CENTRO UNIVERSITÁRIO METODISTA IZABELA HENDRIX
Islano Santos de Lima
UMA REDAÇÃO, DOIS CONTEÚDOS: os elementos jornalísticos na primeira página de O Tempo e Super Notícia
Belo Horizonte 2012
Islano Santos de Lima
UMA REDAÇÃO, DOIS CONTEÚDOS: os elementos jornalísticos na primeira página de O Tempo e Super Notícia
Monografia apresentada ao Curso de Comunicação Social, do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Jornalismo. Orientador: Ivan Satuf Rezende
Belo Horizonte 2012
Resumo Este estudo foi desenvolvido a partir de uma análise da primeira página dos jornais O Tempo e Super Notícia, ambos da Sempre Editora. As edições escolhidas foram de 29 de fevereiro a 6 de março de 2012, totalizando 14 primeiras páginas, sendo sete de cada jornal. O objetivo é identificar quais elementos (textos, fotos, infográficos, cores) que firmam o contrato de comunicação com o leitor. O suporte teórico utilizado ao longo da pesquisa foi organizado com base no conceito de contrato de comunicação a partir da análise do discurso proposta por Patrick Charaudeau. A partir dos conceitos de mass media e penny press é traçada uma distinção fundamental entre jornalismo referência e popular. Entre os principais resultados podemos destacar que o jornal O Tempo utiliza a visada informativa, ou seja, leva um saber a quem presume não possui-lo, enquanto o jornal Super Notícia utiliza a visada de páthos, ou seja, tenta provoca no leitor, através das manchetes, fotos e cores, sensações agradáveis ou desagradáveis. O primeiro segue o padrão do jornalismo de referência e o segundo do jornalismo popular.
Palavras-chave: Jornalismo. Contrato de comunicação. Jornal impresso. O Tempo. Super Notícia.
Agradecimentos Agradeço primeiro a Deus, por ter dado força de vontade para superar os desafios. Aos meus pais, José Francisco e Idelma Maria, pelo apoio, incentivo e pelo amor incondicional. Agradeço também a minha família pela educação embasada no respeito e por apostar nos meus sonhos. Aos meus amigos, pela compreensão nos momentos que estive em falta, devido ao tempo curto para estar junto de pessoas que estimo tanto. Para finalizar agradeço ao meu orientador, o Professor Ivan Satuf, pela dedicação, esclarecimento e atenção durante o período da pesquisa e por contribuir com a minha formação acadêmica durante estes quatro anos de curso.
Lista de Ilustrações Figura 1: Gráfico demonstrativo O Tempo..................................................................23 Figura 2: Gráfico demonstrativo Super Notícia ..........................................................24 Figura 3: Primeira página do O Tempo 29/02..............................................................26 Figura 4: Primeira página do Super Notícia 29/02.......................................................26 Figura 5: Primeira página do O Tempo 01/03..............................................................29 Figura 6: Primeira página do Super Notícia 01/03.......................................................29 Figura 7: Primeira página do O Tempo 02/03 ............................................................31 Figura 8: Primeira página do Super Notícia 02/03... ..................................................31 Figura 9: Primeira página do O Tempo 03/03 .............................................................33 Figura 10: Primeira página do Super Notícia 03/03 ..................................................33 Figura 11: Primeira página do O Tempo 04/03 ...........................................................34 Figura 12: Primeira página do Super Notícia 04/03.....................................................34 Figura 13: Primeira página do O Tempo 05/03 ...........................................................35 Figura 14: Primeira página do Super Notícia 05/03.....................................................35 Figura 15: Primeira página do página do O Tempo 06/03...........................................36 Figura 16: Primeira página do Super Notícia 06/03.....................................................36
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 7
CAPÍTULO 1 - O DISCURSO DAS MÍDIAS E A CONSTRUÇÃO DA NOTÍCIA NOS JORNAIS IMPRESSOS ......................................................................................... 9 1.1 CONTRATO DE COMUNICAÇÃO DOS JORNAIS IMPRESSOS ............................................... 9 1.2 J ORNALISMO POPULAR E DE REFERÊNCIA ................................................................... 13 CAPÍTULO 2 - O JORNALISMO MINEIRO E OS JORNAIS "O TEMPO E "SUPER NOTÍCIA" ..................................................................................................... 17 2.1 HISTÓRIA DOS JORNAIS O TEMPO E SUPER NOTÍCIA ................................................... 17 2.2 UMA REDAÇÃO E DOIS CONTEÚDOS ............................................................................ 19 CAPÍTULO 3 - ANÁLISE DA PRIMEIRA PÁGINA DOS JORNAIS “O TEMPO” E “SUPER NOTÍCIA” ..................................................................................................... 22 3.1 METODOLOGIA .......................................................................................................... 22 3.2 ANÁLISE GERAL ......................................................................................................... 23 3.3 ANÁLISE DAS 14 PRIMEIRAS PÁGINAS DOS JORNAIS .................................................... 26 CONCLUSÃO ............................................................................................................... 38 REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 40 ANEXOS ....................................................................................................................... 41
7
INTRODUÇÃO Com o advento da internet surgem rumores de que o jornal impresso não conseguirá sobreviver aos avanços tecnológicos. Em Minas Gerais a realidade é diferente, os jornais continuam tendo tiragens significativas e tentam ampliar as vendas abrindo novas publicações com apelo popular. Este é o caso da Sempre Editora, que publica o jornal O Tempo, direcionado para das classes A e B, e que em 2002 apostou no jornalismo popular, criando o Super Notícia. Com a crescente tiragem de jornais e a comercialização da imprensa, Traquina (2005) chama a atenção para o novo jornalismo (penny press), criado no século XIX, onde os jornais assumem a função mercadológica e as informações passam a ser produzidas e comercializadas pelas empresas de comunicação como mercadoria com foco nos leitores, e o público também passa a consumir os jornais como produto midiático. Sendo o jornal um produto mercadológico, torna-se necessário atrair seu público para o consumo. A primeira página assumiu então a função de chamar o leitor para a leitura dos conteúdos contidos na parte interna, ela faz com que o consumidor adquira o produto jornalístico, seguindo assim as regras da sociedade de consumo. Com o importante papel de atrair a atenção do leitor por meio da seleção de notícia e mostrar o que há de mais importante no jornal, a primeira página estabelece o contrato de comunicação com o leitor, uma vez que ela faz com que o consumidor adquira o produto. Para entender como o contrato de comunicação é estabelecido pelos jornais e quais os elementos contido na primeira página que firmam o contrato com o leitor, a presente pesquisa tem como objetivo fazer este estudo tendo como base os jornais O Tempo e Super Notícia. Por pertencerem à mesma empresa, pretende-se identificar como o contrato de comunicação é constituído. Levaremos em conta o fato de eles serem produzidos pela mesma redação, a diferença entre o público-alvo de cada um, o apelo visual e os elementos jornalísticos contidos na primeira página. O primeiro capítulo do estudo abrange as teorias de análise do discurso das mídias. Nossa intenção é identificar e problematizar este relacionamento entre a instância da produção e a instância da recepção. Para isso, faremos na primeira parte uma análise do discurso a fim de entender a construção das notícias jornalísticas nos jornais impressos. O objetivo é compreender o processo de construção linguística. Para tanto, utiliza-se a teoria de Patrick Charaudeau (2006), que discorda das primeiras teorias da informação (fundamentalmente
8 /transmissionista) e demonstra que a comunicação não seria um circuito fechado e de mão única entre emissão e recepção. Ainda neste capítulo mostrou-se necessário entender a diferença entre os tipos de jornais, tanto em relação à forma (standart/tablóide) quanto no conteúdo (referência/popular). A investigação se baseou no conceito de mass media debatido por Traquina (2005) e se amparou na teoria de Amaral (2006) para definir o jornal de referência e o popular. Na segunda parte da pesquisa investigaremos a inserção de O Tempo e Super Notícia na sociedade e alguns de seus principais concorrentes regionais. Atualmente, O Tempo vende uma média de 42 mil exemplares diários e o Super Notícia aproxima-se de 300 mil. O trabalho de Carrato (2002) dá suporte à investigação sobre os jornais. Os objetos de pesquisa escolhidos para a análise comparativa foram às primeiras páginas dos jornais O Tempo e Super Notícia. A principio faremos uma análise geral das 14 primeiras páginas que compõem a amostra da pesquisa. Em seguida, é feita uma análise comparativa das sete primeiras páginas dos dois jornais, confrontando dia a dia os dois produtos para verificar como se dá o contrato de comunicação.
9
CAPÍTULO 1 - O DISCURSO DAS MÍDIAS E A CONSTRUÇÃO DA NOTÍCIA NOS JORNAIS IMPRESSOS 1.1 CONTRATO DE COMUNICAÇÃO DOS JORNAIS IMPRESSOS
Fazer uma análise comparativa de dois jornais da mesma empresa e com o mesmo formato físico é um grande desafio. Sabemos que cada um tem a sua especificidade. Assim, é necessário fazer um estudo sobre a relação entre os interlocutores. Para Charaudeau (2006), todo discurso depende, para a construção de seu interesse social, das condições específicas da situação de troca na qual ele surge. Esta situação de comunicação se constitui em um quadro de referência que se dá no momento que inicia o ato de comunicação com suas restrições de espaço, tempo, relações e palavras. A primeira página do jornal funciona como um instrumento de valorização para o impresso. Tem como finalidade hierarquizar os conteúdos contidos naquele pedaço de papel. Sua função primordial é chamar a atenção do leitor, convidando para leitura dos conteúdos internos. Sendo o objeto desta pesquisa os jornais O Tempo e o Super Notícia, temos como objetivo identificar o contrato de comunicação deles com o seu público com base nos elementos que compõem a primeira página. O necessário reconhecimento recíproco das restrições da situação pelos parceiros da troca linguageira nos leva a dizer que estes estão ligados por uma espécie de acordo prévio sobre os dados desse quadro de referência. Eles se encontram na situação de dever subscrever, antes de qualquer intenção e estratégia particular, a um contrato de reconhecimento das condições de realização da troca linguageira em que estão envolvidos: um contrato de comunicação. (CHARAUDEAU, 2006, p.68)
O contrato é composto de “dados externos” e “dados internos” (Charaudeau, 2006). Os dados externos compõem características específicas dos indivíduos que participam do contrato de comunicação na situação comunicacional. Eles podem ser reagrupados em quatro categorias: condição de identidade, condição de finalidade, condição de propósito e a condição do dispositivo, sendo que cada uma corresponde a um tipo de condição de enunciação da produção linguageira. A condição de identidade define-se através das respostas às perguntas: “Quem troca com quem?” ou “Quem fala a quem?”. Revelam-se, portanto, as marcas pessoais e sociais dos envolvidos, como idade, gênero, camada social, nível educacional ou cultural.
10 A condição de finalidade busca compreender o objetivo da troca comunicacional. Ela se define através da expectativa de sentido e responde à pergunta: “Estamos aqui para dizer o quê?”. Dentro desta categoria o autor revela um contrato do “querer”, que tem o objetivo de manipular o interlocutor e persuadi-lo a aceitar o acordo firmado. Para isso, Charaudeau (2006) divide esta condição em quatro tipos de visadas: prescritiva, informativa, iniciativa e Páthos. A visada prescritiva, que consiste em querer “fazer fazer”, isto é, querer levar o outro a agir de uma determinada maneira. A visada informativa, que consiste em querer “fazer saber”, ou seja, querer transmitir um saber a quem presume não possuí-lo. A visada iniciativa, que consiste em querer “fazer crer”, isto é, querer levar o outro a pensar que o que está sendo dito é verdadeiro (ou possivelmente verdadeiro). E a visada Páthos, que consiste em fazer sentir, ou seja, tem a função de provocar no outro um estado emocional agradável ou desagradável. Retomando as condições estabelecidas pelo autor nos dados externos do contrato de comunicação, temos ainda a condição de propósito, que responde à pergunta “Do que se trata?”. A condição de propósito diz respeito ao assunto principal tratado na comunicação e seus subtemas. Não menos importante é a condição do dispositivo, na qual se faz a pergunta “Em que ambiente se inscreve o ato de comunicação, que lugares físicos são ocupados pelos parceiros, que canal de transmissão é utilizado?”. Essa condição remete ao contexto espacial e o meio onde acontece a comunicação. Tanto o jornal O Tempo quanto o Super Notícia utilizam o mesmo dispositivo, o impresso. A comunicação neste dispositivo contém características gerais que definem a finalidade do ato de comunicação e estabelecem o lugar dos parceiros da troca comunicacional. As manchetes, imagens, a hierarquia das notícias, cores, ou seja, o espaço físico do jornal e os elementos que compõem a primeira página são algumas das características do dispositivo impresso que o torna singular como meio de comunicação. O jornal impresso tem o papel como suporte, onde os caracteres estão previamente fixados. Ele é um produto acabado, como uma temporalidade própria (quotidiano em sua maioria) que indica uma determinada postura corporal (sentado, folheando as páginas) e momento especial de leitura, mais focado, já que o produto é oferecido de forma finalizada ao leitor. Ele é barato, portátil e descartável. (LEMOS, online)
Para exemplificar os dados externos através do objeto dessa pesquisa podemos resumir da seguinte forma. O jornal O Tempo diz para seu público em sua maioria das classes A, B e C. O Super Notícia para o seu público, que na maioria é das classes B, C, D e E, segundo
11 dados da própria empresa Sempre Editora1. Enquanto o primeiro diz para informar os leitores focando em uma cobertura abrangente (nacional, internacional e regional), o segundo diz para informar seu público com informações de caráter popular, uma cobertura predominantemente local e voltada para Belo Horizonte e a região metropolitana. O Tempo informa notícias de cidades, economia, política, crimes, cultura, moda, colunas diárias, prestação de serviço e esportes. O Super Notícia pública notícias policiais – principalmente relacionadas a assassinatos, roubo e tráfico de drogas -, esporte (com foco no futebol), cidades, prestação de serviço, celebridades e TV. O primeiro constrói o discurso seguindo os padrões jornalísticos, enquanto o segundo lança mão do modo popular e sensacionalista, tal como analisado no capítulo 1.2. Já os dados internos referem-se a “como se diz”. São elementos inerentes ao discurso, como figuras de linguagem, jargões e a seleção de palavras e imagens para se expressar. A escolha da forma de falar, o uso de linguagem e imagens “constituem as restrições discursivas de todo ato de comunicação”, (Charaudeau, 2006, p. 70). Estes dados são agrupados em três espaços: de locução, relação e tematização. No espaço da locução o enunciador toma a iniciativa da palavra e justifica o que pretende, impondo-se como sujeito falante, construindo assim a imagem do destinatário ao qual ele se dirige. No espaço de relação, o sujeito falante, ao construir sua imagem de locutor e de seu destinatário, estabelece a relação de força ou de aliança, escolhendo entre exclusão ou inclusão, de agressão ou de convivência com o destinatário. No espaço da tematização o sujeito falante toma posição com relação ao tema proposto no contrato, escolhendo um modo de intervenção (direto, retomada, de continuidade, etc), mas também escolhe um modo de organização discursiva particular (descritivo, narrativo, argumentativo). Levando em conta os dados internos do contrato de comunicação, podemos dizer que ao criar os jornais O Tempo e o Super Notícia, o enunciatário se dispôs a fazer o primeiro com base no jornalismo padrão e o segundo com o caráter popular, sendo este início o espaço da locução. Depois da escolha da forma jornalística, cada jornal adotou uma linha editorial, ou seja, partiu-se em busca de uma linguagem própria. As escolhas feitas pelos dois veículos estão inseridas no espaço da relação, cabendo ao leitor decidir a sua função de “aliança, de
1
Os dados do público-alvo dos jornais foram retirados de arquivos enviados por e-mail pela Sempre Editora no dia 27/02/2012. Os arquivos foram anexados ao final da presente pesquisa.
12 exclusão ou inclusão, de agressão ou de conivência com o interlocutor”. (CHARAUDEAU, 2006, p.71) No espaço da tematização, o jornal O Tempo propõe temas como resultados ou descobertas de pesquisas, fraudes, reportagens investigativas e assuntos de grande interesse da população mineira. Os leitores sabem que vão encontrar manchetes de economia, cidades, política, crimes, cultura, moda, colunas diárias, prestação de serviço, esportes entre outros. Já o Super Notícia propõe temas policiais, futebol, cidades, prestação de serviço e notícias de celebridades. Considerando que esta pesquisa visa à análise comparativa da primeira página dos dois jornais e que eles possuem públicos diferentes, é importante ressaltar que o espaço da tematização será fundamental para identificar o contrato de comunicação de cada um, pois nele são tratados os domínios do saber por meio da organização do discurso. Pelo espaço da tematização é possível saber o que se quer comunicar. O “modo de intervenção” e o “modo de organização discursivo” permitem que os leitores de O Tempo e do Super Notícia identifiquem o jornal pelos temas propostos na primeira página. Os dois jornais, apesar de pertencerem à mesma empresa jornalística, possuem linha editorial e contrato de comunicações diferentes. Além das observações já citadas até aqui, outros elementos da primeira página chamam a atenção. O fato de o Super Notícia disponibilizar grande espaço para o futebol é um deles. Um dia depois da rodada esportiva em que um dos protagonistas é o Atlético, América ou Cruzeiro, a manchete principal sempre remete ao resultado das partidas. Para o jornal, a vitória, empate ou derrota das equipes mineiras tem valor-notícia maior que os outros acontecimentos das demais editorias. A cor de fundo das manchetes segue a cor utilizada pelos times, ou seja, branco e preto (Atlético), branco e verde (América) e branco e azul (Cruzeiro). O Tempo também reserva espaço na sua primeira página para o futebol, porém, o assunto não se torna manchete principal. As notícias de esporte ficam dentro de um espaço delimitado pela cor amarela, que remete ao caderno de esporte. Outro destaque que chama a atenção no Super Notícia é a foto de uma mulher seminua que estampa todas as edições, ocupando um espaço importante na primeira página. Também existem as publicidades que ocupam a parte superior, ao lado da logomarca, e a parte inferior. As publicidades na primeira página têm a função de divulgar promoções do próprio jornal. Já no contrato de comunicação estabelecido pelo O Tempo, de acordo com a mostra desta pesquisa, não é permitido qualquer tipo de publicidade na primeira página.
13 Pode-se, portanto, levantar a hipótese de que o valor-notícia é um dos elementos essenciais dentro do contrato de comunicação de cada jornal. A subjetividade do valor-notícia no momento da definição do que é ou não notícia leva em conta a importância do fato ou acontecimento que será noticiado. Nas redações, essa decisão do que será ou não notícia é tomada pelos editores, que fazem a seleção baseados em experiências profissionais e intuição. Para Wolf (1987), os valores-notícias são componentes da noticiabilidade, que agem uns em relação aos outros, a fim de complementar a seleção de um fato a ser noticiado ou não. Os valores-notícia são elementos que orientam os jornalistas na escolha do que deve ser noticiado e o que não deve ser destacado dentro do processo produtivo. Pode-se dizer que um acontecimento pode não ser tratado como notícia no jornal O Tempo e se tornar manchete principal do jornal Super Notícia. O inverso também é verdadeiro. No momento das escolhas do que irá ou não ser publicado leva-se em conta o público, a linha editorial dos veículos de comunicação e o valor-notícia que se julga ser o mais importante para aquela edição. Para Amaral (2006), os critérios de noticiabilidade “não são valores fixos, variam e se misturam permanentemente. Mas são uma maneira de organizar a análise de como um fato é elevado ao estatuto de notícia em cada jornal” (AMARAL, 2006, p.62).
Os valores-notícia são, portanto, regras práticas que abrangem um corpus de conhecimentos profissionais que, implicitamente, e, muitas vezes, explicitamente, explicam e guiam os procedimentos operativos redacionais [...] Os valores-notícia são qualidades dos acontecimentos, ou da sua construção jornalística, cuja presença ou cuja ausência os recomenda a serem incluídos num produto informativo, Quanto mais um acontecimento exibe essas qualidade, maiores são suas possibilidade de ser incluído (GOLDING e ELLIOTT apud WOLF, 1987, p.174).
O contrato de comunicação que os jornais O Tempo e o Super Notícia estabelecem com o público é essencial para a comunicação, pois se baseia em linguagem e todo ato de linguagem é uma “ato de liberdade, sem deixar de ser uma liberdade vigiada” (CHARAUDEAU, 2006, p.71). 1.2 JORNALISMO POPULAR E DE REFERÊNCIA
Para Traquina (2005), o jornalismo das sociedades democráticas tem suas raízes no século XIX, pois foi neste período que se desenvolveram os mass media, o que corriqueiramente denominamos imprensa. Nesse período aconteceu a expansão dos jornais,
14 permitindo a criação de novos empregos e profissionais dedicados integralmente à profissão de jornalista para fornecer informações e não propagandas para seus leitores.
Este novo paradigma será a luz que viu nascer valores que ainda hoje são identificados com o jornalismo: a notícia, a procura da verdade, a independência, a objetividade, e uma noção de serviço ao público – uma constelação de idéias, que dá forma a uma nova visão do “pólo intelectual” do campo jornalístico. (TRAQUINA, 2005, p.34)
No século XIX cresceram as tiragem de jornais e a comercialização da imprensa. Além disso, os jornais faziam parte das lutas políticas e se engajavam em causas específicas. Porém, ainda naquele século, ocorreu a criação de um novo jornalismo, o penny press e os jornais assumiram a função mercadológica de um negócio que pode render lucros, tendo como objetivo aumentar as tiragens. “Com o objetivo de fornecer informação e não propaganda, os jornais oferecem um novo produto – as notícias, baseadas nos “fatos” e não nas “opiniões” (TRAQUINA, 2005, p.34)
O novo jornalismo veio na forma da chamada penny press, nome que vem do fato de que, perante o preço estabelecido ou comum de seis centavos, o preço desta nova imprensa foi reduzido a um centavo. Com o objetivo de aumentar a circulação, atingindo pessoas que normalmente não compravam um jornal por razões econômicas, o baixo preço destes jornais tornava-os acessíveis a um novo leque de leitores. Há assim um novo conceito de audiência: 1) um público mais generalizado e não uma elite educada; 2) um público politicamente menos homogêneo. (TRAQUINA, 2005, p.50)
Este novo paradigma passa a ser partilhado entre a sociedade e os jornalistas, assim constituindo o que o autor chama de um novo grupo social, ou seja, o jornalista reivindica um monopólio do saber – o que é notícia, a comercialização da imprensa – a informação como mercadoria. A comercialização e profissionalização dos profissionais marcaram a evolução da atividade jornalística. Sendo que no final do XIX surge uma imprensa mais sensacionalista, aquilo que se chamou de “jornalismo amarelo” nos Estados Unidos. Os jornais populares constroem sua legitimidade de outros parâmetros, relacionando-se de uma forma peculiar com o mundo do seu público leitor. Precisam falar do universo do seu público-alvo, adotam uma estética pragmática, sem levar em conta se as informações são do âmbito do privado ou do entretenimento. Além disso, são obrigados, por interesses mercadológicos, a utilizar determinados recursos temáticos, estéticos e estilísticos deslocados do discurso jornalístico tradicional. (AMARAL, 2006, p.57)
Nesta pesquisa, classificaremos o jornal Super Notícia como jornal popular. Entendese que este se destina a setores populares da sociedade, diferenciando-se do jornal O Tempo,
15 que denominaremos como jornal de referência, ou seja, segue o padrão dos jornais tradicionais, preza pela seleção de notícias, enquadramentos e fontes, que atendem aos interesses informativos de forma mais abrangente.
Considero jornais de referência os grandes jornais consagrados econômica e politicamente ao longo da história, que dispõem de prestígio no país e são dirigidos às classes A e B. Os jornais de referência são também conhecidos como quality papers2 (jornais de qualidade) e considerados veículos de credibilidade entre os fornecedores de opinião. Os jornais populares constroem sua legitimidade de outros parâmetros, relacionando-se de uma forma peculiar com o mundo do seu público leitor. Precisam falar do universo do seu público-alvo, adotam uma estética pragmática, sem levar em conta se as informações são do âmbito do privado ou do entretenimento. Além disso, são obrigados, por interesses mercadológicos, a utilizar determinados recursos temáticos, estéticos e estilísticos deslocados do discurso jornalístico tradicional. (AMARAL, 2006, p.57)
Nos últimos quinze anos foram lançados inúmeros jornais populares no mercado editorial brasileiro. Eles se tornaram um fenômeno. Um exemplo disso é o Super Notícia, que vende quase 300 mil exemplares diariamente. Com um formato compacto, o jornal segue a tendência mundial, com preço baixo, linguagem acessível, projeto gráfico atraente, anúncios de produtos populares e serviços voltados para o público de baixa renda. O jornal O Tempo se distancia do Super Notícia pela abrangência de notícias e pelo público-alvo: destina suas informações prioritariamente para os públicos das classes A e B, ou seja, uma menor parcela da sociedade. Geralmente, este público leva em conta informações de qualidade e com profundidade na notícia, formação de opinião e temas diversos. Para Amaral (2006) o público leitor dos jornais de referência, neste caso O Tempo, tem um nível de escolaridade e de exigência maior sobre o veículo, fazendo com que esses jornais tenham maior qualidade.
O jornalismo de referência fala, sobretudo, com o leitor interessado no mundo público. É preciso compreender que todos os grandes jornais movem-se pelos interesses comerciais, mas os jornais de referência, para terem sucesso comercial, precisam antes de tudo ter credibilidade e prestígio perante os formadores de opinião. (AMARAL, 2006, p.55)
Bastante diferente é o jornalismo popular que se instaura não mais em critérios como imparcialidade ou credibilidade, mas por meio de uma comunicação quase sensorial com o público:
2
Grifo da autora.
16 A imprensa popular ligada a grandes empresas de comunicação existe pela necessidade de ampliar o mercado de consumidores de jornais para um público que vive numa situação social, cultural e econômica diferente da do público das classes A e B. Os jornais assumem formas específicas, porque o que move essa imprensa é, antes de qualquer coisa, a sedução do público e não a credibilidade ou prestígio.” (AMARAL, 2006, p.58)
Para Amaral (2006), os jornais de referência e os populares, mesmo quando pertencem à mesma empresa, não funcionam seguindo os mesmo padrões, pois eles respondem a mercados e atendem a anunciantes e eleitores diferentes. As definições que fizemos para entender a lógica dos jornais nos auxiliarão na fase da análise comparativa do O Tempo e Super Notícia, visando compreender o contrato de comunicação de cada um.
17
CAPÍTULO 2 - O JORNALISMO MINEIRO E OS JORNAIS “O TEMPO” E “SUPER NOTÍCIA” 2.1 HISTÓRIA DOS JORNAIS O TEMPO E SUPER NOTÍCIA
Apesar dos inúmeros rumores de que o jornal impresso vai acabar devido ao advento da internet, ele ainda é uma realidade no estado de Minas Gerais, onde a vendagem de alguns diários tem aumento a cada dia. No início da década de 1960, com os conflitos político-ideológicos no país, Belo Horizonte, chegou a ter 11 jornais, sendo nove diários.3 O único a circular até os dias de hoje é o Estado de Minas, fundado em 1929 e adquirido por Assis Chateaubriand, no ano seguinte (CARRATO, 2002). Segundo Carrato (2002), no ano de 1988, o então governador do estado, Newton Cardoso (PMDB), decide criar um novo jornal, surgindo o Hoje em Dia. O jornal veio com um planejamento visual diferente, com policromia nas capas e contracapas de seus cadernos, diferente da diagramação conservadora do Estado de Minas, preto e branco. O Hoje em Dia revoluciona a imprensa mineira pelas cores e com o slogan “Um jornal de verdade” e passa então a concorrer com o Estado de Minas. Ainda na década 80, o jornal Hoje em Dia é adquirido pelo bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, ficando Newton Cardoso como acionista minoritário. Até o final do ano de 1996, a disputa por leitores era travada apenas pelos dois jornais, até que no dia 21 de novembro daquele ano, a Sempre Editora lançou um mais novo concorrente. Buscando uma fatia do mercado, o empresário e deputado federal Vittorio Medioli decide contratar uma equipe de consultores, tendo à frente o jornalista Herval Braz, com a responsabilidade de elaborar o projeto de uma nova publicação diária no estado. Este novo jornal foi batizado de O Tempo (CARRATO,2002). O investimento foi de 25 milhões para a criação e implantação do parque gráfico do jornal, que passaria a atender também a produção do semanário Jornal da Pampulha, que é distribuído somente aos domingos.
Disposto a não só enfrentar a concorrência como a inovar, O Tempo lança-se na tarefa de recuperar para o jornal um grande número de leitores que migraram das 3
Segundo Carrato são esses os jornais existentes no início da década de 1960 em Belo Horizonte: Estado de Minas, Diário da Tarde, Diário de Minas, O Debate, O Diário, Correio de Minas, Informador Comercial, Binômio, Última Hora (edição mineira).
18 publicações locais para os jornais de circulação nacional. Para tanto, aposta numa boa cobertura nacional e internacional, enfatizando igualmente o tratamento dos temas regionais e locais. (CARRATO,2002, p.479)
Projetado e instalado na cidade de Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, o novo jornal mexeu com o mercado. Tanto o Hoje em Dia quanto o Estado de Minas foram obrigados a agir para evitar a perda de leitores para o novo concorrente. Para isso, o Estado De Minas cria um programa interno de capacitação voltado para novos valores do jornalismo. Já o Hoje em Dia optou por utilizar o marketing para manter seus leitores. Após 100 dias da primeira publicação, O Tempo lançou um caderno especial e estipulou a meta: “Vender 40 mil exemplares dia até o final do ano, além de transformar a publicação numa das mais lidas no Estado” (CARRATO, 2002, p.479-480). Nesta data, a empresa investe em campanha de assinaturas e marketing nos principais meios de comunicação. Em 24 de março de 2008, o jornal O Tempo adota o formato tablóide (6 colunas x 38 cm), seguindo, de acordo com a empresa, uma tendência dos principais jornais do mundo. O novo formato chega com a promessa de manter a imparcialidade e ousadia na divulgação das notícias. Entre as novidades estão os cadernos de turismo, automóveis, imóveis e um caderno de classificados aos domingos. Atualmente, O Tempo tem circulação diária em 344 municípios mineiros e nas praças de Brasília, São Paulo, Guarapari e Vitória, com cadernos de Política, Economia, Esportes, Cidades, Magazine, Opinião (com coluna de Arnaldo Jabor às terças-feiras e Trigueirinho aos domingos) e Pandora (Caderno feminino) com circulação nos domingos. Outros cadernos chamados pelo jornal de suplementos são compostos por Imóveis & Construção, Fim de Semana, O Tempinho (voltado para o público infantil), TV Tudo, Viagens, Carro & Cia, Guia do Assinante e Classificados.4 Vendido por R$ 1,00 de segunda a sábado e por R$ 2,00 aos domingos, O Tempo conseguiu atingir sua meta e hoje, além do reconhecimento estadual e nacional, tem tido uma vendagem acima de 40 mil exemplares. Segundo dados de janeiro de 2012 do Instituto Verificador de Circulação, o jornal O Tempo teve uma média de venda diária de 42.732 exemplares, à frente de um dos concorrentes diretos, o Hoje em Dia, com 26.155 exemplares vendidos por dia. 4
Os dados dos municípios mineiros e praças onde circulam o jornal O Tempo e os dias de publicação dos cadernos chamados de suplementos foram retirados de arquivos enviados por e-mail pela Sempre Editora no dia 27/02/2012. Os arquivos foram anexados ao final da presente pesquisa
19 Para continuar crescendo, em maio de 2002, a Sempre Editora lança um novo jornal, desta vez com um enfoque popular direcionado para as classes B, C e D. Surge então o Super Notícia. Na linha editorial ganham destaques temas com sexo, crimes, esportes, noticiário da TV, celebridades, classificados e prestação de serviço. Quando foi lançando, o Super Notícia era vendido a R$ 0,50. Segundo Amaral (2006), em 2005 o Diários dos Associados lança ao preço de R$ 0,25, o jornal Aqui, destinado ao público das classes C e D. O preço agressivo fez com que o Super Notícia, baixasse seu preço para o mesmo valor. Desde então, o Super Notícia tornou-se o jornal mais lido do estado, desbancando o tradicional jornal Estado de Minas, que foi líder de vendas durante quatro décadas. Em alguns meses o Super Notícia lidera a lista de jornais nacionais mais vendidos, ficando alguns períodos à frente do tradicional jornal Folha de S. Paulo. Dados do Instituto Verificador de Circulação5 mostram que a vendagem do jornal Super Notícia durante janeiro de 2012 atingiu a média diária de 294.997 exemplares, enquanto o Estado de Minas vendeu, em média, 66.544 exemplares por dia. O Super Notícia, por ser um jornal popular e com baixo valor de comercialização (R$ 0,25), não possui assinatura. Como estratégia para chegar ao leitor, além das bancas de jornal, ele também é vendido em pontos alternativos de venda por ambulantes nas ruas. Com cores atraentes, o Super Notícia, possui o formato de tablóide com o mesmo tamanho do O Tempo (6 colunas X 38 centímetros), também circula em 344 cidades mineiras e nas praças de Brasília, São Paulo, Guarapari e Vitória.
2.2 UMA REDAÇÃO E DOIS CONTEÚDOS A escolha do tema desta pesquisa, “Uma redação, dois conteúdos: os elementos jornalísticos na primeira página de O Tempo e Super Notícia”, fez com que nós olhássemos além do objeto de pesquisa. Para isso, identificamos as matérias com o mesmo assunto na primeira página dos jornais O Tempo e Super Notícia, e em seguida, verificamos a autoria das fotos e dos textos contidos na parte interna dos tablóides. O objetivo desta análise é identificar matérias e fotos na primeira página dos dois jornais realizadas pelos mesmos profissionais, assim podemos afirmar que eles pertencem a uma única redação. 5
Os dados da vendagem dos Super Notícia baseia-se no Instituto Verificador de Circulação. Os arquivos foram enviados por e-mail pela Sempre Editora no dia 27/02/2012, e foram anexados ao final da presente pesquisa.
20 Na edição de 29 de fevereiro de 2012, a manchete esportiva sobre o jogo do clube América ganha destaque na primeira página dos dois jornais. O Tempo destaca a manchete “América recebe o Villa Nova”, enquanto o Super Notícia traz “Coelho encara o invicto Leão de olho na liderança do mineiro”. Em ambos os jornais as matérias foram redigidas pelo repórter Lucas Morais com foto do fotógrafo Alisson Gontijo. Na editoria de Cidades o Super Notícia, publicou como manchete principal “Enfermeiro abusa de paciente sedado”. O Tempo destacou o mesmo assunto com o título “Paciente é violentado durante internação em hospital”. As matérias dos dois jornais foram feitas pela repórter Karina Alves, com foto de autoria de Ângelo Pettinati. Os dois exemplos que identificamos na primeira página desta edição demonstram que naqueles dias o mesmo jornalista e fotógrafo (a) saíram a serviços dos dois jornais, o que reforça o nosso argumento de uma única redação. Na edição de 1o de março, a manchete principal de O Tempo destaca “Minas Gerais sofre com epidemia de violência” e, no Super Notícia, “Capital vive epidemia de violência”. As duas matérias foram feitas pela repórter Joana Suarez com imagem novamente produzida por Ângelo Pettinati. Este é mais um dos exemplos que identificamos e que reforça nosso argumento de que os dos jornais pertencem à mesma redação. Na edição de 2 de março de 2012, a manchete de cidades da primeira página de O Tempo destaca: “Insegurança. Criminosos roubam 16 veículos por dia em Belo Horizonte”. Já o Super Notícia usa a manchete “BH tem 16 carros roubados por dia”. As duas matérias foram feitas pela repórter Iane Chaves com imagem produzida por Cristiano Trad. Na edição do dia 3 de março, identificamos outro exemplo que reforça ainda mais a ideia de que os jornais são produzidos por uma mesma redação. Na análise dos textos e fotos das manchetes “Beleza na areia”, de O Tempo, e “Arte na Areia”, do Super Notícia, notamos o mesmo texto nos dois jornais, no entanto, a assinatura do repórter Rafael Rocha não aparece na matéria publicada em O Tempo. Nesta edição identificamos mais duas matérias na primeira página dos dois jornais com o mesmo assunto, feitas pelos mesmos profissionais. Na edição do dia 4 de março, a manchete de esporte sobre uma vitória do Cruzeiro é destaque da primeira página dos dois jornais e as matérias foram assinadas pelo repórter Lucas Morais, com foto de André Fossati. Na edição de 5 de março, localizamos duas matérias da primeira página com o mesmo assunto e de autoria do repórter Thiago Nogueira, mais uma vez com uma imagem capturada por André Fossati.
21 Das sete primeiras páginas que analisamos, entre 29 de fevereiro e 6 de março de 2012, apenas na última não identificamos manchetes da primeira página com conteúdos produzidos pelos mesmos profissionais. Esta análise dos conteúdos da primeira página demonstra que os jornais O Tempo e Super Notícia, utilizam os mesmos repórteres e fotógrafos para fazerem coberturas de assuntos que serão publicados pelos dois tablóides. Com isso podemos afirmar que os dois jornais compartilham a equipe de profissionais (jornalistas/fotógrafos), justificando o tema da pesquisa “Uma redação, dois conteúdos”.
22
CAPÍTULO 3 - ANÁLISE DA PRIMEIRA PÁGINA DOS JORNAIS “O TEMPO” E “SUPER NOTÍCIA” 3.1 METODOLOGIA
O método de pesquisa utilizado neste trabalho discute as principais diferenças entre dois jornais impressos da mesma empresa de comunicação. O estudo aborda as principais diferenças dos elementos que compõem a primeira página dos jornais O Tempo e Super Notícia. Por isso, foram analisados os aspectos que interferem no tratamento das notícias publicadas nos dois veículos e realizado um estudo bibliográfico, análises do discurso e dos conteúdos, além da comparação entre textos, imagens e cores que compõem a principal página dos jornais. O método comparativo permitiu fazer uma análise detalhada do corpus, constituído das primeiras páginas dos jornais O Tempo e Super Notícia no período de 29 de fevereiro a 6 de março de 2012. O espaço de coleta foi de uma semana, pois o objetivo é fazer uma pesquisa dentro da lógica semanal dos jornais. Cada edição, de segunda a domingo, possui uma “cara” própria, um conteúdo característico. Após a rodada esportiva, geralmente nos jornais de segunda e de quinta-feira, tanto O Tempo quanto o Super Notícia destacam na primeira página as notícias do futebol. Outro exemplo que podemos apontar são os cadernos e as colunas do O Tempo com publicações em dias específicos, a coluna Opinião (com Arnaldo Jabor às terças-feiras e Trigueirinho aos domingos) e o caderno feminino, Pandora, com circulação aos domingos. Se a mostra da pesquisa fosse superior a uma semana, possivelmente teríamos o mesmo resultado, devido esta lógica de publicação dos jornais. Para fundamentar a análise comparativa da primeira página dos jornais, realizamos uma pesquisa bibliográfica para garantir o embasamento teórico. Também contamos com a colaboração da empresa Sempre Editora, que nos enviou arquivos com dados de vendagem e público-alvo dos jornais. Após pesquisar a história dos jornais, partimos para a análise do contrato de comunicação que cada um firma com seu público-leitor. A metodologia adotada na presente pesquisa segue de uma perspectiva macro, que dê conta de aspectos gerais, até alcançar elementos específicos numa visada micro. Para tanto, fizemos uma análise geral das 14 primeiras páginas selecionadas, comparando os temas abordados, as imagens e as cores utilizadas dentro da composição da notícia. Em seguida, foram analisados os jornais dia a dia,
23 traçando um comparativo detalhado entre as edições. Assim, foi possível chegar à conclusão de como os jornais firmam o contrato de comunicação com o leitor. 3.2 ANÁLISE GERAL
Das 14 primeiras páginas, sendo sete de cada jornal, que compõem a amostra desta pesquisa, analisamos os temas que tiveram destaques nas edições e ocuparam a principal página do jornal. Destaque de temas na primeira página do “O Tempo”
Figura 1: Gráfico demonstrativo dos temas da primeira página do O Tempo
Nos sete dias analisados, podemos perceber que os assuntos de cidades prevaleceram na capa de O Tempo, porém, diferente do Super Notícia, O Tempo destacou apenas três casos policiais, das 18 manchetes, sendo as outras 15 de assuntos que envolvem a cidade de alguma forma. Vale fazer esta ressalva, uma vez que separamos os assuntos de cidades dos casos policiais no Super Notícia, como mostra o gráfico “Destaque de temas na primeira página do Super Notícia”. O contrato de comunicação do O Tempo permite destacar na primeira página as principais colunas da edição, o que justifica o número de manchetes de colunas diárias no gráfico. O que também apareceu durante todas as edições analisadas foram as manchetes de economia, que tiveram uma média de duas por edição, em seguida a política, com nove manchetes ao logo de sete dias. Decidimos separar no gráfico o futebol dos demais esportes pelo fato de o Super Notícia dar maior destaque para a modalidade. O resultado mostra que, apesar de o futebol ter
24 sido destaque oito vezes na primeira página do O Tempo, o jornal também destacou outros esportes, totalizando oito manchetes. Diferentemente do Super Notícia, que não abre espaço para temas culturais, O Tempo destacou oito manchetes da editoria de cultura. Outra observação que fizemos é sobre as notícias nacionais. O Tempo destacou seis manchetes do caderno Brasil (Nacional), enquanto o Super Notícia noticiou apenas uma durante as sete edições analisadas. O Tempo também destacou na primeira página notícias dos seus cadernos denominados “Suplementos”. Foram destaque matérias do caderno Carro&Cia, Viagens, Interessantes, Tecnologia, TV Tudo e Pandora (caderno feminino).
Destaque de temas na primeira página do “Super Notícia”
Figura 2: Gráfico demonstrativo dos temas da primeira página do Super Notícia
Na primeira página do jornal Super Notícia os assuntos policiais, o futebol e a imagem de mulher (muitas vezes seminua) estiveram presentes em todas as sete edições. Para quantificar os elementos da primeira página, separamos os assuntos policiais da editoria de cidades, o futebol de outros esportes, e foto da mulher classificamos como “erotismo”. Desta forma, o gráfico acima mostra os assuntos que foram destaques nas sete edições do Super Notícia, tanto em manchetes, quanto em noticia seguida de foto. Através do gráfico podemos perceber que as manchetes sobre crimes, juntamente com o futebol, predominaram sobre os demais temas, tendo uma média de duas matérias por edição. A foto da mulher também marcou presença em todas as edições. Diferente de O Tempo, que deu destaque a oito manchetes de futebol, mas também dedicou espaço para oito chamadas de capa sobre outros esportes, o Super Notícia destaca 14 manchetes de futebol e apenas uma de outros esportes. O jornal popular também deixou os
25 temas nacionais de fora de seis edições, noticiando um destaque da editoria em apenas uma edição. Outras observações que fizemos no Super Notícia foram com relação à publicidade. Em cada edição analisada o jornal estampou na primeira página cinco peças publicitárias, totalizando 35 ao longo das sete edições. Apesar de as publicidades serem promoções, produtos e classificados do próprio jornal, elas não têm espaço na principal página de O Tempo. Outro aspecto que não podemos deixar de analisar tanto em O Tempo, quanto no Super Notícia, são as cores presentes na diagramação da primeira página dos jornais. Para Guimarães (2003), a primeira leitura que fazemos da primeira página de um jornal é uma comunicação não-verbal, ou mesmo pré-verbal, pois no todo do padrão visual, as cores se antecipam às formas e aos textos. Portanto, quanto maior o potencial de informação das cores, maior será antecipação da informação. Para seduzir seu leitor através da primeira página O Tempo possui uma tonalidade clara, equilibrando os elementos visuais, proporcionando uma leitura harmoniosa. A manchete principal se destacada na parte superior e as demais são distribuídas juntamente com fotos, ilustrações e infográficos que hierarquizar as informações. A cor em O Tempo é utilizada para identificar seus cadernos e colunas do dia. O Super Notícia, com seu forte caráter popular, utiliza muito mais cores do que O Tempo. A manchete principal fica na para superior em um espaço delimitado muitas vezes por cores fortes (preto, vermelho e azul). Como poderemos verificar na parte da análise detalhada, muitas vezes a primeira página do Super Notícia, por utilizar muitas cores, fotos e manchetes com letras garrafais, dá um aspecto de poluição, tornando sua primeira página mais chamativa se comparada com a do O Tempo. Para fazer esta análise da primeira página dos jornais utilizaremos o termo corinformação toda vez que a cor fizer parte da construção da notícia. Considera-se a cor como informação todas as vezes em que sua aplicação desempenhar uma dessas funções responsáveis por organizar e hierarquizar informações ou lhes atribuir significado, seja sua atuação individual e autônoma ou integrada e dependente de outros elementos do texto visual em que foi aplicada (formas, figuras, texturas, textos, ou até mesmo sons e movimentos, como em produtos multimídia). Quando quiser enfatizar o uso desse conceito, utilizarei o termo cor-informação. (GUIMARÃES, 2003, p.31)
Podemos identificar a cor-informação nas manchetes de esporte de O Tempo, que usa o amarelo no fundo das notícias, seja de texto, foto ou infográficos, para chamar a atenção do
26 leitor e informar que naquele espaço haverá exclusivamente notícias ligadas ao mundo esportivo. No Super Notícia, a presença da cor-informação também é percebida nas manchetes de futebol, principalmente quando as notícias são dos times da capital mineira. Na análise detalhada da primeira página podemos identificar as cores usadas pelos times delimitando o espaço da notícia e da foto. O jornal O Tempo também usa a cor-informação para identificar o caderno de cultura. Neste caso, a tonalidade vinho delimita o espaço das manchetes. As colunas também são delimitas por cores verde, azul e cinza. Já no Super Notícia, as manchetes de violência, assassinato e morte utilizam o vermelho, enquanto as manchetes de abuso sexual e luto lançam mão do preto. A cor-informação tem presença garantida nas 14 primeiras páginas analisadas por esta pesquisa, pois carrega a função de chamar atenção do leitor, ajudar a hierarquizar e situar a leitura através da primeira página.
3.3 ANÁLISE DAS 14 PRIMEIRAS PÁGINAS DOS JORNAIS Quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012
Figura 3: Primeira página do O Tempo 29/02
Figura 4: Primeira página do Super Notícia 29/02
27
A primeira página do jornal O Tempo, edição de 29 de fevereiro de 2012, é composta por 15 manchetes das editorias Brasil (Nacional), Economia, Política, Cidades, Carros & Cia, Viagens, Colunas do dia e Esporte. No Super Notícia a primeira página é composta por oito manchetes de três editorias: Cidades, Esporte e Variedades. As manchetes destacadas na primeira página mostram o espaço de tematização conforme citado por Charaudeau (2006), ou seja, os jornais selecionaram os principais temas abordados dentro da edição a partir de domínios do saber e por meio da organização do discurso. O Tempo tem como manchete principal “Turista terá que dormir em motel durante a Copa”. A matéria é baseada em uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que divulgou dados sobre a hospedagem no Brasil visando à Copa do Mundo de 2012. O estudo identificou que 23,5% das vagas para hospedagem estão em motéis, justificando o título da principal manchete do jornal. Nesta manchete o jornal O Tempo utilizou a visada informativa, “que consiste em querer “fazer saber”, isto é, querer transmitir um saber a quem presume não possuí-lo” (CHARAUDEAU, 2006, p. 69). No Super Notícia a manchete principal, “Enfermeiro abusa de paciente sedado”, faz um relato de um suposto abuso sexual. Segundo o jornal, o homem teria sido violentado por um técnico em enfermagem dentro de uma Unidade de Pronto-Atendimento (UPA), em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. Na manchete do Super Notícia o jornal utilizou a visada de páthos, “que consiste em “fazer sentir”, ou seja, provocar no outro um estado emocional agradável ou desagradável” (CHARAUDEAU, 2006, p. 69). Nesta edição, o assunto com o maior número de manchetes na primeira página, em ambos os jornais, é o esporte, com quatro em cada um. Em O Tempo, “Seleção joga mal e vence a Bósnia com gol contra no fim da partida”, “Sada enfrenta o Minas em clássico”, “América recebe o Villa Nova” e o destaque da coluna do Tostão, “Entre os grandes times, o Corinthians é o mais organizado, e o São Paulo, o mais desorganizado”. No Super Notícia, “Gol contra no final salva time de Mano”, “Cruzeiro anuncia que irá homenagear ídolos estrangeiros”, “Goleador André tenta repetir a trilha de Tardelli no Atlético” e “Coelho encara o invicto Leão de olho na liderança do Mineiro”. Os dois jornais concedem espaço na primeira página para o noticiário da Seleção Brasileira, no entanto, o Super Notícia também destaca informações dos times da capital mineira (América, Atlético e Cruzeiro). Diferentemente de O Tempo, que publicou apenas manchete do América, pelo fato de o time jogar naquele dia pela liderança do Campeonato Mineiro, o Super Notícia destaca as informações do Cruzeiro e Atlético, notícias estas que,
28 para O Tempo, não têm valor-notícia para a primeira página, pois elas refletem apenas situações interna dos clubes, sendo reservadas apenas aos leitores do caderno de Esporte. Segundo Wolf (1987), os valores-notícias são componentes da noticiabilidade, que agem uns em relação aos outros, a fim de complementar a seleção de um fato a ser noticiado ou não. A primeira página de O Tempo é composta por seis fotos/imagens. A de maior destaque é da cerimônia fúnebre de dois oficiais, mortos após incêndio na base da Antártida. Isto demostra que o contrato de comunicação do jornal permite dois tipos de destaques diferentes, a manchete principal e a foto de outro fato com grande valor-notícia, ou seja, nem sempre a informação mais importante será ilustrada pela foto de maior destaque da publicação. No Super Notícia três fotos estampam a primeira página, além da imagem do escudo dos três times da capital mineira. A manchete principal, "Enfermeiro abusa de paciente sedado”, tem a foto do rosto do acusado dentro de um círculo identificando-o. Outra foto é da seleção brasileira comemorando o gol feito. Porém, a que mais chama atenção é a imagem da participante do Big Brother Brasil, Laisa Portela, seminua, que ocupa grande parte da primeira página. A escolha da forma de falar, o uso de linguagem e imagens tanto em O Tempo quanto Super Notícia, “constituem as restrições discursivas de todo ato de comunicação”, (CHARAUDEAU, 2006, p. 70). Nesta edição podemos verificar que O Tempo firma o contrato de comunicação oferecendo informações nacionais e regionais com temáticas diversas. O Super Notícia também firmar o contrato de comunicação fornecendo informações regionais, mas o foco está na Grande BH. Também podemos perceber na primeira página do Super Notícia o tripé, violência, futebol e erotismo.
29 Quinta-feira, 01 de março de 2012
Figura 5: Primeira página do O Tempo 01/03
Figura 6: Primeira página do Super Notícia 01/03
A primeira página do jornal O Tempo, edição de 1o de março de 2012, é composta por 14 manchetes das editorias Brasil (Nacional), Cidades, Colunas do dia, Cultura, Economia, Esporte e Política. No Super Notícia a primeira página é composta por cinco manchetes das editorias de Cidades, Esporte e Variedades. Nesta edição de O Tempo, a manchete principal destaca os dados de um estudo sobre a violência divulgado pelo Governo do Estado: “Minas Gerais sofre com epidemia de violência”. Mais uma vez encontramos a visada informativa (Charaudeau, 2006). No Super Notícia a manchete principal relata um homicício: “Assassinada com 6 tiros pelo ex”. A manchete direta, forte, com detalhes (o número exato de disparos) e a palavra “assassinada” revelam a dimensão da visada páthos (Charaudeau, 2006). O fato com maior valor-notícia em O Tempo, ganha destaque na parte inferior da página do Super Notícia, “Capital vive epidemia de violência”. Enquanto o primeiro destaca o estudo sobre a violência englobando todo o estado, o segundo restringe a notícia à capital mineira. O Tempo destaca os dados que dizem que houve aumento na criminalidade de 2010 para 2011 no estado de Minas Gerais. Segundo os dados divulgados pelo jornal, foram 553 homicídios a mais em 2011 em relação ao ano anterior. O Super Notícia, que destaca matérias de violência na sua primeira página, sendo que em vários dias da semana o assunto torna-se
30 manchete principal, nesta edição optou por relatar um caso isolado de assassinato para aflorar a dimensão emocional do leitor. Outro aspecto que chama a atenção na manchete é a palavra “assassinada”, que ocupa quase toda a primeira linha da manchete, contribuindo para o caráter sensacionalista. Nesta manchete a cor-informação marca presença, uma vez que o vermelho escuro remete à cor de sangue e delimita o espaço da manchete sobre o homícídio. Na parte de esporte, tanto as manchetes do Super Notícia quanto de O Tempo destacam os resultados dos jogos de futebol. No O Tempo as manchetes são “América ganha do Villa de Virada” e “Minas vence clássico contra o Sada”. No Super Notícia, “Coelho bate Leão de virada” e “Sada Cruzeiro abre placar de 2 a 0 em cima do Vivo-Minas, mas perde de virada em jogo de muita emoção pela Superliga”. Enquanto O Tempo utiliza os nomes dos clubes de futebol na manchete, o Super Notícia utiliza a forma popular de se referir aos times, ou seja, pelos nomes dos mascotes: Coelho e Leão. Mais uma vez, nota-se explicitamente o apelo ao popular no contrato de comunicação. A cor-informação, conforme defende Guimarães (2003) foi utilizada nos dois jornais. Em O Tempo o amarela ocupa o fundo da manchete remetendo ao caderno de esporte, enquanto no Super Notícia a cor que predomina no fundo é o verde, que remete ao time vencedor do dia anterior: o América Mineiro. A foto de maior destaque na primeira página do Super Notícia é da atriz Carol Castro. A manchete diz: “Morena Solterinha”. A foto mostra a atriz de biquíni e ocupa grande parte da página. A imagem sensual não tem relação direta com o conteúdo da notícia, uma vez em que o objetivo dela é informar que atriz está solteira e que vai integrar ao elenco da próxima novela das seis da Rede Globo, “Amor Eterno Amor”. Em O Tempo a foto de maior destaque é de uma cena da peça teatral “Romeu e Julieta”, com a seguinte manchete, “Um Shakespeare após 20 anos”. Outro destaque é a foto da cantora Maria Rita, com a manchete “Maria Rita traz Elis em show gratuito na Capital”. Charaudeau (2006, p.72) define a instância de produção com um duplo papel: “de fornecedor de informações, pois deve fazer saber, e de propulsor do desejo de consumir as informações, pois deve captar seu público”. Nesta edição de O Tempo percebemos a preocupação do jornal em disponibilizar as principais manchetes de cada editoria e as colunas do dia na primeira página. No Super Notícia, identificamos novamente o tripé, violência, futebol e erotismo.
31 Sexta-feira, 2 de março de 2012
Figura 7: Primeira página do O Tempo 02/03
Figura 8: Primeira página do Super Notícia 02/03
A primeira página do jornal O Tempo, edição 2 de março de 2012, é composta por 12 manchetes das editorias de Cidades, Colunas do dia, Cultura, Economia, Esporte, Gastronomia, Política e o destaque para o título do editorial. No jornal Super Notícia a primeira página é composta por oito manchetes das editorias de Cidades, Esporte e Variedades. A manchete principal do O Tempo, “Prefeitura autoriza prédios na Pampulha”, divulga a autorização para a construção de dois hotéis na região, contrariando a vontade de moradores e especialistas. No Super Notícia a manchete principal, “Aluno morre ao cair de escolar", relata um acidente que aconteceu na cidade de Paracatu, Minas Gerais, e acarretou na morte de um adolescente. Na primeira página dos dois jornais, identificamos novamente a diferença no espaço de tematização de cada um. O Tempo, além de exibir foto da região onde serão construídos os prédios, ainda destaca que o ato foi de autoritarismo e ressalta a opinião dos moradores e especialistas, dando ênfase à dimensão reflexiva. O jornal também expõe a sua opinião e destaca o título do editorial: “Vergonha, vergonha”. O título do editorial na primeira página assume a função da visada prescritiva, “que consiste em querer “fazer fazer”, isto é, querer levar o outro a agir de uma determinada
32 maneira” (CHARAUDEAU, 2006, p.72). A opinião do jornal na primeira página com a palavra “vergonha” repetida duas vezes faz com que o leitor se coloque no lugar dele e sinta a mesma revolta. Este fato nos chama atenção, pois, nos dias atuais, dificilmente o editorial do jornal ganha destaque na primeira página. No Super Notícia a informação sobre a construção de hotéis na Pampulha não tem lugar na primeira página e o jornal prefere destacar o acidente no escolar e colocar uma foto do veículo. No esporte, O Tempo destaca o automobilismo com a foto do piloto Rubens Barrichello e a manchete, “Depois da F1 Rubinho tenta renascer na Fórmula Indy”. A informação e a foto do piloto ficam no tradicional box amarelo que destaca o noticiário esportivo do Jornal. Abaixo o jornal coloca a cor preta e a escrita amarela para dar a má notícia da editoria: “Solução para ‘grades’ em estádio só depois do Mineiro”, afirmando que o estádio Independência não ficaria pronto para o campeonato regional. O Super Notícia destaca as informações sobre os três times mineiros (América, Atlético e Cruzeiro) da capital e do Guarani de Divinópolis, pelo fato do clube ter tentado contratar o goleiro Bruno, que está preso. Nessa edição, O Tempo destacou também manchete de Gastronomia, “Chefs revelam os ingredientes que não falham”, e de Cultura, “Drive, a zebra de Cannes estréia hoje”. No Super Notícia a foto que mais chama a atenção é da apresentadora Ana Hickmann, de biquíni, acompanhada da machete “Loira poderosa”. Na primeira página desta edição do O Tempo e Super Notícia, apenas uma notícia aparece nos dois tabloides. No primeiro, “Criminosos roubam 16 veículos por dia em Belo Horizonte”, no segundo, “BH tem 16 carros roubados por dia”. Através desta breve análise desta edição dos jornais, identificamos que O Tempo disponibilizou grande parte da sua primeira página para assunto de cidades, pois naquele dia o fato com maior valor-notícia era desta editoria, porém, não deixou de noticiar os fatos mais importantes e curiosos da edição. O Super Notícia não se distanciou de seus temas recorrentes: violência, futebol e erotismo.
33 Sábado, 03 de março de 2012
Figura 9: Primeira página do O Tempo 03/03
Figura 10: Primeira página do Super Notícia 03/03
A primeira página do jornal O Tempo, edição 3 de março de 2012, é composta por 14 manchetes das editorias de Cidades, Colunas do dia, Cultura, Economia, Esporte e Política. No Super Notícia a primeira página é composta por oito manchetes das editorias de Cidades, Esporte, Geral e Variedades. No jornal O Tempo, a manchete principal, “Governo omite dados de crimes no interior”, diz que secretaria corrigiu o número de cidades sem registro de violência. No Super Notícia a manchete principal, “Aposentada morre em suposto ritual", relata que cinco filhas da vítima teriam deixado a mãe, que é diabética, por 20 dias sem remédio e com alimentação precária. Uma montagem com as fotos das cinco filhas da vítima aparece em destaque e toda a comunicação visual se dá pelo uso do box vermelho que envolve a informação. Mais uma vez, verifica-se o intuito do jornal de causar uma reação imediata no leitor, neste caso, de repúdio, ódio, comoção, bem diferente ao convite à reflexão presente na manchete de O Tempo. Nesta edição, a foto do argentino Oscar Luiz fazendo uma escultura de areia em uma calçada na Avenida do Contorno, no bairro Floresta, em Belo Horizonte, é compartilhada entre os dois jornais, que destacam a imagem na primeira página.
34 Outra manchete que teve sua foto destacada no O Tempo mostra que um casal gay registrou a filha que foi gerada por fertilização in vitro. No Super Notícia a manchete “Casal gay registra filha concebida por fertilização” não tem foto. No esporte, outro destaque da primeira página dos dois jornais é a partida do Cruzeiro. No jornal O Tempo, “Cruzeiro e América-To jogam hoje na Arena”, já o Super Notícia destaca, “Raposa ataca o Dragão”. Novamente, o jornal se utiliza dos mascotes para dá ênfase ao confronto em uma perspectiva popular. Nessa edição do Super Notícia o destaque de Variedades é Tatiana Viana. A foto da jovem ocupa grande parte da primeira página com a manchete “Super Gata”. A informação diz, “Morena cheia de charme, Tati adora estar com os amigos e quer ser uma grande modelo fotográfica”. Não existe qualquer justificativa, segundo os critérios de noticiabilidade que norteiam o jornalismo, para a foto estar primeira página. O fato é que a jovem na primeira página preenche o lugar da mulher seminua, como prevê o contrato de comunicação do jornal.
Primeira página 5 – Domingo, 04 de março de 2012
Figura 11: Primeira página do O Tempo 04/03
Figura 12: Primeira página do Super Notícia 04/03
A primeira página do jornal O Tempo, edição de 4 de março de 2012, é composta por 13 manchetes das editorias de Cidades, Colunas do dia, Cultura, Economia, Esporte, Pandora (Caderno Feminino), Política e TV Tudo. No Super Notícia a primeira página é composta por
35 seis manchetes das editorias de Cidades, Esporte e Variedades. A manchete principal do O Tempo destaca, “Igreja recebe 200 pedidos de anulação de casamentos”. O principal destaque do Super Notícia sobre o futebol: “Cruzeiro vence a 4ª seguida e pressiona os rivais”. Além da manchete, o jornal publica uma foto dos jogadores comemorando. A maior parte da primeira página é sobre o jogo e todo o espaço onde estão as informações e a foto ficam dentro de um espaço delimitado pela cor azul, que remete ao Cruzeiro. Enquanto O Tempo destaca a manchete “Cidade Administrativa faz dois anos sem resultados esperados”, o Super Notícia abre espaço para a partida do Cruzeiro: “Wellington Paulista faz dois gols e Cruzeiro cola nos líderes”. Em O Tempo o destaque do caderno TV Tudo é “O Fantasma de Gabriel Braga Nunes” e conta detalhes sobre o novo personagem do ator. No Super Notícias o destaque de Variedades é a atriz Letícia Spiller. A manchete informa que atriz acabou de sair da novela Malhação e foi escalada para outra novela. Na foto a atriz aparece com um vestido decotado. Outra observação que podemos fazer é que, por ser uma edição de domingo, O Tempo se distância do factual e seu conteúdo se aproxima mais de uma revista semanal, proporcionando ao leitor notícias aprofundada de diversas editorias. No Super Notícia o futebol ganha maior destaque devido à rodada do Campeonato Mineiro do final de semana.
Primeira página 6 – Segunda-feira, 05 de março de 2012
Figura 13: Primeira página do O Tempo 05/03
Figura 14: Primeira página do Super Notícia 05/03
36 A primeira página do jornal O Tempo, edição de 5 de março de 2012, é composta por 10 manchetes das editorias de Brasil (Nacional), Cidades, Colunas do dia, Cultura, Economia, Esporte e Política. No Super Notícia a primeira página é composta por cinco manchetes das editorias de Cidades, Esporte e Variedades. A manchete principal do O Tempo destaca “Lafayette Andrada é acusado de fraude em instituição”. O jornal traz a informa sobre uma suposta fraude na universidade UNIPAC, que teria terceirizado cursos, o que é proibido por lei. No Super Notícia, “Galo vira líder isolado”, fala sobre a vitória de virada do Atlético sobre o América no Campeonato Mineiro. Na primeira página do Super Notícia a atriz Deborah Secco, com pouca roupa, ocupa grande destaque com a manchete “Louco por ela”. O conjunto foto/notícia tem a função de divulgar o novo seriado da TV Globo que aborda o universo feminino e tem a atriz no elenco, porém, a imagem chama mais atenção pelo erotismo do que pela informação. O Super Notícia também destaca uma mulher com o rosto machucado e os dizeres “Homem rapta e espanca a ex”. A notícia relata a agressão feita por um dono de ferro-velho que não teria suportado o fim do namoro.
Primeira página 7 – Terça-feira, 06 de março de 2012
Figura 15: Primeira página do O Tempo 06/03
Figura 16: Primeira página do Super Notícia 06/03
A primeira página do jornal O Tempo, edição de 6 de março de 2012, é composta por 13 manchetes das editorias de Cidades, Colunas do dia, Cultura, Economia, Esporte, Política e
37 Tecnologia. No Super Notícia a primeira página é composta por seis manchetes das editorias de Cidades, Esporte e Variedades. Nesta edição de O Tempo a manchete principal, “Vereadores querem anular decisão sobre hotéis na Pampulha”, aborda uma polêmica municipal a partir de um evento mundial: a Copa do Mundo de 2014. No Super Notícia a manchete principal é “SUS apura briga em consultório”, que relata drama de uma dona de casa que registrou ocorrência policial para denunciar um médico que a teria agredido com gritos e palavrões durante uma consulta. Embora a manchete principal do O Tempo seja de política, a foto de maior destaque é da editoria de cidade e mostra três crianças comendo maçãs. A imagem e o texto chamam a atenção para o perigo da obesidade infantil e destacam a Semana de Mobilização Saúde na Escola. Outra foto é da chanceler da Alemanha, Angela Merkel e da presidente Dilma Rousseff na feira de tecnologia em Hannover, onde a presidente do Brasil criticou as políticas econômicas dos países desenvolvidos. A foto do homem mais rico do país acompanhado da manchete “Eike Batista é o que mais enriquece entre os mais ricos”, e do escritor Luis Fernando Verissimo, também são destaques na primeira página, sendo a primeira de Economia e a segunda de Cultura. No Super Notícia as fotos destacadas na primeira página são do jogador Montillo, do Cruzeiro, visitando o garoto Pedro Arthur, mineiro símbolo da luta contra a meningite bacteriana; do cantor sertanejo Sérgio Reis, na cama do hospital com a manchete, “Sertanejo passa bem”; e a de maior destaque é da madrinha de bateria Solange Gomes, de vestido curto, com o texto “Musa só no Rio”.
38
CONCLUSÃO Essa pesquisa teve como principal objetivo identificar quais os elementos contidos nas primeiras páginas dos jornais O Tempo e Super Notícia que firmam o contrato de comunicação com os leitores. Constatamos que a primeira página do jornal impresso tem a função de atrair o leitor para ler os conteúdos internos. Por isso, é de extrema importância analisar a forma como são hierarquizadas as notícias, fotos, infográficos e cores que compõem a primeira página, pois é através dela que é possível seduzir o leitor e reconhecer as condições de realização da troca linguareira em que estão envolvidos. O jornal O Tempo se distancia do Super Notícia pela abrangência de notícias e pelo público-alvo: destina suas informações prioritariamente para os públicos das classes A e B. Geralmente, este público leva em conta informações de qualidade e com profundidade na notícia, formação de opinião e temas diversos. Por outro lado, o Super Notícia busca firmar contrato com leitores das classes C, D e E ao investir em um tipo de comunicação pautada pela capacidade de provocar sensações imediatas junto ao público. Pode-se dizer que, apesar de complexo, o contrato de comunicação de um jornal impresso pode ser reconhecido pela primeira página. Este estudo sobre O Tempo e Super Notícia, além de demonstrar a diferença entre os dois jornais, mostra a existência de elementos permanentes na primeira página para selar o contrato de comunicação com o leitor. O Tempo segue a visada informativa que, como observamos durante a análise, busca oferecer para seu leitor informações abrangentes e preza a publicação de informações de diversas editorias por entender que a função do jornal é de entregar para o leitor notícia que presume que ele não saiba. O Super Notícia tem sua primeira página elaborada através da visada de páthos, como também tratamos na análise. O jornal seleciona notícias com caráter popular, manchetes de assassinato, violência, futebol e uma mulher em trajes mínimos ou seminua para provocar no leitor sensações agradáveis ou desagradáveis. O objetivo principal do Super Notícia é mexer com as emoções do seu público leitor, atraindo para a leitura dos conteúdos internos. Com isso, é possível afirmar que o espaço da tematização, como classifica Charaudeau (2006), é um dos elementos da primeira página que firmam o contrato de comunicação com o leitor, ou seja, o “modo de intervenção” e o “modo de organização discursivo” permitem que
39 os leitores do O Tempo e do Super Notícia identifiquem o jornal pelos temas contidos na primeira página. Após a análise da primeira página do O Tempo, que classificamos como jornal de referência, pode-se dizer que haverá chance de serem noticiados neste jornal informações quando os indivíduos envolvidos na notícia forem importantes, se o assunto tiver impacto sobre a nação, no caso de envolver muitas pessoas da sociedade, se gerar importantes desdobramentos, se o assunto for relacionado a políticas públicas ou algum assunto que puder ser divulgado com exclusividade. Podemos afirmar que estes são os valores-notícia que hierarquizam as informações em O Tempo. No Super Notícia, por ser um jornal popular, terá maior probabilidade de ser noticiado se o assunto possuir capacidade de entreter o leitor, se for próximo geográfica ou culturalmente do universo do leitor, quando puder ser simplificado, quando puder ser narrado dramaticamente, quando tiver identificação dos personagens com os leitores e se for útil. Pela análise feita da primeira página do Super Notícia, podemos afirmar que estes elementos são os que mais se aproximam dos valores-notícia do jornal. Portanto, podemos afirmar que o valor-notícia dos dois jornais são conjuntos de regras tácitas que ajudam a firmar o contrato de comunicação com os leitores. Outro elemento que identificamos foi a cor-informação, que é utilizada de forma diferente nos dois jornais. O Tempo usa a cor-informação para remeter aos cadernos de notícia e o Super Notícia para dar sentimentos às informações. De acordo com Guimarães (2003), a primeira leitura que fazemos do jornal é não-verbal, ou mesmo pré-verbal. A necessidade dos jornais em atrair seus leitores pela primeira página faz a cor se tornar essencial para que o leitor reconheça os periódicos. O Super Notícia, como podemos perceber no Capítulo 3, muitas vezes deixa de noticiar assuntos de outras editorias para destacar uma mulher, quase sempre em trajes mínimos ou seminua, na primeira página. Este fato nos leva a afirmar que o contrato de comunicação do jornal com o leitor prevê uma figura feminina na primeira página com apelo puramente erótico.
40
REFERÊNCIAS AMARAL, Márcia Franz. Jornalismo popular. São Paulo: Contexto, 2006. CHARAUDEAU, Patrick. Discurso das Mídias. São Paulo: Contexto, 2006. CARRATO, Ângela. Imprensa mineira, um monopólio próximo ao fim. In: MOUILLAD, Maurice; PORTO, Sérgio Dayrell (org). O jornal: da forma ao sentido. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2002.p. 469 a 482. GUIMARÃES, Luciano. As cores na mídia: a organização da cor-informação no jornalismo. São Paulo: Annablume, 2003. LEMOS, André. Materialidade dos Dispositivos de Leitura Eletrônicos. 08 junho 2012. Disponível em: <http://zonadigital.pacc.ufrj.br/reflexoes-criticas/materialidade-dosdispositivos-de-leitura-eletronicos/>Acesso em: 08 junhos 2011. SKROTZKY, Douglas Coltri. Destak: uma análise sobre as notícias do primeiro grande jornal gratuito do Brasil. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2009. TRAQUINA, Nelson. Teorias do Jornalismo: Porque as notícias são como são. Florianópolis: Insular, 2005. WOLF, Mauro. Da sociologia dos emissores ao newsmaking. In: Teorias da comunicação. Lisboa: Editorial Presença, 1987.
41
ANEXOS