Expressão - Edição 6 - 2019

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USJT

dezembro 2019

ano 26

edição 6

EXPRESSÃO JORNALISMO UNIVERSITÁRIO CRÍTICO, CIDADÃO E PLURAL

ESPECIAL - Págs. 6 a 9

Uma nova morada em construção Vindos do Oriente Médio, da África e da América Latina, imigrantes e refugiados conquistam oportunidades e enriquecem paisagem cultural do Brasil

EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS Imunoterapia explora novas técnicas de combate ao câncer Pág. 5

VIDA DIGITAL Experiência do usuário se destaca em realidade virtual e aumentada Pág. 10

CULTURA E ARTES Religiões disseminam práticas culturais pela cidade Pág. 13 dezembro 2019

ESPORTE Ex-esportistas transformam periferia com projetos sociais Pág. 14 EXPRESSÃO

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CAR@ LEIT@R

Todos os anos, dezenas de milhares de pessoas chegam ao Brasil apenas com um passaporte, uma mala e a vontade de reconstruir suas vidas. Não têm passagem de volta ou data para retornar; às vezes, nem casa têm mais. Essa dura realidade, vivida por imigrantes e refugiados, ganhou o foco do Especial desta edição, discutindo os meandros do acolhimento e da adaptação de quem acha aqui no Brasil uma nova morada. Como nossos leitores sabem, o Expressão é um jornal produzido por alunos – a maioria deles vinculada ao programa de estágio supervisionado do curso de Jornalismo. Desta vez, no entanto, abrimos espaço para a produção de uma turma

#INSTANTÂNEO

(4º semestre – matutino), no âmbito da disciplina Redação Jornalística, com reportagens que abordam trabalho, direitos humanos, segurança, cultura e identidade no viés de refugiados e imigrantes. Esta sexta edição fecha o ano tocando em outros temas quentes: a imunoterapia, a concretização – ou não – das tendências digitais previstas para 2019, a expansão das tecnologias de imersão e realidade virtual. Com essa seleção, esperamos agradar os leitores que nos acompanharam neste ano produtivo e intenso. E que venha 2020, com uma nova equipe e mais temas para destrinchar! Boa leitura e boas festas!

Texto e foto: Victor Hidalgo

Histórias de imigração encantam visitantes de museu

O Museu da Imigração de São Paulo foi inaugurado em 1993 na extinta Hospedaria dos Imigrantes, na rua Visconde de Parnaíba, 1316, na conexão da região central com a Zona Leste. O edifício é um patrimônio tombado por conta de sua importância na compreensão dos fluxos de imigração no País. Ele conta com uma exposição de longa duração, intitulada “Migrar: experiências, memórias e identidades”, que se divide em oito módulos. Seu foco apresenta ao visitante o processo migratório como algo inerente à humanidade.

#FICA A DICA

Imposição da maternidade é EXPRESSÃO problematizada em livro Divulgação

Os Editores

Jornal universitário do 4º ano de Jornalismo dezembro 2019 • ano 26 • edição 6 Chanceler Dr. Ozires Silva

Redação Alun@s do curso de Jornalismo da Universidade São Judas

Reitor Prof. Marcelo Henrik Coordenadora dos cursos de JO, PP, RTV, RP e Cinema e Audiovisual Prof.ª Jaqueline Lemos Supervisor de estágio e jornalista responsável Prof. José Augusto Lobato MTB 0070684 - SP

Impressão Folha Gráfica Converse com a gente jornalexpressao@usjt.br Instagram @jorn_expressao Facebook @expressaoUSJT

Supervisora de estágio, projeto gráfico e direção de arte Prof.ª Ana Vasconcelos MTB 25.084 - SP

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EXPRESSÃO

Ano: 2018 País de origem: Chile Giselle Magno

A autora chilena Lina Meruane faz, em "Contra os Filhos", uma diatribe em relação à imposição que a sociedade

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coloca na mulher para ter um filho. É muito claro logo nas primeiras linhas que a autora não é contra as crianças, mas aos seus pais que os têm sem querer tê-los de fato. Essa sociedade consumista e contaminadora, que cria uma aparente “crise de fertilidade” como desculpa para continuar a impor a maternidade para as mulheres em pleno século XXI, é foco da obra. “É contra os filhos que redijo estas páginas. Contra o lugar que os filhos foram ocupando em nosso imaginário coletivo desde que se retiraram 'oficialmente' de seus postos de trabalho na cidade e no campo... Con-

tra os confortáveis cúmplices do patriarcado que não assumiram sua justa metade na histórica gesta da procriação...”. As palavras de Meruane nas primeiras páginas já indicam: esta é uma leitura intensa que descreve a dificuldade da sociedade em aceitar as mulheres que não querem ter filhos, uma sociedade que transforma a mulher em uma “máquina de fazer filhos”, que é considerada egoísta se escolhe uma carreira ao invés da maternidade, enquanto aos homens esse tipo de julgamento não é nem sequer considerado. Uma sociedade que impõe um modelo de mulher-mãe que é aque-

la que abandona suas inspirações, sua carreira em troca do cuidado dos filhos, é tema da crítica. A discussão vai além do século XXI. Como diz Meruane, "a cada êxito feminista se seguiu um retrocesso, a cada golpe feminino um contragolpe social destinado a domar os impulsos centrífugos da liberação”. "Contra os Filhos" é uma leitura moderna, necessária e provocadora: às mulheres, para que não percam sua independência, aos homens, para perceberem que não somos máquinas reprodutoras. E aos filhos, para que saibam o seu lugar na hierarquia do lar e social.


PROTAGONISTA

Mag Magrela: traços firmes que (e)levam a mulher brasileira Valéria Contado

Carolyne Barbara Maciel, conhecida como Mag Magrela, 34 anos, é artista de rua e cantora. Conheceu a street art quando tinha 22 anos, depois de uma crise existencial que fez com que largasse a faculdade de Administração, na qual já estava no terceiro ano. Mas a arte entrou em sua vida muito nova, ainda no colo do pai, que era funcionário público e pintava por hobby. Suas personagens marcantes estão espalhdas pelas ruas de São Paulo. Por meio da arte, levou seu nome a lugares como Nova York, nos Estados Unidos, Lisboa, em Portugal, além de muitos estados dentro do Brasil. Expressão - De onde veio o seu apelido Mag Magrela? Mag Magrela - Da escola. Eu era muito magra. E tinha outra Carol na sala, e aí eu era Carol, a Magrela. Eu odiava e aí pegou. Claro, porque eu odiava. Se eu não odiasse, ia passar desapercebido. Mas, quando eu fui pintar na rua, pensei: poxa, não vou assinar Carol. Tem 448 milhões de “Carois”. Aí eu comecei a assinar Magrela. E hoje em dia é Mag – que é o apelido do apelido. Eu gosto mais. Pouquíssimos me chamam de Magrela. As pessoas que são meus mestres, assim, eles que vão me dando as dicas. Como é o seu processo criativo? Eu filtro o que o mundo me deu. Antes do traço, antes de qualquer coisa, você tem que entender por que está fazendo aquele desenho. Eu, desde muito nova, usei esse material para me expressar. Tudo que eu tinha de agonia, de inspiração, de intuição, desenhava. O desenho, como tudo nessa vida, como andar de bicicleta, como escrever, como dançar, é prática. A técnica é o de menos. O que importa é como você vai raspar o tacho das emoções dentro de você. As vezes você tem que limpar a técnica, desenhar, desenhar e depois se aprofundar naquilo. Não existe um jeito certo de fazer. Não tem regra. Isso faz a sua identidade. Você sente. Passa pro papel e depois passa para o muro. Eu apren-

Mag Magrela

Com personagens femininas fortes e traços reais, livres de estereótipos, grafiteira paulista colore as ruas da cidade e propõe olhar crítico a questões de gênero

Desenho de Mag Magrela na Rua Paes de Andrade, no bairro da Aclimação, em São Paulo di uma técnica todos esses anos. Mudar seu estilo é um jeito de pensar, que dói.

foi enfiado pela minha goela, que a sociedade me mostrou, eu nunca aceitei.

As pessoas ainda têm dificuldade de inserir. De por o foco no feminino, nas mulheres.

E você já mudou o seu estilo? Lembro que, quando comecei a pintar, fazia o Ramires, que é o meu primeiro personagem, e ele é bem estático. É um personagem mais durão, tipo um carimbo. Era sempre igual. Daí eu falei: “quero fazer movimento”. Então fui mudando esse personagem. No começo ele ainda era homem, um personagem masculino, e foi se transformando em uns monstrinhos, e de repente comecei a fazer umas mulheres. Foi meio que transformando isso – e a partir desse momento sinto que consegui conectar com meu feminino. Ladeira abaixo do encontro e da cura com o meu feminino, que era muito machucado. Muito! O feminino que

E quando você percebeu que seus desenhos se conectavam com as pessoas? É importante que eu conte alguma coisa. Isso aqui tá contando uma história, isso aqui tem um porquê. Tem um título. Tem toda essa energia. Depois que eu mudei isso, sinto que as pessoas se conectam. O mundo tem muita coisa pra falar e eu também. E essa conexão com as mulheres, com o meu feminine. Acho que quando a gente começa a cuidar do nosso ser mulher, a gente entende muito mais as outras. Não tem jeito, a sociedade é uma merda para as ‘mina’... o mundo é muito machista. Tem gente que tem a pachorra de dizer que não chamou mulheres para os eventos porque procurou na internet e não encontrou.

E por que você escolheu retratar o corpo feminino em seus desenhos? Eu gosto muito de pintá-las. É muito complicaado ser mulher na sociedade, nunca tá bom. Se você tem um pouquinho a mais, um pouquinho a menos, não tá bom. Ai eu comecei a cavucar nas minhas dores. Por isso que o começo do meu trabalho é muita dor. A minha retratação da mulher é uma coisa muito louca. Quando comecei a pintar os corpos femininos, não queria fazer corpos como a sociedade quer que sejam. Eu queria fazer corpos do jeito que eles são. Sempre fiz mulheres com os peitos caidos, bem desconstruidas. Eram bem mais pesados. Queria levar esse peso de um corpo.


EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS

Terapia musical propõe novo cuidado

Amanda P. e Marcela Joaquim

A música está presente em nossas vidas há muitos anos e hoje, graças à internet, podemos escutar, compartilhar e até gravar em qualquer lugar e a qualquer hora. Muitos não sabem, mas a música tem o poder de trazer bem-estar e outros benefícios para a saúde quando usada como terapia. A musicoterapia é um método terapêutico que, por meio de músicas com letra ou apenas melodias, ajuda o paciente a expressar suas emoções por meio dos sons. ‘‘Hoje nós usamos a musicoterapia com pessoas que têm depressão e ansiedade, com crianças e com idosos", explica a psicóloga Sandra Rizzolo Benevento, sócia da empresa Lysanias Paramitas Psicologia e Saúde. O bacharelado em Musicoterapia é curso superior: tem duração de quatro anos

e o processo seletivo é adaptado a cada instituição. Em algumas faculdades, o candidato realiza uma redação e os conhecimentos musicais são avaliados após aprovação no vestibular e antes de iniciar o semestre. Com isso, caso o aluno tenha pouco domínio musical, é orientado a realizar um nivelamento musical para formar cada vez mais profissionais qualificados para exercer com excelência seu trabalho. No curso de Psicologia, a musicoterapia não é uma disciplina, mas os professores abordam sutilmente este tema e o indicam como sugestão para estágio. Carolina Brito, 25, psicóloga, comenta: “a cada quinze dias realizamos estágio em um hospital psiquiátrico, levávamos músicas tranquilas para as sessões, que duravam uns 50 minutos. Sentamos em um local para esperar os pacientes, quando chegavam expli-

Amanda Pucci

Musicoterapia coloca emoções em ritmos musicais e propõe alcance de bem-estar

Novas terapias avançam no combate a transtornos psicológicos e problemas de socialização cávamos a proposta e eles participavam cantando e isto trazia memórias e emoções”, diz. O método, segundo ela, é relevante. “Acredito ser uma forma muito interessante de abordagem para a atuação na terapia, principalmente com pessoas que possuem dificuldade de expressarem-se por meio da

FORMAÇÃO

Isabela Sampaio

Cursinhos populares garantem acesso ao ensino superior

Cursos geram acesso Isabela Sampaio

Para os cidadãos de baixa renda e escolas públicas, o projeto de entrar em uma universidade parece estar mais distante, em função das

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dificuldades nos processos seletivos. De olho na preparação desse público, os cursinhos pré-vestibular populares são um bom aliado. Em São Paulo, as zonas Norte, Leste, Oeste e central têm apresentado essa inciativa. Os cursos preparatórios têm modalidades gratuitas, preços especiais para estudantes da rede pública e bolsas de estudo. Entre eles estão o Cursinho Popular da ACEPUSP, Rede Emancipa – Vladimir Herzog, Cursinho Popular Zeca da Casa Verde e Cursinho Popular da EACH-USP. O Diretor de Comunica-

EXPRESSÃO

ção do Cursinho Popular da ACEPUSP, Pedro Augusto Assunção, diz que a proposta nasceu em 2002, dentro da Cidade Universitária da USP. "O objetivo é democratizar o acesso à educação de nível superior e de qualidade", diz. A taxa de aprovação dos alunos que concluem o Cursinho Popular da ACEPUSP varia de 70% a 80% em universidades públicas e federais. A ex-aluna Kamila Oliveira, 21, conheceu o projeto por indicação de uma amiga. "O conteúdo é ótimo e os professores são dedicados", diz ela, que hoje cursa Ciência da Computação.

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fala com o psicólogo, pois a musicoterapia suscita emoções, memórias e sentimentos que podem ajudar no tratamento, além de contribuir na aproximação e formação de vínculo entre o psicólogo e paciente.” No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza Práticas Integrativas

e Complementares (PICS) para os cidadãos, e atualmente esse programa conta com 29 práticas – entre elas estão dança circular, musicoterapia, reiki, quiropraxia e yoga. EXPANSÃO

"Aqui no Brasil, a musicoterapia esta sendo mais

reconhecida", diz a psicóloga Sandra Rizzolo. Além do estímulo do SUS, o número de estabelecimentos que oferece esse tipo de trabalho cresceu consideravelmente, com salto de 13%. Passou de 22.164 em 2017 para 25.197 estabelecimentos em 2018.

EPIDEMIAS E SURTOS

Vacinas são a principal forma de prevenir doenças em 2020 A riane Delago Nos últimos anos, o Brasil passou por surtos que colocaram a população em alerta e forçaram o Ministério da Saúde a atuar com campanhas de prevenção em diferentes estados. No dia 3 de outubro, a Secretaria da Saúde de São Paulo liberou dados sobre os casos de sarampo, doença com maiores índices do ano: foram registrados 6387 casos e nove mortes. Para 2020, a população e a Secretaria já estão em alerta sobre as possíveis doenças

que podem retornar ao País. As arboviroses, malária, hanseníase, sarampo, sífilis (congênita, em gestantes e adquirida), leishmanioses e a influenza são as doenças que sempre estão no radar do Ministério e das Secretarias, segundo a Coordenadoria de Vigilância em Saúde (Covisa). O Sistema Único de Saúde (SUS) já está em alerta e deverá tratar como prioridade no próximo ano. A Covisa possui diferentes métodos de classificação de surtos ou epidemias. A segunda é a elevação do número de casos de uma

doença ou agravo, com excesso em relação à frequência esperada. Já o surto é um tipo de epidemia em que os casos se restringem a uma área geográfica pequena e delimitada ou a uma população institucionalizada. A única forma de prevenção é a vacinação. Hoje, são mais de 300 milhões de vacinas disponíveis nas UBS. No início de setembro, foi divulgada uma redução de 7% no orçamento com vacinas para 2020. O Ministério da Saúde alega que este corte não afetará o Calendário Nacional de Vacinação.


ONCOLOGIA

ESPECIALIZAÇÃO

Tratamento é menos invasivo e prolonga a vida dos pacientes, mas alto custo ainda é uma grande barreira no Brasil

Mirela Freitas

Marcos Paone

Imunoterapia avança no combate ao câncer

Marcos Paone

Mesmo com os seus avanços, a comunidade científica ainda busca a cura do câncer. Um aliado nessa trajetória é o uso da imunoterapia, que se tornou a maior e principal evolução no tratamento do câncer ao longo dos anos. Este não é um tratamento novo, mas o avanço nas suas pesquisas fez com que a imunoterapia se tornasse mais inteligente e eficaz. Ela difere da quimioterapia, mais agressiva, que ataca as células tumorais. “Alguns tipos de câncer têm a habilidade de ‘enganar’ as células de defesa

Prédio do IBCC Oncologia no bairro da Mooca, na Zona Leste da cidade: novas fronteiras científicas e, desta forma, tornam-se invisíveis ao sistema imunológico. Com a imunoterapia, nós estimulamos o sistema de defesa do paciente, para que reconheça e venha também a destruir as células tumorais”, informa Lilian Arruda, médica

investigadora do Centro de Pesquisa Clínica em Oncologia do Instituto brasileiro de Controle do Câncer (IBCC). Apesar dos seus benefícios, principalmente a longo e médio prazo, uma das maiores barrei-

Cursos lato sensu garantem preparação para o mercado

ras na adoção da imunoterapia é o alto valor do tratamento e dos medicamentos. Até setembro de 2018, a imunoterapia ainda não estava disponível para pacientes do SUS. Isso está mudando graças a uma parceria entre o Hospital de Amor e o Governo de São Paulo. Já na saúde suplementar, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) informam que planos de saúde têm que cobrir os custos dos pacientes com tratamentos imunoterápicos associados à quimioterapia.

PARA O FUTURO

Clima e resíduos são desafios ambientais Keller Dantara

Mudanças climáticas são um conjunto de alterações que ocorrem na atmosfera terrestre. Elas afetam a temperatura, o clima, o nível do mar ea qualidade do ar, entre outras. Essas alterações são verificadas por registros científicos feitos ao longo de diversos anos. Essas mudanças podem acontecer por diversos fatores, sejam eles naturais ou por interferência humana. Nas últimas décadas houve um aumento significativo da temperatura terrestre, que levou ao derretimento das calotas polares, à alterações no bioma das florestas, à extinção de diversas espécies e ao aumento do nível do mar. Esse fenômeno, denominado aquecimento global, é

causado pela presença dos gases do efeito estufa na atmosfera terrestre, como o dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4). Segundo o Greenpeace, as emissões de gases do efeito estufa aumentaram ao longo dos últimos 10 anos mais rapidamente que durante todo o período entre 1970 a 2000. ALIADOS E VILÕES

Com diferentes focos, as práticas de reciclagem, a melhoria nas matrizes energéticas, a redução no uso de plástico e um menor consumo de produtos de origem animal podem ajudar a minimizar as mudanças ambientais. Hoje, 60% a 90% do lixo nos oceanos são plásticos, segundo as Nações Unidas. Se continuarmos assim, até 2050, pode haver

mais plástico que peixes nos mares. Thays Majara, 27, engenheira ambiental e diretora de projetos da Engea (Empresa Júnior de Engenharia Ambiental), defende o consumo consciente, “Você escolheria um produto descartável de ele fosse ficar no seu quintal por 500 anos? Não existe lado de fora quando se trata do planeta” O consumo de proteína animal é outro desafio. Um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio ambiente de 2010 também destaca que o consumo de produtos de origem animal é uma das principais causas do impacto sobre o meio ambiente, da poluição, do efeito estufa e do desperdício dos recursos. Para fazer 1 kg de carne são necessários 15 kg de vegetais.

QUANTO TEMPO LEVA PARA SEU LIXO SE DISSOLVER NOS OCEANOS?

CASCAS DE FRUTAS DE 2 A 5 SEMANAS BITUCA DE CIGARRO DE 1 A 5 ANOS SACOLAS PLÁSTICAS DE 10 A 20 ANOS LATAS DE 80 A 100 ANOS GARRAFAS PET 450 ANOS

Parar de estudar depois de terminar a graduação não é uma alternativa para quem quer se destacar profissionalmente. Com a concorrência acirrada, os profissionais devem investir em opções de crescimento para não ser deixados de lado. Por esse motivo, o modelo de pós-graduação é uma oportunidade de se diferenciar e preparar quem deseja cursar mestrado e doutorado (stricto sensu) no futuro. Os cursos lato sensu se estruturam em recortes específicos de algum campo de estudo, com utilidade a quem já está trabalhando, deseja se realocar no mundo corporativo ou quer fazer mestrado. As particularidades desse curso estão na menor carga horária, no mínimo 360 horas. Concluindo-as, o o profissional terá um certificado com benefícios potenciais nos empregos. Essas características se diferem do stricto sensu, voltado para os especialistas atuarem nas salas de aulas, em pesquisas e projetos, além de terem um diploma com título de mestre ou doutor. Bruno Farias, graduado em Gestão de Políticas Públicas pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), diz que a especialização o preparou bem para o mestrado. "As disciplinas da especialização, como psicologia comunitária, direitos humanos, desenvolvimento social e políticas públicas, me ajudaram a pensar um projeto de pesquisa." No portal do Ministério da Educação, são apresentados os critérios necessários para que as instituições de ensi-

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no possam atender a essa demanda de especialização. As universidades devem atender a Resolução CNE/ CES N°1, de 2007. Na prática, instituições de educação superior devem ser credenciadas e os docentes devem ser constituídos por professores especialistas ou que tenham capacidade técnica-profissional. No caso de cursos a distância (EAD), é obrigatório haver provas presenciais, e os alunos precisam defender presencialmente a monografia ou trabalho de conclusão de curso. O coordenador dos cursos de especialização lato sensu da Universidade Presbiteriana Mackenzie, José Estevam Salgueiro, destaca que esses cursos permitem atualização na área de conhecimento. "Os professores, em sua grande maioria, são profissionais atuantes no mercado. Os cursos são bastante úteis, em função dos interesses e do desenho de carreira que o aluno tenha feito ou venha a fazer." TIPOS DE PÓS Dentro do chapéu da formação lato sensu, há duas modalidades. Na Especialização, o profissional irá se aprofundar em um recorte especifico de uma determinada área. Ela é recomendada para quem terminou a faculdade e vê a necessidade de dominar o assunto em que está trabalhando. Já o MBA, traduzido para Mestre em Administração de Negócios, dá foco aos que querem ter uma visão aperfeiçoada de administração.Os empresários, executivos e gestores, que têm maior interesse nessa área, são o principal público.

EXPRESSÃO

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ESPECIAL

Brasil é um dos principais destinos para refugiados na América Latina

Gabriela Carvalho, Larissa Callejas, Laura Motta e Maria Luisa Garcia

Entre os limites que contornam todo país e definem seu território, a imigração aparece como um dos fenômenos mais complexos. Conforme dados das Nações Unidas, são mais de 68 milhões de pessoas em movimento no mundo – incluindo imigrantes e refugiados. ​Em busca de um novo lar, o deslocamento pode ser feito por diversos motivos. Deixar a terra natal pode ter razões mais profundas e difíceis do que se aparenta, e os países que os recebem também possuem justificativas e meios para os atender. No caso do Brasil, haitianos, sírios, venezuelanos e bolivianos estão entre os mais acolhidos. Entre guerras e questões socioeconômicas, políticas e humanitárias, povos de diferentes nações veem no Brasil um símbolo de recomeço. UMA ESCOLHA VIÁVEL

Com amplo território, o Brasil tem destinos capazes de atender as populações refugiadas. O especialista Iberê Moreno, professor historiador e internacionalista, explica como o processo de deslocamento acontece. “Existem diversas subjetividades que devem ser avaliadas. Quando lidamos com a questão da imigração não intencional, o refugiado não escolhe baseado em uma vontade,

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e sim em uma oportunidade. Por isso, temos que pensar que a maioria deles não são as pessoas mais pobres dos países, e sim aqueles que já possuem algum tipo de formação.” Um dos desafios para o refugiado ou imigrante é a questão trabalhista, já que muitas dessas pessoas possuem formação e área definida de atuação, mas não conseguem validar seus títulos com facilidade. Quando os imigrantes e refugiados tentam se integrar à sociedade brasileira, a receptividade é deixada de lado e outro fator, o medo, pode levar à xenofobia. Alguns brasileiros ainda temem que os refugiados, de alguma maneira, “roubem” seus empregos, quando na realidade, o cenário é inverso. O temor se traduz em problemas de relacionamento, de acordo com a internacionalista Elcinéia Silva de Castro. “O acolhimento fica só no discurso e isso é observado até na escola; os filhos desses imigrantes e refugiados sofrem, pois os colegas escutam de casa o pai e a mãe falando mal dos refugiados, que eles estão tirando muitos empregos”, afirma. Segundo ela, o medo da competição profissional se liga à experiência anterior de quem chega ao País. “Normalmente, os imigrantes e refugiados falam três ou quatro idiomas e os brasileiros acham que isso vai ser uma grande ameaça, uma competição.” Muitos dos que chegam

EXPRESSÃO

Pixabay

Em um cenário de crises mundiais, País é visto como lugar para recomeçar entre haitianos e venezuelanos

ao Brasil acabam em trabalhos informais com jornadas desgastantes. Os órgãos responsáveis por atender os imigrantes e refugiados trabalham por melhorias e inclusão e buscam aprimorar a visibilidade do Brasil no exterior. “Talvez o que tenha faltado foi trabalhar o espírito acolhedor que nós temos no discurso internacional no âmbito doméstico, pois são poucos que têm essa noção de recepção e acolhimento. Relações internacionais não são só entre Estados, instituições e organizações, também acontece, entre pessoas; acho que perdemos muito isso”, diz Castro. O aumento do fluxo de imigração no mundo, hoje, se dá em maioria por razões político-sociais e climáticas. Em 2018, segundo a Agência das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), havia 68,5 milhões de pessoas deslocadas à força; delas, 25,4 milhões são refugiadas, 40 milhões se deslocaram internamente em seus países e 3,1 milhões solicitaram asilo.

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No caso da Venezuela, que sofre com graves problemas políticos e humanitários, o Brasil é um país vizinho cotado para se iniciar uma nova vida. Fugindo de uma crise que assola o país ao menos desde 2013, os venezuelanos buscam entrar em território brasileiro pelo estado de Roraima. Já no Haiti, começamos a ter imigrações ao Brasil a partir de 2010, quando o país sofreu com um terremoto que desestabilizou centenas de famílias. O fator climático acabou sendo o gatilho da crise migratória, tratada por meio de acordo humanitário entre os governos. Dos 774,2 mil imigrantes registrados no País de 2011 a 2018, 14,7% foram haitianos – e estes são a principal nacionalidade no mercado de trabalho formal em 2018, de acordo com o estudo Imigração e Refúgio no Brasil, do Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra). Conforme cita a especialista Elcinéia Castro, o

Haiti é um país que sofre com miséria, problemas políticos e desastres ambientais. “Após o desastre em 2010, o Brasil foi escolhido pelos haitianos como uma grande oportunidade para reconstruir a vida.” A situação difere do Brasil, segundo ela. “Nós não temos riscos políticos, e nem desastres ambientais, nós temos enchentes, mas sabemos que não é a natureza, esse é um problema estrutural”, alega. O fato de o Brasil ser potencialmente seguro nessas questões o favorece na escolha de destino. Entretanto, as questões trabalhistas vêm, progressivamente, se tornando um problema, visto que o desemprego aumentou em 42,4% em quatro anos, sendo 24,8% só no primeiro trimestre de 2019, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). E O FUTURO?

Para entender qual é o prognóstico, é preciso entender as principais diferenças entre imigrante e refugiado. Um imigrante é aquele que decide ir a um outro país em busca de melhores oportunidades. Já o refugiado se vê obrigado a isso, pois encara situações que ameaçam sua sobrevivência. A tendência é que imigrantes escolham deixar seus países, mas mantendo o desejo de retornar ao lar original – diferentemente do refugiado, que deseja

voltar, mas na maioria das vezes não consegue. Iberê Moreno indica que essas diferenças decidem o destino de quem se desloca. “O imigrante não quer estabelecer raízes, ele quer voltar pro seu país; muitas vezes ele já estabeleceu raízes, por passar tanto tempo longe, mas ele vai fazer esse movimento”, analisa. “Já o refugiado está em outro país, mas não quer estar; ele continua porque já não consegue mais voltar ou porque, mesmo com uma estabilidade política e com a volta de diversos membros daquele país, a pessoa já não consegue mais retornar, por mais que queira.” Nesse contexto, ONGs de apoio e as próprias ações da Organização das Nações Unidas (ONU) trabalham para solucionar conflitos em andamento – caso da Venezuela, que no momento possui dois presidentes, um parcialmente reconhecido pela comunidade internacional, e problemas graves de abastecimento, violência urbana e desnutrição. “A ONU nunca gerou a paz mundial, mas ela gerou a paz entre as potências e consegue desenvolver projetos que buscam maior estabilidade e maior desenvolvimento coletivo do mundo e não só de alguns países. Por isso que é tão importante, para regular e gerar impacto de diálogo entre os países para tentar desenvolver o mundo”, conclui Iberê Moreno.


LINGUAGEM

Idioma ainda é desafio para a integração de imigrantes Projetos buscam capacitar quem chega ao Brasil quanto à língua portuguesa

Em julho de 1951, o Brasil aderiu à Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados, data que marca o início de uma longa história de contato com povos de outras nações. Estabelecendo padrões para o tratamento de refugiados, a convenção define o conceito de refugiado e o princípio de não devolução. De acordo com este, um país não pode “devolver” um refugiado a seu país de origem, tendo em vista os riscos à sua vida. Ao chegar ao Brasil, são muitos os desafios – e a aprendizagem e a adaptação a um novo idioma, na maioria das vezes, são a primeira barreira. Apesar de ser comum o uso dos termos “imigrante” e “refugiado” como sinônimos, há diferenças cruciais entre eles (confira na reportagem ao lado). Hoje, 11.231 pessoas no Brasil estão no grupo de refugiados, segundo dados de 2019 do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare). Entre 2011 e 2018, o Brasil recebeu mais de 774 mil imigrantes em seu território. O predomínio é do Haiti, da Bolívia e da Venezuela, que, segundo relatório feito pelo Observatório das Migrações Internacionais (OIM), foram também as nacionalidades com maior movimentação no mercado de trabalho formal brasileiro. Adaptar todo

de Estudos Migratórios. A área de acolhida temporária da Missão Paz já conta com 110 quartos. Apesar de ter sua sede junto a uma igreja, o programa não busca catequizar. Como a comunidade latina é forte, há missas em espanhol, inglês e italiano. “A gente tenta fazer com que as religiões sejam também instrumentos de integração”, conclui.

Gisele Augusto

Geovana Miranda

Geovana Miranda, Gisele Augusto, Isabella Arruda e Ana Eduarda Leite

APOIO AO IMIGRANTE

Mural feito manualmente pelo Cami para campanha contra o trabalho forçado ou degradante este público a um novo idioma – no caso, a língua portuguesa – é uma responsabilidade da nação que acolhe. FAMILIARIDADE

Para os latino-americanos, lidar com a língua portuguesa pode ser mais fácil do que para a população árabe ou africana, por exemplo, mas isso não é uma regra. Diana Vargas Carbajal, peruana de 43 anos, professora de espanhol em um colégio na zona leste de São Paulo, encontrou mais facilidade em aprender japonês do que o português, ainda que o espanhol derive do latim, que é a mesma língua mãe do português. “Aprendi o japonês, o português eu deixei de lado porque estava ‘bloqueada’”, conta Diana. Antes de migrar para o Brasil, Diana morou dos 16 aos 20 anos no Japão. Quando chegou aqui, percebeu que precisava aprender o idioma. “Aí

eu coloquei na minha cabeça: ‘Eu quero estudar. Eu acho que a melhor forma de aprender o português vai ser fazendo uma faculdade’. Daí entrei na faculdade e decidi fazer licenciatura em português”, relembra a professora. “Tenho a consciência de que morando aqui no Brasil não falo português corretamente. Eu tenho até vergonha e às vezes prefiro falar em espanhol.” Diana explica como pode ser difícil para um estrangeiro dominar a fala da língua portuguesa. “Minha professora exigia muito que eu aprendesse a aula de fonética. Éramos um espanhol, uma peruana, um colombiano e 60 brasileiros. Nós três ficamos de DP em fonética porque não conseguíamos falar – essa nasalização interna, esse som interno que vocês têm que é próprio do português.” ENSINO E CAPACITAÇÃO

Várias iniciativas de acolhimento facilitam a

Retrato da imigrante Diana Vargas Carbajal integração de imigrantes e refugiados recém-chegados ao País. Documentação, primeira moradia, auxílio na procura de trabalho, profissionalização e cursos de idiomas estão entre as frentes de trabalho. Um dos projetos mais reconhecidos é o Abraço Cultural, que ajuda na integração de refugiados por meio do ensino da língua – ou seja, é um curso de idiomas ofertado para brasileiros em que os professores são pessoas que vivem no Brasil em situação de refúgio. As orientações para o imigrante e o refugiado são dadas de acordo com o nível de urgência. "A demanda dele pode ser documentação ou alternativa de moradia. Há pessoas, às vezes do mesmo país, que vêm para estudar. Na questão da imigração e do refúgio, é difícil ter visões gerais assim, quando uma pessoa chega no País cada caso é um caso, as de-

mandas são diferentes", diz Wellington da Silva de Barros, trabalhador do Centro de Estudos Migratórios da instituição Missão Paz. MORADIA

A Missão Paz trabalha com moradia e auxílio e oferece cursos de língua portuguesa. Iniciada em 1939 pelos Missionários de São Carlos, originalmente tinha o objetivo de apoiar imigrantes italianos que chegavam aos milhares ao Brasil; depois de 1960, o serviço se universalizou. “Eles cuidam da saúde com o oferecimento de médicos e psicólogos, educação com cursos, moradia com assistentes sociais e cestas básicas”, explica Barros. “Fazem a mediação entre refugiado, imigrantes e empresas. Esse é o foco na Missão Paz, que elas que elas sejam cidadãs aqui no nosso país”, complementa o funcionário do Centro

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Outra instituição pastoral de auxílio ao migrante é o Cami, Centro de Apoio ao Migrante. O Cami foi criado em 2005 no Pari pelo Serviço Pastoral do Migrante (SPM), que já atendia a migração para o interior de São Paulo, ao concluir que era necessária uma atenção especial aos imigrantes. A área escolhida foi estratégica: a ideia era que o ponto de atendimento ficasse próximo ao seu público de atendimento. “Muita gente não tinha documentação porque a cidade de São Paulo é tão grande que eles tinham medo de se deslocar e procurar as instituições para se regularizar", explica o padre Roque Renato Pattussi, coordenador geral do Cami. A dificuldade também envolve o espectro financeiro. "Primeiro porque não sabiam, não conheciam a cidade, segundo porque sobrava pouco dinheiro para se regularizar, terceiro porque na época só podia se regularizar por matrimônio com brasileiro ou brasileira ou com filho nascido aqui no País.”

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CARREIRA E VIDA

A viagem de uma vida em busca de um emprego Moisés Martins, João Pedro, Luis Etchebehere, Alaíde Colafati e Vinicius Mangini

Debaixo de um calor de 30ºC na tumultuosa tarde da cidade de São Paulo e em meio ao ápice de movimentação do dia na região do Brás está o vendedor senegalês Abdu, vendendo seus óculos na calçada da Rua Barão de Ladário, colocados em uma pequena mesa de madeira. Abdu olha a rua, os carros, as pessoas ao redor e seus parceiros em uma pequena fração de tempo, enquanto explica o produto para o comprador e procura o troco em seus bolsos. Quando nos aproximamos, com um olhar curioso, quem nos recebe é o segundo vendedor da mesa – que não quis se identificar. Ao explicar nossa reportagem, nos direciona para falar com Abdu, mais fluente em português. OLHAR DESCONFIADO

Abdu nos recebe ainda desconfiado de que fôssemos de alguma espécie de fiscalização. Isso poderia colocar em risco suas mercadorias, que não possuem permissão legal para serem vendidas. Ele conta que é vendedor ambulante da região do Brás há cerca de dois meses e que saiu do Senegal em busca de melhores condições de vida. Veio para o Brasil e desembarcou em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, antes de vir para São Paulo. Quando perguntamos sobre as motivações de

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Pixabay

Na esperança de se recolocar no mercado, imigrantes desembarcam no Brasil, mas esbarram em diversos problemas relacionados às condições de trabalho

Abdu para vir para o País, ele destaca a dificuldade para quem não possui condições de estudo. “É para melhorar a vida, ‘tá ligado’? Porque lá mesmo é difícil, lá tem trabalho, mas pra quem não tem estudo não tem trabalho bom, aí sempre as pessoas que não têm estudo procuram melhorar a vida em países diferentes”, nos conta o vendedor, com um português ainda repleto de sotaque.

nasceu, o preconceito e a xenofobia ainda são os maiores problemas. “Cheguei aqui sem falar nada do português, aí eu falava francês e wolof. Depois eu fui aprendendo com meus amigos e trabalhava de carteira assinada. Também havia muitos amigos que me ajudavam. Se eu falasse alguma coisa errada eles diziam ‘não é assim, é assim e assim’. Foi desse jeito que eu aprendi”, conta.

BARREIRAS DO PRECONCEITO

A JORNADA PELA REGULARIZAÇÃO

Se para os próprios brasileiros de baixa renda e carga escolar a luta por um emprego formal já é complicada e árdua, para um imigrante com baixa escolaridade e pouca fluência no português a situação pode ser ainda pior. Abdu nos conta que, mesmo com a distância da família e do lugar que

EXPRESSÃO

De acordo com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Brasil registrou cerca de 700 mil imigrantes no período entre 2000 e 2018 e esse índice é propício a crescer com a tendência de políticas acolhedoras a estrangeiros. Mas para todos que vêm para o País com a intenção de trabalhar, é preciso passar por

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um processo de registro. O professor de direito trabalhista da Universidade São Judas Danilo Uler explica como é realizada essa etapa: “se o imigrante trabalhar de modo subordinado, contínuo e mediante salário, ou seja, na qualidade de empregado, precisa ter uma carteira de trabalho e previdência social (CTPS). Caso trabalhe como autônomo, precisa abrir uma empresa, geralmente como microempreendedor individual”, explica. Segundo o docente, a CTPS é emitida pela Secretaria de Trabalho, com agendamento. “Aliás, esse agendamento exclusivo pelo site tem sido apontado como um obstáculo ao acesso desses trabalhadores ao emprego registrado”, aponta. Ainda assim, com a devida documentação, muitos empregados e empregadores ultrapassam os limites estabelecidos por lei e acabam por oferecer trabalho em condições degradantes ou até análogas à escravidão. A vigilância pelo fim do trabalho escravo é constante, mas, com o número de desempregados chegando aos 13 milhões e o volume de imigrantes também em crescimento, a perspectiva é que infelizmente mais pessoas acatem as subcondições de trabalho. “Quem trabalha de forma ilegal não pode ser penalizado, justamente porque o trabalho irregular já prejudica. A única exceção é quando o próprio trabalho é ilegal, representan-

do um ilícito penal”, diz Uler. “Quem emprega um imigrante de modo irregular se submete às mesmas multas administrativas aplicadas quando emprega irregularmente outros trabalhadores. Quando há trabalho em condições análogas à trabalho escravo, o empregador comete crime”, comenta o professor. Quando questionado sobre a quantidade de trabalho ilegal envolvendo imigrantes, o professor destaca a dificuldade do idioma e a burocracia no processo de unificação de órgãos governamentais de fiscalização do trabalho. “É bem verdade que o mercado de trabalho brasileiro é historicamente desestruturado: apesar de

leis trabalhistas protetivas, convivemos com situações de desrespeito sistemático e de fraude à legislação trabalhista. E isso afeta todos os trabalhadores.” As barreiras linguísticas, culturais e de acesso a direitos acabam colocando os imigrantes mais sujeitos à exploração, diz o professor. “A fiscalização sempre foi feita pelo Ministério do Trabalho, que, com sua extinção e transformação em secretaria vinculada ao Ministério da Economia, deixa de cumprir essa importante função”, conclui. A reportagem entrou em contato com o Ministério da Economia e a Secretaria do Trabalho, porém não recebemos resposta ou qualquer contato de retorno até a publicação desta edição.

Como denunciar Caso você identifique relações empregatícias baseadas na submissão de pessoas a serviços forçados, jornadas exaustivas, condições degradantes ou servidão por dívida, deve denunciá-las ao Ministério Público do Trabalho (MPT) ligando no número 158. Dali o caso será encaminhado para o setor do ministério que é responsável por receber as denúncias. ​Após feita a denúncia, o MPT e a Polícia Federal (PF) irão apurar o caso. Se houver irregularidade, o resgate das pessoas escravizadas vai ser feito, seguido de orientação jurídica pela Defensoria Pública da União (DPU). Entre os direitos dessas pessoas estão a indenização por danos morais e o pagamento das verbas da rescisão trabalhistas. Os indivíduos resgatados têm, ainda, o direito ao seguro desemprego, que dá o direito a três parcelas do salário mínimo para o trabalhador, mas somente para quem não possui outro benefício do INSS exceto a pensão por morte. A solicitação desse direito deve ser feita até 90 dias após o resgate, com o auxílio de um auditor fiscal da Secretaria do Trabalho.


VIVER BEM

Burocracia para refugiados afeta obtenção da casa própria Victor Hidalgo

Em meio a crises, milhares de venezuelanos procuram abrigo no Brasil – e uma das maiores dificuldades é o acesso à moradia

São Paulo é o destino de 52% dos refugiados que chegam ao Brasil Lara Romera, Gabriel de Assis, Camila Stucaluc, Fernanda Vollstedt, Sara Martins e Hellen Cerqueira

Travessias longas percorridas em busca de um lugar estável para viver. Esse é o cenário que milhares de famílias venezuelanas enfrentam desde 2014 por conta da crise política, econômica e social instaurada no país vizinho. Os impactos são extensos e incluem a burocracia necessária para se instalar em um novo território – o que inclui a habitação, por meio da compra da casa própria ou de aluguéis que exigem documentação específica. Segundo a Polícia Federal (PF), até novembro de 2018 havia registro de 77.306 pedidos de refúgio e 39.692 pedidos de residência em todo o Brasil. Em Roraima, 96.094 venezuelanos procuraram a PF para solicitar regularização migratória. Desses, 62.128 pediram refúgio e 24.966 residência. A principal porta de entrada desses re-

fugiados é o estado de Roraima, mais precisamente na cidade de Pacaraima. Porém, esse é só o começo da jornada para a obtenção do status de refugiado. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), atualmente, a Venezuela é o país com o maior grupo populacional fora do local de origem, e o Brasil é o país com o quinto maior contingente de refugiados venezuelanos. Ao falar sobre os direitos assegurados a essa parcela da população, o advogado Osmar Assis destacou o enunciado do artigo 5º da constituição brasileira. O artigo afirma que todos são iguais perante a lei e garante a brasileiros e estrangeiros residentes no país a “inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Um dos principais pilares para garantir a estabilida-

de de uma pessoa é o acesso à propriedade, ou seja, moradia. Em São Paulo, cidade destino de 52% dos refugiados que chegam no Brasil, o Centro de Referência de Atendimento para Imigrante (Crai) oferece apenas 540 vagas para imigrantes e refugiados se alojarem por tempo limitado. Muitos refugiados acabam buscando outros lugares para se abrigar,

como ocupações, cortiços, casas de aluguel com preços abusivos e, inclusive, as próprias ruas. Segundo a Agência da Organização das Nações Unidas para Refugiados no Brasil (Acnur), refugiados moradores da capital paulista apontaram que a maior dificuldade vivenciada por eles é o acesso regular à moradia. Outra alternativa para encontrar um local digno para morar seria comprando a casa própria, mas a burocracia é grande. “A parte documental de aquisição de imóveis geralmente é a mais complicada”, salientou Osmar de Assis. CASA PRÓPRIA

Os principais documentos necessários para a compra de um imóvel são RG, CPF, certidão de nascimento ou casamento e certidão de interdição e tutela. Além disso, é realizada uma consulta prévia para compreender a situação judicial, civil e financeira

do futuro proprietário. Antes, outro procedimento surge no caminho: a escolha de um lugar e a quantia exigida para a compra. O corretor de imóveis Daniel Garcia traz um levantamento sobre os bairros da cidade de São Paulo, uma das participantes do programa solidário de acolhimento à população venezuelana. A relação também mostra valores do metro quadrado e a renda mínima exigida para os trâmites de aquisição.As pessoas em situação de refúgio, majoritariamente desamparadas, encontram dificuldades para acessar esses dados. E é nesse contexto que o Refúgio 343 surge. A fim de auxiliar as famílias venezuelanas, Fernando Rangel, Laura Fatio e Guilherme Sperandio uniram forças e criaram o projeto. 20 de junho de 2019, Dia Mundial dos Refugiados, é a data de nascimento da organização, quando, oficialmente, interiorizaram a primei-

Imigrante x refugiado: entenda a diferença

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ra família, em São Paulo. “A interiorização é a estratégia que adotamos para promover com amor e responsabilidade a inserção socioeconômica dessas famílias no Brasil”, disse Débora Spitzcovsky, coordenadora de comunicação do Refúgio 343. “Contamos com a ajuda da sociedade civil. Cada família é designada a uma equipe acolhedora, responsável por assessorá-la durante todo o processo de interiorização em seis diferentes frentes: Educação, Português, Saúde Mental e Física, Carreira e Financeiro”. Mais de 20 famílias foram interiorizadas com a ajuda da organização até hoje. O processo dura ao todo três meses e caminha para que, no final, a família ou pessoa beneficiada tenha autonomia sobre suas demandas. “Nosso objetivo final é capacitar essas famílias para a independência”, explica a coordenadora. E eles não atuam sozinhos. A iniciativa recebe apoio da Fraternidade Sem Fronteiras, de agências da ONU, do Ministério da Defesa Civil e de instituições privadas.Os voluntários fazem um cadastro no sistema do Refúgio 343. Em seguida, a equipe analisa o perfil do acolhedor e seleciona uma família que se encaixa em suas condições. “Após darmos ‘match’ entre acolhedor e família, providenciamos, juntamente com nossos parceiros, seu deslocamento para a cidade de interiorização”, descreve Débora Spitzcovsky.

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VIDA DIGITAL

Chatbots e interações marcam 2019 Especialistas fizeram projeções diversas sobre o futuro do mundo conectado; no fim do ano, nota-se avanço em tecnologias de interação que combinam robôs e humanos A comunicação em ambiente digital estimula, desde os anos 1990, uma série de previsões – das otimistas às mais realistas. Hoje, as empresas estão aderindo muito mais à automação de processos, incluindo ferramentas API (programação de aplicações), chatbot e bot. Os chatbots, por exemplo, são tecnologias que permitem que os robôs respondam aos usuários de forma automática e vão aprendendo as interações de forma semelhante às pessoas, otimizando processos de atendimento. William Ferreira, 26 anos, é formado em marketing e em seu dia a dia utiliza a tecnologia como aliada para beneficiar a eficiência em dados. Ele destaca a importância dos avan-

Tendências das mídias para 2019

Caroline Guimarães

Caroline Guimarães

cem aos poucos nos ambientes de trabalho). INFORMAÇÃO

ços tecnológicos na otimização de tempo, mas reforça a importância de se investir em pessoas, mesmo em um mundo digital. “Investir em digital é reduzir gastos, mas existem habilidades

humanas que jamais serão substituídas, e que, por sinal, são consideradas necessárias para os profissionais do futuro." Essas habilidades, ressaltadas por grandes executivos do segmento,

incluem a capacidade de tomar decisões (levando em consideração a imensa quantidade de dados que as empresas reúnem cada dia mais), pensamento crítico (envolvendo raciocínio e lo-

gica para questionar determinados problemas), criatividade (construir ideias inovadoras para apresentar algo novo) e resolução de problemas (solucionar problemas indefinidos que apare-

No outro rumo, cada vez mais as redes sociais (Facebook, Instagram etc.) figuram como formas de interagir; nelas, além da influência social, é possível se fazer jornalismo. Os jornalistas podem usar os grupos para se conectar com as comunidades e compartilhar histórias. É possível ter controle das publicações e dos comentários, submetidos à filtragem de moderadores. As máximas aplicadas às perspectivas digitais em 2019, no geral, foram atendidas, mas novas tendências sempre surgem com o decorrer do ano. Para isso, todos os dias novas formas de comunicação e eficiência são pensadas, de olho em uma melhor conexão entre empresas e usuários e no fortalecimento dos vínculos humanos nas interações.

MAIS IMERSÃO

Realidade virtual e aumentada expandem universo dos games Fernanda Souza

A indústria de videogames está em transformação no Brasil. Os conceitos de VR (Virtual Reality – Realidade Virtual) e AR (Augmented Reality – Realidade Aumentada) são as novas tendências do setor tecnológico de entretenimento. O objetivo é aproximar os jogadores do mundo virtual, permitindo a sensação de transição no tempo e espaço. O segmento VR trabalha com uma experiên-

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cia imersiva dentro de um mundo totalmente novo e interativo, como no filme Matrix, que retrata uma realidade simulada por máquinas. A experimentação, normalmente, ocorre por dispositivos 3D e o display head-mounted, uma espécie de óculos virtual. De acordo com o técnico de computação Wilson Júnior, 27 anos, “essa nova tendência interativa muda tudo". "A partir do momento que

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os jogos tiverem uma imersão total, poderão ser aproveitados por pessoas de várias faixas etárias, o que é ótimo para aumentar o público-alvo do segmento". Na AR, a sobreposição de elementos é o que se destaca. Componentes do mundo virtual passam a fazer parte do espaço autêntico de forma rápida e prática. Esse formato tecnológico ganhou força em 2016 com o lançamento do jogo Pokémon Go, voltado

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para smartphones, permitindo que os seus usuários capturem criaturas virtuais nas proximidades de sua localização. Eventos como o Brasil Game Show (BGS) destacam a força dos jogos na indústria brasileira. A feira, que acontece no Expo Center Norte, se consolidou como a maior do ramo na América Latina, com cerca de 300 mil visitantes durante a semana de exposição (9 a 13/10), em São Paulo.

Quem passou por lá teve a oportunidade de conhecer as grandes produtoras, nomes de destaque e conferir apresentações. Para o estudante Kevin Santos, 22 anos, o acesso a essa tecnologia vem ganhando espaço. "Só que para comprar os jogos é necessário um bom investimento. O preço varia de loja em loja, mas ainda não é algo que seja totalmente barato e acessível." Conforme dados da Newzoo, consultoria de

inteligência em jogos, em 2018, o número de gamers foi de aproximadamente 75,7 milhões no país. A movimentação financeira ficou em torno de US$ 1,5 bilhão (equivalente a R$ 6 bilhões), liderando a América Latina e na 13ª posição do ranking global da atividade. Com esse crescimento, a tendência é que haja novos investimentos para os apaixonados pela cultura geek (fãs de tecnologia).


TECNOLOGIA

Minas Programam deseja crescer a cada ano e ajudar mais mulheres Wanessa Brasil

A tecnologia da informação é um espaço dominado por homens, mesmo as mulheres sendo maioria nas universidades. Segundo o Censo da Educação Superior, em 2015, 60% das pessoas que concluíram o ensino superior foram mulheres, mas essa taxa cai para 41% nos cursos relacionados à ciência e para 29,3% em cursos de engenharia e da área de exatas. O Minas Programam foi criado para tentar mudar esse cenário, buscando promover conhecimento nas áreas de ciência, tecnologia e computação para meninas e mulheres, em sua maioria negras e moradoras de áreas periféricas.

Divulgação Minas Programam

Desde 2015, projeto tem oferecido cursos e conhecimento para que o mundo feminino possa ingressar na área da programação

Turma do curso de Introdução à Prograação, edição de 2018: novas perspectivas às mulheres Criado em 2015 pelas amigas Ariane Cor, Bárbara Paes e Fernanda Balbino, o projeto já ajudou dezenas de meninas e mulheres e continua a todo o vapor com o curso anual de Introdução à Programação, além de oficinas, treinamentos e debates que acontecem durante todo o ano. Atualmente, tudo ocorre no Galpão de Cultura e Cidadania, mais

conhecido como Galpão ZL, na Zona Leste de São Paulo, graças ao apoio do projeto Elas Periféricas da Fundação Tide Setubal. “Fiz o curso de dados com python, todo o conteúdo me agregou muito. Consegui me recolocar no mercado de trabalho com uma grande oportunidade graças ao Minas Programam”, declara

Vilma de Oliveira Valdevino, 24, analista de BI, formada em Sistema da Informação pela Universidade Nove de Julho. O curso e os eventos são totalmente gratuitos, ministrados somente por mulheres, oferecendo espaço para aprender e compartilhar conhecimento. “São selecionadas de 30 a 35 garotas para o curso de Introdução à Programação, que tem 64 horas de duração. A cada ano que se passa procuramos aprimorá-lo”, explica Ariane Cor, 32, designer, estudante de Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP) e uma das fundadoras do projeto. Todo projeto gera custos, tempo e muito engajamento. “O maior desafio

inicialmente foi a questão financeira. Atingir garotas negras da periferia que se interessam por tecnologia e garantir a permanência delas no curso, e posteriormente permitir que elas sejam inseridas no mercado de trabalho, no ensino superior ou que consigam viabilizar os próprios negócios é essencial”, declara Ariane. Os desafios surgem para as idealizadoras do projeto e também para as meninas e mulheres que desejam seguir na área da tecnologia da informação, ciências e exatas. “No primeiro dia de aula, veio um menino e falou que eu estava na sala errada. Sofri preconceito no primeiro minuto que pisei na sala de aula, como se eles quisessem

me falar que ali não era o meu lugar”, conta Vilma. PERSPECTIVAS

O projeto deseja crescer e poder ajudar mais mulheres, que não necessariamente querem trabalhar com tecnologia, mas que estão afastadas dessa área e que possuem conhecimentos em outros universos. “Em 2020 desejamos realizar mais edições do curso com novos parceiros, inclusive vamos fazer uma edição já no início do ano. A gente tem uma ideia de atingir mães, donas de casas e mulheres mais velhas, para que elas se sintam mais seguras e usem a tecnologia de uma forma positiva e aproveitem esses benefícios”, finaliza Ariane.

LITERATURA JOVEM

Núbia da Cruz Giovanna Vaccaro tem apenas 19 anos, mas já podemos chamá-la de uma escritora experiente, com três livros lançados – o primeiro com 13 anos. Estudante de Jornalismo da Universidade São Judas, ela acredita que o curso contribui na hora da sua escrita. Com um público majoritariamente adolescente, seu último livro, chamado "Stowe", é um suspense que já vendeu cerca de 10 mil exemplares. Em entrevista ao Expressão, ela destaca o vín-

culo com as plataformas da literatura. Como é a sensação de ter livros sendo tão jovem? Desde o primeiro livro, me senti realizada. É como um sonho. Todas as minhas publicações e livros mudaram totalmente o curso da minha vida, não sei o que eu estava fazendo se não fosse pela minha primeira publicação. Eu conheci pessoas, lugares e, principalmente, leitores. Eu me sinto muito bem por ter um público que quer saber minha opinião sobre os assuntos e ler sobre o

que eu quero falar. Quais as diferenças de evolução de qualidade nos seus livros? Publiquei o primeiro com 14 anos e o mais recente, neste ano, com 19 anos. São cinco anos de carreira e eu já evoluí muito — tanto na escrita quanto como pessoa. Todo mundo fala que meus livros são bem melhores hoje em dia. Como ocorreu a publicação do seu primeiro livro? Eu era uma pessoa muito tímida e, quando comecei

a escrever, não sabia que aquela história se tornaria um livro. Escrevi no Word e escondi no meio dos documentos do computador da minha mãe, porque não queria que ela ou qualquer outra pessoa lesse. Mas deu errado! Minha mãe encontrou e leu, adorou e disse que gostaria de publicar. Eu não acreditei no começo porque elogio de mãe normalmente é exagero. Ela correu atrás de uma editora e mandamos originais para várias. Algumas me aceitaram e cobraram um valor para que eu pudesse publicar.

Quais as dificuldades do mercado editorial? É difícil encontrar alguém que realmente goste de ler, mas o público leitor no Brasil é bem assíduo, por isso, o déficit literário não me atrapalha. As dificuldades no mercado é que estamos em crise, as livrarias estão fechando, as editoras não investem e os autores não sabem se divulgar. Por que a escolha do suspense em seu novo livro? Eu queria mudar meu gênero. Meu público era 90% formado por meni-

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Núbia da Cruz

“As publicações e os livros mudaram o curso da minha vida”

nas adolescentes (que eu amo), mas eu queria expandir. Queria leitores meninos e mais velhos. Além do mais, é uma coisa que eu amo: vibrar com uma história.

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CULTURA E ARTES

Clubes de leitura crescem e estimulam debates Jéssica Carvalho

Reuniões presenciais e on-line reúnem aficionados por livros

Literatura feita por mulheres está entre os focos Eloísa Ribeiro

Com a correria do dia a dia, acabamos perdendo ou deixando de lado algumas atividades, entre elas a leitura, que está se tornando cada vez mais rara com o

crescimento da tecnologia. Segundo levantamento feito pelo Retrato da Leitura do Instituto Pró-Livro em 2018, 44% da população não lê, e 30% nunca comprou um livro. Para fomentar o setor, existem os clubes de

leitura, que têm como intuito fortalecer a prática e gerar o hábito entre os novatos. Os clubes de leitura surgiram no século 18, quando os puritanos americanos se juntavam para estudar a Bíblia. Ao longo dos anos, foram crescendo e se aperfeiçoando. Neles, pessoas que gostam de ler ou que querem entrar para esse mundo têm a oportunidade de discutir as bras. O Extra Literário, que teve seu início em 2016, é um clube que trouxe um diferencial. Ele busca ler autoras mulheres, com o intuito de levar obras contemporâneas de literatura brasileira e estrangeira, voltadas ao conhecimento e debate de assuntos do feminino pre-

PARA 2020

Governo estadual disponibiliza menor orçamento para a cultura Murilo Coelho

O governo já tem um orçamento destinado à cultura no estado de São Paulo para o ano de 2020. A estimativa para o próximo ano é que R$ 800 milhões sejam aplicados no estado, número inferior ao ano de 2019, no qual foram investidos cerca de R$ 816 milhões. A deputada estadual Isa Penna, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), relata os números que a cultura obteve nos últimos 10 anos no estado de São Paulo. Além disso, opinou que o trabalho terceirizado, que é gerenciado pelas empresas privadas, deveria ser

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efetivado pelo estado. “O cálculo da cultura encolheu significativamente nos anos anteriores no estado. De 2010 para este ano de 2019, enquanto o orçamento geral subiu 77%, o da área cultural teve apenas 13%, o que significaria uma diminuição de R$ 924 milhões para R$ 816 milhões disponibilizados entre esses anos. Em 2020, o orçamento geral irá chegar a um valor de R$ 239 bilhões”, informa a deputada. Na divisão do orçamento geral, de acordo com o valor completo dado pelo governo, a cultura fica com a menor parte investida em comparação a outras áreas,

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como a saúde e educação. “Do pouco orçamento destinado pelo governo à cultura no estado, quase 80% é direcionado a empresas privadas, como organizações sociais e as fundações, que gerenciam de forma terceirizada as atividades culturais, um trabalho que deveria ser efetivado pelo estado”, explica Isa Penna. Segundo Isa, a Frente Parlamentar em Defesa da Cultura, representada pelo Secretário da Cultura e Econômica Criativa, Sérgio Sá Leitão, prometeu voltar ao percentual de 0,63%, do ano de 2010. No entanto, o planejamento orçamentário para 2020 tem redução.

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sente em obras. Fundadora e mediadora, Jessica Carvalho, 28, teve a ideia de trazer esse assunto para a pauta depois de ver uma pesquisa feita pela professora brasiliense Regina Dalcastagné mostrar que 72,7% dos livros que foram publicados no Brasil por grandes editoras entre 1975 e 2004 foram escritos por homens. “59% dos leitores do País são mulheres. Por que não fazer uma curadoria que contemple o gênero feminino em termos de representação e autoria?”, questiona Jessica, que ressalta que o clube é para todos. “Buscamos falar sobre a forma com que a história foi escrita, para além do conteúdo em si."

MORADIA

Ocupação 9 de Julho acolhe artes e sofre pressão Isabela Lopes Ocupado pelo Movimento Sem Teto do Centro (MSTC), o edifício 9 de Julho já pertenceu ao INSS, possui 14 andares e, hoje, abriga mais de 120 famílias. Além de um espaço para viver, os moradores contam com atendimento médico toda semana, exposições de arte e aulas de teatro, entre outros. As atividades são proporcionadas por voluntários e ativistas como Aparelhamento, Uneafro, UBS República, Projeto Pipa e Equipe Redemoinho. Uma atividade elogiada com frequência é a Cozinha Ocupação 9 de Julho, em que os moradores e voluntários realizam almoços mensalmente com a ajuda de chefs convidados. Silvia Cristina, 57 anos, aposentada, já participou algumas

vezes. “Eles fazem uma comida saborosa e leve. Também sempre tem um prato diferente”. Um dos maiores projetos, este ano, foi a festa junina: mais de 8 mil pessoas prestigiaram o evento. Naquela época, o Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC) da Polícia Civil decretou a prisão dos principais líderes do movimento, sob acusações de extorsão, agressões e ameaças. Em contrapartida, a defesa questionou a falta de provas. 100 dias após a prisão, foi concedido por desembargadores do Tribunal da Justiça de São Paulo um habeas corpus para as lideranças. De acordo com o secretário de Habitação, João Faria, a prefeitura não tem interesse em retirar os moradores do local, mas, o clima que vivem é de insegurança e instabilidade.

ARQUITETURA

Edifícios carregam história e cultura do País Beatriz Alves Muitos edifícios de São Paulo foram desenvolvidos por grandes nomes da arquitetura, trazendo algo novo para que possamos admirar. Mas que histórias e conhecimentos esses prédios podem trazer para o país? O arquiteto Toni Moraes alega que as edificações sempre marcam a história do país de alguma forma e nos dizem o contexto da produção arquitetônica e do pensamento dessa produção. "No entanto, precisamos ter em mente que esse processo sempre foi de exclusão, pelo fato de a arquitetura ser uma atividade elitista desde o acesso às

faculdades até o canteiro de obras”. O arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer foi um dos personagens mais influentes da moderna arquitetura mundial, com obras como o Memorial da América Latina, inaugurado em 1989. O arquiteto Adilson Macedo, destaca esse e outros nomes. "Alguns edifícios hoje representam a obra de arquitetos que você indica como ‘nomes da arquitetura’. Realmente são Oscar Niemayer, Lucio Costa, Rino Levi e outros. Eles fizeram nossa arquitetura despertar interesse internacional.” O trabalho de arquitetos sempre foi algo a se admirar. “Eles representam a me-

mória imagética das nossas construções. Algumas dessas obras são até um tipo de manifesto concreto das ideias de seus idealizadores, como o edifício do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro", diz Moraes. “O Edifício Martinelli, por exemplo, tem uma história curiosa. Ele foi construído como um edifício residencial e, na época, era o edifício mais alto da cidade. Para convencer os compradores de que era seguro habitar um edifício tão alto, o dono do investimento resolveu construir um andar a mais pra colocar a sua própria residência e assim chancelar a segurança da habitação”, explica Toni.


RELIGIOSIDADE

ISLAMISMO

Número de jovens ateus e agnósticos cresce

Práticas culturais marcam religião que mais cresce no mundo Filipe Mello e Graziella Milantoni

Nicole Fraga e Valéria Abreu

Atualmente, no Brasil existem mais de 20 religiões e crenças. No entanto, é possível constatar uma insatisfação por parte dos jovens, que, apesar da diversidade religiosa, seguem outros rumos. De acordo com estudo realizado pelo Núcleo de Tendências e Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) em 2015, com a amostragem de 1.500 respondentes na faixa de 18 a 34 anos, 19,3% são ateus e 6,2% agnósticos, representando 25,5%. Essas duas escolhas são posições filosóficas que estão em constante crescimento no País. Agnósticos consideram os fenômenos sobrenaturais inacessíveis à compreensão humana; afirmam que podem ou não existir. Já

os ateus são aqueles que não acreditam em Deus ou em qualquer “ser superior”. Diferentemente da Teologia, que procura compreender as relações internas dos grupos religiosos, as Ciências da Religião estudam o fenômeno religioso de forma plural e interdisciplinar. Segundo Hamilton Castro da Silva, 40 anos, graduado em Ciências Sociais e História, mestre e doutor em Ciência da Religião, “a produção de ateus ou agnósticos está relacionada com a secularização da nossa sociedade". "A religião perdeu sua força hegemônica e simbólica para poder explicar a realidade. Agora, na Modernidade, a religião enfrenta concorrentes: a política e a ciência. A religião não consegue mais exercer sua força hegemônica", diz. A desvinculação religiosa,

Nicole Fraga

Experiências negativas e avanço da ciência estão entre os motivos para esse fenômeno

Jovens e stão mais propensos a não se encaixar em religiões específica muitas vezes, acontece por conta de experiências negativas. Os mais novos estão deixando de confiar na Bíblia e na igreja. Os principais motivos são alguns dogmas que, na percepção dos jovens, são ultrapassados ou têm restrições consideradas atrasadas. Álvaro Benício Miranda de Paiva, 19 anos, estudante de Engenharia Mecânica na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), já seguiu o catoli-

cismo e teve interesse no islamismo, mas atualmente é ateu.. “Não via no universo a necessidade da existência de qualquer tipo de Deus para que as coisas fossem da forma que são". conta. Já Luana Miranda Bastos, 19 anos, estudante do 6º semestre de Filosofia na Unifesp, declara que se tornou agnóstica. “Minha mente está aberta para descobrir coisas novas e criar sem me prender a uma religião."

JUDAÍSMO

Herança cultural resiste em SP Leidinara Azevedo O judaísmo é a religião monoteísta mais antiga do mundo e também a com menor número de fiéis. Estudo realizado pelo instituto de estatísticas israelita e pela Universidade Hebraica de Jerusalém aponta que há em torno de 15 milhões de judeus no mundo (dados de 2018). A população judia está, em sua maioria, em Israel e nos Estados Unidos. No Brasil, segundo o censo do IBGE de 2010, a população judaica é de cerca de

110 mil pessoas, sendo a segunda maior concentração de judeus da América Latina, ficando atrás apenas da Argentina. O número também coloca o país em 11° lugar mundial. No Brasil, a maioria dos judeus está no estado de São Paulo, com mais de 51 mil pessoas. Como essa é uma religião de tradição matriarcal, é certo dizer que todos os filhos de mães judias são considerados judeus. Uma das práticas mais emblemáticas dessa religião é uma espécie de touca,

chamada de kipá, que os homens judeus usam em respeito e temor a Deus. Em países como Israel, onde a religião está mais presente, seus costumes estão presentes mais fortemente nas comunidades fiéis. Em São Paulo, a situação não é a mesma: existem poucas sinagogas, templos onde acontecem as reuniões e os cultos dessa tradição. Samuel Navon, de 21 anos, mora em São Paulo e tem avós que vieram de Israel para o Brasil nos anos 1970. “Sempre recebi os ensina-

mentos da minha religião, é uma tradição da minha família. Meu pai usa o Kipá todos os dias, mas eu uso apenas nos momentos de oração, quando saio na rua com ele as pessoas ficam olhando". O Expressão também ouviu Débora Batista Alcazar, 26 anos, que dedica seu tempo partilhando a experiências da sua religião com crianças e jovens. “Somos conhecidos por sermos o povo ‘escolhido de Deus’, mas também temos uma longa história de lutas, derrotas e vitórias como judeus", relata.

Religião que mais cresce no mundo, o islamismo contava com 35.167 seguidores até 2010, segundo o IBGE. Com 115 mesquitas ao redor do país, a religião, que tem como cinco principais pilares fé, oração, jejum, caridade e peregrinação, segue sendo praticada por seus seguidores e descendentes. Mohamad Sabouni, 30, engenheiro de comunicação, é responsável pela parte de marketing de uma mesquita do Islã localizada na região do Cambuci em São Paulo. Ele conta que, na mesquita, são feitas cinco orações diárias e, por isso, fica aberta das 4h da manhã até as 20h e, algumas vezes, até mais tarde para conversas com lideranças e outros momentos de oração. ‘’Às sextas feiras é o nosso dia sagrado. Às 12h30, o sheik faz o sermão junto com a gente. É considerado o encontro dos muçulmanos em São Paulo. Fazemos a reza especial, reza da sexta-feiras. Tem a parte dos homens, que tem comparecimento obrigatório, e a parte da mulheres, que podem vir de modo opcional." As orações da mesquita são transmitidas também via redes sociais, para que os seguidores possam acompanhar a distância. Além disso, existem palestras religiosas para as famílias dedicadas exclusivamente às mulheres, com duração de aproximadamente uma hora e meia. Essa aproximação é uma forma de conectar mais pessoas à fé no Brasil – que não está entre os líderes no Islã global, que cresce

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em maior expressão em países da Europa. ‘’Acho que o islamismo tenta orientar as pessoas a seguir a Deus e ao Alcorão, para que possamos ter recompensas, bênçãos e ter Deus em primeiro lugar. Fazemos sempre jantares, festas para reunir a todos, assim tentando fazer com que a comunidade esteja sempre unida", explica Salua El Majzoub Yassine, 43, muçulmana de criação. Sabouni defende que as religiões, dentro da sua concepção, acreditam em um Deus único, em histórias que saem de um livro sagrado e em sua palavra. Para elas, as práticas do islamismo é que são diferentes. ‘’Acreditamos em todos os profetas e mensageiros, mas damos mais ênfase ao último’’, diz. A mesquita é frequentada por diferentes nacionalidade. Sabouni explicou que não necessariamente os muçulmanos são árabes e que não é necessário saber falar a língua para se tornar um seguidor do Islã. Aproveitou, ainda, para contarà reportagem que boa parte da população árabe não é muçulmana. Salua e Mohamad afirmam que não sofreram, no Brasil, nenhum caso de preconceito. ‘’Em São Paulo, as pessoas são mais modernas", diz Mohamad. A maior parte dos muçulmanos presentes no Brasil está concentrada nos estados de São Paulo e no Paraná; uma alta parcela é descendente de sírios e libaneses. Segundo o IBGE, 83,2% dos muçulmanos no País são autodeclarados brancos, e 99,2% vivem em centros urbanos.

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ESPORTE E LAZER

Academias ao ar livre: uma opção de lazer para os idosos Renato Rodrigues

Parceria entre prefeitura e iniciativa privada qualifica espaços em toda a capital

Academia ao ar livre no parque Ceret, na Zona Leste

Renato de Lima Rodrigues

São Paulo possui mais de 1,1 mil academias ao ar livre, que estão espalhadas por parques, praças e outros locais públicos de aproximadamente 300 municípios. Os números são do último

levantamento feito pela Secretaria de Estado de Esporte Lazer e Juventude. Os aparelhos instalados são voltados para a terceira idade, mas qualquer pessoa pode fazer uso deles. A prática de exercícios físicos é essencial para todas as

pessoas. Contudo, na terceira idade eles são ainda mais necessários. O professor de educação física Léo Carneiro Mota, de 38 anos, afirma que a atividade contribui em diversos aspectos. “Quanto mais exercícios eles fizerem, mais ativos serão, mais fortes os músculos, ossos e os órgãos ficarão”, explica. Boa parte dos idosos prefere fazer atividade física em ambientes ao ar livre ao invés de frequentar academias de espaços particulares. “Eles não gostam porque são ambientes fechados, onde muitas vezes não têm interação com outras pessoas. Por causa disso, a maioria procura espaços a céu aberto aonde há pessoas da idade deles e com as quais possam interagir, se divertir

e conversar”, diz Mota. Apesar dos benefícios, o educador físico aponta que a falta de um profissional para orientar é um ponto negativo, embora haja instruções nas placas de identificação. “É necessário um profissional para orientar como cada coisa deve ser feita porque, às vezes, as pessoas fazem os exercícios do jeito errado, o que pode causar alguma lesão”, alerta. O Expressão foi até alguns parques para destacar as estruturas existentes. Confira: PARQUE DO CARMO

O parque do Carmo se localiza na Zona Leste é frequentado, para prática de exercícios físicos, principalmente no período da manhã. Há pouco tempo, os

aparelhos estavam em más condições, porém, de acordo com o morador da região Valdir Caetano, 62, isso mudou. “Tinham colocado os aparelhos e com o passar do tempo tudo ficou destruído. Os novos foram instalados há pouco tempo”, conta. A estrutura nova é responsável pelos exercícios físicos do aposentado. “Venho sempre para alongar as pernas e os braços. Utilizo os aparelhos há quase 10 anos”. PARQUE CERET

Localizado no bairro Jardim Anália Franco, o Centro Esportivo Recreativo e Educativo do Trabalhador (CERET) é utilizado para a prática de exercícios físicos e esportes pelos moradores da região. O aposentado Pe-

dro Teruya, 78, frequenta o espaço todos os dias e elogia a qualidade da estrutura. “Tem a piscina que é cuidada e conta com salva vidas. E o pessoal do campo tem boa relação com as pessoas que participam”. PARQUE IBIRAPUERA

Em um dos mais famosos parques do Brasil, o fluxo de pessoas fazendo exercícios físicos é grande. E as novas estruturas patrocinadas por uma instituição privada, junto com as antigas fornecidas pela prefeitura, também ajudam pessoas como o aposentado Silvio Cunha, 75, que usa as academias do parque há cerca de dois anos. “Venho três vezes por semana para fortalecer a musculatura”.

INSERÇÃO SOCIAL

Projetos comunitários de ex-esportistas promovem transformação social em periferias Letícia Fleming e Patrícia Magarian

Entre os países democráticos, o Brasil é o mais desigual do mundo e o que mais concentra rendimentos entre o 1% dos mais ricos – é o que aponta o Relatório da Desigualdade Social, da Escola de Economia de Paris. Além disso, os dados do Cadastro Único do Ministério da Cidadania mostram que a miséria no país voltou a crescer e já atinge mais de 13 milhões de pessoas, sendo que mais de 500 mil entraram na situação de extrema pobreza no último ano.

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Nesse cenário, a presença de organizações que buscam a inserção social de jovens e adolescentes, por meio de esportes, por exemplo, é de extrema importância para assegurar um futuro com maior possibilidade de entrada no mercado de trabalho. Muitas instituições do gênero são fundadas, inclusive, por esportistas. Esse é o caso do Instituto Próxima Geração (IPG), criado pelo ex-tenista Mauro Menezes. De acordo com Douglas Santana, diretor da funda-

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ção, o projeto tem como principal objetivo gerar oportunidades de transformação social por meio do tênis. “Nossa missão é proporcionar espaço dentro do ecossistema do tênis para jovens e crianças de comunidades carentes”, comenta ele. Com quase dois anos de atuação, o IPG possui, atualmente, um programa, chamado Próximos Campeões. Nele, os participantes contam com aulas de tênis, preparação física, aulas de inglês, acompanhamento escolar, médi-

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co e nutricional, reforço alimentar e cursos profissionalizantes dentro da área do tênis. “É um projeto muito completo. Hoje atendemos 110 crianças e o desejo é sempre de ampliar”, diz Santana. Localizado em São Paulo, o projeto contempla crianças e jovens entre oito e 18 anos. Entretanto, há a necessidade de se comprovar a matrícula em uma instituição de ensino por meio de boletins escolares bimestrais. O Instituto Reação, fundado em 2003 pelo ex-judoca e medalhista olímpico Flá-

vio Canto, é outro exemplo relacionado a esse tipo de programa. O projeto, que procura estimular a integração social por intermédio do esporte e da educação, possui três programas que atendem indivíduos das mais diversas faixas etárias. Apesar de atuar principalmente no Rio de Janeiro, o instituto também possui unidades em Cuiabá (MT). De acordo com Alice Pereira, coordenadora de comunicação do instituto, “os programas procuram alcançar todas as crianças, jovens e adolescentes que querem

utilizar o judô como uma ferramenta para desafiar o sistema e as estatísticas”. Com uma equipe grande, formada por um alto número de voluntários, o Instituto Reação acredita que vidas podem ser mudadas por meio não só do judô, mas de diversos outros esportes. “Todo mundo aqui adora contribuir para a causa e é muito bom saber que, além de essa questão estar ganhando mais visibilidade, diversos outros projetos estão sendo criados”, conclui.


CULINÁRIA INTERNACIONAL

Bares e restaurantes de SP incluem cultura estrangeira em suas identidades Victor Ferreira e Luiza Vivas

A diversidade é um fator presente em grande escala no Brasil. Europeus, asiáticos e até os vizinhos sul-americanos marcam presença no País, seja por meio do turismo, seja pela via da imigração. Com a chegada constante dessas pessoas no território nacional, a cultura inevitavelmente é modificada, fazendo com que os brasileiros descubram, aos poucos, como os demais costumes podem ser atrativos. A gastronomia e o comércio de maneira geral procuram se adaptar para manter a modernidade e atender a diversidade de públicos. Bares

Victor Ferreira

A gastronomia de diferentes países se torna porta de entrada para o conhecimento, refletindo disputas políticas e diversidade local e restaurantes da cidade de São Paulo são alguns exemplos desse tipo de estabelecimento. Separamos dois deles para você conhecer: AL JANIAH

Localizado na região da Bela Vista, o bar e restaurante demonstra forte presença na luta pela igualdade. Com eventos diversificados, repletos de música, arte e exposição cultural, o local se torna um atrativo e tanto para quem quer conhecer uma nova culinária e frequentar em um ambiente diferenciado, experimentando novos sabores e tendo contato com funcionários estrangeiros. O Al Janiah é conhecido por acolher e contratar

trução da democracia por meio do afeto e da comida, de viés notadamente árabe. Entre os principais pratos estão o babaganoush, um composto feito à base de berinjela, o hommus, uma pasta de grão de bico árabe, e o saboroso tabule, que é uma salada de tomate com trigo, pepino e ervas. RIO MAR

O Rio Mar, bar idealizado por peruanos, é localizado em tradicional área do centro de São Paulo refugiados da Palestina e Síria; outra parte dos funcionários é composta de imigrantes cubanos e ar-

gelinos, e outros são militantes do antifascismo. O objetivo da casa é proporcionar uma recons-

Idealizado por três irmãos peruanos, o Rio Mar fica localizado na região central de São Paulo, oferecendo uma seleção de pratos típicos da culinária latino-americana. Localizado em um ambiente simples e agradável, em uma das mais famosas avenidas

da cidade, esquina da São João com a Ipiranga, o restaurante funciona em uma sobreloja. Com pratos decorados, a casa oferece alimentos à base de peixe com tempero especial dos chefs Hosler, Michael e Franco, que também são donos do estabelecimento. O cardápio é composto de pratos como ceviches, frutos do mar e bebidas típicas. A casa se caracteriza por trazer um pouco da cultura peruana para a maior metrópole brasileira. De acordo com um dos proprietários, Hosler Fernandes, o foco é evitar comidas “gourmetizadas”; são valorizados pratos bem servidos e que consigam agradar a diferentes tipos de gostos.

PROFISSIONALIZAÇÃO

Futebol feminino tem lenta evolução no País Letícia Fleming e Patrícia Magarian

O Decreto-Lei 3199, baixado pelo então presidente Getúlio Vargas em 1941, proibia as mulheres de praticarem o futebol enquanto os times masculinos do esporte participavam de inúmeros campeonatos, como a Copa do Mundo. O decreto ficou em vigor durante 40 anos, mas, depois de seu fim, passou a ser obrigatório que os clubes brasileiros de série A também mantenham times compostos por mulheres.

Com essa conquista, os campos de futebol foram tomados pela força, luta, representatividade e talento femininos. Entretanto, a lei dos anos 1940 impacta até os dias atuais o exercício das mulheres dentro da profissão, principalmente em questões como apoio de patrocinadores, cobertura jornalística desfavorável e salários menores comparados aos dos jogadores homens. Uma das principais fundadoras do blog Jogadelas, Gabriela Nolas-

co, fala sobre o fortalecimento feminino na área esportiva. "Para que as mulheres consigam cada vez mais seu espaço no futebol, é necessário que haja profissionais que entendam da categoria e que conheçam a deficiência do futebol feminino, desde questões administrativas até o desenvolvimento das meninas para a categoria de base”, analisa. O crescimento do futebol feminino é resultado de alguns anos de trabalho, porém, ainda existem pontos deficitários

que impedem resultados ainda maiores. “Investimento é o principal ponto. Os clubes precisam olhar com carinho para o futebol feminino, porque normalmente ele é visto como gasto e não como um investimento”, complementa Gabriela. Carolayne Costa, 22, é jogadora de futebol da Atlética Engenharia na Universidade São Judas há cinco anos e destaca pontos importantes sobre o período atual que o futebol feminino brasileiro está vivenciando.

“Estamos em uma crescente, devagar, mas crescente. A obrigatoriedade traz mais times para os campeonatos e normalmente os clubes não gostam de estar tão fracos. Até nesses times, que têm o futebol feminino, é possível notar o atraso em relação ao masculino. Por exemplo, esse ano o Santos passou por uma situação em que as jogadoras precisaram dormir nos bancos do hotel pela falta de planejamento e organização do time. Por isso eu acho que está me-

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lhorando, mas bem mais devagar do que se deseja”, explica a jogadora da Atlética Engenharia. Embora ainda haja um caminho longo para trilhar, de acordo com Carolayne é necessário levar em consideração o espaço que o futebol feminino já alcançou. “É importante você olhar e ver que é possível chegar lá. As mulheres sempre sofreram e ainda sofrem muito preconceito, então o campo pode e deve ser usado como um palanque de busca por igualdade.”

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INFOGRÁFICO

São Silvestre: 95 anos de conquistas Texto: Eloísa Ribeiro e Núbia da Cruz

1925

1925 a 1944

: Maiores vencedores lina, com 29 g na categoria mascu kin ran o era lid l asi O Br vencedores. vem o Quênia, com 14 is po de o log es; eõ camp vencedoras. Quênia lidera com 12 o , na ini fem ia or teg Na ca . ncia, com sete vitórias Portugal vem na sequê

Acessibilidade: A corrida é aberta para pessoa s com deficiência, com largadas específicas na com petição.

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A primeira corrida aconteceu no ano de 1925, criada pelo jornalista Cásper Líbero. Ele teve como inspiração uma corrida que já acontecia na França, assim como as provas de rua que eram realizadas antes no Brasil – como as famosas voltas de São Paulo (1918) e de Piracicaba (1919). Desde então, as corridas acontecem sempre no último dia do ano. O nome é uma homenagem ao santo São Silvestre. Na estreia, foram 68 atletas inscritos, 48 competindo e 37 classificados. Alfredo Gomes, do Clube Espéria, fez 8,8 quilômetros em 33m21s.

Durante esse período, a corrida São Silvestre era restrita a gêneros e nacionalidade. Apenas homens e brasileiros podiam competir. Somente em 1945, com o fim da Segunda Guerra Mundial, estrangeiros começaram a ser convidados a participar.

1941

Durante as 16 primeiras corridas, competiam apenas corredores paulistanos. Essa regra só mudou em 1941, quando José Tibúrcio dos Santos, que é mineiro, se inscreveu e conseguiu competir – e venceu a corrida.

1964

39 anos após a criação da São Silvestre, os índios participaram pela primeira vez da corrida. Foram cinco integrantes da Ilha do Bananal.

1975

Ano da chegada das mulheres: até então, elas não podiam sequer pensar em competir. A primeira mulher a correr foi a alemã Christa Vahlensieck. Somente 20 anos depois, em 1995, tivemos nossa primeira brasileira vencedora: Carmem de Oliveira.

2003 2005 2010

Marílson Gomes dos Santos foi o primeiro brasileiro a ser tricampeão da São Silvestre desde que a competição foi internacionalizada. Suas vitórias foram em 2003, 2005 e 2010.


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