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Agênero: a moda sem rosa versus azul
Comportamento Agênero, a moda sem rosa versus azul
Grifes contemporâneas produzem peças que não se limitam ao padrão Sofi a Chiaradia
Foto: Leonardo Angelo Albuquerque (@leoangelo) / divulgação
A marca Pangea investe em testes para que as peças sirvam em diferentes pessoas
Agênero, unissex, genderless... Termos que se tornam a cada dia mais presentes quando o assunto é a forma como nos vestimos. Ao perceber a força atual dessa tendência, é possível questionar quando e por que o gênero passou a ter importância na moda e o motivo pelo qual está em evidência.
A professora do curso de Design da ESPM Porto Alegre Viviane Gil explica que, para teóricos de moda como James Laver, não é possível analisar a história dos trajes a partir da divisão de gêneros, isso porque a expressão do gênero no vestuário depende muito da localidade e da cultura de cada povo. Os escoceses modernos, por exemplo, usam saia, e as mulheres do extremo oriente, onde o clima é frio, historicamente sempre usaram calças. Um estilo só pode ser considerado moda quando muita gente faz uso do mesmo. Portanto, se levarmos em conta a teoria da moda, perceberemos que o agênero ainda não é considerado “moda” e sim a necessidade de um grupo de expressar pensamentos e ideologias ao ultrapassar o limite de gênero proposto pela sociedade.
Além disso, Viviane explica que uma peça agênero, pensada de modo projetual, é defi nida como um traje que pode ser usado ergonomicamente por corpos femininos ou masculinos, e as características comuns dessas peças seriam cores neutras e cortes retos. Porém, se levarmos em conta a perspectiva daqueles que produzem e fazem uso desse tipo de moda, as conclusões serão diferentes. De acordo com Nilo Lima, sócio cocriador da marca cearense agênero Pangea, “Toda roupa, enquanto tecido costurado, é sem gênero. Quem signifi ca a roupa é a pessoa e não o contrário.” O estilista acrescentou que, para a Pangea, o importante é que a pessoa que veste a roupa seja quem defi na o que aquela peça é, sem predeterminações de gênero. A marca tem como cultura deixar os clientes livres para experimentações, o objetivo é que o indivíduo se sinta confortável com a peça e tenha o arbítrio para decidir se ela lhe cabe ou não. A Pangea investe em testes de modelagem, tecido e tabela de medidas para que as peças possam servir para o maior número de corpos possível. De acordo com Johny Oliveira, cofundador da marca gaúcha Piña con Limón, a defi nição é mais simples. Para ele, a moda agênero é liberdade. O estilista defende que essa moda é o movimento que permite que um indivíduo não precise manter padrões. A Piña produz com o objetivo de que qualquer cliente possa vestir o que quiser, de qualquer tamanho, sem impor limlitações por tabela de medidas, gênero e orientação sexual. Johny ressalta que as gerações mais jovens são as que estão se encaminhando cada vez mais para esse caminho. Conforme dados expostos pelo varejista Rob Smith durante a WWD Culture Conference, 56% dos consumidores da geração Z (jovens entre 13 e 20 anos) compram produtos considerados “de fora” da sua área de gênero atribuída.
A moda, no decorrer da história, sempre foi uma forma de expressão cultural, e não somente vestuário. Emerson Brandão, estilista da marca Cejuntos moda agênero, de São Paulo, explica que a moda nunca pode ser considerada apenas como uma forma de se vestir, pois, por meio das roupas, uma pessoa demonstra muito sobre quem ela é. De acordo bom Brandão, a construção da ideia da moda separada em masculino e feminino se deve ao patriarcado, em uma época em que as mulheres eram vistas como frágeis, delicadas e românticas, vestindo babados e peças acinturadas, e os homens precisavam externar seriedade e braveza, por meio de peças retas e sóbrias. Hoje, a moda ainda é uma forma de expressar personalidade, e por isso a moda agênero tornouse um posicionamento importante para que ocorra o começo de uma desconstrução cultural.
Para a estudante de psicologia da PUC-RS Luísa Mendes, 22 anos, que tem como hábito usar peças de roupa agênero, essa moda vai além de marcas de grife investindo em editorias minimalistas. Ela declarou que esse estilo “é uma escolha que envolve minha conduta, meu orçamento e a minha visão sobre o que a moda pode ser”. A estudante explica que, para ela, tanto uma bermuda cargo quanto um vestido fl orido podem ser considerados moda agênero, pois esse estilo permite a apropriação de peças consideradas femininas e masculinas e a ressignifi cação das mesmas em um novo contexto. Nilo acrescenta que, por mais que no momento ainda exista estranhamento quando o assunto é a moda agênero, ele acredita que em algumas décadas essa cultura vai estar mais forte e vai ser naturalizada na sociedade.
Foto: Bruno Ost / divulgação