Desmistificação, alcance e aproximação do feminismo no Instagram1

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Desmistificação, alcance e aproximação do feminismo no Instagram1

Jaqueline Clarindo Batista Chaves2

Resumo

Este trabalho tem como objetivo discutir a utilização do Instagram como meio de comunicação para propagação, desmistificação e aproximação do movimento feminista brasileiro. Parte-se do pressuposto de que o feminismo contemporâneo tem, além das pautas intrínsecas à causa, um desafio que perdura no tempo, mas ainda demanda atenção: a desmistificação do que é o movimento feminista e a sua definição para as mulheres que não entendem ou não aceitam a causa como válida para si mesmas. Entende-se, hipoteticamente, que pelas ferramentas de comunicação e interação disponíveis na plataforma Instagram, defensoras do feminismo tem tentado desmistificar o movimento, alcançar novas adeptas e aproximar-se das mulheres que mal compreendem a causa ou não conhecem o feminismo. Para comprovar tal hipótese, é feita aqui uma análise comparativa de duas páginas do Instagram (Empodere Duas Mulheres e Todas Fridas) e de suas abordagens comunicacionais e conceituais a fim de identificar quais são as pautas colocadas em discussão nas páginas, como elas tentam desmistificar o feminismo e como elas usam as possibilidades de comunicação do Instagram como plataforma digital. Palavras-chave:

feminismo;

desmistificação;

Instagram;

empoderamento;

propagação.

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Trabalho apresentado ao curso de pós-graduação em Comunicação e Marketing em Mídias Digitais como requisito de obtenção do título de especialista em comunicação e marketing em mídias digitais. 2 Pós-graduanda em Comunicação e Marketing em Mídias Digitais no Centro Universitário Estácio de Brasília, e-mail: jaquelinebatcha@gmail.com 1


1. Introdução

As pautas de um movimento social variam de acordo com a época, as mudanças sociais de determinado país ou cultura em que tal movimento se origina e se mantém. As pautas desses movimentos também seguem em compasso com as evoluções sociais, políticas, culturais, econômicas e, até mesmo, acadêmicas do nicho em que este movimento tem vida. A causa feminista, em suas nuances, segue tal compasso. Basta notar que a origem e a pluralidade do movimento feminista são reflexo das questões levantadas ao longo da história e dos assuntos que hoje são concernentes ao indivíduo mulher. O feminismo tornou-se tão complexo e abrangente quanto o que se entende hoje do universo feminino (seja biológico, social, político, econômico, conceitual, etc.). Atualmente, o movimento compreende até mesmo as questões de gênero que hoje inserem na categoria mulheres transgêneros e transexuais que assim se identificam. Neste sentido, pode-se mencionar, ainda, que atualmente algumas questões são obsoletas (embora não ignoradas), por assim dizer, visto que já são realidade para a mulher por já terem sido conquistados ou resolvidas pelo movimento feminista: a participação da mulher na vida política, a decisão de casar-se ou não, e métodos contraceptivos. Isso, porque esses e muitos outros direitos já foram conquistados para que hoje as mulheres pudessem ter esses direitos. Contudo, outras pautas ainda estão vigentes e são passíveis de luta e reclamação. O voto, por exemplo, já não é uma questão na maioria dos países. Contudo, a representatividade ainda é um problema a ser enfrentado. Quando comparado com o número de homens, a quantidade de mulheres nas casas legislativas e judiciárias é claramente menor. As prioridades e temáticas discutidas dentro do movimento feminista foram alteradas, adequadas, refeitas, acrescentadas, removidas e repaginadas. O mundo mudou e, assim como, o feminismo também. Tendo em mente esta evolução, faz-se necessário discutir um assunto que ainda permanece tão atual e pertinente quanto no início do feminismo no século XVIII: a desmistificação e o conhecimento que se tem 2


sobre o movimento por significativa parte das mulheres que não reconhecem a validade da causa. É importante, contudo, deixar claro que a noção de conhecimento aqui não se trata do entendimento acadêmico a respeito do movimento, pelo contrário, as áreas das ciências sociais se debruçaram ao longo dos últimos anos em pesquisas e discussões a respeito do movimento feminista. Inúmeros estudos, levantados principalmente por mulheres, foram desenvolvidos para se entender porque o feminismo é importante, como e quando se tornou pauta universal e quais as implicações do movimento na vida das mulheres e na estrutura como um todo da sociedade. O conhecimento que se discute aqui é aquele no sentido popular e cultural. Fala-se de conhecimento aqui quando se trata de como as mulheres não feministas, por assim dizer, em seu cotidiano, marcado pelo acesso a informações livremente, entendem o feminismo que se manifesta nos meios de comunicação, nas passeatas, nas reclamações e protestos de mulheres, nas notícias de violência contra mulher, nas discussões sobre gênero, na participação da mulher no mundo político, corporativo e temas afins. Dito isso, pretende-se neste artigo discutir como as ativistas do movimento feminista fazem uso da plataforma Instagram como meio para propagação e comunicação do movimento e do empoderamento feminino para congregar mais mulheres em torno da causa. Parte-se do pressuposto de que as redes sociais, especialmente o Instagram caracterizado pelo alto engajamento e apelo visual, aumentam a interação entre os usuários e os mediadores das páginas, viabiliza a desmistificação sobre o movimento feminista e a difusão das causas carregadas sob a bandeira do feminismo a fim de reunir não adeptas em torno da discussão do tema, na tentativa de clarificar o movimento e validar a causa feminista. Este fenômeno de congregação online coopera para clarificação do movimento e disseminação das noções do feminismo, pois amplia consideravelmente o número de adeptas e a resolução de mitos e concepções errôneas a respeito do feminismo. Além, claro, de permitir a união de mulheres em volta do cerne da causa: igualdade social, política e econômica entre os sexos. 3


Para embasar tal discussão, este artigo estabelece sua pesquisa em dois pilares: o primeiro é a identificação do que é o feminismo, incluindo suas origens, e as variações do movimento ao longo dos anos, traçando, ainda, o que seria o feminismo no Brasil que permeia as principais vozes do movimento nos meios de comunicação digitais (considerando, é claro, a pluralidade do feminismo). O segundo pilar é o uso dos meios de comunicação pelo feminismo para propagação e validação da causa tanto nos meios de comunicação durante o nascimento do movimento quanto agora, nos meios de comunicação digitais. Dito isso, destaca-se que a intenção é analisar como a causa social e seus defensores fazem uso das características e permissões destes meios de comunicação, a fim de propagar os ideais feministas. Para tal proposta, é traçada a seguinte linha de discussão: as origens do feminismo em comparação ao feminismo contemporâneo, a fim de esclarecer quais foram e quais são os assuntos em pauta no movimento. Este pano de fundo vem para preceder a discussão sobre o feminismo brasileiro e suas faces. Apresentado a causa social, passa-se para a descrição do que alguns autores chamam de “as ondas do feminismo”, as vertentes mais eminentes ao longo da história. Na sequência, discute-se a pluralidade do movimento atual. Dito isso, entra em discussão a presença da causa nos meios de comunicação, com ênfase na comunicação digital online, feita especificamente pela internet via Instagram. Por fim, são apresentadas as páginas do Instagram (Empodere Duas Mulheres e Todas Fridas) em uma análise comparativa e as considerações retiradas deste artigo.

2. O movimento feminista

Historicamente, o feminismo de que se tem conhecimento hoje tem origem na Europa. A história é unânime ao dizer que o feminismo floresceu, enquanto movimento social e político, em meio às ideias liberais de igualdade trazidas pela revolução democrática burguesa na França e Inglaterra e, posteriormente, nos Estados Unidos da América. 4


As mudanças sociais levantadas pela classe burguesa lançaram luz sobre um novo caminho para que outros grupos, ainda não organizados, pudessem formar seus próprios movimentos. Assim nasce o movimento de mulheres, principalmente da burguesia, voltado para a discussão da igualdade de direitos no âmbito social, político, familiar e laboral. O movimento se fortalece ao compasso do estabelecimento do capitalismo. Autores como Rocha (2017) e Farias (2015) concordam que o auge do movimento feminista se deu com a luta sufragista, quando as políticas públicas sobre as mulheres começam a ser discutidas sem a participação delas. Na intenção de poder votar sobre seus próprios direitos, as mulheres se reúnem em salões escondidos e, em seguida, em passeatas pelas ruas, clamando pelo direito de participar do processo eleitoral. Para além das questões cívicas, o feminismo daquela época também adiciona outras pautas do universo feminino como, por exemplo, a divisão sexual do trabalho e as implicações de ser mulher em um ambiente laboral majoritariamente masculino, visto que nos primeiros moldes de trabalho na indústria, os homens eram a principal mão de obra. Este cenário político e econômico segundo Farias (2015), é movido pelas regras do mercado competitivo, voltados para o lucro com o menor custo possível: mão de obra barata. Esta concepção, segundo a autora, desencadeou: “[...] transformações nas relações sociais, inclusive na família, que perde seu caráter de unidade produtiva para a produção fabril, tendo a maior parte dos meios de produção e força de trabalho transferida às fábricas”. (FARIAS, 2015, p. 30)

A industrialização reestruturou as noções de provisão familiar e os papéis atribuídos aos membros de uma família, principal e exclusivamente da classe baixa e média baixa. Os homens não são mais os únicos provedores da casa porque o custo de vida aumenta, a urbanização exclui a cultura de subsistência e obriga que mais de uma pessoa tenha uma fonte de renda. É também neste cenário que crianças a partir dos seis anos precisam trabalhar para aumentar a renda familiar. “Desta maneira, passa a haver uma participação massiva das mulheres na força de trabalho – reflexo do interesse da burguesia por mão de obra barata e jornadas excessivas de trabalho, associada à condição de inferioridade à qual a mulher era submetida no espaço doméstico”. (FARIAS, 2015, p. 30 apud COSTA e SARDENBERG, 2008, p. 25) 5


A participação da mulher no mercado como força trabalhadora muda, contudo, a importância que ela recebe socialmente permanece a mesma. A mulher ainda é vista como inferior, desprovida de direitos, sujeita a uma figura masculina (marital ou paternal). Além disso, os direitos trabalhistas, que na época sequer existiam de forma legal e concisa, eram claramente inferiores aos dos homens que trabalhavam com mesma carga horária e em funções semelhantes. O salário era menor bem como a possibilidade de negociação da carga horária e outros benefícios concedidos aos homens, mas não às mulheres.

3. Vertentes do feminismo

O feminismo nasceu, não de forma generalista, como um movimento movido por pautas específicas, ainda que já tivesse em seu âmago a ideia da defesa e luta pela concessão de mais e melhores direitos para as mulheres de maneira igualitária ao sexo masculino. A vitalidade do movimento era efêmera, pois dependia do tempo de vida da questão em debate, como o movimento sufragista, conforme explica Farias (2015, p. 29) passando também por momentos de “quase completa desarticulação, como foi nas décadas de quarenta, cinquenta e parte de sessenta, quando as sufragistas, após conquistarem o direito de voto, retornam a casa”, mesmo dando prosseguimento às suas questões e pautas de maneira restrita e segregada. Como exemplo está a luta pelo sufrágio feminino. O feminismo europeu, por assim dizer, nasceu para que as mulheres conseguissem votar. Quando este direito foi conquistado, com muita luta, o movimento enfraqueceu até outra pauta entrar na linha de discussão do movimento feminista, que até aquele momento, permanecia focado nas questões civis. Com o sucesso das primeiras lutas pelo sufrágio feminino e a propagação do movimento para outros continentes, o movimento feminista passa a ser um movimento de maior abrangência e frequência e, consequentemente, com uma vida mais duradoura quando passa a se articular, no fim do século XIX, para além do aspecto 6


político da vida das mulheres, “reiterando que os problemas das mulheres têm raízes sociais, ou seja, estendendo até a ideia do doméstico enquanto dimensão da esfera pública” (FARIAS, 2015, p. 31). Costa e Sardenberg (2008) afirmam que o feminismo na América Latina, principalmente no Brasil, foi e é um movimento multifacetado. O movimento já foi um feminismo: “[...] sufragista, anarquista, socialista, comunista, burguês e reformista. Já lutou no parlamento, nas ruas e nas casas para conquistar e garantir o acesso da mulher à educação formal. E vem lutando pela igualdade de salários e inalienável de todas ao controle sobre o próprio corpo e gozo de nossa sexualidade, enfim, pela construção de uma sociedade mais justa e igualitária, onde a mulher possa realizar-se plenamente enquanto ser humano e cidadã”. (COSTA E SARDENBERG, 2008, p. 32)

Nesse cenário universal de opressão e exploração das mulheres duas tendências do movimento feminista tomam corpo e ganham destaque entre o fim do século XVIII e início do século XIX, inclusive em alguns países da América Latina: o feminismo burguês e o feminismo socialista, ambos engajados na luta por direitos sociais e políticos das mulheres, conforme afirma Rocha (2017). A autora supracitada vai dizer que estas duas tendências principais dominarão o feminismo internacional por mais de um século em função da polarização política e econômica da época que também se separavam em dois polos extremistas: capitalismo e socialismo. Polarização essa que é exacerbada pela primeira guerra mundial que eleva essa separação à níveis mundiais em aspectos bélicos movidos por noções ideológicas e econômicas. O feminismo burguês é, essencialmente, o resultado da inquietação da mulher burguesa em relação à sua condição de indivíduo inferior num cenário de crescimento econômico e acúmulo de riqueza, mas não para todos, apenas para os homens (GREGORI, 2017). De acordo com o autor, o movimento feminista burguês sufragista caracterizou-se por: “[...] sua moderação e ideais reformistas, jamais se preocupando em refletir sobre a contradição e as consequências que o sistema traria à mulher operária, obrigada a assumir duplas ou triplas jornadas”. (GREGORI, 2017, p. 56)

Já Costa e Sardenberg (2008) dizem que o movimento feminista burguês: “[...] se limitava a reivindicar uma série de reformas jurídicas quanto ao status da mulher, com base na noção de que a igualdade nas leis bastaria 7


para solucionar todos os problemas de caráter discriminatório que as mulheres sofriam. Em nenhum momento questionam o papel da mãe e de esposa, como considerados pelas sociedades patriarcais”. (COSTA E SAEDENBERG, 2008, p. 26)

Na contramão, o feminismo socialista se referia às chamadas lutas gerais da sociedade. Este movimento entendia que à medida que lutassem por uma sociedade sem classes sociais, “estariam também lutando por uma sociedade sem barreiras, sem desigualdades no que tange às outras categorias classificatórias como sexo, raça, idade etc.“ Costa e Sardenberg (2008, p. 27). Isto é, acreditavam que com o surgimento da sociedade socialista, com a socialização dos meios de produção e erradicação da exploração do trabalhador, surgiria, automaticamente uma sociedade mais igualitária, em todos os sentidos. 3.1 Feminismo no Brasil Em meio ao instável cenário da América Latina, de acordo com Costa (2004), o surgimento do feminismo no Brasil acompanha o processo histórico do movimento feminista no mundo, especialmente no final do século XX, inicia-se a luta sufragista em alguns países do continente. O início do movimento é dado pelas contribuições dos meios de comunicação que propagavam “as ideias feministas [...] que foi responsável pela divulgação e popularização da reivindicação das bandeiras e lutas das primeiras manifestações feministas” (COSTA, 2004, p.2). Contudo, o movimento feminista que floresce no Brasil esbarra no nascimento e fortalecimento do regime militar, conhecido por silenciar movimentos sociais populares, transformando-os em algo diferente estruturalmente, incluindo o feminismo brasileiro. Segundo Farias (2015), o regime militar no Brasil criou: “um feminismo de resistência que atuou desde os movimentos guerrilheiros até organizações políticas na luta contra a opressão das mulheres na sociedade e pela redemocratização do país” (FARIAS, 2015, p. 31). Nessa direção, a década de 1970 foi marcada pela remodelação de um feminismo que precisa bater de frente com partidos políticos, organizações ideológicas e grupos ligados às essas organizações que têm aversão a todo e 8


qualquer movimento social, principalmente um grupo formado por mulheres para mulheres. A principal pauta do movimento feminista durante o processo de redemocratização, a partir da década 1980, foi a elaboração de demandas de transformação da “condição das mulheres, bem como repensar a posição do movimento com o Estado” (FARIAS, 2015, p. 32). Nesse novo contexto, as feministas incluíram a agenda feminista na política pública e esferas normativas, garantindo o aumento significativo de organismos governamentais de políticas para as mulheres. Neste momento surgiram programas de saúde bem como instituições como Delegacia de Defesa da Mulher e Delegacias Especializadas de Atendimento a Mulheres, Conselho dos Direitos das Mulheres, interferência na elaboração da Constituição de 1988. Além disso, segundo Costa (2014, p. 21) houve um notável “crescimento da demanda de profissionais especializadas ou com conhecimento em gênero, a partir de espaços como o Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM), criado em 1983”. O feminismo ganhou, a partir deste momento da história do Brasil, um caráter popular. O movimento se instalou em diversas esferas sociais: no trabalho rural, nas fábricas, e outros grupos e classes de mulheres. Ainda neste sentido, de acordo com Pinto (2010), a partir dos anos oitenta, as feministas começam a reclamar pautas como direito ao trabalho, à posse de terra, à igualdade no casamento, à sexualidade e distintas preferências sexuais, caminhava ao lado dos: "[...] movimentos populares de mulheres, que estavam nos bairros pobres e favelas, lutando por educação, saneamento, habitação e saúde, fortemente influenciadas pelas Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica”. (PINTO, 2010, p. 17)

4. Ondas e fases do feminismo

Desde as primeiras manifestações feministas até agora, pareceu adequado aos pesquisadores do tema separar os vários tipos do movimento que surgiram ao longo da história em fases ou as chamadas ondas. São separações didáticas que 9


ajudam a compreender a evolução do feminismo e como e quando o movimento tomou novos rumos ou manteve as mesmas estruturas. Rocha (2017) descreve as fases ou as ondas do feminismo. A autora detalha tais ondas e as características do feminismo em cada uma delas, dando um panorama de como o movimento se desenvolveu e quais vertentes surgiram ao longo dos anos tornando o feminismo um movimento complexo e cada vez mais atual e adequado às questões ao longo da história. 4.1 Primeira onda A primeira onda do movimento feminista se caracteriza pela luta por direitos civis das mulheres. Com base no princípio de igualdade das constituições do século XIX, de que todos os homens são iguais perante a lei. Na França, marcada por revoluções. “A mulher, que participa ativamente ao lado do homem do processo revolucionários, não vê também que as conquistas políticas se estenderem ao seu sexo. É neste momento histórico que o feminismo adquire características de uma prática de ação política organizada. Reivindicando seus direitos de cidadania frente aos obstáculos que os contraria, o movimento feminista, na França assume discurso próprio, que afirma a especificidade da luta da mulher” (ALVES; PITANGUY, 1981, p. 32).

Alves e Pitanguy (1981), afirmam que o feminismo inicial procurou em sua prática enquanto movimento superar as formas de organização tradicionais, permeadas pela assimetria e pelo autoritarismo. Assim, o movimento feminista não se organiza de forma centralizada, e recusa uma disciplina única, imposta a todas as militantes. Nesta fase, o movimento se caracterizou pela formação de grupos diversos, por vezes desconectados, em diferentes frentes de ação, em geral formadas por pequenos agrupamentos sem muita interação, mas unido em si mesmo e bem alinhado internamente. É neste cenário, por exemplo, que nasce a primeira noção de sororidade e solidariedade entre as mulheres do movimento feminista, conforme explicam Alves e Pitanguy (1981). No Brasil, a luta pelo sufrágio, diferente da América do Norte e Europa, “[...] não teve as características de movimento de massas [...]. Iniciou-se bem mais tarde, em 1910, quando a professora Deolinda Daltro funda, no Rio de Janeiro, o Partido Republicano Feminino, com o objetivo de 10


ressuscitar no Congresso Nacional o debate sobre o voto da mulher, que não havia sido retomado desde a Assembleia Constituinte de 1891" (ALVES; PITANGUY, 1981, p. 47).

O direito ao voto pelas mulheres neste país é conquistado quando em 1932, Getúlio Vargas promulga-o em projeto de lei. A luta pelo sufrágio caracteriza a primeira onda do movimento feminista, em todo mundo, adquirindo novas vertentes e ampliação na divulgação de seus propósitos em anos posteriores. 4.2 Segunda onda A segunda onda do movimento feminista passa da luta pelo direito ao voto e à participação da mulher na vida pública à crítica do espaço privado e do trabalho doméstico. O movimento nesta fase do feminismo lutava contra as condições que, diferente da vida nas fábricas e nos outros ambientes de trabalho, permaneciam os mesmos na esfera privada das mulheres, principalmente em casa com seus pais e maridos (DESCARRIES, 2000). “Procurando opor-se aos pressupostos androcêntricos dos saberes dominante e assim escapar à rigidez das proposições normativas e ao fechamento do pensamento binário estático do feminino e do masculino [...] tendo em vista conter os efeitos perversos de uma organização social, na qual os lugares e as atividades dos indivíduos são naturalizados e hierarquizados segundo o pertencimento a um sexo ou outro”. (DESCARRIES, 2000, p. 10)

Ainda segundo Descarries (2000), a segunda onda traz três correntes distintas do feminismo. O feminismo igualitário, feminismo radical e o feminismo da feminitude. Diferente do feminismo da primeira onda que tinha, por assim dizer, uma só frente de ação. A primeira corrente estabelece-se como herança da tradição das suffragettes e dos movimentos antirracistas americanos, “[...] reivindicando a igualdade de direito e de fato para todas as mulheres, em nome do direito inalienável de cada indivíduo à igualdade e à autodeterminação” (DESCARRIES, 2000, p. 15). O objeto de reivindicação das feministas igualitárias estabelece-se em torno da igualdade de direitos políticos, educacionais e na esfera do trabalho, onde a divisão sexual do trabalho acarretaria e corroboraria para um sistema de discriminação entre os sexos (DESCARRIES, 2000).

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Já a corrente do feminismo radical surge em 1970 com proposições mais agressivas. Lutavam contra os determinismos biológicos e seu enfoque transpassou a execução dos papéis sociais, como as feministas igualitárias, em luta ferrenha contra todo um sistema patriarcal e opressor. Desta forma: “[...] enquanto as igualitárias criticavam os pais em vez das estruturas, as radicais reivindicam a abolição das instituições patriarcais para acabar com o determinismo biológico e concretizar seus objetivos libertadores” (DESCARRIES, 2000, p.17).

No aspecto do determinismo biológico nasce a luta pela libertação da mulher da obrigatoriedade do papel e dos deveres biológicos da maternidade, sendo esta, segundo as feministas radicais, uma forma de opressão individual e coletiva. As feministas desta onda questionavam, ainda, a atribuição do trabalho doméstico à mulher como uma determinação histórica, biológica e social, constituindo-se assim, para as feministas radicais “uma expressão da opressão intrínseca na instituição familiar. Para estas, a configuração da opressão iniciava-se no ambiente familiar, em sua forma privada” (ROCHA, 2017, p. 33). A última corrente do feminismo, dentro da segunda onda, se manifestou no seguinte cenário: “[...] encorajadas pelos ganhos substanciais realizadas na esfera pública, muitas mulheres ocidentais reviraram seu desejo de evitar novos sobressaltos que pudessem desestabilizar sua maneira de ser a dois e de viver sua maternidade: seu sonho de harmonia e estabilidade na era do efêmero coabitava dificilmente com a oposição radical”. (DESCARRIES, 2000, p. 21)

Nesta corrente há um retorno às discussões pautadas no feminismo igualitário, questões de identidade, maternidade, negadas pelo feminismo radical. As feministas da vertente feminitude não poderiam negar suas experiências enquanto mulher e mãe. Descarries afirma que esta corrente discute “sobre o sujeito feminismo, o corpo, a gestação, a procriação e o prazer materno, vistos como espaços distintos e lugares primeiros de diferença em relação ao outro” (DESCARRIES, 2000, p. 22). Acreditavam, segundo Rocha (2017), que a negação à natureza da mulher e o destino natural a qual está predestinada, assim como a busca pela emancipação através do trabalho assalariado, repercute na mulher a perda de suas habilidades naturais, inerentes ao seu gênero e consequentemente à perda de sua identidade. 12


4.3 Terceira onda A terceira onda do movimento feminista é uma crítica aos paradigmas abordados pelas ondas antecessoras. De acordo com Rocha (2017), as ondas passadas tinham uma identidade, cor e classe definidas, formada por uma categoria específica de mulheres, que se esqueciam que as opressões atingem as mulheres de modos diferentes, sendo necessário um recorte que compreendessem mulheres de outras classes, raças e cores. O discurso universal seria excludente, de acordo com esta vertente, uma vez que nas duas primeiras ondas, nem todas as mulheres clamaram por determinada ação. O sufrágio foi o clamor de mulheres brancas e burguesas majoritariamente com um posto de trabalho, por exemplo. Como prerrogativa esta onda fundamentava-se na desconstrução de alguns fatores enraizados na sociedade, como a questão identitária e de gêneros e a noção binárias desses gêneros, sendo este, fruto do patriarcalismo e da necessidade de dominação do sexo masculino sobre o feminino, pois o patriarcado teria criado uma: “[...] matriz heterossexual normativa a qual os sujeitos deveriam ser encaixados. Desta maneira, a terceira onda do movimento feminista amplia o conceito de gênero, resgatando-o da binaridade anteriormente imposta pelo sistema.” (ROCHA, 2017, p. 38)

4.4 Quarta onda O cenário que recobre o pano de fundo do começo da quarta onda é, essencialmente, marcado pela popularização e “democratização do feminismo na rede ou através dela [da rede]” (CAZARRÉ, 2016, s/p). Esta onda é mais uma revisitação e crítica das fases anteriores do que uma nova proposição para o movimento. As bandeiras das ondas anteriores são diversas, por esta razão, a quarta ondas preferiu revisitar as fases passadas com o seguinte foco: “sua principal característica não é a temática abordada, mas a massificação do feminismo” (CAZARRÉ, 2016, s/p). Por isso, era necessário olhar para as primeiras vertentes e discutir como elas se manifestam no presente.

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É neste momento da história do movimento que surge paralelamente o ciberfeminismo, a onda mais recente e ainda corrente do feminismo. Esta onda tem data na década de 90, com a popularização das tecnologias da informação e a deliberação do uso da internet. É neste exato momento que as vertentes do “movimento feminista se apropriam da rede em uma espécie de "chamamento" de novas mulheres a romperem as amarras sociais e adentrarem no espectro das tecnologias da comunicação para a militância feminista” (ROCHA, 2017, p. 31). Esta onda surge após o advento da internet e emprega o uso maciço da mesma, porém o emprego da terminologia advém após o ganho de notoriedade do ciberfeminismo no campo cibernético que, promovendo profundas discussões e campanhas virtuais no século XXI, fortalece-se ampliando o debate e da troca de ideias, trazendo reflexo da sua estruturação na rede e permitindo que o movimento realize sua mais importante função: a disseminação do discurso feminista. É então neste contexto que se institui a quarta onda do movimento feminista (ROCHA, 2017, p. 77).

As tecnologias de informação e comunicação (TICs) representam, na atualidade alternativas ao conteúdo veiculado pelos meios de comunicação de massa tradicionais, possibilitando novas formas de ativismo através da rede, comumente denominadas ativismo digital ou ciberativismo (RODRIGUES; GADENZ; RUE, 2014, p. 25). De acordo com Rocha (2017, p. 64), “o ciberfeminismo compreende tanto pela inserção/participação de ativistas do movimento social feminista, quanto por pessoas que não detém conhecimento prévio acerca da temática”. Segundo Ferreira (2015), os ciberespaços feministas objetivaram atrair mais jovens e desconhecidos de causa, esclarecendo temas, conceitos e palavras de ordem do movimento. 4.4.1 A pluralidade do movimento feminista contemporâneo Lemos (2009, p. 15) afirma que é um trabalho árduo nomear os feminismos atuais sob um mesmo adjetivo ou padrão: “Este fenômeno se dá por causa da pluralidade de pautas e discussões oportunizadas pelas diversas vertentes de ideologias dos movimentos feministas”. Rocha (2017) apresenta a pluralidade do feminismo em suas mais variadas faces. Grupos identitários pró-aborto, contra aborto, corrente do feminismo radical, corrente do feminismo da feminitude (que entendem e define a mulher ou o indivíduo cis gênero), transfeminismo (que tentam inserir o indivíduo trans - transgêneros e 14


transexuais - no rol de mulheres, que entendem as mulheres por sua essência e não por sua determinação biológica) e muitos outros. Não é tarefa fácil descortinar os caminhos do movimento feminista, posto que este se desenvolveu em diferentes territórios com diferentes características, em cada um deles com demandas próprias. Por exemplo, a reflexão de Collins (2016) a respeito da mulher negra na sociedade norte-americana expressa, não somente a vertente de ser mulher em uma sociedade machista, mas o ponto da questão: ser uma mulher negra em uma sociedade machista e racista. O movimento feminista branco, elitizado, da classe média intelectualizada, contrasta com os anseios do movimento feminista negro e constitui-se ainda diverso das prerrogativas do movimento popular de mulheres. Enquanto as primeiras reivindicações do movimento feminista branco pleitearam os direitos perante a discrepância entre a difusão dos princípios universais de igualdade e a realidade da desigual divisão de poderes entre homens e mulheres, perpassando o direito ao voto, como sua primeira onda; o movimento feminista negro teve como principais lutas questões referentes à igualdade racial e sexual (ROCHA, 2017, p. 27).

5. A comunicação do feminismo

Como todo movimento periférico e pouco aceito não tem à sua disposição espaços voluntários nos grandes meios de comunicação e de massa. As poucas aparições se davam pelas notícias de como grupos de mulheres arruaceiras e com comportamentos não aceitáveis iam às ruas, agiam fora dos padrões ou expressavam opiniões e pensamentos não adequados ao seu papel social. Entretanto, de forma direta ou indireta, essa comunicação auxiliou na propagação do movimento nos seus anos iniciais, sem contar ainda a comunicação alternativa feita pelos próprios grupos. Principalmente nas de comunicação secundários, alternativos e independentes, principalmente impressos. Claramente, hoje, há um cenário diferente, o feminismo e suas causas fazem parte das pautas tratadas pela imprensa. E este cenário melhorou ainda mais quando a instalação e os avanços da tecnologia da comunicação estabeleceram um marco importante para o movimento 15


feminista brasileiro e sua propagação entre o público dessas redes sociais via internet (ALVAREZ, 2003). Pela democratização e acesso livre, a internet ajudou o movimento, permitindo que ganhasse força, assim como outros movimentos, reunindo pessoas com assuntos em comum, ampliando o acesso à informação, propagando essas informações e fazendo o movimento ganhar espaços e adeptos, além de promover e permitir a discussão aberta e participativa sobre o que é o feminismo e a sua construção. Aqui, cabe um contraste entre como as discussões eram antes: em uma sala escondida, mulheres debatendo o assunto longe dos maridos e pais. Hoje a discussão acontece online, em posts e páginas sobre assunto, aberto ao público, incluindo mulheres que são contra o movimento ou não se identificam com as questões concernentes ao tema.

6. Metodologia de pesquisa

Esta pesquisa baseia-se na comparação analítica de dois objetos: as páginas com teor feminista do Instagram (Empodere Duas Mulheres e Todas Fridas). Este método foi escolhido pois a análise comparativa permite colocar um objeto frente ao outro e apontar elementos de exceção e pontos em comum que podem ou não ser aplicados a outros objetos similares. Assim, também é possível revelar as regularidades desses objetos em determinados contextos. Nesse sentido, pretende-se identificar como as páginas feministas tratam do feminismo e se adotam alguma das vertentes apresentadas ao longo do texto. Além disso, é objetivo deste estudo analisar como as páginas fazem uso das ferramentas visuais e textuais que o Instagram como plataforma de comunicação oferece. Coloca-se como questão aqui quais são as peculiaridades de cada página, dos seus discursos, dos recursos visuais e textuais que elas adotam, o estilo e padrão das publicações no feed, a linha editorial e os temas mais comuns nas publicações. 16


Todo este aparato serve para esclarecer como estas páginas, tomadas como amostra, tentam propagar o feminismo e desmistificar a causa para aquelas que não conhecem o feminismo, não entendem a causa ou não dão suporte ou credibilidade ao movimento. Serão as quatro publicações mais curtidas no último mês (março de 2019) de cada página e que dialogassem com as proposições feitas pelas páginas nas descrições que elas fazem de si mesmas nos espaços de descrição e informação sobre o perfil no Instagram, tudo isso na tentativa de identificar as questões apresentadas acima: as vertentes do feminismo brasileiro e as estratégias de comunicação adotadas pelas páginas para propagação e desmistificação do feminismo. Foram estabelecidas as seguintes categorias de comparação: 

Utilização da plataforma: comparar as páginas do Instagram, os processos de comunicação adotados (mais textos que imagens, mais imagens do que texto, processo editorial) e vertentes feministas adotadas pelas páginas: pautas preferidas, temas mais abordados.

Pautas dos movimentos: comparar dois aspectos, que dialogam com a teoria aqui apresentada: os assuntos mais pautados do movimento feminista pelas páginas (relacionar com as pautas do movimento feminista no Brasil, os mais destacados, os mais discutidos, ver se há relação ou conexão entre o que o movimento, de forma geral, prega e o que as páginas publicam, se há uma consonância).

Diálogo com as vertentes do feminismo brasileiro atual: quais vertentes do feminismo abordadas neste artigo se apresentam nas páginas ou mesmo nas publicações analisadas. Além de identificar como o ciberfeminismo se manifesta nas páginas em questão.

7. As páginas Feministas no Instagram

Reprodução do texto de apresentação do projeto que dá nome à página Empodere Duas Mulheres - @empodereduasmulheres: 17


Empodere Duas Mulheres é um projeto pessoal que foi idealizado e lançado em Janeiro de 2015, como uma plataforma de união, empoderamento e acolhimento de mulheres – e que acabou tomando proporções jamais imaginadas. É uma plataforma dedicada a mulheres com foco em questões que falam sobre as suas vidas, suas inseguranças, dificuldades, medos e também vitórias que são sempre celebradas coletivamente. Através de um canal de contato, quero trazer a voz do amanhã, hoje. Atualmente, falo sobre diversos assuntos: Mulheres e histórias inspiradoras, notícias cujo tema principal seja focado no nosso dia-a-dia, frases motivacionais e também sobre o cotidiano de mulheres ao redor do mundo. Acredito que outros jornais e plataformas digitais, embora permitindo as opiniões da nossa geração, ainda restringem demais a divulgação de questões consideradas fundamentais e relacionadas às mulheres. Muitas vezes, a grande mídia acaba deixando de dar voz a questões que são de suma importância para o avanço dos nossos direitos e da mudança do nosso papel na sociedade sexista. As mulheres, principalmente as periféricas e com recortes específicos dentro da sociedade, estão sub-representadas pela mídia mainstream, então estou aqui para fornecer uma voz: a Empodere Duas Mulheres. A Empodere Duas Mulheres também quer mostrar às mulheres ao redor do mundo que, por mais que a sociedade sempre as tenha ensinado o contrário, elas jamais estarão sozinhas – principalmente uma vez que as suas bases de mulheres estiverem estabelecidas. Somos as nossas melhores amigas e apoiadoras nas adversidades da vida, o que influenciou na decisão de nomear a página com este nome, uma vez que acredito no potencial transformador que mulheres possuem quando estão unidas por uma mesma causa. A Empodere Duas Mulheres quer ser o seu veículo preferido: uma plataforma para aquelas atualmente sem uma voz estável, buscando novas maneiras de se conectar com mulheres à sua volta e dar poder à sua própria voz – e assim encontrar a sua força interior que possa estar adormecida. Quero fazer com que mulheres saibam que não estão sozinhas e que podem caminhar juntas, porque juntas somos mais fortes! (EMPODERE DUAS MULHERES, 2019)

Reprodução do texto de apresentação do projeto que dá nome à página Todas Fridas - @todasfridasoficial: A Todas Fridas surgiu entre julho e agosto de 2015, com o intuito de empoderar outras mulheres e lutar contra as distintas opressões que são destinadas ao gênero feminino. A ideia era criar uma página que tivesse material para que outras mulheres obtivessem contato com o feminismo, assim como eu tive, e que as ajudassem a se desprender de suas amarras! Então convidei outras moças para admnistra-la comigo, inclusive são mulheres maravilhosas de distintas vertentes, mas que se respeitam e hoje que lutam juntas. (TODAS FRIDAS, 2019).

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7.1 Empodere Duas Mulheres

Figura 1: post da página @empodereduasmulheres no instagram.

A página Empodere Duas Mulheres lança seus esforços sobre a interação entre as mulheres feministas e sobre as mulheres que ainda não integram e não conhecem o movimento. A página produz conteúdo para, aparentemente, reforçar a solidariedade e sororidade entre mulheres. Esta intenção pode ser notada em outras publicações semelhantes a esta com proposições de que o feminismo é mais que um movimento social, é um movimento sobre mulheres unidas em torno de si mesmas. A página destaca em vários posts que o suporte feminino é essencial. Mulheres precisam dar suporte a outras mulheres, lutar umas pelas outras. O movimento vai além da luta de rua por direitos ou da reconstrução do papel social da mulher. No feminismo defendido pela página, mulheres devem apoiar mulheres que querem total independência e também aquelas que querem exercer seus papéis de mães, esposas e donas de casa. Qualquer que seja a decisão da mulher, ela deve ter suporte da outra.

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Figura 2: post da página @empodereduasmulheres no instagram.

Outra pauta muito comum é o ensino, por assim dizer, do amor próprio e da priorização de si mesma nas relações visto que a mulher sempre foi forçada e educada a colocar os outros à frente de si mesma (família, amigos, filhos, pais) como forma de manifestação do que dizem ser um espírito feminino, materno e correto de agir. O feminismo atual, pelo menos que se manifesta nesta página, preza e prega um novo olhar da mulher sobre si mesma, sobre seus papéis na sociedade, o que passa a ser prioridade para a mulher e não para os outros a sua volta. A questão não é a mulher tornar-se egoísta e indisposta a acolher seus familiares e amigos, a questão é a mulher não ser obrigada a isso por ser mulher e precisar estar à disposição de todos.

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Figura 3: post da página @empodereduasmulheres no instagram.

Aqui mais uma vez aparece o suporte feminino relacionado a violência contra mulher e o papel de outras mulheres em dar apoio e orientação, além de suporte emocional. As vertentes originais do feminismo apontaram para isso, mas de forma indireta. Como visto, apesar da violência contra mulher ser comum e até mesmo legalmente aceita (maridos poderiam “corrigir” suas esposas, se achassem necessário) naquela época, só nas últimas décadas o movimento começou a levantar essa pauta como fundamental para o feminismo. A partir deste passo em direção à complexidade do movimento, nasceu políticas, leis, processos contra a violência contra a mulher. Hoje, por exemplo, temos a caracterização cível e criminal de agressões: a lei contra o feminicídio.

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Figura 4: post da página @empodereduasmulheres no instagram.

Outra pauta recorrente na página Empodere Duas Mulheres é crítica a mulheres que rejeitam o movimento por inúmeras razões: não se identificam com as pautas, pensam que as bandeiras levantadas não são realmente necessárias ou não relacionam as lutas feministas com os direitos que hoje as mulheres podem usufruir (como sugere a imagem acima). Publicações semelhantes a essa discutem a aversão que algumas mulheres têm à causa. Ao que parece, receber o título de feminista é uma ofensa, pois há uma associação entre a figura da mulher feminista com conceitos como falta de higiene e depilação, vulgaridade, aversão à vida e a família, desrespeito e insubmissão. Por causa desse estereótipo que se aplica apenas à vertente radical do feminismo, essas mulheres rejeitam toda e qualquer ideia advinda do movimento, ideias que, inclusive, suportam as noções sobre o papel da mulher que elas consideram corretos, como o feminismo de feminitude que abrange a mulher mãe, esposa, dona de casa e afins. Há, ainda, vertentes do feminismo que dialogam com religiões tradicionais e conservadoras como o cristianismo católico e protestante.

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7.2 Todas Fridas

Figura 5: post da página @todasfridasoficial no instagram.

A página Todas Fridas tem um histórico de publicações majoritariamente voltado para a pauta relacionamentos, mais uma pauta levantada pelo feminismo contemporâneo e abraçada pelo movimento no Brasil. Esta bandeira versa sobre os relacionamentos, principalmente conjugal com parceiros (e parceiras, nos movimentos que compreendem relações pessoas do mesmo sexo) que subjugam e oprimem a mulher com agressões verbais, físicas e emocionais. Esta pauta do movimento feminista dialoga, ainda que indiretamente, com as questões levantadas no início do movimento, ainda na Europa, em que as feministas da época discutiam a subjugação da mulher no ambiente familiar. A opressão vinha de dentro de casa e apenas era reproduzida na rua e, posteriormente, no ambiente de trabalho quando as mulheres tiveram de trocar suas funções em casa para trabalhar nas fábricas.

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Figura 6: post da página @todasfridasoficial no instagram.

Ainda neste sentido, a página publica conteúdos que reforcem a ideia de que a mulher deve e precisa, como forma de cuidar de si mesma e se respeitar como indivíduo valioso, rejeitar ou evitar todo e qualquer relacionamento que a diminua como pessoa.

Figura 7: post da página @todasfridasoficial no instagram.

Esta postagem segue a mesma lógica: o reforço da ideia de que a opressão contra a mulher também ocorre em relacionamentos, principalmente com homens que veem na mulher figuras de inferioridade, propriedade, submissão, incapacidade e incompetência. 24


Figura 8: post da página @todasfridasoficial no instagram.

Aqui, pode-se perceber inúmeras referências ao ser feminista. Primeiro, a mulher feminista passa a imagem e até mesmo o comportamento em geral comuns aos homens: sociáveis, boêmios, confiantes, sexualmente ativos, adaptáveis a qualquer situação social e características afins. Esta figura, por vezes, assusta e ameaça homens e mulheres que não aceitam ou mesmo entendem uma mulher com comportamentos historicamente masculinos. Além disso, a mulher feminista, com essas ou quaisquer outras características tendem a afastar essas pessoas que sentem aversão a este tipo de comportamento. 7.3 Análise Comparativa Para facilitar e dinamizar o processo de análise foi criada uma tabela com as principais características e categorias extraídas das páginas e citadas no sub-tópico acima. Categorias Diálogo com as vertentes

Empodere Duas Mulheres -

Feminismo social com referências ao feminismo político, no sentido de exercício e reclamação de direitos.

Todas Fridas -

Feminismo pessoal com ênfase sobre as relações e atribuição de papéis nas suas situações sociais.

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Pautas adotadas

-

Comunicação

-

-

Aproximação das mulheres não feministas, conscientização e educação sobre o movimento. Sororidade e solidariedade. O olhar da mulher sobre si mesma.

-

Criação de novos conteúdos, principalmente visual. Chamadas/títulos curtos. Recursos visuais e textuais equilibrados.

-

-

-

Liberdade feminina e caracterização de situações que configuram opressão à mulher. Comportamento feminino. O olhar da sociedade patriarcal sobre a mulher.

Reprodução de conteúdo produzido pela audiência nas redes sociais. Comentários ou citações sobre o conteúdo Recursos visuais e textuais desequilibrados.

Tabela 1: Análise comparativa feita a partir dos posts coletados nas duas páginas.

8. Considerações finais

O feminismo, enquanto movimento social, é versátil e flexível à realidade das mulheres que o abraçam em sua cultura. No Brasil foi assim, a luta sufragista acompanhou os pequenos avanços políticos que seguiam o ritmo da jovem democracia estabelecida. Da mesma forma, o movimento adequou-se a nova estrutura política quando o regime militar derruba a antiga forma de governo e estabelece uma ditadura violenta por anos. Atualmente, discute-se no Brasil a violência contra a mulher, o papel dela como profissional e questões de gênero, biologia e participação familiar e relacionamentos entre parceiros. Seguindo este compasso, o feminismo brasileiro se envolve nestas questões e se volta para como a mulher olha para si mesma e como a sociedade olha para essa mulher. Neste sentido, o feminismo no Brasil se dispõe a oferecer a esta mulher um novo olhar sobre si como indivíduo que pode e deve desprender-se das amarras impostas pela sociedade brasileira marcada pelo patriarcalismo, machismo, desigualdade social, racial e econômica, que ainda se apresenta em um cenário 26


político caótico que também ignora ou não entende o indivíduo mulher em sua complexidade e totalidade ao, por exemplo, não discutir políticas públicas para as mulheres ou, ainda, discutir tais políticas sem ter em mente o bem-estar dessas mulheres. Com este pano de fundo, há uma imensidão de mulheres que, a esta altura da evolução e acesso aos meios digitais de comunicação, ainda não compreendem e rejeitam veementemente o movimento feminista por vê-lo só por meio de estereótipos e padrões de comportamento que nem de longe abarcam a pluralidade da causa que abraça todos os tipos de pensamentos e de mulheres em torno de um cerne: a igualdade dos sexos, social, política e economicamente. Na tentativa de reverter este cenário, ativistas do movimento feminista brasileiro têm usado as plataformas digitais de comunicação e as interações sociais em redes online para propagar e disseminar informações sobre o feminismo a fim de clarificar as dúvidas, estabelecer um diálogo com esse público avesso e tentar atrair adeptos para o movimento que hoje levanta bandeiras extremamente atuais e que envolve até mesmo as mulheres que rejeitam o movimento feminista.

9. Referências

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