Cartilha: A Cáritas e as Mulheres

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A C谩ritas e as Mulheres: Uma hist贸ria de 30 anos

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A Cáritas e as Mulheres: Uma história de 30 anos

Expediente: Publicação: Cáritas Arquidiocesana de Passo Fundo Rua Paissandu, 1868, 99010-102, Passo Fundo-RS 54 3045 1262 - 54 9173 5352 www.caritaspf.com.br caritas@caritaspf.com.br 1ª Edição, março de 2013, 1000 exemplares 2ª Edição, agosto de 2014, 500 exemplares Organização: Secretariado Arquidiocesano de Cáritas Diagramação: Broto Comunicação Impressão: Tapejarense Indústria Gráfica

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Apresentação Apresentamos nas páginas que seguem, de forma breve e simples, uma memória do trabalho da Cáritas junto aos grupos de mulheres, destacando momentos significativos e decisivos na afirmação e no fortalecimento dos grupos. O intuito é resgatar elementos da história, a partir de um processo de reflexão coletiva. Não se trata de um trabalho extenso e que consiga dar conta de fatos e acontecimentos em sua abrangência. A intenção é atiçar a memória para recuperar, através das experiências e do compartilhamento das aprendizagens relatadas, outras tantas iniciativas e ações realizadas. A Cáritas Arquidiocesana de Passo Fundo iniciou seu acompanhamento e organização junto aos grupos de mulheres de periferias de Passo Fundo e região no ano de 1983, isto é, levando em conta seus 50 anos de atuação, significa mais da metade de sua história. Em 2013, comemora-se trinta anos de atividades desenvolvidas junto às mulheres. Este é o objetivo desta cartilha: sistematizar as ações executadas ao longo deste período, sempre tendo em vista a emancipação e organização feminina, buscando o resgate da autoestima das mulheres. Atualmente, são aproximadamente 40 grupos organizados e acompanhados pela entidade, que busca promover alternativas de trabalho e geração de renda, através da capacitação das mulheres envolvidas. São desenvolvidos diversos cursos e oficinas a fim de resgatar e fortalecer as capacidades e potencialidades de cada mulher. Esses espaços de capacitação possibilitam a troca de experiências e o enriquecimento mútuo entre as mulheres dos grupos. Nos encontros de formação, vários temas são refletidos: família, violência, trabalho, cooperativismo, gravidez, saúde, políticas públicas, economia solidária e outros, todos relevantes para que o trabalho atinja as metas esperadas. Muitas destas temáticas serão abordadas ao longo desta cartilha.

Na primeira parte do texto faremos uma fundamentação bíblico-teológica a partir do texto de Jó 2,1-11, dando ênfase à participação de Maria, mulher que soube observar a necessidade da família e da comunidade. No momento certo, agiu e intercedeu a Jesus pelos que necessitavam - e continua agindo em nossas comunidades, muitas vezes através da ação e do trabalho das mulheres Cáritas. Na sequência, faz-se uma breve leitura histórica da trajetória das mulheres, com ênfase no século XVIII, período forte da industrialização e do ingresso delas no mercado de trabalho. Este recorte quer fazer memória das lutas, conquistas e retrocessos ocorridos ao longo da história. A memória dos acontecimentos visa impulsionar as mulheres na continuidade da jornada, que ainda é longa no que se refere à conquista de direitos e autonomia. Um dos núcleos centrais do texto é a organização e atuação das mulheres nos grupos. O apoio da Cáritas, as dificuldades, motivações, conquistas e desafios enfrentados pelas mulheres são aqui abordados. Os grupos acompanhados pela Cáritas nestes 30 anos de história, o processo de formação, a atuação da Comissão Diocesana de Mulheres e os encontros como espaços de animação, articulação e capacitação dos grupos, são refletidos nesta parte da cartilha. Por fim, discorre-se sobre três temáticas consideradas fundamentais no processo de formação e acompanhamento dos grupos: a dimensão da saúde, a prevenção e combate da violência contra a mulher e a economia popular solidária.

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1. Inspirações de uma mulher de atitude

(João 2,1-11)

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No terceiro dia, houve uma festa de casamento em Caná da Galileia, e a mãe de Jesus estava aí. Jesus também tinha sido convidado para essa festa de casamento, junto com seus discípulos. Faltou vinho e a mãe de Jesus lhe disse: “Eles não têm mais vinho!” Jesus respondeu: “Mulher, que existe entre nós? Minha hora ainda não chegou.” A mãe de Jesus disse aos que estavam servindo: “Façam o que ele mandar.” Havia aí seis potes de pedra de uns cem litros cada um, que serviam para os ritos de purificação dos Judeus. Jesus disse aos que serviam: “Encham de água esses potes.” Eles encheram os potes até a boca. Depois Jesus disse: “Agora tirem e levem ao mestre sala.” Então levaram ao mestre sala. Este provou a água transformada em vinho, sem saber de onde vinha. Os que serviam estavam sabendo, pois foram eles que tiraram a água. Então o mestre sala chamou o noivo e disse. “Todos servem primeiro o vinho bom e, quando os convidados estão quase bêbados, servem o pior. Você, porém, guardou o vinho bom até agora.” Foi assim, em Caná da Galileia, que Jesus começou seus sinais. Ele manifestou a sua glória, e seus discípulos acreditaram nele. (João 2, 1-11)


1.1 Ação de Jesus e intervenção de Maria Essa passagem bíblica traz profundos ensinamentos teológicos, pois trata do primeiro sinal de Jesus. Ao fazermos uma reflexão sobre o texto, percebemos o quanto a presença de Maria foi importante para ação de Jesus e para o todo da festa de casamento¹. A celebração do casamento revela duas alianças. A primeira é a aliança “deles”, das autoridades judaicas que, neste evangelho, por não terem mais vinho, perseguiram Jesus até a crucificação (Jó 19,6). A segunda é a de Jesus. Maria percebeu a falta de vinho. Ela buscava o sentido que a religião petrificada havia matado na antiga aliança. Se o mediador da antiga aliança no Sinai foi o homem Moisés, agora, na nova aliança, quem faz a mediação é uma mulher. No texto, ela não tem nome. É que ela é mais que a mãe de Jesus. Representa também a comunidade da nova aliança. Maria estava no casamento e Jesus e os discípulos foram convidados a participar da mesma festa. Estando presente, Maria percebeu que algo estava faltando, o vinho². Ela foi até Jesus e lhe disse: “eles não têm mais vinho” (Jó 2,3). E Jesus disse que ainda não chegara a sua hora. Aparentemente parece que Jesus responde de uma forma que não se importou com o que estava acontecendo. Quando afirma que ainda não havia chegado a sua hora, ele fala de realidades profundas, que vão além das aparências e que muitos

não entendiam. Maria, rapidamente, percebeu e não discutiu com Jesus. Entendeu o que ele quis ensinar. Compreendeu que não se tratava somente de resolver um problema de falta de vinho, de atender uma necessidade concreta, mas sim, o que este fato podia ajudar as pessoas a conhecerem melhor quem era Jesus e se posicionarem diante dele. Maria continua, insiste e diz aos que estavam servindo “façam o que ele mandar” (Jó 2,5). Essas palavras têm uma grande força simbólica, pois ela não só realiza a vontade de Deus na sua vida, mas também orienta os outros a fazerem o que Deus lhe pede. Maria estava naquela festa não apenas como simples convidada, pelo contrário, estava trabalhando, atenta a todas as preocupações da família e assim percebeu o que estava acontecendo. Quando recorreu a Jesus, certamente em seu coração havia a certeza de que o filho podia apontar saídas para a situação. Podemos entender o pedido de Maria como uma intercessão feita por ela, sem a solicitação da família, mas por sua própria vontade, por vê-la em situação difícil, de constrangimento diante dos convidados pela falta de vinho. Maria está atenta a tudo o que ocorre com seus filhos, se fazendo muito atuante e presente na vida das pessoas.

¹A festa humana de casamento serve na tradição bíblica de metáfora para a Aliança de Deus com o seu povo (Os 2,18-21; Ez 16,8; Is 62,3-5). O vinho é dom de Deus para a alegria das pessoas e sinal de felicidade (Sl 104[103],15; cf. Jz 9,13; Eclo 31,27-28; Zc 10,7). É por essa razão que ele será abundante nas “bodas escatológicas” (Am 9,13; Is 25,6). Em razão de sua cor, o vinho era tido como o sangue da vinha. Daí ele ter se tornado, como o sangue, símbolo da vida. “Eu vim para que todos tenham vida, e a tenham em abundância”, diz o Senhor (Jó 10,10). A nós é dada a tarefa de distribuir este vinho da alegria e de oferecer esta vida que é dom. ²O que significa a falta de vinho? Entre os camponeses da Galileia o vinho era símbolo da alegria e do amor. Sabiam-no todos. Se na vida falta a alegria e o amor, em que pode terminar a convivência? Maria não se engana. Jesus intervém para salvar a festa proporcionando vinho abundante e de excelente qualidade.

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1.2 Maria, mulher atenta à realidade O texto bíblico que citamos e refletimos tem aspectos significativos a serem estudados sobre a atuação de Jesus. Porém, não queremos aprofundar a ação de Jesus, mas observar o quanto Maria foi importante nesta ação e relacionar com as mulheres de hoje, de maneira especial as que dedicam parte de seu tempo nos trabalhos da Cáritas. Maria era atenta, perspicaz e observadora. Ao perceber o que estava acontecendo na festa, demonstrou sensibilidade frente à situação da “falta de vinho”. Ela podia não perceber ou simplesmente ignorar o que estava acontecendo, mas não, além de visualizar a falta do vinho, tomou a atitude de resolver o problema da família. As mulheres que a cada dia constroem a história da Cáritas com certeza se inspiram em Maria. As realidades com que se deparam hoje são famílias de periferias, de beira trilhos, de quilombos, de terras indígenas... Nestes espaços elas vivem, de certa forma, os mesmos sentimentos de Maria, quando percebem a “falta de vinho”, que hoje podemos traduzir em falta de alimentação, moradia, saúde, educação, lazer, informação, cidadania, entre outras tantas situações. Estar atento, a exemplo de Maria, é colocarse no lugar das famílias e perceber o que “falta”, não ficando parado. Maria agiu. É importante encontrar meios de transformar a realidade em que estamos inseridos. Esse texto bíblico em que Maria tem uma participação especial nos ajuda a perceber o quanto estes grupos de mulheres, nestes 30 anos de existência, vivenciaram e, com ousadia, encontraram formas de resolver seus problemas. A “falta de vinho” - “falta de alegria e de amor” na atualidade, é a falta de pão e de cidadania que as famílias experimentam.

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Precisamos valorizar a cada dia a atuação e a participação de todas as mulheres que se dedicam à vida religiosa, social e política para transformar a realidade em que estão inseridas. A presença das mulheres é fundamental para o crescimento sadio das relações sociais.


2. Traços de uma história de conquistas e desafios

Para discorrermos sobre a história dos 30 anos de trabalho da Cáritas junto aos grupos de mulheres, torna-se necessário fazer memória de alguns elementos que servem de base para esta caminhada. Poderíamos partir da situação atual das mulheres, porém o resgate histórico, mesmo que de forma simples, auxilia na reflexão, fortalece e impulsiona a dar continuidade às lutas travadas. A memória histórica é reveladora de que os direitos que, aos poucos, as mulheres estão usufruindo, são frutos de uma trajetória longa e árdua. É fundamental retomar o passado para fortalecer e reanimar a luta do presente.

Se olharmos para a literatura produzida, percebemos diferentes maneiras de abordar a história de luta das mulheres. Não temos condições aqui, e nem é nossa pretensão e objetivo, explorar essa gama de referenciais e autores. O que faremos é trazer algumas ponderações, no intuito de refletir sobre aspectos que auxiliaram na conquista de direitos e no fortalecimento do protagonismo feminino.

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As mulheres possuem uma trajetória relacionada à discriminação, à exclusão, ao preconceito e a uma relação de submissão, em que somente os homens eram considerados sujeitos de direitos perante a sociedade. Durante os últimos 500 mil anos as mulheres eram tratadas como inferiores e até incapazes, sendo submetidas primeiro à autoridade do pai, na falta dele, dos irmãos e, depois, do esposo. Suas funções eram definidas como as do cuidado: da casa, dos filhos e do marido. Eram destituídas de direitos sociais e não eram consideradas capazes de trabalhar, estudar e exercer sua cidadania³ - palavra esta que por muito tempo foi exercida exclusivamente pela população masculina, sem que a mulher sequer pudesse aparecer nos espaços públicos ou ter a sua opinião valorizada. Somente muito tempo atrás se tem notícias de relações de equidade entre homens e mulheres. Leonardo Boff e Rose Marie Muraro, no livro Feminino e Masculino: uma nova consciência para o encontro das diferenças, falam do mito do Paraíso perdido, onde homens e mulheres viviam de forma integrada entre si e com a natureza. Na história da evolução da humanidade esta é conhecida como a fase que teve um milhão e meio de anos4. Nas referências indicadas pelos autores, trata-se de dois milhões de anos atrás, antes de ocorrer o segundo ponto de mutação, marcado pela invenção do machado de pedra lascada e pelas sociedades de caça5.

A humanidade ainda passou pela era da fundição agrícola e da civilização urbano/industrial, até chegarmos ao ponto de “mutação” em que nos encontramos: a chamada segunda revolução industrial. Durante todo esse tempo tem se experimentado relações marcadas pelo modelo patriarcal.

³As mulheres não tinham direito de estudar e nem votar. Somente em 1932, período de Getúlio Vargas, foi promulgado o novo Código Eleitoral, garantindo o direito de a mulher brasileira votar. Porém, o que estava garantido foi cancelado em 1937, com a ditadura do Estado Novo, retornando como direito somente mais tarde. (GRUPO DE PESQUISA TEOLOGIA E GÊNERO, 2005, p 186).

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GRUPO DE PESQUISA TEOLOGIA E GÊNERO, 2005, P.179.

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MURARO; BOFF, 2002, p. 9;13.


2.1 Inserção no mercado de trabalho e seus dilemas A partir do século XVIII, com o processo de industrialização em expansão, começa a aparecer um conjunto de questões que indicam para a maior absorção da mão de obra feminina no mercado de trabalho. Se, por um lado, a urbanização obriga as pessoas a buscarem uma complementação da renda para sobreviver (quando não há substituição da mão de obra masculina pela feminina), por outro, o trabalho da mulher (e das crianças) era mais barato para as indústrias. O aumento e o investimento industrial também geram momentos de pico, onde há maior necessidade de absorção de mão de obra. Todos esses fatores tornam o trabalho fora de casa, remunerado, uma realidade para a mulher, fazendo com que, além de complementar a renda familiar, permitisse autonomia e liberdade. Mas o trabalho nas fábricas se dava de maneira muito extensiva. A busca desenfreada pelo lucro dos grandes proprietários fazia com que convocassem mais trabalhadores para acelerar a produção. Este período pode ser considerado auge em termos de exploração da mão de obra pelas fábricas, especialmente das mulheres. Elas produziam de forma igual aos homens, mas recebiam menos pelo trabalho desenvolvido, engrossando a margem de lucro dos proprietários. Em alguns momentos e em alguns lugares, como em fábricas inglesas, a carga horária chegava ao absurdo de 16 a 18 horas diárias de trabalho, esgotando os trabalhadores e tirando o direito do descanso necessário antes de retornarem ao trabalho. Os salários eram baixos e a produção era cronometrada, sendo que aquelas que produziam mais em menos tempo tinham maiores chances de permanecerem no emprego. Muitas vezes, ao retornar para casa tinham que enfrentar os maridos, que ainda não haviam assimilado a ideia de as mulheres trabalharem fora e cuidarem dos filhos e dos afazeres domésticos.

A segunda metade do século XX, além de ser marcada por grandes transformações em termos tecnológicos e de modelo produtivo, foi caracterizada por altos índices de desemprego e precarização das relações de trabalho, contribuindo para o aumento da pobreza e da miséria de parcelas significativas da população. A reestruturação produtiva baseada nos avanços tecnológicos e nos modelos de gestão intensificadores de trabalho alterou de forma rápida o mercado e as condições de trabalho. Milhões de postos de trabalho foram extintos. Direitos sociais, conquistados pelas lutas das classes trabalhadoras

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a duras penas, foram flexibilizados e eliminados. As condições de subemprego fragilizaram ainda mais a proteção dos trabalhadores. Como reações a essa crise do trabalho surgiram diversas iniciativas. Neste contexto, a empregabilidade e o empreendedorismo foram enfatizados pela perspectiva liberal. “A divisão sexual do trabalho e a opressão das mulheres são anteriores ao capitalismo, mas foram apropriadas e aprofundadas por ele. O sistema capitalista necessita desse trabalho invisível e realizado gratuitamente pelas mulheres, pois ele garante que o trabalhador chegue ao serviço com roupa limpa e passada, alimentação preparada, etc, diminuído os custos das empresas com o salário. Dessa forma, o trabalho feminino não pago serve para aumentar a produtividade do trabalho dos trabalhadores.”6

A realidade do mundo do trabalho nunca foi fácil e na história das mulheres ela é marcada pela resistência e pela luta por espaço no mercado, além de salário digno e condições adequadas. Apesar da entrada de milhões de mulheres no mercado de trabalho nos últimos 30 ou 40 anos, a diferença salarial permanece. É urgente a superação das chamadas barreiras de gênero, que trazem à tona a urgência da participação das mulheres em termos de acesso a oportunidades, distribuição de poder, decisões, responsabilidades, bens e riquezas. Muito se conquistou neste sentido, porém a jornada de trabalho das mulheres ampliou, pois, além de dar conta de sua profissão, tem a preocupação com a casa e os filhos.

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MAB, 2011, p. 09

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MAB, 2011, p. 10

“Um dos modos pelo qual a desigualdade de gênero se manifesta é através do trabalho doméstico (não remunerado) que compromete o tempo livre das mulheres. A jornada semanal média de trabalho doméstico das brasileiras é de 29 horas e 21 minutos, somando-se o tempo dedicado a “serviços de limpeza, cozinha, lavar e passar roupas” (17h44`), cuidado com crianças (10h) e com as pessoas idosas ou doentes (1h37`), contra 8 horas e 46 minutos declarados pelos homens (ou 6h15`, segundo o relato das mulheres). Ou seja, a jornada semanal média de trabalho doméstico dos homens é de três a quatro vezes menor que a das mulheres.”7

A inserção da mulher no mercado de trabalho foi uma conquista, porém faz-se necessário pensar alternativas para que a jornada não seja ainda maior. Por isso, uma discussão que precisa ser ampliada junto aos grupos de mulheres, aos homens e com toda a sociedade, é a da divisão do trabalho doméstico e do cuidado com os filhos.


2.2 Peculiaridades da trajetória das mulheres no Brasil A mulher brasileira, assim como em outros lugares do mundo, passou ao longo da história por diversas situações de repressão. Algumas peculiaridades parecem importantes destacar, a começar pela época da escravidão, quando eram obrigadas a obedecer às ordens de seus patrões. Eram vendidas como mercadorias e tratadas de maneira desumana, sem as mínimas condições de dignidade e respeito. Mesmo com a abolição da escravatura, as mulheres negras continuavam a serem escravas de uma sociedade moralista e excludente. Em outras situações, não somente no caso da etnia negra, mas de forma geral a mulher, era obrigada a satisfazer aos homens sem jamais reclamar ou negar-se. No que se refere à participação da mulher na sociedade, como mencionado acima, ela servia para procriar e para os serviços domésticos. Segundo Alice Gabriel, o estudo do feminismo no Brasil precisa considerar a situação vivida pela mulher brasileira. Para ela, é importante compreender que o tipo de colonização instalada no país estimulava a monocultura e o latifúndio, favorecendo a manutenção da família patriarcal. O proprietário das terras tinha poderes sobre todos: escravos e família. A mulher tinha a função de realizar-lhe os desejos. As meninas aprendiam desde cedo as tarefas da casa - “prendas domésticas” - e a saírem apenas para a missa8. Levou muito tempo até que as mulheres começassem a reivindicar direitos de igualdade, oportunidades de vida digna e autonomia. A sociedade predominantemente machista ocasionou o desfecho de uma história cheia de desigualdades e opressões para com a população feminina que, além de submissa, sofreu e ainda sofre com a falta de reconhecimento sobre a importância do seu papel na sociedade.

Contudo, nos últimos anos as mulheres têm se mostrado ativas na sociedade e estão ganhando cada vez mais espaço no exercício da democracia, transformando-se em protagonistas e cidadãs. Tudo isso depois de muitos anos de luta, sofrimento, ganhos e perdas. A mulher deve ser vista e reconhecida como provedora de habilidades tão eficientes e profissionais como os homens, bastando que lhes sejam oferecidas oportunidades. Muito foi conquistado, mas a discriminação ainda existe e as concepções preconceituosas estão arraigadas na cultura, dificultando que as mulheres mostrem o quanto são fundamentais ao desenvolvimento de diversas esferas sociais. Os sinais de resistência e as conquistas servem de esperança e motivação para continuar caminhando. 8

GABRIEL, 2004, p. 02

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3. Papel da Cáritas na construção de alternativas para as mulheres A Cáritas Arquidiocesana de Passo Fundo comemorou 50 anos de atuação no ano de 2011. Durante estas cinco décadas, a entidade primou sempre pela conquista da autonomia e do protagonismo dos sujeitos, através da garantia dos direitos e da cidadania. Para que tais objetivos fossem cumpridos, a entidade priorizou de forma muito significativa a organização de grupos comunitários, nas mais diversas áreas, seja de mulheres, economia solidária, reciclagem ou até mesmo espaços de formação e qualificação. Hoje, a Cáritas possui dez programas de ação, trabalhando com preservação ambiental, políticas públicas, economia solidária, alimentação saudável, agroecologia, equipes paroquiais, voluntariado, mulheres, crianças e adolescentes, populações tradicionais, emergências, articulações e parcerias, Fundo de Solidariedade e sustentabilidade da rede Cáritas. O trabalho com as mulheres, desenvolvido de forma mais efetiva desde 1983, visa fortalecer e incentivar o processo de organização de grupos, tanto da cidade de Passo Fundo quanto de outras cidades de abrangência da arquidiocese. As atividades desenvolvidas procuram, desde o início, a participação política da mulher e sua inserção efetiva na sociedade, no trabalho e na política, através da capacitação profissional. Assim, as ações superam o mero assistencialismo, tornando-se efetivas na busca por uma sociedade mais igualitária, principalmente no que diz respeito à questão de gênero. Desta forma, faz-se necessário um breve resgate histórico, com o objetivo de citar os principais aspectos da trajetória percorrida pela instituição junto às mulheres. Os grupos surgiram das

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necessidades sociais locais das comunidades e de demandas das próprias mulheres. Em 1983, na Vila Bom Jesus, em Passo Fundo, a Cáritas apoiou um grupo de mulheres chamado “União e Amizade”. O investimento feito foi na construção/ aquisição de tanques comunitários que serviram para a lavagem de roupas da comunidade. Construíram no local uma bica, que permitia que a água chegasse até os tanques. Este fato foi uma das primeiras conquistas da Vila Bom Jesus. Até então a comunidade usava o rio para a atividade. Consideramos este fato um marco que dá início as atividades da entidade com grupos de mulheres. A partir desta organização, com o apoio da Cáritas, surgiram outras iniciativas, denominadas “grupos de mães”. Foi a partir de 1985 que o trabalho passa a se dar mais fortemente com as mulheres das periferias. Neste momento, havia nove grupos sendo acompanhados pela entidade, em Passo Fundo. Os registros escritos e a memória das pessoas que fizeram parte desta fase inicial revelam que no final da década de 80, muito provavelmente coincidindo com o despertar gerado pelo encontro de Mulheres da Periferia de 1987, o trabalho passou a englobar outras cidades de abrangência da então Diocese de Passo Fundo, não mais apenas a cidade sede. A partir deste momento a atuação junto aos grupos de mulheres tomou outros rumos, em virtude de novas necessidades. A ênfase passa a ser a luta por políticas públicas mais eficazes e pela criação de uma Delegacia da Mulher no Município de Passo Fundo. Os novos desafios, por seu caráter de urgência, sobrepuseram-se ao acompanhamento dos grupos. Novos temas e práticas foram executados: informações sobre saúde, meio ambiente, combate e preven-


ção ao estresse, participação política, combate à violência, política de assistência, alimentação saudável, autoestima, gênero, além de apoio a projetos de geração e complementação de renda. Toda a luta das mulheres tem o objetivo de afirmar seus direitos, sua liberdade e sua dignidade. Ela revela a crença de que é possível construir relações de afeto, solidariedade e cooperação, tanto na vida pessoal, como na esfera pública. Neste sentido, a Cáritas apoia e incentiva a luta das mulheres para que elas se afirmem como agentes de transformação social, como sujeitos políticos da própria história e da história de suas comunidades.

Com este intuito, em 1990, é criada a Comissão Diocesana de Mulheres, formada por mulheres integrantes de grupos populares e equipes paroquiais. A comissão tinha como objetivo fortalecer a luta das mulheres, ser um espaço de reflexão, de mística e de socialização das realidades. Somente em 1995 foi elaborado o Regimento Interno da Comissão Diocesana de Mulheres que, no Art 2º, traz as seguintes competências: “- Articular o trabalho com grupos de mulheres em nível diocesano, respeitando a autonomia dos grupos nas comunidades, paróquias e municípios; - Preparar o encontro diocesano, uma vez ao ano no 2º sábado de março; - Pensar subsídios formativos e informativos para os grupos de mulheres; - Encaminhar ações relativas às bandeiras de luta, tais como: saúde, violência contra a mulher, aposentadoria da mulher dona de casa. - Garantir que a caminhada dos grupos seja: participativa, organizada, democrática, aberta as lutas populares, com uma visão de conjunto e transformadora.”

A Comissão Diocesana de Mulheres atuou de 1990 à 2012, quando se integrou ao Conselho de Representantes – instância de representações dos diversos trabalhos desenvolvidos pela Cáritas. O grupo participou ativamente das ações da Cáritas e de encontros de formação promovidos pela entidade, além de atividades desenvolvidas em outras regiões do Estado, como encontros de Mística Feminina, em Porto Alegre, Pelotas e Canoas.

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Tanques Comunitários na Vila Bom Jesus


3) Parcerias como elemento estratégico no trabalho. A entidade acredita que as possibilidades, a força e a concretização dos projetos obtêm melhores resultados quando construídos coletivamente e com suporte técnico. Exemplo disso é a parceria constituída entre a Cáritas e a Universidade de Passo Fundo – UPF. Com os estagiários e bolsistas disponibilizados pela universidade, tornou-se possível a realização de diversas oficinas de aprendizagem e qualificação junto aos grupos de mulheres, em vista do desenvolvimento de novas técnicas de artesanato, panificação, alimentação, entre outros.

Comissão Diocesana de Mulheres - 1997 Dando continuidade nas perspectivas de emancipar e capacitar as mulheres, várias ações foram e estão sendo realizadas, com o suporte da Cáritas, junto aos grupos de mulheres. Destacamos algumas delas: 1) Participação da Cáritas Arquidiocesana de Passo Fundo e da Comissão de Mulheres nas ações desenvolvidas pelas entidades de Passo Fundo e pela Prefeitura Municipal, em prol da conquista de direitos civis, políticos e sociais das mulheres. Destaque para a Semana Municipal da Mulher e para os 16 dias de ativismo.

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2) Participação efetiva da Cáritas, em 2010, da criação do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher – COMDIM. O Conselho é um espaço fundamental na luta das mulheres por seus direitos.

4) Promoção de mostras dos produtos confeccionados. A organização e incentivo à participação dos grupos de mulheres em feiras realizadas na cidade e na região, propiciam a partilha e dão maior visibilidade ao trabalho das mulheres, auxiliando na geração e/ ou complementação de renda. 5) Promoção, a cada dois anos, do Encontro Arquidiocesano de Mulheres, a fim de incentivar e fortalecer a organização dos grupos acompanhados. Os encontros ocorrem próximo ao Dia Internacional da Mulher, o que leva sempre a uma reflexão sobre as conquistas e desafios que se mostram à frente da luta por melhores condições de vida e trabalho, pela igualdade de gênero e pela emancipação feminina. 6) Incentivo, mobilização e articulação inicial para a implantação da Delegacia da Mulher em Passo Fundo, adquirindo 1459 assinaturas. O processo logo foi integrado por muitas outras organizações sociais, principalmente ligadas às mulheres. O espaço hoje conta com uma delegada e atende especialmente mulheres vítimas de agressões.


Embora os desafios sejam muitos, os resultados do trabalho são facilmente perceptíveis. Os encontros são oportunidades para as mulheres tomarem consciência dos desafios que têm pela frente e das conquistas alcançadas. Assim passam a compreender o quão importante é seu papel na sociedade e na família. Deixam de ser coadjuvantes de suas próprias vidas para se tornarem protagonistas e participantes, tanto no âmbito político quanto no social. O acompanhamento da Cáritas aos grupos foi importante para o fortalecimento dos mesmos. Estes espaços proporcionam às mulheres momentos de partilha, convivência, troca de experiências, valorização pessoal e resgate da autoestima. O trabalho também obteve resultados positivos no âmbito da formação profissional, através da qualificação dos produtos e de seus empreendimentos.

Grupo de Mulheres na Paróquia Nossa Senhora de Fátima, Carazinho 1997

Pintando uma nova sociedade 1980 marca o início de uma organização para defesa da vida, da natureza e a luta por direitos à saúde. É o centro de nossa atenção que se sustenta na solidariedade entre os grupos e na espiritualidade que anima a ação. Clarete De David

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3.1 Palavra das mulheres dos grupos

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O acompanhamento da Cáritas aos grupos de mulheres iniciou na década de 80 pelo forte clamor do contexto social local. Violência contra a mulher, analfabetismo, pobreza, falta de capacitação e qualificação profissional e o próprio desemprego foram algumas das questões interpretadas pela entidade como gritos de socorro. Assim, a formação dos grupos passou a se constituir em alternativa às mulheres, as quais encontraram espaço e oportunidade de capacitação profissional, resgate da dignidade e da autoestima, além da discussão de temáticas como: saúde, violência, políticas públicas, cooperativismo, economia solidária entre outros. É importante verificar como, na ótica das mulheres, são visualizadas as dificuldades, os desafios e as conquistas já alcançadas pelos grupos. a) Motivações e objetivos da organização dos grupos O estímulo e o suporte dado pela Cáritas encontravam terreno fértil nas carências experimentadas pelas mulheres, que eram transformadas em demandas e motivações decisivas para a organização dos grupos. Alguns se formaram visando a integração e a troca de experiências; outros tinham a necessidade de creche para as mães que trabalham fora e não tinham com quem deixar seus filhos; alguns pretendiam prestar ajuda às pessoas carentes da comunidade e outros ainda tinham como objetivo a geração ou complementação de renda através do artesanato e de pequenas confecções. Na organização do trabalho voluntário e na 9

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capacitação dos grupos que visavam trabalho e renda, aparecia o apoio e o suporte da Cáritas. A formação sempre foi luz e sustento na caminhada dos grupos em si e horizonte na luta por direitos. Os grupos têm, de maneira geral, os objetivos de capacitar as mulheres e de gerar e/ou complementar sua renda familiar através do artesanato e da panificação; resgatar a autoestima das participantes; tornar as mulheres agentes políticas e sociais de transformação, a partir da luta e reivindicação de seus direitos; promovê-las através da troca de experiências e de conhecimentos, dentre outros que, assim como as motivações, são próprios de cada um dos grupos. Segundo os relatos o fato de encontrar-se no grupo é uma oportunidade de fazer algo diferente, de ensinar e aprender no coletivo. Uma das participantes relata: “venho para o grupo porque me identifico com as pessoas que aqui estão. É um espaço de convivência”. b) Dificuldades encontradas As principais dificuldades relatadas pelos grupos inserem-se na busca de recursos e no fato de não se sentirem aceitos pela comunidade no início de suas atividades, além de que não possuíam local para se encontrar. Muitos iniciaram em residências cedidas por membros do grupo, realidade que ainda enfrentamos. Outro elemento é a falta de perseverança das participantes nos grupos. Há grande rotatividade e, por outro lado, há pessoas que se concentram em algumas metodologias de trabalho que dificultam pos-

A reflexão produzida nesta parte do texto é o resultado de uma pesquisa realizada junto às mulheres que atuam nos grupos organizados que são acompanhados e apoiados pela Cáritas. A pesquisa teve como objetivo verificar as motivações da organização dos grupos, os momentos que marcaram a caminhada e verificar as principais demandas dos mesmos, para assim avaliar as ações desenvolvidas pela entidade junto aos grupos. As entrevistadas foram questionadas sobre as suas motivações, seus objetivos e seus desafios. Esse trabalho integra e se sustenta na metodologia utilizada pela Cáritas de partir da realidade das mulheres e auxiliar no processo de emancipação das pessoas acompanhadas.


Grupo de Mulheres Renascer, na paróquia São Judas Tadeu, em Passo Fundo síveis mudanças e não deixam o grupo avançar em qualidade e em quantidade de participantes. Mas, como lembrado em diversos relatos, as dificuldades puderam ser superadas com a união e o esforço das mulheres envolvidas. c) Momentos marcantes para os grupos Conforme a pesquisa é possível perceber que vários momentos foram marcantes para os grupos acompanhados pela Cáritas Arquidiocesana de Passo Fundo. Os relatos englobam desde o prazer de ver pronto um artesanato desenvolvido pelas mãos das mulheres até os encontrões, passando pelos momentos de partilha de vivências e de conhecimento e por viagens realizadas, além da ajuda prestada às famílias em vulnerabilidade. Outra questão que marca os grupos são aqueles momentos em que está em crise, onde parece que não será mais possível dar continuidade, mas surge uma “luz”, uma saída, e juntas as mulheres reconstroem o caminho pedregoso percorrido.

d) Mudanças percebidas com a organização dos Grupos de Mulheres Após a organização dos grupos de mulheres, várias foram as conquistas nos âmbitos pessoal, comunitário e social. Despertou-se a valorização, a autoestima e a potencialidade de cada uma das mulheres participantes. Com o trabalho, também se tornou possível a geração e/ou complementação de renda das famílias envolvidas. No âmbito comunitário, também houve mudanças: alguns grupos destacaram a forma de trabalho, que se dá de maneira coletiva, solidária e transformadora. Muitas mulheres passaram a participar e se inserir na comunidade através deste trabalho.

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O grupo de mulheres “Damas da Caridade” é um grupo de amigas que cultiva a amizade. Fazemos caridade, com os produtos que passam por nossas mãos, tesouras, tecidos, linhas, além do gostoso chimarrão. No pavilhão “Irmã Carolina” nos reunimos todas as quintas. Orgulha-nos que a mesma foi nossa madrinha. Com muita devoção pedimos a Nossa Senhora Aparecida proteção, ao grupo e seus familiares e, principalmente, a todo esse chão. Arceli de Souza

Grupo de Mulheres Passo a Passo

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A Cáritas não poderia ter feito coisa melhor ao criar os grupos de mulheres. Muitas delas tiveram a oportunidade de melhorar de vida, saúde e autoestima, libertando-se da dependência. Ivone Vanini


3.2 Formação como fortalecimento dos grupos Muitas bandeiras de lutas fazem parte da história dos grupos de mulheres apoiados pela Cáritas, pois a entidade construiu, desde 1987, encontros de formação com diferentes temas de reflexão. Cada temática faz memória de uma determinada realidade que necessitava ser refletida, no intuito de construir, com as mulheres, espaços de resistência e de emancipação.

São momentos de integração, capacitação e organização da luta das mulheres. A cada período usou-se uma nomenclatura diferente para falar dos encontros, expressando as circunstâncias vividas pelos grupos. Na tabela a seguir visualizamos informações sobre os encontros realizados:

Data/Encontro

Temática

Município

25/03/87 1º Encontro de Mulheres da Periferia

Situação da Mulher na sociedade atual, seu valor enquanto pessoa e sua importância na organização comunitária

Passo Fundo

13/09/87 2º Encontro de Mulheres da Periferia

A mulher gaúcha, na família, na nova república, na Igreja e na previdência social

Passo Fundo

20/03/88 3º Encontro das Mulheres da Periferia

A organização das mulheres e o movimento popular

Passo Fundo

29/11/88 4º Encontro de Mulheres da Periferia

Avaliando: pontos positivos, dificuldade e o novo no trabalho

Passo Fundo

12/03/89 1º Encontro de Mulheres do Meio Popular

Assim como somos capazes de gerar vidas, geramos uma nova sociedade

Passo Fundo

01/07/89 1º Encontro Pastoral da Mulher Pobre

Autonomia e organização de grupos

Marau

25/07/89 Seminário Diocesano sobre a Mulher

Mulher e Homem: imagem de Deus

Passo Fundo

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Data/Encontro

Temática

Município

10/03/90 2º Encontro de Mulheres do Meio Popular

Mulher: na família, na luta contra a violência, no trabalho, na ação nos movimentos populares, na saúde e no planejamento familiar

Passo Fundo

24/03/90 Encontro de Mulheres

Mulher e Homem imagem de Deus e a realidade da família

Carazinho

09/03/91 3º Encontro de Mulheres da Periferia

A mulher em busca de vida nova

Passo Fundo

14/03/92 4º Encontro de Mulheres no Meio Popular

Mulheres pintando a nova sociedade

Passo Fundo

13/03/93 5º Encontro Diocesano de Mulheres do Meio Popular

Mulheres construindo a nova sociedade

Passo Fundo

12/03/94 6º Encontro Diocesano de Mulheres do Meio Popular

Buscam no claro escuro da vida os caminhos da ternura, da compaixão e da justiça

Passo Fundo

11/03/95 7º Encontro Diocesano de Mulheres do Meio Popular

Mulher! Pare! Olhe para si mesma e descubra seu valor!!!

Passo Fundo

08/03/97 1º Encontrão Diocesano de Mulheres

Mulheres construindo solidariedade e cidadania

Passo Fundo

13/03/99 2º Encontrão Diocesano de Mulheres

Mulheres rumo ao novo milênio

Passo Fundo


Data/Encontro

Temática

Município

17/09/99 3º Encontrão Diocesano de Mulheres

Violência e discriminação contra as mulheres

Passo Fundo

11/11/00 4º Encontrão Diocesano de Mulheres

Como a sociedade trata e vê as mulheres trabalhadoras urbanas (sonhos e desafios)

Passo Fundo

28/04/01 5º Encontrão Diocesano de Mulheres

Mulher presença atuante no novo milênio

Passo Fundo

08/03/03 6º Encontrão Diocesano de Mulheres

Mulher: berço da gestação ecológica

Passo Fundo

12/03/05 7º Encontrão Diocesano de Mulheres

Mulheres promotoras da Paz

Passo Fundo

10/03/07 8º Encontrão Diocesano de Mulheres

Mulheres Vida e esperança da Família

Carazinho

21/03/09 9º Encontrão Diocesano de Mulheres

25 anos de grupos de mulheres: vencendo desafios e construindo mundo novo

Sertão

02/04/11 10º Encontrão Diocesano de Mulheres

Mulheres e meio ambiente: compromissos e práticas fazendo a diferença

Carazinho

09/03/13 11º Encontrão Arquidiocesano de Mulheres

A Missão da mulher Cáritas: na família, na sociedade, na Igreja e com a juventude.

Passo Fundo

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3.3 Refletindo sobre a dinâmica e os temas dos encontros Os encontros visam o fortalecimento dos grupos a partir da troca de experiências e formação. De 1987 a 2013, foram realizados vinte e cinco encontros, sendo que vinte, em Passo Fundo, um no município de Marau, três em Carazinho e um em Sertão. Na época os encontros foram intitulados Encontros de Mulheres da Periferia, Encontros de Mulheres do Meio Popular e Encontro Pastoral da Mulher Pobre. Há uma grande relevância nos nomes dos encontros, pois demonstram que as lutas estavam voltadas para a realidade popular. As temáticas refletidas, além de terem a preocupação específica com a luta das mulheres, não descuidaram de questões contextuais mais amplas. Nas décadas de 70 e 80, por exemplo, quando cresciam as mobilizações pelo fim da ditadura militar e pela redemocratização do Brasil, as mulheres também se envolviam nessa discussão. De fato, vivíamos um momento de efervescência dos movimentos sociais, dos sindicatos, das pastorais sociais e das Comunidades Eclesiais de Base – CEB’s. Exemplo típico desta relação foi a temática utilizada no encontro de 1988: “a organização das mulheres e o movimento popular”. Neste período se trabalhou muito nos grupos a construção da Constituição Federal. Muitas sugestões partiram do meio popular e, por isso, a Constituição de 1988 é considerada a Constituição Cidadã. A ação das mulheres na construção da Constituição foi fundamental. Em todo o país as mulheres realizavam abaixo-assinados e reuniam-se para formar propostas que deveriam ser avaliadas e contempladas na Constituição. Lutavam pela aposentadoria, licença maternidade e fim da violência contra a mulher. Muitas proposições indicadas pelas mulheres foram incorporadas na Constituição.

1º Encontro de Mulheres do Meio Popular, Passo Fundo 1989

Os encontros sempre tiveram como objetivo refletir assuntos pertinentes à vida das mulheres e acontecimentos da atualidade, além de serem espaços de convivência e lazer. Como a cada encontro aumentava a participação das mulheres e pensando na possibilidade de ampliar ainda mais, a partir de 1993, os encontros passaram a ter caráter Diocesano. Este fato possibilitou maior integração, ampliando a oportunidade de formação, troca de experiências e reforçando a luta pelos direitos das mulheres.

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IV Encontro de Mulheres de Periferia em 1988, Passo Fundo


Ao redor dos encontros é criada uma mística específica, pois a espiritualidade é algo muito importante na vida das mulheres. Sendo assim pensou-se em uma forma de Maria peregrinar com os grupos. A peregrinação da imagem de Nossa Senhora Aparecida iniciou nos anos 90. A Comissão Diocesana de Mulheres estudou a história de três nomes dedicados a Nossa Senhora e partilhou em um encontro. Feita a votação entre todas as participantes, foi escolhida Nossa Senhora Aparecida para ser a padroeira da Comissão Diocesana de Mulheres e dos grupos de mulheres. A religiosidade e a devoção a Nossa Senhora fortalece a vida e a ação dos grupos de mulheres. Maria esteve sempre atenta às necessidades de seu povo, como percebemos na passagem bíblica de João 2, 1-11. É nesta mãe atenciosa, perspicaz e ativa, que os grupos buscam luz e força para realizar o trabalho de solidariedade, acolhida e transformação social. Outras mudanças ou iniciativas foram ocorrendo no processo de organização dos encontros, como a definição das temáticas a serem discutidas. O objetivo é refletir sobre a vida e a luta das mulheres, relacionando quando possível com os temas da Campanha da Fraternidade de cada ano. Quanto às datas dos encontros, a ideia foi sempre organizar próximo ao dia internacional da mulher, pelo simbolismo da data. Contudo, outras ações dificultaram isso em algumas ocasiões. CELEBRANDO OS 30 ANOS

Encontro Diocesano de Mulheres de 2009, em Sertão

Vale destacar que os encontros de mulheres, desde seu surgimento, sempre contaram com a participação e apoio de homens. Sejam eles companheiros, esposos, voluntários, agentes de pastoral. O envolvimento dos mesmos ajudou e continua ajudando a construir esse espaço de partilha, reflexão e convivência. A cada ano há maior participação de homens nos encontros, o que enriquece a compreensão e ajuda a enfrentar os desafios do modelo de sociedade onde as relações estão cada vez mais fragilizadas. O empenho da Cáritas na organização de grupos de mulheres e nos encontros diocesanos acontece porque a entidade aposta na organização e na força das mulheres. Acredita na construção de um novo mundo, um espaço onde as pessoas tenham igualdade de direitos, justiça e se posicionem de forma contrária a qualquer tipo de discriminação ou violência.

Em 30 anos de história, se constroem novas trajetórias... Do individual, ao coletivo. Da luta pontual, à articulação e resistência. Da espera, sem respostas, à esperança renovada. Da voz silenciada, ao protagonismo. Do riso tímido, à gargalhada exuberante. Do sonho solitário, ao movimento coletivo, rumo à mudança, ao NOVO! Passos já foram dados. Melhores dias virão! De igualdade, dignidade, justiça. Então... Mulheres LIBERTAS, enfim serão!

Com certeza esta atividade devolve às mulheres muita estima e afinidade, pois cada encontro traz crescimento, fazendo reviver a sua interioridade.

Loiva de Oliveira

Gessi Alves dos Santos

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3.4 Principais compromissos assumidos durante os encontros de mulheres -

alargar o conhecimento sobre a realidade social e os direitos das mulheres; ampliar a comissão de articulação das mulheres; organizar a associação das donas de casa; encaminhar pedido para a delegacia da mulher, em Passo Fundo; conquistar e ocupar espaços de exercício da democracia e cidadania; aprofundar o estudo sobre os direitos já conquistados, a fim de garanti-los; participar ativamente nas pastorais da Igreja e nos grupos; estimular o planejamento familiar e não a esterilização; não omitir-se frente às injustiças; valorizar-se como mulher, acreditando nas próprias capacidades e nas das companheiras; formar grupos de apoio às mulheres vítimas de violência; incentivar a criação da casa de apoio às mulheres vítimas de violência; fortalecer a organização das mulheres através de cursos de formação; assinar o projeto de lei que cria o Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres; incentivar e apoiar as mulheres que se candidatam a cargos eletivos comprometidas com os direitos das próprias mulheres; - apoiar e criar novos grupos de mulheres; - promover a conscientização da população quanto ao uso da água; - atuar na garantia do direito à saúde, ao trabalho e à remuneração justa, à habitação e a viver sem violência e sem nenhum tipo de discriminação; - construir uma cultura de solidariedade e de paz; - apoiar e auxiliar na organização e estruturação do MMTU - Movimento das Mulheres Trabalhadoras Urbanas; - cuidar da família nas diferentes dimensões (escola, trabalho, amigos, lazer e sociedade).

Alguns desses compromissos são objetos de luta dos grupos de mulheres há bastante tempo, de forma que já foram dados passos significativos em suas conquistas. Outros necessitam de insistência nos debates, perseverança e empenho para efetivação.

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4. Referenciais importantes na atuação junto às mulheres Diante do processo de trabalho desenvolvido junto aos grupos de mulheres, a entidade prioriza três grandes temas que fazem parte dos programas de ação da Cáritas. São temáticas sobre as quais já se tem algum acúmulo e que continuam como preocupação e elementos de estudo, além de serem prioritárias no acompanhamento e na reflexão. São elas: a dimensão da saúde, o combate à violência contra a mulher e a economia popular solidária. Ao falarmos de saúde não podemos deixar de falar de uma alimentação saudável, boas relações, saúde da mulher e da luta pela saúde pública de qualidade, que se efetiva a partir da participação, principalmente, no conselho municipal de saúde.

Outra dimensão que preocupa a entidade é a luta pelo fim da violência contra a mulher. O índice de casos no ano de 2012 em Passo Fundo foi de quase cinco por dia, em torno de 1.728 denúncias foram registradas na Lei Maria da Penha10. A economia popular solidária tem se mostrado um ótimo espaço de trabalho para as mulheres em situação de vulnerabilidade social. Muitos grupos trabalham nesta perceptiva, que contribui na geração de renda e no sustento familiar, que em muitas famílias é de responsabilidade das mulheres.

4.1 A Mulher e os cuidados com sua saúde O cotidiano urbano e do mundo do trabalho que nos envolve na atualidade é extremamente exigente e, se não houver planejamento e cuidado, tira o tempo de descanso e de lazer, tão importantes para a saúde. O ritmo exigido pelo trabalho não é o mesmo que o do nosso organismo. Estamos tão constantemente atarefados pelo trânsito, pelo trabalho, pelos estudos, que nos vemos estressados e sem muita disposição para o dia a dia. Sabemos que uma das formas de obtermos boa saúde é através da alimentação saudável - isto é, bem preparada e diversificada (legumes, verduras, frutas...). É fundamental utilizarmos produtos agroecológicos, sem agrotóxicos. Outra necessidade de nosso corpo são os exercícios físicos, que nos ajudam na saúde física e mental. Tais características dizem respeito à dimensão preventiva da saúde, preocupação quase nula da medicina tradicional. 10

Fonte: Diário da Manhã, 25 de janeiro de 2013

Uma das características da maioria dos grupos de mulheres da Cáritas é observar o cuidado de sua saúde através de uma alimentação adequada, exercícios físicos e da convivência fraterna e solidária. Isso se dá semanalmente ou até diariamente nos grupos de mulheres. Os mesmos se reúnem para o trabalho de confecção, pintura em tecido, crochê, tricô, panificados, etc e propiciam um espaço de integração, lazer, diálogo e gestos de solidariedade uma para com a outra. Temos exemplos de mulheres que à pedido médico buscaram os grupos simplesmente para conviver. Nem todas as participantes tem como preocupação única e exclusiva o aumento da renda familiar. Algumas frequentam os grupos como espaço de terapia e encontro.

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A dimensão da saúde, principalmente da mulher, sempre foi uma das prioridades da Cáritas em seus planejamentos. Outra inserção que consideramos fundamental é a participação da entidade no Conselho Municipal de Saúde, em diversos municípios em que desenvolve suas ações. Esta presença efetiva, seja como conselheira ou participante, contribui na construção de uma política de saúde de qualidade e fortalece as ações que a entidade promove. A mulher precisou, ao longo da história, lutar por diversas conquistas, como já vimos anteriormente. No Brasil, as mulheres rurais foram protagonistas na organização de um movimento próprio e a Comissão de Mulheres, juntamente com a Cáritas, se preocupou em propor e estruturar um movimento para as mulheres trabalhadoras urbanas - MMTU. Com o passar do tempo o movimento entendeu que deveria ter sua autonomia e atualmente, vem cumprindo de forma muito significativa seu papel e a Cáritas continua participando e apoiando suas ações. O cuidado com as pessoas que fazem parte da família Cáritas se dá na sua integralidade, através da orientação em vista de uma alimentação saudável, de um convívio fraterno e solidário e do cultivo da espiritualidade.

Há muitas mulheres, cansadas de lutar. Buscando mais saúde e a vida transformar. São mulheres letradas e de muita fé Todas convidadas por Jesus de Nazaré. Que o alimento que plantamos venha nos ajudar E a garantia da saúde de todos os povos sustentar. Ir. Iraci Zortea

Oficina de alimentação saudável, Paróquia São Judas Tadeu 2012

Conheci a Cáritas em Janeiro de 1992, onde recebi tudo que sei hoje, tanto conhecimento teórico como prático. Por meio destas experiências, defendendo a vida e a saúde, atuo hoje como coordenadora no Conselho Municipal da Saúde.

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Maria Salete Colussi


4.2 Violência contra a mulher Durante a história, agressões cometidas por maridos e companheiros contra as mulheres não pertenciam ao universo da violência, no sentido de que não eram nem mesmo nomeadas enquanto tal. Há um salto paradigmático fundamental quando essas agressões passam a ser reconhecidas como formas de violência e como crimes de violação de direitos humanos. Segundo a Lei Maria da Penha – Lei Federal nº 11.340/2006, “Art. 2º - Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhes asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.” Todavia, tais direitos nem sempre são respeitados. A violência contra a mulher trata-se de um fenômeno construído histórico e socialmente. Ela se materializa em diversas culturas, classes sociais, países e idades, a partir da visão de “inferioridade” da mulher com relação ao homem. Muitas vezes, inclusive, tal modalidade de violência perpassa as próprias famílias e acaba ocorrendo dentro de casa, onde a mulher deveria se sentir mais protegida. Em Passo Fundo há o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher - COMDIM, no qual a Cáritas atualmente participa como uma das conselheiras. O conselho tem como objetivos principais proteger a mulher de todas as formas de violência, pensar políticas públicas para as mulheres e prezar, desta forma, pelos seus direitos. ¹¹Fonte: SINAN: Atendimentos Femininos por Violência. Brasil. 2011.

Ainda assim, o número de casos de violência ainda é muito preocupante: o município ficou em 12º lugar no ranking estadual de homicídios de mulheres, em análise do ano de 2008 a 2010. Já na análise dos atendimentos realizados, atendeu um total de 298 mulheres vítimas de violência, somente no ano de 2011. Estes atendimentos configuram negligência e violências física, psicológica e sexual, conforme indicado no gráfico abaixo¹¹:

1%

14%

Violência Física - 186

10% 13%

Violência Pisicológica - 38

62%

Violência Sexual - 31 Negligência - 2 Não especificada - 41

Através dos dados explicitados, percebe-se que a violência física contra as mulheres ainda é corrente, bem como as demais formas de violência (psíquica, sexual, etc.). Elas continuam sendo subjugadas pelos homens e, na maioria dos casos, pelos próprios companheiros, apesar das políticas públicas, programas, conselhos de direito e legislações existentes. Todavia, como o

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desequilíbrio relacional entre homens e mulheres foi constituído de forma histórica e social, é passível de transformação. Daí a importância de que os movimentos feministas, entidades da sociedade civil e conselhos da mulher, busquem juntos a efetivação dos direitos, no que diz respeito a melhores condições de saúde, educação, segurança, habitação, trabalho, etc, pois as mulheres cada vez mais são desafiadas a liderar, proteger e assegurar a vida em todos os aspectos. A Lei Maria da Penha é a legislação mais avançada no mundo para a prevenção da violência contra a mulher e a punição do agressor. É vitória das mulheres e hoje conhecida e reconhecida por grande parte da população. A lei é tão importante para a vida das mulheres que precisa ser efetivamente incorporada pelos serviços públicos. É necessário ampliar a quantidade de delegacias da mulher, centros de referências, serviços de abrigamento, unidades de saúde e melhorar a as condições de atendimento das mulheres nestes momentos em que estão tão vulneráveis.

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Ser Mulher é se valorizar; Ser Mulher é resgatar sua identidade e cidadania; Ser Mulher é lutar pelos seus direitos; Ser Mulher é denunciar todas as formas de violência; Ser Mulher é buscar saídas para uma vida sem violência; Ser Mulher é sonhar com justiça e paz; Ser Mulher é não ter medo de ser feliz. Odete Kuhs Silveira

A Lei n. 11.340/06 constitui-se em ação afirmativa, ou seja, em discriminação positiva a fim de fornecer defesa às mulheres em situação de violência decorrentes da problemática de gênero. Visa proteção destinada às mulheres em razão de serem historicamente subjugadas e depreciadas, com isso vulneráveis a ações violentas. Josiane Petry Faria


4.3 Mulheres e Economia Solidária

Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, a Economia Solidária traduz-se em uma

“(...) inovadora alternativa de geração de trabalho e renda e uma resposta a favor da inclusão social. (Ela) Compreende uma diversidade de práticas econômicas e sociais organizadas sob a forma de cooperativas, associações, clubes de troca, empresas autogestionárias, redes de cooperação, entre outras, que realizam atividades de produção de bens, prestação de serviços, finanças solidárias, trocas, comércio justo e consumo solidário.” A Economia Solidária, desta forma, tem se mostrado um campo fecundo para a inserção da mulher na sociedade e no mercado de trabalho, através de associações e de pequenas empresas que visam a geração de trabalho e renda de forma a respeitar a integralidade dos sujeitos que nelas atuam. O Fundo de Solidariedade da Arquidiocese de Passo Fundo - FDS12, gerido pela Cáritas Arquidiocesana, é um importante instrumento nesta inserção, através da aprovação de projetos sociais que partem do viés da Economia Solidária, em especial os que são idealizados por mulheres: panificação, artesanato, confecção, associações de reciclagem, etc.

Conselho Municipal dos Direitos da Mulher

Assim, o incentivo do fundo vem auxiliando na emancipação feminina, sua inserção social e empregatícia, além do acesso de tais mulheres à renda ou a complementação desta. Isso possibilita melhores condições de vida às mulheres e às populações que antes se encontravam, muitas vezes, em situação de vulnerabilidade social e que, a partir da prática da Economia Solidária, passam a se ver como sujeitos sociais protagonistas e passíveis de transformarem a realidade na qual se inserem.

¹²O FDS é um fundo que busca apoiar projetos que levem a uma concreta transformação social, através do repasse de recursos à projetos sociais que são encaminhados à Cáritas Arquidiocesana e estão sujeitos à aprovação, acompanhamento, devolução solidária e prestação de contas à entidade.

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Além disso, como a presença feminina mostrase muito forte em tal organização econômica, acaba por auxiliar na desmistificação de que os homens são “superiores” ao desenvolver atividades laborais geradoras de renda. A atuação feminina em tais atividades também abre a elas um campo para que se tornem proprietárias dos meios de produção, possibilitando melhores condições de trabalho. Ao mesmo tempo, a renda é distribuída de forma mais igualitária em relação à distribuição no interior das empresas capitalistas, pois é feita embasada no direito dos cooperados.

COOPERVITA

Preciso ser solidário, ver um local. Preciso de recursos humanos e também de material. Recorro ao apoio da Cáritas Arquidiocesana, e sei que com amor faremos um trabalho de generosidade e transformação social. Orcinda Formighieri

O ser mulher e o participar da economia solidária, faz parte de mim e da minha vida. Ser semente e germinar, dar bons frutos, participar. Querer e poder transformar. A cada dia tentar o melhor, tendo o tempo como espera.

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Marizete Garbin


Considerações Finais Comemoramos neste ano de 2013, 30 anos de trabalho com as mulheres. Nesta caminhada, tivemos dificuldades, desafios, alegrias e sonhos. Certamente, muitos se tornaram realidade, enquanto tantos outros, ainda permanecem nos impulsionando, fazendo com que não possamos parar. O trabalho desenvolvido só foi possível graças a união e força de todos e todas, tendo presente a missão de cada um e da Cáritas. Assim, queremos agradecer às pessoas que articularam e contribuíram na organização e no acompanhamento dos grupos de mulheres. Com muito empenho e dedicação, elas buscaram desenvolver diversas atividades que propiciaram a reflexão de muitas temáticas pertinentes ao dia a dia das mulheres. Mais que isso, possibilitaram a participação nas lutas em defesa dos direitos da mulher, sua valorização, resgate de sua identidade, autoestima e na busca de complementação e geração da renda familiar. Convidamos todas e todos a se animar e continuar esta história, para que, motivados pela fé, partilha e solidariedade, acreditemos que um dia ainda possamos ver muitas flores brotar do chão impossível.

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Referências Bibliográficas: BÍBLIA. Português. Bíblia Pastoral. São Paulo: Paulus, 1990. COMISSÃO DIOCESANA DE MULHERES. Nossa Vida, Nosso Corpo, Nossa Saúde, Nossa Sexualidade. Cartilha. Passo Fundo, 1995. GABRIEL, Alice. Feminismo no Brasil. São Paulo: Vozes. 2004. GRUPO DE PESQUISA TEOLOGIA E GÊNERO. Teologia na perspectiva de gênero: resgate histórico e prospectivas. In: FAVRETO, Clair; BALBINOT, Rodinei (orgs). Itepa: História e prospectivas. Passo Fundo: Palotti, 2005. MAB. O modelo energético e a violação dos direitos humanos na vida das mulheres atingidas por barragens. Cartilha. São Paulo, 2011. MURARO, Rose Marie; BOFF, Leonardo. Feminino e Masculino: uma nova consciência para o encontro das diferenças. 4ª ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2002.

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Mulher Cáritas Uma imagem de amor voltada à sociedade Símbolo de partilha, amor e caridade, És tu mulher Cáritas muito mais que personagem És tu mulher Cáritas o trabalho, a força e a coragem. Com olhos no horizonte, passos firmes e a mente em oração Não desiste e não teme, leva esperança, força e fé A cada grupo, a cada família e a cada coração. Acredite mulher Cáritas, não há o que temer Tu já conheces a realidade - a alegria e o sofrer Deus conhece tua luta, teu amor e teu poder Nós conhecemos tua história e exaltamos teu vencer. Uma história de luta, persistência e cidadania Uma história de carinho, mãos dadas e amizade A mulher Cáritas é exemplo de compaixão e alegria É modelo de vida e solidariedade. Ora-se para que tu mulher, dona do gerar Siga tua missão sempre com um sorriso no rosto Inspirando confiança em cada ser e em cada olhar Levando paz e partilha onde há rancor, mágoa e desgosto. Aplaudimos agora em pé Teus esforços, tuas conquistas e o teu construir. Admiramos de alma contente cada passo e cada vitória E levamos como exemplo tua comunidade, tua vida e tua história. Cintia Gris

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