AH - Agronotícias | 25 de março de 2016

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Especial do jornal A Hora

MARÇO | 2016

Circulação mensal ANDERSON LOPES

Transição gradual Falta de informações, desorganização de cadeias produtivas e limitações de mercado retardam o crescimento de culturas que buscam pluralizar e aumentar a renda dos fumicultores. Expoagro Afubra mostra alternativas para diversificar.

Páginas 6 a 20


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Receita torna cultivo absoluto

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tabaco é hoje a mais importante cultura agrícola não alimentícia do planeta e contribui substancialmente para as economias de mais de 150 países. O impacto da produção ajudou a levar o Brasil à posição atual de segundo maior produtor de fumo do mundo e de líder nas exportações mundiais. Estar alicerçado em um sistema de produção integrada que assegura a compra de toda a safra pelas indústrias, com remuneração acordada previamente, orientação técnica na propriedade e financiamento dos insumos, torna o setor do tabaco em um dos que maior segurança e renda oferece dentro da agricultura familiar. Esse sistema é altamente sustentável. O tabaco ocupa apenas 2,64 hectares, em média, o equivalente a 16,8% do tamanho médio das propriedades produtoras, que é de 15,7 hectares. A renda do cultivo, porém, representa expressivos 53,1% da receita anual. Essa proporção de retorno econômico explica por que mais de 168 mil produtores se mantêm fiéis à atividade. Nenhum outro produto alcança tamanho resultado em pequenas propriedades e tal dimensão de cultivo. Baseado na agricultura familiar, e na grande maioria dos casos em terrenos de topografia acidentada, onde o uso de máquinas para produzir grãos é inviável, o tabaco é um caso de sucesso no minifúndio brasileiro, seja pela rentabilidade, pela segurança de comercialização ou pela diversidade de outras atividades econômicas

Índice

Editorial Exigência de PPCI preocupa setor produtivo

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Especial – Tabaco – Sobram alternativas, falta rentabilidade

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Mais tempo para fazer cadastro

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Abertura de mercado chinês ameaça produção de maçãs

Tenho dito A seguir, a opinião sintetizada sobre este caderno dos integrantes do grupo de discussão, que participam a cada mês da elaboração das principais pautas e temas abordados.

O tabaco continua importante na pequena propriedade por ser uma cultura passível de ser feita em pequenas áreas de terras e com alta rentabilidade. Além disso, é uma cadeia produtiva bem organizada, tecnificada e com mercado para seus produtos, principalmente internacional. A atividade leiteira é uma boa opção de diversificação nas propriedades fumageiras. Oreno Ardêmio Heineck – Diretor-executivo do GL) Instituto Gaúcho do Leite (IGL)

A diversificação é necessária, mas esbarra, além da questão de receita, na falta de recursos para mudar a matriz produtiva, dificuldades de mercado e demora no retorno financeiro. que comporta. Adaptou-se perfeitamente bem à região e à vocação de seus produtores, com impacto significativo da tecnologia e da assistência técnica. Estudo da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra) mostra que a relação custo-benefício é muito favorável. Para exemplificar, na safra 2013/14, um hectare de tabaco gerou receita de R$ 16,4 mil. A mesma área com milho alcançou R$ 1,8 mil, ou apenas 11% do valor. Em pequenas áreas e na proporção em que é produzido na Região Sul, o tabaco é insuperável. Alguns produtos, como olerícolas ou frutas, em pequena escala podem gerar faturamento próximo, mas à medida em que a produção e a oferta ao consumidor crescem cai o valor de mercado. Além disso, não há um preço mínimo e garantia de compra de toda produção por parte das indústrias. É preciso encontrar alternativas, cuja rentabilidade se equipare ao tabaco, que neste ciclo chega a R$ 23 mil de faturamento bruto. É preciso reconhecer os males que são causados pela cultura. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), por ano ocorrem uma média de 6,4 milhões de mortes em todo o mundo devido a doenças ligadas ao consumo de tabaco e, por isso, a entidade tem uma luta ferrenha contra a produção. No entanto, a OMS não faz qualquer movimento de estímulo à diversificação de culturas. É preciso cobrar para que faça sua parte e estimule a diversificação, as diretrizes aprovadas em Moscou no ano passado. Apesar de ser controversa, enquanto não houver alternativas rentáveis, oferta de crédito acessível, orientação técnica, garantia de preço e de compra de toda produção, o agricultor continuará plantando tabaco por uma questão de segurança, principalmente financeira.

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produção de tabaco, além de ser uma das principais fonte de A pr renda na pequena propriedade, também é importante para a indústria, pois dá oportunidade de trabalho para a população urbana. No momento, ainda devemos dar condições ao produtor, seja com orientação técnica, financiamento, para que ele continue produzindo e aumente seus lucros. As alternativas para ele substituir o tabaco estão acontecendo, no entanto, devemos buscar outras possibilidades para as indústrias e seus empregados, bem como os municípios onde as fábricas estão instaladas. A Expoagro Afubra se mostra um local onde o produtor encontra soluções alternativas para toda cadeia produtiva do tabaco. Gilberto Moacir da Silva – Médico-veterinário e consultor técnico

O tabaco proporciona boa rentabilidade ao produtor. A atividade, ividade, basicamente manual, é muito praticada em áreas de relevo vo acentuado onde outras culturas têm o manejo dificultado para o uso de maquinários. Além disso, necessita de pequenas áreas para garantir o sustento da família. Esses são os principais fatores para a persistência das famílias nessa cultura. Outro destaque são as décadas de assistência técnica de qualidade por parte das indústrias para obter o produto desejado uma vez que a maior parte (85%) é destinada para a exportação. Resumindo: rentabilidade, área e assistência como tripé para motivação ao produtor. duto Lauro Baum – Presidente do STR de Lajeado

Boa leitura

Fundado em 1º de julho de 2002 Vale do Taquari - Lajeado - RS

DIREÇÃO EDITORIAL Fernando Weiss

COORDENAÇÃO Giovane Weber

Diretor Geral: Adair Weiss Diretor de Conteúdo: Fernando Weiss Diretor de Operações: Fabricio Almeida

PRODUÇÃO Giovane Weber

ARTE Gianini Oliveira e Fábio Costa

Tiragem desta edição: 10.000 exemplares. Disponível para verificação junto ao impressor (ZH Editora Jornalística)



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Entidades representativas buscam adequação da Lei Kiss. Anteprojeto está em fase de elaboração. Apesar de casos de incêndios serem recorrentes, principalmente em aviários, produtores contestam medida e argumentam que medida é desnecessária e aumenta os custos de produção.

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Exigência de PPCI preocupa setor produtivo GIOVANE WEBER

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exigência de elaboração do Plano de Prevenção e Proteção contra Incêndio (PPCI) nos imóveis rurais definida pela lei 14.376, conhecida como Lei Kiss, preocupa produtores e representantes da cadeia produtiva. Lideradas pelo Fundo de Desenvolvimento e Defesa Sanitária Animal (Fundesa), nove entidades propõem a dispensa do PPCI em aviários, chiqueiros, pocilgas, estrebarias, estábulos, bretes, criadouros, instalados em edificações rudimentares ou provisórias. Conforme o presidente Rogério Kerber, a lei é muito ampla e por isso ele defende uma adaptação à realidade do setor. Com a maior parte das estruturas de produção de suínos e aves automatizadas, destaca que a presença de pessoas nesses locais, até por questões de sanidade, é limitada e por períodos muito curtos durante o dia. “Apenas ocorre uma vistoria para ver se tudo está dentro da normalidade. Diferente de uma indústria, restaurante ou clube onde a presença de pessoas é contínua e por longas horas.” Com quase 50 anos de experiência na atividade rural, Kerber, que também atua como diretor-executivo do Sindicato das Indústrias de Produtos Suínos do Rio Grande do Sul (SIPS/ RS), reforça que não recorda de nenhum incêndio ligado à suinocultura. “A lei protege a vida humana. Não existe risco comprovado que justifique a adoção do plano. Seria mais um custo ao produtor.” O argumento é reforçado

Nos aviários de Lamm, todo processo é automatizado. A entrada é limitada e apenas ocorre em casos de anormalidades nos sistemas

por José Eduardo dos Santos, diretor-executivo da Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav). “O risco é zero. Não se precisa instalar um sistema hidráulico, ou diferentes tipos de extintores de incêndio. Precisamos adequar a lei à realidade de cada segmento.” Na indústria de aves faz mais de 20 anos, Santos diz não ter conhecimento de incêndio em aviários. A Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag-RS) pretende excluir hortigranjeiros e agroindústrias familiares da exigência de PPCI. A justificativa é de que o investimento é inviável e desnecessário nas estruturas. Entre as exigências da

Como todo processo é automatizado, entramos no aviário apenas quando ocorrem problemas no sistema de alimentação. Sírio Lamm, produtor

lei, estão a obrigação de instalar hidrante, porta de emergência, extintores, reservatório de água, entre outros. Uma proposta de mudança para a Lei 14.376 foi encaminhada pelo Conselho Estadual de Segurança, Prevenção e Proteção Contra Incêndio (Coesppci) ao governador José Ivo Sartori em janeiro. O projeto já passou pela Casa Civil, que remeteu à direção-geral da Secretaria da Segurança Pública. Hoje, o anteprojeto está em fase de elaboração. Ou seja, ainda pode sofrer alterações. Entre as mudanças propostas pelo Conselho ao governador, está a isenção de PPCI em edificações agropastoris de


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exploração familiar, como silos de pequeno porte, aviários e pocilgas, informa o major Everton de Souza Dias, chefe da divisão técnica de Prevenção de Incêndio do Corpo de Bombeiros. A proposta final com as alterações será encaminhada para a Assembleia Legislativa.

“Será mais um custo” Sírio Lamm, 68, de Travesseiro, se dedica à avicultura faz mais de 30 anos. Neste período, foi registrado apenas um princípio de incêndio durante a queima de penas, durante a limpeza da estrutura. Critica as exigências da lei. “É mais um custo. Algumas pessoas sem conhecimento de como funciona o trabalho nas propriedades criam e aprovam essas leis e quem paga somos nós. O risco de alguém morrer dentro de um aviário é quase nulo, ainda mais em um incêndio.” Com todo processo automatizado, em caso de um fio elétrico tocar o chão ou a tela, o sistema é desativado na hora. Além da colocação dos fios em dutos, os fornos foram instalados em prédios de material, acoplados

aos aviários. O calor é levado ao interior por meio de um cano de inox. “Pagamos seguro de R$ 1,6 mil por ano para compensar possíveis perdas com vendavais ou incêndios.”

Mais casos em aviários No RS, a ocorrência de incêndios em aviários é recorrente. O sinistro geralmente está relacionado a falhas na rede elétrica ou caldeiras usadas para aquecer as estruturas durante os dias de frio. O último caso registrado no Vale do Taquari aconteceu no dia 5 de outubro do ano passado em Linha Lenz, em Estrela. O sinistro teria iniciado no forno. No aviário, havia 21 mil animais, dos quais 12 mil morreram devido ao calor e à fumaça. De acordo com o filho Egídio, o forno foi reformado antes de receber este novo lote. “Estava bem vedado, mas como o prédio está localizado na parte alta onde pega bastante vento, qualquer faísca pode originar um incêndio.” Um levantamento inicial apontou prejuízo de R$ 100 mil. Além da estrutura e equipamentos, queimaram 30 metros de lenha,

armazenados ao lado da caldeira. O sistema é elétrico e o avicultor programa o aparelho para ser acionado caso a temperatura fique abaixo do mínimo. A família se dedica à atividade faz 18 anos. São dois aviários com capacidade de alojar 42 mil aves por lote.

“O ideal é ter seguro” O gerente de uma empresa especializada na venda de equi-

pamentos para aves e suínos, de Lajeado, Lucélio Lunedo, destaca os cuidados para evitar esse tipo de prejuízo em aviários. Recomenda uma reforma da caldeira a cada três anos, além de evitar o depósito de lenha ao lado da estrutura e providenciar a colocação de dutos para proteger os fios elétricos. “O ideal é ter seguro. Algumas empresas exigem até extintores. O melhor é monitorar e evitar o acúmulo de penas perto da estrutura, pois elas são altamente inflamáveis.”

Procura aumenta Para dar continuidade à produção em caso de sinistro (incêndio, temporal ou vendaval), os produtores começam a recorrer ao seguro. As modalidades oferecidas contemplam criações de aves, suínos ou até mesmo toda propriedade. Conforme o corretor Rogério Lourenço, de Lajeado, os valores variam de acordo com a atividade. Os mais procurados são para a avicultura, setor em que as perdas são mais recorrentes. Na região, 600 estrutu-

ras têm seguro. Para o setor, são colocadas à disposição do cliente três modalidades. “O valor mínimo pago por ano é de R$ 800. Varia de acordo com a metragem, tempo de construção e para qual tipo de sinistro o produtor queira se prevenir.” No caso da suinocultura, o valor mínimo é de R$ 550. A modalidade porteira fechada tem valor inicial de R$ 1,1 mil. Segundo Lourenço, o seguro passou a ser uma exigência das próprias integradoras.


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No Brasil, a produção de fumo gera renda para cerca de 168 mil agricultores, 80 mil só no RS. Desde 2005, o país faz parte de um tratado internacional que reúne 180 nações para reduzir o consumo de tabaco, responsável por muitas doenças. Como as medidas devem afetar diretamente a produção no campo, sindicatos, Emater e entidades representativas do setor buscam maneiras de diminuir a dependência econômica dos fumicultores estimulando a diversificação nas propriedades.

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Na propriedade da família Brandão, interior de Progresso, o tabaco começa a dividir espaço com a produção leiteira. Embora a lucratividade seja menor, Venícios entende ser fundamental

Sobram alternativas, falta rentabilidade

C

om os 60 mil pés de fumo colhidos em uma área de quatro hectares, em Linha Anto Bravo, a 18 quilômetros do centro de Progresso, Venícios Brandão, 22, comemora a boa cotação da cultura neste ciclo. Embora as intempéries meteorológicas tenham causado queda de 40% na produtividade, ainda é o fumo que põe no caixa da família o maior percentual da renda por hectare – cerca de R$ 12 mil. Após concluir o curso de Técnico Agrícola há dois anos, por intermediação do professor, Brandão voltou para a propriedade dos pais. No mesmo período, colocou em prática o

aprendizado adquirido durante a formação e o estágio, onde trabalhou durante 12 meses na criação de suínos. Dos 36,6 hectares, apenas a metade é cultivável. O restante é mata nativa e área de preservação permanente. No local, estão espalhadas caixas de abelhas, cuja maior parte da produção é destinada ao consumo familiar. No restante, o tabaco ainda reina absoluto. Aos poucos, a produção leiteira, 250 litros diários, ajuda a incrementar os lucros. A matéria-prima das 16 vacas em lactação é destinada para uma cooperativa de Encantado. “Igual ao tabaco, temos garantia de orientação

técnica, boa remuneração e pagamento sem atrasos.” Para tocar a propriedade, Brandão conta com a ajuda dos pais e de dois irmãos. Ao longo do ano, todos se revesam para cuidar do rebanho e do plantio de tabaco. “Precisamos diversificar, mas está difícil encontrar uma cultura mais rentável em uma área pequena.” A família investiu R$ 100 mil na construção de um galpão, compra de um trator, instalação de uma sala de ordenha e um resfriador a granel. O jovem reclama da infraestrutura precária do interior. “Não há água encanada, sinal de internet e celular funciona apenas com antena. Não vejo isso como um

conforto, mas uma necessidade mínima para ficar no campo. Tudo faz parte do processo de melhora na gestão, acesso à informação, aumento da produtividade, da nossa renda e qualidade de vida.” A tentativa de Brandão em diversificar, freada pela dependência econômica do tabaco, retrata parte da realidade dos 80 mil fumicultores gaúchos. Depois de 11 anos da ratificação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco pelo Brasil, encontrar alternativas viáveis a essa cultura ainda é o grande desafio do segundo maior produtor mundial e líder em exportações desde 1993.


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Área reduz em 30%

Precisamos diversificar, mas está difícil encontrar uma cultura mais rentável em uma área pequena evitar a dependêrncia de apenas uma cultura

Venícios Brandão, produtor

Em Progresso, conforme dados da Emater, a área cultivada reduziu em 30% nos últimos 15 anos. A atuação de cooperativas estimula investimentos nas cadeias leiteira e suína. No entanto, para muitas famílias o tabaco ainda é a principal fonte de lucro. Segundo a extensionista Simone Teresinha Kotz Wobetto, o fato de muitas famílias ainda trabalharem em áreas arrendadas ou em regime de parceria, devido à boa lucratividade, faz o tabaco ser a principal cultura. “Quem conseguiu comprar sua terra tem mais facilidade de diversificar. Aqueles que moram de aluguel plantam o que o patrão determina e dá dinheiro, ou seja, fumo.” Neste ciclo, 614 famílias cultivaram 1,6 mil hectares. A média colhida por hectare chega a dois mil quilos.

Na Chamada Pública de Diversificação do Tabaco e Pública da Sustentabilidade, em torno de 180 agricultores recebem orientação técnica e alternativas para reduzir a dependência. “É um trabalho de formiguinha. Diariamente fazemos visitas e tentamos estimular o produtor a ter novas formas de gerar renda na propriedade. A grande dificuldade é o valor ganho por hectare e todos os benefícios que a indústria oferece. Nos demais setores, essas vantagens são menores e geram um lucro inferior.” Entre as atividades, a cadeia leiteira é a que ganha mais adeptos. Houve um acréscimo de 70% na produção nos últimos dez anos. São 279 produtores, cuja produção anual alcança 10,6 milhões de litros. São 12 suinocultores e 78 produtores de frangos.


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Fique atento Quando: Dias 21, 22 e 23

Onde: Parque da Expoagro Afubra – BR 471, km 161, Rincão del Rey, Rio Pardo

Horário: das 8 às 18h, com entrada franca

Expositores: mais de 400, entre empresas, instituições e entidades. Segundo Werner, a renda do tabaco, na média, somada à obtida com a diversificação aumentou a receita das propriedades em até 24,6% desde 2011

“Diversificar é uma coisa, renda é outra” A lavoura do produtor é diversificada, no entanto, a renda com o cultivo de tabaco desbanca as demais alternativas, como a criação de suínos e aves, a produção de leite e de grãos e o reflorestamento. Levantamento da Afubra revela que, na safra de 2005/6, 73% da renda das propriedades dos fumicultores tinha origem no tabaco, 16% na produção animal e 11% na produção vegetal. Na safra 2014/15, a área média das propriedades é de 15,3 hectares, sendo que apenas 17,6% do terreno é destinado ao cultivo de tabaco, que alcança 51,4% da renda do produtor. O cultivo do milho respondeu por 22,5%, a soja por 7,8%, o feijão por 1,8%, e outras culturas por 3,1%. A pastagem ocupa 20,3% da propriedade e o índice de cobertura florestal é de 26,9% com áreas de mata nativa preservada

(15,7%) e reflorestada (11,2%). Em termos de valores da renda média da propriedade, a receita bruta chega a R$ 81 mil e o tabaco participou com R$ 43.462. Ou seja, ele continua sendo uma importante fonte de renda da propriedade. Os investimentos em outras atividades resul-

taram na diminuição da área plantada no Brasil em dez anos, de 439,2 mil hectares para 342,9 mil hectares. O número de fumicultores também caiu neste período, de cem mil para 80 mil famílias produtoras no estado. Para Benício Werner, presidente da Afubra, esses números mostram

O produtor sempre optará pela cultura que lhe traga mais renda. E, até o momento, o tabaco continua sendo essa cultura, em pequenas áreas de terra.” Benício Werner, presidente da Afubra

que a diversificação faz parte da propriedade fumicultora. Para auxiliar os agricultores a apostar cada vez mais em outras atividades, ocorre a 16ª Expoagro Afubra, nos dias 21, 22 e 23, em Rio Pardo, considerada a maior feira da agricultura familiar no país. Segundo Werner, a exposição é um local de conhecimento e informação. Os produtores têm à disposição o que existe de novo em termos de culturas, tecnologias e equipamentos. Palestras técnicas, lavouras demonstrativas, máquinas, exposição de animais, entre outros, abrem o leque de opções para a pequena e média propriedade rural. “As instituições que estão presentes na feira têm oportunidade de promover suas atividades e em prol dos projetos e políticas públicas desenvolvidas, sendo o maior exemplo a Emater”, cita.

Alimentação: três restaurantes com bufê e quatro lancherias

Estacionamento interno: 6 mil veículos

Informação: www.afubra.com.br

Atrações: Exposição de máquinas e equipamentos, lavouras demonstrativas, dinâmica de máquinas, Dia do Arroz, piscicultura, animais (ovinos, caprinos, gado de corte e de leite, aves), Seminário de Turismo Rural, Fórum de Diversificação, palestras técnicas, avicultura colonial, usina de biodiesel, microdestilaria de álcool, quintais orgânicos, agroindústrias, espaço cultural, hortaliças, área florestal, entre outras.


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DIVULGAÇÃO

Receita média cresce 24% A renda do tabaco, na média, somada à obtida com a diversificação aumentou a receita das propriedades rurais nos últimos anos. Conforme a Afubra, houve um acréscimo de receita de 24,6%, comparando 2011/12 com 2013/14. No entanto, a rentabilidade para o produtor com o tabaco nas duas últimas safras foi menor do que no ciclo 2012/13. A principal causa é o maior rigor na comercialização, provocado, especialmente, por um desequilíbrio entre a oferta e a demanda, em consequência do aumento significativo da produção na África. O número de famílias produtoras, nos últimos cinco anos, reduziu em 17,7% na área de cultivo de tabaco. Benício Werner explica que nessa diminuição um percentual razoável migrou

para os centros urbanos. Outra parte também se estabeleceu com agroindústrias familiares. E muitos optaram pela criação de aves e suínos e produção leiteira. A área média de plantio aumentou em 0,45% nas propriedades. O novo panorama na geração de renda entre as famílias produtoras de tabaco não representou reflexos para as indústrias. Tanto que, conforme Werner, na última safra, houve mais oferta do que demanda do produto conforme informações das próprias fumageiras. A redução na área de cultivo segue as necessidades de produção para atender o mercado. Em conseqüência da orientação para diminuir o cultivo na próxima safra, o presidente da Afubra acredita no aumento do preço médio por quilo durante a comercialização.

“E com a diminuição de gastos com mão de obra, insumos, lenha e energia, ele terá um resultado melhor. Provavelmente a receita bruta será menor, porém, em termos de

resultado financeiro líquido, será melhor do que na atual safra, podendo inclusive aumentar a produção de culturas com as quais ele está diversificando”, explica Werner.

Feira oferece opções para que produtor diversifique sua propriedade, aumente a receita e diminua a dependência do tabaco


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Produtor depende menos do tabaco, revela pesquisa O aumento da diversificação nas propriedades mudou na última década o panorama quanto à geração de renda entre as famílias nas áreas de produção de tabaco. Levantamento anual do departamento de Pesquisa e Estatística da Afubra com os associados da Região Sul, ao final da safra, revela a participação cada vez maior na renda da produção animal e vegetal e o consequente aumento da receita total dos produtores com a redução da dependência do fumo. Os números mostram que na safra de 2005/6 o tabaco contribuía com 73% da renda das propriedades dos fumicultores, a produção animal com 16% e a vegetal com 11%. No ciclo 2013/14, a participação do tabaco na renda familiar total baixou para 53%, enquanto a produção animal aumentou para 26% e a agrícola para 21%. Já a área de cultivo de fumo oscila de acordo com a oferta e a demanda, com redução de 17,3% nesse período. O percentual em volume

de produção caiu 16,8%. “Isso quer dizer que tivemos um aumento de

Até para diarista precisamos assinar a carteira de trabalho Valmor Butzge, produtor

produtividade por hectare, o que representa ganho para o produtor”, esclarece Werner. O dirigente afirma que o aumento da diversificação de atividades torna as propriedades ainda mais sustentáveis e traz mais segurança ao produtor diante da redução do consumo de cigarros nos últimos anos. Além disso, o aumento da renda das famílias representa melhor qualidade de vida na área rural e viabiliza investimentos em novas tecnologias. Embora o período do comparativo do levantamento de dados coincida com a adesão do Brasil à Convenção Quadro para Controle do Tabaco, em 2005, Werner afirma que o início de mais investimentos em diversificação é anterior. Como prova, lembra da criação da Expoagro Afubra, em 2001, com o objetivo de propagar as reuniões técnicas e dias de campo já existentes e para divulgar as tecnologias à disposição do produtor rural, com o apoio de entidades e empresas. Além disso, a ANDERSON LOPES

diversificação faz parte dos objetivos da entidade desde a sua fundação, há 60 anos, constando do primeiro estatuto. A diminuição do consumo de cigarros, no entanto, principalmente entre 2012/13 e 2014/15, levou as entidades representativas dos produtores a divulgar ainda mais a diversificação de culturas

para tornar a propriedade mais sustentável. A criação da feira estimulou o interesse por novas atividades, com grande número de produtores constituindo agroindústrias, com a descoberta de um novo perfil de mercado, pois os consumidores se sentiram atraídos pelos produtos desses empreendimentos.

Leis trabalhistas atrapalham mudança O casal Valmor Augusto e Jandira da Costa Butzge, de Venâncio Aires, cresceu em meio às lavouras de fumo. Por ciclo, em uma área arrendada de 3,5 hectares, são cultivados 55 mil pés. Embora tenha registrado perdas em função do granizo e do excesso de umidade, estima colher até 500 arrobas. Parte do volume foi vendida e o preço agradou. "Recebi R$ 161 por arroba, tudo da classe BO1, a de melhor qualidade", conta orgulhoso. Segundo Jandira, os motivos por ainda se manteren na atividade se resume à falta de conhecimento para iniciar uma outra cultura, ausência de mão de obra e demora no retorno financeiro. "No fumo sabemos fazer tudo, desde o preparo da terra, até a classificação das folhas. Por hectare o rendimento chega a R$ 10 mil.

Sem área de terra própria, o tabaco é a melhor alternativa." Valmor concorda. Na safra passada conseguiram comprar um terreno na cidade e construir a casa própria. Como empecilhos à diversificação, cita o rigor das leis trabalhistas e ambientais. "Até para diarista precisamos assinar a carteira de trabalho." Destaca que apesar do trabalho na lavoura ser árduo durante os meses de novembro a janeiro, no restante dos meses, o serviço é mais leve. "Em outras atividades não teríamos folga, sem falar da incerteza quanto à compra, preço mínimo e seguro agrícola." Enquanto terminam a classificação das folhas, planejam a próxima safra e cuidam do cultivo de alimentos para a subsistência.


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Menos quantidade, mais qualidade Segundo levantamento da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), apenas 10% da safra já foi comercializada. Paulo Vicente Ogliari, gerente técnico, estima uma perda superior a 20% neste ciclo devido à ocorrência de granizo (37 mil notificações entre agosto e dezembro) e excesso de umidade nas lavouras da Região sul, devido à atuação do El Niño. Com a oferta menor, projeta-se um aumento no valor pago pela arroba, mesmo não havendo acordo sobre o percentual entre a Comissão Representativa dos Fumicultores e as empresas fumageiras.

Falta tabaco e as empresas para honrar seus contratos podem pagar acima do valor mínimo ..... Paulo Vicente Ogliari, gerente técnico

Se por um lado as entidades estavam dispostas a reduzir o seu percentual de reajuste solicitado, que era de 17,7%, para 12,8%, para garantir a assinatura do protocolo, por outro, nenhuma das empresas recebidas alcançou esse patamar. A última reunião ocorreu na quinta-feira em Santa Cruz do Sul. Isto inviabilizou um acordo e a assinatura do protocolo. No entanto, quem vendeu registra boa remuneração. O percentual de aumento da arroba, comparado com o ciclo passado, chega a 12%. “Falta tabaco e as empresas para

honrar seus contratos podem pagar acima do valor mínimo da arroba de BO1, considerado o de melhor qualidade, hoje cotado a R$ 10,99 o quilo.” Após três safras com oferta ajustada à demanda, Ogliari estima uma disputa muito acirrada pelo produto no campo nos próximos meses. “Aconselhado é alguém sempre ficar na propriedade para evitar roubos.” Alerta também para a atuação dos compradores intermediários e estelionatários. A safra está estimada em 588 mil toneladas. Na safra 2014/15, a produção chegou a 697 mil toneladas. GIOVANE WEBER


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Preço bom Embora o excesso de chuvas tenha afetado a produtividade e provoque quebra superior a 50% em algumas regiões, a qualidade das folhas colhidas está excelente. “Perdemos em peso, mas a cor das folhadas curadas ficou muito boa. Isso reflete em preço melhor na esteira”, resume o produtor Daniel Bortolini, de Doutor Ricardo. Com ajuda dos pais, cultivou 25 mil pés de fumo de galpão e de forno. As vendas iniciam apenas em maio. A prioridade é finalizar a colheita, pois o sol quente proporciona um falso amadurecimento e a queima das folhas. A constatação é a mesma na propriedade da família Parisoto, em Putinga. Os 25 mil pés cultivados já foram colhidos e estão em fase de cura no galpão. Segunda Lurdes, a quantidade é menor devido às intempéries, mas essa perda será suprida pela qualidade e melhor preço. No ciclo passado, a média alcançada por arroba ficou em R$ 90. “Esperamos ganhar até R$ 120. Quando falta produto, a indústria costuma pagar mais”, referindo-se a colheitas passadas com cenário parecido.

Há quatro gerações, tabaco é a principal alternativa de lucro José Alfonso e Ilária Ana Rippel, de Linha Hansel, Venâncio Aires, são netos de fumicultores. O pai de José comprou cinco hectares e ofertou ao filho para que plantasse tabaco. Na época, tinha 22 anos. Depois da segunda safra, devolveu o valor das terras ao pai, já tinha sua própria casa e resolveu casar. Como a área era considerada muito pequena, passou a arrendar mais terras. Com a expansão do negócio, adquiriu outras sete propriedades. A diversificação tem como base a subsistência, proveniente do cultivo de frutas, feijão, milho e horta e da criação de suínos, galinhas e gado. O casal planta hoje 600 mil pés

de fumo, em uma área de 42 hectares, entre terras próprias e arrendadas. Tem 20 estufas e mais duas arrendadas. Trabalha diretamente com seis famílias que expandem o negócio, envolvendo, no total, 30 pessoas. Por safra, são colhidas 7,3 mil arrobas. A primeira filha de José e Ilária, Ana Cláudia, nasceu em 1979. Nutricionista, mora em Porto Alegre. Junto com ela, está a neta. A segunda filha, Cleusa Fernanda, nasceu em 1984. Casada, trabalha na fumicultura junto com os pais. “Cursei Engenharia Agrícola por seis meses e desisti.

Aqui ganho mais dinheiro. Busco aperfeiçoamento em cursos para reduzir o uso de agrotóxicos, diminuir custos, melhorar a produtividade e a qualidade do tabaco produzido.”

“Inexiste cultura com garantia de preço e compra ” Enquanto limpa o galpão e começa a preparar a área onde serão instalados os canteiros da nova safra em abril, Rippel destaca a boa lucratividade do último ciclo. Apesar do excesso de chuva e das tempestades de granizo terem resultados em uma perda de mil arrobas, ele não reclama dos resultados. “Boa parte o seguro pagou. As folhas colhidas foram de excelente qualidade.” A média paga por arroba chega a R$ 140. Há alguns anos, Rippel tentou diversificar e plantava milho-doce nas restevas do fumo. Chegou a colher 20 toneladas. A indústria se transferiu para Goiás e a maioria dos produtores desistiu do cultivo. “Não há cultura tão rentável na pequena propriedade. Até hoje o governo nunca conseguiu me apresentar uma alternativa com garantia de preço e compra. O fumo me oferece isso e por esse fator continuamos a plantar e nem cogitamos parar.” Entre os meses de novembro e fevereiro, a família trabalha até 14 horas na colheita, no monitoramen-

Comecei do nada. Tudo o que eu construí na vida foi plantando tabaco. O governo nunca me apresentou uma cultura de igual retorno, com garantia de preço, compra, orientação técnica, linha de crédito e onde se aplique tão pouco agrotóxico José Alfonso Rippel, fumicultor

to da temperatura dos fornos de secagem, na classificação e monta dos fardos para entrega à indústria fumageira. “Cansa, mas vale a pena. A renda que obtemos nos motiva a continuar na lavoura.” Após a colheita, 15 hectares foram arrendados para um vizinho produzir soja. A porcentagem chega a 15% do total produzido. Para ele, é apenas uma forma de a lavoura ficar protegida de ervas daninhas. “Nunca plantaria, pois o custo é elevado, se aplica muito veneno e a renda é baixa.” Atento às novas tecnologias, para auxiliar na redução de mão de obra e qualidade do produto, Rippel inaugurou no passado o investimento de R$ 30 mil em uma estufa elétrica para secagem das folhas. Financiada por uma fumageira para pagar em cinco anos, sem juros, a estrutura reduziu o gasto com lenha pela metade. “A qualidade final da folha seca é melhor e agiliza o trabalho.”Ao longo de sete dias, a temperatura das estufas deve ser mantida entre 90ºC e 160ºC.


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MARÇO/2016

CAPA

Custo e mão de obra dificultam a implantação de novas culturas Segundo o técnico em Agropecuária, da Emater de Venâncio Aires, Vicente Fin, esses são os principais empecilhos para a implantação de uma nova produção agrícola na propriedade onde o tabaco ainda é a maior fonte de renda. Embora a importância de não depender de um único item para obter lucro seja reconhecida pela maioria dos agricultores, sem ter mão de obra, custo elevado e garantia de mercado, essas situações prejudicam os investimentos realizados pelos produtores, muitas vezes, forçando-os a desistir do negócio que haviam planejado. Segundo Fin, a necessidade de buscar informações

corretas sobre a nova cultura é a primeira apontada antes de realizar algum investimento. “Qualquer pessoa que diversifique sua propriedade tem que ter conhecimento de mercado, saber o zoneamento, a legislação em torno da atividade.” No caso de pequenos produtores, segundo Fin, um dos pontos importantes é identificar qual a perspectiva de mercado da nova cultura dentro do próprio município e região. O técnico destaca a importância de fazer a transição de forma gradual, usando inicialmente espaços pequenos da propriedade e expandindo somente se as condições se mostram favoráveis para aumentar a produção.

Número de produtores reduz Na safra 2014/15, Venâncio Aires, maior produtor nacional, produziu 20.316 toneladas. Ao todo, foram colhidas 692 mil toneladas. São 3.740 famílias produtoras, cuja área cultivada ocupa 8,6 mil hectares. A estimativa é de colher 15,9 mil toneladas neste ciclo. Conforme Fin, a movimentação financeira em 2013 foi de R$ 175 milhões. São gerados mais de dez mil empregos diretos e indiretos, tanto na lavoura como nas indústrias. Nos últimos anos, êxodo rural, legislação trabalhista no campo, envelhecimento e oscilação dos preços influenciam na redução do número de produtores. “Há oito anos tínhamos cinco mil produtores e perto de nove mil empregos nas fumageiras.” As atividades que mais crescem são a avicultura, a suinocultura e a produção de leite, cujo sistema é integra-

do, em que o produtor tem garantia de preço, compra e orientação técnica. “O tabaco já era responsável por 74% da arrecadação no setor agropecuário. Hoje está em 53%.” Outras culturas como a soja também conquistam espaço após a colheita do fumo, devido à boa cotação do grão. No entanto, alguns fatores ainda colaboram e fazem o produtor apostar na cultura do tabaco. Entre eles, Fin destaca o fato de a atividade se adaptar a pequenas áreas, conhecimento intrínseco, infraestrutura produtiva (instalações/construções) já instalada e adequada para essa finalidade, comercialização garantida, insumos definidos e assistência específica e a renda por hectare – média de R$ 9,5 mil. “Nenhuma outra cultura proporciona esse rendimento. É difícil o produtor abrir mão de uma renda tão boa.”

Por mês, família Rosa cultiva em média 3 mil mudas de hortaliças. Produtos são vendidos em

Setor movimenta R$ 45,6 milhões

O tabaco já era responsável por 74% da arrecadação no setor agropecuário. Hoje está em 53% Vicente Fin, técnico da Emater

Apesar da fumicultura ainda ser uma das principais motrizes financeiras no interior, a área reduziu em 37% desde 2014. De acordo com Eduardo Mariotti, extensionista da Emater de Boqueirão do Leão, a cultura ocupa três mil hectares e a produção chega a seis mil toneladas por ciclo. Movimenta R$ 45,6 milhões. Segundo Mariotti, as restrições impostas pela convenção-quadro ajudaram a conscientizar o produtor da necessidade de manter mais que uma alternativa de renda na propriedade. “A tradição herdada de geração em geração perde força. Produzir alimentos, cuidar mais da saúde de quem planta e de quem consome ganha cada dia novos adeptos.”


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MARÇO/2016 FELIPE NEITZKE

Após 50 anos, hortigranjeiros substituem tabaco Durante 50 anos, na propriedade da família Rosa, de Passo de Pedras Brancas, em Boqueirão do Leão, o tabaco reinou absoluto. João, 32, e Paulo, 27, filhos de Alpídio e Nilde, começam a mudar essa realidade. No lugar do tabaco, hortigranjeiros – pepinos, tomate, moranguinho e melão, garantem a permanência na lavoura. Conforme João, os primeiros testes foram iniciados em 2006 após as incertezas provocadas pela convenção quadro. “Queríamos ficar na lavoura, mas sabíamos que somente plantar tabaco seria inviável no futuro.” Após visitas técnicas a outros produtores da região, foi erguida a primeira estufa. Foi preciso persistência. “Foi preciso recuperar o solo, identificar quais as variedades que seria possível cultivar

e para quem vender. O processo foi lento, difícil. Tudo foi superado e hoje temos um retorno igual ou maior do com a fumicultura.” Os 50 mil pés de fumo, com os quais pagou as prestações da compra da terra e carro, construiu a casa e pagou os estudos dos filhos deixarão de ser cultivado em 2017. Por mês, são cultivadas três mil mudas de verduras. Além da feira semanal, o produto é entregue de porta em porta. A área será ampliada para dois hectares. Para manter a oferta constante e as plantas protegidas das intempéries meteorológicas, outra estufa de dois mil metros quadrados está em fase de construção. Cultivados de forma sustentável e livre de agrotóxicos, a meta é expandir as vendas para todo Vale do Taquari.

Iniciamos uma nova fase. Bom para o bolso, para a saúde e o mais gratificante, ver meus filhos darem continuidade ao meu trabalho. feiras e nas casas dos clientes. Fumo deixará de ser cultivado em 2017

Alpídio da Rosa, produtor


16 ANDERSON LOPES

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CAPA

“No tabaco somos reféns da indústria” Em 2004, Claudionei Olbermann fechou a empresa que mantinha em Lajeado para se dedicar ao cultivo de fumo com a mulher Ângela, em Cruzeiro do Sul. Ela cresceu em meio à lavoura e ajudou o pai durante 25 anos. No auge chegaram a cultivar 120 mil pés. No entanto, a oscilação do preço e a vontade de empreender fizeram o casal abandonar a atividade. “No tabaco somos reféns da indústria. Em safra cheia, pagam o querem e quando falta pagam mais do que ele vale. O produtor é dominado pelas multinacionais que ditam o quanto que devemos lucrar.” Incentivado pela Emater, resolveu montar uma agroindústria para beneficiar a produção de aipim. Uma parte já era descascada e entregue para uma empresa local. Há dois anos, montou o projeto e construiu um prédio de 75 metros quadrados. Foram investidos R$ 50 mil. Outros R$ 11 mil foram repassados via Feaper, além de equipamentos e uma câmara fria

para armazenar a matéria-prima beneficiada. Embalado a vácuo, a embalagem de um quilo é vendida entre R$ 2,75 e R$ 4,50, dependendo da época do ano, para programas de alimentação escolar, restaurantes e mercados. O beneficiamento inicia em fevereiro e se estende até novembro. Por semana, são industrializados até mil quilos. No lugar onde antes mantinha a lavoura de fumo, hoje cultiva aipim. São 3,5 hectares neste ciclo. Além da mandioca, Claudionei iniciou o processamento de moranga. “Fizemos um teste e a aceitação foi muito boa. Vamos aumentar a área cultivada na próxima safra.” O cuidado com a sanidade, a forma de armazenamento e a qualidade do produto são os segredos do aumento das vendas, segundo Olbermann. Destaca o trabalho desenvolvido pela Emater. “São fundamentais para auxiliar no forma de gerenciar, produzir e conquistar novos mercados.”

Deixamos de ser empregados para virarmos empreendedores. O fumo não é a única opção rentável na propriedade, basta ter força de vontade e buscar conhecimento. Claudionei Olbermann, produtor


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Agroindústrias são opção O técnico em agropecuária, Luiz Henrique Bernardi, da Emater de Santa Clara do Sul, destaca como fundamental o produtor acreditar no seu potencial e analisar a viabilidade econômica e técnica da atividade escolhida para reduzir ou até mesmo substituir o tabaco. Destaca a criação de agroindústrias e a produção leiteira como boas alternativas. De acordo com Bernardi, a compra de 30% dos alimentos da agricultura familiar ajuda muitos produtores a empreender no meio rural. “Muitos já faziam doces, schmiers,

Por safra, Olbermann industrializa mais de 45 toneladas de aipim e moranga. Embalado a vácuo, quilo chega ao consumidor com preços entre R$ 2,75 e R$ 4,50.

mas de forma artesanal, sem registro. A partir do momento em que têm mercado garantido, legalizam a atividade e incrementam a oferta. O tabaco perde espaço.” Entre as dificuldades, cita a oferta de matéria-prima e a gestão. “O produtor acumula funções que dentro de uma empresa são divididas em vários setores. Ele produz, beneficia, vende e ainda administra. É preciso buscar conhecimento e qualificação, é fundamental cultivar na propriedade pelo menos 50% daquilo que será beneficiado.”

Além da vontade de diversificar, é necessário analisar a viabilidade técnica e econômica. Não obrigamos ninguém a desistir da cultura do tabaco, apenas ajudamos a indicar alternativas viáveis para incrementar os lucros. Luiz Bernardi, técnico em agropecuária

Uso de agrotóxicos reduz em 83,3% A lavoura de tabaco teve redução aproximada de 83,3% no uso de princípios ativos nas últimas duas décadas. Hoje, é usado apenas 1,1 quilo por hectare, índice que elevou o tabaco à condição de produto agrícola comercial que menos usa agrotóxicos no país. Em outras culturas, as quantidades são muito maiores. O tomate recebe 36 quilos de agroquímicos por hectare; a batata, uma média de 28,4 quilos por hectare, e o morango, 5,5 quilos por hectare.


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CAPA

Produziralimentos émaisrentável Acostumado com o cultivo de tabaco desde os 14 anos, o agricultor Alcione José Zangalli, 39, de Picada Serra, Marques de Souza, começou a investir na criação de frangos quando tinha 20. Boa parte dos 37 hectares de terra está localizada em uma região montanhosa e íngreme, imprópria para a produção de grãos ou atividade leiteira. Oscilação no preço, escassez de mão de obra e uso de agrotóxicos despontam como motivos pelos quais Zangalli migrou para a avicultura. “Se vendemos um saco de soja, milho, sabemos o preço que vamos receber. No fumo, depende do humor do classificador. Priorizei também a saúde da minha família, além de buscar uma atividade que gerasse mais lucros.” Casado faz 16 anos com Márcia, 37, comemora os frutos da mudança. Nas três estruturas construídas, a última em 2015, no sistema dark house, a capacidade de alojamento é de 80 mil aves por lote. Até o fim do ano, outros dois aviários entram em funcionamento. Por lote ( oito por ano) serão criados 180 mil frangos. O investimento será de R$ 1,8 milhão. “A tecnologia aprimora a qualidade e reduz a mão de obra. Produzir alimentos é um negócio rentável e seguro.” O rendimento por lote chega a R$ 36 mil. Para incrementar a renda da família, 22 hectares da propriedade foram reflorestados com o plantio de eucalipto. Por ano, são comercializados 300 metros cúbicos de toras (R$ 120 o metro cúbico) e 400 metros de lenha para forno, cujo preço médio do metro chega a R$ 30. Para ele, entre os motivos que mantêm o agricultor no cultivo de tabaco, estão as vantagens oferecidas pela indústria. “Oferecem custeio para construir estufa, fornecem insumos, garantem a compra, em resumo, se você quiser, nem precisa sair da propriedade, apenas produzir, sem falar da rentabilidade por hectare. Muitos se acomodam e têm medo de fazer um financiamento para investir em outra cultura.” Para Zangalli, a saída é levar conhecimento ao meio rural e transformar o produtor em um empresário. “Além de produzir, é preciso saber gerenciar. Conhecer o mercado, buscar informações corretas, estabelecer parcerias e analisar a oferta de crédito são fundamentais.”

Zangalli investirá R$ 1,8 milhão na construção de dois novos aviários dark house. Por lote serão criados 180 mil

O que cuidar antes de iniciar uma nova cultura Conhecer o mercado

Informação Buscar orientações quanto ao manejo, produção, rentabilidade e processo de implantação. Quanto menos erros, mais chances de obter resultados positivos.

Quem são os compradores, os concorrentes, os custos, logística, demanda de mercado, preços. Avaliar quais os lucros que podem ser obtidos com a cultura.

Crédito Gestão Saber gerenciar as áreas de produção, comercialização, mão de obra e finanças.

Verificar a disponibilidade de linhas de financiamento, juros e prazos para efetuar o pagamento. Procurar orientação de um agente financeiro, Emater ou sindicatos.

Mão de obra Verifique a disponibilidade de trabalhadores. Procure auxílio dos sindicatos, Senar, Sebrae, secretaria da Agricultura, Emater e demais órgãos para qualificar a mão de obra


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Novas funcionalidades O aproveitamento do tabaco para produção de biocombustíveis mobiliza profissionais no campo e no meio acadêmico. Na Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), no mestrado em Tecnologia Ambiental, são desenvolvidas pesquisas que utilizam todas as partes da planta, como sementes, folhas e caule. Um dos trabalhos é a dissertação do mestrando Leonardo Anacker, que prevê a utilização do caule do tabaco para produção de etanol. O resíduo pós-colheita, que geralmente é incorporado ao solo pelos agricultores, tornou-se a matéria-prima do estudo nos últimos dois anos. A pesquisa conseguiu 0,33 grama de combustível por grama de biomassa (caule moído e seco). Outro projeto mantido pelo Mestrado em Tecnologia Ambiental da Unisc e a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul é focado no uso do tabaco energético para produção de biodiesel. A variedade é uma cultivar especial que produz uma grande quantidade de sementes, das quais é frangos. Tecnologia aprimora qualidade e reduz a mão de obra

extraído o óleo que se transforma em combustível. As sementes são fornecidas pelo agricultor Nelson Tatsch, que conduz as pesquisas em campo em sua propriedade, no interior de Rio Pardo. Os experimentos em Rincão Del Rey são acompanhados pelas empresas Suchem e M&V Participações, que trouxeram a novidade para o Brasil. A proposta das empresas é oferecer uma nova oportunidade de renda para os produtores com o aproveitamento das sementes para produção de biocombustível. As primeiras experiências começaram em 2011 e chegaram à terceira colheita neste ano. Com produtividade crescente a cada ano na área experimental, em Rio Pardo, a intenção agora é garantir a estruturação e desenvolvimento de toda cadeia e atingir a escala comercial entre dois e três anos. Além da produção de energia sustentável, as empresas parceiras apostam na cultura como uma opção de renda e diversificação para as propriedades de base familiar.


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Tabaco no Brasil

CAPA

321.520 hectares

Área

Mercado ilegal movimenta R$ 6 bi Com mais de 750 mil toneladas na safra 2013/14, o país se destaca na segunda posição do ranking mundial, sendo responsável por mais de 10% da produção de tabaco em todo o mundo. O Brasil é líder no ranking mundial desde 1993, tendo embarcado para 96 países em 2014 um montante de US$ 2,46 bilhões. No RS, o tabaco responde por 10,2% do total das exportações, colocando o setor como segundo principal produto exportado no ano passado, atrás somente da soja. Um dos grandes desafios é o combate ao mercado ilegal de cigarros. Conforme Luciano Stremel Barros, presidente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (IDESF), esse mercado movimenta cerca de R$ 6 bilhões por ano e o Brasil deixa de arrecadar R$ 4,5 bilhões em impostos ou 35 mil postos formais de trabalho. Em detrimento do crescimen-

to do contrabando de cigarros no RS, a estimativa de evasão fiscal tem crescido, apresentando uma evolução de 22% entre 2012 e 2014, ano no qual o RS perdeu R$ 115 milhões em evasão fiscal com o contrabando de cigarros. Com esse montante seria possível, por exemplo, restaurar 380 quilômetros de rodovias e construir 3,4 mil casas populares. Segundo Barros, a falta de controle na produção e a comercialização do produto no Paraguai são a principal causa do desenvolvimento da indústria ilegal. No país vizinho, a carga tributária representa menos de 13% do preço da venda; no Brasil, chega a 66%. “A produção de cigarros no Paraguai supera 60 bilhões de unidades ao ano. O número é muito superior ao consumo local, que é de 2,7 bilhões de unidades. O que não é consumido acaba entrando no Brasil e outros países de forma ilegal”, alerta Barros.

Famílias produtoras 712.610 toneladas

Produção

2.216 quilos por hectare

Produtividade

Região Sul

Indústria

Indiretos

674.080

29 mil

1,4 milhão

Total 2.143.080 Tabaco na Região Sul (RS,PR e SC) – 619 municípios – 114.240 propriedades – 614.920 pessoas ocupadas – 15,3 hectares (área média das propriedades)

Produção 697.650 área com tabaco 308.260 hectares produtividade 2.263 quilos por hectare

– União Europeia: 42% – Extremo Oriente: 28%

(18.168 toneladas), Santa Cruz do Sul (14.593 toneladas) e Candelária (13.911 toneladas). Para o presidente do Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (SindiTabaco), Iro Schünke, a produção de tabaco faz parte da tradição desses municípios, além de ser a cultura fundamental nos aspectos sociais e econômicos. “É essa tradição do cultivo em pequenas propriedades diversificadas que confere excelência ao tabaco brasileiro, reconhecido pelos importadores por sua qualidade ímpar”, comenta.

Brasil

Lavoura

Em 2014, % total

Cultivado em 619 municípios do RS, Santa Catarina e Paraná, o tabaco tem na Região Sul 98% da produção brasileira. Com 154 mil produtores integrados, um universo de aproximadamente 615 mil pessoas participa do ciclo produtivo no meio rural, somando uma receita bruta anual de R$ 5 bilhões. Na safra 2014/15, foram produzidas 692 mil toneladas. De acordo com a Afubra, o maior produtor foi Venâncio Aires, com 20.316 toneladas. Em seguida, aparecem Canguçu (19.942 toneladas), São Lourenço do Sul

153.730

Empregos

Destinos

Maiores produtores

168.520

– América do Norte: 10% – Leste Europeu: 8%

Preço médio R$ 7,13 por quilo Valor bruto por família R$ 72.701 Valor por hectare R$ 16.140 Valor por hectares de outros produtos R$ 6.435 Renda per capita R$ 19.132 Faturamento total R$ 25,1 bilhões Exportação R$ 5,9 bilhões Tributos ao governo R$ 12,8 bilhões

Total exportado: 476.217 toneladas Produção de cigarros Brasil: 3.635.198.380 maços/boxes com 20 unidades (2014) Mundo: 6,1 mil bilhões de unidades (2014) Contrabandeados: US$ 64,9 milhões (2014 em Foz do Iguaçu)

Fonte – Receita Federal/Afubra/Secex Dados de 2014


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A pouco mais de um mês para o fim do prazo para proprietários rurais preencherem o Cadastro Ambiental Rural (CAR), líderes do setor querem prorrogar a exigência por mais dois anos. Ministério do Meio Ambiente descarta adiamento e data final permanece sendo 5 de maio.

Mais tempo para fazer cadastro

C

GIOVANE WEBER

CAR em números 83,9%

Norte 93,7 milhões de hectares cadastráveis 78,7 milhões de hectares cadastrados

reflorestada, ele temia que o não preenchimento poderia trazer prejuízos. “Registro em talão a lenha. Sem o CAR, poderia me complicar. Se é regra, temos que fazer, não adianta ficar reclamando.” Outra preocupação é com a possibilidade de em 2017 deixar de conseguir contrair um financiamento. “Esse dinheiro sempre é bem-vindo. Hoje poucos conseguem fazer algum investimento sem o crédito bancário.”

“A maioria deixa para última hora” O agricultor Helemar Krohn, 72, de Sério, fez o cadastro dos 15 hectares de terras em novembro do ano passado. Auxiliado pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município, pagou uma taxa de R$ 20. Com boa parte da área

129,9 milhões de hectares cadastráveis 85,2 milhões cadastrados

Nordeste 76,1 milhões cadastráveis 29,2 milhões cadastrados

Sudeste 67,4%

O presidente da Fetag, Carlos Joel da Silva, reclama das dificuldades do próprio sistema eletrônico. “Ficou fora do ar por dois meses e agora funciona de forma lenta. Tem que ser prorrogado, não tem jeito.” Responsável pelo CAR no estado, a Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Sema) argumenta que o sistema, ao contrário do ano passado, está pronto para receber todos os cadastramentos. “Ainda falta mais de um mês para correr atrás e se regularizar”, defende a secretária-adjunta Maria Patrícia Möllmann.

38,4%

Com área regularizada, Krohn garante o direito a financiamentos bancários a partir de 2017

65,6%

Centro-Oeste

56,4 milhões cadastráveis 38 milhões cadastrados

Sul Ainda falta mais de um mês para correr atrás e se regularizar” Maria Möllmann, secretária-adjunta

35,7%

om o prazo final, 5 de maio, se aproximando, fica cada vez mais evidente a dificuldade, senão a impossibilidade, que produtores, em especial os do RS, terão para cumprir com a exigência do novo Código Florestal. Enquanto um grupo de deputados da bancada ruralista e demais líderes do setor tentam sensibilizar o Ministério do Meio Ambiente para que o prazo seja novamente prorrogado por, no mínimo, dois anos, a ministra Izabella Teixeira descarta o adiamento. “Entendemos que houve dificuldades na hora de implantar o sistema. Vamos estudar uma saída jurídica para manter os benefícios advindos do CAR mesmo para quem não conseguir fazer a declaração em tempo hábil.” O deputado federal Heitor Schuch (PSB) recomenda aos produtores continuar inscrevendo suas propriedades e evitar as penalizações. Uma das maiores preocupações é quanto ao bloqueio de crédito em 2017. “Mesmo que o prazo termine em maio, continue fazendo o cadastro. É quem nem campanha de vacinação.” Um projeto de lei apresentado pelo parlamentar amplia em dois anos o período de adesão. Para agilizar a tramitação na Câmara, Schuch apresentará um requerimento de urgência para votação da proposta direto em plenário. Segundo a Secretaria do Ambiente, 35% de uma base de 480 mil propriedades do estado estão cadastradas. “Podemos chegar a 50% e o prazo termine. Importante é fazer da forma correta e sem atropelos, assim, evitamos contratempos no futuro”, orienta o assessor do Sistema Farsul, Eduardo Condorelli.

41,8 milhões cadastráveis 14,9 milhões cadastrados

Fonte – Ministério do Meio Ambiente


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Risco fitossanitário e mercadológico une produtores e entidades para impedir a entrada da fruta chinesa no país. Apesar das intempéries, qualidade da fruta colhida no estado é boa. Alta do dólar motiva exportação. Encargos e falta de mão de obra inviabilizam cultura na agricultura familiar.

MARÇO/2016

Abertura de mercado chinês ameaça produção de maçãs A

intenção do Brasil comprar maçãs da China mobiliza agricultores e indústria. Além do preço menor, o risco sanitário faz a Associação Gaúcha dos Produtores de Maçã (Agapomi) cogitar recorrer à Justiça, caso não houver convencimento do governo federal. Conforme o presidente da Agapomi, José Maria Reckziegel, os chineses enfrentam problemas com vírus, bactérias e ainda não conseguiram eliminar a principal praga da cultura (a cydia pomonella, mariposa cuja lagarta se alimenta da polpa da fruta). Além da questão sanitária, Reckziegel está preocupado com o futuro da cultura em pequenas propriedades familiares. Outro temor está nas condições de competitividade. Para ele, o setor brasileiro está amparado por tecnologia, qualidade e produtividade, no entanto, perde quando o assunto é subsídio governamental. “Os chineses recebem muito incentivo. Colocam o produto aqui abaixo do nosso custo de produção, o que torna a concorrência desleal. Não se trata de reserva de mercado, mas, sim, de sobrevivência do setor.” A estimativa é de que uma caixa de 20 quilos de maçã chinesa possa custar aqui R$ 34. Por outro lado, no segundo semestre, o valor padrão do produto nacional pode atingir R$ 60, quase o dobro. As negociações iniciaram no fim de 2015, quando a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, esteve no país asiático. Enquanto o Brasil exportaria carne e

GIOVANE WEBER

Inviável para a agricultura familiar

Para o técnico em Agropecuária Nicolás Eigon Brandt, da Emater de Vacaria, um dos maiores polos produtores do estado, a importação chinesa pode levar muitos produtores familiares e até empresariais à falência. Cita como exemplo a queda na produção de alho na década de 1990, quando houve a abertura do mercado chinês. “Não tem como competir.” Como alternativa, cita o cultivo de pequenas frutas como amora, framboesa, morango e mirtilo. Além da demanda garantida pelo benefício à saúde, exigem investimento menor. “Implantar um hectare de maçã em cultivo protegido custa até R$ 100 mil. Para o produtor familiar é inviável.” No município, a produção de maçã alcança 277 mil toneladas, em 6,8 mil hectares, por 70 produtores.

Análise técnica frutas tropicais, compraria dos chineses maçã e pera. Eles detêm mais da metade da produção mundial, ou seja, 80 milhões de toneladas. Enquanto isso, a safra nacional é de cerca de 1,163 milhão de toneladas.

Com menor oferta, quilo da fruta dobrou de preço neste ciclo

Em nota, o Mapa afirma que a compra de maçã da China apenas ocorrerá após uma análise técnica. O órgão não revelou se uma possível liberação da importação da fruta seria de forma gradual. “Se após a realização da Análise de Risco de Pragas (ARP) que o Mapa regularmente realiza para esses tipos de produtos for constatado que a importa-


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MARÇO/2016

ção de maçãs da China não oferece risco significante à produção agrícola nacional, o Brasil, como país membro do Organização Mundial do Comércio, deve permitir a importação de maçãs daquele país”, explica a nota. Para impedir a reintrodução da praga (traça-da-maçã) nos pomares, Pierre Nicolas Péres, diretor-presidente da Associação Brasileira de Produtores de Maçã, destaca a necessidade de fazer um controle rígido sobre o produto caso a importação seja liberada.

Menor oferta A colheita da fruta iniciada em fevereiro está estimada em 480 mil toneladas. Segundo dados da Agapomi, a cultura ocupa 14,5 mil hectares no RS. Nos pomares, a variedade gala responde por 65% do total, seguida da fuji, 30%, e as demais, como daiane e pink lady, ocupam os 5% restantes. Segundo Reckziegel, a ocorrência menor de horas de frio do que a macieira necessita, aliada às geadas tardias de setembro e granizo em outubro, provocou perdas de até 30% em algumas regiões produtoras como Arvorezinha e Ilópolis, na região alta do Vale do Taquari. O excesso de chuvas e baixa insolação contribuíram para agravar os prejuízos e resultaram na redução do tamanho e quantidade de frutas fixadas por planta. A qualidade, entretanto, deve se manter nos mesmos níveis de 2015, espera a Agapomi. No que se refere aos preços, os produtores projetam uma compensação em virtude da queda na oferta nacional. Além do mercado interno, com a alta do dólar, existe a intenção de expandir as exportações, tendo ainda os países europeus como principais compradores. No ano passado, o Brasil enviou 60 mil toneladas para outros mercados. Em 2016, a projeção é de comercializar um volume superior a 70 mil toneladas. A Agapomi estima a criação de 25 mil vagas temporá-

Os números Produção em 2015 (em mil toneladas) Brasil: 1.163 SC: 611,7 (52,6%) Rio Grande do Sul: 510,9 (43,9%) Preço Caixa de 20kg de maçã chinesa: R$ 34 em média Caixa de 18kg da maçã brasileira: entre R$ 20 e R$ 60, dependendo da época da colheita Empregos SC: 40 mil RS: 25 mil Toda cadeia produtiva abrange 150 mil pessoas Hectares RS: 16.495 mil SC: 17.924 mil Produtividade – Pomar adulto, em plena produção, rende entre 40 e 50 toneladas Consumo per capita Brasil: 6 quilos/habitante/ano Europa: entre 15 e 60 quilos Variedades Gala (55%), fuji (40%), eva, daiane, pink lady, entre outras (5%) Capacidade de armazenagem 460 mil toneladas

Fonte – Agapomi e Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM)

A entrada da fruta chinesa cria uma guerra de preços. Nosso produto perde espaço, a área pode encolher e levar produtores à falência, além do risco de reintroduzir pragas em nossos pomares. José Maria Reckziegel, presidente da Agapomi

rias para auxiliar na colheita. Enquanto em anos anteriores era preciso contratar trabalhadores de outros estados e de países do Mercosul, hoje sobra mão de obra devido à crise econômica que fez o desemprego aumentar. Em Santa Catarina, maior produtor do país, a estimativa é de colher 650 mil toneladas. Está prevista a contratação de 40 mil temporários.

Desmotivação no pomar

Encargos trabalhistas, alta carga tributária, aumento nos custos de produção, falta de trabalhadores qualificados e a possível compra da fruta chinesa fazem o agricultor Odacir Salva, de Ilópolis, pensar em desistir da produção de maçã. “Se não bastasse, uma chuva de granizo devastou 90% do pomar em outubro. Fazer o cultivo protegido custaria R$ 40 mil por hectare. Isso não compensa, prefiro parar.” Devido a exigências do seguro rural e à baixa qualidade das frutas que ficaram no pé, Salva nem colherá as maçãs neste ciclo. “Poucos compram fruta feia. Fazer schmier ou compota era uma possibilidade, mas com o preço do açúcar o lucro seria mínimo, nem compensaria o valor gasto com funcionários.” A colheita manual do fruto exige, em média, duas pessoas por hectare. Salva se dedica à cultura desde 2008, quando foram implantadas as primeiras mudas. Com 2,2 mil plantas em fase produtiva, a projeção era de colher até 25 mil quilos nesta safra, das variedades fuji, daiane e gala. Para atender os clientes, optou em comprar maçãs de outro produtor de Arvorezinha. Com a oferta menor, o preço aumentou. De R$ 1,60, valor cobrado pelo quilo na safra passada, a cotação subiu para R$ 3,50. “Com o dólar alto, as regiões produtoras optam por exportar a fruta de boa qualidade. As demais são vendidas para mercados locais.”



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