UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO – UPE FACULDADE DE CIÊNCIAS DA ADMINISTRAÇÃO DE PERNAMBUCO – FCAP MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO DO DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL – GDLS
JOCELENILTON GOMES DA SILVA
RESPONSABILIDADE COMPARTILHADA: SISTEMA DE LOGÍSTICA REVERSA DE RESÍDUOS DE MEDICAMENTOS DOMICILIARES COMO INSTRUMENTO PARA A SUSTENTABILIDADE
Recife, 2016
JOCELENILTON GOMES DA SILVA
RESPONSABILIDADE COMPARTILHADA: SISTEMA DE LOGÍSTICA REVERSA DE RESÍDUOS DE MEDICAMENTOS DOMICILIARES COMO INSTRUMENTO PARA A SUSTENTABILIDADE
Dissertação apresentada à banca do Programa de Mestrado Profissional em Gestão do Desenvolvimento Local Sustentável da Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco – FCAP, Universidade de Pernambuco – UPE, como requisito para a obtenção do grau de Mestre em Gestão do Desenvolvimento Local Sustentável. Orientador: Prof. Dr. José Luiz Alves
Recife, 2016
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Universidade de Pernambuco - UPE Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco – FCAP Biblioteca Prof. Leucio de Lemos S586r
Silva, Jocelenilton Gomes da. Responsabilidade compartilhada: sistema de logística reversa de resíduos de medicamentos domiciliares como instrumento para a sustentabilidade./
Jocelenilton Gomes da Silva. – Recife: o autor, 2016. 183 f.: il.: 30 cm. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco (FCAP). Programa de Mestrado Profissional em Gestão do Desenvolvimento Local Sustentável, 2016. Orientador: José Luiz Alves. 1. Logística Reversa. 2. Resíduos Sólidos. 3. Medicamentos Domiciliares. I. Alves, José Luiz. (Orientador). II. Título.
FCAP-UPE 26-2016
CDD: 658.788 Edna Meirelles – CRB-4/1022
JOCELENILTON GOMES DA SILVA
RESPONSABILIDADE COMPARTILHADA: SISTEMA DE LOGÍSTICA REVERSA DE RESÍDUOS DE MEDICAMENTOS DOMICILIARES COMO INSTRUMENTO PARA A SUSTENTABILIDADE
Dissertação apresentada em 10 de junho de 2016 para obtenção do Título de Mestre em Gestão do Desenvolvimento Local Sustentável do Programa de Pós-Graduação da Universidade de Pernambuco (UPE), pela Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco (FCAP).
ORIENTADOR _______________________________________ Prof. Dr. José Luiz Alves Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco (FCAP) COMISSÃO EXAMINADORA _______________________________________ Prof. Dr. Emanuel Ferreira Leite Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco (FCAP) Examinador interno ______________________________________ Prof. Dr. Ericê Bezerra Correia Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco (FCAP) Examinador interno ______________________________________ Prof.ª Drª. Jenny Alvares Botello Universidad Autónoma del Estado de Mexico (UAEMéx) Examinadora externo
Recife, 2016
“Há um momento para tudo e um tempo para todo propósito debaixo do céu. Tempo de nascer, e tempo de morrer; […] Tempo de guardar, e tempo de jogar fora.” Eclesiastes 3: 1-2a, 6b. Bíblia de Jerusalém.
Dedico esta Dissertação à minha esposa Jennyfher e à minha filha Jessicah, pela compreensão por todo tempo desprendido.
AGRADECIMENTOS
Ao Criador que me dotou de uma mente inquieta e capacitou com um espírito de eterno aprendiz.
À minha mãe Marilene e irmãos (Jociclene, Jocilene e Jocelenilson) por sempre acreditarem em mim, muitas vezes mais do que eu mesmo.
Ao meu Orientador, Professor Doutor José Luiz Alves que com amizade e verdadeiro sacerdócio me guiou por meio de tantos caminhos de sombras que percorri durantes estes meses.
À Zeza e Angélica, servidoras da Secretaria do Mestrado por fazerem mais do que o que lhes é requerido, sempre com um sorriso sincero no rosto.
Aos colegas da Turma Nove, um misto de competências e saberes, pelo ambiente propício para pensar e criar, que redundou em amizades para o resto da vida.
Por fim, a Jennyfher e Jessicah, que suportaram a minha reclusão e as minhas conversas longas e tediosas sobre sustentabilidade e metodologia da pesquisa nos lanches pós-cinema, nas poucas vezes que saímos.
RESUMO
A dispersão de resíduos sólidos de medicamentos domiciliares inservíveis e em desuso tem se constituído num problema de saúde pública. Os danos, que a disposição dos mesmos causa na rede pública de esgoto, tem sido alvo de investigação pela farmacoepidemiologia e os resultados apontam para um aumento da resistência das bactérias às substâncias de alguns antibióticos e a alteração hormonal da fauna aquática. Foi empreendida uma pesquisa documental e bibliográfica de caráter exploratório e aplicado na literatura técnica de livros e artigos científicos da base de dados da Scielo e do Google Acadêmico sobre como o Princípio da Responsabilidade Compartilhada da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) pode minimizar ou reduzir esta dispersão. O princípio determina que, todos os elos da cadeia de valor de produtos farmacêuticos envidem esforços integrados, que concorram para a redução do descarte inadequado dos medicamentos domiciliares em desuso, por meio da implementação de sistemas de logística reversa que recolham estes resíduos e os encaminhe para destinação ambientalmente adequada. Reconheceu-se o grau de importância que tem a Responsabilidade Compartilhada e sua estreita correlação de interdependência com a logística reversa para a correta destinação ambiental dos resíduos de medicamentos domiciliares. Averiguou-se ainda, que há uma lacuna na Região Metropolitana do Recife (RMR) quanto ao que a Lei da PNRS estabelece, deste modo elaborou-se um sistema de logística reversa de resíduos de medicamentos domiciliares para ser proposto pela unidade Recife de um operador logístico que transporta medicamentos, como resposta às exigências da Lei 12.305/2010. Palavras-chave: Logística Reversa, Resíduos Sólidos, Medicamentos Domiciliares, Responsabilidade Compartilhada, Ciclo de Vida do Produto.
ABSTRACT
Unserviceable and fallen-into-disuse medicine's solid waste dispersal has amounted to a public health issue. The damage that their disposal causes to public sewerage has been target of investigation by the pharmacoepidemiology, and the results point to a raise in bacteries' resistance to some antibiotics' substances and the hormonal alteration of aquatic fauna. A documental and bibliographic research of exploratory character was undertaken and applied into the technical literature of books and scientific papers from Scielo and Google Academic database about how the Principle of Extended Producer Responsibility from the National Policy on Solid Waste (PNRS) can minimize or reduce such dispersal. The principle determines that all pharmaceutical products value chain links engage integrated efforts, cooperating to reduce
inappropriate
fallen-into-disuse
medicine's
disposal
through
the
implementation of reverse logistics systems that will collect the waste and forward it to the environmentally appropriate destination. It has been observed the degree of importance that Extended Producer Responsibility and its narrow correlation of interdependence to reverse logistics, for the correct environmental destination of medicine waste. It has been investigated, as well, that there is a gap in the Recife Metropolitan Areas (RMR) regarding what the PNRS establishes and, therefore, a reverse logistics system on medicine waste has been elaborated to be proposed by unit Recife of a logistic operator who transports medicine, as reply to the requirements of Law 12.305/2010. Keywords: Reverse Logistics, Solid Waste, Medicine Waste, Shared Responsibility, Product Life Cycle.
LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS
ABDI
- Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial
ABINEE
- Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica
ABNT
- Associação Brasileira de Normas Técnicas
ABRELPE
- Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos
Especiais ABCV
- Associação Brasileira de Ciclo de Vida
ACV
- Avaliação do Ciclo de Vida
ANATEL
- Agência Nacional de Telecomunicações
ANVISA
- Agência Nacional de Vigilância Sanitária
CDR
- Canais de Distribuição Reversos
CFF
- Conselho Federal de Farmácia
CLM
- Council of Logistics Management
CONAMA
- Conselho Nacional do Meio Ambiente
CSCMP
- Council of Supply Chain Management Professionals
EMLURB
Empresa Municipal de Limpeza Urbana
GEE
- Gases de Efeito Estufa
IBGE
- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICMS
- Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços
ISO
- International Organization for Standartization
LCM
- Life Cycle Management
MDL
- Mecanismo de Desenvolvimento Limpo
MMA
- Ministério do Meio Ambiente
MNCR
- Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis
OCDE
- Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
ONU
- Organização das Nações Unidas
PEV
- Postos de Entrega Voluntária
PNDAARM - Programa Nacional de Destinação Ambientalmente Adequada de Medicamentos PNEA
- Política Nacional de Educação Ambiental
PNMA
- Política Nacional do Meio Ambiente
PNMC
- Politica Nacional de Mudanças Climáticas
PNRS
- Política Nacional de Resíduos Sólidos
PNUMA
- Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
RMR
- Região Metropolitana do Recife
Sisnama
- Sistema Nacional do Meio Ambiente
SNVS
- Sistema Nacional de Vigilância Sanitária
SLR
- Sistemas de Logística Reversa
SKU
- Store Keeping Unit
TMS
- Transportation Management Sistem
UNESCO
- Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura WMS
- Warehouse Management Sistem
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Incinerador de grelha fixa…..………………….……………..…………….
65
Figura 2 Usina de gaseificação por plasma…………….…..…..…..….…..……….
67
Figura 3 Corte de um aterro sanitário….…………………………………………….
70
Figura 4 Ciclo de Vida do sistema-produto.….……..……………………..……….. 121 Figura 5 Estrutura da Avaliação do Ciclo de Vida………………………………….. 123 Figura 6 Principais etapas dos fluxos reversos.................................................... 131 Figura 7 Canal reverso de pós-consumo…………………………………………… 133 Figura 8 Estação Coletora……………...…………………………………………….. 148 Figura 9 Equipamento de contenção de carga…………………………………….. 161
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................12 1.1 Contextualização do Problema.............................................................................12 1.2 Definição do Problema..........................................................................................17 1.3 Objetivos da Pesquisa...........................................................................................18 1.3.1 Objetivo Geral.....................................................................................................18 1.3.2 Objetivos Específicos.........................................................................................19 1.4 Justificativa............................................................................................................19 1.5 Metodologia...........................................................................................................21 CAPÍTULO II................................................................................................................23 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA...................................................................................23 2.1 Antecedentes à Política Nacional de Resíduos Sólidos.......................................26 2.2 Análise da Política Nacional de Resíduos Sólidos...............................................28 2.2.1 Dos Princípios....................................................................................................31 2.2.2 Dos Objetivos.....................................................................................................51 2.2.3 Dos Instrumentos...............................................................................................79 2.2.4 Dos Resíduos Sólidos e Rejeitos.......................................................................96 2.3 Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto......................108 2.3.1 Responsabilidade Compartilhada....................................................................110 2.3.2 Ciclo de Vida do Produto..................................................................................116 2.4 Logística Reversa................................................................................................126 2.5 Logística reversa de medicamentos domiciliares...............................................142 CAPÍTULO III.............................................................................................................153 ESTRUTURANDO UM SISTEMA DE LOGÍSTICA REVERSA................................153 3.1 Caracterização da Empresa................................................................................153 3.2 Operação do CD Recife......................................................................................155 3.3 Operação Reversa de Medicamentos na RMR..................................................162 CAPÍTULO IV............................................................................................................164 CONCLUSÕES.........................................................................................................164 REFERÊNCIAS.........................................................................................................169
12
CAPÍTULO I INTRODUÇÃO
1.1 Contextualização do Problema A confiança cega nos benefícios advindos das pesquisas científicas e dos avanços tecnológicos, que se manifestou de forma exponenciada durante quase todo século XIX, entrou num longo declínio desde que as luzes deste mesmo século se extinguiram. Esta confiança era parte do conjunto das características do modelo social que se desenvolveu durante a Revolução Industrial, por isso mesmo também chamado de Sociedade Industrial. Para este modelo social os riscos ambientais, sociais ou econômicos eram considerados como intrínsecos à evolução científica e como consequência previsível do progresso proporcionado. O preço a ser pago por todos os benefícios resultantes e que seria minimizado ou superado quando as pesquisas científicas alcançassem níveis que sequer poderiam ser previstos ou imaginados
àquela
época,
permitindo
que
fossem
alcançados
avanços
consideráveis nas áreas de consequências mais críticas (BECK, 2011; HARARI, 2015; HOBSBAWN, 2014). No próprio Século XIX algumas vozes dissonantes quanto à postura confiante nos benefícios obtidos por meio dos avanços da Revolução Industrial e do Capitalismo dela resultante se fizeram ouvir em diversas áreas da sociedade, uma das áreas que logrou contribuição mais profícua foi a literatura. O inglês Charles Dickens (1812 – 1870) e os franceses Victor-Marie Hugo (1802 – 1885) e Émile Zola (1840 – 1902) foram alguns dos proeminentes escritores daquele período que se dedicaram ao tema. Charles Dickens (2014, p. 37) apresenta o contexto no qual inspirou Tempos Difíceis de forma lúgubre: “Era uma cidade de tijolos vermelhos, ou de tijolos que seriam vermelhos caso as cinzas e a fumaça permitissem; mas no estado de coisas de então, era uma cidade de vermelhos e negros antinaturais”. Nesta obra, mais do que em qualquer outra, efetuou um relato dramático do esgarçamento do tecido social da sociedade daquela época. A despersonalização
13 causada pela exploração trabalhista da indústria, sempre em busca do lucro fácil sem mensurar as externalidades, alcançou níveis tais que os mais hábeis trabalhadores eram considerados apenas uma “Mão” e dos que não eram providos de habilidades que os destacassem sequer poder-se-ia dizer que eram notados ou percebidos como algo além de meros objetos. Estes estavam sujeitos a desenvolver atividades rotineiras e entendiantes, que não transmitiam sentido algum para suas vidas sem objetivos maiores ou aspirações relevantes: “para fazer o mesmo trabalho, e para quem cada dia era o mesmo de ontem e de amanhã, e cada ano o equivalente do próximo e do anterior” (DICKENS, 2014, p. 37) 1. Este livro, que conta com a admiração de um gênio do quilate de G. K. Chesterton, é considerado pela crítica literária como um manifesto de protesto contra as consequências sociais e ambientais, as externalidades, resultantes dos avanços científicos e tecnológicos que em algum momento fugiram ao controle humano durante e imediatamente após a Revolução Industrial inglesa. Com a geração incessante de riquezas e a concentração destas em poucas mãos e a aparente produção de conforto para os indivíduos que não sabiam sequer que precisavam de todo aquele aparato (MATOS, 2007, p. 27). Jean Valjean, um fugitivo das galés francesas, consagrado pela indústria do entretenimento por meio de filmes, musicais e peças de teatro, Fantine, uma prostituta desdentada, esfarrapada e doente e Cosette, uma órfã sem esperanças, são os personagens centrais da obra mais conhecida de Victor Hugo e que o imortalizou: Os Miseráveis. Publicado originalmente em 03 de abril de 1862 é parte do movimento conhecido como Romantismo. Nesta obra em particular Hugo utilizase de sua pena para efetuar uma análise introspectiva sobre as condições sociais da época em que se insere, interpretando de forma vigorosa e por vezes revolucionária, as transformações que as Revoluções Industrial e Francesa introduziram no corpo orgânico da sociedade francesa dos séculos XVIII e XIX e o decorrente e inevitável conflito de classes que começava a imergir e tomar força, sem deixar de demarcar sua posição de forma incisiva e inquestionável. 1
O contexto escuro e sem esperança daquela época é perceptível em toda a obra: “Era uma cidade de máquinas e chaminés altas, pelas quais se arrastavam perenes e intermináveis serpentes de fumaça que nunca se desenrolavam de todo. Havia um canal negro e um rio que corria púrpura por causa da tintura malcheirosa, e grandes pilhas de edifícios cheios de janelas, onde se ouviam ruídos e tremores o dia inteiro, e onde o pistão das máquinas a vapor trabalhava monótono, para cima e para baixo, como a cabeça de um elefante em estado de loucura melancólica” (DICKENS, 2014, pg. 37).
14 Uma chave hermenêutica à obra de Hugo é a confiança que tinha no homem e na sua imensa capacidade de transformar o meio em que habitava de forma positiva, tal confiança é patente nesta obra, mais do que em qualquer outra que tenha escrito. Valjean que esteve preso 17 anos por roubar um pão, suportou todos os suplícios imagináveis na pior das prisões francesas: as galés, sai do cativeiro de forma inusitada, como um farrapo humano e após uma experiência espiritual com um representante do clero que lhe demonstra imerecida bondade, se permite deixar para trás toda a carga negativa que se amoldou ao seu caráter durante o encarceramento e se torna um cidadão virtuoso, altruísta e de uma bondade infinita (HUGO, 2013). Hugo seguindo a tendência romântica de sub-repticiamente defender ideias de fraternidade e liberdade leva o leitor a refletir sobre o envilecimento humano, causado principalmente pela onipotência do dinheiro e as muitas variáveis do nascente capitalismo: individualismo feroz, a usura bancária ou de indivíduos quase sempre inescrupulosos, desprezo pelo meio ambiente e pela natureza. Apresenta ainda de forma trágica, embora favorável, os últimos dias da Comuna de Paris, ato de suprema coragem de alguns manifestantes que defendiam ideias de igualdade no meio de uma desigualdade tão crescente (HUGO, 2013). Outra obra que retrata de forma traumática essa época é Germinal do escritor francês Émile Zola, expoente do movimento naturalista que tem no visceral O Cortiço do maranhense Aluísio de Azevedo um correspondente brasileiro. Para escrevê-lo (originalmente publicado em 1885), Zola decidiu conhecer de perto as agruras dos trabalhadores das minas de extração de carvão e passou cerca de dois meses atuando como mineiro. Sua “encarnação” para familiarizar-se com o meio em que mais morriam do que viviam incluiu viver no mesmo lugar que os trabalhadores, onde comeu e bebeu nas mesmas tavernas. Retratou de forma crua e realista as lutas diárias daqueles trabalhadores em busca da sobrevivência durante o Segundo Império francês: os baixos salários e a exploração trabalhista que os expunha a uma luta sem sucesso contra fome; as moradias inapropriadas até mesmo para animais; o calor inclemente dentro das minas e as constantes infiltrações que os obrigavam a trabalhar com os pés sempre úmidos; as péssimas condições de trabalho por conta da falta de estruturas sólidas e
15 seguras; as doenças epidérmicas e respiratórias trazidas pelas atividades profissionais; os acidentes constantes que aleijavam aqueles que preferiam a morte como uma forma de libertação de uma realidade sem esperança, além da exploração sexista a que as mulheres estavam sujeitas, seja de ordem familiar, conjugal ou trabalhista (ZOLA, 2000). Zola observou tudo isso enquanto empurrava um vagonete cheio de carvão, acompanhou ainda de perto a greve dos mineiros contra a opressão trabalhista, sob a orientação do movimento socialista que estava no nascedouro e se disseminava entre o proletariado. E a luta entre as ideias anarquistas e socialistas, tão em voga àquela época. Germinal que é o primeiro mês da primavera no calendário da Revolução Francesa utiliza-se das ideias, que serviam de sementes da revolução que possibilitaria uma transformação social, como uma metáfora. Por diversas razões é considerado um libelo cruento contra exploração que a revolução industrial causou na França (CHIAVENATO, 1995). Outro modelo social sub-repticiamente substituiu este modelo da Sociedade Industrial, ainda que também tenha sofrido alterações profundas desde as últimas décadas do fim do século XX. O sociólogo alemão Ulrich Beck (2011) denominou este modelo de Sociedade de Risco que neste paradigma é menos catástrofe que antecipação da catástrofe. Seria um estágio da modernidade no qual começam a se concretizar as ameaças produzidas até então pela sociedade industrial 2. Um modelo que busca antever cenários futuros por meio de simulações no presente, tentando antecipar as prováveis catástrofes (quer sejam mudanças climáticas, êxodo de refugiados, escassez de alimentos, revoluções sociais e políticas, crises financeiras, guerras e litígios internacionais, conflitos étnicos e religiosos ou desastres ambientais) que podem surgir em decorrência dos modelos atuais de produção e consumo. De forma que políticas públicas e medidas econômicas possam ser 2
A história contada pela ganhadora do Nobel de Literatura de 2015 sobre o acidente de Tchernóbil, ilustra o que Beck entende como Sociedade de Risco: Em 26 de abril de 1986, às 01h23min58, uma série de explosões destruiu o reator do 4º bloco da Central Elétrica Atômica de Tchernóbil, Ucrânia, provocando uma catástrofe sem precedentes em toda era nuclear. Em 29 de abril foram registrados altos níveis de radiação na Polônia, Alemanha, Áustria e Romênia, no dia 30, na Suíça e norte da Itália, nos dias 1 e 2 de maio, na França, Bélgica, Países Baixos, Grã-Bretanha e norte da Grécia, em 3 de maio, em Israel, Kuwait e Turquia. “Projetadas a grandes alturas, as substâncias gasosas e voláteis se dispersaram pelo globo: em 2 de maio foram registradas no Japão; no dia 4 na China; no dia 5, na Índia; e em 5 e 6 de maio, nos Estados Unidos e Canadá. Em menos de uma semana Tchernóbil se tornou um problema para o mundo inteiro.” (ALEKSIÉVITCH, 2016, pg. 11).
16 estruturadas e implementadas e que contribuam efetivamente para que essas catástrofes sejam evitadas. Este modelo é caracterizado como aquele no qual a elevação do nível de conforto e do bem-estar de cada indivíduo que vive em sociedade é propiciado pela constante inovação tecnológica [ou destruição criativa, no dizer do economista austríaco Joseph Schumpeter]. E tornou-se realidade no mesmo momento em que a modernização atingiu seu ápice de sucesso: avanços tecnológicos, sociais, culturais, científicos ou econômicos. Porém, este sucesso intrinsecamente também permitiu o surgimento de aspectos causadores de consequências negativas, visto que criam um ciclo que escapa ao controle humano, são denominados de efeitos colaterais indesejados do processo de modernização. Quando esta sociedade se dá conta dos riscos a que está exposta estabelece uma necessidade premente de precaução e segurança ao mesmo tempo que, obrigatoriamente impõem uma “lógica do risco”, gerando uma crise de legitimidade nas instituições da Modernidade, pois se instala um estado constante de indeterminação e insegurança (BAHIA, 2012; BECK, 2011). Esta Sociedade está em constante perigo de sofrer catástrofes de diversas ordens devido à evolução técnica constante da fase anterior, também conhecida por “modernidade simples”. E este perigo e risco a que esta sociedade é vulnerável e está submetida é causado pela própria sociedade global e globalizada que toma decisões por intermédio de alguns dos seus membros no manejo dos avanços tecnológicos,
industriais,
biológicos,
sociais,
políticos,
culturais,
científicos,
econômicos, genéticos, de energia nuclear, etc., numa ação reflexiva: sendo ela a causadora dos efeitos que lhe atinge, daí este modelo também ser denominado como “modernização reflexiva” (GIDDENS; LASH; BECK, 2012). A Sociedade do Risco é pródiga em gerar incessantemente riquezas, com a mesma voracidade com que produz socialmente riscos globalizados que atingem indiscriminadamente as condições básicas de todas as nações do planeta. Estes riscos de procedência antrópica são porém, indeterminados do ponto de vista do binômio espaço-tempo, o que contribui para que a comprovação dos danos se torne quase impossível, bem como o nexo de causalidade, fator imprescindível para que um fato antecedente seja vinculado a um resultado danoso (BAHIA, 2012, p.61).
17 Esta sociedade de risco deverá trilhar dois caminhos da mesma importância: nenhuma nação deverá tentar resolver seus problemas sozinha, visto que os efeitos colaterais são globais; abrir espaço para discussão de ordem moral e política que facilite o surgimento de uma cultura amadurecida e que tendo consciência do risco global, proporcione meios para a criação de espaços alternativos que façam surgir um movimento civil de responsabilidade globalizada. Que supere de forma eficiente o que Beck (2011, p. 75) chama de “irresponsabilidade organizada”, aquela contradição que enfrenta a sociedade de risco diante de uma degradação ambiental ao não ter instrumentos efetivos que lhe permita responsabilizar indivíduos ou instituições pelo dano causado (BAHIA, 2012, p. 60). A Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto, um princípio-mor da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) instituída pela Lei 12.305 de 02 de agosto de 2010 e regulamentada pelo Decreto 7.404 de 23 de dezembro de 2010, é uma tentativa de minimizar esta “irresponsabilidade organizada” e propiciar a criação de uma cultura de responsabilização dos riscos e dos danos causados ao meio ambiente, com a obrigatoriedade da criação de sistemas de logística reversa que garantam o retorno efetivo e satisfatório dos resíduos de produtos de pós-venda ou pós-consumo e suas respectivas embalagens ao ciclo produtivo, ao ciclo de negócios ou recebam a destinação final de forma ambientalmente adequada.
1.2 Definição do Problema
O aumento gradual e consistente na renda média do trabalhador brasileiro desde a estabilização da economia em 1994, mormente o da classe D, E e F, o levou a efetuar gastos em áreas dantes impensáveis, tais como educação e saúde. O gasto com medicamentos contribui para a redução das doenças, porém contribui também para uma dispersão muito alta de resíduos de medicamentos inservíveis e vencidos. Ainda que a PNRS tenha estabelecido o retorno destes resíduos à cadeia produtiva para a efetiva e eficiente destinação final de forma ambientalmente
18 adequada, uma questão ainda se apresenta: Os resíduos de medicamentos domiciliares em desuso ou vencidos em poder dos moradores da Região Metropolitana do Recife (RMR) são descartados de forma ambientalmente adequada, segundo o que estabelece a PNRS? Ha uma lacuna percebida que necessita ser preenchida: Os resíduos de medicamentos domiciliares, que consistem em sobras de medicamentos em desuso ou vencidos, bem como as suas respectivas embalagens são dispostos de forma inadequada no meio ambiente, causando danos a este e a todos animais, incluído aí o ser humano, que fazem parte da biota, por falta de estrutura de coleta seletiva ou ausência de postos de coletas voluntários e, por desconhecimento dos danos que os mesmos causam ao meio ambiente por parte de parcela significativa da população da RMR que não tem sido educada ambientalmente. Dois importantes fatores norteiam esta pesquisa, e é a partir dos mesmos que se pode estabelecer as linhas delimitadoras de ação: a) Os moradores da RMR descartam resíduos de medicamentos domiciliares de forma inadequada por não haver instrumento público ou privado que proporcione o descarte adequado; b) O descarte é efetuado de forma inadequada por desconhecimento dos danos que os medicamentos podem causar ao meio ambiente.
1.3 Objetivos da Pesquisa
1.3.1 Objetivo Geral
Elaborar um sistema de logística reversa de resíduos de medicamentos domiciliares para a Região Metropolitana do Recife (RMR), a ser implementado pela unidade Recife de um operador logístico de alcance global.
19
1.3.2 Objetivos Específicos
Avaliar os aspectos legais da gestão e gerenciamento de resíduos de medicamentos domiciliares em desuso ou vencidos; Investigar a importância da Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto para a correta destinação dos resíduos de medicamentos domiciliares; Avaliar a importância do sistema de logística reversa como instrumento da PNRS para a correta destinação ambiental dos resíduos sólidos de medicamentos domiciliares; Averiguar as lacunas existentes na RMR quanto à logística reversa de resíduos de medicamentos domiciliares;
1.4 Justificativa
A logística reversa é entendida pelo legislador como um instrumento relevante e de importância considerável para que a Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto seja instituída, esta é definida pela PNRS como: Conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados (BRASIL, 2012, p. 11).
A PNRS entende que esta Responsabilidade Compartilhada se tornará uma realidade quando: – Forem efetuados investimentos, por parte da iniciativa privada, no desenvolvimento de produtos sustentáveis, aqueles que não agridem o meio ambiente quando de sua fabricação e que, após o ciclo de vida chegar ao fim, possam retornar facilmente ao fluxo como insumos ou possam ser descartados de forma ambientalmente adequada; os consumidores forem devidamente informados
20 da utilização correta dos produtos quando os mesmos chegarem ao fim da vida útil, quanto à reciclagem ou disposição final; os produtos e os seus resíduos sólidos forem sistematicamente recolhidos após o fim do uso e recebam a devida destinação final; todos os elos da cadeia participem de forma conjunta dos planos de gestão integrada de resíduos sólidos, quando os produtos que fluem em seus canais ainda não estão sendo objeto de sistema de logística reversa (art. 31º); – As embalagens forem projetadas para que seus materiais constituintes passem por processo de reutilização ou reciclagem de forma eficiente e eficaz (art. 32º); – Sistemas de logística reversa sejam estruturados e implementados pelos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de agrotóxicos, pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes, lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio, produtos eletrônicos, que atuem de forma independente, porém complementar, dos sistemas públicos de coleta e limpeza urbana, que objetivem o retorno dos produtos ou embalagens que foram descartados pelo consumidor após o uso (art. 33º); – As coletas seletivas forem estruturadas em nível municipal, com envolvimento e participação de todos, até mesmo do consumidor final quando do descarte dos resíduos, desde a forma de separar até a forma de acondicionar aquilo que seguirá para a destinação final (art. 35º); – O titular dos serviços públicos estruturar o sistema para que não apenas descarte os resíduos nos aterros ou lixões, mas que possibilitem condições de separar rejeitos de resíduos que ainda podem receber outras tratativas que não a disposição final (art. 36º), (BRASIL, 2012, p.31). Soma-se a estes fatores ainda a Lei estadual 14.236/2010, que dispõe sobre a política estadual de resíduos sólidos, que estabelece no art. 19: “Os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes são obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos, após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos.” (PERNAMBUCO, 2010).
21 Culminando com o Ministério do Meio Ambiente (2013), publicando o Edital de Chamamento 02, em 09 de outubro de 2013, que apresenta em suas Disposições Preliminares: Dever dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de medicamentos em estruturar e implementar um sistema de logística reversa, mediante destinação ambientalmente adequada dos resíduos de medicamentos, vencidos ou em desuso, após o descarte pelo consumidor de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos.
1.5 Metodologia
Trata-se de uma pesquisa que quanto à natureza delineia-se como pesquisa aplicada, visto que objetiva propor uma intervenção prática e local como proposta de solução para um problema percebido. Prodanov e Freitas (2013, p. 51) afirmam que este tipo de pesquisa é aquele que: “objetiva gerar conhecimentos para aplicação prática dirigidos à solução de problemas específicos. Envolve verdades e interesses locais”. Enquanto que Antônio Carlos Gil (2010, p. 27) afirma que este tipo de pesquisa, que ele classifica sob a rubrica “finalidade”, é a que: “abrange estudos elaborados com a finalidade de resolver problemas identificados no âmbito das sociedades em que os pesquisadores vivem”. Quantos aos fins, objetivos ou propósitos da pesquisa, delineia-se como também exploratória visto que o fenômeno a ser estudado será considerado em sua amplitude e não será descartado nenhum viés desse fenômeno num primeiro momento. Prodanov e Freitas (2013, p. 51) consideram que este tipo de pesquisa é aquele que: “… tem como finalidade proporcionar mais informações sobre o assunto que vamos investigar, possibilitando sua definição e delineamento”. Gil (2010, p. 27) afirma que este tipo de pesquisa possibilita que o pesquisador se familiarize com os problemas percebidos, tornando-os mais explícitos à medida que são explorados e facilita a construção de hipóteses, quando reduz as incertezas sobre o assunto em questão. Quanto aos procedimentos técnicos ou métodos empregados delineia-se como pesquisa bibliográfica, visto que se recorrerá a material publicado em busca
22 de fundamentação teórica: livros técnicos, revistas técnicas, publicações em periódicos e artigos científicos, etc. (PRODANOV e FREITAS, 2013, p. 54; GIL, 2010, p. 29). também pode ser delineada como pesquisa documental, visto que parte do referencial teórico consiste em análise exegética de documentos institucionais (conjunto de leis, decretos, editais e resoluções). Gil (2010, p. 30) ressalta que este delineamento é um dos mais importantes no campo da economia. E ainda pode ser, quanto à metodologia, classificada como pesquisa-ação, termo cunhado por Kurt Lewin para definir aquelas pesquisas que visam não apenas a produção de conhecimento científico em artigos e livros, mas que guiam o pesquisador a uma tomada de decisão e o conduzem à ação social (GIL, 2010, p. 42). Este mix de metodologias visa alcançar resultados que possibilitem não apenas a compreensão do fato em si, mas que também possam propor alterações no status quo gerando benefícios sociais para os envolvidos, mormente as associações de catadores de materiais recicláveis que serão envolvidas na implementação dos sistemas que esta pesquisa objetiva implantar. Por último, quanto à forma de abordagem do problema delineia-se como qualitativa, visto que o que está em discussão não é o aspecto puramente quantitativo, mas sim o que o dado em si representa. Prodanov e Freitas (2013, p. 70) definem este tipo de pesquisa como aquele que, no qual o ambiente natural: “… é a fonte direta para a coleta de dados e o pesquisador é o instrumento-chave. Tal pesquisa é descritiva. Os pesquisadores tendem a analisar seus dados indutivamente”, enquanto Goldenberg (2013, p.14) assevera que: Na pesquisa qualitativa a preocupação do pesquisador não é com a representatividade numérica do grupo pesquisado, mas com o aprofundamento da compreensão de um grupo social, de uma organização, de uma instituição, de uma trajetória, etc.
Gil (2010, p. 29) insere este tipo de pesquisa sob a rubrica natureza dos dados, enfatizando que a melhor forma de avaliar os resultados de uma pesquisa é tomando conhecimento de como os dados foram obtidos e quais os procedimentos que foram empregados em sua análise e interpretação.
23
CAPÍTULO II FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Ainda que o termo não seja consenso entre os cientistas, a época atual instaurada pelos humanos após a Revolução Industrial foi batizada de Antropoceno por Paul Crutzen, ganhador do Nobel em Química por suas pesquisas com as substâncias depletivas do ozônio. O Antropoceno teria substituído o Holoceno que começou 11.700 anos atrás, desde o fim do último período glacial e demarca o início da Revolução Agrícola, marco importante para a sobrevivência humana (KOLBERT, 2015, p. 115). Diversas alterações de escala geológica efetuadas pelo homem justificam esta nomenclatura: as atividades humanas efetuaram mudanças em toda a superfície do planeta, entre um terço e metade da área; a maior parte dos rios foi represada ou desviada pela ação humana; os fertilizantes industriais geram mais nitrogênio do que é gerado naturalmente por todos os ecossistemas terrestres; a atividade pesqueira extrai mais de um terço da produção primária das águas litorâneas oceânicas; o homem utiliza-se de mais da metade do escoamento da água doce de fácil acesso. Os geólogos são unânimes em admitir que os humanos estão deixando uma assinatura no planeta que será legível daqui a milhões de anos (KOLBERT, 2015, p. 117). Parte dessa assinatura indelével são os resíduos sólidos urbanos, de construção civil, agrossilvopastoris, de saúde, industriais, de transporte, de mineração, radiativos ou perigosos, cuja geração em escala mundial tem sofrido vertiginoso crescimento desde a década de 80 do século passado. A concentração demográfica que tem se adensado e os fatores de produção que sofreram incremento exponencial neste período, e que privilegiam a descartabilidade, podem ser apontados como variáveis que contribuem diretamente para este crescimento geométrico. No Brasil não poderia ser diferente, somadas àqueles fatores a relativa estabilidade econômica alcançada com a consolidação do Plano Real e a consequente elevação da renda das Classes C, D e E, a economia tem se mantido em crescimento e o consumo em constante aceleração (PEREIRA, et al, 2012, p. 6).
24 Concomitantemente a esta conjuntura, a obsolescência dos produtos pródiga em geração de resíduos, tem sido “programada para ser percebida” num prazo cada vez menor, principalmente daqueles que compõem a categoria linha verde (que compreende desktops, notebooks, impressoras e aparelhos de telefonia móvel: os smartphones, e os tablets). Possibilitando que o consumo, quando não o “consumismo”, se mantenha nas mesmas tendências de alta garantindo assim a manutenção do crescimento do varejo e a demanda ao setor industrial consequentemente. Gerando, dessa forma, cada vez mais resíduos que se dissipam em progressão geométrica, causando uma desorganização sistêmica constante: a entropia, em escala nunca dantes imaginada nesta era industrial (XAVIER; CORRÊA, 2013, p. 22). Saraiva (2012, p. 701) apresenta dados da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), que comprovam quem em 2005 a base instalada de aparelhos de telefonia móvel somava 86,2 milhões de unidades. Em 2010 este número se elevou para 202,9 milhões, um aumento de 135,38% em cinco anos, o que representaria um crescimento quase 27,08% anualmente. Saraiva (2012, p. 701) ainda cita a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) que afirma que quase 55 milhões de unidades de aparelho de telefonia foram vendidas, apenas em 2010. Este aumento exponencial de produção e consumo se deve à necessidade que estas indústrias têm de se manterem competitivas. Lançando produtos novos sem inovação tecnológica significativa em relação aos modelos já existentes, apenas modificações estéticas, num espaço de tempo menor do que 10 anos atrás. Com isso o Ciclo de Vida do Produto tende a ser menor, beneficiando assim a geração cada vez maior de resíduos. Martins e Murari (2013, p. 2) citando dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE) - que efetua um panorama dos resíduos sólidos no Brasil por meio dos dados de suas associadas –, afirmam que em 2009 o Brasil gerou cerca de 57 milhões de toneladas de resíduos, quase 8% a mais do que o ano anterior. As capitais e as cidades com mais de 500 mil habitantes produziram aproximadamente 23 milhões de toneladas de resíduos. Citam ainda dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que revelam que em 2000 o Brasil gerou 45,7 milhões de toneladas de resíduos. O
25 aumento na geração de resíduos da ordem de 12 milhões de toneladas não acompanha o crescimento da população que foi de cerca de 1% nem da geração per capita que totalizou 6%. No editorial do periódico do setor farmacêutico Pharmacia Brasileira, Brandão (2013, p. 8) traz uma estimativa, com bases em estudos acadêmicos e na experiência internacional de programas de coleta de resíduos de medicamentos domiciliares, que são gerados anualmente no Brasil entre 10,3 e 19,8 mil toneladas de resíduos de produtos farmacêuticos. Para cada município com mais de 100 mil habitantes seriam geradas, portanto, 6,7 mil toneladas. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) elenca as principais causas para o acúmulo de resíduos de produtos farmacêuticos: Dispensação em quantidades superiores às necessárias para tratamento; Não implantação do fracionamento de medicamentos pela cadeia farmacêutica; Interrupção ou mudança de tratamento; Amostras grátis distribuídas pela indústria; Gerenciamento inadequado de estoques de medicamentos por parte das empresas e estabelecimentos de saúde; População carente de informação sobre a promoção, prevenção e cuidados básicos com sua saúde; As estações de tratamento de esgoto não são eficazes na eliminação dos resíduos de alguns tipos de substância; (BRANDÃO, 2013, p. 08).
Ainda se somam a estas causas, duas de ordem mais ligadas às organizações que armazenam, distribuem e comercializam medicamentos: as aquisições, compras de medicamentos com base nas vantagens comerciais recebidas através de descontos em escala, com constantes cancelamentos da compra no ato da entrega por estar em “desacordo comercial” e o armazenamento e manuseio inadequados, sem estar de acordo com as Boas Práticas de Armazenagem, Fabricação e Transportes, que são fatores geradores de avarias e consequentemente de resíduos. A ausência de sistemas estruturados que garantam o retorno de forma segura do resíduo de medicamento domiciliar leva a população a optar por meios inseguros e ineficientes de descarte. Os resíduos são descartados por meio do sistema de esgoto das residências, junto com os demais dejetos em estado líquido ou semilíquido. A combinação de elementos e substâncias químicas: detergentes domésticos, resíduos industriais, resíduos de medicamentos, produtos de limpeza,
26 que reagem ao se encontrarem nas redes de esgotos são os potenciais causadores de mutações e infertilidade à vida aquática (BRAUNGART; MCDONOUGH, 2013, p. 36). Foi para, em parte, propor uma solução para esta alta entropia que a PNRS foi instituída.
2.1 Antecedentes à Política Nacional de Resíduos Sólidos
Em 02 de Agosto de 2010, a Lei 12.305 foi sancionada pelo então Presidente da República, Luís Inácio da Silva e posteriormente regulamentada, por meio do Decreto 7.404 (em 23 de dezembro de 2010), um ciclo de mais de 21 anos de marchas e contramarchas e intensas discussões chegava ao fim. O marco inicial deste ciclo remonta a 1983, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) retomou o interesse pelas questões ambientais, inserindo-as em sua agenda de prioridades, criando a Comissão Mundial do Meio Ambiente, a presidência da mesma coube à Gro Harlem Brundtland, então primeira-ministra da Noruega, Mansour Khalid, sudanês, foi escolhido como vice-presidente da Comissão. Após quatro anos de intensa discussão a Comissão elaborou um relatório que partiu de uma cosmovisão bastante complexa das causas dos problemas socioeconômicos e ecológicos da sociedade global. Criticando o modelo de crescimento econômico adotado, tanto pelos países ditos desenvolvidos, bem como por aqueles em desenvolvimento, posto que o mesmo era baseado na exploração excessiva dos recursos naturais3. Aponta para uma nova postura ética que deveria prevalecer, caracterizada pela responsabilidade tanto entre as gerações quanto
3
Algumas medidas foram sugeridas pelo relatório para serem tomadas pelos estados nacionais: “a) limitação do crescimento populacional; b) garantia da alimentação a longo prazo; c) preservação da biodiversidade e dos ecossistemas; d) diminuição do consumo de energia e desenvolvimento de tecnologias que admitem o uso de fontes energéticas renováveis; e) aumento da produção industrial em países não-industrializados à base de tecnologias ecologicamente adaptadas; f) controle da urbanização selvagem e integração entre campo e cidades menores; g) as necessidades básicas devem ser satisfeitas.” (BRÜSEKE, 2009, p. 33).
27 entre os membros contemporâneos da sociedade atual (BRÜSEKE, 2009, p. 33; PEREIRA; SILVA; CARBONARI, 2011, p. 55). O Relatório Our Common Future (Nosso Futuro Comum), publicado em 1987, passou a ser chamado de Relatório Brundtland, em alusão à presidente da comissão e como tributo à condução das discussões e debates. Ao mesmo se deve a definição de desenvolvimento sustentável mais aceita hoje, ainda que definições mais acuradas tenham sido compostas posteriormente: “O equilíbrio que procura satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades” (CMMAD, 1988, p. 46). Estabelecendo que a partir de então o desenvolvimento sustentável, visto pelo prisma da equidade intergeracional: as futuras gerações merecem tanta atenção quanto as atuais, deveria se tornar princípio orientador central de governos e instituições privadas, organizações e empresas (VEIGA, 2015, p. 9). Este conceito contrariava tudo o que estava sendo feito então em diversas partes do mundo. Pois buscava-se o crescimento e o desenvolvimento econômico, ou buscava-se acelerar o crescimento dos países em situação desvantajosa do ponto de vista do dito Primeiro Mundo e manter o desenvolvimento econômico daqueles que já haviam alcançado o patamar desejável, sem a preocupação em mensurar os danos causados ao meio ambiente – as externalidades –, este, segundo alertas de cientistas, já começava dar sinais de exaustão. O passo seguinte dado pela ONU foi propor, em 1989 a elaboração de estratégias efetivas que não apenas mitigassem a degradação ambiental, mas retardassem
o
seu
progresso,
ao
mesmo
tempo
que
promovessem
o
desenvolvimento sustentável dentro do prisma de equidade intergeracional. Esta resolução resultou na Agenda 21, um programa que foi aprovado durante a Conferência sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento do Rio de Janeiro (que ficou conhecida como Rio-92 ou Eco-92), o programa deveria ser implementado pelos países ao longo do século XXI e objetivava incorporar os princípios do desenvolvimento sustentável nas politicas públicas de cada país (ARAÚJO; FELDMANN, 2012, p. 561; CNUMAD, 1997). Uma
das
diretrizes
dessa
agenda
discorria
sobre
a
manipulação
ambientalmente saudável dos resíduos sólidos. Não bastava segregar e tratar
28 adequadamente os resíduos gerados dispondo-os de forma ambientalmente correta ou buscar o aproveitamento por meio do reúso ou reciclagem, mas sobretudo, a adoção de medidas que fossem eficazes na mudança dos fatores de produção e na alteração dos padrões de consumo. Para que tais ações e medidas pudessem lograr êxito, a agenda previa o envolvimento de toda a sociedade, preconizando a Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida e a logística reversa como instrumentos eficazes para este fim (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 28). Neste contexto, o então Deputado Federal Fábio Feldmann, apresenta o Projeto de Lei (PL) 3.333/92, por meio do qual torna pública a primeira proposta de uma lei abrangente de âmbito nacional, que tratasse dos resíduos sólidos. O mesmo é apensado ao PL 203/91 de autoria do então Senador Francisco Rollemberg [projeto original apresentado em 27 de outubro de 1989] e que dispunha sobre o acondicionamento, a coleta, o tratamento, o transporte e a destinação final dos resíduos de serviço de saúde. Face à complexidade e quantidade de temas debatidos que envolviam diversos atores com repercussão em quase todas as áreas e atividades econômicas desenvolvidas no país, transcorreram-se quase 20 anos de tramitação no Congresso Nacional (ARAÚJO; FELDMANN, 2012, p. 561; ARAÚJO; JURAS, 2011, p 33).
2.2 Análise da Política Nacional de Resíduos Sólidos
A Lei 12.305/2010 que “Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei 9.6054, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências” e o Decreto 7.404/2010 que “Regulamenta a Lei n.º 12.305, de 2 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; cria o Comitê Interministerial da Política Nacional de Resíduos Sólidos e o Comitê Orientador para a Implantação dos Sistemas de Logística Reversa; e dá outras providências” integra a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), pelo que as diretrizes constantes na Lei 6.938/1981 que a instituiu serão também aplicadas. E mantém relação de subordinação e articulação 4
Lei de Crimes Ambientais.
29 com outras políticas públicas brasileiras, que têm o mesmo espírito: Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA); Política Federal de Saneamento Básico e a Politica Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC) (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 56). Esta articulação é percebida com mais intensidade na PNEA, pois as soluções para os problemas que perpassam pela PNRS, por conta do caráter difusos destes, só lograrão êxito efetivo com o envolvimento de toda a sociedade e aplicação de um programa reflexivo de educação ambiental para todos os setores desta sociedade, sem negligenciar nenhum segmento. Que não tratem apenas dos fatores de produção ambientalmente adequada, dentro do que o Princípio da Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto preconiza, mas também os padrões de consumo que apontem para um consumo responsável, consciente e sustentável, que é um dos objetivos da Lei 12.305/2010 (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 56). Com a Política Federal de Saneamento Básico a relação de mútua dependência é mais estreita e maior. As ações referentes à limpeza urbana e ao manejo adequado dos resíduos sólidos são elementos essenciais do saneamento básico, logo fica evidente essa conexão entre os dois conjuntos de leis e de seus raios de atuação. Principalmente quando a Lei 11.445/2007 estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, define este no art. 3º, caput, inciso I como um conjunto de atividades (coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixo orgânico da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas)
e
a
desenvolvimento
infraestrutura destas
necessária
atividades),
logo
(instalações suas
operacionais
disposições
para
o
aplicar-se-ão
conjuntamente com a PNRS (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 56). A articulação com a PNMC é conceitual e inferencial. A gestão de resíduos sólidos mantêm estreita correlação com a emissão de gases de efeito estufa 5 (GEE) e o objetivo maior da PNMC é a descarbonização da economia. A gestão e o gerenciamento ambientalmente adequado de resíduos sólidos e rejeitos contribuirá para a redução da emissão de gases nocivos, com a captação do gás metano e a geração de energia. Estas medidas causarão provável impacto positivo na matriz 5
“O efeito estufa pode ser entendido como a elevação da temperatura da Terra provocada pela introdução de excessivas quantidades de gases estranhos na atmosfera.” (MUCCI, 2014, p. 23).
30 energética nacional, posto que a energia captada será totalmente renovável, dentro dos parâmetros que a intersecção das duas políticas estabelece (SABBAG; PEREIRA; FUJIHARA, 2012, p. 573). A Política Nacional de Resíduos Sólidos é apresentada como aquela que: reúne o conjunto de princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes, metas e ações adotadas pelo governo federal, isoladamente ou em regime de cooperação com os estados, Distrito Federal, municípios ou particulares, com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos (BRASIL, 2012, p. 12).
A PNRS faz distinção entre gerenciamento e gestão de resíduos sólidos aplicando uma lógica processual ou operacional: a) gerenciamento aglutina as etapas de acondicionamento, coleta, armazenagem, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, pode dizer respeito a apenas um tipo de determinado resíduo; b) a gestão integrada envolve o planejamento e a coordenação de todas as etapas necessárias para o gerenciamento de resíduos sólidos, bem como, a relação de interdependência das dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social 6. Na gestão integrada a coexistência de mais de um tipo de resíduo sólido ou rejeito é esperada e desejável, visto que contribui para escala (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 49). O art. 1º, § 1º enumera quais atores estão sujeitos à observância desta lei e estabelece como essência principiológica que a sociedade é responsável pelo lixo que produz: as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento de resíduos sólidos (BRASIL, 2012, p. 09).
Esta identificação abrangente é necessária para que um dos aspectos inovadores e relevantes da PNRS seja concretizado: a transição do predomínio do sistema de comando e controle estatal, de cunho corretivo-repressivo, para um 6
A Organização Panamericana de Saúde define gestão de resíduos sólidos: “[…] abrange um conjunto articulado e inter-relacionado de ações normativas, operativas, financeiras, de planejamento, administrativas, sociais, educativas, de monitoramento, supervisão e avaliação para a administração dos resíduos, desde a sua geração até sua disposição final, a fim de obter benefícios ambientais, a otimização econômica de sua administração e sua aceitação social, respondendo às necessidades e circunstâncias de cada localidade e região.” (SILVA FILHO, 2012, p. 371).
31 modelo amplo baseado em acordos setoriais, diversas modalidades de planos de gestão e gerenciamento e os instrumentos econômicos com vistas à implantação do compartilhamento da responsabilidade com a gestão dos resíduos sólidos (YOSHIDA, 2012). Os geradores de resíduos sólidos são caracterizados como: “pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que geram resíduos sólidos por meio de suas atividades, nelas incluído o consumo” (BRASIL, 2012, p. 10). A inclusão da atividade de geração de resíduos sólidos por meio do consumo de bens explicita todo o espectro da cadeia de valor, sem deixar de fora nenhum elo, de forma que não haja isenção de responsabilidade quanto aos objetivos que a Lei estabelece (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 48).
2.2.1 Dos Princípios
No Art. 6º, IV, a Lei 12.305/2010, a Lei da PNRS, estabelece 11 (onze) princípios legais7 que nortearão a gestão e o gerenciamento dos resíduos sólidos e serão os vetores da politica implantada por meio dela, a saber: I – A prevenção e a precaução; II – O poluidor-pagador e o protetor-recebedor; III – A visão sistêmica, na gestão dos resíduos sólidos, que considere as variáveis ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública; IV – O desenvolvimento sustentável; V – A ecoeficiência, mediante a compatibilização entre o fornecimento, a preços competitivos, de bens e serviços qualificados que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida e a redução do impacto ambiental e do consumo de recursos naturais a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada do planeta; VI – A cooperação entre as diferentes esferas do poder público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade; VII – A responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto; VIII – O reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania; IX – O respeito às diversidades locais e regionais; X – O direito da sociedade à informação e ao controle social; 7
Serão analisados os tópicos que tangenciem os objetivos desta pesquisa.
32 XI – A razoabilidade e a proporcionalidade; (BRASIL, 2012, p. 13).
Um ordenamento jurídico é composto por dois tipos distintos de normatização: os princípios e as regras. O campo das regras é disjuntivo e binário: sim ou não, não existe faixa intermediária. O comando previsto é aplicado em função de ter havido ou não a hipótese fática normativa. Enquanto que no campo principiológico não existe hipótese fática normativa, os comandos inerentes ao mesmo podem e devem ser aplicados onde couber (RIBEIRO, 2014, p. 129). Mello (2011, p. 54) apud Ribeiro (2011, p. 132) tratando da questão axiológica dos princípios afirma: […] violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento, mas todo sistema de comando. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalação (sic) do princípio violado, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.
Além da questão normativa propriamente dita, os princípios se tornariam prevalecentes em função de que se constituem em critérios para a exata compreensão do conjunto de normas. Sendo portanto, chave hermenêutica 8 não só para as normas do mesmo conjunto, mas também para outros princípios e normas do mesmo ordenamento jurídico ou conjuntos de princípios e normas de distintos ordenamentos (RIBEIRO, 2014, 9. 129). – Princípios da Prevenção e Precaução: o binômio de princípios recebeu destaque na Declaração do Meio Ambiente de Estocolmo de 1972, enquanto que o Princípio da Precaução foi enfatizado na Declaração de Princípios da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, ocorrida no Rio de Janeiro em 1992. Desde então tem pautado o plano da ordem jurídica de muitos países (a Comunidade Europeia considerou o Princípio da Prevenção importante o bastante para inclui-lo no seu ordenamento jurídico 9), ainda que não se tenha 8
9
Hermes era o mensageiro dos deuses na mitologia grega. Na mitologia latina ele passou a ser conhecido como Mercúrio. Atribuía-se ao mesmo a função de portador de mensagens lacradas aos destinatários (daí o termo hermético para algo de conteúdo inacessível, sem as devidas chaves), dele deriva o termo hermenêutica (verbo ermhneuein – hermeneuein) que significa “interpretar”. Hermenêutica portanto, está associada às regras e princípios que regem a interpretação do texto do que ao ato em si. (WEGNER, 2001). Diretiva 2008/98/CE, no art. 3º, 12: “medidas tomadas antes de uma substância, material ou produto se ter transformado em resíduo, destinadas a reduzir: a) a quantidade de resíduos, designadamente através da
33 unanimidade em torno das distinções entre os mesmos. Uma parcela significativa da doutrina ambientalista considera-os como sinônimos (LEMOS, 2012, p. 67; MARTINS; MURARI, 2013, p. 5). Segundo Lemos
(2012, p. 67), o Princípio da Prevenção é o princípio
concretizador do Princípio do Poluidor-pagador. Um dos mecanismos de aplicação efetiva do mesmo seria por intermédio dos estudos prévios de impactos ambientais, nos casos de instalação de empreendimentos ou de operacionalização de atividades potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental. Martins e Murari (2013, p. 5) afirmam que o princípio essencialmente é a antecipação da catástrofe, do risco. Trataria de riscos que podem ser antevistos ou previstos, de impactos prováveis e perigos possíveis, com a devida fundamentação teórica e legitimação concedida pela comprovação científica. Lidaria portanto, com o perigo concreto. A característica télica (finalidade substantiva) primordial do princípio é evitar o dano, na maior amplitude possível, somente quando não for possível evitar totalmente o prejuízo ambiental, só então será aceito que medidas mitigadoras ou redutoras do dano sejam tomadas (MACHADO, 2012, p. 40). Sarens (1999, p. 302) apud Lemos (2012, pg. 68) faz distinção entre três espécies de prevenção: prevenção fundamental que envolve a concepção de produtos e o uso otimizado dos mesmos; prevenção corretiva que envolve o melhoramento progressivo e continuado com vistas à retificação de erros que porventura tenham sido percebidos; prevenção terminal que envolve a logística reversa propriamente dita, com a coleta seletiva e a reciclagem como fases importantes. Tais etapas, não necessariamente sucessivas, garantiriam que os objetivos maiores da PNRS sejam alcançados: evitar a produção do resíduo com a aplicação de tecnologias na composição do produto e da embalagem que permitam o menor desperdício possível, com foco no setor primário, por ser aquele que tem acesso à natureza por meio da extração de recursos naturais; conscientizar o consumidor sobre o consumo sustentável e responsável.
reutilização de produtos ou do prolongamento do tempo de vida dos produtos; b) os impactos adversos no ambiente e na saúde humana resultantes dos resíduos gerados; ou c) o teor de substâncias nocivas presentes nos materiais e nos produtos.” (LEMOS, 2012, pg. 70).
34 Alguns objetivos específicos da Lei da PNRS mantém correlação com a prevenção principiológica: estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços; adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais; Incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o aproveitamento energético; estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável. A tríade objetivada pela Lei seria alcançada quando: os objetivos, seguindo as premissas dos princípios, fossem alcançados por intermédio dos instrumentos (LEMOS, 2012, p. 70). Morato Leite e Belchior (2012, p. 39) afirmam que o princípio deveria ser aplicado quando se sabe quais serão as consequências de determinada atividade, quando a mesma ainda está em fase de projeto. Após a comprovação científica do nexo causal, coibir-se-ia a degradação do meio ambiente, antes que a mesma se concretize, posto que a finalidade do princípio é eliminar os perigos quando ainda estão na fase de riscos e puderem ser antecipadamente verificados, em suma: prevenir o dano ambiental na Sociedade de Risco. O Princípio da Precaução, que doutrinariamente segue o espírito do Princípio 15 da Declaração de Princípios da Rio-9210, tem como premissa maior: orientar o desenvolvimento e a aplicação do direito ambiental nos casos de incerteza científica quanto à periculosidade ou virulência do dano. A Declaração Ministerial de Bergen sobre o Desenvolvimento Sustentável, instrumento da Comunidade Europeia (1990), foi o primeiro ordenamento internacional a considerar o Princípio da Precaução como de aplicação geral, equiparando-o ao desenvolvimento sustentável (LEMOS, 2012, p. 71). Este princípio versa sobre os riscos que ainda não se tornaram realidade, que doutrinariamente antecedem o perigo. A certeza de que ocorram ainda não é exata ou a ciência ainda não comprovou o seu grau de virulência, envolve o perigo abstrato (MARTINS; MURARI, 2013, p. 5). Segundo Morato Leite e Belchior (2012, p. 16) o perigo abstrato, aquele que tem como característica a invisibilidade e a 10 “Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaças de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.” (LEMOS, 2012, p. 72).
35 imprevisibilidade pela racionalidade humana, deve ser alvo de investigação que comprove ou não, a probabilidade de o risco existir por meio de analogias com outros processos e atividades, em busca de verossimilhança e de evidências, ainda que tais instrumentos não estejam dentro da capacidade de compreensão e percepção do ser humano. Machado (2012, p. 42) quando trata da correlação entre a incerteza do dano ambiental, a avaliação prévia das atividades humanas, e o Princípio da Precaução afirma: O incerto não é algo necessariamente inexistente. Pode não estar bem definido. Ou não ter as dimensões ou o peso ainda claramente apontados. O incerto pode ser uma hipótese, algo que não foi verificado ou não foi constatado. Nem por isso, o incerto deve ser descartado de imediato. O fato de o incerto não ser reconhecido ou de não ser entendido aconselha que seja avaliado e pesquisado.
Tratativas que deverão ser tomadas sob a égide principiológica da precaução no âmbito da PNRS: a preocupação com a educação ambiental, que propicie um consumo mais consciente com menor descarte de resíduos e reduza o consumismo; diminuição dos desperdícios nos processos de produção, armazenagem, transporte, distribuição, consumo e o fluxo reverso; fim inadiável dos lixões e a instalação de aterros sanitários ou controlados que possuam tecnologias inovadoras e seguras na promoção da captura do gás metano e eficiência no aproveitamento energético (MARTINS; MURARI 2013, p. 13). – Princípio do poluidor-pagador e do protetor-recebedor: Segundo Lemos (2012, pg. 62-63) o Princípio do poluidor-pagador já estava previsto numa Recomendação do Conselho da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de 1972, determinando que o custo das medidas ambientais definidas pelas autoridades públicas para proteção ao meio ambiente fossem considerados no custo dos produtos ou serviços cuja produção ou consumo causasse poluição11. Além de ter se tornado um princípio constitucional na União Europeia, exarado no Ato Único Europeu, art. 130º R e ter sido aditado ao Tratado 11 A Lei 6.938/1981 (Política Nacional de Meio Ambiente), no art. 3º, caput, inciso III define poluição como: “a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; afetem desfavoravelmente a biota; afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; ou lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.” (ARAÙJO; JURAS, 2011, p. 59).
36 de Roma, evidenciando a sua importância e aceitação universal. A Declaração do Rio o incluiu como o Princípio 1612. O Princípio do poluidor-pagador impõem que os agentes econômicos sejam responsabilizados diretamente pelos custos ambientais, se houver, causados por suas atividades, sejam de serviço ou de produção industrial, desde a logística de suprimentos até a logística de distribuição, sem esquecer a atividade reversa. Quando estes custos de degradação ao meio ambiente, também chamados de poluição, não são arcados por aqueles que os geram, esses custos tornam-se externalidades13 para o sistema econômico, ou seja, são externos às funções de custo e de demanda. O princípio possibilita que estes custos ambientais sejam internalizados nas atividades de produção e consumo, induzindo mudanças no padrão estabelecido de uso dos recursos naturais (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 59). Há correlação entre este princípio e os dois primeiros objetivos da Lei da PNRS: proteção da saúde pública e qualidade ambiental e a não geração, a redução, a reutilização, a reciclagem e o tratamento dos resíduos sólidos, bem como a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos. A violação dessas obrigações gerais tipifica o infrator como responsável por arcar com os recursos financeiros
condizentes
com
tal
infração.
A
instituição
deste
princípio
obrigatoriamente instituiu outro princípio: Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto (MACHADO, 2012, p. 43). Quando se passa a considerar a questão axiológica do bem socioambiental e suas funções, bem como as condições da sociedade ou comunidade que dele dependem ou são beneficiados, é válida a advertência de que o principal objetivo deste princípio não é vender o direito de poluir e nem aceitar pagamento por 12 “As autoridades nacionais deverão esforçar-se para promover a internalização dos custos ambientais e a utilização de instrumentos econômicos, tendo em conta o princípio de que o poluidor deverá, em princípio, suportar o custo da poluição, com o devido respeito pelo interesse público e sem distorcer o comércio e o investimento.” (LEMOS, 2012, pg. 63). 13 Kuwahara (2014, p. 78) define externalidades como: “… efeitos de ações de produção ou de consumo que geram custos ou benefícios a outros agentes, sem que haja compensações no mecanismo de preços. As externalidades são positivas quando há benefícios não precificados, mas configuram falhas à medida que geram quantidades insuficientes do bem. Similarmente, as externalidades negativas correm quando há custos não precificados e, como consequência, são geradas quantidades excessivas”. Lemos (2012, p. 59) discorrendo sobre externalidade negativa afirma que: “[…] podemos afirmar que haverá uma externalidade negativa toda vez que um impacto ambiental gerado pela produção e pelo consumo não for suportado pelos agentes diretamente beneficiados pela atividade produtiva. Isso significa que os custos ambientais estarão sendo transferidos para a coletividade, tendo-se em vista que os bens ambientais são bens de uso comum do povo. O grande problema das externalidades negativas é que elas geram ineficiências econômicas”.
37 poluição, mas sim a busca por equidade e justiça social, impedindo que a socialização do prejuízo alcance aqueles que não foram beneficiados com a socialização dos lucros e as benesses intrínsecas, além de conter a degradação ambiental (LEMOS, 2012, p. 64). O alcance e a aplicação deste princípio se resumem em dois vieses que essencialmente traduzem o teor do mesmo: caráter preventivo, envidar esforços que redundem em evitar a ocorrência do dano ambiental, com a internalização dos custos da prevenção, através da introdução de tecnologias menos poluidoras e mais avançadas, traduzindo essa preocupação em gastos necessários à diminuição, eliminação ou neutralização do dano ambiental; caráter repressivo, uma vez constatada a ocorrência do dano ambiental, vise-se sua reparação imediata e de forma eficaz, minimizando o alcance e a perenidade do dano. Necessário apontar que há estreita correlação deste princípio com a Constituição Federal Brasileira 14 e a Lei de Crimes Ambientais15, o que ressalta a força dos diplomas legais e sua importância na Lei da PNRS (MARTINS; MURARI, 2013, p. 11). Araújo e Juras (2011, pg. 61-62) apontam que a Lei da PNRS é o primeiro diploma legal a assumir explicitamente a adoção do princípio do protetor-recebedor que segue uma lógica inversa ao princípio do poluidor-pagador. Enquanto este atribui ao agente econômico de direito público ou privado o ônus da reparação do dano ambiental, aquele postula que o agente, público ou privado, que por meio de suas atividades produtivas protege um bem natural, trazendo para a coletividade benefícios, deve receber compensação financeira como incentivo pelo serviço de proteção prestado. A aplicação do princípio poderia se dar através de: a) não tributação de florestas nativas assegurada na legislação sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural16; b) compensação a municípios na distribuição dos recursos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), que possuam áreas protegidas, o chamado “ICMS Ecológico” (ARAÚJO; JURAS, 2011, 14 Art. 225, § 3º: “As condutas e atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos causados.”(MARTINS; MURARI, 2013, p. 11) 15 Lei 6.938/1981, art. 14, § 1º: “é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, de indenizar ou de reparar os danos ambientais causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”. (MARTINS; MURARI, 2013, p. 11). 16 Lei 9.393/1996, art. 10, § 1º, inciso II, alínea “e”.
38 p. 61-62); c) redistribuição de ICMS aos municípios que investem em disposição ambientalmente adequada de resíduos sólidos e aterros sanitários; d) instituição de incentivos fiscais e linhas de financiamento de fácil acesso para a criação e desenvolvimento de associações de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis (MARTINS; MURARI, 2013, p. 16); e) municípios que se organizarem de forma integrada para a gestão dos resíduos sólidos receberão os recursos da União para tais fins com prioridade (MACHADO, 2012, p. 46). Martins e Murari (2013, p. 15) utilizam o termo “positivação” quando tratam da inserção deste princípio na Lei da PNRS, porquanto, segundo os mesmos, o princípio não foi criado pela PNRS, já era conhecido no mundo jurídico brasileiro e já estava sendo aplicado em alguns municípios e Estados por meio do dispositivo legal conhecido como: Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) 17. Donato (2008, p. 48), numa obra que antecede a Lei da PNRS, investiga a correlação entre este princípio e a logística verde, que conceitualmente engloba a logística reversa. Observa que este princípio é uma inovação doutrinária no ordenamento jurídico brasileiro quando estabelece que o protetor ambiental, de direito púbico ou privado, pessoa física ou jurídica, receberá a devida retribuição, sempre que o poder público e a sociedade estiverem em condições de fazê-lo e de acordo com a legislação específica para tal. Ressalta porém que inexiste regulamentação de como colocar em prática o que este princípio orienta e que o mesmo ainda é obscuro para muitos agentes de governos municipais e estaduais. – Princípio do Desenvolvimento Sustentável 18: O Relatório Brundtland apresentou a definição de desenvolvimento sustentável que viria a se tornar a mais consagrada nos meios acadêmicos, governamentais e no mundo corporativo a partir de então e que balizaria todas as discussões futuras sobre o binômio economia (leia-se crescimento econômico) e meio ambiente: “O equilíbrio que procura 17 “Transação voluntária na qual o serviço ambiental bem definido ou uma forma de uso da terra que possa segurar este serviço é comprado por pelo menos um (sic) comprador de pelo menos um (sic) provedor sob a condição de que o provedor garanta a provisão do serviço.” (MARTINS; MURARI, 2013, p. 15). 18 A Lei da PNRS não é o primeiro ordenamento legal brasileiro a utilizar-se deste conceito novel de desenvolvimento: “Mencione-se que a Lei 6.938/1981, mesmo tendo sido aprovada antes da consolidação do discurso do desenvolvimento sustentável, já contemplava expressamente preocupações com esse teor. No art. 4º, caput, inciso I, da citada lei, insere-se entre os objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente a compatibilização do desenvolvimento socieconômico com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico, bem como a preservação dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente.” (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 63).
39 satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades.” (CMMAD, 1988, p. 46). Veiga (2015, p. 09), baseando-se no conceito do Relatório de Brundtland, define o princípio do desenvolvimento sustentável como uma ambição de que a humanidade desenvolva a capacidade e o senso de equilíbrio em atender às suas necessidades atuais, sem que tal ato comprometa a possibilidade de que as gerações futuras também possam ter suas necessidades supridas, de que merecem tanta atenção quanto as gerações atuais. Ainda efetua ressalvas ao vocábulo “necessidades” que foi empregado na definição do princípio, pois conclui que o termo torna o caráter deste viés de desenvolvimento muito antrópico, desprezando as necessidades do meio ambiente como um todo. Martins e Murari (2013, p. 19) afirmam que este princípio é a espinha dorsal da Lei da PNRS, e como tal pressupõe a estruturação de instrumentos que possibilitem a conscientização do papel ambiental, econômico, social e político que todos agentes, de direito público ou privado, pessoa física ou jurídica, desempenham em seus ambientes corporativos e comunidades, ou deveriam desempenhar. Ao mesmo tempo que faz a correlação hierárquica entre esse princípio e o Princípio da Visão Sistêmica 19, considerando este em relação de subordinação àquele. Demajorovic (2013, pg. 10) defende que as discussões sobre o princípio do desenvolvimento sustentável na gestão dos resíduos sólidos não devem ficar restritas às limitações problemáticas de nível de adequação ecológica de processos sociais, mas sim que possibilitem a definição de estratégias de desenvolvimento, ou modelos múltiplos, que levem em consideração o viés econômico no mesmo patamar que o viés ecológico. Afirma ainda que desenvolvimento sustentável tem imanente a si a noção de redefinição das relações sociedade humana-natureza e cobra uma transformação substancial do próprio processo civilizatório.
19 “A visão sistêmica, na gestão dos resíduos sólidos, que considere as variáveis ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública.” No Art. 6º, IV.
40 Correlacionando este princípio aos princípios 5º 20 e 8º21 da Declaração do Rio, Lemos (2012, p. 53) enfatiza que não se pode discutir o mesmo sem discutir alguns temas transversais [do campo do direito e da economia, mormente discutir o modelo atual de desenvolvimento econômico22] que tratem da ampla proteção e defesa do meio ambiente e que possibilitem a criação de instrumentos que viabilizem o controle da produção e do consumo. Afirma ainda que este princípio deve ser visto como uma máxima política, não apenas como parte de um ordenamento jurídico. E com tal viés servir para a criação de modelo ideal que permeie todas as atividades econômicas, traçando planos e estratégias com vistas à redução do consumo, estímulo à promoção de investimento e desenvolvimento da capacidade dos indivíduos, fundamentando políticas públicas. Quando se analisa a conjuntura estrutural à época da apresentação do Relatório Brundtland, e se procura traçar a gênese deste conceito, percebe-se que o mesmo emergiu em um contexto de controvérsias entre crescimento econômico e meio ambiente, com forte influência de instabilidades institucionais e mudanças geopolíticas (KUWAHARA, 2012, p. 69). Veiga (2015, p. 7) apresenta uma dessas controvérsias que permearam as discussões que redundaram na forma final do relatório: desenvolvimento transcende a noção de crescimento econômico, seja intensivo, seja extensivo. Para ele desenvolvimento abrange a proteção dos direitos humanos, o aprofundamento da democracia, o acesso à educação de qualidade, cultura de inovação tecnológica, política e social. Crescimento econômico extensivo é quando há aumento da produção atrelada ao aumento da população sem o aumento da produtividade (que os 20 “Os recursos não renováveis da Terra devem ser empregados de maneira a se evitar o perigo de seu esgotamento e a se assegurar a toda Humanidade a participação nos benefícios de tal emprego.” (LEMOS, 2012, p. 50). “Todos os estados e todos os povos devem cooperar na tarefa essencial da eliminação da pobreza, o que constitui condição indispensável ao desenvolvimento sustentável, com o fim de reduzir diferenças de níveis de vida e responder, de forma melhor, às necessidades da maioria dos povos do mundo.” (MACHADO, 2012, p. 48). 21 “O desenvolvimento econômico ou social é indispensável para assegurar ao Homem um ambiente de vida e trabalho favorável e criar na Terra condições favoráveis para melhorar a qualidade de vida.”(LEMOS, 2012, p. 50). “Com o fim de chegar ao desenvolvimento sustentável e à melhor qualidade de vida para todos os povos, os Estados deverão reduzir e eliminar os modos de produção e de consumo não viáveis e promover políticas demográficas apropriadas.” (MACHADO, 2012, p. 48). 22 “O princípio do desenvolvimento sustentável deve ser encarado em consonância com os demais princípios de proteção ambiental. O bem que propicia o desenvolvimento econômico, social, cultural, político é o mesmo que importa para a manutenção da sadia qualidade de vida. Por isso, não tem sentido que o desenvolvimento se dê de forma desordenada, causando dano ao meio ambiente.” (LEMOS, 2012, p. 50).
41 economistas chamam de estado de estagnação), enquanto que crescimento econômico intensivo, ou desenvolvimento econômico (termo adotado pela maioria dos economistas), é tão somente aumento da produtividade, independente do fator população. Logo, seria impróprio confundir desenvolvimento propriamente dito com desenvolvimento econômico (elevação da renda per capita ou progresso material como era chamado no passado). Veiga (2015, p. 15) então, faz uma síntese das concepções de Amartya Sen, Prêmio Nobel de Economia em 1998, e de Mahbub ul Haq 23 sobre o que seria desenvolvimento: só é possível falar de desenvolvimento quando o conjunto dos benefícios do crescimento econômico servem para ampliar as capacidades humanas. E estas capacidades são definidas como tudo aquilo que as pessoas podem ser ou fazer na vida. Para que uma sociedade possa ser considerada desenvolvida, sem absurdas privações, destituições de dignidade humana e opressões políticas e sociais, num mundo com alto grau de opulência e desigual, seus membros não podem ser privados de liberdade. O crescimento econômico é um dos fatores que podem contribuir para eliminar as limitações de escolhas e oportunidades das pessoas, pois pode facilitar a expansão das liberdades desfrutadas pelos membros de uma sociedade, aliado à industrialização, inovação e progresso tecnológicos, avanços sociais, que contribuem substancialmente para a expansão da liberdade humana, porém não são tudo (SEN, 2010, p. 10, 16; VEIGA, 2015, p. 56-57). Sen (2010, p. 16) lista quais são as principais fontes de privação da liberdade que o desenvolvimento pleno deve remover: pobreza e tirania (estes roubam das pessoas a liberdade de saciar a forme, de obter uma nutrição satisfatória ou remédios para doenças que têm tratamento, a oportunidade de vestir-se e morar dignamente, de ter acesso à água tratada e saneamento básico); carência de oportunidades econômicas e destituição social sistemática (ausência de programas epidemiológicos, de sistema planejado de assistência médica e educação de qualidade); negligência dos serviços públicos (carência de serviços públicos e 23 Diretor de projeto Programa para Desenvolvimento da ONU (PNUD). Foi quem concebeu e elaborou o primeiro Relatório do Desenvolvimento Humano. Vale registro a crítica de ul Haq ao Relatório do Clube de Roma: “[...] Mahbub ul Haq (1976) levantou a tese de que as sociedades ocidentais depois de um século de crescimento industrial acelerado, fecharam este caminho de desenvolvimento para os países pobres, justificando essa prática com uma retórica ecológica.” (BRÜSEKE, 2009, p. 30).
42 assistência social) e intolerância ou interferência excessiva de Estados repressivos (ausência de instituições eficazes para a manutenção da paz e da ordem locais) e a negação das liberdades civis por regimes autoritários e de restrições impostas à liberdade de participar da vida social, política, cultural e econômica da sociedade. Removendo-se as restrições de liberdade, o processo de desenvolvimento pode ser eficaz. O grau de medida de que um processo de desenvolvimento está em curso ou atingindo o objetivo é quando se pode investigar se houve aumento das liberdades das pessoas primordialmente, quando as pessoas são inteiramente livres para agir, sem nenhuma condição que as prive de fazer escolhas, então se terá um desenvolvimento eficaz (SEN, 2010, p. 17) 24. – Princípio da Ecoeficiência25: A Lei da PNRS é o primeiro ordenamento jurídico a apresentar este princípio. Antes havia aparecido conceitualmente numa publicação preparada pelo World Business Council for Sustainable Development especialmente para a Conferência Rio-92 (Changing Course: A Global Business Perspective on Development and the Environment)26, com o sentido mais amplo de fazer mais com menos, criando mais valor com menos impacto social, econômico e ambiental. Conceitualmente o princípio prega o uso mais eficiente de materiais e energia, na geração de serviços ou produtos. Tal objetivo, redução dos impactos ambientais, deve ser alcançado ao mesmo tempo em que se busca a redução dos custos econômicos do produto ou serviço (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 63). Machado (2012, p. 50) comenta que a eficiência ecológica pregada por este princípio, do jeito que está enunciado, se confunde conceitualmente com o Princípio do Desenvolvimento Sustentável, aparentando ser uma redundância. Entretanto 24 Em função do princípio do desenvolvimento sustentável não conseguir atingir suas metas “utópicas”, já estão em franca atividade discussões que defendem o fim do desenvolvimento sustentável como é conhecido hoje. Muitos defendem o que se pode chamar de “pós-desenvolvimento” que seria uma tentativa de requalificar o desenvolvimento, expurgando a sua extrema dependência do crescimento econômico, outros defendem o que se convencionou chamar de decrescimento (fr: décroissance), no qual as economias desenvolvidas seriam desafiadas a inverter a relação entre produção do bem-estar e PIB. Grosso modo seria desconectar a melhoria da situação dos indivíduos do aumento estatístico da produção material (LÉNA, 2012, p. 49). 25 A descrição completa do princípio é: “A ecoeficiência, mediante a compatibilização entre o fornecimento, a preços competitivos, de bens e serviços qualificados que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida e a redução do impacto ambiental e do consumo de recursos naturais a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada do planeta.” Art. 6º, inciso V. 26 “A ecoeficiência atinge-se através da disponibilização de bens e serviços a preços competitivos, que, por um lado, satisfaçam as necessidades humanas e contribuam para a qualidade de vida e, por outro, reduzam progressivamente o impacto ecológico e a intensidade de utilização de recursos ao longo do ciclo de vida, até atingirem um nível que, seja compatível com a capacidade de renovação estimada para o planeta Terra.” (MARTINS; MURARI, 2013, p. 20).
43 Martins e Murari
(2013, pg. 20) preferem considerar este princípio, ao lado do
Princípio da Visão Sistêmica, como subprincípios do Desenvolvimento Sustentável e apontam a própria construção do enunciado como justificativa para este encadeamento lógico. A correlação entre os objetivos de uma abordagem ecoeficiente e os objetivos 2º (“Não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos”), 3º (“Estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços”) e 14º (“Incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial
voltados
para
a
melhoria
dos
processos
produtivos
e
ao
reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o aproveitamento energético”) da Lei da PNRS é evidente. Retratam e instrumentalizam a busca pela ecoeficiência (MARTINS; MURARI, 2013, p. 21). Ecoeficiência é uma filosofia de gestão, desde a fase de projeto até a fase de pós-consumo, que se traduz por meio de um conjunto de atividades que têm como objetivo minimizar ou eliminar os impactos da atividade antrópica sobre o meio ambiente, tendo como alvo principal a sustentação da vida: Reduzir o consumo de materiais e serviços desnecessários e redundantes e que não agregam valor ao produto ou serviço final; reduzir o consumo de energia com bens e serviços (minimizar as emissões de carbono ao menor nível possível ou até mesmo extingui-las); reduzir a dispersão de substâncias tóxicas; intensificar a reciclagem dos materiais, com seleção de insumos que sejam reaproveitáveis; maximizar o uso sustentável de recursos renováveis (desenvolver novas tecnologias que permitam otimizar este uso); prolongar a durabilidade dos produtos (por meio de práticas mais eficientes na cadeia de suprimentos); agregar valor aos bens e serviços (produtos melhorados e com revisão consciente da obsolescência programada) (PEREIRA; SILVA; CARBONARI, 2011, p. 69; MARTINS; MURARI, 2013, p. 20-21). Diz-se que um processo ou produto é ecoeficiente quando, para sua estruturação ou implementação, não há extração de recursos do meio ambiente em escala superior à capacidade de produção destes recursos por parte da natureza; reduz drasticamente a utilização de combustíveis fósseis e de substâncias
44 poluentes; adoção de políticas e medidas pedagógicas de conservação de energia renovável e dos recursos naturais não renováveis; estímulo à capacidade produtiva de produtos renováveis e aumento na mesma escala de redução e extinção de produtos não renováveis (PEREIRA; SILVA; CARBONARI, 2011, p. 69). Braungart e McDonough (2013, pg. 80) propõe o termo ecoefetividade, em vez de ecoeficiência, já que o conceito remete ao sentido de “trabalhar nas coisas certas” - produtos, serviços e sistemas certos – em vez de apontar para fazer “as coisas erradas menos mal”. Isto atingiria o âmago da questão, de um ponto de vista ético e social, com fortes implicações para o marketing, para a indústria, comércio e o próprio consumo. Só faz sentido fazer alguma coisa “corretamente”, se esta coisa for a “coisa certa” a ser feita. Ecoeficiência, sobretudo, é permitir que o meio ambiente recupere a sua própria capacidade natural de produção de recursos naturais. Este processo toma emprestado da física o conceito de resiliência: Diz respeito à capacidade de certos materiais de, tendo acumulado certa quantidade de energia, quando submetidos a estresse sem ocorrer ruptura, a recuperam ao voltar ao seu estado original (PEREIRA; SILVA; CARBONARI, 2011, p. 69).
Quando qualquer sistema natural adquire a capacidade de reestabelecer o seu equilíbrio, voltando ao estado original ou anterior, após ter sido abalado ou afetado por algum fator externo. Este fator externo não necessariamente deve estar associado a desastre ambiental. A extração de um recurso natural qualquer acima da capacidade de produção daquela área ou ambiente pode afetar de forma intensa e degradante o equilíbrio do sistema (SILVA, 2014, p. 24; PEREIRA; SILVA; CARBONARI, 2011, p. 69). Este conceito de resiliência quando aplicado à biologia ou ecologia dá origem ao novel conceito de resiliência ecológica: Capacidade de um sistema de absorver as tensões criadas por perturbações externas sem que sua estrutura e função sejam alteradas. Um ecossistema resiliente é capaz de retornar às suas condições originais de equilíbrio dinâmico após sofrer estresses como incêndios e descarga de poluentes, por exemplo (MOUSINHO, 2008, p. 361).
45 Resiliência ecológica está relacionada à capacidade de um sistema complexo e integrado de absorver pertubação e reorganizar-se, preservando a mesma função, estrutura e feedbacks, conservando integralmente a identidade. Esta capacidade pode ser potencializada por meio de ações conjuntas de alcance global, geradas por políticas governamentais e estratégias corporativas: incentivo e garantia da proteção ao meio ambiente; implementação de medidas de precaução que sejam capazes de sinalizar antes que o sistema esteja exaurido; estímulo e auxílio à recuperação dos sistemas danificados27 (PEREIRA; SILVA; CARBONARI, 2011, p. 69; SILVA, 2014, p. 24; VEIGA, 2015, p. 42). – Princípio da Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto: O Art. 3º, XVII define o que o legislador compreende por este princípio: Conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, para minimizar o volume dos resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos (BRASIL, 2012, p. 11).
O art. 30º apresenta de forma mais ampla o que é e qual o objetivo maior da responsabilidade compartilhada: É instituída a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, a ser implementada de forma individualizada e encadeada, abrangendo os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, os consumidores e os titulares dos serviços púbicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, consoante as atribuições e procedimentos previstos nesta seção. Parágrafo único: A responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos tem por objetivo: I – compatibilizar interesses entre os agentes econômicos e sociais e os processos de gestão empresarial e mercadológica com os de gestão ambiental, desenvolvendo estratégias sustentáveis; II – promover o aproveitamento de resíduos sólidos, direcionando-os para sua cadeia produtiva ou para outras cadeias produtivas; II – reduzir a geração de resíduos sólidos, o desperdício de materiais, a poluição e os danos ambientais; IV – incentivar a utilização de insumos de menor agressividade ao meio ambiente e de maior sustentabilidade; V – estimular o desenvolvimento de mercado, a produção e o consumo de produtos derivados de materiais reciclados e recicláveis; 27 Este conceito tem recebido uma aceitação tão ampla que alguns estudiosos sugerem que o mesmo seja utilizado no lugar do termo “sustentabilidade”, por contas das dificuldades semânticas com o vocábulo. O economista mexicano Enrique Leff, o físico inglês de Oxford, David Deutsch e o também físico holandês Roland Kupers são os expoentes desta defesa (VEIGA, 2015, p. 43).
46 VI – propiciar que as atividades produtivas alcancem eficiência e sustentabilidade; VII – incentivar as boas práticas de responsabilidade socioambiental (BRASIL, 2012, pg. 28).
Por toda a Lei da PNRS perpassa a atribuição de responsabilidades aos diversos atores que compõem as cadeias de valor que geram resíduos. A caracterização dos atores é um conceito inovador neste conjunto legal, inclui até mesmo o consumidor como responsável pela destinação ambientalmente adequada do resíduo ou rejeito. Os demais atores: fornecedores, fabricantes, transportadores, distribuidores, atacadistas, varejistas, poder público responsável pela limpeza urbana, nas três esferas de gestão, têm definidas as suas responsabilidades dentro de suas áreas de atuação (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 64; ARAÚJO; JURAS, 2012, p. 67). Desde 1994 que a Alemanha tem um conjunto de leis que regulamenta a gestão dos resíduos sólidos: a Lei de Economia de Ciclo Integral e Gestão de Resíduos. Este dispositivo legal ampliou a responsabilidade dos fabricantes a todo ciclo de vida de seu produto (desde a fabricação, passando pela armazenagem, comercialização, distribuição, transporte, uso, até a eliminação). O ordenamento jurídico foca a atenção em evitar a geração de resíduos, primordialmente, para os resíduos não evitáveis aponta-se a valorização (recuperação material, reciclagem, valorização enérgica), aos resíduos não valorizáveis aponta-se a eliminação de forma ambientalmente compatível (ARAÚJO; JURAS, 2012, p. 63). Além da Alemanha, a União Europeia tem editado normas que orientam a gestão de resíduos em vários âmbitos (resíduos em geral, óleos usados, pilhas e acumuladores, embalagens e resíduos de embalagens, veículos em fim de vida, etc.), estas diretivas estão se tornando leis nacionais em vários países, França e Espanha são os mais recentes exemplos de países que editaram leis específicas. Novos princípios de responsabilidade ambiental estão sendo disseminados, entre os quias se encontra o Extend Product Responsibility (Responsabilidade Estendida do Produto), que serviu inspiração para a Lei da PNRS. Alguns outros países têm adotado instrumentos econômicos, não apenas comando e controle, voltados à prevenção da geração de resíduos e ao incentivo à reutilização e à
47 reciclagem: Áustria, Dinamarca, Hungria, Itália, Suíça, Japão, Canadá, EUA (ARAÚJO; JURAS, 2012, p. 63). Manzini e Vezzoli (2011, p. 87) apresentam a definição de Extensão da Responsabilidade do Produtor (Extended Producer Responsibility) originalmente feita pelos pesquisadores da Universidade de Lundt: […] a extensão da responsabilidade do produtor é uma estratégia visando à redução do impacto ambiental de um produto, tornando o produtor responsável pelo ciclo de vida total do produto e, em particular, pela recuperação, pela reciclagem e pela digestão dos resíduos finais. A extensão da responsabilidade pode ser implementada através de instrumentos administrativos, econômicos e informativos. A composição desses instrumentos determina a fórmula precisa da extensão da responsabilidade.
No Brasil, antes mesmo da Lei da PNRS ser sancionada, a Lei n.º 9.974 de 06 de junho de 2000, introduziu o dever do usuário de agrotóxicos de devolver as embalagens vazias aos estabelecimentos comerciais, nos quais foram adquiridas. Atribuindo às empresas produtoras e comercializadoras de agrotóxicos a responsabilidade pela destinação final ambientalmente adequada das embalagens vazias de seus produtos, dos produtos retidos pela fiscalização e daqueles que forem considerados impróprios para o uso ou em desuso. O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) também atribuiu responsabilidades similares às empresas
fabricantes
ou
importadoras
de
pneumáticos 28,
aos
fabricantes,
importadores e comerciantes de pilhas e baterias 29 e aos fabricantes e comerciantes de óleos lubrificantes30 (ARAÚJO; JURAS, 2012, p. 67). Para a Lei da PNRS a Responsabilidade Compartilhada será traduzida por meio de ações de todos os entes e os entrelaça, pessoas físicas e jurídicas de direito privado com pessoas jurídicas de direito público, com um mesmo objetivo: “minimizar o volume dos resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo 28 Resolução n.º 416 de 30 de setembro de 2009: “para cada pneu novo comercializado para o mercado de reposição, as empresas fabricantes ou importadoras deverão dar destinação adequada a um pneu inservível”. (ARAÚJO; JURAS, 2012, p. 67). 29 Resolução n.º 401 de 04 de novembro de 2008. “Os fabricantes nacionais e os importadores de pilhas e baterias devem, ainda, apresentar ao órgão ambiental competente plano de gerenciamento de pilhas e baterias, que contemple a destinação ambientalmente adequada” (ARAÚJO; JURAS, 2012, p. 67). 30 Resolução n.º 362 de 23 de junho de 2005: “todo óleo lubrificante usado ou contaminado deverá ser recolhido, coletado e ter destinação final, de modo que não afete negativamente o meio ambiente e propicie a máxima recuperação dos constituintes nele contidos.” (ARAÚJO; JURAS, 2012, p. 67).
48 de vida dos produtos” (SILVA, 2014, p. 26). As ações deverão ser tanto individualizadas (todos os atores que foram caracterizados pela lei, obrigatoriamente deverão dar a sua parcela de contribuição no equacionamento do retorno do resíduo sólido de saúde, doméstico, industrial, etc.) quanto encadeadas e serão realizadas por meio de tarefas específicas, inter-relacionadas, para cada um dos atores da cadeia de produção e consumo, dentro de suas competências e aérea de atuação (ARAÚJO; JURAS, 2012, p. 67), A Lei da PNRS (BRASIL, 2012, p. 28) entende que esta responsabilidade compartilhada será estruturada e implementada quando: – A iniciativa privada efetuar investimentos no desenvolvimento de produtos sustentáveis, que não agridam o meio ambiente quando de sua fabricação e que, após o ciclo de vida chegar ao fim, possam retornar facilmente ao fluxo como insumos ou possam ser descartados de forma ambientalmente adequada; Os consumidores forem informados sobre as ações a serem tomadas quando os produtos chegarem ao fim da vida útil, quanto à reciclagem ou disposição final; Os resíduos sólidos e as embalagens forem sistematicamente recolhidos e recebam a devida destinação final; Todos os elos da cadeia participem de forma conjunta dos planos de gestão integrada de resíduos sólidos, quando os produtos que fluem em seus canais ainda não estão sendo objeto de sistema de logística reversa (Art. 31º); – As embalagens forem projetadas para que seus materiais constituintes passem por processo de reutilização ou reciclagem de forma eficiente e eficaz (Art. 32º); – Sistemas de logística reversa sejam estruturados e implementados pelos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de agrotóxicos, pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes, lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio, produtos eletrônicos, que atuem de forma independente, porém complementar, dos sistemas públicos de coleta e limpeza urbana, que objetivem o retorno dos produtos ou embalagens que foram descartados pelo consumidor após o uso (Art. 33º)31; 31 Em 22/08/2013 o Deputado Federal Major Fábio (DEM/PB) apresentou o Projeto de Lei (PL) 6.160 que sugere uma alteração no texto do Art. 33º, que estabelece quais os segmentos de mercado que são obrigados a estruturar e implementar os sistemas de logística reversa, com a inclusão do inciso VII: “Medicamentos para uso humano e animal, seus resíduos e embalagens.”. Foi apensado ao PL 2.121/2011, apresentado pelo Deputado Walney Rocha (PTB/RJ), que sugere que “as farmácias, drogarias e farmácias de manipulação devem disponibilizar recipiente, em local de fácil visualização, para recolhimento de medicamentos
49 – As coletas seletivas forem estruturadas em nível municipal, com envolvimento e participação de todos, até mesmo do consumidor final quando do descarte dos resíduos, desde a forma de separar até a forma de acondicionar aquilo que seguirá para a destinação final (Art. 35º); – O titular dos serviços públicos estruturar o sistema público de coleta e limpeza urbana para que não apenas descarte os resíduos nos aterros ou lixões, mas que possibilite condições de separar os rejeitos, para os quais não há outra destinação possível que não seja a disposição final, de resíduos que ainda podem receber outras tratativas que não a disposição final (Art. 36º). – O Princípio do reconhecimento do resíduo sólido 32: O preceito legal estabelece prioridade na não geração de resíduos, na inevitabilidade da geração, assuma-se a reutilização ou a reciclagem como degraus a serem obrigatoriamente seguidos. Este é essencialmente o “espírito” da Lei (MACHADO, 2012, p. 50). A União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios em suas áreas de abrangência e jurisdição, poderão instituir dispositivos legais ou normativos que objetivem a concessão de incentivos fiscais, financeiros ou creditícios às indústrias e entidades que tenham processos produtivos que priorizem a reutilização, o tratamento e a reciclagem de resíduos sólidos33 (MACHADO, 2012, p. 52). A Lei da PNRS prevê que para a promoção da cidadania, gerar renda e trabalho e recuperar os valores econômicos dos resíduos sólidos por meio da reutilização e da reciclagem, algumas medidas deverão ser tomadas: a extinção dos lixões a médio prazo (prazo original final seria 02 de agosto de 2014); a não proliferação de aterros sanitários e de incineradores que são emissores de GEE; estimular a reutilização de materiais servíveis em mercados secundários; estimular a utilização de materiais reciclados nos processos fabris, aumentando com isso o valor dos resíduos, causando um efeito em cadeia que pode redundar em benefícios sociais por todos os fluxos produtivos diretos e reversos (SILVA, 2014, p. 27) 34. impróprios para o consumo ou com data de validade vencida”, foi encaminhado em 09/10/2013 à Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) para ser analisado pelo relator o Dep. Marcus Pestana (PSDB/MG). Disponível em <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=588760> Acesso em Março de 2014. 32 Descrição completa: “o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor da cidadania” (BRASIL, 2012, p. 13) 33 “[…] respeitadas as limitações da Lei Complementar n.º 101, de 04 de maio de 2000 (Lei da Responsabilidade Fiscal)” (MACHADO, 2012, p. 52).
50 Dentre as metas que devem constar no Plano Nacional de Resíduos Sólidos estão inseridas a inclusão social e a emancipação econômica dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis35. Para tanto estabelece a integração destes catadores nas ações que envolvem a Responsabilidade Compartilhada Pelo Ciclo de Vida do produto como um de seus objetivos 36. E um dos instrumentos que deve ser utilizado para isso é (art. 8º, IV): “o incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis” (BRASIL, 2012, p. 18). Cooperativas e associações que congreguem os catadores, de forma que a classe seja fortalecida e possa dotá-la de instrumentos que previnam contra exploração por parte dos demais setores da cadeia produtiva. Não pretende extinguir com a atividade do catador, mas sim de inclui-lo socialmente e valorizá-lo economicamente (MACHADO, 2012, p. 52). – O Princípio da razoabilidade e a proporcionalidade: Pela razoabilidade busca-se garantir que todos os atos administrativos relacionados à gestão e ao gerenciamento dos resíduos sólidos terão a razoabilidade como amparo legal de sua legitimidade, ou seja, quando não houver uma norma expressa ou clareza numa regra, dar-se-á a oportunidade de que a mesma seja interpretada na concepção mais profunda e mais equânime. Este princípio é extremamente necessário face às diferenças regionais e locais e realidades econômicas distintas e discrepantes 34 O projeto de Lei 425/2014, aprovado no Senado no dia 07/07/2015 alterou o prazo da Lei 12.305/2010 para extinção dos lixões, o novo texto estabelece um prazo escalonado: “Art. 1º Os arts. 54 e 55 da Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, passam a vigorar com a seguinte redação: Art. 54. A disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, observado o disposto no § 1º do art. 9º, deverá ser implantada nos seguintes prazos: I – até 31 de julho de 2018, para capitais de Estados e de Municípios integrantes de Região Metropolitana (RM) ou de Região Integrada de Desenvolvimento (Ride) de capitais; II – até 31 de julho de 2019, para Municípios com população superior a 100.000 (cem mil) habitantes no Censo 2010, bem como para Municípios cuja mancha urbana da sede municipal esteja situada a menos de 20 (vinte) quilômetros da fronteira com outros países limítrofes; III – até 31 de julho de 2020, para Municípios com população entre 50.000 (cinquenta mil) e 100.000 (cem mil) habitantes no Censo 2010; IV – até 31 de julho de 2021, para Municípios com população inferior a 50.000 (cinquenta mil) habitantes no Censo 2010. Parágrafo único. A União editará normas complementares para definição de critérios de priorização de acesso a recursos federais e para implementação de ações vinculadas dentro dos prazos máximos estabelecidos nos incisos do caput.” (NR). “Art. 55. O disposto nos arts. 16 e 18 entra em vigor nos seguintes prazos: I – até 31 de julho de 2017, para Estados e para Municípios com população igual ou superior a 50.000 (cinquenta mil) habitantes no Censo 2010; II – até 31 de julho de 2018, para Municípios com população inferior a 50.000 (cinquenta mil) habitantes no Censo 2010. Parágrafo único. Os Estados deverão apoiar os Municípios nos estudos de regionalização, na formação de consórcios públicos e no licenciamento ambiental.” Disponível em: <http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/119536> Acesso em 30 de abril de 2016. 35 Art. 15º, V: “metas para a eliminação e recuperação de lixões, associados à inclusão social e à emancipação econômica dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis”. (BRASIL, 2012, pg. 18). 36 Art. 7º, XII: “Integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos”.
51 (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 64; MACHADO, 2012, p. 53; MARTINS; MURARI, 2013, p. 27). Pela proporcionalidade busca-se garantir que haja correspondência entre a finalidade de uma disposição de cunho normativo ou diretriz e o meio, ou instrumento, empregado para que ela seja alcançada, ou seja, se corresponde ao critério de medida justa e oportuna, em relação ao termo de deferimento. Se as duas grandezas ou coisas estão em recíproca relação. O meio ou instrumento a ser escolhido deverá ser adequado para atingir o resultado almejado, revelando-se conforme e útil ao fim desejado (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 64; MACHADO, 2012, p. 53; MARTINS; MURARI; 2013, p. 27).
2.2.2 Dos Objetivos
Os objetivos da Lei da PNRS são apresentados no art. 7º, com destaque para o objetivo II, que pode ser tomado como o objetivo síntese das disposições trazidas por este diploma legal (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 65): I – Proteção da saúde pública e da qualidade ambiental; II – Não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos; III – Estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços; IV – Adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais; V – Redução do volume e da periculosidade dos resíduos perigosos; VI – Incentivo à indústria da reciclagem, tendo em vista fomentar o uso de matérias-primas e insumos derivados de materiais recicláveis e reciclados; VII – Gestão integrada de resíduos sólidos; VIII – Articulação entre as diferentes esferas do poder público, e destas com o setor empresarial, com vistas à cooperação técnica e financeira para a gestão integrada de resíduos sólidos; IX – Capacitação técnica continuada na área de resíduos sólidos; X – Regularidade, continuidade, funcionalidade e universalização da prestação dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, com adoção de mecanismos gerenciais e econômicos que assegurem a recuperação dos custos dos serviços
52 prestados, como forma de garantir sua sustentabilidade operacional e financeira, observada a Lei 11.445, de 2007; XI – Prioridade, nas aquisições e contratações governamentais para: a) produtos reciclados e recicláveis; b) bens, serviços e obras que considerem critérios compatíveis com padrões de consumo social e ambientalmente sustentáveis; XII – Integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; XIII – Estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do produto; XIV – Incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o aproveitamento energético; XV – Estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável (BRASIL, 2012, pg. 13-140.37
– Não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos: A apresentação do objetivo de forma gradual e hierarquizada não foi acidental, a diretriz constante no art. 9º da Lei da PNRS estabelece a hierarquia 38. O enunciado lista as ações por grau de importância, por ordem de prioridade a ser observada obrigatoriamente na gestão e no gerenciamento dos resíduos sólidos, o que torna este objetivo de longe o mais significativo, os demais convergem para ele, direta ou indiretamente. A inovação fundamental trazida por este objetivo é que “não gerar” é colocada em primeiro lugar, antes mesmos dos tradicionais “3R” (YOSHIDA; 2012, p. 24). Busca-se desta forma, “não geração”, a resolução da causa fundamental do problema de dispersão de resíduos sólidos. O viés prático-legal da novel Lei recomenda que o manejo ambientalmente saudável de resíduos deva ir além da disposição final segura. Este objetivo será alcançado por meio de outros objetivos da própria Lei da PNRS: Estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços; Incentivo à indústria da reciclagem, tendo em vista fomentar o uso de matérias-primas e insumos derivados de materiais recicláveis e reciclados; Gestão integrada de resíduos sólidos; Estímulo à implementação da 37 Serão objeto de discussão apenas aqueles que tangenciam os objetivos desta pesquisa. 38 “Na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos, deve ser observada a seguinte ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos.” (BRASIL, 2012, p. 15).
53 avaliação do ciclo de vida do produto; Incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o aproveitamento energético; Estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável (MARTINS; MURARI, 2013, p. 19). A interdependência dos princípios, objetivos e instrumentos da Lei da PNRS é visível. Este objetivo de “não geração de resíduos” contribui para que o Princípio da Responsabilidade Compartilhada seja estruturado e implementado, por usa vez, depende de que alguns instrumentos (educação ambiental), ou outros objetivos (alteração dos padrões não sustentáveis de produção e consumo) lhe auxiliem na consecução do resultado, já o objetivo de “alteração dos padrões não sustentáveis de produção e consumo” requer a intervenção da “educação ambiental”. “Não geração” é mais do campo do consumo consciente ou sustentável 39 do que do campo da logística e produção (SILVA, 2014, p. 29). A “não geração” exige mudanças na própria atividade econômica. A forma como as relações comerciais têm se dado atualmente são insustentáveis 40, necessário se faz refletir sobre o modelo que se tem e aquele que se deseja. A busca constante por inovação tecnológica que possibilite que o processo produtivo seja mais eficiente e alcance melhor aproveitamento dos bens envolvidos, com geração de resíduos cada vez menor e que estes sejam reinseridos no próprio processo e o emprego de mecanismos de gestão ambiental em cada etapa da cadeia de valor, desde a criação até a fase de descarte do rejeito.
39 A advertência de Leonard (2011, p. 159) sobre consumismo é muito pertinente: “consumismo refere-se à atitude de tentar satisfazer carências emocionais e sociais através de compras e demonstrar o valor pessoal por meio do que se possui. Já o superconsumismo é quando utilizamos recursos além dos necessários e dos que o planeta pode suprir”. 40 “A insustentabilidade surge quando a degradação entrópica suplanta a capacidade dos seres vivos em assegurar uma baixa entropia, ou seja: a base material e energética da vida vai se reduzindo.” (STAHEL, 2009, p. 117).
54 Educação ambiental para todos e participação dos mais diversos setores da sociedade, como estabelece a Declaração do Rio, 41 na implementação de políticas ambientais é de vital importância (LEMOS, 2012, p. 53). A “redução” também será alcançada por meio das ações, instrumentos e diretrizes aplicadas à “não geração”. Braungart e McDonough (2013, pg. 58-59) advertem que a redução ou a desmaterialização 42 não são eficazes para deter o esgotamento do meio ambiente e a consequente destruição e degradação das reservas ambientais, apenas diminuem a velocidade destas. O que levará a degradação e a destruição ocorrerem numa escala menor e por um período de tempo maior, com a mesma virulência que uma degradação pontual e intensiva. Este objetivo será alcançado por meio de políticas públicas e ações corporativas e empresariais que contribuam para reduzir eficientemente a geração de resíduos. Estas ações estão diretamente ligadas a outro objetivo da Lei da PNRS: “Estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do produto” (13º). Visto que é necessário, desde a fase de projeto, antever as formas de geração de resíduos e buscar novas tecnologias que impeçam esta geração. Algumas ações que contribuem para que o objetivo seja alcançado: revisão do acondicionamento do produto (embalagens adequadas, que não contribuam para a geração de resíduos por meio das avarias de transporte e armazenagem); revisão de processos ineficientes de movimentação de materiais; adequação dos equipamentos de movimentação de materiais ao perfil de carga utilizado, reduzindo o risco de geração de resíduos; controle de estoque eficiente (produtos que se tornam resíduos por expiração da data de validade, estando ainda no transportador ou no distribuidor).
41 O princípio 10º da Declaração do Rio dispõe que: “[…] a melhor maneira de tratar questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar em processos de tomadas de decisões. Os Estados devem facilitar e estimular a conscientização e a participação pública, valorando a informação à disposição de todos. Deve ser propiciado acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que diz respeito à compensação e reparação de danos.” (LEMOS, 2012, p. 55) 42 “Redução ou diminuição da quantidade de matérias-primas utilizadas num processo produtivo específico ou a redução do tamanho do produto em si.” (BRAUNGART; MCDONOUGH; 2013, p. 58).
55 Alguns produtos são enviados pelo fornecedor com data de validade muito próxima, o comprador recusa a carga quando do ato da entrega e o fornecedor responsabiliza o transportador pelos resíduos, má gestão (SILVA, 2014, p. 29). Adverte Demajorovic (2013, pg. 30), que a maioria das empresas prefere a estratégia tradicional de destinação final: Com efeito, quanto mais o objetivo do mero controle se desloca para a redução de resíduos e de riscos já no próprio processo produtivo, maiores são dos desafios para as empresas, uma vez que dependem de um conhecimento e de um processo de aprendizado estranhos à realidade da maioria delas.
Os degraus seguintes (reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos) estão inseridos no que a Lei da PNRS (BRASIL, 2012, pg. 10) no art. 3º (Definições), VII, conceitua como destinação final ambientalmente adequada: destinação de resíduos que inclui a reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético ou outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama43, do SNVS44 e do Suasa45, entre elas a disposição final, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos.
As características dos resíduos sólidos determinam a classificação dos resíduos e, em decorrência, a forma de manuseio que deve-se aplicar aos mesmos, além de induzir a designação da forma de destinação final. Tem que haver compatibilidade entre a tipologia e a natureza do resíduo e o local de sua pretendida destinação ou disposição final (VIEIRA, 2013, p. 111). “Reutilização” ou “reconsumo” é um canal reverso da logística e um dos que mais depende que a “educação ambiental” possibilite o surgimento de espaço para discussões em torno da necessidade da mudança de padrões de consumo. Este objetivo é conceituado no art. 3º, XVIII como: processo de aproveitamento dos resíduos sólidos sem sua transformação biológica, física ou físico-química, observadas as condições e os padrões estabelecidos pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa” (BRASIL, 2012, p. 12). 43 Sistema Nacional do Meio Ambiente. 44 Sistema Nacional de Vigilância Sanitária. 45 Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária.
56 “Reutilização” é o processo de extensão do uso de um produto ou seus componentes, a reaplicação do uso sem transformação por meio de qualquer processo industrial. É uma das mais simples ações contra o descarte indevido de rejeitos. Em alguns casos trata-se da transferência, com todas as complexidades logísticas e de marketing que esta operação requer, do bem em fim de uso para outros mercados secundários, que o absorvam sem alterações em sua forma (COSTA; MENDONÇA; SOUZA, 2014, p. 24; LEITE, 2009, p. 9). As origens podem ser as mais diversas: aspectos comerciais (o produto ficou obsoleto, erro de expedição ou excesso de estoque, mercadoria em consignação, pequenos defeitos estéticos que não comprometem o uso, mudança de estação 46, prazo de validade vencido47); fim de uso (o produto tornou-se inservível ao proprietário, porém ainda encontra-se em perfeitas condições de uso, sofre processo de higienização e pequenos reparos antes de ser encaminhado para o mercado de bens de segunda mão) (COSTA; MENDONÇA; SOUZA, 2014, p. 24; LEITE, 2009, p. 9). Os produtos originários de “questões comerciais” podem ser reinseridos no mercado por meio de outros canais de distribuição: os outlets, lojas de venda a varejo no qual os próprios fabricantes ofertam os seus produtos diretamente ao púbico alvo sem intermediários, normalmente fora dos grandes centros urbanos e mercantis. Os originários de “fim de uso” podem ser enviados para mercados de bens de segunda mão (bazares e brechós), dessa forma um mesmo produto pode ser reutilizado inúmeras vezes, por consumidores diferentes, até que atinja o fim de sua vida útil e receba a devida disposição final; além das práticas simples e tão comuns de doação do bem a quem dele ainda pode fazer uso, que, em algumas
46 “No ramo têxtil, existe a necessidade de retirar do canal de venda toda coleção de roupas por conta da troca de estação. Nas lojas não faz sentido deixar roupas de verão quando entra a estação mais fria, esta coleção então é destinada a outros canais de vendas em outras regiões com climas diferentes, garantindo a comercialização destes produtos.” (MACEDO, 2011, p. 54). 47 “Ainda encontramos casos de devolução dos produtos por fim do prazo de validade, na indústria alimentícia é muito comum ter que retirar o produto do mercado por estar com o prazo de validade próximo do vencimento, então este produto retirado é destinado normalmente à produção de ração animal. Neste caso a base do produto retirado serviu de matéria-prima para outro produto, novamente observamos a condição de comercialização do produto. Na indústria alimentícia quando não há a possibilidade do reaproveitamento para ração animal é efetuado o descarte total do produto por questões de qualidade e risco de contaminação.” (MACEDO, 2011, p. 54).
57 situações, é tão distinto daquele para qual foi projetado e destinado originalmente (COSTA; MENDONÇA; SOUZA, 2014, p. 24; VIEIRA, 2013, p. 111). A advertência de Braungart e Donough (2013, pg. 60) quanto ao reúso não deve ser desprezada e parece ser cabível que encerre a discussão sobre este objetivo da PNRS: Encontrar mercados para reusar resíduos também pode dar às indústrias e consumidores a sensação de que algo de bom está sendo feito pelo meio ambiente, porque as pilhas de resíduos parecem “ir embora”. Mas, em muitos casos, esses resíduos – e quaisquer toxinas e contaminantes que contiverem – são simplesmente transferidos para outro lugar.
“Reciclagem” é definida pelo legislador no art. 3º, XIV como o processo de “transformação dos resíduos sólidos que envolve a alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à transformação em insumos ou novos produtos” (BRASIL, 2012, p. 13). Lemos (2012, p. 129) chama à atenção para o fato de que este objetivo correlaciona-se com os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade (que vão requerer a investigação em alguns casos concretos, se o processo de reciclagem em si, que visa a preservação dos bens abióticos, não implica em desperdício energético, ponderando os interesses ambientais
envolvidos
se
necessário),
bem
como
com
o
princípio
do
“reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania”, art. 6º, VIII (BRASIL, 2012, p. 13). O processo de reciclagem é mais amplo do que o sentido que o termo encerra, inclui diversas etapas e atividades que transcendem a alteração das propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas. É um conjunto de atividades, técnicas, processos e operações que visam à revalorização dos resíduos, nos quais os materiais constituintes dos produtos descartados são extraídos industrialmente (reutilização ou reaproveitamento de polímeros 48), sofrendo transformação em matérias-primas secundárias ou recicladas que serão reinseridas no ciclo produtivo
48 “Substância constituída de moléculas caracterizadas pela repetição múltipla de uma ou mais espécies de átomos ou grupo de átomos (unidades constitucionais) ligados uns aos outros em quantidades suficientes para fornecer um conjunto de propriedades que não variam acentuadamente com a adição ou a remoção de uma ou algumas unidades constitucionais.” (RAZZOLINI FILHO; BERTÉ; 2009, p. 100).
58 de novos produtos do mesmo ciclo (ciclo fechado 49) ou de outro (ciclo aberto50) (GUARNIERI, 2011, p. 82; RAZZOLINI FILHO; BERTÉ; 2009, p. 100). Guarnieri
(2009, p. 83-84) faz distinção entre recycling (reciclagem
propriamente dita), downcycling e upcycling. Recycling estritamente seria a recuperação dos materiais constituintes de um resíduo sólido e a reinserção destes no mesmo ciclo produtivo para a produção de um produto similar ao que deu origem à matéria-prima secundária51. Downcycling seria a recuperação dos materiais constituintes de um resíduo sólido e a reinserção destes em um ciclo produtivo que resulte em produto com valor inferior ao que deu origem à matéria-prima secundária (o processo de recuperação ou extração dos materiais constituintes não é eficiente)52. Upcycling seria a recuperação dos materiais constituintes de um resíduo sólido e a reinserção destes em um ciclo produtivo que resulte em produto com melhor qualidade e valor ambiental superior ao que deu origem à matéria-prima secundária53. Para Leite (2009, pg. 9, 51), reciclagem se constitui num canal reverso de revalorização da logística, com todas os vieses estratégicos e operacionais, compreendendo diversas etapas e atividades para o reaproveitamento dos materiais constituintes (a fase inicial do canal é o descarte, seguindo-se o desmanche 54 do produto para a separação dos componentes e o envio do material para reciclagem ou para outro canal reverso, a remanufatura 55), enquanto que “reciclagem industrial” 49 “são constituídos por etapas de retorno de produtos de pós-consumo, nas quais os materiais constituintes de determinado produto descartado, ao fim de sua vida útil, são extraídos seletivamente para a fabricação de um produto similar ao de origem.” (LEITE, 2009, p. 57). 50 “são constituídos pelas diversas etapas de retorno dos materiais constituintes dos produtos de pós-consumo […], nos quais esses materiais são extraídos de diferentes produtos de pós-consumo, visando à sua reintegração ao ciclo produtivo e substituindo matérias-primas novas na fabricação de diferentes tipos de produtos.” (LEITE, 2009, p. 55). 51 Ex: óleo do motor do veículo, após filtração e destilação, o resíduo volta a ter a mesma qualidade que o óleo que deu origem ao resíduo. 52 Ex: o papel de boa qualidade para ser utilizado para receber escrita não pode ser reciclado em papel da mesma qualidade e tipo e características. Os materiais constituintes, que foram extraídos são utilizados para produzir papel para fotocópias, papel higiênico, papel cartão, etc. 53 Ex: lona de caminhão usada que é transformada em bonés, roupas, chapéus, bolsas e outros artigos com alto valor agregado. 54 Desmontagem, desmanche ou canibalismo é um processo intrínseco ao processo de reciclagem propriamente dito: “um processo industrial no qual um produto durável de pós-consumo é desmontado em seus componentes. Os componentes em condições de uso ou de remanufatura são separados e destinados à remanufatura industrial e os materiais para quais não existem condições de revalorização são enviados para a reciclagem industrial”. (LEITE, 2009, p. 9) 55 “Remanufatura é o canal reverso no qual os produtos podem ser reaproveitados em suas partes essenciais (‘cores’), mediante a substituição de alguns componentes complementares reconstituindo-se um produto com a mesma finalidade e natureza do original.” (LEITE, 2009, p. 8). “quando os componentes provenientes
59 é o processo industrial de reciclagem propriamente dito, a viabilidade técnica e econômica deste processo é o aspecto mas importante na estruturação do canal reverso. Sob outra perspectiva, reciclagem é apresentada como: “uma forma de substituição de matérias-primas primárias e uma fonte de economia de energia” (COSTA; MENDONÇA; SOUZA, 2014, p. 30). A economia da energia que seria consumida durante o processo de beneficiamento da matéria-prima, que deixou de ser extraída, além da economia com a não extração de recursos naturais, que podem não ser renováveis. A reciclagem industrial emprega tecnologias distintas para cada tipo de material constituinte: fusão, processos magnéticos, térmicos, mecânicos, ópticos, químicos, espectrofotometria, etc. Os resíduos passam por diversas etapas dentro do processo: separação do resíduo, extração do material constituinte, purificação industrial e filtração do material extraído para que se avalie a adequação às exigências de qualidade do processo de fabricação do produto dos quais se tornarão matéria-prima secundária (LEITE, 2009, p. 159). Para que o processo de reciclagem obtenha êxito e seja eficiente, a definição da reciclabilidade tecnológica dos materiais constituintes dos resíduos sólidos precisa ser efetuada. Este processo permite que se avalie qual o nível de adequação técnica da matéria-prima secundária ao processo de reciclagem industrial (LEITE, 2009, p. 160). A reciclabilidade tecnológica exige que certos critérios sejam preenchidos para validar a adequação técnica de um material constituinte: a) facilidade de transporte com o pós-consumo (baixa densidade volumétrica é onerosa e torna-se impeditivo); facilidade de desmontagem do produto durável (custos associados à desmontagem complexa pode onerar); aptidão para remanufatura (nível de padronização do produto alto e constância dos componentes são significativos); facilidade de separação do produto de pós-consumo (se há indicação clara dos componentes dos produtos); facilidade de extração do material constituinte dos produtos de pós-consumo (dificuldades técnicas inerentes ao material ou de concepção do projeto56); conservação das propriedades originais (materiais que não do processo de desmanche industrial […] passam por técnicas avançadas de engenharia de produção que promovem a sua reparação ou renovação” (COSTA; MENDONÇA; SOUZA, 2014, p. 30). 56 “Alguns exemplos são as modificações de projeto que melhoram as linhas de desmontagem de veículos e a redução no número de diferentes tipos de plásticos na confecção de computadores, visando a facilidade de
60 são totalmente reprodutíveis quando reciclados industrialmente 57); número de reutilizações possíveis (quantidade de reciclagens, sem que ocorra a gradativa degradação das principais propriedades requeridas); nível percentual de substituição das
matérias-primas
novas
(capacidade
do
material
secundário
substituir
integralmente ou parcialmente a matéria-prima virgem, pureza exigida do material constituinte reciclado) (LEITE, 2009, p. 160-161). Braungart e Donough (2013, pg. 63) fazem advertências pontuais ao modo como as empresas hoje estão operacionalizando a reciclagem industrial: A simples reciclagem de um material não o torna ecologicamente benigno de modo automático, especialmente se ele não foi especificamente projetado para a reciclagem. Adotar sem questionar abordagens ambientais superficiais, sem compreender plenamente seus efeitos, pode não ser melhor – talvez possa ser até pior – do que não fazer nada […] Pode ser mais caro para as empresas, em parte por tentar prolongar o tempo de vida dos materiais mais do que o projetado, uma conversão complicada e confusa, que, em si mesma, despende energia e recursos.
Leonard (2011, p. 231) faz ressalvas sobre como o processo de reciclagem industrial é apresentado como solução para a entropia atual: É especialmente alarmante, quando observamos as estatísticas sobre a crescente geração de dejetos. Sim, a reciclagem está aumentando, mas o mesmo ocorre com o lixo. Nosso objetivo não deveria ser reciclar mais, e sim descartar menos […] reciclar é uma saída fácil: não põe em xeque questões que envolvem os atuais sistemas de produção e consumo, nem a manutenção de um modelo econômico obcecado por crescimento, nem a distribuição desigual dos recursos do planeta.
A Lei da PNRS prevê a utilização de diversos tipos de tecnologias de tratamento dos resíduos sólidos, além do tratamento mecânico citado, dentre elas: tratamento bioquímico: através da ação de grupos de seres vivos (bactérias, fungos, lesmas e minhocas), que se alimentam dos resíduos reduzindo a densidade volumétrica das moléculas, com a variação da temperatura, pressão e acidez destas moléculas as substâncias resultantes reagem entre si quimicamente, caracterizando separação. A tecnologia e o teor de determinada matéria-prima podem variar em função do produto de pósconsumo utilizado, resultando em custos diferentes e orientando o mercado de pós-consumo para aqueles que se apresentam mais convenientes.” (LEITE, 2009, p. 161). 57 “[…] não se consegue, com o nível atual da tecnologia, manter as mesmas propriedades originais do material, sendo obrigatória sua reintegração em produtos que demandem níveis diferentes dessas propriedades.” (LEITE, 2009, p. 161).
61 o processo bioquímico (biodigestão58, compostagem59) e o tratamento térmico: os resíduos recebem energia em forma de calor, a intensidade sendo determinada pela combinação da temperatura de reação com o tempo de reação, resultando na alteração das características dos resíduos. Os diversos processos físico-químicos ocorridos durante o processo causam a redução volumétrica (secagem60, pirólise61, gaseificação62, incineração, plasma) (MACHADO, 2013). As discussões “acaloradas” de ambientalistas, acadêmicos e profissionais de gestão e gerenciamento de resíduos sólidos sobre a eficácia dos processos térmicos indicam falta de consenso sobre o tema. As tecnologias de maior aceitação no mercado são incineração e tocha de plasma, sendo aquela a que menos consenso obtém. Estas discussões giram em torno do consumo excessivo do oxigênio, da liberação do carbono por meio da combustão e da geração das cinzas. Especialistas apontam o fato de que a redução da volumetria por meio da incineração é grande, porém não o suficiente para extinguir todo o resíduo sólido, além disso a oferta de oxigênio, que deve ser feita para que uma incineração seja considerada eficiente, tem que ser superior às necessidades de queima dos rejeitos, ultrapassando de 10 a 25% (MONTEIRO et al. 2001, p. 140). Incineração pode ser definida como “processo de queima, na presença de excesso de oxigênio, no qual os materiais à base de carbono são decompostos, desprendendo calor e gerando um resíduo de cinzas” (MONTEIRO et al. 2001, p. 140)63. 58 “Decomposição da matéria orgânica na ausência de oxigênio nos chamados Biodigestores ou Centrais de Biogás” (MACHADO, 2013). 59 “Decomposição da matéria orgânica na presença de oxigênio em Usinas de Compostagem” (MACHADO, 2013). 60 “Retirada de umidade dos resíduos com uso de correntes de ar. Ocorre na presença do ar atmosférico e temperatura ambiente” (MACHADO, 2013). 61 “Decomposição da matéria orgânica a altas temperaturas e na ausência total ou quase total de oxigênio. As temperaturas do processo podem variar de 200 a 900°C” (MACHADO, 2013). 62 “Transformação de matéria orgânica em uma mistura combustível de gases (gás de síntese). Na maioria dos processos não ocorre uma oxidação total da matéria orgânica em temperaturas variando entre 800 e 1600°C” (MACHADO, 2013). 63 O processo é efetuado em um incinerador composto por duas câmaras de combustão, na primeira câmara, os resíduos sólidos ou líquidos, são expostos à temperatura que pode variar entre 800 e 1.000 °C. O excesso de oxigênio se faz necessário para que a combustão ocorra de forma eficiente. Após o processo, todos os resíduos que estavam na câmara são transformados em gases, cinzas e escória. Os gases que foram gerados na primeira combustão sofrem uma segunda combustão na segunda câmara, a temperatura pode variar de 1.200 a 1.400 °C. Depois que o processo de queima é efetuado, os gases passam por um processo de resfriamento rápido, que tem por finalidade evitar que as cadeias orgânicas tóxicas, que são bastantes
62 A falta de consenso é recente, contudo o ato da combustão de rejeitos é quase tão antigo quanto o ato de lançar fora objetos inservíveis: Cerca de 630 a.C. o rei reformador Josias determinou o vale de Geena, uma área ao sul da cidade de Jerusalém, como local impuro, por ter sido o local preferido do culto ao deus Moloque com prováveis sacrifícios humanos, antes da presença hebreia. Por conta disto o mesmo passou a receber todos os detritos sólidos da cidadela, servindo por centenas de anos como lixão a céu aberto. O lixo da cidade era lançado e queimado ali e não poucos cadáveres foram lançados também. A julgar pelos textos bíblicos que cobrem uma faixa de tempo considerável, o fogo das incinerações ardia dia e noite e parecia nunca se extinguir. Razão pela qual, o vale ficou associado no apocaliptismo judaico e no cristão a uma analogia do inferno: “onde o fogo não para de queimar” (EIGENHEER, 2009, p. 29). Bartholomeu, Caixeta-Filho e Pinheiro (2011, pg. 127) destacam os benefícios que a redução volumétrica por meio da incineração pode trazer: a esterilização e a redução de cerca de 90% do volume dos resíduos. Consequentemente, uma redução dos riscos de contaminação envolvidos numa possível destinação final incorreta e uma contribuição para a ampliação da vida útil dos aterros existentes.
Redução volumétrica apenas não basta, para que incineração possa ser considerada eficiente por uma cosmovisão sustentável e atender aos requisitos da Lei da PNRS. Obrigatoriamente deverá estar associada ao aproveitamento energético, desta forma outros benefícios se somariam aos já mencionados: “contribui para a diversificação da matriz e ampliação da geração de eletricidade nas regiões em questão, evitando a necessidade de investimentos em fontes de energias fósseis e não renováveis” (BARTHOLOMEU; CAIXETA-FILHO; PINHEIRO, 2011, p. 128). Yoshida (2012, p. 25), desembargadora federal e professora universitária, adverte: não se pode ignorar os riscos das emissões tóxicas, liberadas mesmo pelos incineradores mais modernos, constituídas por três tipos de poluentes perigosos para o meio ambiente e para a saúde extensas, se recomponham, logo em seguida, são tratados na área de controle da poluição em lavadores, ciclones ou precipitadores eletrostáticos, para expurgar as substâncias nocivas ao ambiente que porventura ainda restarem, para só então serem lançados na atmosfera por meio de uma chaminé, que deve dispor de filtros eficientes que assegurem a redundância de controle de poluentes, visando o gerenciamento de risco ambiental. (MONTEIRO et al, 2001, p. 140).
63 humana: os metais pesados, os produtos de combustão incompleta e as substâncias químicas novas altamente tóxicas e cancerígenas, formadas durante o processo de incineração, que são as dioxinas e os furanos.
A figura 1 apresenta o corte transversal de um incinerador de grelha fixa 64, um dos mais utilizados hoje em dia.
Figura 1: Incinerador de grelha fixa Fonte: Monteiro et al, 2001, p. 140.
Nenhum processo de incineração atual alcança 100% de eficácia em sua operação. As substâncias advindas do processo, seja por transformação ou combinação de diversas outras substâncias, podem se deslocar eficientemente pelo ar ou pelas correntes oceânicas, alcançando comprovadamente longas distâncias, e causar uma contaminação em níveis globais, algumas vezes, irreversíveis. Além dessa disseminação por meio da natureza, as dioxinas que são liberadas durante o processo de combustão, podem se propagar por meio dos animais ruminantes e dos peixes e contaminar toda a cadeia alimentar, chegando inclusive ao homem (YOSHIDA, 2012, p. 26). Leonard (2011, p. 216-221). faz críticas ao que considera como “suposta 64 Monteiro et al descrevem o funcionamento deste tipo de incinerador: “os resíduos são lançados sobre uma grelha fixa, onde são queimados. O ar é introduzido sobre a grelha de modo a minimizar o arraste das cinzas. As cinzas e a escória resultantes da queima caem através dos orifícios da grelha num cinzeiro, de onde são removidas mecanicamente ou por via úmida. Para garantir o excesso de oxigênio necessário à completa combustão dos resíduos e dos gases, o fluxo de ar é feito por meio de um exaustor colocado antes da chaminé” (2001, p. 140).
64 redução volumétrica dos resíduos sólidos” e lista algumas razões pelas quais os incineradores não deveriam ser utilizados: a) poluem; b) não eliminam a necessidade de aterros: para cada 03 (três) toneladas de rejeitos que são lançadas dentro de um incinerador, 01 (uma) é expelida na forma de cinzas extremamente tóxicas e que tem que ser disposta em aterro sanitário, visto que a concentração de metais pesado nelas é bastante alta. Além da ineficiência dos sistemas de filtragem que não eliminam as toxinas, apenas as deposita em outros locais; c) violam os princípios da justiça ambiental; d) drenam a economia local e geram poucos empregos; e) operação dispendiosa; f) estimulam desperdício; g) minam soluções reais e criativas; h) não fazem sentido algum. As críticas de Leonard fazem ecos às criticas de Braungart e McDonough (2013, pg. 60): […] Os resíduos só queimam em incineradores porque há materiais valiosos – como o papel e o plástico – que são inflamáveis. Uma vez que esses materiais nunca foram projetados para serem queimados com segurança, podem liberar dioxinas e outras substâncias quando incinerados. Em Hamburgo, na Alemanha, algumas folhas de árvores contêm concentrações tão altas de metais pesados advindos de partículas radioativas de incineradores que as próprias folhas devem ser queimadas.
A tecnologia de plasma, entretanto, tem sido apontada como mais eficiente para reduzir a volumetria dos rejeitos sem a geração de resíduos não absorvíveis. Quando um rejeito é exposto à dada temperatura, ocorre a fusão, que é a transição para o estado líquido; se este mesmo líquido continuar recebendo calor de forma cada vez mais gradual, e o processo de aquecimento não refrear, ocorrerá então a ebulição, que é a formação de gases; se esse gás, continuar recebendo calor em altíssimas temperaturas (o gás sofre alterações consideráveis em suas características básicas, quando a temperatura atinge 2.000 ºC as moléculas do gás dissociam-se do núcleo atômico, quando a temperatura atinge 3.000 ºC os átomos são ionizados ao perderem parte dos elétrons), converter-se-á em substância no estado plasmático depois que sofrer colisão quando for exposto à temperatura ambiente. O gás que é produzido durante a gaseificação pode ser utilizado também para gerar energia que dará sustentabilidade à própria usina. A figura 2 apresenta o fluxo
65 operacional de uma usina de plasma (BARTHOLOMEU; CAIXETA-FILHO; PINHEIRO, 2011, p. 132; MENEZES; MENEZES; MENEZES, 1999).
Figura 2: Usina de gaseificação por plasma Fonte: <www.biogroup.net.br/plasma/usinadeplasma.jpg> Acesso 17 de maio de 2014
O processamento por plasma térmico age de duas formas: os resíduos orgânicos são gaseificados, este mesmo gás produzido pode ser utilizado posteriormente para a geração de energia 65; os resíduos inorgânicos, que seriam transformados em cinzas nos incineradores tradicionais, sofrem o processo de liquefação, por terem sido expostos às altas temperaturas, e formam um subproduto inerte e vitrificado, não agressivo ao meio ambiente, que pode receber inúmeras aplicações, desde pavimentação, impermeabilização de telhas até matéria-prima de concreto, dentre outras aplicações (BARTHOLOMEU; CAIXETA-FILHO; PINHEIRO, 2011, p. 133). 65 Durante o processo de combustão são expelidos gases, que passam por vários estágios de um sistema de redução de poluentes (scrubber, por meio do qual os ácidos são removidos do gás, e o gás é enviado para o precipitador eletrostático, que é aplicado para a remoção de poeira e filtros, um terceiro estágio, são utilizados para a remoção de partículas finas), para que ao serem enviados para a atmosfera, por meio da chaminé, as implicações para o ambiente sejam mínimas, ou mesmo nulas. Os gases são então recuperados por meio da corrente quente através de aquecedores convencionais, que são dotados de superaquecedores eficientes que contribuem para aumentar a recuperação de energia. (OLIVEIRA, 2000, p. 3).
66 As principais vantagens para o uso do plasma: a capacidade de alcançar elevadíssimas temperaturas possibilitam que a pirólise da substância orgânica seja efetuada de forma rápida e completa; capacidade de efetuar a fusão e vitrificar determinados resíduos inorgânicos; os reatores de plasma são de dimensões compactas, visto que a energia se apresenta em alta densidade, sem que a capacidade dos mesmos seja reduzida por isso, o que também favorece a construção
de
equipamento
móvel;
as
instalações
necessárias
para
o
processamento dos gases exaustos não precisam ser de dimensões vultuosas, visto que a energia elétrica reduz a vazão total de gás; os tempos de partida e de paragens dos reatores são reduzidos, o processamento é otimizado pelas instalações menores e pela alta densidade de energia (MENEZES; MENEZES; MENEZES 1999). Bartholomeu, Caixeta-Filho e Pinheiro (2011, p. 133) ainda citam como vantagens: verifica-se o potencial custo-eficiência da incineração. Além disso reduz-se significativamente o problema com a disposição dos RSU. A tecnologia plasma, além de utilizar totalmente os resíduos, constituise em uma forma de energia renovável alternativa, com elevado potencial de oferta, e possibilita a redução da necessidade de aterros, pois não há emissões diretas para a atmosfera. Todos os contaminantes conhecidos podem ser efetivamente tratados na tecnologia plasma e aceitam todo tipo de resíduo sólido e líquido, inclusive materiais tóxicos e perigosos, sem necessidade de préprocessamento.
Há estreita correlação entre esta tecnologia e a advertência que o legislador faz ao estabelecer as diretrizes que deverão nortear os rumos da aplicação da Lei da PNRS: Poderão ser utilizadas tecnologias visando à recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos, desde que tenha sido comprovada sua viabilidade técnica e ambiental e com a implantação de programa de monitoramento de emissão de gases tóxicos aprovado pelo órgão ambiental (BRASIL, 2012, p. 15).
As usinas de plasma já são comuns em países desenvolvidos, que estão abandonando, paulatinamente, os incineradores convencionais, no Japão o plasma térmico tem sido utilizado eficientemente para fundir cinzas de incineração, reduzindo, consequentemente, o volume descartado; na França, o plasma tem sido
67 utilizado para transformar as cinzas de incineração e asbesto em escória inerte; nos Estados Unidos tem sido utilizado na recuperação de metais de catalisadores; para a eficiente destruição de resíduos militares e na recuperação de zinco metálico de poeiras siderúrgicas (MENEZES; MENEZES; MENEZES, 1999). O último degrau do objetivo é a “disposição final ambientalmente adequada”, que é entendida pela Lei da PNRS no art. 3º, VIII, como: distribuição ordenada de rejeitos em aterros, observando normais operacionais específicas, de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos (BRASIL, 2012, p. 10).
Está inserida no conjunto de atividades e operações que compõem o gerenciamento de resíduos sólidos (art. 3º, X): conjunto de ações exercidas, direta ou indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, de acordo com plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos ou com plano de gerenciamento de resíduos sólidos, exigidos na forma desta Lei. (BRASIL, 2012, p. 10).
O legislador esclarece o significado do termo “rejeitos” da frase “distribuição ordenada de rejeitos em aterros”, porquanto o conceito é uma inovação doutrinária no ordenamento jurídico brasileiro e significa mais do que “resíduo do resíduo” (art. 3º, XV): Resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentam outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente adequada (BRASIL, 2012, p. 10, 15).
“Distribuição ordenada”, que deve ser a última alternativa a ser tomada quando do destino final de um resíduo, pode ser entendida como a técnica de dispor os rejeitos no solo, sem causar danos ambientais e sem comprometer a segurança da saúde pública. Envolve alguns métodos de engenharia sanitária para confinar os rejeitos, reduzindo-os ao menor volume permissível e ocupando a menor área possível: recobrimento do material em camadas, segregando-o com cobertura diária, (tanto intermediária, como final dos resíduos), ou intervalos inferiores, se necessário;
68 sistemas de escoamento de líquidos e emanação de gases produzidos pelos materiais orgânicos (GUARNIERI, 2011, p. 90; LEITE, 2009, p. 68). A figura 03 apresenta o corte de uma seção, com a descrição estrutural e operacional citada.
Figura 3: Corte de um aterro sanitário Fonte: <http://www.portalresiduossolidos.com/aterro-sanitario/> Acesso 17 de maio de 2015
Os aterros sanitários devem ser impermeabilizados e revestidos com camadas de material absorvente, a camada pode ser natural (argila) ou sintética (manta de polietileno de alta densidade), que impossibilitará a percolação de líquidos, folhas de plástico podem também ser aplicadas na contenção do vazamento de poluentes para o solo e os lençóis freáticos. Possuir também dispositivos de coleta do líquido lixiviado (chorume) e biogás, para posterior manejo ambientalmente adequado que propicie a geração de energia e sistemas que permitam monitoramento contínuo das águas subterrâneas (OLIVEIRA; OLIVEIRA, 2012, p. 300). A vida útil de um aterro sanitário é de 20 anos. O tempo necessário para que produza significativamente mentano é em torno de 01 a 02 anos e prolonga-se por
69 até 60 anos. Para que recupere energia eficientemente, precisa ser equipado com: sistema de impermeabilização superior (argila de baixa permeabilidade compactada para evitar a fuga do gás para a atmosfera); poços de drenagem (perfurações no solo do aterro, verticais, horizontais ou mistas); rede de coleta (interligando os poços de drenagem às bombas de vácuo que conduzem o biogás à estação de geração de energia e garantem vazão regular); grupos geradores que utilizem biogás como combustível para a geração de energia elétrica à semelhança das turbinas (COSTA; MENDONÇA; SOUZA, 2014, p. 21; OLIVEIRA; OLIVEIRA, 2012, p. 303). Ainda há o fator de geração de crédito de carbono, por conta das reduções de emissão de gases de efeito estufa, quando se queima ou se utiliza biogás gerado nestes aterros, além da descarbonização, o empreendimento pode se tornar sustentável financeiramente. A certificação aos estabelecimentos que preenchem os requisitos é concedida pelo Executive Board do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) da ONU (OLIVEIRA; OLIVEIRA, 2012, p. 303). – Estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços: No art. 3º, XIII, a Lei da PNRS apresenta o que o legislador entende como padrões sustentáveis de produção e consumo. O enunciado do conceito é claramente devedor ao conceito do item lexical desenvolvimento sustentável: Produção e consumo de bens e serviços de forma a atender as necessidades das atuais gerações e permitir melhores condições de vida, sem comprometer a qualidade ambiental e o atendimento das necessidades das gerações futuras (BRASIL, 2012, p. 11)66.
A adoção de padrão sustentável de produção tem correlação com o Princípio do Desenvolvimento Sustentável como norteador, enquanto, tem correlação com o Princípio da Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto como vetor operacional. Mantendo, ainda, relação de mútua dependência com os objetivos: “estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do produto” e “incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial
66 Há estreita correlação com o que foi estabelecido pela Agenda 21, como gestão ampla e integrada dos resíduos sólidos: “O manejo ambientalmente saudável de resíduos deve ir além da simples deposição ou aproveitamento por métodos seguros dos resíduos gerados e buscar desenvolver a causa fundamental do problema, procurando mudar os padrões não sustentáveis de produção e consumo” (CNUMAD, 1997, Cap. 21).
70 voltados para melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o aproveitamento energético”. Produção sustentável é a ponta de um iceberg. Diversos fatores podem contribuir para tornar as cadeias produtoras sustentáveis, todos passam por profunda e necessária mudança cultural, mudança de cosmovisão. Essa mudança de mentalidade passa pela reflexão necessária de reconhecer que a biosfera é limitada e o planeta, finito. Não se pode mais continuar considerando que o manejo linear de matérias-primas é sustentável, o planeta está em fase de esgotamento e o tempo de reação é muito curto: a) produção mais eficiente que reduza a quantidade de resíduos sólidos gerados. Dados do Programa de Indústria para a América Latina de 2001, do PNUMA, apontam para o percentual de que cerca de 75% dos materiais que são utilizados nos processos produtivos se tornam resíduos e poluição, apenas 25% são de fato transformados em produtos acabados, que ainda assim têm uma taxa bastante alta de geração de resíduos no pós-consumo. 98% dos produtos elaborados são descartados em até 06 (seis) meses, devido à obsolescência programada e à obsolescência percebida. b) produção mais limpa, que consiste no uso de tecnologias integradas à logística de manufatura (processos produtivos) e à logística de suprimentos (desde a extração da matérias-primas até a movimentação interna nas plantas industriais), com foco no aumento da eficiência no uso dessas matérias (não gerando resíduos, reduzindo a geração e reciclando o inevitável) e no uso da água e energia (PHILIPPI JR et al, 2012, p. 241). Os atuais padrões de produção não são sustentáveis pelo viés ambiental e nem pelo viés social. Quando analisados pelo prisma das classes menos favorecidas, permitem a identificação de problemas que precisam ser equacionados para que a desigualdade social seja minimizada e se alcance o desenvolvimento sustentável de fato: cadeias produtivas que utilizam processos fabris e materiais que degradam o meio ambiente e trazem riscos para a saúde, almejando lucros abusivos; processos produtivos ineficientes, que geram desperdícios em grande escala e causam prejuízos ambientais, muitas vezes sem reparação a curto e médio prazos; procedimentos ineficientes no que tange à regulação do uso dos recursos
71 naturais; má distribuição de acesso a recursos naturais, não apenas de recursos econômicos; elevado custo de transação para aqueles desprovidos de recursos financeiros, pagam mais do que os ricos para terem acesso aos mesmos recursos naturais (PEREIRA; SILVA; CARBONARI, 2011, p. 102). A adoção de padrões sustentáveis de consumo 67 de bens e serviços tem correlação com o objetivo do “estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável” e estreita dependência do instrumento da “educação ambiental 68”. O Regulamento da Lei da PNRS (Decreto 7.404/2010) apresenta medidas a serem adotadas obrigatoriamente pelo poder público, como um dos atores envolvidos na gestão e gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos. É notória a valorização da educação ambiental para a consecução do objetivo de “adotar padrões sustentáveis de consumo”: desenvolver ações educativas voltadas à conscientização dos consumidores com relação ao consumo sustentável e às suas responsabilidades no âmbito da responsabilidade compartilhada de que trata a Lei nº 12.305, de 2010; apoiar as pesquisas realizadas por órgãos oficiais, pelas universidades, por organizações não governamentais e por setores empresariais, bem como a elaboração de estudos, a coleta de dados e de informações sobre o comportamento do consumidor brasileiro; elaborar e implementar planos de produção e consumo sustentável; divulgar os conceitos relacionados com a coleta seletiva, com a logística reversa, com o consumo consciente e com a minimização da geração de resíduos sólidos (BRASIL, 2012, p. 68).
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) define o consumo sustentável como: Fornecimento de serviços e produtos que atendam às necessidades básicas, proporcionando uma melhor qualidade de vida enquanto minimizam o uso de recursos naturais e materiais tóxicos como também a produção de resíduos e a emissão de poluentes no ciclo de vida do serviço ou do produto, tendo em vista não colocar em risco as necessidades das futuras gerações (LEMOS, 2012, p. 37). 67 “Pela ótica do consumo responsável, que busca ampliar o sentido do termo, o ser humano consome em quase todos os minutos do dia, não apenas quando entra num shopping munido de talão de cheques e de cartão de crédito. Até dormindo o ser humano está consumindo: energia elétrica do aquecedor, ventilador ou arcondicionado. Quando acorda, no simples ato de ir ao banheiro para efetuar a higiene pessoal, o consumo passa para uma escala maior: água, creme dental, barbeador, sabonete, shampoo, perfume, desodorante, roupas, e, ao tomar café da manhã, o consumo muda apenas de segmento: café, açúcar, leite, pão, manteiga, ovos, etc., e assim segue aumentando ou diminuindo pelo resto do dia.” (SILVA, 2014, p. 36). 68 “Em seu art. 1º define que a EA compreende os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, que é bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.” (RIVELLI, 2014, p. 344).
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Há necessidade de se estabelecer diferenciação entre consumo e consumismo: “… o consumo é necessário à vida; o consumismo a depreda” (TRIGUEIRO, 2008, p. 84). A sociedade precisa adquirir a consciência de que o consumo consiste em adquirir e utilizar bens e serviços para atender às necessidades reais, o consumismo, por outro lado, cria uma zona, com áreas limítrofes confusas, que às vezes inexistem, entre “desejos” e “necessidades”: “[…] refere-se à atitude de satisfazer carências emocionais e sociais através de compras e demonstrar o valor pessoal por meio do que se possui.” (LEONARD, 2011, p. 159). O consumo é um malefício, quando se torna: “[…] uma distorção da satisfação das necessidades, a publicidade como um algoz que introjeta nas pessoas a necessidade de consumir cada vez mais” (DOURADO; BELIZÀRIO; SORRENTINO, 2012, p. 231). O reflexo do quanto as sociedades contemporâneas “sacralizaram o consumo”, transformando-o num ritual com uma liturgia própria, é o que aconteceu no day after 11 de setembro de 2001 nos EUA: o então presidente George W. Bush incluiu as compras entre as atividades que representavam repúdio máximo ao terrorismo”. Com o país ainda em estado de choque, Bush disse para pendurarmos as plaquinhas de “A América está aberta a negócios” nas janelas e continuar comprando. Segundo a maioria dos especialistas em economia e política, deixar de comprar significa frear a economia e ameaçar empregos; assim, comprar é patriótico, é nosso dever (LEONARD, 2011, p. 16).
Esta sociedade “sacraliza” o ato de consumo, transformando os locais de compras em verdadeiros templos. Também estimula que o tempo dedicado ao ato de comprar seja maior e que a repetição deste ato seja em intervalos cada vez menores, além de aquisição em quantidades maiores ou o aumento do tamanho dos produtos de forma que o consumidor se convença de que está levando vantagens. O efeito colateral deste “culto” é que esta mesma sociedade também gosta de descartar, tanto quanto gosta de comprar, como parte do processo de classificação social. Há equilíbrio entre o volume do consumo e a quantidade do descarte, são faces da mesma moeda que valida o processo de legitimação e reconhecimento (DOURADO; BELIZÀRIO; SORRENTINO, 2012, p. 231).
73 Braungart e McDonough (2013, pg. 106) afirmam que as indústrias projetam e planejam os produtos para que o consumidor ao adquirir e abrir tenha a sensação de uma “defloração metafórica”. Lemos (2012, p. 30, 34) constata que o padrão de consumo insustentável da sociedade atual é capaz de forjar a própria identidade do consumidor, e acrescenta: O sistema produtivo não se preocupa mais em procurar o consumidor para o produto criado, mas sim em conhecer o consumidor e desenvolver produtos individualizados, adotando, pois, o caminho inverso ao anteriormente percorrido […] o indivíduo deve se portar de acordo com seu nível social, escolhendo produtos fabricados para seu status.
Este mal também assola o consumidor de produtos farmacêuticos com consequências graves e, às vezes, mortais. Angell (2014, pg. 141) faz críticas aos anúncios de medicamentos diretos ao consumidor em revistas, TV, banners que são fixados em consultórios, etc., visto que este não é habilitado para discernir entre o que é de fato informação relevante e apenas propaganda. Por conta dessa desinformação: […] estes pressionam os médicos para prescrever medicamentos novos, caros e frequentemente de utilidade insignificante, mesmo quando opções mais conservadoras (entre elas a de medicamento nenhum) poderiam ser melhores e mais seguras.
A educação ambiental aplicada contribui para minimizar este caos. Ela pode gerar o diálogo interdisciplinar por meio de processos educativos e culturais, estrategicamente planejados e eficientemente implementados. Educação que possibilite profunda mudança cultural, levando em consideração os objetivos primários da gestão de resíduos sólidos que apontam para a redução e a reutilização. Educação que permita o surgimento de uma cultura de consumo consciente, que não apenas reflita sobre a perspectiva ambiental do descarte e as consequências intrínsecas, mas que conduza à reflexão sobre a real necessidade na aquisição de bens (PHILIPPI JR et al, 2012, p. 240). Por isso, recomenda-se uma abordagem sistêmica: desconstrução da cultura baseada no consumo extremo; transformar o mapa mental da sociedade, refazendo as crenças e desejos que são distorcidos pela cultura do consumo; desconstrução da relação entre consumo e felicidade, conduzindo à reflexão sobre necessidades
74 objetivas e subjetivas, primárias e secundárias; redesenhar o papel e as responsabilidades do conceito de cidadania e entender a significância que o consumo tem para o ciclo de vida de um produto; levar a sociedade a repensar os hábitos de consumo e comportamentos. Isto só será possível com um programa de educação ambiental que abranja todo os setores da sociedade (PHILIPPI JR et al, 2012, p. 241). Georgescu-Roegen (2012, pg. 134), economista romeno e um dos precursores da economia ecológica, fez a proposta de um programa bioeconômico (a absorção da economia pela biologia, visto que o campo dos fenômenos que esta engloba é mais amplo do que o daquela) de pequenas dimensões, porém de longo alcance, os pontos 05 a 07 são aqueles que tangenciam o conceito de consumo responsável e educação ambiental: É preciso que nos curemos da sede mórbida por engenhocas extravagantes, tão bem ilustradas pelo contraditório carrinho de golfe, e pelos mamutes que são os carrões possantes. Quando nos decidirmos a fazê-lo, os fabricantes terão de parar de fabricar tais “bens”; Temos também de abandonar a moda, “essa doença da mente humana”, como a chamou o abade Ferdinando Galiani em seu famoso Della Moneta (1750). É realmente uma doença mental jogar fora um casaco ou um móvel quando ainda podem nos servir para o que esperamos deles. E é, de fato, um crime bioeconômico comprar um carro “novo” a cada ano e remodelar a casa a cada dois anos. Outros autores já afirmaram que as mercadorias deveriam ser fabricadas para durarem mais (por exemplo, Hibbard, 1968, p. 146 69). Mas é mais importante que os próprios consumidores se reeduquem, de modo a não levar em conta a moda. Então, os fabricantes terão de focalizar-se na durabilidade. Este ponto tem ligação estrita com o anterior: é necessário tornar mais duráveis as mercadorias já duráveis, concebendo-as como passíveis de ser reparadas. (Não há casos em que fazemos como alguém que joga fora um par de calçados porque o cadarço está desgastado?).
– Integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos: O art. 1º, parágrafo único do Decreto 7.405/2010, que instituiu o Programa Pró-Catador define os catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis como: “as pessoas físicas de baixa renda que se dedicam às atividades de coleta, 69 Georgescu está se referindo a: “Mineral resources: challenge or threat?”. Em Science, 12-4-1968, pp. 143145.
75 triagem, beneficiamento, processamento, transformação e comercialização de materiais reutilizáveis e recicláveis” (BECHARA, 2013, p. 102). A inclusão dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nos planos de gestão e gerenciamento de resíduos sólidos e nos sistemas de logística reversa são previstos pela Lei da PNRS e o seu regulamento. Além de ser o objetivo, a integração das cooperativas ou outras formas de associação dessa classe nas ações que se refiram à coleta seletiva e aos sistemas de logística reversa, também é um instrumento de fomento (art. 8º, IV): “o incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis” (BRASIL, 2012, p. 14). No art. 36º, VI, § 1º, quando discorre sobre o Princípio da Responsabilidade Compartilhada, indica a inserção de tais associações ou cooperativas como prioritárias nas diversas etapas que serão implementadas para que as metas sejam cumpridas: […] priorizará a organização e o funcionamento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda, bem como sua contratação (BRASIL, 2010, p. 32).
O Regulamento nos artigos 40º, 41º e 42º aponta para ordem de prioridade que devem ser seguidas por aquelas organizações que estruturarem e implementarem sistemas de logística reversa e planos de gerenciamento de resíduos sólidos e os planos municipais. As cooperativas e associações de catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis serão priorizadas. O sistema de coleta seletiva de resíduos sólidos e a logística reversa priorizarão a participação de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis constituídas por pessoas físicas de baixa renda. Os planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos definirão programas e ações para a participação dos grupos interessados, em especial das cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda. 42. As ações desenvolvidas pelas cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis no âmbito do gerenciamento de resíduos sólidos das atividades relacionadas no art. 20 da Lei nº 12.305, de 2010, deverão estar descritas, quando couber, nos respectivos planos de gerenciamento de resíduos sólidos (BRASIL, 2012, p. 34).
76 Ao incluir a atividade de coleta seletiva por meio dos catadores de materiais recicláveis entre os seus instrumentos de estruturação e implementação dos planos de gestão integrada de resíduos sólidos, dos planos de gerenciamento de resíduos sólidos e dos sistemas de logística reversa, a PNRS reconhece a importância do trabalho de aproximadamente 800.000 (oitocentos) catadores de resíduos em todo o território nacional, destes, apenas 80.000 (oitenta mil) estavam associados a algum tipo de cooperativa, segundo dados do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), no ano de 2012 (MNCR, 2012, p. 415). Este reconhecimento impacta significativamente o setor econômico, mais geração de emprego e renda, além da regulamentação de uma categoria profissional que se encontra à margem da sociedade. Este impacto envolve o aparato de capacitação técnica e a montagem de estrutura mínima de funcionamento das cooperativas e associações, dotando-a de amparo legal. Impactará também a dimensão social, pois a regulamentação garantirá a não exploração trabalhista e profissional de membros de um setor da sociedade que, em virtude de sua condição econômica, não pode prescindir da atividade laborativa à qual está vinculado, sob pena de comprometimento da própria sobrevivência e a da família (MNCR, 2012, p. 421). O exercício desta atividade, sob as piores condições possíveis, não é um fato desconhecido pela história e nem tampouco é algo recente. Antes mesmo da unificação das tribos que deram origem ao primeiro Estado de Israel (c. 1.224 a.C.), quando os hebreus ainda lutavam diariamente pela sobrevivência sob o jugo egípcio. O autor do livro de Êxodos registra no capítulo 5, versículo 6 que em retaliação à solicitação do profeta Moisés e de seu irmão Aarão para que libertasse o povo hebreu, Faraó (muito provavelmente Ramsés II) ordena que um dos insumos para a fabricação de tijolos crus, a palha, não seja mais concedida do estoque real, e sim que deveria agora ser recolhida pelos próprios hebreus. Somava-se à carga de trabalho de confecção dos tijolos a recolha, catação da palha, que era necessária para conceder consistência aos tijolos crus, os mesmos não passavam pelo processo de cozimento. Percebe-se por uma passagem tão antiga como essa, quase 3.200 anos atrás, que o ato de colher, catar, ajuntar e recolher insumos e
77 matérias-primas para serem utilizados, ou reutilizados, sob as mais excruciantes condições não era de todo desconhecido dos antigos (SILVA, 2014, p. 39). – Estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do produto: A Lei da PNRS define Ciclo de Vida do Produto 70 como: “série de etapas que envolvem o desenvolvimento do produto, a obtenção de matérias-primas e insumos, o processo produtivo, o consumo e a disposição final” (BRASIL, 2012, p. 10). A norma ABNT NBR ISO 14040:2001 (2001, p. 2), que é norma equivalente à ISO 14040:199771, define a Avaliação do Ciclo de Vida de Produto (ACV) como: Uma técnica para avaliar aspectos ambientais e impactos potenciais associados a um produto mediante: a compilação de um inventário de entradas e saídas pertinentes de um sistema de produto; a avaliação dos impactos ambientais potenciais associados a essas entradas e saídas; a interpretação dos resultados das fases de análise de inventário e de avaliação de impactos em relação aos objetivos dos estudos.
O método de análise ACV originou-se do conceito de Ciclo de Vida, que é o levantamento e a avaliação de toda a história de vida de um produto (aquisição de matéria-prima para a fabricação ou beneficiamento, a fabricação propriamente dita, a comercialização, o transporte, a utilização, a manutenção e a destinação final dos resíduos) para calcular seu impacto ambiental. A avaliação se dá em 04 fases que são estabelecidas pela norma 14.040: definição de objetivos e escopo; análise de inventário (NBR 14.041); análise de impacto (NBR 14.042) e interpretação dos resultados (NBR 14.043) (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 68). A ACV tem correlação instrumental com a ecoeficiência, pois assegura a mensuração do peso e o impacto de um produto, durante todo o seu ciclo de vida, para o meio ambiente. Esta avaliação auxilia a tomada de decisões, uma vez que identifica materiais e processos produtivos e de manufatura que causam menos impactos à envolvente ambiental e identifica eficientemente a fase do ciclo de vida no qual o impacto é maior, contribuindo para melhorar o desempenho ambiental de um sistema. Por meio da ACV é possível responder a perguntas tais como: Em que parte do ambiente o produto/serviço causa impacto maior? Quais as linhas de ação que deverão ser seguidas prioritariamente? Qual a matéria-prima, primária ou secundária, que causará menos impacto para o produto ou para a geração do 70 LCA, do inglês Life Cicle Assessment (ARAÚJO; JURAS, 2011, p. 68). 71 NBR ISO 14040 - Environmental management - Life cycle assessment Principles and framework.
78 serviço? Qual a solução mais adequada para uma dada localidade? (SILVA, 2010, p. 12). Estas etapas do processo de avaliação são comumente chamadas de “do berço ao túmulo” (cradle to grave). O atual sistema de produção industrial linear: os recursos são extraídos da natureza, modelados ou transformados em produtos, vendidos e após terem sido “consumidos” são descartados e seus resíduos são dispostos de forma ambientalmente adequada num “túmulo”. A alternativa que se faz a este modelo que degrada o meio ambiente e o exaure é chamado de “do berço ao berço” (cradle to cradle). Esta abordagem entende que o ciclo de vida de um produto não se encerra quando seus resíduos são dispostos ambientalmente de forma adequada, o produto é projetado para “ciclar” tantas vezes quanto for possível e permissível para a matéria, não há túmulo, a matéria-prima está sempre renascendo (BRAUNGART; MCDONOUGH, 2013, p. 106). Os objetivos: adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais; redução do volume e da periculosidade dos resíduos perigosos; incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o aproveitamento energético são alcançados por meio das estratégias e instrumentos do objetivo da “não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos” e “estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do produto”.
2.2.3 Dos Instrumentos
No art. 8º, a Lei da PNRS (BRASIL, 2010, p. 14, 15) apresenta 19 (dezenove) instrumentos por meio dos quais os objetivos serão alcançados, sob a égide dos princípios e diretrizes. Os instrumentos são classificados: de planejamento, que se referem às medidas a serem adotadas no trato dos resíduos sólidos (incisos II, XI, XII, XV, XVII, “b”, XVII, “c”, XVII, “e”), de controle, que se relacionam ao
79 acompanhamento de implementação da política, da perenidade e continuidade de suas ações (incisos I, III, V, VII, VIII, XIII, XIV, XVI, XVII, “a”, XVII, “d”, XVII, “f”) e econômicos, que se correlacionam à indução dos agentes através de incentivos e isenções que reduzam o custo (incisos IV, VI, IX, XVIII, XIX), segundo os propósitos a que se destinam no elenco dos objetivos e finalidades a serem atendidos: I – os planos de resíduos sólidos; II – os inventários e o sistema declaratório anual de resíduos sólidos; III – a coleta seletiva, os sistemas de logística reversa e outras ferramentas relacionadas à implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; IV – o incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis; V – o monitoramento e a fiscalização ambiental, sanitária e agropecuária; VI – a cooperação técnica e financeira entre os setores público e privado para o desenvolvimento de pesquisas de novos produtos, métodos, processos e tecnologias de gestão, reciclagem, reutilização, tratamento de resíduos e disposição final ambientalmente adequada de rejeitos; VII – a pesquisa científica e tecnológica; VIII – a educação ambiental; IX – os incentivos fiscais, financeiros e creditícios; X – o Fundo Nacional de Meio Ambiente e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; XI – o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir); XII – o Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (Sinisa); XIII – os conselhos de meio ambiente e, no que couber, os de saúde; XIV – os órgãos colegiados municipais destinados ao controle social dos serviços de resíduos sólidos urbanos; XV – o Cadastro Nacional de Operadores de Resíduos Perigosos; XVI – os acordos setoriais; XVII – no que couber, os instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente, entre eles: a) os padrões de qualidade ambiental; b) o Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais; c) o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental; d) a avaliação de impactos ambientais; e) o Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente (Sinima); f) o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras; XVIII – os termos de compromissos e os termos de ajustamento de conduta; XIX – o incentivo à adoção de consórcios ou de outras formas de cooperação entre os entes federados, com vistas à elevação das escalas de aproveitamento e à redução dos custos envolvidos; (Grifo nosso).
80 – Os planos de resíduos sólidos: estão entre as principais ferramentas e instrumentos disciplinados pela Lei da PNRS. No art. 14º são apresentados os 06 (seis) diferentes planos direcionados à gestão integrada e ao gerenciamento dos resíduos sólidos: I – o Plano Nacional de Resíduos Sólidos; II – os planos estaduais de resíduos sólidos; III – os planos microrregionais de resíduos sólidos e os planos de resíduos sólidos de regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas; IV – os planos intermunicipais de resíduos sólidos; V – os planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos; VI – os planos de gerenciamento de resíduos sólidos. (BRASIL, 2012, p. 18).
A distribuição ordenada que o legislador efetuou impõe responsabilidades ao poder público, em seus diferentes níveis de gestão, e à iniciativa privada. A Lei da PNRS (BRASIL, 2012, p. 18) estabelece ainda: “É assegurada ampla publicidade ao conteúdo dos planos de resíduos sólidos, bem como controle social em sua formulação, implementação e operacionalização”, tais atividades estão diretamente ligadas aos programas e ações de educação ambiental que deverão ser tomados. A ação exitosa da política exigirá uma série de medidas complementares, que contribuam para mudanças de hábito de consumo e atitudes de descarte por parte da população e, que “eduquem” as corporações e instituições que são também geradoras de resíduos em um volume maior e mais degradante (BRASIL, 2012, p. 18; CRESPO; COSTA, 2012, p. 284). Os planos são a base para a implementação da política e a ferramenta que guiará a operacionalização do gerenciamento de forma integrada e que garantirá que ações efetivas sejam tomadas. Os planos também devem definir as condições pelas quais os objetivos da política serão alcançados, em nível municipal e estadual. Deverão conter: diagnósticos minuciosos das causas da existência e proliferação dos resíduos; metas de não geração; diretrizes; redução; reutilização; reciclagem e de disposição final; programas e ações de educação ambiental e informação social que serão estabelecidos, e que sejam os vetores da implantação. As ações deverão primar pela coerência e viabilidade técnica, econômica e política (CRESPO; COSTA, 2012, p. 283).
81 A apresentação do conteúdo do plano de gerenciamento de resíduos sólidos, que é de responsabilidade e competência da iniciativa privada 72, servirá de exemplo da complexidade e das diversas etapas que deverão ser efetuadas e da dependência mútua com os demais planos e ações: I – descrição do empreendimento ou atividade; II – diagnóstico dos resíduos sólidos gerados ou administrados, contendo a origem, o volume e a caracterização dos resíduos, incluindo os passivos ambientais a eles relacionados; III – observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa e, se houver, o plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos: a) explicitação dos responsáveis por cada etapa do gerenciamento de resíduos sólidos; b) definição dos procedimentos operacionais relativos às etapas do gerenciamento de resíduos sólidos sob responsabilidade do gerador; IV – identificação das soluções consorciadas ou compartilhadas com outros geradores; V – ações preventivas e corretivas a serem executadas em situações de gerenciamento incorreto ou acidentes; VI – metas e procedimentos relacionados à minimização da geração de resíduos sólidos e, observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, à reutilização e reciclagem; VII – se couber, ações relativas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, na forma do art. 31; VIII – medidas saneadoras dos passivos ambientais relacionados aos resíduos sólidos; IX – periodicidade de sua revisão, observado, se couber, o prazo de vigência da respectiva licença de operação a cargo dos órgãos do Sisnama. § 1º O plano de gerenciamento de resíduos sólidos atenderá ao disposto no plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos do respectivo município, sem prejuízo das normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa. (BRASIL, 2012, p.
25). – A coleta seletiva, os sistemas de logística reversa e outras ferramentas relacionadas à implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos: A Lei da PNRS (BRASIL, 2012, p. 10) define coleta seletiva, 72 “Art. 20. Estão sujeitos à elaboração de plano de gerenciamento de resíduos sólidos: I – os geradores de resíduos sólidos previstos nas alíneas e, f, g e k do inciso I do art. 13; II – os estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços que: a) gerem resíduos perigosos; b) gerem resíduos que, mesmo caracterizados como não perigosos, por sua natureza, composição ou volume, não sejam equiparados aos resíduos domiciliares pelo poder público municipal; III – as empresas de construção civil, nos termos do regulamento ou de normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama; IV – os responsáveis pelos terminais e outras instalações referidas na alínea j do inciso I do art. 13 e, nos termos do regulamento ou de normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e, se couber, do SNVS, as empresas de transporte; V – os responsáveis por atividades agrossilvopastoris, se exigido pelo órgão competente do Sisnama, do SNVS ou do Suasa.” (BRASIL, 2012, p. 24).
82 que consiste numa das etapas do gerenciamento dos resíduos sólidos como: “coleta de resíduos sólidos previamente segregados conforme sua constituição ou composição” e o Decreto 7.404/2010 que a regula, estabelece como se dará a operacionalização da atividade73. Leite (2009, p. 70) define coleta seletiva como: “qualquer coleta que contenha uma prévia seleção do material a ser captado ou que seja dirigida a determinado material”. Enquanto que Xavier e Corrêa (2013, p. 70) ressaltam que a coleta seletiva é: “uma atividade-chave para a Logística Reversa, sendo, em grande parte, responsável pela viabilidade e nível de eficácia do processo, em função da qualidade do material coletado”, além de viabilizar, ou não, financeiramente qualquer sistema de logística reversa que vier a ser implementado. A coleta de materiais recicláveis (papéis, plásticos, vidros, metais, embalagens longa vida, isopor, latas de refrigerante, etc.) contribui para que: recursos naturais sejam utilizados de forma racional, com redução da extração de insumos; o reúso seja efetivamente incentivado; a expansão do mercado da reciclagem; a educação para o consumo consciente seja exercitada e a inclusão social, econômica, cultural e financeira dos catadores e catadoras de materiais recicláveis, minimize, de alguma forma, este flagelo que assola a humanidade: a indignidade que é a pobreza (BESEN, 2014, p. 243). Besen (2014, p. 247), chama à atenção para o fato de que a maior parte dos resíduos domiciliares é matéria orgânica, fruto de má gestão da economia doméstica: desperdício de alimentos. Esta matéria orgânica quando disposta no meio ambiente ou em aterros sanitários é pródiga geradora de gás metano 74, um dos 73 “Art. 9º A coleta seletiva dar-se-á mediante a segregação prévia dos resíduos sólidos, conforme sua constituição ou composição. § 1º A implantação do sistema de coleta seletiva é instrumento essencial para se atingir a meta de disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, conforme disposto no art. 54 da Lei nº 12.305, de 2010. § 2º O sistema de coleta seletiva será implantado pelo titular do serviço público de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e deverá estabelecer, no mínimo, a separação de resíduos secos e úmidos e, progressivamente, ser estendido à separação dos resíduos secos em suas parcelas específicas, segundo metas estabelecidas nos respectivos planos. § 3º Para o atendimento ao disposto neste artigo, os geradores de resíduos sólidos deverão segregá-los e disponibilizá-los adequadamente, na forma estabelecida pelo titular do serviço público de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos. Art. 10. Os titulares do serviço público de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, em sua área de abrangência, definirão os procedimentos para o acondicionamento adequado e disponibilização dos resíduos sólidos objeto da coleta seletiva. Art. 11. O sistema de coleta seletiva de resíduos sólidos priorizará a participação de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis constituídas por pessoas físicas de baixa renda. Art. 12. A coleta seletiva poderá ser implementada sem prejuízo da implantação de sistemas de logística reversa.” (BRASIL, 2012, p. 44, 45). 74 “O dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4) são os dois principais gases de feito (sic) estufa que causam o aquecimento global e provocam as mudanças no clima. Segundo o Painel Intergovernamental de
83 gases de efeito estufa. Ressalta ainda que as ações que devem ser implantadas, precisam se preocupar com a causa e não com o efeito. Para tanto, ações de educação ambiental devem ser tomadas pelo poder público que “eduque” a população a fazer um melhor aproveitamento pré-consumo: compras planejadas que reduzam a incidências de produtos vencidos; reduzir a preparação de alimentos e estimular o aproveitamento das cascas e das sobras de forma sustentável. O legislador compreende que as metas estabelecidas pelo plano nacional de resíduos sólidos, que se estenderão para os planos estaduais e municipais, representam desafios que necessitam da implantação e do aprimoramento dos serviços de limpeza urbana no quesito coleta seletiva formal, sob pena de não lograr êxito. Esta coleta tem que ser universalizada, eficiente, de qualidade e de abrangência social, incluindo na sua operacionalização as cooperativas e associações de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis (BESEN, 2014, p. 241). Os estados deverão prover, por meio de gestão integrada do plano de gestão de resíduos sólidos, que a coleta seletiva seja efetivamente implementada, art. 17º, § 3º: “[…] e estabelecer soluções integradas para a coleta seletiva, a recuperação e a reciclagem, o tratamento e a destinação final dos resíduos sólidos urbanos e, consideradas as peculiaridades microrregionais, outros tipos de resíduos” (BRASIL, 2012, p. 20). Os municípios deverão implantar a coleta seletiva, por meio dos planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos, para se habilitarem a ter acesso aos recursos da União destinados a serviços de limpeza urbana, bem como, serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades federais de crédito ou de fomento de tais atividades, art. 18º, § 1º, II: “[…] implantarem a coleta seletiva com a participação de cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda” (BRASIL, 2012, p. 21). Estes planos municipais deverão ter indicadores que mensurem efetivamente os alvos propostos, dentre eles a coleta seletiva (art. 19º, XIV): “metas de redução, reutilização, coleta seletiva e reciclagem, entre outras, com vistas a reduzir a Mudanças do Clima (IPCC), 1 g de CH4, equivale a 25 g de CO2,” (BESEN, 2014, p. 247).
84 quantidade de rejeitos encaminhados para disposição final ambientalmente adequada” (BRASIL, 2012, p. 22). No Regulamento (BRASIL, 2012, p. 69), art. 79º, II, “b”, o poder executivo estabelece que a União e os demais órgãos ou entidades de crédito e de fomento a ela vinculados destinarão prioritariamente os recursos mencionados no art. 78º 75 aos municípios que: “[…] implantarem a coleta seletiva com a participação de cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda”. Esta inclusão das cooperativas e associações faz parte de um dos pilares da PNRS: dimensão social. Prevê a melhoria das condições de vida dos catadores e catadoras, porquanto gerará emprego e renda e trabalho formal e informal. Contribuirá também para melhoria da saúde social: otimização da limpeza urbana, redução da exposição da população a riscos causados por enchentes (resíduos sólidos urbanos e rejeitos em córregos e riachos), redução da transmissão de doenças causadas por vetores e redução da vulnerabilidade da população aos impactos do aquecimento global, a alteração da temperatura e da umidade do ar podem contribuir para a proliferação de agentes infecciosos (BESEN, 2014, p. 269). No âmbito da Responsabilidade Compartilhada, art. 35º, estabelece obrigações para os consumidores dos municípios que implementarem a coleta seletiva por meio de plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos: os consumidores são obrigados a: I – acondicionar adequadamente e de forma diferenciada os resíduos sólidos gerados; II – disponibilizar adequadamente os resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis para coleta ou devolução. Parágrafo único. O poder público municipal pode instituir incentivos econômicos aos consumidores que participam do sistema de coleta seletiva referido no caput, na forma de lei municipal (BRASIL, 2012, p. 31).
O Regulamento (BRASIL, 2012, p. 71) também prevê que “Os consumidores que descumprirem as respectivas obrigações previstas nos sistemas de logística reversa e de coleta seletiva estarão sujeitos à penalidade de advertência” (art. 84º, § 75 “Art. 78. A elaboração dos planos de resíduos sólidos previstos no art. 45 é condição, nos termos do art. 55 da Lei nº 12.305, de 2010, para que os estados, o Distrito Federal e os municípios tenham acesso a recursos da União ou por ela controlados, bem como para que sejam beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades federais de crédito ou fomento destinados, no âmbito de suas respectivas competências: I – a empreendimentos e serviços relacionados à gestão de resíduos sólidos; ou II – à limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos. Parágrafo único. O acesso aos recursos mencionados no caput fica condicionado à comprovação da regularidade fiscal perante a União.” (BRASIL, 2012, p. 69).
85 2º). Estas obrigações respectivas estão dispostas no art. 9º, §3º: “Para o atendimento ao disposto neste artigo, os geradores de resíduos sólidos deverão segregá-los e disponibilizá-los adequadamente, na forma estabelecida pelo titular do serviço público de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos” (BRASIL, 2012, p. 44). A Responsabilidade Compartilhada (art. 30º da Lei) será efetivamente implantada por intermédio dos sistemas de logística reversa (art. 13º e 14º do Regulamento) que deverão ser estruturados e implementados, tendo a coleta seletiva (art. 9º do Regulamento) e a educação ambiental (art. 77º do Regulamento) como instrumentos e ferramentas que a viabilizarão (BRASIL, 2012). A Lei da PNRS torna explícito que a Responsabilidade Compartilhada se estende por todo o Ciclo de Vida do Produto. Estão sob sua égide aqueles que extraem as matérias-primas; o setor manufatureiro; os que distribuem os produtos acabados; os que os comercializam; os que compram e consomem até que o descarte seja necessário; os que tratam dos produtos quando os mesmos se transformam em resíduos sólidos ou se tornam rejeitos, quando não mais podem ser reaproveitados (GALLI, 2013, p. 56). – Os sistemas de logística reversa: A Lei da PNRS (BRASIL, 2012, p. 11) institui como principal ferramenta de sua operacionalização a logística reversa, que possui definição sedimentada na própria PNRS, sendo compreendida como (art. 3º, XII): instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.
A conceituação é inovadora e diferencia-se das definições acadêmicas e técnicas de logística reversa. Enquanto as definições anteriores se prendiam aos aspectos operacionais e de gestão, esta ressalta o aspecto de aplicação econômica e social. Compreendendo que a logística reversa se constitui num conjunto de ações (mapeamento dos resíduos, coleta seletiva, triagem, transporte, acondicionamento, armazenagem, beneficiamento, etc.) que têm por objetivo facilitar o retorno dos resíduos sólidos aos fabricantes ou responsáveis por sua inserção no mercado, para
86 que sejam reutilizados ou reaproveitados, por meio de algum processo industrial, e reinseridos no ciclo produtivo, ou sejam dispostos em local apropriado de forma ambientalmente adequada, caso venham a ser classificados como rejeitos (MARTINS; MURARI; 2013, p. 13). Este instrumento se correlaciona com os princípios do poluidor-pagador, responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto e prevenção e precaução. Por isso, quando da implantação do sistema de logística reversa, ao se avaliar a viabilidade técnica e econômica do conjunto de ações e atividades operacionais a serem implantados, devem ser considerados também, o grau e a extensão do impacto à saúde pública, ao ethos social da envolvente ambiental, às diversas formas locais de manifestação cultural e ao meio ambiente que os resíduos sólidos gerados causam ou eventualmente possam causar, (MACEDO; ROHLFS; 2013, p. 08). O termo “restituição” do conceito do legislador se refere a fluxo físico de produtos, resíduos sólidos, rejeitos e embalagens. Em se tratando de logística reversa, diz-se que este fluxo é reverso, porém, a logística propriamente dita não trata apenas de fluxo de produtos, mas também do fluxo financeiro e o fluxo de informações, muitas vezes mais importante que os outros dois, mormente nesta era da informação (RAZZOLINI FILHO; BERTÉ, 2009, p. 66). A Lei também lista os setores que têm obrigatoriedade imediata de estruturar e implementar os sistemas de logística reversa como instrumento de gestão, que assegurem o retorno dos produtos pós-consumo, pós-vendas ou pós-industrial (até mesmo aqueles que não chegaram a sair da planta fabril, mas não “sobras” do processo produtivo) e suas respectivas embalagens, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos: os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de: I – agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de gerenciamento de resíduos perigosos previstas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em normas técnicas; II – pilhas e baterias; III – pneus; IV – óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; V – lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista;
87 VI – produtos eletroeletrônicos e seus componentes. (BRASIL, 2012, p. 29).
Para os segmentos produtivos de agrotóxicos, seus resíduos e embalagens 76, pilhas e baterias77, pneus78 e óleos lubrificantes79, seus resíduos e embalagens, já havia legislação (resoluções do CONAMA) estabelecendo e regulando as obrigações pós-consumo, tais regulações antecedem à PNRS. Foram acrescidos à sistemática legal os segmentos de lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista 80 e os de produtos eletroeletrônicos e seus componentes 81. 76 “[…] os usuários de agrotóxicos são obrigados a devolver as embalagens vazias dos produtos aos estabelecimentos comerciais em que foram adquiridos ou a postos ou centros de recolhimento, por força da Lei n° 7.802/1989 (Artigo 6º). O usuário possui prazo de até 1 ano para devolução e deve realizar a operação de tríplice lavagem no caso de embalagens que contiverem formulações miscíveis ou dispersíveis em água. Cabe às empresas produtoras e comercializadoras realizar a destinação final ambientalmente adequada, com vistas à reutilização, reciclagem ou inutilização.” (MACEDO; ROHLFS. 2013, p. 11). 77 “A Resolução CONAMA n° 401/2008 […] No contexto da logística reversa, a norma dispõe que os estabelecimentos que comercializam pilhas e baterias e a rede de assistência técnica autorizada obrigatoriamente deverão conter pontos de recolhimento adequados, a fim de receber dos usuários os materiais utilizados, para posterior repasse aos respectivos fabricantes ou importadores. Aos fabricantes e importadores cabe encaminhar os resíduos para destinação final ambientalmente adequada (Artigos 4º e 6º). A fim de ressaltar aos consumidores a importância da devolução dos produtos, nas embalagens destes deverá constar a informação de que é necessária a devolução após o uso” (MACEDO; ROHLFS, 2013, p. 12). 78 “[…] a Resolução CONAMA n° 416/2009 dispõe sobre a prevenção à degradação ambiental causada por pneus inservíveis e sua destinação ambientalmente adequada […] No âmbito da logística reversa, os fabricantes e importadores de pneus novos ficam obrigados a coletar e dar destinação adequada aos pneus inservíveis existentes no território nacional, na proporção de um pneu destinado para cada pneu comercializado […] Aos estabelecimentos de comercialização, cabe, no ato da troca de um pneu usado por um pneu novo ou reformado, receber e armazenar temporariamente os resíduos entregues pelo consumidor (sem nenhum ônus para este), sendo vedado o armazenamento de pneus a céu aberto.” (MACEDO; ROHLFS, 2013, p. 14). 79 “[…] a Resolução CONAMA n° 362/2005 determina que todo óleo lubrificante usado ou contaminado deve ser recolhido, coletado e ter destinação final adequada – de forma que propicie a máxima recuperação dos constituintes contidos nos materiais e não afete negativamente o meio ambiente. O recolhimento ocorre quando o revendedor ou gerador retira o óleo usado ou contaminado do equipamento que o utilizou e o armazena até o momento da coleta, a qual consiste em retirar o óleo do local de recolhimento e transportá-lo até a destinação ambientalmente adequada […] impõe como obrigatoriedade, no Brasil, a observância do princípio da reciclabilidade.” (MACEDO; ROHLFS, 2013, p. 13). 80 A consulta pública já foi realizada, o setor aguarda a devolutiva do Comitê Orientador: “A Portaria MMA nº 327, de 5 de setembro de 2014, publicada no Diário Oficial da União de 8 de setembro de 2014, tornou pública a abertura do processo de Consulta Pública da proposta de acordo setorial para a implantação de sistema de logística reversa de lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista que se realizou no período de 00h00 do dia 15 de setembro de 2014 até às 23h59 do dia 15 de outubro de 2014 (30 dias). Após a área técnica da Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano realizar a análise das 367 contribuições recebidas de diferentes setores da sociedade brasileira, as respostas a cada uma foram encaminhadas ao respectivo proponente por meio de e-mail do sítio www.governoeletronico.com.br.” Disponível em: <http://www.sinir.gov.br/documents/10180/104444/RESULTADO+DA+CONSULTA+P %C3%9ABLICA+SOBRE+A+PROPOSTA+DE+ACORDO+SETORIAL+DE+L %C3%82MPADAS.pdf/6903bf40-8858-43b5-b75d-c15f21321dcf> Acesso em 01 de maio de 2016. 81 Dez propostas de acordo setorial recebidas até junho de 2013, sendo 4 consideradas válidas para negociação. Proposta unificada recebida em janeiro de 2014. Em negociação. Próxima etapa – Consulta Pública. Disponível em: <http://www.sinir.gov.br/web/guest/logistica-reversa> Acesso em 01 de maio de 2016.
88 Para tais segmentos se demandará, na forma da Lei da PNRS, regulamento que especifique a forma que será adotada de aplicação das exigências legais na questão do retorno dos resíduos sólidos gerados (ARAÚJO; JURAS, 2012, p. 70). Além dos segmentos com obrigatoriedade imediata, outros segmentos (produtos comercializados em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro, bem como os demais produtos e embalagens) podem ter a obrigatoriedade estendida – na forma que for disposta em regulamento ou em acordos setoriais ou termos de compromisso firmados entre o Poder Público e o setor empresarial (BRASIL, 2012, p. 30). A Lei da PNRS atribui às embalagens dos produtos – plásticas, metálicas ou de vidro – o mesmo grau de importância que atribui aos resíduos sólidos originários dos produtos. Estabelece que os responsáveis por embalagens 82 devem garantir que: as mesmas possam ser reutilizáveis ou recicláveis; o peso e o volume destas embalagens deve ser determinado pelas dimensões necessárias para a proteção do produto e seu conteúdo; sejam projetadas de forma que possam ser reutilizadas de maneira tecnicamente viável e compatível com as exigências aplicáveis aos produtos nelas contidos (LEMOS, 2012, p. 109). O Regulamento da Lei da PNRS (BRASIL, 2012, p. 45) estabelece que estes sistemas de logística reversa serão implementados e operacionalizados por intermédio dos instrumentos: acordos setoriais 83; regulamentos expedidos pelo Poder Público; ou termos de compromisso. Os acordos setoriais e os termos de compromisso são também instrumentos de implantação da PNRS e como tal, mantêm correlação de mútua dependência com o instrumento da logística reversa. Os acordos setoriais podem ser originários de: a) iniciativa do poder público, para tanto deverão ser precedidos de editais de chamamento pelo Ministério do Meio Ambiente, identificando os produtos ou embalagens que serão objeto da logística reversa e o setor responsável, bem como algumas diretrizes metodológicas básicas84; b) propostas dos setores empresariais referidos no art. 18º: “os 82 Identificados como: “[…] todo aquele que: I – manufatura embalagens ou fornece materiais para a fabricação de embalagens; II – coloca em circulação embalagens, materiais para a fabricação de embalagens ou produtos embalados, em qualquer fase da cadeia de comércio.” (BRASIL, 2012, p. 29). 83 “ato de natureza contratual firmado entre o poder público e fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, tendo em vista a implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto” (BRASIL, 2012, p. 10). 84 Os editais de chamamento poderão apresentar as seguintes indicações: “I – os produtos e embalagens que serão objeto da logística reversa, bem como as etapas do ciclo de vida dos produtos e embalagens que
89 fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes dos produtos referidos nos incisos II, III, V e VI do art. 33 da Lei nº 12.305, de 2010, bem como dos produtos e embalagens referidos nos incisos I e IV e no § 1º do art. 33 daquela lei.” (BRASIL, 2012, p. 47). Estas propostas formais deverão ser apresentadas ao Ministério do Meio Ambiente com requisitos mínimos de: indicação dos produtos ou embalagens que serão objeto de acordo; descrição das etapas do ciclo de vida em que o sistema de logística reversa será inserido; descrição de como se dará a operacionalização; inserção das associações de catadores de materiais recicláveis em algumas das etapas operacionais; definição do papel do consumidor, que deverá atuar ativamente; programa de divulgação de informações sobre os métodos existentes para a redução dos resíduos; metas a serem alcançadas; cronograma de implantação, identificação dos resíduos perigosos e quais cuidados devem ser tomados; descrição das atribuições e das responsabilidades de cada participante da cadeia produtiva (BRASIL, 2012, p. 48). Após consulta pública e avaliação do MMA, que seguirá os critérios previstos no art. 28º do Regulamento85, a proposta seguirá para o Comitê Orientador 86 que poderá arquivar a proposta por não ser fruto de uma negociação consensual ou não
estarão inseridas na referida logística; II – o chamamento dos interessados, conforme as especificidades dos produtos e embalagens referidos no inciso I; III – o prazo para que o setor empresarial apresente proposta de acordo setorial, observados os requisitos mínimos estabelecidos neste decreto e no edital; IV – as diretrizes metodológicas para avaliação dos impactos sociais e econômicos da implantação da logística reversa; V – a abrangência territorial do acordo setorial; e VI – outros requisitos que devam ser atendidos pela proposta de acordo setorial, conforme as especificidades dos produtos ou embalagens objeto da logística reversa.” (BRASIL, 2012, p. 48). 85 “I – adequação da proposta à legislação e às normas aplicáveis; II – atendimento ao edital de chamamento, no caso dos processos iniciados pelo poder público, e apresentação dos documentos que devem acompanhar a proposta, em qualquer caso; III – contribuição da proposta e das metas apresentadas para a melhoria da gestão integrada e do gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos e para a redução dos impactos à saúde humana e ao meio ambiente; IV – observância do disposto no art. 9º da Lei nº 12.305, de 2010, quanto à ordem de prioridade da aplicação da gestão e gerenciamento de resíduos sólidos propostos; V – representatividade das entidades signatárias em relação à participação de seus membros no mercado dos produtos e embalagens envolvidos; e VI – contribuição das ações propostas para a inclusão social e geração de emprego e renda dos integrantes de cooperativas e associações de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis constituídas por pessoas físicas de baixa renda.” (BRASIL, 2012, p. 50). 86 O Comitê Orientador para Implantação de Sistemas de Logística Reversa – Comitê Orientador, órgão colegiado de caráter deliberativo e consultivo, tem a finalidade de promover a implantação de logística reversa no país. “[…] com a seguinte composição: I – ministro de Estado do Meio Ambiente; II – ministro de Estado da Saúde; III – ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; IV – ministro de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; e V – ministro de Estado da Fazenda.” (BRASIL, 2012, p. 52).
90 atender aos requisitos, aceitar a proposta 87 ou solicitar dados complementares (BRASIL, 2012, p. 51). “Nas hipóteses em que não houver, em uma mesma área de abrangência, acordo setorial ou regulamento específico” (BRASIL, 2012, p. 51), o Poder Público poderá celebrar Termos de Compromissos, conforme o Regulamento da Lei (art. 32º do Decreto 7.404/2010), com fabricantes, distribuidores ou comerciantes citados no art. 33º da Lei 12.305/2010. o Regulamento prevê também que estes termos podem ser celebrados ainda, quando as metas se tornarem lenientes, como forma de recrudescê-las: “fixação de compromissos e metas mais exigentes que o previsto em acordo setorial ou regulamento” (BRASIL, 2012, p. 51), Quando os Acordos Setoriais ou os Termos de Compromissos não lograrem o êxito que a PNRS pretende, o Poder Executivo poderá lançar mão de decretos para implantar os sistemas de logística reversa por meio de regulamentos. Após consulta prévia ao Comitê Orientador88 sobre a viabilidade técnica e econômica do sistema a ser implantado e posterior consulta pública (BRASIL, 2012, p. 51). A Lei da PNRS sugere (sem prejuízos de exigências específicas que forem fixadas por meio da lei ou regulamento, em normas dos órgãos de controle e vigilância ambiental, ou em acordos setoriais ou termos de compromisso entre o setor público e o setor empresarial), algumas medidas que podem ser tomadas pelo setor empresarial, se forem julgadas necessárias e viáveis, para garantir a implementação eficaz e a operacionalização efetiva dos sistemas de logística 87 “O acordo setorial contendo a logística reversa pactuada será subscrito pelos representantes do setor empresarial e pelo presidente do Comitê Orientador, devendo ser publicado no Diário Oficial da União.” (BRASIL, 2012, p. 51) 88 Ao Comitê Orientador compete: “I – estabelecer a orientação estratégica da implementação de sistemas de logística reversa instituídos nos termos da Lei nº 12.305, de 2010, e deste decreto; II – definir as prioridades e aprovar o cronograma para o lançamento de editais de chamamento de propostas de acordo setorial para a implantação de sistemas de logística reversa de iniciativa da União; III – fixar cronograma para a implantação dos sistemas de logística reversa; IV – aprovar os estudos de viabilidade técnica e econômica; V – definir as diretrizes metodológicas para avaliação dos impactos sociais e econômicos dos sistemas de logística reversa; VI – avaliar a necessidade da revisão dos acordos setoriais, dos regulamentos e dos termos de compromisso que disciplinam a logística reversa no âmbito federal; VII – definir as embalagens que ficam dispensadas, por razões de ordem técnica ou econômica, da obrigatoriedade de fabricação com materiais que propiciem a reutilização e reciclagem; VIII – definir a forma de realização da consulta pública relativa a proposta de implementação de sistemas de logística reversa; IX – promover estudos e propor medidas de desoneração tributária das cadeias produtivas sujeitas à logística reversa e a simplificação dos procedimentos para o cumprimento de obrigações acessórias relativas à movimentação de produtos e embalagens sujeitos à logística reversa; e X – propor medidas visando incluir nos sistemas de logística reversa os produtos e embalagens adquiridos diretamente de empresas não estabelecidas no País, inclusive por meio de comércio eletrônico.” (BRASIL, 2012, pg. 53).
91 reversa (art. 33º, § 3º, I, II, III): a implantação de procedimentos de compra de produtos usados e suas respectivas embalagens; estruturação de rede de Postos de Entrega Voluntária (PEV) de resíduos reutilizáveis e recicláveis; montagem de parcerias com cooperativas e associações de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, sempre que viável (BRASIL, 2012, p. 30). Estabelece também as ações e atividades que estarão a cargo dos demais atores na gestão dos resíduos sólidos por meio dos sistemas de logística reversa: consumidores89, comerciantes e distribuidores90 e fabricantes e importadores91. Os titulares de serviço público de limpeza urbana e de resíduos sólidos são advertidos de que, na condição de contratados – por meio dos acordos setoriais ou termos de compromisso – do setor empresarial para desempenhar atividades relacionadas aos sistemas de logística reversa que são de responsabilidade daquele segmento, vierem a, gratuitamente ou por valor menor que o adequado, assumir estas ações de coleta ou destinação final, incorrerão em evidente improbidade administrativa (BRASIL, 2012, p. 31; RIBEIRO, 2014, p. 139). – a educação ambiental: Nas disposições gerais da Lei da PNRS, o legislador declara a articulação desta com a PNEA. No Regulamento, o poder executivo referenda a educação ambiental instrumental aplicada à gestão dos resíduos sólidos como partícipe da base de sustentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, e estabelece os seus objetivos: “[…] o aprimoramento do conhecimento, dos valores, dos comportamentos e do estilo de vida relacionados com a gestão e o gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos.” (BRASIL, 2012, p. 12, 68).
89 “Os consumidores deverão efetuar a devolução após o uso, aos comerciantes ou distribuidores, dos produtos e das embalagens a que se referem os incisos I a VI do caput, e de outros produtos ou embalagens objeto de logística reversa, na forma do § 1º.” (BRASIL, 2012, p. 30). São ainda obrigações dos consumidores (art. 35º): “Os consumidores são obrigados, sempre que estabelecido sistema de coleta seletiva pelo plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos ou quando instituídos sistemas de logística reversa na forma do art. 15, a acondicionar adequadamente e de forma diferenciada os resíduos sólidos gerados e a disponibilizar adequadamente os resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis para coleta ou devolução” (BRASIL, 2012, p. 31). 90 “Os comerciantes e distribuidores deverão efetuar a devolução aos fabricantes ou aos importadores dos produtos e embalagens reunidos ou devolvidos na forma dos §§ 3º e 4º.” (BRASIL, 2012, p. 30). 91 “Os fabricantes e os importadores darão destinação ambientalmente adequada aos produtos e às embalagens reunidos ou devolvidos, sendo o rejeito encaminhado para a disposição final ambientalmente adequada, na forma estabelecida pelo órgão competente do Sisnama e, se houver, pelo plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos” (BRASIL, 2012, p. 30, 31).
92 As origens da Lei 9.795/1999, que instituiu a Política Nacional de Educação Ambiental, remontam à Conferência Intergovernamental de Tibilisi em 1977, Geórgia (à época integrante da União Soviética). Esta conferência é fruto da parceria entre a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e o PNUMA, e, deste encontro histórico saíram as definições, os objetivos, os princípios e as estratégias para a Educação Ambiental de forma globalizada. O documento final apresenta 41 (quarenta e uma) recomendações sobre educação ambiental, a recomendação que trata de como deve ser o processo educativo é uma das mais relevantes: “ser orientado para a resolução dos problemas concretos do meio ambiente, através de enfoques interdisciplinares e, de participação ativa e responsável de cada indivíduo e da coletividade.” (ARAÚJO; FELDMANN, 2012, p. 562). A educação ambiental é apresentada na declaração de Tibilisi como um vetor resultante da articulação de diversas e distintas experiências educativas e do encontro multidisciplinar (biologia, sociologia, economia, antropologia, filosofia, teologia, linguística, psicologia, direito, etc.). Este vetor proporcionaria o surgimento de uma percepção integrada do meio ambiente, de cunho axiológico, capaz de produzir conhecimento que se traduziria em ações concretas de prevenção e que apresentariam soluções para os problemas ambientais de forma eficaz, coerente e responsável. Recomenda a educação ambiental como um processo contínuo, que deve atender às demandas e necessidade de todos os grupos etários e categorias profissionais (ARAÚJO; FELDMANN, 2012, p. 563). A educação ambiental passou então, a fazer parte de todas as discussões futuras que tratassem do meio ambiente de forma ampla e da correlação da degradação ambiental com as ações antrópicas. A Constituição Federal de 1988 incorporou as preocupações da Conferência de Tibilisi 92, a Agenda 21 faz referências à educação ambiental 93 e a Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente, 92 O art. 225, § 1º, IV estabelece que é papel do poder público: “promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente.” (ARAÚJO; FELDMANN, 2012, p. 563). 93 “[…] O ensino é também fundamental para conferir consciência ambiental, ética, valores e atitudes, técnicas e comportamentos em consonância com o desenvolvimento sustentável e favoreçam a participação pública nas tomadas de decisão. Para ser eficaz, o ensino sobre o meio ambiente e desenvolvimento dever abordar a dinâmica do desenvolvimento do meio físico/biológico e do socioeconômico e do desenvolvimento humano (que pode incluir o espiritual), deve integrar-se em todas as disciplinas e empregar métodos formais e informais de meios efetivos de comunicação.” (ARAÚJO; FELDMANN; 2012, p. 564).
93 documento principiológico final da Conferência Rio-92, a insere como um de seus pilares94. A Política Nacional de Educação Ambiental define a aplicação da educação às questões ambientais como: […] os processos por meio dos quais os indivíduos e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos e habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (DOURADO; BELIZÁRIO; SORRENTINO, 2014, p. 225).
O Regulamento da Lei da PNRS estabelece quais as medidas que o poder público “deverá” tomar visando o cumprimento do objetivo tetraédrico pedagógico relativo à gestão e o gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos: o aprimoramento do conhecimento 95; dos valores96; dos comportamentos97; e do estilo de vida98. Estas ações e medidas não desobrigam os fornecedores de produtos e suas embalagens e provedores de serviços de suas responsabilidades referentes ao dever de facilitar que o consumidor tenha fácil acesso às informações sobre o serviço ou produto, de forma que este cumpra as obrigações que lhe dizem respeito, garantindo que os sistemas de logística reversa e coleta seletiva instituídos sejam exitosos (BRASIL, 2012, p. 68).
94 “Princípio 10: a melhor maneira de tratar as questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações acerca de materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar de processos decisórios. Os Estados irão facilitar e estimular a conscientização e a participação popular, colocando as informações à disposição de todos […]” (ARAÚJO; FELDMANN, 2012, p. 564). 95 Incisos I, V, VIII: incentivar atividades de caráter educativo e pedagógico, em colaboração com entidades do setor empresarial e da sociedade civil organizada; apoiar as pesquisas realizadas por órgãos oficiais, pelas universidades, por organizações não governamentais e por setores empresariais, bem como a elaboração de estudos, a coleta de dados e de informações sobre o comportamento do consumidor brasileiro; divulgar os conceitos relacionados com a coleta seletiva, com a logística reversa, com o consumo consciente e com a minimização da geração de resíduos sólidos (BRASIL, 2012, p. 68). 96 Inciso II: promover a articulação da educação ambiental na gestão dos resíduos sólidos com a Política Nacional de Educação Ambiental(BRASIL, 2012, p. 68). 97 Incisos III e VII: realizar ações educativas voltadas aos fabricantes, importadores, comerciantes e distribuidores, com enfoque diferenciado para os agentes envolvidos direta e indiretamente com os sistemas de coleta seletiva e logística reversa; promover a capacitação dos gestores públicos para que atuem como multiplicadores nos diversos aspectos da gestão integrada dos resíduos sólidos (BRASIL, 2012, p. 68). 98 Incisos IV e VI: desenvolver ações educativas voltadas à conscientização dos consumidores com relação ao consumo sustentável e às suas responsabilidades no âmbito da responsabilidade compartilhada de que trata a Lei nº 12.305, de 2010; elaborar e implementar planos de produção e consumo sustentável (BRASIL, 2012, p. 68).
94 A educação ambiental que será instrumentalizada pela PNRS, deverá ser reconhecida como uma ferramenta de mobilização social que assegure a obediência às diretrizes dessa mesma PNRS, bem como favoreça o alcance das metas e objetivos propostos (DOURADO; BELIZÁRIO; SORRENTINO, 2014, p. 221). As ações da educação ambiental aplicada à gestão e ao gerenciamento dos resíduos sólidos se classificam em quatro categorias: informações orientadoras e objetivas (oferecer um repertório para que as pessoas saibam a importância do tema dos resíduos sólidos); sensibilização/mobilização das comunidades diretamente envolvidas (conteúdos que aprofundem as causas e consequências dos excessos de geração de resíduos e as formas e dificuldades no tratamento e na destinação dos resíduos); informação, sensibilização ou mobilização para o tema resíduos sólidos desenvolvidos em ambiente escolar (propor o tema como vetor para trabalhar as questões ambientais de maneira mais ampla); campanhas e ações pontuais de mobilização (distribuídas em uma série de temas e formas de abordagem
que
variam
conforme
cada
caso)
(DOURADO;
BELIZÁRIO;
SORRENTINO, 2014, p. 222). A educação ambiental voltada para os resíduos sólidos tem o desafio de levar a comunidade (no amplo sentido do termo) a repensar a forma e a intensidade do consumo e a responsabilidade pelos resíduos gerados. Algumas perspectivas são percebidas: – a crise ambiental atual exige respostas urgentes e a educação deve ser capaz de conceder uma resposta, que não só questione o modelo socieconômico estabelecido, mas que apresente quais mudanças precisam ser efetuadas e em que densidade; – aprofundar a compreensão e o exercício da responsabilidade do indivíduo e da comunidade diante dos desafios que a degradação ambiental impõem; – perceber o outro, alteridade, reconhecendo e respeitando as diferenças, seja no sentido econômico, social, gênero, raça, cultural ou político; – não aceitação da “pasteurização” do indivíduo pelo modelo econômico vigente, que o exclui dos processos de construção de identidade, não lhe restando alternativa que não seja conformidade às regras do mercado;
95 – trazer à consciência da comunidade de que o consumo não é um ato individual, uma questão de escolha apenas, mas sim algo que é determinado pelos códigos que circulam socialmente e que são utilizados para que o indivíduo atribua identidade a si próprio e a outrem; – refletir sobre a função do consumo como classificador social, quando legitima o que se deve consumir, desvaloriza quem tem pouco e valoriza quem tem muito, utilizando-se de critérios socialmente determinados e, na maioria das vezes deturpados; – reconhecer que a valorização do consumismo é reforçada pela indústria (obsolescência planejada) e pelo marketing (supervalorização do design e dos produtos da moda) e que há correlação entre consumo e descarte de forma diretamente
proporcional,
não
são
processos
automáticos,
sem
nenhuma
significância cultural (uma sociedade de consumo é uma sociedade de descarte); – reconhecer que um dos processos de classificação social intrínsecos ao modelo social vigente é a legitimação e o reconhecimento da identidade por meio da quantidade de descarte; – perceber que o maior dilema que a sociedade atual enfrenta, face às questões de resíduos sólidos, é a mudança reflexiva de paradigma, para a qual esta sociedade não está devidamente amadurecida. Somente com a redução do consumo a níveis necessários, da distribuição, da produção e da extração da matéria-prima se chegará aos limites impostos pela natureza de absorver os resíduos de forma adequada (DOURADO; BELIZÁRIO; SORRENTINO, 2014, p. 232, 233).
2.2.4 Dos Resíduos Sólidos e Rejeitos
O tema principal da PNRS são os resíduos sólidos. Os princípios, objetivos, instrumentos e diretrizes convergem para ações e medidas concretas que assegurem a gestão e o gerenciamento integrado destes resíduos, com vistas à não
96 geração, redução, reutilização, reciclagem ou disposição final adequadamente ambiental. Resíduos sólidos foram por muito tempo convencionalmente chamados de “lixo”, dando origem semântica a um verbo, que sintomática ou metaforicamente, alude à pouca atenção que o vulgo concede a algo ou a alguém: “- Estou pouco me lixando”. A alteração da nomenclatura representa mais do que mudança semântica, representa uma mudança cultural (SILVA; ALVES; 2015, p. 01). A Lei da PNRS define de forma inequívoca o que são resíduos sólidos (art. 3º, inciso XVI): Material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólidos ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d'água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face de melhor tecnologia disponível (BRASIL, 2012; p. 11).
O conceito até então amplamente aceito era o da Resolução n.º 05, de 05 de agosto de 1993 do CONAMA (1993, pg. 01) “Dispõe sobre o gerenciamento de resíduos sólidos gerados nos portos, aeroportos, terminais ferroviários e rodoviários” e que reproduzia integralmente a definição constante na NBR 10.004:2004 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT): Resíduos nos estados sólido e semi-sólido, que resultam de atividades da comunidade de origem: industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços e de varrição. Ficam incluídos nesta definição os lodos provenientes de sistemas de tratamento de água, aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de poluição, bem como determinados líquidos cujas particularidades tornem inviável seu lançamento na rede pública de esgotos ou corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica e economicamente inviáveis, em face à melhor tecnologia disponível.
A norma conceitua os resíduos sólidos a partir das características físicas (sólido, semissólido, lodo) e da origem dos mesmos (industrial, doméstica, hospitalar, etc), Lemos (2012, pg. 91) faz crítica a esta apresentação, sugerindo que a norma deveria ter se atentado ao caráter subjetivo também, mencionando a condição psicológica do possuidor, proprietário ou detentor (ex: se procede, se
97 propõe proceder ou se está obrigado a proceder), além de não esclarecer quais as características essenciais para que uma substância seja identificada como resíduo sólido e quais as responsabilidades dos detentores ou possuidores. A definição de resíduos sólidos da Lei da PNRS é fortemente influenciada pela legislação germânica. As disposições gerais da Lei Alemã para a Promoção da Gestão Integrada do Ciclo Fechado de Resíduos Sólidos apresenta conceito similar: “Resíduos no sentido desta lei são todas as coisas móveis que se enquadram nos grupos do Anexo I e cujo detentor se desfaz, quer se desfazer ou é obrigado a se desfazer.” (LEMOS, 2012, p. 96). A primeira tentativa efetuada, no âmbito da Comunidade Europeia, de conceituar resíduo foi da Diretiva 75/442/CEE: “qualquer substância ou objeto de que o detentor se desfaz ou tem a obrigação de se desfazer por força das disposições nacionais em vigor” (LEMOS, 2012, p. 94). Lemos (2012, p. 94) afirma que a primeira parte do conceito comunitário é similar ao conceito res derelictae do direito civil: “o abandono da coisa móvel”, que remonta às origens romanas do direito e que estabelecia que o abandono da coisa configurava perda de propriedade. Porém, face às questões ambientais, a segunda parte do conceito considera a saúde pública, a gestão racional dos recursos e a proteção da paisagem como o núcleo central da problemática do descarte. A Diretiva 91/156/CEE alterou o conceito anterior: “quaisquer substâncias ou objetos abrangidos pelas categorias fixadas no Anexo I [resíduos de produção ou consumo; produtos que não obedeçam às normas ou estejam fora de validade; e elementos inutilizáveis] e de que o detentor se desfaz ou tem a intenção ou a obrigação de se desfazer” (LEMOS, 2012, p. 94). Segundo Lemos (2012, p. 95) o Anexo I da Diretiva 91 enumera 16 categorias de resíduos de forma exemplificativa ou “lista aberta”, trata-se do Catálogo Europeu de Resíduos (CER). A inclusão de uma determinada matéria no catálogo não evidencia que a mesma será considerada resíduo em todos os casos, o conceito geral que deve ser aplicado é de que o resíduo depende do seu detentor “dele se desfazer, ter a intenção de se desfazer ou ter a obrigação de se desfazer”, o caráter subjetivo proposto pela Diretiva99. O material pode ter sido incluído na listagem, 99 “Nos termos do Anexo da Decisão 2000/532/CE, a inclusão de um material na lista não significa que ele seja considerado resíduo em todas as circunstâncias, mas apenas quando ajusta-se à definição de resíduo
98 porém se o detentor não quer dele se desfazer, não pode ser considerado resíduo, a discussão jurídica não se prende à significância objetiva do material. A definição, que o substitutivo ao Projeto de Lei 203/1991 propunha de resíduos sólidos para a PNRS, visava preencher a lacuna que uma definição restrita possibilita, uma vez que a proposta de recuperar os resíduos sempre que for “economicamente viável” deixa margem às mais distintas interpretações: materiais resultantes de processo de produção, transformação, utilização ou consumo, oriundos de atividades humanas ou animais, ou decorrentes de fenômenos naturais, a cujo descarte se procede, se propõe a proceder ou se está obrigado a proceder (LEMOS, 2012, p. 101).
Ribeiro (2014, p. 109-111) observa que a definição que a PNRS faz de resíduos sólidos inclui incomumente, em função do seu conceito jurídico-legal, gases contidos em recipientes e líquidos – que não podem ser lançados na rede pública de esgotos ou em corpos d'água –, para facilitar a determinação da origem dos resíduos. Além do substrato material em si, o conceito também aponta para um elemento exógeno: o ato de haver o descarte, o ato de se desfazer da coisa. Muito embora seja prevista em lei essa forma de extinção da propriedade 100, a PNRS contudo, estabelece na terceira parte da definição que o proprietário, detentor ou mero possuidor é responsável pela “destinação final” 101 do resíduo sólido, portanto, ele não perde a propriedade, e a responsabilidade intrínseca à mesma, ao efetuar o descarte. As ações que envolvem os resíduos sólidos foram classificadas pelo legislador, no enunciado do conceito, em três modalidades, a relevância das mesmas se acentua quando da análise das responsabilidades com a destinação final dos mesmos: categoria histórica, envolve a atuação do responsável, nenhum outro aspecto é relevante (“a cuja destinação final se procede”); categoria estabelecida na letra 'a' do Artigo I da Diretiva 75/442/CE, em sua versão modificada pela Diretiva 91/156/CE. O Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia já declarou que a efetiva qualificação como resíduo deriva do possuidor desfazer-se, ter a intenção de se desfazer ou a obrigação de se desfazer das substâncias ou objetos contidos na lista.”(LEMOS, 2012, p. 96). 100 Código Civil artigo 1.275, III. 101 Para que não se perca de vista o que o legislador entende como destinação final: “destinação de resíduos que inclui a reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético ou outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama, do SNVS e do Suasa, entre elas a disposição final, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos.” (BRASIL, 2012, p. 10).
99 psicológica, envole aquilo que o responsável pretende fazer (“a cuja destinação final se propõe proceder”); e a categoria imperativa, envolve as hipóteses plausíveis, que por força de legislação o responsável pretende fazer (“a cuja destinação final se está obrigado a proceder”) (LEMOS, 2012, p. 102). A PNRS quando conceituou resíduos sólidos se preocupou mais com o aspecto dos resultados da ação antrópica em si (tudo o que for descartado por meio das relações e atividades sociais humanas é resíduos sólidos), relegando a segundo plano os demais aspectos quanto à motivação para o descarte (esgotamento das características preponderantes e propriedades originais da matéria, substância ou bem em função do uso, danos, acidentes, etc.; se as propriedades originais da matéria, substância, objetos ou bem deixaram de atender à finalidade principal para qual foram projetadas ou é fruto da subjetividade da análise individual sobre o que pode ser considerado servível ou inservível para o uso humano em sociedade). Face a isto, cabe a advertência: Tendo presente que um dos postulados da Lei n. 12305/2010 consiste na redução do descarte de resíduos e que isso pressupõe a revisão e a redução dos padrões de consumo da sociedade, é possível admitir que deva ele pressupor o esgotamento das características preponderantes da matéria, da substância, do objeto ou bem, de forma a torná-los inservíveis para a finalidade para o qual foram concebidos (MILARÉ; MILARÉ; FRANCO, 2012, p. 212).
Mousinho (2008, p. 361) apresenta, em obra que antecede à PNRS, uma alternativa à definição de resíduos sólidos de forma pedagógica, categorizando-os por composição química, origem, e periculosidade: Qualquer material resultante de atividades humanas descartado ou rejeitado por ser considerado inútil ou sem valor. Pode estar em estado sólido ou semi-sólido e ser classificado de acordo com sua composição química (orgânico e inorgânico), sua fonte geradora (residencial, comercial, industrial, agrícola, de serviços de saúde, etc.) e seus riscos potenciais ao ambiente (perigosos, inertes e não inertes).
A perspectiva comumente utilizada para se classificar os resíduos quanto à operacionalização é a de que os mesmos são objetos estáticos, fruto do paradigma estabelecido: produção – consumo – eliminação dos resíduos. Aragão (2006 apud LEMOS, 2012, p. 94) propõe que esta perspectiva se torne dinâmica, com implicações para a gestão dos resíduos e a atribuição de responsabilidades quanto
100 à destinação final: “os resíduos são aquilo que surge na etapa terminal das torrentes de materiais que fluem da natureza para a sociedade humana e de novo para a natureza” (grifos da autora). Por essa perspectiva dinâmica os resíduos estariam num eterno devir, “do berço ao berço” (cradle-to-cradle) e não “do berço ao túmulo” (cradle-to-grave). Dois aspectos são intrínsecos à perspectiva dinâmica e, são determinantes para a atribuição de responsabilidade na gestão dos resíduos: anabolismo, que consiste na extração da matéria-prima, transformação da mesma em produto acabado através do processo produtivo e sua segunda transformação em resíduo pós-consumo (demanda preocupação com a preservação da natureza, dos recursos naturais e geológicos, do direito da indústria do comércio, dos serviços e do consumo) e catabolismo, a gestão propriamente dita da eliminação dos resíduos (LEMOS, 2012, p. 94). O legislador também apresenta uma definição para rejeitos, logrando dessa forma a impossibilidade de ambiguidade na interpretação do vocábulo, por conta de sentido dúbio (inciso XV do Art. 3º): resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente adequada (BRASIL, 2012, p. 11).
O substitutivo ao Projeto de Lei 203/1991 também propunha uma definição mais ampla para o termo “lixo”, que contrasta visivelmente com a definição de “rejeitos” da Lei: resíduos sólidos comuns, ou a esta classificação equiparados, produzidos individual ou coletivamente, pela atividade humana ou animal, ou por fenômenos naturais em áreas urbanas, nocivos à saúde, ao meio ambiente e ao bem estar (sic) da população, não enquadrados como resíduos perigosos (LEMOS, 2012, p. 101).
A noção de “resíduo último” ou “resíduo não aproveitável” era familiar entre os profissionais da indústria e do saneamento envolvidos com o gerenciamento dos resíduos sólidos. As tratativas aplicadas envolviam dispô-los – o montante envolvido era bastante significativo –, adequadamente em aterros sanitários ou, na maioria das vezes, nos indesejados “lixões”, uma vez que as alternativas tecnológicas
101 disponíveis não eram atrativas do ponto de vista econômico, logístico e operacional. A noção de “rejeitos” também já estava disseminada, porém referindo-se apenas aos resíduos radioativos gerados em serviços de saúde ou rejeitos de mineração (BEL, 2012, p. 489). A utilização do termo “rejeitos” para os resíduos que “não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente adequada”, é para conceder maior força legal à diretriz de prioridade na gestão e gerenciamento: “não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos”. Rejeito, portanto, é aquilo que não foi possível reciclar ou reutilizar. “O conceito está acrecido do componente econômico, uma vez que o rejeito não é aquilo que não se tentou reciclar ou reutilizar, antes, aquilo cujas tentativas de reciclagem/reúso foram inviabilizadas pelo alto custo” (VELTEN, 2013, p. 132). O caráter subjetivo do enunciado pode vir a ser alvo de polêmica, visto que causa uma incerteza jurídica, o que os juristas chamam de “termo jurídico indeterminado”: as expressões “depois de esgotadas todas as possibilidades”; “processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis”; e “não apresentem outra possibilidade que não…” induzem às interpretações as mais diversas, com significados até antagônicos, deixando a interpretação ao critério dos agentes da administração pública (BEL, 2012, p. 490)102. A Lei da PNRS classifica os resíduos sólidos em duas categorias ou ordens classificatórias, quanto ao processo ou atividade que lhes deu origem e quanto ao risco à saúde pública, à vida humana e animal e ao meio ambiente: I – quanto à origem: a) resíduos domiciliares: os originários de atividades domésticas em residências urbanas; b) resíduos de limpeza urbana: os originários da varrição, limpeza de logradouros e vias públicas e outros serviços de limpeza urbana; c) resíduos sólidos urbanos: os englobados nas alíneas a e b; d) resíduos de estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços: os gerados nessas atividades, excetuados os referidos nas alíneas b, e, g, h e j;103 102 Considere-se a seguinte situação hipotética: “Indústria em região distante de empresas recicladoras. Poderá classificar seus resíduos industriais como rejeitos e dispô-los em aterro sanitário, alegando recuperação economicamente inviável em face de seu custo de transporte?” (BEL, 2012, p. 490) 103 A Lei ainda dispõe no parágrafo único do art. 13º: “Respeitado o disposto no art. 20, os resíduos referidos na alínea d do inciso I do caput, se caracterizados como não perigosos, podem, em razão de sua natureza, composição ou volume, ser equiparados aos resíduos domiciliares pelo poder público municipal.” (BRASIL,
102 e) resíduos dos serviços públicos de saneamento básico: os gerados nessas atividades, excetuados os referidos na alínea c; f) resíduos industriais: os gerados nos processos produtivos e instalações industriais; g) resíduos de serviços de saúde: os gerados nos serviços de saúde, conforme definido em regulamento ou em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS; h) resíduos da construção civil: os gerados nas construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção civil, incluídos os resultantes da preparação e escavação de terrenos para obras civis; i) resíduos agrossilvopastoris: os gerados nas atividades agropecuárias e silviculturais, incluídos os relacionados a insumos utilizados nessas atividades; j) resíduos de serviços de transportes: os originários de portos, aeroportos, terminais alfandegários, rodoviários e ferroviários e passagens de fronteira; k) resíduos de mineração: os gerados na atividade de pesquisa, extração ou beneficiamento de minérios; II – quanto à periculosidade: a) resíduos perigosos: aqueles que, em razão de suas características de inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade, patogenicidade, carcinogenicidade, teratogenicidade e mutagenicidade, apresentam significativo risco à saúde pública ou à qualidade ambiental, de acordo com lei, regulamento ou norma técnica; b) resíduos não perigosos: aqueles não enquadrados na alínea ª (BRASIL, 2012, p. 16).
A classificação binária que a PNRS efetuou, permite que subclassificações, com base em outros critérios, sejam efetuadas: a) quanto à destinação: recicláveis ou não recicláveis; b) quanto à origem ou natureza da atividade que ocasionou a geração: de serviços de saúde 104 (RSS); da construção civil 105 (RCC); industriais106
2012, p. 16). 104 “são aqueles gerados nos serviços de saúde, conforme definido em regulamento ou em normas estabelecidas pelos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) e do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS). (BARROS, 2012, p. 31). 105 “Constituem-se nos resíduos gerados nas construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção civil, incluídos os resultantes da preparação e escavação de terrenos para obras civis. Constitui-se por materiais agregados para concreto, fragmentos de concreto armado, madeira, cerâmica, argamassa, solos, restos da alimentação das equipes de funcionários, tijolos, etc. Possuem também, resíduos passíveis de proporcionarem toxicidade, como sobras de tintas, lâmpadas fluorecentes, solventes, amianto, entre outros.” (BARROS, 2012, p. 31). 106 “São resíduos gerados nos processos produtivos e instalações industriais. Engloba uma diversidade de indústrias e processos produtivos, assim como resíduos não associados à atividade fim da indústria. Nesse sentido, torna-se essencial a classificação conforme a ABNT NBR 10004, além do conhecimento do processo industrial que deu origem ao resíduo, visando ao correto gerenciamento nas mais diversas etapas, que englobam desde o transporte interno até a destinação final ambientalmente adequada.” (BARROS, 2012, p. 30).
103 (RI); urbanos (RSU), que compreendem os domiciliares 107 e os de limpeza urbana108; os de estabelecimentos comerciais e prestadores de serviço 109; dos serviços públicos
de
saneamento
básico110;
agrossilvopastoris111;
de
serviços
de
transportes112; e de mineração113; c) quanto à logística: os de fonte de geração fixa (RFGF), a geração é mais concentrada numa área; e os de fonte de geração difusa (RFGD), a entropia é bastante alta, a geração não está concentrada numa área específica; d) quanto ao grau de periculosidade: perigosos e não perigosos, que podem ser inertes ou não inertes (CRUZ, 2014, p. 48). A norma ABNT NBR 10.004 (2004, p. 5) classifica os resíduos sólidos quanto aos seus potenciais riscos ambientais e à saúde pública, de forma que possam ser gerenciados adequadamente, e os divide em: Classe I – Perigosos: aqueles que apresentam periculosidade 114 (em função das propriedades físicas, químicas ou infectocontagiosas dos resíduos, os riscos 107 “São originários de atividades domésticas em residências urbanas. Constituem-se em uma grande diversidade de itens, em geral, sobras de alimentos, produtos deteriorados, garrafas de vidro ou de plástico, embalagens, papel higiênico, fraldas descartáveis, entre outros. Entretanto, contém, ainda, alguns resíduos passíveis de serem tóxicos e, por vezes, descartados inapropriadamente, como lâmpadas fluorescentes, pilhas e baterias, solventes, inseticidas, herbicidas, etc.” (BARROS, 2012, p. 29). 108 “São procedentes de varrição, limpeza de logradouros e vias públicas e demais serviços de limpeza urbana. São compostos por folhas, galhos de árvores, terra, areia. Como no caso dos resíduos domiciliares, podem também conter os resíduos descartados inadequadamente, como pneu, entulhos, etc. A capina gerada no (sic) sistemas de limpeza urbana pode ser usada como material alternativo na cobertura operacional de aterros sanitários de pequeno porte.” (BARROS, 2012, p. 29). 109 “Dentre os resíduos gerados nessas atividades são excetuados os resíduos de limpeza urbana, resíduos dos serviços públicos de saneamento básico, resíduos de serviço de saúde, resíduos de construção civil e resíduos de serviços de transporte. São compostos, sobretudo pelo resultado da atividade comercial praticada, a exemplo de restos alimentares em restaurantes e lanchonetes. Possuem grande quantidade de material de escritório, papelão, plástico, embalagens em geral, entre outros.” (BARROS, 2012, p. 29). 110 “Dentre os resíduos gerados nessas atividades são excetuados os geradores de resíduos sólidos urbanos. Estações de Tratamento de Esgoto (ETE) e Estações de Tratamento de Água (ETA) produzem lodo que devem (sic) ser desidratados e tratados. No caso dos ETE, os processos de tratamento biológico podem ser aeróbicos (na presença de oxigênio) ou anaeróbicos (na ausência de oxigênio) […] As ETA produzem lodo passível de recuperação de produtos químicos utilizados durante o processo de tratamento da água, sobretudo nas etapas de coagulação e floculação, por meio de ajuste de pH.” (BARROS, 2012, p. 29, 30). 111 “São os resíduos gerados nas atividades agropecuárias e silviculturais, incluídos os relacionados a insumos utilizados nessas atividades. São constituídos por resíduos perigosos utilizados na agricultura, como embalagens com restos de fertilizantes químicos e pesticida” (BARROS, 2012, p. 33). 112 “São os resíduos originários de portos, aeroportos, terminais alfandegários, rodoviários e ferroviários e passagens de fronteira […] Os resíduos dos serviços de transporte recebem atenção especial em decorrência do fato de que o tráfego de cargas e pessoas representa o risco de transmissão de doenças e disseminação de pragas em agriculturas, por exemplo. (BARROS, 2012, p. 35) 113 “São constituídos pelos resíduos gerados na atividade de pesquisa, extração ou beneficiamento de minérios.” (BARROS, 2012, p. 35). 114 “Característica apresentada por um resíduo que, em função de suas propriedades físicas, químicas ou infecto-contagiosas pode apresentar: a) risco à saúde pública, provocando mortalidade, incidência de doenças ou acentuando seus índices; b) riscos ao meio ambiente, quando o resíduo for gerenciado de forma inadequada.” (ABNT, 2004, p. 2).
104 podem se manifestar em três vieses: a capacidade patológica – grau de eficiência em provocar doenças ou acentuar a incidência –, a tanatológica – grau de eficiência em provocar a mortalidade humana ou animal – e o nível de intensidade em causar degradação ambiental quando os mesmos não são gerenciados de forma ambientalmente adequada), ou uma das características: inflamabilidade (D001) 115, corrosividade (D002)116, reatividade (D003)117, toxicidade (D005 a D052)118,
115 Um resíduo sólido é caracterizado como inflamável se uma amostra dele apresentar qualquer uma das seguintes propriedades: a) ser líquida e ter ponto de fulgor inferior a 60°C; b) não ser líquida e ser capaz de, sob condições de temperatura e pressão produzir fogo por fricção, absorção de umidade ou por alterações químicas espontâneas e, quando inflamada, queimar vigorosa e persistentemente, dificultando a extinção do fogo; c) ser um oxidante definido como substância que pode liberar oxigênio e, como resultado, estimular a combustão e aumentar a intensidade do fogo em outro material; d) ser um gás comprimido inflamável (ABNT, 2004, p. 3). 116 Um resíduo é caracterizado como corrosivo se uma amostra apresentar uma das seguintes propriedades: a) ser aquosa e apresentar pH inferior ou igual a 2, ou, superior ou igual a 12,5, ou sua mistura com água, na proporção de 1:1 em peso, produzir uma solução que apresente pH inferior a 2 ou superior ou igual a 12,5; b) ser líquida ou, quando misturada em peso equivalente de água, produzir um líquido e corroer o aço (COPANT 1020) a uma razão maior que 6,35 mm ao ano, a uma temperatura de 55°C (ABNT, 2004, p. 3). 117 Um resíduo é caracterizado como reativo se uma amostra dele apresentar uma das seguintes propriedades: a) ser normalmente instável e reagir de forma violenta e imediata, sem detonar; b) reagir violentamente com a água; c) formar misturas potencialmente explosivas com a água; d) gerar gases, vapores e fumos tóxicos em quantidades suficientes para provocar danos à saúde pública ou ao meio ambiente, quando misturados com a água; e) possuir em sua constituição os íons CN- ou S2- em concentrações que ultrapassem os limites de 250 mg de HCN liberável por quilograma de resíduo ou 500 mg de H2S liberável por quilograma de resíduo, de acordo com ensaio estabelecido no USEPA - SW 846; f) ser capaz de produzir reação explosiva ou detonante sob a ação de forte estímulo, ação catalítica ou temperatura em ambientes confinados; g) ser capaz de produzir, prontamente, reação ou decomposição detonante ou explosiva a 25°C e 0,1 MPa (1 atm); h) ser explosivo, definido como uma substância fabricada para produzir um resultado prático, através de explosão ou efeito pirotécnico, esteja ou não esta substância contida em dispositivo preparado para este fim (ABNT, 2004, p. 4). 118 “Para avaliação dessa toxicidade, devem ser considerados os seguintes fatores: ― natureza da toxicidade apresentada pelo resíduo; ― concentração do constituinte no resíduo; ― potencial que o constituinte, ou qualquer produto tóxico de sua degradação, tem para migrar do resíduo para o ambiente, sob condições impróprias de manuseio; ― persistência do constituinte ou qualquer produto tóxico de sua degradação; ― potencial que o constituinte, ou qualquer produto tóxico de sua degradação, tem para degradar-se em constituintes não perigosos, considerando a velocidade em que ocorre a degradação; ― extensão em que o constituinte, ou qualquer produto tóxico de sua degradação, é capaz de bioacumulação nos ecossistemas; efeito nocivo pela presença de agente teratogênico, mutagênico, carcinogênico ou ecotóxico, associados a substâncias isoladamente ou decorrente do sinergismo entre as substâncias constituintes do resíduo; c) ser constituída por restos de embalagens contaminadas com substâncias constantes nos anexos D ou E; d) resultar de derramamentos ou de produtos fora de especificação ou do prazo de validade que contenham quaisquer substâncias constantes nos anexos D ou E; e) ser comprovadamente letal ao homem; f) possuir substância em concentração comprovadamente letal ao homem ou estudos do resíduo que demonstrem uma DL50 oral para ratos menor que 50 mg/kg ou CL50 inalação para ratos menor que 2 mg/L ou uma DL50 dérmica para coelhos menor que 200 mg/kg” (ABNT, 2004, p. 4, 5).
105 patogenicidade
(D004)119,
carcinogenicidade120,
teratogenicidade121
e
mutagenicidade122. Classe II - Não perigosos: aqueles que não apresentam periculosidade ou algumas das outras características citadas para a Classe I. A codificação para alguns desses resíduos são apresentadas no anexo H da norma. Subdividem-se em Classe II A – Não inertes123: podem apresentar propriedades de biodegradabilidade, combustibilidade ou solubilidade em água; e Classe II B Inertes124: aqueles que quando expostos à água destilada ou desionizada, à temperatura ambiente, não tiverem nenhum de seus constituintes solubilizados, não se mostraram biodegradáveis. Os resíduos de medicamentos domiciliares são enquadrados como Classe I – Perigosos, em função da toxicidade: “propriedade potencial que o agente tóxico possui de provocar, em maior ou menor grau, um efeito adverso em consequência de sua interação com o organismo”. Como agente tóxico 125 pode, potencialmente, provocar toxicidade aguda126 nas vidas humanas ou animal que inadvertidamente 119 Um resíduo é caracterizado como patogênico se uma amostra dele contiver ou se houver suspeita de conter, microorganismos patogênicos, proteínas virais, ácido desoxiribonucléico (ADN) ou ácido ribonucléico (ARN) recombinantes, organismos geneticamente modificados, plasmídios, cloroplastos, mitocôndrias ou toxinas capazes de produzir doenças em homens, animais ou vegetais. Os resíduos gerados nas estações de tratamento de esgotos domésticos e os resíduos sólidos domiciliares, excetuando-se os originados na assistência à saúde da pessoa ou animal, não serão classificados segundo os critérios de patogenicidade (ABNT, 2004, p. 5). 120 “Agente carcinogênico: Substâncias, misturas, agentes físicos ou biológicos cuja inalação ingestão e absorção cutânea possa desenvolver câncer ou aumentar sua frequência. O câncer é o resultado de processo anormal, não controlado da diferenciação e proliferação celular, podendo ser iniciado por alteração mutacional.” (ABNT, 2004, p. 2). 121 “Agente teratogênico: Qualquer substância, mistura, organismo, agente físico ou estado de deficiência que, estando presente durante a vida embrionária ou fetal, produz uma alteração na estrutura ou função do individuo dela resultante.” (ABNT, 2004, p. 2). 122 “Agente mutagênico: Qualquer substância, mistura, agente físico ou biológico cuja inalação, ingestão ou absorção cutânea possa elevar as taxas espontâneas de danos ao material genético e ainda provocar ou aumentar a frequência de defeitos genéticos.” (ABNT, 2004, p. 2). 123 “Aqueles que não se enquadram nas classificações de resíduos classe I – Perigosos ou de resíduos classe II B – Inertes, nos termos desta Norma.” (ABNT, 2004, p. 5). 124 “Quaisquer resíduos que, quando amostrados de uma forma representativa, segundo a ABNT NBR 10007, e submetidos a um contato dinâmico e estático com água destilada ou desionizada, à temperatura ambiente, conforme ABNT NBR 10006, não tiverem nenhum de seus constituintes solubilizados a concentrações superiores aos padrões de potabilidade de água, excetuando-se aspecto, cor, turbidez, dureza e sabor, conforme anexo G.” (ABNT, 2004, p. 5). 125 “Qualquer substância ou mistura cuja inalação, ingestão ou absorção cutânea tenha sido cientificamente comprovada como tendo efeito adverso (tóxico, carcinogênico, mutagênico, teratogênico ou ecotoxicológico).” (ABNT, 2004, p. 2). 126 “Propriedade potencial que o agente tóxico possui de provocar um efeito adverso grave, ou mesmo morte, em consequência de sua interação com o organismo, após exposição a uma única dose elevada ou a repetidas doses em curto espaço de tempo.” (ABNT, 2004, p. 2).
106 sejam expostos ao uso indiscriminado ou ainda, atuar como agente ecotóxico 127, causando dano ambiental se sofrer disposição final inadequadamente ambiental: (ABNT, 2004, p. 2). O CONAMA (1993, p. 595) por meio da Resolução 5/1993 classifica os resíduos sólidos em 04 (quatro) grupos distintos: A: resíduos que apresentam risco potencial à saúde pública e ao meio ambiente devido à presença de agentes biológicos.128; B: resíduos que apresentam risco potencial à saúde pública e ao meio ambiente devido às suas características químicas 129; C: rejeitos radioativos130; D: resíduos comuns, os demais que não se enquadram nos grupos descritos anteriormente. Os resíduos de medicamentos estão enquadrados no Grupo B. Sob esta rubrica estão as drogas utilizadas em tratamentos quimioterápicos e todos os produtos que foram por elas contaminados; os resíduos farmacêuticos, incluídos os medicamentos vencidos, aqueles que foram contaminados e tiveram suas propriedades alteradas, os que foram interditados por algum órgão competente de saúde pública e aqueles que não foram utilizados e os demais produtos considerados perigosos, constantes na classificação da NBR 10.004:2004 (tóxicos, corrosivos, inflamáveis e reativos). No art. 12 a resolução estabelece que: Os resíduos sólidos pertencentes ao grupo “B” deverão ser submetidos a tratamento e disposição final específicos, de acordo com as características de toxicidade, inflamabilidade, corrosividade e reatividade, segundo exigências do órgão ambiental competente (CONAMA, 1993, p. 3).
127 “Substâncias ou misturas que apresentem ou possam apresentar riscos para um ou vários compartimentos ambientais.” (ABNT, 2004, p. 2). 128 “Enquadram-se neste grupo, dentre outros: sangue e hemoderivados; animais usados em experimentação, bem como os materiais que tenham entrado em contato com os mesmos; excreções, secreções e líquidos orgânicos; meios de cultura; tecidos, órgãos, fetos e peças anatômicas; filtros de gases aspirados de área contaminada; resíduos advindos de área de isolamento; restos alimentares de unidade de isolamento; resíduos de laboratórios de análises clínicas; resíduos de unidades de atendimento ambulatorial; resíduos de sanitários de unidade de internação e de enfermaria e animais mortos a bordo dos meios de transporte, objeto desta Resolução. Neste grupo incluem-se, dentre outros, os objetos perfurantes ou cortantes, capazes de causar punctura ou corte, tais como lâminas de barbear, bisturi, agulhas, escalpes, vidros quebrados, etc, provenientes de estabelecimentos prestadores de serviços de saúde.” (CONAMA, 1993, p. 595). 129 “Enquadram-se neste grupo, dentre outros: a) drogas quimioterápicas e produtos por elas contaminados; b) resíduos farmacêuticos (medicamentos vencidos, contaminados, interditados ou não-utilizados); e, c) demais produtos considerados perigosos, conforme classificação da NBR-10004 da ABNT (tóxicos, corrosivos, inflamáveis e reativos).” (CONAMA, 1993, p. 595). 130 “enquadram-se neste grupo os materiais radioativos ou contaminados com radionuclídeos, provenientes de laboratórios de análises clínicas, serviços de medicina nuclear e radioterapia, segundo Resolução CNEN 6.05.” (CONAMA, 1993, p. 595).
107 A classificação eficiente de um resíduo sólido, além de ser uma obrigação legal, permite que o seu gerenciamento seja efetuado de forma efetiva. O mercado de produtos farmacêuticos é um pródigo gerador de resíduos, e as causas fundamentais para que isto ocorra se originam em não conformidades: avarias de transporte (causadas por manipulação inadequada; empilhamento máximo superado em função da colocação de outros tipos de cargas por sobre o lote, quando o mesmo já atingiu seu limite máximo; falta de treinamento das equipes que operam a carga) ausência de equipamentos de movimentação de materiais adequados; utilização de veículos que fogem ao perfil indicado pela legislação sanitária; ou acondicionamento indevido (algumas embalagens não são resistentes o suficiente para suportarem os constantes atritos que longas viagens exigem, em função das más condições das estradas brasileiras) (SILVA, 2014, p. 48). Lemos (2012, p. 88) classifica os resíduos sólidos como bens socioambientais (aqueles considerados essenciais para a manutenção da vida das espécies), e como tal, em função da relevância que teriam para a equidade intergeracional, atribuem ao possuidor e ao proprietário responsabilidades intransferíveis quanto à destinação final. Tal status se estende também aos rejeitos: resíduos que após esgotadas as alternativas de tratamento e recuperação por meio de processos tecnológicos, que sejam viáveis economicamente, não lhes resta alternativa que não seja a disposição final de forma adequada ambientalmente. “Nesse sentido, é também um bem socioambiental, de dupla titularidade” (LEMOS, 2012, p. 88), pública e privada. O direito individual se subordina ao direito coletivo, quando se trata de defesa do meio ambiente que é um direito fundamental.
2.3 Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto
As questões não resolvidas de Tchernóbil que ainda assustam os moradores da região do entorno do epicentro do reator, deixando o mundo em um estado de suspensão e insegurança constantes: Em breve a Ucrânia empreenderá uma obra de grande envergadura. Sobre o sarcófago que cobriu, em 1986, o quarto bloco destruído da
108 CEA de Tchernóbil, aparecerá um novo abrigo que será designado de 'Arca'. Da realização desse projeto participam 28 países doadores, cujas inversões iniciais de capital ultrapassam 768 milhões de dólares. Esse novo abrigo deve durar não trinta, mas cem anos. A grandiosidade da sua construção se deve à necessidade de um volume que possa dar conta dos trabalhos de sepultamento dos resíduos. Serão necessárias fundações colossais, prevendo-se a produção de material rochoso artificial feito à base de colunas e chapas de concreto armado. Em seguida, há que se preparar o depósito para onde serão trasladados os resíduos radiativos extraídos do velho sarcófago. O novo abrigo será confeccionado em aço de alta qualidade, capaz de resistir às radiações gama. Só em metal serão empregadas 18 mil toneladas. A 'Arca' será uma instalação sem precedentes na história da humanidade. Em primeiro lugar, as suas proporções surpreendem. A dupla cobertura alcançará 1509 metros de altura. Esteticamente se assemelhará à torre Eiffel (ALEKSIÉVITCH, 2016, p. 15).
O êxodo dos refugiados sírios, norte-africanos e curdos que tem deixado a Europa perplexa e sem ação; a tragédia da Samarco que devastou uma área imensa em Minas Gerais, além de ter causado a morte de um rio; a ameaça do regime da Coreia do Norte de deflagrar um conflito mundial por meio de uma suposta bomba de Hidrogênio, que faz o mundo prender a respiração; as ações de grupos terroristas como o Boko Haram e Estado Islâmico, que desrespeitam as leis mais básicas de humanitarismo; a possibilidade cada vez maior de degelo do permafrost no hemisfério Norte, com todas as variáveis ambientais, econômicas e financeiras intrínsecas: […] e risco de 'singularidades de grande escala', uma maneira complicada de dizer 'catástrofes', como o colapso dos mantos de gelo da Antártida Ocidental e da Groenlândia, uma mortandade em massa da floresta na Amazônia Central ou um degelo do subsolo permanentemente congelado do hemisfério Norte, chamado permafrost, que libere metano na atmosfera a ponto de causar um aquecimento descontrolado (ANGELO, 2016, p. 81).
Todas estas situações são classificadas como riscos, “efeito colateral sistemático do processo de modernização”, e são uma realidade cada vez mais presente no nosso cotidiano, só mudam de nome e de endereço desde que o conceito foi utilizado pela primeira vez em 1986 (BECK, 2011, p. 7-10, 33). O Princípio da Responsabilidade Compartilhada é o leitmotiv131 da Política 131 “Leitmotiv vem do alemão: motivo condutor ou motivo de ligação, e é um termo composto, uma expressão idiomática para conceituar qualquer causa lógica conexiva entre dois ou mais entes quaisquer”. (WEGNER, 2001, p. 46)
109 Nacional de Resíduos Sólidos e perpassa por toda a Lei, bem como por seu Regulamento. Suas raízes conceituais estão fincadas na nova cultura jurídica do direito ambiental (justiça ambiental) no contexto da sociedade de risco.
2.3.1 Responsabilidade Compartilhada
Ulrich Beck (2011, p. 7), sociólogo alemão, traça a gênese da sociedade de risco desde a revolução industrial do século XVIII, que foi seu embrião. Este fenômeno está provocando uma ruptura histórica: a modernidade (também chamada por alguns estudiosos como pós-modernidade) está em processo de reconfiguração. Durante a fase de transição da sociedade agrária e feudal para a sociedade tecnológica e industrial ocorreu uma ruptura histórica também, quando aquela sociedade se extinguiu, entretanto, essa ruptura que está sendo vivenciada no início do século XXI não representa o fim da sociedade moderna. Este momento vivido pela humanidade é um momento de transformação, metamorfose profunda, da sociedade industrial clássica, caracterizada pela produção, avanços científicos, pesquisas espaciais, inovação tecnológica e a distribuição não igualitária de riquezas, para uma sociedade denominada sociedade “industrial” de risco. A produção social da riqueza na modernidade é acompanhada por uma produção social dos riscos (ROBALINHO, 2014, p.53). O conceito de risco é complexo (no sentido semântico do termo: “entretecido junto”), por se tratar de uma representação do perigo, ele encerra em si não apenas o perigo potencial, mas também a percepção deste perigo, visto que os efeitos dessa transição da fase de risco para a fase de perigo, podem já ser percebidos (ROBALINHO, 2014, p.53). Um ponto fundamental para a compreensão do fenômeno é que o risco é uma construção antrópica: “[…] é um conceito moderno, ele pressupõe decisões humanas, futuros humanamente produzidos.”(Grifos do autor) (BECK, 2011, p. 362), além de ser antecipação e análise de cenários futuros: “risco não significa catástrofe; significa antecipação da catástrofe. Os riscos consistem em encenar o futuro no
110 presente, ao passo que o futuro das futuras catástrofes é em princípio desconhecido” (BECK, 2011, p. 362). A sociedade pós-moderna consegue controlar alguns dos riscos que produziu, porém outros escapam ao controle ou neutralizam as ações e os mecanismos de controle típicos da sociedade industrial. Esta ascensão da sociedade de risco como modelo teórico marca a falência, não o desaparecimento, da modernidade, à medida que as ameaças produzidas ao longo da sociedade industrial começam a tomar forma e se concretizam (MORATO LEITE; BELCHIOR, 2012, p. 15). A sociedade de risco é aquela que pode sofrer a qualquer momento as consequências de uma catástrofe ambiental e uma convulsão social, em função de: contínuo crescimento econômico; explosão demográfica; avanços tecnológicos e científicos; questões raciais e étnicas cada vez mais acirradas e não solucionáveis; recrudescimento do fascismo, quebra da legalidade e do estado de direito; explosão do consumo; dependência de combustíveis fósseis para transporte urbano; conflitos políticos e religiosos de origem indiscerníveis; êxodo moderno de refugiados; ameaças terroristas; uso de armas químicas em zonas de guerra civil; ameaça de um conflito atômico mundial de alcance global; mudanças climáticas de forma radical; etc. (BECK, 2011, p. 7). Estes riscos potenciais, que podem se transformar em perigos reais, estão numa escala evolutiva ascendente, acirrando os problemas já existentes e permitindo o surgimento de problemas com alto grau de variabilidade. Além disso, constata-se que a evolução concomitante da sociedade (da sociedade industrial para a sociedade de risco, da modernidade simples para a modernidade reflexiva), não está sendo acompanhada pelos mecanismos jurídicos de solução e responsabilização dos problemas dessa nova sociedade, estes têm encontrado dificuldade em se adequar a esta nova realidade (BECK, 2011, p. 7-10). “A sociedade de risco é uma sociedade catastrófica. Nela, o estado de exceção ameaça converter-se em normalidade” (BECK, 2011, p. 28). Esta sociedade de risco é um mundo de incertezas fabricadas, através de inovações tecnológicas e científicas e respostas sociais mais aceleradas, produzindo um novo cenário de risco global, de incertezas não quantificáveis quanto às consequências das atividades e tecnologias empregadas no processo econômico.
111 A evolução tecnológica desta sociedade não a habilita a prever e controlar os riscos que ela mesma contribuiu decisivamente para criar, riscos que potencialmente podem gerar danos ambientais, sociais e de saúde pública irreversíveis. Tais consequências, intrínsecas ao modelo de desenvolvimento vigente, não são descobertas dentro do espaço-tempo que permita serem evitadas ou minimizadas. A sociedade de risco deslocou a sociedade industrial do lugar que ocupava definitivamente (BECK, 2011, p. 7-10; GUIVANT, 2001, p. 95). Este agravamento dos riscos, mormente os ambientais, está diretamente ligado às escolhas com respeito à forma de aplicação do conhecimento técnicocientífico no processo produtivo, dai Demajorovic (2013, p. 35) constata: […] as catástrofes e os danos ao meio ambiente não são surpresas ou acontecimentos inesperados, e sim consequências inerentes da modernidade, que mostram, acima de tudo, a incapacidade do conhecimento construído no século XX de controlar os efeitos gerados pelo desenvolvimento industrial.
A questão central, então, é aplicar técnicas, formas simbólicas, meios de comunicação de massa, que permitam a visualização de cenários futuros alternativos, com base nos dados do presente, do contrário os riscos perderão a relevância: “se a destruição e o desastre forem antecipados, isso pode gerar uma pressão para agir. A construção social de uma antecipação 'real' de catástrofes futuras no presente pode se tornar uma força política que transforme o mundo.” (BECK, 2011, p. 362). Enquanto a sociedade industrial era caracterizada pela lógica da produção de e distribuição de bens (o desenvolvimento tecnológico representava uma solução aos problemas do homem relacionados à produtividade, saúde e escassez) e pelos conflitos em relação à produção e distribuição de riqueza, a sociedade de riscos é caracterizada pela produção de bens (que é solução e também problema) e de riscos e os conflitos inerentes em torno dessa produção e distribuição de riscos. Os riscos na iminência de se tornarem perigos, obedecem a uma nova lógica distributiva:
são
mais
democráticos
e
globalizados,
distribuindo-se
indiscriminadamente de forma equalizada e equânime. A distribuição destes “novos” riscos não obedeceria à lógica da modernidade, que distinguia entre pobres e ricos. Nenhum país, nenhuma sociedade, nenhuma classe social, nenhuma ordem
112 econômica estaria totalmente imune às ameaças produzidas e agravadas pelo progresso tecnológico e científico. Algumas classes sociais podem ser afetadas por alguns desses riscos num grau mais intenso, em função de não ter acesso a recursos, porém, estas ameaças não são compreendidas como situações de classe (o que era típico da sociedade industrial clássica). Estes ricos se apresentam de forma real e irreal, por efetuarem a ligação dos danos e perigos históricos, que já aconteceram, a riscos abstratos, que ainda estão por se tornar realidade (ROBALINHO, 2014, p.54). O novo paradigma da sociedade de risco, que busca responder à questão de como equacionar a distribuição de riscos de forma desigual e ao mesmo tempo legítima e questionado por Beck (2011, p. 24): Como é possível que as ameaças e riscos sistematicamente coproduzidos no processo tardio de modernização sejam evitados, minimizados, dramatizados, canalizados e, quando vindos à luz sob a forma de “efeitos colaterais latentes”, isolados e redistribuídos de modo tal que não comprometam o processo de modernização e nem as fronteiras do que é (ecológica, medicinal, psicológica ou socialmente) “aceitável”?
A universalidade dos riscos, uma nova lógica social, é também uma ação reflexiva: o homem passa a sofrer as consequências de suas próprias decisões e escolhas e tais consequências não são, em sua grande maioria, restrita àqueles que as produziram ou contribuíram para produzir. A propagação dos riscos pode ser em escala global, ainda que tenham sido causados por decisões particulares e terem sido criados localmente. “Torna-se claro nesse caso, que a Terra se transformou num assento ejetável, que não mais reconhece diferenças entre pobre e rico, branco e preto, sul e norte, leste e oeste” (BECK, 2011, p. 45). As sociedades modernas foram abaladas em seus fundamentos, crenças, expectativas e planos pela antecipação da catástrofe global (aquecimento global, desastres nucleares, escassez de alimentos e água, ameaça terrorista, etc.), que proporcionou a geração de percepções em âmbito global de risco e incerteza, estas se caracterizam como: a) deslocalização – as causas e consequências dos riscos não se limitam a um local ou espaço geográfico, seriam onipresentes e ubíquas; b) incalculabilidade – as consequências dos riscos são incalculáveis, em virtude de, em sua maioria, serem virtuais ou hipotéticos, baseados em incógnitas científicas e
113 dissensos normativos; c) não-compensabilidade – a modernidade acreditava utopicamente na ciência, crendo que poderia colocar os perigos da decisão e as suas inevitáveis e arriscadas consequência sob monitoramento e controlá-los (BECK, 2011, p. 363). Esperava-se que o avanço tecnológico pudesse evidenciar que esta sociedade exerce controle reflexivo, porém, a sociedade de risco simboliza uma era de descontrole, pelo fato dos grandes riscos civilizatórios, que podem causar a exterminação, escaparem à percepção (ROBALINHO, 2014, p. 54). O elemento central das ações no mundo é o próprio ser humano, que passaria a ter então um elevado nível de responsabilidade quanto à exposição aos perigos e seriam gestores de sua própria carga de riscos, ainda que também produtores dessa mesma carga: “os riscos da modernidade cedo ou tarde acabam alcançando aqueles que os produziram ou lucram com eles” (BECK, 2011, p. 27). Beck (2011, p. 60) então preconiza como se dará as relações dentro da sociedade de risco, no que tange à responsabilização pelos danos ambientais: “O sonho da sociedade de classes é: todos querem e devem compartilhar do bolo. A meta da sociedade de risco é: todos devem ser poupados do veneno” (Grifos do autor). A superação do risco não pode se tornar a “cosmética do risco”, com soluções superficiais, ineficientes, parciais e aparentes que não abordem a causa raiz: “[..] embalagens, mitigações sintomáticas da poluição, instalação de filtros purificadores ao mesmo tempo em que se mantém as fontes poluidoras” (BECK, 2001, p. 68). Essa consciência do risco global permite o surgimento de outra modernidade, uma modernidade alternativa, ou modernidades alternativas e plurais. Por meio dessas “modernidades” surgiria então uma cultura civil de responsabilidade transfronteiriça e transnacional com capacidade de superar os conflitos geopolíticos. Este espaço moral e político para o surgimento dessa cultura seria propiciado pela ameaça dos riscos globais: “a experiência traumática de que todos são vulneráveis e a decorrente responsabilidade pelos outros, até para sua própria sobrevivência, são os dois lados da crença no risco mundial.” (BECK, 2011, p. 364). E as soluções que forem estruturadas para minimizar ou erradicar os efeitos devem partir de decisões governamentais integradas, os Estados necessitam
114 cooperar-se mutuamente, os riscos quando transformados em perigos não respeitam fronteiras geopolíticas e nem a solução pode ser aplicada apenas de um lado da fronteira (ROBALINHO, 2014, p. 54). Esta sociedade demanda que o Estado e o Direito efetuem transformações reflexivas para que os impactos da crise ambiental sejam minimizados, com a devida atribuição de responsabilidades, e as dimensões dos riscos controladas. Estas mudanças são prementes e urgentes, uma vez que a sociedade de risco não lida apenas com o risco certo e em potencial, tem diante de si o desafio de gerir riscos imprevisíveis e abstratos, em virtude das incertezas científicas da atualidade (MORATO LEITE; BELCHIOR, 2012, p. 13). Beck (2011, p. 364) aponta para o que nomeia de “irresponsabilidade organizada”,
quando
o
Estado
e
os
setores
empresariais
interessados,
deliberadamente, utilizam-se de meios e de instrumentos para ocultar as origens e as consequências do risco ambiental, com o objetivo de minimizar os efeitos e transmitir para a sociedade uma falsa ideia de que o risco ecológico estaria controlado, é a invisibilidade do risco ecológico. Esta irresponsabilidade é só mais um dos agravantes enfrentados pela sociedade de risco, que vivencia uma degradação ambiental crescente e irreversível, uma expansão da justiça ambiental e o aumento dos conjuntos de leis reguladoras, ao mesmo tempo que nenhum indivíduo ou instituição são responsabilizados por nada (BAHIA, 2012, p. 60; MORATO LEITE; BELCHIOR, 2012, p. 16). A responsabilidade civil no âmbito da justiça ambiental que é o fundamento da responsabilidade compartilhada, tem como pilares: o dano, pois sem ele não há objeto a ser reparado; a ação culposa do autor, que poderia ter evitado o resultado; e o nexo causal, que é o liame existente entre a conduta do agente e a consequência danosa, o que gera a obrigação de indenizar. O ordenamento jurídico brasileiro tem adotado como regra a responsabilidade objetiva, que permite que, ao constatar o nexo de causalidade entre o dano e a ação do agente, este será responsabilizado independentemente da culpa (CF art. 225, § 3º) não se faz necessária a comprovação de culpa do agente degradador, por conta do risco da atividade exercida (MORATO LEITE; BELCHIOR, 2012, p. 26).
115 Lemos (2012, p. 148) observa que as Cortes Europeias, sob a rubrica da socialização dos riscos e como forma de aplicar a proteção imediata à vítima do dano ou ao meio ambiente degradado, já dispensam totalmente a prova de qualquer liame de causalidade entre o dano causado e o agente causador, postergando as discussões jurídicas cabíveis entre o causador do dano e aquele que for obrigado a pagar a indenização para eventual ação regressiva.
2.3.2 Ciclo de Vida do Produto
“Todo produto ou processo resulta, em maior ou menor medida, em impacto sobre o meio ambiente” (XAVIER; CORREA, 2013, p. 149). A metodologia da Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) foi desenvolvida partindo desta premissa, com o objetivo de definir o perfil e o grau de adequação ou impacto ambiental dos produtos ou processos de um sistema (ACBV). Esta metodologia propõe uma mudança de paradigmas: a análise de um processo ou produto por meio de uma visão sistêmica que considere os subsistemas que fazem parte das respectivas cadeias de valor. As inter-relações de subordinação destes sistemas são preservadas, de maneira que a compreensão do “todo” seja possível, assim como a identificação de pontos críticos em seus subsistemas, processos e fluxos. Esta análise abrangente que será efetuada, norteará as principais ações no sentido de reduzir ou mitigar os danos ao meio ambiente e à saúde humana – (ABCV; XAVIER; CORREA, 2013, p. 149). Esta visão sistêmica permite a identificação de etapas com maior potencial de impacto, sem que os detalhes de cada etapa ou processo sejam desprezados, Xavier e Correa (2013, p. 149) observam que: A gama possível de diferentes processos produtivos e produtos existentes não permite a definição de soluções padronizadas que sejam aplicáveis a todos os casos. A Avaliação de Ciclo de Vida (ACV) trabalha com uma visão ampla e integrada de todas as etapas da vida útil de um produto, avaliando o impacto da extração, composição e processamento dos materiais, consumo energético e gestão dos resíduos.
116 A visão sistêmica da ACV pela ótica do ecodesign132 pode ser compreendida como: “Considerar o ciclo de vida quer dizer adotar uma visão sistêmica de produto, para analisar o conjunto dos inputs e outputs de todas as fases, com a finalidade de avaliar as consequências ambientais, econômicas e sociais” (MANZINI; VEZZOLI, 2011, p. 92). Esta visão deve orientar todas as decisões que deverão ser tomadas desde a fase de projeto do desenvolvimento de produtos e embalagens. A primeira investigação sistemática que pode ser compreendida como uma aplicação da ACV foi realizada em 1965 nos Estados Unidos pela Coca-Cola. Tinha como objetivo identificar qual o tipo e o formato de embalagem para refrigerantes teriam as menores emissões e seriam mais eficientes, utilizando menos recursos em sua fabricação. O relatório final apresentou um inventário das matérias-primas, dos combustíveis utilizados e das cargas ambientais em cada etapa do processo produtivo de cada embalagem e ficou conhecido como REPA (Resource and Environmental Profile Analysis) (ABCV). A metodologia da ACV é um processo de conscientização da condição sistêmica e relacional das atividades produtivas entre si, e, sobretudo, com o meio ambiente e quais os níveis ou graus dos impactos ambientais que causam, buscando prover ações que minimizem a degradação. Seguindo seis marcos teóricos: a) o impacto ecológico das matérias-primas e a energia usada na produção, incluindo a extração, transporte e os resíduos; b) o processo de fabricação e montagem; c) os sistemas de transporte e distribuição; d) aspectos ambientais relacionados com o uso do produto; e) o potencial do produto para ser reutilizado e reciclado; f) os aspectos ambientais relacionados com a disposição final do produto (ABCV; MOTTA, 2013). Manzini e Vezzoli (2011, p. 96) consideram cinco fases principais que aglutinam sub-fases: pré-produção; produção; distribuição; uso; descarte. Motta (MOTTA, 2013) descreve 07 (sete) etapas que julga as principais para serem
analisadas: […] uma avaliação que inclui o ciclo de vida completo do produto, processo ou serviço, partindo da extração e processamento das matérias-primas (berço), a fabricação, o transporte e a distribuição, 132 “Ecodesign é um modelo 'projetual' ou de projeto (design), orientado por critérios ecológicos. […] sintetiza um vasto conjunto de atividades projetuais que tendem a enfrentar os temos postos pela questão ambiental partindo do ponto inicial, isto é, do redesenho dos próprios produtos.” (MANZINI; VEZZOLI, 2011, p. 17).
117 assim como o uso final do produto/serviço e sua disposição final (túmulo).
A ACV também é uma ferramenta multidisciplinar que abrange várias áreas do conhecimento, busca medir os fluxos de matéria e energia envolvidos no ciclo de vida de um bem, que é bem mais amplo do que o ciclo mercadológico 133, e relacionálos às diversas categorias de impactos ambientais. Desta forma, é possível compreender quais danos ou benefícios, se houverem, a fabricação, o uso e o descarte deste bem trazem ao meio ambiente. A metodologia para ser efetiva precisa ser multicritério, dedicar-se a muitas categorias de impacto ao mesmo tempo. Xavier e Correa (2013, p. 149) sintetizam: “[…] a ACV consiste na análise de um sistema por meio da avaliação das entradas, saídas e dos impactos ambientais potenciais ao longo da ciclo de vida de um produto”. A escala da ACV pode ser local ou global e podem ser avaliados tanto impactos reais (diagnóstico, risco histórico) quanto potenciais (prognóstico, antecipação do risco). É uma metodologia essencialmente quantitativa, os resultados são apresentados através de números que refletem as categorias de impacto e efetuam, inclusive, comparações entre produtos semelhantes. Permitindo identificar os pontos críticos no ciclo de vida do produto e assim sugerir melhorias pontuais, sem perder a visão global, nos processos produtivos (ABCV). A Society of Envirommental Toxicology and Chemistry (Sociedade de Toxicologia e Química Ambiental) define o programa de avaliação do ciclo de vida como um processo objetivo que tem por finalidade avaliar as cargas ambientais (pegada ecológica) associadas a um bem, serviço ou processo. Identificando e quantificando os impactos gerados em cada etapa ou elo da cadeia de valor quanto ao uso de energia, matéria-prima e emissões ambientais. Buscando enxergar oportunidades de melhoria no processo total, não apenas numa fase localizada (MOTTA, 2013).
A metodologia adotada por Manzini e Vezzoli (2011, p. 91) preocupa-se principalmente com as trocas (input e output) que são efetuadas entre os conjuntos 133 “Esse tipo de ciclo não se confunde com o ciclo mercadológico, pelo qual um dado produto segue um ciclo desde a sua introdução no mercado (nascimento) até sua retirada do mercado (morte), passando por crescimento da demanda, maturidade e declínio.” (GUARNIERI, 2011, p. 65).
118 de processos que acompanham o “nascimento”, “vida”, e a “morte” de um produto e o meio ambiente. É efetuada uma interpretação dos fluxos das atividades do produto (matéria, energia e emissão) durante toda a vida do mesmo (cada processo ou atividade absorve uma certa quantidade de matéria e de energia, efetuando uma gama de transformações e liberando emissões de diversas ordens). São consideradas todas as etapas e fases de um produto ainda na fase de concepção do projeto: a extração dos recursos necessários para a produção dos materiais que o compõem [“nascimento”] até o “último testamento” [morte] desses materiais e, até mesmo, depois que não são mais úteis, a disposição final. Manzini e Vezzoli (2011, p. 93) descrevem as cinco fases, “momentos fundamentais”, que devem ser consideradas: Pré-produção – esta fase é a de produção das matérias-primas semielaboradas que serão utilizadas para produzir os componentes. Os momentos que requerem atenção não dividida nesta fase são: a) aquisição dos recursos – que podem ser primários renováveis 134 e não renováveis135 (recursos virgens) ou secundários (recursos reciclados136, estes recursos são recuperáveis em dois momentos: pré-consumo137; pós-consumo138); b) transporte dos recursos do lugar da aquisição ao da produção; c) transformação dos recursos em material e energia. Produção – produção propriamente dita, com a utilização dos componentes que foram fabricados na fase anterior. Momentos fundamentais desta fase: a) transformação dos materiais; b) montagem; c) acabamento. Ainda são atribuíveis a esta fase as atividades e processos de: pesquisa; o desenvolvimento; projeto; controles produtivos; e ainda, a gestão dessa atividade; Distribuição – a fase em que o produto é deslocado da planta fabril para distribuidores, comércio varejista, atacadista ou consumidor final, ou ainda, para ser inserido em outro processo produtivo, destacam-se: a) embalagem; b) transporte; c) armazenagem. Não apenas os consumos e a energia gasta durante o transporte 134 “[…] as biomassas, são cultivados e depois colhidos.” (MANZINI; VEZZOLI, 2011, p. 93) 135 “são extraídos do solo”. (MANZINI; VEZZOLI, 2011, p. 93) 136 “[…] provêm dos descartes e dos refugos dos processos produtivos e das atividades de consumo.”(MANZINI; VEZZOLI, 2011, p. 93) 137 “[…] são constituídos de descartes, refugos, ou excedentes gerados durante a produção.” (MANZINI; VEZZOLI, 2011, p. 94). 138 “[…] são os materiais provenientes dos produtos e das embalagens depois de terem passado pelas mãos dos consumidores finais.” (MANZINI; VEZZOLI, 2011, p. 93)
119 devem ser considerados, mas também o uso dos recursos para a produção dos próprios meios de transporte utilizados, além da própria estrutura de estocagem ou armazenamento; A figura 4 resume o conjunto das possíveis relações físicas e químicas em relação à biosfera (a parte externa da superfície terrestre na qual subsistem as condições indispensáveis à vida animal e vegetal) e a geosfera (o conjunto das terras e águas);
Figura 4: Ciclo de Vida do sistema-produto Fonte: Manzini e Vezzoli (2011, p. 91)
Uso – a fase em que o bem é usado por um certo período de tempo, ou, por suas próprias características, é consumido. Momentos fundamentais: a) uso ou consumo – em muitos casos o uso de um produto absorve recursos materiais e energéticos para o seu funcionamento e produz consequentemente resíduos e refugos; b) serviço – alguns produtos podem requerer atividades de serviços, reparos e manutenção do seu funcionamento, de reparação de possíveis danos ou
120 mesmo a substituição de partes ultrapassadas. O produto será utilizado até que sofra descarte definitivamente; Descarte – o produto chega ao fim da vida útil. Fases em destaque: a) recuperação da funcionalidade do produto ou de qualquer componente – reutilização ou remanufatura; b) valorização das condições do material empregado ou o conteúdo energético do produto – reciclagem (anel aberto ou fechado 139), compostagem ou incineração; c) não recuperação do produto ou de seus componentes – disposição final ambientalmente adequada. Outra metodologia bastante aceita é a que é regulamentada por meio da série de normas da International Organization for Standartization(ISO)140. A ISO 14040, define os parâmetros e determina a estrutura, os princípios, os requisitos, as diretrizes e as práticas gerais que devem constar em um estudo ACV. No Brasil a ACV é regulamentada e padronizada pela norma ABNT NBR ISO 14040 de 2001. (MOTTA, 2013)141. Um estudo e programa ACV se caracteriza pelo alto grau de iteração entre suas quatro fases: – A Definição de Objetivo e Escopo (ISO 14041:2004): a fase de definição dos objetivos e do escopo142 é o momento em que se determinam as fronteiras do estudo (tempo-espaço), destinatários dos resultados, os critérios e os indicadores de qualidade, as regras de corte (estabelecimento de limites) e as categorias de impacto a serem consideradas, fase de calibração do sistema e parametrização. “O objetivo de um estudo da ACV deve declarar inequivocamente a aplicação pretendida, as razões para conduzir o estudo e o público-alvo, isto é, para quem se pretende comunicar os resultados do estudo.” (ABNT, 2001, p. 5); 139 Uma variação nominal para os termos “ciclo aberto e fechado”. 140 Organização Internacional para Padronização 141 Estas foram substituídas pela ISO 14040:2009, tendo ainda a ISO 14044:2009, gestão ambiental – avaliação do ciclo de vida – requisitos e orientações. 142 “Na definição do escopo de um estudo da ACV devem ser considerados e claramente descritos os seguintes itens: - as funções do sistema de produto ou, no caso de estudos comparativos, dos sistemas; - a unidade funcional; - o sistema de produto a ser estudado; - as fronteiras do sistema de produto; - procedimentos de alocação; - tipos de impacto e metodologia de avaliação de impacto e interpretação subsequente a ser usada; - requisitos dos dados; - suposições; - limitações; - requisitos da qualidade dos dados iniciais; - tipo de análise crítica, se aplicável; e – tipo e formato do relatório requerido para o estudo. Convém que o escopo seja suficientemente bem definido para assegurar que a extensão, a profundidade e o grau de detalhe do estudo sejam compatíveis e suficientes para atender o objetivo estabelecido. A ACV é uma técnica iterativa. Portanto, o escopo do estudo pode necessitar de modificação enquanto o estudo estiver sendo conduzido, quando informações adicionais forem coletadas.” (ABNT, 2001, p. 5).
121 A figura 5 permite que se tenha uma visão geral dessas correlações:
Figura 5: Estrutura da Avaliação do Ciclo de Vida Fonte: Norma ABNT NBR 14040:2001
– Análise de Inventários (ISO 14041:2004): a análise consiste na obtenção de informações referentes aos fluxos de massa e energia (quantidades e tipos de matérias-primas, energia, água, resíduos, emissões e outros impactos ambientais) que constituem as diversas etapas do ciclo de vida do produto, além dos procedimentos de cálculo para quantificá-los, dentro das áreas limítrofes estabelecidas na fase anterior143(ABNT, 2001, p. 5); – Avaliação de Impactos (ISO 14042:2004): é uma análise técnica e quantitativa na qual se valora e avalia os dados obtidos durante a fase de inventário, possibilitando que o impacto real causado seja determinado. Os fluxos definidos no inventário
(os descartes gerados nos diferentes processos: as emissões
atmosféricas; a geração de efluentes e resíduos sólidos; o consumo de energia e de matérias-primas; e a disposição dos produtos) são convertidos em impactos 143 “Análise do inventário envolve a coleta de dados e procedimentos de cálculo para quantificar as entradas e saídas pertinentes de um sistema de produto. Estas entradas e saídas podem incluir o uso de recursos e liberações no ar, na água e no solo associados com o sistema. Podem ser feitas interpretações destes dados, dependendo dos objetivos e do escopo da ACV. Estes dados também constituem a entrada para a avaliação do impacto do ciclo de vida. O processo de condução de uma análise do inventário é iterativo. Na medida em que os dados são coletados e é conhecido mais sobre o sistema, podem ser identificados novos requisitos ou limitações para os dados que requeiram uma mudança nos procedimentos de coleta de dados, de forma que os objetivos do estudo ainda sejam alcançados. Às vezes, podem ser identificadas questões que requeiram revisões de objetivo ou do escopo do estudo.” (ABNT, 2001, p. 7).
122 ambientais através da multiplicação dos valores brutos por fatores de equivalência que remetem a resultados em unidades comuns, como por exemplo, kg de CO2 equivalentes para a categoria de aquecimento global 144 (ACBV; XAVIER; CORREA, 2013, p. 150). – Interpretação (ISO 14043:2004): aquilo que foi constatado pela análise do inventário e pela avaliação de impacto (no caso de estudo de inventário do ciclo de vida, somente os resultados da análise de inventário), são cotejados, “colados” e combinados com o que tinha sido definido previamente no objetivo e no escopo. São apontados os impactos causados pelos diferentes processos existentes durante todo o ciclo de vida. Busca-se então, identificar as questões significativas do estudo, checar a integridade dos dados, a sensibilidade e a consistência dos resultados e definir as conclusões, as limitações e apontar recomendações do estudo (que podem se o redesenho do produto ou processo, a substituição de insumos, a gestão eficiente de resíduos, o tamanho do produto, a forma da embalagem, etc. (ACBV; MOTTA, 2013)145. A metodologia ACV quando aplicada à elaboração de mecanismos legais e normativos que regulamentem o processo produtivo, a gestão de produtos, extração de insumos, resíduos, o consumo e a disposição final dos rejeitos requer que a visão sistêmica e multidisciplinar seja empreendida, para que estas normas e mecanismos legais sejam de fato efetivas no atendimento das necessidades da sociedade. Sem a visão sistêmica é impossível identificar, analisar e modificar etapas ou 144 “A fase de avaliação do impacto da ACV é dirigida à avaliação da significância de impactos ambientais potenciais, usando os resultados da análise de inventário do ciclo de vida. Em geral, este processo envolve a associação de dados de inventário com impactos ambientais específicos e a tentativa de compreender estes impactos. O nível de detalhe, a escolha dos impactos avaliados e as metodologias usadas dependem do objetivo e do escopo do estudo. Esta avaliação pode incluir o processo iterativo de análise crítica do objetivo e do escopo do estudo da ACV, para determinar quando os objetivos do estudo foram alcançados ou modificar o objetivo e o escopo, se a avaliação indicar que eles não podem ser alcançados. A fase de avaliação de impacto pode incluir, entre outros, elementos como: - correlação de dados de inventário por categorias de impacto (classificação); - modelagem dos dados de inventário dentro das categorias de impacto (caracterização); - possível agregação dos resultados em casos muito específicos e somente quando significativos (ponderação).” (ABNT, 2001, pg. 7). 145 “As constatações desta interpretação podem tomar a forma de conclusões e recomendações para os tomadores de decisão, de forma consistente com o objetivo e o escopo do estudo. A fase de interpretação pode envolver o processo iterativo de análise crítica e revisão do escopo da ACV, assim como da natureza e da qualidade dos dados coletados de forma consistente com o objetivo definido. Convém que as constatações da fase de interpretação reflitam os resultados de qualquer análise de sensibilidade que seja realizada. Embora decisões e ações subseqüentes possam incorporar implicações ambientais identificadas nas constatações da interpretação, elas ficam além do escopo do estudo da ACV, uma vez que outros fatores, como desempenho técnico, aspectos econômicos e sociais, também são considerados.” (ABNT, 2001, pg. 7).
123 processos que não são eficientes ou que tem contribuição com os impactos ambientais maiores. As trocas compensatórias (tradeoffs) não podem ser efetuados. Os interesses sociais, ambientais, políticos e econômicos têm que ser visualizados quando do planejamento do processo sistêmico de redução no uso de energia e extração de materiais, no consumo e no descarte dos resíduos (XAVIER; CORREA, 2013, p. 150). Dentre as muitas aplicações possíveis para a ACV, algumas de destacam: desenvolvimento de produtos; escolha de tecnologias; identificação da fase do ciclo de vida em que ocorrem os impactos mais significativos; seleção de indicadores ambientais relevantes para a avaliação de projetos; e reformulação de produtos ou processo (XAVIER; CORREA, 2013, p. 150). Guarnieri (2011, p. 68) observa que esta metodologia tem uma estreita correlação com a logística reversa, posto que esta, torna viável a aplicação do modelo da ACV ao operacionalizar parte significativa do que a metodologia propõe: “[…] o retorno dos resíduos gerados nos processos produtivos e de vendas ao ciclo produtivo e/ou de negócios, analisando e implementando práticas que contribuam para revalorização dos mesmos e preservação ao meio ambiente”. Razzolini Filho e Berté (2009, p. 81) apontam quais as questões da ACV que a logística reversa pode responder: “Como estruturar o processo de coleta dos materiais a serem reciclados/recuperados? Qual a forma (modal) de transporte será utilizada para o transporte? Como será feita a destinação final pós-consumo?”. Braungart e McDonough (2013, p. 103) criticam a visão ainda limitada da ACV por se ater ao ciclo do berço ao túmulo (cradle to grave), propõem que a visão seja do berço ao berço (cradle to cradle): O que teria acontecido, às vezes nos perguntamos, se a Revolução Industrial tivesse ocorrido em sociedades que enfatizassem a comunidade em vez do indivíduo e nas quais as pessoas não acreditassem em um ciclo de vida cradle to grave, mas na reencarnação?
Rozenfeld (1989) descreve os momentos fundamentais do ciclo de vida no processo produtivo dos medicamentos: a) gestação é o período que se inicia com a concepção de uma nova entidade terapêutica no interior dos laboratórios e centros de pesquisa; b) nascimento de um novo produto, no momento em que os fabricantes
124 apresentam ao órgão gestor da Anvisa (DIMED) a documentação referente aos estudos deste novo produto e recebem autorização para comercializá-lo; e c) vida útil do medicamento corresponde ao período durante o qual ele é comercializado. Estes estudos apresentados devem assegurar que o produto oferece condições de segurança e eficácia aceitáveis e comprovadas, e devem cobrir as etapas previstas em lei: ensaios em animais, ensaios clínicos em grupos de pessoas sadias e posteriormente em grupos de pessoas que apresentaram alguma doença. Os estudos clínicos são baseados em ensaios controlados 146 e duplo cego147. As pesquisas são efetuadas com pequenos grupos de pacientes com rigoroso controle médico, sem a presença de qualquer paciente de risco e em curtos períodos de tempo. Hiratuka (2009, p. 66) apresenta o ciclo de vida da cadeia 148 estruturado em quatro
estágios
evolutivos:
pesquisa
e
desenvolvimento 149;
produção
de
farmoquímicos150; produção de especialidades farmacêuticas 151; marketing e comercialização das especialidades farmacêuticas 152. No que tange à apresentação dos medicamentos, estes podem ser encontrados na forma sólida, líquida, semissólida e gasosa. Quanto à validade dos mesmos, em média 80% dos 146 “Devem ser controlados no sentido de submeter o novo produto a comparação com outros produtos já conhecidos ou então com placebo, para que se possa provar que ele é mais eficaz do que o produto já empregado ou, no caso de placebo, para provar que ele é melhor do que se não houvesse havido qualquer intervenção, isto é, se estivéssemos diante da possibilidade de cura espontânea.”. (ROZENFELD, 1989). 147 “[…] nem o médico, nem o paciente devem saber o que está sendo administrado, se a substância ativa, se o placebo. Esta medida visa assegurar que nem o comportamento do médico, nem o do paciente interferirão nos resultados. Devem-se ademais evitar os erros casuais e os erros sistemáticos.” (ROZENFELD, 1989). 148 “[…] a cadeia produtiva farmacêutica é formada pela etapa química e pela etapa farmacêutica. Na primeira etapa os aditivos e os fármacos são sintetizados; já na etapa farmacêutica o medicamento final é produzido. Na síntese química, diversos produtos purificados são fabricados com a utilização de insumos gerados na indústria química básica. Tais produtos purificados gerados classificam-se como: 1) intermediários de síntese, que são intermediários derivados da síntese do princípio ativo e 2) intermediários de uso, que são os princípios ativos finais que serão usados na produção do medicamento.” (HIRATUKA, 2009, p. 66). 149 “Nessa primeira etapa da cadeia produtiva, o que se pretende é conhecer a fundo uma doença, pesquisá-la no nível molecular para, então, testá-las. Em seguida, são realizadas fases pré-clínicas nas quais são selecionadas as moléculas mais propicias, testadas em animais e, posteriormente, são realizados os testes em seres humanos, nas fases clínicas da cadeia. Após o término dos testes, os resultados são inspecionados pelo órgão regulador e caso eles sejam aprovados, os medicamentos já podem ser comercializados com exclusividade.” (HIRATUKA, 2009, p. 66). 150 “A segunda etapa está relacionada com a linha de produção de farmoquímicos. Esta etapa possui vários outros estágios que geram um produto intermediário. O que se produz no fim dessa etapa é o próprio fármaco” (HIRATUKA, 2009, p. 66). 151 “[…] se refere à produção das especialidades farmacêuticas para comercialização no mercado” (HIRATUKA, 2009, p. 66). 152 “[…] diz respeito ao marketing e as vendas dos medicamentos, voltadas principalmente aos médicos”(HIRATUKA, 2009, p. 66).
125 medicamentos tem validade de dois anos, 13% tem validade de três anos e 7% tem outros prazos de validade.
2.4 Logística Reversa
A prática da logística é milenar, mormente no contexto militar, e a história está repleta de exemplos de cadeias de suprimentos que foram eficientes e contribuíram para moldar o curso da experiência humana: o desenvolvimento náutico dos fenícios; as imensas construções dos egípcios; a trajetória dos hebreus por mais de 40 anos através de regiões desérticas (segundo o relato bíblico no Êxodo); a administração maia, asteca, persa e helênica ultrapassando cadeias de montanhas; e o auge da integração do mundo por meio de Roma. Há também na história fartos exemplos de ausência de cadeias de suprimentos ou cadeias ineficientes, que também contribuíram para a derrocada de impérios: Alexandre, o Grande, Gêngis Khan, Napoleão Bonaparte153 são talvez os mais conhecidos (GRANT, 2013, p. 6). Nos tempos modernos percebe-se que esta atividade ficou atrelada às atividades militares até meados do século XX (as derrocadas de Napoleão e do eficiente exército alemão na Segunda Guerra Mundial nas estepes geladas russas foram possíveis em função de decisões logísticas equivocadas). O desembarque da Normandia em 06 de junho de 1944 e a Operação Tempestade no Deserto em janeiro de 1991 são consideradas as maiores e mais complexas operações de logística da história. Após este período o mundo corporativo apercebeu-se de seu valor e passou a copiar suas táticas e estratégias (SILVA; ALVES, 2015, p. 125). Ronald Ballou (2006, p. 28) define a logística como o processo que tem a missão de agregar valor ao: “colocar os produtos ou serviços certos no lugar certo, 153 Em 1812, Napoleão invadiu a Rússia com um poderoso exército: 600 mil homens e 180 mil cavalos. Confiante da vitória e de seu talento como estrategista, conduziu seu exército pelo imenso território russo, enquanto as tropas do czar retiravam-se das cidades ateando fogo às plantações e a tudo que pudesse ser útil aos franceses. Napoleão chegou ao Kremlin, porém suas tropas mal alimentadas e cansadas, começaram a ser vitimadas pelo rigoroso inverno russo. Apenas 30 mil soldados chegaram vivos a Paris. Conta-se que durante a retirada estes “catavam brotos de raízes” para comer, a incomoda posição que assumiam para retirar do solo as raízes teriam dado origem ao famoso ditado: “Foi assim que Napoleão, perdeu a guerra!”. (COTRIM, p. 269).
126 no momento certo, e nas condições desejadas, dando ao mesmo tempo a melhor contribuição possível para a empresa”. Chopra e Meindl (2003, p. 7) definem logística de forma mais ampla: “a cadeia de suprimentos é uma sequência de processo e fluxos que acontecem dentro e entre diferentes estágios da cadeia, e que se combinam para atender à necessidade de um cliente por um produto”. A eficiência da operação logística está diretamente ligada a satisfazer as necessidades e anseios do cliente, seja o destinatário do bem ou o remetente. Com o aumento do consumo e o consequente aumento do descarte, o fluxo dos produtos passou a se inverter. Ao invés do esperado montante para jusante, o jusante para montante passou a ser mais comum do que se esperava: retornos de produtos,
seja
por
responsabilidade
do
cliente
(endereço
insuficiente,
estabelecimento fechado, pedido inexistente, cancelado ou divergente, ICMS divergente, desacordos comerciais, desistências da aquisição, data de vencimento próxima, etc.); seja por responsabilidade do transportador (avarias, trocas ou extravios ocorridos durante o transporte). Estas operações eram consideradas um estorvo, pois lançavam produtos no contrafluxo, os chamados “retornos”. Além dessas operações invertidas da logística direta, houve um aumento considerável de obrigações legais e necessidades de mercado do descarte ou retorno de embalagens (vasilhames de refrigerantes e cervejas, cartuchos de impressoras e copiadoras, encalhes de jornais e revistas, etc.) e de produtos que tiveram a vida útil expirada. Os famosos recalls nada mais são do que operações de logística reversa (SILVA; ALVES, 2015, p. 125). Logística reversa, logística inversa ou reversão logística é um processo que o mercado impôs naturalmente. É decorrente da necessidade crescente das corporações em atender às demandas de um mercado em constante expansão. Manter a competitividade na busca por satisfazer o cliente cada vez mais exigente e atender às obrigações impostas pelas inúmeras leis de proteção ao consumidor e ao meio ambiente que passaram a regular os produtos e os resíduos destes, que fluem no fluxo inverso da cadeia de suprimentos (LEITE, 2009, p. 15). Em 1993 foi efetuada uma das primeiras tentativas de conceituação de logística reversa por meio de uma visão sistêmica: Council of Logistics
127 Management154(1993 apud LEITE, 2009, p. 16): “Logística reversa é um amplo termo relacionado às habilidades e atividades envolvidas no gerenciamento de redução, movimentação e disposição de resíduos de produtos e embalagens…”. Rogers e Tibben-Lembke (1999 apud LEITE, 2009, p. 2) expandem o conceito de 1993 do Council of Logistics Management (CLM), e definem logística reversa como: O processo de planejamento, implementação e controle da eficiência e custo efetivo do fluxo de matérias-primas, estoques em processo, produtos acabados e as informações correspondentes do ponto de consumo para o ponto de origem com o propósito de recapturar o valor ou destinar à apropriada disposição155.
O viés adotado segue duas linhas distintas: a) econômico, o fluxo inverso deve ser capaz de recuperar o valor do bem ou do resíduo (“matérias-primas, estoques em processo, produtos acabados”), enviando-os para mercados de bens de segunda mão ou revalorizando-os por meio de remanufatura ou reciclagem industrial; b) ambiental, prioriza destinar o bem à apropriada disposição final. Além desses vieses, o conceito ainda aborda a preocupação com o aumento da eficiência do fluxo e com isso, a consequente redução do custo global da operação, o que contribui para que a implementação deste tipo de fluxo seja atrativa para as corporações (LEITE, 2009, p. 24). O
Council
of
Supply
Chain
Management
Professionals
(CSCMP),
anteriormente CLM (2006 apud LEITE, 2009, p. 16), sob a ótica do conceito mais amplo de cadeia de suprimentos afirma que: Logística empresarial é a parte do Supply Chain Management que planeja, implementa e controla o eficiente e efetivo fluxo direto e reverso, a estocagem de bens, serviços e as informações relacionadas entre o ponto de origem e o ponto de consumo, no sentido de satisfazer as necessidades do cliente.
A percepção do fluxo reverso evoluiu e passou a não ser mais imprevisto e nem indesejado, visto que é planejado e controlado. Sob duas perspectivas se pode entender a logística reversa: estratégica e operacional. A perspectiva estratégica é 154 Que teve o nome alterado para Council of Supply Chain Management Professionals demonstrando a ampliação de sua área de atuação. 155 “The process of planning, implementing, and controlling the efficient, cost effective flow of raw materials, in-process inventory, finished goods and related information from the point of consumption to the point of origin for the purpose of recapturing value or proper disposal.” (ROGERS; TIBBEN-LEMBKE, 1999, p. 02).
128 definida por Leite (2009, p. 17): “refere-se às decisões de logística reversa no macroambiente empresarial constituído pela sociedade e comunidades locais, governos e ambiente concorrencial”. Esta perspectiva norteia os eixos econômico e ambiental das corporações em busca de competitividade e sustentabilidade: recuperação de valor financeiro; atenção aos ordenamentos jurídicos; diversificação do portfólio de serviços aos clientes; redução do risco de exposição de imagem de corporação agressora do meio ambiente; demonstração de responsabilidade ambiental. Sob a ótica da perspectiva operacional serão definidos: caracterização do produto logístico; estruturação da rede reversa de logística; estruturação do plano sistêmico da operação; montagem da roteirização dos pontos de coleta ótima; modais de transportes; políticas e locais de armazenagem; políticas de gestão de estoques; sistemas de informações que considerem o fluxo reverso do ponto de vista fiscal, econômico e operacional. Esta alteração de cosmovisão em relação à logística reversa foi puxada pelo mercado e não empurrada pelos acadêmicos e profissionais de logística, surgiu face às necessidades que se apresentaram quando os fluxos reversos, deixaram de ser esporádicos para se tornarem rotineiros, necessitando portanto, de planejamento e controle (LEITE, 2009, p. 17). Paulo Leite (2009, p. 17), pioneiro na discussão e divulgação da logística reversa no vernáculo, define o fluxo reverso como: A área da logística empresarial que planeja, opera e controla o fluxo e as informações logísticas correspondentes, do retorno dos bens de pós-vendas e de pós-consumo ao ciclo de negócios ou ao ciclo produtivo, por meio dos canais de distribuição reversos, agregandolhes valor de diversas naturezas: econômico, de prestação de serviços, ecológico, legal, logístico, de imagem corporativa, dentre outros.
Os bens que fluem pelos Canais de Distribuição Reversos (CDR) são divididos em bens de pós-venda e bens de pós-consumo, estabelecendo um marco no estudo na logística reversa no Brasil (LEITE, 2009, p. 20). O objetivo estratégico dos canais reversos de pós-venda é agregar valor ao produto, ou bem logístico, que retornou ao fluxo operacional por razões comerciais, erros não identificados na fase de processamento do pedido, problemas de
129 garantias, defeitos ou falhas de funcionamento, avarias percebidas durante a fase de movimentação e transporte, término de contrato de consignação, relocalização de estoque do varejo, entre outros motivos. Podem fluir reversalmente pela estrutura da logística direta ou ter uma estrutura própria, em função de volume e custo, implementada para atender à demanda independentemente (LEITE, 2009, p. 18). A Figura 6 apresenta áreas de origem dos produtos (comércio e indústria), os diversos canais de distribuição reversos (pós-venda, industriais e pós-consumo), as causas dos retornos (garantia/qualidade, comerciais, manutenção, fim de vida útil e fim de uso) e as diversas opções a serem seguidas, quanto à destinação final ou disposição final ambientalmente adequada.
Figura 6: Principais etapas dos fluxos reversos. Fonte: Leite (2009, pg. 20)
Leite (2009, p. 18) define logística reversa de pós-venda como: área de atuação específica que se ocupa do equacionamento e da operacionalização do fluxo físico e das informações logísticas correspondentes de bens de pós-vendas, não usados ou com pouco uso, os quais, por diferentes motivos, retornam aos diferentes elos da cadeia de distribuição direta, que se constituem de uma parte dos canais reversos pelos quais esses produtos fluem156. 156 Em outro lugar define como: “[…] a área específica de atuação da logística reversa que se ocupa do planejamento, da operação e do controle do fluxo físico e das informações logísticas correspondentes de
130
Os canais de distribuição por onde estes bens fluem reversalmente são chamados de canais reversos de bens de pós-vendas e são constituídos: pelas diferentes formas e possibilidades de retorno de uma parcela de produtos, com pouco ou nenhum uso, que fluem no sentido inverso, do consumidor ao varejista ou ao fabricante, do varejista ao fabricante, entre as empresas, motivados por problemas relacionados à qualidade em geral ou a processos comerciais entre empresas, retornando ao ciclo de negócios de alguma maneira (LEITE, 2009, p. 8).
O objetivo estratégico dos canais reversos de pós-consumo é agregar valor ao produto, ou bem logístico, que retornou ao fluxo operacional por ter chegado ao fim da vida útil para o seu proprietário, tornando-se inservível. Estes bens ou produtos podem ainda possuir condições de utilização, com a mesma função para a qual foram projetados ou outras que lhe forem cabíveis. O canal também é constituído por bens que não oferecem condições de serem reutilizados ou são resíduos industriais. Os produtos originários desses resíduos podem ser classificados como bens duráveis 157, semiduráveis158 ou descartáveis159 e fluem reversalmente pelos canais de reúso, remanufatura ou reciclagem, até que não tenham mais utilidade e sejam dispostos de forma ambientalmente adequada. Normalmente não utilizam a estrutura da logística direta para fluírem pelo canal reverso, utilizam estrutura própria implementada para o canal (LEITE, 2009, p. 18). Leite (2009, p. 18) define logística reversa de pós consumo como: a área de atuação da logística reversa que equaciona e operacionaliza igualmente o fluxo físico e as informações correspondentes de bens de pós-consumo descartados pela sociedade em geral, que retornam ao ciclo de negócios ou ao ciclo produtivo por meio dos canais de distribuição reversos específicos.
bens de pós-venda, sem uso ou com pouco uso, que por diferentes motivos retornam pelos elos da cadeia de distribuição direta.” (LEITE, 2009, p. 187). 157 “São os bens que apresentam duração média de vida útil variando de alguns anos a algumas décadas.” (LEITE, 2009, p. 39). 158 “São os bens que apresentam duração média de vida útil de alguns meses, raramente superior a dois anos”.” (LEITE, 2009, p. 39). 159 “São os bens que apresentam duração média de vida útil média de algumas semanas, raramente superior a seis meses.” (LEITE, 2009, p. 39).
131 Os canais de distribuição por onde estes bens fluem reversalmente são chamados de canais reversos de bens de pós-consumo e são constituídos de: diversas etapas de comercialização e industrialização pelas quais fluem os resíduos industriais e os diferentes tipos de bens de utilidade ou seus materiais constituintes, até sua reintegração ao processo produtivo, por meio de subsistemas de reúso, remanufatura ou reciclagem (LEITE, 2009, p. 49)160.
A figura 7 apresenta a estrutura de um canal reverso de pós-consumo, com os subsistemas reversos e as possibilidades de destinação final:
Figura 7: Canal reverso de pós-consumo Fonte: Adaptado de Leite, 2009, p. 47
A PNRS define logística reversa de forma não usual, por intermédio de uma visão gerada em âmbito corporativo e legislativo: Instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos
160 Em outro lugar: “[…] são constituídos pelo fluxo reverso de uma parcela de produtos e de materiais constituintes originados no descarte dos produtos, após finalizada sua utilidade original, retornam ao ciclo produtivo de alguma maneira. Distinguem-se três subsistemas reversos: os canais reversos de reúso, de remanufatura e de reciclagem.” (LEITE, 2009, p. 8)
132 produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada (BRASIL, 2012, p. 11).
A ênfase maior é no equacionamento dos pilares econômico e social: por um lado existe o setor empresarial que busca recuperar o valor do bem ou do resíduo, para reduzir o custo da operação e do outro, a visão sistêmica socioambiental: Esta visão está fundamentada em políticas e cosmovisões ambientais que, sob a égide do desenvolvimento sustentável, preconiza: o meio ambiente, as energias e as fontes de recursos renováveis, as pessoas, tanto da geração presente, como das vindouras, devem ser priorizados sob todas as formas possíveis; a busca por meios ou tecnologias que assegurem a extração minimamente possível dos recursos não renováveis deve ser um continuum; a ênfase em tornar claro que o resíduo não, necessariamente deverá retornar ao próprio ciclo, o que constituiria um ciclo fechado, mas pode servir de insumo ou matéria-prima de outra cadeia, o ciclo aberto (LEITE, 2012, p. 354). A evolução conceitual de logística reversa, em função das recentes e atuais demandas legais e mercadológicas, requer que, do ponto de vista operacional, seja efetuada a integração entre a concepção clássica da logística reversa e o gerenciamento integrado de resíduos sólidos; do ponto de vista gerencial, envolva os aspectos da logística verde e do LCM (Life Cycle Management)161 nas discussões concernentes ao fluxo de materiais e resíduos. Costa, Mendonça e Souza (2014, p. 27) propõe então, uma definição de logística reversa por meio de uma análise transdisciplinar: recuperação de resíduos de pós-venda ou de pós-consumo, pela coleta, pré-tratamento, beneficiamento e distribuição, de forma a ou retorná-lo à cadeia produtiva, ou dar-lhe destinação final adequada. Deve enfocar a minimização dos rejeitos e dos impactos negativos e a maximização dos impactos positivos, sejam ambientais, sociais ou econômicos. Este processo incorpora as atividades operacionais, de gestão e de apoio que, de forma integrada e envolvendo os diversos atores, planejem e viabilizem a implementação das soluções mais adequadas para os resíduos.
Xavier (2014, p. 37) tratando de design e sustentabilidade na cadeia de resíduos tecnológicos apresenta a logística reversa num contexto mais amplo: cadeia reversa. A logística reversa portanto, não seria apenas mais um elo de uma 161 Gerenciamento do Ciclo de Vida.
133 cadeia de valor, mas sim uma cadeia de valor própria e interdependente de outras cadeias diretas e reversas que comporiam a rede de valor, que é o somatório e a integração de diversas cadeias. Esta visão de logística reversa, como uma cadeia própria, atribui-lhe o mesmo grau de importância que recebe a logística de suprimentos, a logística de manufatura e a logística de distribuição. Guarnieri (2011, p. 47) estabelece a distinção entre logística verde e logística reversa, uma vez que os conceitos são utilizados intercambiavelmente com frequência, porém indiscriminadamente: “a logística reversa operacionaliza o retorno dos resíduos após sua geração e sua revalorização e reinserção econômica”, enquanto que a logística verde: Tem como objetivo principal atender aos princípios da sustentabilidade ambiental como o da produção limpa, onde a responsabilidade é do “berço à cova”, ou seja, quem produz deve responsabilizar-se também pelo destino final dos produtos gerados, de forma a reduzir o impacto ambiental que eles causam.
Alguns
elementos
e
instrumentos
fundamentais
lastreiam
a
operacionalização eficiente de uma cadeia de logística reversa: processo de vigilância eficiente (gatekeeping) para triar mercadorias defeituosas antes que adentrem a cadeia direta; tempos de ciclo de descarte curtos, produtos em situação de devolução não podem “envelhecer”; sistemas de informação de logística inversos; centros de devolução que manuseiem rápida e eficientemente as devoluções; práticas de devolução “zero”; remanufatura e restauração de produtos; recuperação de ativos que minimize custos associados ao descarte; negociação do valor do material devolvido sem estabelecer diretrizes de preço; políticas de gerenciamento financeiros; e terceirização gerenciamento do fluxo reverso (GRANT, 2013, p. 285) Xavier e Corrêa (2013, p. 66) apresentam os aspectos, por meio dos quais a motivação para o estudo mais intenso da logística reversa tem sido incentivado: a) exigências legais e normativas; b) consumidores mais conscientes e exigentes; c) aumento do fluxo de retorno de produtos; d) aumento do fluxo de logística direta de produtos comercializados pela internet (com significativo índice de retornos de produtos por estarem fora de conformidade); e) ciclo de vida dos produtos cada vez mais curtos; f) necessidade de redução dos custos da cadeia produtiva; g) aumento
134 do uso de embalagens retornáveis para reúso; h) recall frequente de produtos que apresentam não conformidade; i) produtos que retornam por encerramento de leasing ou comodato. Leite (2009, p. 21) também lista alguns fatores de incentivo à estruturação e implementação de sistemas de logística reversa: a) sensibilidade ecológica de clientes que tem impulsionado as corporações; b) sustentabilidade econômica, social, cultural e ambiental têm se tornado conceitos comuns e ter programas que os inclua é fator mínimo de competitividade; c) avanços de conceitos e legislações ambientais; d) competitividade empresarial, adequação ao mercado, não é mais um diferencial; e) imagem corporativa, padrões de consumo e produção sustentáveis são requeridos por mercados mais exigentes; f) gestão dos custos logísticos, equacionar os retornos é fator preponderante; g) dimensão do mercado da logística reversa, mercado em franca expansão. Grant (2013, p. 286), citando a realidade norte-americana como parâmetro, cita os fatores principais que incentivam a estruturação de uma cadeia reversa: a) reduções de custo; valor agregado para clientes; c) obediência às regulamentações legais de forma adequada; d) controle e gerenciamento da cadeia de valor, bem como de seus dois sistemas, direto e reverso; medição dos custos totais, por meio da adoção do custeio do ciclo de vida total do produto; e) do ponto de vista financeiro, alocar adequadamente os recursos disponíveis. Quando da estruturação dos sistemas de logística reversa, algumas ferramentas ocupam espaço privilegiado, dentre elas: rastreabilidade e planos de operação para cada etapa. A rastreabilidade é uma ferramenta tecnológica, nativa do ramo automotivo. A as peças que fluem nos canais diretos recebem códigos de identificação com lote e data de fabricação e caso um recall de fábrica seja necessário, é possível rapidamente acionar a cadeia de distribuição e a de suprimentos para que as peças retornem pelos canais reversos para serem remanufaturadas ou trocadas, assegurando a confiabilidade e o equilíbrio da cadeia produtiva. Dado o sucesso do setor automotivo, outras cadeias produtivas estão implantando esta tecnologia com sucesso. No ramo farmacêutico é uma exigência dos órgãos reguladores que querem assegurar a localização eficaz e ágil de algum
135 produto que porventura tenha sido identificado com desvios de qualidade ou falha de produção. No segmento de bens de consumo, no qual cada Store Keeping Unit (SKU) – unidade básica de armazenagem – é associado ao lote de fabricação que identifica a data de produção, de acordo com o Calendário Juliano, além dos dados da planta produtora e, em alguns itens, até mesmo o turno no qual foram fabricados. (SILVA; ALVES, 2015, p. 126; XAVIER; CORREA, 2013, p. 203). Souza (2014, p. 88) sugere que um programa de operações logísticas necessita de 04 (quatro) planos: plano de preparação e acondicionamento; plano de coleta e transporte; plano de beneficiamento; e plano de destinação final. Leite (2012, p. 355) propõe 06 (seis) etapas a serem seguidas obrigatoriamente: entrada do produto na cadeia reversa; consolidações quantitativas e geográficas dos produtos coletados; seleção e destino dos produtos retornados; processamentos industriais de reaproveitamento de produtos ou materiais; distribuição destes novos produtos ou materiais ao mercado. Bartholomeu, Branco e Caixeta-Filho (2011, p. 26) por outro lado, apresentam um modelo de sistema de logística reversa que aglutina etapas: geração; acondicionamento (realizado pela fonte geradora); coleta (regular ou seletiva); préprocessamento; transbordo; disposição final. Xavier e Correa (2013, p. 197) tomando por analogia a cadeia de suprimentos que engloba todos os sistemas de operações logísticas, propõe que um sistema de logística reversa seja composto de: projeto para o meio ambiente (etapa de projeto do produto); mapeamento do descarte; coleta; triagem; manutenção ou reparo; processamento primário; processamento secundário; reinserção na cadeia produtiva. Chopra e Meindl (2003, p. 10) advertem que a estratégica da cadeia de suprimentos, seja direta ou reversa, necessariamente tem que estar alinhada à estratégia competitiva da organização, para que não haja descompasso. Cada processo operacional do sistema de logística reverso tem que ser norteado pelo planejamento estratégico. Não se pode estruturar uma cadeia reversa que tenha como diferencial competitivo a responsividade de 95% dos anseios dos clientes, se o planejamento da organização foca em eficiência, custo menor. É vital que seja implantada uma visão por processo, mas que seja também uma visão sistêmica,
136 pois nenhum ganho isolado, em algum processo individual, pode ser maior do que o ganho da soma de todos os processos do sistema. A colação162 analógica das propostas de programas de logística reversa permite que se sobressaiam quatro processos macros, com seus respectivos subprocessos: preparação e acondicionamento, coleta e transporte, beneficiamento e destinação final. Serão estes que comporão o plano operacional. Plano de preparação e acondicionamento – Xavier e Corrêa (2013, p. 195) destacam alguns desafios para a estruturação de um plano de preparação e acondicionamento de resíduos sólidos: o grau de incerteza de disponibilidade de insumos é maior nas cadeias reversas, em que não se pode prever, com precisão e antecedência, a quantidade de matéria-prima a ser recebida, dentro de determinado período e conforme as especificações requeridas pelo processo produtivo.
As variáveis que devem ser discutidas quando do planejamento destas atividades incluem: a) avaliação do ciclo de vida do produto que deu origem ao resíduo (análise da distribuição, consumo e os hábitos dos consumidores) e mapeamento dos locais de destinação dos resíduos e rejeitos; b) coleta de amostra significativa e representativa de todo o resíduo, que permita a caracterização do mesmo por meio de testes laboratoriais; confecção de plano de amostragem de acordo com as normas de referência (que contenha: detalhamento dos equipamentos de proteção a serem utilizados durante o manuseio da
amostra,
seleção
dos
pontos
de
amostragem
que
permitam
uma
representatividade ampla, o número e o volume das amostras, instrumentos a serem utilizados para coleta e para transporte do material coletado, os cuidados com a preservação das amostras, e a periodicidade desta amostragem); mapeamento dos processos que deram origem aos resíduos, para que resíduos perigosos não sejam manipulados como resíduos comuns, o que pode comprometer a integridade física dos que operam a coleta e manuseiam os resíduos; c) classificar e categorizar as amostras dos resíduos sólidos de acordos com 162 Termo utilizado na área de manuscritologia e é definida como: “confronto de um ms. [manuscrito] com o original ou com outra cópia, para verificar a correspondência entre os respectivos textos e assim analisar a maior ou menor autoridade para a escolha do texto exato.”(PAROSCHI, 199, p. 15).
137 as normas de referência (ABNT NBR 10.004:2004 – norma específica para classificação de resíduos – e NBR 12.808:1993 – norma específica para classificar resíduos oriundos de serviços de saúde) quanto à inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade, patogenicidade, combustibilidade, biodegradabilidade e solubilidade. Tais medidas garantirão a correta manipulação dos resíduos e determinarão quais tratativas deverão ser adotadas em casos de exposição aos mesmos. Algumas embalagens de produtos trazem estas informações gerais, porém, nem todos os resíduos serão coletados em suas embalagens originais por isso se faz necessária a realização de testes laboratoriais para a devida classificação dos resíduos; d) segregação do resíduo na origem com coletores de diferentes cores (recuperação de valor econômico, visto que os resíduos não terão suas características básicas alteradas por propriedades contaminantes de outros resíduos,
prevenirá
a
contaminação
cruzada
de
produtos
perigosos);
dimensionamento da capacidade instalada de coleta para que o fluxo de descarte não seja comprometido e nem o custo com transporte seja excessivo; treinamento para os envolvidos na operação; além de estruturação de programas de educação ambiental; e) acondicionamento dos resíduos a serem coletados de maneira segura, de forma que suas propriedades e características físico-químicas sejam preservadas; formas de contenção que serão utilizadas para que os resíduos permaneçam seguros até que sejam dispostos finalmente. Outras variáveis deverão ser levadas em consideração: os resíduos perigosos, aqueles que expelem líquidos que possam percolar pelo solo, resíduos que sejam reativos a outros tipos de resíduos, que demandam cuidados específicos; e) local apropriado para o armazenamento temporário até que a volumetria dos resíduos alcance um patamar no qual se torne viável o transporte dos mesmos até a destinação final adequada (SOUZA, 2014, p. 89; XAVIER; CORRÊA, 2013, 198). Plano de coleta e transporte – Esta “distribuição invertida” que é a coleta é um dos maiores desafios para a logística reversa, Xavier e Correa (2013, p. 199) afirmam que: […] muitos consumidores devem retornar seus produtos para poucas
138 empresas – por esse motivo, o custo unitário para a devolução de itens pósconsumo tem um valor proporcionalmente alto em relação o custo do produto”. Se a coleta não ocorrer de forma efetiva, a viabilidade de todo o processo pode ser comprometida, pois será em função da qualidade do material coletado que os custos da operação poderão ser minimizados ou exponenciados. São os processos de coleta e transporte que asseguram que os resíduos sólidos sejam devolvidos adequadamente para o ciclo de negócios, para o ciclo produtivo de onde foram originados ou para outros ciclos produtivos, quando for viável econômica e tecnologicamente. Nesta fase a observância às leis e resoluções dos órgãos da defesa do meio ambiente ou da vigilância sanitária é imprescindível para garantir que a operação não cause danos à saúde dos profissionais que efetuam a coleta e o transporte, nem ao meio ambiente e à imagem da empresa (SILVA; ALVES, 2015, p. 130). Variáveis a serem priorizadas, quando das discussões de planejamento e estruturação deste plano: a) mensuração da quantidade de resíduos gerados em determinado intervalo de tempo, que é a base para o planejamento da rotina de coleta; identificação da capacidade de armazenamento local do gerador (cálculo da periodicidade da coleta – a equação geração de resíduos versus capacidade de armazenamento deverá ter uma solução ótima); roteirização propriamente dita, que equacione responsividade X eficiência; b) definição dos receptores sob critérios estabelecidos anteriormente: aptidão para atender aos objetivos operacionais do gerador; habilitação técnica comprovada, tanto do ponto de vista legal quanto das exigências dos órgãos fiscalizadores ambientais e de vigilância sanitária; se a capacidade instalada e de fluxo do receptor em processar os resíduos é compatível com a volumetria gerada no período; c)
definição
dos
transportadores
sob
critérios
preestabelecidos:
transportadores habilitados e aptos a atenderem aos objetivos do gerador e do receptor; habilitação técnica e legal juntos aos órgãos fiscalizadores e agências reguladoras; consolidação entre o fluxo de geração dos resíduos, a capacidade de processamento do receptor e a capacidade de carga do transportador; definição da volumetria a ser coletada; intervalo de realização destas coletas e a roteirização
139 propriamente dita, diária ou semanalmente customizada; avaliar necessidade de estações intermediárias de transbordo; d) quando da implementação do processo de coleta, tais questionamentos deverão ter sido equacionados: coleta seletiva ou particular; sistema de trabalho para a realização da coleta; avaliação dos riscos existentes em determinada atividade; eliminação dos riscos; padronização de procedimentos e comportamentos; aplicação de treinamento aos envolvidos, emissão de ordem a cada procedimento, programa de saúde ocupacional; e) questionamentos a serem equacionados quando da implementação da rotina de transporte: identificação das características da carga; avaliação dos riscos existentes; definição de mecanismos de combate e prevenção de acidentes; definição dos veículos coletores e os equipamentos de contenção; definição de itinerários, rotina de operacionalização segura do veículo, treinamento dos condutores; atenção às normas legais e sanitárias quanto às documentações de transporte exigidas (SOUZA, 2014, p. 91). Plano de beneficiamento – Souza (2014, p. 93) afirma que este plano é vital para a operacionalização do sistema ou programa de logística reversa, pois consegue atrair a atenção dos empresários: “[…] é partir dele que são gerados os estímulos necessários à promoção do negócio propriamente dito […] os resíduos agregam algum valor econômico em sua comercialização ou destinação”. O objetivo principal deste plano é estabelecer um programa de transformação das características físicas a serem efetuadas nos resíduos (pré-tratamento e tratamento), com o objetivo de recuperação de valor por meio da comercialização daqueles que serão reutilizados em algum processo produtivo ou, daqueles que serão objeto da disposição final. As etapas a serem seguidas estão diretamente ligadas ao processo que gerou os resíduos e à tipologia desses resíduos: seguir instruções para tratamento de cada tipo de resíduo; receber; avaliar e separar os materiais (por tipo e condição de aproveitamento); limpeza; moagem; compactação; desmanche (dependendo do tipo); armazenar temporariamente; e disposição final adequada. Este plano tem recebido bastante atenção por ser uma interface estreita entre a segregação do material e a destinação final cabível, além de contribuir teoricamente para a redução
140 dos danos causados por resíduos com componentes perigosos. A escolha do processo a que será submetido o resíduo dependerá de estudo técnicos (viabilidade técnica e orçamentária; qualificação e quantidade da mão de obra; caracterização, volume, grau de separação dos resíduos; localização em relação às fontes geradoras; impactos ambientais; destinação dos produtos e subprodutos gerados; legislação; e fatores de mercado), pois: “a solução mais adequada pode ser uma combinação entre as opções disponíveis, ou uma única delas” (SOUZA; SOUZA, 2014a, p. 132). Algumas atividades estão diretamente ligadas a este macroprocesso (SOUZA, 2014, p. 94, 95): a) quando do recebimento: identificação dos riscos e cuidados necessários para o manuseio dos resíduos de forma segura; recepção do resíduo; avaliação e separação dos materiais, por tipo de material e pela condição de aproveitamento nos quais se encontram (estes processos devem ser efetuados nos Centros de Triagem, quando possível); identificação de oportunidades de obtenção de materiais de alto valor contidos nos resíduos; definição do tipo de beneficiamento e encaminhamento; resíduos inservíveis deverão ser encaminhados imediatamente para a disposição final adequada; controle da documentação legal, sanitária e fiscal; estocagem temporária dos resíduos; b) quando da armazenagem temporária: compactação para redução volumétrica e unitização para otimização da armazenagem (quando a tipologia do resíduo permitir); acondicionamento adequado dos resíduos, respeitando as características e as normas próprias de armazenagem de cada tipo de resíduo; c) pré-tratamento: segregação ou triagem dos resíduos; compactação, quando a tipologia permitir; moagem, para redução volumétrica quando possível; higienização, quando necessário; gerenciamento ambientalmente adequado dos efluentes; d) quando do tratamento a escolha do processo será pela tipologia e características do material: desmanche; reparo; recondicionamento; renovação (refurbish163); remanufatura; reciclagem mecânica ou industrial; compostagem e outros processos de biodigestão; e descontaminação. Os rejeitos podem sofrer 163 Restauração (refurbishment, em inglês), também às vezes renovação, é um processo industrial de manutenção e/ou reparo.
141 processo de incineração com reaproveitamento energético ou serem coprocessados em fornos clínquer como insumos para as indústrias de cimento (SOUZA e SOUZA, 2014a, p. 133). Plano de destinação final dos materiais – “A 'disposição final' é entendida, aqui, como o último local de destino para o qual são enviados produtos, materiais e resíduos em geral sem condições de revalorização” (LEITE, 2009, p. 9). Alguns resíduos em fim de vida útil ainda podem ter utilidade em outros ciclos ou atividades, podem ser doados para práticas artesanais ou órgãos públicos e inciativa privada que darão a destinação final de forma adequada; Os rejeitos (resíduos que não foram processados por não haver viabilidade técnica de beneficiamento e nem de transformação) deverão ser dispostos em aterros industriais e sanitários para a decomposição dos materiais e tratamento do líquido lixiviado (chorume), o tratamento inclui também a incineração e tratamento dos gases gerados para que não agridam o meio ambiente. Diversos outros tratamentos biológicos (lodos ativados; lagoas aeradas; lagoas de estabilização; reator anaeróbico de fluxo ascendente), recirculação ou irrigação e físico-químicos (diluição, filtração, coagulação, floculação, precipitação, matrizes de carvão ativo, sedimentação, oxidação direta, evaporação direta ou forçada, lavagem do efluente líquido com ar, troca iônica, osmose reversa e ultrafiltração) podem ser aplicados nas tratativas destes rejeitos (SOUZA e SOUZA, 2014b, p.159).
2.5 Logística reversa de medicamentos domiciliares
Segundo Silva e Alves (2015, p. 129) a cadeia produtiva farmacêutica se defronta com uma lacuna de amplitude vasta, quando da estruturação de um programa de logística reversa que atenda à Lei da PNRS, no que concerne aos resíduos de medicamentos vencidos ou inservíveis domiciliares: quais os domicílios, onde estão localizados e qual a quantidade destes resíduos que está nas mãos da população? Não há no Brasil hoje nenhum estudo que forneça dados concretos para responder tal pergunta.
142 A Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), em estudo encomendado pela Anvisa (para fundamentar as análises das propostas de estruturação dos sistemas de logística reversa por parte dos representantes do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e do Ministério da Saúde), apresenta duas metodologias aplicadas em âmbito internacional que possibilitam, por meio de analogia, estimar a quantidade de resíduos de medicamentos em desuso ou vencidos dispersos nos domicílios brasileiros. A primeira metodologia foi aplicada no Sudeste da Inglaterra em 2007, a pesquisa estudou os resíduos de medicamentos domiciliares coletados numa amostragem de 500 residências. As análises dos dados apontaram para um percentual de 19% em termos de descarte de medicamentos em relação ao total de medicamentos adquiridos. A segunda metodologia foi aplicada na Flórida em 2009, adaptando um modelo australiano ao contexto americano, apontou para um percentual de 11% de descarte de resíduos de medicamentos, também em relação ao total dos medicamentos adquiridos (HIRATUKA, 2013, p. 73). Tais estimativas não podem ser utilizadas como parâmetro ideal para quantificar o volume de resíduos descartados no contexto brasileiro, visto que fatores como educação, moradia, saneamento básico e acesso a melhores condições de vida e renda, podem alterar sobremaneira a forma como a população percebe sua própria contribuição à preservação do meio ambiente e às questões de criação e manutenção de um mundo sustentável. Crespo (2008, p. 65) comentando os resultados das pesquisas que dirigiu sobre a consciência ambiental do brasileiro corrobora esta lacuna: “Quanto mais alto o nível de escolaridade, mais consistente é o interesse, o conhecimento e a preocupação com as questões ambientais”. A forma mais comum de disposição final de resíduos de medicamentos domiciliares em desuso ou inservíveis é a rede pública de saneamento e esgoto. Esta forma de descarte inadequado destes resíduos impõe riscos consideráveis para a saúde pública e social e pode contribuir para o agravamento da degradação do meio ambiente. Hiratuka (2013, p. 10) afirma que diversos estudos em âmbito internacional, têm apontado para o fato que: […] o descarte não judicioso de medicamentos vencidos ou sobras, feito pela população em geral, no lixo comum ou na rede pública de esgoto, traz consequências em termos da agressão ao meio ambiente e à saúde humana. Dentre os efeitos associados à
143 presença de resíduos de certos medicamentos no meio ambiente, a literatura especializada aponta riscos como a contaminação da água, do solo, da flora e da fauna. Além disso, há claramente o risco direto à saúde de pessoas que possam reutilizá-los por acidente ou mesmo intencionalmente.
Algumas substâncias envolvidas na produção de medicamentos podem se caracterizar como tóxicas ou que conferem periculosidade aos resíduos (ABNT, 2004, p. 3). Dependendo então de sua composição, os medicamentos podem ser tipificados e classificados como resíduos classe I, por serem constituídos de substâncias químicas que oferecem risco à saúde pública ou ao meio ambiente (inflamabilidade, corrosividade, reatividade e toxicidade). Rodrigues (2009, p. 45) chama à atenção para o fato de que algumas propriedades físico-químicas conferem aos medicamentos elevada tendência a bioacumulação164: “Em verdade 30% de todos os fármacos desenvolvidos são lipofílicos (hidrosolubilidade < 10%), sedimentando-se em ambientes aquáticos ou transferindo-se para fase biótica”. As principais classes de fármacos com mais risco ambiental inerente são: antibióticos (76,6%), hormônios (73,6%) e os antidepressivos (69,4%). Entre os impactos ambientais mais preocupantes associados a estes resíduos está a genotoxicidade (capacidade que algumas substâncias químicas apresentam em produzir alterações genéticas em organismos a elas expostos). Antibióticos como penicilinas, estreptomicina, ou alguns antiparasitários como ivermectin®, também podem interferir diretamente no ciclo biológico, por inibição do crescimento, além de efeitos colaterais genotóxicos, seja causando dano ao DNA, seja interferindo nos mecanismos de transdução165(RODRIGUES, 2009, p. 45) Rodrigues (2009, p. 47) ainda cita alguns estudos que observaram que o estradiol, um hormônio feminino, quando lançado em efluentes promovia a
164 “Bioacumulação é frequentemente usado como termo geral para descrever o processo de absorção de substâncias por um determinado organismo, e por ele armazenado. A bioacumulação engloba todas as fontes de substâncias combinadas (água, comida e ar por exemplo), sendo mais frequente nos organismos aquáticos.” Disponível em: <knoow.net/ciencterravida/biologia/bioacumulacao/>. 165 “Transdução é o processo de reprodução no qual o DNA bacteriano é transferido de uma bactéria para outra por um vírus, os chamados bacteriófagos. Existem dois mecanismos de transdução: generalizada, em que qualquer gene pode ser transmitido, e restrita, que se limita a alguns genes específicos.” Disponível em: <www.sobiologia.com.br/conteudos/Reinos/biomonera3.php>.
144 feminização de peixes. Outros estudos verificaram potencial mutagênico 166 do produto de degradação da furosemida, um dos diuréticos mais consumidos no mundo. Foram percebidas também, alterações no desenvolvimento de plantas, plâncton, microrganismos e insetos. Ainda se pode citar outro efeito ambientalmente degradante e que afeta a saúde pública: desenvolvimento da resistência. Estudos comprovam que cerca de 55% de todos os microrganismos apresentem resistência a pelo menos um antibiótico. Tais estudos conduzidos tomaram os antibióticos betalactâmicos (grupo das penicilinas) como vetores da pesquisa. Rodrigues (2009, p. 46) lista os principais sítios de ocorrência de degradação ambiental causadas por fármacos: a) águas de lençóis freáticos: por infiltração de linhas de esgoto ou efluentes; b) águas de rios: por despejo de esgoto doméstico, industrial ou do uso rural quando transportadas do solo pelas chuvas; c) águas oceânicas: por despejo de esgoto doméstico ou dos próprios rios; d) sedimentos: pela deposição de espécies ativas insolúveis; e) solo: pelo despejo urbano inadequado ou do uso rural. As estações de tratamento de esgotos operam com baixa eficiência na remoção dos resíduos de fármacos, os processos convencionais que são utilizados, permitem a contaminação das águas superficiais. A virulência, a toxicidade e a periculosidade dos resíduos de fármacos é tão intensa que até mesmo substâncias que foram digeridas pelo organismo humano subsistem após tratamentos. Rodrigues (2009, p. 47) adverte: […] principalmente associada a medicamentos de uso humano, decorrer principalmente: excreção urinária ou fecal, consequente contaminação de esgotos por fármacos e/ou metabólitos; ou do descarte de medicamentos vencidos em domésticos.
pode com seus lixos
As tratativas estabelecidas pelos regulamentos e normas dos órgãos de vigilância sanitária, no que concerne à destinação dos resíduos de fármacos, determinam que sejam enviados a aterros para produtos perigosos classe I. A impossibilidade do resíduo de medicamento domiciliar ser destinado à reutilização, à 166 “Agente mutagênico é todo tipo de agente que quando exposto às células apresenta capacidade de gerar mutação. Em outras palavras, um dano no material genético (DNA) que não sofre reparação no processo de replicação celular, sendo passado para os descendentes […] diversas substâncias consideradas cancerígenas, que desempenham seu papel alterando as ligações químicas, ou até mesmo substituindo nucleotídeos normais por moléculas similares. Radicais livres também catalisam reações químicas prejudiciais ao DNA.”. Disponível em: <http://www.infoescola.com/biologia/agentes-mutagenicos/>
145 reciclagem ou à recuperação do produto final ou das matérias-primas que compõem o produto, torna-se uma variável agravante e reducionista (SILVA; ALVES, 2015, p. 130). Hiratuka (2013, p. 66) observa que um programa de logística reversa, que atenda ao que a PNRS estabelece, para este segmento deve ser estruturado para realizar da maneira mais efetiva possível, sem oferecer riscos aos agentes envolvidos: “o envio dos resíduos de medicamentos domiciliares para destinação final, excluindo qualquer possibilidade de reúso, recuperação e reciclagem”. Outra variável impõe restrições operacionais e de controle: o processo de coleta dos medicamentos envolve em uma das pontas o consumidor final, não estando o mesmo apto para segregar adequadamente os medicamentos perigosos dos não perigosos. Ainda que a maior parte dos resíduos de medicamentos domiciliares possua características de não-periculosidade, tanto para o possuidor ou detentor, como para grande parte dos profissionais envolvidos em transporte, armazenamento e destinação final destes resíduos. No entanto, a segregação dos resíduos de medicamentos domiciliares considerados perigosos dos não perigosos não deve estar a cargo do possuidor ou detentor, que, não está habilitado, na maioria das vezes, para realizar tal segregação. Trata-se de uma análise difícil mesmo para os profissionais ligados à área de saúde e de coleta e tratamento de resíduos. Hiratuka (2013, p. 66) recomenda: Dessa forma o ideal é evitar ao longo do sistema, a tentativa de segregação dos medicamentos perigosos dos não perigosos, assim como a segregação das embalagens primárias e secundárias. Além disso, deve-se garantir condições de armazenamento, transporte adequado, evitando excesso de manipulação ao longo do processo.
No momento inicial é importante que seja implantado o processo de controle dos resíduos por lotes, com lacração, pesagem, identificação e informação sobre o destino de cada lote. Estas urnas ou caixas coletoras distribuídas devem seguir um padrão: a) por receberem todos os tipos de resíduos, com diferentes apresentações (líquido, pomada, etc), elas devem ser de material inviolável, resistente e à prova de vazamentos; b) deverão apresentar informações visuais que auxiliem sua operação; e c) ter boca de lobo, para evitar qualquer possibilidade de acesso aos resíduos ou
146 mesmo de furto. O ponto de partida de qualquer programa ou sistema de logística reversa deve ser a rede de farmácias e drogarias 167, onde podem ser disponibilizadas as urnas ou caixas coletoras (Figura 8 apresenta um modelo já implantado no sudeste).
Figura 8: Estação Coletora Fonte: <www.ecocidades.com>
No momento de adesão ao programa as redes de farmácias e drogarias receberão as caixas coletoras e o material educativo/publicitário (cartazes e folhetos) para serem distribuídos nos seus pontos de venda. As urnas coletoras serão 167 “Em 2009, a RDC n. 44/2009 editada pela Anvisa permitiu às farmácias participarem de programas de coleta de medicamentos a serem descartados pela comunidade, como forma de mitigar a lacuna regulatória existente sobre o descarte adequado de resíduos domiciliares. De acordo com entendimento do comitê gestor da coleta amostral realizada no âmbito do GTT de medicamentos, o medicamento em desuso nos domicílios não perde as características como produto farmacêutico e tem como principal risco o seu uso inadequado e/ou descarte indevido no lixo comum ou rede de esgoto” (HIRATUKA, 2013, p. 66).
147 disponibilizadas em áreas visíveis nas farmácias participantes, bem como ter os profissionais do atendimento treinados e informados para orientar a população sobre a importância do descarte adequado e sobre o uso do sistema de coleta (HIRATUKA, 2013, p. 99)168. A periodicidade da coleta das urnas coletoras será estabelecida em função da volumetria, além de variar por conta da localização dos pontos de coleta. As redes de drogarias que efetuam o abastecimento dos pontos de vendas com frequência semanal utilizar-se-ão de sua própria estrutura de distribuição para coletar as urnas, com significativo aumento da eficiência, sem custos adicionais. O mesmo controle de gerenciamento de risco que é efetuado com os medicamentos que serão disponibilizados para venda, deverá ser efetuado com os resíduos. Devem reservar um espaço seguro para armazenamento dos lotes de resíduos até que sejam transportados de volta para as distribuidoras e centrais de distribuição. “Este espaço envolve tanto a segurança necessária para evitar contaminações bem como roubos, furtos ou desvios desses resíduos” (HIRATUKA, 2013, p. 100). Deve-se avaliar a possibilidade de inserir as cooperativas de catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis nesta etapa do plano. As mesmas poderão ser utilizadas para separar as embalagens secundárias e as bulas dos medicamentos, que por se constituírem em material reciclável, ainda podem ser reutilizados com valorização dos resíduos. As embalagens primárias, plásticas ou de vidro, não devem ser separadas dos respectivos medicamentos e seguirem a mesma destinação final que for aplicada a estes. As etapas subsequentes do programa visam equacionar o problema da 168 Como funcionam estas estações de coleta: “os equipamentos de autoatendimento são dotados de uma tela de computador que orienta os usuários sobre o passo a passo do descarte. Há três coletores em cada estação: um para pomadas e comprimidos, outro para líquidos e sprays e o último para caixas e bulas, que devem ser rasgadas antes do descarte. Não há risco de retirada e reaproveitamento dos materiais, pois os coletores têm aberturas do tipo boca de lobo e portas com fechamento a chave, impedindo o acesso ao que foi depositado. Os equipamentos têm capacidade de 5 kg em cada compartimento. Quando o volume máximo é atingido, o saco plástico é pesado e fechado com um lacre numerado. Além disso, antes de fazer o descarte o consumidor registra o tipo do medicamento que será depositado por meio do leitor de código de barras da estação. É possível, assim, rastrear os resíduos até o destino final. Todas as informações são enviadas para a central de controle, que gera um relatório e, automaticamente, comunica a empresa responsável pela coleta do material para a remoção. Os materiais têm seu destino final na incineração ou são levados para os aterros industriais classe 1, dependendo do procedimento adotado em cada município relativo à destinação dos resíduos sólidos de medicamentos domiciliares. O sistema também gera informações on-line sobre o volume total de resíduos acumulados. Os dados registrados são usados para a elaboração do 'Preservômetro', índice que permite ao consumidor acompanhar quanto foi recolhido e quais os benefícios para o meio ambiente. As informações são disponibilizadas nas próprias estações de coleta e no site” (REIS; MOTA, 2012).
148 destinação. As soluções legalmente viáveis e ambientalmente adequadas para equacionar este problema de destinação/tratamento destes resíduos são: aterro industrial nível 1, co-processamento ou incineração. Qualquer que seja a escolha do processamento, deverá levar em consideração um lote mínimo de resíduos para que seja enviado, com vistas a controle dos custos e viabilidade econômica da operação. Este envio deverá ser organizado, gerenciado e monitorado por alguma entidade local/regional, para gerar economia de escala e exercer maior controle sobre os dados de destinação, a fim de prestar contas à entidade gestora do programa em nível nacional (HIRATUKA, 2013, p. 100). Os atores/parceiros envolvidos no processo têm papéis específicos a desempenhar no Programa Nacional de Destinação Ambientalmente Adequada de Medicamentos
(PNDAARM),
mediante
o
Princípio
da
Responsabilidade
Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto: o consumidor como o mais importante ator169; as redes de farmácias e drogarias 170; os distribuidores171; a indústria farmacêutica/importadores172; a Anvisa e o Conama173; as empresas prestadoras de serviços de transporte, as empresas ou usinas de tratamento e disposição final; os operadores regionais/locais174; a entidade gestora do PNDAARM (sem fins lucrativos) – formado por técnicos e por conselho gestor 175 (HIRATUKA, 2013, p. 97169 “Levar os medicamentos para os pontos de coleta” (HIRATUKA, 2013, p. 97). 170 “Indicar representante para o Conselho Gestor; disponibilização de espaço para caixas coletoras; orientação aos consumidores quanto aos procedimentos de coleta; controle dos lotes: pesagem e identificação; disponibilização de espaço para armazenamento de lotes, conforme normas de segurança estabelecidas no Programa Nacional; alimentar o programa de gerenciamento padronizado dos lotes: informações quanto aos lotes de devolvidos pelos consumidores, bem como as informações quanto aos estoques vencidos e/ou danificados de seus próprios estoques; e adesão voluntária ao Programa Nacional de Destinação Ambientalmente Adequada de Medicamentos” (HIRATUKA, 2013, p. 97). 171 “Recolhimento dos lotes junto ao varejo; disponibilização de espaço para armazenamento de lotes, conforme normas de segurança estabelecidas no PNDAARM; indicar representante para o Conselho Gestor” (HIRATUKA, 2013, p. 97). 172 “Financiamento do programa; e Indicar representante para o Conselho Gestor” (HIRATUKA, 2013, p. 98). 173 “Colaborar para a definição das diretrizes e normas do Programa Nacional de Destinação Ambientalmente Adequada dos Resíduos de Medicamentos (PNDAARM); e Indicar representante para o Conselho Gestor” (HIRATUKA, 2013, p. 101). 174 “Nomear membro para o Conselho Gestor; Selecionar, organizar e credenciar a rede de parceiros (prestadores de serviços) em nível local em conformidade com as diretrizes e normas do PNDAARM; Controlar/Monitorar os lotes gerados nas redes de farmácias e drogarias e sua destinação; Implantar nas unidades parceiras o programa de gerenciamento padronizado dos lotes conforme planejado e definido pela entidade gestora do PNDAARM; Fiscalizar os serviços de transporte e adequação do tratamento em nível local em conformidade com as diretrizes e normas definidas pelo PNDAARM; Remunerar, mediante o cumprimento das metas, todos os prestadores de serviços que fazem parte da rede; Descredenciar prestadores de serviços que não estiverem em conformidade com os procedimentos do programa”(HIRATUKA, 2013, p. 102). 175 “Realizar o planejamento de metas e o contrato de gestão com as operadoras regionais/locais; Monitorar os serviços executados pelas operadoras regionais/locais; Repassar os recursos oriundos da indústria para os
149 106). Cabe às empresas prestadoras de serviços de transporte, logística e as que prestam serviço de tratamento e disposição final de resíduos perigosos: a) realizar serviço de logística de transporte conforme normas estabelecidas no PNDAARM; b) realizar o tratamento ambientalmente correto conforme as normas estabelecidas no PNDAARM; c) se houver necessidade de ponto de transbordo, assumir a responsabilidade por todos os procedimentos de segurança segundo as normas estabelecidas no PNDAARM; d) implantar e alimentar o programa de gerenciamento padronizado dos lotes: fornecer informação por lote transporte concluído e destinação concluída; e) enviar, na periodicidade necessária estabelecida pelas operadoras regionais/locais do PNDAARM, todas as informações solicitadas para checagem de cumprimento de metas (HIRATUKA, 2013, p. 97-106). O MMA recebeu três propostas de acordo setorial da cadeia produtiva de medicamentos: indústria, comércio e distribuição até abril de 2014. Porém em função da ausência de instrumentos que possibilitassem a criação de um sistema de governança integrado que permitisse o gerenciamento dos resíduos de forma segura, tais propostas não foram aceitas: “[…] elas não possuíam o encadeamento necessário para propiciar o gerenciamento dos resíduos desde o ponto de descarte até a disposição final dos rejeitos” (ASCOFERJ, 2016). O MMA empreendeu mais duas reuniões que não obtiveram êxito. Em abril de 2015, o Ministério encaminhou correspondência a todos os representantes do setor farmacêutico, solicitando uma proposta única. O setor de distribuição e logística mandou proposta semelhante à que tinha anteriormente enviado, o comércio solicitou prorrogação do prazo e a indústria apenas efetuou reunião com o MMA reafirmando os pleitos iniciais. Permanece o impasse: […] membros da cadeia produtiva de medicamentos atribuíram uns aos outros as principais responsabilidades pelo gerenciamento dos medicamentos vencidos. Nesse contexto, as propostas tornaram-se divergentes. Nenhuma delas forneceu dados sobre a forma como deverá ser feito o recolhimento dos medicamentos. Há também uma série de exigências relacionadas a isenções fiscais e tributárias, o operadores regionais/locais; Divulgar resultados e prestar contas à sociedade; Realizar campanhas educativas/publicitárias; Desenvolver o programa de informática padronizado para gerenciamento dos lotes e controle dos serviços de destinação adequados; Articular a produção e financiar a reposição as caixas coletoras padronizadas conforme as especificações do PNDAARM; Avaliar e realizar a revisão periódica das metas, diretrizes, abrangência, normas e custos do PNDAARM; e Quando necessário promover campanhas de coleta junto às operadoras regionais/locais (HIRATUKA, 2013, p. 102).
150 que dificulta ainda mais as negociações com o setor, já que o cumprimento da Política Nacional de Resíduos Sólidos não pode ficar condicionado a outros normativos legais (ASCOFERJ, 2016).
Segundo o próprio MMA, o setor de medicamentos está, por meio dos planos contraditórios e divergentes, procrastinando a apresentação de uma proposta unificada e que tenha efetividade, além disso, tem persistido em fazer exigências para o cumprimento da lei, alegando que não vê necessidade no recolhimento de todos os medicamentos adquiridos pelos consumidores, deixando, atualmente, o ônus de recolhimento desses resíduos para as prefeituras. O poder executivo deverá exercer as suas prerrogativas estabelecidas no Regulamento da Lei, caso o setor não apresente nenhuma proposta consistente, e baixar um decreto regulamentando o recolhimento dos medicamentos descartados pelos consumidores (ASCOFERJ, 2016). Face este impasse, não foi estabelecido, portanto, nenhum sistema ou programa de logística reversa para recolher os resíduos de medicamentos domiciliares na RMR, instrumentalizado pelo setor produtivo farmacêutico, conforme estabelece a Lei da PNRS. Além disso, nenhum instrumento de práticas pedagógicas sistemáticas de educação ambiental massificada que oriente a população sobre o descarte correto de medicamentos, foi estruturado e implementado. O Conselho Regional de Farmácia de Pernambuco tem empreendido ações pontuais, de eficácia limitada e cosméticas. Tais ações teriam como alvo efeito pedagógico e ações de marketing da instituição, além disso, a capacidade instalada é insuficiente para solucionar o problema da dispersão 176.
176 “[…] Conselho Regional de Farmácia do Estado de Pernambuco (CRF-PE) a lançar o programa Descarte Seguro. A iniciativa foi lançada na manhã nesta terça-feira (20/01), no Parque Treze de Maio, no centro do Recife, ocasião em que farmacêuticos e estudantes de farmácia participaram de ação de prestação de serviços gratuitos à população. A data escolhida tem um motivo: 20 de janeiro é o Dia Nacional do Farmacêutico. 'A maioria das pessoas desconhece os riscos do descarte inadequado dos medicamentos. Nosso objetivo conscientizar a população quanto a esses riscos e possibilitar à mesma um destino adequado para os medicamentos dos quais não façam mais uso ou que estejam com prazo de validade vencido', informa Gisêlda Lemos, vice-presidente do CRF-PE […] O serviço de coleta de medicamentos em desuso ou vencidos será oferecido na sede do CRF-PE […] Uma estação de recolhimento passará a funcionar no local a partir desta quarta-feira, 21. O serviço é gratuito e direcionado às pessoas físicas […] Os medicamentos entregues na estação de coleta do CRF serão incinerados por uma empresa especializada em tratamento desse tipo de resíduos, considerado perigoso” (CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DE PERNAMBUCO, 2015).
151 Outro programa de logística reversa de medicamentos, de iniciativa pública, tem sido experimentado no Recife. Com área de atuação restrita e sem divulgação em massa: os resíduos de medicamentos poder ser levados às Unidades Básicas de Saúde. A Emlurb (Empresa Municipal de Limpeza Urbana) efetuou contrato com empresa que presta serviço de tratamento e destinação final de resíduos perigosos, a mesma recolhe os resíduos de medicamentos domiciliares para serem incinerados. A Emlurb está estruturando um programa de educação voltada para o consumo e descarte de medicamentos para orientar a população sobre a importância de se descartar, de maneira correta, os resíduos de medicamentos domiciliares em desuso ou inservíveis: “Os usuários de insulina, por exemplo, são orientados a depositar as seringas utilizadas em garrafas pet que devem ser entregues nas unidades de saúde ou nas farmácias da família” (BEZERRA, 2015). A despeito das discussões em instâncias federais do acordo setorial previsto na Lei da PNRS e da Lei 14.236/2010, de instância estadual, está tramitando na Câmara dos Vereadores do Recife o projeto de lei 226/2014 que regula o descarte de medicamentos em desuso no município. A abrangência do mesmo inclui os medicamentos de uso humano e animal de vários tipos, como os antirretrovirais, os hormonais e os corticoides. A proposta é que o descarte seja uma obrigação das empresas
fabricantes,
importadoras,
distribuidoras
e
revendedoras
de
medicamentos (CÂMARA MUNICIPAL DO RECIFE, 2016)177.
177 “Segundo a justificativa do projeto, a intenção da iniciativa é a prevenção de danos ambientais e humanos. “A aprovação deste projeto de lei provocará o início a uma mobilização da população recifense e do empresariado do setor farmacêutico e hospitalar para melhorar as condições ambientais e de saúde da cidade”, explica Aimée Carvalho. Os medicamentos em desuso deverão ser entregues nos estabelecimentos que comercializam ou distribuem – mesmo que gratuitamente – esses produtos. O projeto de lei ainda estabelece regras para o acondicionamento e descarte dos remédios, que devem ser dispostos em embalagens invioláveis, resistentes e longe de locais que não sejam preparados para recebê-los. Também são previstas penalidades, tais como advertências e multas, para quem infringir as normas da matéria. Segundo Aimée Carvalho, o projeto ainda pode aliviar as contas públicas caso seja aprovado. “A proposição objetiva, também, retirar da responsabilidade do Poder Público uma atribuição de elevados custos econômicos para atribuí-la ao setor privado que atua na complexa cadeia de medicamentos, mas que auferem lucros elevados”, argumenta a parlamentar.” (CÂMARA MUNICIPAL DO RECIFE, 2016)
152
CAPÍTULO III ESTRUTURANDO UM SISTEMA DE LOGÍSTICA REVERSA
3.1 Caracterização da Empresa
A empresa Transportadora e Entregadora Expressa é um provedor de soluções logísticas, tendo alcançado a performance de 12 milhões de entregas realizadas no ano fiscal de 2015 (Junho de 2014 até maio de 2015). Atuando há mais de 70 anos no Brasil e presente de forma mais intensiva no Norte (segmento de eletroeletrônicos, motocicletas e peças de automóveis), nordeste (segmento de varejo; farmacêutico; cabotagem; indústria de bens de consumo, confecções, calçados), sudeste (setores: farmacêutico; bens duráveis; lâmpadas; telefonia; informática; calçados; cosméticos; perfumaria, confecções, e-commerce), além de expansão recente para o sul (setor calçadista e informática) e centro-oeste (polo farmacoquímico). Os 184 pontos de atendimento cobrem cerca de 5.000 municípios brasileiros, com 42 filiais instaladas (650 mil m² de área construída e de pátio), 9.000 funcionários, 3.000 veículos próprios e mais de 10.000 terceirizados. Transformou-se em player de soluções integradas de logística e supply chain há cerca de 20 anos, após mais de 50 anos atuando com o transporte rodoviário. Oferece o serviço de envio de encomendas expressas e cargas para quase 220 países por via aérea. Em 2012 tornou-se subsidiária de uma das maiores empresas de transporte de cargas e logística dos EUA, passando a engrossar o corpo de mais de 300.000 funcionários da holding. Certificada pelo ISO 9001 desde 1997, mais recentemente certificou algumas unidades com ISO 14001:2004 e OHSAS 18001:2007. Conta com mais de 17 mil clientes ativos. Oferece soluções de transporte e logística segmentadas: aéreo, rodoviário, logística, B2C e farma (departamento que atende especialmente as indústrias farmacêuticas, operadores logísticos do segmento e distribuidoras farmacêuticas com cargas de alto valor agregado, que requerem cuidados especiais
153 por se tratar de carga destinada à saúde e ao bem-estar humano. A empresa possui todas as licenças da ANVISA e das agências estaduais de vigilância sanitária). Está conectada nacionalmente por meio de Rede Integrada de Dados, Voz sobre IP e Videoconferência. Além de utilizar-se de várias tecnologias da informação: TMS (Sistema de Gerenciamento de Transporte); Expresso LOG (uma ferramenta desenvolvida para acompanhamento on-line dos serviços de logística. O cliente pode monitorar 24 hs o andamento do produto do seu ponto de partida até a sua chegada. Os módulos vão desde o Recebimento, passando pela Triagem, Embalagem, Expedição, Transferência, Distribuição e até a Logística Reversa); WMS (Sistema de Gerenciamento de Armazém); ERP (Sistema Integrado de Gestão Corporativa); integração nacional da base FISCAL (consolidando as mais distintas legislações estaduais) e EDI (utiliza EDI para troca de informações com os seus clientes e fornecedores que garante qualidade nos processos, rapidez, agilidade, segurança e confiabilidade nas informações trafegadas e processadas). A unidade de Recife, locus desta pesquisa, ocupa 45.000 m 2 no total, com 21.000 m2 de área construída, destes, 8.500 m2 estão reservados para área da logística (armazenamento, triagem, expedição, recebimento) que possui 10.000 pallet places (capacidade de empilhamento de mercadorias). O centro de distribuição tem 70 docas para carregamento ou desembarques simultâneos e que são operadas para atividades de expedição e recebimento, com a capacidade instalada operacional de 6.000 Ton/dia. A capacidade de circulação de veículos é de 150 que operam transferências entre filiais e 220 que efetuam entregas na RMR (25 estão reservados exclusivamente para a distribuição de medicamentos, passando por rigoroso sistema de higienização diariamente, programa de desinsetização e teste de opacidade trimestral, este teste permite o monitoramento das emissões dos veículos à Diesel). O quantitativo de funcionários que se revezam em três turnos, 07 dias por semana é de 980, entre operação e back-office. Esta unidade, que serve de hub para o norte e nordeste, recebe em média 50 Ton/dia de produtos farmacêuticos destinados às 08 (oito) centrais de distribuição de medicamentos (03 voltadas exclusivamente para atender às drogarias de suas próprias redes, 05 que atendem farmácias diversas) e 02 (duas) centrais de distribuição de redes de supermercados (que também possuem farmácias internas e
154 comercializam medicamentos), localizadas na RMR. As origens são as mais diversas: Fortaleza (CE), São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Teresina (PI), Goiânia (GO), e Belo Horizonte (MG), além de distribuir medicamentos produzidos no interior do estado: Caruaru e Vitória de Santo Antão. Não há a distribuição direta para as farmácias e drogarias, o medicamento é entregue às grandes redes e às centrais distribuidoras que efetuam os abastecimentos. Além do produto acabado, também abastece com insumos vindo da indústria química as plantas produtivas da cadeia farmacêutica na capital, laboratório estatal, interior do estado, cerca de 30 Ton/semana.
3.2 Operação do CD Recife
Em setembro de 2014 o índice de avarias dos produtos farmacêuticos (com a consequente geração de resíduos sólidos) estava em torno de R$ 300.000,00 por mês (em função do alto valor agregado de alguns medicamentos, quando considerada a volumetria/pesagem, não ultrapassa 500 kg/mês). Com vistas à redução destes índices e a adequação dos processos para a estruturação e implementação de um sistema de logística reversa que atenda ao estabelecido pela Lei da PNRS, foi empreendido o mapeamento dos processos para identificação dos nós da operação que apresentam oportunidades de melhoria. O mapeamento destes processos desde a origem dos produtos até a entrega ao cliente, permitiu a identificação de três grandes blocos de operação: a) transportes; b) movimentação interna (armazenagem); c) distribuição. a) transportes – diz respeito às atividades operacionais necessárias desde a coleta até o embarque entre as filiais de origem e destino: – erros na coleta dos produtos farmacêuticos (falta de análise da capacidade de empilhamento das caixas, permitindo que o excesso deste empilhamento cause avarias nas embalagens que estão na base da formação da carga); – má formação da carga (ainda que a carga esteja dentro do limite de
155 empilhamento, a colocação de outros tipos de produtos sobre um pallet já no limite provoca o excesso e a avaria das caixas que estão na base); – não utilização de equipamentos de contenção para a carga (problemas de desníveis das estradas e os trajetos prolongados – superiores, às vezes, a 3.000 km) podem causar avarias às embalagens mais sensíveis e frágeis, provocando rompimento do conteúdo; – ausência de check-list das condições dos veículos quando os mesmos são disponibilizados nas docas para carregamento (teste de “luz” que identifique rupturas das chapas do baú, tanto do teto quando das laterais e aberturas no assoalho que propicie a entrada de líquidos; e, teste que localize a presença de pragas, insetos); – não “envelopamento” da carga (aposição de lona plástica sobre os pallets, desde o início do compartimento de cargas até o final, comprovadamente reduz o risco de molhadura, o deslocamento dos veículos do Sudeste para o Nordeste obriga-os às constantes mudanças climáticas); b) movimentação interna: as atividades que ocorrem nas filiais de destino, desde o descarregamento até a armazenagem ou cross-docking178: – descarregamento de carga não unitizada (quando a carga não vem da origem unitizada – arrumada e ordenada sobre pallets em várias camadas –, a filial de destino então é obrigada a unitizar a carga, facilitando a movimentação interna, armazenagem e o posterior carregamento para a entrega (a fixação da carga no pallet é efetuada por meio da cobertura, ou envolvimento da carga, por meio de filmes Stretch, se as camadas forem insuficientes para consolidar o bloco, poderá haver adernamento e consequentemente o tombamento do bloco unitizado). Se esta operação não for efetuada da forma correta, pode ocasionar avarias (respeitar a capacidade máxima de empilhamento das caixas, altura máxima de montagem dos pallets, não ultrapassando 1300 mm, e nem a base excedendo as dimensões padrão – 1000 mm x 1200 mm); – equipamentos de movimentação interna de materiais inadequados (utilização de transpaleteira hidráulica para transportar carga unitizada de grandes dimensões e peso elevado é vetor potencial de acidentes, a devida utilização de equipamentos elétricos ou empilhadeira minimiza o risco); 178 “Transferir cargas recebidas para uma área próxima para expedição imediata […] isto é, as remessas nunca são preparadas e armazenadas” (GRANT, 2013, p. 102).
156 c) distribuição: as atividades que dizem respeito à entrega das cargas ao cliente destinatário. – separação indevida da carga para carregamento (não emissão de listas de separação acarreta na retirada de lote de carga indevido da estrutura porta-pallets, movimentação em excesso é fator gerador de avarias); – carregamentos dos veículos de porte médio em docas reservadas para veículos de grande porte (obrigando a utilização de plataformas móveis para transferência dos pallets do stage – plataforma fixa – do armazém para o veículo, as mesmas podem ficar desniveladas e provocar acidentes com avarias); – erro de carregamento para distribuição (o carregamento de cargas destinadas a uma rota em veículo que atende rota distinta), provoca o deslocamento indevido da carga, que deverá retornar, ser descarregada e sofrer posterior carregamento no veículo da rota correta, excessos de manuseios e movimentação, propensão à avaria e extravios; – avarias de transporte na distribuição (pallets sem equipamentos de contenção, sem amarração ou com erro de empilhamento podem sofrer adernamento
dentro
do
compartimento
de
carga
do
veículo
causando,
consequentemente, avarias profundas); – acidentes com equipamentos de movimentação de materiais (quando da retirada dos pallets do compartimento de carga, a desatenção com o nível da doca do armazém do cliente provoca o tombamento ou adernamento da carga que está sobre os mesmos, causando avarias); – medicamentos vencidos, as entregas de medicamentos são efetuadas por meio de agendamento, quando a carga chega no CD em Recife, a cópia da nota fiscal é enviada para a distribuidora que então planeja a “janela” de entrega, que vai depender inclusive de acordo comercial com o fornecedor, este prazo pode ser superior a 03 (três) meses. Em muitos casos, a indústria envia os medicamentos para o varejo com tempo de vida útil muito curto (18 meses), as redes de farmácias, por outro lado, não recebem medicamentos para comercializar com menos de 12 meses de intervalo para o vencimento da validade. No ato da entrega, após análises da distribuidora, quando constatado o tempo curto para distribuir o medicamento, todo o lote é devolvido e volta para o estoque
157 no CD da Entregadora para aguardar a decisão de devolução do remetente, por um prazo, muitas vezes, superior a 06 (seis) meses. Quando a autorização para devolução da carga é recebida, a mesma já está com a validade vencida e não lhe resta alternativa que não seja a incineração; – perfil de veículos inadequados para transportes de medicamentos (carregar veículos sem atentar para o perfil da carga x perfil do veículo x perfil do destinatário, um veículo de pequeno porte, conduzindo uma carga unitizada, pode não ser o ideal para o desembarque desta carga no armazém do cliente); – devolução no ato da entrega, por razões as mais diversas as distribuidoras podem recusar o recebimento de uma carga completa de medicamentos, desacordo comercial, por exemplo. As equipes de entrega não aplicam os mesmos procedimentos analíticos da integridade da carga que são aplicados quando da coleta, visto que a carga foi descarregada, manuseada pelo cliente e novamente unitizada, efetivamente estas atividades são geradoras de avarias, por manipulação excessiva e indevida; – desembarque do “retorno” no CD, em função da movimentação e do fluxo operacional (a ausência de docas e equipes reservadas para especificamente desembarcar cargas de medicamentos que foram recusadas ou coletadas no cliente pode ser vetor de geração de avarias), as equipes que operam cargas diversas não possuem treinamento específico de manuseio de produtos farmacêuticos. O mapeamento de todas etapas e processos foi concluído em novembro de 2014. Como plano de ação para corrigir as falhas operacionais e processuais foi elaborado pelo gestor da logística reversa, a farmacêutica responsável e o engenheiro de segurança do trabalho o Manual de Boas Práticas de Transporte e Armazenagem de Produtos de Interesse à Vigilância Sanitária, que passou a fazer parte dos Procedimentos Operacionais Padrão. O documento foi distribuído e disseminado por meio de treinamentos on the job em janeiro e fevereiro de 2015 (meses de baixa movimentação, parte dos laboratórios está de férias coletivas) com as equipes de operação (recebimento – armazenamento – separação – distribuição – entrega) dos produtos farmacêuticos: operadores, conferentes, empilhadores, separadores, carregadores, arrumadores, motoristas, assistentes, coordenadores e supervisores. Cada módulo ministrado foi
158 acompanhado da avaliação de reação para mensurar o aprendizado, os funcionários que as avaliações tiveram mais de 30% de respostas erradas, foram encaminhados para novo treinamento e reteste. Dos
meses
de
março
até
agosto
de
2015,
foram
efetuados
acompanhamentos e monitoramento do nível de adequação da operação às orientações do Manual de Boas Práticas, por meio dos indicadores corporativos de avarias e não conformidades. Em setembro de 2015, com o fechamento do 1º trimestre do ano fiscal FY16, constatou-se que o montante envolvido em indenizações de medicamentos por avarias reduziu para R$ 120.000,00 (em termos volumétricos não ultrapassando 200 kg). As atividades que mais impactaram esta redução e as oportunidades de melhoria que o Manual descreve, merecem destaque: – No ato da coleta: Observar atentamente as condições externas de cada volume, se alguma caixa estiver sem identificação, violada, manchada ou aberta, comunicar imediatamente ao responsável pela expedição para que sejam tomadas as devidas providências; Realizar o manuseio e o empilhamento das caixas respeitando a simbologia de empilhamento máximo citado na embalagem, assim evitando que avarie as caixas; Observar a posição para acondicionamento das caixas (setas de “Este Lado para Cima”) para que o produto interno não fique invertido, podendo em alguns casos vazar; Colocar os equipamentos de contenção de carga e fixá-los corretamente (a Figura 9 apresenta a visão do compartimento de carga de um veículo com o equipamento de proteção fixado); – No ato do descarregamento: Estacionar o veículo nas docas destinadas à descarga de produtos Farmacêuticos, ou seja, na doca da Área de Farma e apresentar-se à expedição com a respectiva documentação (Nota Fiscal) para a descarga e conferência; Solicitar ao rastreamento o destravamento do veículo, em seguida abrir as portas traseiras do veículo com cuidado, evitando desta forma uma possível queda de volume, pois pode ter ocorrido deslocamento de caixas até a chegada ao nosso centro de redistribuição; Iniciar o processo de descarga com cuidado, para assim evitar avarias nas caixas, e agilidade no descarregamento; Toda a carga deverá ser descarregada em paletes ou gaiolas quando necessário, em seguida separá-la por praça/n° de volume, realizando o
159 empilhamento conforme prescrito na própria caixa, quando se tratar de módulos de armazenagem obedecer aos padrões de posicionamento das setas. Durante o empilhamento, sempre colocar as caixas mais leves sobre as mais pesadas, agrupando e conferindo os volumes e etiquetas de cada nota fiscal; acondicionar todos os materiais em paletes e/ou gaiolas pequenas, evitando colocar diretamente em contato com o piso e afastados das paredes;
Figura 9: Equipamento de contenção de carga Fonte: http://aluplexbrasil.com.br/wp-content/uploads/2013/11/redecontenc3a7c3a3o-carga-1.jpg
Ao carregar os veículos de transferência de filiais, também respeitar os padrões determinados pelo cliente; todos os produtos perecíveis e/ou termolábeis serão desembarcados do veículo de coleta, as notas fiscais encaminhadas à expedição para a emissão de conhecimento e reembarcados para viagem/ transferência de filial, caso haja necessidade de pré-armazenagem por qualquer que seja o motivo, deverá ser comunicado imediatamente ao cliente e em seguida colocados sob refrigeração. – No ato da entrega: Manter o planejamento logístico da empresa (plano de rota); priorizar entrega de perecíveis por terem um prazo de refrigeração, “gelo”, de 48 horas a partir da data e hora da coleta; manter desligado os equipamentos do veículo enquanto estiver nas dependências do cliente [para que não ocorram
160 movimentos que possam causar acidentes ou tombamentos da carga] e não sentar ou subir sobre as caixas; apresentar-se a recepção de materiais munido da respectiva nota fiscal e após autorização, iniciar o processo de descarga, obedecendo às orientações do local de descarga do cliente; conferir na presença da pessoa responsável pelo recebimento, a quantidade de volumes e a integridade de cada volume a ser entregue; comunicar de imediato a filial responsável, quaisquer ocorrências como: avarias mecânicas, sobras ou faltas, acidentes e outros; contactar a filial responsável, quando ocorrer qualquer irregularidade na entrega seja na quantidade de volumes ou unidades; não entregar a vizinhos ou endereços que não constam na nota fiscal sem prévia autorização; – No ato da arrumação do veículo: durante o planejamento do embarque, verificar no armazém todas as cargas que tenham prioridade de embarque (clientes especiais), em seguida verificar o peso a ser carregado e cubagem destas cargas; verificar com o operador responsável pela arrumação, a carga a ser carregada, lembrando que é fundamental o embarque dos Produtos Farmacêuticos que possuam embalagens de vidro ou latas de alumínio, em gaiolas pequenas de transferência, a fim de evitar avarias dos mesmos durante a viagem; buscar a melhor metodologia para uma arrumação perfeita no baú [compartimento de carga]; Identificação: carga lastro, carga leve e cargas incompatíveis (exemplo: Bebidas alcoólicas, venenos, produtos químicos e radioativos, tintas, vernizes, baterias de carro, produtos inflamáveis, solventes, alimentos entre outros que ficará ao critério do farmacêutico responsável); analisar procedimentos de arrumação específicos de alguns clientes e as suas particularidades; verificar que carga, em função do peso, será colocada na altura do eixo; não deixar espaço na traseira do compartimento de carga do veículo. Se mesmo assim ficar, arrumar a carga de modo que fique [em nível] rebaixado, a fim de não provocar avarias; o compartimento de carga do veículo para transporte de medicamentos tem que ser, obrigatoriamente fechado após o término do carregamento. Como evitar pendências: Arrumar a carga conforme procedimento padrão; carregar e entregar obedecendo ao itinerário; não jogar a mercadoria a fim de evitar avarias; acondicionar em local adequado; obedecer à capacidade dos equipamentos de trabalho;
161 Se durante a coleta, manuseio e pré-armazenagem ou qualquer outro tipo de movimentação com cargas de medicamentos que possam causar contaminação isolar o local e comunicar ao farmacêutico e ao Técnico de segurança do trabalho; O produto avariado deverá ser retirado do local com auxílio de equipamentos adequados (EPI), quando houver risco e comunicar ao cliente remetente; se o produto for líquido, evitar derramamento no piso, paletes, gaiolas e demais produtos e, providenciar a limpeza da área onde ocorreu a avaria, lavando o local com água e detergente neutro; o manuseio das avarias somente deverá ser feito por pessoas devidamente treinadas; comunicar imediatamente o cliente sobre a avaria, analisar informações sobre o produto verificando se existe algum tipo de risco e providenciar o reparo do mesmo; Na ocorrência de avaria no ato da entrega, solicitar que o cliente recebedor registre no verso do comprovante de entrega: o produto avariado, as quantidades, e a nota fiscal envolvida; estas informações devem ser repassadas ao cliente remetente para que o mesmo adote as tratativas que julgar cabíveis; deve-se aguardar a emissão da NFe (nota fiscal eletrônica) de devolução das mercadorias avariadas para posterior retorno ao fabricante/distribuidora para que seja incinerado ou reembalado, de acordo com o nível da avaria.
3.3 Operação Reversa de Medicamentos na RMR
Conforme constatado, o que cabe às empresas prestadoras de serviços de transporte, logística e as que prestam serviço de tratamento e disposição final de resíduos perigosos se resume, no que tange à responsabilidade em estruturar e implementar um sistema de logística reversa, tão somente a: a) realizar serviço de logística de transporte conforme normas estabelecidas no PNDAARM [a Transportadora e Entregadora Expressa não mantém vínculo contratual com nenhum fabricante ou operador logístico do ramo farmacêutico para efetuar operações reversas de resíduos de medicamentos domiciliares, com todas as implicações inerentes, tais obrigações não foram previstas, logo, teriam que ser
162 efetuadas revisões contratuais com a inclusão de responsabilidades]; b) realizar o tratamento ambientalmente correto conforme as normas estabelecidas no PNDAARM [o core competence da Transportadora e Entregadora Expressa não lhe permite ou lhe faculta esta operação]; c) se houver necessidade de ponto de transbordo, assumir a responsabilidade por todos os procedimentos de segurança segundo as normas estabelecidas no PNDAARM [ a adequação operacional que o Manual de Boas Práticas estabeleceu, foi uma preparação para esta etapa do sistema reverso, com todos os vieses antevistos e mapeados]; d) implantar e alimentar o programa de gerenciamento padronizado dos lotes: fornecer informação por lote de transporte concluído e de destinação concluída [o parque tecnológico da Transportadora e Entregadora Expressa lhe permite atender a esta exigência, customizando o WMS para que efetue estes controles reversos, com as informações que lhe forem repassadas pelas distribuidoras de medicamentos]; e) enviar, na periodicidade necessária estabelecida pelas operadoras regionais/locais do PNDAARM, todas as informações solicitadas para checagem de cumprimento de metas [o WMS emite relatórios de operações efetuadas, caso seja necessária esta etapa]; Apesar desta restrição de responsabilidade, os planos de preparação e acondicionamento; coleta e transporte; beneficiamento; e destinação final junto com uma cópia do Manual de Boas Práticas de Transporte e Armazenagem de Produtos de Interesse à Vigilância Sanitária (posteriormente validado pelo setor de Gerenciamento de Risco e Segurança do Trabalho, gerente-geral da unidade e diretor de operações regional) foram apresentados ao operador logístico de 18 dos laboratórios farmacêuticos contratantes para que fossem anexados às propostas que deveriam ser enviadas ao MMA.
163
CAPÍTULO IV CONCLUSÕES
Dois vetores nortearam esta pesquisa: os moradores da RMR descartam resíduos de medicamentos domiciliares em desuso ou inservíveis de forma inadequada por não haver instrumento público ou privado que possibilite que descartem adequadamente; o descarte é também efetuado de forma inadequada por desconhecimento, por parte da população, dos danos que os medicamentos podem causar ao meio ambiente e à saúde pública. Estes vetores são o desdobramento natural de uma indagação imposta: os resíduos de medicamentos domiciliares em desuso ou vencidos em poder dos moradores da RMR são descartados de forma ambientalmente adequada, segundo o que estabelece a PNRS? A resposta a esta pergunta é negativa. Após 02 anos e seis meses, desde que o Edital de Chamamento foi publicado em outubro de 2013, ainda não houve acordo setorial, as propostas apresentadas foram consideradas sem integração e sem consistências pelo Comitê Orientador. As ações previstas de educação ambiental voltadas para doutrinar a população quanto ao consumo consciente e sustentável, bem como, quanto ao descarte adequado dos resíduos, que deveriam ser implantadas concomitantemente com o programa de logística reversa, também não foram estruturadas e nem implementadas. Outra questão foi percebida durante a análise do material coletado, embutida na primeira questão: qual a responsabilidade que um operador logístico, que efetua entregas de medicamentos em centrais distribuidoras de produtos farmacêuticos na RMR tem diante da exigência da Lei da PNRS de estruturar e implementar um sistema de logística reversa, face à responsabilidade compartilhada e atribuições individualizadas e encandeadas? Os questionamentos conduziram os rumos da pesquisa. A Lei da PNRS, seu Regulamento, editais, normas, outros ordenamentos jurídicos e resoluções foram analisados por meio da lente da logística, mais propriamente da logística reversa. Os aspectos legais da gestão e do gerenciamento integrado de resíduos sólidos, naquilo que tangenciava a estruturação e implementação do sistema de logística
164 reversa de medicamentos domiciliares –, foram esquadrinhados em buscas de subsídios que contribuissem para identificar a responsabilidade compartilhada de um operador logístico face o Edital de Chamamento 02 de 09 de outubro de 2013 do MMA, e contribuíssem para sistematizar o programa com todas as etapas a serem seguidas e com as responsabilidades identificadas e distribuídas. Os princípios da Prevenção e Precaução, Poluidor-pagador e Protetorrecebedor,
Desenvolvimento
Sustentável,
Ecoeficiência
e
Responsabilidade
Compartilhada pelo Ciclo de Vida do Produto foram analisados, mormente nos aspectos que estabelecem correlação com os sistemas de logística reversa. Tais lentes de análise também foram estendidas quando da análise dos objetivos (“não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos”; “estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços”; “integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos”; e “estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do produto”), instrumentos (“os planos de resíduos sólidos”; “a coleta seletiva, os sistemas de logística reversa e outras ferramentas relacionadas à implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos” e “educação ambiental”) e as diretrizes. A Lei da PNRS é permeada pela Responsabilidade Compartilhada. Por todo o ordenamento jurídico percebe-se claramente que o “espírito” que a dirige é de que todos os elos são responsáveis pelo retorno dos resíduos gerados que fluem no interior da cadeia produtiva de jusante a montante. Tão importante quanto recolher e dar o destino ambientalmente adequado aos resíduos sólidos é ter disponíveis instrumentos que contribuam para a redução dos resíduos na geração, no consumo desenfreado e irresponsável. Deixar de atuar nos efeitos e atuar nas causas é o mais efetivo modo de gerir um risco. Antes da estruturação de um sistema que recolha um tipo específico de resíduo sólido, se faz necessário investigar o resíduo e suas peculiaridades quanto à movimentação, manuseio e disposição final. Algumas normas da ABNT e Resoluções Colegiadas do Conama foram analisadas em busca do entendimento dos órgãos reguladores na tipificação do resíduo sólido de medicamento domiciliar
165 inservível, vencido ou em desuso. A constatação de que este resíduo é classificado como Perigoso – Classe I e como tal, deve receber a disposição final adequada: “aterro industrial nível 1, ser enviado para que seja objeto de co-processamento nos altos-fornos das cimenteiras ou seja incinerado em equipamentos que efetuem a recuperação energética e o tratamento dos gases efeito estufa”, estabelece diretrizes fundamentais para o projeto e planejamento do programa. Para entender o princípio-mor da Lei da PNRS, foi traçada a gênese da Responsabilidade Compartilhada desde a teoria da Sociedade de Risco do sociólogo alemão Ulrich Beck. Segundo esta teoria a sociedade do princípio do século XXI está sentindo os efeitos colaterais da Revolução Industrial, estão se concretizando as ameaças sociais e ambientais que pairaram sobre o planeta por quase 200 anos. A Responsabilidade Compartilhada é a correção da irresponsabilidade organizada, aquele estado em que os riscos, abstratos ou concretos, dos danos ambientais são ocultos e passa a vigorar a falsa ideia de que a ameaça não vai se concretizar ou que o dano ambiental foi corrigido (Tchernóbil é um trágico exemplo de um risco concreto, a negação do aquecimento global é outro exemplo drástico de um risco abstrato). Esta consciência de que todo o planeta corre risco cria o espaço para o surgimento de uma modernidade alternativa, a que ultrapassa as barreiras geopolíticas, religiosas, étnicas e as vaidades nacionais em busca de soluções globais. Não se pode buscar soluções locais para riscos globais, só com o compartilhamento de responsabilidades será possível mitigar, ou mesmo minimizar, os danos ambientais já em curso e evitar o surgimento de novos riscos que ameacem se tornar perigos e ponham a sobrevivência da humanidade sobre a Terra em xeque. A metodologia da Avaliação do Ciclo de Vida foi analisada em busca de respostas de como esta ferramenta auxilia na identificação da geração de resíduo em cada fase da vida de um produto, para que correlações com a logística reversa possam ser efetuadas. A logística reversa integrada é capaz de providenciar o retorno efetivo do resíduo para alguma fase anterior do processo, onde possa ser reaproveitado ou enviado para outra cadeia produtiva onde seja revalorizado, ou
166 ainda, receba a disposição final adequada, sem nenhum dano ou efeito colateral ao meio ambiente. A metodologia tem como precípua finalidade, a não-geração de resíduos. Os aspectos operacionais, táticos e estratégicos da logística reversa foram avaliados, esta que é o principal instrumento de concretização da Responsabilidade Compartilhada apregoada pela Lei da PNRS. A literatura acadêmica e técnica recente (depois de 2010) foram revisadas em busca de respostas para a questão do quão importante é de fato, a logística reversa para desfazer a entropia do sistema produtivo farmacêutico, reordenando este sistema, coletando o que está disperso ou “espalhado”. Este é um processo bastante complexo, visto que o sistema está aberto, por conta dos fluxos de matéria de dentro para fora e de fora para dentro e depende de variáveis que considerem a viabilidade econômica e legal da operação. A logística reversa certamente contribuirá com a reversão dos fluxos de dispersão dos resíduos de medicamentos domiciliares, a contribuição que ela pode dar para que a entropia seja desfeita é operacional, diminuir a dispersão, recolher, organizar e dispor onde necessário for o resíduo. Porém a resposta está muito aquém do que o quadro atual de produção, consumo e poluição requerem, e esta resposta plena não pode ser dada unicamente pela logística reversa, é necessário que o consumo sustentável seja estimulado pela educação ambiental e que os setores produtivos pratiquem um capitalismo ético, que sobreviva de prover as necessidades reais, não de transtornar o consumo em consumismo com propagandas que distorcem a imagem de desejo e necessidades. A
logística
inquestionavelmente,
reversa
é
consegue
um
instrumento
influenciar
os
para três
a
pilares
sustentabilidade, basilares
do
desenvolvimento sustentável: ambientalmente, por retirar do mercado os resíduos que poderiam degradar o meio ambiente e causar sérios problemas sanitários e de saúde pública; socialmente, por inserir no processo de separação dos resíduos as cooperativas de catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis, nas etapas de triagem e reciclagem das embalagens; e economicamente, por proporcionar que as embalagens e os resíduos sólidos possam ser reinseridos no ciclo produtivo ou ciclo de negócios, e criar oportunidades, facilitando que empresas especializadas em destinação final de resíduos façam negócios.
167 Os planos do programa de logística reversa foram moldados e estruturados a partir da realidade da unidade de Jaboatão dos Guararapes da Transportadora e Entregadora Expressa. Estas sugestões foram repassadas para o operador logístico contratante, que concentra mais de 90% dos clientes de produtos farmacêuticos que a Expressa presta serviço. O aumento da qualidade de alguns processos ligados à operação farmacêutica foi percebida por meio dos indicadores corporativos, redução do índice de avaria e indenização processual. A capacidade instalada está estruturada, aguarda a decisão do setor para que seja implementada, os benefícios advindos dos incrementos operacionais são perceptíveis. As propostas dos três setores da cadeia produtiva de produtos farmacêuticos (distribuição, comércio e indústria) que foram enviadas ao MMA não foram aceitas pelo CORI, apresentam vícios de formas e metas insuficientes. Não há transparência na definição dos papéis dos atores e suas responsabilidades diante do que a Lei da PNRS estabelece. Estas propostas serviram apenas para procrastinação da implantação dos sistemas de logística reversa. O desafio maior compreendido não é estruturar e implementar um programa de recolhimento de resíduos de medicamentos domiciliares, convergindo os mais distintos interesses. E sim, empreender uma pesquisa de alcance nacional, com amostra probabilística, com instrumentos que possibilitem a quantificação, por meio de pesagem, dos resíduos de medicamentos vencidos ou em desuso de posse da população e qual destinação atual de tais resíduos. Isto permite saber qual o tamanho exato do problema. Esta metodologia ainda não foi aplicada no Brasil e recomenda-se a mesma para estudos futuros, que também possa contribuir para a estruturação de um programa de educação ambiental que contribua para disseminação do consumo sustentável e consciente do produto farmacêutico, com todas as implicações que um programa assim exigiria.
168
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