com experiências de campo e do cotidiano permitem tecer uma análise crítica das relações que a Praça do Povo tem com seu entorno.


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Pelos usos do solo pode-se notar que mesmo que a estrutura viária do aterro tenha sido traçada a partir dos prolongamentos das ruas antigas, de acordo com o Plano Urbanístico do Aterro Norte, a Av. Rio Branco, antiga Rua da Praia continua sendo uma fronteira, mas agora sem a praia. Se tivesse sido completamente implementado, o aterro da Praia Grande teria representado o acréscimo de quase metade da área do bairro Centro. Ainda assim, a atual área do aterrado Norte tem dimensões imponentes, correspondendo ao rebatimento da área do quadrilátero Av. Rio Branco, Av. Feliciano Sodré, Rua Visconde de Sepetiba e Rua São João. Todavia, à diferença do centro velho que tem uma ocupação de comércio, serviços e de uso residencial mesclado, o “novo centro” do aterrado se configura como um grande vazio urbano. Os usos de estacionamento e terrenos baldios que dominam a maior parte da área aterrada combinados com as vias de acesso ao Terminal João Goulart de fato minam a vitalidade nas quadras entre a Av. Rio Branco e a Praça do Povo. As áreas ocupadas por grupos relacionados à pesca como a Vila de Pescadores da Praia Grande, a comunidade de marisqueiros e o Mercado São Pedro se localizam nas bordas do aterro, contidos e afastados entre si. Vale lembrar que o antigo mercado de peixe ficava


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sobre um píer na Praia Grande. Já as comunidades pesqueiras desta região são mais recentes, sua formação ocorreu após o aterramento. A relação de trabalho e subsistência com a Baía os fez construir novas relações com esse litoral redesenhado. No Centro, predomina o uso comercial e misto, enquanto que no seu entorno, existem também as áreas de uso predominantemente residencial com o bairro da Ponta da Areia, a Vila Militar e os Morros do Arroz, do Estado, o Ingá e São Domingos ao Sul. Os espaços livres públicos existentes no entorno são muito diversos entre si. Além da esplanada árida da Praça do Povo, há a Praça de Esportes Governador Roberto Silveira ao Norte, o morro da Armação, o Jardim São João e a Praça do Rink (Praça General Gomes Carneiro), e espaços como os canteiros centrais da Avenida Rio Branco e o calçadão entre o Terminal e a Estação das Barcas. Esses espaços livres são em geral de pequeno a médio porte e constituem um sistema com pouca conectividade, exercendo poucas funções ecológicas.


50 Fig. 14 Mapa de uso do Solo Fonte: Isabella Valentim, 2019


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Fig. 15 Mapa de Gabarito Fonte: Isabella Valentim, 2019


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Legislação urbana O Caminho Niemeyer é considerado Área de Especial Interesse Urbanístico desde 2000, por uma lei específica anterior a sua construção (NITERÓI, 2000). Entretanto, somente em 2006 com a lei municipal nº 2411 que foram estabelecidos os parâmetros de uso e ocupação do solo. A AEIUT Caminho Niemeyer é dividida em 4 frações, I - conjunto arquitetônico do Caminho Niemeyer no Aterrado Praia Grande Norte; II - conjunto arquitetônico do Caminho Niemeyer na Via 100; III - Fração Urbana Orla Mar; IV - Fração Urbana Gragoatá/UFF. A Fração I corresponde à área da Praça do Povo, do Terminal até as a estação das Barcas e a fração III Orla Mar, corresponde aos terrenos que hoje se encontram subutilizados, de acordo com a análise de uso do solo realizada. De forma geral a lei prevê que essa área tenha uma mistura de usos residencial, comercial e de serviços, com incentivos especiais ao uso hoteleiro. São permitidas edificações com garagem no subsolo, embasamento, lâmina e cobertura com gabaritos máximos variáveis de acordo com o setor, podendo variar entre 12 e 42 metros de altura.


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Entretanto, ainda que tenham sido estabelecidos parâmetros para novas construções, até o presente momento nenhuma das quadras foi ocupada.

Fig. 16 Frações I e III – AEIUT Caminho Niemeyer Fonte: Prefeitura Municipal de Niterói, 2006


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Acredito ser importante olhar para experiências anteriores de implantação de parques urbanos a fim de extrair práticas positivas que levaram ao sucesso destes espaços públicos. Serão analisadas então duas referências emblemáticas de parques: o moderno Parque do Flamengo no Rio de Janeiro e o contemporâneo High Line Park em Nova York, que serão brevemente analisados quanto a sua história, principais linhas de projeto e apropriações.

Do outro lado da Baía, o Parque do Flamengo Um importante referencial para a elaboração deste trabalho foi o projeto urbano paisagístico do Parque do Aterro do Flamengo na cidade do Rio de Janeiro, inaugurado em 1965. Construído também sobre uma área aterrada às margens da Baía de Guanabara, o Parque do Aterro do Flamengo é um marco, um dos mais importantes equipamentos urbanos da cidade do Rio, cumprindo múltiplas funções urbanas e de lazer. Ademais, o Parque do Flamengo também foi a principal referência para o projeto não implantado da década de 1970 para o Aterro da Praia Grande.


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A urbanização do Aterro do Flamengo era parte de um plano maior de articulação do tráfego entre as zonas Sul, Centro e Norte, englobando também o desmonte do Morro de Santo Antônio, o elevado da Perimetral e o Túnel Rebouças. (OLIVEIRA, 2006). A área aterrada seria o principal eixo que conectaria a Zona Sul ao Centro, sendo assim, à época pensava-se em utilizar a maior parte do aterro para a construção de vias expressas deixando para o paisagismo apenas os canteiros de separação. A ideia visionária do parque veio de Lota de Macedo Soares, que convenceu o então governador Carlos Lacerda a destinar parte da área aterrada para a construção de uma área de lazer pública. Seu projeto e implantação foram realizados por três equipes, uma de tráfego e obras, uma de infraestrutura e um grupo de trabalho multidisciplinar com consagrados nomes do modernismo brasileiro. O Parque é continuamente aberto ao público e está sob tutela da Fundação Parques e Jardins. Foi inscrito no Livro de Tombo Paisagístico da Diretoria de Patrimônio Histórico Nacional em 1965, antes mesmo de sua inauguração por seu pelo valor estético, arquitetônico e paisagístico. Mais recentemente o Parque do Flamengo também veio a


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compor junto a outros bens, a paisagem cultural do Rio de Janeiro, que em 2012 obteve o reconhecimento internacional da Unesco. À criação do parque, estava atrelada a justificativa das obras de desmonte do morro de Santo Antônio e do aterro, à justificativa de dar para a cidade uma área de lazer ativa e da criação de solo de alto valor no Centro do Rio de Janeiro. Seu paisagismo moderno também está relacionado à ideia de desenvolvimento da cidade. Segundo Chuva (2017) o Parque do Flamengo “deve ser compreendido na mesma chave de uma estética moderna e civilizadora” (CHUVA, 2017, p.146) As motivações sociais para a construção do Aterro, destacadas também nos argumentos para a sua patrimonialização, estavam relacionadas às funções previstas para ele, voltadas para as novas necessidades da vida moderna nos grandes centros urbanos, que incluem a diversão, a recreação, o desfrute de horas livres e tudo o que pode estar relacionado ao lazer (e também ao turismo) de modo disciplinado, como descanso merecido por conta das horas de trabalho. (CHUVA, 2017, p.151)


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Para adequar a cidade às necessidades da vida moderna foi pensado o programa de usos de lazer e recreação do Parque, com a concepção de que a recreação é um serviço público necessário para o bom funcionamento da sociedade. Um extenso programa de atividades foi cuidadosamente pensado sob a coordenação de Ethel Bauzer de Medeiros para os 120 hectares de parque. Entre os itens do programa estavam uma marina, áreas de estar, playgrounds, coleções de árvores, área de estacionamento, campos de futebol, um restaurante, pistas de aeromodelismo, pistas de kart, áreas de piquenique e uma praia artificial. (OLIVEIRA, 2006) De acordo com as informações oferecidas pelo site oficial do parque, o projeto buscou materializar a imagem de um ambiente tropical urbanizado. Como espaço social e educativo representa o sonho de uma ordem social. O desenho do parque é dividido em três faixas conectadas através de passarelas e passagens subterrâneas. A primeira faixa corresponde àquela entre as edificações e as vias rápidas onde estão os estacionamentos, as quadras e os playgrounds. A segunda faixa é a das autopistas e dos jardins centrais, projetados a partir da perspectiva de dentro dos


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carros. A terceira faixa é aquela ao longo da Baía, com equipamentos de lazer incluindo a praia e a antiga pista de trenzinho hoje usada como ciclovia. Fig. 17 Vista Aérea Parque do Aterro do Flamengo Fonte: Pedro Kirilos, 2010


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O paisagismo assinado por Burle Marx constituiu uma importante contribuição para a ampliação do repertório de arborização no paisagismo brasileiro. Apesar da obra de Burle Marx ter características próprias e únicas, alguns aspectos de seu projeto são característicos do paisagismo moderno brasileiro. O Parque do Flamengo desde sua concepção foi pensado para conviver lado a lado com as autopistas. Ao seu moderno projeto paisagístico estão associadas novas formas de se apreender a paisagem da cidade. O parque apesar de trabalhar espaços de permanência orientados pela recreação moderna, tem sua matriz está relacionada ao movimento, à velocidade e a fluidez da cidade moderna. (MAGINA, 2009, p.9)

O Contemporâneo High Line Park O parque da High Line na cidade de Nova York criado a partir da conversão de um viaduto ferroviário desativado em um parque urbano é um exemplo de sucesso do paisagismo contemporâneo. A linha férrea elevada a 9 metros do nível da rua que cortava o lado Oeste de Manhattan ao longo de 2,4 km fora construída nos anos 1930 e tinha função de abastecer de


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mercadorias os galpões da região. As mudanças consequentes da ascensão do modelo rodoviário levaram a ferrovia ao declínio até o completo seu abandono nos anos 1980. A estrutura do elevado permaneceu ao tempo e nas décadas seguintes viu-se o crescimento espontâneo de plantas sobre seu leito. Para os habitantes da região, a presença do viaduto desativado criou um paisagem especialmente interessante, onde se podia ter contato com o tempo lento em contraste ao ritmo da metrópole nova iorquina. Em 1999, foi formada a Associação de Amigos da High Line (Friends of the High Line) a partir do interesse em comum sobre o futuro da estrutura. Após diversos encontros e discussões decidiu-se reclamar pela transformação do viaduto em parque urbano lançando assim uma ampla campanha pela recuperação do mesmo. A ideia do parque foi então gerada a partir de um processo participativo sugerido por uma organização social. Por meio da campanha, a ideia ganhou apoio de diversas entidades, incluindo a Prefeitura de Nova York e em 2004 a Associação lançou um concurso público para o projeto do futuro parque. Os vencedores do concurso foram o escritório de arquitetura Diller Scofidio + Renfro e o escritório de arquitetura paisagística James Corner Field Operations que trabalharam junto a uma equipe multidisciplinar contando com profissionais de engenharia, segurança,


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manutenção, horticultura e arte pública. O parque foi financiado por recursos públicos e privados arrecadados pela Associação, sua primeira seção foi inaugurada em 2009 e a última em 2014. Atualmente sua programação, manutenção e gestão são feitas pela Associação de Amigos da High Line e o Departamento de Parques e Recreação de Nova York (Department of

Parks & Recreation). O aspecto de ruína que inspirou a associação de moradores a impedir a demolição e promover a recuperação da High Line também orientou o design do parque, concebido abraçando as qualidades e o fascínio que a ruína desperta em quem a contempla. O conceito do projeto se apropria justamente da paisagem espontânea auto-semeada que surgiu nas ruínas urbanas do elevado. Como uma ruína encontrada em um jardim do século XVIII, essa estrutura incrustada de plantas é agora valorizada pela sua pátina como uma ruína industrial devastada pelo tempo e pelos caprichos da natureza. Também como uma ruína, o High Line Park deflagra memórias e associações com o passado industrial de Nova York e sua glória agora passada. Este é um passado que está suficientemente longe para a maioria dos nova-iorquinos de modo a lhes permitir a apreciação dele como algo pitoresco. De modo significante, ele também revela mudanças na paisagem que


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frequentemente passam despercebidas, tais como a dispersão de sementes através do vento e da ação dos pássaros. (HERRINGTON, 2009, p.82 apud JARDIM, 2012, p.122) Fig. 18 Walking the High Line – o elevado antes da intervenção Fonte: Joel Sternfeld, 2001


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A escolha das espécies para o parque se baseia na vegetação que colonizou os trilhos durante o período de abandono, adotando uma aparência selvagem, o projeto utilizou principalmente plantas nativas. Esse tipo de vegetação por estar mais adaptado às condições locais demanda menos manutenção e oferece habitat para diversas espécies, contribuindo para a sustentabilidade do parque. Além disso, este viés projetual revela a sensibilidade com o vazio pré-existente e o seu valor. Com relação ao design é interessante observar que a estrutura não apenas foi preservada mas também valorizada, trabalhando inclusive com os trilhos, que nos canteiros ficam à mostra e se misturam à vegetação. Segundo Jardim, o projeto atingiu “um sutil equilíbrio entre design contemporâneo e histórico, decadência industrial e beleza natural” (JARDIM, 2012, p.129). Um projeto como este é duplamente interessante para a cidade pois ao mesmo tempo que valoriza o patrimônio histórico industrial apresenta um novo espaço verde de lazer e contemplação. O parque se configura como um parque linear, um calçadão suspenso que conta com uma sequência de espaços de estar, decks, passagens e vistas para a cidade. O acesso se


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dá em diversos pontos a partir do nível da rua onde também se encontram elevadores e banheiros públicos. É importante ressaltar o caráter sustentável do projeto em todas as suas etapas, trabalhado a partir do uso de materiais de longa durabilidade, da escolha de vegetação adaptada ao clima local, do não uso de pesticidas, de práticas de manutenção sustentáveis no geral e de uma programação voltada para diversos grupos sociais. O parque se tornou muito querido pelos moradores e passou a fazer parte do elenco de pontos turísticos da cidade, atraindo diariamente milhares de visitantes. Sua recuperação também produziu efeitos no entorno, principalmente de valorização imobiliária. O sucesso da High Line estimulou outras iniciativas, não apenas nos Estados Unidos, de conversão de estruturas elevadas em parques lineares como o Minhocão em São Paulo. Mas apesar de possuir diversos pontos positivos e do intuito do projeto de ser modelo para intervenções futuras, Nogueira (2015, p.116) ressalta que “o High Line Park é modelo único e não replicável, inserido em um contexto específico e particular americano”.


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Análise comparativa O paralelo com o Parque do Flamengo é importante porque foi a principal inspiração para a destinação do Aterro da Praia Grande na época do seu efetivo aterramento, nos anos 1970. Sendo assim possível ter uma projeção do tipo de espaço público que se pensava para a área central de Niterói mas que por diversas razões não veio a ser implantado. Ambos os parques estudados tiveram um forte papel de lugarização para onde foram implantados, o aterro recém criado no caso do Rio de Janeiro e o elevado desativado no caso de Nova York. Ambos estão também relacionados ao desencadeamento da valorização do patrimônio arquitetônico e paisagístico de suas respectivas cidades. Isso ressalta o potencial que os parques como espaços públicos verdes possuem de fortalecimento do imaginário urbano e de estabelecimento de relações com a paisagem e o lugar. Tanto o Parque do Flamengo quanto a High Line utilizaram da vegetação nativa ou adaptada ao local. Entretanto, as propostas moderna e contemporânea tem grandes diferenças entre si não apenas por serem produtos de diferentes cidades e climas, mas também pelas suas premissas de desenho. A High Line trabalha com a vegetação de forma


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muito mais sutil e na escala do pedestre, enquanto que o Parque do Flamengo trabalha com diferentes escalas mas de uma forma geral, como observado por Magina (2009), privilegia a escala urbana e a perspectiva de dentro do automóvel. O programa do Parque do Flamengo apesar de seus amplos espaços livres e das apropriações que vieram a ocorrer ao longo de sua vida, foi desenvolvido a partir de uma concepção de recreação para o homem e a vida modernos. Seu projeto está relacionado à atitude do preenchimento do vazio estrutural gerado a partir do aterramento e do desmonte dos morros, de um preenchimento a partir de uma concepção particular de cidade e sociedade. Ao passo que a contemporânea High Line apresenta uma proposta para o vazio urbano que dialoga com os parques vagos (vague parks). Para Kamvasinou (2006), o conceito de parques vagos, que surge na década de 1990 está bastante alinhado com as políticas urbanas contemporâneas e sugere um importante modelo a ser adotado. Os vague parks são espaços públicos que emergem justamente dos terrenos vagos da cidade contemporânea, tomando partido de suas potencialidades como vazios. Em contraste com outros espaços da cidade formal onde prevalece o controle, o comércio e o monitoramento, os terrenos vagos e seus potenciais parques oferecem


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princípios opostos, como a indeterminação, o não controle, camadas de memória e o tempo lento. (KAMVASINOU, 2006, p.257). Desta forma, esses espaços se configuram justamente uma alternativa ao pensamento dominante da cidade, brechas onde pode florescer a diversidade.

A partir das análises realizadas neste trabalho, as potencialidades e criticidades levantadas a respeito da área de estudo, proponho que a Praça do Povo seja objeto de uma intervenção paisagística orientada por demandas contemporâneas de uso de espaços públicos. Uma intervenção que busque compatibilizar a área com a escala do pedestre, com o objetivo de melhorar as condições de fruição da Praça como importante espaço de lazer do Centro.


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Fig. 19 Imagem aérea da Praça do Povo, Niterói Fonte: Cultura Niterói, 2013

Para além dos limites da Praça em si, também deve ser prioridade trabalhar a integração da mesma com o entorno. Os acessos à Praça merecem ser repensados levando em consideração as diversas origens e direções de fluxo de pessoas. De forma também a pensar na requalificação dos percursos de chegada, que podem vir a funcionar como elementos conectores do aterrado. A Praça do Povo não é um espaço de passagem, como é a Praça Araribóia ou a Praça XV, as quais os citadinos atravessam em seus percursos diários entre atividades necessárias.


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Estando ligeiramente fora do percurso cotidiano, sua visitação tem caráter intencional, motivada pelos atrativos que ela oferece para o desenvolvimento de atividades opcionais. Sendo assim, para que se possa potencializar os usos e apropriações da Praça é essencial considerar dois fatores que Gehl destaca com relação às atividades ao ar livre: o clima, que diz respeito ao conforto térmico, e os convites, "convites para uma atividade ao ar livre que vá além de uma simples caminhada incluem proteção, segurança, um espaço razoável, mobiliário e qualidade visual" (GEHL, 2013, p.21). Além de aspectos físicos deste espaço público, julgo ser importante abordar aspectos simbólicos da praça como lugar. Como foi visto anteriormente, a história do Aterrado Norte é marcada por processos e projetos autoritários que culminaram em um lugar fragmentado, árido, empobrecido de significados e relações humanas. Acredito que a vegetação como elemento de projeto seja uma potente estratégia para promover novos significados e relações com o lugar. Após os estudos sobre as estruturas imaginantes do lugar arborescente do Parque do Flamengo, Crichyno afirma que as árvores são capazes “de inflar a paisagem de valores e significados simbólicos profundos, existenciais, possibilitando ser experienciados pelos


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sujeitos urbanos.” (CRICHYNO, 2017, p. 54). A árvore “transcende ao significado que o urbano lhe impõe” (CRICHYNO, 2017, p.37), tecendo relações de apego e canais de comunicação que muitas vezes ainda não somos capazes de compreender e que somente as árvores como elemento urbano podem possibilitar. Crichyno conclui que as árvores são fundamentais nos projetos urbanos na paisagem e que sua presença influi sensivelmente na definição de uma paisagem significativa (CRICHYNO, 2017, p. 54). É uma prática do paisagismo contemporâneo localizar os projetos em áreas consolidadas, se apropriando de estruturas pré-existentes muitas vezes tidas como vazios urbanos, sejam elas linhas de trem desafetadas, antigas, fábricas, viadutos ou friches. A “destruição criativa” do pensamento moderno sobre a cidade é abandonada, e nestas propostas busca-se uma convivência entre tempos na paisagem, de camadas que se sobrepõem em palimpsesto. São grandes referências deste tipo de proposta o Parc de la Villette em Paris, o Parque da Juventude em São Paulo e o o High Line Park em Nova York, que conjugam intervenções paisagísticas contemporâneas a arquiteturas do passado sem anular sua presença.


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O homem primitivo parou sua carreta; decide que aqui será seu chão. Escolhe uma clareira, derruba as árvores mais próximas, aplana o terreno em torno; abre o caminho que o ligará ao rio ou àqueles de sua tribo que ele acabou de deixar; enterra os piquetes que sustentarão sua tenda. [...] O caminho é tão retilíneo quanto lhe permitem seus instrumentos, seus braços e seu tempo. (CORBUSIER, 1977, p.43) Corbusier descreve o processo do homem primitivo de construção de sua cabana, o processo de dominação da natureza e de edificação de um espaço ordenado para sua tribo. O homem primitivo abria clareira, já o moderno criava solo, aterros, sempre com o objetivo de ordenar o espaço. Uma clareira, entretanto, não se mantém aberta sem um trabalho de manutenção ou uso intenso. Da mesma forma que o aterro não é por si só inóspito e infértil. Se hoje a área de estudo tem um aspecto devastado, com uma cobertura vegetal rarefeita e de baixa diversidade, isso não é mais do que o resultado de um projeto e de sua uma manutenção ativa. Assim que são concluídas, as construções do homem entram em um processo de degradação irreversível. Sua capacidade de evoluir as condena, mais cedo ou mais tarde, à ruína. Quando uma obra é


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concluída, já está morta. A natureza, pelo contrário, nunca termina nada. Ela se encarrega dos furacões, interpreta as cinzas de um incêndio, inventa um processo de vida com bases, sempre renovadas, em uma revolta. (CLÉMENT, 2011,p.21) * Tradução própria As friches, terras negligenciadas pelo homem, nem naturais, nem de uso agrícola são objeto de estudo do paisagista Gilles Clément. De certo modo esses terrenos denotam uma perda do poder humano sobre a natureza, assim como pode se interpretar o insucesso dos diversos projetos para a Praia Grande. Clément convida a um olhar diferente para as friches, não diagnosticando-as como depauperações da paisagem mas sim com um senso de oportunidade sobre estes terrenos onde a natureza está demonstrando seu poder de recolonização. Clément questiona se depois de ter conquistado terrenos, o homem não poderia também cedê-los de volta à natureza. E propõe uma renaturalização não pelo abandono mas em forma de jardim, o chamado jardim em movimento. (CLEMENT, 2011) Tendo em vista a história da área de estudo de dominação da cidade sobre o mar, proponho olhar para os interstícios da Praça do Povo assim como Clément olha para as

friches, como uma oportunidade para fazer crescer um jardim em complementaridade à


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arquitetura de Niemeyer, ao existente, buscando o fortalecimento do lugar e a valorização da memória. Propõe-se então três diretrizes básicas para a intervenção expostas no quadro a seguir (Quadro 2) 1) Integração urbana; 2) Lugar arborescente; 3) Atividades ao ar livre. Estas diretrizes estão inter relacionadas , com igual importância para a requalificação do lugar e deverão ser trabalhadas por meio de estratégias de projeto.

Quadro 2 Disretrizes e Estratégias Fonte: Isabella Valentim, 2019


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Requalificação do entorno Propõe-se que a requalificação do entorno se dê por eixos, voltados principalmente para o acesso de pedestres e ciclistas. Sua definição deriva da identificação das possíveis origens de fluxos de pessoas e da consequente abertura de novos acessos para a Praça. O objetivo é romper com o isolamento e com a sensação da praça estar nos “fundos do terminal”, de forma a promover uma integração urbano-paisagística do aterrado tendo a Praça como elemento de unidade, conectando equipamentos da Praia Grande e as comunidades pesqueiras. Inicialmente seriam dois eixos, um ao norte, integrando o Mercado de São Pedro e a Praça, e outro ao sul, partindo da Praça Araribóia contornando a borda do aterro e se prolongando por toda a orla. Prevê-se mais três acessos à Praça, um ao norte, outro ao sul e um para a Vila de Pescadores. O miolo do aterro permanece como uma indefinição quanto a sua futura forma e uso. Na Lei nº 2411 de 2006 que regulamenta a Área de Especial Interesse Urbanístico do Caminho, prevendo um futuro adensamento, foram estabelecidos parâmetros de uso e ocupação do


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solo como traçado viário, alinhamentos, altura máxima das construções, afastamentos, coeficiente de aproveitamento, dimensões mínimas de lotes e a permissão para a área usos comerciais, residenciais e de serviços.

Fig. 20 Estratégias de conexão e acesso FonteIsabella Valentim, 2019


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Com a previsão da ocupação dos lotes da Fração Orla Mar 3, 4 e 5, definiu-se também dois eixos futuros. Estes eixos e acessos futuros correspondem ao prolongamento das ruas Marquês de Caxias e Saldanha Marinho. As Rua 12 e A, ruas de acesso e saída do Terminal João Goulart continuarão com o mesmo fluxo de ônibus, sendo necessário prever atravessamentos seguros e infraestrutura cicloviária adequada.

Lugar arborescente Tendo em vista questões sociais, ambientais e simbólicas, propõe-se um jardim público à beira-mar em que sejam utilizadas prioritariamente espécies vegetais de restinga considerando seu valor ornamental, de usos medicinal, alimentar, tecnológico e construtivo. Restinga, no sentido botânico designa o conjunto de diversas comunidades vegetais presentes em depósitos arenosos litorâneos. Este era o ecossistema que originariamente cobria o areal da Praia Grande. Como já dito anteriormente, sendo uma área aterrada, não há uma cobertura vegetal que se poderia buscar reconstituir. Mas traço um paralelo com a abordagem da estética da


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ruralidade e da transculturalidade trabalhada por Azevedo (2006) e sua importância em “tempos de cidades que não tem mais fim”. O autor valoriza as experiências da paisagem rural e promove a sua reutilização em projetos de paisagismo dentro da cidade contemporânea, adotando a transculturalidade ao invés da negação da estética da ruralidade, como o fez a cidade moderna. Se a cidade não tem mais fim e expulsou o campo, ou mesmo matou o rural tradicional que existia outrora ali fora dela, por que não permitir agora, em seu bojo, a recriação de alguns de seus aspectos importantes para a atualidade? (AZEVEDO, 2016, p.129) Vale ressaltar que esta reapropriação não se identifica com a lógica do saudosismo, e sim com uma lógica da valorização cultural. Neste sentido, se a cidade de Niterói expulsou desde a criação da Vila Real da Praia Grande, o areal, a restinga e todas as relações que ali existiam, por que não buscar neste ecossistema, na sua estética e força os caminhos para se repensar o Aterro? Pela localização costeira da Praça é particularmente interessante que a vegetação proposta seja adaptada a fatores ambientais como salinidade, escassez de água, insolação forte e direta e ventos marítimos. Além disso, alinhado com as preocupações ambientais


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contemporâneas, o plantio de restinga pode vir a reestabelecer relações ecológicas no ambiente urbano. Nos parques, à diferença das praças a vegetação assume uma função de organização espacial, como importante de delimitadora do espaço, (MACEDO;SAKATA, 2003, p.15). A proposição de um passeio com vegetação de restinga busca definir este lugar à beira-mar alternando composições intencionais com plantio mais livre baseados no Modelo Restinga de Fernando Chacel. Este modelo tem o propósito de: [...] recriar na paisagem, pelo processo de ecogênese, elementos e associações vegetais próprios das restingas e das áreas de transição entre elas e os manguezais. Concebeu-se esse modelo como um jardim natural enfatizador de amostras significativas daquele tipo de ecossistema (CHACEL, 2001 p.55) Seriam ações específicas para o desenvolvimento da praça-parque como lugar arborescente o cultivo de um jardim em movimento, o desenho de composições vegetais que valorizem a arquitetura, bem como a compatibilidade com o programa de atividades; o projeto


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e cultivo de um pomar de restinga, trabalhando da ideia do paisagismo comestível (DIEZ, 2018) e a estruturação de um horto botânico temporário. Fig. 21 Modelo Restinga Fonte: CHACEL, 2001, p.55


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Aliado a este projeto seriam importantes aliados o desenvolvimento de programas de educação ambiental, além de parcerias com as comunidades e instituições do entorno, principalmente aquelas diretamente relacionadas à Praia Grande como as comunidades de pescadores.

Programa de atividades O objetivo de se repensar o programa de atividades da Praça é de dar suporte às atividades já presentes e possibilitar novas apropriações do lugar, diversificando os usos e suas relações sociais. Entendo que o programa de atividades internas dos prédios existentes é um dado consolidado. Essas atividades culturais e educativas vem sendo atrativos de pessoas para a Praça, mas foi percebido também que a população busca este espaço público para a utilização de suas áreas externas, para contemplação da paisagem, piqueniques, andar de patins, bicicleta ou simplesmente estar em um espaço aberto. Conclui-se que existe uma


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demanda por áreas públicas abertas nessa área, demandas que devem ser levadas em consideração para requalificar a Praça. Medeiros, especialista em recreação responsável pelo programa de atividades do Parque do Aterro do Flamengo afirma a importância do lazer para a vida urbana, pois “é nas ocupações desinteressadas que descobrem uma área universal de intercâmbio de experiências” (MEDEIROS,1971,p. 114-115). Entende assim o lazer como fator agregador de uma comunidade, gerador de campos onde é mais fácil superar diferenças entre grupos sociais distintos. A proposta de um projeto participativo tem principalmente a intenção de evitar que se repita um processo autoritário de decisão sobre o espaço público, como o que ocorreu diversas vezes no Aterro da Praia Grande. Espera-se que desta forma, o envolvimento popular não se dê apenas nas instâncias burocráticas mas concretamente na própria praça-parque.


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Fig. 22 Vantagens do processo participativo Fonte: GATTI; ZANDONADE, 2017, p.16

Destaco que a Praça do Povo é um lugar de interesse de diversas comunidades inclusive de fora da cidade de Niterói, o que a torna especialmente interessante por conta do seu potencial de agregação e diversidade. Todos estes grupos devem ser incluídos nesse processo para que na Praça não continuem sendo reproduzidos os mesmos interesses que vêm modelando o aterro há décadas e que tem produzido para a cidade mais efeitos negativos do que positivos.


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A Praia Grande e o seu aterro foram sucessivamente agredidos pelos projetos e obras modernas que não valorizaram a paisagem e a memória local em nome da criação de uma nova Niterói. Pelas análises realizadas, observo que a condição contemporânea desta Praça na cidade de Niterói, ainda sob certos aspectos de vazio favorece a potencialização desta esplanada vaga como espaço verde público. As referências e diretrizes discutidas neste trabalho põem em questão a cristalização da Praça do Povo como obra de Niemeyer seja sob a atual legislação municipal que a define como Área de Especial Interesse Turístico estático ou sob um possível tombamento do conjunto do arquiteto. Este trabalho busca diretrizes para intervir na Praça do Povo por concluir a partir das análises quanto ao lugar, arquitetura, histórico, escala, acessibilidade e simbolismo que uma intervenção na Praça seria extremamente positiva para a cidade e para todos que frequentam o Centro de Niterói. Não existe apenas um caminho de projeto, tanto menos uma solução pronta para todas as problemáticas levantadas com relação à Praça e seu entorno. As diretrizes


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apresentadas dialogam com a ideia de diversidade inerente a um espaço público de qualidade e com o processo de transformação constante dos lugares. Os princípios da proposta de um lugar arborescente, integrado e participativo, se alinham àqueles destacados por Kamvasinou para os parques e terrenos vagos, como a indeterminação, o não controle, camadas de memória e o tempo lento.


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