Jornal Ora-pro-nobis

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Edição 00 - Ano 01 - Novembro - 2010

Vida de Maquinista Pág. 8

Camelódromo: a vantagem de um clima simples Pág. 3

André Azevedo

Sinfonia dos Sinos atrai turistas e movimenta comércio Págs. 4 e 5 Dificuldades para consolidar o turis­mo Pág. 6


OPINIÃO EDITORIAL

ARTIGO

O ponto de partida

Diploma: uma questão de ética

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jornal Orapronobis, do Curso de Com­unicação Social (Jorna­ lismo) da UFSJ, nasce descompro­ missado com políticas institucionais, é liberto de interesses políticos e econômicos, possui liberdade de escri­ ta, tem a necessidade de experimentar e traz o tempero de uma falta de práti­ ca peculiar a qualquer início, atenuada por uma enorme vontade de escrever. O jornal será todo escrito e diagra­ mado pelos alunos do curso, com o apoio dos professores, pois trata-se de um jornal laboratório, quesito cur­ ricular de todo curso de Jornalismo, instituído pelo MEC. É aqui que os estudantes iniciarão sua prática pro­ fissional, vivenciando os principais processos que envolvem a construção de um jornal. Este pequeno grande empreendimento é resultado de mui­ tas expectativas e não medirá esforços para proporcionar a vocês, leitores, uma leitura útil e ao mesmo tempo agradável. Este jornal pretende fugir do jor­ nalismo político-partidário, traço tão

peculiar da história mineira, para que assim tenhamos mais espaço dedicado aos temas sociais que tanto escapam aos olhos da imprensa tradicional. O Orapronobis pretende também evitar alguns temas mais densos e já des­ gastados, concentrando esforços numa tentativa de resgate da cultura são­ joanense, que, por mais evidente que esteja por toda a cidade, ainda reserva muitas surpresas e histórias. Persona­ lidades, lugares e eventos que tem nossa cidade como palco serão pre­ sença constante em nossas páginas. Entretanto, a difusão da riqueza de nosso patrimônio cultural não será seu único objetivo. É quase uma obri­gação do jornal também denunciar proble­ mas, ajudar a conscientizar a popula­ ção e as autoridades para aquilo que deve e pode ser melhorado na cidade. O Orapronobis se preocupa com as­ suntos de interesse público, e por isso abre suas páginas para o envio de pro­ postas de matérias, de reclamações, de problemas que afetam a população e outras coisas importantes. O objetivo

deste jornal é realizar um jornalismo comunitário, o qual, mesmo que não possa mudar o mundo, possa dar voz e representatividade a quem mais merece, o povo. O Orapronobis é uma forma de retribuir a chance que nos é dada, de estudar em uma universidade federal, mantida com dinheiro públi­ co. E por isso toda a equipe é muito grata! Mais do que isso, a equipe do O­rapronobis, formada por aspirantes ao diploma, sabe que um dos princi­ pais diferenciais que o jornal pode ofe­ recer é o respeito com a comunidade e o compromisso com a ética. Por isso, o jornal buscará fazer sempre um jor­ nalismo ético, sério e livre de matérias sensacionalistas e panfletárias. Sem mais delongas, aproveitem esta edição de número 00. Que este seja um veículo informativo de presença constante em sua vida. Terminadas as explicações, esperamos que apreciem esta primeira leitura!

CRÔNICA

Sons dos sentidos Carol Argamim Gouvêa

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la havia se acostumado com o toque dos sinos. Não lhe incomo­ dava mais ser interrompida em uma conversa pela forte e insistente músi­ ca e nem chegava mais a se assustar quando, andando na rua, ouvia um grande badalo de repente. Mais do que isso, acordava todas as manhãs com as batidas suaves e guiava-se durante todo o dia pelo badalar que marcava as horas que se passavam. Por mais estranho e bizarro que lhe parecesse no começo, agora sa­ bia quando morria alguém na cidade, mesmo que não fizesse ideia de quem fosse. Sabia quando era dia de festa, aniversário de santo, nascimento de criança e até data de eleição. Sentiase como uma velha fofoqueira, mesmo que não precisasse se pendurar em um muro para ouvir novidades. Mas não foi sempre assim. No começo, achava aquilo tudo uma grande loucura. Coisa de interior, sinos que falam. Vinha de uma cidade grande, cheia de carros e prédios por todos os lados. E se eram poucas as igrejas, imagine só os sinos: já haviam entrado há muito tempo em extinção. E mesmo se ainda existissem, sons de sinos seriam facilmente sufocados pelas incessantes buzinas, motores de ônibus e carros, músicas ridículas de propaganda de supermercado e dis­ puta eleitoral. E naquela cidade tudo era dife­ rente, de um jeito quase assustador a princípio. Os sinos não só ainda exis­ tiam como podiam ser vistos e ouvidos

por todos os lados. Cidade pequena, sem muitos ruídos irritantes, exceto por aquele som alto que triunfava so­ bre todas as vozes. E o pior de tudo era a insistente declaração dos moradores locais de que podiam entender o que aquelas coisas (batidas?) “falavam”, de que podiam compreender sua lín­ gua antiga e quase perdida. Inacredi­ tável. Mas os meses se passaram, e o tempo aliado à necessidade a fez per­ ceber que também podia entender ao invés de apenas ouvir. Até mesmo a mecânica da coisa passou a assustála, a forma como o sino girava sobre si mesmo, como o sineiro empurrava tanto peso, como o som se produzia naquele imenso pedaço de metal. E então ela se descobriu fascinada, per­ cebeu que parava sempre à frente de uma das grandes igrejas da cidade, sempre esperando que o sino falasse e lhe contasse seus segredos. Foi então que ela entendeu. Aquela coisa arcaica e antiga era algo real­ mente singular. Era bonito, perigoso, único. Mas o que tanto lhe intrigava era o fato de compreender que os sinos continuavam a cumprir a mesma fun­ ção que lhes foi designada há séculos: informar o povo de São João del-Rei. Será que as outras pessoas, assim como ela, já tinham percebido a pro­ fundidade daquilo? E quando entendeu a importância da revelação, engoliu em seco. Ela, que cresceu na cidade grande e sempre vi­ veu à frente de computadores, havia

se rendido a algo muito mais antigo do que poderia suportar. Via as limi­ tações, o jeito arcaico, mas também a eficiência. Sim, os sinos eram o seu novo jornal. Adriano Moura

EXPEDIENTE

ORAPRONOBIS: Curso de Comunicação So­

cial – Jornalismo da Universidade Federal de São João del-Rei Coordenador do curso: Guilherme Rezende Orientação: Jairo Faria Mendes, João Barreto, Kátia Lombardi, Paulo Henrique Caeta­ no e Vanessa Maia Barbosa de Paiva Editor: João Eurico Heyden Subeditora: Ayalla Simone Nico­ lau Arte: Adriano Moura, Pedro Inácio Leonel, Quéfrem Vieira, Rhonan Moreira Neto Redação: Adriano Moura, Ana Pessoa, André Azevedo, Anna Carolina Slaibi (Editora de Política e Economia), Anna Júlia Silveira, Antônio Ferreira, Carol Arga­ mim Gouvêa (Editora de Opinião), Cláudia Lino,

Ana Pessoa

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epois de ser exigido por quase 40 anos no Brasil, o diploma de jornalista não é mais necessário para o exercício da profissão desde a decisão do Supremo Tribunal Fe­ deral (STF) em 17 de junho de 2009. O principal argumento utilizado foi que a obrigatoriedade de forma­ ção acadêmica em jornalismo fere o direito de liberdade de expressão e do livre pensamento garantido na Constituição de 1988. Muitas pes­ soas que são contra a regulamen­ tação da profissão alegam que uma pessoa que escreva bem e que tenha uma formação em um curso superior pode atuar como jornalista. Porém, esta profissão não se resume a isto. Os jornalistas levam as notícias às pessoas. Para isso, é necessário coletar os fatos, apurar e checar in­ formações, além de redigir, editar e publicar o material de acordo com a ética da profissão. Por isso, a for­ mação acadêmica específica é indis­ pensável. A prática do jornalismo durante a formação universitária é importante para vivenciar o dia-a-dia do profis­ sional, para o aluno familiarizar-se e por em prática as técnicas jornalísti­ cas que aprende. A teoria não se aprende na rua. Ética no jorna­lismo e formação humanística são apren­ dizados de disciplinas como Filoso­ fia e Sociologia. Uma Proposta de Emenda Cons­ titucional (PEC) apresentada pelo Deputado Paulo Pimenta (PT-RS), em votação, propõe o restabeleci­ mento do diploma. “A PEC dá mais garantia à sociedade de um trabalho profissional, sério e comprometido com o interesse social”, diz Pimenta. Mas nem todo jornalista é um bom profissio­nal, assim como uma pes­ soa que não fez curso superior nesta área pode atuar bem numa redação. Porém, um ano e quatro meses de­ pois da queda do diploma de jorna­ lismo, constata-se que a procura pelo curso superior de Comunicação Social – Jornalismo diminuiu e nos faz pensar como ficará a qualidade do jornalismo no país.

Daniel Gouvêa, Fernando Paulo de Oliveira, Gabriel Cunha, Íris Marinelli (Editora de Perfil), Laís Gottardo, Natasha Terra Passos (Editora de Cultura), Nayana Andrade, Patrícia Botaro, Quefrém Vieira, Rômer Castanheira (Editor de Esporte), Talita Andrade (Editora de Cidade), Thamires Franco, Thiago Longatti, Walquíria Domingues End: Campus Tancredo Neves (CTAN), Av. Visconde do Rio Preto, s/n°, CEP 36301360, Colônia do Bengo – São João del-Rei Gráfica: Setor de Gráfica – SEGRA Tiragem: 1000 exemplares E-mail: orapronobis@hotmail. com

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POLÍTICA E ECONOMIA

Aberto à negociação

Adriano Moura, Íris Marinelli e Quéfrem Vieira

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camelódromo de São João del-Rei, situado próximo a rodoviária velha, é um complexo que abriga diversos comerciantes e retira das ruas os “camelôs”. O espaço foi cedido pela prefeitura em 2002. Antes da mudança, os produtos eram vendidos em barracas improvisadas nas calça­ das, no centro da cidade, o que causava impactos no trânsito e conflitos com os lojistas. Para se comercializar no camelódromo, paga-se um alvará anual no valor de R$ 92 e a média de lucro obtida pelos trabalhadores está em torno de um salário mínimo. O espaço é aberto de segunda a sábado e possui 44 lojas que vendem os mais diver­ sos produtos - de bijuterias a brinquedos. Entretan­ to, como contou um camelô, o que mais dá lucro é a venda de CDs e DVDs piratas. Embora proibida, muitos ainda arrumam um jeito de vender a merca­ doria clandestinamente. A fiscalização se tornou mais rigorosa por exigên­ cia dos lojistas da cidade. Para Cristiane Vieira, que possui há três anos uma loja no camelódromo, existe uma rixa entre os camelôs e os outros comerciantes. “Nós somos desvalorizados, apesar de comprar nos­ sa mercadoria no mesmo fornecedor dos outros, aqui Nas lojas do camelódromo é possível encontrar diversos produtos, de bijuterias a brinquedos o que nós vendemos por 10 lá se vende por 30. A diferença é que os lojistas de fora do camelódromo têm uma associação, enquanto os camelôs adotam o esquema cada um por si”, desabafa.

“” “Aqui, nós é que escolhemos o cliente”, conta Cristiane Vieira

O tratamento dado aos clientes é peculiar. Assim que alguém entra no estabelecimento, os vendedores começam a oferecer seus produtos insistentemente. “Aqui, nós é que escolhemos o cliente”, conta Cris­ tiane Vieira. Esse costume é uma forma de melhorar as vendas. Quem entra no camelódromo é um pos­ sível comprador, que não pode ser desprezado. Por outro lado, o camelódromo oferece vantagens aos clientes. “Tem um clima mais simples e todos os vendedores estão abertos à negociação. O preço inicial nunca é o que eu acabo pagando”, conta a estudante Fernanda Frasão. Segundo Luiz Carlos, que trabalha há dez anos como camelô, sair da rua trouxe vantagens e des­ vantagens. Por um lado, melhoraram as condições de trabalho. “Agora, trabalhamos em teto de alve­ naria sem precisar montar e desmontar (a barraca) todo dia ou trabalhar na chuva”, explica. Por outro, ele diz que não teve escolha, já que foi uma decisão tomada pelos lojistas e pela prefeitura em conjun­ to. Luiz Carlos conta que a mudança diminuiu as vendas, pois na avenida o fluxo de pessoas era bem maior. O Secretário de Arrecadação de São João del-Rei, José Antônio Furtado, relata que não existem dados ou pesquisas sobre o camelódromo – sua influência na economia da cidade, o número de clientes, entre outros aspectos. “Eu mal passo lá por perto”, afirma.

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Quéfrem Vieira

À sombra dos candidatos Anna Carolina Slaibi, Gabriel Cunha e Nayana Andrade

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m período eleitoral, entram em ação os “marqueteiros” e publicitários. São eles os responsáveis pelos longos discursos dos candidatos, pelos inúmeros panfletos, “santinhos”, banners, dentre muitos outros materiais espalhados pelas ruas das cidades. É difícil pensar em eleições sem lembrar de uma estrutura publicitária atuando incessantemente. Formado em Marketing Político pela ESPM, com experiência de consultor e publicitário político, Mauro Marques afirma que a publicidade é funda­ mental para uma campanha de sucesso. “O trabalho desses profissionais é essencial em uma campanha. Esse trabalho exige do profissional muita criativi­ dade e astúcia, pois organizar uma campanha não é tarefa fácil”, declara. Marques explica que a elaboração de uma cam­ panha é determinada por algumas etapas. Segundo ele, o primeiro a se fazer é estabelecer o perfil do candidato. Construir um diálogo com ele, no intuito de conhecer as suas dificuldades e qualidades. O publicitário ressalta, também, que é preciso um cuidado na escolha da linguagem que vai ser usada na campanha, pois “um vocabulário fácil de ser com­ preendido é fundamental” Além disso, o candidato tem que saber mexer com a emoção dos eleitores. “Tocar nas feridas da sociedade é uma estratégia que sempre traz resultados”, garante Marques. Ao preparar o assunto principal abordado na cam­ panha, o publicitário procura associá-lo à vocação da cidade, como explica Marques. Em municípios voltados para o artesanato, por exemplo, os projetos apoiados trazem benefícios aos artesãos moradores destes lugares. Além disso, fazer o levantamento das lideranças de bairro também é uma estratégia bas­ tante utilizada pelos aspirantes a um cargo público.

Esses líderes são importantes, pois, além de serem multiplicadores e de promoverem a divulgação das ideias, são formadores de opinião e geralmente con­ seguem angariar muitos votos. O último passo é selecionar as mídias, desenvol­ ver um slogan, criar panfletos, fazer as propagandas, que tanto vemos nos períodos eleitorais e, assim, di­ vulgar o trabalho e os projetos dos candidatos, ou melhor, dos publicitários. “Um bom político sem o auxilio de um bom publicitário e consultor não se elege facilmente”, concluiu Mauro Marques. Anna Carolina Slaibi

Marques: tem que saber mexer com a emoção


CULTURA Talita Andrade

Sinfonia dos Sinos, inspirada em espetáculo de Diamantina, incorpora tradição musical de São João del-Rei

Uma sinfonia badalada Natasha Terra Passos, Antônio Ferreira, Fernando Paulo de Oliveira e Thiago Longatti

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ão João del-Rei é conhecida nacionalmente como a cidade dos sinos, por possuir várias igrejas que utilizam as badaladas para trans­ mitir diversas mensagens, principalmente religiosas. A tradição são-joanense da linguagem dos sinos está sendo finalmente resgatada, valorizando a cultura local, através do espetáculo de música “Sinfonia dos Sinos”. A primeira edição do evento foi apre­ sentada em junho deste ano. No dia 16 de setembro, no Largo do Rosário, foi realizada a segunda edição. A primeira apresentação aconteceu em 2008 de forma um pouco diferente. De acordo com os produ­ tores José Luiz Mourão e Vera Feu (Música e Arte Produções Ltda.), o evento musical chamado Noites Seresteiras utilizava as janelas do Casarão dos Lus­ tosa como palco para os músicos. No primeiro for­ mato do evento, havia apresentação de um conjunto de serenata, bossa nova e MPB. O formato atual foi baseado na Vesperata, evento realizado em Diamantina (MG). De acordo com os organizadores, “a ideia foi considerada muito boa, mas era preciso dar ao evento características próprias da cidade”. Segundo eles, não era interes­ sante apenas importar o espetáculo, mas sim agregar características de São João del-Rei, como o toque dos sinos. Deste modo, aperfeiçoou-se o Noites Se­ resteiras, resultando no atual projeto da Sinfonia dos

Talita Andrade

Sinos, no qual participam os sineiros da Igreja do Rosário, abrindo o espetáculo. Com incentivo da Lei Rouanet, o evento atrai maior número de patrocinadores, conseguindo exce­ lente qualidade em sua programação e fomentando o comércio através do turismo. De acordo com a chefe de serviços turísticos, Ana Luiza Capel Moreno, os setores hoteleiro e gastronômico são os mais movimentados graças ao fluxo de turistas atraídos pelo evento, que comporta de 400 a 700 pessoas.

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Sineiros da Igreja do Rosário abrem o espetáculo

Para o espectador são-joanense Mário Lúcio dos Passos, 45, psicólogo, o evento “é o resgate da cul­ tura de nossa terra. A Sinfonia dos Sinos é especial porque São João del-Rei é considerada a cidade da música. O repertório da Sinfonia é de primeira qualidade, as escolhas das música são bem feitas”. Para ele os sinos têm uma linguagem própria, é um momento terapêutico.

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Em 2011, música aos sábados Os idealizadores da Sinfonia dos Sinos prometem apresentação todo mês em São João del-Rei. A seguir, Vera Feu e José Luiz Mourão, da Música e Arte Produções Ltda, contam um pouco a história do espetáculo e as perspectivas para os próximos meses.

do mês de março a outubro. JO: O projeto sempre teve esse mesmo formato? VF: Não. Nos dois primeiros espetáculos tínhamos somente a banda apresentando a sinfonia. A partir de agosto inserimos, às 19h30 um cantor (Wagner Branco) e a aceitação foi muito grande. Em setem­ bro introduzimos um saxofonista (Daniel d’Olivier). Pretendemos buscar sempre novidades para apre­ Jornal Orapronobis: Quando e como surgiu a ideia sentar ao público a cada evento. desse projeto? Vera Feu: Em 2008, nós fizemos um evento musi­ JO: Quais são os patrocinadores e colaboradores cal chamado Noites Seresteiras no mesmo local, uti­ da Sinfonia dos Sinos? lizando o Largo e as janelas do casarão dos Lustosa. JM: Os patrocinadores atuais são: Viação Presiden­ O formato era um pouco diferente, pois tinha apre­ te e Associação Comercial e Industrial de São João sentação de um conjunto de serenata, um conjunto del-Rei. Os colaboradores são: Secretaria de Cul­ de bossa nova e uma cantora apresentando MPB. No tura e Turismo de São João del-Rei, ROTA, Buffet início de 2010, entramos com este projeto na Lei Cecília Resgala, Prefeitura Municipal de São João Rouanet com incentivo da Secretaria de Cultura e del-Rei, Pousada Pequena Tiradentes, Convention Turismo através de seu secretário Ralph Justino. Bureau, Trilha dos Inconfidentes, Associação de A ideia era dar continuidade a este espetáculo para Hotéis e Pousadas, Saint Germain Turismo, Orques­ tra Popular Livre, Del Rey Publicidade, Restaurante 2010 e nos outros anos. e Choperia Rex, Vereador Mauro Duarte, Instituto Estrada Real, CIEMG FIEMG. É importante desta­ JO: Quem foram os seus idealizadores? VF: Em abril de 2010, o secretário recebeu uma car também que fizemos uma parceria com o Lendas proposta do Maestro Alex, que fazia a Vesperata em São-Joanenses que irá ocorrer sempre na sexta feira Diamantina e do Sr. Wander Carvalho Dias, de Belo anterior ao Sinfonia dos Sinos. É um belo pacote Horizonte, de trazer o evento para São João del-Rei. cultural que estamos oferecendo ao público. A ideia foi considerada muito boa, mas era preciso dar ao evento características próprias da cidade. JO: Por que foi escolhido o Largo do Rosário como Não era interessante somente importar o espetáculo. local do evento? Como uma das características de São João del-Rei VF: Primeiramente, já tinha sido feito o primeiro é o toque dos sinos, criou-se a Sinfonia dos Sinos, evento naquele local. Em segundo lugar, a Secreta­ onde eles fazem a abertura do espetáculo. Como ria de Cultura está no casarão onde é feita a sinfonia. nosso evento já estava sendo analisado no Minis­ E, finalmente, porque de fato é um dos pontos mais tério da Cultura e tínhamos sido os precursores da bonitos da cidade. ideia de um evento musical naquele local, a nossa empresa Música e Arte Produções Ltda., foi con­ JO: Como é a estrutura do evento? vidada pelo Ralph para coordenar o projeto. E aqui VF: O maestro cuida das músicas, a secretaria recebe as reservas de mesas e contata os fornece­ estamos. dores e nós cuidamos do resto. JO: Qual a periodicidade do evento? José Mourão: Em 2010 o evento foi realizado em JO: A Sinfonia dos Sinos tem apoio de algum projunho, julho, agosto e setembro e terá o último es­ grama do governo, como a lei Rouanet? petáculo em outubro. Para 2011 teremos um evento JM: Em princípio, não. Mas como disse no início por mês, no sábado, fora de feriados prolongados, desta entrevista, em janeiro entramos com o outro

projeto, em nome da Orquestra Popular Livre na Lei Rouanet e conseguimos, neste mês, a aprovação. Agora é procurar outros patrocinadores e encaixar a Sinfonia dos Sinos em nosso projeto. JO: A prefeitura de São João del-Rei apóia o evento? De que forma? JM: Sim, temos tido todo apoio da Secretaria de Cultura e Turismo através do Ralph que é um par­ ceiro incansável, sempre buscando novos colabora­ dores para nos ajudar. Além disto, a base da banda que executa o projeto é a banda Santa Cecília, que é da Prefeitura. JO: Qual é o planejamento da Sinfonia dos Sinos para o próximo ano? VF: Melhorar cada vez mais a qualidade do espe­ táculo. Torná-lo um evento responsável pela vinda de muitos turistas a São João del-Rei, aumentando o movimento nos hotéis, restaurantes, comércio em geral e criando oportunidades de novos empregos. JO: Qual é a colaboração deste evento para São João del-Rei? JM: É uma grande oportunidade de mostrar nossa cidade e conquistar o coração do turista para que ele volte e traga os amigos. São João del-Rei tem muito a ganhar. E queremos fazer, de público, um agradecimento aos moradores do Largo do Rosário. Apesar de terem suas rotinas alteradas uma vez por mês, têm mostrado uma compreensão muito grande e, com isto, colaborado enormemente para que São João se torne cada vez mais conhecida. Um agra­ decimento especial à família Lustosa pela cessão das sacadas de sua residência para execução do es­ petáculo. JO: De que forma a Sinfonia dos Sinos contribui para a tradição de São João del-Rei como “cidade dos sinos”? VF: Não só mostrá-la como “a cidade onde os sinos falam”, mas mostrar a beleza e musicalidade deste toque. É importante passar para o turista o signifi­ cado real da Sinfonia dos Sinos que é aquela que eles fazem quando comunicam entre si. Talita Andrade

Sinfonia dos Sinos atrai turistas e movimenta hotéis e restaurantes, criando oportunidades de emprego

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CIDADE

Turismo sem estrutura

Carol Argamim Gouvêa, João Eurico Heyden e Wanessa Fagundes

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Pousada Villa Magnólia, Leonardo Aparecido Ferreira, ainda há muito o que fazer. Ele afirma que “o turismo deixa muito a desejar. Falta infraestru­ tura. Igrejas e restaurantes não ficam abertos. E faltam principalmente eventos culturais”. Leonardo ressalta ainda que o fato de São João del-Rei ter sido Capital da Cultura ajudou a divulgar o nome da cidade, mas esse reconhecimento ainda não foi explo­ rado da forma adequada pelo turismo. Em razão da falta de preocupação da prefeitura, “a cidade está suja e o tu­ rista reclama.” Mas, mesmo com tantos problemas, de acordo com Joel Dornelas, ge­ rente do Hotel Lenheiros, o turismo na cidade se encontra em expansão: “O hotel mantém uma média de 70% das vagas ocupadas. Mesmo não ha­ vendo grande divulgação de São João del-Rei, as agências de turismo das capitais estão realizando um ótimo tra­ balho”. Segundo o gerente, a secretaria de tu­rismo da cidade está fazendo sua parte, ao criar, por exemplo, a Sinfonia dos Sinos, um evento que ocorre uma vez por mês desde junho e que lota os hotéis do centro da cidade, mesmo em baixa temporada de turismo. O proprietário da Agência de Tu­ rismo Estrada Real, Márcio Honório, conta que em julho todos os seus ser­ viços lotaram: “Em dia de semana, eram cerca de 30 pessoas por dia. Já nos finais de semana, esse número subia para 140”. Ele ainda explica que cerca de 60% de seus clientes já ha­ viam passado por São João e região, enquanto os outros 40% tomaram co­ nhecimento da cidade através de co­ nhecidos ou por agências de turismo. O recepcionista chefe da Pousada Casarão há 25 anos, Adalberto Lúcio, acredita que o aumento do turismo é um reflexo do crescimento do poder aquisitivo. Segundo ele, agora “as pes­ soas têm dinheiro pra viajar”. Para ele o que falta agora é organizar: “Você vai na secretaria de turismo, eles não têm um mapa turístico pra te dar”. Adalberto reforça a idéia que “falta estrutura, a prefeitura precisa dar mais apoio”. Por fim, a expansão da UFSJ tam­ bém tem colaborado com o turismo em São João del-Rei, mesmo que in­ diretamente. A Universidade, além de promover grandes eventos como o Inverno Cultural, traz personalidades importantes, contribuindo nacional­ mente com a promoção da cidade. Segundo o Pró-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da UFSJ, professor Marcos Vieira, é fato que o turismo é maior nas cidades históricas que possuem universidades, como São João e Ouro Preto. “O papel da UFSJ

no turismo é indireto, mas nem por isso menos importante. As universi­ dades proporcionam um maior acesso à produção cultural local. Exemplo disso foi o Inverno Cultural deste ano, que atraiu cerca de 80.000 pessoas”, afirma. Adaptar-se ao turismo pode ser muitas vezes algo negativo para a população local, quando se pensa na efervescência cultural original da ci­ dade. É o que explica Lúcia Rezende, ao afirmar que Tiradentes “pagou um preço” pela escolha de tornar a cidade um verdadeiro pólo turístico. Segundo ela, a cidade ganhou muito em econo­ mia, mas os moradores perderam seu espaço para os novos comerciantes. “São João del-Rei, ao contrário, é uma cidade dinâmica o tempo todo, com ou sem turista. Não precisa dos turistas para que as coisas aconteçam; ela é uma cidade independente. As igrejas e as procissões estão sempre lotadas, as orquestras funcionam, a

cultura permanece. Isso é que é muito importante. E por outro lado acho que tem uma resistência dos moradores com relação ao turista. É importante manter a identidade, a tradição cul­ tural, mas também não impedir que o turismo avance. Encontrar o equilíbrio é que é difícil. Acho que você pode abrir para o turismo, mas tomando o cuidado para não perder a identidade”, afirma Lúcia. Giovani Frigo também ressalta que a arquitetura de Tiradentes é predomi­ nantemente colonial, “parada no tem­ po”. São João del-Rei consegue um dinamismo maior ao possuir uma ar­ quitetura variada, que vai do colonial ao pós-moderno. Marcos Vieira reforça a ideia: “São João del-Rei, diferentemente de outras cidades históricas, possui um patrimônio ‘vivo’, pois se movimenta de forma a não servir apenas a propósitos turísticos. Vários dos prédios tombados funcionam como sede de instituições ou lojas, sem perder seu caráter histórico”. Adriano Moura

ão João del-Rei, além de pos­ suir uma arquitetura centenária, é palco de inúmeros atrativos culturais, o que lhe rendeu o título de Capital Brasileira da Cultura em 2007. Entretanto, apresenta alguns empeci­ lhos para consolidar o turismo e ainda está longe de atingir o nível esperado. Os dados sobre turistas na cidade são pouco precisos, já que a Secretaria de Cultura e Turismo não possui um número oficial de visitantes. Estima-se a vinda de 100 a 150 mil pessoas por ano na cidade, mas, segundo o assis­ tente da Secretaria, Giovani Antônio de Souza Frigo, nenhuma empresa foi contratada para fazer a aferição do número de visitantes. Não existem re­ cursos para tal investimento. Segundo Lúcia Helena Bortolo de Rezende, ex-secretária de Cultura e de Turismo, até mesmo quando a cidade foi eleita Capital Brasileira da Cultura (CBC) os problemas financeiros exis­ tiam. “A questão da verba é que foi um pouco decepcionante quando São João foi eleita a capital. Primeiro acháva­ mos que o comitê responsável pela realização da CBC ajudaria com os gastos financeiros. Nós tivemos que arrumar dinheiro, patrocínio, tudo. Até mesmo a divulgação prometida não foi suficiente”, conta Lúcia. O então governador Aécio Neves destinou uma verba de R$ 2 milhões à cidade, que foi toda convertida em projetos de restaurações de museus e casas importantes do patrimônio e a vinda de companhias artísticas, como o consagrado Grupo Corpo de Belo Horizonte. De acordo com a ex-secretária de Cultura e de Turismo, apesar das dificuldades enfrentadas pelos orga­ nizadores da Capital Brasileira da Cultura em São João del-Rei, muitas modificações foram feitas na cidade em 2007. Entre os projetos realizados, Lúcia Rezende aponta a criação da Casa das Artes e Cultura, na residên­ cia colonial onde nasceu Otto Lara Rezende. Com a mudança de admin­ istração da prefeitura, não só a casa das artes foi desativada (para abrigar o departamento de água e esgoto da cidade) como quase todos os projetos realizados foram interrompidos e es­ quecidos. Segundo Giovani Frigo, da secre­ taria de Cultura e Turismo, a falta de banheiros públicos, a ausência de uma área de estacionamento de ônibus e de uma área de convenções, são entraves para elevar o turismo na cidade ao ní­ vel máximo. Segundo Frigo, isso “não impede a vinda do turista, mas atra­ palha a receptividade”. Para o auxiliar administrativo da

Igrejas são-joanenses atraem visitantes

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ESPORTE

Entre o céu e a terra Rômer Castanheira

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m cidades como Tiradentes, Prados e São João del-Rei, a escalada vem a cada dia ga­ nhando mais adeptos, desbravando caminhos repletos de cursos d’água e cenários propícios para esportes radicais de outono-inverno. Tal prática é bastante desenvolvida na região, principalmente na famosa Serra de São José, ambiente favorável àqueles que buscam aventuras movidas a adrena­ lina. O montanhismo ganha adeptos de perfis varia­ dos, a maior parte na faixa etária entre 18 a 35 anos. As atividades acontecem geralmente nos finais de semana. A expansão do esporte é essencial para a consci­ entização da sociedade sobre uma atividade que, feita com segurança e sabedoria, promove lazer,

sentimentos de liberdade e força de vontade na vida. Para que isso aconteça são necessários cursos que ensinem esse esporte e os componentes do monta­ nhismo. Praticante do montanhismo há mais de 15 anos, o coordenador e orientador do Grupo Base Brasil, Márcio Andrade do Vale, conta que para desempe­ nhar o esporte, além de vontade e determinação é necessária aptidão física e mental, aliadas às técni­ cas desenvolvidas no curso básico que ministra. Em seu grupo, o período de alta temporada do esporte radical é registrado sempre nos finais de outono e início de inverno, de meados de abril a setembro. Um dos alunos do curso Base Brasil, Klauss Silva, comenta que a integração com a natureza ajuda em Rômer Castanheira

sua vida na superação dos limites e desafios. Ele ar­ gumenta que ao associar um esporte radical à sua rotina desgastante, ele acaba criando uma forma de se livrar do estresse do dia-dia. Na Serra de São José existem três unidades admi­ nistrados pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF): a Área de Proteção Ambiental (APA) São José, o Re­ fúgio Estadual de Vida Silvestre Libélulas da Serra de São José e a Área de Proteção Especial Serra São José. Juntas somam 4.758 hectares de áreas protegi­ das, que fazem parte do cartão postal de uma região. Conhecer a Serra de São José: Também é possível conhecer a Serra sem visitála. Esse é o objetivo do projeto Cultura, História e Biodiversidade da Serra de São José. Desenvolvi­ do no mês de maio, o plano estabelece métodos para ensinar noções básicas e oferecer suporte aos alunos da rede púbica de Tiradentes. Os estudantes vivenciarão a inclusão digital associada ao apren­ dizado sobre a história da Serra, além de práticas esportivas e culturais do local. Essa iniciativa é da Fundação Rodrigo Mello Franco de Andrade, jun­ tamente com a Pró-Reitoria de Extensão da UFMG e a Prefeitura Municipal de Tiradentes. As práticas acontecem geralmente aos sábados e domingos, iniciadas pela manhã. Após os trei­ namentos, os alunos do curso básico vão à serra e começam as atividades. Os interessados devem procurar o grupo Base Brasil, localizado na Avenida Leite de Castro, nº 508, bairro Fábricas, ou no endereço eletrônico basebrasilvest@hotmail.com.

A Serra de São José: destino preferido dos atletas

Muay Thay, o futebol da Tailândia Rômer Castanheira, Anna Júlia Silveira e Laís Gottardo

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onhecida mundialmente como A Arte das Oito Armas, o Muay Thay é uma luta ori­ ginária da Tailândia, país onde é o esporte nacional. A arte marcial, que tem mais de dois mil anos de existência, foi criada pelo povo tailandês como forma de defesa nas suas guerras e para ob­ tenção de uma boa saúde. O esporte é tão popular na Tailândia quanto o futebol no Brasil, o que o torna a maior potência do esporte no mundo. As técnicas básicas do Muay Thay são os socos, chutes, joe­ lhadas e cotoveladas, além de técnicas de clinch e arremesso. Yuri, 19 anos, reside em Ritápolis e sempre teve ligação com os esportes. Desde criança, além de jogar bola com os amigos, praticava o Kickboxing e, há cerca de cinco anos, vem atuando na arte do Muay Thay. Ele conta que iniciou a prática do es­ porte por curiosidade e hoje afirma ser apaixonado pela técnica. Sua rotina de treinamento na Academia Forma e Força é de segunda a quinta-feira, pelo me­ nos duas horas por dia. Segundo o atleta, no começo da carreira passou por certas dificuldades, na maio­ ria das vezes financeiras, pelo fato de treinar por dois anos em local alugado. Diante dos empecilhos, Yuri deixou o Muay Thay de lado por um ano, mas

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voltou a praticá-lo ao conhecer o seu atual professor, Alessandro Campos, que o incentivou a continuar. Yuri participou de um campeonato em Uberaba no mês de setembro e, apesar de não ter se sagrado campeão, trouxe consigo um sentimento maior de paixão pelo esporte: “ao aplicar o golpe cruzado, consegui me esquivar do contra-golpe do meu ad­ versário, mas em seguida fui atingido no rosto por uma joelhada, o que me desclassificou da com­ petição”. Para o jovem, a primeira qualidade de um prati­ cante de artes marciais é o auto-controle, afinal, se­ gundo ele, “um lutador com um golpe bem aplicado em uma pessoa que não conheça os domínios da luta pode trazer graves lesões”. Yuri conta ainda que o patrocínio, mesmo sendo pouco, foi o que possibilitou sua ida ao campeonato na cidade de Uberaba. A ajuda veio por parte da pre­ feitura e dos comerciantes da cidade de Ritápolis, a quem tem muito a agradecer. “A prática do Muay Thay deve ser ainda mais divulgada e explorada, de maneira a fazer com que mais pessoas conheçam e não julguem a luta como forma de violência, e sim como um esporte de contato”, ressalta o atleta quan­ to à prática do esporte.

Anna Júlia Silveira

Yuri: requisito básico é o auto-controle

“A dor é passageira, mas o orgulho é eterno”


PERFIL

André Azevedo

O maquinista Alexandre Augusto Goddi Campos tem orgulho em atender os turistas

O homem da máquina Carol Argamim Gouvêa e Íris Marinelli

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Alexandre participou destes ao vestir figurinos de época. A verdade é que Alexandre é quase uma cele­ bridade nas estações de São João del-Rei e Tiraden­ tes. É sempre muito procurado pelos turistas, que que­rem ouvir curiosidades, tirar fotos e conhecer a caldeira, o que o faz ter contato com pessoas de vários lugares do Brasil e do mundo. Alguns turistas acabam se tornando até mesmo amigos do maqui­ nista, voltando de tempos em tempos e mandando cartões e fotos. Além disso, Alexandre já foi entre­ vistado por alguns programas de TV e, principal­ mente, pelos participantes das oficinas da Mostra de Cinema de Tiradentes. Isso o deixa muito orgulhoso – ele faz questão de lembrar amigos e entrevistas. Mas nem tudo é fácil na vida de maquinista. Só de se aproximar da máquina, pode se sentir o ca­ lor forte que vem da caldeira, quase insuportável. Alexandre tem que aguentar todos os dias esse ca­ lor, durante toda a viagem e, para isso, utiliza equi­ pamentos de segurança – como botas de aço (de quase 2 kg cada uma!), óculos e abafador de ruído. Também possui algumas obrigações extras, como cursos anuais de simulador de trem e de caldeiras em Belo Horizonte. Para completar, finais de sema­ na e feriado são os principais dias de trabalho para Alexandre. “Tem que gostar muito desse trabalho, pois é muito difícil”, afirma. Mas ele ama tanto esse ofício. Muito entusiasma­ do, ele conta como é gratificante trabalhar em lo­ comotivas que possuem mais de um século, ressal­ tando como é importante manter a tradição, já que a Maria Fumaça mudou a sua função, passando de comercial para turística. Ele afirma que antigamente a linha do trem era bem maior, com estações em Pra­ dos, Antônio Carlos e Barroso - agora, a locomo­ tiva só vai até Tirandentes, por isso a necessidade de manter essa linha e as características originais dos vagões. Fizemos a Alexandre uma última pergunta, algo

que havia nos intrigado durante a viagem, sobre o porquê de o trem apitar tanto. “Porque isso faz parte da tradição e porque é obrigatório apitar nos cruza­ mentos para alertar os carros. Os turistas e o povo de São João também acham bonito”, responde. Ale­ xandre conta que ainda tem um apito preferido, pois das duas locomotivas em atividade, um possui dois tons diferentes de sonoridade. “Quando escutam o trem se aproximar, as pessoas acenam. Não viram minha mãe dando tchau da janela de casa?”, disse ele, sorrindo. Após conversar animado por mais de meia hora, ele termina a entrevista. Mas, antes de se despedir, faz questão de mostrar o funcionamento da caldeira e tirar fotos – ele adora fotos, por acaso. Por fim, ele se despede e entra na máquina. A locomotiva ganha vida. E então, mais uma vez a Maria Fumaça soa o apito. Ou seria Alexandre? Carol Argamim Gouvêa

ez horas da manhã. Havia fumaça e vapor por todos os lados quando encontramos o homem de uniforme pela primeira vez. En­ quanto ele se dirigia para a máquina, entrávamos em um dos vagões admirando o cenário de filme antigo: sofás de couro e paredes de madeira conservados por mais de um século. Tudo remetia ao passado. E, então, a Maria Fumaça soou pela primeira vez o apito, dando início ao seu trajeto até Tiradentes. A viagem demorou 40 minutos. Durante o cami­ nho, crianças acenavam e moradores de São João del-Rei admiravam a locomotiva. Depois, a paisa­ gem foi tomada por fazendas, serras e rios, que completavam o cenário da viagem. Foi apenas em Tiradentes que encontramos o homem de uniforme outra vez. Alexandre Augusto Goddi Campos, o maquinista. Figura interessante de se conhecer, com alma de Maria Fumaça. Alto, magro e sorridente. Logo à primeira vista Alexandre parece uma pessoa feliz, orgulhosa. Ele fez questão de ser entrevistado no vagão da loco­ motiva, onde se sentou confortavelmente, como se estivesse em casa. Sem parar de falar um segundo e sempre gesticulando muito, o maquinista de 39 anos contou sua história de amor à Maria Fumaça. Formado em 1998 em Engenharia Mecânica pela UFSJ, entrou como voluntário na estação em 2002, após passar toda a infância admirando o trem que passava em frente a sua casa. Apaixonado pelo que faz, recusaria qualquer proposta de emprego melhor se esta significasse o fim de seu trabalho na ferrovia. E mais do que isso, Alexandre é quase um român­ tico. “Tenho paixão pela locomotiva. Amor mesmo, como se fosse minha. Eu a trato igual mulher, trato bem.” O condutor conta algumas curiosidades sobre a Maria Fumaça, explica seu funcionamento, lembra de histórias. Segundo ele, várias celebridades já via­ jaram naqueles vagões e alguns filmes e novelas já tiveram o trem como pano de fundo – o próprio

Alexandre: paixão pela locomotiva

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