CENTRO UNIVERSITÁRIO DO LESTE DE MINAS GERAIS ESCOLA POLITÉCNICA CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO
ÍTALLO DE ANDRADE CAMPOS
SOLUÇÕES BIOFÍLICAS COMO INSTRUMENTOS DE DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO EM CORONEL FABRICIANO
Coronel Fabriciano/MG 2015
ÍTALLO DE ANDRADE CAMPOS
SOLUÇÕES BIOFÍLICAS COMO INSTRUMENTOS DE DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO EM CORONEL FABRICIANO
Trabalho de conclusão de curso de graduação apresentado à Escola Politécnica do Centro Universitário do Leste de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do grau de Arquiteto e Urbanista.
Orientadora: Danielly Borges Garcia Macedo
Coronel Fabriciano/MG
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2015
“Nós jamais seremos plenamente saudáveis, satisfeitos ou realizados se vivermos separados e alienados do ambiente do qual nós evoluímos”
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Stephen R. Kellert
RESUMO
Por meio de análises bibliográficas, o trabalho busca contextualizar a evolução do ser humano e das cidades, relacionando o avanço da indústria em detrimento à natureza e à redução de sua presença nos assentamentos humanos, principalmente nas cidades. Guiando-se pela hipótese de que o contato com a natureza é indispensável ao desenvolvimento humano, o trabalho descreve o conceito de biofilia e suas aplicações no urbanismo, além de reunir informações a respeito de seus benefícios para a saúde humana, economia local e meio ambiente como um todo. Para compreender o contexto de Coronel Fabriciano e seu potencial de desenvolvimento biofílico, foram realizadas pesquisas de campo a fim de compreender o pensamento da população local no que diz respeito à relação entre cidade e meio ambiente, além do levantamento fotográfico e análise de ações biofílicas espontâneas, surgidas a partir da ação da natureza ou dos próprios moradores da região. Como resultante foi observado um considerável anseio, por parte da população no sentido de integrar a natureza à infraestrutura local, embora algumas barreiras culturais e educacionais precisem ser vencidas. Com isso sugere-se a criação de um instituto educacional no Município que, além de servir como instrumento de ensino fundamental ao mesmo tempo em que estimula o convívio social e com a natureza, também realize ações ambientais em parceria entre alunos e iniciativas público-privadas.
Palavras-chave: Biofilia. Sustentabilidade. Urbanismo. Natureza. Meio ambiente. Biomimetismo.
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Saúde.
ABSTRACT
Through bibliographic analysis, the paper seeks to contextualize the evolution of human beings and cities, relating the industry advancement over the nature and the reduction of its presence in human settlements, especially in the cities. Guided by the hypothesis that contact with nature is essential to human development, the paper also describes the concept of biophilia and its application in urban planning, as well as gather information about their benefits to human health, local economy and the environment as a whole. To understand the context of Coronel Fabriciano and its potential to biophilic development, field surveys were conducted in order to understand the thinking of the local population regarding the relationships between the city and the environment, in addition to photographic survey and analysis of spontaneous biophilic actions, arising from both the actions of nature and inhabitants of the region. As result it was observed a considerable desire on the part of the population, towards the integration of nature to the local infrastructure, although some cultural and educational barriers need to be overcome. Thus suggests the creation of an educational institute in the city that, in addition to serving as a primary school while it stimulates social interaction and nature, also conduct environmental activities in partnership between students and public-private initiatives .
Key words:
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Biophilia. Sustainability. Urbanism. Nature. Environment. Biomimicry. Health.
SUMÁRIO
1.
Objetivos ...................................................................................................... 7
2.
Justificativa ................................................................................................... 8
3.
Ruptura entre homem e natureza .............................................................. 10
3.1.
Breve história da humanidade ............................................................. 10
3.2.
Breve história das cidades .................................................................. 11
3.3.
Dicotomia tecnologia/natureza ............................................................ 14
4.
O que é sustentabilidade ........................................................................... 15
4.1.
Definição, história e debates ............................................................... 15
4.2.
A rentável maquiagem verde............................................................... 19
5.
O que é biofilia ........................................................................................... 23
5.1.
Definição .............................................................................................. 23
5.2.
Saúde e bem estar socioambiental ..................................................... 25
5.3.
desenvolvimento socioeconômico ....................................................... 27
6.
O que são cidades biofílicas ...................................................................... 29
6.1. 7.
Definição, critérios e cidades análogas ............................................... 29
Estudo preliminar do potencial de desenvolvimento biofílico em Coronel
Fabriciano ................................................................................................................... 34 7.1.
Levantamento e análise local .............................................................. 34
7.2.
Análise crítica do Plano diretor de Coronel Fabriciano ....................... 49
8.
Conclusões e proposta inicial para a segunda etapa do trabalho de
conclusão de curso ..................................................................................................... 57
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Referências Bibliográficas .................................................................................. 59
1.
OBJETIVOS
O trabalho busca contextualizar a evolução humana junto à natureza, relacionando-a com a migração urbana que se intensificou a partir da primeira revolução industrial. Será enfatizada uma análise na ruptura ambiental desencadeada nesse período, bem como algumas das consequências positivas e negativas atreladas a tais mudanças. Será feita uma análise bibliográfica sobre o urbanismo biofílico, destacando a importância da interação humana com variadas formas de vida para o seu desenvolvimento individual e coletivo, além de seus reflexos na evolução das cidades e tecnologias. A partir disso, serão realizadas pesquisas de campo a fim de compreender os pontos de vista da população local no que diz respeito à relação entre cidade e meio ambiente, além de buscar por ações espontâneas locais que buscam retomar o contato com a natureza – ainda que de forma subconsciente – em determinadas comunidades de Coronel Fabriciano. Após uma análise local, será feita uma análise crítica do Plano Diretor de Coronel Fabriciano, a fim de encontrar ferramentas que fundamentem a elaboração de projetos a fim de contribuir na transformação do município em uma cidade mais saudável,
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próspera e ambientalmente consciente.
2.
JUSTIFICATIVA
Em meio às atuais discussões sobre mudanças climáticas, eficiência energética, esgotamento de recursos naturais, redução de emissões, entre outros, as medidas de preservação e otimização da diversidade biológica em meios urbanos no Brasil ainda não recebem atenção o suficiente, muitas vezes sendo tratadas como supérfluas ou de pouca utilidade dentro do ritmo acelerado das cidades, que dão mais importância às ações econômicas e sociais, respectivamente. A arquitetura e o urbanismo também têm sido rediscutidos dentro deste contexto, apontando uma forte tendência à humanização das cidades e à reintegração da natureza nos meios urbanos. Estudos realizados por pesquisadores de vários países, como Estados Unidos, Inglaterra, Holanda, entre outros, indicam que o convívio abundante com a natureza beneficia a saúde e o desenvolvimento físico e mental a curto, médio e longo prazo. Alguns desses estudos também associam a ausência de atividades ao ar livre – algo cada vez mais comum na era digital – a sintomas como dislexia, hiperatividade, déficit de atenção, agressividade, etc. Tais sintomas – apelidados de “Transtorno de Déficit de Natureza” pelo jornalista Richard Louv em seu livro Last Child in The Woods, 2005 – normalmente são tratados com remédios de alto risco, enquanto poderiam ser resolvidos ou amenizados a partir de mudanças no estilo de vida urbano. Considerando que o termo “sustentabilidade” trata, em grande parte, da manutenção de um planeta habitável para as próximas gerações, é muito importante estimular a aproximação de crianças e jovens à natureza, tanto pelos benefícios supracitados, quanto para promover sua valorização. A autora Janine Benyus ainda defende em seu livro Biomimicry: Innovation Inspired by Nature, 1997, a importância de buscar inspiração nas soluções já oferecidas pela própria natureza, adaptando e aplicando-as no planejamento e design de qualquer produto, afinal elas são resultado de vários milênios de evolução. Tal prática é chamada de “biomimetismo”. Ela já se provou viável e eficiente, e torna-se mais praticável em proporção ao acesso natural oferecido próximo aos ambientes de
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pesquisa, normalmente urbanos.
As evidências supracitadas são apenas alguns dos exemplos que apontam a necessidade de restituir o acesso seguro e abundante à natureza, reestabelecendo sua conexão ao ser humano, cuja saúde e bem estar dependem fortemente desse contato. Os benefícios trazidos pela priorização de espaços naturais nas cidades podem, portanto, impactar desde a redução de doenças físicas e mentais em habitantes urbanos até o aprimoramento de tecnologias e técnicas por meio do
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biomimetismo. Considerando as pessoas como principais recursos
3.
RUPTURA ENTRE HOMEM E NATUREZA
3.1. BREVE HISTÓRIA DA HUMANIDADE
Descobertas antropológicas realizadas principalmente a partir do século XX – após o desenvolvimento de técnicas de datação por meio do carbono-14 e de análises genéticas – mostram que alguns dos fósseis de hominídeos mais antigos já encontrados até o momento chegam a cerca de 3,6 milhões de anos de idade. Durante milhares de anos, no período Paleolítico Inferior (ocorrido entre aproximadamente 3.000.000 a.C. até cerca de 250.000 a.C.), os seres humanos viveram como nômades, buscando alimento e abrigo no próprio ambiente natural e começando a fabricar alguns dos primeiros instrumentos de pedra, além de arcos e setas. Porém, devido às fortes variações climáticas ocorridas no período Paleolítico Superior (ocorrido entre aproximadamente 300.000 a.C. até cerca de 10.000 a.C.), que causaram intensas variações de temperatura e umidade, as habituais fontes de alimentos, como animais e plantas silvestres, se tornaram mais escassas. Para sobreviver, o homem voltou-se, em grupo, às atividades de colheita, abandonando o nomadismo e passando a fixar-se em locais específicos. Com isso, as técnicas fabricação de ferramentas também progrediu, possibilitando criar, por exemplo, serras de madeira com pequenas lascas de pedra que serviam como dentes. À medida em que as primeiras técnicas de agricultura e pastoreio começaram a ser desenvolvidas, durante o período Neolítico (cerca de 10.000 a.C. a 3.000 a.C.), os seres humanos também começaram a organizar os espaços onde habitavam, iniciando as primeiras vilas, onde fabricavam objetos ainda mais avançados, como potes de cerâmica e ferramentas feitas com ossos, irrigavam o solo, selecionavam sementes, cultivavam plantas e domesticavam alguns animais. Se estabelecer em apenas um local também contribuiu para o entendimento das estações do ano e suas características. Há muita divergência entre os autores quanto ao início da Idade dos Metais –
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período histórico no qual a raça humana aprendeu a manipular metais a fim de criar objetos. Porém, a maioria dos autores considera que esse período se dividiu entre Era
do Cobre (cerca de 5.000 a.C.), Era do Bronze (cerca de 3.000 a.C.) e Era do Ferro (1.200 a.C.). A utilização desses novos materiais impactou diretamente na fabricação de objetos e ferramentas, contribuindo no avanço das técnicas agrícolas e pecuárias já existentes. Ao final da transição entre o período Neolítico e início da Idade do Metal, por volta de 4.000 a.C., os primeiros agrupamentos humanos começaram a adquirir algumas características de cidades, alterando sua esfera organizacional ao passo em que sua densidade populacional aumentava. Com a separação das atividades agrícolas e pecuárias, e sua consequente divisão social do trabalho, pastores e agricultores, surgiu também a necessidade de troca de mercadorias. Começaram então a aparecer os primeiros locais de permuta. Acredita-se que a necessidade de controlar melhor as transações de mercadorias levou ao eventual surgimento da escrita, uma vez que nem sempre os produtos necessários estavam imediatamente disponíveis para a barganha. Para ABIKO, BARREIROS e DE ALMEIDA (1995), “[...]com o contínuo aumento populacional, somado com a consolidação da prática da agricultura intensiva surgiu um novo estilo de vida, o qual induziu a mudanças fundamentais, na economia e nas ordens social, tecnológica e ideológica”. Segundo os autores, a cidade está no centro dessa evolução, possuindo não apenas um maior número de habitantes, mas também uma capacidade de transformação muito maior, determinando novos rumos para o desenvolvimento da sociedade.
3.2. BREVE HISTÓRIA DAS CIDADES
As evidências arqueológicas de ruínas das cidades mais antigas remontam ao final do Período Neolítico e início da Idade do Metal, por volta de 4.000 a.C. Inicialmente sua principal finalidade era servir como centro de troca de mercadorias, como consequência da divisão de trabalhos iniciada na Revolução Neolítica. O comércio era efetuado por meio da utilização de pequenos objetos como conchas e
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pedras semipreciosas.
Nesse período as cidades surgiam inicialmente a partir de pequenas aldeias à margem dos rios, onde o terreno era mais fértil e propício às práticas da agricultura, como irrigação e transporte. Segundo o historiador PINTO (2015), “os principais locais de surgimento das cidades foram ao longo dos vales dos rios Tigres e Eufrates, na Mesopotâmia; do Nilo, no Egito; do rio Indo, na Índia; do Yang-Tsé- Kiang e HoangHO na China; e do San Juan, na Meso-América”. O avanço das cidades às regiões mais distantes dos cursos d’água tornou-se possível à medida em que o domínio das técnicas de irrigação evoluiu, com a utilização de pequenas valas que desviavam a água para as plantações próximas. Herdeira de importantes aspectos arquitetônicos, políticos, filosóficos, jurídicos, militares e artísticos das cidades gregas, um dos exemplos mais notórios de cidades antigas foi Roma. Ela foi o centro do maior império da época, um dos maiores da história da humanidade, contribuindo significativamente para o avanço de técnicas de irrigação e transporte, por exemplo, construindo grandes aquedutos e estradas pavimentadas que persistem até os dias de hoje. PINTO (2015) ainda afirma que: “[...] é a partir do declínio do Império Romano que se vê a perda de importância das cidades no ocidente europeu. Com as invasões dos povos bárbaros e a destruição que inicialmente acarretaram, os habitantes destes locais se viram forçados a irem para o campo atrás de refúgio e segurança em terras de latifundiários. Da criação de comunidades nestes latifúndios verificou-se a formação dos feudos, que deram o caráter rural ao período medieval”.
A ruralização da região exerceu forte impacto sobre a política, que antes era centralizada em Roma, e enfraqueceu drasticamente o comércio existente. Porém, a cidade de Constantinopla manteve-se relevante, substituindo Roma como centro urbano e comercial da Europa. Na América pré-colombiana alguns dos principais centros urbanos e comerciais foram Cuzco, no atual Peru e Tenochititlan, no atual México (PINTO, 2015), apesar dessas cidades apresentarem evidências de possuírem maior integração com o meio ambiente. Com o renascimento comercial e urbano, ao final da Idade Média, as cidades
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europeias voltaram a se desenvolver como centros culturais e comerciais. Pouco
depois, a partir de uma complexidade de acontecimentos, foi iniciado o período que se denominou “Revolução Industrial” (PINTO, 2015 e ABIKO Et. al, 1995, p.37). ABIKO Et. al (1995, p.37) ainda cita HAROUEL (1990) ao afirmar que “a Revolução Industrial é quase imediatamente seguida por um explosivo crescimento demográfico das cidades [...]”. Esse fato se deu como consequência da redução da taxa de mortalidade alcançada graças aos progressos científicos e técnicos realizados na época. Ainda segundo ABIKO Et. al (1995, p.37), potentes transformações organizacionais
foram
desencadeadas
pela
Revolução
Industrial,
mudando
completamente as técnicas produtivas e “[...] acelerando o desenvolvimento e a concentração do novo sistema econômico”. Os autores afirmam que: “No campo, o parcelamento das antigas terras comuns em redor das aldeias torna possível uma melhor utilização do solo e transforma gradualmente os cultivadores diretos em arrendadores ou assalariados, coagidos a um nível de vida forçado, pouco superior ao mínimo necessário para sobreviver. A alternativa para este estado de coisas era o trabalho industrial, sobretudo o têxtil, que desde há muito estava organizado nos campos, nos domicílios dos camponeses”.
A soma dos fatores que atraiam trabalhadores para a cidade, junto aos de coerção, forçaram o deslocamento populacional para um ambiente altamente contrastante. No ambiente da cidade industrial, havia muita fumaça e fuligem, decorrente das máquinas a vapor e carvão, além de sérios problemas de saneamento subsequentes ao intenso êxodo rural. Apesar dos avanços na indústria e do uso de materiais industrializados (como ferro e vidro) na construção civil, as cidades não foram capazes de acompanhar as demandas habitacionais. Famílias que se deslocavam do campo acabavam se alojando em espaços vazios disponíveis nos bairros antigos. Mesmo comparadas às carências higiênicas do campo, o adensamento habitacional provocou sérios problemas de escoamento de detritos, além do alto acúmulo de lixo. A partir desse período, a presença da natureza praticamente se extinguiu de dentro das cidades industriais, uma vez que os espaços vazios eram agressivamente
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edificadas próximas ao local de trabalho.
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disputados pelo crescimento industrial e pelos trabalhadores cujas residências eram
3.3. DICOTOMIA TECNOLOGIA/NATUREZA
Em decorrência da revolução industrial e do espetacular aumento produtivo, vários avanços tecnológicos e científicos foram alcançados. Isso deu à indústria o papel central na existência e desenvolvimento das cidades e da sociedade como um todo. Porém a maioria dos processos industriais da época, alguns dos quais seguem até os dias de hoje, eram altamente prejudiciais, lançando na atmosfera uma grande quantidade de fuligem e gases tóxicos, além de produzir grandes quantidades de lixo, direta e indiretamente. À medida em que as indústrias se tornaram maiores e mais numerosas ao redor do planeta, uma quantidade cada vez maior de resíduos foi gerada, aparentemente sem a menor preocupação ou entendimento de suas consequências para o equilíbrio da biosfera terrestre e para as gerações vindouras. Além disso, necessidade de explorar recursos naturais, para atender uma demanda de consumo cada vez maior, acabou por criar um paradigma no qual natureza e progresso se tornaram elementos antagônicos, uma vez que apenas o progresso econômico era visto como responsável para a manutenção da existência humana e do novo estilo de vida que havia sido criado. Para garantir a aquisição de mais recursos, destruir era preciso. Foi apenas a partir do século XX que as discussões ambientais ganharam força, com autoridades científicas de todo o planeta percebendo sinais de diminuição da biodiversidade, esgotamento de recursos hídricos e minerais, além de mudanças climáticas alegadamente provocadas pelas ações humanas. Percebeu-se, enfim, que a natureza era muito maior e mais poderosa do que a indústria. Ignorá-la traria, sem a menor dúvida, efeitos devastadores para o atual estilo de vida da humanidade, isso caso ela sobreviva às consequências desencadeadas. Perceberam então que os valores produtivos adotados a partir da Revolução Industrial eram insustentáveis e corriam sério risco de entrar em colapso. Portanto
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eles precisavam ser drasticamente revisados.
4.
O QUE É SUSTENTABILIDADE
4.1. DEFINIÇÃO, HISTÓRIA E DEBATES
Etimologicamente, o termo “sustentabilidade” vem do latim sustentare, que significa sustentar; defender; favorecer, apoiar; conservar, cuidar. Na prática, ele advoga a adoção de atitudes que se sustentem por período indeterminado, ou seja, que não entrem em colapso. Por exemplo: se determinada pessoa possui um filtro de barro do qual retira água sem nenhuma atitude que vise sua reposição, em breve ela terá de lidar com o fato de que não terá mais água filtrada. O termo tem adquirido cada vez mais presença no cotidiano do século XXI, mas ainda assim uma enorme sombra de dúvidas ainda paira sobre o pensamento de algumas pessoas com relação ao assunto. Porém sua banalização acabou por transformá-lo em uma daquelas palavras sobre a qual muitas pessoas tem medo de perguntar e serem taxadas como “ignorantes” ou “desatualizadas”, pois assume-se que todos já estão plenamente cientes do que se trata. Entretanto percebe-se uma convicção equivocada de que “sustentabilidade” tem a ver apenas com questões ambientais. Apesar da sustentabilidade estar fortemente enraizada no equilíbrio ambiental, que foi deixado de lado à frente aos deslumbrantes avanços tecnológicos e econômicos, desde o surgimento das cidades surgiram outros fatores do qual o ser humano necessita para a manutenção de sua existência. Não se pode mais ignorar todo o progresso que fizemos até aqui, pois esse retrocesso desperdiçaria todo o alto preço que a humanidade e o planeta pagaram para chegar onde estamos. Portanto o que devemos almejar, na verdade é a transformação do desenvolvimento atual em algo que possa ser mantido sem prejudicar as futuras gerações. A noção atual de “desenvolvimento sustentável” se difundiu a partir do Relatório de Brundtland, realizado em 1987 pela “Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento” (World Comission on Environment and Development). Nesse
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contexto, a comissão definiu o conceito como o “desenvolvimento que atende às
necessidades das gerações atuais sem comprometer a capacidade das futuras gerações de suprir as próprias necessidades”. Segundo BÄRLUND (2004), “[...] o conceito se tornou uma das abordagens mais bem sucedidas a serem introduzidas em muitos anos. Na verdade, ele ajudou a moldar as agenda e atitudes das comunidades internacionais no que diz respeito ao desenvolvimento econômico, social e ambiental”. Inúmeros debates foram desencadeados pelo relatório e vários agentes viram oportunidades para usar o novo conceito. Porém logo foi observado que o conceito era muito vago e abrangente, podendo ser interpretado de inúmeras maneiras. Durante a Agenda 21, realizada no Rio de Janeiro em 1992, foram aprovados documentos que incluíam um comprometimento ambicioso por parte dos líderes mundiais, para assegurar o desenvolvimento sustentável em vários níveis da sociedade. Com impulso gerado pela conferência “Rio-92”, comitês nacionais de desenvolvimento sustentável foram implantados em diversos países. Porém, debates céticos com relação ao tema continuavam a acontecer. Alguns constatavam que o termo “desenvolvimento sustentável” era mais utilizado como desculpa do que como diretrizes para ações reais. Também foram feitas duras críticas à hegemonia de fatores centrados no meio ambiente, sendo exigidas mais ênfase nos “pilares” sociais e
econômicos
do
conceito.
Como
resultado
dessas
discussões,
hoje
a
sustentabilidade se sustenta no equilíbrio entre três fatores, conforme Figura 5.1, também chamados de 3 pilares da sustentabilidade: Ambiental, Social e Econômico.
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Esses pilares também podem ser referidos como Ecologia, Equidade e Economia,
como na abordagem dos conceitos apresentados no livro “Cradle-to-Cradle: Criar e reciclar ilimitadamente” (2013).
Figura 4.1 - Três pilares da sustentabilidade
Porém a conceituação geral não dá diretrizes de como articular as inevitáveis divergências de objetivos entre rentabilidade/racionalidade econômica, justiça social e equilíbrio ambiental. Nesse ponto vale destacar a importância da atuação dos arquitetos e urbanistas, capacitados a sistematizar estas diferentes variáveis, em associado a profissionais especializados em áreas variadas, como engenheiros, advogados, botânicos, etc. Com a “Cúpula de Johanesburgo sobre Desenvolvimento Sustentável”, o foco deixou de ser em medidas abrangentes, que atenderiam a uma grande quantidade de áreas simultaneamente. A partir daí adotou-se uma abordagem mais prática, enfatizando um menor número de áreas substanciais por vez. A Cúpula destacou audaciosamente a realização dos compromissos estabelecidos na Rio-92, ao invés de gastar tempo na elaboração de novos acordos. A decisão de escolher três itens específicos para serem cumpridos a cada ciclo de dois anos. Ainda que alguns desses elementos sejam bem abrangentes e diversos, a separação de metas bienais simplificou muito seu gerenciamento quando comparado com os tratados pré-
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Johanesburgo.
Em algumas cidades da Europa, após mais de uma década de experiência trabalhando dentro dos princípios do desenvolvimento sustentável, um dos aspectos mais bem sucedidos foi a ampla difusão de atividades locais, graças à seriedade de algumas cidades na promoção do conceito. Porém, em um curso para governantes da Europa Central e Oriental, os participantes despertaram uma série de preocupações no que diz respeito à falta de entendimento do conceito em suas administrações, apoio político insuficiente, recursos limitados em diferentes níveis para uma ação efetiva, envolvimento inadequado da sociedade civil, sistemas educacionais inertes, além de problemas específicos em vários setores da economia (BÄRLUND, 2004). Um dos conceitos mais atuais no que diz respeito à sustentabilidade é o Cradleto-Cradle, elaborado pelo engenheiro químico alemão Michael Braungart em parceria com o arquiteto americano William McDonough. O conceito busca a biomimetização de diversos processos produtivos, baseando-se no fato de que a natureza jamais produz “lixo”, mas sim “nutrientes”, que podem ser transformados e reutilizados infinitamente, servindo de alimento a vários seres vivos ao longo do processo. Seguindo esta lógica, ilustrada na Figura 5.2, o conceito advoga um design inteligente que selecione, desde as primeiras etapas de projeto, materiais puros e inócuos, unidos de modo a facilitar e incentivar seu recolhimento e separação entre “nutrientes técnicos” (como vidro, polímeros, metais, produtos químicos, etc.) e “nutrientes biológicos” (como água, tecidos orgânicos, madeira, etc.). Os nutrientes técnicos são capazes de retornar à indústria, reduzindo os custos e impactos ambientais relacionados à sua extração. Já os nutrientes biológicos podem ser
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retornados em segurança à natureza.
Figura 4.2 - Ciclo Cradle-to-Cradle. Disponível em http://www.c2cplatform.tw/en/c2c.php?Key=3. Acesso em: 10/11/2015.
4.2. A RENTÁVEL MAQUIAGEM VERDE
Graças ao advento da internet e seu subsequente rompimento de barreiras na comunicação, as pessoas tem um acesso sem precedentes à informação, tanto em volume, quanto em variedade, velocidade e alcance. O avanço dos comércios digitais proporcionou aos consumidores um leque muito maior de produtos à sua disposição, facilitando não apenas a comparação de preços, mas também de suas características menos aparentes, como composição, processos de fabricação, responsabilidade socioambiental, etc. A consolidação da Sociedade da Informação tornou os consumidores muito mais informados, exigentes e conscientes, aproximando também sua relação com empresas, marcas e mercado de consumo.
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conectado quase o tempo todo está interessado também nos compromissos que a
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Segundo MARROQUÍN (2004), “o novo consumidor, mais bem informado e
empresa defende em relação à sociedade e ao meio ambiente”. Porém, diante de uma avalanche de informações despejadas a cada minuto pelos meios de comunicação, combinado com o cotidiano apressado do século XXI, nem sempre as pessoas tem tempo ou o hábito de pesquisar melhor sobre os produtos que estão consumindo, no que diz respeito aos seus impactos socioambientais. Esse fator dá a algumas marcas a oportunidade de alavancar suas vendas através de uma prática profundamente antiética chamada de “maquiagem verde”, ou “greenwash”. Segundo o site do Selo SustentaX, tal pratica consiste na “propaganda enganosa corporativa que tenta mascarar um desempenho ambiental fraco”, podendo ser caracterizada crime de falsidade ideológica, conforme estabelece o Art. 299 do Código Penal Brasileiro de 1940: CP - Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940: “Art. 299 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.”
Ainda segundo o site do Selo SustentaX, “nesse caso, o fato juridicamente relevante poderia ser considerado o propósito de obter vantagem para si (ex. geração de imagem de empresa responsável ambientalmente visando aumento de vendas)”. Conforme levantamento realizado pelo grupo Market Analysis (2015), comparando o período entre 2010 e 2014, “o uso de apelos nos produtos sobre cuidados do fabricante ou marca com o meio ambiente está se tornando unanimidade no Brasil”. O aumento na quantidade de produtos que se autodeclaram “verdes” cresceu 478%, enquanto a quantidade de embalagens com apelos visuais que remetem à responsabilidade ambiental cresceu 296%. Desses apelos ambientais, apenas 15% são sustentados por certificações legítimas, levantando dúvidas quanto à veracidade do restante. Apesar de ser antiética e criminosa, a prática do greenwash – em alguns casos – também pode ser interpretada como resultado da falta de conhecimento. Como exemplo disso podemos citar os produtos de utilidades domésticas da Linha Evo,
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pertencente ao Grupo Dissenha. Os produtos dessa linha, como o porta-copos exemplificado na Figura 5.3, utilizam um material composto de plástico e madeira (WPC), que, segundo o site da
empresa, “[...] é um produto inovador e ambientalmente sustentável, pois em sua composição deixa de utilizar parte da matéria-prima de origem fóssil (plástico) e utilizase de até 50% de madeira de reflorestamento (fonte renovável)”. Mas isso ainda está longe de ser considerado suficientemente sustentável, pois segundo os conceitos apresentados por BRAUNGART e MCDONOUGH (2013, p. 140), “[...] queremos projetar processos e produtos que não apenas devolvem os nutrientes técnicos e biológicos que usam, mas pagam com juros a energia que consomem”.
Figura 4.3 - Porta-copos da Linha Evo. Disponível em: http://www.linhaevo.com.br/#!descanso-de-copo/c9kb. Acesso em: 10/11/2015
Ao nos perguntarmos, ainda conforme os autores supracitados (2013, p. 153): “Os resíduos são nutrientes?”, podemos imediatamente obter um incisivo “não”. Infelizmente, como consequência dessa amálgama de componentes técnicos e biológicos, o plástico não pode ser reciclado pela indústria devido à presença da madeira e nem a madeira pode ser digerida pela natureza devido à presença do plástico. O produto, que se diz sustentável, na verdade aumenta apenas cerca de 10 anos na vida útil do plástico (que poderia, de outra forma, ser reciclado infinitamente) ao mesmo tempo em que aprisiona todos os nutrientes contidos na madeira, impedindo sua reutilização pela natureza. Também não há, nas embalagens ou no site, qualquer indicação de que o produto pode ser reciclável ou de que a empresa se responsabiliza pelo seu recolhimento para efetuar o descarte adequado. As demandas mercadológicas, por empresas e marcas mais transparentes e responsáveis nos quesitos socioambientais, também impactou fortemente a construção civil e o planejamento urbano. Várias empesas foram criadas com foco na
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pode adquirir são: AQUA, BREEAM, Casa Azul, DGNB, LEED e Procel Edifica.
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certificação ambiental de edifícios. No Brasil, os principais certificados que um edifício
Apesar de todas as certificações supracitadas possuírem alto índice de atuação, aceitação e reconhecimento no mercado, ainda são encontradas suspeitas e acusações de greenwash por parte de algumas delas. Segundo ALTER (2014), colunista do site TreeHugger, a certificação LEED, por exemplo, tem sido atacada há vários anos por receber apoio de madeireiras, como o Conselho de Manejo Florestal (FSC), e até mesmo de fabricantes de plásticos e produtos químicos. Isso levanta dúvidas com relação ao seu real comprometimento com o meio ambiente, tornando-se suspeita de praticar greenwash em benefício de seus “patrocinadores”. Atualmente podemos citar duas organizações que buscam detectar e combater o greenwash em certificados ambientais para edificações, entre outras áreas. Uma delas é a Environmental Policy Alliance (EPA), cuja missão é ser “[...] devotada à descoberta de financiamentos e agendas ocultas por trás de grupos de ativismo ambiental e à exploração das interseções entre ativistas e agências governamentais”. Criada por meio de uma parceria entre o Greenpeace e o Sierra Club, duas entidades alvo do EPA, também podemos destacar a Greenwash Action, cujo objetivo é “[...] apoiar o progresso em direção a um mundo saudável, diverso e climaticamente estável, defendendo programas que representem verdadeiras lideranças ambientais e desafiando interesses especiais que estejam usando greenwash para confundir o mercado”. Como pudemos observar, nos últimos anos houve um abundante aparecimento produtos, empresas, certificados e ativistas com foco em questões ambientais. Mas nenhuma dessas iniciativas é isenta de questionamentos, seja quanto à sua eficiência ou até mesmo sua autenticidade. Apesar da sustentabilidade ser discutida a décadas, ainda não surgiu sequer um conjunto de critérios que se provou universal, tampouco deverá surgir nos próximos anos. Tanto especialistas quanto leigos se mantém confusos diante dos debates e iniciativas rumo ao desenvolvimento sustentável. Essa obscuridade só pode se desfazer à medida em que nos aproximamos, exploramos e compreendemos a natureza, além dos pontos em que suas ações e necessidades intercedem com as humanas. Para isso devemos torna-la presente e acessível em
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nosso cotidiano, atendendo ao nosso instinto biofílico.
5.
O QUE É BIOFILIA
5.1. DEFINIÇÃO
“Desde a infância nós nos concentramos alegremente em nós mesmos e em outros organismos. Aprendemos a distinguir coisas vivas das inanimadas e nos movemos em direção a isso como mariposas em direção à luz... Explorar e associar-se à vida é um processo profundo e complicado no desenvolvimento mental. Até certo ponto ainda subvalorizado na filosofia e religião, nossa existência depende dessa propensão, nosso espirito é tecido a partir disso, esperança surge em seu fluxo.[...]” (WILSON, EDWARD, 1984, “Biophilia”).
Edward Osborne Wilson é um entomologista e biólogo americano, professor e pesquisador emérito da Universidade de Harvard, sendo particularmente conhecido e respeitado por suas pesquisas nas áreas de ecologia, evolução e sociobiologia. Ao final da década de 1970, Wilson estava ativamente envolvido em questões de conservação ambiental, promovendo e contribuindo para pesquisas sobre biodiversidade. Em 1984 ele publicou um livro chamado “Biophilia”, no qual explorou as fundações psicológicas e evolutivas da atração humana pelo ambiente natural. Seu trabalho continua sendo muito influente na formação da ética conservacionista moderna, continuando a ser explorado e citado por fomentadores ambientais contemporâneos como BRAUNGART, M., McDONOUGH, W., autores do livro e conceito “Cradle-to-Cradle”. O termo “biofilia” já havia sido utilizado pelo psicólogo sueco Erich Fromm, para se referir ao amor e atração pela vida e seres vivos. É válido destacar que esse sentimento pode ser orientado para descrever a empatia e afinidade tanto por pessoas quanto por animais, plantas e todos os demais seres vivos, sendo portanto um aspecto tanto social quanto ambiental. GUNDERSON (2014) cita BURSTON (1991) dizendo que há um motivo para o trabalho de Fromm ter sido uma fonte de inspiração para os primeiros movimentos verdes. Porém foi a partir das publicações de Wilson que o
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termo alcançou maior visibilidade.
Uma das evidências que Wilson considera em sua defesa da biofilia, é o fato do ser humano ter passado mais de 99% de sua existência em um convívio íntimo com a natureza, conforme ilustrado na Figura 6.1. A humanidade teria, portanto, evoluído grande parte de suas qualidades genéticas antes do surgimento das cidades, levantando a hipótese de que a afinidade pela natureza seja uma característica hereditária.
Figura 5.1 - Linha do tempo ilustrando alguns dos períodos da humanidade até o surgimento das cidades e os dias atuais, com base nas pesquisas de ABIKO, BARREIROS e DE ALMEIDA (1995).
Em contraposição à biofilia, há o termo “tecnofilia”, que descreve a paixão humana pela criação de novas tecnologias que o tornem menos dependente da natureza. Tal sentimento é ainda mais evidente nas novas gerações. A existência dessas duas afinidades antagônicas nos expõe muito bem os desafios de trabalhar em equilíbrio entre os dois conceitos. Os benefícios trazidos pela tecnologia são muito evidentes em nosso cotidiano, nos proporcionando conforto e facilidades sem precedentes no que diz respeito a comunicação, transporte e produtividade. Por outro lado, vimos a partir da Revolução Industrial um considerável declínio do convívio com a natureza. Segundo o último relatório da ONU, atualmente mais de 50% da população mundial vive nas cidades, com uma estimativa de alcançar 66% até 2050. É possível afirmar que essa ruptura exerceu impacto especialmente naqueles que nasceram e cresceram em ambientes completamente urbanos, muitas vezes sem ter a oportunidade de explorar e compreender a natureza e sua importância para a própria sobrevivência humana. O que pode ser observado é que a maioria da nova safra de jovens cresceu em ambientes fechados, passando maior parte do tempo diante da tela fria de uma TV, computador ou celular, em uma sociedade cujo mercado se tornou demasiadamente
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competitivo e cruel, concedendo menos tempo livre até mesmo às crianças (BEATLEY, 2011).
ROGERS (2009) defende ainda que há uma grande possibilidade de que a biofilia venha à tona a partir do aprendizado. Portanto o melhor momento para desenvolvê-la seria durante a infância, quando a fisiologia cerebral ainda está em construção e a curiosidade infantil naturalmente induz à exploração do mundo ao nosso redor.
5.2. SAÚDE E BEM ESTAR SOCIOAMBIENTAL
Apesar de muitas vezes serem pouco perceptíveis, os frutos da presença abundante de elementos naturais no cotidiano das pessoas podem impactar vigorosamente em sua saúde física e mental, subsequentemente influenciando o desempenho profissional e acadêmico, convívio social, auto-estima, etc. Em uma pesquisa realizada por DE VRIES Et al. (2003) para o Netherlands Institute for Health Services Research (NIVEL), comparando a saúde de pessoas que viviam em regiões mais verdes com a de quem vivia em regiões menos verdes, foi relatado que: “[…] esta hipótese foi testada empiricamente combinando dados holandeses sobre indicadores auto-referidos de saúde em mais de 10.000 pessoas com dados de ocupação do solo descrevendo a quantidade de áreas verdes nos locais onde viviam. Na análise multinível nos orientamos para as características socioeconômicas e demográficas, bem como a urbanidade. Viver em um ambiente verde foi um fator positivamente relacionado a todos os três indicadores de saúde disponíveis, sendo ainda mais forte do que a urbanidade a nível municipal. Análises em subgrupos mostraram que a relação entre um dos indicadores de saúde foi um tanto mais forte para donas de casa e idosos, dois grupos supostamente mais dependentes e expostos ao ambiente local. Além disso, para todos os três indicadores de saúde, a relação com o espaço verde foi relativamente mais forte em pessoas com menor grau educacional.[...]”
Em um relatório sobre sua pesquisa relacionando a recuperação de pacientes cirúrgicos com a vista que eles tinham a partir de suas janelas, ULRICH (1984)
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internação, “[...] a maioria das vistas naturais aparentemente evocam sentimentos
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concluiu que, além de melhorar a recuperação pós-operatória e reduzir o tempo de
positivos, reduzem o medo em indivíduos estressados, mantém o interesse e pode bloquear ou reduzir pensamentos estressantes [...]”. BEATLEY (2010, p.4) também argumenta que “pesquisas indicam a capacidade da natureza em reduzir o stress, elevar o bom humor, aprimorar as habilidades cognitivas e performance acadêmica, e até mesmo ajudar a moderar os efeitos de TDAH, autismo, e outras doenças infantis”. Uma das particularidades mais interessantes em explorar as complexas interações da natureza está no fato de que quanto mais as entendemos, maior nos parece a sua importância. Durante as pesquisas feitas pare esse trabalho, não foi encontrado qualquer registro de pesquisadores que defendam o contrário. É argumentável que os únicos a ainda considerar o reequilíbrio e reintegração ambiental como um aspecto secundário diante do progresso econômico e tecnológico, são aqueles que não possuem conhecimento o suficiente sobre o tema. Mesmo diante dessa afirmativa, o desconhecimento ambiental – mais evidente nas gerações que vivenciaram a tardia revolução industrial brasileira – impõe um desafio paradoxal àqueles que buscam equilibrar desenvolvimento econômico, ambiental e social. A falta de acesso e convívio com a natureza levam ao definhamento da biofilia que, por sua vez, leva à desvalorização e segregação da natureza. Certamente um círculo vicioso difícil de romper. Segundo GUNDERSON (2014) apud BUTTEL (1996) é necessário identificar os padrões comportamentais que possuem dimensões ambientais óbvias, bem como atividades banais cujos impactos ambientais não são reconhecidos e/ou passam despercebidos. Diante da vasta diversidade ambiental, cultural e comportamental ao redor do mundo, a busca pela elaboração de diretrizes universais de conscientização pode não ser o melhor caminho. Por outro lado, a preservação ambiental é (indiferentemente às inclinações individuais) essencial à existência humana. Portanto um caminho alternativo, com viabilidade mais iminente, seria a existência de canais colaborativos para mobilização e troca de informações (empíricas e/ou acadêmicas), com o objetivo
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de fomentar e enriquecer as ações biofílicas locais.
5.3. DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO
Em 2012, a firma de consultoria em sustentabilidade e planejamento estratégico Terrapin Bright Green, realizou uma pesquisa cujo objetivo foi quantificar o retorno financeiro alcançado ao incorporar aspectos biofílicos no design de edifícios e espaços públicos. Para isso foram reunidos resultados de pesquisas em diversas áreas, realizadas por pesquisadores de vários países ao redor do mundo. O estudo mostrou que a inclusão de elementos naturais em edifícios corporativos pode reduzir o índice de adoecimento e ausência de funcionários, aumentar a retenção de colaboradores e melhorar a performance do trabalho ao reduzir os sintomas de fatiga mental e estresse. Os dados da pesquisa indicavam que cerca de 10% dos casos de ausência de funcionários podiam ser atribuídos a uma arquitetura sem conexões com a natureza. O levantamento realizado também encontrou evidências de que as economias médicas podem ser bastante significativas, tanto a nível individual quanto corporativo e governamental, considerando que a natureza contribui tanto para a manutenção da saúde quanto para a velocidade de recuperação de pacientes médicos sob diversos tratamentos, reduzindo seu tempo de permanência nos hospitais. A inclusão do design biofílico em lojas varejistas mostrou também uma valorização de 25% a mais nos produtos vendidos, em comparação com outros estabelecimentos sem acesso a natureza. Além das economias já bastante difundidas envolvendo economias em gastos com energia elétrica proporcionadas pela iluminação e ventilação naturais, estudantes em salas de aula mais iluminadas naturalmente apresentaram resultados acadêmicos de 7 a 18% superiores, comparados aos que possuíam ambientes de estudos com menor índice de iluminação natural. Além disso, o primeiro grupo também apresentou um aumento de 20 a 26% na velocidade de aprendizado, com relação ao segundo. Surpreendentemente, alguns resultados de estudos realizados por Kuo & Sullivan (2001) também mostraram que alguns casos de violência doméstica eram
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quando comparados a habitações em lugares áridos.
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25% menores em empreendimentos imobiliários realizados em locais mais verdes,
Outros estudos também mostraram significativas melhorias em vários espectros da saúde humana, incluindo a redução dos sintomas e, consequentemente, do uso de medicamentos para tratar o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), especialmente em crianças; redução da pressão arterial; melhoria nas funções cognitivas, resistência mental e foco; diminuição da violência e atividades
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criminais, entre outros.
6.
O QUE SÃO CIDADES BIOFÍLICAS
6.1. DEFINIÇÃO, CRITÉRIOS E CIDADES ANÁLOGAS
“Cidades biofílicas” são diferentes das “cidades verdes” por argumentarem dando maior importância ao bem estar e saúde mais do que apenas focando na eficiência energética e conservação ambiental, sendo esta uma consequência de suas outras buscas. Ela promove o acesso à natureza incluindo-a em cada espaço possível e estimulando as interações humanas entre si e com outras formas de vida. BEATLEY (2010, p.47) sugere critérios como uma tentativa inicial de mensurar e julgar as inclinações biofílicas de uma cidade, servindo para guiar o seu planejamento. Tais critérios podem ser visualizados na Tabela 1, extraída e traduzida de seu livro “Biophilic Cities: Integrating Nature into Urban Design and Planning”. Tabela 1 Indicadores de uma Cidade Biofílica Condições biofílicas e infraestrutura Percentual da população acesso a praças ou áreas verdes a até 100m de distância Exemplo: A meta do PlaNYC quanto à existência de praças ou áreas verdes a cerca de 10 minutos de caminhada de todos os moradores até 2030. Evidências sugerem que parques dentro de até 100m de distância são mais visitados; talvez uma meta mais sensate seria fornecer pelo menos uma praça ou área verde dentro de 100 metros para cara morador. Existência de uma rede ecológica conectada e integrada; urbanismo verde do teto à região Exemplo: Helsinki, região Finlandesa, conectou uma rede de áreas verdes; o Keskupuesto Park fornece uma fatia intacta desde uma antiga floresta às margens do município até o próprio centro da cidade. Percentual do terreno municipal em estado de conservação nativa ou semi-nativa Exemplo: Cidades devem fornecer mais do que praças formais, canteiros centrais gramados e paisagismo exotico; deve haver áreas onde os residentes possam ver e vivenciar a natureza nativa
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os dois maiores parques – Bold Park e Kikg’s Park – são deixados em grande parte em vegetação
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ou semi-nativa – florestas, pantanais, campinas e vegetação nativa. Na cidade de Perth, Austrália,
nativa. Nagoya, Japão, abriu mão de 10% de seu território para preservação ambiental. Uma meta de 10% parece minimamente rasoável. Percentual de cobertura florestal na cidade (em algumas regiões isso pode ser menos apropriado) Exemplo: American Forests recomenda uma meta de 40% de cobertura florestal sobre uma área metropolitan inteira; mais concentrada em áreas externas e menos em locações centrais da cidade. São Paulo, Brasil, que se esforça para proteger a Mata Atlântica, possui aproximadamente 20% de sua juristição em mata densa. Extensão e número de características urbanas verdes (ex.: telhados verdes, paredes vegetais, árvores) Exemplo: Um telhado verde ou outra característica urbana verde para cada mil habitantes, ou no mínimo uma por bloco urbano. Chicago, por exemplo, atualmente possui mais de 500 telhados com cobertura vegetal. Número de jardins comunitários e hortas (absolutos e per capita); acesso a áreas de jardins comunitários Exemplo: O programa comunitário P-Patch de Seattle estabeleceu o objetivo de pelo menos um jardim comunitário para cara 2.500 habitantes da cidade. Atividades Biofílicas Percentual da população que é ativa em clubes ou organizações relacionados à natureza e ao ar livre; número de tais organizações ativas na cidade Exemplo: Muitos residents urbanos são membros ativos em clubes naturais, clubes de jardinagem ou observação de pássaros, e outras organizações que encorajam conexões com a natureza e atividades ao ar livre. Uma meta potencial e razoável seria ter ao menos um quarto da população da cidade envolvida em uma ou mais dessas organizações. Percentual da população comprometidos com a restauração da natureza e em trabalhos voluntários, bem como os números absolutos Exemplo: Brisbane, Austrália, possui 124 grupos ativos de cuidados ambientais (conhecido como Habitat Brisbane) e cerca de 2.500 voluntários ativos; em uma população de aproximadamente 1 milhão de habitantes, isso representa uma taxa de participação de apenas 0,0025%. Uma meta minima seria ver entre 1 a 5% da população de uma cidade participando ativamente nos esforços de
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cuidados ambientais. Percentual de tempo que os habitants passam ao ar livre (pode variar de acordo com o clima)
Exemplo: Atualmente a maioria dos Americanos passa apenas 5% de seus dias ao ar livre. Uma meta inicial de 15 a 20% pareceria razoável, e até mesmo ambiciosa, dependendo do clima e época do ano. Percentual de habitants que praticam jardinagem ativamente (incluindo varandas, telhados e jardins comunitários) Exemplo: Pesquisas recentes indicam que impressionantes 44% dos residents de Vancouver, Columbia Britânica, cultiva pelo menos um pouco de sua própria comida Extensão do tempo de recesso e de brincadeiras ao ar livre nas escolas Exemplo: O sistema educacional da Finlândia fornece oportunidades de brincar ao ar livre entre cada segmento de ensino durante o dia letivo (essencialmente a cada 45 minutos). Atitudes e Conhecimento Biofílico Percentual da população capaz de reconhecer espécies nativas da fauna e flora locais Exemplo: pelo menos um terço dos habitantes de uma cidade deveriam ser capazes de identificar corretamente uma espécie comum de pássaro nativo, digamos, um cardeal em Richmond, Virginia. Dimensão na qual os habitantes são curiosos em relação ao mundo natural ao seu redor (como medidos por protocolos como questionários ou experimentos comunitários) Exemplo: Habitantes de uma cidade deveriam passar, em média, um mínimo de trinta minutos diários observando, explorando ou aprendendo sobre a natureza ao seu redor. Um número de governos estaduais ministrou pesquisas de conscientização ambiental para colher informações sobre a quantidade de tempo gasto olhando ou vivenciando a natureza, bem como a extensão de conhecimentos sobre espécies da fauna e flora locais. Por exemplo, o Florida Backyard Wildlife Habitat Program, aplicado pelo Serviço de Extensão da Vida Selvagem da Flórida, fez perguntas tais como as seguintes como parte de seu formulário: “Você pode identificar com facilidade algumas borboletas adultas da Flórida? (Sim/Não) Se sim, quantas espécies aproximadamente?” e “Em média, quantos minutos por semana você passa observando borboletas, outros insetos e aranhas em seu quintal?”. (Conferir o link: duval.ifas.ufl.edu/pdf/lawn_and_garden/Wild_Life_Habitat_ Application.pdf) Estudos acadêmicos e pesquisadores universitários também coletaram informações similares sobre o conhecimento da natureza local que também podem fornecer modelos úteis. Por exemplo,
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em um estudo particularmente interessante sobre conhecimento de aves em Wellington, Nova
Zelândia, Parker (2009) pediu para famílias identificarem seis espécies de aves locais (por meio de fotografias apresentadas em um questionário); ver também Archer e Beale (2004). Instituições e Governos Biofílicos Adoção de planos ou estratégias de biodiversidade local Exemplo: Muitas cidades ao redor do mundo prepararam planos de ação de biodiversidade, como por exemplo Dublin, na Irlanda e Cidade do Cabo, na África do Sul. Amplitude de organizações de apoio biofílico locais, por exemplo, a existência de um museu de história natural ou jardim botânico Exemplo: Cidades dos EUA, tais como Cleveland, Ohio, possuem tanto um jardim botânico quanto um museu de história natural ativos. Uma meta razoável seria assegurar que as cidades possuam organizações municipais e recursos equivalentes a essas duas formas de engajamento e educação biofílica. Prioridade dada à educação ambiental Exemplo: Muitas escolas urbanas possuem salas de aula ao ar livre e esforços educacionais que unem aprendizado em áreas tradicionais (ciência e matemática) com atividades laborais que envolvem aprender sobre a natureza. Uma meta razoável seria que pelo menos metade das escolas públicas da cidade trabalhassem com essas iniciativas. Percentual do orçamento local direcionado à preservação, recreação, educação, e outras atividades relacionadas ao à natureza Exemplo: Enquanto há poucos estudos comparativos, uma meta razoável seria ter um mínimo de 5% do orçamento de uma cidade voltado para a conservação, educação e restauração ambiental. Adoção de leis de planejamento, programas de subsídio, bonus de densidade, iniciativas de áreas verdes e padrões de iluminação que permitam desfrutar melhor o céu noturno. Exemplo: Muitas cidades americanas, tais como Seattle e Portland, possuem disposições nas leis municipais que obrigam ou encorajam características verdes e design biofílico. Um código de planejamento municipal deveria incluir uma combinação de incentivos (ex.: bonus de densidade) e requisitos (ex.: percentual de áreas verdes) para encorajar as características urbanas verdes.
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Número de iniciativas e projetos piloto biofílicos apoiados pela cidade
Exemplo: Muitas cidades, tais como Chicago, tem visto grande valor em pilotar novas ideias e conceitos de design verde e fornecimento de suporte tĂŠcnico e financeiro. Uma cidade deveria ter
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encaminhados pelo menos cinco iniciativas e projetos piloto biofĂlicos.
7. ESTUDO
PRELIMINAR
DESENVOLVIMENTO
DO
POTENCIAL
BIOFÍLICO
EM
DE
CORONEL
FABRICIANO 7.1. LEVANTAMENTO E ANÁLISE LOCAL
Para avaliar o potencial biofílico de Coronel Fabriciano, Minas Gerais, e sua propensão ao convívio natural, foi elaborado um questionário para começar a compreender as percepções e expectativas da população em relação à infraestrutura e paisagem urbana do município. A pesquisa foi realizada com 50 pessoas aleatórias no Centro de Coronel Fabriciano, sendo 50% do sexo masculino e 50% do sexo feminino. O principal público alvo jovens entre 20 a 30 anos, geração ainda está adquirindo seu espaço na sociedade e deve ditar os rumos do futuro próximo, correspondendo a 52% dos entrevistados (Gráfico 1).
Gráfico 7.1 - Faixa etária dos entrevistados
A primeira etapa da pesquisa tinha como objetivo compreender algumas das percepções e pretensões dos participantes em relação à presença da natureza em Coronel Fabriciano, em contraposição a elementos infraestruturais destinados a veículos, como vagas de estacionamento e pavimentação. Conforme visto no Gráfico 2, 52% dos entrevistados possuíam algum veículo automotivo. Quando questionados
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sobre suas preferências entre o aumento na quantidade de árvores ou de vagas de estaconamento no Centro de Coronel Fabriciano, 80% dos entrevistados optou pela
presença de árvores (Gráfico 2), apesar de 52% possuírem algum veículo automotivo (Gráfico 3). Dentre o público de 20 a 30 anos, a preferência por árvores chegou a 96,15%.
Gráfico 2 - Preferência entre mais árvores ou vagas de estacionamento no Centro de Coronel Fabriciano
Gráfico 3 - Posse de veículos automotivos entre os entrevistados
Apesar de sua insatisfação quanto à insuficiência de elementos naturais presentes no Centro de Coronel Fabriciano (Gráfico 4), sendo que vários dos entrevistados se queixaram da elevada temperatura na região, quando indagados sobre suas preferências quanto ao tipo de pavimentação nas ruas onde moravam,
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71,4% dos entrevistados escolheriam o asfalto (Gráfico 5).
Gráfico 4 - Grau de satisfação em relação à presença de elementos naturais no Centro de Coronel Fabriciano
Gráfico 5 - Preferência dos entrevistados quanto aos tipos de pavimentação viária
Tal contradição pode indicar uma preferência cultural, e não uma escolha real baseada em ponderações, pois alguns dos entrevistados pareciam não relacionar a impermeabilidade do solo, proporcionada pelo asfalto, com o aumento da temperatura local e do índice de alagamentos.
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Na segunda etapa da entrevista, foi apresentado aos participantes um cenário no qual teriam o poder de decidir a prioridade das políticas ambientais (Gráfico 6), sociais (Gráfico 7) e econômicas (Gráfico 8) em Coronel Fabriciano.
Gráfico 6 - Grau de importância dado às políticas ambientais em Cel. Fabriciano
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Gráfico 7 - Grau de importância dado às políticas sociais em Cel. Fabriciano
Gráfico 8 - Grau de importância dado às políticas econômicas em Cel. Fabriciano
. Em média, as políticas ambientais receberam mais importância, empatadas com 34,2% de preferência. A pesquisa ainda revelou um elevado equilíbrio entre os três aspectos em meio aos entrevistados, conforme demonstrado no Gráfico 9.
Gráfico 9 - Equilíbrio alcançado entre políticas ambientais, sociais e econômicas.
Tal análise se relaciona fortemente aos preceitos da sustentabilidade, que objetivam justamente o equilíbrio entre os aspectos ambientais, sociais e econômicos em quaisquer ações tomadas na sociedade.
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Questionados sobre a prioridade que dariam, numa escala de 1 a 5, para iniciativas de cunho ambiental (como a construção de parques, restauração de matas e nascentes, revitalização de rios e córregos, etc.) e iniciativas de infraestrutura (como
a construção e pavimentação de ruas, iluminação pública, saneamento básico, etc.), a média de priorização entre os dois aspectos ficou bastante equilibrada, privilegiando levemente os aspectos ambientais (Gráfico 10).
Gráfico 10 - Preferência dos entrevistados entre mais iniciativas infraestruturais vs. mais iniciativas ambientais.
Notamos, portanto, uma tendência popular à valorização da natureza e o reconhecimento, ao menos parcial, de alguns dos benefícios propiciados por sua presença dentro das cidades. Embora haja um aparente paradigma de oposição entre obras ambientais e infraestruturais, por parte dos órgãos executivos do Município, a entrevista indicou que a população valoriza o equilíbrio e a integração de ambos. Ainda que sua implementação faça parte das políticas municipais, algumas estratégias biofílicas podem ser realizadas individual ou coletivamente pelos próprios cidadãos, preferencialmente com o auxílio de profissionais qualificados, no sentido de integrar a natureza e transformar a infraestrutura já existente. Em determinados casos, a própria natureza tomará iniciativas de auto preservação que também beneficiam a população local. Nesses casos, basta dar-lhe espaço e, dependendo da situação, guia-la para que sua presença não represente riscos. Para exemplificar alguns casos em Coronel Fabriciano, foi realizado um levantamento fotográfico em áreas adjacentes ao Centro Universitário do Leste de
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os moradores e a gestão municipal.
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Minas Gerais, com a finalidade de identificar algumas das relações entre a natureza,
Na centralidade do Caladinho, corre um ribeirão homônimo por cerca de 12 quilômetros até desaguar no Rio Piracicaba. Entre 2007 e 2008 foi realizada uma obra de canalização do ribeirão, que passa pelo subterrâneo do Unileste. Na Figura 7.1 podemos observar o local onde a água abandona a galeria subterrânea, seguindo a céu aberto pelos bairros Caladinho de Baixo e Santa Terezinha II, até alcançar sua foz.
Gráfico 7.1 - Margens do Ribeirão Caladinho, próximo ao Unileste
Ao longo de suas margens podemos verificar a presença abundante de vegetação nativa, conforme visto nas figuras 7.1, 7.2, 7.4 e 7.5. Essas plantas surgiram espontaneamente, isto é sem a intervenção dos moradores ou dos agentes
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municipais.
Gráfico 7.2 - Margens do Ribeirão Caladinho, próximo à rua Equador
Apesar do alto índice de lixo e outros poluentes na água (Figura 7.3), a presença vegetal contribui parcialmente para sua limpeza, consumindo parte dos componentes orgânicos e amenizando os odores gerados pela decomposição dos mesmos.
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Gráfico 7.3 - Aspecto visual do Ribeirão Caladinho
Subsequentemente, as plantas que margeiam o ribeirão contribuem para a estabilidade das encostas (Figuras 7.4 e 7.5), atirantando suas raízes e produzindo ácidos húmicos e fúlvicos, que aumentam os índices de coesão das partículas do solo.
Gráfico 7.4 - Residências próximas ao Ribeirão Caladinho
Na Figura 7.5 podemos observar um muro residencial próximo a um talude bastante íngreme. Sem a cobertura vegetal, o terreno estaria muito mais suscetível à erosão, principalmente em períodos chuvosos, pondo em risco a segurança dos moradores e vizinhos. Durante as obras de canalização do ribeirão, a prefeitura municipal não realizou
operações
de
recuperação
vegetal nas encostas. A partir de uma mobilização de moradores locais, impulsionada pela
Gráfico 7.5 - Proteção vegetal natural em talude próximo ao Ribeirão Caladinho
insatisfação em relação à utilização de um lote próximo ao Ribeirão Caladinho como depósito de lixo e entulho, a prefeitura municipal de Coronel Fabriciano declarou o
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local como Área de Preservação Permanente (Figura 7.6).
Gráfico 7.6 - Área de Preservação Permanente
No local é interessante observar como a vegetação natural que surge a partir das margens do córrego, na rua Equador (Figura 7.7), parece caminhar em direção às plantas que foram cultivadas pelos moradores do local (Figura 7.8), em um canteiro remanescente da obra de canalização do Ribeirão Caladinho.
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Gráfico 7.7 - Vegetação que cerca a Área de Preservação Permanente
Gráfico 7.8 - Intervenção paisagística realizada pelos moradores próximos à Área de Preservação Permanente
Além da intervenção paisagística acima, outros moradores próximos se apropriaram de um canteiro entre as ruas Equador e Xingu para o cultivo de plantas ornamentais. A manutenção dos vegetais é realizada pelos próprios vizinhos, inclusive a poda, conforme observado na Figura 7.9.
Gráfico 7.9 - Intervenção espontânea no canteiro próximo à praça
Ao mesmo tempo em que notamos iniciativas biofílicas populares, também constatamos que algumas obras realizadas pelo município não apresentam qualquer preocupação com o estímulo, ou sequer a preservação de elementos vegetais. Isso
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pode ser observado em uma obra recente de revitalização da Praça José Maria de Man, no Bairro Universitário, cujas árvores foram cortadas. Há casos em que o corte
de árvores é justificável, pois com o passar do tempo algumas podem apresentar um enfraquecimento do tronco e galhos, acarretando em riscos reais para os usuários do local. Entretanto, conforme vemos na Figura 7.10, o município não se preocupou em substituir as árvores cortadas por novos exemplares, que não precisariam ser, necessariamente, da espécie plantada anteriormente.
Gráfico 7.10 - Revitalização da Praça José Maria De Man
A ausência ou insuficiência de espaços naturais presentes nos espaços públicos do município pode sinalizar a falta de conhecimento e/ou interesse ambiental por parte de sua atual gestão. Isso também pode indicar a persistência de um paradigma no qual natureza e progresso são duas coisas distintas, enquanto, na verdade, elas deveriam caminhar em conjunto e estimular o desenvolvimento mútuo. Ao perceber a existência de um grande canteiro central subutilizado em uma rua próxima ao Unileste (Figura 7.11), foi idealizado um seminário para ser realizado no 1º Congresso da Escola Politécnica do Centro Universitário do Leste de Minas Gerais. O canteiro, localizado na Av. São Paulo, no Bairro Aparecida do Norte, também surgiu como remanescente das obras de canalização na centralidade do Caladinho. Após sua conclusão, os próprios moradores do local plantaram algumas mudas de oitis
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(Licania tomentosa) para sombrear a rua e o canteiro.
Gráfico 7.11 - Canteiro central da Av. São Paulo, bairro Aparecida do Norte
O objetivo inicial do seminário seria avaliar a viabilidade de exploração da participação popular como meio de desenvolvimento colaborativo local. Para isso os moradores da Av. São Paulo foram convidados a participarem de ações que, em conjunto com os alunos do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Unileste, transformariam o canteiro em uma pequena praça, com alguns mobiliários básicos construídos de pallets, além do cultivo de uma pequena horta comunitária e plantio de árvores frutíferas de pequeno e médio porte, como figueiras, amoreiras e pitangueiras, além de algumas ornamentais como o ipê amarelo. A escolha de árvores de pequeno e médio porte se justificou pela existência de fios de alta tensão correndo transversalmente sobre a rua, a cerca de 12 metros de altura. O seminário propunha três etapas distintas, porém complementares: 1) Exibição de um documentário análogo (Praça de Bolso do Ciclista, 2015), seguido de um debate sobre sustentabilidade e explicação dos trabalhos seguintes. 2) Realização de uma oficina que ensinasse os princípios básicos de marcenaria, envolvendo critérios de segurança e utilização correta de ferramentas, como preparo para a etapa posterior. 3) Oficina de construção com pallets que, a partir dos métodos aprendidos na
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oficina de marcenaria, construiria peças simples de mobiliário urbano que seriam transportadas para o canteiro da Av. São Paulo. 4) Plantio das árvores adquiridas no viveiro municipal de Coronel Fabriciano.
Para a divulgação do seminário foi elaborado um cartaz (Figura 7.12) detalhando os dias, horários e locais de cada oficina. Algumas cópias impressas foram fixadas em bares e na padaria local da Av. São Paulo.
Gráfico 7.12 - Cartaz de divulgação do seminário
A oficina de construção com pallets teve um elevado número de participantes, que dividiram os custos do material. A quantidade de pessoas acabou por contribuir muito com a velocidade de execução do trabalho, sendo assim dois bancos foram
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construídos em um único dia (Figura 7.13)
Gráfico 7.13 - Fase final de confecção do mobiliário com pallets
No dia seguinte os bancos foram transportados para o canteiro da Av. São Paulo (Figura 7.14), para serem utilizados livremente pelos moradores.
Gráfico 7.14 - Mobiliário instalado no canteiro central da Av. São Paulo, no bairro Aparecida do Norte
Apesar do interesse inicial dos moradores locais em contribuir para a melhoria do local, e sua contribuição para a divulgação das oficinas, nenhum deles compareceu às atividades propostas. Devido à escassez de mão de obra voluntária e às altas temperaturas no dia de sua execução, a oficina de agricultura urbana acabou não sendo executada. Além disso, no dia seguinte à instalação dos bancos à sombra de
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uma árvore, eles haviam sumido.
As experiências supracitadas evidenciam uma necessidade, somada ao desejo por parte dos cidadãos de Coronel Fabriciano, por mais presença da natureza no meio urbano. Entretanto a ausência de políticas municipais que estimulem a inclusão de elementos naturais, somada à dificuldade de cativar os cidadãos a tomarem suas próprias iniciativas locais, representam um grande desafio a ser enfrentado rumo à reintegração entre a cidade e o meio ambiente.
7.2. ANÁLISE CRÍTICA DO PLANO DIRETOR DE CORONEL FABRICIANO
Em dezembro de 2012 foi aprovada Lei Municipal N.º 3.759, que institui o Plano Diretor de Coronel Fabriciano e dá outras providências. A lei possui como objetivo básico a orientação da administração pública e das iniciativas privadas no que diz respeito ao desenvolvimento e expansão urbana do município. Para compreender melhor o planejamento urbano da cidade quanto à integração entre cidade, pessoas e natureza, foi realizada uma breve análise de seu conteúdo para entender quais das ferramentas poderiam ser aproveitadas para a transformação de Coronel Fabriciano em uma cidade mais biofílica, ou seja, com mais afinidade a todas as formas de vida. É importante destacar que ainda no TÍTULO I da Lei 3.759 (CORONEL FABRICIANO, 2012), que trata “dos Princípios Fundamentais e Objetivos Gerais da Política Urbana”, temos alguns artigos e incisos que podem servir de base para programas e políticas ambientais mais amplas e eficientes. Logo no Art. 3º, II, “a oferta de um meio ambiente ecologicamente equilibrado” é apresentada como uma função social da cidade. Tal afirmação se relaciona diretamente com o princípio primordial do urbanismo biofílico, que é a associação do ser humano com a natureza, em cuidado e benefício mútuo. Segundo o Art. 4º da mesma lei, nos incisos II e III, algumas das exigências e critérios para o cumprimento da função social da cidade são o “aproveitamento socialmente justo do solo” e a “utilização adequada dos recursos naturais disponíveis,
justo”, o artigo deixa uma grande margem para o seu não-cumprimento. Além disso,
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respectivamente. Porém ao não especificar o que seria o aproveitamento “socialmente
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bem como proteção e melhoria do meio ambiente natural e construído”,
o aproveitamento “ambientalmente justo” do solo também deveria ser uma exigência, a fim de fornecer espaço para outras formas de vida, contribuindo para a manutenção da saúde da cidade e de sua população. Entre os objetivos do plano diretor, citados no Art. 5º, uma gestão com foco no desenvolvimento sustentável e biofílico poderia focar nos incisos III, VII, VIII e IX, considerando-os em todas as ações do poder executivo: CORONEL FABRICIANO. LEI N.º3.759, 2012. “Art. 5º. São objetivos do Plano Diretor: [...] III – fortalecer a identidade do Município por meio da valorização de suas referências simbólicas e da proteção, preservação e recuperação de seu patrimônio cultural, histórico, artístico, ambiental e paisagístico; [...] VII – preservar, proteger e recuperar o meio ambiente VIII – ampliar os espaços públicos destinados ao lazer e ao convívio; IX – promover a integração e a complementaridade das atividades urbanas e rurais; [...]”
Nos últimos anos a cidade de Coronel Fabriciano tem fortalecido seu turismo, principalmente na região da Serra dos Cocais das Estrelas, rica em paisagens naturais e rurais. Porém ainda há, literalmente, um longo caminho a ser percorrido no sentido de integrar as atividades urbanas e rurais da cidade, principalmente considerando a distância geográfica entre ambos. A ampliação e o aprimoramento do transporte público e das vias de acesso à Serra dos Cocais são medidas essenciais para sua integração, além da realização de programas educacionais e culturais que estimulem o turismo entre os moradores locais. Quanto ao TÍTULO II, que trata “dos Eixos Estratégicos do Desenvolvimento Municipal”, seria possível trabalhar embasado em alguns dos incisos e parágrafos do Art. 8º. CORONEL FABRICIANO. LEI N.º3.759, 2012.
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“Art. 8º. São diretrizes estratégicas no tocante à integração da Zona Rural ao contexto socioeconômico e ambiental do Município:
[...] II – admitir, mediante condições, a instalação de empreendimentos econômicos de caráter urbano na Zona Rural; III – apoiar e estimular empreendimentos com sustentabilidade ambiental e econômica na Zona Rural, promovendo, através de parcerias, ações visando à geração de emprego e renda, respeitando tradições locais e aproveitando a mão-de-obra local e os recursos naturais disponíveis;”
Nesses
dois
incisos
é
possível
enxergar
a
oportunidade
de
atrair
empreendimentos inovadores, que possam conciliar o estilo de vida rural às tecnologias urbanas sustentáveis. Um exemplo disso seria um centro de pesquisas com foco no desenvolvimento de técnicas mais saudáveis e eficientes de produção agropecuária. A proximidade com as lavouras orgânicas já existentes, além da presença de Mata Atlântica no local poderiam servir como objeto de pesquisa de novas tecnologias biomiméticas. Ainda no Art. 8º: “[...] §1º. Visando à implementação das diretrizes estratégicas dispostas neste artigo, deverá o Executivo Municipal empreender em curto prazo as seguintes ações: I – definir a política pública para o desenvolvimento do turismo rural, contemplando entre outros os seguintes aspectos: [...] d) vinculação ao Circuito Mineiro da Mata Atlântica; e) exploração e divulgação da “imagem clima de montanha” para as partes altas do município;
Considerando o clima quente do município, com temperaturas médias de 28,9ºC no verão, segundo informações do site da Prefeitura Municipal de Coronel Fabriciano, a promoção do acesso gratuito às belezas naturais da Serra dos Cocais, complementado por uma infraestrutura auxiliar (pousadas, restaurantes, postos de atendimento e resgate, etc.), pode ser bastante rentável e servir como modelo de integração à natureza e desenvolvimento sustentável no Brasil. Em parceria com
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programa contínuo de turismo ecológico envolvendo a abundante Mata Atlântica
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outros municípios, como Timóteo e Marliéria, ainda seria possível implementar um
presente na região, tanto no Parque Estadual do Rio Doce quanto na Serra dos Cocais das Estrelas. No que se relaciona à Zona Urbana, o Plano Diretor ainda prevê no Art. 9º algumas “diretrizes estratégicas no tocante à promoção do desenvolvimento urbano sustentável”. Algumas dessas diretrizes parecem ser mais limitantes do que construtivas, como é o caso dos incisos I, V e VII: CORONEL FABRICIANO. LEI N.º3.759, 2012. “Art. 9º. São diretrizes estratégicas no tocante à promoção do desenvolvimento urbano sustentável: I – compatibilizar a expansão urbana com as condições do meio físico, impedindo que o tecido urbano se estenda sobre áreas impróprias à urbanização; [...] V – promover a ocupação do solo e o adensamento, em compatibilidade com a fluidez do tráfego; [...] VII – estabelecer a disciplina do uso do solo em compatibilidade com o desenvolvimento econômico preconizado e com o sistema viário e de transporte; [...]”
Nos incisos citados é possível observar uma postura defensiva, que entende a urbanização como um empecilho para a natureza e vice-versa. Eles parecem se preocupar mais com a preservação da atual infraestrutura urbana do que com sua adaptação em conjunto com as novas edificações. Tal posicionamento pode ser atribuído à falta de conhecimento por parte de algumas gestões públicas do Brasil no que diz respeito às novas teorias e técnicas de planejamento e expansão urbana, incluindo as que se relacionam ao urbanismo sustentável. Alguns dos itens presentes no inciso III também evidenciam essa insuficiência de informações: “[...]
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III – adotar medidas de prevenção de erosões, tais como:
a)
elaboração
de
estudos
geológicos
como
exigência
para
licenciamento de empreendimentos em áreas com susceptibilidade a processos erosivos; b) prevenção de processos de erosão laminar; c) preservação da cobertura vegetal de encostas e topos de morros; [...]”
Os itens presentes no inciso III, mais uma vez são limitantes, não dando liberdade à elaboração de empreendimentos capazes de mitigar a erosão, ainda que em áreas suscetíveis à mesma, por meio de estratégias biofílicas. Além disso, o item “b” ainda desconsidera todos os outros tipos de erosão além da laminar e adota como medidas preventivas apenas a preservação das coberturas vegetais já existentes, sem prever medidas proativas de bioengenharia dos solos. Apesar do inciso VIII dispor-se a “promover a urbanização e regularização dos assentamentos precários passíveis de consolidação sustentável", ele o faz de forma extremamente vaga. Tal passagem chega a dar a impressão de tratar da sustentação estrutural dos assentamentos precários, pois em momento algum da legislação deixa clara a sua definição de “sustentabilidade”. Por outro lado, outros programas mais completos e objetivos podem surgir com base nesse inciso. Por fim, no que diz respeito ao Art. 9º, os incisos IX e X se relacionam fortemente com os conceitos biofílicos do urbanismo, sendo eles: “[...] IV – promover a mobilidade urbana sustentável no Município, priorizando os deslocamentos não motorizados e o transporte público; X – promover o fortalecimento da identidade municipal, por meio de: a) ampliação e valorização dos espaços públicos; b) preservação, proteção e recuperação do patrimônio cultural e ambiental; c) melhoria da articulação viária entre bairros e regiões do Município.”
A promoção da mobilidade urbana sustentável e do transporte público seriam altamente vantajosas em Coronel Fabriciano, levando em conta que a maioria de suas
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o Centro da cidade, apresentam um grande déficit de estacionamentos.
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vias são relativamente estreitas e que os principais centros comerciais, principalmente
No TÍTULO III, que trata “do ordenamento do território”, são encontrados alguns artigos bastante úteis no planejamento urbano biofílico. No Capítulo II (Zoneamento), seção III (Zona de Proteção Ambiental), é válido observar os seguintes artigos:
“[...] Art. 15. [...] Parágrafo único. Em razão de seus recursos naturais e beleza cênica, a ZPA se constitui ainda em zona de interesse paisagístico, voltada para atividades de turismo e lazer, sendo passível de ocupação com baixa densidade construtiva. Art. 16. [...] I – são admitidos somente os usos considerados compatíveis com a preservação ambiental; [...]”
Em relação ao Art. 15, uma medida que poderia contribuir imensamente com a preservação das ZPAs seria a atribuição de usos compatíveis. A criação de parques ecológicos, com infraestrutura adequada, poderia estimular sua visitação por parte dos moradores da região, inibir o desmatamento e ocupação irregular, além de promover o contato e valorização da natureza. Quanto ao inciso I do Art. 16, tal critério poderia ser estendido a outras áreas da cidade, principalmente aquelas com ausência de elementos naturais, como é o caso do Centro. Ainda no que diz respeito às áreas com insuficiência de elementos naturais, alterações poderiam ser feitas na Seção II do Capítulo V, que tratam das calçadas e sistemas viários, respectivamente: Seção II Das Calçadas Art. 50. O espaço viário destinado às calçadas deve ter largura suficiente para garantir a acessibilidade e o caminhamento seguro dos pedestres, além de permitir a arborização e a implantação de mobiliário urbano. §1º. As calçadas devem ser dimensionadas em 20% da largura da via
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para cada um dos lados e devem ter largura mínima de 2,40m, independente da classe da via.
§2º. Nas vias arteriais, coletoras e Vias da Área Central as novas edificações estarão sujeitas ao Recuo de Alinhamento obrigatório, onde a calçada lindeira apresentar largura inferior a 2,40m (dois metros e quarenta centímetros). §3º. O Recuo de Alinhamento obrigatório terá a medida equivalente à diferença entre a largura da calçada existente e a largura mínima de calçada, estabelecida em 2,40m (dois metros e quarenta centímetros). §4º. A área disponibilizada para ampliação da calçada continua sendo parte do lote e utilizada no cálculo do coeficiente de aproveitamento do terreno. §5º. A área disponibilizada para ampliação da calçada será compensada através do coeficiente de aproveitamento do terreno, agregando para cada 1m² (um metro quadrado) disponibilizado, 3m² (três metros quadrados) a mais de potencial construtivo.
Além de prever larguras acessíveis e a permissão de arborização e mobiliário urbano, a legislação deveria também impulsionar a existência de jardins nas calçadas, aumentando a permeabilidade do solo e a retenção de águas pluviais, além de contribuir com o equilíbrio microclimático local. Tal iniciativa também poderia fazer parte de um programa mais amplo que culmine na criação de hortas comunitárias urbanas, complementando principalmente a nutrição em famílias de baixa renda, sem necessariamente impactar na produção agrícola das zonas rurais. Alguns trechos da Lei Nº 3.759 ainda preveem ações de educação ambiental, como é o caso do Art. 55, IV, b, que prenuncia a “implementação de ações de educação ambiental visando a orientar o uso das espécies adequadas”, como estratégia para garantir a arborização urbana adequada. Entretanto, poderia ser mais eficiente a inclusão de tais espécies em documentos anexos ao próprio Plano Diretor. Muitos desses programas podem ser realizados por meio de parcerias entre iniciativas públicas e privadas, com o auxílio de trabalhos voluntários, para a criação de um programa mais amplo de educação e restauração ambiental, fazendo uso dos seguintes incisos do Art. 55: “[...] VII – promover ações voltadas para a prevenção de enchentes
como o controle de erosões; monitoramento das áreas de contribuição para
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incluindo, entre outras medidas: revegetação de cabeceiras e margens bem
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decorrentes do transbordamento dos Córregos Caladão e Caladinho,
as bacias destes córregos; criação de áreas verdes permeáveis especificamente destinadas ao controle de cheias e onde sejam permitidas apenas atividades compatíveis com a retenção das águas pluviais; [...] XIII – promover o desassoreamento dos cursos d’água e a desobstrução sistemática da rede de drenagem existente. [...] XXI – promover a educação ambiental bem como a identificação, divulgação e implantação de sistemas adequados de convivência harmoniosa da população com as áreas verdes dos parcelamentos urbanos implantados.”
Nesse caso, a inclusão da população nos processos de restauração e conscientização ambiental podem ser essenciais na difusão de conhecimentos sobre sustentabilidade, valorização da natureza, além de estimular a troca de informações e interações interpessoais, permitir uma maior abrangência do programa e ainda
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aliviar a sobrecarga de responsabilidade dos órgãos executivos municipais.
8. CONCLUSÕES E PROPOSTA INICIAL PARA A SEGUNDA ETAPA DO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
Considerando a natureza biofílica inerente ao ser humano, bem como os abundantes benefícios alcançados pelo atendimento dessa necessidade, fica clara a necessidade de reintegrar a natureza à sociedade e vice-versa, a partir das cidades. Entretanto, dentro do atual contexto político e econômico do Brasil, contar apenas com as iniciativas governamentais pode continuar atrasando o desenvolvimento sustentável do país, que se torna evidente em comparação a alguns países da Europa, Ásia e até mesmo outros da America Latina, como é o caso da Colômbia. Um caminho mais viável, ao menos até que as novas gerações políticas revitalizem o poder público nacional, poderia ser a implementação de iniciativas ambientais pautadas no apoio e realização popular. É necessária a criação de um programa capaz de envolver diversas gerações, principalmente as mais jovens, atuando na recuperação de cursos d’água, áreas degradadas, atuando também no reflorestamento e agricultura urbana, entre outros. Tanto por sua viabilidade orçamentária quanto por suas subsequentes resultantes socioambientais e econômicas, as ações tomadas a partir desse programa devem ser realizadas, preferencialmente, dentro dos princípios do design biofílico, ajudando a difundi-los como alternativa colaborativa para o desenvolvimento sustentável. Diante do potencial biofílico observado na cidade de Coronel Fabriciano, propõese a criação de um instituto educacional que associe ensino o fundamental à educação ambiental, ao mesmo tempo em que estimula o convívio social e o contato com a natureza. A finalidade do instituto seria difundir, de forma prática, os preceitos de sustentabilidade ambiental, social e econômica, não se restringindo apenas ao ensino tradicional em sala de aula, mas também realizando ações socioambientais em parceria com os estudantes e iniciativas público-privadas.
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profissionais do arquiteto e urbanista, conforme RESOLUÇÃO N° 21, DE 5 DE ABRIL
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Para a elaboração do projeto supracitado, faz-se uso das atribuições
DE 2012, do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR). Entre as atribuições estão: RESOLUÇÃO N° 21, DE 5 DE ABRIL DE 2012, Dispõe sobre as atividades e atribuições profissionais do arquiteto e urbanista e dá outras providências. [...] Art. 2º As atribuições profissionais do arquiteto e urbanista a que se refere o artigo anterior são as seguintes: I - supervisão, coordenação, gestão e orientação técnica; II - coleta de dados, estudo, planejamento, projeto e especificação; III - estudo de viabilidade técnica e ambiental; IV - assistência técnica, assessoria e consultoria; [...] VIII - treinamento, ensino, pesquisa e extensão universitária; [...]”
Nesse caso, seriam aplicados os incisos supracitados no estudo de viabilidade, escolha do local apropriado e elaboração do projeto. Além disso, para a realização da proposta, seriam necessários estudos continuados em relação aos aspectos a serem trabalhados em Coronel Fabriciano, buscando aplicar estratégias sustentáveis dentro
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dos preceitos do design biofílico.
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