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SUMÁRIO
Agradecimentos, 5 Prefácio, 15 Apresentação, 17 Nota da autora, 19
1. Na redoma: introdução – princípios em direito tributário I, 21 1.1. Legalidade, 24 1.2. Anterioridade, 26 2. Fora da casinha: princípios – continuação, 29 2.1. Irretroatividade tributária, 30 2.2. Igualdade ou isonomia tributária, 33 2.2.1. Non olet, 34 2.2.2. Capacidade contributiva, 34 2.3. Vedação ao confisco, 36 2.4. Não limitação ao tráfego de pessoas e bens, 37 2.5. Uniformidade geográfica, 37 2.6. Não cumulatividade, 37 3. Ressaca tributante: imunidades tributárias, 40 3.1. Imunidade recíproca, 42 3.2. Imunidade para templos de qualquer culto, 43 3.3. Imunidade para partidos políticos etc., 45 3.3.1. Partidos políticos, 45 3.3.2. Entidades sindicais, 45 3.3.3. Instituições de educação, 45 3.3.4. Entidades de assistência social, 45 3.4. Imunidade dos livros etc., 46 3.4.1. Livros, 46 3.4.2. Jornais, 46 3.4.3. Periódicos, 46 3.4.4. Papel, 46
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4. Maçãs caídas: Sistema Tributário Nacional, 47 4.1. Prestação pecuniária, 48 4.2. Prestação compulsória, 49 4.3. Prestação diversa de sanção, 49 4.4. Prestação instituída por lei, 50 4.5. Prestação cobrada mediante atividade plenamente vinculada, 50 5. Depois de um rock sempre vem outro: competência tributária, 52 5.1. Competência privativa, 54 5.2. Competência comum, 55 5.3. Competência cumulativa, 55 5.4. Competência especial, 56 5.5. Competência residual, 56 5.6. Competência extraordinária, 56 6. Oi, sol, seu lindo: impostos, 58 6.1. Impostos, 60 6.1.1. Impostos diretos e indiretos, 62 6.1.2. Impostos pessoais e impostos reais, 63 6.1.3. Impostos fiscais e impostos extrafiscais, 63 6.1.4. Impostos progressivos, impostos proporcionais e impostos seletivos, 63 7. Cuidado, queda adiante: taxas, 65 7.1. Taxas, 66 7.1.1. Taxa de polícia, 67 7.1.2. Taxa de serviço, 67 8. Complicada e perfeitinha: contribuições de melhoria e empréstimos compulsórios, 71 9. Metamorfose ambulante: contribuições I, 77 9.1. Conceito de contribuições parafiscais ou especiais, 79 9.2. Espécies, 80 9.2.1. Contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas, 80 9.2.2. Contribuições de intervenção no domínio econômico, 82 10. Vamos fazer um filme? Contribuições II, 85 10.1. Contribuições sociais, 85 10.1.1. Contribuições gerais, 85 10.1.2. Contribuições de seguridade social, 86 10.1.3. “Outras” contribuições, 89 10.2. Estudo complementar das contribuições, 90 10.2.1. CPMF (contribuição provisória sobre movimentação financeira), 90 10.2.2. COSIP (contribuição para o serviço de iluminação pública), 90 Sumário 8
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2. Fora da casinha:
princípios – continuação
Eu gostei de estudar escrevendo. Toma mais tempo, sim, mas faz essas coisas chatas entrarem na minha cabeça de maneira mais fácil. Apesar de ter dormido bem pouco, acordei estranhamente disposta. Será que estou atingindo um nível supremo em que não preciso mais dormir? Não... Que bobeira... Hoje, outro dia. Menos sol lá fora, mas tudo bem. Eu ficaria com vontade de ir para a piscina se o sol estivesse forte. Delícia ficar estirada feito lagartixa, vendo a pele ficar preta. Adoro. Ainda bem que hoje nem dá. Eu tinha dito que não iria entrar no mérito dos meus conflitos mentais aqui, mas isso sim é uma coisa impossível (aprender tributário não é). Ontem, mesmo tendo voltado para a cama supertarde e bem cansada, consegui alguns minutinhos para pensar em coisas aleatórias. E essas coisas me deixam meio encanadas: será que sou normal? As pessoas, em geral, perdem boa parte da vida questionando as coisas? Porque eu perco. E fico questionando as coisas mais absurdas possíveis. Desta vez me peguei pensando numa frase que tenho tentado traduzir para o português, mas ainda não consegui fazer a concordância correta. Eu tenho isso mesmo (está vendo? Não é loucura minha achar que sou louca). Tem horas em que eu consigo me expressar perfeitamente em inglês, mas em português fica difícil. Ô linguinha difícil essa nossa. A frase é “one day you’re heartbroken, the other day you break someone’s heart”. Pensei nisso porque há algum tempo eu estava toda jururu por conta de um tonto qualquer que desistiu de mim sem dar explicações. Na sequência, fiz a mesma coisa com outro tonto. Exatamente a mesma coisa. Simplesmente não dei mais sinal de vida. Eu machuco as pessoas e depois fico me perguntando se elas estão bem. Será que alguém se pergunta se eu estou bem? Deixa pra lá. Eu estou bem, sim, a propósito. Estou ótima. Mais linda do que nunca.
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Já fiz algumas coisas que precisava fazer agora cedo, e enrolei um pouquinho antes de retomar. Mas o livro está bem aqui, ao lado do teclado do computador, aberto. Eu o deixei nesse lugar estratégico de propósito, e ele continua a me desafiar. Ele diz que não vou conseguir, mas quem disse que eu escuto? Na experiência de ontem, eu me senti absurdamente bem estudando depois de ter escutado aquele lance da auto-hipnose. Hoje, antes de recomeçar, fiz isso de novo. E não é que a redoma voltou? Entrei no meu mundinho, deixei de fora todos os problemas e aqui, agora, só quero aprender e compartilhar conhecimentos. Parei no segundo princípio. Tem mais um monte. Vamos ver até onde eu consigo chegar hoje.
2.1. Irretroatividade tributária Esse é fácil. A lei só pode abranger fatos geradores que acontecerem depois da sua publicação. Assim: uma lei nova determina que a partir de hoje serão tributados todos aqueles que usarem calça jeans. Eu soube dessa lei; então, pobre que sou (não cabem mais tributos no meu orçamento), não vou mais usar calça jeans para não precisar pagar tributo. Mas usei ontem. E antes de ontem. Tenho de pagar o tributo por ter usado a calça antes? Não. Só se eu usar a partir de hoje, quando a lei começou a ter vigência. Fundamento do princípio: segurança jurídica. Se não existisse essa regra, eu nunca saberia quais dos atos que eu pratico seriam ou não tributáveis. Mas olha que importante: é preciso ligar esse princípio ao da anterioridade. Exemplinho: lei da calça jeans, publicada em 5 de julho deste ano. Pela anterioridade anual, só pode ser cobrado o tributo em 1o de janeiro do ano que vem. Ok. Então ainda tenho todo o resto deste ano para usar calça jeans, e isso não vai ser tributado. A tributação só vai começar quando a lei ultrapassar as barreiras da anterioridade. Mas cuidado: isso só vale pra lei que cria ou aumenta o tributo. Ai, meu Deus. Como assim? Muita calma nessa hora: a lei que criou o tributo começa a valer hoje, 29 de março (meu aniversário! E eu ganhei uma calça jeans de presente). Legal. A partir de hoje, então, se eu usar a calça, terei que pagar o tributo. Vamos supor que o pagamento desse tributo deva ser feito no dia 12 de julho. Tá. Eu não resisto, porque o presente que ganhei é muito lindo, e uso a calça. Pratiquei o fato gerador. No dia 12 de julho, vou precisar pagar “x” de tributo. Beleza. Passa-se um mês. Estamos agora no fim de abril. Surge uma lei nova lei que muda a data do pagamento do tributo (ou até mesmo uma portaria; pode, lembra?): eu não tenho mais que pagar no dia 12 de julho, mas sim no dia 5 de maio. E agora? Em que dia terei que pagar? Essa lei nova, que mudou a data do pagamento, pode ser aplicada a mim, que usei a calça jeans antes. Mas como? A lei não se aplicava somente aos fatos que acontecessem depois dela? Princípios 30
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Sim. Mas o que acontece aqui é que essa nova lei não criou o tributo, mas apenas alterou dados formais (a data de pagamento). Então, mesmo que eu tenha usado a calça antes da publicação da lei que mudou a data do pagamento, tenho que pagar o tributo na data nova que ela estipulou. Dois artigos do CTN são importantes aqui. São as exceções. Eles falam das hipóteses em que a lei vai retroagir. O primeiro é o art. 106. E esse é tranquilinho. A lei nova vai se aplicar a fatos que aconteceram no passado nas seguintes situações: ►► se a lei for meramente interpretativa: uma lei que interpreta outra não muda o sentido desta, então ela se aplica sempre. Publicou hoje, se aplica para a frente, para trás, para os lados, para todo canto; ►► lei mais benigna: tratando-se de ato não definitivamente julgado: essa é boa para nós, reles contribuintes. Veja: uma lei cobrava 3 “x” de tributo. Achei absurdo. Não quero pagar. Entro com uma ação para ver isso. Está errado! Aí, os caras estão lá decidindo a minha demanda. Nesse meio-tempo, surge uma lei nova que fala: “É verdade. Esse tributo não deveria ser 3 ‘x’. Ele é só ‘x’ a partir de agora”. O que acontece? Essa lei retroage para mim, e eu só tenho que pagar “x”. Mas olha: só funciona assim se o ato não estiver definitivamente julgado. Se o meu vizinho entrou com a mesma ação bem antes de mim, e a ação dele já foi definitivamente julgada no sentido de que ele terá que pagar os 3 “x” mesmo, para ele não vai valer a nova lei. Só para mim (que sou mais bonita). Da mesma forma, também não valerá para ele se foi tonto e pagou os 3 “x” sem reclamar. Ato jurídico perfeito. Já era. Essa parte funciona também para as multas: uma lei estipulava multa de 40% caso o tributo não fosse pago na data certa. Não tenho dinheiro este mês, não pago o tributo. Aí, depois de um tempo, surge uma nova lei dizendo que a multa agora é só de 10%. Vou pagar só a multa de 10%. Mas como? Mesmo que eu tenha dado causa à incidência da multa quando ela era de 40%, a lei nova, que reduziu a multa, retroage e se aplica a mim. Legal, né? Cuidado aqui, porque não adianta querer dar uma de “João sem braço”: se eu pagar a multa antes de surgir essa lei nova, não posso depois pedir para o Fisco devolver a diferença. Já paguei; dancei. E mais: você já viu algum dia o Fisco te devolver alguma coisa? Nem eu. É a mesma coisa que acontece em penal (como eu amo penal... que saudade das penas, das frações de aumento e diminuição e até do erro de tipo!): eu, com raiva do fulaninho que me trocou por outra, mato-o. Vou presa, cumpro a pena. Depois que cumpri a pena, surge uma nova lei dizendo que as pessoas podem matar aqueles que as trocam por outras. Não vão mais presas. O que acontece comigo? Nada. Já cumpri minha pena. Não tem como eu ficar com crédito de dias de cadeia. Seria interessante se pudesse, né? Eu mataria mais uns dois ou três... Mas não. Não pode. 31
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É isso. Não falei que esse era fácil? Até eu já sabia. Agora tem o outro artigo. O 144. Mais chatinho. O caput fala daquilo que já vimos: o lançamento é feito com base na lei vigente na data em que se deu o fato gerador, mesmo que ela tenha sido depois modificada ou revogada. Para tudo. O que é lançamento? Eu ainda não sei, mas tenho quase certeza de que vamos chegar a essa parte. Por enquanto, basta saber que a lei que se aplica é a vigente no dia em que aconteceu o fato gerador. Aí vem o § 1º. Ele diz que pode ser aplicada ao lançamento uma lei posterior ao fato gerador. Aí. Já começou a embananar tudo. Que coisa! Devagarinho. Quando é que isso pode acontecer? Aqui não me resta outra alternativa senão copiar o que está escrito na lei: ►► instituição de novos critérios de apuração ou processos de fiscalização; ►► ampliação dos poderes de investigação das autoridades de fiscalização; ►► outorga de maiores garantias ou privilégios ao crédito, exceto, neste último caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros.
Quer saber de uma coisa? Não entendi bulhufas. Ai, caramba. Eu estava indo tão bem... Primeira pedra no caminho. E o que você faz com ela? Chuta que é macumba, uai! Intriga da oposição! Relaxa. Você vai conseguir. (Sim, esta sou eu falando comigo mesma.)
Por partes. Leia o artigo de novo, de novo e de novo. Agora, última vez, de novo. Estamos vendo as hipóteses em que uma lei criada depois da ocorrência do fato gerador vai retroagir para atingir esse fato. Certo. Quando? Muita calma. Passinhos de bebê. 1) Quando ela criar novos critérios de apuração ou processos de fiscalização. 2) Quando ampliar os poderes de fiscalização das autoridades de fiscalização. Essas normas se aplicam imediatamente, porque são meramente instrumentais. Não existe qualquer relação com o direito material. Acho que aqui convém abrir parênteses, por conta da Lei n. 10.741/2001. Que lei é essa? É uma lei que passou a permitir o cruzamento de dados da falecida CPMF com as declarações de imposto de renda, para buscar sonegadores. Trocando em miúdos, a lei permitiu a quebra do sigilo bancário. O que acontecia era que a galera cheia da grana movimentava um montão de dinheiro, mas declarava só um pouco dele. O Fisco, malandrinho, percebeu isso e disse: “Epa, mas como assim você movimentou 10 ‘x’ e só declarou ‘x’?”. Essa lei autorizou a quebra do sigilo bancário nesse sentido. A galera do dinheiro não curtiu, e alegou que isso era violação do princípio da irretroatividade: “Essa lei foi criada agora, mas eu movimentei o dinheiro lá atrás. Não pode”. O Fisco bateu o pé. “Pode sim!”. Princípios 32
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O que aconteceu? O STJ reconheceu o direito de o Fisco fazer essas investigações, porque se trata de lei procedimental. Então, retroage. Acho que com o exemplo dessa lei ficou bem mais tranquilo para visualizar, né? Vamos ver o outro inciso, então. 3) Quando outorgar bla bla bla: esse inciso parece complicadinho, mas depois de lido trinta e duas vezes ele fica fácil. Quando privilegia o Fisco, pode! Então, se uma lei nova dá mais garantias ao crédito tributário, ela se aplica aos fatos geradores ocorridos antes da sua vigência. Mas, se atribuir responsabilidade a terceiro, aí não pode retroagir, porque passa a atingir aspectos estruturais do tributo. Até que não foi tão dolorido assim. Mas tem o § 2º ainda: não se aplica este artigo para impostos lançados por períodos certos de tempo, desde que a lei preveja a data em que o fato gerador se considera ocorrido. Que é isso? (às vezes me dá vontade de escrever “que p... é essa?”, mas acho que não cairia muito bem). É o seguinte: para alguns tributos a lei inventa uma data para a ocorrência do fato gerador. Por exemplo, o IPVA. É um tributo que recai sobre a propriedade de um carro. Mas então em que dia eu pratico o fato gerador? Não dá para saber, né? A propriedade é minha todos os dias desde que eu comprei o carro (aqui eu preciso fazer constar uma coisa! Viva! Já acabei de pagar o meu financiamento! Meu carro é meu, não é mais do banco!). Então a lei vem e fala: esse fato gerador ocorre no dia 1º de janeiro de cada ano. O § 2º diz que o art. 144 não se aplica a esses casos. Como o fato gerador acontece em um dia determinado que a lei inventou, então valerá a lei desse dia. E não é que foi? Santo Google! Muito legal esse CTN comentado (download grátis!) pelo TRF1: http://www.trf1.jus.br/Publicacao/Arquivos/CTN_COMPLETO_INTERNET.pdf.
2.2. Igualdade ou isonomia tributária É assim: eu sou contribuinte, você é contribuinte. Então o Fisco tem que nos tratar da mesma forma. Todo mundo exatamente igual, então? Não. Aqui tem aquela velha historinha: tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades. Então os contribuintes que se encontram em condição de equivalência devem sempre ser tratados de maneira igual pelo Fisco. Não pode cobrar mais de mim só porque eu sou mais bonita que o meu vizinho. Ah, só para constar: meu vizinho é um senhorzinho barrigudo, judiado que dói. Não é muito difícil ser mais bonita que ele. Só para deixar claro que eu não sou metida. Desse princípio surgem dois subprincípios: 33
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2.2.1. Non olet Eu gosto desse: o dinheiro não tem cheiro. Também gosto da historinha por trás dele: diz a lenda que um imperador qualquer (não me lembro quem era) estava conversando com seu filho, e este perguntou por que havia tributação sobre o uso dos banheiros públicos. O pai respondeu que o dinheiro desses tributos não trazia o cheiro dos banheiros. Era dinheiro, independentemente do lugar de onde viesse. Isso significa que qualquer pessoa que realizar o fato gerador em princípio deve pagar o tributo. Não importa quem, como, por quê, não importa nada: praticou o fato gerador, paga. E ponto. A análise é objetiva: simples assim. Veja o exemplo do IR: você auferiu renda, tem que pagar. Não interessa se você a recebeu vendendo drogas, fazendo tráfico internacional de órgãos, rodando bolsinha na rua Augusta. Ganhou, pagou. É isso. Não importa, ainda, se o negócio jurídico que originou a obrigação tributária é nulo, anulável ou inválido. Também não importa se o fato gerador foi praticado por pessoa considerada relativa ou absolutamente incapaz civilmente ou por pessoa jurídica que não esteja constituída regularmente. Para o direito tributário não interessa nada disso.
2.2.2. Capacidade contributiva A expressão aqui é “justiça fiscal”. Não vejo nada de justo em me cobrar o tanto de tributos que cobram, mas tudo bem. Em tese, seria mais ou menos como: cada um paga proporcionalmente ao que tem, ao que fez etc. A frase de uma pessoa muito querida, que se aplica a um milhão de situações, cabe aqui também: “Cada um dá o que tem”.
É. Essa frase dá margem a umas 48 interpretações. É bem essa a ideia. Volta! Foco, mulher.
Esse princípio está no art. 145 da Constituição, e há duas coisas importantes a que devemos prestar atenção quando o lemos (ah! Fica a dica: tem que ler artigo. Eu sei, eu também não gosto de ler artigo, mas não adianta... tem que ler): a) Só se aplica aos impostos. Só? Será? Não... Está escrito lá, sim, mas o todo-poderoso STF já decidiu que se aplica também às taxas e às contribuições para a seguridade social. E o que o STF decide está decidido, meu amigo. Ele é o cara. b) “Sempre que possível”: toda vez que vejo essa expressão em qualquer lei, tenho a nítida impressão de que ela foi colocada lá exatamente a fim de deixar espaço para nunca ser possível. O lance é o seguinte: só vai rolar a tal “justiça fiscal” se o tributo tecnicamente permitir. Por exemplo: no IR dá (ganha mais, paga mais), mas no ICMS não (comprou, já era; independentemente de quem, como ou onde). Princípios 34
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Existem três maneiras de aplicar esse “sempre que possível”: A) Progressividade: o tributo vai ter alíquota variável. Aí, se a base de cálculo for mais alta, também o será a alíquota. Essa coisa de progressividade tem dois lados: um fiscal (quanto mais se ganha, mais se paga) e um extrafiscal (se você fizer uma coisa que não é legal fazer, seu tributo vai ser maior). Três são os impostos que comportam a progressividade: ►► IR: clássico. É literalmente a regra do ganha mais, paga mais. Tranquilo. ►► IPTU: a primeira coisa importante para lembrar aqui é que a progressividade, em regra, é vedada para os impostos reais. Mas, ei... pera aí: IPTU é imposto real, droga. Calma. A Constituição (e só ela pode fazer isso) permite algumas exceções, caso do IPTU. A progressividade aqui tem caráter extrafiscal: não tem nada a ver com o “ganha mais, paga mais”, mas sim com a função social (ah... a função social... tão linda). É assim: se você não usa direitinho seu imóvel, você não cumpre a função social. Aí o seu IPTU vai ser mais caro. Até aqui, legal. Progressividade extrafiscal. Estudo isso em ambiental (que eu também amo, como amo o direito penal! Tributário, morra de inveja!). Só que, olha só, preste atenção: no ano 2000 (EC n. 29) mudou uma coisinha: passou a ser permitida a progressividade em função do valor do imóvel, e alíquotas diferenciadas em razão da localização e uso deste. Aqui, a progressividade é fiscal. É de imposto real, é progressiva e é fiscal. Exceção de tudo. Pois é. Bem-vindo ao mundo maravilhoso do direito tributário. ►► ITR: progressividade extrafiscal aqui também. Você tem uma fazenda gigante e não produz nada nela: seu imposto é maior. Função social (diga se esse negócio de função social não é lindo. Eu quase choro!). B) Proporcionalidade: a alíquota é sempre fixa, mas a base de cálculo é variável. Essa técnica se dá nos impostos reais, em que o fato gerador ocorre sobre elementos econômicos do bem (propriedade, circulação etc.). Mais um quadrinho2, mas este nem precisa colar na parede do banheiro. É só para exemplificar mesmo: Proporcionalidade B.C. 10 100
Alíquota 10% 10%
Progressividade $ 1 10
B.C. 10 100
Alíquota 10% 25%
$ 1 25
Deu para ver bem legal a diferença entre proporcionalidade e progressividade, né? Esta última é mais brava! C) Seletividade: outra técnica de exteriorização do postulado da capacidade contributiva, mas aqui as alíquotas variam em razão inversa à essencialidade do bem. É só lembrar do cigarro: é essencial? Não. Muito pelo contrário! Quer dizer... bom. Não vou entrar no mérito. Eu respeito os fumantes. Mas, enfim, essencial não é. Então, sabe de quanto é o IPI sobre ele? Mais de 300%!
2 SABBAG, Eduardo. Direito tributário. São Paulo: Premier, 2008.
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E o do feijão? Feijão é essencial? Oxe, minino! Claro que é! Sabe quanto é o imposto sobre o feijão? Eu também não sabia... Google nele e... 12%! Viu? É mais um motivo para pensar em parar de fumar e comer mais feijão.
Senti certa vontade de encerrar por aqui. Ah, mas vamos terminar essa coisa de princípios, tá? Não falta muito. Prometo. Os mais complicadinhos já foram.
2.3. Vedação ao confisco Não teve como. Automaticamente, coloquei para tocar a música do Charlie Brown Jr. Estou ficando velha... Ouvia essa música muito tempo antes de pensar em me envolver com esse tal de direito. “Eu confisco, eu confisco. Eu sou da lei, seu trouxa, eu confisco.”
Fácil lembrar, né? Musiquinha do confisco não pode! Não, Sr. Fisco: não vai pegar tudo que é meu, não! Já tenho pouca coisa! Vai querer me levar tudo? Na-na-ni-na-não. Aqui entra um probleminha: o tal do caso concreto. Não existem parâmetros objetivos na lei para identificar o que significaria “confisco”. Precisa analisar caso a caso. E a análise deve levar em conta toda a carga tributária, não apenas um tributo específico. Interessante observar também que a lei brasileira não proíbe o confisco em si, mas sim a tributação com efeito de confisco. A expressão é mais ampla. Qualquer tentativa do Estado de extrapolar na tributação está dentro da proibição constitucional.
“Carga tributária” também é uma expressão legal. Eu imagino o Bino, do “Carga Pesada”, dirigindo um caminhão, e, na carreta, escrito em letras garrafais, “Tributária!”. Carga tributária. E logo lembro da frase: “É uma cilada, Bino!”. Péssimo de novo. Ah, desculpa. É a minha mente! Não tenho culpa. Olha só que bonitinho isto aqui: “Tributo com efeito de confisco é tributo que, por ser excessivamente oneroso, seja sentido como penalidade. É que o tributo, sendo instrumento pelo qual o Estado obtém os meios financeiros de que necessita para o desempenho de suas atividades, não pode ser utilizado para destruir a fonte desses recursos. Nesse sentido o tributo não pode ser antieconômico, vale dizer, não pode inviabilizar o desenvolvimento de atividades econômicas geradoras de riqueza, ou promotoras da circulação desta”3.
3 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 239 e 240.
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