Elemental Assassin 01 - Spider’s Bite
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’ Elemental Assassin 01 Jennifer Estep
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Sinopse Meu nome é Gin. E eu mato pessoas. Eles me chamam de Aranha. Eu sou a assassina mais temida no Sul – quando não estou ocupada no Pork Pit cozinhando o melhor churrasco de Ashland. Sendo uma Elemental de Pedra, eu posso ouvir tudo, desde os sussurros do cascalho sob os meus pés até as vibrações das íngremes Montanhas Apalache acima de mim. A minha magia do Gelo também vem a calhar para fazer uma faca ocasional. Mas eu não uso os meus poderes no trabalho a não ser, que seja absolutamente necessário. Chame de orgulho profissional. Agora que um implacável Elemental do Ar me traiu e matou o meu treinador 1, eu estou procurando vingança. E eu vou exterminar qualquer um que ficar no meu caminho – bom ou mau. Eu posso parecer quente, mas ainda sou um dos caras maus; essa é a razão de eu estar em apuros, desde que o irresistivelmente difícil detetive Donovan Caine concordou em me ajudar. A última coisa que esta fria assassina precisa quando está lutando contra uma magia mais poderosa do que a sua é uma distração sexy... Especialmente quando Donovan me quer morta tanto quanto o inimigo.
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Do original handler, ela aqui refere-se àquele que lhe ensinou a ser uma assassina.
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Dedicatória Como sempre, para a minha mãe, por todas aquelas visitas à biblioteca. Para a minha avó, que odeia usar meias. Para o André, também conhecido como Wheezley Blighter, porque eu disse que iria. E, para mim, porque eu sempre quis escrever um livro de assassinos.
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Agradecimentos Qualquer autor vai lhe dizer que o seu livro não seria possível sem ajuda e o trabalho árduo de muitas, muitas pessoas. Aqui estão algumas das pessoas que me ajudaram a trazer Gin Blanco e a cidade de Ashland para a vida: Obrigado à Kelly Wimmer, por me encorajar a escrever o livro e à Annelise Robey, por acreditar em mim e por ser tão entusiasta acerca da série. Obrigado à Lauren McKenna, por todos os seus conselhos editoriais nas primeiras etapas e à Megan McKeever, pelo seu afiado olho editorial e respostas prontas a todas as minhas muitas perguntas. Todos vocês ajudaram a fazer o livro o melhor que ele pode ser e foi um prazer trabalhar convosco. E, finalmente, obrigada a todos os leitores aí fora. Entreter vocês é a razão de eu escrever livros e é sempre uma honra e um privilégio. Boa Leitura!
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Prólogo — Você está vindo comigo — ele disse. Com a mão livre, Caine procurou dentro do bolso da jaqueta e tirou um par de algemas de Silverstone2. Ele as jogou no espaço entre nós. O metal fez um tinido quando parou aos meus pés. — Coloca essas. — Algemas. Excêntrico. Mas eu prefiro ter um pouco mais de liberdade durante o sexo. Você não? Caine sacudiu-se como se eu lhe tivesse arrancado a arma das mãos e atirado nele. Os olhos dele desceram pelo meu corpo, indo para os meus seios e coxas, antes de voltarem para o meu rosto. Sim, ele estava pensando sobre isso. Toda a distração que eu precisava. — Não há necessidade de se preocupar com essas porque não está me levando, detetive. — Aonde vai? — Caine perguntou. — Está presa aqui. Eu sorri. — Eu? Presa? Nunca. Eu me virei, saltei para o muro da varanda e me lancei para o lado na escuridão abaixo.
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Metal.
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Capítulo 01 — O meu nome é Gin e eu mato pessoas. Normalmente, minha confissão teria gerado ofegos de surpresa. Rostos pálidos. Suor, nervosismo. Gritos sufocados. Uma ou duas cadeiras derrubadas enquanto as pessoas tentavam fugir antes que eu lhes enterrasse uma faca no coração – ou nas costas. Uma ferida mortal era uma ferida mortal. E eu não era exigente sobre onde a fazia. — Oi, Gin — quatro pessoas me responderam em um coro perfeito, maçante e momentaneamente em uníssono. Mas não neste lugar. Dentro das paredes do Asilo de Ashland, a minha confissão – por muito verdadeira que possa ser – nem sequer mereceu uma sobrancelha levantada, muito menos choque ou pavor. Eu era relativamente normal comparada com as aberrações da natureza e magia que povoavam os pisos. Como Jackson – o gigante albino de dois metros e vinte – sentado à minha esquerda que baba mais do que um mastim3 e que gorgoleja mais do que uma criança de três meses de idade. Um longo fio de clara e brilhante saliva escorria de um dos seus lábios demasiado grandes, mas Jackson estava muito ocupado murmurando absurdos à margarida imperfeita tatuada na parte de trás da sua mão para prestar atenção. Ou para fazer algo sensato e higiênico, como limpar a boca. Eu afastei-me mais dele para não entrar em contato com o muco escorrendo. Nojento. Mas o Jackson era típico, no tipo de pessoas do asilo. Asilo. A palavra sempre me fez sorrir. Uma palavra tão bonita para o buraco do inferno. Era ruim o bastante eu ter estado presa aqui quase uma semana. Mas o que realmente me enlouquecia era o barulho – e ter que ouvir o edifício em torno de mim. Os gritos dos condenados e enlouquecidos já tinham há muito tempo mergulhado nas paredes e pisos de granito do asilo, como todas as emoções e ações fazem com o passar do tempo. Sendo uma Elemental de Pedra, eu podia sentir as vibrações na rocha e ouvir o constante e insano ruído apesar do tapete industrial e das minhas meias brancas de algodão. 3
Raça de cão.
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Quando eu cheguei aqui, eu tentei chegar à pedra, usar minha própria magia para trazer à pedra um pouco de conforto. Ou pelo menos acalmar os gritos para que eu pudesse dormir um pouco durante a noite. Mas foi inútil. As pedras já estavam perdidas há tempo demais para ouvir ou responder à minha magia. Assim como as pobres almas que se arrastavam em cima delas. Agora, eu apenas bloqueava o maldito barulho – do mesmo jeito que fiz a tantas outras coisas. Uma mulher na frente do círculo de cadeiras plásticas se inclinou para frente. Ela estava diretamente na minha frente, por isso era fácil os olhos claros dela encontrarem os meus. — Agora, Gin, já fez essa afirmação antes. Nós já discutimos isso. Você apenas pensa que é uma assassina. Você certamente não é. Evelyn Edwards. A psiquiatra que era suposto curar todos os malucos nesta mágica casa de doidos. Ela irradiava frieza profissional e confiança no seu terninho preto apertado, blusa de marfim e os seus estiletes baixos. Óculos pretos quadrados penduravam no fim do seu nariz pontiagudo, destacando os seus olhos esverdeados e o seu cabelo cor de areia era curto e um pouco despenteado. Evelyn era bonita o suficiente, mas um olhar faminto arruinava a sua expressão serena – um olhar que eu reconheci. O olhar duro de um predador astuto. A razão para eu estar aqui hoje. — Eu certamente não sou um mero assassino — eu retruquei. — Eu sou a Aranha. Com certeza, já ouviu falar de mim. Evelyn revirou os olhos e olhou para o alto funcionário em pé apenas um pouco além do anel de cadeiras. Ele riu, depois levantou um dedo para a têmpora e fez um círculo. — Claro que eu ouvi acerca da Aranha — Evelyn disse, tentando ser paciente. — Todo mundo ouviu falar da Aranha. Mas você certamente não é ele. — Ela — eu corrigi. O funcionário riu outra vez. Eu levantei uma sobrancelha em desagrado. A piada estava nele porque essa risada tinha acabado de lhe custar à vida. Eu não me importava de ser zombada, mesmo tendo passado os últimos dias fingindo ser um débil mental. Para matar pessoas, você tinha que se aproximar delas. Entrar no mundo delas. Fazer da vida delas a sua. Os hábitos delas os seus hábitos. Os pensamentos delas os seus pensamentos.
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Para este trabalho, entrar no mundo de Evelyn Edwards tinha significado ser jogada no Asilo de Ashland. Para Evelyn e os seus funcionários subordinados, eu era apenas mais um esquizo4 tirado das ruas, levado à loucura pela magia elementar, drogas, ou a combinação dos dois. Outra pobre e perdida pessoa do estado que não valia a pena o seu tempo, atenção, consideração, ou simpatia. Eu passei os últimos dias trancados no asilo convencendo Evelyn e os outros que eu era só uma aberração tão maluca como o resto dos psicopatas balbuciados. Dizendo absurdos acerca de ser uma assassina. Babando. Pintando com os dedos, utilizando as ervilhas mofadas servidas na cantina para o almoço. Eu até cortei um bocado do meu longo cabelo pintado de loiro durante a hora dos trabalhos manuais para manter a farsa. Os enfermeiros de plantão afastaram as tesouras de mim, mas não antes que eu as usasse para tirar um parafuso solto da mesa da sala de recreação5. O mesmo parafuso que eu tinha afiado com uma ponta tipo dardo de duas polegadas de comprimento. O mesmo parafuso que eu tinha escondido na minha mão. O mesmo parafuso que eu ia enfiar na garganta de Evelyn. A arma repousava na minha palma e o ferro sentia-se duro contra a minha pele cicatrizada. Duro. Substancial. Frio. Reconfortante. Claro, eu não precisava realmente de uma arma para matar a psiquiatra. Eu poderia ter acabado com a Evelyn usando a minha magia de Pedra. Podia ter procurado o poder elementar que corria em minhas veias. Podia ter aproveitado os acres de granito que constituíam o asilo e feito todo o edifício desabar sobre a cabeça dela. Usar a minha magia de Pedra era mais fácil do que respirar. Chame de orgulho profissional, mas eu não uso o meu poder elementar para matar a não ser que eu absolutamente tenha que fazer, a não ser que não haja outra forma de ter o trabalho feito. Simplesmente muito fácil da outra forma. Mas ainda o mais importante, magia te faz ser notada nestas partes. Especialmente magia elementar. Se eu começasse a desmoronar prédios em pessoas ou a matá-los com tijolos, a polícia e outros indivíduos mais repugnantes iriam sem dúvida tomar nota – e um interesse doentio por mim. Eu tinha feito mais do que a minha cota de inimigos ao longo dos anos e, a única razão de que eu ainda estivesse viva todo este tempo, foi por manter-me nas sombras. Por rastejar dentro e fora de lugares completamente despercebida, exatamente como o meu xará 6 indica. Além disso, havia muitas maneiras de fazer alguém parar de respirar. Eu não precisava de magia para me ajudar nisso. — A Aranha — os lábios escarlates de Evelyn se contraíram e ela se permitiu uma pequena risada. — Como se alguém como você pudesse ser alguém assim. O mais temido assassino do Sul. 4
Pessoa que sofre de esquizofrenia. Do original rec room que é uma sala para eles relaxarem, se divertirem um pouco, talvez fazer os tais trabalhos manuais e outras atividades... 6 Neste caso A Aranha (the Spider) que é o seu apelido de assassina. 5
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— Leste do Mississipi — eu a corrigi outra vez. — E eu certamente sou a Aranha. Na verdade, eu vou te matar Evelyn. Dentro de três minutos e contando. Talvez fosse a maneira calma em que eu olhava para ela – meus olhos cinza firmes e nivelados. Ou talvez fosse a completa falta de emoção no meu tom. Mas a risada ficou apanhada e morreu na garganta de Evelyn como um animal encurralado numa armadilha. Ela não estaria muito longe disso. Eu me levantei e estiquei os braços sobre a minha cabeça, movendo o parafuso para uma melhor posição na minha mão. A T-shirt branca de manga comprida que eu usava subiu acima da minha calça de pijama, expondo o meu estômago liso. O alto funcionário do asilo lambeu os lábios, os olhos trancados na minha virilha. Homem morto caminhando. — Mas já falamos o suficiente sobre mim — eu disse, sentando na cadeira mais uma vez. — Vamos falar sobre você, Evelyn. Ela abanou a cabeça. — Agora, Gin, você sabe que isso é contra as regras. Os terapeutas não estão autorizados a falar com os pacientes sobre si mesmos. — Por que não? Você tem me feito perguntas por dias. Tentando fazer com que eu me abra sobre o meu passado. Para falar sobre os meus sentimentos. Para chegar à conclusão que eu sou fria e emocionalmente indisponível. Hora de virar, você sabe. Além disso, você falou muito com Ricky Jordan. Seus olhos se arregalaram por trás dos óculos. — Onde — onde ouviu esse nome? Eu ignorei a questão. — Ricky Robert Jordan. Dezessete anos. Um Elemental do Ar com um grave distúrbio bipolar. Um doce, mas confuso miúdo, por todos os relatos. Você realmente não deveria ter se envolvido com ele, Evelyn. A mão da psiquiatra apertou em torno da sua longa caneta de ouro até que os nós dos dedos estalaram com a pressão. O funcionário franziu a cara e os olhos dele deslizaram para frente e para trás entre nós, como se eu e Evelyn estivéssemos jogando uma partida de tênis verbal. Jackson e os outros três pacientes sentados à minha volta continuaram a babar, balbuciar e murmurar coisas sem sentido, fechados dentro dos seus próprios mundos distorcidos.
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— Correção — eu continuei. — Você não o deveria ter usado como seu menino brinquedo. Pisco. Entraste em pânico quando ele percebeu que não estava realmente deixando o seu marido por ele? Ele ameaçou contar aos pais como o seduziu do mesmo jeito que faz a todos os homens jovens bonitos deixados a seus cuidados? É por isso que o encheu de alucinógenos e o mandou para casa, para a sua família? A respiração da Evelyn saiu da sua boca em arfadas curtas. O pulso em sua garganta pulsava como asas de um beija-flor delicado. Eu inclinei-me para frente, capturando o seu olhar apavorado. — Mamãe e papai Jordan não apreciaram quando o Ricky teve um surto psicótico e se enforcou em seu próprio armário, Evelyn. Mas antes de morrer, ele lhes escreveu uma carta, lhes dizendo como ele apenas não conseguia continuar sem você. Normalmente, eu não teria me incomodado com toda a exposição do assassinato. Tão clichê. Eu teria me infiltrado no asilo, matado Evelyn e teria fugido antes que alguém soubesse que ela estava morta. Mas deixar Evelyn Edwards saber exatamente porque estava morrendo tinha sido uma exigência do trabalho. E estava me dando mais meio milhão de dólares. — É por isso que eu estou aqui, Evelyn. É por isso que vai morrer. Você fudeu com o rapaz errado. — Guarda! — Evelyn gritou. A última palavra que ela alguma vez disse. Movi o meu pulso e a afiada ponta do parafuso voou sibilando pela sala e afundou na sua garganta, perfurando a traqueia. Ás7. O grito da Evelyn se transformou em um chiado assobiado. Ela caiu da cadeira de plástico e atingiu o chão. A mão dela apertou-se em torno do parafuso e ela o puxou. Sangue respingou no tapete, parecendo um padrão abstrato de Rorschach 8. Estúpido da parte dela. Ela podia ter vivido outro minuto se o tivesse deixado na garganta. O funcionário amaldiçoou e correu para frente, mas eu era mais rápida. Peguei a caneta de ouro da psiquiatra do chão onde tinha caído, levantei-me e a enfiei no seu coração. — E você — eu murmurei no ouvido dele enquanto ele se estremecia e caía contra mim. — Eu não estou sendo paga por você. Mas considerando como ficou excitado estuprando pacientes do sexo feminino, vou te considerar um serviço público. Pro-fodidoBonos9. 7
No sentido de ter acertado no centro do alvo. O teste de Rorschach é um teste psicológico projetivo desenvolvido pelo psiquiatra suíço Hermann Rorschach. O teste consiste em dar possíveis interpretações a dez pranchas com manchas de tinta simétricas. 9 O trabalho pro bono é uma forma de trabalho voluntário que, diferentemente do voluntarismo, implica que a atividade seja exercida com caráter e competências profissionais, não sendo, no entanto, remunerada 8
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Eu arranquei a caneta do seu peito e o esfaqueei mais duas vezes. Uma vez no estômago e uma vez nas bolas. A luz cintilante e lasciva nos olhos do enfermeiro esmoreceu e morreu. Eu o larguei e ele bateu no chão. Em menos de trinta segundos, estava acabado. Vencido10. Muito fácil. Eu nem estava sem fôlego. Meus olhos cinzentos voltaram às quatro pessoas na sala. O Jackson ainda babava para o nada. Os outros dois homens olhavam para o chão como se algo estivesse errado, mas eles não tinham certeza do que era. A quarta pessoa, uma mulher, já tinha se abaixado, as mãos nos joelhos. Ela mergulhou os dedos no sangue que ia escurecendo de Evelyn, depois lambeu como se fosse o mel mais doce. Vampiros. Eles realmente comeriam qualquer coisa. Os murmúrios insanos do piso de granito se intensificaram, alimentados pela nova camada de sangue infiltrando-se pelo tecido solto do tapete e indo escorrer para a pedra. A forte discórdia me fez apertar os dentes. Eu ficaria feliz em deixar este lugar e este ruído para trás. Muito, muito para trás. Eu arranquei a caneta da virilha do funcionário e peguei o meu parafuso. Testemunhas eram ruins, especialmente na minha linha de trabalho e eu considerei matar Jackson e os outros. Mas eu não estava aqui por eles. E eu não assassinava inocente, nem mesmo essas almas patéticas que estariam melhores mortas e livres das suas mortais cascas rachadas. Então eu guardei as minhas armas ainda sangrentas no bolso e fui em direção à porta. Antes de sair para o corredor, eu olhei por cima do ombro para o corpo sem vida de Evelyn Edwards. Seu rosto e olhos estavam abertos em um olhar de chocada surpresa. Uma expressão que eu tinha visto mais de uma vez ao longo dos anos. Não importa o quão ruim as pessoas foram, não importa que mal elas cometessem, ou quem elas foderam, ninguém nunca acreditava que a morte estava indo até eles, cortesia de um assassino como eu. Até que era muito tarde.
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Do original “Game, set, match” que é uma expressão do ténis quando é declarado um vencedor e que passou a ser usada também em outras situações com o sentido de algo concluído com sucesso.
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Capítulo 02 Agora vem a parte mais difícil – sair do asilo. Porque enquanto tudo que precisei para ser jogada aqui foi um falso episódio psicótico e algumas mãos sujas, muitos obstáculos ficam entre mim e o mundo do lado de fora, ou seja, duas dúzias de atendentes, um par de guardas de segurança, uma variedade de cadeados e muros de doze metros de altura cobertos com arame farpado. Eu rastejei até o final do corredor e espiei a próxima passagem. Deserta. Já passava das sete, e a maioria dos pacientes já tinha sido colocada de volta em suas celas acolchoadas para gritar noite a fora. Com um pouco de sorte, Evelyn e o atendente não seriam descobertos até de manhã. Mas eu estarei bem longe até lá. Nunca conte com a sorte para passar por nada. Uma lição que eu aprendi de maneira difícil há muito tempo. Usando a rota que eu tinha memorizado e mantendo em mente o tempo da ronda dos atendentes, foi suficientemente fácil fazer o meu caminho através dos corredores sombrios para a ala direita do asilo. Graças a um pedaço de fita adesiva que eu tinha colocado sobre a fechadura, a porta de um dos armários de suplementos já estava aberta. Eu escorreguei para dentro. Suprimentos industriais estavam amontoados na área escura. Esfregões. Vassouras. Papel higiênico. Solventes de limpeza. Eu andei até o canto de trás, onde os construtores tinham sido muito mesquinhos para cobrir a parede de granito com tinta e pressionei minha mão na pedra bruta. Ouvindo. Como uma Elemental de Pedra, eu tenho o poder, a magia, a habilidade de ouvir o elemento onde quer que esteja não importa a forma que ele tenha. Seja o cascalho embaixo dos meus pés, uma montanha com afloramento rochoso sobre minha cabeça, ou só uma simples parede, como a que eu tinha minha mão agora, eu podia ouvir as vibrações das pedras. Desde que as ações e emoções das pessoas ficam gravadas no que as rodeia, especialmente pedra, com o tempo virar essas vibrações podia me dizer um número de coisas, do temperamento da pessoa vivendo na casa até saber se um assassinato tinha ocorrido no local.
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Mas a pedra debaixo da minha mão só balbuciava sua usual insanidade. Não existiam notas afiadas de alarme. Sem conflituosas vibrações de atividade apressada. Sem distúrbios súbitos rompendo através da rocha. Os corpos ainda não tinham sido descobertos, e meus amigos loucos estavam provavelmente ainda babando uns nos outros. Excelente. Eu subi numa prateleira de metal contra a parede, afastei um forro solto no teto, e peguei o pacote enrolado em plástico de roupas que eu tinha escondido ali. Eu tirei as respingadas de sangue, pijama branco e coloquei as novas roupas. Uma das primeiras coisas que eu tinha feito quando cheguei aqui tinha sido invadir a sala de reposição dos pacientes e liberado as roupas que eu estava usando quando os policiais me trouxeram aqui. Em adição aos meus jeans azuis, camiseta azul escuro de mangas compridas, botas, e jaqueta de lã azul escura com capuz. Eu também tinha um par de canivetes comigo, juntamente com um relógio de prata que tinha um carretel garrote longo enrolado na parte traseira. Pequenas frágeis armas, mas eu tinha aprendido há muito tempo a fazer funcionar com o que eu tinha. Além do repositório, eu também tinha prestado uma visita à sala de registros, pego meus arquivos de mulher desconhecida e destruído, assim como apagado qualquer menção de minha estada aqui dos computadores. Agora, não existia nenhum traço de que eu tenha um dia estado no asilo. Além do corpo esfriando de Evelyn Edwards, é claro. Coloquei o relógio em volta do meu pulso. Um feixe de luz da lua passando pela janela atingiu a minha mão, acendendo uma cicatriz embutida profundamente em minha palma. A runa da aranha – o símbolo para paciência. Eu desdobrei minhas mãos e olhei para as linhas. Na frágil idade de treze anos, eu tinha sido espancada, vendada e torturada – forçada a segurar um pedaço de Silverstone, um medalhão no formato da runa aranha. Minhas mãos foram fixadas com fita adesiva em volta da runa, que tinha então sido aquecida por uma Elemental de Fogo. O metal mágico tinha derretido e queimado para dentro de minhas palmas, por isso as cicatrizes. Naquela época, dezessete anos atrás, as marcas tinham sido recentes, feias encarnadas – como meus gritos e a risada da vadia que me torturou. As cicatrizes tinham desbotado com o tempo. Agora, elas eram só linhas prateadas atravessando os redemoinhos de minha pele pálida. Eu queria que minhas memórias daquela noite estivessem igualmente entorpecidas. O luar destacou o metal ainda na minha carne e fez as marcas mais visíveis do que eram durante o dia. Ou talvez isso tenha sido porque eu faço à maior parte do meu trabalho a noite, quando as coisas escuras, às escuras emoções, saem para brincar. Algumas vezes eu quase esqueço que as runas estão lá até momentos como esse, quando elas se mostram... E me lembram da noite que minha família foi assassinada.
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Eu ignorei o doloroso puxão de memórias e continuei com o meu trabalho. O trabalho estava só metade feito e eu não tinha nenhuma intenção de ser pega porque eu fiquei com olhos nublados e piegas com coisas que são melhores esquecidas. Emoções eram para aqueles muito fracos para desligá-las. E eu não tenho sido fraca há muito tempo. Enfiei o pijama sangrento e o plástico vazio na parte inferior de um dos baldes que os zeladores usam para enxugar o chão. Então peguei uma lata de alvejante de uma das prateleiras de metal, abri e despejei o líquido dentro do balde. Usando a manga da minha jaqueta para segurar uma das pontas do espanador, eu dei a coisa toda uma boa mexida. Não teria nenhum DNA para ser achado naquelas roupas. Assumindo que a polícia se quer se incomode de checar por algum. Assassinatos, especialmente esfaqueamentos, não eram exatamente incomuns em asilos, o que é exatamente o porquê de eu ter decidido pegar a psiquiatra aqui em vez de na casa dela. Quando isso estava feito, enfiei a mão no bolso da jaqueta e puxei um par de óculos com armação de prata oval. As lentes azuladas foram na minha face, obscurecendo meus olhos cinza. O outro bolso continha um boné de baseball, para esconder meu cabelo tingido de loiro e lançar sombras no meu rosto. Ferramentas simples realmente fazem um melhor trabalho, principalmente quando o assunto é mudar sua aparência. Um pouco de vidro aqui, algumas roupas largas lá e a maioria das pessoas não poderia dizer qual cor sua pele era, muito menos o que você realmente parecia. Meu disfarce completo, eu peguei um dos meus canivetes, abri a porta e sai no corredor. Usando minhas roupas normais e um grande amigável sorriso do sul, eu saio. Ninguém me deu uma segunda olhada, nem mesmo os assim chamados guardas de segurança que eram pagos por sua estelar vigilância e excepcional atenção aos detalhes. Cinco minutos depois, eu rabisquei um falso nome na lista de saída dos visitantes na recepção. Outro atendente, mulher desta vez, fez uma careta para mim através da divisória de vidro. — O horário de visitas terminou trinta minutos atrás — ela disparou, com o rosto contorcido em desaprovação. Eu tinha interrompido seu encontro noturno com seu livro de romance e barra de chocolate. — Oh, eu sei, meu doce — eu ecoei em minha melhor voz de Scarlett O’Hara. — Mas eu tinha uma entrega a fazer para um dos amigos da cozinha e Big Bertha me disse para levar o meu doce tempo — mentira é claro. Mas eu coloquei um preocupado olhar no rosto para manter a atuação. — Eu espero que estejam tudo certo com vocês todos? Big Bertha disse que estava bem. A enfermeira empalideceu. Big Bertha era a mulher que comandava a cozinha – e praticamente todo o resto do asilo – com punho de ferro. Ninguém queria mexer com a Big
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Bertha e arriscar ficar íntimo com a frigideira de ferro fundido que ela sempre carrega. Especialmente não por doze pratas por hora. — Que seja — a atendente rebateu. — Só não deixe acontecer de novo. Não aconteceria de novo porque eu não tinha nenhuma intenção de voltar para esse lugar horrendo, nunca. Eu aumentei a voltagem no meu sorriso falso. — Não se preocupe meu doce, com certeza não vou. A enfermeira abriu a porta e eu saí. Após o mau cheiro insuportável de baba, urina e água sanitária do asilo, o ar da noite cheirava limpo, batata frita e folhas frescas de árvores. Se eu não tivesse acabado de matar duas pessoas, eu talvez tivesse enrolado, aproveitando o som dos sapos coaxando nas árvores e a suave resposta no pio das corujas à distância. Em vez disso, eu andei em direção ao portão da frente com seguros e objetivos passos. O metal se afastou com a minha aproximação e eu dei ao guarda em sua cabine a prova de balas um alegre aceno. Ele balançou a cabeça sonolenta e voltou para sua seção de esportes do jornal. Eu pisei de volta no mundo real. Meu pé sobre o cascalho triturado espalhados fora do portão e a pedra sussurrando nos meus ouvidos. Baixo e estável como os carros que passam por ali dia sim e dia não. Um som de longe mais feliz do que o constante, insano grito do granito do asilo. Um longo estacionamento flanqueado por uma série de densos pinheiros me cumprimentou. O extremo do pavimento liso levava para uma estrada de quatro pistas. Nenhum farol podia ser visto vindo ou indo a nenhuma direção. Nenhuma surpresa. O Asilo de Ashland era situado na borda de Ashland, a metrópole sulina que beirava o Tennessee, Carolina do Norte e Virgínia. A cidade metropolitana não era tão grande quanto Atlanta, mas chegava perto e era uma das joias do Sul. Ashland se espalha nas Montanhas Apalaches como um cão espalhado em um frio chão de cimento no verão. As florestas ao redor, colinas e rios preguiçosos dão à cidade a ilusão de ser um pacífico e tranquilo lugar intocado. Uma sirene estourou, cortando através da noite, sobrepondo todo o resto. Ilusão quebrada mais uma vez. — Tranquem tudo! Tranquem tudo! — alguém gritou pelo interfone. Então, os corpos tinham sido descobertos. Eu aumentei o meu passo, passei vários carros e chequei meu relógio. Vinte minutos. Mais rápido do que eu esperava. A sorte não tinha sorrido para mim esta noite. Vadia caprichosa.
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— Hey, você aí! Pare! Ah, o habitual grito de desânimo depois da raposa já ter entrado no galinheiro. Ou nesse caso, matado o cão raivoso que se escondia no interior. O portão ainda não tinha sido fechado e eu ouvi um barulho quando parou. Passos soava no cascalho atrás de mim. Eu talvez ficasse preocupada, se eu já não tivesse me misturado na floresta em volta. Embora eu tivesse gostado de ir direto para casa e lavar para fora o fedor de insanidade do meu cabelo, eu tinha um jantar para atender. E Fletcher odiava ficar esperando, principalmente quando tinha dinheiro para coletar e transferências bancárias para verificar. Eu corri cerca de um quilômetro e meio, me mantendo dentro da linha de pinheiros que beiravam a rodovia, antes de pisar na estrada principal. A meia milha mais abaixo, eu alcancei um pequeno café chamado Fim da Linha, o tipo sombrio de lugar que permanece aberto à noite toda e serve pizza de três dias atrás e café. Depois de ervilhas mofadas e purê de cenoura no asilo, o velho bolo de morango tinha o gosto do paraíso. Eu engoli um pedaço enquanto eu esperava um táxi vir me pegar. O motorista me deixou em um dos bairros mais sórdidos do centro de Ashland, a dez quadras do meu real destino. Fachadas anunciando bebidas baratas alinhavam-se na calçada. Grupos de jovens negros, brancos e homens hispânicos vestindo roupas largas encaravam uns aos outros de lados opostos, formando um triângulo de problema em potencial. Um Elemental de Ar implorava na esquina e fazia promessas de fazer chover por quem quer que desse a ele dinheiro suficiente para comprar uma garrafa de uísque. Outro triste exemplo de que Elementais não são imunes a problemas sociais como não ter casa, alcoolismo e vícios. Todos nós temos nossas franquezas e caímos em maus lugares na vida, mesmo os usuários de magia. Era o que eles faziam depois que determinava se eles terminariam nas ruas como esse pobre bêbado ou não. Eu dei a ele uma nota de vinte e continuei andando. Prostitutas também ocupavam a rua como antigos soldados forçados em outro turno do dever por seus respectivos cafetões. A maioria das prostitutas eram vampiros e seus dentes amarelos brilhavam como pequenos pedaços de topázio de baixo da pouca iluminação. Sexo era quase tão estimulante para os vampiros quanto beber sangue. Deixava-os bem entorpecidos e deixava-os encherem seus corpos tanto quanto um bom gelado copo de A positivo, o que era o porquê tantos deles serem prostitutas. Além disso, é a profissão mais velha do mundo. Tirando os normais traumáticos ferimentos que arriscam a vida, vampiros podiam viver uns longos tempos – várias centenas de anos. É sempre bom ter uma habilidade que nunca vai sair de estilo. Alguns dos vampiros me chamaram, mas
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uma olhada na dura expressão dos meus lábios fez com que eles continuassem a procurar mais fáceis e mais prováveis prospectos. Eu andei duas quadras antes de jogar os óculos em uma lixeira próxima a um restaurante chinês. O contêiner de metal fedia a tempero velho e a comida de uma semana. O chapéu de baseball e a jaqueta ficaram em um carrinho de compras de uma mulher sem teto. Pela condição da jaqueta dela, ela podia usar. Se ela sair de seu coma induzido pela bebida tempo suficiente para notar que eles estavam ali. A vizinhança ficou um pouco melhor conforme eu caminhava, indo de usuários de drogas, membro de gangues, lixo branco até colarinho azul, pescoço vermelho e pobre trabalhador. Lojas de tatuagem substituindo as lojas de bebidas. As poucas prostitutas que andavam nessas ruas pareciam mais limpas e melhor alimentadas do que seus cansados, magros irmãos e irmãs ao sul. Mas eles eram humanos também. Com os pedaços do meu disfarce fora, eu diminui meu passo e caminhei o restante do caminho, aproveitando o gélido ar da noite. Eu não podia ter o suficiente disso, mesmo que estivesse misturado com tabaco. Vários bons e velhos amigos fumavam e brindavam suas cervejas em frente a suas portas, enquanto dentro, suas esposas se apressavam para preparar e servir o jantar a tempo. Trinta minutos depois eu cheguei ao meu destino: O Pork Pit. O Pit, como os habitantes locais chamavam, era nada mais do que um buraco na parede, mas tem o melhor churrasco em Ashland. Diabos, de todo o Sul. O desenho de um porco de neon colorido segurando um prato cheio de comida queimada sobre o toldo azul desbotado. Eu passei meus dedos sobre o tijolo agredido que delineava a porta da frente. A pedra vibrava com mudos e entupidos contentamentos, como os estômagos e artérias um pouco depois de comer aqui. A placa na janela da frente lia-se fechado, mas eu empurrei a porta e entrei. Cabines de vinil antiquadas, rosa e azul agachavam em frente às janelas. Um balcão com bancos correspondentes ficam ao longo da parede do fundo, onde os clientes podem sentar e assistir os cozinheiros no outro lado da divisória de vidro, fazendo pratos de churrasco de carne bovina e suína. Mesmo com a grelha fechada há pelo menos uma hora, o cheiro de carne queimada, fumaça e especiarias perduravam pesado no ar, uma nuvem de aroma quase espessa o suficiente para comer. Rastros de porco rosa e azul feita em uma pintura descascando cobria o chão, levando respectivamente ao banheiro das mulheres e dos homens. Meus olhos cinzentos se focaram na caixa registradora situada no lado direito do balcão. Um homem sozinho sentado próximo, lendo um antigo e rasgado exemplar de Onde a Samambaia Vermelha Cresce e bebendo uma xícara de café de chicória. Um homem velho, final dos setenta, com delgados e espessos cabelos brancos que cobriam seu mosqueado couro cabeludo marrom. Um avental com manchas de graxa
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pendurado no fino pescoço e arrastando abaixo de sua camisa azul e calças. O sino sobre a porta tocou quando eu entrei, mas o homem não olhou para cima de seu livro. — Você está atrasada, Gin — ele disse. — Desculpe. Eu estava ocupada falando sobre meus sentimentos e matando pessoas. — Era para você chegar aqui uma hora atrás. — Por que Fletcher? Quase soa como se você estivesse preocupado comigo. Fletcher deu uma olhada por cima de seu livro. Seus olhos remelentos se assemelhavam ao vidro verde fosco de uma garrafa de refrigerante. — Eu? Preocupado? Não seja boba. — Nunca. Fletcher Lane era meu intermediário. Aquele que faz as reuniões com potenciais clientes, pega o dinheiro e prepara meus trabalhos. O intermediário que suja as mãos – por uma taxa significativa. Ele tinha me tirado das ruas dezessete anos atrás e me ensinado tudo o que eu sei sobre ser uma assassina. O bom, o mau ou feio. Ele era também uma das poucas pessoas que eu confio – outra sendo seu filho Finnegan, que era tão ganancioso quanto o velho era e não tinha medo de mostrar. Fletcher colocou seu livro de lado. — Com fome? — Eu estive empurrando ervilhas em torno de uma placa de plástico durante uma semana. O que você acha? Eu me estabeleci no balcão enquanto Fletcher começou a trabalhar atrás dele. O velho colocou um copo de limonada cheio na minha frente. Eu provei e fiz uma careta. — Tá morno. — Todo o gelo está no freezer para a noite. Esfrie você mesmo. Em adição a ser uma Elemental de Pedra, eu também tinha o raro talento de ser capaz de controlar outro elemento – o Gelo, embora minha magia nessa área seja de longe mais fraca. Eu coloquei minha mão no copo e me concentrei, alcançando o frio poder que
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ficava no fundo dentro de mim. Cristais de gelo em forma de floco de neve saíram de minha palma e ponta dos dedos. Eles gelaram o lado do vidro, passou pela borda e caiu dentro do líquido abaixo. Eu segurei minha palma sobre o copo e puxei minha magia de novo. Uma gelada luz prateada tremeluzia, centrada na cicatriz da runa Aranha. Eu me concentrei e a luz se juntou em cubos de gelo quadrados. Eu joguei dentro do líquido amarelo, então fiz alguns mais e joguei-os também. Eu provei a limonada de novo. — Muito melhor. A próxima coisa que Fletcher colocou no balcão era um hambúrguer pingando maionese e entupido com queijo suíço defumado, alface, manteiga de erva doce, uma fatia de tomate e uma suculenta placa grossa de cebola vermelha. Uma tigela de feijão apimentado seguiu junto com um pires de salada de repolho e cenoura rendilhada. Eu cavei na comida, saboreando o jogo de doce especiarias, sal e vinagre na minha língua. Eu engoli uma colher de feijão quente e foquei no molho que os cobria, tentando isolar os muitos sabores. O Pork Pit era famoso por seu molho de churrasco, que Fletcher preparava em segredo na parte de trás do restaurante. As pessoas compravam galões disso de uma vez. Ao longo dos anos, eu tinha tentado descobrir a receita secreta do Fletcher. Mas não importava o que eu tentasse, não importava quantos lotes da coisa eu fazia, meu molho simplesmente nunca tinha o mesmo gosto do dele. Fletcher alegou que tinha um ingrediente secreto que dava ao seu molho o pontapé picante. Mas o duro velho homem não me dizia o que era ou quanto ele usava. — Você vai me dizer o que está no molho de churrasco um dia? — eu perguntei. — Não — ele disse. — Você vai desistir de tentar descobrir? — Não. — Então eu acho que estamos presos num impasse. — Eu podia consertar isso — eu murmurei. Um sorriso divertido brilhou no rosto do Fletcher. — Aí você nunca conseguiria a receita. Eu balancei a cabeça e me concentrei na minha comida. Enquanto eu comia, Fletcher pegou seu livro e leu algumas páginas a mais. Ele não me perguntou sobre o trabalho. Não precisava. Ele sabia que eu não teria voltado a não ser que estivesse feito. Eu sempre sentia
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falta da comida do Pit quando eu estava trabalhando. Sentia falta do cheiro de especiarias e gordura fazendo cócegas no meu nariz. Sentia falta do barulho estridente e alegre do raspar de pratos e talheres. Sentia falta de cozinhar e reclamar de clientes exigentes e péssimas gorjetas. Mas principalmente, eu sentia falta de relaxar na brisa da noite com Fletcher, quando a porta da frente estava trancada e tudo estava quieto, exceto por nós dois. O Pork Pit era mais do que só um restaurante para mim. Era meu lar – ou pelo menos o mais próximo a isso que eu tinha tido nos últimos dezessete anos. Provavelmente o único que eu teria novamente. A vida de um assassino não era exatamente propícia a filhos e cercas. — Como está o Finn? — eu perguntei depois que já tinha comido o suficiente para tirar o atraso. Fletcher deu de ombros. — Ele está bem. Fazendo seus negócios. Controlando o dinheiro de outras pessoas. Meu filho, o investidor bancário e o gênio da computação. Ele devia ter pegado um trabalho honesto, como roubar. Eu escondi meu sorriso atrás do meu copo de limonada. O brilho de civilidade de Finnegan Lane nunca falha em divertir seu pai, ou a mim. Eu tinha acabado de colocar o último pedaço do estupidamente bom hambúrguer em minha boca quando Fletcher pegou algo embaixo do balcão. Ele levantou com uma pasta de documentos e colocou ao lado do meu prato vazio. Suas mãos salpicadas de marrom descansaram na pasta um momento antes de deslizar para longe. — O que é isso? — eu perguntei. — Eu te disse que eu estava tirando uma folga depois da psiquiatra. — Você tem estado de folga por dias agora — Fletcher tomou um longo gole de seu café. — Passar seis dias trancada em um insano asilo não é a minha ideia de um bom momento. Fletcher não respondeu. A pasta descansava entre nós, uma silenciosa pergunta. Eu não podia deixar de me perguntar que segredos estavam ali. E quem tinha chateado alguém o bastante para acabar em minha linha de visão. Minhas especialidades não são baratas. Especialmente quando você adiciona a taxa de intermédio do Fletcher no topo disso.
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— Quem é o alvo? — eu perguntei, cedendo ao inevitável. Maldita curiosidade. Uma emoção que eu não conseguia esmagar, não importa quanto eu tente. Uma coisa que eu tinha pegado do velho homem ao longo dos anos. Ele era ainda mais curioso do que eu. Fletcher sorriu e abriu a pasta. — O nome do alvo é Gordon Giles. Ele empurrou a pasta para mim e eu folheei o conteúdo. Gordon Giles. Cinquenta e quatro anos. O diretor financeiro das indústrias Halo. Um contador glorificado que trabalha com papéis, em outras palavras. Divorciado. Sem filhos. Gosta de pescar. Gosta de visitar prostitutas pelo menos duas vezes por semana. Um Elemental do Ar. O último pedaço de informação era infeliz. Elementais eram pessoas que podiam manipular os quatro elementos – Gelo, Pedra, Ar, e Fogo. Algumas pessoas também têm talentos para usar ramificações desses, como água, metal, e eletricidade. Mas você não era considerado um verdadeiro Elemental a menos que pudesse usar um dos quatro grandes. Minha magia de Pedra era forte e me deixava fazer praticamente tudo que eu quisesse com o elemento, de esmigalhar tijolos e quebrar concreto até fazer minha própria pele tão dura quanto mármore. Eu não podia fazer tanto com minha magia de Gelo, além de criar cubos, pingentes, ocasionais facas e outras pequenas formas. Embora as esculturas de miniaturas de animais de Gelo tenham me feito popular nas festas. Desde que Gordon Giles era um Elemental do Ar, ele podia controlar as correntes, o sentido do vento, sentir vibrações no ar do mesmo jeito que eu podia na pedra. E ele podia manipular também, exatamente como eu. Dependendo de que tipo de talentos naturais ele tivesse e quão forte seu poder seja, Giles podia usar sua magia de ar para tentar me sufocar antes que eu o matasse. Forçar bolhas de oxigênio em minhas veias. Socar-me com o vento. Ou uma centena de outras coisas desagradáveis. Eu estudei a foto anexada no topo da informação. O cabelo sal e pimenta11 de Gordon Giles caía sobre a testa, apenas tocando o topo de seus óculos de ouro. Seus olhos pareciam poças de tinta em pó azul atrás das lentes. Sua face me lembrava a de um furão – longa e magra. Lábios pinçados. Queixo pontiagudo. Um triângulo afiado como nariz. Os olhos do Gordon tinham um olhar de nervosa antecipação. O olhar de um homem que sabia que os monstros andavam nas ruas e esperava que eles saíssem e o pegassem a qualquer momento. Homens paranoicos eram muito mais difíceis de matar do que os alheios. Eu teria que ser cuidadosa com ele.
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Quando o cabelo já começa a ter cabelos brancos, mas ainda não totalmente, daí fica com essas duas cores.
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— E o que Giles tem feito para merecer minha particular marca de atenção? — Parece que o diretor financeiro têm mexido nos livros das Indústrias Halo — Fletcher disse. — Alguém descobriu e quer consertar a situação. — Proteção? — eu perguntei. Fletcher deu de ombros. — Nenhuma que eu saiba, mais o rumor é que Giles está ficando nervoso e pensando em se entregar a polícia, como se eles fossem até se importar em mantê-lo seguro. Polícia. Eu bufei. Que piada. A maioria dos melhores de Ashland era mais tortuosa do que as estradas das montanhas que atravessa a cidade. Se você for aos policiais por proteção, você também pode se enforcar e salvar ao seu companheiro de sela o problema era rasgar seus perfeitos e bons lençóis. — Indústrias Halo — eu murmurei. — Essa não é uma das companhias da Mab Monroe? — Ela é a acionista majoritária — Fletcher disse. — Mas uma de suas subalternas, Haley James e sua irmã Aléxis, estão realmente à frente do negócio. A Indústria Halo foi fundada pelo pai delas, Lawrence. Ele e as irmãs mantiveram na família por anos, até Mab decidir que ela queria um pedaço da ação e caiu sobre eles. O pai morreu de um ataque cardíaco duas semanas depois que Mab assumiu. Pelo menos, isso foi à palavra oficial. — E extraoficialmente? — eu perguntei. Fletcher deu de ombros. — O rumor é que o pai estava criando muitos problemas. Não me surpreenderia se seu ataque cardíaco fosse mais um infeliz acidente causado por Mab em pessoa. — Um ataque cardíaco? Esse não é muito o estilo dela — eu disse. — Geralmente, ela só incinera as pessoas com sua magia, queima suas casas ao chão, esse tipo de coisa. — Verdade — Fletcher concordou. — O que significa que ela provavelmente passou o trabalho para um de seus garotos e pediu para fazer parecerem causas naturais. De qualquer jeito, Lawrence James acabou morto. Ashland pode ter uma força policial e um governo, mas a cidade era realmente comandada por uma mulher. Mab Monroe. Mab era uma Elemental do Fogo – forte, poderosa, mortal. Tudo isso era ruim o suficiente, mas ela não era só uma Elemental
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comum. Mab Monroe tinha mais magia, mais poder bruto, do que qualquer Elemental tem tido nos últimos quinhentos anos. Pelo menos, esse era o rumor que tomou a cidade. Devido ao fato de que qualquer um que vá contra ela acaba morto mais cedo ou mais tarde, eu tendia a acreditar nisso. Uma respeitável, frente de negócios com várias ramificações esconde o império estilo máfia de Mab. Intimidação, subornos, drogas, sequestros e assassinatos. Nada disso incomoda Mab. Ela revirava no sangue como porco na poça. Ela tinha seus espiões em toda a parte. Departamento de polícia. Câmara Municipal. Escritório do prefeito. Policiais, Promotores, Juízes e outras variedades. Caras legais não duram muito nessa cidade, a não ser que eles passem para o lado negro – e o bolso no quadril da Mab. Como toda boa mulher de negócios, Mab Monroe escondia sua verdadeira natureza por traz de um verniz de sofisticação cultural. Doando dinheiro para caridade. Liderando angariadores de fundos. Devolvendo a comunidade. Tudo isso designado para distanciar ela das coisas feias que ela ordenava ser feito em uma base diária. Mab mantinha seu olho na grande cena, o que é o porquê ela ter dois tenentes, por falta de uma palavra melhor, que comandam as operações do dia a dia. Seu advogado, Jonah McAllister e Elliot Slater. McAllister cuidava das pessoas que desafiavam Mab por meios legais. O habilidoso advogado enterrava as pobres pessoas em tanta papelada e fita vermelha que a maioria deles falia só tentando pagar seus próprios advogados. Slater afirma ser um consultor de segurança, mas o gigante não era nada mais do que um executor em um belo terno. Ele cuidava daqueles que trabalhavam para Mab e lidava com aqueles que cruzavam com a Elemental do Fogo em uma rápida, brutal e permanente forma – quando Mab não se dignava a fazer isso ela mesma. Para maioria das pessoas, Mab Monroe era o modelo ideal de virtude Elemental, um perfeito casamento de dinheiro e magia. Mas aqueles de nós que lidam na sombria parte da vida conhecia Mab pelo que ela realmente é – impiedosa. A Elemental do Fogo tinha uma pegada firme em Ashland, seus dedos em tudo que vale a pena, lucrativo ou útil operava na cidade, mas isso só não parecia ser suficiente para ela. Mab só continuava procurando e acumulando, mais e mais e mais, como se dinheiro, poder e influência fossem o vital oxigênio que ela precisava para encher a si mesma. Colocando simplesmente, ela era uma valentona, embora uma com mágica suficiente para suportar qualquer coisa que ela clame e conseguir tudo que ela quisesse. Eu nunca gostei de valentões. Mas a magia de Mab não impedia as pessoas de silenciosamente conspirar contra ela. Várias vezes por ano, Fletcher conseguia pedidos sobre me contratar para pegar Mab Monroe. Nós tínhamos feito um pouco de reconhecimento nela ao longo dos anos e
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tínhamos decidido que era muito próximo de ser uma missão suicida para se quer se incomodar com isso. Mesmo se eu conseguisse passar por suas hordas de seguranças e guarda-costas gigantes, Mab sempre podia me matar ela mesma. Ela não tinha medo de usar sua própria mágica Elemental. Era assim que ela tinha conseguido seu caminho ao topo em primeiro lugar – matando qualquer um que desafiasse sua meteórica ascensão pelo submundo de Ashland.
Mesmo assim, Fletcher mantinha um arquivo aberto da Elemental, monitorando sua segurança, seus movimentos, procurando por qualquer sinal de fraqueza. Por alguma razão, o velho queria Mab morta. Ele só não tinha achado um jeito de conseguir isso feito ainda. Pelo menos, não um que não envolva ele indo a um momento de glória com ela. — Você está me dizendo que Gordon Giles foi estúpido o suficiente para roubar dinheiro de uma das empresas da Mab Monroe? — eu perguntei. Fletcher deu de ombros. — Parece que sim. O cliente não deu mais nenhum detalhe e eu não perguntei. Se você passar para a página de trás, você vai ver que tem um limite de tempo para esse. Eu virei a página apropriada e li a informação. — Eles querem o serviço feito até amanhã à noite? Você quer que eu pegue um trabalho com menos de vinte e quatro horas de aviso? Você não é assim Fletcher. — Leia o pagamento. Meus olhos deslizaram mais abaixo no papel. Cinco milhões. Pergunta feita e respondida. Fletcher pode ter me amado como uma filha, mas ele também amava conseguir seus quinze por cento. Eu não era adversa ao meu corte, também. — Não é um mal trocado — eu admiti. — Nada mal? É duas vezes seu preço normal — uma mistura de orgulho e antecipação coloriu a voz rouca do Fletcher. — O cliente já fez o depósito de cinquenta por cento. Faz esse serviço e você pode se aposentar. Aposentadoria. Uma coisa que tem estado na mente do Fletcher desde que eu tinha voltado para casa com um braço quebrado e o baço machucado de um trabalho mal feito em
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St. Agustine seis meses atrás. O velho continuava falando sobre eu me aposentar em um tom sonhador, como se existisse um mundo de opções que iriam magicamente se abrir para mim no momento que eu pendurasse minhas facas. Em vez do tédio maçante da realidade. — Eu tenho trinta anos, Fletcher. Um altamente efetivo, bem pago, procurado profissional em minha área de experiência. Eu sou boa no meu trabalho, o sangue não me incomoda e as pessoas que eu mato fizeram por merecer. Por que eu iria querer me aposentar? Mais importante, o que eu iria fazer comigo mesma? Eu tinha um pacote de habilidades bem particular, um que não se encaixa em muitas opções. — Porque existe mais na vida do que só matar pessoas e contar dinheiro, não importa o quanto alguém possa aproveitar eles — seus olhos verdes se fixaram nos meus. — Porque você não devia ficar olhando por cima do seu ombro para o resto da sua vida. Você não quer viver na luz do dia um pouco, criança? — Viver na luz do dia — o slogan do Fletcher sobre viver uma vida normal. Dezessete anos atrás, eu tinha querido nada mais. Eu tinha rezado para o mundo se acertar, para o tempo voltar atrás então eu poderia voltar para segura, para a protegida existência que eu tive um dia. Mas eu tinha desistido desse conto de fadas há muito tempo. Nunca, além de melancolia e dor, viria a desejar algo que eu nunca poderia ter. Esse sonho dourado, essa suave esperança, a parte sentimental de mim estava morta, queimada e desfeita em cinzas – exatamente como a minha família tinha sido. Pessoas como eu não se aposentam. Elas apenas continuam até acabarem mortas – o que era usualmente mais cedo, do que mais tarde. Mas eu iria rolar os dados o maior tempo possível. Mesmo que fosse uma aposta de otário no final. Mas eu não queria brigar com o velho. Não essa noite. Goste ou não, ele era uma das poucas pessoas no mundo que eu amo. Então eu o distraí balançando a pasta no ar. — Você realmente acha que isso é uma boa ideia? Esse trabalho? — Por cinco milhões de dólares, eu acho. — Mas não tem tempo para preparação nesse trabalho — eu protestei. — Sem tempo para planejar, para checar pontos de fuga, nada. — Vamos lá Gin — Fletcher disse. — É um trabalho fácil. Você pode fazer uma coisa assim dormindo. O cliente até sugeriu um lugar para você fazer isso. Eu li um pouco mais.
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— O Teatro? — O Teatro — Fletcher repetiu. — Vai ter um grande evento amanhã a noite. Eles estão dedicando uma nova ala a Mab Monroe. — Mais uma? — eu perguntei. — Já não existem prédios suficientes nessa cidade com o nome dela? — Aparentemente não. O que eu quero dizer é que terá um monte de pessoas lá. Muita imprensa. Muitas oportunidades de se perder na multidão. Deveria ser fácil o suficiente para você entrar, pegar o Giles e sair. Você é a Aranha depois de tudo, largamente conhecida por sua habilidade e proeza. Eu fiz uma careta ao seu tom grandioso. Algumas vezes Fletcher me lembrava um mestre de cerimônias de um circo fazendo os tristes elefantes, receosos cavalos e atos que não valem nada parecerem mais grandiosos do que eles realmente eram. — A Aranha foi ideia sua não minha. Você foi o que pensou que poderia cobrar mais por meus serviços se eu tivesse um nome cativante, Homem de Lata — eu disse, me referindo ao velho pelo seu nome adotado de assassino. Fletcher sorriu. — Eu estava certo, também. Todo assassino tem um nome. O seu só acontece de ter um melhor som, graças a mim — eu cruzei meus braços em volta do meu peito e o encarei. — Qual é Gin. É dinheiro fácil. Acabe com o contador amanhã à noite, aí você pode tirar suas férias — Fletcher prometeu. — Férias de verdade. Algum lugar quente, com meninos de cabana cheios de óleo e bebidas caras. Eu levantei uma sobrancelha. — E o que você saberia sobre meninos de cabana cheios de óleo? — Finnegan talvez tenha apontado eles quando ele me levou para o Key West ano passado — Fletcher disse. — Embora nossa atenção tenha mudado rapidamente para as adoráveis senhoritas fazendo topless no sol ao lado da piscina. Claro que tinha. — Tudo bem — eu disse, fechando a pasta. — Eu vou fazer isso. Mas só porque eu te amo, mesmo você sendo um bastardo ganancioso que me explora muito — Fletcher levantou sua xícara de café. — Eu vou beber a isso.
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Capítulo 03 Eu terminei minha limonada, peguei a pasta de papéis, disse boa noite para Fletcher e fui para casa. Meu apartamento ficava no prédio atravessando a rua, cinco andares acima do chão, mas eu nunca ia direto para casa do restaurante – ou de qualquer lugar. Eu andava três quarteirões e cortava dois becos, tendo certeza que não estava sendo seguida, antes de voltar e entrar no prédio. Tudo estava quieto, por ser tarde da noite, exceto o barulho dos meus sapatos no chão de granito da portaria. Eu peguei o elevador para o meu andar. Antes de eu colocar minha chave na fechadura, pressionei minha mão contra a parede. Nada de estranho. Só a normal voz muda da pedra. Eu particularmente escolhi esse apartamento porque é perto da escadaria, com acesso ao telhado com um resistente cano que corria no exterior do prédio. Minha rota de fuga, juntamente como outras. Eu as testava pelo menos uma vez por mês, fazia possíveis cenários de captura e fuga. Meu próprio mantra de sobrevivência. Nunca se é muito cuidadoso quando especialmente na minha área de trabalho, até uma pequena ida ao banheiro pode significar morte. Minha morte. Eu liguei as luzes. O cômodo da frente era a cozinha, depois o enorme quarto com o banheiro na esquerda e alguns quartos na direita. Um sofá adorável, algumas cadeiras reclináveis, alguns aparelhos. Uma TV de plasma, com DVDs e CDs empilhados em volta. Pilhas e pilhas de livros, algumas chegando a dois metros. Umas prateleiras guardando potes e panelas na cozinha. Um bloco cheio de facas afiadas ficava no canto. Não tinha nada aqui que eu deixava sem observar antes. Tem várias possibilidades na minha profissão. Eu era cuidadosa nos meus trabalhos e Fletcher era extremamente seletivo em escolher clientes. Mas sempre tinha um risco de descobrimento, exposição, tortura e morte. Mais razões para o Fletcher querer minha desistência do trabalho. Para amansar o velho homem, eu tentava viver uma vida normal, exceto por minhas atividades noturnas. Minha principal identidade era como Gin Blanco, uma cozinheira de
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meio período e garçonete do Pork Pit e estudante no Colégio Comunitário de Ashland. Arquitetura e escultura, os sonhos de mulheres. Eu pegava qualquer curso que se aplicava à mim, não importava quão eclético fosse. Entretanto, literatura e aula de culinária eram minhas aulas preferidas e, eu me inscrevia todo semestre. Cozinhar era uma paixão que eu tinha – a única que eu realmente tinha depois da leitura. Eu gostava do cheiro de açúcar e temperos. As intermináveis combinações de doce com salgado. As simples e complexas fórmulas que te deixam separar ingredientes e juntá-los em obras de arte. Além do mais, cozinhar me dava várias desculpas para ter tantas facas em volta. Outra necessidade no meu trabalho. Vendo que tudo estava em ordem, fui mais para dentro do apartamento. Eu deveria ter ido ao banheiro, tomado banho e, então, me enrolar na cama estudando os papéis de Gordon Giles. Planejando o alvo. Escrevendo os materiais que eu precisava. Visualizando minha fuga. E sonhando com os homens que Fletcher prometeu que estariam esperando por mim em Key West. Sentei na poltrona, vendo vários desenhos em pedaços. Um trabalho de arte que terminei. Três desenhos ao todo, cada um diferente, mas com temas relacionados. Eu desenhei as marcas da minha família morta. Ao invés de cristas ou luvas, usuários de magia se identificavam através de marcas. Vampiros, Gigantes, Anões, Elementais. Marcas era tudo o que você via. Tatuagens, colares, anéis, camisetas. Até alguns humanos as usam, especialmente para negócios. Alguns usuários de magia reclamam disso, dizendo que as marcas só podem ser usadas por aqueles que possuem poderes, mas com os humanos usando as marcas não tinha um verdadeiro impacto. Apenas Elementais poderiam utilizar as marcas com poder; fazer os símbolos virem à vida e fazer uma função específica. E realmente um Elemental do Fogo traçando um raio de luz para uma madeira para começar uma fogueira era puro exibicionismo. Especialmente quando ele poderia apenas estalar os dedos e fazê-la acender. Mas as marcas de magia eram boas para algumas coisas – telegramas, alarmes e explosões de magia. Esse último certamente se aplica aos assassinos. A maioria das marcas não tem poderes próprios, mas eram maneiras de anunciar sua espécie, mostrar suas alianças e dizer algo sobre seu temperamento, trabalho ou hobbies. A marca da minha família, a família da Neve, era um floco de neve – o símbolo para a pureza do gelo. Minha mãe, Eira, tinha a marca em um medalhão que ela usava em uma corrente em volta do pescoço. Minha mãe levou a tradição um pouco mais a sério e fez um medalhão para cada um de nós, com o símbolo revelando algo sobre nossa personalidade. Não tinha uma foto da minha marca – a marca da aranha. O pequeno círculo composto de oito linhas não foi intrigante ou interessante o bastante para ganhar um mérito
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no desenho. Claro, eu não tinha mais o medalhão de aranha, mas se eu quisesse ver a maldita coisa, tudo o que eu tinha que fazer era olhar a cicatriz na palma da minha mão. Eu me retirei do transe. As memórias sempre eram piores durante a queda. Foi quando minha mãe e minha irmã mais velha, Annabella, foram mortas por um Elemental do Fogo, seus corpos reduzidos à cinzas. Bria, minha irmã mais nova, escapou desse destino, apenas para ser enterrada viva nos escombros do que restou de nossa casa. Tudo que eu encontrei de minha irmã, foi um rastro de sangue em uma das rochas da base. Mas as marcas no meu desenho não trariam minha família de volta. Nada poderia fazer isso. Eu não sei por que fiz os malditos desenhos, em primeiro lugar. Eu realmente precisava de umas férias. Ou talvez o papo de Fletcher de largar este negócio mexeu mais comigo do que imaginei. Meus dedos se apertaram em volta do arquivo na minha mão. Eu tirei meus olhos dos desenhos, fui ao meu quarto e fechei a porta, bloqueando minha visão das marcas. Fora de vista, quase fora da mente. Às oito da manhã do dia seguinte, eu estava no lado de fora do balcão do Teatro de Ashland, um prédio construído de granito cinza e brilhando como mármore. Vinte minutos atrás, eu entrei pela porta da frente. Com minha blusa branca, calça preta e botas de cano baixo, eu parecia com qualquer músico que estaria aqui para o espetáculo da noite. Ninguém me olhou duas vezes quando eu passei pelo lobby e subi a imensa escadaria. Eu usei minha magia de Gelo para fazer pequeninas chaves, que usei para abrir a porta que levava para a sacada. Permanecendo nas sombras, eu abri a mala do violoncelo e tirei uma casca de plástico que se parecia com o clássico instrumento. Escondido dentro tinha um compartimento secreto com meus instrumentos para a noite, incluindo uma corda para escalada. Eu amarrei a corda em um cano de metal e joguei a corda na falésia. A corda balançou nas pedras abaixo, e você não notaria se não soubesse que estava lá. Mas eu ainda tapei a corda com algumas folhas que tinha na sacada. Era improvável que alguém viesse aqui, mas nunca se sabe se alguém queira fumar ou fazer uma rapidinha. Melhor não correr o risco. Enquanto eu me movimentava, minhas mãos raspavam na rocha do prédio. O granito grudava em baixo das minhas unhas. A música da orquestra penetrava nas rochas. Eu fechei meus olhos e pousei minhas mãos na rocha. O som era tão vívido, tão puro, tão lindo, depois de ficar no asilo e finalmente poder usar minha magia. Eu mandei um raio do meu poder pela pedra, dando um comando sutil. Os pequenos remendos do granito se movimentaram em pequenas ondas, um depois do outro, como se eu estivesse correndo meus dedos em um piano. Os remendos voltaram no lugar e
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eu me permiti um pequeno sorriso. Magia Elemental poderia ser deliciosa, como mortal. Com o meu trabalho aqui terminado, peguei minha mala do violoncelo, abri a porta da sacada e entrei. A sacada era o andar mais alto do Teatro, um cinzento espaço morto onde as áreas executivas e administrativas eram localizadas. A área estava deserta, com apenas as luzes baixas de iluminação. Eu fui para escada de emergência e desci vários lances, antes de aparecer no segundo andar do prédio. Era como pisar em outro mundo. O segundo andar era circular, com uma entrada enorme. Uma grande escadaria levava para o andar de baixo, coberta por um brilhante lustre que pareciam elegantes geleiras. O carpete era de um leve tom Borgonha, costurado com delicados fios dourados. As paredes eram largas, estampadas em adesivos à prova de som, com um ocasional espelho e uma pintura brilhante. Há alguns quarteirões de distância, uma prostituta vampira faria sexo com você em seu carro por 50 pratas, enquanto os mendigos cavavam nos lixos procurando o suficiente para comer durante a noite. Mas aqui, as coisas mais sujas e sombrias não significavam nada. Pessoas andavam ao redor da entrada principal, algumas descendo ambos os lados da enorme escadaria. Como se para agradar alguma elite de arte, os convidados usavam vestidos com tons de diamantes, resplandecentes ternos pretos. Algumas pessoas bebericavam champanhe, outras misturavam drinks, enquanto outras pegavam um espeto de frango, rolinhos primavera e outras guloseimas que as garçonetes serviam. A conversa pairava sobre o ar, com graves murmúrios de risada virando uma gargalhada. Como eu me parecia com os outros músicos, as pessoas me davam a mesma atenção que davam a um carpete. Eeu me movi entre as pessoas com facilidade e saí em busca do meu alvo. Arfadas surgiram na multidão e eu procurei a fonte da repentina causa. Meu olhar travou em Mab Monroe. A Elemental de Fogo desceu a grande escadaria e começou a andar pelo salão. Todos os olhos estavam nela e as vozes pararam, como uma música que para no refrão. Mab provocava esse efeito nas pessoas. Seu macio cabelo vermelho enrolado brilhava como uma moeda e ela usava um vestido do mais escuro escarlate, com um decote na frente para mostrar seus seios. Seus olhos eram piscinas pretas em seu rosto. Fogo e enxofre. Era nisso que eu pensava toda vez que via Mab. Um grande colar dourado estava pendurado em seu pescoço delicado. Meus olhos captaram a peça do centro do colar: um rubi circulado por doze raios. Os diamantes encravados nos raios os faziam brilhar como se fossem o sol. O símbolo para fogo. A marca pessoal de Mab, usada por ela e somente ela. Mesmo do outro lado do salão, eu podia ouvir
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a preciosa pedra vibrando. Ao invés de beleza e elegância, aquilo sussurrava um bruto, furioso poder. O barulho fez meu estômago contorcer. Mab Monroe andou pela multidão, rindo, falando, sorrindo, apertando mãos. Eu olhei a Elemental, mais uma vez pensando na quantidade de dinheiro que recusei ao longo dos anos para matá-la. Uma pena, realmente. Eu não me considerava nenhum tipo de herói, mas eu não teria me importado em dar aos bons cidadãos de Ashland uma chance de luta para remover Mab de suas gargantas. Meu olhar foi para seus companheiros. Um robusto homem usando um terno ficava ao lado de Mab, enquanto outros dois circulavam pelo grande salão. Elliot Slater não estava entre eles esta noite, mas eles eram gigantes como ele, com pescoços grossos, com punhos enormes e olhos grandes. Perfeitos escudos de carne. Não que Mab realmente precisava deles. Sua magia Elemental de Fogo era mais que suficiente para lidar com qualquer ameaça. Os gigantes estavam para fazer show, mais do que qualquer coisa. O caminho que Mab Monroe estava fazendo, a traria até perto de mim e eu entrei novamente nas sombras. Mas ela e seus guardas passaram sem nem olhar em minha direção e eu continuei a procurar por minha presa – e qualquer outra que talvez aumente o drama da noite. Haley James entrou no salão alguns minutos depois e foi direto para as escadas. Sua pele era de um creme e seu cabelo loiro era curvado. Alexis James seguiu sua irmã. Alexis era vários centímetros maior, com o mesmo tom de cabelo, mas seu cabelo era curto. Ela usava um simples vestido preto. Haley James chamou por Mab e as duas mulheres começaram a trocar elogios. Alexis ficou em um canto, seu rosto sem expressão. De acordo com o arquivo de Fletcher, Haley James era a chefe oficial executiva das Indústrias Halo, com Alexis sendo a cabeça do marketing e relações públicas. A companhia esteve em sua família por anos e tinha acordos com várias áreas, mas o foco principal era a especulação de magia Elemental de Ar para uma variação de produtos médicos e cosméticos. As irmãs James empregavam um monte de Elementais, mas eles não eram famosos por conhecerem suas próprias magias. Perguntei-me se Haley James foi quem descobriu que Gordon Giles estava desviando dinheiro. Se ela me contratou para esconder isso. Ou para esconder de Mab Monroe que ela estava perdendo milhões e queria evitar a fúria da Elemental de Fogo. Se Mab descobrisse, ela não só iria tirá-la do negócio, como iria tirar a irmã também. Tinham inúmeras razões para Haley James pedir para eliminar Giles. Eu coloquei o pensamento de lado. Não importava para mim quem tinha me contratado para matar Giles, desde que o resto do dinheiro aparecesse depois do feitio. Se não aparecesse, bem, aí eu ficaria interessada em quem queria Gordon Giles morto. Mas
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não antes. Falando do Sr. Giles, ele finalmente chegou. Ele caminhou pelo salão e desceu a grande escadaria, como Mab Monroe fez, mas com menos graciosidade. Gordon Giles usava um terno que era um pouco grande para a sua pequenez. Ele era tão magro, seus ossos dos ombros saltavam no tecido da roupa. Seu rosto era fino e magro, como se o ato de respirar lhe causasse dor. Ele continuava a lavar suas mãos a seco e seus olhos iam e voltavam de Haley James para Alexis James e para Mab Monroe. Tentando ver de que direção o perigo iria vir. De que sombra a bala iria sair. Mas ele não iria ver, não iria me ver, até ser tarde demais. Mas realmente, já tem sido tarde desde a hora em que a cliente contratou Fletcher. Porque eu era a Aranha. Eu sempre seguia em frente. E eu nunca, jamais errava.
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Capítulo 04 Pessoas começaram a se amontoar em suas cabines para assistir a atuação. Gordon Giles escorregou para uma cabine marcada A3. Eu subi para o andar de cima, criando outro par de ferramentas com a minha magia de Gelo, em seguida usei-as para abrir a porta para as escadas que levavam à passarela. Parei dentro da porta e tirei minha grossa camisa branca, revelando por baixo uma camiseta de manga longa preta. O traje branco encheu a caixa do violoncelo e eu puxei um confortável encaixe, colete preto cheio dos meus suprimentos: dinheiro, celular descartável, cartões de crédito, um par de identidades falsas. Um gorro preto que estava dobrado no meu bolso agora estava na minha cabeça, escondendo meu cabelo loiro esbranquiçado. Fiz meu caminho até as escadas e caminhei para fora da passarela. Não era uma verdadeira passarela metálica, mas uma varanda com carpete estreita, a parede descascada tocando a ópera inteira em um círculo gigante, assim como os pisos abaixo faziam. As luzes já tinham diminuído e vários holofotes focados no palco, destacando o brilho dos instrumentos da orquestra. Os músicos ficaram em silêncio sobre o largo palco semicircular, esperando pela deixa do maestro. Eu rastejei pela passarela. Do alto no ponto de observação, eu poderia olhar para baixo por cima de todo complexo – e dentro das cabines VIP do segundo andar, incluindo aquele que pertencia a Gordon Giles. Giles já estava sentado. Ele devia não ter encontrado programa mais interessante para a noite, porque ele tinha se virado. Giles balançou sua mão e o papel enrolado batia no seu joelho em um rápido padrão estacato. O tique nervoso de um homem que sabia que estava em problemas. O maestro limpou sua garganta e bateu levemente seu bastão. A multidão excitada, imóvel e calada. O bastão de metal veio abaixo de novo e a orquestra estourou numa canção. Energia. Emoção. Alegria. Fechei meus olhos, ouvindo a excelente orquestra, a
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perfeita harmonia dos instrumentos criou como eles anunciaram seu complexo modelo de notas e cordas. Toda mistura e fundição juntas em uma cacofonia de suprema beleza. Eu ouvi poucos segundos mais, deleitando a harmonia. Então eu desliguei a música e voltei ao trabalho. De acordo com o horário no arquivo de Fletcher, o trabalho tinha que ser feito antes do intervalo. O cliente queria fazer um espetáculo da morte prematura de Gordon Giles por ter descoberto seu corpo. Abri minha caixa do violoncelo e puxei fora o cartucho de plástico uma vez mais. Escondendo o compartimento debaixo onde tinha minha arma escolhida para a noite – uma besta12. A arma parecia como uma típica besta, exceto por um poderoso rifle montado acima do gatilho e o parafuso de metal farpado já em posição de tiro. O arco era uma arma perfeita para um trabalho de médio alcance como este. Já que eu não queria dar uma chance a Gordon Giles de usar sua magia Elementar do Ar contra mim, eu decidi fazer isso á distância. Puxar o gatilho e ir embora. Direto e simples, sem sangue borrifado em minhas roupas, para uma mudança. A única desvantagem real do meu trabalho. Eu poderia ter usado um rifle, é claro. Fácil de obter, barato para comprar, mesmo resultado no final. Mas as armas atolam demais para meu gosto. Com um arco, você não corre esse risco. A mesma razão eu uso facas Silverstone na maioria dos meus trabalhos. Junto com a besta, eu tinha várias facas secretas na minha pessoa hoje à noite. Duas arregaçaram minhas mangas. Uma contra as minhas costas. Duas enfiadas dentro das minhas botas. Meu arsenal de cinco pontos usual. Apenas no caso das coisas não irem exatamente como planejado, e eu ter um perto e pessoal com alguém. A melhor coisa em usar facas Silverstone era o fato de que o metal mágico era quase inquebrável e o único bloqueio que essa lâmina fez foi quando eu enfiei muito no peito de alguém e tive um problema em arrancá-lo de novo. Por esse tempo, bem, isso não importa muito. Eu agarrei a besta e coloquei-a na borda da parede do balcão. Estava escuro lá em cima e ninguém olhou em minha direção, mas eu ainda me encolhi para lançar meu ataque da mais profunda sombra. Pela mesma razão eu abandonei minha camisa branca. Eu não queria algum garoto chato olhando para cima e perguntando para a mamãe o que a figura negra com uma arma assustadora estava fazendo subindo nas vigas. Eu poderia estar aqui para matar alguém, mas não havia necessidade para assustar outras pessoas no meu atendimento e arruinar suas noites. E um grito poderia quebrar meu momento de oportunidade. Dada à natureza de Gordon Giles, eu duvidava que eu desse outro tiro nele em breve. Eu estava surpresa de ele aparecer em tal função pública. Se eu 12
http://pt.wikipedia.org/wiki/Besta_%28arma%29
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fosse um contador que roubava milhões da Mab Monroe, eu teria tido meu rosto escondido em uma ilha deserta. Não tendo um desempenho na Casa de ópera local. A ampliação da mira me deu uma visão de olhos de águias na cabine. É por isso que eu era capaz de ver um pedaço de luz, pois a porta estava com a parte traseira quebrada. Meu olho cinza alargado no âmbito, tentando determinar a identidade do recém-chegado e quanto ele estava indo para fuder meus planos. Donovan Caine caminhou para dentro da cabine. Eu conhecia Caine pela visão – e reputação. Donovan Caine era um dos poucos policiais honestos da cidade, criado para ser assim pelo seu saudoso pai detetive. De acordo com Fletcher, Caine era o tipo de homem que não olha para o outro, não importa quem estava colocando a pressão. Não aceitava suborno. Não usava drogas. Inferno, ele nem sequer fuma, de acordo com Fletcher. O detetive tinha sido designado para investigar alguns dos meus trabalhos anteriores em Ashland, embora com pouco sucesso. Ao contrário de alguns companheiros assassinos, eu não era estúpida o suficiente para assinar meu trabalho. Alguns caras do contrato, especialmente os usuários de magia, realmente tiveram tempo para esculpir suas próprias runas pessoais na carne de suas vítimas ou sobre as paredes ou no chão circundante. Eu tinha ouvido rumores de certo vampiro que gosta de desenhar uma runa com o sangue de suas vítimas – depois de misturá-la com seu próprio. Idiotas. Deixando uma runa para trás era tão ruim quanto deixar uma impressão digital. Mostrando-se uma passagem só de ida para a cadeira elétrica. Povos do sul não são tímidos sobre execução de pessoas, especialmente quando estas manifestações foram sancionadas pelo governo. Mas Caine sabia que eu existia, principalmente por causa do último trabalho na cidade há meses – quando eu matei seu parceiro. Cliff Ingles não tinha sido um mau policial – exceto por sua tendência para bater e estuprar prostitutas fora de serviço. Em Ashland, não foi suficiente tirá-lo fora da força, muito menos para justificar a minha marca particular de atenção. Até Ingles virou sua forma forçada para a filha de treze anos de uma prostituta. O vampiro sabia o suficiente para mandar uma mensagem pedindo ajuda de Fletcher no sentido geral. O velho não gostava de estupradores, especialmente aqueles que atacam crianças. Eu também não, então eu fiz o trabalho legalmente. Outro serviço público. O prefeito devia me dar uma medalha. Caine devia saber que seu parceiro não era o cara mais limpo ao redor, mas evidentemente ele não percebeu a extensão da depravação de Ingles. Porque depois que eu coloquei uma faca no intestino de Ingles e cortei seus testículos, Donovan Caine publicamente prometeu trazer o assassino do seu parceiro à justiça. Jurou de um lado e para o outro encontrar o assassino responsável pela dolorosa morte prematura do seu parceiro e
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fazê-la pagar de todas as formas possíveis. A investigação tinha parado, mas Caine não tinha desistido. Toda semana ou mais, ele mandava um novo anúncio de serviço público para a mídia local, suplicando por informações sobre o assassino de Ingles. Oh, Caine não sabia que era precisamente eu, Gin Blanco, a Aranha, que matou seu parceiro. Todos os detetives sabiam que era um assassino que tinha abatido Cliff Ingles. Se tivesse sido um membro de gangue ou algum outro criminoso, ele poderia ter sido estúpido o suficiente para se gabar sobre isso, alguém teria dedurado e Caine provavelmente teria o encontrado até agora. De qualquer maneira, o detetive queria revidar a quem assassinou Ingles e obter vingança por seu parceiro morto. Desde então, eu tinha tomado um interesse pelo detetive. Sua determinação pertinente me divertiu, no entanto, foi infrutífero e equivocado e eu tinha Fletcher compilando um arquivo sobre ele. Eu segui Caine através da mira quando ele se aproximou de Giles. Cabelo preto curto. Olhos cor de avelã. Queixo forte. Mandíbula quadrada. Nariz torto acidentado. Magro. Pele bronzeada que mostra sua herança Hispânica. Ele era bonito o suficiente, embora não tão bonito quanto alguns outros homens que eu vi no saguão. Mas Caine movia-se solto, confiança fácil de um homem que sabe o que está fazendo – e sabe que pode lidar com qualquer coisa que aparecer no seu caminho. Havia alguma coisa mais sexy do que a confiança e a habilidade de voltar-se? Eu não penso assim. A consciência quente percorria o meu corpo. Meus seios apertados e uma pequena, dor agradável estabelecida entre as minhas pernas. Gostaria de saber se Donovan Caine seria bom e certo na cama. Aposto que ele iria. Por um momento, eu deixei minhas fantasias com o detetive. Nu. Contorcendo-se debaixo de mim. Sua boca provocando meus mamilos rígidos. Seus dedos calejados amassando meus seios. Imaginei-me afundando em seu palpitante comprimento. Cavalgando nele até que ele gritasse meu nome. Drenando cada gota de prazer que poderia sair de seu corpo magro, até que ambos ficassem gastos e suados e saciados. Hummm. Pena que ele joga para a oposição e quer colocar uma bala na minha cabeça. Meu sonho iria ficar apenas nisso. Fletcher disse que Gordon Giles poderia ir a polícia por proteção. Deve ser por isso que Caine está aqui. Para encontrar com Giles. Acalmá-lo com as garantias habituais de segurança, imunidade, o quer que seja. Um sorriso puxou meus lábios. Fiquei imaginando o que Donovan Caine faria quando eu colocasse uma seta no coração de Gordon Giles. Será que ele vai tentar administrar algum tipo assistência médica, embora já seja tarde demais? Será que ele vai chamar ajuda? Ou caçar fora da cabine, arma na mão, decidido a encontrar o assassino?
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Tudo que eu tinha que fazer era puxar o gatilho e descobrir. Entretanto, em vez de terminar meu serviço, eu assisti o detetive. Caine pegou um lugar a direita de Giles. Os dois dobraram suas cabeças juntos e começaram a sussurrar. Bem, Caine fez a maioria dos sussurros. Gordon apenas sacudiu sua cara de fuinha em um padrão de não-não-não. O que quer que Caine queira que ele fizesse Gordon não estava dando atenção. Eu estava tão preocupada com Donovan Caine que eu não registrei o clique, até que fosse tarde demais. Mas a arma fria encostada na nuca definitivamente chamou minha atenção. — Largue a arma — uma voz sussurrou em meu ouvido.
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Capítulo 05 — Largue a arma — a voz sibilou novamente. O cano pressionou contra a minha espinha, na base do meu crânio. Se ele atirasse em mim lá, eu estaria morta antes de cair no chão, especialmente se ele estivesse usando balas de pedra ou silverstone. Por um momento, pensei em alcançar minha magia de Pedra, usando-a para proteger minha pele com uma casca impenetrável. Mas se o bastardo fosse mais rápido que eu, apenas meio segundo, ele poderia ser capaz de puxar o gatilho antes que eu trouxesse magia suficiente para suportar. Além do mais, usar tanto poder apagaria minha força. A julgar pela minha situação atual, eu iria precisar de cada pedacinho da minha energia esta noite. Melhor salvar esse truque para quando eu estivesse realmente desesperada. Esse era apenas um contratempo leve até agora. — Larga isso agora, caralho. — Claro — eu respondi com uma voz calma, fácil. — Vou largá-la. Mas você vai ter que me dar algum espaço. Eu não consigo puxar de volta com você bem em cima de mim. Uma mentira descarada é claro. Mas ele tinha me obtido e agora eu não estava em posição de lhe passar a perna – ou a arma em minha coluna. — Tudo bem. Mas não tente nada estúpido. A arma foi tirada do meu pescoço e eu o senti dar cinco passos para trás. Perfeito. Eu deixei o gatilho inclinar-se, facilitando a arma no balcão da parede e a coloquei lá, com o cano apontando de volta para ele. — Agora, levante-se e se vire, lentamente. Mãos para cima, onde eu possa vê-las. Eu fiz como ele pediu e me virei para encará-lo. Um homem asiático baixo, corpulento com músculos grossos e poderosos estava atrás de mim. Ele usava o cabelo
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preto em um rabo de cavalo e uma cicatriz branca cortava toda a sua bochecha direita, indo do canto do olho marrom até a linha da mandíbula. Como eu, ele estava vestido de preto. Assassinos realmente não vestiam nenhuma outra cor quando estavam trabalhando. — Oi, Brutus. Ele inclinou a cabeça. — Gin. Todo assassino tinha um nome, uma palavra código que identificava ele ou ela e talvez desse uma dica sobre sua especialidade. Se você queria alguém envenenado, você provavelmente vai chegar à Hemlock. Morte pelo fogo? Olhe para Phoenix. Destripar as entranhas? Hooke era a sua garota. Fletcher Lane tinha sido conhecido como o Homem de Lata porque ele nunca deixou emoção entrar no caminho de seu trabalho. O apelido de Brutus era Víbora e uma tatuagem de runa das presas de cobra enrolava ao lado de seu pescoço. Brutus se chamava de Víbora porque ele era o tipo de cara que rastejava ao redor de vegetação rasteira. O que você não via até que pisasse nele ou ele decidisse te atingir. Como agora. Como há um número limitado de pessoas que se especializam em nossa profissão, pelo menos ao nosso nível, nós corremos para um ao outro mais do que uma vez ao longo dos anos. Três vezes agora, nossos respectivos clientes nos contrataram para matar a outra pessoa. Eu coloquei uma faca nas costas de Brutus em Savannah na última vez que nos encontramos. Ele retornou o favor me dando um tiro no estômago. Todos os seis dos nossos clientes tinham morrido. Eu poderia ter sido uma pedra fria eficiente quando se trata das minhas atribuições, mas Brutus era uma máquina. Ele nunca demonstrou qualquer tipo de emoção. Nem prazer, nem dor, nem sequer um lampejo de satisfação com um trabalho bem feito, nada. Ele aparecia, matava seu alvo e seguia em frente. Eu fiquei lá com as mãos para cima. Um silenciador completava a arma em sua mão. A arma estava no nível do meu coração. Brutus não perderia. A menos que eu o fizesse. — Você sabe, estou realmente triste por isso, Gin — apesar do seu pedido de desculpas, a voz de Brutus era plana. Sem emoção. — Mas o dinheiro era bom demais para deixar passar. Meus olhos esvoaçaram para o camarote. Donovan Caine e Gordon Giles sussurravam entre si, indiferentes ao drama que acontecia acima de suas cabeças. Caine parecia estar exigindo algo de Giles, que ainda estava sacudindo a cabeça não não não. Minha cabeça girava, tentando fazer sentido da situação.
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— O que é isso? — perguntei. — Uma armadilha? Eu mato Giles e, então, você me mata? — Esse era o plano, mas desde que você estava desperdiçando seu tempo doce, decidi fazer primeiro. Meus olhos cinzas estreitaram. — Por quê? Eu estava indo terminar o trabalho. Indo matar Giles. Sou uma profissional. Eu não pego trabalhos a menos que pretenda seguir com eles. Brutus deu de ombros. — A morte do contador vai levantar algumas questões complicadas, então, meu empregador decidiu que seria melhor se o assassino dele fosse capturado. Imediatamente. — Então você vai me fazer o cara caído para proteger seu cliente — minha voz era tão plana quanto à dele. Brutus assentiu. — Desta forma, não há perseguição, nem prova tirada, sem perguntas embaraçosas. Mas haverá uma troca de tiros com um dos guardas da segurança da Casa de Ópera. Quando a fumaça dissipar, você será a única a não respirar. A trilha começa e termina com você. — Assim você tem alguém no interior, então. Tem alguém ajudando você. Brutus não disse nada, mas eu não precisava que ele confirmasse a minha suspeita. Meu olhar voltou para o camarote, mas ninguém tinha se juntado a Donovan Caine e Gordon Giles. Brutus tinha que ter alguém estacionado do lado de fora da porta, esperando no caso de Giles ficasse assustado e tentasse sair. — Qual é a minha motivação? — perguntei, mudando meu peso para o meu pé direito. — Nada muito elaborado. Apenas uma prostituta pobre, sem classe, chateada com Giles por ter prometido se casar com ela e fazer dela uma mulher honesta. Uma mulher demente furiosa por amor e ciumenta, que decidiu resolver a questão com suas próprias mãos. — Uma prostituta matando por amor? Nessa cidade? — eu zombei. — Você não poderia vir com algo mais criativo que isso?
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Brutus deu de ombros. — Não foi minha decisão. Eu assenti. — Claro que não. Bem, tenho que admitir que é um plano sólido, Brutus. Seu cliente deveria te dar um bônus. A propósito, quem é seu cliente? Brutus balançou a cabeça. — Você deveria saber melhor do que me perguntar algo como isso, Gin. Eu sabia melhor, mas perguntando me deu a oportunidade de mudar meu pé esquerdo mais perto em direção à arma do chão. — Eu adoraria continuar conversando, mas eu tenho uma agenda a cumprir — o aperto de Brutus aumentou na arma. — Você é uma assassina decente, Gin. Quase tão boa quanto eu. Eu realmente sinto muito... Chutei com o pé esquerdo, sacudindo o gatilho da arma. O cano atirou, pegando Brutus acima de seu tornozelo direito. O outro assassino grunhiu e disparou um tiro, enquanto eu me joguei para a direita. A bala de sua arma apenas cortou meu ombro, girando em torno de mim. Eu assobiei quando uma fita de fogo quente explodiu em meus músculos. Mas isso era melhor do que o projétil perfurando meu coração. Empurrei a dor para longe, batendo o chão em um rolamento, agarrei o coldre de meu pseudo violoncelo e fiquei de pé. Levantei o coldre na altura do peito. Mais duas balas dum-dum nela. Balancei meu braço esquerdo e uma faca de prata de pedra caiu na manga em minha mão. Outra bala atingiu o coldre e eu cambaleei para trás como se tivesse sido atingida. Então girei, pendurando o coldre de um lado e joguei a faca em Brutus. A lâmina pegou o assassino em seu ombro direito. A arma escorregou de seus dedos contorcidos e estatelou no chão. — Você e essas facas do caralho — Brutus murmurou e arrancou a lâmina do encaixe de seu ombro. — Pegue um armamento real. Pegue uma arma. — Armas são para pessoas que não tem o intestino ou habilidade para usar uma lâmina — derrubei a besta carregada do coldre do violoncelo e coloquei na palma a faca escondida na manga direita. E então nós dançamos.
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Nós circulamos voltas e voltas na passarela estreita, chutando, socando, golpeando com nossas facas. Brutus cortou meu bíceps esquerdo, aumentando o fogo quente desse lado do meu corpo. Bati meu cotovelo em sua boca. Ele me deu um soco nos rins. Eu dei uma joelhada na virilha dele. Nós estávamos empatados profissionalmente. Treinados, qualificados, eficientes, mortais. Mas a ferida no tornozelo de Brutus o dificultava mais do que o arranhão da bala fez em mim. Ele recuou para sair do caminho do corte da minha adaga e seu tornozelo torceu. Ele tropeçou para o chão. Toda a abertura que eu precisava. Antes de Brutus conseguir se recuperar e puxei o arco cruzado em seu tornozelo e me joguei em cima dele. Dessa vez, Brutus não pôde parar o gemido de dor que escapou de seus lábios. Ele tentou se agarrar comigo, mas eu empurrei minha faca contra seu pescoço. A lâmina apenas cortou através de sua pele. Ele congelou. — Agora — eu disse, levantando a flecha e pressionando na ponta sangrenta de seu olho esquerdo. — Você vai me dizer exatamente que contratou você e porque ele quer Gordon Giles tão fodidamente morto. Ou eu vou colocar essa flecha pela porra do seu olho até seu cérebro. Brutus sorriu seus dentes vermelhos com seu próprio sangue. — Você tem duas opções, Gin. Você pode me matar, ou se salvar, ou tentar. Toquei a parte superior da flecha contra seu olho. Brutus pode ser tão frio quanto pedra, mas mesmo ele estremeceu com isso. — O que você quer dizer? — Eu disse ao meu cliente que você era boa, que você poderia ir embora. Assim, nós elaboramos um segundo plano. Mesmo se você me matar você ainda será culpada pelo assassinato de Giles. Eu tenho outro homem de pé pronto para levá-lo para fora. A pista para o jornal conduzindo a você já foi criada. Cartas ameaçadoras e afins. Está tudo no lugar.. Ergui minha faca para cima e bati com ela no coração de Brutus. Na primeira vez, ele engasgou em surpresa e dor. Na segunda, seus olhos castanhos incharam e mais sangue escorreu de sua boca. Na terceira vez que eu o esfaqueei, ele estava morto. — Arrogante do caralho — eu murmurei ficando de pé. — Você deveria ter apenas atirado em mim. Não conversado até sua morte.
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O corpo de Brutus deu um espasmo no momento final em concordância. Eu já estava passando por cima dele e pegando as armas. Porque Brutus estava certo sobre uma coisa. Eu tinha que salvar a vida de Gordon Giles ao invés de tomá-la – se eu tivesse alguma esperança de salvar a minha própria. Eu enfiei o arco de volta na caixa do violoncelo, corri pelas escadas da passarela e empurrei a porte de saída. Meu ombro ferido bateu no batente da porta e eu assobiei. Levar um tiro, mesmo que apenas de raspão, sempre sentia como se alguém tivesse empurrado um atiçador de metal em brasa na minha carne. Como se um Elemental de Fogo tivesse colocado as mãos em mim e soltado sua magia incendiária. Mas eu ignorei o desconforto. Compartimentalizar a dor, aprender a bloqueá-la e continuar não importa o que, tinha sido uma das primeiras coisas que Fletcher tinha me ensinado. Fletcher. Meus pensamentos se voltaram para ele. Ele estava nessa, também. Se o cliente de Brutus me queria para assumir a culpa pela morte de Gordon Giles, matar Fletcher seria o próximo na lista de afazeres. Eles não podiam dar ao luxo de deixá-lo vivo. Finnegan Lane tampouco. Eu tinha que chegar a eles. Logo. Eu corri através do andar executivo, larguei a caixa do violoncelo pela porta destrancada da varanda e fui para a escadaria. Bati descendo as escadas para o segundo andar. Intervalo estava ainda algum minuto de distância. Ninguém estava no corredor ainda e eu tinha um caminho limpo para o camarote VIP de Gordon Giles. Eu não precisava de pessoas começando a gritar quando eles percebessem que uma mulher vestida de preto estava segurando uma faca ensanguentada em uma mão e uma flecha afiada ainda mais ensanguentada em outra. Mais à frente, um homem abriu a porta do camarote e entrou. O backup de Brutus. E eu percebi que ele não estava indo apenas para matar Giles. Uma trilha sem saída e sem testemunhas significava que ele teria que tirar Donovan Caine, também. Matar Giles e me culpar era uma coisa, mas eu não precisava da exaltação de um policial morto em cima disso. Especialmente um honesto como Caine, que era uma espécie de herói do povo em Ashland. Os policiais, mesmo os corruptos, entrariam todos que eles conheciam para pegar o assassino de Caine. Os apetites insaciáveis da pressão da imprensa e do público os forçariam a fazer isso. Donovan Caine e Gordon Giles definitivamente precisavam continuar respirando hoje à noite. Apressei o passo e investi através da porta. Gordon Giles agachou meio dentro, meio fora de seu assento, seus olhos azuis alargaram com pânico e medo. Donovan Caine ficou alto e ereto. Ele apenas olhou furioso. O homem com a arma virou ao som da porta abrindo. Eu dei um passo à frente e soquei o otário. Seu nariz ficou esmagado sob meu punho fechado e o sangue espirrou nas paredes cobertas por cortinas. O homem amaldiçoou e
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cambaleou para trás. Eu usei o seu próprio momento para girar em torno dele, puxá-lo para mim e enganchei meu braço direito em torno de seu ombro. Minha faca pressionada em sua garganta. — Ninguém se move ou ele morre! — eu assobiei. Ele ia morrer de qualquer jeito, mas eles não precisavam saber disso. Gordon Giles não se moveu. A mão de Donovan Caine flutuava sobre a arma no coldre na cintura. Cowboy. O suposto assassino sacudiu contra mim, tentando quebrar meu aperto. Mais dor quente floresceu no meu ombro, mas eu tranquei meus dentes juntos e encerrei isso para fora. Eu espetei a ponta da faca em sua garganta para dissuadi-lo de mais um movimento. — Para quem você está trabalhando? — eu rosnei em seu ouvido. — Eu não sei sobre o que você está falando — suor escorreu pela volta de seu pescoço, misturando com o meu próprio. Ele cheirava a alho. — Mentira. Você foi designado para matar Giles se eu não o fizesse. Giles ofegou e seu rosto de fuinha empalideceu. Os olhos castanhos de Donovan Caine se estreitaram e sua boca achatou em uma linha dura. — Diga-me para quem você está trabalhando, ou eu vou cortar a sua garganta bem aqui e agora. Brutus não esta vindo para ajudar você. O homem endureceu com a menção do nome do outro assassino. Por um momento, eu pensei que ele poderia me contar, poderia me dar a informação que eu precisava, mas ele arqueou as costas e eu sabia que ele tinha tomado a decisão errada. — Vá para o inferno, puta — ele cuspiu as palavras, junto com uma boca cheia de sangue. — Você primeiro. Eu cortei sua garganta. Sangue quente e pegajoso jorrou em minhas mãos. O homem borbulhava e agarrou a ferida aberta. Gordon Giles gritou uma vez, um som de menina estridente, mais adequado para uma líder de torcida entusiasmada do que um homem de meia-idade. Ele balançou para trás e para frente. Seus olhos rolaram para cima de trás da cabeça e o contador tombou em um desmaio. Donovan Caine tinha um estômago mais forte. O detetive foi pegar sua arma. Antes que Caine pudesse pegar sua arma no coldre livre, eu empurrei o homem morrendo para frente, mandando-o para o detetive. Então me virei e corri para fora do
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camarote. Corri de volta para o caminho que eu tinha vindo, batendo até as escadas para o andar executivo, agarrando a caixa do violoncelo, irrompendo por entre as portas e acabando na varanda. Assim que entrei no pátio de pedra, arremessei a caixa do violoncelo para o lado no rio e corri em direção à corda escondida. Eu ouvi os passos pesados de Donovan Caine na escada abaixo de mim. Sem tempo para ser cautelosa, para estar segura. Eu teria que descer do lado dos penhascos e esperar que Caine tivesse um tiro péssimo ou não cortasse a corda antes de eu chegar ao chão... — Pare aí mesmo! — uma voz masculina ressoou. Eu congelei e olhei sobre meu ombro. Donovan Caine avançava para mim, sua arma apontada para meu peito com a firmeza de um homem que sabia que tinha um excelente tiro. Eu me virei e levantei as mãos, assim como dei um passo em direção à varanda. — Quem é você? — ele rosnou. — Para quem você trabalha? — Eu honestamente não sei — eu disse em uma voz calma. — As coisas ficaram um pouco complicadas essa noite. Seu olhos brilharam como topázio enfumaçado. — Complicadas como? Ele não estava atirando em mim no local. Bom para mim, descuidado da parte dele. — Alguém armou para mim — eu disse. — Era para eu matar Giles e ir embora, mas alguém tinha outras ideias. Eles queriam me matar antes que eu fizesse o trabalho, então me culpar por seu assassinato. Se você checar na passarela de cima, você encontrará um homem morto. Seu nome é Brutus. Ele é um assassino. Atende pelo apelido de Víbora. Caine deu mais um passo em frente. — Eu não acredito em você. — Eu não ligo para o que você acredita. O ponto é que Gordon Giles ainda está em perigo. Eu ficaria mais preocupado com ele do que comigo. O detetive pensou nisso, sua jaqueta preta lutando para conter a força de seus músculos enrolados. Suas feições eram duras e ásperas nas sombras. Trechos da escuridão pintavam suas maçãs do rosto, mas o luar ofuscava seu cabelo escuro e delineava os lábios grossos.
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Apesar da gravidade da situação, eu pensei sobre aqueles lábios contra os meus. Sua língua pesada acariciando a minha, então descendo para meu corpo em um movimento doce e lento, antes de mergulhar nos cachos na junção das minhas coxas. Hummm. — Você está vindo comigo — ele disse. Com uma mão livre, Caine alcançou dentro do bolso de sua jaqueta e tirou um par de algemas de pedra de prata. Ele as atirou na varanda entre nós. O metal tilintou a uma parada das minhas botas. — Coloque-as. — Algemas. Excêntrico. Mas eu prefiro ter um pouco mais de liberdade durante o sexo. Você não? — Caine sacudiu como se eu tivesse puxado o revólver de suas mãos e atirado nele. Seus olhos esvoaçaram para o meu corpo, indo para os meus seios e coxas, antes de voltar ao meu rosto. Sim, ele estava pensando nisso. Toda a distração que eu precisava. — Não há necessidade de se preocupar com isso porque você não está me levando para dentro, detetive. — Onde você está indo? — Caine perguntou. — Você está presa aqui. Eu sorri. — Eu? Presa? Nunca. Usando minhas pernas, eu virei, saltei para cima na parede da varanda e me lancei para o lado na escuridão abaixo.
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Capítulo 06 Eu consegui me impulsionar suficientemente longe da sacada para não bater nas pedras duras e irregulares da falésia abaixo. O vento gritou nos meus ouvidos antes do meu corpo mergulhar nas profundezas escuras do rio Aneirin. Eu me virei durante a descida e atingi a água com os pés. A força da minha queda tirou as armas das minhas mãos e me afundou até ao leito rochoso, quinze metros abaixo da superfície. A água negra estava tão fria que eu me senti como se tivesse sido instantaneamente congelada. O choque gelado e cruel da queda roubou o precioso ar dos meus pulmões. Mas eu não tentei voltar para a superfície. Ao invés eu deixei a corrente me pegar no seu abraço áspero e me arrastar rio abaixo. Eu comecei há contar os segundos na minha cabeça. Dez, vinte, trinta... Quando cheguei aos quarenta e cinco, voltei à superfície. As minhas roupas e botas encharcadas faziam peso para baixo, mas eu me libertei da água. Eu dei uma respiração ofegante e afundei de volta sob a superfície. Dez, vinte, trinta... Quando cheguei aos quarenta e cinco, voltei à superfície. Desta vez, continuei lá. Eu fui avançando na água e olhei de volta para o Teatro. Luzes brilhavam no terraço, do qual eu tinha saltado. Figuras se moviam para frente e para trás no parapeito, mas eu estava muito longe para ver quem era. Eu me perguntei se Donovan Caine ainda estava no terraço. Ou se ele tinha voltado para Gordon Giles para colocar o contabilista em segurança. Mas eu não podia pensar neles agora. Eu tinha de chegar a Fletcher. Apesar de Brutus estar morto, a notícia da tentativa fracassada de assassinato começaria a vazar – junto com o fato de que Giles ainda estava vivo. Quem quer que tenha contratado Brutus começaria a limpar a casa, matando todos os que poderiam apontar um dedo culpado para ele, incluindo Fletcher. Eu virei a cabeça e nadei para terra. Levou-me vinte minutos para chegar ao lado oposto do rio. Quando eu finalmente me arrastei para a margem inclinada e enlameada, eu tinha percorrido a nado meia milha desde o Teatro. Luzes azuis e vermelhas da polícia brilhavam na distância e um cão de caça
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uivou para a lua. Os seus irmãos e irmãs juntaram-se a ele num coro baixo e gutural. O som ecoou através do rio e até a mim e depois voltou à origem. Eles não estavam assumindo que eu tinha me afogado. Muito ruim. Apesar da magia de Gelo nas minhas veias, a água fria tinha cobrado o seu preço. Os meus dentes batiam e as minhas unhas curtas tinham azulado com o frio. O arranhão no meu ombro onde a bala tinha raspado sentia-se apertado e entorpecido e os meus rins doíam dos golpes de Brutus. Tal como fazia o meu braço esquerdo onde ele o tinha cortado com a faca. E o pior de tudo, eu cheirava a podre, como peixe-gato. Mas eu forcei a mim mesma a continuar em movimento, a pôr um pé em frente do outro. Eu aumentei o meu passo ritmado para uma caminhada rápida, depois uma corrida. Eu tinha que me mover. Tinha que me manter quente até que pudesse pegar algumas roupas secas. Enquanto corria, eu abri o fecho de um bolso do meu colete e tirei o meu celular. Graças a ser à prova de água eu ainda tinha sinal. O telefone tocou e tocou e tocou. Fletcher deveria ter estado lá. Ele sempre espera por mim no restaurante depois de um trabalho. Ele devia ter respondido. Eu tentei o número do Finnegan. Sem resposta. Medo inundou o meu corpo, acrescentando-se ao meu sofrimento, fazendo o meu peito doer, me tornando mais pesada. Mas eu empurrei isso para o lado e forcei os meus pés a se moverem. Mais rápido. Eu tinha que ir mais rápido. Água saía em jato das minhas botas com cada passo rápido. Eu corri duas milhas no escuro, tropeçando a maior parte do caminho. Eu permaneci dentro da fileira densa de arbustos e abetos que delimitavam a autoestrada. Carros zumbiam pelas quatro vias, mas eu não me atrevi a tentar parar um deles ou a chamar um táxi. Um gambá molhado parecia mais atraente do que eu neste momento. Cheirava melhor também. Mais à frente, avistei um sinal para um dos hipermercados que Vende-Tudo que pontilhavam a cidade como borbulhas cavernosas na face de um adolescente. Um dos muitos interesses comerciais de Mab Monroe. Pela primeira vez, eu estava grata por ver um símbolo tão descarado da América incorporada do sul. Porque todas as minhas facas me tinham sido arrancadas quando eu atingi o rio e eu precisaria de novas armas para salvar Fletcher e Finn. Roupas secas e sapatos também, ou eu corria o risco de hipotermia. Apesar da minha corrida, os meus dentes ainda batiam e as minhas mãos tremiam da água fria. É difícil cortar alguém se os teus dedos estão demasiado dormentes para rodear o cabo da faca. Por muito que eu odiasse cada segundo de atraso para chegar a Fletcher e Finn, eu precisava de alguns fornecimentos antes de ir atrás deles. Ou todos estariam mortos.
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Marchei até ao estacionamento e rumei para a seção de jardim, deserta exceto pelos amores-perfeitos do dia que já murchavam e as bolsas de palha que não foram vendidas. Eu deslizei pelo muro baixo de blocos cinza que separava as flores do estacionamento. Linhas de ancinhos e sopradores de folhas penduravam no cabide improvisado na parede e toda a área cheirava a fertilizante. A porta para a loja ainda estava aberta e eu me dirigi para dentro. À minha volta, o concreto barato do edifício buzinava e apitava como uma caixa registadora. Um carrinho vazio, abandonado por algum cliente instável, descansava na entrada. Eu empurrei a engenhoca de metal rangendo até à seção das mulheres e agarrei as primeiras roupas que se pareciam com algo que me serviria. Jeans. Um sutiã. Calcinhas. Uma t-shirt preta de mangas compridas. Casaco de lã a combinar. Meias. Botas. Um boné de basebol preto com uma runa13 amarelo-pálida costurada nele. O símbolo da beleza. Porque bonés de basebol eram tão belos por si próprios. A minha próxima parada foi na farmácia, onde eu peguei uma pomada antibiótica, gaze, aspirina superforte e mais suprimentos médicos. Eu dei uma passada na seção de beleza, pegando desodorante e refrescante corporal para tentar disfarçar o meu perfume de peixe-gato. Depois fui para o corredor do ar livre e despejei no carro vários pacotes de aquecedores de mãos químicos. A minha parada final foi na seção de cozinha. Várias facas grandes foram para o topo da minha pilha de mercadorias. Eu empurrei o carrinho cheio para a pista de self-checkout na frente da loja. Tirei um cartão de crédito com um nome falso do meu colete empapado e paguei os itens. Uma caixa parada ao pé dos registos deu-me um olhar aborrecido e depois voltou para a sua revista. Como eu estava apenas molhada e fria – e não viciada e desejando sangue como as prostitutas vampiras que compravam à noite, eu não merecia sua atenção. Levei os meus produtos para o banheiro na parte traseira da loja. Eu tranquei a porta atrás de mim e tirei as minhas roupas molhadas, tremendo o tempo todo. Usando os suprimentos que tinha acabado de comprar, eu limpei o ferimento no meu ombro e o do meu bíceps, fechei-os com a pele líquida e cobri ambos com ataduras de gaze. As lesões ainda latejavam e pulsavam com calor, mas não eram profundas o suficiente para precisar de pontos. A bala tinha apenas raspado o meu ombro, em vez de atravessar. Claro, eu poderia ter ido à casa de Jo-Jo e tê-la cuidando de mim. Alguns minutos com a curadora Elemental do Ar e eu me sentiria como se tivesse passado uma semana sendo mimada num SPA luxuoso. Mas eu não tinha tempo para isso. Não se eu quisesse chegar ao Fletcher e ao Finn antes de eles estarem mortos. 13
As Runas são uma linguagem de magia, para levar o ser a uma evolução interior de sua alma. Suas mensagens são divinas, para o encontro de um bem maior. Mágicas e proféticas, as Runas fazem parte da tradição cultural dos vikings. Segundo o mito, essas pequenas peças foram encontradas pelo deus Odin que as divulgou entre seu povo como símbolos de sabedoria e do conhecimento de todos os mistérios dos deuses e dos homens.
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Eu tentei ligar para pai e filho novamente enquanto me encharcava de desodorante e refrescante corporal, mudava para roupas secas e rachava aspirina entre os meus dentes. Sem resposta. Abri os aquecedores de mãos e enfiei-os nos bolsos da jaqueta e jeans e no espaço entre as minhas botas e meias. As roupas ensanguentadas foram jogadas no lixo. Nenhum ponto em escondê-las. Eram roupas genéricas que podiam ser encontradas em qualquer loja. Não era como se eu tivesse costurado o meu nome dentro delas: Propriedade de Gin Blanco. Além disso, se Donovan Caine era esperto, ele iria verificar todas as lojas, postos de gasolina e empresas de táxi num raio de cinco milhas do Teatro. Mais cedo ou mais tarde, ele iria ver a filmagem de vigilância da loja Vende-Tudo. Ele saberia que eu vim aqui para me limpar. Mas isso seria tudo o que ele saberia. Eu rasguei o plástico que cobria as facas e testei uma com o meu polegar. Não era tão afiada como eu gostava; o equilíbrio estava fora, o punho de madeira era escorregadio como merda quente no verão, mas teria que fazer o trabalho. Praticamente qualquer coisa o faria se colocasse força suficiente por trás dele. Enfiei duas facas nas mangas da minha jaqueta. Uma foi contra as minhas costas e mais duas deslizaram para as minhas botas, descansando junto aos aquecedores de mãos. Brutus já tinha pagado por me trair. Agora era a vez do seu empregador misterioso e de qualquer um que se metesse entre mim, Fletcher e Finnegan. Eu esperava que Donovan Caine e o resto da força policial estivessem estocados com café e donuts e aprovados para horas extras. Porque a contagem de corpos em Ashland estava prestes a subir esta noite – muito. Escondida nas sombras, eu olhava para a porta da frente do Pork Pit. O porco de néon brilhava na noite escura, as suas luzes rosa assumindo um tom vermelho sangue. Ou talvez isto fosse apenas os meus pensamentos escurecendo o que eu poderia encontrar no interior da loja de aparência inocente. Olhei para o meu relógio. Depois das dez. Mais de duas horas desde a fracassada tentativa de assassinato no Teatro. Eu estava aqui agachada há três minutos, esperando por um sinal de vida no interior. Nada. Usando o meu celular, eu tinha ligado para o restaurante mais uma vez, mas Fletcher mais uma vez não tinha respondido. Eu tentei Finn novamente, também. Sem resposta. Eles provavelmente já acharam os dois mortos.
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O empregador de Brutus iria querer saber sobre mim – aonde eu iria, o que eu faria, com quem eu iria falar. Fletcher e Finnegan poderiam lhe dar essa informação. Duas horas eram um longo tempo para estar nas mãos do inimigo. Dois minutos eram suficientes para quebrar a maioria das pessoas. Mesmo sem magia. A coisa inteligente a fazer seria ir embora. Misturar-me com as sombras. Para desaparecer da forma que Fletcher tinha me ensinado. Da forma que sempre planejamos se algo desse errado. Eu tinha suficientes identificações falsas e cartões de crédito no meu colete para começar e, mais do que suficiente dinheiro escondido em várias contas no exterior para viver uma vida de luxo anônimo. Teria sido mais fácil do que comer torta de pêssego. Mas eu não podia fazer isso. Eu não podia empurrar Fletcher e Finn para fora da minha mente. Não podia lhes virar as costas. Não podia ignorá-los e ir embora como eles teriam querido que eu fizesse. Não quando poderia haver uma chance de salvar um ou ambos. Eu devia-lhes isso. Eles tinham me tirado das ruas quando eu não tinha outro lugar para onde ir. Eu devia-lhes tudo. E eles teriam feito o mesmo por mim. O pai e o filho teriam vindo por mim logo que pudessem, apesar dos seus próprios votos ao contrário. Não, eu não os estava deixando. Não agora, nem nunca. Além disso, eu nunca fui um dos que toma o caminho mais fácil na vida. Fácil era para as pessoas demasiada fracas para ultrapassá-lo e fazer o que precisava ser feito. E eu não era fraca. Não mais. Eu aproximei-me do Pork Pit por trás, deslizando para o beco por trás do prédio. Os meus olhos apanhados numa fenda preta na parte de trás do restaurante, um espaço estreito apenas grande o suficiente para que uma criança pudesse se espremer lá dentro. Um sorriso duro curvou os meus lábios. Um velho esconderijo meu, de quando eu vivia nas ruas. Vazio e muito pequeno para mim agora. Além disso, eu não precisava me esconder. Eu tinha me tornado o que sou para nunca mais ter de correr e me esconder novamente. Mas isso não significava que eu não devia ser cautelosa. Então eu abaixei-me ao lado de uma das lixeiras de metal. Observando. Ouvindo. Esperando. Nada. Nem mesmo o escavar de um rato no contentor ao meu lado. Algo muito, muito ruim deve ter acontecido para afugentar os ratos. Eu pus a minha mão sobre o edifício, ouvindo a pedra. O contentamento entupido de ontem tinha dado lugar a uma nota dura, estridente. Algo tinha aborrecido o tijolo, mexido com a sua paz habitual. Algo repentino. Inesperado. Sangrento. Violento. A sensação desagradável, baixa, acentuada e vibrante acertou na minha cabeça como um canto fúnebre para os mortos.
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Fletcher. A minha mão alcançou a porta de trás do restaurante. Eu parei. A porta estava entreaberta apenas um pouquinho, dificilmente o suficiente para ser perceptível, mas eu tinha passado os últimos dezessete anos observando tudo e todos à minha volta. As facas de cozinha deslizaram para as minhas mãos. Eu afastei-me da porta e olhei para ela. Um fino fio preto envolvia a maçaneta e seguia para o interior, era daí que vinha a abertura. Usando uma das facas, eu cortei o fio, com cuidado para não o agitar. Então eu fiquei de um lado da porta e abri. Uma espingarda tinha sido erguida dentro da sala traseira, manipulada para disparar quando a porta fosse aberta. Gire a maçaneta, entre e obtenha dois buracos no peito. Uma armadilha crua, mas eficaz. Eu esperei e ouvi. Silêncio. Frio, frio silêncio. Fletcher deveria ter estado trabalhando na cozinha ou fazendo o inventário no armazém. Deveria ter estado preparando o seu café de chicória e lendo o seu último livro. A calma gelou-me mais do que o rio tinha feito, embebendo os meus ossos como uma chuva gelada, apesar dos aquecedores de mãos químicos nos meus bolsos. Eu entrei para o restaurante, verificando o piso e o teto em torno por mais armadilhas. Nada. Eu parei após cada passo. Esperando, observando, procurando. Nada se moveu, nem mesmo as aranhas avô Pernalonga nos seus cubículos nos cantos. Finalmente, na frente do balcão da loja, eu o encontrei. Fletcher deitado em uma piscina vermelha de sangue no chão. Várias facadas irregulares e respingos de sangue manchavam o seu rasgado e dilacerado avental azul de trabalho, quase como se uma garrafa de ketchup tivesse explodido nele. As suas roupas estavam em frangalhos à sua volta, cortes defensivos escureciam as suas mãos e as suas articulações estavam inchadas e feridas, como se ele tivesse atingido alguém repetidamente. Dinheiro derramava da caixa registadora presa aderindo ao piso pegajoso e ensanguentado, juntamente com a cópia agredida de Where the Red Fern Grows14, que ele tinha estado lendo. Pedaços de um copo quebrado pontilhavam o chão ao lado dele, junto com restos do seu café de chicória. Cheiro de cafeína permanecia no ar. O aroma leve fez o meu coração torcer. Fletcher também tinha sido torturado – por um Elemental do Ar.
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É um livro de crianças escrito por Wilson Rawls sobre um menino que compra e treina dois cães de caça da raça Redbone Coonhound.
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Longos pedaços de pele estavam faltando no seu rosto, braços, mãos. O fedor de virar o estômago à carne crua dominava as piscinas redondas de sangue com cheiro de cobre no chão. O Elemental do Ar tinha usado os dedos como se fossem fodidas máquinas de pressão15, forçando oxigênio sob a pele de Fletcher. Fazendo-a empolar, queimar e inchar antes de ele a arrancar músculos, tendões e tudo. Uma pequena faixa aqui, um corte do tamanho do polegar ali, uma marca em forma de punho sobre o seu coração. Nenhuma das feridas era imediatamente letal, mas todas eram excruciantemente dolorosas. Os ferimentos eram tão profundos que eu podia ver os ossos de Fletcher em alguns lugares. Pedaços de marfim flutuando numa confusão vermelha de carne rasgada. Fletcher tinha sido esfolado vivo por magia. E o Elemental do Ar tinha continuado a torturar Fletcher, mesmo depois de ele estar morto. Essa era a única forma de explicar toda a falta de pele. Todas as empolas e bolhas horríveis de carne. Havia tantas, tantas delas. Todas causando mais dor do que a maioria das pessoas experimentavam numa vida inteira. Isso revirou o meu estômago. Eu posso ter matado pessoas, mas eu geralmente acabava com a sua vida rapidamente. Uma única ferida. Duas no máximo. Rápidas, seguras, precisas. Este... Alguém tinha tido extremo prazer nisto. Satisfação. Alegria, até. A minha visão ficou turva. Algo queimou nos meus olhos. Chorando. Eu estava chorando. Algo que eu não tinha feito em dezessete anos. Aspirei uma respiração e exalei um soluço. O meu corpo tremia. Os meus lábios tremiam. Uma leveza curiosa encheu a minha cabeça. Eu não conseguia olhar para Fletcher. Não agora. Não quando eu estava tão perto de perder o controle. De ceder a esta fraqueza emocional. Eu agachei-me e forcei-me a dar respirações profundas. Foquei-me em aspirar o ar profundamente dentro dos meus pulmões e a descer no poço que era o meu estômago revirado. Como se isso fosse a coisa mais importante do mundo. Como se Fletcher não estivesse deitado à minha frente. Morto. Quando voltei a mim mesma, eu abri os meus olhos cinzentos e encarei as feridas repulsivas. Não como uma pessoa que acabou de descobrir um assassinato horrível. Não como a mulher que acabou de perder o seu mentor, o velho homem que ela tinha amado. E definitivamente não como Gin, cujo coração rasgado tinha acabado de ser cortado e jogado num prato com batatas fritas.
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Do original sandblasters, que são uma espécie de máquinas que geram uma explosão de vapor carregado de areia, usada para limpar ou polir superfícies duras.
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Não, eu examinei as feridas como um assassino, como a Aranha. Fria. Clínica. Independente. Determinada a aprender o que podia a partir delas. E, eu encontrei alguma coisa. O Elemental que tinha queimado Fletcher era uma mulher, alguém com mãos delicadas e finas, a julgar pelo tamanho pequeno do punho sobre o coração de Fletcher. Eu fechei o meu próprio punho em comparação. O dela era menor. O fato de uma mulher ter torturado Fletcher não me surpreende. Eu aprendi há muito tempo que o sexo mais justo era muito mais cruel do que os homens – e muito mais paciente. Esta cadela sádica... Ela tinha se revelado ao torturar Fletcher. Ao usar a sua magia para feri-lo. Ao esfolá-lo vivo lentamente. Ao ouvi-lo gritar por misericórdia até a sua garganta estar tão vermelha como a sua pele crua. E ela ia pagar por isso. Mais do que ela alguma vez fodidamente imaginou. Qualquer outra coisa que tenha acontecido hoje à noite quer Finn estivesse vivo ou morto, eu não estava fugindo. Não disto. Não dela. Eu não estava mudando de cidade e escondendo-me em algum país estrangeiro por um tempo. Ashland podia não ser o lugar mais agradável, mas era minha casa. Mais importante, o Pork Pit era minha casa, por muito louco que isso soasse. Eu não estava deixando isso para trás. Não assim. Não com o sangue de Fletcher cobrindo o chão como uma nova camada de cera. Eu segurei a minha respiração, esperando que Fletcher virasse sua cabeça, abrisse os seus olhos verdes aborrecidos e resmungasse comigo por mantê-lo à espera. Mas ele não fez isso. E ele nunca mais o faria. A cadela que tinha feito isso ia pagar. Eu precisava ir. Precisava me mover. Precisava chegar a Finn, se já não era tarde demais. Mas eu não conseguia me afastar do corpo de Fletcher. Ele foi quem me tirou das ruas quando eu não tinha para onde ir. Quem me resgatou de lutar com ratos por lixo para comer. Salvou-me de vender o meu corpo para os cafetões vampiros. Ensinou-me a ser forte. Mostrou-me como sobreviver – e viver com o que eu tinha que fazer para continuar dessa forma. Enquanto eu estava agachada sobre o corpo sangrento de Fletcher, um fraco arrastar de pés soou. Um suave ruído de raspar que se introduziu na minha dor. Mais do que suficiente para colocar o meu controle frio e calmo de volta ao seu lugar. Uma sombra caiu sobre as poças de sangue a secar de Fletcher, transformando as poças carmesins numa cor preta escura. Desleixado. Desleixado. Desleixado. Os meus dedos se apertaram em volta da faca na minha mão. Eu me virei e apontei-a para o homem atrás de mim. O metal passou pelo ar e afundou no braço direito dele. Ele urrou de dor e pulou em mim, cortando com um canivete. Eu evitei o seu golpe desajeitado e estranho. Usando a velocidade do movimento dele, eu empurrei o homem para frente. Ele
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aterrissou no balcão e depois caiu para o chão. Pulei em cima dele e tirei a lâmina da sua mão. Eu sentei-me escarranchada em cima dele, esmagando as suas costelas entre os joelhos. Eu não me importei com a ferida latejando no meu ombro ou com o corte queimando no meu braço. Não pensei no frio que não deixava o meu corpo, na exaustão retardando os meus movimentos. Eu apenas lhe bati – mais e mais e mais, esmagando as articulações dos dedos apertados no seu rosto até que a pele em minhas mãos rompeu e sangrou. Sabia bem como feri-lo. Tão fodidamente bem. O homem gemeu e murmurou com dor. Eu obriguei-me a parar antes de matá-lo. Não ainda. Eu aspirei com uma respiração irregular. O cheiro metálico do seu sangue inundou a minha boca como saliva, fazendo-me querer mais. Eu puxei a minha faca para fora do seu braço. Ele rosnou. Eu inclinei-me para frente e pressionei o meu braço contra a sua garganta, cortando seu oxigênio. Eu trouxe a ponta sangrenta até onde ele podia vê-la. — Você vai me dizer tudo o que aconteceu nesta sala hoje à noite. Você vai me dizer para quem trabalha e quais são os planos dela. Você vai me dizer tudo o que eu quero saber e vai ser feliz por fazê-lo. — E por que... Faria isso... Cadela? — o homem cuspiu. Eu inclinei-me para frente até que os meus olhos cinza estivesse diretamente sobre os seus. — Porque o primeiro corte não vai te matar — eu disse numa voz calma, morta. — Nem o segundo, nem o terceiro, nem mesmo o décimo. Mas você vai desejar a todos os espíritos a quem reza para que o tivessem feito.
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Capítulo 07 Eu não tive um nome específico ou uma informação muito útil sobre ele. Eu estava muito irritada e com muita pressa para usar a delicadeza necessária para esses tipos de coisas. Além disso, ele era apenas a ajuda despachada para fazer a verificação final para ver se eu apareceria no restaurante. Ele tinha visto a porta de trás aberta e me seguiu para dentro. Mas o homem confirmou minha suspeita – Finnegan era o próximo. O que significava que eu tinha que correr se eu tinha alguma esperança de salvá-lo. Machucou-me muito deixar o corpo de Fletcher atrás do balcão. Sophia Deveraux, a anã cozinheira, que vinha no início de cada manhã para assar o pão fermentado para os sanduíches, iria encontrar Fletcher. Ela ligaria para a polícia. Revirando os restos e virando a caixa registradora, a polícia poderia pensar que foi um assalto que deu errado. Isso é o que eles pensam de todos os crimes em Ashland. Fletcher seria apenas mais uma estatística, mais um caso arquivado, outro assassinato não resolvido entre centenas a cada ano. Antes de sair do restaurante, eu lavei o sangue das minhas mãos e rosto, junto com minhas lágrimas. Eu também arrastei o corpo do homem morto para a câmara fria e o joguei em uma das geladeiras vazias. Eu gravei uma nota em um adesivo rosa na parte superior do aparelho para capturar os olhos de Sophia. Ela saberia o que fazer com o corpo. Sophia era a anã que era contratada pelo Fletcher para o trabalho de moça de eliminação. Eu cheguei por trás do freezer diferente e puxei uma mochila preta, uma das várias que eu tinha escondido em vários pontos da cidade. Dinheiro, celulares, cartões de crédito, armas, identidades falsas, maquiagem, e poucas roupas. Tudo o que eu precisava para fazer uma escapada rápida, mudar minha aparência ou fazer um trabalho inesperado e sujo. Eu voltei para frente do restaurante e agachei ao lado de Fletcher. Mais algumas lágrimas se reuniram em meus olhos enquanto eu ainda olhava para ele, de forma brutalizada. Eu deixei o ardor, a umidade salgada escorrer pelo meu rosto. Não havia tempo para lamentar corretamente por Fletcher e deixar-me entristecer. O tempo para fazêlo viria mais tarde – quando a cadela que o tinha matado estivesse tão morta quanto ele estava. Conforto frio. Porque não importa o que eu lhe fizesse, não importa o quanto eu a torturasse, o quão devagar eu a matasse, não traria Fletcher de volta. Nada faria isso.
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— Adeus, Fletcher — minha voz se quebrou nas palavras. Uma lágrima pingou da minha bochecha e se misturou com o sangue e queimaduras em seu rosto. Eu arrumei e limpei o resto da umidade, compondo-me mais uma vez. Então eu quebrei o vidro e a fechadura da porta da frente, pulei para fora e me afastei. Isso me tomou vinte minutos para alcançar o lugar do Beco de Finnegan. Como eu, Finn vivia em um apartamento em um prédio perto do restaurante. Exceto que o lugar dele fazia o meu parecer uma vagabunda caixa de papelão molhada. A torre de metal gigante tinha vinte andares, com uma torre elegante em cima, como se fosse um arranha-céu real em vez de um pobre substituto no sul. Eu me dirigi em torno da entrada lateral para os inquilinos, maravilhosamente escondida atrás de duas árvores altas de magnólia. Um minuto e duas lâminas de gelo que eu conjurei, a porta abriu e eu escorreguei para dentro. Apesar da hora tardia, as pessoas ainda rondavam os corredores, como os empresários que viviam no prédio trouxeram suas conquistas noturnas para um pouco mais de bebida e um pouco mais de álcool – alimentado desajeitado e fodendo no escuro. Eu entrei em um dos elevadores em meu caminho para cima. Um homem com oitenta anos vestindo um smoking amarrotado e uma peruca cabeluda babava na orelha de uma prostituta loira, enquanto outro esfregava sua virilha florescente. Uma terceira garota, morena, destacava-se ao lado, não envolvida ou não se importando com o ménage... Quatro era realmente uma multidão. As duas prostitutas me deram um olhar duro. Seus lábios vermelhos recuaram e elas mostraram as presas para mim. Vampiros. As presas chiques, da cor branca pérola e seus dentes pontudos. Mas quando elas perceberam que eu não partilhava das suas ações, elas voltaram a dizer ao cara velho o quanto eles estavam indo se divertir se esfregando nele. Meus lábios se contraíram. Uma maldita diversão que eu tinha ouvido a noite toda. O homem saiu no sexto andar com suas duas amigas da noite, deixando-me sozinha com a terceira mulher. Eu olhei para suas roupas. Cor brilhante, chamativo o suficiente, não muito apertada, cerca do tamanho M. Funcionaria. Eu bati no botão de parada do elevador e me virei para a outra mulher. Sua mão caiu sobre sua bolsa e ela me olhou com o olhar desconfiado de uma garota que sabe que estranhos podem ser perigosos, especialmente na parte legal da cidade. Seus dentes picaram através de seus lábios. Outro vampiro. — Eu darei a você dois mil dólares pelas suas roupas, sapatos e aquela bolsa — eu disse.
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— As roupas? — ela perguntou seu olhar castanho ainda mais incerto agora. — É isso? Nada estranho? Nada extra? Eu mostrei a ela um maço de notas. — Nada estranho ou extra. Cinco minutos depois, a puta saiu do nono andar vestindo minha jaqueta barata, jeans e botas. Um minuto depois disso, eu saí no décimo primeiro andar. Eu fui até a escada de emergência e abri minha mochila. Escova de cabelo, batom, pó compacto. Não demorou muito para me maquiar, prender meus cabelos descoloridos e de outro modo me transformar em Gin, o nome da excêntrica garota. Eu também peguei três facas de silverstone para fora da mochila, colocando a primeira contra minhas pequenas costas e a segunda na palma da minha mão direita. A terceira encheu a minúscula bolsa da prostituta. Pronta para a batalha, eu deixei a bolsa na escada, voltei ao elevador e andei até o décimo segundo andar – o andar de Finn. Banqueiro de investimento, especialista em computadores e tudo a cerca do caráter obscuro de Finnegan Lane tinha feito bem para ele, razão pela qual seu apartamento pegava todo o piso em vez de apenas uma parte, como edifícios com outras unidades habitacionais. Finn não acreditava em esconder sua riqueza e ele não se importava que sua forma de acanhado novo rico chateasse os mais velhos. Aqueles povos, especialmente os vampiros que tinham estado ao redor desde a Guerra Civil, desprezavam o seu chamativo estilo de vida, mas Finn fazia dinheiro suficiente para levá-los a engasgar com as suas normas antiquadas do sul. Ainda, eu sempre estava com cautela extra quando visitava o lugar de Finn. Ele pode não ser tão profundo no negócio de assassinato como eu era, mas ele ainda fazia uma abundância de inimigos com seu banco e regime de corretor – legal e de outra forma. Pessoas eram mais viciadas sobre dinheiro do que qualquer outra coisa, mesmo sexo. Adiciona à mistura, Finn um mulherengo desenfreado e, era uma maravilha que ninguém tivesse me contratado para matá-lo anos atrás. O elevador abriu e saí para a antecâmara brilhante que era a frente do apartamento de Finn. Uma mesa baixa de nogueira. Duas cadeiras. Espelho dourado na parede. Um par de árvores falsas de noz plantadas em ambos os lados da porta da frente. Uma decoração sulista no seu melhor. Um guarda parado do lado de fora sacudiu sua cabeça na minha direção ao som do elevador quando abrindo. Um homem grande, alto e largo com um pescoço musculoso que teria sido perfeito em um zagueiro da NFL. Provavelmente um pouco de sangue de gigante em sua árvore genealógica. Ainda assim, ele era só um cara. Eu teria pelo menos três
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homens aqui. Talvez mais, desde que eu sabia exatamente do que eu era capaz – e quanto determinada eu estava em pegar Finnegan antes que ele parasse de respirar. O guarda fechou a cara, mas ele não foi para sua arma ou bater na porta atrás dele para alertar quem quer que possa estar lá dentro. Erro número um. Eu me dirigi a ele, balançando meus quadris e deixando a minha pequena saia de zebra listrada subir e mostrar minhas longas e torneadas pernas, com meias arrastão. Eu já tinha perdido a maioria dos botões da minha blusa de seda escarlate para deixar meus cinco dólares espiando através do sutiã preto. O piso da antecâmara era feito de mármore e as delicadas pedras murmuravam um barulho no momento em que meus saltos atravessavam. Pela primeira vez esta noite, meu espírito rastejou. As vibrações seriam diferentes se Finn já tivesse morrido. Mais escuro, mais baixo, mais sombrio. Como as pedras do Pork Pit. Um som que eu nunca, nunca esqueceria. Fletcher. Eu empurrei todos os pensamentos sobre meu mentor, todas as fracas, devastadoras emoções de lado e foquei no homem a minha frente. O que eu estava aqui para fazer. Eu parei cerca de três passos de distância do guarda, fazendo uma pose de modelo, tombei minha cabeça, bati meus cílios e dei a ele meu olhar mais insinuante. Se houvesse uma coisa que todas as mulheres do sul sabiam instintivamente fazer, era flertar. É codificado em nosso DNA, juntamente com uma predileção por gordura, açúcar e chapéus de tamanho grande. — Olá, bonitão — eu disse uma voz suave e sussurrada. — Eu sou Candy. Estou aqui para ver o Finny. — Sr. Lane está com outro assunto essa noite. Reunião importante — o tom do guarda foi rude, mas seus olhos pálidos chamuscaram um caminho dos meus seios até minhas pernas e voltaram. Eu ri. — Sim, comigo bobinho. O guarda deixou-se olhar um segundo a mais, então sacudiu sua cabeça. — Desculpe. É outra reunião. Você vai ter que sair. Eu amuei.
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— Mas Finny e eu sempre temos encontros aos domingos à noite. Eu sou sua menina depois de horas. O guarda não disse nada, mas seu olhar foi pincelando meus peitos e pernas. Se ele fizesse isso mais rápido, ele teria vertigens. Eu amuei por mais um instante, então, ampliei meus olhos cinzentos e sorri, como se o pensamento mais incrível do mundo tivesse acabado de me ocorrer. Eu dei um passo à frente. O guarda empertigou-se, mas ele não foi para trás. Eu olhei para ele através dos meus cílios e trilhei meus dedos em seu peito largo. Ele não estava usando nada por baixo da camisa azul listrada. Nenhum colete, sem equipamento de proteção. Ruim para ele, bom para mim. — Bem... E você docinho? Eu posso te interessar mostrando alguns doces da Candy hoje à noite? Uma garota precisa pagar seu aluguel, se você sabe o que quero dizer. O guarda abriu sua boca, mas ele nunca teve a chance de responder. Porque eu trouxe minha mão direita para cima e meti a faca que eu tinha na palma da mão em seu peito. Seus olhos esbugalharam com surpresa. Eu apertei minha mão sobre sua boca para impedi-lo de gritar, arrancando a faca para fora e o esfaqueando novamente. O guarda deveria ter atirado em mim no segundo em que eu saí do elevador. Não cometa o erro de se deixar ao alcance das minhas armas. Desleixado, desleixado, desleixado. Mas uma garota bonita é uma garota bonita e homens sempre querem olhar, conversar e foder com elas. Mesmo que seu chefe o tivesse avisado para tomar cuidado com qualquer mulher que viesse a chegar perto dele hoje à noite. Os olhos do guarda vidraram e ele deslizou para baixo. Eu facilitei seu corpo grande e pesado para o chão e retirei minha faca. Eu também vasculhei os bolsos, tirando sua carteira e celular e colocando-os sobre a mesa de nogueira para coletar mais tarde. Ele não estava usando nenhuma joia, nem mesmo um relógio. Debaixo dos meus pés, a luz delicada que soprava pelo chão de mármore tomou uma nota mais dura quando as poças de sangue jorraram em cima do piso. Outro som que eu estava familiarizada. Uma vez que eu tinha cuidado do guarda, eu virei minha atenção para a porta do apartamento. Uma vez que as próprias paredes foram construídas com metal e madeira em vez de pedra, eu não podia usar minha magia Elemental para sentir o que esperava atrás da barreira. Mas eu não estava indo embora sem descobrir o que estava acontecendo, ou tinha acontecido, ao Finn. Eu tinha apenas que me arriscar. Eu virei a fechadura e abri a porta com um barulho. Vozes chegaram para mim, fracas, baixas e murmúrios indistintos. Eles deviam estar na sala de estar. Deslizei dentro da porta e parei. O apartamento de Finn tinha a forma de um grande F. O elevador levava à
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antecâmara estreita, que por sua vez levava ao corredor em que eu estava. O corredor corria por todo o apartamento dando a volta ao apartamento antes de tomar uma curva a direita e abrir para uma ampla sala de estar. O quarto principal e o banheiro estavam localizados na extremidade da sala. A meio caminho entre aqui e lá tinha outra curva a direita, que levava a cozinha. Eu andei nas pontas dos pés, facas em ambas as mãos agora e me precipitei para a cozinha. Aparelhos, bancadas de mármore, um par de pias. Eu passei por eles, colada à parede e me movendo mais para dentro da sala. Eu parei quando vim para a entrada que conectava a cozinha à sala de estar. Um espelho brilhava na parede de trás do outro quarto. O painel de vidro deu-me clareza, dos reflexos para trás dessa área. Eles o tinham amarrado uma cadeira de espalda reta. Finnegan Lane era muito filho de seu pai, com uma pele corada, um compacto corpo musculoso e cabelo cor de noz escura. Robusto escocês-irlandês armazenado, assim como eu e tantos outros povos nas Montanhas Apalaches. Seus olhos teriam sido um verde alegre, se eles não estivessem quase fechados de inchaço. Corte e hematomas apareciam em seu rosto e sangue escorria pelo seu queixo, salpicando sua camisa branca, calças pretas e sapatos engraxados. A raiva encheu-me com a visão do rosto espancado de Finn, mas eu empurrei-a de lado e fiquei olhando para seu corpo, procurando por pedaços faltando em sua pele e outros sinais de tortura. Eu não vi nenhum e o cheiro da carne rasgada não contaminou o ar. O Elemental do Ar que tinha torturado Fletcher não estava aqui – ainda. Finn parecia que tinha saído para a cidade antes de ter sido amarrado. Ele devia mesmo ter estado na ópera hoje à noite. Finn apreciava esses tipos de funções sociais, se misturando com as pessoas ricas que tinham mais segredos que ele e fariam qualquer coisa para mantê-los. Se Finn esteve na casa de ópera, teria sido fácil o suficiente agarrá-lo na confusão e trazê-lo de volta ao apartamento para uma conversa mais privada. Também explicaria a demora em tê-lo torturado e matado até agora. Eu estudei os guardas. O primeiro cara tinha mais de dois metros de altura, com largos e poderosos ombros, pele pálida e leitosa, de tamanho grande e olhos que pareciam de inseto. Um gigante e, definitivamente, musculoso, que é por isso que eu não vi nenhuma protuberância folgada sob seu terno. Quem precisava de uma arma quando seus punhos eram do tamanho de bolas de boliche? O outro cara era pequeno, um humano. Sua pele era escura, como ébano polido e ele usava um conjunto de óculos de moldura dourada quadrados. Ele carregava uma arma – uma em cada ombro. Enquanto eu olhava, o Pequeno se adiantou. — Apenas nos diga onde ela está e tudo isso pode acabar — ele disse em uma voz agradável. — Eu prometo que faremos o final ser rápido. Três na parte de trás da sua cabeça. Você não sentirá nada.
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Finnegan levantou a cabeça e olhou para o cara através de seu rosto machucado e inchado. — Aqui está o que eu acho sobre você e sua promessa fudida — Finn cuspiu sangue na cara do Pequeno. A saliva escarlate acertou seus óculos, vomitando sobre as lentes como o líquido do limpador de para-brisa. O Pequeno endireitou e tirou os óculos. Ele sacudiu a cabeça, o Grandão bateu com o punho no rosto do Finn. Seu nariz bateu e triturou como cereal. Apesar da batida, eu tive que sorrir. Finnegan Lane nunca faltou para o desafio ou estilo. O Grandão terminou sua mais recente rodada de punição e Finn sentou lá tossindo sangue. O Pequeno tirou um lenço do bolso e limpou o óculos. Depois das lentes estarem de volta em seu rosto, o Pequeno circulou Finn, tentando sua tática novamente. — Certamente você vê como isso é inútil. Seu pai já está morto — Fletcher. Ouvir as palavras em voz alta foi um puta tapa no meu coração. Eu trinquei meus dentes contra a dor e foquei no que era importante agora – Finn. — Ninguém está vindo salvar você — o Pequeno continuou — Com certeza não a assassina. Ela saltou uma sacada de cem metros na casa de ópera. Se a queda não a matou, ela está provavelmente em seu caminho para fora da cidade, isso se a polícia não pegá-la primeiro. Eu fiz uma careta. Polícia? Eu não gostei de como isso soou. Especialmente no modo como Pequeno se referiu a eles, como se eles fossem sua própria força pessoal. Isso se transformou de uma mera atitude direita para um balão cheio de conspiração. Eu gostaria de saber quanto tempo Brutus, Pequeno e seus compatriotas tinham estado planejando isso – e como Fletcher, Finn e eu tínhamos sido tão desleixados para nos deixar sermos pegos no meio dessa teia de aranha pegajosa. — Vamos lá — o Pequeno adulou. — Faça isso fácil para você. Diga-nos onde ela pode ir. É tudo o que queremos. Alguns lugares para começar a procurar por ela, se ela já não estiver morta — Finn gargalhou, embora o esforço o fizesse tossir mais sangue. — O que é tão engraçado? — o Pequeno perguntou. — Eu pensaria que um homem na sua situação seria incapaz de algo tão tolo como gargalhar — Finn levantou sua cabeça. Um piscar de verde pode ser visto através dos machucados vermelhos e roxos que prejudicaram seu rosto. — Ela não está morta e você não pode pegá-la porque ela é mais esperta do que você. Melhor. Mais forte. Mas ela virá para você em breve, idiota. Para você e para quem quer que você trabalhe. Você deve também começar a planejar seu funeral. — Ela é apenas uma mulher — Pequeno apontou. Finn riu novamente, uma risada profunda e gutural que me puxou. Eu nunca tinha percebido antes o quanto o som da sua risada era parecido com Fletcher.
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— Ela não é uma mulher, ela é a porra da Aranha. É por isso que a contratou, lembra? Porque ela é a melhor. Então você pode pegar suas perguntas e promessas e trepar sozinho de seis formas diferentes até domingo. Porque eu não direi outra palavra e eu estarei vendo você no inferno realmente em breve. Eu me certifiquei que as facas estavam posicionadas corretamente em minhas mãos. Eu tinha só uma chance antes que matassem Finn. Eu não perderia Finn. Nem agora, nem nunca. — Ele não vai falar. Isso é inútil. Acabe com ele — Pequeno estalou. O Grandão avançou e recuou o punho para o golpe fatal. Finn sentiu sua morte se aproximando e sorriu. Eu contornei toda a parede e entrei na sala. O Grandão estava muito focado em Finn para me notar. Minha primeira faca entrou em seu olho esquerdo, um dos poucos pontos macios na cabeça de um gigante. O Grandão estremeceu como uma marionete cujos fios haviam sido arrebentados. Seu outro olho de inseto alargou e, por um momento, eu pensei que poderia soltar sua cabeça como um brinquedo. Ele caiu de joelhos, então a lançou para frente. Sua cabeça acabou no colo de Finnegan. Ele nunca fez um som. Pequeno era mais atento. Mais rápido, também. Ele conseguiu dirigir uma arma de dentro de seu paletó. Mas eu cruzei a sala em passos rápidos e bati a arma longe antes que ele pudesse levantá-la. Pequeno virou para mim, mas eu evitei seu grande golpe, que surgiu de sua fraca defesa e mergulhei a segunda faca em seu coração. Ele convulsionou contra mim, chorando e lutando para se livrar, mesmo enquanto seu sangue revestia minha mão. — Você realmente deveria ter escutado Finn — eu sibilei em seu rosto, forçando a arma mais profunda em seu peito. Ele morreu balbuciando. Pequeno afrouxou contra mim e eu o empurrei para longe. O corpo bateu no chão. Um som encantador. — Já era hora de você chegar aqui — a voz de Finn saiu em uma baixa e grossa voz cheia de dor. Eu puxei a faca para fora do Pequeno, em seguida puxei a outra para fora do olho do Grandão. Eu usei as armas sangrentas para cortar através das amarras de Finn, então empurrei o corpo do gigante fora dele. — E o homem do lado de fora? Ou tenho mesmo que perguntar? — Finn disse. Eu olhei para ele. — Certo. Pergunta estúpida. Olhei para os corpos no chão. Sangue escorria de suas feridas, arruinando o branco imaculado do tapete felpudo e macio. Ainda mais gotas de sangue me cobriam, como se um balde de tinta tivesse sido despejado sobre minha cabeça. Mas tudo que eu podia ver era o corpo de Fletcher, espancado, esfolado e torturado dentro de Pork Pit. Quebrado e morto. Meus olhos agitaram para Finn. Seu rosto lindo, reduzido a polpa mole. Eu não sentia raiva frequentemente, mas um nó frio e duro pulsava em meu peito, exatamente onde seria meu coração.
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Meu polegar traçou sobre o punho da minha faca. Muito rápido. Isso tudo tinha sido malditamente muito rápido. Esses homens não tinham sofrido como Fletcher tinha. Eles quase não sentiram nada. Uma faixa de fogo, o mundo desmoronava e eles tinham ido embora. Fácil. Rápido. Relativamente sem dor. O nó de raiva em meu peito se contraiu e eu quis pular no corpo dos guardas, picar, talhar e mutilá-los até que ninguém tivesse certeza de qual parte era, ou o que era de quem. Para enviar uma mensagem ao seu chefe, do jeito que ela havia enviado a mim brutalizando Fletcher. Mas Finn estava ferido e precisava de cuidados. Além disso, algo sempre pode dar errado. Eu tive adrenalina suficiente para isso, mas agora eu podia sentir a queda vindo. Minhas mãos e pernas se contorciam de fadiga, estresse e excesso de uso. E eu ainda me sentia fria e úmida de ter mergulhado no rio gelado. Vingança, justiça, retribuição, carma, qual quer que seja a merda que você queira chamar, poderia esperar. Mantendo Finn a salvo e respirando, era minha prioridade agora. Minha missão. Era o que Fletcher teria me pedido para fazer. Pela primeira vez na minha vida, eu estava fazendo exatamente o que o velho homem queria.
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Capítulo 08 Virei minhas costas para os corpos. Finn abaixou-se, apoiando-se nas mãos e nos joelhos, vasculhando os bolsos dos homens mortos, retirando suas carteiras e telefones celulares. Ele também arrancou seus relógios e uma corrente de ouro do pescoço do Pequeno. Finn começou a abrir uma das carteiras, mas eu a tirei da mão dele. — Mais tarde — eu disse. — Precisamos levar você até Jo-Jo. Você parece merda requentada. Finn fez uma careta. — Assim tão ruim? — Confie em mim. Você não quer se olhar no espelho agora. Seu ego não aguentaria. Finn bufou. — Por favor. Meu ego aguenta qualquer coisa — ele apontou com a cabeça para os corpos. — E eles? — Sophia, claro. Você sabe como ela adora esse tipo de trabalho — peguei o telefone sem fio que descansava em uma mesa e marquei o número sete. Como eu, Finn tinha o número da anã programado na discagem rápida. O telefone tocou duas vezes antes que ela atendesse. — Humpf? — o grunhido baixo era a habitual saudação de Sophia Deveraux. A anã não era muito de conversas. — É Gin — eu disse. — Eu fiz uma bagunça no apartamento do Finn. Preciso que você venha limpar tudo. — Humm — um pouco mais de interesse neste grunhido do que no primeiro.
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— Dois dentro, um antes de chegar ao elevador. Pequeno, médio, e grande — nosso código para humano, meio-gigante e gigante. — Danos? — sua voz mais grossa seria a de um viciado em uísque e tabaco. Quando ela se dignava a falar, Sophia gostava de se limitar a pequenos surtos de sílabas. Nada muito extenuante. Então novamente, sua irmã anã, Jo-Jo, falava bastante por ambas. Eu olhei o tapete ensopado de sangue. Finn poderia ter pensado que era legal instalar aquele tapete de pelúcia branco, mas agora parecia que espaguete cobria todo o chão – com um par de almôndegas por cima. — Vamos apenas dizer que o piso de mármore fora do apartamento será consideravelmente mais fácil de limpar do que o tapete no interior. Você vem? — Hum-rum — o grunhido de Sophia para sim. — Ótimo. E tome cuidado. Pequeno, médio e grande podem ter alguns amigos chegando mais tarde. Nós vamos ver Jo-Jo. Vemo-nos lá — eu desliguei o telefone e me virei para Finn. — Ela está vindo. Vá buscar o que você vai precisar para os próximos dias. Roupas, seu computador, o que seja. Você vai ficar comigo até que isto esteja acabado. Finn assentiu, se levantou e deu um passo. Uma de suas pernas cedeu. Ele tropeçou, cambaleou e quase caiu sobre a cadeira onde tinha estado amarrado. Corri para seu lado, coloquei meu ombro sobre o seu e o ajudei a ir para o quarto. Finn se sentou na cama enquanto eu joguei algumas roupas, seu laptop e mais alguns itens solicitados em um saco, junto às carteiras e joias que tínhamos tirado dos caras mortos. Dez minutos mais tarde, as portas do elevador se abriram, revelando a garagem escura anexada na parte traseira do edifício de Finn. Eu o ajudei a sair do elevador. Cimento escuro e sujo surgiu em todo o lado. Luxuosos carros de modelos recentes estavam estacionados em seus lugares esperando em frente de uma rampa estreita que subia e virava para o próximo nível do parque. Luzes fluorescentes cintilavam sobre os veículos e um mata-mosquito estava pendurado no canto. Uma mariposa que voava por ali decidiu pousar na brilhante e tentadora superfície azul. O resultante, estalo e chiado soaram como uma granada explodindo no espaço fechado. Finn apontou para um conjunto de escadas que corria entre os dois níveis e nós descemos por elas nas pontas dos pés. O cheiro de óleo de motor e gás de tubo de escape engrossava o ar. Deslizei os dedos de minha mão contra a parede de concreto. Notas agudas de preocupação pontuavam o murmurar da pedra. Nada incomum. Todo mundo ficava um pouco paranoico e claustrofóbico em estacionamentos, até eu.
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O baixo e constante murmúrio não aliviou minha mente. Não depois da noite longa e sangrenta que eu tinha tido. Mas nós chegamos até ao segundo nível sem qualquer incidente. Eu arrastei Finn para o carro mais próximo que eu vi que era dele – um veloz Aston Martin prata, que teria se sentido em casa num filme de James Bond. Finn colecionava carros como outras pessoas colecionavam enfeites. — Não — Finn gemeu. — Não o Aston. Tudo menos o Aston. Eu só o tenho há um mês. O sangue nunca vai sair dos bancos de couro. Nem mesmo Sophia será capaz de tirálo. — O que você sugere, então, sua alteza? — eu rebati. Ele apontou. — Pega o meu Benz. Pelo menos é bordô por dentro. Revirei os olhos, mas fiz como ele pediu. Finnegan Lane podia não ser meu irmão de sangue, mas ele me irritava tal como um irmão faria. Provocando, irritando, zombando, até eu querer cortar sua língua e fritá-la em uma frigideira para o jantar. Ainda assim, eu faria qualquer coisa por ele. Mesmo manchar o veículo que ele preferia com o seu sangue. Abri a porta do Benz preto, despejei Finn na frente, joguei nossas coisas atrás e afundei no banco do condutor. O couro era tão macio como um colchão quente, acomodando minha bunda, endireitando minha espinha, apoiando meu pescoço e ombros. Humm. Sentia-me tão bem, apenas ficar aqui quieta por um minuto e não ter que me preocupar com a nossa próxima jogada – ou sobre quem poderia estar esperando na esquina para me abater. Eu poderia ter colocado minha cabeça para trás no banco e estar dormindo em menos de um minuto. Pena que minha noite estava longe de terminar. Dois minutos depois, saímos da garagem. Eu virei na rua adequada e segui para Norte, em direção à casa de Jo-Jo. Minha rota nos levou para o Pork Pit. O porco de néon brilhava como um farol na escuridão. Eu tentei não pensar em Fletcher, deitado em uma poça de seu próprio sangue na vitrine, mas a imagem de seu corpo esfolado e sua carne arruinada, encheu minha mente. Pela segunda vez hoje à noite, lágrimas quentes picaram em meus olhos. Droga. Eu não tinha chorado tanto assim desde que era uma criança. Finn viu o brilho de humidade. — Ei, ei. Ele não iria querer que fizesse isso. Você sabe como ele se sentia sobre o choro. — Um desperdício de tempo, energia e recursos.
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As palavras saíram automaticamente, do mesmo jeito que tantos outros ensinamentos de Fletcher saíam. As lágrimas eram difíceis de fazer recuar, mas eu consegui. Eu sempre conseguia. Nós seguimos em silêncio. Eu parei em um sinal vermelho e respirei fundo. Hora de começar a trabalhar. Finn e eu precisávamos conversar antes de chegarmos à casa de Jo-Jo. — Conte-me. Onde você estava quando eles pularam em você, porque eles levaram você de volta para o apartamento. — Claro — Finn mudou seu corpo batido para um lado para que ele pudesse olhar para mim sem ter que virar a cabeça. — Papai me falou sobre o trabalho, naturalmente, então eu decidi participar da inauguração da nova ala do Teatro. Para apoio moral — eu levantei uma sobrancelha. — Tudo bem, então, minha amiga queria ir também, eu tinha alguns clientes com quem precisava falar — Finn admitiu. — Vários pássaros, uma pedra. Sabe o que quero dizer? — Claro — eu disse em um tom irônico. Finn continuou sua história. — Então eu estou no Teatro, camarote, ótimos lugares, quando eu ouço um homem gritar. Pelo menos, eu acho que era um homem. Bastante agudo se você me perguntar — Gordon Giles, depois de eu cortar a garganta do outro assassino. — E eu deduzi que você tinha feito o seu negócio e estava em seu caminho para fora do edifício. Então eu e minha amiga saímos com todos os outros para ver sobre o que era a comoção. E eu vi um cara segurando uma arma perseguindo um vulto escuro e magro — Donovan Caine me perseguindo pelo corredor. — As notícias de que houve um assassinato em um dos camarotes se espalharam. Minha amiga está muito, muito aborrecida, então eu sugiro que vamos para algum lugar mais sossegado onde ela pudesse acalmar. Revirei meus olhos novamente. — Você quer dizer, onde você pudesse ficar sozinho com ela e ter sexo estou-tãofeliz-por-não-ter-tido-minha-garganta-cortada. Um sorriso fraco puxou para cima os lábios inchados de Finn. — Nós descemos para um dos salões privados e ficamos envolvidos. A porta abre com um estrondo exatamente quando as coisas estão ficando interessantes. — Então eles apanharam você com suas calças para baixo. Finn suspirou.
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— Os bastardos podiam pelo menos, ter nos deixado acabar. Mas eles me puxaram para longe, disseram à minha amiga para desaparecer e me levaram para o meu apartamento. Eu suponho que eles estavam esperando que você aparecesse para me salvar. — Eles disseram alguma coisa? Qualquer menção para quem eles estavam trabalhando? Por que eles queriam Gordon Giles morto? Qualquer coisa? — Nada — Finn balançou a cabeça. — Eles apenas começaram a bater em mim e a exigir saber onde você estava. Eu continuei dirigindo, parando em sinais vermelhos, fazendo as curvas apropriadas, mantendo o carro sob o limite de velocidade. A última coisa que eu precisava era ser parada pela polícia, especialmente considerando o fato de que eu e Finn estávamos cobertos de sangue. Estávamos quase a chegar à casa da Jo-Jo quando Finn fez a pergunta que eu estava temendo desde que invadi seu apartamento. — E sobre... Sobre Papai? — ele perguntou em voz baixa. — O que eles fizeram com ele? Meu coração deu uma guinada, mas eu mantive meus olhos cinza na estrada, evitando o brilhante e penetrante olhar de Finn. Minhas mãos estrangularam o volante. Eu desejava que fosse o pescoço da Elemental do Ar, ao invés do volante. — Esfaqueado até à morte. Encontrei-o no Pork Pit. Ele já estava morto quando cheguei lá. Eu deixei de fora a parte sobre a Elemental do Ar e a tortura terrível. Finn não precisava ouvir isso. Apesar de seus negócios obscuros e eventual necessidade de violência, Finnegan Lane realmente era uma alma gentil. Roupas, carros, mulheres, dinheiro, essas eram as coisas que ele gostava. Finn era perfeitamente feliz fodendo e bebendo, contando seu dinheiro e tentando arrumar mais. Inofensivo, pelos padrões de Ashland. E a razão pela qual Fletcher tinha treinado a mim para ser um assassino e não seu filho, apesar de aos trinta e dois, Finn ser dois anos mais velho que eu. Eu era mais forte do que ele. Mais dura. Mais fria. Eu tive que ser apenas para sobreviver à minha infância. Finn continuou me olhando, querendo saber o resto da história. Dei-lhe a versão curta e editada. A luta com Brutus no Teatro. Ser perseguida por Donovan Caine. O mergulho no rio. Ir para o Pork Pit e depois para o apartamento dele. — Eles também mandaram um cara para o restaurante, no caso de eu aparecer — eu acrescentei.
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— E o que você fez com ele? Eu dei a Finn uma olhada plana. — O que você faz melhor — ele murmurou. — Obrigado por isso, Gin. Eu encolhi os ombros. — Fletcher foi como um pai para mim. Era o mínimo que eu podia fazer. Eu só queria ter tido mais tempo com o bastardo. Mais tempo para cortar, ferir e matar – mais tempo para agir e menos tempo para pensar sobre o que eu tinha perdido hoje à noite. E o quão fodidamente essa perda doía.
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Capítulo 09 Apesar da escuridão, uma mudança notável varreu as ruas da cidade enquanto eu dirigia mais longe do Pork Pit. A guerra civil poderia ter sido mais, mas uma batalha de outro tipo ainda alastrava-se em Ashland – entre North Town e South Town. As duas regiões da cidade pegaram seus nomes das suas respectivas localizações geográficas e foi unido pelo amplo, limite circular do centro da cidade. Mas isso é onde as similaridades terminam. South Town era a bruta, a parte bruta da cidade, onde os trabalhadores pobres e gente de colarinho azul vivem em habitações públicas degradadas entre vampiras prostitutas, viciados e outro lixo branco. O Pork Pit e meu apartamento eram localizados no centro, perto da fronteira de South Town. North Town era uma debutante em comparação, lar de yuppies16 do colarinho branco e monetários da cidade, social e mágico da elite. A área de destaque temático e subdivisões com nomes como Tara Cutesy Heights e Lament Lee, juntamente com alastramento de mansões em estilo fazenda. Mas a moda antiga, elegância antebellum17 naquela parte da cidade faz nada melhor. Em North Town pessoas chamam você de doce na sua frente enquanto você é apunhalado pelas costas. Pelo menos em South Town a decoração combina com o perigo. Jo-Jo fez sua casa em North Town, condizente com o seu poder Elemental do Ar, riqueza, status e conexões sociais. Eu fiz a volta dentro da subdivisão Tara Heights, deslizando em uma rua marcada como Magnólia Lane e dirigi o Benz em uma rodovia pavimentada com paralelepípedos circulares brancos. Eles brilhavam como ossos brancos sob o luar pálido. A resplandecente casa de três andares, com plantação e fileiras de colunas brancas empoleiradas no topo de uma colina gramada, um diamante Rainha em seu trono de esmeralda. Três passos a levaram até a varanda envolvente, parcialmente encoberta por trepadeiras Kudzu enroladas em simples roseiras. Uma lâmpada queimada solitária na varanda, tornando as sombras em torno da casa um pouco menos sinistras. 16 17
"Yuppie" é uma derivação da sigla "YUP", expressão inglesa que significa "Young Urban Professional", ou seja, Jovem Profissional Urbano. Aconteceu ou existiu nos EUA no período antes do início da guerra civil em 1861.
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Eu ajudei Finn a sair do carro e subir os degraus para a varanda. Uma porta de tela frágil na fachada e uma mais pesada de madeira. Eu puxei a tela aberta, em seguida estendi a mão e bati contra o batente da porta interior. O batedor estava na forma de uma nuvem inchada – a runa Elemental de Ar da Jo-Jo. Um cão latia em algum lugar, uma vez dentro da casa. Rosco, o gordinho da Jo-Jo, um preguiçoso basset hound. Pesados passos soaram familiares e eu poderia sentir o cheiro de perfume Chantilly até aqui. A porta abriu e uma mulher pôs seu rosto para fora. — O que vocês querem a esta hora? Mesmo que fosse perto da meia-noite, Jolene “Jo-Jo” Deveraux, parecia que estava pronta para ir para a igreja de domingo. Um vestido florido cobriu sua encorpada e musculosa figura e um colar de pérolas penduradas em seu pescoço curto. Seus pés estavam descalços, embora esmalte glamour pink cobrissem as unhas pequenas dos pés. A cor combinava com seu batom e sua sombra. Jo-Jo, seu cabelo loiro-claríssimo estava penteado com o habitual coque alto com cachos presos, apesar de que suas raízes começavam a mostrar o preto. Mesmo com 1,52 ela era alta para uma anã e seu cabelo apenas aumentava sua altura. Mas eu ainda tinha dezessete centímetros acima dela. — Oi Jo-Jo — eu arrastei Finn para a luz. — É Gin. Meu menino aqui precisa de alguma ajuda. Os olhos da anã eram quase incolor, exceto pelo ponto preto no meio. Seu olhar pálido fixo golpeou o rosto de Finn e o sangue respingou em nós como tiras de papel de parede molhados. Os pés de galinha e rugas de expressão do rosto de meia-idade se aprofundaram com a preocupação. — Sinos do inferno e trilhas de pantera — Jo-Jo balbuciou em uma voz tão leve e doce como xarope de damasco. — Entre, entre. Leve-o para os fundos. Você sabe onde. Eu meio que arrastei Finn para dentro e através de um longo corredor, que deu em uma grande sala que pega a metade de trás da casa. Parecia como o típico salão de beleza do sul. Cadeiras giratórias acolchoadas. Secadores de cabelo antiquados. Dois galpões cobertos com spray de cabelo, esmaltes de unha, tesouras, rolos e pentes desdentados. Fotos de modelos com cabelos de vinte anos atrás cobriam as paredes, enquanto as revistas de moda e beleza estavam seis centímetros de profundidade em cada superfície disponível. Uma porta para o lado levou até uma sala cheia de camas de bronzeamento artificial. Jo-Jo Deveraux fez sua vida o que ela chamava de “mamãe drama”, usando sua magia elementar do AR em concursos de beleza, bailes de debutante e circuito da sociedade de Ashland e mais. Se pudesse ser purificada, arrancado, suavizado, pinçado, depilado,
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cortado, encaracolado, tingido, curtidos e esfoliados, Jo-Jo faz em seu salão. Magias do AR eram ótimas para suavizar as rugas indesejáveis e levantar os seios de alguém de volta a maneira que parecia há cinco anos atrás. Somente uns poucos seletos amigos sabiam sobre os negócios curandeiros da anã. Mas Jo-Jo e Fletcher viviam dessa maneira e eu tenho feito uso dos seus generosos serviços ao longo dos anos. Puxei Finn até uma das cadeiras vermelho-cereja, derrubando-o e me jogando no banco ao lado. Jo-Jo afundou atrás de nós. Ela foi até uma das pias que se alinhavam na parede e lavou as mãos. Rosco, o basset hound que tinha uivado antes, sentou no seu lugar habitual em uma cesta de vime na porta. O cachorro olhou para mim, fungou uma vez, em seguida baixou a cabeça marrom e preta em cima de seu estômago gorducho. O único momento em que Rosco se movia de sua cesta era quando tinha comida envolvida. Jo-Jo puxou uma cadeira sobre Finn. Ela clicou em uma luz alógena brilhante em seu ângulo para que destacasse seu rosto abatido. — Que diabo aconteceu Finn? Quanto eu vi você mais cedo esta noite, você estava beijando uma coisa doce e jovem no Teatro. Jo-Jo Deveraux era uma borboleta social de primeira ordem. Não havia nada que ela amasse mais do que enrolar seu cabelo, um belo vestido, alguns sapatos agradáveis e sair para uma festa ou baile beneficente. E ela era convidada para cada um. Você conhecia muitas pessoas quando tem duzentos e cinquenta e sete anos contando. Finn estremeceu. — Infelizmente fomos interrompidos. Jo-Jo abriu sua boca para perguntar outra coisa, mas eu a cortei. — Fletcher morreu — de alguma forma eu forcei as palavras, mesmo queimando minha garganta como ácido. O rosto pálido de Jo-Jo mudou para mim. Uma sombra passou sobre seu rosto, mas ela não pareceu muito surpresa. Além de ser curandeira, Jo-Jo também tinha um pouco de premonição. Muitos Elementais do Ar são dados o fato que eles pudessem ouvir e tocar em vibração e as emoções do ar. Ou talvez a anã apenas percebesse que não viríamos aqui a essa hora da noite, se algo ruim não tivesse acontecido. — Fletcher morreu? Como?
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Pela segunda vez eu contei minha história. Teatro. Rio. Fletcher morre no chão do Pork Pit. — Eu sinto muito, Gin, Finn — Jo-Jo disse em uma voz suave. — Fletcher foi um inferno de homem. Sophia e eu o amávamos apenas como vocês dois fizeram. — Sim, ele era — eu respondi. — E eu sei que vocês o amavam. Cada um de nós ficou em silêncio, oprimido por pensamentos e lembranças do velho. Nós não falamos por um longo tempo. Eu era grata pelo silêncio. Jo-Jo examinou o rosto de Finn outro minuto antes ela voltar ao trabalho. Ela segurou sua mão na frente do seu rosto, sua palma da mão sem tocar a carne dele, sangrenta e pisada. Os olhos da anã começaram a ficar opaco, branco leite, como se as nuvens amontoassem através do seu olhar. Um brilho semelhante revestia a palma da mão. Poder crepitava através da sala e eu mudei de cadeira. Ar é um Elemento oposto à pedra e eu sempre me sentia inquieta quando esse tipo de magia estava sendo usado. Pareceu-me mal. Então novamente, minha magia de Pedra e Gelo iria fazer sentir do mesmo jeito a Jo-Jo ou qualquer Elemental de Ar ou Fogo. Finn fechou seus olhos e inclinou a cabeça para trás contra a cadeira, como se estivesse recebendo um tratamento facial. De uma maneira, ele estava. Jo-Jo passou a palma da mão pelo seu rosto, foçando oxigênio em suas feridas abertas, fazendo circular por baixo de sua pele, usando as moléculas para curar e fundir tudo de novo. Era como assistir uma fotografia de lapso de tempo. O inchaço no rosto de Finn reduzia. Os hematomas roxos tocar seus olhos desbotados. Os cortes na sua testa e nos seus lábios inchados fecharam. Jo-Jo demorou alguns minutos para corrigir todos os danos e, quando ela finalmente deixou cair à palma da mão, Finn parecia como seu usual, autodespreocupação, até o brilho diabólico em seus olhos verdes. Eu não conseguia parar de pensar em Fletcher e como diferentemente outro Elemental tinha usado a magia do ar sobre ele. Jo-Jo assentiu, satisfeita com seu trabalho. — Agora tire. E vamos ter que olhar para o resto de você. Finn sorriu. — Porque querida, pensei que você nunca pediria. Finn foi muito feliz em abandonar o resto do seu smoking, sangrento em ruínas. Por baixo, usava uma boxers azul feita de seda listrada e aqui e ali com barcos branco. Mauricinho. A boxers agarrava-se aos quadris de Finn, trazendo o tom corado de sua pele.
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Seu peito era largo e sólido e uma pitada generosa de cabelo castanho encaracolado conduzia para baixo da cintura do tecido. Mais escoriações feias marcavam sua figura. As marcas dos punhos modelados pintaram seu corpo em roxo e verde-jardim. Ainda, muitas mulheres teriam achado Finn extremamente sexy e altamente atraente sexualmente, especialmente quando você adiciona o charme juvenil de seu rosto para o resto do torneado e suave pacote. Mas eu tinha visto e feito tudo isso antes, durante a minha juventude, meus anos mais tolos. Jo-Jo segurou sua palma no peito de Finn e começou a curar as feridas no torso e quaisquer outros danos dentro do seu peito. — Você sabe, há algo errado quando um cara usa cueca mais cara do que o meu conjunto completo — eu murmurei — Você apenas tem inveja que mais pessoas olham para mim mais do que para você — Finn disse. — Ainda com casos chatos de uma noite só com os jovens da faculdade comunitária? — Ainda dormindo com qualquer coisa que fica parada tempo suficiente? — repliquei. — Touché. Jo-Jo sorriu para a nossa brincadeira e, por um momento, recuou a morte sombria de Fletcher. Eu meio que esperava que ele viesse através da porta do salão, um copo de café de chicória em uma mão e um largo sorriso esticando seu rosto. Mas o velho homem não estava lá. E ele nunca estaria de novo. Todos sabemos disso. Nós apenas estávamos lidando da única forma que nós conhecíamos. Por acontecer no negócio atual. É o que Fletcher teria desejado que fizéssemos. Depois que ela terminou com Finn, a anã se virou para mim. — Sua vez, Gin — ela disse. Eu levantei uma sobrancelha. — O que faz você pensar que eu preciso de cura? — Por que você é você, tão corajosa e confiante e teimosa a recuar de qualquer um. Jo-Jo me conhecia bem. Assim que Finn se vestiu, eu tirei a camiseta com o sangue da vampira vadia, inclinei-me de volta na minha cadeira e deixei o trabalho para a magia
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Elemental do Ar. Jo-Jo removeu meus curativos e colocou a sua palma da mão próxima ao meu ombro ferido. Um formigamento chiou à vida no músculo sob a minha pele e expandiu-se. Em seguida, outro, depois outro. Quente, quente, insistente, até meu ombro todo vibrar com eles. Rangi os dentes, tentando ignorar a estranha sensação de que não era nada como carícia fria da minha magia de Gelo e Pedra. O fluxo forçado da magia também fez as cicatrizes das runa aranha em minhas palmas coçar e queimar, um metal Silverstone reagiu com o poder do Ar. Silverstone absorve todos os tipos de magia e muitos Elementais usam isso para armazenar pedaços do seu poder, um tipo de bateria que eles podiam aproveitar mais tarde, quando eles precisassem de um pequeno aumento. Mesmo através da minha pele cheia de cicatrizes, o metal faminto de magia do Ar forçou meu corpo. — Você sabe que podia prevenir isso — Jo-Jo murmurou, seus olhos clarearam seu rosto. — Tudo que você tem que fazer é usar sua magia de Pedra para endurecer sua pele. Nada pode penetrar sua magia. A imagem da minha mãe, Eira e também da minha irmã mais velha, Annabella, desaparecendo em bolas de fogo passaram pela minha mente. Por um momento, o ar cheirou a carne queimada. Meu estômago se apertou. — Você sabe que eu não uso minha magia assim a menos que seja absolutamente necessário — eu disse. — É bom para as pequenas coisas, mas não estou me deixando dependente dela. Não é minha linha de trabalho. Porque o momento que eu faço é quando eu falho. E então eu morro. Jo-Jo moveu sua mão para meus rins, onde Brutus me deu um soco. Mais formigamento se espalhou pelo meu torso. — Você vai ter que contar a ele um dia, Gin. Magia é tão forte quanto à pessoa que a maneja. Você é forte. Ele não vai deixar você para baixo, porque você nunca se deixa para baixo. Eu não sei se Jo-Jo estava falando vagamente no geral ou porque ela tinha visto algum vislumbre. De qualquer forma eu não estava comprando. — Está tudo bem e bom, até que a pessoa que eu estou lutando seja mais forte que eu. Atirando força bruta, magia bruta, os Elementais lutavam um contra o outro. Testando sua força contra a outra pessoa. Às vezes, os duelos levam segundos. Às vezes, horas. Mas eventualmente, a magia de alguém sempre prevalecia, sempre derrotando a outra pessoa. E quando isso acontece, o azarado Elemental é esmagado e sente sob o ataque
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do outro poder. Sufocada pelo Ar, gelada pelo Gelo, martelada pela Pedra. Queimada viva pelo fogo, como minha mãe e minha irmã mais velha. Eu balancei minha cabeça, banindo as velhas memórias. — Não obrigada. Tudo que eu preciso é fazer o trabalho com minhas facas Silverstone. Nada mais. Magia é tão fácil. Faz você correr riscos estúpidos, faz você pensar que é invencível, faz você ficar desleixado. Vou usá-lo quando eu tiver, mas não vou depender disso. Eu não mencionei o fato que já tinha feito coisas horríveis o suficiente com minha magia para durar a vida. Que eu tinha matado com isso muito antes de Fletcher me levar das ruas. Que eu o ataquei sem pensar e usei meu poder para desmoronar as pedras da minha própria casa, assim eu poderia escapar dos meus torturadores. Essa combinação aciona o Elementar que começava e minha magia fez toda a estrutura ruir. Que Bria, minha irmã mais nova, morreu por causa do que eu tinha feito, tinha sido enterrada viva como todos os outros. Algumas das muitas razões para eu não usar meu poder como agora, a menos que não houvesse outra opção. Ele só me lembra de um tempo mais escuro, quando tudo o que tinha conhecido tinha se perdido em uma noite de fogo. Jo-Jo terminou seu trabalho deixou cair à mão, mas seus olhos pálidos ficaram no meu rosto. — Veremos. A porta da frente abriu batendo e passos pesados bateram contra o chão do corredor. Poucos segundos depois Sophia Deveraux entrava no salão. Sophia era uma polegada maior que sua irmã mais velha e seu corpo era grosso, com uma camada extra de músculo rígido. Quando Jo-Jo era luz, Sophia era escuridão – como no gótico. Baixa, cabelos pretos e lisos agarravam à cabeça, sua correspondência sombra de olho, delineador e batom. Seus olhos eram também pretos. Em vez de vestido, Sophia vestia jeans preto, botas pretas e uma camiseta preta estampada com caveiras cor de rosa. As caveiras encontravam as de plástico pendurado no espeto, coleira de couro preta que cercava sua garganta grossa. Mesmo que ela tivesse 113 anos, Sophia tinha o olhar adolescente mal-humorada para baixo. Sophia sentou em uma das cadeiras do salão de beleza e examinou o esmalte de Glitter rosa em suas unhas. Jo-Jo inclinou-se sobre ela e acariciou a mão da irmã. Apesar das suas diferenças, as irmãs eram próximas. Viver juntas por mais de um século faria isso com você. Sophia deu um meio sorriso para Jo-Jo, sua mais animada e agradável expressão. — Algum problema em se livrar do corpo? — perguntei Os olhos negros de Sophia encontraram com os meus cinza.
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— Nuh-uh — a versão gótica da anã para não. Como a cura de Jo-Jo, eu também herdei a perícia de Sophia quando Fletcher se aposentou do negócio de assassino. Eu não sabia como Sophia destruía os corpos que eu enviei. O que ela faz com eles, onde os colocou e em primeiro lugar por que ela ainda gostava de fazer esse tipo de trabalho sujo. Mas a anã gótica poderia limpar nesse negócio como ninguém. Sophia deixou todos os locais intocados. Sem sangue, sem fibras, sem cabelos, sem DNA, ou evidência de qualquer tipo. O fato que ela assa o melhor pão de Ashland é um bônus. — Bom. Vou precisar de você para executar no Pork Pit nos próximos dias — eu engoli o ácido que mais uma vez revestia minha garganta. — E chamar a polícia pela manhã. Eu contei a Sophia tudo o que aconteceu essa noite. A anã não disse nada. Mas por um momento, algo escuro e comovente acendeu seu olhar. Poderia ter sido tristeza. Difícil dizer com Sophia. Ela era mais fria do que eu. Uma vez feitos os arranjos com Sophia, eu agradeci Jo-Jo pela hospitalidade e habilidades e prometi ter Finn em sua quantidade usual. Então me levantei, coloquei de volta a camisa da vadia com sangue e despertei Finn, que estava tirando uma soneca na cadeira do salão de beleza. — Vamos — eu disse. — Nós ainda temos coisas para fazer esta noite. — Como o quê? — Jo-Jo perguntou. Corri a mão pelo meu cabelo. Meus dedos capturados em uma moita de sangue. — Vamos fazer algumas coisas para os garotos do apartamento de Finn. Eu queria ir com eles. Eu também quero ver o que está nos noticiários o que foi vazado para a imprensa. O assassinato de Gordon Giles vai ser uma grande história e nós precisamos ficar em cima disso. Jo-Jo concordou, balançando seus cachos loiros. — Bem, sejam cuidadosos. Fletcher Lane foi um dos meus mais antigos e queridos amigos. Se você precisar de qualquer coisa, qualquer coisa é só gritar para mim e Sophia. Um sorriso cruel apareceu no meu rosto. — Obrigada. Mas eu não penso que nós precisaremos de sua ajuda de novo, especialmente não a Sophia. Porque uma vez que eu colocar minhas mãos no responsável por isso, não será suficiente para deixar alguma coisa microscópica dele.
Elemental Assassin 01 - Spider’s Bite Do outro lado da sala, Sophia Deveraux grunhiu em desaprovação.
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Capítulo 10 Antes de sairmos, Jo-Jo prometeu cuidar dos preparativos para o funeral de Fletcher. Fiquei feliz em ceder essa tarefa a ela. Eu precisava focar em encontrar seu assassino e não nas emoções cruas que a morte do velho homem tinham me contagiado. Jo-Jo também me deu alguns tubos da sua pomada cicatrizante infundida magicamente no caso de Finn e eu termos quaisquer problemas prolongados de manhã. Trinta minutos mais tarde, depois de esconder sua Benz em uma garagem anônima poucos quarteirões de distância, Finn e eu estávamos em meu apartamento. Eu chequei o prédio e a pedra ao redor da porta antes de entrarmos, mas as vibrações estavam baixas e estáveis, como de costume. Quem quer que tenha contratado Brutus, não sabia onde eu morava. Caso contrário, ela teria ficado acampada do lado de fora até agora. Apesar dos cuidados de Jo-Jo, eu estava feliz com a trégua. Eu realmente não queria lidar com mais sangue e corpos hoje à noite. Mesmo eu tinha limites. Mas eu ainda tomei precauções de usar minha magia para traçar runas na pedra do lado de fora da porta. Pequenos e apertados cachos em espiral – o símbolo da proteção. As runas brilharam com uma cor prata antes de afundar na pedra. Se alguém tentasse entrar no apartamento hoje à noite, minha magia desencadearia as runas e ecoariam pela pedra – subindo a um grito estridente que me acordaria do sono mais morto e profundo. Finn e eu sentamo-nos à mesa da cozinha vasculhando as carteiras e outros itens que pegamos dos homens em seu apartamento. Eu abri a carteira de Shortie e olhei para a carteira de motorista dentro. — Falsa — Finn pronunciou. Eu olhei para o cartão plastificado. — Como você pode dizer? — O selo da cidade de Ashland, no lado errado. Deve ser à direita, longe da foto, não à esquerda em cima dela.
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Além de lidar com o dinheiro de outras pessoas, Finn era também bastante bom com documentos. Ele tinha feito todas as minhas identidades falsas e poderia traçar um rastro de papel tão grosso e elaborado que enganaria até o contador forense mais estudioso. Algo dourado brilhou embaixo da pilha de carteiras. Pus meus dedos no metal e retirei uma corrente que Finn tinha arrancado do pescoço do Pequeno. Um medalhão pequeno pendurava no fim – um dente em forma triangular com nítidas, afiadas e irregulares bordas visto como feito em jato polido. — O que isso parece para você? — eu perguntei. — Um pedaço cafona de joia de homem. — Vamos lá. Seja sério. Olhe para isso de novo. Ele a espiou. — Um dente. Não, espere, poderia ser uma runa. Um dente... Um símbolo de força e prosperidade. Você acha que um Elemental está envolvido nisso? O olhar de Finn piscou para os três desenhos no meu manto. O floco de neve, a videira de hera e a primavera. Os símbolos da minha família morta. Seus olhos verdes caíram para a minha mão e as runas de aranha gravadas em minhas palmas. Finn sabia que eu era uma Elemental de Pedra e Gelo, embora eu nunca tenha lhe dito nada sobre a minha família. Mas eu tinha certeza que Finn tinha pesquisado as runas que eu desenhei e descoberto a quem elas pertenciam. Informação era como um afrodisíaco para Finn. Descobrir os segredos das pessoas era um jogo divertido. Fletcher tinha sido do mesmo jeito. Mas nenhum dos dois jamais me tinha perguntado sobre as runas ou meu passado. Não pergunte, não conte. A única regra que nós três tínhamos. — Sim, um Elemental está envolvido nisso. — Como você sabe? — Finn perguntou. — Houve alguns danos no Pork Pit. Mesas viradas, cadeiras quebradas, vidros quebrados, como se um furacão tivesse rasgado pela frente da loja. Parecia como um dano de Elemental do Ar para mim – uma mentira suave e fácil. — Mas eu nunca vi esse símbolo exato antes e eu conheço as runas de todas as grandes famílias de Elementais em Ashland. Os Elementais extremamente ricos, de qualquer maneira. Eles eram os únicos que podiam pagar pelos meus serviços. Seus feudos sozinhos poderiam me manter ocupada pelo resto da minha vida. Membros de famílias Elementais opostas, como Pedra e Ar ou
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Fogo e Gelo, raramente se misturam a menos que forçados pelos negócios ou ocasionais infelizes casos de amor Romeu e Julieta. Esses Elementais estavam sempre disputando posição, dinheiro, poder, juntamente com seres humanos ricos, vampiros, gigantes e anões que faziam parte da crosta superior da cidade. Se os Elementais não pudessem conseguir o que queriam com dinheiro, eles usavam suas magias, muitas vezes com resultados viciosos. Os outros faziam também. Duelos ao amanhecer não eram incomuns na cidade. Quando isso falhava, bem, é quando eles contratam alguém como eu para limpar a bagunça. Os Elementais mais fracos e outros usuários de magia de meios mais modestos levavam uma vida simples. Eles trabalhavam e colocavam seus filhos na escola. Viviam em subúrbios limpos e dirigiam minivans para aulas de balé. Alguns deles raramente utilizavam seus poderes afinal. Em contraste, os Elementais pobres e oprimidos usavam suas magias demais. Eles realizavam truques de salão na esquina para a diversão dos outros e conseguir uns trocados para alimentar qualquer hábito que eles tivessem. Drogas, bebidas, sexo, sangue. A luta constante para sobreviver e o uso de sua magia os queimavam – ou os deixavam loucos. Eu tinha visto mais de um Elemental psicótico durante a minha estadia no Albergue de Ashland. Magia tinha esse efeito em algumas pessoas, alguns Elementais. Usar seus poderes os deixavam mais chapados do que álcool, melhor do que drogas, até que ficassem viciados nisso. Mas Elementais eram muito mais perigosos do que os drogados comuns, porque eles tinham perdido o controle, mas ainda tinham toda aquela magia crua correndo em suas veias. — Bem, não é uma explosão do sol, portanto, não é o símbolo da Mab Monroe — Finn disse. Pensei na runa que eu tinha visto no colar de Mab mais cedo essa noite. Uma explosão do sol. Um rubi rodeado de ouro, enrolado com linhas onduladas. Tão parecido com a minha própria runa de aranha, mas tão diferente. — Eu não sei — murmurei. — Ela poderia estar envolvida nisso. Gordon Giles fez um trabalho para uma das empresas dela. Talvez Mab descobriu que ele estava fazendo algo que ela não aprovava. Há rumores de que ela matou o chefe anterior da empresa, o pai das irmãs James, para fazer muitas ondas quando ela assumiu. — E, então, Mab fez o quê? — Finn zombou. — Contratou você para cuidar disso e, então, decidiram cuidar de você? Não faz sentido. Você mesma acabou de dizer isso. Mab nunca teve medo de ficar com as mãos sujas. Todo mundo sabe que ela matou aquele Juiz Federal três meses atrás porque ele estava apenas pensando em tentar indiciá-la. Se Mab não
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gostou do que quer que Gordon Giles estivesse fazendo, ela teria cuidado disso sozinha. Não expor você para assumir a culpa. Finn estava certo. Mab Monroe corroeu essa cidade. Ela não teria se importado em ser apanhada. Ela teria matado Gordon Giles, levantaria seu corpo e arrancaria os dedos de quem fuma na frente de todos no Teatro. Não, Mab Monroe não tinha chegado onde ela estava sendo subservente. Isso era obra de outra pessoa. Alguém que não teve a coragem de aceitar as consequências das ações dela. Puta covarde. — Nós não podemos descartar Mab completamente. Mas ela provavelmente não é aquela que puxa as cordas. — Quem nos resta então? — Finn perguntou. Eu encolhi os ombros. — A maioria dos nossos clientes é motivada por sexo, dinheiro ou vingança. De acordo com o arquivo de Fletcher, Gordon Giles não tinha uma esposa ou uma namorada firme. Ele preferia comprar e pagar pelo seu entretenimento sexual. — Prostitutas? Eu assenti. — Prostitutas. Muitas delas. Mas nenhuma prostituta na mente certa prometeria me pagar cinco mil para matar Giles. Apenas poucos seriam sequer capazes de colocar suas mãos em dinheiro suficiente para o pagamento inicial, muito menos no restante. Assim as regras tem praticamente sexo como motivo. Fletcher disse que Giles estava roubando dinheiro, então eu teria que ir com Haley James. — Seu chefe nas Indústrias Halo? Assenti novamente. — Ela poderia ter encontrado informações sobre o desfalque e decidiu matar Giles em vez de deixar a informação vir a público. Não seria bom para sua empresa se a palavra escapasse que ela estava sendo fraudada por seu impulsor superior. — Talvez. Mas Giles morrer de qualquer maneira não vai parecer bom para as Indústrias Halo. E desfalque é estabelecer a lista tanto quanto os crimes fazem. Nós precisamos de mais informação — Finn olhou para o dente de jato novamente. — Uma runa de dente... Isso poderia ser de qualquer Elemental. Pedra, Ar, Fogo, Gelo. Ou até mesmo
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alguém com um talento menor por metal ou água, ou qualquer outra coisa. Não é específico o suficiente. A maioria dos Elementais escolhem runas que representam suas magias. Como o floco de neve da minha mãe para sua magia de Gelo, ou a explosão solar de Mab Monroe para seu poder de Fogo. Um dente seria mais adequado para um vampiro, por motivos óbvios. Finn estava certo. Não havia maneira de dizer a que tipo de Elemental isso pertencia. A runa não significava nada em si, assim como eles não tinham o poder real a menos que você tenha criado ou imbuídos com magia. Eu poderia ter recusado a runa de dente como uma mera bugiganga, se não pela forma macabra que Fletcher foi torturado. Eu tenho visto apenas todas as coisas ruins que as pessoas podem fazer uns aos outros e eu conheci os sinais da magia do Elemental de Ar quando os vi. Pequeno vinha trabalhando para alguém. Fazia sentido que ele usaria o símbolo de seu empregador, quem quer que ela fosse. — Nós vamos descobrir isso — eu prometi. — Vamos ver o que mais está aqui. Fomos através dos restos dos itens. Mais identidades falsas, alguns cartões de crédito e várias centenas de dólares em dinheiro vivo. Nada de útil. A televisão zumbia em segundo plano enquanto trabalhávamos. Às cinco da manhã, o primeiro noticiário retumbou. A história principal era o incidente no Teatro. Finn e eu sentamos no sofá e assistimos ao espetáculo. Um repórter do lado de fora do Teatro. Luzes vermelhas cintilavam ao fundo: — A tragédia ocorreu na noite passada na Casa de Ópera de Ashland, quando uma mulher perturbada tentou matar um dos participantes. O alvo acredita-se ser Gordon Giles, um empresário rico de Ashland e o diretor financeiro das Indústrias Halo. O mesmo tiro na cabeça de Giles, que estava no arquivo de Fletcher apareceu na tela. O repórter relatou os acontecimentos da noite, embora com uma grande quantidade de giro. Agora, ao invés de golpeando no camarote, o detetive Donovan Caine tinha me impedido de entrar, com um espectador inocente tragicamente perdendo a sua vida no processo. Besteira de mídia. Eu me perguntava como eles explicariam as manchas de sangue que estavam dentro do camarote ao invés de fora, no corredor. — Mesmo Giles não sendo ferido no incidente inicial, ele foi envolvido em um acidente de trânsito em seu caminho para casa. Uma SUV grande bateu em sua limusine. A polícia diz que o impacto acendeu o tanque de gasolina e o veículo explodiu. Giles e seu motorista foram dados como mortos no local. A televisão cortou em um lance da limusine engolida pelas chamas. Matando Giles, torturando Fletcher. Garota ocupada, nossa misteriosa Elemental de Ar.
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— Eles mataram Giles de qualquer maneira — Finn murmurou. — Eles realmente deviam querê-lo morto. O repórter apareceu na tela novamente. — Giles foi atacado por essa mulher, acredita-se ser uma ex-amante descontente do empresário e possível prostituta. Acredita-se também que ela tenha estado atrás do acidente de carro que o levou à morte. A polícia não está liberando o nome dela, mas um detetive em cena forneceu aos funcionários esse esboço. Eu bufei. Eles não estavam liberando meu nome porque não sabiam isso. Mas um momento depois, meu rosto apareceu no monitor. Ou pelo menos, o que poderia ter passado por meu rosto se você inclina a cabeça apenas para direita e olha de soslaio. Não era uma representação realmente imprecisa. Donovan Caine tinha conseguido, pelo menos, meus olhos e o conjunto rígido do lado direito da minha boca, mesmo que o tobogã preto tivesse escondido meus cabelos loiros descoloridos. Ainda assim, eu não estava preocupada sobre alguém me reconhecer no esboço. Era muito difícil para isso. Além disso, as pessoas nunca realmente olharam para aquelas coisas de qualquer maneira, ou se lembraram delas depois do fato. Não em uma cidade como Ashland onde todos poderiam ser uma ameaça em potencial. Falando de Caine, o rosto dele foi o próximo a piscar na tela. Ele ficou atrás de um dos capitães sêniores do Departamento de Polícia de Ashland, que estava falando em um microfone. Mais policias ladeavam os dois homens. — ...E embora ela não tenha tido sucesso em prejudicar o Sr. Giles inicialmente, ela ainda é procurada por seu assassinato. Esse foi o capitão falando. Stephenson era seu nome, de acordo com a identidade na tela. Wayne Stephenson. Um gigante com olhos pálidos e atarracados, cabelos grisalhos, cuja constituição física estava indo a ficar gordo. Talvez tenha sido o centro das atenções da mídia, mas Stephenson parecia estressado. Um tom esverdeado tingia sua pele pastosa e ele apagou um brilho de suor na testa com um lenço branco. Um repórter acenou, gritando o nome de Donovan Caine e tentando levá-lo a responder uma pergunta. O detetive fez uma careta e abriu a boca para responder, mas o capitão deu um passo em frente à Caine, bloqueando-o de vista. — Manobra defensiva legal — Finn disse. — Alguém não quer Caine falando sobre o que realmente aconteceu.
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Finn balançou a cabeça. — Honestidade fará você ser morto nessa cidade. Todos os repórteres começaram a falar ao mesmo tempo, um bando de corvos grasnando perguntas à Caine e aos outros oficiais. O capitão Stephenson estendeu os braços por silêncio. — Nós queremos enviar uma mensagem à mulher que matou o Sr. Giles. Seja você quem for, esteja onde estiver, se você está aí fora nos assistindo, saiba disso: nós vamos fazer tudo ao nosso alcance para encontrá-la. Finn me deu uma cotovelada. — Parece que alguém ficou excitado por você, Gin. O capitão Stephenson, continuou falando. — Sr. Giles era um empresário respeitado e um membro descente da comunidade. O empregador do Sr. Giles, Indústrias Halo, já me autorizou a anunciar uma recompensa por informações que levem à captura e prisão de seu assassino. O capitão fez um gesto para sua direita e Alexis James se aproximou. Em algum tempo durante a noite ela trocou o vestido preto pequeno por um terninho preto severo. As pérolas ainda espremiam sua garganta e pulso. Por que seria ela na conferência de imprensa em vez de sua irmã, Haley? Então eu me lembrei. Alexis era a cabeça do marketing e relações públicas. A porta-voz da empresa. A visão de Alexis James adicionou ao frenesi dos jornalistas. — Alexis! Alexis! Quanto você está oferecendo? — um deles gritou em meio ao barulho. Alexis colocou seus lábios perto do microfone. — Um milhão de dólares. Finn e eu ficamos sentados lá, em silêncio atordoados. Mas Alexis James não tinha terminado. Ela falou sobre o ótimo cara que Gordon Giles foi e como ela esperava que a recompensa em dinheiro ajudasse a polícia a me pegar, a puta do mal que tinha matado ele. A conferência de imprensa finalmente acabou, mas os repórteres não estavam dispostos a deixar suas fontes escapar. Eles tentaram pedir ao capitão de polícia e Donovan Caine mais algumas perguntas. Mas Stephenson acenou dispensando-os e ele e Caine deixaram o pódio e desapareceram de vista, juntamente com Alexis James.
Elemental Assassin 01 - Spider’s Bite — Um milhão de dólares? Caralho — Finn disse. Isso resumia perfeitamente os meus sentimentos.
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Capítulo 11 Nada mais a fazer ou dizer. Não hoje à noite. Finn instalou-se no quarto de hóspedes, enquanto eu tomei um banho para limpar o sangue misturado no meu cabelo. A roupa da prostituta vampira arruinada foi para o lixo. Eu, mais tarde, irei levá-las para o incinerador e queimá-las. Graças a Jo-Jo e à sua magia de cura, o meu ombro esquerdo e o meu braço já não pulsavam onde Brutus tinha disparado e esfaqueado. Mas o meu peito ainda ardia com raiva fria por perder Fletcher. Pelo que lhe havia sido feito. Pela profanação do Pork Pit. A alegria sádica que a Elemental do Ar tinha tido fazendo ambas as coisas. E para quê? Para que eu pudesse ser culpada de um assassinato que nem sequer cometi? Inútil. Tudo isso. Eu não conseguia acreditar que Fletcher tinha ido. Morto. Que eu não tinha chegado a ele a tempo. Que eu não tinha sido capaz de salvá-lo, como ele tinha me salvado há tanto tempo atrás. Os meus pensamentos perturbados voltaram-se para a última conversa que eu tive com Fletcher. Faz este trabalho e pode aposentar-se. A sua voz rouca sussurrou as palavras na minha mente. Eu tinha zombado da sugestão, escarnecido, ignorado, da mesma maneira que o tinha feito durante seis meses, desde que o velho tinha levantado a questão pela primeira vez, sobre sair do negócio. Talvez – apenas talvez – se eu o tivesse ouvido da primeira vez que ele me pediu para sair todos aqueles meses atrás, Fletcher ainda estivesse vivo. Talvez se eu tivesse parado de matar pessoas nessa altura, o trabalho de Gordon Giles nunca teria vindo à nossa direção. Talvez se eu apenas tivesse aceitado seus desejos, suas esperanças de uma vida normal para mim, o velho poderia estar agora no Pork Pit, lendo um livro e bebendo café, em vez de estar olhando o teto com olhos opacos e cegos. Talvez se eu tivesse saído quando ele me pediu da primeira vez, Fletcher ainda estivesse vivo. Minha culpa. Tudo era minha fodida culpa. Culpa e tristeza brotaram no meu peito, rachando as paredes em volta do meu coração, desintegrando a pedra fria em pó. A minha garganta fechou e lágrimas mais
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quentes do que a água caindo em cascada em torno de mim, queimaram nos meus olhos. E caí de joelhos no chuveiro, pressionando-me contra o azulejo liso. E, pela primeira vez em dezessete anos, eu verdadeiramente, profundamente chorei. Dez minutos passaram talvez quinze. Eu não tinha a certeza. Mas a água penetrou através da minha dor e eu tremi contra a parede do chuveiro. Alguns poderiam chamar-me de hipócrita por causa de minha dor pela morte de Fletcher e pela raiva que sinto da Elemental do Ar que o matou. Eu tinha baldes de sangue em minhas mãos e as minhas ações tinham deixado muita gente chorarando por seus entes queridos. Mas havia linhas, regras, código não importa o quão distorcidos eles possam parecer. Nada de crianças, nada de animais de estimação, nada de tortura, nada de culpar outra pessoa pelo que eu fiz. A forma como a Elemental do Ar tinha torturado Fletcher... Ela merecia ser punida só por isso. Ser abatida como um cão raivoso antes que o fizesse a mais alguém. Fletcher se foi, mas eu ainda estava aqui. Assim como Finn. E eu ia fazer tudo o que estivesse no meu poder para manter-nos dessa forma. O velho tinha implantado na minha cabeça a sobrevivência acima de tudo o resto – emoções, consciência, medo, arrependimentos. Se isso me fazia uma hipócrita, que assim seja. Há piores coisas para se ser. Como morta. Obriguei-me a fazer todos os movimentos dos meus rituais de fim de noite. Lavar o meu corpo, ensaboar o cabelo, secar, deslizar no meu pijama de flanela mais macio – o que Jo-Jo me dera, aquele com as nuvens azuis fofas. Culpa, lágrimas e esgotamento emocional à parte, eu precisava estar no meu melhor amanhã. E no futuro próximo. Oh, eu não estava preocupada com a recompensa. Fletcher tinha ensinado como ser cuidadosa, como ser invisível, uma habilidade que eu tinha aperfeiçoado nestes últimos dezessete anos. O que tornava ainda mais estranho que alguém tenha sido capaz de nos encontrar. Eu ainda não entendia como ou quando tínhamos sido tão descuidados, tão desleixados. Mas alguém, em algum lugar, algum momento tinha falado sobre o que nós três fizemos. Quando eu me aproximasse da Elemental do Ar, eu iria perguntar como ela tinha encontrado Fletcher – e eu não iria perguntar amavelmente. Antes de ir para a cama, eu andei pelo apartamento e pressionei a minha mão na pedra em volta da porta e de todas as janelas mais uma vez, verificando as minhas runas de proteção. A pedra murmurou em resposta antes de voltar para o seu usual, baixo zumbido. Para seguro adicional, eu guardei uma faca de Silverstone debaixo dos meus dois travesseiros e coloquei mais algumas na mesa-de-cabeceira, facilmente acessíveis. Depois me enrolei numa bola apertada sob os lençóis macios. A tensão no me corpo lentamente se dissipou e, então, eu sonhei...
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Soluços grandes, pesados e de cortar a respiração sacudiram o meu corpo, fazendo-me tremer da cabeça aos pés. Lágrimas escorreram pela minha face rachada numa torrente interminável, misturando-se com a sujeira em minhas mãos. Eu dei uma respiração irregular e lambi os meus lábios rachados, provando o meu próprio sal. — Isso não te está fazendo bem nenhum — uma voz baixa atravessou a minha miséria. Passos soou no asfalto e eu olhei para cima, fungando. Um homem de meia-idade e alto parou na minha frente com cabelo castanho-escuro. Um avental gorduroso escondia sua camisa azul de trabalho e calças. Botas castanhas cobriam seus pés e um saco preto do lixo pendia da sua mão direita. — Lágrimas são um desperdício de tempo, energia e recursos — ele disse num tom sério, como se estivesse partilhando comigo algum grande segredo místico. Minha mãe e as minhas irmãs estavam mortas. Pessoas queriam me matar. Eu estava sozinha e vivendo nas ruas. Fria. Cansada. Esfomeada. Tão esfomeada. Eu tinha muito sobre o que chorar. O homem olhou para mim, seu olhar verde absorvendo tudo desde a minha cara suja, cabelo despenteado e roupas rasgadas. Ele suspirou e depois procurou dentro do saco de lixo preto. Eu fiquei tensa, alcançando a magia que flui pelas minhas veias. Se ele tirasse uma faca e viesse para mim, eu usaria o meu poder nele. Fazer os tijolos voarem da parede e esmagá-lo no rosto. Fazer uma adaga de gelo com as minhas próprias mãos e esfaqueá-lo com ela. O que fosse preciso. Mesmo que isso significasse usar a minha magia para matar – novamente. O homem puxou um saco branco de papel amassado. Eu estava sentada, os meus joelhos apertados contra o meu peito. Os meus olhos estavam ao nível do logotipo com o porco impresso na lateral do saco. — Aqui — o homem segurou o saco. — Há um hambúrguer aqui. Uma encomenda que alguém não veio buscar. Feijões cozidos também. Podes ficar com eles, se quiser. O meu estômago gritou sim, mas eu balancei a cabeça numa negativa. Ninguém te dava nada de graça nas ruas de Ashland. Ele provavelmente queria que eu lhe fizesse sexo oral ali no beco. Eu não estava desesperada o suficiente para fazer isso. Não ainda. Eu não tinha muito para oferecer aos treze anos, além de seios muito pouco desenvolvidos e quadris magros, mas eu tinha percebido que a maioria dos homens que queria sexo não se importava com isso, desde que conseguissem o que queriam. O homem encolheu os ombros. — Você é que sabe criança.
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Ele abriu a lixeira e jogou fora o saco preto. O branco foi em seguida. Assobiando, ele abriu a porta traseira para o restaurante e desapareceu no interior. Eu contei os segundos na minha cabeça. Dez, vinte, trinta... Quando cheguei aos quarenta e cinco, levantei-me, corri para a lixeira e arranquei o saco branco das profundezas sombrias e malcheirosas. Eu corri pelo beco e deslizei num buraco negro. A fenda era grande o suficiente para eu rastejar lá para dentro, mas não grande o suficiente para alguém conseguir vir atrás de mim. Rasguei o saco, arranquei o sanduíche e mastiguei. Tão bom, eu queria chorar. Eu não conseguia lembrar a última vez que tinha comido carne, especialmente tanta assim. Com mãos trementes, eu abri a tampa do copo de isopor, inclinei o recipiente e deixei os feijões cozidos mornos deslizar para a minha boca. O molho sobre eles era doce, mas com uma pitada de picante. Depois do lixo que eu tinha andado comendo isso tinha gosto de céu... — Filho da puta! O amaldiçoar acordou-me. Eu abri os meus olhos cinza, a minha mão já em volta do cabo da faca de Silverstone debaixo do meu travesseiro. — Filho da puta! A voz exasperada voltou. Finn. Apenas Finn. Eu relaxei o meu aperto, deslizei para fora da cama e dirigi-me para ele. Finn estava na cozinha, lançando uma bolacha torrada18 de uma mão para a outra para evitar se queimar. — Que horas são? — eu perguntei, minha voz grossa do sono e de memórias que eu não conseguia banir. — Cinco da tarde — Finn deu uma mordida na torrada e quase cuspiu de volta por estar tão quente. — Doze horas? Por que me deixou dormir tanto tempo? — Porque precisava de descanso. Ambos precisávamos. Ele estava certo. Jo-Jo podia ser a melhor, mas ser curado por um Elemental do Ar ainda cobrava seu preço, enquanto seu corpo tentava se ajustar a passar de gravemente ferido a estar subitamente bem de novo. Apesar do meu dia de sono, eu ainda me sentia cansada, meus braços e pernas movendo-se mais lentamente do que o habitual. Ou talvez isso fosse porque eu tinha usado meu corpo tão arduamente por muito tempo ontem à noite. Mas a magia sempre tinha um custo, o que era outra razão pela qual eu não gostava
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Do original ‘toaster pastry’ que é um tipo de bolacha confeccionado para serem aquecido na torradeira e servido como café da manhã ou por vezes como lanche, alguns contém recheio dentro que pode ser de morango, chocolate…
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de usar o meu poder para matar. Eu não gostava de pagar o preço mais tarde. Ele sempre me esgotava me fazia fraca. Eu não podia me dar ao luxo de estar fraca. Nunca. A torradeira atirou mais uma bolacha. Finn agarrou-a e me deu. Eu segurei a bolacha fina na minha mão direita. O calor não me incomodou. Então, mais uma vez, Finn não era aquele com cicatrizes em suas mãos. Não era aquele que tinha sentido a runa da aranha queimar em sua carne. O metal Silverstone podia suportar somente alguma magia. A Elemental de Fogo que tinha me torturado tinha tido magia mais do que suficiente para transformar a minha runa em líquido superaquecido; marcar-me para sempre e rir durante todo o tempo. A memória fez a minha cabeça doer e eu massajei a minha têmpora. A televisão estava ligada, mas o som estava cortado. Algum incompreensível game show com o que pareciam concorrentes gritando cintilou na tela. Eu mudei o canal para o Food Network19. — Mais alguma notícia sobre o meu trabalho fracassado de ontem à noite? — Nada demais — disse Finn. — Mais conferências de imprensa na hora do almoço com a polícia, nomeadamente o Capitão Wayne Stephenson prometendo te apanhar não importa o quê. Outra com Alexis James falando sobre o grande homem que era Gordon Giles e sobre como ela espera que a recompensa vá ajudar a levar o seu assassino à justiça. Sabia que eles já tiveram mais de mil pistas desde que ela ofereceu o dinheiro ontem à noite? — Um milhão de dólares — sacudi a cabeça. — Cada maluco de Ashland, Elemental ou outra coisa, estará me perseguindo. Ou pelo menos perseguindo o meu fantasma. — Inferno, por isso tudo, estou tentado a entregar-te eu mesmo. Eu encarei-o. — Não que eu o faria alguma vez — Finn corrigiu. — Amizade é muito mais importante do que dinheiro. Eu arqueei uma sobrancelha. Os lábios de Finn começaram a tremer e ele soltou uma risada baixa. Eu bufei. — Não posso acreditar que disse isso com uma cara séria. — Nem eu — confessou.
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Canal televisivo sobre comida e como cozinhar.
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Eu joguei-lhe uma das almofadas do sofá. Finn abaixou-se para se desviar dela. Seu sorriso desapareceu e ele apontou com a cabeça para uma das janelas viradas para a rua. — Sophia chamou a polícia para o Pork Pit. Eles chegaram por volta das três da tarde. Eu me levantei e olhei pela fresta entre as cortinas para a rua abaixo. Fita amarela de cena do crime pendurava na porta da frente do restaurante. O sol da tarde brilhou na fita lisa, criando um ponto brilhante que queimou os meus olhos. Ninguém se moveu dentro da loja. Normalmente, as cinco horas de um dia de semana, pessoas estariam esperando para entrar e sentar. Mas as pessoas que passavam apenas reduziram a velocidade dos seus passos e atiraram olhares curiosos, mas conhecedores para a loja. Em Ashland, fita de cena do crime era melhor do que um obituário no jornal. Normalmente, eu trabalhava na parte da tarde, uma vez que o restaurante estava sempre tão lotado nessa altura e eu sentia falta do barulho e da pressa da multidão do jantar, juntamente com o saber que Fletcher estava inclinado contra a caixa registadora, sorvendo o seu café de chicória e lendo algumas páginas do seu mais recente livro – do jeito que ele fez durante tantos anos. Coisas que o velho nunca faria novamente. A dor e a culpa ameaçaram me esmagar novamente, mas eu concentrei-me na raiva fria no meu peito, deixando-a congelar as outras, as emoções mais suaves. Eu tive a minha crise de choro ontem. Agora era hora de ser forte. Por mim, por Fletcher e especialmente por Finn. Eu tinha fracassado com Fletcher. Eu não ia fazer o mesmo com o filho dele. — Os policiais já se foram? — eu murmurei. — Sim — disse Finn. — Os bastardos sequer estiveram uma hora lá dentro. O médico legista chegou primeiro que eles. Os policiais olharam em volta alguns minutos, levaram o corpo dele e foram embora. Nós ficamos ali um minuto, vendo o mundo girar. Um mundo do qual Fletcher já não fazia parte. A raiva fria bateu no meu peito, um tambor lento, firme. Finn falou primeiro. — Eu odeio ser exigente, mas nós precisamos de algum tipo de plano, Gin. Porque esta pequena conspiração em que fomos apanhados não vai desaparecer até que ambos estejamos mortos. Eu sei que papai sempre nos disse para deixarmos a cidade. Para fugir se algo lhe acontecesse ou a um de nós. Mas eu... Eu não posso fazer isso, Gin. Eu simplesmente não posso. Não até que quem quer que esteja por trás disto pague pelo que fez a papai. Eu entendo se quiseres sair da cidade...
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— Cale-se — eu rosnei. — Eu não vou a lugar nenhum. Eu não vou fugir e eu não vou sair da cidade. Finn piscou. — Não vai? O rosto esfolado de Fletcher cintilou na minha frente. A sua carne arruinada. O sangue dele no chão do Pork Pit. O nó gelado no meu peito apertou. — Não, eu não vou a lugar nenhum. — Tem a certeza? — Positivo. Traição é uma coisa. Se isto tivesse sido sobre não nos pagarem o resto do pagamento, bem, eu poderia ter entendido isso. Já aconteceu antes. Mas eles mataram Fletcher. Eles te machucaram. Eles armaram para mim. E isso é inaceitável. Finn afastou os seus olhos verdes do Pork Pit e olhou para mim. — Então qual é o plano? Como descobrimos quem está por trás disto? — Com um corpo de cada vez. Finn piscou para a veemência na minha voz, mas eu já tinha mudado para assuntos mais práticos. — E quanto ao seu trabalho? O que vai dizer aos homens do dinheiro lá no banco? — Já tratei disso. Eu disse ao meu chefe que estou doente com a dor por causa do assassinato do meu pai e que estou tirando uma semana de folga — ele disse. — O que não é realmente uma mentira. — O que precisamos fazer primeiro é descobrir o que Gordon Giles estava aprontando. — Você acha que o cliente mentiu ao pai? Isso nunca iria acontecer — a voz de Finn gotejou com sarcasmo como gordura de um pedaço de bacon. — Como é que sugere que decifremos os motivos e atividades de um homem morto? Porque Gordon Giles certamente não nos vai dizer nada. Eu revirei os olhos.
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— Simples. Tudo o que temos que fazer é nos encontrarmos com Donovan Caine. Silêncio. Finn piscou para mim por alguns segundos. Em seguida ele enfiou um dedo no ouvido, girou-o e tirou-o, como se estivesse limpando cera de um corredor. — Desculpa Gin, mas eu acho que ficou no manicômio tempo de mais. Porque essa é a ideia mais louca que já teve. Encontrarmo-nos com Donovan Caine? Perdeu a sua fodida cabeça? Eu ignorei o tom cada vez mais alto de Finn. Às vezes ele gritava pior do que uma criança de cinco anos. — Faz todo o sentido. Donovan Caine estava no Teatro para ver Gordon Giles. Alguém criou um monte de problemas para matar Gordon Giles, me culpar e enterrar toda a história com o meu cadáver. Isso me diz que isto é sobre mais do que apenas fundos desviados. Eu quero falar com Donovan Caine e ver o que ele sabe. Ver porque é que ele estava se encontrando com Giles. Finn arranhou o peito e inclinou-se contra a parede. Os músculos dos seus ombros ondearam e incharam com o movimento. — E como propõe fazer com que Caine te diga tudo isso? — Porque sabemos algo que ele não sabe. — E isso seria... — Que alguém no departamento de polícia está dentro disto. — Estamos em Ashland, Gin. A polícia geralmente está dentro de tudo. Eles fazem carreira com esse tipo de coisa. Eu olhei para Finn. Ele suspirou. — Tudo bem. Diz-me o que está pensando. — Antes de morrer, Brutus me disse que um rastro de papéis já tinha sido criado, ligando-me a Gordon Giles. O cara no seu apartamento disse que os policiais estavam procurando por mim em todo canto. Umas horas mais tarde, meu desenho distorcido estava em todos os noticiários, junto com a minha suposta relação com Gordon Giles. Como poderia isso acontecer sem um cara dentro do departamento da polícia?
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— Que é algo que Donovan Caine poderia descobrir por si mesmo, se fosse suficientemente inteligente. Eu ainda não vejo como isto fará com que o detetive te ajude. — Ele pode ser esperto, mas Caine tem um olho cego e um fraquinho pelos seus companheiros de azul. Ele é fiel a eles e à ideia de que os policiais são boas pessoas. Que eles realmente servem e protegem e tudo isso. Você viu como ele estava com raiva e incomodado, tentando encontrar o assassino do seu parceiro. Como acha que ele vai reagir se eu lhe disser que alguém no departamento está ajudando o assassino de Giles? E que essa pessoa estava bem com o fato de acabar também com Caine simplesmente por ele estar lá? Finn pensou nisso. — Ele provavelmente ficaria chateado. — Exatamente. Por isso eu vou me oferecer para trocar informações com ele. Ele me ajuda a encontrar a pessoa que armou para Giles. Eu o ajudo a erradicar a corrupção no departamento de polícia. Você sabe que benfeitor Caine é. Eu vou apelar ao seu senso de justiça. Mais silêncio. Então Finn bufou. — Eu não acredito que disse isso com uma cara séria. Eu sorri. Finn sacudiu a cabeça. — Essa magia Elemental nas suas veias finalmente te deixou louca, Gin. Insanidade. Completa insanidade. Viu aquela conferência de imprensa? Donovan Caine não está dirigindo o departamento de polícia. O capitão dele arrastou-o para o plano de fundo por uma razão: para mantê-lo quieto. Os policiais te querem morta porque eles estão sendo pagos para olhar para o outro lado ou simplesmente não se importam o suficiente para descobrir o que realmente aconteceu. Ou provavelmente ambos. — Que é mais uma razão para eu ir a Caine. Ele estava tentando proteger Gordon Giles, ele pode me dizer o que Gordon Giles estava aprontando. Além disso, ele é provavelmente o único policial da cidade que não vai atirar em mim assim que me vir. Ou tentar. — Talvez, talvez não. Você sabe o que eu penso sobre homens honestos. — Que não há nenhum. Finn apontou-me o dedo indicador.
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— Precisamente. Fui até ao sofá, sentei-me e coloquei os meus pés na mesa de café. — Tem uma ideia melhor? Porque se tem, me diz. Eu sou a que está sendo procurada por assassinato. Normalmente, isso não me incomodaria, exceto que desta vez eu nem mesmo o fiz. — Mas como sabe que Donovan Caine vai sequer ouvir? — Finn perguntou. — Você matou o seu parceiro, Gin. Ele poderia até nem saber antes, podia não ter qualquer pista sobre quem é ou como é a sua aparência, mas depois da sua performance no Teatro na noite passada, eu estou disposto a apostar que ele juntou dois e dois. Ou pelo menos que está pensando seriamente sobre isso. Pensei na hesitação de Caine na varanda. Ele poderia ter atirado em mim e o caso estaria encerrado. Poderia ter disparado uma bala no meu coração tão facilmente como eu podia lançar uma faca nele. Mas ele não o tinha feito. — Donovan Caine também quer descobrir quem está por trás disto. O seu senso de honra, de dever, não o deixará esquecer o assunto. Especialmente quando ele perceber que estaria tão morto quanto Gordon Giles se eu não tivesse estragado tudo. — Tudo bem — Finn disse. — Digamos que o bom detetive quer que a verdade e a justiça e todas as outras atitudes prevaleçam. Como propões que entremos em contato com Caine? Sem levarmos um tiro ou imediatamente sermos mortos de qualquer outra forma? Alguém está com certeza o vigiando. — Simples — eu respondi. — Nós vamos fazer a coisa que a Elemental do Ar fez e que os policiais menos esperam que façamos. Finn balançou a cabeça. — Não o diga. Por favor, não o diga. — Nós vamos visitar Donovan Caine em plena luz do dia — eu conclui. Finn simplesmente gemeu. Ele ainda tentou falar comigo para eu desistir da ideia. Enumerou todas as razões de por que um encontro com Donovan Caine era na melhor das hipóteses complicado e, na pior das hipóteses, letal. Finn falou e pediu e implorou até que o seu rosto estava tão azul, roxo e verde como ele estava antes de Jo-Jo o ter curado. Mas ele não me fez mudar de ideia.
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Apesar de todo meu treinamento, apesar de todas as vezes que eu me afastei de um trabalho mal feito, eu não ia fugir. Não desta vez. Assassinos não deviam levar nada pessoalmente, não era suposto eles se permitirem emoções ou saciar seus sentimentos. Receber o pagamento. Fazer o trabalho. Ir embora. Não olhar para trás. Essa era a forma como o jogo era jogado. Mas eu não podia ignorar o nó duro e frio de raiva no meu peito. Eu não me importava em ser baleada ou que pensassem em mim como um monstro. Eu tinha demasiado sangue em minhas mãos para pensar em mim mesma como qualquer outra coisa que não isso. Mas eu me amaldiçoaria se deixasse alguém me trair porque ela era demasiado covarde para aceitar as consequências das suas próprias ações. Fletcher tinha morrido, tinha sido terrivelmente torturado, por causa deste esquema e Finn tinha quase sido espancado até à morte. Alguém ia pagar por isso – por tudo isso. Com a sua fodida vida. Depois de Finn perceber que eu não ia mudar de ideia, nós começamos a trabalhar. Finn encontrou algumas pessoas dispostas a dar-lhe informação sobre Donovan Caine – por um preço. Enquanto isso, eu voltei à pasta que Fletcher tinha me dado sobre Gordon Giles. Eu não sabia quando Fletcher tinha sido abordado para fazer o trabalho ou por quem, mas ele compilou uma quantidade substancial de informações sobre Giles. O patrimonio líquido. Negócios. Ações. Hobbies. Hábitos. Causas de caridade. Restaurantes favoritos. Cinquenta e quatro anos de vida reduzidos a uma simples pasta de papel. Meio triste. Mas quanto mais eu revia as informações, menos convencida eu ficava de que Gordon Giles era um homem corrupto e desonesto que tinha roubado milhões. Uma das razões, ele não precisava do dinheiro. Giles tinha vários milhões guardados em várias contas e rendas e ganhava ainda mais como diretor financeiro das Indústrias Halo. E ele não gastava o seu dinheiro como se este fosse ficar fora de moda. Nada além de ternos caros, refeições agradáveis, viagens de pesca em alto mar em alguns meses e visitas semanais às prostitutas. Giles mantinha a maior parte do seu dinheiro longe. Ele até mesmo dava mais de um milhão de dólares para investigação sobre o câncer de mama todos os anos, em honra da sua mãe morta. Que príncipe. Claro, muita gente esconde a sua verdadeira natureza atrás de organizações de fundos e sorrisos brilhantes, Mab Monroe sendo o principal exemplo. Mas eu era boa lendo pessoas, mesmo no papel e não havia nada na pasta que sugerisse que Giles precisava ou tinha o desejo de roubar. Ele simplesmente não parecia ganancioso ou desesperado o bastante para isso. Eu avancei para a parte que tinha os detalhes dos hábitos gastadores de Giles. Você podia dizer tudo sobre um homem pelos seus vícios e eles já me tinham ajudado a chegar
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perto de mais do que alguns dos meus alvos. Prostitutas pareciam ser a despesa principal de Giles. Pelo menos uma vez por semana, ele deixava vários milhares de dólares nas meninas do Norte, uma boate de luxo que iria satisfazer qualquer necessidade, desejo ou vício que tivesse. Sexo, drogas, sangue, uma combinação dos três. Humm. Finn e eu poderíamos ter que visitar Rosalyn Phillips no clube e para ver o que ela sabia. Era um tiro longo20, mas talvez Giles tivesse dito algo a alguma das prostitutas de Rosalyn, talvez tivesse sussurrado um pedacinho doce de nada no ouvido dela que poderia me levar ao seu assassino. Informação é poder e, mais importante, a margem de manobra. Eu não gostava de chantagem, pensava nela como a forma mais vil de persuasão, mas eu vou usá-la se ela nos tirar desta confusão. E depois, em um par de duas semanas ou meses, quando a Elemental do Ar pensar que o nosso acordo está certo e que tudo está correndo bem, eu vou matá-la. Havia uma razão para minha mãe me ter dado uma runa de Aranha. Mesmo criança, eu tinha sido paciente. Capaz de esperar pela minha vez, pelo momento certo para falar, inferno, até mesmo para esperar o Natal vir todos os anos. De alguma forma, eu sempre tive esse tipo de restrição interna. Eu podia sentir raiva fria pela morte de Fletcher, mas eu podia controlá-la – não importa quanto tempo eu tivesse de esperar para vingar o seu assassinato. Uma hora mais tarde, Finn recostou-se na cadeira e entrelaçou os dedos atrás da cabeça. Ele estava sentado à mesa da cozinha, uma caneca de café de chicória ao lado do seu notebook. — De acordo com uma das minhas fontes e dos recibos de cartão de crédito dele, Donovan Caine gosta de almoçar todos os dias no Cake Walk. — Esse gorduroso restaurante na Avenida St. Charles? — eu perguntei. — Esse mesmo. O Cake Walk era muito parecido com o Pork Pit – um lugar com um buraco na parede para gin21 e que serve comida melhor do que qualquer restaurante cinco estrelas de Ashland. O Cake Walk especializou-se em sobremesas, juntamente com sopas, sanduíches e chá gelado tão doce que dava para roer o açúcar entre os seus dentes. Era perto da universidade comunitária e eu já tinha comido lá várias vezes. Muita maionese na salada de frango para o meu gosto.
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No sentido de haver poucas probabilidades de algo assim ter acontecido. É uma bebida destilada à base de cereais e zimbro. É considerada uma bebida muito forte, com teor alcoólico superior ao uísque. Teve origem nos Países Baixos, no século XVII. 21
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Usando o meu laptop, eu pesquisei o restaurante, juntando toda a informação que conseguia encontrar. O Cake Walk estava situado junto dos edifícios da borda da faculdade e era virado para uma rua movimentada de quatro pistas que atravessavam abaixo. Os meus olhos estudaram um mapa online mostrando o restaurante e outros marcos da zona. — Arranja-me os desenhos técnicos do restaurante e alguns mapas melhores da área — eu pedi a Finn. Ele assentiu, discou um número em um dos meus celulares descartáveis e falou com alguém em voz baixa. Alguns minutos depois, Finn me fez o sinal do polegar para cima e desligou. — Sendo enviado por e-mail diretamente do escritório do urbanista — ele disse. Eu levantei uma sobrancelha. — Escritório do urbanista? Não é a sua multidão habitual. Qual das secretárias você fodeu lá? Finn sorriu. — Bethany. Senhora mais velha. O marido a deixou por uma mulher mais jovem. Eu a ajudei a perceber exatamente o que ela tinha a oferecer aos bons homens de Ashland. — E o que seria isso? — O melhor par de pernas que eu já vi — Finn suspirou. — Pernas maravilhosas que pareciam não acabar nunca, especialmente quando estávamos na cama... — Poupe-me os detalhes e apenas me mostra a pasta. Fui até à mesa da cozinha e me inclinei sobre o seu ombro. As mãos de Finn deslizaram pelo teclado enquanto ele abria uma das suas contas falsas de correio eletrônico. Esqueça a penicilina. A Internet era a melhor coisa inventada alguma vez. Ela fazia com que a troca de informações anônimas fosse muito mais fácil. O computador sibilou e Finn abriu um novo e-mail. Os esquemas e mapas apareceram na tela, junto com algumas fotos ao nível da rua. Bethany realmente tinha gostado do tempo dela com Finn para lhe dar toda esta informação tão rapidamente. Eu comparei as informações das pastas ao mapa online que eu tinha visto. — Parece possível — Finn disse, expressando os meus pensamentos. — Um par de saídas, um monte de tráfego a pé por causa do almoço, várias ruas laterais e edifícios para
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se perder, para não falar do campus da universidade. Mas ainda vai tomar um grande risco. Caine é um detetive, no fim das contas. Quem quer que tenha contratou Brutus provavelmente tem pessoas observando-o, só para terem a certeza que ele permanece na linha. — Eu sei. Mas eu preciso falar com Caine. Encontrar-me com ele é a única forma que vamos ter de chegar ao fundo disto e descobrir quem armou para nós e por quê. — Quando quer fazê-lo? — Finn perguntou. — Amanhã — eu disse. — Nós faremos o primeiro contato amanhã.
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Capítulo 12 — Deixe-me entrar com você — Finn disse. Nós estávamos sentados em um Cadillac Escarlate preto no fim da rua que abrigava o Cake Walk. Noite passada, Finn tinha pegado a luxuriosa SUV emprestada em um dos estacionamentos do centro da cidade. Ele pode ser um glorificado banqueiro, mas Finn também era muito útil em mudar certos itens de dono, como carros. Normalmente, nós iríamos dirigindo sua Mercedes ou qualquer um dos outros seis carros que ele tinha. Mas desde que a Elemental do Ar sabia exatamente quem o Finn era e tinha alguém no departamento de polícia trabalhando pra ela, nós tínhamos decidido roubar qualquer transporte que nós fossemos precisar nos próximos dias em vez de usar seus próprios veículos. Só no caso de alguém do departamento tenha colocado um alerta nas rodas do Finn. Além disso, furtar o carro de alguém estava bem abaixo na lista quando o assunto era crimes em Ashland. Mesmo se alguém reportar seu carro roubado passaria um par de dias antes de a papelada passar para reportar isso. Essa coisa já estaria acabada faz tempo até lá. Uma vez que nós estávamos com o veículo, nós tínhamos trabalhado tarde da noite em como eu iria abordar Donovan Caine. O que iria revelar, prometer, ameaçar. Finalmente, perto de três da manha, nós tínhamos ficado no meu apartamento para descansar para o meu grande encontro no almoço. — Você vai precisar de algum reforço — Finn adicionou. — Só no caso de Caine decidir que ele quer te prender, não importa quanto dano colateral possa existir. — Caras como Caine tentam evitar danos colaterais. Isso não significa que as coisas não possam dar erradas, mas é melhor você ficar aqui fora. Eu não preciso me preocupar com você enquanto eu estou falando com o detetive — eu sorri. — Além disso, alguém tem que dirigir o carro de fuga. Finn bufou.
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— Isso não é Conduzindo Miss Daisy. E você certamente não parece com a Jéssica Tandy. Se camuflar com o que te rodeia era outra habilidade que os assassinos tinham que comandar. Algumas vezes eu uso roupas chamativas para conseguir isso. Perucas, maquiagem, óculos, joias. Algumas vezes eu uso meu corpo. Afetando um sotaque, andando de certa maneira, falando alto e sem parar. Mas o que eu faço de melhor é ser invisível. Em parecer e agir tão completamente normal e tão comum que eu desapareço, igual papel de parede. Movimentos lentos, voz quieta, expressão neutra. Você me via, mas não chegava a registrar o fato de que eu estava ali. Uma habilidade que eu tinha aperfeiçoado enquanto vivia nas ruas quando criança. Nenhum dos sujos, desprivilegiados, e oprimidos, nunca queriam chamar atenção para si mesmos, exceto pelos vampiros que se prostituem. A última aproximação era aquela que eu tinha decidido usar hoje. Só sendo eu mesma. Jeans, botas, camiseta, jaqueta. Conforto casual. Minha única concessão à reunião de hoje era minha camiseta branca, que conta com um monte de amoras. A camisa mergulhava em um V profundo na parte da frente que cortava as amoras e mostrava meu pescoço e a borda do meu sutiã de renda branco. Todo homem gosta de olhar seios, não importa a quem eles estão anexados. Se me desse uma vantagem momentânea ou ao detetive uma excitação barata, ainda melhor. Eu não estava acima de usar o que eu tinha. Mas eu não entraria sem minhas facas de Silverstone. Uma em cada manga, duas enfiadas em minhas botas e outra escondida na parte inferior das minhas costas. Meu usual arsenal de cinco pontos. E Jo-Jo estava certa. Eu tinha minha mágica de Gelo e Pedra para recorrer se as coisas ficarem realmente desesperadas. Mas isso não iria acontecer. Porque eu era mais esperta do que isso. Mais forte. E Donovan Caine não era o lascivo, bastardo estuprador que seu parceiro morto tinha sido. Eu encarei para fora das janelas escurecidas ao Cake Walk. Um enorme bolo de chocolate coberto com chantili e uma desbotada cereja lascada cobria a maior parte da janela da frente. Pessoas relaxavam em pequenas mesas no lado de dentro. Era quase uma da tarde e um estável número de pessoas entravam e saíam do restaurante, como se almoçando em uma linha de montagem. Finn e eu tínhamos estado sentados no mesmo lugar pela última hora. Finn mantinha seus olhos fixos nas glamurosas mulheres que entravam e saíam do restaurante enquanto eu procurava por Caine. — Onde você acha que o Caine está? Já são quase uma. Ele já devia ter chegado. Finn deu de ombros.
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— Minha fonte disse que ele geralmente está no restaurante às doze e trinta. A maioria de suas faturas de cartão de crédito indica que ele sai por volta de uma e quinze, uma e meia. Talvez ele tenha pegado um caso. Eu tinha acabado de virar de volta para janela quando eu vi Caine virando a esquina. Ele caminhou pela rua, mais uma vez se movendo com aquela solta e fácil confiança que eu acho tão atrativa. Ele usava um amassado terno azul e uma camisa branca que fazia sua pele brilhar como bronze polido. Uma listrada gravata prata pendurada solta em volta de seu pescoço. O cabelo preto dele estava amarrotado, como se ele tivesse correndo seus dedos por ele em frustração e sua expressão estava fixada em uma carranca. Eu podia ver o duro brilho de seus olhos castanhos mesmo a essa distância. O detetive me lembrava um Hispânico Dirty Harry, pronto para calar qualquer um que entrasse em seu caminho. Alguém não tinha tido uma boa manhã. Eu me perguntava se era porque tinham mandado ele se afastar do assassinato de Gordon Giles. Caine abriu a porta do Cake Walk e entrou. Eu fiquei onde eu estava vendo o fluxo de pessoas e carros. Cerca de trinta minutos depois de Caine entrar no restaurante, dois caras usando ternos pretos aparecerem no final do quarteirão. Eles tinham o olhar corporativo e se vestiam de acordo e se misturavam bem com a multidão de homens de negócios, exceto por um par de coisas. Primeiro de tudo, eles não estavam com pressa para voltar para o escritório como todos os outros. Segundo, suas faces eram mais duras, mais frias do que a dos corporativos ao redor deles. Terceira e mais chamativo, eles tinham os braços ligeiramente para os lados em uma maneira que sugeria que cada um deles tinha uma arma dentro de seu paletó. Talvez duas. Um deles comprou um jornal de um vendedor na esquina, enquanto o outro ascendia um cigarro. — O bom detetive está sendo seguido — Finn disse. — Eu esperava isso — eu murmurei. — A pergunta é: ele sabe disso ou não? Eles são parte do time da Elemental do Ar? Eles são policiais? — Definitivamente não são policiais — Finn disse. — Mesmo os mais sujos detetives sabem melhor usar um terno de cinco mil dólares. Aqueles caras estão usando o último desenho da coleção masculina de outono da Fiona Fine. Eu sacudi minha cabeça. — Você e suas roupas. Pior do que uma mulher. A próxima coisa que eu sei é que você vai estar falando sobre sapatos.
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— Nada — Finn disse. — É tudo sobre o terno. Ninguém olha os sapatos de um homem. Eu encarei os dois homens. Um deles parecia contente em ler seu jornal enquanto Caine almoçava. O fumante era mais aventureiro. Ele foi andando em direção de três mulheres encostadas no edifício, bebendo mochas gelados e olhando os empresários que passavam andando. Coeds22, pela aparência de suas apertadas blusas, brilhante piercing no umbigo e mochilas. A espreita de sua graduação de Sra. O homem começou uma conversa com as garotas, então puxou um pedaço de papel do bolso e passou a uma das garotas. Humm. Isso podia ser útil. — Mantenha um olho naquelas garotas. Tenha certeza de que elas não vão embora enquanto eu estou lá dentro. — Com prazer — Finn respondeu. Eu esperei mais alguns minutos, mas os vigias do Caine não fizeram nenhum movimento em direção ao restaurante, exceto olhar para cima toda vez que alguém passava pela porta. Eu não gostei do fato de alguém estar vigiando Caine, mas essa é a melhor chance que eu teria de ficar perto do detetive. Para descobrir o porquê de ele ter ficado tão interessado em Gordon Giles e o que Giles tinha estado realmente aprontando. Eu tinha que arriscar. E se eu tivesse que ninar os dois homens seguindo o detetive, bem, eu ficaria mais aborrecida sobre sangue respingando em minhas roupas do que derrubar seus corpos na calçada. — Tudo certo — eu disse. — Eu vou entrar. Se eu não estiver de volta em vinte minutos... — Eu devo te deixar para trás — Finn terminou. — Eu sei o procedimento Gin. Eu estava fazendo isso para o meu pai muito antes de você estar por perto. A menção ao Fletcher trouxe uma sombra escura ao carro. O rosto do Finn endureceu e ele virou para longe. Mesmo através das escuras lentes de seus óculos de sol, eu podia dizer que ele estava piscando as lágrimas de volta para dentro. O mesmo tipo de tristeza me encheu, embora eu tenha chorado todas as minhas lágrimas na outra noite no chuveiro. Mas o pensamento do meu assassinado mentor me motivou a continuar com isso. Achar quem tinha armado para nós e por que era a única maneira com a qual eu poderia manter Finn seguro e ter certeza de que Fletcher não tinha morrido por nada. Estendi meu
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Uma mulher que frequenta uma faculdade ou universidade mista.
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braço e apertei a mão de Finn. Ele não olhou para mim, mas seus dedos se apertaram com os meus. — Me deseje sorte — eu sussurrei e sai do carro. Eu andei em ângulo, em direção à porta da frente do restaurante, fazendo parecer que eu tinha vindo da faculdade comunitária há vários metros longe daqui. Eu coloquei minha mão direita próxima ao meu quadril e apalpei uma de minhas facas de um jeito que a ponta mal passava do topo da manga de minha jaqueta. Meu polegar acariciou o punho. Do canto dos meus olhos, eu podia ver o cara com o jornal me espiando sobre o topo. Mas ele não me reconheceu do pobre desenho da polícia porque ele não se moveu em minha direção, gesticulou para o seu parceiro ou puxou um celular e chamou reforço. Mesmo assim, eu adicionei um balanço de flerte em minha longa caminhada para dar a ele outra coisa para se focar além de meu rosto. Eu esperei um par de caras carregando maletas sair da porta da frente e entrei no Cake Walk. O restaurante era escuro e frio depois do calor do sol do meio dia e eu diminui meu passo, deixando meus olhos se ajustarem a luz. Meus dedos roçaram contra a parede ao lado da porta e eu ouvi as vibrações da pedra. Auto, alegre, assim como os trabalhadores do restaurante enquanto gritavam ordens uns aos outros. A única coisa para se preocupar aqui eram quantas calorias o bolo triplo de chocolate tinha e quão rápido elas iriam direto para o seu traseiro. Um balcão, não muito diferente do que tinha no Pork Pit, corria ao longo da parede dos fundos. Atrás da divisória de vidro, trabalhadores faziam sanduíche de salada de frango, preparavam tigelas de sopa de batata, cortavam brilhantes fatias de tortas de amora úmidas e dourados bolos Mountain Dew. O cheiro de açúcar, canela e noz-moscada pairava no ar e eu quase podia sentir a gordura nas paredes. As cabines vermelhas, mesas de metal e cadeiras de ferro estavam limpas, mas desbotando e brilhando de desgaste. Donovan Caine sentava sozinho em uma cabine no canto, com vista para rua. Ele tinha tirado seu paletó e rolado as mangas de sua camisa para cima. Um punhado de cabelos pretos cobria seu marrom antebraço. Caine comia um sanduíche de presunto. Um saco de batatas fritas, uma porção de salada de repolho e dois pedaços de torta de amora decoravam sua mesa, junto com um copo de chá gelado. Um homem com um caloroso apetite. Eu fui para o fim da linha de montagem, optando por um pedaço de bolo Mountain Dew e uma limonada que eu não teria a chance de comer ou beber. Eu mantive um olho em Caine, mas o detetive estava focado em sua comida. Ele não olhou para cima, nem mesmo uma vez. Os dois vigias do lado de fora não fizeram nenhum movimento para entrar no Cake Walk, então eu decidi continuar com o meu plano. Eu paguei pela sobremesa, andei até lá e joguei minha bandeja sobre a mesa.
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— Esse banco está ocupado — Caine grunhiu, sem nem mesmo olhar para cima. — Não se preocupe docinho, eu não vou ficar muito tempo — eu sentei em frente a ele. Ele reconheceu minha suave voz. Eu podia dizer pelo jeito que seus largos ombros se enrijeceram em baixo do material de sua camisa branca. O jeito que todo seu corpo ficou tenso. O jeito que ele reuniu sua força começando no fundo de seu estômago, se preparando para atacar. Donovan Caine colocou seu meio comido sanduíche de volta no prato devagar, com cuidadosos e calmos movimentos. Ele colocou suas palmas na mesa e então levantou seus duros olhos aos meus. Eu sorri. — Se importa se eu me juntar a você? Donovan Caine não entrou em pânico. Não começou a tagarelar, gritou, puxou sua arma, ou fez qualquer coisa estúpida que ia fazer com que ele fosse morto. Em vez disso, seus olhos castanhos se cerraram e ele me olhou com uma expressão fria. — Você é a mais audaz assassina que eu já encontrei ou a mais estúpida — a voz dele, um baixo e rico som, rolou para fora das profundezas de seu peito. Meu sorriso alargou — Você tem que ser os dois em minha linha de trabalho. Minha piada foi respondida com outro olhar apertado. Donovan Caine precisava trabalhar em seu senso de humor. — Por que você está aqui? — ele perguntou. — Para terminar o que você começou na outra noite? — Não — eu disse. — Eu não estou aqui para matar você, detetive. Eu só quero conversar. Outra encarada. Então os olhos dele caíram em sua arma presa no coldre de sua cintura. Uma breve tremulação, uma rápida olhada pra baixo e nada mais, mas eu vi. — Se eu fosse você detetive, eu não faria nada estúpido, como tentar puxar a sua arma. Seu corpo ficou tenso, uma rodada de energia muito mais apertada.
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— Por que não? Eu acenei com minha cabeça em direção a janela. — Esta vendo aquele Caddy preto lá fora? A SUV? Ele assentiu. — Um de meus associados está naquele veículo. Acontece que ele tem várias armas com ele. Se eu não sair do restaurante em quinze minutos, ele vai começar a atirar nos Coeds por toda a quadra da universidade. Se eu for impedida ou seguida, ele vai começar a atirar nos Coeds. Se ele ficar entediado ou se o nariz dele coçar, ele vai começar a atirar nos Coeds. Sua escolha, detetive. Eu não mencionei o fato de que eu também tinha uma faca na palma da minha mão e podia danificar sua artéria femoral debaixo da mesa mais rápido do que ele poderia sacar a arma. Eu esperava que não chegasse a isso, entretanto. Eu precisava do detetive e agora mesmo ele precisava de mim também, se ele não fosse muito teimoso para ver isso. Caine não respondeu. Em vez disso, continuou me encarando, como se ele pudesse desvendar os segredos do meu caráter só por me olhar nos olhos. Depois de alguns momentos, seu olhar se desviou do meu. Caine estudou minha face, cabelo, roupas, memorizando isso para usar depois. Ele provavelmente teria um novo, melhor retrato falado meu circulando na mídia a tempo do jornal das seis. Mas o bom detetive não estava acima de checar meus seios. Uma breve tremida nos olhos, uma rápida olhada para baixo e nada mais, mas eu vi. — Tudo bem — ele murmurou. — Converse. Eu tomei um gole da minha limonada. Não estava azeda o suficiente. — Eu tenho uma proposta para você. Caine bufou. — Verdade? O que seria isso? Deixar-me escolher minha própria morte? — Não — eu respondi. — Mas eu achei que você podia estar interessado em descobrir quem me pagou para matar Gordon Giles. Seu olhar aguçou.
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— Você sabe quem foi? — Ainda não, mas eu vou descobrir. — Por quê? — Porque eles me traíram. Eles mandaram alguém para me matar depois que eu matasse Giles. Caine gargalhou, um som áspero, amargo que poderia descascar as pinturas das paredes. Várias pessoas encararam o detetive. Ele esperou até que eles voltassem sua atenção aos seus, meio-comido, pedaços de torta antes de ele falar de novo. — Isso te surpreende? — ele perguntou. — A falta de honra entre assassinos? — Não. Mas que eles tentaram isso em mim, isso surpreende. Eu tenho uma reputação. Uma que está sendo jogada na lama por esse incidente. Eu vou consertar isso. — Então você tem um nome — Caine disse em um tom liso. — Algum estúpido codinome que não significa nada para ninguém além de você. O nome Aranha significava mesmo alguma coisa para mim, mas não do jeito que Donovan Caine pensava. Tinha sido ideia do Fletcher e eu tinha concordado com isso. Ele tinha me chamado disso por causa das cicatrizes da runa em minhas palmas. Ele também disse que eu tinha lembrado ele de uma aranha quando nós nos vimos pela primeira vez, com braços magros e longas pernas se escondendo num canto escuro. A memória me puxou, querendo desabrochar em mais alguma coisa. Mas eu enrolei minha mão livre em um apertado punho e fiz com que as emoções não desejadas fossem embora. Agora não era o momento de mostrar nenhum sinal de fraqueza. — Se importa em me dizer que nome é esse? — Caine perguntou. — Algumas pessoas me chamam de a Aranha. Assassinos não saem exatamente anunciando por aí, mas muita gente que negociava com o lado sombrio da vida sabia meu codinome, se nada mais. Donovan Caine não era exceção. Mas a mexida de seus olhos e o alargamento de suas narinas me disse exatamente quem e o que ele estava pensando: Cliff Ingles. E, se era eu ou não, quem tinha matado ele. — Se você está se perguntando se eu sou a pessoa que matou seu parceiro, a resposta é sim.
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Nenhuma razão para esconder a informação desde que Caine já estava considerando a possibilidade. Melhor ter isso em aberto do que ter ele distraído especulando sobre isso. Especialmente quando eu precisava que Caine se focasse no problema atual, o que era achar a Elemental do Ar para eu poder matar ela. Se o detetive ficar todo indignado e justiceiro por causa de seu parceiro assassinado, se ele fizer alguma coisa estúpida, como tentar pegar sua arma, eu ia pegar ele aqui mesmo, não importa quanto ele possa ser capaz de me ajudar. Não importa quão cansada eu possa estar de sangue e morte nesse momento. Caine se inclinou para frente. Desgosto e ódio queimavam como brasa em seus olhos. — Você matou Cliff Ingles, meu parceiro, um policial e você vêm aqui com uma proposta para mim? Você é maluca ou só estúpida? — Nenhum dos dois. Eu espero que você não seja tão estúpido e me ouça — eu também me inclinei para frente, meus olhos se encontrando com os dele. O detetive não era o único que podia fazer o olhar duro. — Essas pessoas tentaram me matar. Isso, eu posso até entender. Ser um alvo, ser atingido, você mesmo, é um perigo que vem com o emprego. Mas eles não estavam felizes só comigo. Eles mataram meu intermediário. Outro de meus associados foi quase espancado até a morte. Encurtando, eles me incriminaram e, então, tentaram amarrar todas as pontas soltas. Eles cruzaram a linha, mesmo entre assassinos. Caine bufou. — Você supõe que eu vá sentir pena de você? — Não — eu respondi. — Eu não quero e nem preciso de sua simpatia. O que eu estou oferecendo a você é minha ajuda, detetive. Ele se recostou na cabine, me estudando, tentando ler meus olhos e rosto. Mas eu tinha aprendido há muito tempo atrás como manter minha expressão tão branca quanto um pedaço de papel. Dizer nada, fazer nada, não mostrar nada que você não queira ou tenha que fazer. — Mesmo se eu fosse negligenciar o fato de que você assassinou meu parceiro e considerasse sua oferta, o que eu ganharia em retorno? Além de uma facada nas costas? Eu ignorei seu comentário sarcástico. — Eu tenho alguma informação que pode ser útil para rastrear quem esta por trás do assassinato de Gordon Giles. Não é muito, mas é um lugar para começar. Concorde em trabalhar comigo, me dar qualquer pista ou teorias que você possa ter e eu vou dar a informação para você... Junto com meus outros serviços. De graça. Uma relação recíproca.
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Os olhos dele passaram pelos meus seios de novo antes de voltar ao meu rosto. — Outros serviços? — Você vai precisar de ajuda para rastrear as pessoas que fizeram isso... E lidando com eles... Outra bufada. — Senhorita, eu sou um policial. Eu posso lidar com essas pessoas eu mesmo. Minha vez de bufar. — Verdade? É por isso que o Capitão Stephenson foi o único falando na conferência de imprensa do lado de fora do Teatro? É por isso que ele te impediu de responder qualquer pergunta? É por isso que eu estou sendo culpada pelo assassinato do Gordon Giles, mesmo quando nós dois sabemos que eu estava me pescando para fora do rio Aneirin, quando ele foi morto naquele falso acidente de carro? Encare isso Caine, todo o departamento de polícia de Ashland é tão sujo quanto um par de meias velhas da academia. Excluindo a presente companhia, é claro. Ele não disse nada. — Eu tive a chance de questionar algumas pessoas que eu encontrei ontem à noite. Algumas das pessoas envolvidas nessa conspiração. Todos eles disseram a mesma coisa. Que alguém, algum policial no departamento, estava ajudando eles. Pense nisso. Quão rápido as coisas aconteceram. Quão rápida a minha suposta conexão com Giles foi descoberta e meu esboço passou na televisão. E, então, existe você detetive. Aquele cara do lado de fora do camarote não ia matar só o Giles. Ele ia pegar você também. Você tem que saber isso. E agora você sabe que alguém em seu precioso departamento de polícia estava nisso. Que ele estava bem com deixar você ser morto. Alguém não gosta muito de você, detetive. Silêncio. Donovan Caine se mexeu na cabine. Seu dedo indicador batendo um padrão no topo da mesa. Um músculo se contraiu em sua bochecha direita. Ele queria pegar sua arma. A vontade de fazer isso endurecia sua face, todo seu corpo. O olhar dele se desviou para o SUV do lado de fora e ele se forçou a manter suas emoções. Para relaxar um pouco. Eu tinha estado certa. Caine não era o tipo de policial que estaria bem com danos colaterais. Não importa o quanto ele queira me matar agora mesmo. — Você realmente acha que essas pessoas vão parar o que quer que eles estejam fazendo só porque eu fui presa, colocada na cadeia, ou morta? Não nessa cidade. Não com
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Mab Monroe controlando as coisas. Ela pode ser a pessoa que queria Gordon Giles morto em primeiro lugar, embora eu admita que isso não seja muito provável. — Por quê? — ele perguntou. — Porque Mab tende a lidar com esse tipo de situação ela mesma. É a única maldita coisa que eu admiro sobre ela. O canto da boca do Caine se levantou e ele grunhiu. Ele não iria argumentar aquele ponto. — Pense na minha oferta — eu cortei um pedaço do meu bolo para manter as aparências, mesmo embora eu não tivesse nenhuma intenção de comer. Uma pena. O dourado bolo Mountain Dew parecia delicioso. — Você estava conversando com Gordon Giles por um motivo. Alguém não gostou do que eles pensaram que ele poderia dizer e o que você poderia fazer com a informação. É por isso que eles o mataram. Todo resto é só decoração. Ele fez uma careta. — E que garantia eu tenho de que você está dizendo a verdade? Que isso tudo não é só um elaborado esquema para me matar? Meus lábios se levantaram em um sorriso cheio de dentes. — Porque se eu quisesse você morto detetive, eu teria apenas esfaqueado você no Teatro ou eu podia colocar minha faca na sua garganta agora mesmo — ele ficou tenso de novo. Eu lhe dei uma encarada fria. — Mas eu não vou fazer isso. Eu quero chegar ao fundo disso, e você é a única pessoa que pode me ajudar. Encare isso, Caine. Nós precisamos um do outro, nós gostemos disso ou não — meu tempo tinha acabado. Eu escorreguei para fora do banco e levantei. — Você tem algumas horas para pensar nisso. Se você concordar com minha proposta, ligue a luz da sua varanda da frente às seis horas. Eu vou trazer a evidência que eu tenho e nós podemos trabalhar em futuros termos. Engane-me e você vai acabar como Gordon Giles: nu queimado vivo e deitado em uma placa de aço no necrotério. — E se eu não concordar? Não quiser trabalhar com você? — ele perguntou. Eu dei de ombros. — Então não faça. Basta ficar fora do meu caminho. — Isso é uma ameaça?
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— Não — eu disse, me afastando em direção a porta da frente. — Só o jeito que as coisas são. Alguém estava bastante determinado a matar Gordon Giles sem se envolver e até agora, ela conseguiu isso. Em minha experiência, pessoas determinadas tem uma tendência ao sucesso. E desta vez, sou eu quem está determinada. Eu vou descobrir quem foi o responsável por isso, detetive. Você pode trabalhar comigo e eu vou deixar você ficar com o policial corrupto. Ou você pode vagar pelo sangue e os corpos quando eu acabar. Sua escolha. Caine me encarou, sua face ilegível. Eu acenei para ele, então, me virei e sai para a escaldante luz do sol.
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Capítulo 13 Finn me viu sair da Cake Walk e veio com a SUV preta na minha direção. Eu fiquei à espera de ouvir o som da campainha da porta da frente ao ser aberta. Mesmo eu tendo admitido matar seu parceiro, Donovan Caine não veio atrás de mim de arma na mão e gritando – ainda. Nenhum dos dois homens olhou em minha direção. O primeiro homem estava concentrado na seção de esportes do jornal, enquanto seu amigo tinha parado de flertar com as universitárias tempo suficiente para comprar um salgadinho de um vendedor. Olhei o segundo homem, memorizando suas feições. Um cara pequeno, com cabelo preto, um pescoço grosso e um corpo forte e encorpado. Ele sorriu para o vendedor de salgadinho, exibindo um conjunto de presas. Um vampiro. Um que não estava em condições de higiene muito boas, julgando pelo tom amarelo de seus dentes. Meu olhar foi para as universitárias. Ainda bebendo suas mochas. Elas não iriam a nenhum lugar nos próximos minutos. Bom. Finn puxou o SUV preto até o meio-fio ao meu lado. Eu abri a porta do lado do passageiro e pulei para dentro. Finn se afastou da calçada, não tão rápido para fazer os pneus guincharem, mas rápido o suficiente para significar negócios. Ele cortou na frente de uma dona de casa com TBH – Cabelos Grandes do Tenesse23 – em um Lexus vermelho e ela buzinou com desprazer. Finn enfiou um dedo para fora da janela. — Elegante — eu murmurei. — Muito elegante. Chegamos ao semáforo no final do bloco e eu olhei para o espelho lateral. Donovan Caine estava na calçada. Sua cabeça girou para os dois homens, que estavam ocupados fingindo comer e ler o jornal. Ele franziu a testa, olhando o nosso SUV e anotou alguma coisa em um bloco de notas. Então Caine se virou e andou em direção oposta,
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Por todo o Tennessee você pode ver mulheres ultra-religiosas que acreditam que não devem cortar o cabelo. Muitas vezes elas fazem penteados em que o cabelo fica extremamente volumoso.
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provavelmente voltando para a delegacia. Depois de cerca de trinta segundos, seus observadores o seguiram. Finn viu o detetive também. — Boa coisa que eu improvisei essa noite. Porque se não me engano, o bom detetive acabou de copiar o número de nossa placa. Ele está provavelmente no seu caminho para o quartel general nesse momento para pesquisá-lo. Eu bufei. — Típico. Tente fazer um favor a alguém e ele envia o tráfego de policiais em você. — Você mata pessoas — Finn salientou. — É apenas natural que ele seja cauteloso. — Vamos esperar que ele não seja muito cauteloso para pegar meu acordo. Agora, desça um par de blocos, então circule em torno do Cake Walk. — Quer me dizer por quê? — Você verá. Finn fez o que pedi e cinco minutos depois, ele estacionou no mesmo local que ele tinha começado. Uma vez que tive certeza que Donovan Caine e seus observadores tinham ido, eu sai do carro e andei até o trio de universitárias com que o vampiro tinha conversado. Enfiei a mão no bolso e tirei todo o dinheiro que eu tinha comigo – trezentos dólares e troco. Deveria ser mais do que suficiente para o que eu tinha em mente. Eu parei em frente às garotas e mostrei o dinheiro a elas. — Senhoras posso ter um momento do seu tempo? Eu farei valer a pena — as garotas se entreolharam e depois para mim. — Desculpe — disse uma delas, uma mulher negra e pequena em seus vinte anos — Nós não somos prostitutas. — Eu não estou procurando uma prostituta — eu disse. — Aquele cara que estava falando com vocês mais cedo. O vampiro com pouco cabelo. Ele deu algo a vocês. Estou pensando em um cartão de visitas? A segunda garota, uma morena bonita, bufou. — Sim, ele nos deu seu cartão. Disse que era um caçador de talentos e nos perguntou se já tínhamos feito modelagem. Como se nós todas não tivéssemos ouvido essa cantada antes.
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As três mulheres compartilharam uma gargalhada áspera. Tão jovens e já tão cansadas. Eu gostei delas. Eu abanei o dinheiro para elas. — Bem, tem cem dólares aqui para cada uma de vocês se vocês me derem aquele cartão. A terceira mulher, uma gordinha loira, franziu a testa. — Por que você quer aquela porcaria de número? Nós estamos indo jogá-lo junto com nossas xícaras de café. Eu dei a ela um sorriso largo. — Eu estou vigiando o bastardo para sua esposa. Ela pensa que ele a está traindo. Cada pequena coisa que eu possa pegar dele será mais um prego em seu caixão e mais pensão no bolso dela. Querem ajudar uma irmã? As três mulheres se entreolharam e depois para o dinheiro em minha mão. A morena deu de ombros, enfiou a mão no bolso e arrancou um pedaço de papel amassado. — Por trezentos dólares, é seu. Eu troquei as minhas notas pelo cartão e dei a elas outro sorriso vencedor. — Prazer em fazer negócios com vocês, senhoras — deixei as estudantes com suas mochas e corri de volta para Finn. — Você está procurando por alguma ação, uma garota ou algo assim? — Finn perguntou depois que eu escorreguei para o banco do passageiro. — Só nos seus sonhos, Finn. Olhei para o cartão amassado na minha mão. Charles Carlyle. Um número de celular achava-se escrito abaixo do nome, mas meus olhos estavam firmes no símbolo impresso no cartão – um dente em forma de triângulo com bordas serrilhadas feita em tinta preta. A runa da misteriosa Elemental do Ar. — Então para o que foi esse pequeno desvio? — Finn perguntou. Meu polegar esfregava sobre a runa. — Colocar um nome em um rosto. Agora, vamos sair daqui, antes que Donovan Caine envie os policiais de volta por esse caminho.
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Finn despejou o SUV na primeira garagem que apareceu e pegou algo similar – outro modelo-tardio de Cadillac. Ele dirigiu através das ruas, circulando em torno do distrito do centro duas vezes antes de rodar pelo subúrbio para ter certeza que estávamos limpos de qualquer um que pudesse ter um interesse doentio em nós. Como as Montanhas Apalaches cortavam através de mais de metade de Ashland, os subúrbios ao redor eram mais verdes e limpos do que o que você encontraria na maioria das áreas metropolitanas. Os planejadores da cidade trabalharam duro para mantê-lo desse jeito, especialmente em North Town. As árvores e os bosques de matas densas penetravam na paisagem aqui e ali, ladrões apostando seus créditos entre novas subdivisões e calçadas em frente ao Shopping Center. Ashland também tinha sua cota de complexos industriais, mas cuidadosas plantações de carvalhos e nogueiras escondiam os edifícios em ruínas e acres de concreto da vista. Linhas de pinheiros e torcidas colinas relvadas obscureciam as torres altas da cidade das fábricas de papel. Ironia no seu melhor. Eu olhei para fora da janela. Tudo parecia tão normal, tão inocente no subúrbio. Mães levando seus filhos ao futebol, transportando vans cheias de crianças indisciplinadas. As pessoas andando com seus cachorros. Compradores andando vagarosamente pelas ruas agradáveis, os braços cheios de sacolas. Um Elemental de fogo deixando as chamas dançarem sobre seus dedos e fazendo outros pequenos truques de magia para ganhar algum dinheiro em um dos parques. Um Elemental do Gelo fazendo um show semelhante para crianças em um parquinho a uma milha de distância. Eu não pude evitar imaginar o que esse dia poderia ter sido, se eu tivesse escutado o conselho de Fletcher sobre me aposentar e encerrar os negócios seis meses atrás. Ou se eu não o tivesse deixado me convencer a matar Gordon Giles. Se nós tivéssemos, ambos, apenas dado mais atenção ao trabalho e ao que poderia estar errado com ele, e pensado menos no dia de pagamento. A ganância pode pegar você a qualquer momento, assim como a sorte. Eu poderia ter estado no Pork Pit, atendendo mesas durante a hora do almoço, ajudando na cozinha, ou tentando fazer ainda outro lote do molho secreto do Fletcher. Ou eu poderia ter ido à livraria da comunidade do colegial, trabalhando na minha última tarefa para qualquer que seja a aula que eu tivesse decidido assistir. Poderia estar até cochilando em um voo ao Key West tendo as minhas longas e esperadas férias. Ao invés, eu estava correndo da lei e alguma figura misteriosa me queria morta. Um lugar duro e difícil. A história da minha vida. — Eu fiz um par de ligações enquanto você estava dando uma de detetive — Finn disse. — Sophia eliminou o corpo que você deixou no freezer do Pit. Ela disse para lhe dizer bom trabalho — eu fiz uma careta.
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Por qualquer que seja a razão, quanto mais sangrento e mutilado estivesse o corpo, mais a anã gótica gostava do seu trabalho de eliminação. Eu não sabia o porquê. Eu não queria saber o porquê. Fletcher tinha confiado em Sophia e isso era bom o suficiente para mim. Seus métodos, predileções e possíveis fetiches eram da sua própria conta. — Sophia terminou o trabalho hoje de manhã. Ela disse que achou que seria melhor esperar até hoje, pois os policiais já haviam retirado o corpo do meu pai — a voz de Finn quebrou na última palavra. — Sinto muito, Finn. Ele clareou a garganta e deu de ombros. — Todos nós sabíamos que isso provavelmente aconteceria um dia. O papai entendia e aceitava os riscos, assim como nós fazemos. — Fletcher pode ter sido um assassino, mas ele sempre manteve sua palavra. Ele não merecia ser traído assim. Isso não ficará impune. Finn assentiu. — Sophia diz que os policiais estão tratando-o como um assalto que deu errado. Mais outro que deu errado em uma vizinhança incerta no sul da cidade que está indo ladeira abaixo. Eu bufei. — Em outras palavras, eles já encerraram o caso e passaram para o próximo. — É do jeito que é o mundo, Gin. É o jeito do mundo — ele me deu um olhar de soslaio. — Antes de chamar a polícia ontem, Sophia tirou uma foto do corpo do papai. Ela pensou que eu poderia querer ver por mim mesmo. Eu fiquei tensa. Maldita essa garota anã gótica. Maldita e maldita duas vezes. — Ela enviou a foto para mim enquanto você estava dentro do Cake Walk — Finn virou sua cabeça para olhar para mim. — Por que você não me contou que ele foi torturado até a morte por um Elemental do Ar? Eu não conseguia ver os olhos verdes de Finn atrás de seus óculos de sol escuros, mas o pesar cru fez sua voz sair áspera, como se alguém tivesse arranhado um ralador de queijo por cima de suas cordas vocais.
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— Porque morte é morte. Você não pode voltar de lá, por isso não importa particularmente como você chega lá — minha voz tão áspera quanto à dele. As mãos de Finn apertaram o volante. — Ainda assim deveria ter me contado. — Eu estava tentando poupar os detalhes. Emoção afiou minha voz, fazendo-a mais dura do que eu teria gostado. Eu tenho visto muitos corpos em meu tempo, mas nenhum tão ruim quanto Fletcher. A imagem de seu rosto arruinado e esfolado, a alegria que alguém mal intencionado tinha tomado em fazer isso a ele, sempre me assombraria. Outro fantasma do passado que eu nunca seria capaz de banir, não importa o quão duramente eu tentasse. Porque eu podia ter parado isso. Eu devia ter parado isso. Devia ter chegado ao Pork Pit mais cedo. Devia ter sido mais forte, mais rápida, melhor e mais esperta. Devia ter sido tudo o que Fletcher me ensinou a ser, ao invés de apenas uma decepção amarga. As memórias de mais dois corpos relampejaram pela minha mente – a fumaça e casca queimada que tinha sido minha mãe, Eira. Minha irmã mais velha, Annabella. Um respingo de sangue sobre as rochas onde Bria tinha se escondido. O cheiro de carne queimada encheu meu nariz. Gritos de fúria e dor tocaram em meus ouvidos, juntamente com meus próprios soluços sufocados… O SUV colidiu em um buraco, quebrando o feitiço mórbido. Mas o nó apertado de raiva em meu peito bateu, acompanhando em perfeito tempo com meu coração. Uma vez que consegui me controlar, eu me inclinei, coloquei minha mão sobre a de Finn e apertei. Ele não se afastou, mas ele não me olhou tampouco. Eu deixei de lado e sentei de volta em meu banco. Nós não falamos por vários minutos. — Sophia te disse mais alguma coisa? Ela está mantendo sua promessa de cuidar do restaurante, não é? — eu perguntei. — Sim, Sophia disse que poderia cuidar de Pork Pit. Não é um grande negócio. Ela fez isso antes. — O que você vai fazer com o restaurante? — eu perguntei. — Quando isso acabar? É seu agora. Finn encolheu os ombros. — Eu não sei. Eu ainda não cheguei a esse ponto. Suponho que isso depende do que nós encontrarmos e se seremos ou não mortos no processo.
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Eu assenti. O pensamento da morte não me assustava. Eu tinha visto muito disso, tratado muito disso, para sentir medo. Era a tortura que poderia ser infligida antes da morte que me assustava. É aí que a dor real estava. E se você tiver o azar de não morrer, as memórias alfinetariam você muito mais, cada uma, um novo conjunto de alfinetes espetando seu coração. A morte era uma libertação, de muitas maneiras. O fim do sofrimento. Uma fuga para outra coisa. O que a outra coisa era, eu não sabia. Talvez céu. Talvez inferno. Talvez nada. Mas eu duvidava que pudesse ser pior do que algumas das coisas que eu tenho visto e feito em meu tempo de vida. Ou o que eu ia ter que fazer para ter certeza que Finn e eu sobreviveríamos nos próximos dias. Quando ele estava certo que ninguém estava nos seguindo, Finn voltou para nosso apartamento. Ele deixou o SUV roubado a seis blocos de distância. Usando um caminho tortuoso, nós caminhamos de braço dados, cabeças juntas, como um casal de amantes alheios ao resto do mundo. Nossa rota nos levou a passar pelo Pork Pit. O toldo esfarrapado parecia o mesmo, mas o porco de neon estava escuro, triste, quebrado. Assim como Fletcher. Culpa e sofrimento me encheram e eu me concentrei em minha respiração, tentando esmagar os sentimentos. Mas ao invés de gordura de fritura e especiarias, o cheiro de tabaco encheu o ar, aumentando o meu desconforto. Um cigarro pendia dos lábios finos do homem parado em frente ao restaurante. Ele segurava uma fita métrica em uma mão e tomou um gole do refrigerante Dr. Enuf que ele tinha fechado na outra. Uma caixa de ferramentas estava pousada na calçada rachada perto de seus pés com botas. Um vidraceiro entediado, fixando o painel que eu tinha esmagado. Meus olhos agitaram passando pelo homem e eu vi Sophia Deveraux dentro do restaurante. A anã gótica vestia suas calças pretas comuns e botas, apesar de que hoje, sua camiseta escolhida era branca com uma caveira preta e ossos cruzados na frente. Um conjunto de colar com pontas pratas cercavam seu pescoço. Seu batom preto era uma barra escura no rosto pálido. Sophia estava muito ocupada limpando para me notar. Ela empurrava um esfregão para frente e para trás no chão. Os músculos grossos nos braços esticavam e relaxavam com cada movimento. Sophia olhou para o chão como se ela pudesse limpar com a força de sua mente, se não com seus golpes poderosos. Eu nunca tinha visto a anã fazer qualquer mágica, mas o olhar firme preto de Sophia me fez pensar se ela tinha adquirido qualquer um dos poderes de Elemental do Ar que sua irmã Jo-Jo tinha – e o que ela poderia ser capaz de fazer com isso.
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Cada um dos quatro elementos se prestava a várias coisas. Alguns Ares podiam controlar o clima. Outros se tornavam curadores. Os de Pedra trabalhavam frequentemente em construção ou nas minas de carvão que ficavam no norte da cidade. A maioria dos de Gelo gostavam de tendências artísticas, como escultura. Alguns dos de Fogo também eram artistas, usando seu calor para forjar cerâmica e outras coisas. Elementais podiam fazer tantas coisas que era impossível citar todas e isso sem contar com as pessoas com aptidões que vinham de desdobramentos dos elementos como metal, água e eletricidade. Eu olhei para Sophia e eu me perguntei. Finn viu Sophia também. Demorou alguns segundos para ele perceber o que ela estava fazendo – e exatamente o que ela estava limpando. Impossível de perder. O sangue de Fletcher tinha tornado vermelhas as tiras brancas e espessas do esfregão fazendo-o parecer como uma rosa enferrujada. O rítmico sibilar do esfregão contra o chão era como uma faca em meu coração. Torcendo e virando até não haver nada dentro de mim que não tivesse sido rasgado em tiras. Os passos de Finn diminuíram e vacilaram. Eu cerrei meu aperto em seu braço e o arrastei através da rua, antes que ele pudesse fazer algo estúpido, como parar. Ou pior, tentar ir dentro do restaurante. O Elemental do Ar podia não ter homens observando o restaurante desde que Fletcher morreu, mas era uma chance que eu não iria pegar. — Em breve — eu sussurrei em seu ouvido. — Em breve — Finn assentiu e nós passamos. Nós tomamos o elevador até o meu andar e nos aproximamos da minha porta. Eu pressionei minha mão contra a pedra, deixando a textura áspera trabalhar em minha palma. Nenhuma nota de alarme, sem explosões repentinas de perigo. A pedra murmurou em uma voz baixa, como de costume. Ninguém tinha estado perto do lugar o dia todo. — Limpo — eu disse. Finn estremeceu e pôs a chave na fechadura. — Você sabe o quanto isso é assustador, certo? Você escuta um monte de pedras? É apenas não natural. — O que não é natural é o fato de você gastar mais com produtos de cabelo do que eu — eu disse, tentando aliviar o clima. Estendi a mão e cocei sua cabeça, bagunçando seus cachos cor de noz. — Hey! Hey! — Finn protestou. — Qualquer coisa, menos o cabelo. Eu quase consegui dar um sorriso. Nós entramos. Finn acomodou-se na mesa da cozinha e ligou seu laptop. Ele clicou através de suas várias contas de e-mail e mensagens,
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vendo o que suas fontes tinham sido capazes de desenterrar de Gordon Giles e qualquer um que poderia o querer morto. — Aqui — enfiei a mão no bolso e passei-lhe o cartão de visitas que eu tinha pegado das garotas do lado de fora de Cake Walk. — Veja o que você pode encontrar sobre esse cara, também. Quem ele é, onde trabalha, onde frequenta. Finn acenou o cartão para mim. — Você realmente acha que isso nos levará a algum lugar? As identificações que nós pegamos do outro cara eram todas falsas. Eu dei de ombros. — O idiota foi estúpido o suficiente para distribuí-lo àquelas garotas enquanto ele estava bancando o cão de caça de um cara. Aposto que ele foi estúpido o suficiente para dar a elas um com seu nome verdadeiro nisso. Se nós contarmos com Donovan Caine, nós podemos sempre ir fazer uma visita ao Sr. Smooth. Vale a pena tentar. Enquanto Finn testava os fios de seda de sua rede de informações, eu me movi pela cozinha. — Em problemas mais importantes, qualquer pedido é especial para o almoço? — Sanduíche — Finn murmurou, nunca tirando seus olhos da tela piscando. — Você faz o melhor sanduíche. Palavras mais verdadeiras nunca foram ditas. Eu abri a geladeira e examinei dentro decidindo o que usaria nos sanduíches. Cinco minutos depois, eu tinha dois sanduíches de peru e Gouda no pão de centeio integral. Eu adicionei picles e um par de mini cenouras em cada prato, juntamente com alguns biscoitos de chocolate duplo. Cor e apresentação eram a chave quando se trata de preparação de alimentos. Pelo menos, é o que meu professor de culinária tinha afirmado no semestre passado, quando ele tinha nos mostrado como transformar tomates em rosas com nossas facas de poda. Eu fiquei perita no final. Eu pus um prato em frente ao Finn e peguei uma cadeira do outro lado da mesa. — Nada sobre Sr. Smooth ainda? — eu perguntei. Finn deu uma mordida em seu sanduíche.
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— Trabalhando nisso. Você estava certa o idiota foi estúpido o suficiente para nos dar seu nome verdadeiro, que é Carlyle, a propósito. Chales Carlyle, embora seus amigos provavelmente o chamem de Chuck. Adivinha onde ele trabalha? Eu nem sequer tive que pensar sobre isso. — Indústrias Halo. Finn atirou seu dedo para mim. — Bingo. Ele é o vice-presidente executivo. Eu franzi a testa. Carlyle não me pareceu um verdadeiro tipo corporativo. Mais como um guarda vestido com um terno. — Vice-presidente executivo? É uma boa maneira de dizer que ele é a puta24 corporativa de alguém. Finn manteve seus olhos verdes no computador. — Puta corporativa de Haley James. Parece que ele se reporta diretamente a ela. Uma nova contratação. Só começou há alguns meses. O nome de Haley James continuava aparecendo em todos os lugares que nós olhávamos. Não o suficiente para provar sua culpa de ser a Elemental do Ar ou de estar por trás do ataque a Giles, mas definitivamente o suficiente para fazê-la uma pessoa de sério interesse. — Eu colocarei mais pedidos de informações sobre Carlyle — Finn prometeu. — Até hoje à noite eu devo ter um registro de tudo o que ele já fez. — Bom — eu disse. — E sobre o colar de dente? Alguma pista? — A runa? Nada até agora. Não é usado por qualquer pessoa que eu ou meus amigos consideráveis sabemos. Eu coloquei mais antenas com meus contatos. Talvez alguma coisa apareça. Eu franzi a testa de novo. Runas eram importantes, especialmente para os usuários de magia. Elas transmitiam informações, mostravam lealdade, inspiravam medo – e temor. Inferno, eu odiava essas malditas coisas, mas eu ainda tinha três delas na minha cornija. E mais duas em minhas mãos, quer eu as quisesse lá ou não. 24
No sentido de ser tipo um fantoche, que obedece às ordens de alguém.
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Um dente representava prosperidade. Poder. Usando isso como seu símbolo significava que você estava tentando mandar a mensagem que você era forte. Alguém a ser visto com cuidado. Se nós encontrássemos quem usava a runa, nós teríamos encontrado quem tinha definido essa coisa toda. Ou ao menos, alguns de seus subordinados. Eu não tinha nenhum problema em matar meu caminho pela cadeia alimentar até que eu chegasse à própria Elemental do Ar. Charles Carlyle seria tão bom quanto qualquer outro cara para começar. — E sobre Caine? Acha que ele vai aceitar sua oferta por troca de informações? — Finn triturou uma cenoura entre seus dentes. Eu encolhi os ombros. — Eu não sei. Depende do que ele quer mais... Eu morta por matar seu parceiro ou encontrar quem realmente assassinou Giles e descobrir qual de seus prezados companheiros policiais a está ajudando. Meu dinheiro na segunda opção. Caine já pensa que eu sou um monstro. Ele vai querer ir atrás dos outros dois, os que ele não conhece. Finn olhou para seu relógio. — São quase três horas. Ele só tem algumas horas para pensar. — Eu sei. E eu espero que ele faça a decisão certa. Para o bem de todos. Finn bufou. — Você está apenas dizendo isso porque você quer fodê-lo. Eu parei. — O que o faz dizer isso? — Vamos lá, Gin, não jogue comigo. Você tem uma coisa por Donovan Caine. Você tem desde que matou Ingles e ele ficou todo obstinado e determinado em encontrar você. Fletcher me disse sobre o arquivo que ele compilou do bom detetive. Meus dedos esmagaram meu sanduíche, deixando sulcos no pão de centeio. Maldito Fletcher. Maldito e maldito duas vezes. Aquele arquivo era para ficar apenas entre nós dois. Mas eu deveria ter sabido que ele teria contado a Finn sobre isso. O homem mais velho tinha compartilhado tudo com seu filho – incluindo minha curiosidade interessada no detetive. Talvez tenha sido sua boa aparência escura ou o ar de confiança que irradiava de Donovan Caine. Talvez tenha sido a eterna carranca que apertava seu rosto. Ou a tensão de
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ser um homem honesto que estava sentado sobre seus ombros como se ele fosse Atlas carregando o peso do mundo. Ou talvez tenha sido o simples fato que ele ainda era agarrado aos ideais que eu tinha desistido há muito tempo. Mas algo nele me fascinava. — Talvez eu o ache... Interessante — eu admiti. — Atraente em um tipo de jeito de mocinho. Mas isso não me impediria de matá-lo se ele fizesse alguma coisa estúpida, como tentar nos trair. Isso é algo inegociável, não importa o quanto de potencial de transa Donovan Caine possa ter. Finn levantou seu café em uma caneca para mim. — Essa é minha garota. Uma cadela implacável até o fim. Eu o saudei com meu sanduíche. — Sempre.
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Capítulo 14 — Exatamente quanto tempo vamos ficar aqui fora? — Finn perguntou. — Já se passaram horas. Finnegan Lane poderia ser um expert quando se trata de computadores, as leis bancárias internacionais, e fazer as mulheres tirarem a roupa, mas a paciência não era uma de suas virtudes. Outra razão para Fletcher ter me treinado em vez dele. Assassinos que não gostam de esperar fazem coisas estúpidas e depois morrem. — O tempo suficiente para ele pensar que não estamos chegando hoje à noite e relaxar a guarda — eu disse. — Agora pare de ser mimado. É pior a lamentar-se do que uma criança. Olhei por um par de óculos de visão noturna. Donovan Caine vivia em uma casa modesta. Com dois andares e estrutura de madeira, era localizada no final de uma rua sem saída e ficava a cerca de duzentos pés acima de uma colina. Pinheiros forravam a calçada curva que levava até a casa. Finn e eu tínhamos roubado um carro novo e deslizado no bairro suburbano pouco antes das seis. Sorte para nós, um dos vizinhos de Caine em idade universitária tinha decidido dar uma festa barulhenta. Duas dúzias de carros estavam estacionados na rua, enquanto pelo menos uma centena de pessoas, a maioria em seus vinte e poucos anos, estavam em torno da casa estilo fazenda, que era a mais próxima ao domicílio do detetive. Um garoto de faculdade bêbado tinha tropeçado, virou-se e vomitou sobre o capô do nosso SUV roubado. Eu tive que impedir Finn de sair e esfregar o nariz do cara em seu próprio vômito. — Nem sequer é o seu carro — eu apontei. — Você o roubou do estacionamento do shopping. — É o princípio da coisa — Finn fungou. — Este é um Mercedes. Você não vomita em um Mercedes.
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Sentamos-nos a cerca de duas centenas de metros da casa, fora do alcance de câmeras de vigilância ou qualquer equipamento que poderia estar em torno desta estrutura. Além da festa, não havia muita atividade nas ruas. Algumas pessoas vindo do trabalho e indo para o jantar; algumas crianças com uniformes de futebol saindo de um carro; pessoas carregando mantimentos para dentro. As rotinas habituais do subúrbio. Exatamente às seis horas, a luz no alpendre de Donovan Caine tinha acendido. O detetive parecia ter aceitado minhas condições. Ou pelo menos queria que eu achasse que ele tinha. Eu não tinha visto qualquer vestígio de atividade em toda a casa. Nenhum policial escondido nos arbustos, nem detetives a paisana disfarçados de suburbanos, nem a SWAT estacionada em uma van sem marcação. Mas isso não significava que Caine não estava esperando com mais uma dúzia dos mais corruptos de Ashland. Após a luz ter aparecido, Finn e eu havíamos saído da rua. Nós tínhamos matado tempo comendo alguns salgadinhos de milho picantes e salsa em pedaços, de um dos restaurantes mexicanos. Nós tínhamos retornado e passamos as últimas três horas vigiando a casa do Caine. — Eu ainda não consigo acreditar que ele acendeu a luz da varanda — disse Finn, deslocando-se no banco do motorista. — Ele deve estar tão louco e desesperado como nós. — Ou ele sabe que há mais nisso do que os olhos podem ver e quer chegar ao fundo disso — eu respondi. — Você sabe que poderia estar caminhando para uma armadilha. Caine poderia estar esperando lá dentro com uma espingarda, pronto para explodir você e te mandar ao inferno. — Ele poderia, mas eu não acho que ele vai — eu disse. — Ao ligar a luz, ele me deu sua palavra. Isso significa algo para um homem como Caine Donovan. Finn bufou. — Sim, isso significa que você vai perceber que ele é um mentiroso excepcionalmente bom quando você estiver segurando seu intestino e asfixiando em seu próprio sangue no chão de sua sala. Inclinei-me para frente e olhei através dos óculos para a casa. Já passava das onze agora e o dia há muito tempo deu lugar à noite. A escuridão teria encoberto a rua em um manto de silêncio, se cada poste de iluminação perto da casa em festa não tivesse sido ligado ao máximo juntamente com um sistema de som impressionante. Na festa ali perto,
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eles tocaram "Sweet Home Alabama" tantas vezes que eu queria entrar na festa e matar a facadas quem estava selecionando as músicas. Mas o rock estridente, a luz quente e a cerveja não chegaram até a colina de Caine. Sombras se agrupavam em torno da casa, como poças de sangue, sempre em expansão, invadindo a alegria da festa. Uma luz estalou em uma das janelas do segundo andar e uma figura alta e esguia passou na frente dela. Donovan Caine. Eu ajustei os óculos, mas não consegui distinguir suas feições através das cortinas grossas. Ele parecia agitado, andando de um lado da sala para o outro. Sua mão estava em sua cabeça, como se ele estivesse falando em um telefone celular. Ele parecia estar discutindo com alguém. Um par de faróis apareceu no espelho retrovisor, arruinando a minha visão noturna. Praguejando, eu pisquei afastando as manchas que explodiram em meus olhos. Mas ao invés de parar na festa e expelir mais garotos da faculdade, o sedan preto deslizou em frente e o veículo parou no final da rua sem saída, bloqueando a entrada da garagem de Caine. — O que você vê? — Finn sussurrou. Pisquei fora o resto dos pontos negros em minha visão e forçei à vista através dos óculos. — Cinco homens. Ternos. Todos armados com pistolas. Todos indo em direção a casa. Quatro indo para frente. Um liderando a volta em torno da casa. — Merda. — Merda está certo — eu murmurei, tirando os óculos. — Há apenas uma razão para enviar cinco homens à casa de um policial no meio da noite. O mesmo cenário que havia acontecido quando a minha família tinha sido assassinada. O ataque furtivo à noite. As velhas memórias estavam retornando a mim, os gritos ecoando em meus ouvidos, mas bloqueei-as. Agora, não era o momento de relembrar o passado. — Alguém decidiu que o bom detetive é mais uma responsabilidade do que uma vantagem — Finn terminou meu pensamento. — Ele está provavelmente fazendo muitas perguntas sobre o assassinato de Giles. — A Justiça vai te pegar sempre. Agora, você tem a retaguarda e não deixa eles virem atrás de mim. Eu vou surpreender os outros.
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Finn suspirou. — Então, nós vamos ajudá-lo? Eu não respondi. Eu já estava fora, correndo em direção à casa. Várias sebes baixas e pinheiros crescendo pontilhavam a paisagem entre a rua e a casa. Galhos agarraram minhas roupas e o aroma marcante do pinheiro fazia cócegas no meu nariz. Mas foi fácil eu ir de arbusto em arbusto, árvore em árvore, sombra em sombra. Parei a uns quinze metros de distância dos degraus que levavam até a varanda da frente. Ouvindo. Vendo. Esperando. Um homem sozinho estava fora da porta da frente. Seus três amigos, devem ter escorregado para dentro, enquanto eu estava me aproximando da casa. Eu tinha visto o cara ir ao redor da casa, provavelmente para evitar que Donovan Caine fugisse pelas traseiras. Sem problemas. Finn iria cuidar dele. Eu balancei minha mangas e minhas facas caíram em minhas mãos. Frias e reconfortantes, como sempre. Eu escolhi meu caminho até o morro, chegando à varanda. O fim do alpendre de madeira ficava cerca de quatro metros do chão, suportado por um par de faróis baixos. Eu me agachei e olhei sobre a borda, os meus olhos cinza logo acima da linha da varanda. O cara ainda estava na porta da frente, mas seu corpo estava de costas para mim, enfrentando o interior da casa. Ele não estava esperando problemas, pelo menos não desta direção. Desleixado, desleixado, desleixado. Joguei uma das minhas pernas para a varanda e me empurrei para cima. As ripas de madeira estavam frias contra o meu estômago e as cabeças dos pregos pressionaram no meu peito como gelo. Eu me deitei em um canto, onde as sombras eram mais escuras e fiquei agachada atrás de uma cadeira de balanço antiga. O guarda ficou olhando dentro da casa. Eu me levantei e reposicionei minhas facas. Abraçando a parede, deslizei em direção a porta da frente. Outra luz se acendeu no segundo andar, iluminando o jardim além da varanda. Tiros soaram do interior acima da minha cabeça. Uma arma disparou uma vez, depois mais duas vezes. O guarda amaldiçoando se balançou para trás e para frente sobre seus pés, sem saber se deveria entrar ou não. Ele agarrou a arma perto de seu peito, à direita sobre o coração. Não lhe fez nenhum maldito bem. Minha faca deslizou em suas costas, através de suas costelas, até chegar em seu coração. Seu sangue jorrou na minha mão. Quente. Molhado. Pegajoso. A sensação era a
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mesma, ainda que diferente de cada vez. Ele me empurrou e eu levei as mãos à sua boca para impedi-lo de gritar. Não devia ter me incomodado. Algo mais profundo caiu dentro da casa, sobrepondo-se ao barulho que o guarda poderia ter feito ao morrer. Eu puxei a faca, jogando o guarda morto para o alpendre, passando por cima dele e deslizando para dentro. Um par de luzes do teto expulsava uma iluminação fraca. O corredor da frente se ramificava em três direções: para cima, direita e esquerda. Uma sala estava à direita, com uma TV de tela grande, um sofá de couro marrom e um par de poltronas. Uma pequena sala de jantar a esquerda. Um prato sujo e um copo estavam em cima da mesa retangular, junto com um jornal amassado. Aconchegante. A escada estava diante de mim e me dirigi até ela. Novamente, eu abracei a parede, estremecendo ao crack inevitável que parecia que o meu peso fazia na madeira lisa. Eu espreitei quando cheguei ao topo. Outro corredor com quartos em ambos os lados. À minha direita estava o que parecia ser um quarto de hóspede nunca usado e um escritório com um computador semi-enterrado por pilhas de revistas esportivas. Na minha frente estava um banheiro, com um monte de toalhas dobradas em conjunto sobre o piso de ladrilho. Outro quarto estava além daquele para o corredor, provavelmente o quarto principal. Luzes brilhavam no último quarto, onde eu tinha visto Donovan andando para frente e para trás. Ouvi três sons de slap-slap-slap seguidos por um gemido baixo, gutural. O detetive estava sendo espancado. Eu andei devagar para não fazer barulho. Mas os homens dentro do quarto com a intenção de bater em Caine não se preocuparam com possíveis intrusos. Além disso, eles haviam deixado dois guardas, um na frente e um nas traseiras. Nada poderia dar errado quando você deixava um par de caras sozinhos e no escuro para proteger suas costas. Com uma faca em cada mão, na ponta dos pés, fui pelo corredor em direção ao quarto. As vozes indistintas se elevaram em uma conversa significativa. — Diga-nos onde está — disse um homem. — Certamente você pode ver como isso é inútil. Ninguém vem para te salvar, detetive. Completo déjà-vu. — Tudo o que queremos é a flash drive e as informações que Gordon Giles deu para você no Teatro. É isso. — Sim — outra voz masculina soou dentro. — Nos entregue logo e podemos até deixá-lo viver. Revirei os olhos. Mentiroso. A única maneira de Donovan deixar esta casa era em um saco preto para cadáveres. Uma tosse baixa soou, seguido pelo som de alguém cuspindo. Caine, cuspindo o seu próprio sangue.
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— Eu te disse Giles não me deu nada. Nenhuma flash drive, nem documentos, nada — Caine disse numa voz rouca. — Ele não teve tempo antes de seu assassino chegar. — Mas você estava lá para obtê-lo, convencê-lo a dar a informação para você — a voz de um terceiro homem soou. — Ele deve ter dito alguma coisa, lhe dado algo. Outra série de tapas soou, pontuada pela paulada sólida dos punhos ao bater na carne. Caine gemeu novamente. — Onde está a patroa? — número um perguntou. — Ela vai fazê-lo falar. — Sério? Como fez o velho do restaurante falar? — Número dois disse. — A coisa mais medonha que eu já vi, a forma que ela continuou arrancando a pele e a forma como ele ficou rindo dela. Até deu a Carlyle arrepios e você sabe quanto ele é um bastardo frio. Fletcher. Eles tinham estado no Pork Pit naquela noite. Este cara e Charles Carlyle tinham visto Fletcher morrer, provavelmente o tinham segurado enquanto a Elemental do Ar fazia o seu pior nele. Minhas mãos apertaram minhas facas e o nó frio de raiva em meu peito pulsou com antecipação. Fletcher. — O velhote era duro. O detetive aqui não é tão forte, não é, Caine? — número três disse. — A Elemental está vindo — número dois disse. — Não deve demorar muito tempo. Dez minutos, no máximo. Apenas continue lhe batendo. Não há razão para não o amolecer para ela. Vai fazer sua pele descascar mais facilmente. Eles compartilharam uma boa risada com isso. O riso desapareceu e soaram mais socos, firmes e insistentes. Alguém gostava de ser o músculo. Eu prendi uma respiração suave e me preparei. — Falando da elemental, desça as escadas e verifique Phil e Jimmy, sim? Eu não quero aqueles dois se descuidando e ela vendo. Número dois falando de novo, embora eu não tivesse ideia se ele estava se dirigindo a um ou ao três. Não importava muito. Todos estariam mortos em um minuto. Dois no máximo. Eu rastejei perto do quarto, minhas costas roçando a parede, até que eu estava no mesmo lado do batente da porta. Passos soaram no tapete, vindo na minha direção. Eu esperei, reunindo minha força. Uma sombra caiu sobre mim e um homem entrou no corredor.
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Eu bati a minha faca em seu peito. O homem gritou e cambaleou para trás. Eu usei o seu próprio impulso para empurrá-lo mais profundamente no quarto. Meus olhos varreram a área, vendo tudo dentro de um segundo. Donovan Caine estava algemado em uma cadeira. Dois homens vestidos com ternos de pé sobre ele. Um cara segurando uma arma ao seu lado. O cara que eu tinha esfaqueado bateu em uma mesa, derrubou uma lâmpada e caiu no tapete. Morto na chegada. Eu arremessei minha faca no outro homem com a arma. Ele se empurrou para um lado e a lâmina pegou seu ombro em vez da garganta. Ele levantou sua arma e disparou. Atirei-me para frente e para o chão, o áspero tapete queimando meus joelhos e o estômago através do meu jeans e blusa de mangas compridas. O tiro passou pela minha cabeça e quebrou uma lâmpada. Vidro caiu sobre mim, entalhando as minhas mãos. Mas eu já estava em movimento. Eu rolei jogando minhas pernas. Meu chute pegou o terceiro no joelho. Ele gritou e se inclinou para frente, colocando-se entre mim e seu amigo. Eu arranquei a faca da bota e cortei sua garganta. O sangue espirrou nos olhos e no meu rosto, mas eu ignorei o desconforto e a sensação de molhado e segurei o homem a morrer. Faltava um. Ele ergueu a arma e atirou mais três vezes. Mas seu amigo estava no caminho e as balas o atingiram ao invés do meu peito. Puxei-me para cima e empurrei o cara morto no último homem. O corpo caiu contra o braço ferido dele e a arma escorregou da sua mão. Atirei-me em direção ao último cara, mas ele me viu chegando. Seus punhos bateram em meu peito. Golpes fortes e sólidos. Eu me afastei, o meu pé prendeu em algo e eu caí no tapete. Ele pulou em cima de mim, envolvendo as mãos em torno de minha garganta. Eu tentei quebrar o seu agarre, mas ele era mais forte. Minhas mãos arranharam o chão, procurando uma das minhas facas, a arma dele, algo que eu pudesse usar para machucá-lo. Uma perna entrou em minha visão periférica e um pé bateu na cabeça do cara. O homem grunhiu e seu aperto afrouxou. Eu empurrei-o para trás e rolei para sair debaixo dele, meus olhos fixos sobre o tapete cheio de sangue. Ali. Eu peguei a base de uma das lâmpadas quebradas. O vidro curvo tinha quebrado, deixando uma borda afiada e serrilhada com cerca de cinco centímetros de comprimento. Perfeito. O cara fechou a mão no meu ombro e me puxou para cima, determinado a acabar me sufocando. Virei-me e cortei sua garganta. O vidro destroçou a sua carne, em vez de um corte profundo e limpo como a minha faca teria feito. Nada fácil e indolor sobre isso. O homem gritou um som ensurdecedor de
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lamento e dor. Ele tentou se distanciar. Pensei em Fletcher e o segui. Eu puxei o vidro, tirando pedaços de carne com ele, então empurrei de volta. Com força. O que tinha sido um fio de sangue aumentou para uma enchurrada carmesim, respingando no meu tronco e na minha camiseta, jaqueta e jeans. A mão do homem segurou no meu ombro como um torno, fazendo-me estremecer. Sangue e muco borbulharam dos lábios trêmulos. Nós ficámos lá assim. Eu dirigindo o vidro mais e mais para dentro, a mão dele me apertando mais a cada milímetro. Seus olhos ficaram vidrados e após cerca de trinta segundos, seu aperto afrouxou. E ele se juntou a seus dois companheiros mortos no chão. Meus olhos foram para Donovan Caine. Para minha surpresa, ele tinha sua perna para cima, pronto para chutar com o pé novamente. O detetive olhou para mim, então os homens no chão. Ele abaixou sua bota. — Desculpe a bagunça — eu disse.
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Capítulo 15 O canto da boca de Donovan Caine levantou-se em um fraco sorriso – ou uma careta. Difícil dizer uma vez que vergões vermelhos e cortes rasos pontilhavam suas características como rugosas sardas desagradáveis. O início de um olho roxo rodeava seu olho direito e uma contusão já tinha escurecido sua bochecha esquerda. Eu havia salvado Caine de ser espancado tanto quanto Finn, mas o detetive tinha ainda tomado várias boas pancadas. — Você é a única que está uma bagunça — disse Donovan Caine. Olhei para o meu reflexo no espelho sobre a cômoda. Sangue cobria meu rosto como uma espécie de máscara de lama que Jo-Jo podia usar em seu salão. Mais sangue cobria minha jaqueta e camiseta, escurecendo o tecido e gotas e pingos pintavam meus jeans e botas de gobby, padrões de Jackson Pollock25. Distintas contusões de pontas de dedo rodeavam minha garganta, um macabro colar de joias roxas. Eu provavelmente tinha um jogo combinando nos meus ombros das garras mortais do rapaz. Quando adicionava o sangue e os hematomas juntos, eu parecia como se estivesse vestida para o dia das bruxas – como uma vítima de assassinato. Não era exatamente o rosto que eu queria apresentar para o detetive, mas ele estava pior. Muito pior. Mas hoje à noite, algo sobre o sangue fez sentir-me velha. Cansada. Esgotada. Apenas uma vez, poderia ser agradável sair à noite e não ter que incinerar minhas roupas quando chegasse em casa. Apenas uma vez. Eu baixei meus olhos do espelho. — O risco do trabalho. Caine não podia ir a nenhum lugar, dado que ele ainda estava amarrado. Andei atrás dele. As mãos do detetive estavam algemadas, com a corrente enroscada no encosto da cadeira. Algemas Silverstone. Parecia como se Caine nunca fosse a nenhum lugar sem o conjunto. Bizarro. — Chave? 25
Pintor norte americano referencia no movimento do expressionismo abstrato.
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Caine sacudiu sua cabeça. — Sobre a cômoda. Recuperei a chave de metal e me inclinei para trás do detetive. Seus rígidos músculos enrolaram e ele deu uma respiração afiada. Ele cheirava levemente a sabão e eu podia sentir a força de seu corpo, mesmo ele estando acorrentado na cadeira. Caine provavelmente pensava que isso era apenas um ardil. Que eu ia cortar sua garganta em vez de libertá-lo. Eu poderia ter considerado isso, seu eu já não tivesse oferecido trabalhar com o detetive. Minha palavra ainda significava algo para mim, também. As algemas tiniram abertas e Donovan Caine levantou-se. Ele se virou para mim e massageou seus pulsos, friccionando a sensibilidade de volta para suas mãos, seu olhar passou sobre a confusão de sangue, corpos e móveis quebrados. Ele flagrou a arma descartada, semiescondida sob as ruínas de uma das lâmpadas de cristal, perto de seus pés. — Você tem uma decisão a tomar — eu disse em voz baixa. — Você pode pegar a arma. Virá-la sobre mim. Tentar vingar a morte de seu parceiro. Eu não adicionei que ele morreria onde estava quando minha faca rasgasse seu coração. Caine tinha visto do que eu era capaz. Testemunhou minhas habilidades em primeira mão. Eu só esperava que fosse suficiente para temperar sua determinação obstinada para me fazer pagar pela morte de Cliff Ingles. — Ou? — o detetive continuou esfregando seus pulsos, mas seus olhos castanhos nunca deixaram a arma em seus pés. — Ou podemos fazer uma trégua e você pode vir comigo. Trabalhar comigo para chegar ao fundo disto. Eles querem você morto agora, também. Querem todos nós mortos. Donovan Caine olhou fixo para a arma. Um segundo passou. Mais cinco. Dez. Quinze. Trinta. Ele flexionou seus dedos, um xerife do velho oeste prestes a se decidir sobre a imprestável pistoleira que estava ameaçando sua cidade, sua paz de espírito, seu modo de vida. Fiquei tensa, pronta para atacar. O detetive levantou seus olhos para os meus. Seu olhar era da cor de topázio esfumaçado, ou talvez um bom uísque, oscilando de ouro puro para marrom polido e viceversa. Emoções cintilaram em suas profundidades ambarinas, uma após a outra, como vagalumes piscando e desligando. Nojo. Raiva. Desconfiança. Suspeita. Curiosidade. — Por que você veio aqui? — ele perguntou. — Poderia ter deixado eles me matarem.
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Dei de ombros novamente. — Como eu disse antes, preciso de você. Preciso saber o que você sabe sobre Gordon Giles. Acredito que ouvi algo sobre arquivos e uma flash drive. Caine passou a mão sobre seu cabelo preto. — Sim. Esses itens parecem estar perdidos. Meus amigos aqui estavam sob a suposição de que eu os tinha. — Mas você não tem? Ele não respondeu. Caine sabia como manter seu rosto sem expressão também. Movi-me em volta do quarto, pegando minhas facas e deslizando-as de volta em seus vários esconderijos. Também vasculhei os bolsos dos caras mortos, desenterrando suas carteiras, celulares e joias. Ninguém estava usando uma corrente com uma runa de dente triangular sobre ela, mas um dos homens tinha a forma tatuada nas costas de seu pulso esquerdo. Vi isso quando tirei seu relógio. Franzi o cenho. Este maldito símbolo novamente. Eu estava ficando realmente cansada de vê-lo sem saber a quem essa merda pertencia. Caine me viu olhando e se abaixou para ver melhor. Ele tomou o cuidado de não ficar ao alcance dos meus braços e facas. Homem inteligente. — Isso é uma runa? — ele perguntou. — Sim. Uma que eu tenho visto muito ultimamente — puxei meu celular do bolso do meu jeans, usei-o para tirar uma foto da runa, em seguida enfiei o dispositivo no meu jeans mais uma vez. Caine não disse mais nada, mas ele agarrou o pulso do cara, ergueu para a luz e olhou para o símbolo rude, enviando para a memória. Endireitei-me. — Tudo bem detetive. Hora de decidir. Você esta dentro? Ou fora? Ele olhou para cima. — O que acontece se estou fora?
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— Você segue seu caminho e eu sigo o meu. Vou olhar seus meninos companheiros em azul pescarem seu corpo fora do rio Aneirin em um par de dias. Ele balançou a cabeça. — Isso não vai acontecer. — Sério? — eu perguntei. — Estava assistindo a casa. Percebi você discutindo com alguém no telefone justo antes que esses caras aparecessem. Estou disposta a apostar que era alguém de poder. Importa-se em me dizer com quem estava falando? Os olhos de Caine caíram para o chão e vi outro celular nadando em uma poça de sangue. Deve ser dele. — Stephenson — ele murmurou. — Estava falando com Wayne Stephenson, meu capitão. O gordo gigante que tinha dado a conferência de imprensa. O único que tinha mantido um focinho em cima de Caine o tempo todo. Fiz uma nota mental para obrigar Finn a começar a cavar informação sobre o capitão de polícia. Se a Elemental do Ar pagou-o por fora, talvez deixasse uma trilha de volta para ela mesma. — E o que Stephenson queria? Ter certeza que você estava em casa antes que ele enviasse os cães para dentro? — Ele queria falar comigo sobre o caso Giles — Caine disse. — Isso é tudo. Isso não prova nada. — Não — eu disse. — Isso não prova nada. Mas é uma coincidência muito condenatória. Silêncio. Donovan Caine olhou para mim. Emoções continuaram a piscar em seus olhos. Mais rápido agora. Como um raio atingindo a Terra de novo e de novo em uma noite quente de verão. Embora ele não visse isso, eu sabia que ele ainda estava pensando sobre a arma encontrando-se a apenas alguns tentadores metros de distância. Sobre como ele poderia cuidar de um de seus problemas aqui e agora. Eu esperava que ele percebesse o quão estúpido seria. Ou eu estaria usando mais sangue em outro minuto. Dois no máximo. Mas alguns dos meus argumentos deve ter ressoado com ele. O detetive exalou. Ele soltou o pulso do homem morto e ficou em pé. — Estou dentro — ele disse. — Mas...
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Ele balançou a cabeça. — Mas não sem sérias restrições e algumas regras. Esta trégua que está oferecendo somente se estende até um certo ponto. Não vou encobrir nada do que você fez. Nem uma maldita coisa. Não vou matar por você e não deixarei você machucar qualquer pessoa inocente. Eu ri. O som áspero bateu contra as paredes do quarto como o beijo da morte. — Pessoas inocentes? Como os cavalheiros que vieram vê-lo hoje à noite? Os que iam mantê-lo preso enquanto seu chefe o torturasse? Eu acho que você não precisa se preocupar sobre tropeçar com muitas pessoas inocentes neste caso, detetive. — Talvez não. Mas é assim que vai ser. Eu não esperava nada menos dele e poderia viver com esses termos. Era vingança pessoal de Caine contra mim, tão quente, fervendo, raiva irracional, que poderia ser sua ruína. — Diga o resto. Você sabe que quer. — E, segundo, quando isso acabar, eu irei por você. Obter justiça para Cliff Ingles, meu parceiro, não importa o que eu tenho que fazer, mesmo que signifique matá-la. Você entendeu? Caine foi áspero, uma promessa com raiva ardia como uma fogueira em seus olhos. Sua boca era uma linha dura em seu rosto, suas mãos fechadas em punhos, todo seu corpo apertado e tenso. Eu tinha empurrado ele tão longe quanto eu podia. — Entendi — eu disse. — Agora, agarre qualquer equipamento que você pode conseguir em suas mãos em três minutos. Roupas, dinheiro, qualquer coisa. Precisamos nos mover. Agora. Ele olhou fixo para mim. Eu encontrei seu olhar duro com um dos meus próprios. O detetive assentiu e eu sabia que ele ia manter sua palavra. Estávamos no mesmo lado – por agora. — Precisamos partir porque a Elemental do ar está a caminho? — Caine contornou ao redor de mim, ainda mantendo-se fora do alcance dos meus braços e foi em direção ao armário. Ele não ficou totalmente de costas para mim. — Sim, então rápido.
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Donovan Caine puxou uma mochila do armário. Ele enfiou seus dedos em uma tira entalhada no tapete dentro de um pequeno espaço, enrolou-o, em seguida moveu uma tábua solta por baixo. Meteu um par de barras de dinheiro dentro da bolsa, junto com duas pistolas e várias caixas de munição. Talvez o detetive não fosse o modelo de virtude que eu pensava. Ou talvez ele apenas percebesse o valor de estar preparado para tudo nesta cidade. De qualquer maneira, meu respeito por ele cresceu um pouco mais. Apesar de seus ideais antiquados sobre justiça, o detetive era inteligente. Uma característica que eu sempre admirei. Caine moveu-se até a cômoda e pegou algumas roupas. Jeans, meias, cuecas. Concentrei-me no último item. Cuecas pretas. Feitas com uma seda agradável, embora não com tão alta qualidade quanto às de Finn. Pensei no roçar daquela seda contra mim, seguido pelo grosso e duro comprimento dele. Hum. Pena que ele me odiava e eu parecia como uma porção a mais de um filme de terror agora. Caso contrário, eu poderia ter considerado seduzir Donovan Caine. — Eu acho que alguém como você aprecia o desafio de capturar um Elemental. — Caine continuou a meter roupas na bolsa. Eu empurrei minhas fantasias de lado. — Eu posso ser uma assassina, detetive, mas eu particularmente não aprecio matar pessoas. — Então por que fazer isso? A pergunta inevitável. Eu decidi dar-lhe a minha resposta padrão pronta. Donovan Caine não precisava saber sobre o assassinato da minha família ou o tempo vivendo nas ruas. Ele não precisava saber que eu estava cansada de ser fraca, com medo de ser caçada. Que eu tinha escolhido ser uma assassina para que eu nunca me sentisse assim novamente. Portanto, eu seria forte. E especialmente ele não precisava saber como nenhuma das minhas habilidades estava me ajudando a lidar com a morte de Fletcher ou este súbito, cansaço irritante que eu sentia. — Porque sou boa nisso, o sangue não me incomoda e pagam muito, muito bem. Não é porque eu recebo um tesão doentio e distorcido por assistir a luz deixar os olhos das pessoas — eu disse em um tom suave. — Quanto aos Elementais, eles morrem, assim como todos os outros. Magia não te faz invencível. Gordon Giles foi um Elemental do Ar, mas o seu poder não o salvou de ser queimado até a morte naquele acidente de carro falso. Dito isto, eu não quero enfrentar um Elemental do Ar, quando eu já estive em uma luta e tenho que lidar com um homem ferido. Além disso, eu não sei quantos homens mais ela poderia
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estar trazendo. Ela provavelmente tem um par de homens, talvez mais. Não o tipo de probabilidades que eu gosto. Como você pode imaginar, eu prefiro mais ação um-em-um. — Entendido. O canto de sua boca levantou. Desta vez, eu tinha certeza que não tinha imaginado. Se foi uma careta ou um sorriso, eu ainda não poderia dizer. Caine fechou o zíper da bolsa e atirou-a sobre os ombros. — Lidere Macduff. — Citando Shakespeare? Eu nunca teria adivinhado detetive. — Nunca teria imaginado trabalhar com uma assassina também. Coisas estranhas. — Touché — eu cintilei uma das minhas facas Silverstone para ele. — Fique atrás de mim e fique quieto. Havia mais um guarda nos fundos da casa. Meu sócio deveria ter cuidado dele, mas você nunca pode ser suficientemente cuidadoso. Ele levantou uma sobrancelha preta. — Sócio? — Sócio. Agora me siga. Virei-me e caminhei até a porta do quarto. Minha mão apertou o cabo da faca e esperei um batimento, ouvindo. Mas Caine não puxou sua terceira arma, aquela que eu o vi deslizando para fora do armário e contra as costas dele, a que ele pensava que eu não sabia que ele tinha. O detetive estava honrando seu acordo. Ele não ia atirar em mim pelas costas – ainda. Eu fui pé por pé para o corredor. Tudo estava quieto, sem pressa de movimentos bruscos. Sem sussurros roucos, sem suspiros ásperos. Nada. Donovan Caine ficou perto de mim. Seu puro perfume de sabão tomou conta de mim novamente. O calor de seu corpo envolvia o meu e seu hálito soprando contra as costas do meu pescoço, quase como um beijo. Chegamos à parte do corredor que dava para o andar de cima. Eu fiz um gesto com minha mão para Caine ficar parado. Então eu caí de joelhos, deslizei pela parede e espiei através das grades. Finn estava encostado contra a porta da frente, lendo um jornal. O guarda morto estava onde eu o tinha colocado. Finn tinha um pé apoiado nas costas ensanguentadas do cara, o que significava que ele já tinha dado a volta na casa e matado o último homem. Ele não teria estado lá caso contrário. Eu balancei minha cabeça e me endireitei.
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— Vamos — eu disse a Caine. — A costa está livre. Descemos. Finn não olhou para cima enquanto a madeira rangia e rangia sob o nosso peso. Arrebatei o jornal de suas mãos e atirei-o de lado. — Hey — ele protestou. — Eu estava lendo isso. — Agora você não está. Dei um passo para trás de modo que Finn e Caine pudessem ter uma clara visão um do outro. — Donovan Caine este é meu sócio, Finnegan Lane. E vice versa. Os dois homens olharam um ao outro. Caine olhou para a maleável jaqueta de couro de Finn, estilo cáqui e camisa pólo customizada. Finn olhou a mochila de tecido esfarrapado do detetive, os remendos em seu jeans surrado e as manchas em suas botas desbotadas. Hipóteses foram feitas, decisões tomadas, caras avaliadas. Após cerca de vinte segundos de intensos escrutínios, Finn estendeu a mão. Caine apenas olhou para ele, com seu monótono, inexpressivo olhar policial. — Sem aperto de mãos, é? Muito ruim — Finn deixou cair sua mão. — O guarda de trás? — eu perguntei. — Despachado, é claro. Finn não tinha muita prática com facas, mas sempre me apoiou nas tarefas, ele sempre carregava um par de armas com ele. Normalmente um silenciador ia bem, que é provavelmente o porquê eu não ter o ouvido apanhar o guarda de trás. Entre as suas muitas características peculiares, Finnegan Lane passou a ser um excelente atirador. Ele apontou para o homem morto aos seus pés. — Acredito que todos os outros acabaram como este Gin? — É claro. Finn sorriu para mim. — Touché. Donovan Caine olhou para mim.
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— Gin? Este é seu nome verdadeiro? Eu percebi que nunca tinha dito meu nome ao detetive, apenas meu apelido assassino, A Aranha. Mas ele ia ter que me chamar de algo, desde que iríamos trabalhar juntos, e agora era tarde demais para inventar algum tipo de pseudônimo. — Mais ou menos. — Gin? — Caine perguntou novamente. — Sim, como o licor. — Gin — Caine disse a palavra cuidadosamente essa vez, como seu fosse um vinho fino que ele estava degustando em sua língua, em vez de uma versão bastarda do meu nome real. — Combina com você. Apesar da situação, eu encontrei seu sotaque lento, quente e convidativo. — Fico feliz que você pense assim. Agora vamos. Nós esquivamos o morro pelo quintal. A festa na porta ao lado ainda estava forte, embora o rádio agora ecoasse os “Free Bird26”. Alguns mauricinhos tinham tropeçado para fora e estavam dormindo ao ar livres dos seus estupores bêbados no gramado. Ninguém parecia ter ouvido os disparos ou o som de cinco homens morrendo em torno da casa de Donovan Caine. O rock sulista estava tão alto e distorcido, eu duvidava que alguém na rua inteira pudesse pensar em si mesmo. Vizinhos barulhentos. Uma bênção disfarçada às vezes. Chegamos ao SUV. Finn ficou no banco do motorista, enquanto eu deslizei para o lado do passageiro. Donovan Caine fez uma pausa, olhando para as profundezas escuras do veículo. Puxou um fôlego, abriu a porta e subiu no banco traseiro. Ele hesitou novamente e soltou a mesma respiração antes de fechar a porta. Não tem volta. Isso é o que ele tinha que estar pensando agora. Resumidamente também para o que diabos estou fazendo ao entrar no carro de uma assassina? Mas o detetive parecia estar honrando sua decisão. Com a nossa trégua. Ele empurrou sua bolsa para baixo no assoalho e afivelou o cinto de segurança. O estalo afiado me lembrou de algemas tinindo juntas. — E agora? — Caine perguntou. Virei-me para responder a ele e vi um par de faróis descendo a rua em direção a nós. 26
Free Bird é um single de 1974 da banda estadunidense Lynyrd Skynyrd.
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— Se baixem, lá vem eles. Nós nos encolhemos em nossos assentos até que o veículo passou. Outro sedã de luxo. Ele parou próximo ao estacionamento inferior da entrada da garagem de Donovan Caine. — Aqueles são os nossos mais novos amigos? — Finn zombou. — Eles estão um pouco atrasados para a festa. Eu odeio como nós continuamos nos desencontrando com eles. — Vamos descobrir — eu disse. Peguei os óculos de visão noturna e espiei através deles. A porta ao lado do condutor abriu e a luz do interior piscou me mostrando três rapazes. Desleixada, desleixada, desleixada, nem incapacitando aquilo. Reconheci dois dos homens. Charles Carlyle, o vampiro que deu o cartão de vista as alunas no Cake Walk hoje e seu amigo que estava lendo o jornal. Não conhecia o terceiro, mas ele estava vestido em um terno exatamente como os outros. — Três capangas mais — eu murmurei. Os homens saíram do sedã e conversaram entre si sobre o amplo capô. A quarta figura permaneceu oculta na escuridão no banco traseiro. Meus olhos se estreitaram e o nó frio de raiva em meu peito apertou em um laço. Saia, eu pensei. Saia e mostre-se sua puta sádica. — E a Elemental de Ar? — Donovan Caine perguntou. Sua respiração roçou contra minha bochecha. — Ela está sentada no banco traseiro — eu respondi. O volante com capa de couro rangeu sob as mãos de Finn. — Aquela que... — Sim. Cortei Finn antes que ele pudesse dizer qualquer coisa sobre Fletcher. Finn olhou para mim, mas ele apertou seus lábios juntos.
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Fiquei observando. Carlyle deu a volta por trás do veículo e abriu a porta. Ele estendeu a mão, a mulher pegou-a e andou para longe do sedã, como se ela fosse alguma debutante saindo de sua limusine em sua festa de debutantes. Vadia pretensiosa. — Porra — eu amaldiçoei. — Ela está do outro lado do carro de costas para mim e ela está vestindo um longo manto preto. Quem diabos usa um manto? Isto não é Dungeons e Dragons27. A capa está por cima. Não posso ver coisa alguma. Seu rosto, seu cabelo, nem mesmo suas roupas. Nada. O volante rangeu novamente. — Poderíamos pegá-la aqui mesmo, agora mesmo — Finn disse. — Eles não estão nos esperando. Não estão esperando você. — Não. Eu não estou capturando a Elemental. Não hoje à noite. Ela mataria a todos nós. E não vou deixar isto acontecer com vocês. — Mas... — Não Finn — eu estalei. — Ouça-me. Você pode pensar que sabe o que um Elemental pode fazer, mas você não sabe. Não importa qual imagem você viu. Você não tem ideia de como cruel sua magia pode ser. Mas eu tenho. A imagem do corpo de Fletcher passou pela minha mente, seguido pelo incêndio, fervendo restos de minha mãe e de minha irmã mais velha. O sofrimento familiar pressionando em meus pulmões, tentando me sufocar. As runas de aranha em minha mão coçaram, como se fossem criaturas reais contorcendo-se embaixo da minha carne cicatrizada, em vez de apenas lembranças horríveis. Os olhos castanhos de Donovan Caine agitaram de volta e para frente entre nós. — Mas... Finn nunca chegou a terminar a frase. Uma rajada de vento arrancou para longe a cabine, assobiando como um balanço de uma foice da morte. A explosão de ar achatou todos os pinheiros no quintal antes de descer o morro e se precipitar pela rua como um furacão em miniatura. Latas de lixos caíram. Caixas de correio foram arrancadas da terra. Um pobre gato foi pego pelo vento e lançado contra a lateral de uma caminhonete. Ele não voltou a levantar. A Elemental do Ar tinha encontrado o primeiro corpo amassado pela porta da frente, e ela não estava feliz com isso. Eu apertei os olhos nos óculos de proteção, tentando obter 27
Jogo de RPG de fantasia medieval.
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um vislumbre de seu rosto. A capa projetava seu rosto na sombra, mas ela tinha empurrado para trás as mangas de seu manto. As pontas de seus dedos brilharam branco leitoso com magia, como se cada dígito fosse uma tocha soldadora individual. O tipo de poder concentrado que poderia causar uma dor excruciante. O tipo de magia que pode tirar a carne do osso. O tipo de tortura que Fletcher tinha sofrido. Fletcher. A dor e a culpa misturadas em meu peito, uma esmagando a outra, até que eu não tinha certeza do que estava sentindo – além da dor. Mas eu me forcei a pensar, permitindo meu frio julgamento amenizar minhas emoções. Se tivesse sido só comigo, eu poderia ter escapado de volta para a casa, e tinha ido até a Elemental e sua tripulação. Mas eu tinha Finn para pensar. Donovan Caine também. Além disso, Fletcher tinha me chamado de Aranha por um motivo. Eu estava mais na minha melhor prudência quando estava rastejando dentro e fora das sombras. Fiando minhas próprias teias, fazendo meus próprios planos. Não sendo estúpida e saindo em um momento de glória. Eu apontei. — Vê aquela luz? Aquele brilho? Aquela é sua magia. Você quer aquilo para nós, Finn? Porque eu tenho certeza que a Elemental de Ar ficaria feliz em lhe mostrar exatamente o quanto zangada ela está agora. Finn pensou sobre isso. Pensando no seu desejo de vingar a morte de seu pai contra o que ele sabia que seria um plano desastroso na melhor das hipóteses, mortal na pior. No banco de trás, Donovan Caine continuou olhando atrás e para frente entre nós dois. Após trinta segundos, Finn suspirou e largou o volante. — Não. Eu não quero que sejamos nós. Estendi a mão e apertei a dele. — Homem inteligente. Não se preocupe. Nós vamos cuidar dela Finn. Eu vou cuidar dela. Só não esta noite. — Promete? — sua voz tornou-se um sussurro. Apertei a mão de novo. — Prometo. Agora, vamos lá. Antes que a cadela perceba que ainda estamos aqui e observando-a.
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Capítulo 16 Finn esperou até que o vento parou e a Elemental do Ar tinha entrado para a cabine antes de ligar o motor e fazer inversão de marcha no meio da rua larga. Faróis apagados, Finn levou o veículo em direção ao final do quarteirão. Ele passou outra rua antes de acender as luzes e aumentar a velocidade. — Para onde? — Finn perguntou. Ele me deu um olhar de soslaio. Uma questão tão simples, mas eu sabia o que ele estava realmente perguntando – se eu ia levar Donovan Caine para o meu apartamento. Nenhuma outra escolha. A casa de Finn não era uma opção e eu precisava manter o detetive perto para ter a certeza que ele não faria nada estúpido – como ir a uma missão em busca de justiça e nos matar a todos por causa disso. — Para casa — eu disse. — Casa? — Donovan Caine repetiu. — Você vive em Ashland? — Nascida e criada, detetive. O sinal ficou vermelho. Finn parou e usou a pausa para olhar no espelho retrovisor para as feições machucadas do detetive. — Nós não vamos ao, ah, salão primeiro? — Finn perguntou. — Para cuidar de algumas coisas? Eu sabia o que ele estava perguntando. Se nós íamos passar na casa de Jo-Jo, para que a anã pudesse tratar de Donovan Caine com alguma da sua magia de cura de Elemental do Ar. Levar o detetive de volta ao meu apartamento anônimo era uma coisa. Eu podia sempre mudar de residência quando tudo isto estivesse acabado. Já tinha planejado isso. Mas eu não ia levar o detetive à casa de Jo-Jo e lhe pedir que o curasse, especialmente visto que os seus ferimentos não eram fatais. A anã estava naquela casa desde antes da Guerra Civil. Ela não iria se mudar ou desaparecer não importa o que aconteça. Donovan
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Caine não precisava saber sobre a minha ligação com Jo-Jo Deveraux e a sua irmã, a eliminadora de corpos, Sophia. Além disso, se tudo fosse para o inferno, a casa de Jo-Jo era uma das nossas casas seguras, um lugar onde Finn e eu podíamos ficar por algumas horas ou dias. Eu não ia colocar isso em risco. — Não — eu respondi. — Eu trouxe alguns suplementos do salão ontem à noite. Nós estamos bem, por isso é direto para o apartamento. Finn assentiu e fez a curva apropriada. No banco de trás, Donovan Caine não disse nada. Eu liguei o rádio e as suaves notas de música encheram o carro. "Margaritaville" de Jimmy Buffett. A música alegre me fez pensar sobre as férias fáceis e refrescantes a Key West que eu tinha dito a Fletcher que faria após o negócio de Gordon Giles. Fletcher nunca terá a chance de ver o pôr-do-sol de Mallory Square novamente. Eu me perguntava se ia partilhar o seu destino. — Bem, você reuniu o seu bando de homens alegres e os salvou da bruxa malvada. E agora? — Finn perguntou, cortando através dos meus pensamentos sombrios. O detetive bufou à ilusão. — Você está confundindo as histórias. Além disso, não está velho demais para estar falando em contos de fadas? — eu disse. — Talvez. Mas nós ainda precisamos de um plano, Gin. Nós não podemos continuar a contornar as jogadas da Elemental e dos seus homens. Algum dia ela vai ter sorte ao invés de nós. Acredite em mim, eu sei. Eu esfreguei a minha cabeça. Sangue seco caiu em flocos de minhas mãos e rosto, salpicando a frente das minhas roupas como flocos de neve vermelhos. Tornando-me ainda mais suja. Pela segunda vez hoje à noite, eu me senti velha e cansada e esgotada. — Nós vamos para o meu apartamento — eu inclinei a minha cabeça contra o assento. — Vamos nos acomodar para a noite. Amanhã, nós vamos começar a chegar ao fundo disto. — Original — Finn disse. Donovan Caine permaneceu em silêncio no banco traseiro — Tem uma ideia melhor? — eu perguntei. Finn levantou os ombros.
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— Não. Eu sou apenas o motorista, se lembra de Miss Daisy? Eu não sei nada sobre fazer planos. — Então cala a boca, Mamie — eu disse. — Antes que eu te atire do carro. Depois de tomar a usual rota em circuito, chegamos ao meu prédio 30 minutos mais tarde. Finn esperou na escada de emergência com Donovan Caine enquanto eu me assegurava de que ninguém estava escondido no meu apartamento. Esfreguei os dedos sobre a pedra bruta em torno da minha porta. O mesmo zumbido baixo de sempre murmurou de volta para mim. Nenhum visitante hoje. Bom. Enfiei a chave na fechadura e entrei. A primeira coisa que eu fiz foi ir para a cornija, pegar os desenhos das três runas e escondê-los debaixo da minha cama. Donovan Caine não precisava vê-los. Infernos, eu nem tinha a certeza se eu queria vê-los esta noite. Os meus olhos percorreram o resto da sala e da cozinha, procurando por qualquer coisa que pudesse dizer mais sobre mim ao detetive do que eu queria revelar. Mas não havia nada. O espaço estava vazio, distante, espartano. Enfiei a cabeça na escada. — Tudo certo. Entrem. Finn foi para a mesa da cozinha para ligar o seu laptop e verificar o seu e-mail. O homem não podia ficar duas horas sem algum tipo de check-in electrônico. Viciado em computadores. Donovan Caine andou de um lado da sala para o outro, olhando para os meus móveis, os meus muitos livros, até mesmo os DVDs ao pé da televisão. Os seus olhos castanhos passaram sobre tudo, mas eu não conseguia ler as conclusões que ele chegava. Eu fui para a cozinha, abri a minha jaqueta ensanguentada e joguei-a no lixo em cima das roupas de vagabunda arruinadas há duas noites. Poderia muito bem esperar mais um dia ou dois. Do jeito que as coisas estavam indo, eu teria mais coisas para jogar em uma viagem de fim de noite ao incinerador no porão. — Eu vou tomar um banho. Sinta-se confortável, detetive. Assista televisão. Assalte a geladeira. O que seja — eu podia ser uma assassina, mas nunca deixe que te digam que eu não sou uma boa anfitriã. — Você — apontei para Finn. — Fica de olho nele. Quando eu estiver pronta, vamos conversar. Os dois homens se entreolharam. Avaliando os pontos fortes. Procurando pontos fracos. Medindo os seus paus novamente. Balançando a cabeça, eu deslizei para o banheiro e fechei a porta. Tirei o resto da minha roupa ensanguentada e entrei no chuveiro. A água assobiou e coloquei-a tão quente que me escaldaria a pele. Então eu encostei a cabeça contra o azulejo liso e exalei.
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Que noite mais fodida. Correndo por toda a cidade, fazendo acordos, tentando salvar pessoas antes que fossem mortas. Uma nova experiência para mim. Quando eu acordei esta manhã, eu não tinha esperado nada disto. Certamente não salvar Donovan Caine. Oh, eu não tinha nenhum arrependimento sobre matar os homens da Elemental do Ar. Era eles ou eu. Eu sempre irei escolher a mim. Mas mais do que isso, eu tinha chegado a termos com o que faço há muito tempo atrás. Os corpos, o sangue, as lágrimas dos que ficam. Mesmo o fato de que eu ia provavelmente queimar no inferno não me incomodava. Muito. Mas por alguma razão, o nojo e a raiva nos olhos de Donovan Caine me tinham irritado. Eu tinha visto essas mesmas emoções brilhando em olhares de muitas pessoas, geralmente mesmo antes que eu as matasse. Quando as pessoas percebem que é um assassino, elas automaticamente te julgam. Pensam que é frio e sádico e louco, não importa que pecados elas cometessem. Mas vindo de Donovan Caine, esse julgamento me irritou. Talvez por causa da minha curiosa atração por ele. Eu preferia que ele me visse como Gin Blanco do que como a Aranha. Eu bufei. Querer algo que eu não poderia ter. Pensar no pedido de Fletcher para que me aposentasse. Sonhar com umas férias. Sentir-me velha, cansada e desgastada. Eu estava virando um maldito cliché. Da próxima vez que dissesse isso estaria em terapia – ou de volta ao Asilo de Ashland com o resto dos loucos. Dez minutos depois, eu saí do chuveiro e vesti um par de calças da marinha, uma camiseta de mangas compridas condizendo e meias grossas. Um pente de dentes largos alisou o emaranhado dos meus cabelos molhados. Eu me inclinei para frente e o meu queixo caiu, olhando para o espelho. As raízes de Jo-Jo não eram as únicas aparecendo. Talvez dessa vez eu simplesmente deixasse o meu cabelo voltar à sua cor natural. O pensamento me surpreendeu e o pente prendeu em um emaranhado escondido nos meus cabelos úmidos. Eu não conseguia lembrar a última vez que o meu cabelo tinha sido apenas o meu cabelo e não bagunçado28, tingido, ou cortado muito curto para algum trabalho, algum personagem, algum papel que eu estava fazendo. Eu não estava inteiramente certa se me lembrava da cor exata que ele tinha. Por alguma razão isso me incomodou. Eu tirei os meus olhos do espelho, acabei com o pente, abri a porta do banheiro e entrei na cozinha. Finn ainda estava sentado na mesa da cozinha, digitando em seu laptop. Ele provavelmente não tinha se mexido o tempo todo que eu estive no banho, exceto para puxar o seu computador mais perto. Donovan Caine tinha se acomodado. Ele estava recostado contra um dos almofadões no sofá. Um pano da cozinha com gelo cobria o seu olho direito e um velho filme preto-e28
Do original teased, que é um penteado em que se bagunça o cabelo desde as pontas até ao couro cabeludo, para dar um efeito mais completo, em que o cabelo fica com muito volume.
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branco tremulava na televisão em frente a ele. Jezebel com Bette Davis. Caine moveu o gelo para o outro olho e estremeceu. — Quer que eu dê uma olhada no seu rosto? — eu perguntei ao detetive. — Eu sou muito boa em remendar29 pessoas. — Sim — Finn concordou. — Quando ela não as está matando. Donovan Caine fez uma careta para a sua brincadeira de mau gosto. Mas evidentemente o detetive não tinha medo de mim ou do que eu lhe poderia fazer, porque ele se levantou. — Claro — ele disse. — Não pode ficar pior do que já está. Ele podia estar morto e não sentir nada, mas eu deixei o assunto morrer. Caine me seguiu até ao banheiro sobressalente e eu indiquei-lhe que se sentasse na tampa do sanitário fechada enquanto eu fui buscar um dos frascos de pomada cicatrizante que Jo-Jo Deveraux me tinha dado. — Abre as pernas — eu disse. — Perdão? Apontei para as suas pernas. — Abre as pernas, para que eu possa caber entre elas. Eu posso chegar ao seu rosto mais facilmente desse jeito. — Oh. Certo. O detetive abriu as pernas e eu fiquei de joelhos na frente dele. Mais uma vez, o calor de seu corpo me varreu completamente. Apesar de todo o sangue com o que ele tinha estado em contato, o detetive ainda cheirava a sabonete. Irritantemente limpo até ao amargo fim. Eu nunca pensei que um aroma tão simples pudesse ser tão intoxicante. Mas Donovan Caine cheirava tão bem que eu queria enterrar o meu rosto contra o seu pescoço e simplesmente respirar o seu aroma. Humm. Eu peguei o pote do lavatório. A única marca no recipiente branco era a runa em forma de nuvem de Jo-Jo pintada em um azul vivo em cima da tampa. Eu abri e o cheiro suave de baunilha saiu do recipiente. Além da cura com as mãos, os Elementais do Ar como
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Aqui é do original 'patch' que é algo como cuidar de feridas, tratar das pessoas, mas a tradução literal é remendar, e já vi assim em algumas traduções então deixei assim mesmo.
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Jo-Jo também podiam infundir a sua magia em produtos, como esta pomada e dessa forma torná-los mais eficazes. Eu mergulhei a minha mão dentro da pomada. Ela estava quente e lisa contra os meus dedos e arrepios se espalharam pelas minhas mãos e braços, assim como acontecia quando Jo-Jo trabalhava a sua magia em mim. As cicatrizes da runa com a forma de aranha em minhas mãos não arderam nem queimaram tanto como no salão de beleza, principalmente porque a magia na pomada não era tão forte quanto o poder de Jo-Jo cru e não diluído. Mas cuidaria do rosto machucado de Donovan Caine. Inclinei-me e levei os meus dedos com a pomada perto do seu rosto. Caine se encolheu e se afastou mesmo antes que eu o tocasse. O que ele achava que eu ia fazer? Surgir com uma faca do nada e cortar a sua jugular? Como se eu fosse fazer uma bagunça assim no meu próprio apartamento. Como se eu não pudesse tê-lo matado meia dúzia de vezes hoje à noite. Era tarde e eu estava cansada. Por isso eu agarrei o queixo de Donovan, puxei a sua cabeça para baixo quando ele tentou se afastar e esfreguei a pomada em sua pele. Após alguns segundos, a cura, a magia de Elemental do Ar começou a trabalhar nele. Os hematomas no seu rosto amarelaram e desapareceram, enquanto os cortes se fechavam. Donovan sentiu as suas feridas desaparecerem e relaxou – tanto quanto pôde com o assassino do seu parceiro ao alcance do braço. — Você tem um aperto muito firme — Caine disse. — Muito duro. Muito forte. — Isso é um elogio? Ele deu de ombros. — Só uma observação. Eu massajei a pomada pelo resto do seu rosto, incluindo nos seus lábios. O mais baixo tinha sido cortado e eu passei o polegar sobre a ferida como um amante faria. Donovan enrijeceu com o contato íntimo, mas não se afastou. Em vez disso, o detetive me estudou enquanto eu trabalhava. Os seus olhos de policial estudaram tudo desde a minha postura ao movimento circular das minhas mãos, à minha respiração. Arquivando a informação para uso futuro. Para quando a nossa trégua acabasse e ele pudesse vir atrás de mim como realmente queria – com armas de fogo. — O que é isso na sua mão? — ele perguntou. — Parece prata.
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A runa. Ele deve ter visto uma das runas de aranha de Silverstone queimada em minhas mãos. O pequeno círculo cercado por oito finos raios. Outra coisa que ele não precisava saber. Eu fechei os dedos em um punho solto. — Não é nada — eu disse. — Apenas uma cicatriz antiga. Eu tenho um monte delas. — Eu aposto que tem — ele murmurou. Eu terminei com a pomada, me levantei e entreguei ao detetive um frasco de aspirina superforte. — Pode querer tomar algumas destas também. Ele pegou a garrafa das minhas mãos, com cuidado para não tocar a minha pele. Os seus olhos âmbar capturaram e seguraram os meus cinza. Eu me encostei a pia, cruzei os braços sobre o peito e esperei que ele dissesse o que ele queria dizer. — Obrigado — Caine murmurou. Você poderia pensar que ele estava tossindo um pulmão do jeito que ele forçou a palavra para fora por entre seus dentes cerrados. — Por tudo esta noite. Por muito estranho e errado que seja eu não estaria aqui agora se não fosse graças a você. — De nada. Ele assentiu, aceitando a minha fria graciosidade. — Mas não pense que hoje à noite muda alguma coisa entre nós. Depois de encontrarmos a Elemental, eu vou prender você pelo assassinato de Cliff Ingles, como for preciso, morta ou viva. Não te esqueças disso. Eu liguei a água quente e lavei as mãos. — Não se preocupe detetive, eu não me esqueci da sua vendeta30. Mas você deve lembrar o que eu fiz para aqueles homens em sua casa. Porque eu não vou hesitar em fazer o mesmo a você assim que você entrar no meu caminho. Entendido? Donovan Caine observou as manchas do seu sangue escorrerem das minhas mãos e desaparecerem pelo ralo. — Entendido.
30
Na Córsega, espírito de vingança, entre famílias, provocado por um assassínio ou uma ofensa.
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Caine engoliu um par de aspirinas e voltou para a sala. Eu coloquei a tampa na pomada de cura de Jo-Jo e segui-o. O detetive se sentou no sofá novamente. Ele podia me odiar, mas pelo menos ele não era tímido. Enquanto estivemos no banheiro, Finn tinha feito para si uma caneca de café de chicória. Os fumos ricos de cafeína chegaram ao meu nariz e o meu estômago roncou. — Finn? Lanche de final de tarde? — eu fui para a cozinha. — Sanduíche — ele disse, sem sequer olhar para cima do brilho azul do seu monitor. — Mas não peru desta vez. Algo diferente. Pão diferente também. Surpreenda-me — Sim, mestre. Peguei um pedaço de pão de fermento caseiro de Sophia Deveraux que eu tinha trazido do Pork Pit, várias bananas e a manteiga de amendoim e o mel de sourwood31 dos armários, junto com algumas abóboras em conserva. Primeiro, eu misturei a manteiga de amendoim e a abóbora, produzindo uma pasta para babar, cremosa e rica, que eu espalhei no pão. Eu cobri a mistura com bananas fatiadas e reguei mel sobre a fruta. Como toque final, eu salpiquei um pouco de canela em cima da coisa toda e depois a cobri com outra fatia de pão. Eu arranquei uma folha de papel e entreguei-a junto com o sanduíche a Finn, que cravou os dentes no espesso pão com óbvio entusiasmo. Donovan Caine não se moveu do sofá. Eu olhei para ele, querendo saber quem seria o primeiro a acabar com este impasse mexicano. Caine olhou para o sanduíche que desaparecia de Finn. — Isso parece bom. Pode me arranjar um desses? Por favor? — Claro. Fiz-lhe um sanduíche e depois um para mim e mais dois para quem chegasse primeiro. Donovan se mudou para a mesa e sentou-se ao lado de Finn, enquanto eu tirava um pacote de leite da geladeira e tirava algumas canecas do armário. Eu coloquei as canecas na mesa e depois envolvi a minha mão em torno de uma delas e alcancei a minha magia. Cristais de gelo embaciaram o recipiente, garantindo que tudo o que fosse derramado lá dentro permanecesse frio. Eu repeti o processo nas outras duas canecas. Donovan parou e os seus olhos castanhos se estreitaram à pequena demonstração de magia.
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Ou sorrel tree, que é uma espécie de árvore, nativa do oriente da América do norte, mais comum na cadeia menor das montanhas apalache.
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— Você é uma Elemental de Gelo. Eu encolhi os ombros. — Eu tenho um pouco de magia, detetive. Isso é tudo. Dificilmente vale a pena mencionar. Finn olhou para mim. Ele sabia que eu tinha mais do que um pouco de magia, mas desta vez ele não me contradisse. Eu terminei com as canecas e deslizei o sanduíche de Caine para ele. Ele o pegou, mas hesitou antes de morder, como se só de olhar para a comida que eu tinha preparado fosse suficiente para fazê-lo ter um colapso e começar a espumar pela boca. Ele devia saber a esta altura que veneno não era realmente o meu forte. Uma arma barata e teatral, tal como a chantagem. O detetive mastigou e engoliu. Surpresa se espalhou pelo seu rosto. — Isto é muito bom. — Melhor do que o Cake Walk? — eu perguntei. Ele não olhou para mim. — Melhor não, apenas diferente. Finn deu uma cotovelada no detetive de lado. — Eu te disse que Gin faz os melhores sanduíches da zona. Donovan não respondeu, mas ele deu outra mordida e se serviu de um pouco de leite. Eu agarrei o meu próprio sanduíche e leite e me juntei aos dois homens na mesa. A manteiga de amendoim, purê de abóbora e banana teceram uma grossa textura juntos, enquanto que o mel e a canela adicionaram um toque de doçura à mistura. Perfeito. — Alguma pista nova? — eu perguntei a Finn depois de ter comido metade do meu sanduíche. Ele balançou a cabeça e limpou os dedos em uma das toalhas de papel. — Não. Os meus contatos me enviaram alguma informação sobre as Indústrias Halo e as irmãs James. Eu já vi a informação, mas nada sobressaiu ainda. Talvez de manhã, quando eu estiver mais fresco. Meus olhos cinzentos foram para o detetive.
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— Eu acho que é hora de nos dizer sobre o que você e Gordon estavam falando no Teatro. Caine assentiu. — Sim, provavelmente é. Fiquei um tanto surpresa por ele estar cedendo tão facilmente. Se calhar o meu sanduíche era assim tão bom. Ou talvez o detetive tenha finalmente percebido que trabalhar conosco é a sua melhor opção neste momento. A sua única opção, na verdade. Caine terminou o seu sanduíche, bebeu o leite e começou a sua história. — Gordon Giles me contatou cerca de três meses atrás. Disse que tinha informação sobre um escândalo de desfalque nas Indústrias Halo. Disse que me daria todas as informações que eu precisava para afastar várias pessoas durante um longo tempo, se eu prometesse oferecer-lhe proteção. — Por que ele foi até você? — Finn perguntou. — Você é um detetive de homicídios. Crime de colarinho-branco32 não é a sua especialidade. — Giles disse que ia além de fraude, disse que alguém estava usando o dinheiro para algumas coisas bastante desagradáveis. Subornos, aliciamentos — o olhar de Caine virou para mim. — Assassinato por contrato — ninguém falou por um momento. — Giles disse que tinha estado coletando informações por meses — Caine continuou. — Ele deveria me dar às informações no Teatro e eu deveria colocá-lo em uma casa segura. — Deixa-me adivinhar. Toda a informação foi armazenada em um pendrive, o que os homens na sua casa queriam que lhes desses — eu terminei. Caine assentiu novamente. — Contou a alguém sobre Giles? — eu perguntei. — Alguém no departamento de polícia sabia que estava se encontrando com ele? — Eu disse ao meu capitão, Wayne Stephenson, o que Giles queria algumas semanas atrás. Ele trouxe mais alguns caras à jogada. Dependendo do que Giles nos desse, Stephenson disse que ele poderia montar uma equipe para analisar o desfalque. Caine esfregou a mão sobre a sua cabeça. Mas ele não protestou, mas uma vez que Wayne Stephenson não tinha absolutamente nada a ver com a Elemental do Ar. Talvez ele 32
Ato delituoso cometido por uma pessoa de elevada respeitabilidade e posição socioeconômicos e, muitas vezes, representa um abuso de confiança. Refere-se a um tipo de crime de difícil enquadramento em uma qualificação jurídica precisa. Em geral, é cometido sem violência, em situações comerciais, com considerável ganho financeiro. Os autores se utilizam de métodos sofisticados e de transações complexas, o que dificulta muito sua percepção e investigação.
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tivesse tido tempo para pensar nisso. Ou talvez o choque da traição estivesse desaparecendo e a raiva estivesse surgindo. Mas Caine tinha chegado a este ponto. Bom. Tornaria as coisas mais fáceis se ele não estivesse protestando a inocência de Stephenson a cada passo do caminho. Então Stephenson sabia sobre o encontro. As probabilidades eram que o capitão da polícia tinha informado a Elemental do Ar sobre o fato de que Gordon Giles estava se tornando prova do estado. Talvez ela tenha subornado Stephenson para mantê-la informada. Talvez ela tivesse algo contra ele. De qualquer maneira, ele teria soprado o apito33. Foi aí que a Elemental surgiu com o seu plano e decidiu envolver a mim, a Finn e a Fletcher no seu radical curso de ação. Caine tinha, provavelmente, sido lançado como um bônus, para que ele não pudesse apontar o dedo a Stephenson. Olhei para Finn. Ele tinha chegado à mesma conclusão. Ele assentiu, me dizendo que ele começaria a escavar em Wayne Stephenson. — Giles disse quem estava envolvido na fraude? — eu perguntei. — Não — Caine disse. — Apesar de eu suspeitar que pudesse ser Haley James. Giles mencionou o nome dela várias vezes. Como Finn disse esta não é a minha área de especialização. Giles me deu algumas pistas, me provocou com algumas informações, mas isso é tudo. Isso é tudo o que eu sei. É sua vez. Finn começou. — A nossa vez? Para compartilhar? — Tenta não chorar, Finn — eu disse. — Mostra-lhe o que temos. Finn espalhou as identificações que tínhamos tirado aos guardas mortos e mostrou ao detetive. Caine não reconheceu nenhum dos homens, mas ele concordou que as identificações eram falsas e provavelmente não nos levariam a lugar nenhum. Por isso, Finn mostrou a corrente de ouro com a runa do dente triangular. O azeviche polido absorveu a suave luz da cozinha como uma esponja negra. — Interessante — Caine murmurou, estudando a runa. — Eu nunca vi esta runa em particular antes e eu estou a par dos símbolos de todas as gangues da cidade. — Eu acho que a nossa Elemental do Ar constitui um pouco mais do que uma mera gangue — Finn salientou.
33
Expressão equivalente a contar algo a alguém.
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Caine resmungou o seu acordo. — Nós também temos isto — eu deslizei o cartão de visita. — Você tinha dois caras te seguindo no almoço. Um deles passou o seu cartão a algumas meninas da faculdade, Finn está procurando informações sobre ele. Caine pegou o cartão. — Charles Carlyle? Eu pensava que o tinha reconhecido. Ele se veste melhor do que eu me lembrava. — Você o conhece? — eu perguntei. A boca do detetive se apertou. — Infelizmente. Chama a si mesmo de Chuck ou Chuckie C. Ele é um babaca que gosta de pensar que é melhor do que realmente é. Anda sempre passando de um grupo para o outro34, sempre procurando uma forma de ganhar algum facilmente. Uma pessoa repugnante na verdade. Cruzei com ele algumas vezes quando eu estava trabalhando na área da prostituição e dos maus hábitos. — Prostituição e maus hábitos? — Finn perguntou. — Parece mais com crime organizado para mim. O detetive balançou a cabeça. — Seria de pensar assim, mas Chuckie gosta não das senhoras. Uma nova todas as noites, quanto mais nova melhor. Ele é um vampiro, sabe. Eu acho que ele se deleita tanto com o sexo como com o sangue. Eu assenti. Alguns vampiros eram assim. Todos precisavam de sangue, mas muitos deles também ganhavam poder com o sexo – ou se alimentando das emoções dos outros. Alguns vampiros, especialmente os antigos que tinham dominado o seu poder a muito tempo, eram tão perigosos como os Elementais. Ou mais. — Onde é que Chuckie C. gosta de andar? — Finn perguntou. — Agressão do Norte — Caine respondeu. — O clube noturno em North Town.
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Do original crew, que são grupos de pessoas.
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Eu fiz uma careta. Era a segunda vez que esse nome aparecia. Eu folheei o ficheiro de Fletcher sobre Gordon Giles e examinei o conteúdo. Sim, lá estava "Agressão do Norte", escrito na letra apertada e controlada do velho. Bati o meu dedo no papel. — Giles também gostava de frequentar a Agressão do Norte. — Então eles trabalhavam e jogavam juntos — Finn disse. Caine fez uma careta. — O que quere dizer? — Charles Carlyle é atualmente vice-presidente executivo das Indústrias Halo — eu disse. O detetive bufou. — Isso tem que ser um erro. Chuckie C. sabe tanto de negócios quanto eu. Ele é um rufião, não um empresário. — Não há erro, detetive — Finn disse. — As finanças de Carlyle mostram um salário regular depositado na sua conta toda a semana pela empresa. Ficamos assim um minuto, digerindo a informação. — Então, o que fazemos a seguir? — Caine perguntou. — Eu gostaria de ver o que está naquele pendrive de Giles — eu disse. — Já se passaram dois dias desde a tentativa de assassinato. A Elemental do Ar e os seus homens já revistaram o escritório de Giles a esta altura — Finn salientou. — A sua casa também. — Sim, mas eles ainda não encontraram. Caso contrário, eles não teriam perguntado ao detetive por ele — eu olhei para Donovan. — Não sabes onde ele poderia ter escondido isso? Ele balançou a cabeça. — Nem uma pista. Giles estava usando isso como margem de manobra, até que eu arrumasse a casa segura para ele. Eu assenti.
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— Tudo bem. Nós vamos esquecer o pendrive por agora. Nós temos Chuckie C. e nós sabemos onde ele gosta de passar o seu tempo livre. Nós vamos ao clube amanhã à noite e veremos o que ele anda fazendo e com quem ele o anda fazendo. Finn pigarreou. — A Agressão do Norte é o lugar de Roslyn. Pode ser bom avisá-la primeiro. Eu bufei. — Eu não preciso da permissão de Roslyn para espionar um cara no clube dela. Caine olhou de trás e para frente entre nós. — Quem é Roslyn? — Roslyn Phillips — eu respondi. — A vampira que está no comando da Agressão do Norte. Ela também é uma das garotas de diversão de Finn, é por isso que ele quer avisála primeiro. — Garota de diversão — Finn zombou. — Eu me ressinto com isso, Gin. Profundamente. Roslyn e eu temos um relacionamento muito amoroso que é baseado em mútuo interesse e carinho. — Você quer dizer que vocês gostam de dormir juntos quando nenhum dos dois está saindo com mais ninguém. Donovan olhou para Finn, que sorriu de volta. O detetive sacudiu a cabeça, como se ele estivesse tentando banir a imagem de Finn fazendo coisas marotas da sua cabeça. Algo com o que eu estava muito familiarizada. Para além de me arreliar como a um irmão, Finn também me tratava como o companheiro do vestiário. O que ele mais gostava de fazer era de se gabar da sua última conquista sexual. Era realmente chocante que algum marido ciumento não me houvesse contratado para matar Finn há anos atrás. — Então esse é o plano? — Caine perguntou. — Apertar com Chuckie C. e ver o que sai de lá? — Tem uma ideia melhor, detetive? — eu perguntei. — Se assim for, por favor, fale.
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Os nossos olhos se encontraram, cinzento com ouro. Cada cor dura, inflexível. Depois de um momento, Caine balançou a cabeça. — Eu não acreditava que tivesse — eu disse. — Mas não se preocupe, detetive. Eu te deixarei ser o bom policial. Eu sou muito melhor sendo o cara mau de qualquer maneira.
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Capítulo 17 Sem nada para fazer a noite, fomos dormir. Peguei minha cama, enquanto Finn ficou no quarto de hóspede. Donovan Caine fez-se confortável no sofá descartável na sala. Eu remexi no armário perto do banheiro, tirando alguns cobertores e travesseiros disponíveis para meu hóspede inesperado. Anfitriã rápida, essa era eu. Eu andei até a sala e entreguei a roupa de cama para o detetive. — Divirta-se. — Obrigado — ele disse. Caine sacudiu o cobertor azul e verde e começou a fazer o sofá de cama. Eu flutuei até a porta da frente e fingi que estava checando duas vezes as fechaduras. Pressionei minha mão contra a pedra, ouvindo seu murmúrio fraco. Baixo e estável, como sempre. Mais uma vez, tracei pequenos cachos definidos sobre a superfície da pedra – o símbolo da proteção. As runas de prata brilharam antes de afundar na parede e desaparecer. Enviei um estouro de magia através da rocha para testar meu fio de viagem mágica. A nota aguda de alarme soou de volta para mim, levantando-se um grito ensurdecedor. Se alguém tentasse abrir a porta e entrar no apartamento, aquele mesmo som me acordaria. Também ressoaria se alguém tentasse sair. Donovan Caine e eu poderíamos ter um acordo, mas a nossa parceria tênue poderia não impedi-lo de esgueirar-se no meio da noite. Ou tentar. O detetive não estava indo a nenhum lugar sem mim. Caine colocou um cobertor e desdobrou o outro. Ele não era um Elemental, não era Pedra, então ele não podia sentir ou ouvir a vibração. Ele afofou o último travesseiro e o sentou no topo do sofá estendido. Ele virou para me olhar. Eu assenti uma boa noite para ele e me dirigi ao meu quarto. — Durma bem — a voz profunda do detetive ressoou e me tocou, como uma corda de seda chicoteando contra minha espinha. — Se você puder. Olhei por cima do meu ombro para ele.
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— Por que eu não poderia dormir bem? Por que minha consciência está me incomodando? Dificilmente. — Deveria te incomodar. — Por causa de hoje à noite? — eu encolhi os ombros. — Eu fiz o que precisava ser feito para salvar sua vida, detetive. Justamente você não deveria me culpar por isso. — Não por causa de hoje à noite. Por causa do Cliff. O velho e previsível ódio queimou em seus olhos castanhos e seu rosto apertou com determinação. Caine ainda estava contando os minutos até que ele pudesse vir atrás de mim pelo assassinato de seu parceiro. Por um momento, eu considerei contar ao detetive exatamente o que Cliff Ingles tinha sido. Sobre o dinheiro de proteção que ele tinha extorquido de vários cafetões. Sobre as prostitutas vampiras que ele tinha forçado a lhe dar brindes na parte traseira de seu sedan enquanto ele estava de plantão. Sobre a garota de treze anos que ele tinha tão brutalmente, estuprado, espancado e deixado para morrer. O conhecimento acabaria com aquele desprezo hipócrita do rosto de Donovan Caine. Queime isso como se nunca tivesse existido. Mas eu segurei minha língua. Aquela informação era um ás na manga e eu não estava a ponto de derrubá-lo só por despeito. Deixe o detetive manter sua ilusão sobre seu parceiro. Eu precisava dele focado em encontrar a Elemental de Ar – não esfregando sobre o quão errado ele tinha estado sobre Cliff Ingles. Caine era tão fodidamente idealista. Ainda determinado a acreditar no melhor de qualquer um, apesar de tudo evidenciar o contrário. Isso vai fazê-lo morrer um dia. Eu dei-lhe um insípido olhar gelado. — Eu durmo como uma rocha, detetive. Sempre dormi e sempre dormirei. Entrei em meu quarto e fechei a porta atrás de mim. Meu sono foi escuro, preto, confortável e livre de quaisquer sonhos perturbadores ou memórias bruxuleantes de Fletcher. A luz do sol oblíqua através da janela aqueceu meu rosto e penetrou sobre minhas pálpebras. Eu suspirei, rolei e olhei para o rádio relógio ao lado da cama. Quase meio-dia. Hora de começar com as coisas. Eu me arrastei para fora da cama, abri a porta e entrei na sala. Finn sentado em frente ao seu computador, uma xícara de café de chicória ao seu lado. O cheiro familiar me lembrou de Fletcher e eu senti a dor aguda de sua perda. A imagem de seu corpo esfolado piscou em frente aos meus olhos, mas eu empurrei-a de lado e foquei na minha última memória de Fletcher – o velho homem bebendo sua própria xícara de café no Pork Pit. Eu respirei, deixando o rico aroma revestir meus pulmões, fingindo que Fletcher estava aquecendo o apartamento com sua presença fantasmagórica. Fingindo que ele estava me aquecendo.
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Finn me viu entrar na sala. Ele acenou para mim, em seguida, pressionou um dedo em seus lábios e apontou para o sofá. Eu olhei de volta para a mobília. Um monte de cobertores cobriam Donovan Caine como as espessas camadas de uma mortalha funerária. Eu poderia simplesmente ver o topo de sua cabeça através do tecido. Por um momento, eu me perguntei se o detetive dormia nu. Humm. Estaria disposta a espiar se ele o fez. Finn apontou para algo ao lado do sofá. Eu me inclinei. Uma das armas do detetive estava no chão ao alcance fácil. Eu fiz uma careta. Apesar da nossa trégua, Donovan Caine ainda não confiava em mim. O que ele pensou que eu ia fazer? Deslizar e assassiná-lo no meio da noite no meu próprio apartamento? Eu era cruel, não estúpida. Andei para Finn. A luz do sol no meio da manhã escorregou por entre as cortinas e destacou seu rosto, suas características fortes que eram tão semelhantes às de seu pai. Inclinei-me e despenteei seu cabelo cor de noz. — O que foi isso? — Finn murmurou, alisando seu topete cabeceira-de-cama. — Apenas por que... — eu disse, tentando esconder a emoção que engrossava minha voz. — Café da manhã atrasado? — Omeletes. Definitivamente omeletes. Panquecas, também? — Finn perguntou. Eu despenteei seu cabelo novamente, me movendo na cozinha e comecei a trabalhar. Eu tirei vários ovos da geladeira, junto com o queijo, leite e manteiga. Pacotes de morangos congelados esperavam no congelador e eu arranquei-os das profundezas geladas. Farinha, açúcar, spray de cozinha antiaderente e pimenta saíram dos armários. Novamente, o processo contínuo de cozinhar, de criar comida, me tranquilizou. Eu cortei os tomates, cebolas, pimentão verde e presunto e coloquei na minha omelete sudoeste. Os morangos foram para o microondas para descongelar. Creme de leite batido com farinha e uma pitada de açúcar formavam a base das minhas panquecas. O ruído leve de tilintar das louças acordou o detetive. Donovan Caine soltou um gemido baixo e sentou-se. Os cobertores caíram, revelando o mesmo jeans e camiseta que o detetive tinha vestido na noite passada. Assim, ele não dormiu em pelo. Uma pena, realmente. Caine franziu a testa, como se ele não entendesse onde estava. Ele me viu e o conhecimento e as memórias da noite passada queimaram em seu olhos cor de avelã. Seus olhos foram em Finn, então de volta para mim. Ele não relaxou. — Bom dia — eu disse, lançando uma das panquecas de morango. O detetive resmungou algo ininteligível. Caine rolou no sofá e tropeçou até a cozinha. Ele se inclinou sobre o balcão e olhou para o bule borbulhante como um adolescente virgem faria para uma stripper.
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— Caneca? — ele murmurou. Eu abri um armário e passei a ele uma xícara de cerâmica branca. Nossas mãos roçaram. Mais uma vez, aquela consciência quente dele correu através de mim. Meus seios apertaram e uma dor pulsou agradável entre minhas coxas. Mas Donovan Caine estava muito privado de cafeína para notar ou responder na mesma moeda. O detetive sentou-se à mesa perto de Finn e olhou com olhos turvos para sua caneca. Depois de alguns minutos, a fumaça da cafeína trabalhou sua mágica da manhã. O detetive piscou e tomou um gole do seu café. — Gah! — ele quase cuspiu com vigor a boca cheia para fora. — Que diabos é isso? Veneno? — Não, é café de chicória — Finn ergueu a própria caneca em saudação. — Isso colocará cabelo em seu peito. Caine fez uma careta, mas ele continuou bebendo. O detetive ainda serviu-se uma segunda xícara. Quando as panquecas estavam um marrom dourado, eu as coloquei em uma travessa, juntamente com várias omeletes. Pratos, talheres e guardanapos foram para a mesa, junto com uma jarra de suco de laranja. Mais uma vez, eu usei minha magia de Gelo para gelar o recipiente. Donovan Caine não disse nada sobre meu poder, mas os olhos dele ficaram em mim. Frio e calculista. Todos se ajudaram com a comida. Ainda desconfiado, Caine não tocou em nada até que Finn e eu tínhamos ambos engolidos várias mordidas. Mas uma vez que ele começou, o detetive comeu mais do que nós dois juntos. — Isso é realmente bom — Donovan Caine disse, atacando sua terceira panqueca de morango. — Você soa surpreso — eu disse. Ele deu de ombros. — Eu apenas não pensei que uma assassina seria capaz de cozinhar assim. — Bem, eu tenho muita prática com facas. Você poderia dizer que eu sou multitarefa. O detetive congelou seu garfo a meio caminho da sua boca. — Estou brincando. Eu gosto de cozinhar. Isso me relaxa. — Eu aposto — Caine murmurou. Mas sua inquietação não o impediu de encher a boca com outra mordida de panqueca.
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Nós comemos em silêncio por vários minutos. — Então o que você faz quando não está assassinando pessoas, Gin? — Donovan Caine finalmente perguntou. Eu levantei uma sobrancelha. — Por que tão curioso detetive? Ele deu de ombros. — Apenas tentando ter uma conversa. Uma vez que estamos presos um ao outro por um tempo, pensei que poderia ser educado falar sobre outra coisa do que o fato de que estamos indo cometer um crime hoje. — Só um? — eu zombei. — Você está nos vendendo em curto prazo, detetive. O dia é longo. Os olhos de Donovan estreitaram. Ele percebeu que não ia chegar a nenhum lugar comigo, então ele voltou seu olhar para Finn. — E você? — Oh, Finn não é um assassino — eu cortei. — Ele é muito, muito pior. Ele é banqueiro. Meu comentário falso pegou Finn de surpresa e ele engasgou com o café. Donovan Caine soltou uma gargalhada. Foi a primeira vez que eu tinha ouvido o detetive rir sem um fundo de raiva sarcástica. Um som agudo, tingido aqui e ali com amargura, mas não uma surpresa desagradável. Um pouco como o meu riso. Caine sorriu, seus dentes brilhando em seu rosto de bronze. A expressão aqueceu seus olhos de ouro líquido. Minha respiração ficou presa na garganta. Se o detetive parecia tão bom meramente sorrindo, como ele poderia parecer depois de uma noite de sexo lento e suado? Humm. O sorriso de Donovan desvaneceu-se sob meu olhar cinza intenso. — O que você está olhando? — Nada — eu disse. — Coma seu café da manhã. Será um dia longo e todo mundo precisa manter em cima suas forças. Finn, o que seus contatos dizem? Finn me deu um olhar sujo antes de responder.
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— Ainda não há visitas nas identificações falsas dos caras mortos ou qualquer informação sobre o dente da runa. Quem quer que seja a Elemental de Ar, ela está correndo um navio apertado. Nenhum vazamento até agora. — Nenhuma novidade sobre mim? — Donovan Caine perguntou. — Ou o ataque na minha casa? — Nada nos telejornais da manhã — Finn disse. — O Elemental deve ter limpado. Nenhuma conversa sobre corpos, danos provocados pelo vento, nada. No entanto, segundo minhas fontes no departamento de polícia, seu capitão, Wayne Stephenson, está procurando por você. Ele quer uma palavra sobre a sua dissidente investigação sobre o caso de Gordon Giles e o fato de você não ter relatado no dever de hoje. Caine fez uma careta, porque o interesse de seu capitão em seu paradeiro era mais uma evidência que Stephenson estava envolvido com a Elemental. — Você tem alguma coisa sobre Stephenson? — eu perguntei para Finn. Ele balançou a cabeça. — Nada até agora. A primeira vista, suas finanças parecem limpas e ele não está largando maços de dinheiro em qualquer vício ou hábito que eu possa encontrar. Vou continuar a cavar. Nós continuamos nosso café da manhã em silêncio. Eu comecei a limpar as louças da mesa, mas Donovan Caine se levantou e estendeu a mão para a travessa em minhas mãos. — Deixe-me — ele disse. — Estou ficando em sua casa, comendo sua comida. É o mínimo que posso fazer. — Ora, ora, ora! Bonito e educado — eu disse pausadamente. — Sua mãe o criou bem, detetive. Seus olhos acenderam ouro na palavra bonito, quando ele pegou a travessa e despejou na pia. Eu me sentei, sorvendo meu suco, olhei lubricamente para o detetive. — E quanto a Carlyle? — Finn perguntou, não dividindo minha fascinação com a bunda de Donovan Caine. — Nós ainda vamos apertá-lo hoje à noite na Agressão do Norte? — Sim. Nesse ponto, ele é nossa melhor pista. Nossa única pista — eu virei meu olhar para Finn. — Então chame Roslyn e conte a ela com quem precisamos nos encontrar essa tarde.
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— Na noite passada você disse que não precisava da permissão de Roslyn para invadir seu clube — Finn disse. — Por que a mudança? Tomei outro gole de suco. — Porque ela pode saber algo mais sobre Carlyle. Você sabe como ela gosta de acompanhar os hábitos de seus convidados. E eu quero saber tudo o que há para saber sobre esse filho da puta antes de enfrentá-lo esta noite.
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Capítulo 18 Uma vez que tínhamos abandonado o SUV que Finn tinha roubado ontem, estávamos sem transporte. Por isso Finn teve que roubar outro carro de uma garagem de estacionamento35 a quatro quarteirões do meu apartamento. Ele procurou em um nível da garagem, escarnecendo e passando por vários carros compactos perfeitamente prestáveis, antes de descer para o nível seguinte. — O que ele está fazendo? — Donovan Caine perguntou enquanto o seguíamos. — Isto não é o supermercado. Eu bufei. — Diz isso a Finn. Ele é um homem de carros. Quanto mais caro e espaçoso, mais feliz o faz. Finn finalmente parou na frente de um modelo recente da Lexus e assentiu. — Este servirá para hoje. Ferramenta por favor, Gin — ele estendeu a mão para mim. — Não trouxe as suas? — Por que carregar o peso extra quando faz umas descartáveis tão boas? — ele respondeu. Eu odiava admitir, mas Finn tinha um ponto. Suspirei e busquei minha magia de Gelo. Donovan Caine observou o brilho de prata cintilando sobre a minha palma, se perguntando o que eu estava fazendo. Uma pergunta que eu fazia muitas vezes quando lidava com Finnegan Lane. Alguns segundos mais tarde, eu passei a Finn uma vareta longa e delgada, parecida com arame. Ele pegou a fria varinha de Gelo e a enfiou na janela do carro. A fechadura abriu, a vara quebrou e Finn limpou os pedaços restantes da varinha do seu paletó 35
São aqueles parques de estacionamento que têm vários andares.
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impecável. Então ele abriu a porta, se deixou cair no assento do motorista, alcançou debaixo do painel do carro e puxou um par de fios. Trinta segundos depois, o motor rugiu para a vida e Finn nos fez gesto para entrarmos. Eu fiquei com o assento do passageiro, enquanto Donovan Caine deslizou na parte traseira. Finn dirigiu o carro para fora da garagem. Um belo dia de Setembro nos cumprimentou. Céu azul. Nuvens finas. Brisa ligeira. O sol brilhava como uma moeda de ouro, iluminando até mesmo o grafite nas ruas do centro e nos edifícios. — Onde estamos indo? — eu perguntei a Finn. — Até onde te levou o rastro de Roslyn? A discoteca? Finn tinha feito uma chamada de um dos celulares descartáveis e marcou um encontro com Roslyn antes de sairmos. — Nah, o clube nem sequer abre antes das oito. Ela está em casa agora. Apesar do dinheiro gerado pela discoteca dela, Roslyn Phillips não vivia em North Town como o resto dos ricos. Em vez disso, ela fez sua casa nos subúrbios a oeste de South Town. Colinas cortavam esta parte de Ashland como dentes irregulares de um serrote, embora a cor canela, escarlate e dourada das folhas de outono ajudasse a borrar as cristas ásperas. Eu baixei a minha janela e deixei o ar fresco entrar no carro. Trinta minutos mais tarde, Finn virou em uma entrada forrada com carvalhos vermelhos. Ele dirigiu até uma colina íngreme antes das árvores retrocederem, revelando uma casa modesta de dois andares feita de tijolos cinzentos. Persianas pretas e canteiros brancos enquadravam as janelas quadradas, enquanto uma variedade de brinquedos coloridos lutavam por espaço no gramado verde. Felicidade suburbana no seu melhor. Tudo o que a casa precisava para completar o quadro era um retriever dourado pateta correndo pelo jardim. Finn estacionou o Lexus roubado e saímos os três do carro. — Apenas deixe ser eu a falar e tudo correrá bem — Finn alisou o paletó. Ele tinha ido com um casaco cinza hoje, com uma camisa cinzenta que de alguma forma fazia seus olhos parecerem ainda mais verdes do que eram. — Esse era o meu plano — eu respondi. — Você é o porta-voz. Achei que poderias usar algum charme acumulado que dizes ter para fazer Roslyn falar. Ou estava pensando em usar uma técnica mais persuasiva hoje? Ao meu lado, Donovan Caine bufou, mas sua boca se curvou em um pequeno sorriso.
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— Você só está com ciúmes — Finn procurou uma lata de spray para o hálito em seu bolso das calças e esguichou um pouco em sua boca. — Dificilmente. Estive lá e fiz você36 — eu respondi. — Adequado, mas nada de extraordinário. Donovan Caine ficou surpreendido com a revelação. Ele franziu a testa e algo brilhou em seus olhos cor de avelã. Mas o detetive mascarou a emoção antes que eu pudesse decifrar o que era. Finn apertou uma mão sobre o coração. — Oh, Gin, como me machuca. — Eu vou te machucar muito mais se não conseguires fazer Roslyn falar e nos facilitar as coisas hoje à noite com a sua conversa doce — eu disse cortante. — Não se preocupe — Finn disse. — Roslyn irá derramar sobre nós cooperação, já que cuidou do cunhado dela há alguns meses atrás. Ou já se esqueceu? O rosto de um homem brilhou na frente dos meus olhos. Pele de chocolate, cabelos encaracolados, um sorriso com covinhas e olhos negros que eram ainda mais frios que os meus. Não, eu não tinha esquecido Jeremy Lawson. Meu rosto se contorceu com uma dor fantasma. O meio-gigante37 tinha quebrado minha mandíbula antes que eu conseguisse matá-lo. Nojo apertou o rosto de Donovan Caine. — Você assassinou o cunhado desta mulher e acha que ela está feliz por isso? Abri a boca para responder, mas Finn encarou o detetive com um olhar feroz. — Sim — ele retrucou. — O bastardo gostava de bater na irmã de Roslyn e na sua sobrinha. Da última vez, ambas ficaram no hospital durante duas semanas. A menina tem quatro anos, caso esteja interrogando. O olhar do detetive passou para os brinquedos no quintal e o nojo foi drenado para longe do seu rosto áspero. — Por que ela não chamou a polícia? — Caine perguntou numa voz mais calma. — Roslyn chamou, mas Jeremy tinha um par de amigos de pesca na força e bastante dinheiro para fazer todo o mundo olhar para o outro lado. Os policiais nem sequer 36
Expressão americana muito utilizada: Been There, Done That... Que quer dizer que alguém já passou por algo assim, neste caso ela faz um trocadilho. 37 Seria um híbrido, metade gigante.
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enviaram um relatório de disputa doméstica — Finn disse. — Então Roslyn decidiu procurar outra solução mais permanente antes que ele as matasse. O olhar de Caine veio para mim de novo. Curiosidade queimou em seus olhos castanhos, junto com um lampejo de dúvida. O detetive tinha que estar pensando em seu parceiro, Cliff Ingles. Querendo saber se o policial tinha feito algo assim. Querendo saber se foi por isso que eu o matei. Eu mantive a minha expressão em branco enquanto correspondia ao olhar. Após um momento, o detetive baixou os olhos. Chegamos à porta da frente. Uma pequena placa com uma runa gravada nela estava incrustada na pedra à direita. Um coração com uma flecha a traspassá-lo. O símbolo da discoteca de Roslyn, Agressão do Norte. Finn tocou à campainha. Sinos a tilintar ecoaram pela casa. Após cerca de vinte segundos, uma sombra passou na frente do olho mágico. Alguém lá dentro nos estava estudando. Várias fechaduras clicaram e a porta abriu. Roslyn Phillips era uma bela mulher, com olhos e pele cor de caramelo derretido. Seu cabelo preto curto e suave como pena roçava a ponta do seu queixo forte. Óculos de moldura cinzenta estavam empoleirados na ponta do seu nariz pontiagudo e seu rosto estava livre da maquiagem pesada que eu sempre a via usar. Ela parecia mais jovem sem ela, mais suave e mais vulnerável do que eu sabia que ela era. Um par de calças de yoga preta cobria as suas pernas, enquanto uma camiseta a combinar se esticava sobre o seu peito. Mas o traje inócuo não conseguia esconder os seios fartos de Roslyn, os quadris exuberantes e as coxas tonificadas que tinha a maioria dos homens limpando baba do queixo após alguns segundos. E Roslyn sabia como usar seu corpo para o seu pleno potencial. Ela era um dos vampiros que usava o sexo para ganhar poder, juntamente com beber sangue. Os lábios de Roslyn se abriram em um largo sorriso, revelando suas presas. Elas eram tão brancas como lixívia38. — Finnegan Lane. Que surpresa agradável — sua voz era um sussurro baixo e rouco. — Roslyn, querida. Tão bom que possa me receber com tão pouco tempo de aviso — Finn se inclinou e beijou a bochecha lisa de Roslyn. — Sempre um prazer, Finn — Roslyn murmurou. Seus olhos escuros se deslocaram para o detetive antes de pararem em mim. — E trouxe amigos contigo. — O cavalheiro é Donovan Caine — disse Finn. — E você conhece Gin, é claro.
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A lixívia, água sanitária, ou barrela é um composto químico para limpeza e desinfecção de superfícies, é muito utilizada como agente clareador (alvejante) e possui excelente ação bactericida.
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— Claro. Roslyn olhou para mim e eu encontrei o seu olhar escuro com um neutro dos meus. Eu não tinha estado lá quando ela falou com Finn sobre encontrar alguém para matar seu cunhado, uma vez que Finn era conhecido como um homem que podia obter todo o tipo de coisas resolvidas. Mas ela tinha me visto com Finn, sabia que eu era amiga de Fletcher e que trabalhava no Pork Pit. Finn nunca tinha dito a Roslyn que tinha encontrado alguém para fazer o trabalho, nunca tinha sequer admitido que soubesse quem fazia esse tipo de coisa. Mas três semanas depois de Roslyn perguntar, o cunhado abusivo dela tinha sido encontrado esfaqueado até à morte no exterior de um clube de stripper em South Town. Eu tinha certeza que a vampira tinha tirado suas próprias conclusões – sobre um monte de coisas. — Entrem — Roslyn disse. — Nós estávamos terminando o almoço. Ela nos conduziu para dentro e, então, fechou e trancou as portas atrás de nós – com as três fechaduras. Roslyn Phillips não se arriscava com a segurança dela. Mulher esperta. Ela dobrou o dedo e nos levou por várias salas cheias com pesadas mesas de madeira, candeeiros Tiffany e poltronas à moda antiga forradas com veludo. O mobiliário antigo estava em nítido contraste com os brinquedos, livros e outros objetos infantis colocados nas mesas, empilhados nos cantos e espalhados sobre os sofás. Em torno de mim, a pedra da casa alternava entre preocupação baixa e alegria despreocupada, dada a variedade de emoções de seus ocupantes. Nós entramos em um pátio de pedra que dava para uma piscina em forma de coração que havia sido coberta para o inverno. Uma menina que tinha uma impressionante semelhança com Roslyn estava sentada em um castelo rosa de princesa plantado no quintal e empurrava um caminhão basculante azul na grama. De vez em quando, ela parava de fazer barulhos de vroom-vroom tempo suficiente para roer o sanduíche de tomate que ela segurava na sua mãozinha. Roslyn apontou para uma mesa rodeada por cadeiras de vime com espessas almofadas coloridas. Os restos de uma salada Cobb enchiam um prato sobre a mesa, junto com uma caneca meio cheia de sangue, um copo de leite com chocolate, um jarro de limonada e vários copos. Finn se sentou na cadeira em frente de Roslyn. Donovan Caine desabou no assento ao lado dele, enquanto eu fiquei com a última cadeira. Puxei-a para fora da mesa e mudei o ângulo dela de modo a poder ver a menina. Roslyn levantou o jarro. Cubos de gelo tilintaram contra o vidro. — Limonada?
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Parece que eu não era a única dona de casa graciosa na zona. Todos aceitamos e Roslyn dispensou a bebida gelada. Bebi o líquido. Azedo e doce ao mesmo tempo, do jeito que eu gostava. Humm. Roslyn fixou seus olhos em Finn. — A que devo o prazer, Finn? Eu pensei que não era suposto nos encontrarmos até o final desta semana para o ato de caridade do abrigo para mulheres agredidas. — Infelizmente, eu provavelmente não serei capaz de ir ao evento — ele disse. — Então eu pensei em vir te ver hoje. Roslyn inclinou a cabeça e olhou para ele por cima dos seus óculos. — Sério? Foi por isso que veio até aqui? Para me dizer que não iria ao evento? Eu não penso assim. Você quer alguma coisa, Finn. Apenas me diz o que é. Você sabe como eu odeio que me digam balelas. É ruim o suficiente quando eu tenho que fazê-lo aos meus clientes. Ele assentiu. — Tudo bem. Estou interessado em aprender mais sobre alguém que frequenta a sua discoteca e queria avisar primeiro caso alguma coisa... Desagradável aconteça hoje à noite quando tivermos uma pequena conversa com ele. Os olhos de Roslyn cortaram em mim antes de atirarem de volta para Finn. — Quem? Finn suspirou. — Charles Carlyle. Autoproclama-se... — Chuckie C. — Roslyn terminou com uma voz plana — eu o conheço. Roslyn não perguntou a Finn nenhuma das perguntas óbvias, como por exemplo, porque estávamos interessados em Carlyle, o que ele tinha feito, ou o mais importante, o que iríamos fazer com ele. A vampira tinha sido uma prostituta em South Town por um longo tempo antes de se mudar para a gerência. Ela sabia que fazer perguntas era uma maneira rápida de morrer. Donovan Caine se inclinou para frente. — O que pode nos dizer sobre ele?
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Roslyn tomou um gole delicado de seu sangue e sorriu. Suas presas eram uma mancha vermelha em sua boca. — Meus clientes gostam do seu anonimato. O meu clube não duraria muito se eu contasse seus segredos para todo o mundo que vem bater à minha porta. Especialmente um policial como você. Eu sei que costumavas trabalhar como vice 39. Eu me lembro de te ver na Agressão do Norte mais de uma vez. Caine franziu o cenho e abriu a boca, mas eu o interrompi. — Ele está conosco — eu disse. — Detetive Caine não vai te prender por nada. E se ele algum dia se atrever a perturbar, eu vou lidar com ele. Finn cuida bem de seus amigos, Roslyn. Você sabe disso. Roslyn tomou outro gole de sangue e em seguida empurrou o copo de lado. — Tudo bem, eu vou jogar junto, mas só porque é Finn. O que vocês querem saber sobre Carlyle? — Tudo — Finn disse. — O que ele gosta, com quem ele sai, o que as garotas dizem sobre ele. Roslyn encolheu os ombros. — Não há muito a dizer. Ele é um vampiro que se imagina um jogador e um fodão, apesar de seu pau pequeno. Vêm quase todas as noites e fica em uma sala privada na parte traseira. Gosta de garotas que parece que têm doze anos. Ocasionalmente fica mais brusco do que nós permitimos no clube. E está sempre se gabando para as meninas sobre o figurão que ele é. E como ele está montando seu próprio grupo e fazendo um lance no submundo. Besteiras de macho como essas. Um peixe pequeno, embora tenha andando gastando um monte de dinheiro ultimamente. Mais bebidas, mais garotas, uma festa para qualquer um que seja amigo dele. Então Chuckie C. tinha dinheiro para queimar. Mais uma prova de que ele estava trabalhando para a Elemental do Ar. Ela tinha pagado metade do que eu cobrava pelo serviço a pronto. Fazia sentido que ela espalhasse a sua riqueza furtada pelos seus subordinados também. Finn enfiou a mão no casaco e pegou uma foto de Gordon Giles do ficheiro de Fletcher. — E este cara? Era um dos amigos de Carlyle? Roslyn bateu com uma unha pintada no nariz de Giles. 39
Responsável por crimes relacionados com prostituição, pornografia, etc.
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— Gordon? Sim, os dois costumavam sair muito e fazer festas com as meninas. Não tanto recentemente. Humm. Parecia que Gordon Giles tinha abandonado Carlyle pela mesma altura que tinha se aproximado de Donovan Caine sobre o desfalque nas Indústrias Halo. Talvez Giles tenha percebido que estava enfrentando algo com que não podia lidar – ou talvez lhe tenha crescido uma consciência. — Então o que vocês realmente precisam? — Roslyn perguntou. — Você disse que querias falar com Carlyle no clube. — Sim — disse Finn. — O quarto privado que ele reserva... Há algum jeito de podermos ouvir e ver o que está acontecendo lá dentro? Roslyn se recostou na cadeira e cruzou os braços sobre o peito. — Talvez. Mas como eu disse antes, meus clientes desfrutam de seu anonimato. Eles confiam em mim com seus segredos, todos os seus segredos. Eu não iria durar muito se espalhasse a palavra que eu tinha violado essa confiança. Finn abriu o seu sorriso mais encantador. — Certamente poderias fazer uma exceção só desta vez. Por mim. Roslyn riu um som luminoso e ressoante em desacordo com as suas feições rígidas. — Você é um sedutor Finn e eu desfruto da sua companhia. Você me faz rir, o que é difícil de fazer. Mas eu não vou arriscar a minha empresa, o meu sustento, para que possas levar adiante a sua vingança com Carlyle. O rosto arruinado de Fletcher passou diante de meus olhos. Vingança? Oh não, isto era muito mais que isso. Uma vez que a vampira ia se fazer de difícil sobre as coisas, eu decidi lembrá-la exatamente o bom amigo que Finn tinha sido para ela. — Catherine cresceu tanto desde a última vez que eu a vi — eu disse com uma voz suave. — Quando a trouxeste para casa do hospital após a cirurgia. Os olhos escuros de Roslyn foram para a menina brincando no castelo e em seguida vieram rapidamente para encontrar os meus. Seu olhar endureceu e suas presas piscaram sobre seus lábios. Advertindo-me para parar ali. Donovan Caine me deu uma olhada dura, perguntando o que diabos eu estava fazendo. Finn apenas suspirou.
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— Parece que ela está gostando realmente daquele castelo de princesa que Finn lhe deu como presente de boas-vindas a casa — eu continuei. — Me diz como está Lisa, a sua irmã? Eu não a vejo há algum tempo. Vroom-vroom. Vroom-vroom. Catherine empurrou o caminhão de descarga para frente e para trás na grama. — Ela está bem — Roslyn disse em uma voz apertada. — Eu fico com Catherine durante o dia, enquanto Lisa vai para a escola. Ela está terminando o seu curso de Negócios na Universidade Comunitária de Ashland. Eu dei-lhe um sorriso suave e fácil, como se fôssemos apenas duas amigas conversando. — É bom ouvir que elas estão indo tão bem, agora. A boca de Roslyn se apertou em uma linha fina enquanto ela considerava o significado por detrás das minhas palavras casuais. Seus dedos tamborilaram na mesa. Após alguns segundos, sua mão parou. — Sim, elas estão indo muito melhor, agora. A vampira olhou para mim. — Há uma passagem que atravessa a parte de trás do clube. Tem olhos e ouvidos em todas as salas privadas. Nós a usamos para olhar por todas as meninas e nos certificarmos que elas são bem tratadas. Podem assistir Carlyle de lá. Mas ele deixa o clube vivo, entendido? Eu não posso ter pessoas desaparecendo dos quartos privados. Podíamos sempre agarrar Carlyle do lado de fora depois de vermos com quem ele gostava de festejar. Mais fácil assim de qualquer forma. Eu assenti concordando com os termos. Ela relaxou quase imperceptivelmente. — É uma querida, Roslyn — Finn se inclinou e beijou a bochecha dela. — Um amor realmente. Seu rosto suavizou e um sorriso genuíno curvou seus lábios. — Você diz isso para todas as garotas. — Talvez, mas contigo, eu realmente o sinto.
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Roslyn deu um tapinha na bochecha de Finn. Ele pegou a mão dela e pressionou um beijo no interior da palma dela. Eu limpei a garganta antes que eles pudessem passar para outras coisas. Finn suspirou. — Desculpe querida. O dever me chama. Nós vamos estar no clube hoje à noite. Talvez possamos nos encontrar mais no final da semana após algumas dos meus presentes... Dificuldades se resolverem. — Claro que sim. Ligue-me quando ficar livre. E, então, o negócio foi concluído. Eu me levantei. Donovan Caine seguiu o exemplo. Finn suspirou novamente e fez o mesmo. — Vamos, Finn. Eu tenho certeza que Roslyn quer ir ver como está Catherine — eu sorri para a vampira outra vez. — Dê cumprimentos nossos à Lisa. Seus olhos escuros encontraram os meus. — Eu vou — ela murmurou. — Eu vou.
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Capítulo 19 Roslyn nos mostrou a saída, então voltou para dentro para colocar Catherine para dormir. Assim que a vampira bloqueou a porta atrás de nós, Donovan Caine se voltou para mim. — Que diabos foi aquilo? Ameaçando a sobrinha dela desse jeito? — os olhos dele brilhavam com raiva. — A garotinha estava sentada bem ali. — E estava muito envolvida em seu próprio mundo imaginário para prestar atenção em nós. — eu respondi. — Não foi uma ameaça. Eu estava apenas lembrando Roslyn como Finn tinha cuidado de coisas para ela e que lhe devia. Eram negócios, nada mais e Roslyn sabia. É por isso que ela concordou em deixar-nos espionar Carlyle. Agora ela sabe que estamos quites novamente. Caine manteve seu olhar duro no meu rosto. — E se ela não tivesse concordado? O que você teria feito? Puxado uma das suas facas sobre a menina? — Oh cara — Finn murmurou e se afastou. Inclinei a cabeça e me aproximei do detetive até que eu estava bem na frente dele. Donovan Caine não se afastou. Ele tinha mais coragem que a maioria40. — Eu posso ser uma assassina de policiais, detetive, mas eu não sou um monstro. Eu não mato crianças, nunca. Mas você nunca se atreva a me insultar assim de novo ou eu vou ser mais do que feliz em cortar sua garganta — eu peguei uma de minhas facas, mostrei-lha, trouxe até sua garganta e coloquei de volta na minha manga em um movimento suave e rápido. Seu rosto endureceu com fúria. 40
Do original “More balls than common sense”, que traduzido fica “mais bolas que o senso comum”. Acredito que ela fez um trocadilho entre a coragem dele e por ele ter as bolas ainda, já que ela arrancou as bolas do Cliff citado logo abaixo.
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— Assim como você fez com Cliff? — Assim como eu fiz com Cliff — retruquei. — Mas eu vou dar-lhe a gentileza de deixar suas bolas ligadas ao resto de seu corpo. Ficamos lá, olhando um para o outro. Parte de mim queria dar um soco em Donovan Caine, quebrar o meu punho em seu nariz e sentir o jato quente do sangue em meus dedos. Outra parte de mim queria puxá-lo para mim, plantar meus lábios nos dele e derreter a ira em seus olhos para uma paixão líquida. Finn pigarreou. — Se vocês dois terminaram com essa discussão, devemos ir. Temos coisas para fazer e tudo mais. Donovan Caine olhou para mim mais um momento, então foi até o carro e bateu a porta. Finn e eu o seguimos. — A propósito, boa ideia com o castelo, Gin — Finn disse enquanto pegava os fios para ligar o carro. — Você estava certa. Muito melhor do que o cachorro de pelúcia que eu queria comprar. — Você escolheu isso? — Caine perguntou. — O brinquedo de plástico rosa? Eu me virei para olhar para ele. — Acontece que eu fui uma menina uma vez, detetive. Eu sei do que elas gostam. Toda menina quer ser uma princesa. Uma carranca pensativa superou a tensão da raiva no rosto áspero de Caine. — E o que acontece quando elas crescem? Pensei em minha mãe e irmãs e todos os horrores que tinham acontecido no dia em que tinham morrido. Um riso amargo escapou de meus lábios apertados. — Então, elas só querem ser meninas outra vez. Utilizando todas as precauções de costume, voltamos ao meu apartamento. Finn se dirigiu ao seu computador para ver se o seu contato havia descoberto algo mais sobre o Capitão Wayne Stephenson. Donovan Caine estava sentado no sofá e ligou a televisão. O detetive não falou ou olhou para mim e Finn estava demasiadamente absorto em seus e-
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mails para se engajar em conversas substanciais. Eu tirei uma soneca, descansando para o que com certeza seria uma longa noite. Após algum tempo, eu me levantei e tomei um banho. Coloquei jeans preto apertado, jaqueta de couro, botas e uma camiseta de manga comprida preta com um par de cerejas de lantejoulas na frente. Peguei minhas facas de Silverstone e até mesmo tive tempo de colocar alguma maquiagem. Meu batom combinava com a cor escarlate das cerejas. Entrei na cozinha. Finn estava sentado em frente ao seu computador, bebericando sua xícara de café. Ele usava calça preta com dobras afiadas como minhas facas. Uma camisa de botão em um escuro esmeralda cobrindo os ombros largos, enquanto uma gravata preta pendurava em seu pescoço. — Isso é uma roupa bastante escura. Você está tentando imitar a nossa amiga Goth? — Finn perguntou, referindo-se a Sophia Deveraux. Eu encolhi os ombros. — Ela tem certo estilo. Além disso, imagino que as coisas vão ficar um pouco bagunçadas, antes do final da noite. Daí, o preto. Onde está o detetive? Finn sacudiu a cabeça. — Acabou de sair do banho. Donovan Caine nu, a água deslizando em seu corpo magro, seus músculos apertando e relaxando quando ele se lavava. Humm. Imagem muito boa. Apesar de nosso confronto mais cedo, eu ainda achava o detetive extremamente sexy. Ele seria ainda mais atraente se ele perdesse a ira honrada e o pau no cu. Mas nenhum homem era perfeito. Caminhei até a cozinha, peguei um iogurte de amora da geladeira. Eu estava na metade quando a porta do banheiro se abriu e Donovan Caine entrou na cozinha. Ele também usava uma camiseta e jeans, apesar das dele estarem largas e desgastadas nas costuras. Uma jaqueta marrom, não diferente da minha, estava pendurada em seus ombros. O detetive olhou para mim, os olhos castanhos fixos nos meus lábios. Corri minha língua em torno da colher de prata e peguei outra colherada de iogurte. Desejo brilhou no seu olhar, seguido por um lampejo de culpa. Parece que não era só eu que estava com tesão. Talvez eu faça algo sobre isso esta noite. Talvez eu faça um monte de coisas sobre isso. Finn roubou outro carro, um Cadillac com uma parte traseira espaçosa e fomos para a boate. A Agressão do Norte, claro, estava localizada em Northtown. O edifício em si não era nada de especial – um grande armazém com uma aparência anônima de edifício de
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escritórios em verniz brilhante, tão neutro quanto o rosto de uma prostituta vampira. Durante o dia, você pensaria que era outro centro de chamadas anônimo composto por comuns empresários. Mas à noite, era uma história diferente. Uma runa grande pairava sobre a entrada – um coração com uma flecha através dele. O sinal de néon piscou vermelho, depois amarelo, em seguida laranja, destacando a longa fila de pessoas esperando atrás de uma corda de veludo vermelha. Rapazes de terno, meninas vestidas com quase nada e, tudo o que há pelo meio, de todos os tamanhos, formas e cores, todos ansiosos para entrar, ficar bêbados ou drogados e entrar em suas fantasias. A discoteca servia a uma multidão de ricos e os sedãs de luxo e SUVs lotavam o estacionamento em frente à construção e os dois lados. Finn estacionou nosso veículo para a noite em um dos lotes do lado, embaixo dos tentáculos moles de um salgueiro-chorão. — Então, qual é o plano? — Donovan Caine perguntou. — Vamos esperar Carlyle se mostrar, ver o que ele está fazendo e se alguém se junta a ele. Quando ele sair, nós vamos agarrá-lo e levá-lo de volta a casa dele para uma conversa privada — disse eu. — A variedade de coisas que pode acontecer após isso depende da cooperação dele. — Você vai matá-lo? — o detetive perguntou com uma voz plana. Eu me virei para olhar para ele sobre o encosto de cabeça. — Você está falando sério? É claro que eu vou matá-lo. Carlyle está trabalhando para a Elemental do Ar. Isso significa que ele pode ser abatido, tanto quanto eu estou preocupada. Donovan Caine balançou a cabeça. — Eu não posso deixar você fazer isso, Gin, não importa quão mau ele é. Eu sou um policial. Isso significa algo para mim, mesmo que não signifique para você. Olhei para o detetive. Sua moral estava indo atrapalhar a noite inteira a menos que eu o convencesse a ignorá-la, só desta vez. Uma ideia veio a mim, que virou meu estômago, mas era algo que eu tinha que fazer para que Caine ficasse conosco. — Finn, você ainda tem aquela foto em seu celular? A que a garota gótica mandou para você? Ele assentiu lentamente.
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— Seja bonzinho e mostre a Donovan, por favor — Finn abriu seu telefone e procurou o quadro a imagem apropriada. Ele não olhou para a tela quando passou o dispositivo para o detetive. Donovan pegou o telefone. Choque, repugnância e horror brilharam em seus olhos, um após o outro. Eu esperei até que eu vi a emoção que eu queria. Simpatia. Simpatia pelo que Fletcher tinha resistido. Simpatia que eu iria torcer a meu favor. — Dê uma longa e boa olhada, detetive. Isso é o que a Elemental do Ar fez ao meu treinador — eu disse com uma voz suave. — E não parou, mesmo quando ele estava morto. Manteve-se o mutilando. É assim que eu o encontrei, deitado em uma poça de seu próprio sangue, seu rosto e corpo quase irreconhecíveis de onde ela havia usado sua magia para esfolá-lo vivo, para retirar a pele do seu corpo. O fedor era... Indescritível. Ela teria feito a mesma coisa para você, se eu não tivesse intervindo. Exatamente a mesma coisa. Donovan Caine não respondeu. Ele apenas ficou olhando para a foto do corpo de Fletcher. — Eu prometi que eu não iria prejudicar qualquer policial ou pessoa inocente e eu não vou. Como eu disse antes, eu não mato crianças. Animais de estimação também não — disse. — Mesmo quando eu mato, é rápido, fácil e principalmente indolor. A imagem no telefone é uma abominação. Os homens em sua casa disseram que Carlyle estava com a Elemental quando ela fez isso. Ele a ajudou a fazer isso a um velho que eu amava. Então sim, eu vou matar hoje à noite esse bastardo. Se você tiver um problema com isso, você pode nos deixar. Bem agora. Donovan esfregou a mão pelos cabelos negros, fechou o telefone e passou-o de volta para Finn, que pegou sem uma palavra. Donovan Caine fechou os olhos. Sua mandíbula se apertou. Um músculo se contraiu em sua bochecha. Uma veia latejou em sua testa. Finalmente, ele abriu os olhos e olhou para mim. Emoções cintilaram em seu olhar dourado. Choque. Raiva. Nojo. Horror. Resignação. — Tudo bem — disse em uma voz grossa. — Você fez seu ponto sobre Carlyle e a Elementar do Ar. São seus. Mas o cara no departamento de polícia, ele é meu. Eu vou lidar com ele, não você. Entendido? Eu poderia viver com esses termos. — Entendido. Agora, vamos ver se podemos localizar o bastardo.
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Nós três saimos do carro e caminhamos em direção à porta da frente. Finn garantiu que seu cabelo estivesse liso e elegante, seu hálito de hortelã fresca. Ele também ajeitou a gravata, até que estava centrada em seu peito. — Apenas me deixe falar e tudo ficará bem. Revirei os olhos, mas deixei-o ir na minha frente. Finn caminhou até a fila de pessoas esperando para entrar, ignorando os olhares de reprovação e maldições murmuradas que vieram no seu caminho. Um gigante de cerca de dois metros e dez de altura, segurando uma prancheta estava em frente da porta, verificando nomes. Finn parou em frente do gigante e colocou um sorriso no rosto. — Xavier, meu homem. Como estão as coisas hoje? — Finn estendeu a mão. Xavier estudou Finn com seus olhos enormes. Ele virou a cabeça para um lado e seu pescoço estalou. O piscar da runa em forma de coração fez a cabeça raspada do gigante brilhar na noite escura. Um sorriso conhecedor surgiu no rosto do gigante quando ele pegou a mão de Finn e pegou as notas escondidas lá. — As coisas estão mudando — retumbou Xavier com uma voz profunda. — Roslyn disse que você ia aparecer. Aproveite a sua noite, Finn. Finn entregou mais cem e piscou. — Oh, nós pretendemos. Xavier tirou sua corda de veludo e deu um passo para o lado. E, simples assim, estávamos dentro com Finn. O exterior podia ser sem rosto, mas o interior tinha uma personalidade distinta. Uma decadência deliciosa. Cortinas de veludo vermelho cobriam as paredes, o chão era um bambu requintado e o bar em si era elaborado em uma folha de gelo. Runas tinham sido cortadas na superfície do bar, principalmente sóis e estrelas simbolizando a vida e a alegria. Atrás dele, um homem em uma camisa de seda azul fazia bebidas mistas. Seus olhos brilhavam azul e branco na penumbra. O Elemental de Gelo era responsável por cuidar do bar e certificar-se de que sua criação ficava em uma peça até o final da noite41. Homens e mulheres em vários estágios de nudez vagavam pela sala, oferecendo aos clientes champanhe, morangos mergulhados em chocolate e ostras frescas. Você tinha que pagar por tudo o mais no cardápio, se era comida, bebida, sexo, sangue ou drogas. A maioria dos garçons eram vampiros, todas eram prostitutas. Cada uma usava um colar com 41
Quer dizer que o barman com o poder Elemental de gelo era responsável pelo bar e pela escultura de gelo que ele fez, mantendo o mesmo sem
descongelar por toda a noite.
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uma runa no fim, um coração com uma flecha através dele e um sorriso brilhante que sugeria os prazeres que ainda virão. Tudo o que tinha que fazer era pedir e ser capaz de pagar o preço. Algumas pessoas dançavam no ritmo da batida na pista de dança. Outros estavam pressionados junto nos bancos. Beijando, acariciando, gemendo. Em alguns casos, as mesas se contraiam e apertavam, quando as pessoas fodiam no assoalho embaixo. Em outros pontos, surgiam brilhos vermelhos e o fumo enrolava até o teto de uma variedade de substâncias ilegais. Todo mundo tinha uma bebida na mão. De vez em quando, um casal subia as escadas da parte de trás da boate. Os quartos no andar de cima eram alugados por meia hora para aqueles que queriam estar mais confortáveis para praticar o ato. O segundo gigante ficava na frente de outra corda de veludo para um lado do armazém. A entrada para as salas privadas, reservadas para convidados especiais de Roslyn Philips, que pagavam caro pelo privilégio. Nós três nos movemos mais para dentro do clube e vi Roslyn trabalhando na multidão. A vampira negra vagava das cabines às mesas para a pista de dança e de volta. Apertando as mãos, sorrindo, conversando com seus clientes e incentivando todas as pessoas para se acabar em tudo o que eles gostavam. A vampira trocou as calças da ioga para um terno de seda montado em um tom vermelho sangue. O paletó mergulhava em um V profundo na frente, mostrando o seu decote suave, enquanto a saia parava no meio da coxa. Justas botas de saltos altíssimos a combinar chegavam até os joelhos. Mais de um homem e uma mulher pararam Roslyn e sussurraram algo em seu ouvido. Mas a vampira sorriu e, polidamente, recusou os convites. Seus dias de prostituição acabaram, ela não estava mais no cardápio. Ah, as alegrias da gestão. Após um minuto, Roslyn me sentiu olhando para ela. Seus olhos se estreitaram e ela balançou a cabeça, me dizendo que Carlyle não estava aqui ainda. Cutuquei Finn. — Ali está a sua menina — eu disse sobre o barulho da música. — Vai fazer-lhe companhia. Quando ela vir Chuckie C. e lhe mostrar o quarto privado, me ligue no meu celular. Finn assentiu, já indo na direção de Roslyn. — E agora? — Caine perguntou. Eu girei minha cabeça em direção ao bar. — Vamos pegar uma bebida. Podemos muito bem ficar confortáveis enquanto esperamos.
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Nós fizemos nosso caminho através da multidão de pessoas, evitando a pista de dança e chegando ao bar. De perto, a estreita escultura de gelo era ainda mais impressionante e continha tanta magia elementar que criava um suave brilho azul. Poder escorria do barman, como água escorrendo de uma torneira, enquanto ele usava apenas o suficiente de sua mágica para evitar que o bar derretesse e se mantivesse em uma só peça. Seu controle era impressionante. Minha própria magia de gelo mais fraca mexeu em resposta. O garçom colocou guardanapos para baixo sobre a laje fria na nossa frente. — O que posso fazer por vocês? — Eu quero um Gin sobre as pedras — disse eu. Donovan Caine ergueu uma sobrancelha. — Isso não é um pouco clichê? Gin pedindo gin? Eu encolhi os ombros. — Talvez, mas eu gosto. Você? — Quero um uísque, puro. O garçom afastou-se para atender o nosso pedido. Donovan Caine girou em torno de sua cadeira para que ele pudesse olhar para a boate. Eu apoiei meu queixo no meu cotovelo e estudei-o. Cabelos pretos, olhos dourados, magro. Não é um homem particularmente belo, no sentido clássico, mas tudo somado dava um pacote que eu achava excepcionalmente atraente. Donovan Caine podia me odiar, odiar o que eu fazia, odiar a facilidade com que eu podia matar. Mas o detetive estava atraído por mim também. Queria-me como eu o queria. Eu vi nos olhos dele naquela primeira noite na varanda, no Teatro. Novamente no Cake Walk. No início desta noite, quando eu estava comendo o meu iogurte. Olhei para o meu relógio. Nem mesmo dez. Nós provavelmente tínhamos um tempo de espera antes que Charles Carlyle fizesse uma aparição. E eu tinha muitas ideias de como podemos passar o tempo. O barman colocou nossas bebidas na frente de nós. Eu escorreguei cinquenta através do bar de gelo para ele. Caine bebeu o seu uísque. Eu fiz o mesmo ao meu gin. O licor frio queimou ao descer pela minha garganta, de alguma forma se transformando em um calor doce e confortante quando ele bateu no meu estômago. Eu empurrei meu copo vazio para o outro lado do bar e voltei minha atenção para o detetive. Meus olhos cinzentos beberam a curva do queixo, a constante contração de seu
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pulso em sua garganta. Donovan sentiu o meu olhar, viu a fome cintilante lá. Um calor em resposta acendeu seu olhar dourado, mesmo quando ele tentou abafá-lo. — Por que você está me olhando assim? — perguntou ele. Inclinei a cabeça e sorri. — Eu acho que você sabe. — Não, eu não sei. Por que você não me conta? Meu sorriso se alargou. — Por que eu não te mostro de uma vez? — inclinei-me, pegando seu rosto em minhas mãos e apertando meus lábios aos seus. Não era o mais doce, ou mais romântico dos beijos, mas eu gostei da sensação dos lábios do detetive nos meus, mesmo quando ele não fez. Eu provei do uísque que tinha acabado de beber, picante, doce e salgado ao mesmo tempo. Seu aroma encheu o meu nariz. Limpo, como sabão. O aroma estava agarrado a ele, como se estivesse embutido em sua pele. Humm. Passei a minha língua contra os lábios dele. Caine se enrijeceu. Ele não se afastou, mas ele manteve a boca fechada e sua língua dentro. Uma pena, realmente. — Vamos, detetive — eu murmurei contra os lábios apertados. — Todo mundo aqui está fazendo isso. Por que não? — Eu realmente tenho que listar as razões? — ele rosnou. — Não — respondi. — Mas eu tenho outras tantas por que deveríamos. Esta é uma delas. Me enfiei em seu colo. Mesmo que eu não tivesse lhe dado nenhum aviso e tivesse feito pouco para o excitar, a ereção de Donovan pressionou em minha bunda, sólida e apertada. Beijei-o novamente, pressionando levemente meus lábios nos dele. Eu balançava para frente, depois recuava, me esfregando contra seu corpo, apertando meus seios no seu peito, explorando essa atração que fervia entre nós. Humm. Donovan apertou as mãos em punhos em ambos os lados de mim. Tudo o que podia fazer para evitar me tocar. — Vamos, detetive — murmurei. — Você me quer, também. Estou sentada sobre a prova cabal disso. Após isso acabar, nós iremos para nossos caminhos separados. Eu quase morri muitas vezes para contar esta semana. Você também. Por que não devemos deixar o trabalho e o stress um pouco de lado e nos divertir um pouco?
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Donovan olhou para mim. Desejo aqueceu os olhos dele, fazendo-os brilhar como sóis gêmeos. Ainda assim, ele hesitou. Mudei meus quadris novamente, o instigando. O atrito ligeiro o empurrou sobre a borda. O detetive deixou escapar um rosnado baixo, colocando a mão no meu cabelo e me puxou para baixo colocando meus lábios nos dele. Não houve bocas fechadas desta vez. Nem leves toques ou hesitação. Nossas línguas golpearam uma contra a outra, dirigindo cada vez mais profundo dentro da boca de cada um. Minhas mãos se espalmaram sobre o seu peito, amassando os músculos magros, maravilhada com a sua força. Ele me puxou para mais perto. Suas mãos se moveram até meus seios. Eu raspei minhas unhas abaixo de seu estômago. Nós dois nos movendo, provocando o outro com o que cada um de nós tinha para oferecer. Depois de dez segundos, eu estava molhada. Depois de trinta segundos, eu sofria por ele. Quando chegamos aos minutos, eu estava pronta para rasgar o seu jeans e derrubá-lo sob o balcão comigo. Mas eu queria ficar a sós com Donovan Caine, queria esquecer tudo, além dele e de como ele me fazia sentir. — Eles têm quartos no andar de cima — eu sussurrei contra sua boca. Mais emoções brilharam em seus olhos. Desejo. Culpa. Hesitação. Necessidade. Lentamente, ele assentiu. Eu sorri e me inclinei para beijá-lo novamente quando eu senti uma estranha vibração na minha perna. Levei alguns segundos para descobrir o que era. Meu celular vibrando.
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Capítulo 20 Finn estava ligando, o que significou que nossa presa para a noite tinha chegado. Droga e droga dupla Charles Carlyle. Porque não importa o quanto eu queira Donovan Caine, não importa o quanto ele me queira, seguir o vampiro vinha primeiro. Descobrir quem era o seu chefe Elemental do Ar vinha primeiro. Vingar Fletcher vinha primeiro. Eu suspirei. — Desculpe detetive. O dever me chama. — Eu sei — Donovan disse em uma voz rouca. — Eu posso sentir seu telefone vibrar contra a minha coxa. Nossos olhares se trancaram. Desejo ainda iluminou os olhos do detetive, juntamente com algo mais – alívio. Fiquei imaginando as emoções. Alívio sobre o que? Que ele não trairia seu parceiro morto por me foder? Que sua moral permaneceria intacta por mais uma noite? Ou que ele não iria descobrir como seria bom entre nós e ansiar por mais? Meu telefone continuou vibrando. Eu escorreguei do abraço do detetive, tirei o celular do bolso do meu jeans e abri. — O que é, Finn? — Carlyle acabou de entrar pela porta da frente, caso você esteja se perguntando — Finn disse com uma voz sarcástica. — Ou você preferia manter-se arqueando o bom detetive? Meu olhar cortou a frente do clube. Levou alguns segundos para reconhecer Charles Carlyle, também conhecido com Chuckie C., do resto da multidão. Mas uma vez que eu fiz, foi muito fácil segui-lo. O vampiro pequeno e atarracado ostentava um terno preto, com amplas riscas brancas e asas na extremidade. As luzes negras espalhadas por todo o clube fez as riscas e os sapatos arder em um brilho fluorescente. Melhor que GPS. Um chapéu negro cobria a careca de Carlyle. Ele também tinha outros dois acessórios – uma garota em cada braço. As mulheres ostentavam um colar de runa de arco e flecha dos trabalhadores do clube. Chuckie C. estava começando a guiar para fora mais cedo.
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Carlyle foi direto para o gigante guardando a entrada para as salas privadas Vips. Carlyle disse alguma coisa para o gigante. Depois de um momento, o homem mais alto se afastou e Carlyle e as garotas entraram no corredor. — Onde você está? — perguntei a Finn. — De costas passado pela entrada VIP em uma cabine com Roslyn. Eu vi os dois, tão próximos como eu e Donovan Caine tínhamos estado um minuto atrás. — Fiquei aí. Nós vamos até você. Fechei o telefone e me virei para o detetive. — Carlyle está aqui. Vamos.
Deixamos o bar e deslizamos por entre a multidão até chegar a Roslyn e Finn. Uma das mãos da vampira estava fora embaixo da mesa. A julgar pelo sorriso no rosto de Finn, Roslyn estava afagando mais do que o ego dele. À visão do detetive e eu, a vampira se levantou e alisou a saia. Roslyn olhou para a fruta de lantejoulas brilhando em minha camiseta preta. — Cerejas. Fofo — ela disse. Eu sorri. — Siga-me — Roslyn se dirigiu para uma porta em uma parede bem para trás do clube. Donovan Caine caiu no passo atrás dela. — Fique aqui fora e mantenha os olhos nas coisas — eu disse a Finn. — Carlyle pode ter amigos vindo se juntar a ele. — Sem problemas. Estou me sentindo um pouco sedento de qualquer forma — Finn piscou, ficou de pé e saiu andando em direção ao bar. Encontrei-me com Roslyn assim que a vampira abriu a porta para o conjunto de veludo vermelho que cobria as paredes. A abertura levava a um pequeno corredor que se estendia em ambas as direções antes de ramificar para fora em ambas às extremidades. Roslyn fechou a porta atrás de nós, diminuindo a batida da música.
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— Esse é o caminho — ela disse e virou à esquerda. Nós a seguimos pelo corredor. Uma variedade de quartos de ambos os lados do salão. Escritórios com computadores e impressoras, banheiros privativos para os funcionários, uma sala de descanso com máquinas automáticas e linhas de armários de metal. O lado comercial da boate. As paredes estavam cobertas com um veludo preto em vez de vermelho. E combinava com o tapete sob os pés. Roslyn fez várias voltas mais, levando-nos mais profundo nessa toca de coelhos. Cada corredor estava um pouco mais estreito do que o anterior, até o final que chegamos que era apenas largo o suficiente para que uma pessoa percorresse confortavelmente. Esta passagem era construída com painéis escuros em vez de veludos. Ladeada por uma variedade de fendas estreitas, de ambos os lados ao nível dos olhos. Cada uma tinha uma maçaneta do lado, então você podia abrir e fechá-la. Lembrou-me de algo que você gostaria de encontrar na porta de um antiquado speakeasy42. Roslyn parou na entrada do corredor e nos fixou com um olhar insípido. — Carlyle está na terceira sala à direita. Vocês têm trinta minutos antes de eu enviar um dos seguranças para checar as meninas. Tenham ido embora até lá. Eu dei a ela um aceno brusco. A vampira me olhou um segundo antes de virar em suas botas altas e seguir de volta pelo caminho que veio. — Vamos lá — eu disse em uma voz baixa. — Vamos ver o que nosso amigo Chuckie C. está fazendo. Donovan contou as portas e nós paramos em frente à da fenda apropriada. O detetive me olhou. Eu assenti e ele agarrou a maçaneta e lentamente, silenciosamente, deslizou o painel para o outro lado. A abertura retesou horizontalmente cerca de dois pés, mas era apenas mais alto do que um olho. Havia espaço suficiente para nós dois olharmos dentro. Donovan Caine e eu colocamos nossos olhos perto da abertura. A fenda revelou uma sala pequena com um sofá de pelúcia de um lado, juntamente com uma mesa redonda e algumas cadeiras. Os topos de diversas garrafas de bebidas estavam em uma prateleira logo abaixo de nós. Um bar estava contra essa parede que escondia um olho mágico. Uma bola de espelhos girava para cima, espirrando luz prateada em toda a parte.
42
Speakeasy: Um lugar para venda e consumo de álcool, durante a Proibição nos EUA.
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Charles Carlyle não tinha perdido nenhum tempo. Uma das meninas já tinha a cabeça enterrada na virilha do vampiro. Ele tinha a mão na saia da outra e sua língua na garganta dela. Barulhos de beijos e chupadas flutuaram até nós, junto com alguns gemidos das senhoritas. As garotas eram profissionais. Se eu não soubesse melhor, eu poderia ter pensado que elas estavam realmente se divertindo. Donovan Caine mudou ao meu lado, sem dúvida pensando sobre o que tinha acontecido entre nós no bar. Uma vergonha, realmente, que tínhamos sido interrompidos. A cena durou por talvez mais três minutos antes de Carlyle gozar. A prostituta que estava de joelhos limpou a boca, arrastou-se e se juntou a outra no sofá ao lado e Chuckie C. Ambas murmuraram bobagens sobre o quão, quão grande homem ele era e como elas só fingiam com outros caras, mas com ele, o prazer delas foi real. Meus lábios tremeram. A maldita coisa mais engraçada que eu tinha ouvido a noite toda. Carlyle acariciou as duas garotas por mais um momento, então as espalmou no traseiro – duro – e levantou as calças dele. — Sumam garotas — ele disse. — Eu tenho companhia vindo. Companhia? Isso soava promissor. Carlyle jogou um par de notas de cem dólares para as meninas, que elas dobraram e empurraram em seus sutiãs, antes de soprar-lhe beijos e saírem da sala. Chuckie C. soltou um suspiro de um homem satisfeito, então ficou em pé e puxou subitamente suas calças para a posição correta. Eu espero que o filho da puta tenha apreciado aquele boquete. Ia ser o último que ele iria ter. O vampiro foi em direção à parede onde Donovan Caine e eu estávamos e fiquei espreitando-o. Por um momento, pensei que talvez o vampiro atarracado tivesse nos espiado espiando-o. Mas ele pegou uma garrafa e despejou um pouco de uísque em um copo quadrado. Obtendo uma bebida. Ele estava tão perto de nós que eu poderia ter furado o olho mágico com uma de minhas facas e dado a ele um barbeado. Esse momento chegaria em breve. Carlyle tinha acabado de bater de volta seu primeiro gole de uísque, quando a porta do outro lado da sala abriu e um homem entrou. Carlyle bloqueou minha visão, mas eu ainda podia ver que o outro cara era um gigante, com um cabelo grisalho e uma estrutura volumosa que estava lentamente indo à gordura. — Aqui o tempo que você conseguiu — Carlyle disse. — Desculpe — o gigante replicou. — Alguns de nós tem estado ocupados. Donovan Caine enrijeceu ao meu lado. Porque o barítono profundo do segundo homem pertencia a seu chefe – capitão de polícia Wayne Stephenson. — O que você quer beber? — Carlyle perguntou.
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— Uísque e muito dele. Carlyle fez mais um par de bebidas. Stephenson pegou um lugar na mesa e Carlyle entregou-lhe um dos copos e colocou a garrafa sobre a mesa. Stephenson bateu de volta o líquido âmbar como se fosse água e serviu-se de outro. Demorava muito para ter um gigante bêbado. Anões também. Humanos e vampiros eram os únicos que não conseguiam segurar sua bebida. — Eu disse a você no telefone, que o encontro era uma má ideia — Stephenson murmurou e bebeu seu segundo drinque. — Todo mundo está rastejando pelo meu traseiro sobre o assassinato de Giles. Você sabia que o filho da puta era um amigo pessoal do prefeito? Seu colega de quarto na faculdade ou alguma merda desse tipo. O pomposo idiota me ligou duas vezes hoje. Carlyle sentou-se em frente ao gigante. — E eu lhe disse que ela queria uma atualização. Em pessoa. Os olhos pálidos de Stephenson esvoaçaram em direção à porta. — Ela não está vindo aqui, está? É ruim o suficiente eu correr o risco de ser visto com você. Se ela entrar pela porta... — Não se preocupe — Carlyle disse. — Esse lugar é totalmente anônimo. Ninguém se importa com o que você faz, ou com quem você faz isso, contanto que você não pule fora da sua conta. Quanto à Elemental, ela tinha outro peixe para esfolar hoje à noite e me enviou em seu lugar. Então, a sua pele vai ficar exatamente onde está... Por agora. Stephenson extraiu um lenço branco para fora do bolso de seu terno e enxugou a testa com ele. Eu podia sentir o cheiro de seu alívio por toda a extensão da sala. — Eu desejo nunca ter me envolvido nessa confusão. — Você não estaria nessa confusão se não tivesse fodido com todas aquelas meninas de dez anos de idade do time de futebol da sua filha. O tom de Carlyle era leve, de conversação, como se estivesse falando sobre se é possível que chova amanhã. Donovan Caine soltou um rosnado baixo, gutural. O som que um lobo pode fazer antes de rasgar sua garganta. Suas mãos cerraram em punhos e eu ouvi os dentes se chocar com a mandíbula apertada. Então Stephenson era um pedófilo. Teria
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sido fácil para a Elemental de Ar colocar seus ganchos nele. Tudo o que ela precisaria seria uma foto, apenas uma e o capitão da polícia teria sido dela. — E a assassina? — Carlyle perguntou. — Alguma coisa sobre ela? Stephenson bufou e serviu-se do terceiro drinque. — A puta é um caralho de fantasma. Nenhuns dos meus informantes sabem quem ela é ou o que ela parece. E nenhuma das dicas que temos obtido tem valido uma maldita pena, estou começando a pensar que aquele esboço que o Caine nos deu era uma besteira total. Eu acho que ela se foi. Fora da cidade e fora da foto. Carlyle digeriu a informação. — E sobre o filho do velho? O banqueiro? Stephenson deu de ombros. — Finnegan Lane disse a seu banco que estava tirando umas férias porque ele estava com o coração muito doente sobre o assassinato de seu pai. Imagino que ele está em uma ilha em algum lugar por aí. — E Caine? O detetive já apareceu? Stephenson enxugou mais suor na testa. — Não, não consigo encontrar o filho da puta em nenhum lugar. Ele não era estúpido o suficiente para voltar para sua casa. Ele não reportou ao trabalho e nenhum de seus amigos o tem visto. Ele tem que estar ainda em Ashland, no entanto. Ele não tem os recursos para desaparecer como o Lane tem. Carlyle se inclinou para frente e furou o gigante com um olhar fixo, duro. — Você precisa encontrar o detetive. Caine é uma ponta solta que precisa ser cortada antes que ele comece a desvendar as coisas. A Elemental quer que você o encontre. Dez minutos atrás mostrei-lhe o retrato do velho na churrascaria. Você sabe o que acontece quando ela não consegue do seu jeito. Stephenson atirou para trás outro drinque. Um pouco do líquido da coragem deve ter finalmente entrado, porque ele olhou de volta para o vampiro. — Eu liguei para Caine, como você queria. Se a sua equipe tivesse feito seu trabalho e o segurado até que a Elemental chegasse lá, nós não estaríamos nos perguntando onde o
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detetive está e o que ele está tramando. E eu não estaria me perguntando quando a sua chefa vai me matar. Ela matará você também, você sabe. Assim que ela achar que não precisa mais de você. A cadela é louca. Ela realmente acha que ninguém vai notar o que ela está fazendo? Todos os espertalhões que ela está contratando? O fato de que ela está formando a sua própria horda para assumir a organização Mab Monroe? E que ela está usando o dinheiro da própria empresa da Mab para fazer isso? — Ninguém percebeu o desfalque ou qualquer outra coisa, até que Gordon começou a cavar — Carlyle replicou. Meus olhos se estreitaram. Então era isso que se tratava. A Elemental de Ar vinha roubando dinheiro das Indústrias Halo para tentar tomar o controle da cidade longe de Mab Monroe. Para construir uma equipe e financiar a guerra contra a Elemental de Fogo. Gordon Giles teve conhecimento sobre o desfalque e ia soprar o apito sobre ela para a polícia. É por isso que ele teve que morrer. A Elemental de Ar não podia permitir que Mab farejasse seus planos, não antes que ela estivesse pronta para fazer seu movimento. Mas desde que matar Giles definitivamente teria chamado atenção indesejada para si de Mab para as Indústrias Halo, a Elemental de Ar me contratou para fazer a queda – para vir e ser convenientemente a assassina para a morte de Giles. Mas Stephenson estava certo. A vadia era realmente louca se achava que poderia tomar o controle da cidade longe de Mab Monroe. Porque antes da Elemental de Ar poder sequer chegar a Mab, ela teria que tirar seus servos primeiro. O advogado, Jonah McAllister, poderia não apresentar muito problema, embora ele tivesse seus próprios guardas. Mas o gigante reforço de Mab, Elliot Slater, ele seria uma erva daninha difícil de cortar. E então havia Mab, a tarefa mais difícil de todas. Davi teve uma chance melhor contra Golias do que a Elemental de Ar tinha de bater em Mab Monroe. Mas a revelação me disse mais outra coisa – a Elemental de Ar quase certamente tinha de ser Haley ou Alexis James. Ninguém mais era suficientemente elevada na companhia pra gerenciar algo assim. Carlyle iria me contar mais tarde exatamente qual das irmãs era – não importa o quanto sangue eu tinha que pegar no processo. Em vez de discutir mais com o gigante, Carlyle sentou-se em seu assento. Ele passou o dedo ao redor da borda do copo, então deu a Stephenson um olhar astuto. Considerando algo. — Talvez você e eu pudéssemos chegar a um acordo — Carlyle disse em um tom suave. — Uma vez que você parece estar um pouco cansado de trabalhar para a Elemental. Stephenson olhou para ele. — Que tipo de acordo?
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— Ambos concordamos que é apenas uma questão de tempo antes que a Elemental imploda — Carlyle disse. — Quem vai dizer que depois disso acontecer, você e eu não podemos pegar os pedaços? — O que exatamente você está propondo? Carlyle encolheu os ombros. — Nada agora. Exceto que você tome cuidado para mim e eu tomarei cuidado para você até que as coisas se acalmem. Depois disso, bem, vamos apenas ver o que acontece. — E quanto a Elemental? — medo arrastou de volta para a voz do gigante. — Se ela sequer pensar que nós estamos tramando... — Não se preocupe com a Elemental — um sorriso afetado preencheu o rosto paralisado de Carlyle. — Eu tenho um pouco de política segura para mantê-la na linha. Política segura? Havia apenas uma coisa que Carlyle poderia ter que a Elemental queria – o pen drive secreto de Gordon Giles com todos os atos sujos dela nisso. O vampiro ia ser mais útil do que eu tinha antecipado. Stephenson não respondeu à oferta do outro homem. Mas eu pude ver a esperança desesperada nos olhos dele. O capitão da polícia faria qualquer coisa para sair de baixo do dedão da Elemental, até cair na cama com um vagabundo como Carlyle. Ele não percebeu que o vampiro o trataria exatamente do mesmo jeito, no final. — Apenas pense nisso — Carlyle disse. — Mas não por muito tempo. Ele terminou seu drinque e sacudiu a cabeça em direção à porta. — Agora saia. Eu tenho outras coisas para fazer hoje à noite antes de ver a Elemental de novo. Stephenson não precisou ser dito duas vezes. O gigante limpou mais um pouco de suor na testa, se levantou e caminhou para fora da porta. Carlyle esperou alguns instantes antes de colocar a garrafa de bebida de volta no bar e espalmar seu chapéu no topo da cabeça. Ele estava saindo também. Ao meu lado, Donovan Caine se afastou do olho mágico. Eu fiz o mesmo e puxei a maçaneta, cobrindo a fenda. — Aquele bastardo — Caine murmurou em uma voz baixa. — Aquele bastardo filho da puta me expôs — o detetive começou a mudar me passando pelo corredor, mas eu agarrei o braço dele.
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— Não — eu disse. — Nós não estamos aqui pelo seu chefe. Nós vemos o que Carlyle tem a dizer primeiro, então, você pode ir atrás de Stephenson. Esse era nosso acordo, lembra? — a raiva fervia nos olhos de Caine e os músculos em seu braço endureceram sob a minha mão. — Você pega Stephenson — eu repeti. — Você pode lidar com ele do jeito que preferir, mas não hoje à noite. Carlyle está saindo. Nós temos que agarrá-lo. Estou cansada de correr por aí e me esconder nas sombras, detetive. Eu quero a porra de um nome. E Carlyle pode me dar isso. Agora, você está vindo comigo? Ou eu derrubo você e deixo aqui para o gigante de Roslyn te encontrar? Depois de um momento, Caine soltou um suspiro tenso. — Tudo bem. Vamos fazer do seu jeito. Eu assenti. — Bom. Vamos pegar o desgraçado antes que ele parta.
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Capítulo 21 Quando voltamos ao piso principal, eu peguei meu celular e liguei para Finn. — Sim? — disse ele sobre o barulho. — Carlyle está saindo — eu disse. — Eu sei — respondeu Finn. — Stephenson já saiu pela porta da frente. Chuckie C. está tratando da conta da noite com o gigante ao lado da entrada VIP. Parece estar discutindo sobre o preço de alguma coisa. Enquanto vocês dois estavam à escuta, eu tomei a liberdade de sair andando até ao estacionamento para ver se conseguia encontrar o carro do vampiro. Carlyle está dirigindo um doce pequeno BMW vermelho que está estacionado no lado oeste do edifício. Três lugares de distância do nosso carro. Um sorriso duro curvou meus lábios. — Perfeito. O mantenha a vista. O detetive e eu estamos indo para o Beamer 43. Ambos desligamos. Eu teci o meu caminho através da multidão, deslizando de abertura em abertura. Donovan Caine estava mesmo sobre os meus calcanhares. Demorou quase um minuto para que conseguíssemos sair da Agressão do Norte. O ar da noite foi um beijo frio e bem-vindo no meu rosto depois dos aglomerados de corpos no interior da discoteca. — Por aqui — eu disse. O detetive andou ao meu lado. Ele havia abafado a sua ira inicial sobre Stephenson, embora a sua boca estivesse apertada em uma linha dura e determinada. Ele estendeu o braço para as costas, sacou a arma da zona baixa das costas e segurou-a ao seu lado virada para baixo. — Como quer fazer isto? 43
Nome usado para se referir aos automóveis da marca BMW.
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— Não há necessidade de uma arma ainda, detetive. Você e Finn ficam atrás — eu respondi. — Eu vou abordar Carlyle e dominá-lo. Dessa forma, ele apenas vê a mim caso algo desagradável aconteça. Donovan assentiu. — Tudo bem. O BMW estava estacionado exatamente onde Finn disse que estaria. Difícil não notálo, realmente, uma vez que a placa da vaidade na frente dizia CHUCKEC. Donovan abaixou-se nas sombras atrás de um carro a alguns metros de distância. Eu deslizei por trás de um SUV do outro lado do BMW e olhei através da janela do lado do motorista. Estava se aproximando a meia-noite agora e o ar tinha assumido o frio acentuado da descida de temperatura. A música do clube pulsava fora e eu podia ouvir as vibrações sussurrando no concreto sob as minhas botas. Clássicos murmúrios de sexo, drogas e rock and roll. Alguns fumantes estavam agrupados a cerca de duzentos metros de distância, fumando sabe-se lá o quê. Mas, além disso, o estacionamento estava deserto. Todo mundo ainda estava lá dentro, dançando pela noite a fora. Eu coloquei uma das minhas facas na minha palma, com o cabo para fora e comecei há contar os segundos na minha cabeça. Dez... Vinte... Quarenta e cinco... Dois minutos depois, Charles Carlyle passou andando pelo lado do edifício. Ele andava com passos rápidos, com propósito. O passo confiante de um homem que pensa que tem tudo planejado. Que o mundo era seu para governar. Ainda assim, ele lançou um olhar rápido em volta, da maneira que qualquer um faria se estivesse andando por uma área escura à noite. Mas ele não me viu. Eles nunca o faziam, até que era tarde demais. Eu sorri. Pobre Chuck. Eu quase senti pena dele. Até que eu pensei em Fletcher. Eu olhei, mas não vi Finn atrás do vampiro. Finn também conseguia se misturar com as sombras, quando ele queria. Carlyle se aproximou, passando o carro onde Donovan Caine estava agachado. O vampiro assobiou uma melodia suave e tilintou as chaves do carro em seus dedos. Ele apertou um botão e as luzes do BMW piscaram uma vez, desativando o alarme e destravando as portas. Era tempo de eu entrar em ação. Eu saí da parte traseira do SUV em ponta dos pés e me aproximei de Carlyle. O vampiro tinha acabado de enrolar os dedos embaixo da maçaneta da porta para abri-la quando eu o chamei. — Desculpe-me, doce — eu disse com voz arrastada. — Você tem um isqueiro? Parece que eu perdi o meu. Não é possível pôr uma maldita coisa nos bolsos desta minissaia.
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Carlyle se voltou para o som da minha voz, um sorriso já se formando em seu rosto. Apressei os meus passos, ficando em posição. Eu não me parecia com o que ele esperava que eu parecesse e ele franziu a testa, de repente suspeitando. — Quem diabos é... Eu poderia ter estado preocupada, se eu não tivesse já usado o cabo da faca para o pôr inconsciente. O vampiro piscou uma vez antes de revirar os olhos para a parte de trás da cabeça e cair de cara no concreto. À minha direita, Donovan Caine saiu das sombras. Finn apareceu à minha esquerda. — Vamos — inclinei-me e agarrei o vampiro por baixo dos seus braços. — Ajudemme a levar este bastardo sugador de sangue para a mala do carro. Uma hora mais tarde, eu joguei um jarro de água gelada no rosto de Charles Carlyle. O choque do frio fez o vampiro voltar à consciência. Como também fizeram as duas duras bofetadas que eu dei em seu rosto. A ferroada na minha mão foi boa. Finalmente, eu estava fazendo algo sobre o assassinato de Fletcher, tomando a iniciativa, em vez de reagir a outros. — Hora de acordar, Chuck — eu disse. — Hora de acordar, brilhar e cuspir seus segredos. Os olhos do vampiro piscaram várias vezes em sucessão rápida antes de se focarem em mim e nos seus arredores. Depois de carregarmos Chuck para o porta-malas do nosso carro roubado, tínhamos dirigido para a casa do vampiro em um dos subúrbios do limite de North Town, o endereço que Finn tinha encontrado ao escavar procurando informações. Lugar agradável. Casa de fazenda de tetos altos, grande jardim, piscina na traseira. Ser um vice-presidente executivo nas Indústrias Halo, mesmo só no nome, paga melhor do que eu pensava. Tal como ser o braço direito da Elemental do Ar. Finn, Donovan e eu tínhamos entrado na casa e arrastado Carlyle conosco. Agora estávamos os três no que se parecia com uma sala de jogos – televisão de plasma fixada a uma parede, mesa de bilhar no canto, pilhas de revistas pornográficas e garrafas de cerveja vazias em todo o lado. A única coisa boa sobre a sala era a lareira de pedra que ocupava a parede de fundo. Donovan Caine tinha usado suas algemas de Silverstone para prender o vampiro a uma cadeira, que eu tinha arrastado para o meio da sala. Os olhos de Carlyle vieram para mim, depois para os dois homens aproximando-se por trás de mim e depois para a faca de Silverstone na minha mão. — Fode-me — ele murmurou.
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— Rápido no gatilho44. Eu gosto disso em um homem. Eu senti os olhos de Donovan em mim, mas eu não me virei para olhar o inflexível detetive. Em vez disso, eu vaguei pela sala, girando com a minha faca de modo que a lâmina refletia a luz e a dirigia de volta para os olhos de Carlyle. Hora de começar a jogar. — Ótimo lugar que tens aqui, Chuck. Muito bom. Escolheste-o sozinho? Ou foi a Elemental do Ar? O vampiro deu-me um olhar guardado. — O que quer? Eu sorri e sustentei o seu olhar até que eu tinha certeza de que ele tinha percebido o quão frio e duro os meus olhos cinzentos eram. Carlyle podia se considerar um grande homem, mas ele sabia quando estava superado. Seu rosto já tinha apertado com pânico e os músculos dos seus braços e ombros tencionaram sob seu terno enquanto ele discretamente testava as algemas de Silverstone que o prendiam. O bastardo não deveria ter se incomodado. Ele não estava indo para lugar nenhum hoje à noite, exceto o solo. — No caso de não ter percebido, Chuck, deixa-me dizer quem eu sou. A Aranha. A assassina que você e a sua chefe contrataram para matar Gordon Giles e que depois decidiram trair. Eu tenho certeza que reconheces os meus dois companheiros. Finn deu-lhe um sorriso cheio de dentes que era quase tão assustador como o meu sorriso. O vampiro percebeu que não haveria simpatia lá e voltou a sua atenção para Donovan Caine, tentando ver se tinha algum tipo de amigo na sala. Mas o detetive cruzou os braços sobre o peito e colocou o seu rosto de polícia inexpressivo. — Tem andado ocupado, Chuck. Trabalhar para a Elemental do Ar, me incriminar, mandar os seus homens para raptarem e baterem em Finn e depois fazer o mesmo com o detetive. E eu realmente não havia entendido o por quê até que eu te ouvi hoje à noite na Agressão do Norte falando com Stephenson — eu estalei a língua. — Ele está certo, sabe. A cadela é louca se ela acha que vai destronar Mab Monroe como rainha de Ashland — Carlyle não disse nada, mas concordância brilhou em seus olhos. — Mas você já sabe disso não é Chuck? Você sabe que isto não vai acabar bem para ela e já tomou medidas para se proteger. Os olhos do vampiro se estreitaram. Ele havia superado o suficiente do seu pânico inicial para perceber que eu não ia matá-lo – imediatamente. 44
Expressão com o sentido de ser rápido e direto.
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— O que quer? — ele perguntou de novo em uma voz mais forte. Eu coloquei minhas mãos em cada lado dele e me inclinei até que meus olhos frios estavam ao mesmo nível dos dele. — O pendrive. Eu quero o pendrive. O que Gordon Giles fez que contém informações sobre o desfalque das Indústrias Halo. O que a sua chefe Elemental do Ar está tão ansiosa para ter nas mãos. Essa é a sua apólice de seguro, não é Chuck? A Elemental fica muito maluca e tudo o que tem que fazer é enviar as informações para Mab Monroe. E ela vai cuidar da Elemental para você. Carlyle não respondeu, mas a contração na sua bochecha foi toda a confirmação que eu precisava. O vampiro realmente precisava trabalhar em sua cara de poker. — Ele tem o pendrive? — Donovan Caine perguntou atrás de mim. — Tem certeza? — Oh, eu tenho certeza — respondi, sem tirar os olhos do vampiro. — Me diz onde está, Chuck. Agora. Os olhos de Carlyle esvoaçaram para a esquerda, como se procurando uma mentira aceitável. A sua língua arremessou para fora para molhar os lábios. — Digamos que está certa. Digamos que eu... Encontrei o pendrive entre as coisas de Gordon quando eu estava procurando nelas para a Elemental. O que eu ganho se eu te der? — Você morre rapidamente, Chuck, em vez de ser torturado. Isso é tudo o que ganha. Ele bufou baixo. — Não há muita coisa para mim, então. Eu encolhi os ombros. — Depende do quanto gostas de dor. Eu me afastei e trouxe a ponta da minha faca para onde ele a podia ver. Depois eu me inclinei para frente novamente e deslizei a lâmina pelo seu rosto, não o suficientemente profundo para rasgar a pele, mas o suficiente para que ele sentisse o metal frio. Carlyle soltou uma risada suave.
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— Você não tem bolas para... Eu o cortei. Gravei uma linha desde um lado do queixo, pelo pescoço e até ao outro lado do queixo. A lâmina não cortou a sua artéria carótida, mas a faca entrou fundo o suficiente para que ele realmente a sentisse. Sangue escorreu da ferida e caiu como lágrimas vermelhas no terno listrado do vampiro. Eu tinha acabado de aumentar a aposta neste jogo de poker que estávamos jogando. Mas Carlyle me surpreendeu. Ele não começou a implorar ou suplicar ou chorar por misericórdia. Em vez disso, o vampiro reprimiu um grito, as suas presas amareladas brotando através dos seus lábios, antes que os seus olhos fossem para a esquerda novamente. Eu franzi o cenho, me perguntando por que ele estava olhando para o lado, em vez de para mim ou para a faca. Eu não era assustadora o suficiente para ele? Poucas coisas podiam ser mais importantes no momento para o vampiro do que a lâmina que eu tinha acabado de cavar em seu pescoço. Muito poucas. Por isso eu me virei e segui sua linha de visão até a lareira. Humm. Eu usei a calça do vampiro para limpar o sangue da minha faca e me afastei dele. Alívio brilhou nos olhos de Carlyle. — Foda-se — Donovan murmurou, olhando para o sangue no peito do vampiro. — Tinha que cortá-lo tão profundamente? Eu pensava que queria respostas dele, não sangue. — Eu mal o cortei. Ele vai viver. Olha por ele um minuto — eu disse ao detetive. Caine olhou para mim, depois sacudiu a cabeça e tomou uma posição na frente do vampiro. Finn me seguiu para a lareira. — O que estás fazendo, Gin? — ele perguntou em voz baixa. — Verificando um palpite. Eu esfreguei meus dedos contra a lareira de pedra. Atrás de mim, Carlyle assobiou com desagrado, mas eu o ignorei. Ouvindo. Tentando sentir qualquer perturbação, qualquer coisa fora do comum. Havia uma razão para Carlyle continuar olhando para aqui. Eu queria saber o que era. Mas as vibrações da pedra eram baixas e silenciosas. Como eu, o vampiro não estava em casa o suficiente para deixar muita impressão nela. Ainda assim, eu continuei a ouvir. E percebi que havia alguma coisa na pedra. Uma nota de satisfação manhosa. Antecipação. Orgulho. Avidez. Centrada na lareira e ondulando para fora. Ainda ouvindo a pedra, eu deslizei meus dedos sobre a parede e caminhei para perto do centro da lareira. Ela era lindamente construída, feita de lajes irregulares de pedra de rio azul e cinzas encaixadas para formar um elegante arco e depois a chaminé em si. A
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construção era tão perfeita, tão sem falhas, que poderia apenas ter sido feita com magia, por outro Elemental de Pedra. Apenas me levou alguns segundos para identificar a runa esculpida em um dos cantos inferiores. Dois pedaços de pedra lado a lado, com outro descansando em cima deles – uma runa de construtor. Eu prestei atenção nos fracos restos de magia na argamassa que segurava as pedras juntas. Pedras eram os Elementais mais raros e sempre me surpreendia encontrar outro, ver o seu trabalho, sentir o seu poder. Depois eu me concentrei, ouvindo a pedra, tentando encontrar a fonte exata das vibrações. E eu encontrei uma pedra que era um pouco mais clara, um pouco mais suave, do que as outras, como se alguém a tivesse tocado repetidamente, esfregando-a para boa sorte – ou para abrir e fechar um compartimento secreto. A pedra era lisa e fria sob meus dedos pesquisadores. Ali. Um pequeno botão metálico na parte inferior. Fiz pressão sobre ele. Algo clicou e a pedra abriu, revelando um espaço do tamanho de um cofre. — Encontrei algo — eu disse. — O quê? — Finn perguntou, tentando espreitar por cima do meu ombro. Olhei para dentro do espaço. Uma pasta azul gravada com as palavras Indústrias Halo repousava lá dentro, junto com um pequeno pendrive. Havia também algumas fotos de Gordon Giles nu, posando em várias posições íntimas com um monte de prostitutas, muitas das quais ostentavam o medalhão com a runa do coração e flecha da boate Agressão do Norte. Negras, brancas, hispânicas, humanas, vampiras. Eu folheei as fotos. Chicotes, couro, máscaras. Giles tinha sido um pouco mais sério sobre a sua predileção para prostitutas do que o arquivo de Fletcher tinha indicado. Eu virei uma das fotos para o lado. Mais flexível, também. — O que achou? — Donovan Caine perguntou. — O jackpot. Eu peguei o pendrive e o mostrei a Caine e Finn, em seguida, enfiei dentro do meu bolso do jeans. Passei a pasta para Finn, junto com as fotos de Giles. Finn folheou-as e soltou um assobio. — Gordon estava em algumas coisas bem hardcore. Dá uma olhada nisso, detetive. Donovan Caine virou as costas ao vampiro e andou na nossa direção. Atrás dele, algo brilhou nos olhos de Carlyle. Eu senti uma pequena centelha de magia vibrar no quarto. E foi aí que o vampiro fez a sua jogada.
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Capítulo 22 Metal. O vampiro devia ter um pequeno talento elementar para manipular metal. Aquela era a única forma de explicar o surgimento repentino de magia – e porque suas algemas prateadas estalaram para fora como se fossem brinquedos de plástico. Eu mesma as chequei. As correntes eram tão sólidas quanto minhas facas. Carlyle apoiou-se em seus pés. Donovan Caine viu o sinal tarde demais. Ele tinha acabado dar a volta para pegar sua arma quando Carlyle colocou ambas as mãos nas costas do detetive e o empurrou. Vampiros não eram tão fortes quanto gigantes e anões, mas Carlyle tinha mais que peso suficiente para levantar Donovan e enviá-lo voando através do quarto. Os braços balançantes do detetive bateram no peito do Finn. Finn caiu como um saco de batatas e começou a tossir com a força da pancada. Donovan Caine não parou até colidir com a pedra da lareira. Charles Carlyle mostrou suas presas para mim e correu para fora do quarto. — Fiquem aqui! — eu gritei, embora eu duvidasse que Finn ou Caine estivessem prestando atenção. — Eu vou pegá-lo! Sem tempo para verificar um ou outro homem. Eu saltei sobre Finn, o qual continuava tossindo e corri a toda velocidade pela casa. Na minha frente, os passos de Carlyle batiam no chão, seguidos pelo som da porta da frente estalando contra a parede. O filho da puta já estava lá fora. Droga. Eu não poderia deixá-lo fugir. A primeira coisa que Carlyle faria seria chamar a Elemental do Ar e contar a ela que Finn e eu estávamos na cidade – e trabalhando com Donovan Caine. Eu não queria que isso acontecesse. Não até eu saber exatamente o que estava naquele pen drive – e qual irmã James tinha a personalidade de uma cadela sádica e usuária de magia. Eu corri para fora, pulei os degraus, pousei no gramado e apressei-me para a rua. Minha cabeça virou de lá para cá e meus olhos escancearam tudo a vista. Iluminação pública, carros estacionados, árvores, sombras, outras casas no quarteirão. Sem sinal de Carlyle em lugar algum. Para onde ele foi?
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Havia apenas uma maneira para ter certeza. Eu caí de joelhos e coloquei minha mão livre contra a calçada de concreto. As pedras estavam frias e porosas sob meus dedos. O murmúrio delas sussurrou sobre o zumbido do trânsito, o cantarolar do cortador de grama, e o riso das crianças da vizinhança. Sons suburbanos típicos. Eu me concentrei, ouvindo mais, indo mais fundo, usando minha magia para analisar minuciosamente as vibrações. Lá. Uma nota fresca de pânico, começando aqui e correndo para a direita. Eu segurei minha faca com mais força e peguei o caminho. Continuei correndo na grama do lado direito da calçada, não querendo que o som das minhas botas no concreto chegasse aos ouvidos de Carlyle e alertasse o vampiro que eu ainda estava atrás dele. Deixe o bastardo pensar que me perdeu. Deixe-o ir mais devagar. Por que é quando eu o matarei. A rua se dividia em dois caminhos, com uma estrada continuando em linha reta à minha frente e a outra dando a volta para a esquerda e virando novamente para a direita. Ninguém estava à minha frente. Minha cabeça chicoteou em volta e eu vi um lampejo de luz antes que a escuridão a consumisse. Eu sorri. Essas riscas no terno de Carlyle eram melhores que luzes de estrada. Mas eu não corri rua abaixo atrás dele. Em vez disso, eu avancei em frente a toda velocidade, correndo a fim de passar por alguns arbustos picados de azevinho, passando por entre o quintal de alguém. Eu peguei meu caminho rapidamente, mas cuidadosamente, atravessando o gramado, não querendo tropeçar e quebrar meu tornozelo em algum brinquedo espalhado os quais haviam sido deixados no gramado. Casas próximas a duas lojas acima de cada lado meu, suas janelas escuras parecendo gigantes olhos negros rastreando meu progresso. Eu abaixei repentinamente para baixo do varal de roupas e saltei por cima de um baixo cercado dentro do quintal do próximo vizinho. Ganhando vantagem sobre o vampiro. Eu repeti o processo mais duas vezes, antes que a rua cinza lampejasse na minha frente. Mas ao invés de me apressar para a estrada, eu deslizei atrás de um grande quintal e espiei a área. Meu sangue rugiu em meus ouvidos e os sons da noite me lavaram. Um whippoor-will (pássaro americano) chorando na árvore. O vento perturbando a grama e fazendo o balanço da varanda gemer. Alguns insetos zumbindo apesar do frio que estabeleceu o panorama benigno. Smack-smack. Smack-smack. Os passos aumentaram à esquerda vindos em minha direção, movendo mais devagar que antes. Eu peguei minha outra faca e segui. Inúmeras estradas levaram a casa para baixo através do quintal e eu me agachei no lugar mais distante delas, deixando o concreto me
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esconder. Então eu levantei minha cabeça até que eu pudesse ver por cima da beira das estacas. Dez... Vinte... Quarenta e cinco... Os segundos deslizaram, um minuto depois, Charles Carlyle apareceu. Os vampiros podem ser fortes, mas o corpo abarrotado dele foi construído para pequenos custos de energia, não para uma corrida longa. Ele já estava sem fôlego. Graças aos postes de iluminação, eu pude ver o rubor no rosto dele, turvando suas bochechas. Bom. Homens cansados são mais fáceis de matar. A cada passo, o vampiro olhava por cima dos ombros, mas ele nunca olhou para a esquerda ou para direita ou escaneou as sombras à volta ou em frente a ele. Ele não estava me esperando vir de nenhuma outra direção. Descuidado, descuidado, descuidado. A próxima vez que o vampiro girou sua cabeça, eu disparei para frente. Uma cerca de 4 metros intrometia-se contra a rua e eu me abaixei atrás dela. O portão estava à minha direita. Alguém se esquecera de trancá-lo e a brisa da noite o empurrou ainda mais. Perfeito. O som dos passos do vampiro aumentava e eu caí na real de que Carlyle estava falando com ele mesmo em um tom suave. — Estúpida vadia estúpida — ele murmurou, passando pelo portão. — Pensava que ela iria me torturar. Hah. O velho Chuckie C. mostrou a ela quem era o chefe. Vadia estúpida... Minha primeira faca cortou sua perna, rompendo seu tendão, então o bastardo não poderia correr novamente. Carlyle tinha acabado de começar a gritar quando eu apareci de trás da cerca e usei minha outra faca para cortar sua garganta. Um espirro de sangue expeliu do profundo ferimento letal, inundado a mim e à cerca. Carlyle cambaleou para trás, sua perna ferida despencou e ele cambaleou para cima de um carro antes de escorregar e cair na calçada. Uma mão apertou sua perna. A outra tentou diminuir o sangue que jorrava do seu pescoço. Eu dei a volta na cerca e fiquei sobre ele, uma faca ensanguentada em cada mão. Os olhos do vampiro se arregalaram e ele tentou se arrastar. Mas ele já tinha perdido muito sangue. Carlyle tentou se arrastar antes que suas mãos molhadas escorregassem na ferida do seu pescoço. Sangue arterial revestiu a calçada como verniz negro. Eu usei a ponta da minha bota para virar o vampiro, então me agachei do lado dele. — Não diga que eu não mantive minha promessa, Chuck. Eu te disse que você morreria brevemente. O vampiro tentou murmurar alguma coisa para mim, mas o esforço foi demais para ele. O som extinguiu-se como vela e morreu. Poucos segundos depois, Carlyle fez o mesmo. Eu esperei até ter certeza de que ele estava morto, então me levantei. Meus olhos examinaram as casas circundantes, mas nenhuma luz foi acesa. Nenhuma cortina se contorceu. Ninguém abriu a porta da frente. Ninguém ouviu o vampiro morrer, mas eu
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ainda tinha que fazer algo com seu corpo. Meu olhar se voltou para a cerca, eu não achei que o dono apreciaria encontrar sangue respingado por toda ela pela manhã. Então eu puxei meu celular do bolso do meu jeans e apertei alguns números armazenados na discagem rápida. Chamou três vezes antes que ela atendesse. — Humpf? — Sophia Deveraux atendeu com sua saudação habitual. — É Gin — eu disse. — Boas notícias. Eu mudei de opinião sobre não precisar dos seus serviços. Em quanto tempo você consegue chegar acima do norte da cidade? Pela primeira vez, a sorte sorriu para mim. Sophia Deveraux estava na área e chegou cerca de 10 minutos depois, freando em seu Vintage conversível preto. Eu olhei o carro. Com seu corpo comprido, barbatanas, tronco enorme e interior caramelado, ele parecia mais um carro fúnebre do que um carro clássico, especialmente tarde da noite. Eu mostrei a anã gótica, o sangue na cerca e o arbusto para trás do qual arrastei o corpo de Charles Carlyle. — Você acha que pode limpar isso antes que algum dos vizinhos levante e veja você? — eu perguntei em voz baixa. — Ou eu preciso ficar e ajudar você com o corpo? Sophia grunhiu e me de deu um olhar penetrante. — Desculpe. Só pensei que precisava perguntar. Enquanto a anã voltava a trabalhar, eu corri de volta para a casa de Carlyle. A porta da frente ainda estava aberta. Entrei na casa, fechando-a silenciosamente atrás de mim e fui em direção à sala de jogos. — Por que ela ainda não voltou? — a voz áspera de Donovan Caine saiu no corredor e veio até mim. — Porque matar pessoas leva tempo, detetive — Finn respondeu. — Ela provavelmente teve que perseguir o bastardo alguns quarteirões antes de pegá-lo. — E se ele a pegou em vez disso? -— Donovan contrariou. — E se ele começou a cair em cima dela? E se ele a matou? Finn gargalhou. — Improvável. Gin tem dissecando sapos como Carlyle por anos. Por que a preocupação, detetive?
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Uma pausa. — Dane-se se eu sei. — Talvez isso tenha a ver com o fato de vocês dois estarem se agarrando na Agressão do Norte? Outra pausa. — Você viu aquilo? — Não fique embaraçado, detetive. Aqueles olhos, aqueles lábios, aquele corpo firme. Ela é uma gata. E Gin parece ter tido um tempo maravilhoso em seu colo. Mesmo pensando que eu não estava no quarto, eu podia imaginar o sorriso no rosto de Finn. Eu pausei, querendo ouvir a resposta do detetive. — Ela é... Algo — Donovan admitiu. — Mas eu fico feliz por ter parado onde parou. Uma terceira pausa, dessa vez de Finn. — Eu nunca te considerei um cara estúpido detetive, mas quando você diz coisas como essa você me faz repensar. Você está feliz por não ter transado com ela? — Ela é uma assassina e ela matou meu parceiro — Caine vociferou. — Você não transa com o assassino do seu parceiro. — Oh, desça do seu cavalo alto, detetive — Finn respondeu numa voz penetrante. — Cliff Ingles não era o santo que você o faz parecer. Ao contrário. E quanto a Gin ser uma assassina, bem, nós não vivemos realmente em Mayberry. Ela fez o que fez para se manter viva esses anos. Nós todos fazemos, inclusive você, eu imagino. — Eu nunca matei pessoas por dinheiro — Caine disse em um tom ácido. — Com certeza você matou detetive. Isso é chamado de acerto de contas na sua cidade. Ok, tempo de parar com isso antes que os dois homens explodam. Eu desci o corredor na ponta dos pés, abri a porta e a fechei novamente, forte o bastante para eles ouvirem. Eu fiz dos meus passos altos e pesados. — Finn? Donovan? — eu gritei.
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— Ainda no escritório — Finn respondeu. E entrei na sala. Finn inclinou-se na borda da mesa de bilhar, esfregando seu peito. Donovan Caine empoleirou-se na beira da lareira. Um par de cicatrizes decorava as mãos dele, assim como um machucado no lado de seu rosto, mas o detetive não parecia ter sido tão danificado por ter sido atirado pela parede de pedras. Provavelmente machucara o ego dele mais do que qualquer coisa. — E o corpo? — Finn perguntou. — Sendo cuidado pela nossa amiga gótica. Donovan olhou para mim, então para Finn. — E agora? — ele perguntou. Eu puxei o pendrive do meu bolso e o ergui. — Agora nós saímos daqui e vamos ver o que tem nisso e por que a Elemental do Ar quer tanto isso de volta.
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Capítulo 23 Usando todas as precauções de costume, nós deixamos a casa de Carlyle, descarregamos nosso carro roubado em um dos estacionamentos do centro e fomos para meu apartamento. Uma vez que estávamos dentro, Finn abriu seu laptop e plugou o pendrive. Donovan Caine caiu em uma cadeira na mesa da cozinha e folheou a pasta de correspondência que nós tínhamos encontrado no esconderijo da lareira. Eu peguei as fotos de Giles e analisei-as. Lesões, roupa sangrenta, dores, todo o resto foi esquecido exceto a informação que tínhamos encontrado. Finn estava certo. Gordon Giles tinha estado enroscado em algumas coisas bizarras. Folheando as imagens, eu vi muito mais do contador de meia idade do que eu sempre quis. Mas eu estudei cada imagem cuidadosamente. Com sorte haveria uma razão para Gordon Giles ter mantido essas fotos, para além de seu próprio prazer privado. Mas nada me esclareceu. Após cerca de dez minutos sem parar de clicar o mouse e de explosão ocasional de digitação, Finn deixou escapar um assobio baixo e se recostou em sua cadeira. — Você tem alguma coisa? — Donovan Caine perguntou. — Porque eu não posso fazer cara ou coroa do que está nessa pasta. São apenas números de contas e nomes de arquivos e outros rabiscos que não fazem nenhum sentido para mim. — Eu não sou um contador forense e eu estou geralmente mais interessado em esconder dinheiro do que segui-lo, mas parece que Haley James tem tirado dinheiro de sua própria empresa — Finn disse. Não era uma surpresa, mas era uma confirmação bem vinda ao invés de meras especulações. — Você tem certeza que é ela? — eu perguntei.
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Finn assentiu. — Se não, alguém está colocando as culpas nela de forma impressionante, porque a senha dela e as informações do login estão por todo o lugar nesses arquivos. Não exatamente o tipo de informação que você dá para qualquer pessoa, especialmente quando você é a cabeça de uma companhia tão grande quanto as Indústrias Halo. — O que você quer dizer com tirando dinheiro? — Donovan perguntou. — Como ela está fazendo isso exatamente? Finn encolheu os ombros. — O costume de desviar. Encher de despesas. Obter reembolso de viagens de negócios que ela nunca fez. Desviar o fluxo de caixa da empresa para contas offshore. Um par de centenas de milhares de dólares aqui, mais um pouco lá, você ficaria surpreso com o quão rápido isso acrescenta. Eu fiz uma careta, pensando no cuidado que tinha sido posto em toda essa operação, para enquadrar-me a assumir a culpa pelo assassinato de Giles. — Isso soa muito fácil, muito óbvio, muito relaxado. Finn encolheu os ombros novamente. — Tenha em mente que eu tenho olhado para esses arquivos por poucos minutos. Uma empresa tão grande quanto a Halo geraria centenas, se não milhares, de arquivos a cada dia. É provavelmente uma operação muito delicada, mas nós temos o exato, arquivos específicos que você precisa para colocá-lo todos juntos. — Por isso é que Gordon Giles passou meses coletando informação — Donovan Caine disse. — Que é por isso também que ele ia ser a testemunha estrela do estado. Porque ele podia entender como o dinheiro estava sendo desviado e explicar onde exatamente estava indo. — Os arquivos mostram onde o dinheiro estava indo? — eu perguntei. — Para quê estava sendo usado? Finn clicou mais algumas vezes. — Parece que Haley James tem contratado vários novos vice-presidentes executivos nos últimos meses. Parte disso foi para pagar seus salários e, eu uso essa palavra livremente.
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— Sua tripulação, em outras palavras — Donovan Caine opinou. — Os homens que ela pensou que estavam indo ajudá-la a pegar Mab Monroe. — Também tenho aqui vários pagamentos feitos para Carla Stephenson — Finn acrescentou. — Parecem dez pagamentos de dez mil dólares cada. Cem mil, no total. O rosto de Donovan se contraiu. — Carla? É a filha de Wayne Stephenson. Ela tem dez anos. — Provavelmente não é uma doação ao seu fundo de faculdade, apesar de que é o que está listado aqui — Finn disse. — Esperto ele, colocando no nome dela. É por isso que isso não veio imediatamente quando eu corri suas finanças mais cedo. — Continue cavando — eu disse. — Eu quero saber tudo o que há para saber sobre este esquema. Nós voltamos ao trabalho. Finn surfou os arquivos. Donovan olhou de soslaio para as letras pequenas na pasta. E eu peguei a pilha de fotos pornô de Gordon Giles. Felizmente e, para minha ligeira surpresa, nem todas as fotos eram de Giles fazendo com prostitutas vampiras cada maneira que ele sabia. Havia uma foto de uma mulher mais velha que eu assumi que era sua mãe e várias mais de Giles em diferentes locais segurando um peixe e sorrindo para a câmera. Embora fossem de um tipo diferente do que as imagens anteriores, elas ainda eram lembranças, pequenos tesouros que o contador queria manter. Giles tinha provavelmente os colocado todos juntos então ele poderia agarrá-los no momento em que Caine o colocou na proteção de testemunhas. E, então, Charles Carlyle tinha tropeçado com eles e os escondeu em sua lareira. Dada à quantidade de pornografia que eu tinha visto na sala de jogos vampiros, eu não tinha que adivinhar por que as fotos das prostitutas estavam no topo – e coberto com impressões digitais e outras manchas gordurosas. Eu estava quase no final da pilha quando me deparei com uma foto que não coincidia completamente com as outras. Por um lado, não havia nenhuma prostituta nela. Por outro, era estrelada por uma pessoa muito diferente da mãe morta de Giles. Alexis James. Na foto, Alexis James vestia bermuda preta, uma camisa branca sob medida e um chapéu de palha chato. Ela estava ao lado de uma espécie de tubarão cinza que ela furou com a arma na mão. A pobre criatura se pendurou de cabeça para baixo, seu lado aberto com uma fenda, tripas de fora para que todos vissem. O sangue do tubarão transformou a
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doca para um marrom malhado, mas Alexis estava ocupada demais sorrindo para câmera para notar isso. Que classe. Gordon Giles estava ao lado. Ele estava sorrindo também. Assim, Alexis tinha ido com Gordon em uma das suas viagens de pesca e ela mesma espetou um tubarão. Inferno, talvez ela até tenha deixado o contador espetá-la e eles tiveram algum tipo de aventura de viagem de pesca. Comecei a colocar a foto de lado, quando algo chamou minha atenção. Um borrão preto no meio da foto. Eu arranhei-o com a minha unha, me perguntando se isso era apenas sujeira que tinha chegado de alguma forma na impressão. Mas isso não saiu e eu percebi que era parte da foto. O que era aquilo em torno do pescoço de Alexis James? Segurei a foto quase até meu nariz, mas eu não pude decifrá-lo completamente. Levantei e vasculhei uma das gavetas de lixo na cozinha até que eu vim com uma lupa. Então me sentei e usei isso passando por cima da foto de novo. Ao invés do clássico cordão de pérolas que eu sempre a tinha visto usando, Alexis James usava um tipo diferente de colar na foto. Ah, o cordão fino branco que rodeava seu pescoço ainda tinha pérolas, mas havia um grande pingente situado no meio do colar. Um dente – grande, de forma triangular feito em jato polido. O dente era o mesmo que o símbolo âmbar-negro que o cara na casa de Finn tinha usado em uma corrente ao redor de seu pescoço. O mesmo símbolo que o homem na cabine de Caine tinha tatuado em seu pulso. O símbolo da Elemental de Ar. A marca dela. O cartão de visita dela. Eu reconheci a runa imediatamente – e o que isso realmente era. — Filha da puta — eu disse. — Um dente de tubarão. A runa é uma porra de dente de tubarão. Haley James não era a Elemental de Ar. Sua irmã era. Alexis era aquela que tinha torturado Fletcher, quem tinha estado em seu caminho de fazer a mesma coisa com Donovan Caine. Alexis James era aquela que tinha estado puxando as cordas de Charles Carlyle e Wayne Stephenson. Ela era a vadia que tinha criado essa coisa toda. — Sobre o que você está murmurando? — Finn perguntou. — Alguns de nós estão tentando se concentrar. Eu bati a foto sobre a mesa e toquei meu dedo no colar. — Isso, isso é sobre o que eu estou murmurando. Ambos os homens se inclinaram para olhar a foto. Eles avistaram isso ao mesmo tempo.
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— Isso é... — Finn começou. — Isso parece... — Donovan Caine opinou. — Pode apostar que sim — eu rosnei, cortando ambos. — Esse é o dente. A preciosa runa da Elemental de Ar. Alexis James é aquela comandando o show, não sua irmã, Haley. Ficamos sentados ali digerindo a informação. O nó frio de raiva em meu peito começou a bater como um relógio, uma contagem regressiva, lenta e constante para a morte de Alexis James. Tick-porra-tack. — Mas e sobre os arquivos? Os que implicam Haley James? — Donovan Caine perguntou. Nós dois olhamos para Finn. — Alexis poderia estar usando as informações do login de sua irmã — Finn disse. — Não seria difícil para ela fazer. — Ou Haley poderia estar lidando com o dinheiro, enquanto Alexis faz o trabalho sujo — Donovan replicou. — Alexis poderia até mesmo estar fazendo seu roubo, ameaçando-a com a magia. — Não importa para mim de qualquer maneira — eu disse. — As duas vão morrer. Donovan Caine balançou sua cabeça. — Não. Você não pode matar Haley James, não se ela é inocente. — A irmã dela está correndo pela cidade usando sua magia para torturar as pessoas. Quão inocente você acha que Haley é? — eu bati. Os olhos do detetive queimaram em mim. — Haley James poderia estar até o pescoço nisso como Finn está com você. Ou ela pode ser tão inocente quanto aquela garotinha brincando em seu castelo de princesa enquanto sua senhora tia olhava. Até sabermos com certeza, você não pode tocá-la. Lembrase do nosso acordo? Nada de pessoas inocentes. Isso não é negociável, Gin. Não dessa vez. — Por quê? Por que ela não é um capuz da classe baixa que você tenha prendido antes?
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— Algo como isso. O detetive e eu olhávamos um ao outro. Seus olhos brilhavam ouro com determinação. Fúria fria cinzenta saía dos meus. Nenhum de nós olhou para longe e nenhum de nós estava disposto a ceder um centímetro. Ainda assim, apesar de mim, eu gostei de disputar com o detetive. Gostava de empurrá-lo, gostava dele empurrando de volta. Força, convicção e paixão eram características que eu sempre tinha admirado, não importa o quanto eles estavam equivocados nesse caso. — Há outras coisas para considerar — Finn disse em uma voz cautelosa. — Como o quê? — o detetive perguntou seus olhos ainda trancados aos meus. — Como aquela foto e a recompensa por Gin que ainda está circulando — Finn replicou. — O fato que a Elemental quer a sua morte, detetive. E o seu estimado capitão da polícia, Wayne Stephenson. — Stephenson é meu — Donovan Caine estalou seu olhar agitando para o outro homem. — Eu mesmo vou lidar com ele. — Como? Entregando-o aos assuntos internos? Este é o departamento mais desonesto de toda a força. Ele irá apenas subornar seu caminho para fora de qualquer carga que eles possam persuadir contra ele — Finn replicou. A mandíbula de Donovan se apertou. — Eu não sei como ainda, mas eu encontrarei uma maneira. Eu suspirei. Atritos entre nós não estava nos levando a nenhum lugar, mas eu sabia pelo tom da sua voz que Finn tinha algo em mente. — O que você propõe? Finn sorriu e colocou seus braços atrás da cabeça. — Influência. — Influência? Como é que isso vai nos ajudar? — o detetive perguntou. Finn puxou o pendrive de seu laptop e o ergueu.
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— Porque nós temos isso e Alexis James não. Agora, Alexis pode não ter medo de nós, mas há uma pessoa que ela não quer que veja essa informação. Pelo menos não ainda. Não até que ela tenha finalizado seu golpe fatal. — Mab Monroe — eu disse, pegando sua linha de pensamento. Finn assentiu. — Mab Monroe. — Eu ainda não entendo como isso nos ajuda — Donovan disse. — Chantagem — eu repliquei. — Nós ameaçamos rodar a informação para Mab a menos que Alexis James recue e pare de tentar nos matar. — Nós também podemos levá-la para retirar o dinheiro da recompensa em você e convencer Wayne Stephenson a tirar uma aposentadoria antecipada — Finn disse. — Você tem que admitir, é limpo, afinal. Ele sorriu extremamente satisfeito consigo mesmo. Revirei meus olhos, mas eu não podia discordar dele. Finn tinha lampejos ocasionais de brilho e chegar com esse tipo de compromisso foi uma delas. — Alexis James ainda está para morrer pelo o que ela fez ao meu treinador. Não haverá nenhuma discussão sobre isso. Nenhuma ameaça e nada de me caçar depois do fato. — eu disse. — Você pode viver com isso, detetive? Se assim for, eu posso viver com o resto do que Finn está propondo. A generosidade em mim vai embora, você demite Stephenson do departamento e todos nós ficamos com as nossas vidas. O olhar avelã de Donovan Caine escureceu e ele olhou para meus olhos cinza. Depois de um momento, ele balançou a cabeça. — Eu posso viver com isso. A questão é como nós vamos fazer isso? — Fácil — Finn disse. — Nós andamos ao lado de Alexis em um lugar público, soltamos a bomba sobre ela e esperamos ela dar as nossas reivindicações. Balancei minha cabeça. — Não Alexis, Haley. Nós vamos através de Haley James. Donovan fez uma careta.
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— Por quê? — Porque se ela está envolvida, eu vou adicioná-la a minha lista de coisas a fazer — eu disse. — E se não estiver, bem, ela pode começar esquivando-se por proteção. Isso é o que você deixa pessoas inocentes fazerem, certo? O detetive não respondeu. — Então agora tudo o que temos que fazer é descobrir onde as irmãs estão — Finn disse. — Um passo a frente de você — peguei meu celular e bati mais um dos números de discagem rápida. O telefone tocou quatro vezes antes que ela pegasse. — Vocês todos sabem que horas são? — Jo-Jo Deveraux murmurou em meu ouvido, embora sua fala arrastada, lenta e xaroposa levasse algumas mordidas de suas palavras. Olhei para o relógio na parede. — É a Gin e são 3:07. Eu preciso de algumas informações e possivelmente um par de convites. Você acha que pode lidar com isso? Jo-Jo riu. — Para você, querida? Qualquer coisa.
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Capítulo 24 Às 4h da tarde em ponto, eu estava no Five Oaks, o mais elegante, esnobe e exclusivo clube country de Ashland. Jo-Jo Deveraux ligou para mim mais cedo com as informações que eu queria – o próximo compromisso agendado das irmãs James. Haley e Alexis, juntamente com mais uns quinhentos outros convidados, iriam participar de um evento para angariar fundos, para um abrigo para mulheres que havia no clube country. Jo-Jo trouxe uma porção de peças para doar o que garantiu passes-livres pra mim e para o Donovan Caine. Finn já tinha sido convidado, haja vista que ele tinha mais dinheiro que os demais. Agora eu estava no meio do amplo salão de festas do clube, observando o movimento e esperando as irmãs James chegarem. Five Oaks era um enorme complexo composto por cinco edifícios arredondados e o salão de festas era tão grandioso quanto. O próprio salão circular tinha pelo menos uns 300 metros de largura e uns quatro andares de altura. A abóbada de vidro que formava o teto deixava a luz natural recair sobre os membros do clube. Várias escadarias conduziam aos andares de cima, cada uma delas possuindo uma sacada que circundava todo o salão. As duas janelas de vidro que iam do teto até o chão acompanhavam a inclinação da parede de trás, juntamente com duas portas bem grandes que levavam a um amplo pátio de pedra. A incrível vista mostrava ainda outras construções um pouco menores do clube, um monte de piscinas redondas, quadras de tênis, gramados, trilhas para caminhada na areia, bem como as altas e coloridas bandeiras do campo de golfe. Algumas pessoas, separadas em pequenos grupos, conversavam, sorriam e bebericavam Mint Juleps45 no térreo. Outras tinham subido para conversar com mais privacidade na sacada do segundo andar. Outras preferiram pegar seus drinques e se sentarem à mesa, a qual possuía uma cobertura de linho cor de pêssego. O símbolo do clube – uma runa parecendo uma bolota – foi costurado com fios dourados no centro de cada toalha de mesa. O evento ainda teria um jantar, mas a bebida e as conversas já imperavam no ambiente. 45
Bebida feita com açúcar, hortelã e uísque.
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Eu identifiquei vários vampiros importantes, Elementais, anões e gigantes em meio aos convidados, cada um deles esforçando-se ao máximo para serem notados pelos demais. Mas nenhum deles reluzia mais do que Mab Monroe. A Elemental do fogo esbanjava glamour por toda a extensão do salão com seu vestido de festa amarelo-canário. Um xale com babados cobria seus braços nus e o colar de rubi em forma de sol com raios incandescentes cintilava em seu colo. Mab estava bem no meio do salão. As pessoas que estavam ao redor dela tentavam conseguir um pouco de sua atenção. No entanto, os guarda-costas dela os impediam de se aproximar. Os outros dois membros do triângulo encrenqueiro também estavam lá, o advogado da Mab, Jonah McAllister e o segurança, Elliot Slater. O cabelo grisalho, o terno chique e a dentadura do McAllister pareciam tão falsos quanto ele. O pé grande do Slater parecia se agigantar na multidão. Um diamante maior do que um olho cintilava no dedo mindinho daquele gigante. Eu parei próxima à parede de trás, bem próxima a um grupo de negociantes trajando ternos escuros. Alguns deles me olharam com interesse, mas o meu olhar frio desencorajou-os. Ao menos até que eles bebessem um pouco mais. Para me misturar com a classe rica, eu vesti um simples, porém elegante vestidoenvelope46 que a Jo-Jo me deu no Natal passado. O vestido era de tricô com os pontos um pouco afastados e mangas estilo pirata que escondiam as minhas facas. Ele ia até o meu joelho, permitindo que eu carregasse mais duas adagas atadas às minhas coxas. Eu ainda tinha uma faca na bolsa. Estava de salto stiletto47 e com o cabelo preso em um alto rabo de cavalo, ao qual estavam presos dois pauzinhos48 bastante afiados. Meu celular tocou e eu o tirei da bolsa. Um dos negociantes olhou para mim. — Meu marido — eu disse de forma simpática. — O gigante. Ele é do tipo protetor. Gosta de saber onde eu estou o tempo todo e com quem também — ele engoliu em seco e voltou a se concentrar no drinque dele. Evidentemente eu não era gostosa o suficiente para fazê-lo querer despertar o ciúme de um gigante. Eu me afastei um pouco dos caras e atendi o celular. — Algum sinal delas? — Ainda não — Donovan Caine respondeu. — No entanto, Finn parece estar se divertindo no bar. Eu olhei através do salão. Depois que nós chegamos ao clube country, nós nos separamos. Juntos seríamos notados, alvos fáceis. Era mais fácil e seguro nos misturar às pessoas. Finnegan Lane tinha se instalado confortavelmente bem na entrada do bar. Como todos os outros homens de posse, ele vestia um tailleur49. 46
Do original “wrap dress”. Wrap dress é um vestido transpassado que possui amarração na cintura. Stiletto é um tipo de salto alto e fino, com uma média de 12 cm. 48 Do original “chopsticks”. Chopsticks são aqueles pauzinhos que se usam para comer comida oriental. Algumas mulheres os usam como enfeites de cabelo em um coque ou rabo de cavalo. 49 Uma espécie de terno de alta costura. 47
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O elegante caimento daquele tecido azul realçava os ombros largos do Finn, ao mesmo tempo em que a luz que passava pelo teto fazia o cabelo castanho dele brilhar. Ele estava jogando conversa fora com uma anã cheia de diamantes. Ela devia estar usando pelo menos uns quatrocentos pela forma que a pele dela faiscava; tinha os olhos frios e a pele branca como a neve. Provavelmente era alguma cliente dele. Finn me pegou olhando para ele. Ele piscou, levantou sua taça me cumprimentando e voltou a conversar. Pouquíssima coisa o distraía enquanto ele estava trabalhando ou entretendo uma mulher – não importava quão velha ela fosse. Finn podia não dormir com elas, mas gostava de paquerá-las tanto quanto gostava de paquerar com as mais jovens. — Finn sempre acha tempo para esse tipo de coisa — eu murmurei. — Às vezes eu acho que ele devia ter nascido mulher, pois dessa forma ele poderia se dedicar a arte do flerte. Donovan sorriu ao telefone. Um som baixo que foi me aquecendo de dentro para fora. Meus olhos se moveram até o segundo andar. Donovan Caine estava debruçado na sacada bem acima de mim, com o telefone no ouvido. O detetive estava usando um dos ternos do Finn que tinha um tom azul tão claro que parecia prateado. Os ombros de Caine não eram tão largos quanto os do Finn, de forma que o paletó não tinha um caimento perfeito. Todavia, eu podia ver a solidez de sua musculatura magra. Ele tirou o paletó e eu pude ver sua camisa branca com o colarinho desabotoado, por onde dava para espiar sua pele bronzeada. Clássico, resistente, sexy. Donovan Caine estava no ponto. Humm. Nossos olhares se encontraram, dourado e acinzentado. Novamente eu me imaginei dando uns pegas nele. Sentir sua boca na minha, as mãos dele percorrendo o meu corpo e ele rígido, se movendo dentro de mim. Só de pensar já me deixava na vontade. Donovan Caine olhou pra mim. Os olhos cor de mel dele escureceram quando seu olhar recaiu em mim, me olhando de cima a baixo. Seu olhar encontrou o meu, mas dessa vez ele não parecia distante. Diversas emoções passaram pelo rosto dele. Desejo. Vontade. Necessidade. Culpa. O detetive estava pensando no quanto ele me desejava. E em como nosso tempo juntos estava chegando ao fim e em breve ele oficialmente voltaria a me odiar. Donovan estava pensando no quanto ele gostaria de fazer o que quisesse hoje, mesmo que ele fosse se odiar por isso amanhã. E eu também. Naquele momento eu tomei uma decisão. O detetive seria meu. E antes que a noite acabasse. Alguma coisa chamou a atenção do Donovan e ele olhou pra baixo. — É Haley James. Ela acabou de entrar no salão. Eu me virei para direita, me distanciando dos homens de negócio, para conseguir ver a Haley. Ela vestia um vestido dourado super curto e provocante, o qual ressaltava a pele
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clara e os olhos azuis dela. A roupa era um pouco brilhante demais para se usar durante o dia, sem contar que salientava muito os seios devido ao profundo decote em V que descia dos ombros até o umbigo. O cabelo louro claro avermelhado50 dela estava preso em um chignon51 e um enorme diamante reluzente enfeitava as orelhas dela. Finn também tinha visto Haley. Ele se virou mais em direção à anã com quem ele conversava, virando de costas para o resto do salão, mas ainda ficando numa posição em que pudesse ver Haley. A menos que as coisas saíssem de controle, o trabalho do Finn era ficar sentado no bar e vigiar as irmãs. Eu queria saber como Haley e Alexis reagiriam depois que eu jogasse uma bomba nelas. — Eu estou vendo Haley — eu disse ao Donovan. — Cadê a Alexis? — Bem atrás dela. Eu parei de olhar para Haley e vi a Alexis adentrando o salão. Assim como eu, Alexis estava vestindo um vestido preto combinando com os escarpins52. O conjunto de pérolas de sempre adornava o pescoço e o pulso dela, embora ela tivesse acrescentado mais alguns colares no pescoço. Minha mão livre se fechou, formando um soco. Bem que eu gostaria de enforcar aquela vadia usando aquelas pérolas, mas isso seria bom demais para ela. Um jeito muito fácil de morrer. Eu até podia matar as pessoas de forma rápida nos trabalhos, mas isso não era apenas trabalho – isso era pessoal. Alexis James sofreria tanto quanto Fletcher tinha sofrido. E um pouco mais. Mas as irmãs do James não estavam sozinhas. O capitão Wayne Stephenson apareceu na porta logo atrás delas. O gigante rechonchudo trajava um terno branco que o fazia parecer ainda mais largo do que ele era. Embora o salão tivesse ar condicionado, Stephenson passava um lenço de leve por sua testa suada. Ficar perto da Alexis provavelmente o deixava nervoso. Mais dois outros homens trajando ternos escuros adentraram no recinto e pararam ao lado do gigante. Um deles era amigo de Charles Carlyle, da Cake Walk. Já o outro era o homem que estava com Alexis na noite em que ela deixou a cabana de Donovan Caine. Os dois caras se juntaram ao Stephenson, da mesma forma que os patinhos seguem a mãe pata. Mais um dos perdedores da Alexis James. Logo ela estaria falando com sua legião de fãs. Interessante. Stephenson e aqueles dois gorilas não eram importantes agora, de forma que eu continuei a falar ao telefone com o Donovan e a vigiar a mulher, esperando pela minha chance de pegar Haley sozinha. As irmãs levaram bem uns cinco minutos pra conseguir se 50
Do original “strawberryblonde” que significa um cabelo cuja tonalidade fica entre o louro claro e o vermelho. É um tipo de coque bem estruturado que deixa as mulheres elegantes. Geralmente utilizado em casamentos e eventos formais. 52 Do original “pumps” que quer dizer escarpins. Escarpins é uma espécie de salto alto chique. 51
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desviar daquele monte de gente bloqueando a entrada. Mas depois que conseguiram, eles se separaram. Alexis acenou para alguém e foi em direção a essa pessoa. Stephenson e os outros caras também sumiram na multidão. Haley pegou uma mint julep de um dos garçons que passavam e foi se sentar em uma das mesas desocupadas no centro do salão. Perfeito. — Aqui vou eu — eu disse olhando para Donovan Caine. Caine balançou a cabeça. — Boa sorte. Eu sorri. — Eu não preciso de sorte, detetive. Eu tenho algo melhor, influência. Com o telefone na mão, eu fui em direção à Haley James. Levaram pelo menos uns dois minutos para conseguir passar pelo carpete do salão. Meus saltos stiletto faziam buracos naquele tecido felpudo, de forma que eu só conseguia dar um passo de cada vez. Eu estava chegando perto da Alexis. Mas finalmente cheguei até a Haley sem tropeçar e escolhi um assento ao lado dela. Alexis estava parada a mais ou menos um metro e meio de distância, meio que presa no meio daquele monte de gente. Ela não me viu chegando para perto da irmã dela. Assim como o Wayne Stephenson e os outros dois caras, os quais estavam atrás da Alexis. Muito bom. Meu aparecimento repentino surpreendeu Haley James e ela meio que pulou da cadeira, quase derrubando o drinque. Os olhos arregalados azuis-esverdeados dela encontraram os meus olhos acinzentados afiados. Uma pontada de raiva surgiu em meu peito e, por um momento, minhas emoções pareciam que iriam me dominar. Raiva, vingança, nojo. Uma parte de mim desejava pegar uma das minhas facas, esfaquear a Haley e desaparecer em meio ao sangue e aos gritos de desespero. Fazer com que a Alexis sentisse a perda da irmã e lamentasse tanto quanto eu senti com a morte do Fletcher. Como se aquela Elemental do Ar fodida pudesse sentir algo além de êxtase quando tortura as pessoas. Mas eu tinha prometido ao Donovan que eu daria a ela a chance de provar sua inocência. E eu não voltava atrás nas minhas promessas. Não importava o quanto eu quisesse. Então, eu coloquei meu celular na mesa e sorri para ela. — Oi, Haley. Ela franziu a testa. — Eu te conheço? Eu sorri ainda mais.
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— Bem meu anjo, nós não nos conhecemos oficialmente, mas digamos que eu já estive na sua folha de pagamento. Sua irmã, Alexis, me contratou para matar Gordon Giles. Foram necessários alguns segundos para que as minhas palavras surtissem efeito. Haley franziu a testa novamente, relembrando o que eu tinha dito. Se ela fosse inocente ou então não soubesse nada a respeito, ela teria negado a acusação veementemente. Ou então ficado chocada e ultrajada pela acusação. Poderia até gritar até morrer por uma assassina confessa estar sentada ao lado dela. Mas ao invés disso, a feição dela ficou rígida e ela estreitou os olhos. Ah, sim, ela com certeza estava metida nisso – como eu gostaria de enforcá-la. — O que diabos você está fazendo aqui? — ela perguntou. — O que você quer? Dinheiro? Eu sorri. O som áspero e sarcástico fez com que várias pessoas se virassem e olhassem para mim. — Dinheiro? — eu sorri. — Você acha mesmo que pode me comprar assim tão facilmente? Depois do que sua irmã fez? Eu acho que não. Haley levantou uma sobrancelha bem feita. — Você foi bastante receptiva ao aceitar o dinheiro para matar Gordon Giles. Eu retruquei. — Isso foi antes da sua irmã decidir me trair. Isso foi antes da Alexis torturar aquele velho lá no bar. Antes de ela ter batido nele até ele ficar a beira da morte. Antes de ela decidir matar o detetive para não deixar rastros. Já que tentar me oferecer dinheiro obviamente não deu certo, Haley decidiu usar outra tática. Ela arregalou os olhos ainda mais, enrugando ainda mais a testa. Eu tinha que admitir, aquela mudança de atitude foi muito bem encenada. — Não foi ideia minha você tem que acreditar em mim. Era a Alexis que estava por trás de tudo. Ela me forçou a concordar com ela. A concordar com tudo. — Boa atuação — eu disse. — Muito conveniente também, pôr a culpa toda na sua irmã. Mas caso você ainda não tenha percebido, eu deixei a misericórdia para trás há muito tempo. Atualmente, eu acredito na culpa por associação. Haley tremeu o lábio inferior levemente.
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— Não é atuação. Alexis me ameaçou. Ela ameaçou me ferir, até mesmo me matar caso eu não fizesse exatamente o que ela queria. — Sério? — eu perguntei. — Então por que seu login e sua senha aparecem envolvidos às contas desfalcadas? Por que a Alexis forçou você a roubar todo o dinheiro de sua própria empresa? Ela concordou e rapidamente passou a mão na lateral dos olhos, como se estivesse secando uma lágrima. Algumas mulheres do sul sabiam umas coisinhas sobre como serem melodramáticas, mas Haley estava sendo ainda mais melosa que glacê no bolo. Eu bufei. — Querida, você é uma péssima mentirosa. Até o show daquelas vagabundas vampiras nas ruas de Southtown é melhor do que isso. Haley me estudou por um momento. Uma vez que ela percebeu que eu não ia cair naquele papo furado, a feição dela se endureceu novamente. Voltou a bancar a durona. Infelizmente eu realmente também era durona. — Eu sei por que você queria o Gordon Giles morto. Ele estava prestes a ir à polícia e entregar o esquema do caixa dois e você simplesmente não podia deixar isso acontecer. Porém, eu estou curiosa a respeito de uma coisa — eu disse. — Qual o objetivo de tudo isso? Obviamente você não achava que apenas vocês duas iam conseguir acabar com o reinado da Mab Monroe apenas por roubar alguns milhões de dólares. Haley deu os ombros. — Esse era o sonho da Alexis, não o meu. Ela é a única que gosta de bancar a rainha usando o Elemento do Ar. Alexis acredita que a magia dela a faz mais poderosa do que ela realmente é. — E daí? — eu perguntei. — Por que você suporta esse tipo de coisa? Os olhos da Haley brilharam de ódio. — Porque Mab Monroe roubou a companhia do nosso pai, seu orgulho e sua alegria e ainda comprou todo o estoque dele. Todavia, isso não foi o bastante para ela. Papai estava tentando se reerguer, lutando contra ela, mas ela o matou. Ela nos disse o que tinha feito e disse ainda que se quiséssemos continuar respirando, seria melhor que nós nos déssemos bem com ela. Isso aconteceu há dois anos. E agora aquela vagabunda fica dando ordens por aí, nos dizendo o que fazer como se ela conhecesse a nossa companhia melhor do que a
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gente. Eu só quero de volta o que é meu. E se Alexis planeja matá-la, bem, melhor ainda. Talvez assim nosso pai possa descansar em paz. O veneno na voz dela poderia ter feito um monte de gente cair duro. Eu supus que Mab Monroe não iria ficar feliz ao saber disso. Então a Alexis era a única com algum poder. Haley estava apenas agindo de acordo com o plano da irmã e acabou roubando. Que família. — O que diabos você quer? — ela exclamou. — Eu suponho que esse seja o objetivo desse nosso encontro. — Eu quero que você e a sua irmã deem o fora daqui — eu disse. — E retirem essa recompensa em dinheiro que as Indústrias Halo ofereceram por qualquer informação a meu respeito. Faça com que a Alexis demita aqueles caras, incluindo o capitão Wayne Stephenson. Finnegan Lane e Donovan Caine, os caras que sua irmã estava a fim de torturar e matar, também devem ter passe livre. Queremos que nos deixem em paz. E você pode continuar passando a mão no dinheiro da sua própria companhia. Eu to me lixando para o fato de vocês estarem roubando da Mab Monroe, haja vista que com sua inteligência você vai acabar sendo pega em breve — ela não iria continuar roubando por muito tempo, porque eu estava prestes a enfiar uma faca na barriga da Haley e cortar a Alexis de todas as formas possíveis assim que as irmãs abaixassem a guarda. Eu a chantageei apenas para tirar Finn e Donovan Caine dessa bagunça, mas aquelas piranhas iriam morrer pelo que fizeram ao Fletcher. Além do mais, elas tinham me traído primeiro. Era a única forma de se fazer justiça. O rosto da Haley se endureceu diante do meu insulto, mas ela sabia que eu ainda não tinha acabado. — Ou então o que? Eu olhei pra ela, meus olhos cinzentos tão frios e duros quanto o gelo. — Diga-me, você ou a Alexis tiveram notícias de Charles Carlyle hoje? Ela não disse nada. Eu sorri. — Eu tive a oportunidade de falar com Chuck noite passada. Ele não disse muita coisa, é claro, mas eu descobri algo interessante nas coisas dele – o pendrive do Gordon Giles. Ao que parece Chuck meio que o encontrou e decidiu ficar com ele no caso da Alexis decidir se voltar contra ele. É claro, ele não usará isso agora, mas acredito que ele o daria a mim antes de morrer — pela primeira vez, eu vi um pânico genuíno iluminar os olhos azuis-esverdeados da Haley. — Eu realmente li os arquivos. Foi assim que eu tomei conhecimento do login utilizado para roubar o dinheiro — eu apontei para o salão onde
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Mab Monroe estava sendo paparicada. — Agora, eu posso simplesmente ir até lá e dar a informação para a Mab. Estou certa de que ela ficaria muito interessada em saber mais a respeito do desvio de dinheiro, tendo em vista que ela é a acionista majoritária. O que você acha? Um pequeno gemido escapou dos lábios semicerrados dela. A pele dela ficou pálida, e a testa dela brilhou com suor devido ao nervosismo. O autocontrole dela estava começando a se desfazer. — Você não pode dizer nada à Mab. Ela nos mataria assim como ela matou nosso pai. — Eu posso fazer a merda que eu quiser Haley. Sou eu que tenho o pendrive. Eu poderia ir até Mab nesse exato minuto — eu levantei meu braço como se eu fosse acenar para a Elemental do Fogo. — Acredito que eu consigo chamar a atenção dela daqui… — Não! — Haley agarrou o meu braço, tentando abaixá-lo. O grito dela ecoou no salão, calando os ruídos das conversas. Várias pessoas se viraram para ver que estardalhaço era aquele, incluindo Mab Monroe. A Elemental do fogo me pegou apontando para ela e a Haley agarrando o meu braço. Mab franziu a testa, mas eu apenas sorri e balancei meus dedos em sua direção, como se fôssemos velhas amigas. Depois de um momento, Mab ergueu a mão e acenou de volta, embora ela possivelmente não soubesse quem diabos eu era ou porque eu estava cumprimentando ela como uma louca. Mab cravou seus dedos em Eliot Slater e sussurrou algo no ouvido dele. Slater estalou os dedo, e outro guarda-costas gigante da Mab se juntou a eles. Essa era a hora de dar o fora. — Pense na minha proposta, Haley — eu disse. — Eu só a farei uma vez. — Você não entende — ela sibilou. — Alexis era a única que queria Gordon morto, não eu. Eu queria acertar as coisas com ele, mas ela não quis me ouvir. Ela disse que queria dar uma lição nele por virar as costas para ela. E tudo o que eu pude fazer foi convencê-la a contratar um assassino, ao invés de ela mesma fazer o trabalho e acabar sendo pega. Teria dado tudo certo se ela tivesse me ouvido. Mas Alexis sempre complica as coisas. Ela tinha que inventar de mandar você, embora eu tivesse dito a ela que isso não seria necessário, pois o tiro poderia sair pela culatra. Ela não queria a Mab xeretando a gente ou a nossa companhia. Não mais. Não antes que ela estivesse pronta para se vingar. — E você está me entediando com esse papo porque...
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— Porque Alexis não vai aceitar o que você propôs — Haley respondeu com uma voz trêmula. — Ela não vai abaixar a guarda nem para você, nem para ninguém. Antes de o papai morrer, Alexis nunca tinha usado a conexão dela com o ar. Ninguém sabia ao menos que ela tinha esse poder, exceto os familiares. Mas depois que ele morreu, ela mudou. Começou a usar os poderes para tudo e começou a treinar para poder dar conta da Mab. A magia dela... Está fazendo com que ela seja precipitada, louca. Eu não posso convencê-la. Eu olhei friamente para ela. — Então eu sugiro que você tente mais, Haley. Ou você irá sentir a ira da Mab Monroe. Eu acredito que ela consiga torturar você por muito mais tempo do que a Alexis torturou aquele velho no restaurante. Mab tem muito mais prática nesse tipo de coisa. Ela provavelmente manteria você viva por dias. Haley empalideceu, a pele dela assumiu um tom esverdeado, como se ela quisesse vomitar. Eu tirei meu cartão de dentro da bolsa e o entreguei a ela. O número do meu telefone celular. — Você tem uma hora para fazer Alexis aceitar, ligar para mim e cumprir as minhas exigências. Bem, depois desse tempo, quem sabe o que pode acontecer, não é mesmo? Haley James pegou o cartão da minha mão com os dedos tremendo e o levou junto ao peito. Eu olhei fixamente para ela mais uma vez e então peguei meu telefone celular, fiquei de pé e me afastei.
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Capítulo 25 Eu andei no meio da multidão de alta classe com facilidade, deslizando no meu caminho, passando um grupo após o outro e mantendo o celular na minha orelha. — Você ouviu tudo isso, detetive? — Sim — Donovan Caine disse, em tom sombrio. — Eu a ouvi. Eu não tinha cortado a ligação com o detetive, porque eu queria ouvir exatamente o que Haley James tinha a dizer de si mesma. Dessa forma, eu não poderia ser acusada de colocar palavras na sua boca ou de compor sua culpa. Haley deixou bem claro que ela estava bem com o que Alexis queria fazer, enquanto ela teria que continuar roubando sua própria empresa. A única vez que ela tinha demonstrado qualquer outra emoção contrária à arrogância foi quando eu disse-lhe que tinha o pen drive e que eu estava pensando em dá-lo a Mab Monroe. Em seguida, ela entrou em pânico. Ninguém queria enfrentar a ira da Elemental de Fogo, não alguém tão ganancioso como Haley James. Ela provavelmente estava correndo no meio da multidão, agora, à procura de Alexis, tentando pensar em alguma forma de convencer a sua irmã em atender minhas necessidades para que ela pudesse salvar sua própria pele. Haley não era a única correndo através do salão de baile. Também havia um dos guardas de Mab Monroe. Evidentemente que eu agia como uma tratante e Mab queria saber quem eu era e por que eu tinha estado falando com Haley James. Seu gigante varreu a multidão atrás de mim como Sherman marcha através de Atlanta. Eu não me atrevi a virar, mas ouvi o murmurar do povo rolando para fora do seu caminho. Eu peguei o meu ritmo, correndo em torno de grupos de pessoas dançando em volta dos garçons. Eu era rápida, mas o gigante era maior. Seria apenas uma questão de tempo antes que ele me alcançasse. Antes que sua mão carnuda estivesse presa no meu ombro e ele me acompanhasse para fora do salão de baile para um pouco de bate-papo particular, talvez mesmo com Mab. Seria uma complicação que eu não precisava agora. — Você está sendo seguida — a voz de Donovan soou no meu ouvido.
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— Não me diga — eu disse. — Onde você está? — No mesmo lugar de antes. Meio do segundo andar, debruçado sobre o parapeito. Olhei para cima. O detetive estava exatamente onde ele tinha dito que ele estava. Ele tinha desfeito outro botão em sua camisa e parecia sexy e amarrotado na luz. Humm. Pena que eu não tinha tempo para apreciar a vista. — Estou te vendo — eu disse. — Encontre um lugar para eu me esconder dos gigantes. Quarto vazio, almoxarifado, qualquer coisa. Estarei lá em um minuto. — Entendi — Donovan se virou e se afastou da varanda. Meus olhos varreram a multidão, procurando algo que eu poderia usar para retardar o gigante. O murmurio atrás de mim ficou mais alto. Um minuto, talvez menos, antes de ele me pegar. Meu olhar pousou em um garçom constantemente carregando uma bandeja cheia de juleps de hortelã53. Perfeito. Eu diminuí meus passos para obter o meu tempo de passar. O garçom roçou-me e eu chutei o tornozelo tão duro quanto eu poderia com a ponta do meu punhal. Ele gritou com a dor inesperada. Eu me mantive andando, mas o garçom foi para baixo como um homem morto. Sua bandeja tombou e derramou álcool em todos dentro de um raio de três metros. Algumas gotas geladas respingando nas minhas costas. Por um momento ficou um horrorizado silêncio. No segundo seguinte, uma multidão de pessoas revoltadas convergiram para o cara, gritando e brigando com o pobre por ser tão desajeitado. A multidão era tão apertada, que o gigante não podia andar com ela. Enquanto ele tentava trabalhar sua maneira em torno das mesas e pessoas gritando sobre os seus vestidos embebido em álcool, eu subi uma escada para o segundo andar caminhando de volta do jeito que eu tinha acabado de chegar, tecendo dentro e fora dos aglomerados de pessoas neste nível. Abaixo de mim, Mab Monroe olhou para a multidão de convidados e franziu a testa. Ela sabia que algo tinha dado errado. Ela simplesmente não sabia o que ainda. Baixei a cabeça, me afastando da varanda e continuei andando, não tão rápido para não chamar a atenção para mim, mas não com vadiagem. Eu segurei o telefone de volta ao meu ouvido. — Onde você está? — No chamado armário de Abastecimento à esquerda no final do corredor. Segunda porta à sua direita. Fiz a curva adequada. Este corredor estava deserto, então eu abri a porta, entrei e fechei atrás de mim. Caine esperou dentro, encostado em uma grade de metal cheia de papel higiênico. Encostei-me na madeira e soltei uma longa respiração. 53
Bebida.
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— Essa foi por pouco. — Perto demais — Donovan concordou. — Sobre Haley? — eu perguntei ao detetive. — O que ela fez depois que eu a confrontei? — Nada demais. — disse Caine. — Ela ficou lá por um momento, olhando para suas costas, então ela se levantou e correu para fora no meio da multidão. Ir encontrar Alexis, assim como eu pensei que ela faria. — E agora? — Caine perguntou. — Agora vamos ficar aqui até AMC e sua guarda perderem o interesse em mim e Haley James chamar — eu disse. — Não deve demorar muito — eu tinha ultrapassado o detetive. Além da grade de metal em que ele se encostou, não havia muito no armário. Um esfregão e um balde. Várias caixas de luvas de plástico. Um assento que tinha sido resgatado de um dos salões do clube. Eu marquei Finn no meu celular. Ele respondeu no segundo toque. — Você realmente deve ter ficado por perto — disse ele. — O garçom que você derrubou ainda está recebendo gritos. Soa como um bando de corvos grasnando uns aos outros. — Onde você está? — eu perguntei. — Ainda no bar — respondeu Finn. — Conversando com Grace — Finn deve ter piscado para ela, porque através do telefone, ouvi uma mulher rir. O tipo alto, gritando o som da bruxa má, sempre feita em filmes de conto de fadas. Deve ser o anão, o velho enrugado que eu vi com ele antes. — Grace diz olá — respondeu Finn. — Bom para Grace — eu respondi. — Quer me dizer o que está acontecendo lá embaixo? Finn suspirou. — Não é possível que você apenas relaxe e aproveite o show? — Não. Agora me diga o que aconteceu depois que eu saí de perto de Haley. O detetive disse que ela se levantou e correu para a multidão.
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— Direto para Alexis — disse Finn. — Haley puxou sua irmã fora para o pátio. As duas estão falando agora. Alexis não parece satisfeita. Stephenson está com elas também. Pobre bastardo parece fraco. Continua esfregando sua testa com o lenço. Eu sorri. Bom. Com o tempo a cadela perceberia com quem ela estava lidando. — Fique de olho neles, mas não deixe que eles o vejam. Se eles começarem a sair, me ligue. Não as siga. — Sim, mestre —Finn disse. — E não se preocupe. Grace vai me fazer companhia — Finn desligou e eu fiz o mesmo. Joguei o meu celular na prateleira de metal, ao lado do papel higiênico. Então eu passei para o assento e me sentei sobre ele. As almofadas grasnaram com o meu peso e uma mola solta picou-me na bunda. Mudei, mas eu não podia ficar longe do metal ofensivo. Donovan Caine se afastou da parte traseira e começou um ritmo andando para a frente e para trás, dando cinco passos rápidos de um lado do armário para o outro. Seus sapatos rangeram no chão e eu senti o início de uma dor de cabeça. — Você vai ficar nesse ritmo pela próxima hora? — eu disse. — Porque já acabou meu último nervo. O detetive não disse nada, ele apenas continuou andando. Seus movimentos rápidos e controlados pegaram o meu olhar e os meus olhos traçando sobre os seus ombros. Seu aroma limpo de sabão encheu o armário. Lembrei-me da última vez que tinha estado com ele na noite anterior, como era sentir Donovan Caine contra mim. Quanto eu queria terminar o que começamos. E lá estava a promessa que eu fiz para mim mesma. Para tirar o que eu poderia hoje do detetive pois o futuro seria o adeus. Eu chequei o relógio no meu pulso. Cinqüenta minutos. Tempo de sobra. Finn estava lá embaixo vigiando o anão idoso e era seguro o suficiente aqui. Haley e Alexis James devem estar disputando, tentando descobrir o que fazer para responder às minhas exigências. Isso tinha sido o ponto de encontrá-las em público. Elas não eram uma ameaça para nós agora. Quanto aos gigantes, levaria horas para pesquisarem o clube, se eles sequer se incomodassem. Mab Monroe tinha, provavelmente, o chamado de volta para o seu lado já, considerando a bagunça que eu fiz ficando longe dele. Donovan Caine e eu tinhamos 50 minutos para nós. Meus olhos deslizaram para baixo do corpo do detetive. Eu não poderia pensar em uma maneira mais agradável de passar o tempo. Limpei a garganta. Donovan parou o seu passeio e olhou para mim.
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— Você sabe que se as irmãs James concordarem com nossas exigências. Amanhã, todos nós vamos voltar a nossa agenda regular — eu disse. — Finn. Você. Eu. Donovan acenou com a cabeça. — Eu sei — ele olhou para mim, as emoções correndo pelo seu rosto. Desejo. Vontade. Necessidade. Culpa. Seus olhos castanhos me devoraram, movendo-se dos meus lábios para os meus seios e pernas e voltando para cima novamente. Mas ele não fez nenhum movimento para vir em minha direção. Nenhum movimento para tirar o que ele queria de forma tão clara. Tinha que ser eu, então. Fiquei em pé e, lentamente, me aproximei dele. Meus estiletes estalavam no chão. Donovan se engasgou com o som, mas ele não desviou o olhar de mim. Ele não poderia mais do que eu poderia deixar de ir para ele. Parei com um pé na frente do detetive. Meu olhar cinza sobre seu corpo, como eu tinha feito um momento antes. Ombros magros, peito sólido, a força enrolada. Eu gostei do que vi. — Você é um homem atraente, detetive — eu disse. — Eu sou uma mulher atraente. E aqui estamos nós, sozinhos. Juntos — ele não disse nada. Não bastou a abertura. Então, eu continuei. — Ontem, quando estávamos na boate, quando eu estava sentada no seu colo, eu não queria parar. Eu quis rasgar seu jeans, queria sentir você dentro de mim, indo mais e mais até que ambos estivessemos gritando. Você não? Um músculo em seu rosto se contorceu. Ainda assim, Donovan não se mexeu. — Apesar de nossas diferenças, eu me sinto atraída por você, detetive. Alguma coisa em você me fascina. Eu quero você como eu não quis ninguém por um longo tempo. Eu acho que você sente o mesmo por mim. Por um momento, pensei que não iria responder. Mas ele fez. — Eu quero você — sua voz era baixa, apertada, tensa. A confissão lhe custou. Era tudo o que podia fazer para não chegar para mim. Ainda bem que eu não tinha dúvidas sobre como fazer o primeiro movimento. Eu entrei em seus braços e coloquei minhas mãos em seus ombros. Então eu levantei minha cabeça e olhei em seus olhos cor de avelã. — Então, por que não fazemos algo a respeito?
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Capítulo 26 Caine olhou para mim. — Não é uma boa ideia Gin. Estamos aqui por uma razão, lembra? Para que as irmãs James desistam. Nada mais. Elas poderiam estar nos procurando. Desespero selvagem refletia em seus olhos. Caine estava tentando salvar a si mesmo, mas eu não ia deixar que ele o fizesse. — Uma desculpa esfarrapada. Haley e Alexis estão ocupadas demais discutindo sobre o que devem fazer agora. Mesmo que não estivessem, elas não nos encontrariam. Elas provavelmente pensam que nós já saímos do clube para ir a algum lugar esperar a sua chamada. Até então, não temos nada senão tempo — inclinei-me e coloquei a minha boca ao lado da sua orelha. Os ombros de Caine estremeceram debaixo de minhas mãos. Ele estava na borda. — Se você está preocupado com proteção, bem, eu tomo minhas pequenas pílulas brancas, por isso não haverá nenhuma consequência indesejada. E eu suponho que você tenha uma camisinha ou duas em sua carteira como a maioria dos homens — respirei fundo. — Quanto às questões entre nós, eu não me importo que estejamos em lados opostos novamente amanhã, eu quero o que eu posso ter hoje. Eu quero você, detetive. Bem aqui, agora. Eu pressionei meus lábios nos dele. Foi como se eu lhe tivesse dado um choque com um fio elétrico. Ele simplesmente... Explodiu. Donovan Caine soltou um rugido e puxou-me para ele. Ele me virou e me apoiou contra a parede, suas mãos agarrando o tecido macio do meu vestido com força. O detetive esmagou seus lábios contra os meus. Desta vez, eu não tive que provocar sua boca para ela abrir. Sua língua já estava empurrando contra a minha. Eu dei boas vindas à sensação. Seu cheiro – esse cheiro de sabão inebriante e acentuado – encheu o meu nariz. Esfarrapando meu próprio controle. Minhas mãos estavam em toda a parte. Seu rosto, pescoço, peito. Agarrando, apertando, querendo mais. Querendo sentir cada centímetro dele de uma só vez. Tentando me agarrar a algo que acabaria assim que saíssemos desta sala.
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Quando ele tirou o meu vestido do caminho, Donovan Caine foi para minhas calcinhas. Rasgou-as em um movimento e mergulhou dois dedos dentro de mim. Eu gemi já molhada e dolorida para ele. Envolvi uma perna em torno de sua cintura, dando-lhe melhor acesso. Caine moveu seus dedos dentro de mim num ritmo rápido e estável, indo mais fundo de cada vez. Ele gemeu comigo. — Eu queria fazer isto desde o primeiro momento em que vi você na sacada — ele sussurrou contra os meus lábios. — Queria sentir você. — Então não pare — minha voz estava rouca de desejo. — Não pare. Nossas bocas e línguas se juntaram novamente, mesmo enquanto Donovan me acariciava. Havia muito tesão, muito sentimento, muita necessidade entre nós para esperarmos mais. A mão livre de Donovan atrapalhou-se com suas calças, tirando a carteira antes que as calças caíssem no chão com um sussurro. Eu tentei empurrar os seus boxers para baixo, mas a seda preta estava presa em sua ereção saliente. Frustrada, eu os rasguei, o libertando, enquanto ele rasgava o pacote com os dentes e se cobria com o preservativo. — Agora — eu disse com voz crua de desejo. — Agora. Caine me pegou e eu envolvi minhas pernas em volta de sua cintura. Ele me empurrou contra a parede e enfiou seu pau dentro de mim, empurrando o mais forte e rápido que podia. Ambos estávamos em um frenesi. Eu gemi novamente à sensação escorregadia dele se movendo mais e mais profundo dentro de mim. Minhas unhas cavaram em seus ombros. Toda vez que ele empurrava, eu me apertava em torno dele, cada vez mais apertado, ficando mais perto do orgasmo que eu tão desesperadamente desejava. Da doce libertação. Caine enterrou sua cabeça contra o meu pescoço. A prateleira de metal junto a nós estremecia e se sacudia com nossos movimentos. Tudo parecia tão bom que doía. Mas acabou muito rápido, menos de um minuto depois, Caine empurrou uma última vez e estremeceu contra mim, achando sua libertação. Senti-o esvaziar e escorregar para fora. Tanto para a resistência. Eu o tinha empurrado muito duro, muito rápido. Ele estava acabado, mas eu ainda doía com necessidade quente e latejante. E ela não ficaria por cumprir. — Eu... Eu sinto muito — Caine me baixou para o chão e se afastou. — Isso foi muito duro. — Não foi muito duro — eu disse. — Mas nós não terminamos ainda.
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Eu coloquei minhas mãos sobre os ombros de Caine e o levei para o banco do amor. Seus joelhos atingiram a traseira do mesmo e ele se sentou sobre as almofadas coloridas. Eu montei nele, me livrando do preservativo usado e depois pegando o seu comprimento em minhas mãos. Sua respiração acelerou contra o meu pescoço. — Vamos, detetive. Se levante para a ocasião — eu provoquei sua ponta molhada com a ponta afiada da minha unha. — Isso é um desafio? — sua voz estava grossa e rouca com sexo. Suas mãos se moveram para a minha cintura, puxando-me mais perto. Levantei-me de joelhos e esfreguei seu pau contra o meu núcleo. — É mais um incentivo. Não demorou muito para que o detetive estivesse de novo pronto e produzisse outro preservativo da sua carteira. Desta vez, foi a minha vez de ficar no topo. Eu defini o ritmo, o montando longa e lentamente, subindo e, em seguida, descendo nele um pouco mais fundo, um pouco mais rápido, até que ele estava murmurando o meu nome uma e outra vez. Gin, Gin, Gin. Como se fosse algum tipo de oração – ou maldição. A maldita coisa mais sexy que eu alguma vez ouvi. Caine gemeu. Suas mãos foram para os meus seios, massageando-os através do tecido do meu vestido e sutiã, fazendo-me doer ainda mais. Seus lábios estavam contra o meu pescoço e ele me provocou com pequenos beliscões de seus dentes. Eu apertei minhas mãos em seus ombros, o instigando. Os músculos esguios serpentearam tal como ele fazia dentro de mim. Meus próprios músculos apertaram e aceleraram em resposta. A pressão dentro de mim aumentou e aumentou. Eu joguei minha cabeça para trás e deixei o orgasmo rasgar dentro de mim.
Depois que terminamos, ficamos ali sentados no banco do amor. Ombros tocando, uma das minhas pernas nuas mesmo em cima de uma das dele. Não exatamente entrelaçados, mas também não longe um do outro. Eu teria gostado de colocar minha cabeça em seu ombro, fechar os meus olhos e relaxar. Permitindo a mim mesma desfrutar ao máximo este breve momento de prazer tranquilo. Mas eu não podia fazer isso. O sexo já tinha sido pessoal o suficiente. Nós não tínhamos feito amor, mas também não tínhamos apenas fodido. O início de uma suavidade quente pelo detetive tinha florescido no meu peito. Mas eu não queria pensar muito sobre isso agora.
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Eu estava certa sobre uma coisa, no entanto. Donovan Caine era um excelente amante. Eu me senti mais saciada do que eu tinha me sentido em um longo tempo. Havia algo a ser dito sobre a experiência de um homem mais velho, melhor do que os garotos da faculdade com quem eu geralmente transava. Os mais jovens estavam apenas gratos por terem sexo – eles não estavam muito interessados em fazer nada para assustar-me. Como me foder forte e rápido como Donovan tinha feito. Ou me deixar fazer o mesmo com eles. O detetive começou a rir. Risadas afiadas saíam de seus lábios até que ele estava dobrado, o peito tocando os joelhos. — O que há de tão engraçado? — eu perguntei. — Isso. Nós. Você. Eu. Juntos. Eu arqueei uma sobrancelha. — Eu não achei que tivesse sido tão engraçado como foi satisfatório. Eu estava errada? Caine enxugou lágrimas de riso histérico de seu rosto corado. — Oh, não. Foi definitivamente satisfatório. Mas você é uma assassina, você mata pessoas, você matou o meu parceiro. Eu sou um detetive, um policial, supostamente um dos bons, eu acabei de foder você. Duas vezes. — Então, qual é o problema? Donovan Caine me olhou. — Você realmente é fria, não é? Com nada além de gelo em suas veias e uma laje de pedra em vez de coração. Alerta de clichê. Mas as palavras gastas do detetive me descreviam – mais do que ele iria alguma vez perceber. — Você não entende o que eu fiz? — Caine perguntou. — Eu fui contra tudo o que eu acredito. E para quê? Você? Ele estava se afastando de mim. Eu sabia que isso estava vindo, mas ainda me picou como uma agulha. Eu forcei a suavidade em meu peito a endurecer e minha máscara fria assentou sobre o meu rosto mais uma vez.
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— Você não acredita em foder mulheres? — eu mantive meu tom leve, tentando salvar alguma coisa disso. Um pouco de felicidade que eu pudesse lembrar mais tarde. Ele passou sua mão pelo cabelo curto e preto, enrugando-o mais ainda. — Esse não é o ponto. Eu deveria estar prendendo você, te entregando por seus crimes, não me perguntando se restou suco suficiente dentro de mim para uma terceira rodada. Eu encolhi os ombros. — Nós tivemos ambos um bom tempo. Por que você está trazendo moralidades à tona? Porque não havia nada de muito santo e honesto sobre a forma como vocês estava gemendo o meu nome há cinco minutos. Caine ficou rígido, mas ele não podia argumentar com a verdade. Ainda assim, a necessidade dolorosa, o prazer quente, a doce libertação, estava desaparecendo e as velhas dúvidas estavam enchendo seus olhos, juntamente com uma emoção que ele simplesmente não conseguia sacudir – culpa por foder a assassina do seu parceiro. O detetive não ia ultrapassar isso. Não hoje, talvez nunca. Eu suponho que lhe poderia ter falado sobre Cliff Ingles e sobre como o outro policial tinha sido sujo. Mas eu não sabia se isso iria mudar as coisas entre nós. O parceiro de Donovan ainda estaria morto e eu ainda seria quem o matou. Tudo isso significava que a lua de mel já tinha acabado. Uma pena, na verdade. Eu balancei a minha perna para longe da dele e me levantei. — O que você está fazendo? — Donovan perguntou, os seus olhos fixos nas minhas pernas nuas. — Me vestindo — eu disse com uma voz fria. — Está quase na hora de as irmãs telefonarem. Eu sugiro que você faça o mesmo. Enfiei minha calcinha rasgada na minha bolsa e desci o meu vestido de volta para a posição apropriada. Ao meu lado, Donovan Caine fechou o zíper das calças. Nós não falamos um com o outro. Eu peguei meu celular e o deslizei de volta na minha bolsa. Depois eu abri cautelosamente a porta do armário de abastecimento. Ninguém estava no corredor. Mab deve ter chamado o seu gigante de volta para seu lado. Bom. Saímos do armário abarrotado, caminhamos ao redor da varanda do segundo andar, tomando cada um, um conjunto diferente de escadas para descer até ao salão de dança. A multidão tinha aumentado durante a maior parte da hora que tínhamos saído e agora as pessoas e a conversa zumbiam como mosca. Levei um momento, mas conseguia ver Finn
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ainda sentado no bar. A sua companhia tinha mudado, porém. Em vez da velha anã, uma jovem e atraente mulher asiática sorria e o deixava pagar-lhe as bebidas. Eu inclinei a minha cabeça para Finn. Donovan assentiu e nos dirigimos nessa direção. — Você vê as irmãs? — Donovan murmurou. Eu olhei para ele. Uma máscara dura tinha se estabelecido sobre o rosto do detetive, afastando a culpa de seus olhos. O detetive estava deixando de lado seus sentimentos conflitantes por tempo suficiente para fazer o trabalho. Tão profissional. Eu comecei a dizer não, quando um lampejo de ouro chamou a minha atenção. Haley James. Os olhos da pequena mulher estavam fixos na saída do salão. Sua boca estava aberta como se ela estivesse tentando recuperar o fôlego enquanto andava energeticamente nessa direção. Ela estava se movendo tão rápido que eu não via como ela conseguia manter seus pés em suas sandálias de tiras. Suas ações faziam parecer como se alguém a estivesse perseguindo. Um momento ela estava lá, o seguinte, ela tinha desaparecido. Eu fiz a varredura da multidão à procura de Alexis. Lá estava a cadela, a cerca de cem metros atrás de sua irmã e avançando rapidamente. Boca apertada. Olhos estreitados. Feições duras. Alexis estava indo atrás da irmã. Eu não gostaria de ser Haley quando ela a alcançasse. O Capitão Wayne Stephenson estava mesmo atrás de Alexis. Assim como os dois capangas. Os quatro se aproximaram da saída do salão... — Finn! Finnegan Lane! — uma voz sensual gritou. Merda e dupla merda. Eu estava a 60 metros e várias dezenas de pessoas de distância do bar, mas eu ainda a ouvi gritar o seu nome. Assim como ouviu Alexis James. A Elemental do Ar parou onde estava, como se ela tivesse sido atingida por um raio. Stephenson teve que fazer um esforço para não bater nela. Os capangas bateram nas costas largas dele e ricochetearam como bolas de pingue-pongue. Eles conseguiram ficar de pé. Roslyn Philips sorriu, murmurou um pedido de desculpas e contornou Alexis James. Os olhos da vampira se focaram em Finn e ela estava alheia ao súbito interesse da Elemental do Ar por ela. Alexis seguiu o olhar de Roslyn. Sua boca se curvou em um sorriso cruel quando ela avistou Finn, que tinha meio levantado a mão em saudação a Roslyn. Agarrando o braço de Roslyn, Alexis virou as costas e depois gritou um comando a Stephenson. Ele agarrou Roslyn pela cintura e começou a carregá-la para fora do salão. Os dois capangas o ladeando. Umas poucas pessoas deram ao grupo olhares curiosos, mas ninguém se mexeu para intervir. As pessoas podiam ser mais ricas em North Town, mas eles não gostavam de se envolver nos problemas dos outros mais do que os de Southtown.
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Roslyn não sabia o que diabo estava acontecendo, mas ela começou a lutar. Um gigante arrastando você para qualquer lugar nunca era uma coisa boa. A vampira enterrou as presas no antebraço de Stephenson, antes que ele a tirasse da sala. Finn pulou da cadeira atrás deles. Oh, foda-se. Eu tinha começado a me mover assim que ouvi Roslyn chamando o nome de Finn. Tal como tinha Donovan Caine. Nossos passos martelavam no tapete enquanto corríamos para a saída. Mas havia muitas pessoas para que pudéssemos correr em linha reta. Ziguezague, ziguezague, ziguezague. Isso foi tudo o que fomos capazes de fazer. Eu tinha acabado de ver uma abertura, um buraco no meio da multidão, quando alguém parou na minha frente, bloqueando o meu caminho. Olhei para cima. O gigante que Mab tinha mandando atrás de mim antes. — Aí está você — ele rugiu. — A senhora Monroe quer dar uma palavrinha com você. Sem tempo para ser sutil. Eu dirigi o meu joelho em sua virilha. Ele gritou e se inclinou. Eu já tinha colocado em minha palma uma das facas de Silverstone, então eu acertei na traquéia dele com o punho da faca. Asfixiando, ele cambaleou para trás. O traseiro do gigante acertou em uma mesa e capotou. Bebidas e comida foram espalhadas por todo o lado. Gritos e maldições surgiram, mas eu já estava fora da porta. Foi um tiro certeiro do salão de baile até á entrada da frente do clube de campo, mas eu não vi Alexis James, Stephenson, ou Finn no corredor. Eles só podiam estar lá fora. Passar pelo gigante tinha me custado segundos preciosos. Corri pelo corredor em direção à porta da frente. Os passos de Donovan Caine arranhavam o tapete atrás de mim. A porta para o exterior estava aberta, deixando o fluxo de sol da tarde espreitar pela entrada. Mas isso não me aqueceu. Nem uma maldita coisa. Corri lá para fora. Minha cabeça girou para a esquerda, depois para a direita. Ali. Uma limusine estava parada a meio da descida da colina íngreme que levava à entrada do clube. Wayne Stephenson esmagou o seu punho no peito de Finn. Seu corpo cedeu imediatamente. Inconsciente. Stephenson empurrou-o na parte de trás da limusine e depois entrou também nela. Alexis James, Roslyn Phillips e os outros dois capangas já deviam estar lá dentro porque não havia sinal deles. — Finn! — eu gritei, correndo nessa direção. — Finn! Tarde demais. A porta se fechou. Pneus chiaram, a limusine se afastou e desapareceu no sol de fim de tarde.
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Capítulo 27 Por um momento, eu fiquei lá, sem acreditar totalmente no que tinha acontecido. Alexis James tinha Finn e Roslyn Phillips. Sorte, essa vadia caprichosa, realmente me ferrou hoje. Donovan Caine veio atrás de mim. Em alguma altura durante a comoção, o detetive tirou a arma do seu coldre de tornozelo. Então o treinamento de Fletcher tomou posse, como tem feito regularmente. Meus olhos se estreitaram em volta e em frente. Muitos motoristas de limusines haviam saído de seus carros, se perguntando o que era todo aquele drama. O camareiro de smoking olhou para mim pela porta da frente boquiaberto. Uma vez que ele tivesse recuperado o fôlego, o gigante de Mab Monroe não estaria muito atrás. — Nós precisamos sair daqui. Agora — eu disse em voz alta. Eu entrei silenciosamente no estacionamento. Donovan Caine guardou sua arma e me seguiu. Uma vez que nós não queríamos correr o risco de dar um carro roubado ao camareiro, Finn decidiu não roubar outro carro e em vez disso dirigiu seu próprio Benz para o clube country – e ele ainda tinha as chaves. Hora de arrumar outro carro. Eu me apressei entre várias fileiras de carros enquanto saía da linha de visão dos motoristas de limusines e camareiros curiosos. Depois de mais ou menos dois minutos de procura, eu encontrei uma BMW antiga – pré-alarme, em outras palavras. Eu usei o punho da minha faca para estraçalhar a janela, então dei partida no carro. Finn não era o único que podia roubar carros, embora ele fizesse isso com muito mais desenvoltura e muito menos bagunça. Eu escorreguei para o volante. Donovan Caine sentou no assento do passageiro. Nenhum de nós disse uma palavra quando eu alcancei o gás e o carro rugiu do clube country. Eu dirigi por volta de duas milhas, encontrei na esquina o primeiro posto de gasolina e parei o carro. Então eu tirei meu celular da minha bolsa. — O que você está fazendo? — Donovan perguntou. — Ligando para Finn.
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O telefone tocou uma vez. Duas vezes. Três vezes. Quatro. — Alô? — ao invés da voz de Finn, a voz de Roslyn sussurrou na linha. — É Gin. — Mil desculpas, Gin. Eu não me toquei... — Tudo bem, Roslyn — eu disse, tentando suavizá-la, deixá-la calma. — Não é sua culpa. É minha, por ser tão descuidada. Tudo vai ficar bem. Você voltará para casa com Catherine em breve. Agora, bote Alexis James na linha. Eu apertei o botão, ativando o alto-falante e estendi em direção a Donovan Caine, então, ele poderia ouvir a conversa também. — Quem é? — uma voz de mulher veio na linha. Fria, dura, convencida. — Olá, Alexis — eu disse. A gargalhada de Alexis James ecoou no falante. — Então você conhece minha voz. Ótimo. Fará as coisas mais fáceis. — Onde está sua irmã? — eu perguntei. — Onde está Haley? Eu preferiria muito mais lidar com Haley James. Ela parecia estar um pouco receptiva à minha proposta para fugir. Mas mais que isso, ela estava com medo do que eu poderia fazer se ela não cedesse às minhas demandas. Haley estava com medo de que eu virasse a informação para Mab Monroe e deixasse a Elemental de Fogo tratar dela e da irmã. Haley não queria morrer nas mãos da Elemental de Fogo como seu pai Lawrence, morreu. Mas Alexis James não era como Haley. Ela tinha muita fome de poder para ser sensível, para ter medo de Mab. A tendência de insanidade tingia sua voz, um pequeno toque que eu podia ouvir entre o convencimento. Alexis estava viciada em sua própria magia e não queria que isso acabasse. Nenhuma dúvida de que ela pensava que podia acabar com Mab Monroe. Ela provavelmente pensava que era a Mulher Maravilha também. E afora, Alexis James tinha uma coisa que eu queria, algo com que me preocupo, Finn. Isso não vai terminar bem. Para nenhum de nós. — Haley se foi — Alexis disse.
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Meus olhos cinza se estreitaram. — O que você quer dizer com se foi? — A vadia decidiu fugir disso — Alexis riu com desdém. — Me disse sobre as suas demandas pretensiosas. Ela disse que as coisas estavam ficando complicadas demais e foi embora. Aquilo explicaria por que Haley saiu correndo do Country Club antes da irmã dela. — E você não foi atrás dela? Alexis riu. Novamente, uma delicada nota de chateamento cobriu sua voz. Atrás de mim, Donovan Caine inclinou a cabeça. Ele ouviu aquilo também. — Por que eu iria? Haley estava só me vigiando, sempre me dizendo para ser cautelosa e sensível. Deixei-a fugir e se esconder de você e Mab Monroe e todas as outras pessoas assustadoras por aí. Estou melhor sem ela — amargura rastejou pela sua voz. — Sou eu com quem você está tratando agora, não ela. Eu não disse nada. Barulhos fracos e abafados poderiam ser ouvidos nos fundos. Um carro buzinou ao longe. Eles ainda estavam na limusine, ficando mais e mais distantes do Country Club a cada segundo. E eu não tinha a menor ideia da direção que eles haviam tomado. Nenhum caminho para vistoriar ou seguir eles. — E com quem eu estou falando? — Alexis perguntou. — Você sabe exatamente quem é. Você e seus garotos estão sendo seguidos por mim há dias. — Eu quero ouvi-la dizer. Eu respirei profundamente. — Eu sou a Aanha, a assassina que você contratou e em seguida traiu. Donovan Caine se encolheu nas palavras a aranha. Elas o lembraram mais uma vez de quem e o que sou, mesmo que ele tenha se deixado esquecer por uma hora. Seu rosto ficou sério e a culpa transpareceu em seus olhos. Caine estava pensando em Cliff Ingles, seu parceiro e como ele o traiu por me fuder – e curtiu o máximo disso. Os lábios do detetive, aqueles que estavam tão quentes e abertos contra os meus, se apertaram bem forte, uma linha fechada. Droga e droga dupla. Agora não era a hora de Caine começar a me odiar novamente e prometer me trazer à justiça não importa o quê.
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— O que você quer Alexis? — eu perguntei. — O pendrive e qualquer cópia que você tenha feito dele — ela disse. — Em troca? — Você pega os seus amigos em mais ou menos um pedaço. Uma série de slap-slap-slaps soou, seguido por um gemido alto. Finn, tendo a merda batendo nele pela segunda vez em menos de uma semana, provavelmente pelo Capitão Wayne Stephenson. Uma dolorosa, duvidosa proeza. Um slap final soou, seguido por um intenso, grito abafado. Roslyn. O gigante tinha batido forte o bastante para a vampira sentir. Minha mão livre se fechou em punho. — Escute vadia. Eu não pago por mercadorias prejudicadas. Você diz a Stephenson para parar de bater no meu homem agora mesmo. E se ele ou seus dois outros tontos sequer pensarem em tocar na mulher sobre qualquer maneira, eu mesma darei o pendrive a Mab Monroe e deixá-la procurar e encontrar você. Inferno, ela provavelmente fará o prefeito me dar uma medalha por trazer você para os cuidados dela. Silêncio. Um risco calculado. Alexis James pode não ter medo da magia de Mab Monroe, mas ela tinha que perceber que deixar a outra mulher envolvida apenas faria o pior com ela. É por isso que Alexis me contratou e me traiu em primeiro lugar – para alisar seu caminho numa glória usurpada. Alexis ainda precisa do pendrive para desaparecer, esperançosamente mais do que ela queria machucar Finn e Roslyn ou recusar o meu blefe. Mas eu não estava blefando. Eu faria exatamente o que eu prometi – exceto que eu encontraria um caminho para chegar a Alexis James antes mesmo que Mab Monroe fizesse. — Aceito — uma promessa relutante, envolta de incertezas. — Onde você quer fazer a troca? — eu perguntei. — Na pedreira velha que fica na periferia da cidade. Você conhece? Eu fechei meus olhos. Memórias e imagens passaram pela minha mente. Jogando lá com Bria quando criança. Encolhida sob os afloramentos rochosos após a Elemental de Fogo ter assassinado minha família. Jo-Jo sentada comigo dentre as rochas, me ensinando a dominar minha magia Elemental. Fletcher debruçado sobre um assento que parecia laje de pedra lendo um livro enquanto eu corria em volta da pedreira, que circundava o meu caminho por todos os lados. — Eu conheço.
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— Duas horas. Esteja lá com o pendrive, ou seus amigos morrem. Lentamente. Alexis desligou. Eu apertei um botão, fazendo o mesmo, depois olhei para Donovan Caine. O detetive me olhou de volta, seu olhar duro de policial enrugando sua face. Eu suspirei. — Vá em frente e diga. — Isso é culpa sua. Alexis James tem reféns por sua culpa — seus olhos congelaram. — Porque você estava muita ocupada me fodendo para vê-la. — Não tinha jeito de saber que Roslyn chamaria Finn e que Alexia pegaria os dois — eu disse. — Eu admito que deixar Finn no bar foi um descuido da minha parte. Os olhos âmbar de Donovan Caine se encheram de nojo. — Um descuido? Seu desgosto, sua raiva, me esfaquearam, perfurando meu coração. Mas eu botei o sentimento de lado. Agora não era o tempo de emoções. Agora era a hora de ser tão fria e dura quanto à magia do Gelo e da Pedra que corria em minhas veias. — Você não está chateado por causa de Finn e Roslyn. Você sabe que foi um acaso, algo que aconteceria uma vez a cada cem — eu atirei. — Não, você está chateado porque você não me afastou naquele armário. Admita. Você era um participante por conta própria, detetive e gostou muito mesmo. Portanto, não coloque toda a culpa por este acidente em mim — Caine cerrou as mãos em punhos. Parecia que ele queria dar um soco em algo – em mim. — Você pode me culpar e me odiar e me chamar de todos os nomes feios que você quer mais tarde — eu disse. — Finn e Roslyn estão em perigo. Você viu a foto do meu treinador, o que Alexis James fez com ele. Ela vai torturar os dois exatamente da mesma forma. Você pode me ajudar a salvá-los, ou você pode ficar no meu maldito caminho. Você escolhe detetive. Donovan Caine olhou para mim, o ódio e nojo brilhando como o fogo brilhante em seus olhos. — Eu vou ajudá-la pela Roslyn. Porque ela tem uma sobrinha que ela ama. Porque ela é o tipo de pessoa que eu jurei proteger. Mas eu não estou fazendo isso por Finn e com certeza não estou nem aí para você. Eu não poderia me importar menos com você. Estamos entendidos? Suas palavras me rasgaram, mas eu mantive a minha face neutra. Impassível. Dura. Fria.
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— Transparente — eu respondi. — Agora vamos. Usando um caminho tortuoso, eu dirigi o carro de volta para meu apartamento. Olhei no espelho retrovisor, mas ninguém parecia estar nos seguindo. Uma coisa a menos para lidar. Então, novamente, Alexis James não tinha nenhuma razão para me seguir agora. Ela já tinha a vantagem. Donovan Caine olhava para frente, olhos fixos, corpo tenso. Ele não disse nada sobre o percurso, mas eu podia sentir a auto-aversão e o ódio dele fervilhando. Se ele ficar mais quente sob o colarinho, ele espontaneamente entrará em combustão. Quinze minutos depois, nós chegamos ao centro do bairro. Eu estacionei o carro em uma garagem a três quarteirões de distância do meu prédio. Nós andamos o resto do caminho. Eu saí do elevador antes do detetive e fui para a porta do meu apartamento. Enquanto eu brincava com a chave, deixei meus dedos tocarem a pedra. O mesmo sopro, baixo e contínuo soou para mim. Finn não tinha cedido a localização do meu apartamento. Eu sorri. Bom para ele. Muito ruim para Alexis James. Porque parte de mim queria que alguém estivesse à espera lá dentro. Eu teria gostado de botar para fora a minha raiva, matando alguns dos capangas de Alexis James. Abri a porta e entrei no meu quarto, sem me incomodar em esperar por Donovan Caine me seguir. Eu tirei meu vestido e o salto alto e vesti minhas roupas de assassina de costume. Calça preta, camisa de mangas compridas, meias, botas. Amassei o vestido de cocktail extravagante e calcinha rasgados e joguei no lixo ao lado da cama. Ambos cheiravam a Donovan e eu não tinha necessidade de nenhuma distração agora. Não com Finn e Roslyn pendurados na balança. Fui até meu armário e abri a gaveta de cima. Um colete fino estava dentro, não muito diferente do que eu normalmente usava em atribuições. Coloquei-o, em seguida, abri a segunda gaveta. Uma linha de facas envoltas em espuma preta brilhou para mim. Enfiei duas em minhas botas. Mais duas sob as mangas. Uma quinta faca dobrada contra as minhas costas. Eu já estava usando o relógio de prata com o fio de garrote dentro, então eu verifiquei uma segunda vez, certificando-me de que o fio poderia ser facilmente retirado do relógio. Eu poderia fazer mais dano com as facas, mas se a oportunidade se apresentasse, eu estrangularia Alexis James com o fio. Ah, eu queria que ela sofresse pelo que ela tinha feito a Fletcher, como os seus homens tinham espancado a Finn e Donovan Caine, por se atrever a me trair em primeiro lugar. Mas a coisa mais importante agora era salvar Finn e Roslyn. Eu teria uma chance melhor de fazer isso se eu matasse Alexis na primeira chance que eu tivesse. Morta era morta. Desde que todo o universo, menos ela ainda estivesse respirando no fim, bem, eu só tenho que ficar feliz com isso. Fletcher teria que entender. Ele preferiria que Finn estivesse vivo a sua assassina torturada. Por que Alexis James não ficaria contente em negociar Finn e Roslyn pelo pendrive. Não, ela veria isso como uma oportunidade de lidar conosco de uma vez por todas. Ela me
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enganou uma vez e faria isso de novo sem hesitar. Mas agora, eu sabia o que estava vindo e estava planejando de acordo com isso. Quando eu estava pronta, voltei à sala, onde Donovan Caine estava se preparando. O detetive tinha tirado o terno de Finn que ele pedira emprestado. Agora, ele usava calças jeans, botas de caminhada, uma camiseta preta e uma jaqueta de couro. Caine se inclinou e prendeu um coldre e um revólver no tornozelo. Quando isso foi feito, o detetive endireitouse. Ele pegou uma arma das costas, ejetou o pente e verificou. Satisfeito por estar tudo funcionando, ele empurrou o pente de volta para a arma. Mas ele não o pôs de lado. Em vez disso, Caine abaixou a arma para seu lado, o dedo não completamente no gatilho. Ele não olhou na minha direção, mas eu sabia o que ele estava pensando. Que eu lhe causei problemas suficientes. Que ele devia apenas me matar agora. Vingar o assassinato de seu parceiro. Ir atrás de Finn, Roslyn e Alexis James sozinho. E acabar com essa atração que sentia por mim. Diversos pássaros, uma pedra, como diria Finn. — Vai atirar em mim, detetive? — eu perguntei com uma voz suave. Meus dedos esfregaram o cabo da faca que eu já escondia na mão. Nada iria me impedir de chegar a Finn. Nem mesmo Donovan Caine e o que eu sentia por ele. O detetive olhou para a arma na mão. Ele não sustentou o meu olhar. — Parte de mim quer — admitiu. — Por tudo o que você fez. Por todas as pessoas que você matou. Você merece morrer. — Provavelmente — disse. — Mas se você me matar, Roslyn Phillips também morre. Alexis James vai te esfolar vivo com a sua magia antes mesmo que você chegue perto para salvar a vampira. O sangue dela estará em suas mãos. O de Finn, também. — Isso é o que você diz. — Isso é o que eu sei — eu disse. — Essas armas de vocês podem ser boas, mas você não tem nenhuma magia, detetive. Seus olhos se estreitaram. — E você tem muita? Eu vi sua magia de gelo. Não é tão impressionante. — Não, não é. Eu não mencionei o fato de que eu podia controlar outro elemento, pedra, muito melhor. Que Jo-Jo Deveraux sempre dissera que eu tinha mais poder bruto do que ninguém
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que ela já tenha visto. Que às vezes o conhecimento do que eu poderia fazer com minha magia de pedra, o que eu tinha feito com ela, até me assustava. — Mas eu não estou preocupada com a moral do jeito que você está. Eu não me importo com o que é certo e errado. Eu estaria perfeitamente feliz em esfaquear Alexis James nas costas na primeira chance que eu tivesse — Donovan Caine não discordou de mim. — Apenas... Apenas me diga. Por que você fez isso? — ele perguntou em voz áspera. — Por que você matou Cliff Ingles? Quem te contratou? Ah, lá estava ela. A pergunta que ele queria uma resposta. O que eu sabia que ele ia me perguntar mais cedo ou mais tarde. Aquela que aqueles deixados para trás sempre perguntavam. A única que talvez pudesse aliviar sua culpa por me foder. — Você não quer saber. — Diga-me — ele exigiu. — Eu preciso saber. Eu tenho que saber. Por toda a dureza dele, por tudo o que tinha visto em sua vida, Donovan Caine ainda era muito idealista. Ainda esperando, ainda querendo acreditar no bem inerente nas pessoas. Por isso, por causa da suavidade que eu sentia por ele, eu não queria dizer-lhe o quão pervertido seu precioso parceiro havia sido. Não quero dizer a ele sobre o estupro brutal da menina e da surra. Saber o que Cliff Ingles tinha feito destruiria as ilusões restantes que Donovan Caine tinha sobre seu parceiro. E, provavelmente, as pessoas em geral. Se você não pode confiar no seu parceiro, então em quem você pode confiar? O conhecimento iria endurecer algo dentro dele, a maneira como o assassinato de minha família tinha feito comigo 17 anos atrás. — Alguém queria Ingles morto, então eu o matei. Eu não mato e falo detetive. Nem agora, nem nunca — eu afirmei. — Eu sei que você acha que seu parceiro era um santo, mas Ingles tinha seus segredos, assim como o resto de nós. Você quer saber por que eu o matei, descubra por si mesmo. O rosto de Donovan se contraiu. Ele não gostou da minha obstrução a ele, mas eu não lhe dei tempo para pensar sobre isso. — Agora você vai colocar a arma e me ajudar? Ou você vai fazer algo estúpido e morrer no meu piso? Caine deu uma respiração profunda, então a soltou. Seus olhos brilharam de ouro e sua mão fechou em torno da arma. Por um momento, eu pensei que ele tinha feito à escolha errada. Uma escolha fatal. Mas o detetive levantou a arma e a prendeu em suas costas.
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— Eu vou te ajudar — disse ele. — Devo-lhe muito por me salvar daquela noite na minha cabana. E eu não posso deixar que as pessoas morram, não importa quem eles são. Caine não disse o que ele faria depois. Eu não perguntei. — Bom — disse eu. — Temos menos de uma hora. Vamos. Voltamos para o carro que eu tinha roubado e olhei o relógio no painel. Quarenta e cinco minutos contados. Uma mão gelada penetrou em meu peito e enrolou meu coração, segurando-o firme, como uma amante, sussurrando todas as coisas ruins que poderiam acontecer. Não havia medo para mim ou para o fato que eu poderia morrer hoje à noite. Uma possibilidade muito real. Alexis James era uma Elemental do Ar que gostava de usar seu poder para matar. Ela era tão perigosa e mortal como eu. Ainda pior, ela estava no auge de sua magia, chegando a rebentar pelas costuras, como uma boneca de pano lentamente perde seu recheio, um pedaço de tecido inchado de uma vez. Não, meu medo não era por mim. Era pelos outros. Medo de Finn, mesmo Roslyn. E o que a Elemental pode já ter feito a eles – ou faria. Apesar de sua promessa, Alexis James pode ter decidido ter um pouco de diversão com a comida. E eu me perguntava se eles sobreviveriam até eu chegar lá, ou não. Esculpida em uma das montanhas mais altas na área, a Pedreira Ashland Rock escondia-se como um leproso na orla da cidade. A determinada altura, a pedreira tinha sido um dos setores focais na cidade, empregando milhares de pessoas. Mas quaisquer que fossem as rochas ou os minérios ou as pedras preciosas escondidas debaixo da terra estava a muito esgotadas e agora a pedreira estava vazia, com apenas o murmúrio das pedras para quebrar o silêncio. As únicas pessoas que vinham aqui estes dias eram anões que batiam contra as paredes da pedreira pura, com suas pequenas picaretas, procurando algo brilhante para levar para casa para as crianças. Chegamos à pedreira quinze minutos antes do nosso tempo acabar. Eu me aproximei da área sul, tomando uma estrada de acesso pouco usada que eu lembrara usar mais de uma vez quando criança. A mesma estrada de acesso que Bria e eu costumávamos pular amarelinha quando crianças. — Já esteve aqui antes? — Caine perguntou. As primeiras palavras que ele tinha falado desde que tínhamos deixado o apartamento. — Muitas pessoas não sabem sobre essa estrada. — Quando eu era criança, costumava vir aqui e brincar algumas vezes. O detetive deu-me um olhar estranho, mas ele não se intrometeu. Eu não ofereci mais nenhuma informação, como o fato de eu também chegar à pedreira para ouvir as pedras
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falarem comigo. Para sintonizar-me com as vibrações diferentes que ela exalava. Para praticar minha magia. Para encontrar um pouco de paz em um mundo que tinha sido virado de cabeça para baixo. — E você? — eu perguntei. Ele deu de ombros. — Só para o ocasional despejo de corpos por parte dos assassinos. Era um local popular há alguns anos. Nós ainda viemos aqui várias vezes por ano. Na primavera, Cliff e eu... Eu nunca soube o que Cliff e ele fizeram na primavera. Caine calou-se e olhou pela janela. Meditando. Sobre mim, sobre nós, sobre o fato de eu não ter contado a ele porque eu tinha assassinado o seu parceiro. E, que talvez, apenas talvez, Cliff Ingles tinha conseguido exatamente o que ele merecia. Poucos minutos depois, passei o carro em um posto de árvores de carvalho silvestre cerca de uma milha fora da pedreira, estacionei e saí. Assim fez Donovan Caine, que virou para mim sobre o capô. — Por que você está parando? — Caine perguntou. — Nós não estamos tão perto da pedreira. — Porque você não está vindo comigo. — Por que não? — Alexis James é uma Elemental do Ar — disse eu. — Você não vai ter uma chance contra ela. — E você? Eu balancei a cabeça. — Goste ou não, eu posso fazer coisas que você não pode, Detetive. Além disso, Alex está esperando que eu vá sozinha. Ela não vai gostar de companhia. Isso fará com que ela fique nervosa. Eu vou chamar a atenção dela, manter seu foco em mim. Seu trabalho é correr atrás dela e tirar Finn e Roslyn de lá, não importa o quê. Alexis certamente terá Stephenson com ela e, provavelmente, os dois capangas do country club. Você precisa eliminá-los, se temos alguma chance de sobreviver a isso. Você pode fazer isso? O detetive assentiu. — Ótimo. Vamos acabar com isso.
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Donovan Caine olhou para mim uma última vez e nossos olhares se encontraram. Ouro em cinza. Eu sabia o que ele estava pensando. A mesma coisa que eu. Duas horas atrás, tínhamos estado enterrados um dentro do outro. Agora, nós dois estávamos provavelmente no caminho da nossa própria morte. Ironia. Outra vadia. Mais uma vez senti aquela pontada de suavidade em meu peito, mas eu tomei cuidado para não mostrar isso em meus olhos ou em meu rosto. Se ele percebesse, se ele fosse gentil comigo agora, eu não seria capaz de me concentrar. Não seria capaz de fazer o que precisava ser feito. Um luxo que não podia pagar. Nem agora, nem nunca. Caine acenou para mim. Sua maneira de dizer boa sorte. Ou adeus. Fiquei surpresa por ele ter se incomodado com a minúcia, devido à crise que ele teve em meu apartamento. Mas o detetive tinha pulado de volta para a corrida à pedreira. Ele sabia que tinha de trabalhar comigo mais um pouco se ele queria salvar Finn e Roslyn. Em seguida, então ele poderia girar sobre mim. Donovan Caine se afastou e sumiu nas sombras, em direção à parte de trás da pedreira. Eu esperei até eu não poder vê-lo mais, então inclinei meus ombros e comecei a descer um barranco à frente do buraco. Enquanto eu caminhava, eu toquei as várias facas escondidas no meu corpo. Uma em cada manga. Mais duas em minhas botas. Uma contra as minhas costas. O metal frio de Silverstone das armas confortou-me, do jeito que sempre fez. Alexis James podia me matar, mas eu não ia facilitar. Eu andei cerca de meia milha antes de ver uma entrada para a pedreira. A cidade tinha desistido a muito tempo de a manter livre de vagabundos e filhos rebeldes e em um sinal enferrujado lia-se Entre por risco e conta própria. Os restos de um portão de ferro alto rodeava a entrada, mas eu fui por um espaço onde alguém tinha arrancado às barras soltas, e entrei. A pedreira foi moldada como uma tigela funda e larga que estava sobre uma milha de largura. As paredes da pedreira estavam a várias centenas de metros acima da minha cabeça. Pedaços de quartzo brilhavam na penumbra cinzenta, lembrando-me de câmeras em um evento esportivo. Por um momento, eu senti como se estivesse em uma espécie de coliseu romano. Um gladiador forçado a lutar com tigres e leões e outros homens apenas para que eu pudesse ver o sol nascer. De certa forma, eu acho que eu tinha sido um gladiador desde que eu tinha treze anos, sempre lutando para sobreviver e me distanciando das coisas feias que tinha que fazer no processo. Eu não tinha percebido o quão cansada eu estava até agora. Eu não tinha que tocar as pedras para sentir as vibrações. Com tanto elemento cru em torno de mim, o som tocou minha cabeça, um baixo e cortante tamborilar, pontuado aqui e ali por batidas repentinas de mal estar e antecipação. As pedras sabiam que algo estava errado, que algo havia perturbado seu sono e o passar lento do tempo e anos além dos habituais cervos, esquilos e
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estúpidos jovens bêbados que pulavam do alto e caíam para a morte. Eu fiz a curva e lá estava ela. Alexis James. A Elemental do Ar estava em aberto, cerca de 500 metros da pedreira, onde as paredes de pedra subiam para seu maior pico. A luz branca bruxuleante em suas palmas banhando a cadela em um brilho angelical que ela não merecia. O vestido de cocktail elegante de Alexis tinha ido embora. Ou pelo menos encoberto. Agora ela estava vestindo o mesmo manto negro que ela usava fora da cabine de Donovan Caine na noite em que ela veio para torturar e matar ele. Eu me perguntei se ela tinha usado a mesma coisa quando ela tinha assassinado Fletcher. Se o sangue de meu mestre estava preso no tecido. O material ondulando fez Alexis parecida com algum mago de um livro de Harry Potter. Realmente não combinava com as pérolas que cercavam seu pescoço ou o grande dente de tubarão que estava pendurado no meio da vertente brilhante. O mesmo colar que ela usara na foto de pesca com Giles Gordon que fora escondida. Eu olhei a runa. Poder. Força. Prosperidade. O dente era tão grande como a palma de uma mão e polido com alto brilho. A runa era ainda maior do que o rubi de um sol que Mab Monroe gostava tanto de usar. Alexis James se mostrava para mim. E ela não estava sozinha. Meus olhos foram para Finn e Roslyn. Ficaram lado a lado, com as mãos amarradas atrás das costas com algemas de prata. Finn ostentava uma série de novos cortes e hematomas em seu rosto. Uma das faces de Roslyn estava vermelha e inchada. Suas roupas estavam rasgadas e sangrentas mas, além disso, eles pareciam não estar muito pior. Melhor do que eu esperava. Alexis tinha mantido sua palavra sobre uma coisa, pelo menos. Três homens armados ladeavam Finn e Roslyn, formando um triângulo potencial de morte ao seu redor. Os mesmos três homens que haviam entrado na limusine no country club. Capitão Wayne Stephenson. O amigo de Charles Carlyle do Cake Walk. O terceiro fracassado anônimo. Eles deviam ser todos os homens que lhe restavam. Caso contrário, ela traria todos aqui para me atar. É bom saber que eu já eliminei o resto dos seus soldados. Isso significava que não haveria ninguém para conversar após o fato. Eu me perguntei se Donovan Caine já havia dado a volta por trás da árvore deles. Se ele podia ver seu oficial superior apontando uma arma para a cabeça de Roslyn. Finn assentiu e me deu um sorriso encorajador. Roslyn estava pressionada contra ele. Suas presas apareceram sobre os seus lábios. A vampira estava pronta para morder qualquer um que lhe desse a oportunidade. Bom para ela. — Assassina, que bom que você finalmente se juntou a nós — Alexis James disse, jogando para trás o capuz do seu manto.
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Capítulo 28 — Então você é a misteriosa Aranha... — os olhos azul-esverdeados de Alexis James caíram sobre mim. — Eu pensei que você era mais alta. Eu devolvi o olhar frio dela com um dos meus. — E eu pensei que você teria mais gosto do que usar uma capa clichê de bruxa. O que você é? Alguém com 12 anos? — Ai — ela disse. — Insulto assassino. Eu não respondi. — Você tem me causado alguns problemas, sabe — Alexis disse. Eu dei de ombros. — Problemas têm o hábito de me encontrar. E eu tenho o hábito de lidar com eles. Os olhos dela se estreitaram. — Assim como eu. Nós olhamos uma para a outra. Magia cintilou como relâmpago no olhar de Alexis, iluminando seus olhos até que eles ficaram quase totalmente brancos. Um brilho similar contornava a palma de suas mãos. Ela estava focada em seu poder, pronta para usá-lo em mim no momento em que eu saísse da linha. Eu podia sentir a magia de Elemental do Ar dela estalando por sua volta como um cachorro nos pés do seu mestre. A sensação do elemento oposto fez minha pele se arrastar. Ou talvez aquilo fosse apenas por que eu vira o que Alexis gostava de fazer com sua magia. Como ela gostava de esfolar as pessoas vivas com a mesma.
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— Então me diga — eu disse, tentando dar a Donovan Caine o máximo de tempo possível para chegar atrás deles. — De todos os assassinos por aí, por que você me escolheu para enganar? — Por que você era a mais fácil de identificar. — Como? — Como é aquele velho ditado? Lábios frouxos, navios afundados? Ou no seu caso, pegue sua foto no noticiário das seis — Alexis riu alto da sua inteligência óbvia. — Você não deveria saber, mas meu velho amigo Gordon Giles gostava de visitar prostitutas. Parece que ele precisava de um pouco de ajuda para levantar a coisa e estava embaraçado pelos relacionamentos mais tradicionais. Eu tinha visto exatamente o tipo de relacionamentos que Gordon gostava de ter nas suas fotos – os que envolviam trajes. — Quando eu caí na real que Gordon suspeitava sobre para onde o dinheiro da companhia estava indo e estava se metendo por aí. Eu fiz Stephenson o seguir e pegar as mulheres com quem ele estava se encontrando e o que ele tinha dito a elas — Alexis continuou. — Gordon era esperto o suficiente para ficar de boca fechada para as putas, mas Stephenson pegou algumas informações interessantes de uma delas. Informações sobre uma assassina chamada Aranha. Então foi como eles nos encontraram. Nenhuma ação fica impune. Maldito trabalho pro Bono. — Isso botou para fora que você tinha feito alguns serviços para as prostitutas. Matou um policial para ela. Isso exigiu um trabalho duro, mas eu tratei de identificar seu treinador e o contatei. O resto foi fácil — Alexis sorriu. Eu me lembrei do arquivo que Fletcher tinha pegado de Gordon Giles. Fletcher percebeu a tendência de Gordon a visitar prostitutas. Nenhuma menção a todas as fotos bizarras que eu encontrei com o pendrive. Então Giles tinha visitado a mulher cuja filha havia sido raptada. Aquela que contratara Fletcher e me pedira para matar Cliff Ingles. Nós tínhamos fechado o círculo com a ironia e com a falta de sorte esta noite. Finn olhou para Alexis. Ódio passou em seus olhos verdes, fazendo-os queimar ainda mais brilhantes que os de Alexis. Um músculo se contraiu nas maçãs do seu rosto, mas ele se conteve. Finn sabia mais do que fazer qualquer movimento brusco. Ele sabia que eu daria conta de Alexis – ou morreria tentando.
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— Foi fácil o suficiente de encontrar o velho em uma churrascaria qualquer — Alexis continuou. — Mas você, nós nunca pudemos marcar. Claro que eles não puderam. Eu sofri demais para ter certeza que ninguém jamais me seguisse do Pork Pit até o meu apartamento. Além disso, eu era apenas outra funcionária de um restaurante barato. Como Evelyn Edwards, a enfermeira do asilo, dissera, alguém como eu não poderia possivelmente estar fazendo bico como alguém como a Aranha em meu tempo livre. — Então é por isso que você trouxe Brutus — eu disse. — Para me tirar do Teatro. Desde que você não conseguiu me encontrar para fazer isso pessoalmente depois do crime. — Inteligência, também. Você não é o pacote completo? — Alexis sorriu novamente. — Mas chega de conversa. Vamos focar nos negócios. Você tem o pendrive? Eu o alcancei lentamente no bolso dos meus jeans e o tirei. — Eu tenho. — É isso? — ela disse. — É apenas o pen drive? Você não fez outra cópia? — Eu não consegui copiar. Gordon Giles o codificou com alguma espécie estranha de programa. Você olha para isso da maneira errada e todos os dados se apagam. Uma mentira fácil. Assim que eu saí do meu apartamento, usei meu laptop para enviar um e-mail programado com todas as informações do pendrive. Às exatas 6 horas da manhã de amanhã, o e-mail seria enviado para os oficiais do departamento de polícia, o jornal Ashland Trumpet e Mab Monroe. A menos que eu estivesse viva para pará-lo. Só um pouco de segurança. Eu podia morrer esta noite, mas os dias de Alexis James seriam contados assim que Mab recebesse o e-mail. Eu sentiria a satisfação até morta. — E Donovan Caine? — Wayne Stephenson perguntou. Alexis voltou-se para ele. — E Caine? O capitão olhou para ela. — Ela tinha que ser aquela que o salvou daqueles que mandou atrás dele. Eles devem estar trabalhando juntos. Então cadê ele? Por que ele não está aqui? Você mesma disse. Ele é caso perdido que precisa ser eliminado.
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Alexis rejeitou sua ansiedade com uma rajada de vento de suas mãos. — Nós encontraremos o detetive depois. Ele não pode se esconder para sempre. A assassina está aqui e ela está com o pendrive. Você sabe o que fazer. Mate-a. Agora. Stephenson não hesitou. Ele pegou sua arma e atirou em mim. A bala bateu com força em meu peito, me girando e me jogou no chão. O pendrive voou da minha mão e pousou em algum lugar no chão rochoso da pedreira. Stephenson podia ter sido um policial fajuto, mas sua pontaria era real. A bala em meu coração e morte... Isso teria sido um disparo letal – se eu não estivesse usando meu colete. Eu geralmente usava alguma espécie de colete quando eu trabalhava, especialmente quando eu sabia que estava indo a um encontro que não ia terminar bem. Ficava mais fácil carregar certos suprimentos, como identidades falsas e dinheiro. Mas esse colete em particular era especial por que era banhado com silverstone. O metal era mais forte que Kevlar e pararia qualquer coisa menor que um míssil. Também absorveria a larga quantidade de magia Elemental antes de começar a amolecer e derreter. Engraçado, como ele já se tornara conveniente. Mas a força da bala ainda dói, como se eu tivesse sido atingida por uma bola a noventa milhas por hora. Mas eu rangi os dentes e fiquei perfeitamente deitada, esperando pelo inevitável. O eco do tiro reverberou através da pedreira, estrondando como trovão pelas paredes. Ele desapareceu lentamente, substituído pela quietude estranha. A pedra sob minha face murmurava desconfortavelmente afiada, mas eu bloqueei o barulho. Dez... Vinte... Quarenta e cinco... Eu nem tinha contado um minuto quando eu ouvi as palavras que eu esperava de Alexis James. — Pegue o pendrive — ela disse. — E atire na cabeça dela, apenas para ter certeza. Eu tinha que admirar sua profundidade, se nada mais. Passos colidiam no chão de pedras atrás de mim. A maneira de andar era tão lenta e uniforme que eu não pude dizer qual dos três homens ela mandara. Minha mão enrolou a faca que eu pegara. Não ficou melhor. Uma mão estabeleceu-se em meu ombro e me virou. Eu olhei para o rosto do homem. O amigo de Carlyle de Cake Walk. Os olhos dele piscaram de surpresa e seus lábios repuxaram, revelando um par de presas amarelas. — Ela não está...
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Últimas palavras que ele dissera. Eu apertei minha faca em seu coração. O homem cambaleou para trás e eu usei seu momento para me levantar. O movimento surpreendeu os outros e eles ficaram lá, sem ter certeza do que tinha acontecido. — Corram! — eu gritei para Finn e Roslyn. — Agora! Finn bateu com o ombro no segundo homem, que cambaleou. Roslyn atirou-se contra ele e se mandou. Finn arrancou atrás dela e os dois correram tão bem quanto podiam com as mãos amarradas para trás. Eles desapareceram entre o afloramento de rochas. Stephenson e o outro cara não sabiam o que fazer – seguir Finn e Roslyn ou vir até mim. Eles me escolheram. Eu joguei o homem morto de lado e mergulhei para a minha direita. Mais três balas zuniram em minha cabeça. Eu rolei para cima, peguei uma das minhas facas em minhas botas e joguei-as. A arma pegou o segundo homem no estômago. Ele gritou e soltou sua arma. O homem arrancou a faca do seu intestino, sua mão preta e brilhante com seu próprio sangue. Estupidez dele. Ele deu um passo adiante e caiu do chão. Ele sangrou por mais ou menos um minuto. Aquele deixou Stephenson e Alexis James. Eu peguei minha faca da minha outra bota para poder ter uma em cada mão. Mas o capitão da polícia era mais rápido do que eu pensava. Ele disparou outro tiro. Esse entrou em meu colete também. Eu não consegui evitar cambalear. Ele pôs um novo círculo em meu colete e eu caí no chão. Uma das facas escorregou do meu punho e fez barulho na rocha. — Eu lidarei com ela! — Alexis gritou. — Você pega os outros dois. Agora! Stephenson voltou e começou a correr. Mas o gigante estava fora de forma e seu ritmo era lento e difícil. Eu esperava que Finn e Roslyn tivessem adiantado o bastante para enganá-lo até que Donovan Caine pudesse ajudá-los. Aquele deixou a mim e Alexis sozinhas na pedreira. Eu me arrastei, me preparando para jogar ambas as minhas facas nela. Eu precisava matar ela – agora. Antes que ela recorresse à sua magia. Tarde demais. Mesmo quando eu me apoiei em um dos joelhos. Os olhos de Alexis James ficaram completamente brancos como se ela abraçasse totalmente seu poder. O brilho leitoso nas pontas dos seus dedos se transformou em chamas mágicas, lambendo a pele dela. Em menos de um segundo, as chamas se tornaram uma grande bola de puro poder, queimando como um farol entre seus dedos. — Vá para o inferno, vadia! — Alexis sibilou e lançou sua magia em mim.
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Capítulo 29 Jo-Jo Deveraux estava certa. Minhas facas não iam me ajudar neste momento. Só uma coisa poderia me salvar agora, minha magia. Fechei os olhos e estendi a mão para o poder Elemental em minhas veias. A pedra murmurou sob meus pés, sentindo minha magia subindo. Concentrei-me na pedra e em sua vibração, deixando-a alimentar a minha própria magia, forçando meu poder em minhas veias, na minha pele, cabelo, olhos, roupas. Tornando-os tão duros e inflexíveis como o entulho no chão e as paredes de pedra recortadas que me rodeavam. A bola de magia bateu em meu peito, exatamente onde meu coração estaria. Alexis James não estava brincando em torno de mim do jeito que ela estava com Fletcher. Ela tinha ido para matar no primeiro tiro. Foi como ser atingida por um violento tornado, mas pior. A força da explosão derrubou-me para trás e caí sentada e arrancou minhas facas das minhas mãos, mesmo quando o vento gritou em meus ouvidos. A magia Elemental do Ar bateu em mim, tentando quebrar minha magia de pedra. Tentando dominar-me e tirar a minha pele em um golpe fatal. Pedra e ar não se misturavam mais do que Fogo e Gelo faziam. Elementais opostos nunca se misturavam e eu podia sentir Alexis reagir a minha própria magia. O vento uivava e batia contra o meu corpo ainda mais alto do que antes. Mas eu me concentrei na minha própria magia, ouvindo os murmúrios das pedras embaixo do meu corpo, tirando força a partir deles. Eles ainda estavam aqui, apesar das minas que foram abertas, das explosões e das escavações humanas. Apesar da passagem do tempo e dos rigores dos elementos. Apesar de tudo. Eles sobreviveram e assim poderia eu. Rangi os dentes e empurrei de volta contra a magia do ar, contra o vento golpeando meu corpo e minha pele como agulhas frias. O metal em meu colete também reagiu à escalada do poder, absorvendo alguma, mas não toda a magia de Alexis. Havia muito dela. A peça ficou quente e pesada no meu peito. Eu alcancei mais da minha magia própria de pedra, usando meu poder para conduzir a magia do ar para longe, para empurrá-la para trás, para espremer a vida, a energia para fora dela, extinguindo-a. Funcionou.
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O vento, a bola de magia espancando meu torso, se esmaeceu e morreu, dando baforadas em nada. Mas eu não deixei de lado minha mágica, meu poder. Lentamente movi meus pés, concentrando-me em minha magia, meu elemento, deixando me fazer tão dura quanto eu precisava ser para sobreviver a isto. Os olhos de Alexis se estreitaram. — Eu bati em você no peito. Por que você não está morta? Por que a sua pele, seu corpo, não se transformaram em um monte de musgo? Eu não respondi. Deixe a cadela descobrir por si mesma. Alexis recuou e jogou mais de sua magia de ar para mim. A rajada de vento me atingiu no peito novamente. Nada de errado com a sua pontaria. Eu não caí nessa, mas meus pés deslizaram sobre as rochas, como se eles fossem feitos de gelo. Eu empurrei de volta com minha magia de pedra, esperei até que o vento morreu para baixo, depois comecei a frente mais uma vez. Mas Alexis não iria desistir. Desde que a sua magia de ar não trabalhou do jeito que ela queria, ela enfiou a mão no casaco e puxou uma arma. Ela disparou três tiros. Um perdeu-se no crepúsculo. Uma das balas pegou no meu colete, aumentando o calor no meu peito. O golpe de dor aguda foi o suficiente para me fazer perder o controle sobre a minha magia de pedra, só por um segundo. Mas isso foi muito tempo para o terceiro tiro bater no meu ombro esquerdo, em vez de saltar fora da minha pele, como teria sido se eu estivesse focada corretamente. A dor explodiu em meu corpo, eu podia sentir o sangue quente jorrando da ferida e manchando a minha camisa. Mas eu deixei tudo de lado e agarrei minha magia mais uma vez. Nada importava agora, só matar Alexis. Ela abaixou a arma fumegante. Eu estava mais perto dela agora, perto o suficiente para que ela finalmente percebesse a magia de prata queimando em meus olhos, cinzelado à minha pele. Alexis assobiou. — Você é um maldito Elemental. — Assim como você, sua puta — eu comecei a correr e me atirei para ela. Alexis não estava esperando a passagem e ela não foi capaz de obter outro disparo antes de eu bater nela. Sua concentração quebrou e a arma escorregou de seus dedos. Ela caiu para o chão da pedreira comigo em cima dela. Chutes, socos, agarramento. Eu poderia ter feito melhor, mas a magia de Alexis e a frustração tinham me colocado em um frenesi. Ela absorveu meus golpes afiados como se eu nem tivesse batido nela e rugiu de volta com vários dos seus próprios chingamentos. Chute. Tapa. Soco. Soco. Rolamos voltas e voltas trocando golpes, quando não estávamos jogando nossa mágica uma na outra. Alex me bateu com o vento. Eu a empurrei
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de volta com minha magia de Pedra, bloqueando seus ataques ferozes. Depois de dez segundos, eu estava começando a ficar cansada. Trinta segundos, eu estava sugando o vento. Pela marca de minutos, foi tudo que eu poderia fazer para continuar. Usar tanto da minha magia foi rapidamente me drenando. A bala e o fogo causados no meu ombro não estavam ajudando no assunto. Então Alexis me deu um soco de sorte inesperada e minha cabeça bateu contra a rocha. Por um segundo o mundo escureceu. Minha magia de pedra piscou e começou a escapar, como a água é absorvida pela árida areia. Eu lutava para segurar minha magia, minha força, a concentrar-me sobre ela e nada mais. Se eu largasse a magia, eu estaria morta. Seu poder do Ar lavaria sobre mim e me esfolaria viva, rasgaria a pele e músculo e ossos do meu corpo até que eu fosse nada mais que uma pilha de carne em ruínas. Alexis viu-me enfraquecer. Ela se posicionou em cima de mim e me bateu na cara novamente e novamente. Os golpes ainda me atordoando e minha magia de pedra muito mais enfraquecida. Eu podia sentir a magia do ar agora, a amarração contra a minha pele como um chicote. Bolhas começaram a se formar no meu rosto, pescoço e mãos, a magia e o oxigênio contido forçou seu caminho debaixo da minha carne. Alexis levantou a mão e seus dedos brilharam para a vida. Mais uma vez, a sua magia do Ar fez queimar como a de uma tocha de um soldador. Ela levou a mão para cima, posicionando os dedos acima dos meus olhos. Ela estava indo usar sua magia para colocálos para fora e rasgar a pele do meu rosto. Assim como tinha feito a Fletcher. Sua mão caiu para baixo, mas eu peguei com a minha própria e empurrei de volta. Eu segurei o suficiente da minha magia de modo que sua magia do Ar não rasgasse a minha pele imediatamente, mas era apenas uma questão de tempo. Um minuto. Dois no máximo. Para frente e para trás, nossas mãos oscilando, queimando os dedos se aproximando mais e mais perto do meu rosto até que tudo que eu podia ver era o seu brilho branco leitoso. Mais bolhas incharam na minha pele, ameaçando explodir. Isso era uma agonia suficiente. Eu não poderia imaginar a dor quando rompesse. Eu não ia durar muito mais tempo. Não assim. Fletcher, pensei desesperadamente. O que Fletcher faria? Tentaria matar a puta do jeito que desse. Eu quase podia ouvir a sua voz rouca sussurrando no meu ouvido. — Desista assassina — Alexis cantou. — Minha magia é mais forte que a sua. Você não pode vencer. Ar triunfa sobre a Pedra, neste caso. E foi aí que percebi. Isso é quando eu finalmente percebi que eu estava lidando com isso da maneira errada. Eu nunca iria acertar confrontando alguém de frente. Ataques frontais raramente funcionavam no meu ramo de negócio. Fletcher tinha me ensinado isso. Eu era a Aranha. A mulher que se escondia nas sombras. Ataques furtivos eram o que eu fazia de melhor. Pegar as pessoas, manobrando elas, foi nisso que eu me destaquei. Essa era a minha força real.
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Hora de voltar para ela. Eu tinha bastante suco em mim para uma explosão final de mágica. Talvez duas. Até agora, eu estava na defensiva, tentando bloquear a magia de Alexis. Eu nunca gostei de ficar na defensiva. Eu precisava acabar com isso. Agora. Então eu joguei minha mão direita para o lado, tão longe quanto eu podia de seu corpo e da magia do ar uivando ao redor dela como um lobo invisível. Alexis pensou que eu estava enfraquecendo muito mais. Ela fez uma pausa para se permitir uma risada triunfante. Este luxo custou à cadela sua vida. Com a minha mão estendida, cheguei para a minha outra magia, a minha magia do gelo. Esse elemento tinha sido sempre muito mais fraco do que a minha magia de Pedra. Tudo que eu poderia realmente fazer eram cristais de gelo e cubos, pastilhas e outras pequenas formas. Mas foi o suficiente. A cicatriz da runa da aranha na minha mão gelou. Meus dedos se fecharam em torno da borda da arma irregular que eu tinha criado na palma da mão. Conforto frio. Eu bati com a arma no coração de Alexis James. As chamas cor branca leitosa nas pontas dos seus dedos se apagaram como uma vela apagada por um vento forte. O pingente rompeu em seu peito, então eu joguei a minha mão para o lado e fiz outra. Desta vez, a arma fria entrou em seu pescoço. Virei à cabeça para o lado. Seu sangue respingou em minha bochecha esquerda, picando-a como cera quente. A pressão fez algumas das bolhas estourarem em meu rosto. Rangi os dentes contra a dor lancinante. Os olhos de Alexis James se arregalaram e ela agarrou a arma fria em seu pescoço. Mas eu não queria esperar por ela para puxá-lo para fora. Formei outra e cortei sua garganta com ela. Ela borbulhou e pôs as duas mãos sobre a traquéia. Muito tarde. Eu havia cortado sua jugular. Alexis poderia ter sido capaz de se recuperar disso, se ela soubesse como usar sua magia de Ar para curar em vez de matar. Mas ela não fez. E uma artéria cortada era uo fim da sua força, toda a sua magia preciosa do ar não poderia ajudá-la. Alexis estava certa. Minha magia não era mais forte do que a dela. Eu apenas a usei melhor. Alexis parou em minha frente, seu sangue embebido em minhas roupas, cabelos, pele. A última escória de sua magia entrou em erupção de seu corpo, ressaltando-me uma última vez. O colete pressionou no meu peito como uma pedra escaldante. O metal tinha absorvido toda a magia que poderia e tinha liquefeito. Ele espirrou como a água e vazou da casca do colete. Eu apenas estava lá sob Alexis, concentrando-se na minha própria magia, usando bastante o poder da Pedra para me proteger do vento gritante e do metal superaquecido. Após cerca de um minuto, o sangue de Alexis reduziu a gotas, o vento assobiava a distância. Sempre me espantou como rapidamente a vida, calor, poderia virar morto e frio.
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Juntei força suficiente para rolar a Elemental de cima de mim e tirar o meu colete derretido. Eu joguei o material em ruínas para um lado. Mais vazou do tecido e se agrupou no chão como um rio claro. Voltei minha atenção para Alexis James. Ela fracassou em suas costas, olhando para as estrelas que já tinham começado a preencher o céu escuro. Ela tossiu uma vez e mais do seu sangue respingou sobre a rocha ao seu redor. A pedra sob o corpo dela assumiu um murmúrio áspero. Eu cambaleei para os meus pés, a vendo morrer. Inclinei-me um pouco antes de Alexis James morrer e fiquei olhando para ela. O olhar aflito da Elemental do ar acendeu para mim. — Eu não sei onde você está indo — eu disse. — Mas se você vir Fletcher Lane, digalhe que Gin diz Olá.
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Capítulo 30 A leitosa magia branca no olhar fixo da Elemental Ar escureceu, entorpeceu e vazou de seus olhos. Mas eu não me mexi até que tive certeza que Alexis James estava morta. Eu perguntei à toa se eu deveria pegar sua arma e colocar três na cabeça dela apenas para ter certeza... Clique. Eu estava tão focada em Alexis que não ouvi a arma até que fosse tarde demais. Algo que estava acontecendo muito ultimamente. Virei-me. Wayne Stephenson estava atrás de mim, o nível de sua arma no meu peito. O gigante estava a menos de trinta metros de distância. Ele não iria perder. Não a essa distância. Eu estava exausta demais para alcançar minha magia de pedra novamente, para tentar e endurecer minha pele com ela e meu colete Silverstone estava em um amassado, derretido amontoado em meus pés. Pelo menos eu tinha matado Alexis James primeiro. Finn e Roslyn devem estar seguros agora, assumindo que Stephenson já não tivesse atirado neles. O gordo capitão da polícia não parecia tão bom. Sua respiração saía em cansados suspiros e suor deslizava em sua testa como se estivesse em pé no chuveiro. O gigante olhou para mim, em seguida para o corpo imóvel de Alexis. Ele puxou um lenço branco do bolso do peito do seu terno e enxugou algumas inquietantes umidades fora de seu rosto musculoso. — Eu não posso acreditar que você a matou. Você me fez um favor, sabia — ele disse. — Eu gostaria de nunca ter me envolvido com essa cadela psicótica. Mas ela tinha fotos de mim com uma garota. Não poderia dizer não para ela, para nada disso. Mais confirmações que Alexis tinha estado chantageando Stephenson e, além disso, afirmando minha opinião que esta chantagem foi à forma mais baixa de queda de braço. — E, então, ela me prometeu mais. Mais dinheiro, mais garotas, qualquer coisa que eu quisesse. E tudo o que eu tinha que fazer era encontrá-la, matá-la... Ele estava balbuciando, mas eu não disse nada. Quanto mais tempo ele continuasse falando era mais longo o tempo que eu continuava respirando. Meus olhos se agitaram para
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o chão. Uma das minhas facas permanecia cerca de dois pés longe à minha direita. Eu poderia ser capaz de atacá-lo e lançá-la em Stephenson antes que ele atirasse em mim. Fiquei tensa. Tinha apenas uma chance. Mas Stephenson não estava completamente desesperado. Ele viu que eu estava prestando atenção em suas divagações. Seus olhos afiados. — Mas isso vai corrigi-la — ele disse. — Isso vai corrigir tudo. Vou dizer que você matou Alexis e eu matei você. Vai funcionar. Eu posso fazer isso funcionar. Stephenson levantou sua arma... Eu mergulhei em frente, indo para minha faca e tentando sair do caminho da bala. Um tiro soou fora, em seguida mais cinco em sucessão rápida. Minha cabeça estalou acima. Stephenson caiu sobre mim. Ele cambaleou para um lado, em seguida tombou no chão como um poderoso carvalho que tinha sido derrubado por um raio. Eu vi três pequenas, limpas feridas na parte de trás do crânio do capitão de polícia. O mesmo lugar que Brutus tinha querido atirar-me há alguns dias. Três mais buracos vazavam sangue na volta do gigante: dois em seus rins, um em seu coração. Levantei os olhos para o homem que estava em pé atrás do gigante. O único que ainda tinha sua arma levantada. Donovan Caine. Ele caminhou até o corpo de Stephenson e olhou para seu capitão morto. Seus olhos castanhos escureceram, seu rosto baixou e todo seu corpo apenas cedeu. Mais uma vez, o detetive me lembrou do Atlas, suportando tanto em seus magros ombros. Sentei-me, muito cansada e sangrenta para fazer nada mais. Eu tinha carregado minha parte da carga esta noite também. Os olhos castanhos de Donovan voaram para mim, em seguida para o corpo de Alexis James. Ele se moveu em minha direção, arma ainda apertada em sua mão. Eu me abaixei e espalmei minha faca. Eu não ia deixar o detetive me matar. Nem por causa de Cliff Ingles. Nem por causa de nada. Sobrevivência, não importa o quê. A primeira real lição que Fletcher tinha me ensinado. Uma que eu aprendi antes mesmo de conhecer o velho homem. Mesmo se matando Donovan Caine extinguiria qualquer luz que ainda poderia ser deixada dentro de mim. Caine parou cerca de três metros de distância de mim. — Você a matou. Você matou Alexis. Eu não disse nada.
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— Como você fez isso? — ele perguntou. — Eu vi a magia dela. Ela estava iluminando toda a pedreira com ela. E o vento, você poderia ouvir o vento gritando. Como você pôde evitá-lo? — Eu tive sorte — minha voz estava fraca e rouca. — Alexis está morta. Stephenson está morto. Isso significa que nossa trégua está oficialmente terminada. Donovan Caine ergueu sua arma, apontado-a para minha testa. Minha mão apertou em volta do cabo da minha faca. — Você matou meu parceiro. Eu não disse nada. Se ele começasse a puxar o gatilho, estava acabado. Eu iria esfaqueá-lo e deixar seu corpo aqui com os outros. Eu ia lidar com Finn e Roslyn e os policiais e as consequências mais tarde, junto com minhas emoções. — Você é uma assassina, tudo o que há de errado com esta cidade, tudo o que eu odeio — o detetive apertou seu controle sobre a arma. — Eu deveria te matar aqui mesmo, agora mesmo. Fazer a cidade, ao mundo, um favor. Eu me perguntei se me matando seria um serviço público. Se o prefeito lhe daria uma medalha por isso. Meus rachados, aborrecidos lábios contraíram e eu queria rir. O mais engraçado maldito pensamento que eu tive todo o dia. Inferno, toda a semana. O silêncio estendeu entre nós. Segundos que pareceram uma vida. Caine abaixou sua arma. — Mas eu não posso. Não posso matá-la. Eu sinto algo por você. Desejo, gratidão, curiosidade, não sei o que diabos é, mas isso não vai me deixar matá-la, não importa o que você fez. Então, o que isso me faz? — Um bom homem — eu disse com uma voz suave. Caine negou com a cabeça. — Não, apenas me faz estúpido. Ele jogou sua arma e se afastou. Fiquei ali sentada, pensando no meu indulto e tentando reunir força para mover-me, quando um carro dirigiu para o fundo da pedreira. O mesmo carro que eu tinha roubado do clube de campo mais cedo esta noite. O veículo deslizou para uma parada a poucos metros de distância, levando poeira e sangue. Finn saiu do assento do motorista e correu para mim. Roslyn Phillips também saiu do carro e o seguiu em um ritmo mais lento. Finn parou na minha frente, seus olhos verdes varrendo
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sobre minhas roupas, corpo, rosto. Depois que ele percebeu que eu estava mais ou menos inteira, ele relaxou. — O que aconteceu? — eu murmurei. — Como você conseguiu ficar longe de Stephenson? Finn empurrou sua cabeça na direção de Caine, que estava a poucos metros pensativo sobre o corpo do gigante. — Roslyn e eu corremos na direção do detetive. Ele trocou um bom par de tiros com o bom capitão, que se virou e correu como uma garotinha assustada. Eu balancei a cabeça. Então Caine tinha voltado atrás de Stephenson, não para me salvar. Não é surpreendente, exceto para o desapontamento que agitou em meu peito. Finn ficou me olhando. Momentos depois, ele sorriu. Diversão tomou conta de seus olhos verdes. — O que é tão engraçado? — eu perguntei. — Oh, nada. Mas me diga de quem é o rosto que você pensa que se parece como a merda agora? Toquei minha bochecha e estremeci quando a dor passou por mim. Alexis James tinha sido mais forte do que parecia. Ela havia obtido alguns golpes sólidos, sem mencionar as feias, bolhas inchadas que sua mágica de Ar havia levantado em minha pele. Toda parte de mim sentia dores e feridas e rachados da magia intensa que eu havia sobrevivido, e a bala pulsava em meu ombro. — Meu. — Seu — ele concordou. Finn estendeu a mão e deixei ele me puxar para meus pés e em um abraço apertado. Seus braços fechados em volta de mim e lágrimas quentes picando meus olhos. — Eu pensei que tinha perdido você também — ele sussurrou em meu ouvido. Eu me afastei dando a ele um sorriso torto. — Você devia saber melhor que isso. Roslyn Phillips ficou longe para um lado. A vampira parecia despenteada e cansada. Seu escuro olhar concentrado no sangue vazando das costas de Stephenson. Suas presas brilhavam como pérolas no crepúsculo.
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— Com sede? — eu perguntei Roslyn bufou. — Para aquela merda gigante? Eu acho que não. Eu apenas lamento que eu não conseguisse rasgar o pescoço do bastardo eu mesma. Eu sorri para ela, depois de um momento ela sorriu de volta. Donovan Caine clareou sua garganta. Eu me virei para que pudesse ver o detetive. — Você e Finn precisam sair. Agora. Roslyn, você fica comigo. — Por quê? — eu perguntei em uma voz suave. Caine varreu sua mão sobre os corpos que bagunçavam o chão da pedreira. — Aqui está o que aconteceu. Eu fui para fora da grade para investigar o caso Gordon Giles. Os homens vieram a minha casa para me matar, mas eu escapei deles. Eu tenho estado escondido nos últimos dias rastreando ligações, uma das quais era Roslyn. Graças a ela, eu descobri os arquivos de Gordon, mas Alexis James nos encontrou. Ela nos trouxe até aqui para nos matar, mas eu consegui virar o jogo em seu lugar. — E sobre Stephenson? — Finn perguntou. Caine encolheu os ombros. — Ele estava fingindo trabalhar para Alexis para derrubá-la. Ele veio para o resgate, mas morreu no fogo cruzado. — Você sabia que Stephenson estava trabalhando para Alexis, que ele gostava de abusar de meninas jovens. Por que você está protegendo-o? — eu perguntei — Porque ele tem uma esposa e filha que vão precisar de sua pensão. Porque elas não devem sofrer por aquilo que ele fez — os olhos de Caine brilharam com fogo âmbar, desafiando-me a contradizê-lo. Eu não fiz. — E a mulher misteriosa no Teatro? — Identificação equivocada — Caine disse. — Francis a escolheu para enquadrá-la. Um retrato falado de alguém que realmente nunca existiu. Vou pensar em alguma coisa.
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— Tenho certeza que você vai — eu murmurei. — Onde eu entro? Por que você precisa de mim para ficar por perto? Caine olhou para ela. — Porque pessoas viram Stephenson arrastar você fora do clube privado. E eu preciso de alguém para me apoiar. Eu olhei para Roslyn. — Está tudo bem para você ser a principal testemunha de tudo isso? A vampira deu de ombros, mas eu vi algo cintilar em seus olhos. Culpa. Hum. Algo para se pensar mais tarde. — Pensa que você pode vendê-lo? — Caine perguntou a ela. Roslyn riu. O delicado, ressonante som me lembrou de sinos de vento. — Oh querido, vender a mim mesma foi o que eu fiz por anos. Então sim, eu acho que posso conseguir. Você acabou de me dizer o que você quer que eu diga. Quando estiver pronta, os anjos estarão chorando. Eu acreditei nela. Donovan também, porque ele acenou com a cabeça. — Bem, é agradável e arrumado em tudo — eu disse. — Você acha que seus superiores acreditarão em um conto de fadas bizarro? Caine encolheu os ombros. — Não sei e não me importo. Essa é a história que estou enterrando. Além disso, eu tenho isto — ele levantou o pen drive. O detetive deve ter pegado do chão da pedreira enquanto eu estava tendo minha reunião com Finn. — É toda prova que eu preciso — Caine disse. — Eu já usei meu telefone para ligar. As primeiras unidades estarão aqui em dez minutos. Eu fiz uma careta. — Tempo para que a gente vá, então. — Tempo para vocês irem — ele concordou.
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Finn olhou para trás e para frente entre nós dois. — Vou pegar o carro. Ele trotou até o veículo. Roslyn seguiu-o. Eu balancei para frente e para trás por um momento antes de encontrar meu equilíbrio mais uma vez. Meus olhos se encontraram com os de Donovan Caine. Cinza em ouro. — Eu suponho que isso é um adeus, então? — eu disse. — É. Não me deixe pegá-la novamente — ele disse em tom áspero. — Não serei tão generoso da próxima vez. Havia aquela confiança novamente. Uma das muitas coisas que eu achava tão atraente sobre o detetive. Eu inclinei minha cabeça. — Não se preocupe detetive. Eu sou a Aranha. Eu sei como ficar escondida nas sombras, lembra-se? Culpa e um toque de pesar brilhou nos olhos do detetive, embora ele mantivesse seu rosto duro e remoto. Eu fiz o mesmo, embora uma faca de emoção torcesse em meu coração. Finn e Roslyn disseram seus adeus e a vampira foi ficar ao lado do detetive. Finn puxou o carro roubado perto de mim. De alguma forma, eu tropecei adiante e peguei minhas várias facas e os restos do meu colete arruinado. Depois eu empurrei aberta a porta do carro. Eu caí no assento almofadado e me enterrei como uma boneca de pano, toda força saiu do meu corpo. Finn olhou fixamente para mim. — Gin... — Não esta noite, Finn. Não esta noite. Dirija — eu disse. — Apenas dirija. Coloquei minha cabeça contra o banco e fechei meus olhos.
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Capítulo 31 Finn me levou direto para a casa de Jo-Jo. Desta vez, ele teve que me ajudar a chegar à varanda enquanto ele bateu a nuvem contra a porta. O familiar som de passos pesados soou e um momento depois, Jo-Jo Deveraux abriu a porta. Seus olhos ampliaram ante a visão do meu rosto, agredido e empolado. — Ding-dong — disse eu. — A cadela está morta. Jo-Jo apenas sorriu. — Tem certeza de que não poderia tê-la matado mais cedo, Gin? — Finn perguntou. — Antes de ela fazer a sua pele parecer que você teve o pior caso de catapora? — Eu não sei — eu disse. — Por que não vamos voltar ao tempo e ver como você teria ido contra Alexis James e a magia do Ar? Finn levantou uma sobrancelha. Jo-Jo sentou-se diante de mim, mas eu olhei por cima da cabeça dela. — Shihhh — Jo-Jo disse. Os olhos da anã brilharam com a magia branca. — É mais difícil se concentrar, enquanto vocês dois estão tendo uma de suas brigas. Jo-Jo tinha passado a última hora derramando sua magia em mim. Ao contrário das feridas anteriores de Finn, a maioria das minhas tinha sido causada por magia elementar, o que significava que elas eram mais difíceis de curar, apesar da força de Jo-Jo e perícia. Magia sempre era mais difícil de desfazer do que era para criar, em primeiro lugar. A anã usando muito de sua magia em mim ao mesmo tempo, também doeu como o inferno. Mesmo sabendo que era Jo-Jo e ela nunca me faria mal, meu corpo parecia que ainda estava de volta na pedreira sendo empolado com o ar de Alexis James. É por isso que Sofia Deveraux estava atrás de mim, prendendo meus braços para os lados certificando-se que eu não iria me mover ou tentar me levantar da cadeira acolchoada antes de Jo-Jo terminar comigo.
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Ela mandou outro impulso de sua magia do Ar em meu braço esquerdo, trabalhando a bala que ainda estava ali. Eu cerrei os dentes e olhei para algo além do foco de energia de Jo-Jo, isto fez que as cicatrizes de aranha em minhas mãos coçassem e irritassem, juntamente com o resto do meu corpo. Meus olhos se concentraram nas mãos de Sophia. Ela estava com um esmalte rosa. — Cor legal! — disse eu. Sophia resmungou o seu acordo e reforçou seu poder sobre mim. Eu reprimi um gemido. Eu poderia ter sido presa sob um caminhão e não teria sido tão forte e sólido como as mãos de Sophia. Não é à toa que ela poderia jogar corpos mortos ao redor como se fossem bonecos de plástico. Enquanto Jo-Jo trabalhava, Finn contava as irmãs anãs sobre tudo o que tinha acontecido nos últimos dias. — Então Alexis James realmente pensou que ela ia destronar Mab Monroe? — Jo-Jo perguntou. — Ela não é a primeira a pensar dessa maneira. Pobre menina estava louca, não estava? — Estúpida — Sophia disse em sua voz rouca. Pensei no poder que Alexis James possuía. Seu desejo de assumir a AMC para controlar Ashland não soava como exagero para mim tanto como tinha soado antes. Mas Alexis estava morta agora e isso era tudo que importava. Após Jo-Jo fixar o dano, Sophia soltou os meus braços e ela e Finn foram para a cozinha para pegar algo para comer. Jo-Jo se levantou, foi até a pia e lavou meu sangue de suas mãos. Eu fiquei onde estava na cadeira acolchoada, relaxante. — Você estava errada — eu disse. Jo-Jo limpou as mãos em uma toalha de papel. — Sobre o quê? — Sobre nada ser capaz de penetrar minha magia de Pedra. O poder de Alexis James fez. A anã encolheu os ombros. — Você disse que quebrou sua concentração. Da próxima vez, você vai saber o que esperar. Além disso, você ainda é jovem, Gin. Você está agora plenamente entrando em seu poder.
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— Mas Alexis era mais forte do que eu — eu protestei. — Sua mágica era mais forte. Eu senti isso. Você viu o que ela fez para mim com isso. Jo-Jo me deu um olhar astuto. — Se ela era tão forte, como é que ela está apodrecendo na pedreira e você está sentada aqui na minha cadeira? Eu não tinha uma resposta para isso. A anã deu uma risadinha. — A força pura é uma coisa, querida, seja mágico ou natural. Ela só vai chegar até certo ponto. Mas como você usa o que lhe foi dado, é o que realmente importa. Quando você descobrir isso, ninguém vai ser capaz de tocá-la. Nem mesmo eu ou Mab Monroe. Jo-Jo jogou a toalha de papel fora e começou a arrumar o salão. Enquanto ela trabalhava, eu sentei lá na cadeira ponderando as suas palavras e o medo do frio cresceu em mim. A história de Alexis James vazou na próxima semana. Dizer que foi um circo teria sido subestimar o apetite raivoso da mídia de Ashland. História após a história ocupando a mídia e os jornais sobre James e a trilha de corpos em seu rastro. Donovan Caine deve ter sido um melhor mentiroso do que eu havia lhe dado crédito, porque o policial colocou a culpa de tudo em Alexis e ninguém parecia disposto a contradizê-lo. Haley James poderia ter feito se tivesse sido capaz. Mas sua casa foi queimada até o chão com ela na noite após o incidente na pedreira. Somente a fundação da casa de pedra sobreviveu ao incêndio, juntamente com alguns dentes de Haley. Todo o resto foi totalmente destruído pelo calor. O incêndio foi acidental e o médico legista disse que Hayley provavelmente morreu por inalação de fumaça, já que não foi encontrado um corpo para fazer a autópsia. Mas eu não tinha dúvida que Mab Monroe tinha pegado Haley por ocultar as atividades de Alexis dela. Então a coisa que Haley mais temia se tornou realidade depois de tudo. Ironia. Que puta. Finn fez suas investigações discretas sobre a matéria, estendendo a mão para seus contatos diversos. Ele queria saber se Haley tinha contado coisas a Mab, se ela tinha dito a Elemental de fogo sobre Fletcher, Finn, ou de mim. Sobre o que fizemos ou o que as irmãs James tinham nos contratado para fazer. Mas, evidentemente, Haley nunca tinha tido a oportunidade. Dizia-se que Mab tinha ficado tão enfurecida, pela parte de Haley no regime de desfalques que o fogo Elemental dela tinha fritado o local. Nenhuma pergunta. E com Alexis e o resto de seus homens mortos, não havia ninguém para contar o conto. O que significava que Finn e eu estávamos a salvo de qualquer outra pessoa bisbilhotar ou soprar nossa vida a Mab. Uma semana após o incidente na pedreira, nós enterramos Fletcher em Blue Ridge Cemetery. Eu, Finn, Jo-Jo, Sophia, os garçons e os cozinheiros do Pork Pit, alguns dos
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companheiros de Fletcher, que eram tão retorcidos e antigos e mal-humorados como ele tinha sido. Roslyn Phillips também se apresentou para o serviço, embora a vampira tenha seguido seu caminho. Foi outro dia de outono lindo. Céu azul, sol brilhante, nuvens que estavam mais suaves do que marshmallow. O cemitério estava sobre um platô no alto de uma das montanhas que cercavam Ashland e oferecia uma vista espetacular sobre a cidade e o campo abaixo. A grama sob os pés brilhava como ouro, enquanto a siena queimada e folhas vermelhas pintavam com cores a paisagem ainda mais. As montanhas em torno de nós eram manchas contra o céu azul. Nós escolhemos um caixão simples de madeira polida com alto brilho. Fletcher não queria nada extravagante, ele não tinha sido esse tipo de homem e Finn tinha respeitado a vontade do pai. O pastor tinha acabado de começar o serviço no túmulo e as pessoas já estavam chorando. Vários dos garçons e cozinheiros fungaram em lenços. Os velhos enxugaram os olhos com lenços brancos. Finn fez o mesmo. Jo-Jo Deveraux chorou como um bebê, sem vergonha de suas muitas lágrimas, mesmo que elas estivessem arruinando sua maquiagem. Sophia estava sobre sua irmã mais velha, batendo-lhe nas costas. A jovem anã estava de olhos secos, assim como eu. Eu chorei minhas lágrimas na noite que eu tinha encontrado o corpo de Fletcher. Agora, eu só senti... Vazio. Outro pedaço do meu coração se foi e nunca mais voltaria. Assim como todos os outros pedaços que perdi ao longo dos anos. Enquanto o pastor falava as palavras tradicionais de conforto, minha mente voltou ao dia que Fletcher tinha me levado... Minha família tinha ido há nove semanas agora. Talvez dez. O tempo tinha pouco significado para mim. Tudo o que importava era encontrar comida suficiente para mais um dia e algum lugar que não estava frio demais para dormir à noite. Algo que foi ficando mais difícil com a aproximação do Inverno. Meu local preferido era próximo a este restaurante de churrasco chamado de Pork Pit. Uma rachadura no beco em frente à parte de trás do restaurante era grande o bastante para eu me espremer. Eu gostava do espaço pequeno e apertado, o contentamento mudo das pedras no entorno dos edifícios. Ambos me faziam sentir segura, mesmo que eu soubesse que era apenas uma ilusão. Depois havia o homem alto que dirigia o restaurante. Homem Churrasco. É isso que eu chamava ele. Ele sabia que eu estava lá atrás, mas ele não gritou ou me mandou embora, como as pessoas nos restaurantes italianos e chineses fizeram. Ele chegou a me deixar fazer bicos para ele, como varrer o armazém. Na semana passada, eu ajudei a descongelar o congelador e limpar as manchas estranhas nele. Ele me deu cinqüenta dólares por um dia de trabalho. Eu tinha usado o dinheiro para comprar um casaco de lã preta, uma gola alta e o mais grosso par de luvas que tinham na loja. O homem churrasco era muito mais agradável do que as freiras em cima da cozinha da sopa. Elas queriam salvar sua alma antes de lhe oferecerem um copo de água.
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Hipócritas. O homem churrasco tinha me dado um hambúrguer por um pouco mais de uma hora de limpeza das mesas na frente do restaurante. Lambi a última das migalhas dos meus dedos, tentando fazer com que cada mordida durasse para sempre. Mas o homem churrasco não economizou com a carne e esta foi uma noite que eu não passaria fome, uma das muito poucas. O sanduíche fez-me sonolenta e eu me enrolei em uma bola apertada e cochilei na minha pequena rachadura, tendo sobrevivido outro dia nas ruas de Ashland. Algum tempo depois, as pedras me acordaram com seus murmúrios crescentes de um lamento baixo e constante, graças às runas de proteção que eu jogara no tijolo. Meu próprio tipo de alarme, para me manter a salvo dos vagabundos drogados, prostitutas vampiras e cafetões. Algo que eu tinha visto os elementais da rua fazer. Eu esfreguei os olhos e sentei, segurando o tijolo solto no meu colo. Eu usei a minha magia para arrancá-lo de um dos becos das paredes há poucos dias. Uma arma lamentável, mas era melhor que nada. Só me levou um momento para encontrar a origem do alarme. Um homem estava na sombra à minha esquerda. Eu estava calma, esperando que ele não me visse. Eu era muito boa em ficar quieta e silenciosa. Ser invisível era uma habilidade necessária que eu tinha aperfeiçoado nas últimas semanas. A porta dos fundos do restaurante abriu e o homem churrasco saiu, carregando o lixo do dia. Ele assobiou uma melodia alegre quando ele jogou na caçamba. O homem saiu das sombras. Ele levantou uma arma e apontou-a para trás do homem churrasco. E eu percebi que ele ia matá-lo. Ele ia atirar no Homem Churrasco. — Cuidado! — eu gritei. O homem churrasco virou. Ele viu a arma e apontou para um lado. O tiro passou longe. O homem Churrasco se jogou em cima do outro cara e eles caíram no chão do beco. Chutes, socos, xingamentos. O homem com a arma ficou em cima do homem Churrasco e envolveu suas mãos em torno de sua garganta. Estrangulando-o. Ele ia matar o Homem Churrasco. A menos que eu fizesse algo para detê-lo. Eu tinha visto muitas coisas horríveis na rua. Pessoas baleadas, esfaqueadas, espancadas, viciados em drogas e muito mais. Elementais enlouquecidos pela sua própria magia. Prostitutas vampiras sugando a vida dos que não pagavam. Eu aprendi a não me envolver nos problemas de ninguém. Essa era uma maneira rápida de morrer. Mas o homem churrasco tinha sido bom para mim quando ninguém mais tinha. Ele não merecia ser assaltado por trás de seu próprio restaurante. Além disso, se ele morresse, eu teria que ir para outro lugar. E eu não queria fazer isso. Então, eu procurei por minha magia. Eu deixei o poder da Pedra encher minhas veias, e olhei para a parte traseira do Pork Pit, focando a minha atenção sobre os tijolos cor de ferrugem. Um tijolo que já estava solto começou a se mover e vibrar, soltando-se da parede. Os homens continuaram a lutar. Fiquei ali sentada, segurando a minha magia, esperando a minha chance. O homem Churrasco agarrou aos olhos do outro cara e o estranho se afastou, colocando um pouco de espaço entre eles. Toda a oportunidade que eu precisava. Eu me concentrei e os tijolos vibraram voando para fora da parede. A pesada pedra atingiu o
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homem na cabeça e agarrou seu pescoço para o lado. Eu ouvi o crack em toda a extensão do beco. Um som que eu tinha ouvido antes. O que me fez querer vomitar. Eu tinha quebrado o pescoço. Eu usei a minha magia para matar novamente. Que tipo de monstro eu era? O homem Churrasco engasgou de uma respiração profunda. Em seguida, ele empurrou o outro homem de cima dele e se levantou. Eu me amontoei em meu canto me perguntando se o homem churrasco iria chamar a polícia. Se ele fizesse, eu usaria outro tijolo. Mas apenas para aturdi-lo. Eu não ia matar o homem churrasco. Não ele. O homem Churrasco se abaixou e pegou o tijolo solto. Ele olhou para mim um momento, depois se virou e ajoelhou-se ao lado do outro homem. O homem Churrasco quebrou o tijolo contra a cabeça do estranho mais três vezes. Sangue jorrou por toda parte. Coloquei as mãos na minha boca para não gritar. — Fodidos Clientes. — o homem churrasco murmurou. — Sempre querendo trair você, só assim eles podem economizar um pouco de dinheiro — deixou cair o tijolo e limpou as mãos de sangue em seu avental azul, manchando ainda mais o material gorduroso. Então ele se virou e andou até mim. Encolhi-me no meu canto, minhas mãos apertando o tijolo em meu colo. O homem Churrasco se inclinou até que seus olhos estavam no nível dos meus. Não pela primeira vez, percebi quão brilhantes e verdes os olhos dele eram. Como as luzes de uma árvore de Natal. Seria o Natal mais cedo, mas eu não teria uma árvore este ano. Tudo isso se foi, queimado pelas cinzas do fogo elementar. — Obrigado, garota — o homem churrasco disse. — Você me ajudou a sair de um local apertado lá. Qual é seu nome? — o homem Churrasco não estava fazendo nada de ameaçador, mas eu ainda podia sentir a força em seu corpo. Ele era um homem perigoso. Eu não queria fazer nada para aborrecê-lo. — Gin, Gin — era tudo que poderia sair. Meu nome completo era muito para dizer agora. — Gin — questionou. — Como a bebida? — eu balancei a cabeça, com muito medo de fazer qualquer outra coisa. O homem churrasco me estudou, olhando meus jeans rasgados e os sapatos grandes demais que eu cavava na lixeira. — Onde está sua família? — ele perguntou com uma voz delicada, considerando o sangue em suas mãos e no avental. — Mortos — eu sussurrei. — Todo mundo está morto e enterrado — o homem churrasco me estudou por um momento, depois balançou a cabeça, como se ele tivesse decidido algo. — Você está com fome, Gin. Você gostaria de entrar e comer? Talvez se limpar um pouco? É quente no interior do restaurante.
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Oh, podia ser quente, mesmo que apenas por pouco tempo. Mas eu não era estúpida. Eu não confiava no homem churrasco. Não depois do que eu o vi fazer. Mas eu tinha minha magia e a minha vontade de sobreviver. Se ele tentasse alguma coisa, bem, mais uma morte na minha consciência não importaria muito neste momento. Quanto mais quente poderia ser o inferno? Eu assenti. — Sim, senhor — o homem churrasco se endireitou e estendeu a mão. Peguei as mãos dele e ele me puxou para os meus pés, levando-me para dentro... — Gin? — um par de dedos estalou na frente do meu rosto, quebrando minhas memórias. Empurrei-me para trás e olhei para Finn. — Você ainda está com a gente? — Finn perguntou. Sacudi para longe o resto da memória antiga. — Eu sinto muito, o que você disse? Ele acenou com a cabeça no caixão. — Eu estava a perguntar se queria jogar sua flor agora. Antes de eles começarem a cobrir o caixão. Durante a minha viagem pela minha memória, o pastor acabou de falar e o serviço tinha terminado. O casal de rapazes no macacão manchado de terra inclinou-se sobre as pás na distância, impaciente para entrar com seu sujo trabalho. — Claro — eu murmurei. Dei um passo à frente. Finn já tinha jogado a sua flor, uma rosa branca que descansou no topo da madeira dourada. Havia mais duas, uma rosa da Jo-Jo e uma preta de Sophia. Agarrei a minha rosa vermelha. Os espinhos cavaram na cicatriz de aranha na palma da minha mão direita, picando minha pele, puxando o meu sangue, mas eu não me importei. Deixei escapar uma profunda respiração e joguei minha rosa em cima das outras. As pétalas espalharam quando atingiram a superfície do caixão, beijando-a como se fosse o rosto do homem velho, pouco antes deles fecharam a tampa sobre ele. — Adeus, Fletcher — eu sussurrei.
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Capítulo 32 Um por um, os outros amigos se aproximaram de Finn para pagar-lhe seu respeito e dizer a ele o quanto tristes eles estavam pelo velho homem. Alguns me ofereceram as condolências também, mas a maioria da atenção estava focada no filho de Fletcher, não na menina de rua que ele tinha tirado das ruas. Como deveria ser, eu suponho. Durante um período de calmaria, eu vagueei até Roslyn Phillips. A vampira usava um terno escuro, mas o tecido subjugado fez pouco para disfarçar as curvas de seu corpo exuberante. Um chapéu apropriado empoleirado no topo de sua cabeça e uma brisa leve fez o véu rendado flutuar contra suas bochechas. Movi-me para ficar ao lado dela e ambas assistimos Finn falar com um casal de anões dobrado com reumatismo, artrite e velhice. — Que bom que você veio — eu disse em uma voz baixa. — Eu sei que significa muito para Finn. Roslyn assentiu. — Eu queria estar aqui por ele. O mínimo que eu podia fazer. — Quer dizer desde que você, inadvertidamente, matou seu pai? A vampira enrijeceu como se eu tivesse a esfaqueado com uma de minhas facas. Seus olhos chocados encontraram os meus. — Como você... — Como eu descobri isso? — eu encolhi os ombros. — Admito que me levou algum tempo. O tempo todo que Alexis James estava me perseguindo, eu não conseguia descobrir porque ela me escolheu ou até mesmo como ela encontrou Fletcher em primeiro lugar. Mas ela me disse naquela noite na pedreira. Você a ouviu. Ela tinha informações de uma das amigas prostitutas de Gordon Giles, uma cuja a filha foi estuprada, uma pela qual eu matei Cliff — olhei para Roslyn. — Gordon tinha uma pilha inteira de fotos de si mesmo com prostitutas, a maioria das quais usavam um colar de arco e flecha, que é a assinatura para
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seu clube. A prostituta que Alexis espremeu para obter informações, ela foi uma de suas garotas, não foi? Depois de um momento, Roslyn virou a cabeça confirmando. Não adiantaria negar isso agora. — Eu imagino que a prostituta veio a você, querendo um tempo para cuidar de sua filha, que tinha sido tão brutalmente estuprada e espancada. Você disse a ela sobre Fletcher e Finn. Que eles podiam organizar certos... Acidentes para as pessoas. Quando Alexis James teve Stephenson indo buscá-la, a prostituta tinha de dar-lhes algo para salvar sua própria pele e ela pegou Fletcher e Finn. — Eu pensei que estava fazendo um favor a ela. Eu nunca sonhei que isso aconteceria. Se eu soubesse como isso iria acabar... — Roslyn começou. — Guarde isso — eu atirei. — Está acabado agora. Não há como mudar isso. Ficamos ali, lado a lado e assistimos outra pessoa de luto vir até Finn. Tensão irradiava do corpo de Roslyn como o frio fazia do meu. — Você vai dizer ao Finn? — ela finalmente perguntou. Esperei alguns segundos, deixando-a suar. — Não. Não há nenhuma razão para ele saber e isso só azedariam as coisas entre vocês dois. — Eu realmente me importo com ele — Roslyn murmurou. Olhei para ela com meu olhar frio e cinzento. — Eu sei que sim. E ele se importa com você, que é o porquê de eu estar deixando você viver. Isso e... Catherine. Roslyn franziu a testa. — Catherine? — Ela precisa de você. Eu sei como é ficar sem a sua família. Aquela garotinha merece o melhor — eu me virei, então Roslyn sentiu toda a força do meu olhar duro. — Mas se você sequer mencionar o que eu e Finn fazemos para mais alguém, eu vou fatiá-la e queimar os restos. E tudo o que Finn ou eu precisarmos você vai nos oferecer, você irá agora até eu dizer o contrário. Nenhuma pergunta. Entendeu?
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Depois de um momento, Roslyn assentiu. Alívio brilhou nos olhos dela. Ela sabia que cometeu um erro – e eu a estava deixando ir com facilidade. — Bom — eu atirei. — Agora vá dar suas condolências ao Finn, antes que eu mude a porra da ideia. Afastei-me da multidão e fui em direção ao topo do cemitério. Fletcher Lane não era a única pessoa enterrada aqui que eu conhecia. Uma série de cinco sepulturas estava em cima do cume, à sombra de um carvalho silvestre enorme que parecia furar o céu com seus galhos arcados. Uma estátua de pedra tinha sido montada acima das cinco sepulturas, marcando-as. Apesar de cachos grossos de Kudzu54 cobrirem a pedra e o resto do que tinha sido marcado por chuva e vento, o formato era inconfundível. Um floco de neve gigante. A Runa da família Snow, minha família assassinada. Meus olhos caíram da estátua para as sepulturas. Meu pai, Tristan, sua lápide era a mais gasta pelo tempo. Ele morreu quando eu era uma criança. Eu mal recordava seus olhos cinza, muito menos o que ele tinha sido. Mas as outras – eu lembrava delas em detalhes vívidos. Eira, minha mãe. Annabella, minha irmã mais velha. E Bria, o bebê da família. Runas marcavam suas lápides. Um floco de neve, uma trepadeira de hera e uma flor, assim como os três desenhos que eu fiz. Passei pelas sepulturas até que eu vim para o quinto no fim da linha. Genevieve Snow. Amada Filha e Irmã. Era o que a lápide dizia, junto com as datas de meu nascimento e suposta morte. Uma Runa também tinha sido esculpida na pedra. Um pequeno círculo com oito raios finos saindo dela. Uma Runa da Aranha – idêntica às cicatrizes nas palmas das minhas mãos. Eu pensei que sentiria alguma coisa, olhando para meu próprio túmulo, minha própria sepultura fria, mas eu não senti. Apenas... Vazio em tudo o que eu havia perdido. Primeiro minha família, agora Fletcher. Não sobrou muita coisa para me segurar. — Um amigo seu? — uma voz baixa chamou atrás de mim. Eu me virei para olhar Donovan Caine. O detetive estava a poucos metros de distância. Ele usava um terno preto de funeral que delineava a força magra de seu corpo. Caine se moveu para ficar ao meu lado. Como sempre, ele caminhou com aquela confiança fácil, solta, que eu achava tão atraente. Mas o detetive parecia um pouco mais magro do que eu me lembrava. Um pouco mais pálido e as linhas em seu rosto cortavam um pouco mais profundas em sua pele de bronze, como se algo o estivesse perseguindo. Algo de que ele não conseguia fugir. Eu me perguntei se era eu. Eu certamente pensei sobre ele muitas vezes na semana desde o incidente na pedreira.
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É uma planta nativa do Japão.
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Os olhos de Donovan encontraram os meus. Emoções brilharam nas profundezas avelã, da forma como sempre fazia. Cansaço, determinação, curiosidade. O olhar de Caine deslizou pelo meu corpo, tomando meu terninho preto e meu scarpin baixo, antes de voltar rapidamente para meu cabelo. A cor marrom chocolate agora, com luzes caramelo. Tão perto como Jo-Jo tinha sido capaz de tingi-lo à minha cor natural. Deixá-lo crescer levaria tempo. Sempre levava. Como tantas outras coisas. Seu olhar dourado leu a lápide. — Um amigo? Ou foi alguém que você matou? Pensei na menininha inocente e feliz que eu tinha sido e na noite que tudo mudou. A noite que minha mãe e irmã foram assassinadas. — Você pode dizer isso. O que você está fazendo aqui? Donovan apontou o queixo para os enlutados abaixo. — Eu vim prestar minhas condolências. — Como você ficou sabendo sobre Fletcher? — eu perguntei. Ele deu de ombros. — As pessoas estão muito mais dispostas a me fazer favores esses dias. Pedi para um dos recrutas puxarem todas as mortes que aconteceram na noite em que Giles Gordon morreu. Houve apenas um que combinava com a imagem do celular que você me mostrou. — Hum. Donovan hesitou. – Eu... Eu sinto muito sobre ele, Gin. Eu sei que ele era o pai de Finn, que ele era importante pra você. Eu dei a ele um sorriso torto. — Obrigada, detetive. Ficamos no morro vendo as pessoas se afastarem em direção aos seus carros. Condolências foram dadas e as palavras apropriadas foram ditas. Agora era hora de voltar para a terra dos vivos. Algo de que Fletcher já não fazia parte. — Eu vi você na televisão outro dia — eu disse. — Medalha legal que o prefeito deu a você por resolver o caso de Gordon Giles. Muito grande e brilhante.
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Donovan mudou em seus pés. — Vai para dentro de uma gaveta, com todo o resto delas. Mais silêncio. — Por que você realmente veio aqui, detetive? — eu perguntei. — Da última vez que nos vimos, você esteve muito perto de me matar por ter assassinado o seu parceiro. Ele esfregou a mão através de seu cabelo preto curto e latiu uma risada. — Foda-se... Eu não sei... — Talvez seja por isso. Eu agarrei a gravata dele, puxei-o perto e o beijei. Donovan enrijeceu momentaneamente chocado com a minha ousadia. Mas então, o calor queimou entre nós, tão brilhante e forte como nunca. Uma chama, um fogo que não iria morrer. Donovan rosnou, envolveu sua mão em meu cabelo e me puxou para mais perto, até que eu estava nivelada contra ele. Eu inspirei, deixando seu cheiro penetrante, limpo encher meu nariz. Sua língua encontrou a minha e nós nos derretemos um no outro, derramando nossos sentimentos, nossas frustrações, nossos desejos, em um beijo perfeito. Tudo acabou cedo demais. Eu soltei minhas mãos da gravata do detetive. Donovan Caine se afastou. Nossos olhares se encontraram, cinzento em ouro. Então o detetive se virou e foi embora. Eu esperei um minuto antes de segui-lo em um ritmo mais lento. Donovan Caine se aproximou e disse alguma coisa para Finn, que se mostrou surpreso pela súbita aparição do detetive. Finn hesitou por um momento e os dois apertaram as mãos. Então Caine saiu, passando pelo caixão de Fletcher. Ele não olhou para trás. Eu caminhei até Finn, que estava olhando para a forma recuada do detetive com um olhar confuso em seu rosto. — Eu nunca pensei que ele apareceria aqui — Finn disse. — Bem, ele apareceu. Mas ele se foi agora. Eu não acho que nós estaremos vendo o detetive por um tempo. Não até que Donovan Caine pudesse chegar a termos com o que quer que ele sinta por mim. Não até que ele pudesse reconciliar me querer, a mulher que matou seu parceiro, com a culpa que ele sentia por não vingar a morte de Ingles. Não até que ele pudesse aceitar todas as coisas escuras que eu fiz, todas as pessoas que matei – se ele alguma vez pudesse. Não havia nada que eu poderia fazer para mudar como o detetive se sentia ou para apressá-
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lo. Mas eu era a Aranha. Eu era paciente o suficiente para esperar. Eu vasculhei dentro da minha bolsa, tirei um par de óculos escuros e deslizei-os sobre meus olhos. — Eu verei você em duas semanas. Tente não ficar em muitos problemas enquanto eu estiver fora. Eu odiaria ter que interromper minhas férias para salvar seu traseiro de alguma bagunça. — Onde você está indo? — Finn perguntou. — Key West — eu respondi. — Eu ouvi que os garotos de cabana55 são particularmente oleosos nessa época do ano.
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Cabana boys são atendentes do sexo masculino que oferecem serviços “especiais” a hóspedes em hotéis de luxo, são tipicamente vistos como jovens atraentes, seminus que atendem aos caprichos de seus clientes.
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Capítulo 33 Eu peguei um avião naquela tarde. À meia-noite, eu estava ouvindo o som do oceano vindo da varanda do meu quarto no hotel. O vento açoitava meu cabelo ao redor do meu rosto e soprou o cheiro penetrante de sal até mim. A lua no alto pintava tudo de prata fosco. Eu ergui minha última rodada de gin para as ondas do mar espumoso. Gelo tilintava de encontro ao lado do copo. — Este é para você, Fletcher. Apenas as ondas do oceano me responderam, então eu bati de volta a bebida, fechei a porta da varanda e tropecei para a cama. Nos próximos dias, eu fiz todas as coisas que um turista normalmente faria em Key West. Assisti o pôr do sol sobre Mallory Square. Visitei a casa de Hemingway56. Olhei para os gatos com dedos demais. Fiz um par de passeios de mergulho. Comprei para mim algumas bijuterias de concha e alguns limões verdes verdadeiros. Bebi bebidas tropicais até que eu nunca mais quisesse olhar para um abacaxi ou manga de novo. Uma vez que eu tinha esgotado as armadilhas para turistas, eu descansei a beira-mar, lendo livros e admirando os corpos rígidos dos salva-vidas e os garotos de cabana. Fletcher estava certo. Havia muito por onde escolher. Eu puxei conversa com um deles, Renaldo, que estava se colocando através da escola, trabalhando em meu hotel. Renaldo deixou claro que ele estava mais do que disposto a participar de algumas horas de sexo quente, suado e sem sentido – e que ele não iria mesmo esperar uma gorjeta depois. Mas seus olhos eram marrons, não ouro e eu o mandei embora. Também passei muito tempo olhando para o horizonte, sorvendo barcos de bebidas, e pensando sobre o que eu queria fazer quando retornasse a Ashland. Porque eu não queria voltar a ser uma assassina. Eu sabia das minhas forças, minhas habilidades, minhas fraquezas. Como a Aranha, não havia mais nada para provar a mim ou a qualquer outra pessoa. E isso não seria o mesmo sem Fletcher. Ninguém estaria à espera no Pork Pit por
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Ernest Miller Hemingway – 21 de julho de 1899 / 02 de julho de 1961 – foi um escritor e jornalista americano. Seu estilo distinto, caracterizado pela economia e eufemismo, influenciou a ficção do séc. 20, assim como sua vida de aventuras e imagem pública.
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mim tarde da noite. Ninguém perguntaria se eu tinha sido ferida ou como as coisas tinham ido. Ninguém se importaria. Mais importante ainda, o velho homem queria me aposentar. Tinha sido seu último desejo e eu estava indo honrá-lo, mesmo que eu não tivesse ideia do que eu estava indo fazer comigo. Mas era hora de usar minhas habilidades para outra coisa. O que essa outra coisa era, eu ainda não sabia. Mas eu me encontrei estranhamente ansiosa para descobrir.
Voltei para Ashland duas semanas depois, me sentindo revigorada, rejuvenescida e ainda um pouco queimada de sol e de ressaca por todos os copos de bebidas de fruta que eu tinha tomado. Fui direto para Pork Pit, onde os outros tinham descido esperar para me receber em casa. Já era tarde e a noite havia caído mais em Ashland. A escuridão encobria a rua, exceto pelo porco de neon piscando seu azul e rosa brilhantes por cima da porta da frente do Pork Pit. Eu parei fora nas sombras escuras e olhei através da janela. Finn, Jo-Jo e Sophia já estavam reunidos dentro da loja. Finn bebericava uma xícara de café de chicória no balcão. Eu podia cheirar a fumaça quente e reconfortante mesmo aqui na rua. Sophia empurrou um esfregão para trás no chão. Jo-Jo tremulava para frente e para trás, recarregando a xícara de Finn, limpando as mesas, verificando sua irmã. Não é a família com a qual eu originalmente tinha começado, mas uma família, no entanto. Uma, que eu faria qualquer coisa para proteger. Eu abri a porta da frente. O sino tocou e eu caminhei para dentro. Todas as cabeças giraram em minha direção e um momento depois, eu fui bombardeada com abraços, tapas nas costas e perguntas sobre a minha viagem. Sophia, em particular, me abraçou com tanta força que rachou as minhas costas. Soube bem, entretanto. Enquanto os outros tagarelavam comigo, meus olhos varreram o interior do restaurante. A porta, a caixa registradora, os bancos. Tudo o que tinha sido quebrado na noite em que Fletcher morreu foi substituído. Uma forma turva ao lado da caixa registradora chamou minha atenção e eu percebi o que era – a cópia do velho homem de Where the Red Fern Grows. Sophia deve ter salvado da bagunça. Ainda assim, o Pit parecia muito menor sem Fletcher aqui, mais vazio do que tinha sido antes, apesar da presença dos outros. Eu me perguntei se ele iria se sentir sempre assim para mim agora. Mas este não era o momento de ser melancólica, então eu empurrei todos os meus pensamentos escuros e disse aos outros tudo sobre as minhas férias tão esperadas. Jo-Jo, em particular, estava interessada em meus contos dos garotos de cabana oleosos. Eventualmente, nós quatro sentamos em torno de uma das mesas no meio do restaurante.
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— Eu trouxe a todos vocês algumas coisas — eu disse, alcançando a sacola de palha barata que escolhi em Key West. Os olhos verdes de Finn se iluminaram. Ele amava presentes. — O que é isso? Dinheiro? Bebida cara? Tesouro do pirata há muito perdido? Dobrões? Joguei um saco plástico com limões verdes no seu colo. O rosto de Finn caiu mais rápido do que um bolo torto. — Anime-se — eu disse. — Se você for um bom menino, eu lhe farei uma torta de limão. — Eu prefiro algumas margueritas — ele lamentou. — Você está ganhando uma torta, então se comporte. Finn prendeu seus lábios em uma imitação de beicinho. Chequei de volta a minha sacola e tirei uma pequena garrafa de vidro em forma de concha. — E para você, Jo-Jo, eu tenho este belo frasco de perfume. Ela tirou a rolha e cheirou. — Cheira fresco e salgado, como o oceano. Eu gosto. — E, finalmente, para Sophia, há este item adorável. Eu tirei um colar de couro rosa pálido do fundo da sacola. Minúsculo, pendia dólares de areia da madrepérola. A anã pegou isso de mim. Ela olhou para ele por um momento, depois balançou uma vez. Os dólares de areia estalavam juntos, como sinos ao vento. Os lábios de Sophia se curvaram em um pequeno sorriso, mas mais feliz que eu já vi. — E aí está — eu disse. — A soma total das minhas férias. Eu não disse a eles que eu estava permanentemente de férias de ser uma assassina. Que eu me aposentei de ser a Aranha. Haveria tempo suficiente para fazer isso mais tarde. Finn empurrou seu saco com limões para um lado da mesa. — Bem, eu tenho algo para você também. Várias coisas, na verdade. Eu levantei uma sobrancelha.
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— Como o quê? Finn pigarreou. — A propriedade de papai foi resolvida hoje. O testamento foi lido. Além de uma grande quantia de dinheiro, ele deixou para você mais alguma coisa. — Sério? O quê? Finn abriu as mãos largas e sorriu. — Tudo. Eu não ficava surpresa com facilidade, mas minha boca caiu aberta. Todos os pensamentos fugiram. Levei um momento para formar palavras coerente. — Fletcher me deixou o Pork Pit? Por que ele faria isso? Não é como se eu precisasse de dinheiro, ou de dor de cabeça. — Porque ele sabia o quanto você ama o restaurante — Jo-Jo disse. — Ama isso — Sophia engrossou concordando. Meus olhos traçaram ao logo dos estandes, as mesas, a caixa registradora, o livro sangrento sentado ao lado dele. Eu amava o restaurante, tanto quanto eu amava o velho homem. Eles sempre foram um e a mesma coisa em minha mente. E agora era meu. Um calor reconfortante encheu meu peito que eu não sentia desde antes da noite em que Fletcher morreu. — Papai também queria que você tivesse isso — Finn me entregou um pequeno envelope. Gin. Meu nome estava escrito na frente com a caligrafia apertada e controlada de Fletcher. Fletcher. Eu perdi o velho. Mas isso não me impediu de rasgar o envelope. Um cartão de índice estava dentro. Na frente havia uma nota que dizia: Nunca pense que foi culpa sua. Fosse o que fosse, porém isso aconteceu e você não poderia ter evitado. Faça-nos um favor e não fique no negócio por muito tempo. Viva na luz do dia, criança. Amor, Fletcher. Meus olhos embaçaram um pouco, mas eu virei o cartão para ler o restante do texto. Levou um momento para registrar as palavras, mas quando o fizeram, eu balancei a cabeça e sorri. Cominho. Esse é o ingrediente secreto em seu molho de churrasco. Claro. Cominho, acenei o cartão para Finn. — Fletcher finalmente me disse seu ingrediente secreto. Depois que ele morreu. O velho bastardo.
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Finn sorriu e ergueu um brinde do café em silêncio a seu pai. O verde brilhante dos seus olhos me fez lembrar o velho. — Você tem certeza que está bem com isso? — eu perguntei. — Eu, assumindo o restaurante? Fletcher deveria ter deixado isso para você. Ele era seu pai. — Você está brincando? — Finn perguntou. — Manchas de churrasco é um inferno em camisas de seda. Acredite em mim, estou bem com você tendo o restaurante. Além disso, ele era seu pai também. Mais uma vez, pensei na noite em que Fletcher tinha me levado. Como ele tinha me salvado de vender meu corpo nas ruas. Como ele tinha me ensinado a ser forte e sempre sobreviver. Fletcher Lane poderia ter ido embora, mas eu nunca esqueceria o que ele me deu. — Sim — eu disse. — Eu acho que ele era. O grupo se separou logo depois. Mas bem antes de ela sair, Jo-Jo Deveraux me puxou de lado e me entregou um envelope pardo grosso. — Aqui — ela disse. — Fletcher queria que você tivesse isso também. Era algo que ele vinha trabalhando por um longo tempo. O que você faz com isso, é completamente da sua conta. Eu ergui o envelope. Era pesado, com pelo menos uma polegada de papel enfiado dentro dele. — O que é isso? — Você verá — a anã disse. — Nós falaremos sobre isso mais tarde, quando você estiver pronta. Eu franzi o cenho para o seu tom de voz misterioso, mas Jo-Jo sorriu para mim. — Agora me diga de novo em qual hotel você ficou — a anã disse. — Eu quero dar uma boa olhada naqueles garotos cabana quando eu tirar minhas férias na primavera. No momento em que eu disse meus “tchau”, era quase meia-noite. Deixei Pork Pit, mas eu não fui direto para casa. Eu estava aposentada, não estúpida. Andei três quarteirões, cortei através de alguns becos e dobrei de volta antes mesmo de pensar em ir para o meu prédio. Antes de entrar no meu apartamento, pressionei meus dedos contra a pedra que
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delineava a porta. As vibrações eram baixas e estáveis como sempre. Nenhum visitante desde que eu fui. Bom. Entrei no apartamento e acendi a luz. Tudo parecia igual eu tinha deixado – incluindo os três desenhos de runa em cima da lareira. Eu vaguei pelas imagens. Um floco de neve, uma trepadeira de hera e uma prímula (flor). Os símbolos para a minha família morta. Mas agora faltava um, um que eu precisava adicionar. Eu ia fazer outro desenho, decidi. Um de Fletcher, ou talvez do Pork Pit. Não importa muito, de qualquer maneira. Eles eram um e o mesmo para mim. Embora eu quisesse tomar um banho e cair na cama, eu pulei no sofá e abri o envelope grosso que Jo-Jo Deveraux me deu. Poderia muito bem ver que segredos continha, o que Fletcher tinha trabalhado antes de morrer que merecia tanto papel. Curiosidade. Eu realmente precisava aprender a controlar isso. Desfiz o fecho, puxei para fora o maço grosso de papel e comecei a ler. Era um relatório escrito em letra cursiva masculina. Setembro, 21, arquivo relatado as 07h13min a.m. residência totalmente envolvida em chamas na chegada. Várias vítimas temiam... Demorou alguns segundos para eu perceber que eu não estava lendo sobre algum fogo estranho. Que eu estava lá, que eu senti a língua das chamas na minha pele como um amante, lambendo ansioso. Eu olhei para a próxima página. Uma foto brilhante mostrou os restos carbonizados de um corpo humano, os braços abertos como se estivessem implorando por ajuda – ou misericórdia. Meu estômago se apertou, mas eu continuei. Resultados de autópsias, fotos, relatórios policiais, recortes de jornal. Estava tudo aqui. Tudo o que já havia sido escrito, fotografado, fofocado e especulado sobre o assassinato ardente de minha mãe e duas irmãs, dezessete anos atrás. Fletcher. O velho homem sabia exatamente quem eu era, porque eu tinha vivido nas ruas, o que aconteceu com a minha família. De alguma forma, eu deixei escapar, ou ele descobrira. Deve ter levado anos para ele compilar essas informações. Mas ele tinha. E ele deixou isso com Jo-Jo para me dar. Por quê? Eu me perguntei. Por quê? Qual era o ponto disso? Minha mãe e irmã mais velha, Annabella, estavam mortas. Eu tinha as visto morrer com meus próprios olhos. Reduzidas a cinzas. Elas não estavam voltando. E Bria, minha irmãzinha, tinha sido enterrada viva, pulverizada, pelo colapso na alvenaria de nossa casa. Tudo o que tinha sido deixado por ela, foi algumas manchas de sangue. Ela tinha ido também. Então por que Fletcher tinha me deixado a informação? O que o velho tinha esperado que eu fizesse com isso? Rastrear a Elemental de fogo que tinha matado a minha família? Ter a minha vingança sobre a vadia? Eu estava com os olhos vendados quando ela me
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torturou. Eu não tinha nenhuma ideia de quem era ela, muito menos se ela ainda estava viva. Ou o velho queria que eu fizesse algo totalmente diferente com a informação? Minhas mãos começaram a tremer e eu joguei os papéis sobre a mesa de café antes, espalhei-os por toda parte. Mas eu não fui muito rápida o suficiente. Uma folha solta de papel e uma foto deslizaram para fora da pilha e aterrissaram no chão. Eu olhei para eles. Um segundo se passou. Em seguida, cinco, depois mais dez. Um minuto depois, eu ainda estava olhando para eles. Finalmente, eu suspirei. Porra, porra de curiosidade. A única coisa que eu desejava que o velho não me tivesse ensinado. Eu peguei o papel primeiro. Era branco, exceto por um nome solitário escrito na letra de Fletcher. Mab Monroe. O nome da Elemental de fogo foi sublinhado duas vezes, mas foi só isso. Não havia mais nada no papel. Por que o velho teria escrito o nome dela embaixo e colocado nesse arquivo? Era ela a Elemental que tinha matado a minha família? Ela sabia quem fez? Fletcher sempre desejou vê-la morrer. Era por minha causa? E o que ela poderia ter feito para minha família? Ou será que o velho tinha algumas outras rixas contra ela? Algo sobre o qual eu nunca tinha conhecido? Minha cabeça martelou e eu esfreguei minhas têmporas. Depois de um momento, eu olhei para longe do nome. Eu estava muito chocada para decifrar os motivos do velho essa noite, então eu deixei a folha de lado e peguei a foto. Estava aterrissada no chão. Eu olhei para ela alguns segundos antes das minhas mãos sentirem-se firmes o suficiente para pegála. Havia uma data no verso escrito pela mão apertada de Fletcher. Agosto desse ano. Apenas algumas semanas atrás. Eu virei à foto... E meu coração parou. Porque a mulher sorrindo para fora da foto parecia a minha mãe. Longos cabelos loiros, olhos azul, pele rosada. Mas não era a minha mãe. Seu nariz era um toque muito longo, a boca um pouco grande, seus olhos mais duros do que eu me lembrava. Mas eu ainda reconhecia seu rosto, embora eu só tivesse treze anos na última vez em que a vi e ela tinha apenas oito. Dezessete anos se passaram desde então. A noite terrível que eu pensei que ela tinha morrido junto com nossa mãe e irmã mais velha. Meus olhos trancaram em um colar que ela usava. Um pingente de pedra prata descansava na cavidade de sua garganta. Uma runa, em forma de prímula. O símbolo da beleza. A mesma runa que eu tinha em minha lareira. — Bria — eu sussurrei. — Bria. Minha irmãzinha estava viva.
Fim.
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A série Elemental Assassin continua em…
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Web of Lies:
A curiosidade definitivamente vai me matar um destes dias. Provavelmente em breve. Eu sou Gin Blanco. Você pode me conhecer por Spider, a assassina mais temida do Sul. Eu estou reformada agora, mas os problemas ainda continuam a vir ter comigo. Como no outro dia, quando dois punks tentaram assaltar a minha popular churrascaria, o Pork Pit. Depois houve a situação dos disparos sobre o restaurante. Só que, por uma vez, os tiros não eram dirigidos a mim. Eles destinavam-se a Violet Fox. Desde que eu concordei em ajudar Violet e seu avô a protegerem a sua propriedade de um magnata do carvão malvado, eu comecei a me perguntar se realmente estou reformada. E depois há o Detetive Donovan Caine. O único policial honesto em Ashland está tendo dificuldade em conciliar sua atração por mim com a sua mentalidade de escoteiro. E eu mal posso manter minhas mãos fora de seu corpo sexy. O que posso dizer? Eu sou uma Elemental de Pedra com um pouco de magia de Gelo misturada, mas o meu coração não é feito de rocha sólida. Felizmente, Gin Blanco sempre consegue seu homem... vivo ou morto.
Elemental Assassin 01 - Spider’s Bite
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De noite, Jennifer Estep é uma autora, rondando as ruas de sua imaginação em busca de sua próxima ideia de fantasia. Jennifer escreve a série de fantasia urbana "Elemental Assassin". Os livros se focam em Gin Blanco, uma assassina de codinome Aranha, que pode controlar os elementos de Gelo e Pedra. Quando ela não está ocupada matando pessoas e corrigindo erros, Gin dirige uma churrascaria chamada de Pork Pit na metrópole fícticia do sul de Ashland. A cidade é também o lar de gigantes, anões, vampiros e elementais - Ar, Fogo, Gelo e Pedra.
Elemental Assassin 01 - Spider’s Bite
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