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Potência do El Niño divide opinião de especialistas

Aquecimento do Oceano Pacífico traz chuva acima da média na região Sul, com riscos de enchentes para o Vale do Taquari para os próximos meses. Últimos dias do outono serão marcados por frio típico de inverno

VALE DO TAQUARI

As previsões apontam para um período de chuvas acima da média.

Tudo graças ao retorno do El Niño. Com o aquecimento das águas do Oceano Atlântico, há uma mudança no padrão climático em diferentes partes do mundo. No sul do Brasil, a tendência é de elevação nos níveis de precipitação. Já no centro e no nordeste, há mais riscos de estiagens.

Pela leitura da Administração Nacional de Atmosferas e Oceanos (NOOA – sigla em inglês), há uma tendência do fenômeno ser o mais

ENTREVISTA potente das últimas décadas e com duração de seis até 15 meses. No entanto, essa indicação encontra resistência entre especialistas. “Estão chamando de Super El Niño. Mas as temperaturas no oceano ficarão entre 2 a 3°C acima. Não chega a ser muito diferente de outros. Estão dando como novidade algo que não é tão grande assim”, avalia o engenheiro agrônomo, doutor em Produção Vegetal, Marcelino Hoppe.

Os últimos três Super El Niños aconteceram em 1982/83, em 1997/98 e o terceiro em 2015/16. Conforme avaliação do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o volume de chuvas no RS em 2023 deve voltar a ser intenso como foi em 2015.

ANTÔNIO SARTORI • presidente da Brasoja

A Hora – Estimativas apontam que o El Niño será entre moderado e potente. No RS, houve três anos de estiagens, com impacto na produção de grãos, em especial no milho. O que o setor primário pode esperar para os próximos meses?

Antônio Sartori – Nunca na história tivemos uma sequência de três anos de La Niña. O fenômeno é o oposto do atual, em vez de aquecimento das águas do Pacífico, há o resfriamento. O que trouxe chuvas muito abaixo da média, em especial no verão. Foram anos de quebra nas safras. Na soja, colhemos menos. Mas a maior dificuldade foi com o milho. No nosso estado, colhemos três milhões de toneladas, quando precisamos de sete milhões. Essa é uma conta que não fecha. Por isso foi preciso comprar o grão de outros estados.

Tudo isso trouxe muita desvantagem para o Rio Grande do Sul. Nosso risco climatológico é muito grande. Pois se não chover naqueles 25 dias de polinização do milho, ele não recupera mais. A soja é diferente, tem períodos mais longos.

Com a mudança de fenômeno, teremos mais riscos de perdas no cultivo de inverno, em especial do trigo. Para o verão, ter chuvas acima da média é positivo, teremos condições mais favoráveis para a soja e para o milho.

– Há divergências sobre o impacto do fenômeno El Niño. Alguns apontam para um fenômeno mais potente e outros dentro de uma normalidade. Como a produção gaúcha pode se preparar para

MARCELINO

Estão chamando de Super El Niño. Mas as temperaturas no oceano ficarão entre 2 a 3°C acima. Não chega a ser muito diferente de outros. Estão dando como novidade algo que não é tão grande”

A meteorologista da Metsul, Estael Sias, destaca que a intensidade do fenômeno é difícil de prever. Ainda assim, devido ao acompanhamento de institutos internacionais, acredita que 2023 será de Super El Niño.

De acordo com ela, modelos de clima dinâmicos processados pela Universidade de Colúmbia, de Nova York, indica o pico de intensidade de outubro a dezembro, no patamar de moderado a forte. Na corrente de especialistas que acreditam em um El Niño de grande intensidade, está o Serviço Nacional de Meteorologia (NWS), dos Estados Unidos. Conforme o prognóstico, o aquecimento atual do Oceano Pacífico nesta época do ano está entre os maiores observados desde 1950.

Histórico na região

O último grande El Niño foi em 2015. Entre o fim de junho e julho, esses cenários?

Sartori – Os meteorologistas estão em uma situação delicada. Alguns dizem bobagens. Tentam fazer previsões frente a um clima de hoje, que está muito imprevisível. Projetar como será daqui a três meses, um ano, ou dois, a chance de acertar é igual a zero. Tanto o El Niño como o La Niña não são eventos uniformes. São diferentes ao longo da história. Pelo que tenho lido e pesquisado em diversos institutos de pesquisa, os mais confiáveis admitem a possibilidade de um Super El Niño. Neste caso, a preocupação é grande. Eventos climáticos extremos têm sido marcas no mundo. Vemos ondas de calor recorde em Portugal e na Espanha. Ao mesmo tempo, enxurradas e enchentes na

Itália. Na Argentina, ondas de frio devido a ventos polares em pleno verão. Toda essa mudança torna o tema fundamental para o agronegócio. Pois fica cada vez mais difícil acreditar em previsões de longo prazo e se torna fundamental termos leituras mais periódicas e constantes sobre o tempo.

– Em cima dessa mudança de padrão climático. Um assunto técnico que por vezes se torna político, entre quem admite o aquecimento global e outros grupos que falam que se trata de um ciclo. Qual está mais perto da verdade?

Sartori – Existem dois grandes grupos de meteorologistas. Alguns entendem que essas alterações são cíclicas. E isso procede. Se analisarmos na história, houve migrações devido a secas ou enchentes. Meus avós, por exemplo, vieram da Itália em meados do século 19 para fugir da sequência de secas. Vieram ao Brasil pois havia abundância de terras e de água. os acumulados de chuva passaram dos 400 milímetros no Vale do Taquari. Mais do que o dobro da média para o período.

Agora, precisamos ter cuidado no que falamos. Se pegarmos a quantidade de carvão, de petróleo e de gás tirados do subsolo da terra, isso dá mais de 13 bilhões de toneladas trazidos à superfície para gerar energia e provocando o que se chama de aquecimento global. Então, sim, o homem também é responsável pelo aquecimento global.

O clima no mundo está muito errático e tem esses dois fatores juntos. Hoje, temos o excesso de informações, a desinformação e as fake news. Cada vez mais a sociedade precisa de fontes confiáveis e de discernimento para que possamos analisar aquilo que faz sentido.

No primeiro semestre daquele ano, choveu mais de 1,2 mil milímetros. Tal episódio trouxe uma sequência de enchentes pelo Vale do Taquari. Para este fim de outono e inverno, a Defesa Civil regional mantém um plano de ação para haver mais previsibilidade. “Acompanhamos de forma constante os prognósticos. Pelo que vimos, houve uma mudança na perspectiva quanto ao Super El Niño. Talvez não seja tão forte quanto alguns pensam”, diz o coordenador da Defesa Civil de Lajeado, Gilmar Queiroz e complementa: “não temos como prever o tamanho das cheias. O que podemos fazer é minimizar os estragos.”

O Núcleo de Informações Hidrometeorológicas da Univates (NIH) ressalta que há um risco iminente de cheias no Vale do Taquari nos próximos meses. “Teremos chuva acima da média em

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