Espaço com "qualidade"

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Espaço com “qualidade” 2010/2011

“Não se deve fazer referência ao urbano apenas pelo espaço físico das cidades mas também pela sua organização social, política e económica e também pelo modo de vida típica da cidade. Assim, o espaço urbano extrapola os limites físicos das cidades, pois essas características também são encontradas em parcelas do espaço rural.”

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Espaço com “qualidade” 2010/2011

Índice Introdução .................................................................................................................... 4

Relações com o lugar .............................................................................................. 5

Natureza da percepção social ..................................................................................... 7

Espaço identidade e património ............................................................................. 8

Interpretação do espaço urbano ..................................................................... 9

Conclusão ............................................................................................................... 12

Bibliografia .................................................................................................................. 13

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Espaço com “qualidade” 2010/2011

Introdução

A vida urbana é complexada e alicerçada sobre diversos problemas graves que afectam a qualidade dos espaços urbanos. Esses problemas foram o resultado do processo de consolidação das áreas urbanas como espaço importante para a expansão e reprodução da vida social. Os espaços urbanos surgem então como agente amenizador das tensões da vida citadina. Estas áreas são o resultado da percepção de uma população e assume-se como espaços de importância, que definem a identidade de uma população, estes espaços urbanos comportam dimensões éticas, sociais, filosóficos, físicos, históricos, culturais e económicos, compreende-los em sua totalidade é uma tarefa árdua. O que torna um espaço com “qualidade”? Porque enaltecemos certos lugares e os admiramos? Essas foram as questões de partida para delimitar como se processa a percepção dos indivíduos sobre o espaço. Esse espaço é aqui considerado um uso do solo ou um espaço físico. Para isso, esta breve dissertação procurou realizar um curto apanhado teórico sobre como se processa a percepção do espaço e o que leva a que determinada população atribua “qualidade”, a um determinado espaço, de modo a encontrar o principal imaginário que se formou em torno dos espaços com “qualidades”.

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Espaço com “qualidade” 2010/2011 Relações com o lugar

A experiência urbana pode-se resumir em espaços concretos mas de contornos fluidos. Esta experiência configura os espaços, mas nela se reflecte também as representações formuladas sobre os outros, pessoas e lugares, e as estratégias identitárias adoptadas para a apresentação do (eu - nós). A experiência urbana define-se deste modo na relação lógica interior, exterior; através de elementos e processos de auto inscrição, exclusão territorial ou grupal que se definem no confronto com identidade sócioespacial que é atribuída aos lugares. Para explorar a relação lógica entre a identidade dos sujeitos e a identidade dos lugares é preciso primeiro compreender o conceito de lugar que se associa á singularidade dos lugares. O efeito do lugar está associada a uma espacialidade concreta e tanto maior quanto mais forte é a identidade sócioespacial. Na definição de lugar podemos separar o conceito em lugares e não lugares, baseado na experiência que os indivíduos possuem do espaço. Lugar- Um lugar pode ser definido como uma área carregada de significados, como um complexo simbólico, constituído a partir de um sentimento de pertença, segurança e protecção. Também pode ser compreendido como um elemento de identidades culturais, uma maneira de ver o mundo, uma espacialidade experienciada e produzida por uma vivência prolongada. O lugar é muitas vezes constituído por saberes e fazeres e intermediado na experiência pelos símbolos. Não lugar- O conceito de não lugar apareceu ou foi proposto pelo Antropólogo francês, Marc Augé, para designar um espaço de passagem incapaz de dar forma a qualquer tipo de identidade. Para fundamentar este conceito, Marc Augé, começa por analisar e interpretar a sociedade actual. Define em primeiro lugar a noção de sobre modernidade e em que aspecto esta se diferencia da pós-modernidade, na medida em que esta última é “concebida como a adição arbitraria dos traços aleatórios”, ao passo que a sobre modernidade revela três figuras de excesso: a) Excesso de tempo por efeito da aceleração da história em que tudo se tornou acontecimento e que, por haver tantos acontecimento, já nada é acontecimento. Por isso, organizar o mundo a partir da categoria tempo deixou de fazer sentido.

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Espaço com “qualidade” 2010/2011 b) Excesso de espaço por efeito da mobilidade de pessoas, bens, informações, imagens, o planeta se ter encolhido, e sentirmo-nos implicados em tudo, mesmo nos lugares mais remotos.

c) Excesso de individualismo por efeito do enfraquecimento das referências colectivas, e porque as singularidades (dos objectos, grupos) organizam cada vez mais a nossa relação com o mundo. Com isto, um não lugar pode ser definido como um lugar em que não é racional, não é identitário, e não é histórico. Por exemplo as Auto estradas, os aeroportos e as grandes superfícies, podem ser definidos como não lugares. Com isto podemos chegar á conclusão que apenas os lugares possuem as valências necessárias para se tornarem ou serem espaços que enaltecemos e admiramos, espaços com “qualidade”.

“Os não lugares são povoados de viajantes ou passeantes em trânsito. Viajam, solitários, nestes espaços de ninguém são não lugares livres de identidade.” (Marc Augé em Le Sens de Autres, 1994, pag. 169)

Porque os não lugares revelam uma nova forma de viver o mundo mas o retorno ao lugar pode ser o sonho dos que não frequentam os não lugares.

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Espaço com “qualidade” 2010/2011 Natureza da percepção social

Como seria útil saber como as pessoas pensam? Sob quais mecanismos grupos sociais escolhem alternativas? E que tipo de conhecimento esses mesmos grupos possuem sobre algo? Há já vários anos que várias ciências tentam compreender porque determinadas populações possuem determinados comportamentos ou como elas escolhem determinadas opções. Neste ponto de vista vários autores, Tuan (1900), Kunda (1999) entre outros. Acabam por citar nas suas obras que este comportamento deriva da percepção sensorial que um determinado lugar transmite a uma determinada população, assim o papel das sensações e dos sentidos ganha grande importância na formação da percepção. A sensação é o que nos dá as qualidades dos objectos e os efeitos internos dessas qualidades sobre nós. Para termos sensações precisamos dos sentidos (visão, paladar, olfacto, etc.). Como síntese das sensações criamos a percepção de algo, e é esta percepção que nos permite formar ideias, imagens e compreensões do mundo que nos rodeia. Esta visão se aproxima do conceito da UNESCO (1977) em que a percepção é “a maneira pelo qual o homem sente e compreende o meio ambiente (natural ou o citado por ele) e avança no sentido de considerar os factores culturais como importantes para a formação da percepção”. Igualmente a sensação e a percepção dependem de estímulos externos em que o indivíduo é o ser passivo. É a sensação e estímulos que certos lugares transmitem ao indivíduo que define a percepção que estas têm de determinados lugares esta percepção é o que vai dar ao indivíduo a capacidade de atribuir ao lugar uma qualidade. As sensações e a percepção dependem do sujeito e do conhecimento do lugar exterior para que tenhamos sensação ou a percepção. Neste caso o sujeito é activo e o lugar (sentido ou percebido) passivo.

“ A passagem da sensação para a percepção é neste caso, um acto realizado pelo intelecto do sujeito do conhecimento que confere a organização e sentidos ás sensações”: (Chaué, 1996)

Assim, os significados e os valores das coisas decorrem na sociedade de modo a que nela os lugares e as pessoas possam receber sentidos, valores ou funções.

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Espaço com “qualidade” 2010/2011 Espaço identidade e património

Existe nos dias de hoje cada vez mais uma atitude de reconstrução e reconstituição de práticas tradicionais, pelos movimentos sociais e culturais. Em parte porque as populações procuram cada vez mais um ponto de identidade que diferencie e de certa forma as demarque num mundo cada vez mais marcado pela globalização. Assim a revitalização dos espaços que cada vez mais são preservados, devese á nova importância que lhe é dada, relacionada com o regresso às origens ou como uma vontade de encontrar e manter uma identidade passada. Tal sentimento leva a que as populações tenham a necessidade de ter e preservar algo que lhes confira identidade, são estes espaços que querem preservar como património, estes espaços elevam-se então a espaços que enaltecemos, um espaço com “qualidade”. Ao longo do tempo esta influência mútua nos indivíduos proporcionada por certos espaços, vai se evidenciar até representar a ideologia global de uma determinada cultura. Em síntese podemos analisar neste contexto então o exemplo da Torre Eiffel, quando pensamos em Paris umas das primeiras imagens que temos da cidade e que em geral está presente na memória colectiva que criamos da cidade, entre outras é a da Torre Eiffel. Assim o que era para ser um monumento efémero, tornou-se em património, assumindo-se como um espaço ou um monumento, a ser admirado e enaltecido, muito graças á sua singularidade e capacidade de conferir um carácter identitário ao espaço e de certa forma á cidade e a uma população. Em suma a identidade constrói-se a vários níveis, mas é quando falamos de identidade colectiva que surgem espaços com um valor identitário evidente, na medida que simbolizam para um grupo, um espaço de partilha e de construção de identidade comum, neste sentido falar de património é falar de identidade.

“Integram o património cultural todos os bens que sendo testemunhas com valor de civilização ou de cultura portadores de interesse cultural relevante, deva ser objecto de especial protecção e valorização.” (Conceito e âmbito do património cultural, Lei nº 107/2001 de Setembro.)

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Espaço com “qualidade” 2010/2011 Interpretação do espaço urbano

Muitos foram os autores que abordaram a problemática do espaço urbano, entre eles encontram-se Kevin Lynch e Gordon Cullen. Ambos os autores mencionados partem do princípio básico de percepção entendida como a relação natural com a envolvente, permitindo reflectir sobre o quotidiano e possibilita a compreensão do espaço urbano. Neste ponto o interesse pelas condições e pelos elementos perceptíveis da forma urbana e cuja análise não pode alhear-se da visão que, através da percepção, cada individuo obtém do espaço construído, como lugar. Kevin Lynch- É o autor do livro “A Imagem da cidade” publicado em 1960. Nesta publicação Kevin Lynch defende que um meio ambiente ordenado pode actuar como referencial ou como gerador de actividades urbanas. Assim este foca-se principalmente na legibilidade do meio urbano, que ele define como sendo a “facilidade com a qual as partes podem ser reconhecidas e organizadas numa estrutura coerente”. Lynch destaca também a importância decisiva que assume no espaço urbano o factor básico de orientação e argumenta que no processo de orientação, o vínculo estratégico é a imagem ambiental, a representação generalizada do espaço exterior. Kevin Lynch percebe assim a imagem como produto de sensações imediatas e da memória de experiências anteriores. Propondo então analisar a estrutura da imagem cidade. Nesta análise Lynch encontra cinco elementos construtivos que os define como sendo as vias, os nós, os elementos marcantes, os bairros e os limites, e defende que uma vez conhecidos e avaliado cada elemento segundo as suas próprias características é possível operar de um modo significativo sobre a cidade.

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Espaço com “qualidade” 2010/2011 Gordon Cullen- É o autor do livro “Townscape” que foi publicado um ano após a publicação de “A imagem da cidade”, e tal como o autor deste último para Cullen o ponto de referencia da abordagem paisagística é a capacidade individual de percepção visual (a cidade como objecto da percepção dos seus habitantes). Segundo Cullen é necessário para compreender a forma urbana um observador não ocioso dotado de um olhar atento e curioso, capaz de se surpreender e interessar-se pelo que experiência, porque “ em qualquer análise de um lugar urbano é imprescindível estabelecer um diálogo entre o espaço urbano e os elementos que caracterizam a sua vida”. Assim este para demonstrar o seu ponto de vista utiliza uma linguagem evocativa e recorre sistematicamente á imagem, pelo que em “Townscape” fundem-se conceitos próprios da disciplina arquitectónica como a silhueta, a divisão, o espaço, a visão exterior, a distorção, o claro e escuro, a textura, o ponto focal, a metáfora, a ilusão, a nostalgia, o animismo, com noções derivadas da capacidade de utilização dos espaços como a de possessão ou território ocupado que o autor considera como características que os projectistas devem respeitar e procurar reproduzir. Para este autor a complexidade visual é o aspecto fundamental desse processo. Assim este propõe uma análise sequencial do “cenário” urbano através do recurso á visão serial como meio de transmitir a experiência urbana, isto é, o jogo constante entre percepção dos lugares. Com a noção de visão serial ou análise sequencial pretende significar uma malha de relações entre os diversos elementos e as suas características e qualidades. As abordagens desenvolvidas pelo autor são sempre referentes a visões pontuais dos espaços urbanos ou seja aos aspectos exteriores. Não sendo dadas explicações sobre os aspectos estruturais dos espaços analisados, nem são relacionadas as suas características físicas com o contexto social onde se inserem, designadamente com os usos e os significados. Portanto Cullen mantém o parecer de que a incorporação da experiência pessoal na análise urbana favorece uma concepção poética da própria análise, ao deixar de ser um exercício estritamente descritivo, dirigido para a explicação dos “porquês” da forma urbana, a visão passa a ser imediatamente integrada na dinâmica do processo criativo.

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(Análise sequencial de Gordon Cullen)

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Espaço com “qualidade” 2010/2011 Conclusão

O conceito de lugar pode ser definido como uma área carregada de significados, como um complexo simbólico constituído a partir de um sentimento de pertença, segurança e protecção. Também pode ser compreendido como um elemento de identidades culturais, uma maneira de ver o mundo, uma especialidade experienciada e produzida por uma vivência prolongada. O lugar ou espaço é muitas vezes constituído por saberes e fazeres e intermediado na experiência pelos símbolos. A perspectiva desta reflexão tenta assim tratar o conceito de lugar e espaços com “qualidade”, áreas que grupos culturais e sociais tendem a proteger e a enaltecer.

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Espaço com “qualidade” 2010/2011 Bibliografia

http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/1475.pdf, 28-10-2010

http://tercud.ulusofona.pt/publicacoes/2007/MoutinhoMMateusDPrimoJ_Text.pd f, 28-9-2010

http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/1475.pdf, 28-9-2010

http://urbanidades.arq.br/2008/03/kevin-lynch-e-a-imagem-da-cidade/,29-102010, 21:15h.

http://www.scribd.com/doc/7029839/Gordon-Cullen, 14-10-2010, 21:00h

Trabalho realizado por: João Sá nº21799

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