Exame de Época Especial – Guionismo Ano Letivo 2019/2020 Comunicação Social – Escola Educação de Coimbra (ESEC)
Superior
de
Curta-Metragem de Ficção – “Covid-29”: Tema: Confinamento a que nos obrigou a pandemia de Covid-19. Storyline: Passados 10 anos, estamos no ano de 2030 e o vírus da Covid-19 não foi erradicado ao contrário do que se esperava. O vírus sofreu várias mutações desde que surgiu e estamos agora a enfrentar a pandemia Covid-29. O confinamento tornou-se um modo de vida rotineiro nas sociedades humanas e os cientistas desesperam para encontrar medicamentos que aliviem os sintomas deste “novo” vírus e uma vacina capaz de imunizar as pessoas e de o erradicar. Entre eles, FILIPE, um investigador, faz experiências científicas para descobrir um medicamento eficaz contra a Covid-29. Acaba por o conseguir, mas a um preço dramático: a morte do seu filho LUÍS.
Sinopse: Passados 10 anos, estamos no ano de 2030 e o vírus da Covid-19 não foi erradicado ao contrário do que se esperava. Os medicamentos e as vacinas que nos testes se mostravam mais promissores falharam no combate à doença: em alguns casos, só agravam ainda mais a situação de saúde dos doentes. Pior ainda, o vírus sofreu várias mutações desde que surgiu e estamos agora a enfrentar a pandemia Covid-29.
Os cientistas desesperam para encontrar medicamentos que aliviem os sintomas deste “novo” vírus e uma vacina capaz de imunizar as pessoas e de o erradicar. Enquanto isso, o confinamento tornou-se um modo de vida rotineiro nas sociedades humanas. Como investigador científico, FILIPE dedica os seus dias em casa a fazer testes de ensaios clínicos, misturando princípios ativos para tentar chegar a uma formulação química capaz de tratar o Covid-29. Vemo-lo pegar numa caixa de Petri, colocar ao lume de um bico de Bunsen um preparado com vírus e células dentro dela e com uma micropipeta, a pipetar à vez algumas gotas de Maraviroc, Foscarnet e Amantadina. Num impulso de ira com mais uma tentativa falhada, FILIPE pega no telefone e atira-o contra parede da sala. O ecrã do aparelho parte-se com o impacto. O pai de LUÍS não aguenta mais só poder falar com os seus familiares, amigos e colegas de trabalho através do telefone e da Internet... LUÍS, o filho adolescente de FILIPE, tem agora 17 anos. Em 2020, quando tinha 7 anos, LUÍS viveu com intensidade o surgimento da pandemia de Covid-19 e a ansiedade que lhe está associada, pois os seus pais trabalhavam em contacto com o vírus: o seu pai investigava vacinas para o erradicar, a sua mãe, SOFIA, é médica e estava na linha da frente no combate à pandemia. A criança estava na escola a brincar com outros jovens quando soube pelo pai a chocante notícia: a sua mãe estava infetada com Covid-19 e estava internada no hospital onde trabalhava. Como está preocupado com a mãe, a qual não pode visitar, LUÍS, que até então era alegre e extrovertido começa a mostrar-se ansioso e tímido. Durante os dias seguintes, mesmo com os colegas de brincadeiras, aparenta estar distante emocionalmente, como se esteja fechado no seu próprio mundo enquanto brinca. Com o tempo e pelas circunstâncias em que vive, torna-se obcecado por lavar as mãos sempre que vai a algum lado ou toca nalguma coisa. Mesmo usando máscara quando está ao pé das outras crianças da sua escola, LUÍS afasta-se mais e mais delas, passando a preferir brincar sozinho. As pessoas com quem mais procura conversar são os seus pais. Eis senão que na semana seguinte recebe pelo pai a notícia da morte de SOFIA. E nesse momento sente-se como se o mundo à sua volta estivesse a ruir. Desde então, LUÍS passa a maior parte do seu tempo fechado no quarto, reproduzindo com os seus
brinquedos cenas dramáticas de hospital, só saindo desta divisão para ir à sala de estar verificar se está tudo bem em casa ou espreitar as experiências do seu pai. Hoje, já com 17 anos, LUÍS agravou os sintomas do seu comportamento, nomeadamente de ansiedade extrema, bem como episódios psicóticos e depressivos. Ao longo destes últimos 10 anos tem feito as suas atividades diárias a partir de casa, procurando evitar comunicar com outras pessoas sempre que pode. FILIPE continua a dedicar os seus dias a fazer experiências científicas, misturando diferentes princípios ativos antivirais na tentativa de descobrir uma vacina eficaz contra o Covid-29. LUÍS gosta de observar o trabalho do seu pai a uma distância segura e de ouvir os sons do vidro e do metal dos instrumentos laboratoriais a tilintarem uns nos outros. Um dia, depois de jantar com o filho, FILIPE está tão cansado devido ao seu trabalho que adormece com a cabeça na sua mesa de trabalho, deixando em cima dela duas caixas de Petri com culturas de Covid-29 e alguns dos recipientes com princípios ativos antivirais. LUÍS, estranhando não ouvir o barulho habitual do pai a trabalhar, vai à sala de estar ver o que se passa e descobre o pai quieto sem se mexer, sentado à secretária. LUÍS assusta-se e pensa que FILIPE morreu infetado com o vírus, tal como SOFIA, sua mãe, 10 anos antes. Perturbado com estes pensamentos, LUÍS tem um novo surto psicótico, em que cerra os olhos e os punhos, treme e chora compulsivamente. Ao fugir para o seu quarto, LUÍS embate na bancada, fazendo com que alguns dos princípios ativos antivirais caiam e se misturem dentro de uma das caixas de Petri com Covid-29. Pensando que tinha ficado sozinho no mundo, LUÍS vai à cozinha buscar uma faca, leva-a para o seu quarto e cortase nos pulsos. Ao acordar, FILIPE apercebe-se que aquela mistura de princípios ativos fez com que aqueles vírus deixassem de ser capazes de se replicar. Desconfia que foi o seu filho o responsável pela solução que viria a ser o primeiro medicamento eficaz contra o Covid-29. Entusiasmado com esta descoberta, dirige-se ao quarto de LUÍS e, ao abrir a porta, encontra-o no chão, de barriga para cima, de olhar fixo e uma poça de sangue ainda não completamente coagulada.
Guião: INÍCIO DO FLASHBACK 01. EXT. ENTRADA DA ESCOLA PRIMÁRIA – DIA/MANHÃ Plano geral do pátio exterior junto à entrada da escola primária. Do lado esquerdo da imagem, vemos um escorrega no qual algumas crianças deslizam, rindo alto enquanto o fazem. Do lado direito observamos alguns miúdos relativamente afastados uns dos outros que trocam uns pontapés na bola de futebol num campo de jogos situado no pátio. A imagem vai deslizando para a direita e fecha nos miúdos a jogar no campo. Um dos rapazes dá um chuto com mais força na bola, que voa alto pelo ar. O plano aproxima-se da bola que sobe no ar, como se estivesse a acompanhar o seu movimento. Ao cair, a bola ressalta no chão a alguns metros de um outro miúdo. O plano abre para mostrar a distância entre o objeto e LUÍS, rapaz de 7 anos, alto para a idade, com cabelos encaracolados e olhos também castanho-escuros que lhe dão um aspeto tanto calmo como angelical, vestido com um boné e uma T-shirt cor-de-laranja, calças de ganga e sapatilhas pretas. A seguir, uma mão agarra o objeto redondo e estende-o na direção do filho de FILIPE.
02. EXT. ENTRADA DA ESCOLA PRIMÁRIA – DIA/MANHÃ FILIPE, com cerca de trinta anos, aspeto simpático, mas com rugas de expressão na testa, dá a bola a LUÍS, que sorri.
LUÍS
Pai? Obrigada por me trazeres para dar uns chutos na bola com eles. Já tinha saudades...
Ao dizer isto, olha na direção dos colegas que estão no campo de jogos e FILIPE sorri levemente, seguindo-os com o olhar.
Durante alguns instantes, o pai de LUÍS, com a bola ainda na mão, fica a alternar o olhar entre os outros miúdos e o seu filho, franzindo as sobrancelhas. A seguir, atira a bola aos rapazes no campo, por cima da rede de proteção e estuda o filho com os olhos por mais alguns momentos. O sorriso de LUÍS dá lugar a uma expressão neutra.
LUÍS
Passa-se alguma coisa, pai? Para além do vírus?
FILIPE
Luís? Eu... Hã... Não sei bem como te dizer isto...
Começa a tamborilar os dedos da mão no ar, como que procurando deste modo as palavras adequadas para continuar a falar.
Após uns segundos de pausa, qual investigador científico pesando reagentes e princípios ativos, recomeça o discurso, medindo cada palavra.
FILIPE
Como sabes, a tua mãe tem estado na linha da frente no combate a esta pandemia de Covid-19.
LUÍS
Sim, ela é super corajosa!
FILIPE
Sim, é, filho. Acontece que ligaram-me há pouco lá do hospital onde a mãe trabalha. Está internada com Covid-19.
LUÍS esbugalha os olhos, de queixo caído.
LUÍS
A mãe está o quê?!
FILIPE
Ouviste bem, LUÍS. Tu e eu temos de ser fortes nestes próximos dias, ok?
A criança desvia o olhar do pai para os seus pés, e enquanto isso, as lágrimas começam a escorrer pela sua cara.
LUÍS
Vou tentar. Vou tentar.
FILIPE hesita antes de envolver o rapaz num meio abraço.
FILIPE
Ainda queres ir brincar com os teus colegas?
LUÍS
Vamos para casa. Por favor...
03. INT. QUARTO DE LUÍS – DIA/TARDE LUÍS arrasta quarto.
a sua
ambulância de
brincar pelo
chão do
LUÍS
Código vermelho! Código vermelho! Temos aqui uma situação crítica! Ela está em risco de vida!
Pega num pequeno boneco que aparenta feminina e põe-na dentro da ambulância.
ser
uma
figura
LUÍS
Escuto? Vamos avançar! É agora ou nunca! Ela está em perigo de vida!
Enquanto imita a sirene de uma ambulância, pelo chão do quarto, leva o veículo até junto de uma maquete em cartão, em cuja fachada se lê “Hospital”, com o símbolo de uma cruz vermelha por baixo das letras.
Olhando na direção de um boneco masculino colocado à entrada do “hospital”, tira a figura feminina de dentro da
ambulância, coloca-a em cima de uma pequena maca e leva a maca na direção do outro boneco.
LUÍS pega nele com a outra mão.
LUÍS
Ainda vamos a tempo de fazer-lhe o Suporte Básico de Vida? De a tentar salvar? Luís pousa a maca no chão e pega na ambulância de novo, onde se vislumbra o “condutor”.
LUÍS
Já vens tarde! Já vens tarde!
FIM DO FLASHBACK 04. INT. SALA DE ESTAR CASA DE FILIPE – DIA/MANHÃ Na sua bancada de laboratório improvisada na mesa da sala de estar, FILIPE pega numa caixa de Petri, coloca um preparado com vírus e cultura de células ao lume de um bico de Bunsen, dentro dela e com uma micropipeta, pipeta, à vez, algumas gotas de Maraviroc, Foscarnet e Amantadina. O cheiro a soja queimada, proveniente daquela divisão, espalha-se uma vez mais pela casa. Depois de aguardar algumas horas, ao observar os vírus ao microscópio, o pai de LUÍS repara que ainda não foi desta que ocorreram alterações no comportamento do Covid29. Num impulso, FILIPE atira o seu telefone contra a parede da sala. O ecrã do aparelho parte-se após o impacto.
FILIPE
Já não aguento mais! Já não aguento mais só poder falar com a família... Os amigos... Os colegas de trabalho... Através do telefone e da Internet!
05. INT. SALA DE ESTAR CASA DE FILIPE – DIA/TARDE A uma distância segura, LUÍS observa o pai, enquanto FILIPE põe sobre a chama do bico de Bunsen uma outra caixa de Petri e coloca lá dentro, de novo, vírus e cultura de células. O habitual cheiro a soja queimada da cultura de células inunda os recetores olfativos dos dois.
Atraído pelo tilintar do vidro da caixa de Petri sobre o bico de Bunsen, LUÍS tem o impulso de tentar tocar com o dedo indicador da mão direita na chama que arde, mas o pai impede-o de o fazer, após o que pipeta com a micropipeta 3 gotas de Aciclovir, Ritonavir e Enfuvirtida, seguidas de outras 3 de Hidróxido de Sódio.
Contrariamente ao que ambos esperavam, depois de mais algumas horas, repete-se a ausência de modificações nos vírus.
LUÍS desata a chorar desalmadamente, o seu corpo tremendo, incontrolável. O rapaz foge para o quarto e fecha-se lá.
Após intermináveis e incontáveis dias nesta rotina de experiências científicas, eis senão que chega o fatídico dia.
06. INT. SALA DE ESTAR CASA DE FILIPE – NOITE/LUAR
Como de costume, depois de jantarem na silenciosa companhia um do outro, LUÍS e FILIPE dirigem-se para a sala. LUÍS fica a observar ao longe mais duas tentativas do pai que levam a formulações químicas sem efeito no vírus: Zanamivir, Proteinocinase R, Rimantadina; Interferão, Imunoglobulina A e Rimantadina.
Sem nada dizer, LUÍS vai para o seu quarto e deixa o pai a trabalhar sozinho na sala.
Cansado devido ao seu com a cabeça em cima uma caixa de Petri com e reagentes em cima da
trabalho, FILIPE acaba por adormecer da bancada de laboratório, deixando vírus e alguns dos princípios ativos mesa da sala.
07. INT. SALA DE ESTAR CASA DE FILIPE – NOITE/LUAR Estranhando não ouvir o habitual barulho do pai a trabalhar na sala, LUÍS vai ver o que se passa.
Encontra o pai quieto, sem se mexer, sentado à mesa.
LUÍS assusta-se e julgando o pai morto, como a sua mãe dez anos antes, tem um novo surto psicótico, em que cerra os olhos e os punhos, treme e chora compulsivamente.
Ao fugir para o seu quarto, LUÍS embate na bancada, fazendo com que metade do conteúdo dos recipientes de Didanosina, Estavudina, Maraviroc e Cloreto de Sódio caiam e se misturem dentro da caixa de Petri com Covid-29.
Pensando que tinha ficado sozinho no mundo, LUÍS vai à cozinha buscar uma faca, leva-a para o seu quarto e cortase nos pulsos. Ao acordar, FILIPE apercebe-se que aquela mistura de princípios ativos fez com que aqueles vírus deixassem de ser capazes de se replicar. Desconfia que foi o seu filho o
responsável pela solução que viria medicamento eficaz contra o Covid-29.
a
ser
o
primeiro
Entusiasmado com esta descoberta, dirige-se ao quarto de LUÍS e, ao abrir a porta, encontra-o no chão, de barriga para cima, de olhar fixo. O luar vindo da janela do quarto ilumina uma poça de sangue ainda não completamente coagulada.