Arquitetura popular: Aplicação da arquitetura em demandas populares e o papel do arquiteto

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ARQUITETURA POPULAR: APLICAÇÃO DA ARQUITETURA EM DEMANDAS POPULARES E O PAPEL DO ARQUITETO POPULAR ARCHITECTURE: APPLICATION OF ARCHITECTURE IN POPULAR DEMANDS AND THE ROLE OF THE ARCHITECT

ESTUDO REALIZADO NA CIDADE DE VIRGINÓPOLIS – MG Jaíne Lacerda Carvalho Centro Universitário do Leste de Minas Gerais – Unileste-MG, Curso de Arquitetura e Urbanismo, Coronel Fabriciano-MG, Brasil. RESUMO: Este trabalho discorre acerca da aplicação de um método existente (El Metodo), e visa o atendimento de demandas populares por arquitetos com a participação das famílias envolvidas na pesquisa de forma dinâmica e interativa. E destaca a importância do papel do arquiteto na a sociedade contemporânea. A pesquisa é introduzida com a discussão sobre a importância do papel do arquiteto (e de sua respectiva contratação), e como a arquitetura deve ser inclusiva, de forma a compreender e atender as necessidades das famílias, dentro de qualquer contexto social, além de defender a relevância da participação dos clientes nas tomadas de decisões. É embasado nos estudos de autores como Nogueira, Netto, Livingston e Fathy, ponderando uma abordagem sistemática da aproximação entre arquiteto e cliente. PALAVRAS-CHAVE: Sociedade, arquiteto, demandas populares, método, aplicação. ABSTRACT: This assignment discourse about the application of an existent method (El metodo) which aims the care of popular demands of architects with the participation of the families involved in the research in an dynamic and interactive form that exposes the importancy of the roll of an architect in a contemporary society. This research is introduced with the discussion about the importancy of the roll of an architect (and its respective hiring) and how architeture should be inclusive, in order to understand and meet the needs of the families, inside any social context, in addition to uphold the relevance of the clients in decision-making. Is based on the studies of the authors, like, Nogueira, Netto, Livingston, and Fathy, considering an approach of architects and clients. KEYWORS: Society, architect, popular demands, method, application. 1


INTRODUÇÃO

É fundamental entender o planejamento urbano com clareza, para que dessa forma seja viabilizada a pertinência de todos os condicionantes que colaboram com sua criação: a paisagem, a memória, a cultura e, sobretudo como se caracteriza cada local, sem que se rompam os principais símbolos que formam a identidade da cidade. E isso não diz respeito apenas à cidade. Refere-se também às características de uma moradia, e das pessoas que nela habitam.

“O objetivo dessa mesa é tratar do arquiteto como agente de transformação

em

função

social

e

profissional

com

suas

particularidades, nossa principal função, que é atuação diante do ambiente construído, seja na sua melhoria ou do ambiente a se construir, e buscar soluções comuns e que possam trazer sempre a qualificação desse bem[...]”

(informação verbal) ¹

A contratação de um arquiteto possibilita o uso de materiais, técnicas e soluções plausíveis com o contexto social ao qual cada indivíduo está inserido, além de ser comprovada economia em obras que contam com a concepção de projetos feitos por arquitetos. Hoje no Brasil ainda há um vasto número de famílias, que mesmo possuindo condições financeiras para contratar os serviços oferecidos por um arquiteto, opta pela autoconstrução, sem nenhuma orientação técnica e/ou profissional. Datafolha sobre como o brasileiro constrói e ressaltou o papel técnico e social dos arquitetos. A partir das informações de que mais de 85% da população economicamente ativa do Brasil que reformou/construiu suas casas não utilizou serviços de um profissional tecnicamente habilitado, a reportagem mostrou o arrependimento dos entrevistados, como uma moradora do Rio de Janeiro que teve que mandar refazer os serviços de um inexperiente e mesmo assim o resultado final não ficou nada bom. “Para mim, o barato saiu caro”, declarou ela. (informação verbal) ²

¹ trecho da palestra da arquiteta e urbanista Angela Gordilho, Doutora pela FAU-USP, coordenadora do Lab-HABITAR do PPG/AU da FAUFBa, promovida pelo CAU/BA em comemoração ao Dia do Arquiteto – 15/12/2012

² O programa Fantástico, da TV Globo, apresentou em 11/10/2015, dados inéditos da pesquisa menciona acima CAU/BR-

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Em 2015 três arquitetos - Danilo Terra (36 anos), Pedro Tuma (38) e Fernanda Sakano (27) - foram contratados pela diarista Dalva Borges Ramos, moradora da Vila Matilde (São Paulo), que após de 3 décadas trabalhando como diarista em São Paulo, viu sua residência com falhas na estrutura, o que consequentemente levou o teto à ruína. A diarista dispunha de R$ 150.000,00, que incluíam os custos do projeto. A casa erguida pelos arquitetos conta com poucos recursos, e foi projetada através de estrutura com blocos de concreto aparentes. A residência possui soluções de iluminação e ventilação naturais, que por conseguinte geram economia para a família, e venceu o prêmio ArchDaily de melhor casa do mundo, onde mais de 55 mil votantes de diversos países elegeram-na dentre outros 3 mil projetos incluindo dos países Reino Unido, Japão, Eslovênia e Vietnã. A concretização desse projeto provou a garantia de economia e qualidade de espaços projetos por arquitetos. A campanha publicitária do CAU/BR que mostrou a “casa da Vila Matilde” tinha como objetivo justamente mostrar à população brasileira que as obras feitas com auxílio de arquitetos e urbanistas acabam custando menos do que as construções feitas apenas com pedreiros. Arquitetos e urbanistas também garantem segurança, conforto e a valorização de seu patrimônio. (CAU/BR 2015) Segundo os arquitetos do escritório Terra e Tuma em entrevista para o CAU/BR, existe uma grande demanda para soluções de moradias de famílias de baixa renda no Brasil. Frisam que casos como esse, devem ser tidos como regra e não exceção, e que os profissionais de arquitetura carecem de atendimentos para esse tipo de demanda.

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“Uma história comovente foi de uma empregada doméstica de São Paulo que guardou uma poupança e quando o teto de sua casa ameaçou desabar, resolveu contratar dois arquitetos premiados internacionalmente, pagando o preço justo, para reconstruir sua residência em Vila Matilde.” (CAU/BR *figuras: archdaily)

Em um projeto arquitetônico ou urbanístico, um dos pontos mais relevantes é a concepção dos espaços, por isso consiste na parte mais importante do projeto. Uma obra arquitetônica não deve ser apenas beleza ou função; mas a relação desses sentidos, que quando se associam resultam em edificações que por conseguinte, geram pertencimento ao seu usuário. Através do entendimento do espaço, é possível pensar em uma arquitetura que responda as demandas familiares, visando as necessidades e coerência com o contexto em questão. A arquitetura deve ser inclusiva e atender as particularidades de qualquer pessoa, família, ou cidade, independe de sua situação socioeconômica, cultural e espacial. (NETTO,2002). Um dos pontos mais relevantes em relação ao papel do arquiteto é a capacidade de estudar a fundo as peculiaridades de seu cliente, cultura, tempo e espaço, para que as demandas sejam efetivamente solucionadas. Dessa forma o artigo visa através dos estudos sobre a forma de abordagem aos clientes e levantamento e aplicação das características particulares de cada cliente, durante o processo de concepção de projeto arquitetônico; compreender a 4


demanda individual dos clientes e se é possível suprir uma variável de necessidades que existe, além de explorar formas de atuação de arquitetos, que possibilitem resolver demandas populares no que diz respeito à concepção de moradia. Tal proposta surgiu a partir da constatação da ausência de escritórios de arquitetura na cidade de Virginópolis – MG e região que atendam essas demandas e portanto, visa atender a população de baixa renda que nela reside. Acredita-se que os resultados dessa pesquisa possam ser úteis em outras cidades que possuem problemas semelhantes e será aplicado com base no Método já existente do arquiteto argentino Rodolfo Livingston³, havendo por conseguinte alterações feitas acerca das necessidades contundentes com a cidade e contexto sócia em questão.

APROXIMAÇÃO ENTRE ARQUITETO E CLIENTE

A arquiteta Priscilla Nogueira utilizou em sua dissertação de mestrado o método desenvolvido por Livingston (2006). Tal método conta com uma sucessão de técnicas participativas que podem determinar de forma coletiva as necessidades de uma família, buscando soluções arquitetônicas para problemas encontrados pelos usuários em suas moradias. O método emergiu a partir de sua ampla experiência no que diz respeito ao âmbito popular, no entanto pode ser utilizado em outras classes sociais. Esse método dispõe de uma série de encontros do arquiteto e da família, a partir daí o arquiteto determina quais são as necessidades e desejos dos clientes. Livingston (2006) utiliza duas colunas sendo uma de aspirações e a outra de necessidades do projeto, e por conseguinte auxiliam na avaliação das variantes. E as etapas do método são as seguintes: 1. O pacto: etapa inicial, e é onde é explicado o método e contrato 2. Local, família e renda: são recolhidas as dados sobre os clientes com seguinte técnica: 1. O projeto do cliente (PC), que é a reforma indicada pelo cliente; 2. Mais – menos: Saber o que eles mais gostam e o que menos gostam na casa: 3. Exercício fiscal: Criticar ao máximo a habitação, para dessa forma descobrir os problemas que não estão evidentes. __________________ ³ Rodolfo Livingston (Buenos Aires, 22 de agosto, 1931) é um arquiteto argentino que se caracteriza por suas relações pessoais com seus clientes, a sua forte crítica no planejamento urbano, arquitetura e bemestar social em geral. Criador do método "Arquitectos de Familia", esse sistema recebeu dois prêmios internacionais ( "Melhores Práticas" Istambul 1996 "Habitat World Awards", Bruxelas, 2002)

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4. Casa final desejada (CFD), para levantar os desejos que se mantiver oculto, caso considerem inacessível. 5. A história da habitação e da família: essa etapa é utilizada para entender a habitação na situação que se encontra e explorar a predileção dos clientes. 6. Família: é possível através dessa etapa compreender as primordialidades de cada morador. 7. Local atual: é possível compreender como imóvel é habitado.

3. Criatividade e evolução das variantes: Livingston divide essa etapa criativa em criação de campo, fogos de artificio e sensatez; oferece uma série de indicações de organização. 4. Apresentação de variantes: pode ser observado pelo arquiteto a insatisfação ou felicidade dos membros da família, onde os mesmos confrontam sua própria expressão. 5. Conjunto final: são dados os ajustes nas preferências da família e definido o projeto final. Em seguida, o processo para obtenção de detalhes, acabamentos e imagem geral são repetidos. Para a fase de execução, Livingston oferece um manual; com planos, e com fitas de áudio que possibilitam o acesso a informações complementares. (LIVINGSTON, 2006)

Nogueira (2010) observa em sua pesquisa, que houve uma certa apreensão dos indivíduos utilizados como objeto de estudo, no que se refere a confiança no arquiteto, e na sua capacidade de solucionar os problemas habitacionais. Entende-se, portanto, que a utilização do mesmo envolve uma aproximação sistemática entre arquitetos e clientes populares. (NOGUEIRA, 2010)

Vale ressaltar que Livingston (2006) não criou o Método com o objetivo de atender pessoas de baixa renda. Sua ideia era criar uma estratégia que solucionasse os problemas que a forma convencional não era capaz de solucionar, e que tinha como comum. Entretanto, a abordagem de Livingston (2006), mesmo não comprometida diretamente com as classes populares, é a que mais se aproxima de um ponto de partida para a crítica que se buscava empreender.

Segundo a autora Nogueira (2010), é de suma importância destacar um dos pontos mais significativos nos atendimentos: o grande receio dos clientes em firmar um compromisso com arquitetos. Essa

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apreensão pode ser medida pelo alívio que os clientes visivelmente demonstravam quando o método de trabalho era esclarecido e, sobretudo, quando tomavam conhecimento dos custos dos serviços oferecidos. (NOGUEIRA, 2010)

O autor Livingston (2006) descreve sua forma de trabalho, nomeado pelo mesmo de El Metodo, a criação de seu trabalho é baseado na sua vasta bagagem técnica e vai desde o contato inicial com a família, até a exposição de soluções para os problemas da habitação, Livingston (2006) detalha e explica uma forma de trabalho capaz de responder a múltiplas demandas.

CONSTRUINDO COM O POVO – PARTICIPAÇÃO POPULAR

A partir da literatura internacional que relata a participação de usuários na concepção de projetos arquitetônicos, onde Hassan Fathy (1980), conta sua experiência, ele busca sintetizar e estruturar a comunicação entre clientes e arquitetos no processo de criação de projetos. Em meados de 1980, o livro de Hassan Fathy, “Construindo com o povo: arquitetura para os pobres”, foi lançado no Brasil. O autor narra sua atuação na construção de uma nova cidade, com a atuação dos habitantes e adotando materiais construtivos locais (que no caso dos egípcios, utilizam o adobe). Na sua concepção de projeto, Fathy argumenta as diretrizes convencionadas de produção de moradias e cidades, fundamentado em planos organizados, e apresentava uma maneira diferente para a atuação de arquitetos nessa realização: ele almejava romper a barreira existente arquitetura popular e arquitetura criada pelo arquiteto. (FATHY, 1980). Fathy (1980) não relata uma forma sobre a participação de moradores em projetos de moradias, e sim o processo no qual esteve envolvido e que o levou à sua assertivas contundentes em relação à produção da habitação para os pobres. Ele ressalta a importância da participação popular nesse processo pois dessa forma as pessoas criam uma forte ligação com sua moradia.

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POR QUE DEVE-SE CONTRATAR UM ARQUITETO? Ainda há grande receio por parte da população, em especial as que fazem parte do grupo denominado classe C, no que diz respeito a contratação de arquitetos. Isso se dá muitas vezes pela imperícia sobre o papel do arquiteto, ou sobre o que o mesmo é capaz de solucionar. A não contratação de profissionais de arquitetura durante a construção de uma edificação, pode ocasionar vários problemas pertinentes à segurança e conforto da mesma. Essa população, acostumada com práticas informais, não se sente segura em contratar um profissional cujo trabalho não conhece bem. Prefere solicitar seu correspondente mais próximo, um mestre de obras ou um pedreiro mais experiente. Isso ficou mais evidente diante da importância

que

as

consultas

adquiriram

nos

atendimentos.

(NOGUEIRA, 2010)

ARQUITETURA PARA TODOS

A solução de problemas construtivos, deveria ser um dos aspectos mais importantes, no que diz respeito à construção civil. O profissional capacitado para resolver esses problema sem dúvida é o arquiteto.

O que os arquitetos deveriam fazer, em vez disso? Resposta simples e direta: reconhecer as necessidades da maioria e não da minoria; atender à diversidade de classe, raça, cultura, e sexo; projetar sem se prender a estilos ou fórmulas arquitetônicas a priori, preocupar-se com o programa e a construção. Podemos chamar o resultado de “arquitetura do cotidiano”, embora a arquitetura resista a definições estritas: qualquer tentativa rigorosa de delineá-la de maneira concisa levará inevitavelmente a contradições. (BERKE, 2013)

Existe uma parcela de cidadãos de renda média que possui meios para construir suas moradias e que independem de aportes. Essa população geralmente pratica a autoprodução (BALTAZAR DOS SANTOS; KAPP, 2007) e de modo algum contratam arquitetos. Por conseguinte, não tem conhecimento do trabalho de um arquiteto, ou ainda quanto pode custar.

Mesmo com ausência de profissionais

especializados, e sem projetos, mas com recursos econômicos e humanos, esses 8


indivíduos constroem com inobediência em relação aos órgãos reguladores e dos prestadores de serviço formais.

Autoprodução é a produção própria que não segue regras técnicas. Os moradores e construtores diretos tomam as decisões [...]. Produção heterônoma é a que obedece regras técnicas e leis, mas não são os moradores nem os construtores diretos que decidem sobre a obra. Já na produção autônoma moradores e construtores diretos decidem, cientes das regras técnicas e urbanas e com reflexão sobre os espaços resultantes. (NOGUEIRA, 2010)

Mais de 85% das residências no Brasil foram erguidas por seus próprios moradores, em autoprodução, sem nenhum tipo de assistência técnica. (CAU/BR, 2015). Grande parte dessas moradias apontam: 

Má distribuição dos ambientes;

Deficiência no método construtivo;

Problemas com iluminação, ventilação e saneamento.

Esses problemas podem ser evitados quando há contratação de um arquiteto. (CAU/BR 2015) Essa pesquisa tem como objetivo encontrar um meio de explorar formas de aplicação de arquitetura que possibilite resolver demandas populares no que diz respeito à concepção de moradia, e emergiu a partir da observação feita em Virginópolis –MG, acerca da falta de arquitetos na cidade, sobre a forma como é conduzido habitualmente os escritórios de arquitetura em outras cidades e por último, pela inoportunidade em atender as demandas existentes na cidade e região. A

expressão

demandas

populares

pode

ser

caracterizada

como

a

oportunidades de trabalho para profissionais de arquitetura, no que diz respeito a uma estabelecida classe social. Se refere ao ganho financeiro que o cliente possui e/ou contexto social em questão. Trata-se de recursos econômicos e não-econômicos, isto é, refere-se ao que o cliente dispõe e que pode ser utilizado na construção, a contar do começo da construção até um reparo, de uma edificação, seja ela de uso residencial ou comercial. Conforme essa panorama, o termo popular relaciona-se a famílias, que cuja renda mensal é de até cinco salários mínimos (valor em torno de quatro mil e quatrocentos reais). Dado fornecido pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos

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Socioeconômicos (DIEESE). Com base nesses dados, é possível identificar a não contratação de arquitetos pelos indivíduos que compõem as classes C e D. Conforme a literatura internacional que relata a participação de usuários na concepção de projetos arquitetônicos, onde Hassan Fathy (1982), conta sua experiência, onde ele busca sintetizar e estruturar a comunicação entre clientes e arquitetos no processo de criação de projetos. Em meados de 1982, o livro de Hassan Fathy, “Construindo com o povo: arquitetura para os pobres”, foi lançado no Brasil, onde o autor conta sua experiência na estruturação de uma nova cidade, com a atuação dos habitantes e adotando materiais construtivos locais (que no caso dos egípcios, utilizam o adobe). Na sua concepção de projeto, Fathy argumenta as diretrizes convencionadas de produção de moradias e cidades, fundamentado em planos organizados, e apresentava uma maneira diferente para a atuação de arquitetos nessa realização: ele almejava romper a barreira existente arquitetura popular e arquitetura criada pelo arquiteto. (FATHY, 1982, p. 61).

Assim, o artesão da aldeia é estimulado a usar e a desenvolver as formas locais tradicionais, simplesmente porque ele as vê respeitadas por um arquiteto formado, ao passo que o homem do povo, cliente, passa novamente a entender e apreciar o trabalho do artesão. (FATHY, 1982)

Fathy (1982) não relata uma forma sobre a participação de moradores em projetos de moradias, e sim o processo no qual esteve envolvido e que o levou às suas assertivas contundentes em relação à produção da habitação para os pobres, ele acreditava que era possível resolver alguns problemas da sociedade com a participação popular, incluindo os contrutivos. Contudo, em 2008 foi sancionada no Brasil a lei de assistência técnica, de número 11.888/08, porém ainda não é efetivamente utilizada em grande parte do território brasileiro. Esta legislação determina uma ajuda técnica na área de construção civil para famílias de baixa renda. Segundo o arquiteto Clóvis Genfritz, do Instituto dos Arquitetos do Brasil seccional Rio Grande do Sul – IAB/RS, a lei atribui que as famílias de baixa renda sejam cadastradas pela prefeitura e as entidades, com o IAB e Sindicatos dos Engenheiros, além de serem cadastrados arquitetos e engenheiros. A Caixa Econômica Federal e o governo federal pagam pelo trabalho desses profissionais, para que os mesmos elaborem projetos e acompanhem as obras.

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O arquiteto e urbanista conselheiro do CAU/BR, César Dorfman, destaca que a assistência técnica vem no bojo da arquitetura para a população pobre. “Os arquitetos trabalham para 8% da população, segundo dados da União Internacional dos Arquitetos, a UIA. Essa assistência é uma via de mão-dupla: ajuda a família e amplia o campo de atuação dos profissionais”, assinala. “Precisamos esquecer a ideia de que arquitetura para pobre é arquitetura pobre. Tem que ser a mesma arquitetura e urbanismo dignos. O espaço público é tão importante quanto às edificações”, defende Dorfman. Já o arquiteto e urbanistas, Jonny Lessa, ressaltou que cotidianamente, quase nunca o arquiteto trabalha com projetos populares e que o profissional é visto como elite. (informação verbal) ⁴

__________________ ⁴ Fonte: Assessoria de Comunicação do CAU/BR e Assessoria de Imprensa do Congresso PanAmericano de Arquitetos

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A CIDADE DE VIRGINÓPOLIS

O local escolhido para a realização e aplicação do El Metodo de Rodolfo Livingston, é a cidade de Virginopolis – MG, localizada ao leste, na Zona do Rio Doce do Estado de Minas Gerais, conta com cerca de 10.752 habitantes (IBGE, 2016). Segundo o autor do livro História de Virginópolis, Andrade (1978), a cidade não foi dividida em bairros quando começou a ser colonizada. A cidade até os dias atuais ainda não foi dividida em bairros podendo ser identificado apenas o centro da cidade em documento comprobatório (encontrado na prefeitura do município). Porém, os próprios moradores, nomearam os “bairros” da cidade, por isso mais forte se fez o vínculo existente entre a cidade e os moradores. Não há uma divisão de classes sociais estabelecidas pelos bairro por classe social, e também não há registros que comprovem o referido.

http://www.cidade-brasil.com.br/

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PESQUISA

Esta pesquisa faz é parte integrante de um trabalho final de graduação em andamento e é uma especulação de como atender as demandas populares da cidade de Virginópolis – MG e região. É embasada no estudo e interpretação do sistema de trabalho do arquiteto argentino Rodolfo Livingston, e se divide em duas partes. A primeira baseia-se na revisão bibliográfica. A segunda no estudo e entendimento do sistema de trabalho de Livingston (2006). Esse sistema já foi utilizado e aplicado pela arquiteta Priscilla Nogueira, em Belo Horizonte e região metropolitana em 2010. Essa pesquisa é de caráter experimental, que traduz a aplicação desse sistema em demandas concretas, incluindo desde o primeiro contato com clientes à reformulação de alguns pontos do procedimento ao longo do experimento. Para chegar ao objetivo proposto, o artigo se fundamenta através de reflexões feitas a partir de artigos científicos, livros, etc., onde o uso desses tais, servem como referência e forma de validar a linha de pesquisa discutida, de maneira a ressaltar a importância do arquiteto na concepção de edificações, incluindo as de clientes populares. A concretização da pesquisa e aplicação do método em demandas reais e concretas será feita com 2 famílias (com renda mensal de até 5 salários mínimos), da cidade de Virginópolis. O livro de Livingston (2006), é baseado numa forma de trabalho diferenciada, e conta com um método participativo de concepção de projeto, para alteração das habitações e é baseado no vínculo existente entre o arquiteto e a família. São utilizados recursos psicológicos que tem a finalidade de mudar a forma tradicional de trabalho, onde apenas o arquiteto sugere as mudanças. Nesse caso, existe um trabalho mútuo, que conta com a participação da família nas tomadas de decisões. Esta forma de trabalho desenvolve a capacidade de escuta, diálogo e aprendizado para ambas as partes. O método do arquiteto Livingston (2006), estabelece um relacionamento estreito entre o arquiteto e a família. O arquiteto examina os interesses e necessidades de os todos os membros da família (adultos e adolescentes), utilizando técnicas psicológicas para determinar necessidades e desejos. Essa coleta de dados (local e familiar) vem a proposta de trabalhar a criatividade dos participantes juntamente com o arquiteto, além de encontrar soluções alternativas para os problemas encontrados, visando a satisfação da família e economia na utilização de materiais, por exemplo. Os problemas encontrados são examinados, com base na necessidade de mais de um membro da família, a individualidade de cada caso e logo as características da 13


família, pode concluir-se os problemas apontados, mesmo com similares discursos, exigem respostas distintas. É levado em consideração a implementação gradual, ou seja, as futuras transformações das necessidades da família e sua pertinência para o recursos existentes. Com pouco ou qualquer ajuda técnica, é possível solucionar problemas de forma adequada, entre os quais são alguns deles: • Exacerbado problemas funcionais. • Falta de ventilação e iluminação naturais. • Excesso de ruídos oriundos do meio urbano. • Divergência com habitações vizinhas.

Problemas como esses comprovaram a necessidade de integrar o arquiteto e suas atividades técnicas com a comunidade, pois é onde geralmente ocorrem eventualidades como essas e por conseguinte podendo ser revertida a situação atual. Contudo, é primordial que haja uma intensa transformação no pensamento dos profissionais de arquitetura, propensos a realizar grandes projetos, que são a exceção, desprezando a atenção destas reformas e atenção aos usuários. (LIVINGSTON, 2006)

Será aplicado na cidade de Virginópolis – MG um método já existente, e serão feitas as alterações necessárias conforme necessário.

O MÉTODO O método do arquiteto Rodolfo Livingston inclui duas etapas anteriores para o projeto: 1. A informações iniciais 2. Estudos envolvendo criatividade ou de viabilidade das informações colhidas inicialmente. Informações do local Nas visitas feitas pelo arquiteto na casa ou lote, devem ser identificados a localização do lote e o contexto social e urbano do mesmo. Devem ser feitos levantamentos geográficos e as condições reais do local, como também todas as informações que sejam pertinentes na elaboração do projeto. Informações do cliente A entrevista deve ter duração de aproximadamente duas horas, e deve contar com a participação de todos os membros adultos da família, devendo assim evitar interrupções durante a entrevista. Deve ser disponibilizado para os integrantes da entrevista materiais para desenhos a mão, devendo passar as informações sobre a

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residência e sobre a família. O arquiteto deve apresentar o questionamento por meio de uma série de testes psicológicos que são eles: 1 Mais: Estes devem responder à pergunta: O que é mais parecido com a casa? Um desenho pode responder a pergunta. Menos: O que eles gostam menos na casa? Também pode ser respondido com apenas uma coisa. Com este jogo as prioridades dos membros da família são definidas. 2. Fiscal jogo de bagagem Os clientes devem imaginar que a casa é um tribunal como réu e que eles são os promotores. Eles devem atacar erros, embora isso não signifique que o acusado será um problema solucionável. Com este jogo os problemas da casa estão definidos. Se não terá de enfrentar, desta forma, como um jogo, o cliente seria limitada a queixar-se apenas o que mais lhe incomoda. 3. Projeto O cliente tornou-se arquiteto. O arquiteto real será o seu cartunista, submisso, tanto quanto possível. Este exercício é crucial para começar a resolver o principal conflito entre o arquiteto e o cliente: O cliente do projeto e outros exercícios serão úteis para a próxima fase, a da criatividade. 4. Último desejo - Casa Instruções: Esquecendo-se inteiramente de casa própria. O arquiteto retira o plano anterior. "Descrever a sua casa ideal" dentro do limites de uma certa racionalidade, melhor do que seria possível construir. Este jogo, se bem feito, pode estabelecer um bom programa de necessidades. Se você fosse perguntar o cliente simplesmente por seus desejos, sem abordar a exercício como um jogo, este será limitado a consignar esses desejos. Essa demanda vai se manifestar. Ao aplicar o método temos acesso a demanda latente. Estudos de criatividade ou de viabilidade. Este trabalho é feito no estúdio e persegue campo aberto possíveis soluções para o problema. Primeiro passo: Criando o campo Enfrentar o desafio de papel em branco: o arquiteto deve guardar na sua mente o primeiro desenho: não procurar a solução, mas tentar resolver o problema; fazer alguns exercícios, alguns jogos, dessa forma a placa é colocada contra a parede. O papel branco foi substituída pela informação, exibida antes, estimular o processo criativo. Segunda etapa: Fogos de artifício Aplicando exercícios: 1. Acentuar o problema. 15


2. Abordar a questão corretamente. 3. Mudar o visual. 4. Questionar a constante 5. Procure por modelos em outros lugares. 6. Síntese de variantes. O que você recebe? Muitas soluções parciais que nunca teria pensado para tentar obter o processo de solução lógica, como é habitual, em linha reta. Ele tem estimulado a mente com ideias, é libertado por caminhos diferentes, a fim de quebrar a ideia dominante. Terceira etapa: Razoabilidade Considerando todas as informações, incluindo o local, o projeto do cliente e propostas para a primeira fase, o processo se desenvolve a partir de desenhos das possíveis soluções. Analisar as informações obtidas com os problemas e desejos da família. As alternativas identificadas são discutidos com os outros membros do grupo e só então deve citar o cliente para fazer a apresentação dos estudos de viabilidade para a família. Apresentação dos Estudos de Viabilidade Além disso, para os adultos da família, devem estar presentes outros colegas para avaliar melhor os resultados. O arquiteto deve apresentar os projetos ao cliente em primeiro lugar, pedindo-os que se forem corretamente interpretados, serem convidados para a avaliar e abordar os problemas e desejos. Isto é, o cliente não faz, ele enfrenta o arquiteto, enfrenta-se, diluindo assim o conflito. "A minha ideia em relação a sua ideia." Depois com calma, eles serão apresentados as variantes selecionados, que também são avaliadas contra os problemas e desejos. Por experiência, variantes que foram chamados estudos de viabilidade não devem ser inferior a 3 e superior a 5 e será dada à família. Neste momento você se lembra que nesta fase não é datada, porque definir o tempo que você precisa para que eles possam refletir sobre as alternativas apresentadas. O cliente paga. Manual de instruções Nós temos um projeto de lei aprovado pela família chamado ajuste final de estudos de viabilidade. O trabalho pode acabar aqui porque tem respondido às perguntas que levaram o cliente para o arquiteto. No entanto, você pode avançar para a próxima fase projeto executivo, o método é chamado manual Instruções porque carece de alguns desenhos de detalhe incluído geralmente na documentação do projeto e inclui outros.

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O estágio começa com um novo interrogatório referindo-se a detalhes, terminações, recursos e também para a imagem global. O registro deve ser feito três rotas imaginária: 1. Estrutural, trabalho estrutural, desde a fundação até o teto. 2. Ambiente, completando indicações sobre as medidas finais e aberturas. 3. Ambiente: móveis, fontes de luz artificial, interruptores... etc. Em geral, para este trabalho é cobrado 50% do valor total de projeto. (LIVINGSTON, 2006)

CONCLUSÃO

Fundamentado no estudo feito na cidade de Virginópolis – MG, e na percepção da realidade local, pôde ser observado que a cidade carece de profissionais especializados na área da arquitetura e urbanismo. Isso traz a oportunidade de trabalhar em prol da população local, especialmente para as famílias de baixa renda (que contam com até cinco salários mínimos mensais), além de poder trazer para as pessoas o conhecimento sobre o trabalho do arquiteto, e sua importância para a sociedade. A proposta de trabalho se deu através do estudo e aplicação do método de Rodolfo Livingston, pela a arquiteta Priscilla Nogueira em Belo Horizonte - MG e região metropolitana, e pelo próprio Livingston. Fica claro que é de suma importância a participação dos membros das famílias participantes do método, no processo de concepção de projeto, nas tomadas de decisões e no que diz respeito às necessidades e desejos da família. Além disso, fica comprovado economia na obra que conta com a atuação de um arquiteto. Por conta disso, o estudo realizado acerca da cidade de Virginópolis é uma tentativa de atender as demandas existentes na cidade e região, sejam elas populares ou não. A ideia inicial é priorizar o atendimento às famílias de baixa renda, mas isso não é uma regra, podendo ser atendidas também outras famílias, mesmo não sendo considerados parte desse grupo social.

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