GAULEJAC
GESTテグ HIPERMODERNA
O QUE É A GESTÃO HIPERMODERNA Nos manuais ela é apresentada como um conjunto de técnicas destinadas a racionalizar e otimizar o funcionamento das organizações, o que abrange vários aspectos: — Práticas de direção de empresa: trata-se de definir orientações estratégicas, de otimizar as relações entre os vários elementos necessários para colocar em operação um sistema de ação coletiva, de definir a estrutura e a política da organização; — Discursos sobre o modo de organizar a produção, de dirigir os homens que contribuem para isto, de administrar o tempo e o espaço, de pensar a empresa como uma organização racional; — Técnicas, procedimentos, dispositivos que enquadram as atividades, determinam os lugares, as funções, os status, e definem as regras de funcionamento.1 É importante lembrar que três fenômenos modificam profundamente o funcionamento do capitalismo industrial a partir do fim do século XX. As lógicas de produção são cada vez mais submetidas às pressões das lógicas financeiras: a economia financeira acaba substituindo a economia industrial. O peso dos mercados e sua globalização questiona os modos de regular a economia dominados até então pelo Estado-nação: a desterritorialização do capital acaba com as fronteiras que permitiam de controlar sua circulação e de limitar os efeitos especulativos. A fusão das telecomunicações e da informática instaura a ditadura do tempo real e do imediatismo das respostas às exigências do mercado financeiro. Quando a lógica financeira domina a lógica de produção, as relações de poder dentro da empresa mudam. A gestão do pessoal e das relações sociais é substituída pela gestão de recursos humanos. A performance e a rentabilidade são medidas no curto prazo, em tempo real, colocando o sistema de produção num estado de tensão permanente. A gestão hipermoderna é um sistema de organização do poder. Atrás de uma
aparente
neutralidade
existem
alguns
fundamentos
e
algumas
características que devem ser entendidas. Entre as direções cada vez mais 1
DE GAULEJAC, Vincent, La société malade de la gestion, idéologie gestionnaire,
pouvoir managérial et harcèlement social, Paris, Éditions du Seuil, 2005, p. 21ss
submetidas à pressão dos acionistas e a direção executiva que tenta inventar mediações, no meio de lógicas contraditórias, o poder gerencial se confunde. Torna-se difícil identificar de fato o espaço crescente entre, de um lado, os sistemas de organização, em rede, transnacionais e virtuais e, do outro lado, os indivíduos encarregados de pôr tudo isso para funcionar. À abstração do capital responde a flexibilidade e a instabilidade do trabalho. Entre os dois o corpo gerencial procura produzir normas e regras. Embora com aparência objetiva, operacional e pragmática, a gestão hipermoderna é uma ideologia que traduz as atividades humanas e indicadores de performance e custos e benefícios. Indo buscar do lados das ciências exatas uma ciência uma cientificidade que elas não conseguiram conquistar por si só, as ciências da gestão servem para dar suporte ao poder gerencial hipermoderno legitimando um pensamento objetivista, utilitarista, funcionalista e positivista. Elas constroem uma representação do humano como recurso dentro da empresa, contribuindo com sua instrumentalização. A gestão hipermoderna é uma mistura de prescrições racionais e precisas, de ferramentas de medição sofisticadas, de técnicas de avaliação objetivas, mas também de prescrições irracionais e irrealistas, de ferramentas de medição inaplicáveis e de julgamentos arbitrários. Contudo, esta primazia da racionalidade instrumental desenvolve se num universo cada vez mais paradoxal. O poder managerial mobiliza a psique sobre objetivos de produção. Operacionaliza um conjunto de técnicas que captam os desejos e as angústias para coloca-las a serviço da empresa. Ele transforma a energia das pessoas em força de trabalho. Enclausura os indivíduos num sistema paradoxal que os conduz a uma submissão livremente consentida. A ideologia gerencial hipermoderna vem preencher o vazio ético a partir do momento em que este se dissociou da ética protestante que servia de fundamento à sua legitimidade.
CRÍTICA DOS PARADIGMAS NO FUNDAMENTO DA GESTÃO2 PARADIGMAS
PRINCIPIO DE BASE
CRÍTICA
OBJETIVISTA
Entender é medir e calcular
Primazia da linguagem matemática
FUNCIONALISTA
A organização é um dado
Dissimulação das lutas pelo poder
EXPERIMENTAL
A objetivação do ser humano é uma garantia de cientificidade
Domínio da racionalidade instrumental.
UTILITARISTA
A reflexão está a serviço da ação.
Submissão do conhecimento a critérios de utilidade.
ECONOMISTA
O humano é um fator da empresa
Redução do humano a um recurso da empresa.
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DE GAULEJAC, Vincent, La société malade de la gestion, idéologie gestionnaire,
pouvoir managérial et harcèlement social, Paris, Éditions du Seuil, 2005, p.57