Jornal Ora-pro-nobis ed. 3

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Ana Gabriela Oliveira

Você sabe o nome disso? Página 7

Edição 02 - Ano 01 -Maio/ Junho - 2011


OPINIÃO EDITORIAL

Chegamos à terceira edição do Jornal Laboratório Ora-Pro-Nobis com uma vitória a ser comemorada: o jornal começa a se consolidar. A segunda edição havia saído com um atraso considerável, não por falta de matérias, mas porque ainda não encontramos meios para institucionalizar o projeto. A terceira edição chega a fim de concretizar um Ora-Pro-Nobis que ainda convive com os problemas de impressão e a falta de alguns equipamentos diários para os repórteres. A despeito dos contratempos materiais, estamos nos firmando com um conteúdo de alta qualidade e esperando a viabilização das demandas. No jornal, o leitor encontra textos bem elaborados de temas diversos. Numa tentativa de pensar a política na UFSJ, a reportagem principal faz uma análise teórica e factual sobre a polêmica envolvendo a representatividade dos estudantes no Conselho Universitário (CONSU). O texto passa pelos acontecimentos que se desenrolaram durante mais de um mês de negociações, o desfecho, ainda contraditório, chegando às acusações de perda de autonomia estudantil e à alteração do Estatuto.

CRÔNICA

Barro-que-ano Laís Gottardo

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cordou às 4 horas da manhã, pegou todo seu mundo, que foi embalado em três malas, encolheu-se no banco de trás e foi. Seriam as mais longas 6 horas de sua vida – e as mais importantes. Um misto de tristeza, ansiedade, dor e enjoo no gosto da boca, no modo de engolir a saliva. Sabia que se iniciava ali uma nova era, uma espécie de “a.C. e d.C.” só que a.SJDR e d.SJDR. “Nada ficou no lugar”; seu coração e vida ficaram do outro lado da divisa estadual. Como explicar aquele antagonismo dentro do peito? Sabia o que queria e sabia que estava começando, direcionando-se para os anos mais importantes da vida e, ao mesmo tempo, só queria voltar; só queria desistir. Entretanto, lá se foi, tentando disfarçar, chorar baixo, não vomitar. Afinal, são só três anos e meio. Mas não deu; o corpo não aguentou. Foi preciso uma agulha no braço para tornar tudo mais real, mostrar a dor literal, lado a lado com a dor construída, mesmo que não por ela mesma. E mais lágrimas (pensou que desidrataria) e mais medo e mais surpresa... O quê mais? Má Che! Não havia tempo para

literatura; foi necessário prosseguir. Sem exagero, o cenário da nova vida era, dos três possíveis, o mais bonito. Casas antigas, igrejas, esculturas; não havia semáforos lá e, por isso, reinava um certo caos. Mas estava no caminho certo e aquilo começou a lhe cheirar melhor. Vidros abertos, vento no rosto (e o cheiro já não era dos melhores). Parou diante da igreja mais linda que já vira, reparou em seus detalhes e pensou há quanto tempo aquilo se mantinha ali e quantas outras vidas não tinham se iniciado de forma idêntica para pessoas que logo conheceria. Mirou o chão de paralelepípedo e percebeu que quase não sabia mais o que era aquilo – estaria cega? A única certeza era a fraqueza, a fome e o tremor do corpo todo, meio que vibrando para acordar. Passo principal: check in! E quando o voo é alto, é preciso lançar-se de algum lugar... mas neste, tão escuro assim? “O importante é você se sentir bem”. Então, definitivamente, não é esse o melhor ninho. Uma vez encontrado, sentiu pela primeira vez o que é estar só, onde era melhor, mas que não se comparava às

asas da mãe; onde era seu, mas que em nada se parecia consigo; onde seria seu lugar de descanso, mas onde o colchão não se encaixava e nem ela a ele. Sentia-se bem, sim, se era o que a mãe queria saber. O tempo voa quando mais precisamos que ele o faça e assim foi. Muitas lágrimas e risos; chegadas e partidas; descobertas e clichês; “mãos, bocas e perfumes” e lá se foi um ano. Todos os dias ela acorda pensando que, na verdade, ali não é seu lugar. Os sinos, que deveriam aludir a algo celeste, estão mais para despertador de cidades assombradas. Mas como não confiar no destino que a levou até lá, sabendo ela tudo o que passou para fazê-lo acontecer? Como, se cada dia que saía de casa respirava um ar novo e com ele se renovava? Ela mudou e pôde perceber que, realmente, nada é por acaso. O motivo de estar ali era vencer; a si mesma, a outras, a esses próximos tempos por vir. Isso tudo com a vitalidade daquela que deixou o que era a mais de 500 quilômetros e não quis voltar o caminho todo, com os olhos no chão, procurando.

de o professor, notamos a falta de valor de autoridade do mestre. O respeito, dito lá em cima que seria função dos pais, ficou guardado em casa, e a escola acaba sendo um campo de disputa de poder com professores e de exibicionismo aos demais alunos. O governo até tenta realizar medidas sócio-educativas para conter esse tipo de violência, mas não passam de paliativos para mascarar um problema maior. Agora, com uma nova modalidade de violência escolar no país, o assassinato, o governo vem de novo com a história de plebiscito sobre desarmamento. Há 6 anos atrás, foram gastos 500 mil reais para a realização desse mesmo tipo de plebiscito e 60% da população foi contra o desarmamento. Mesmo que a opinião da população mudasse, o tráfico de armas continuará ocorrendo por falta de fiscalização e as armas acabarão chegando facilmente em mãos erradas. Ou seja, desperdício de mais meio milhão de reais do dinheiro público. Não adianta colocar um band-aid na ferida e deixar que o mal se alastre. E

pior, que se alastre dentro das instituições de ensino. Segundo estudo desenvolvido pela Unesco, e encabeçado pela professora Miriam Abramovay, as principais causas da violência entre jovens são: a desigualdade social, o fácil acesso a armas e drogas e a necessidade do sentimento de pertencimento, (o que faz com que eles se unam em gangues). Se é isso que faz com que jovens tenham atitudes violentas dentro das escolas, é nisso que deveria ser investido o dinheiro público, e não em plebiscito. Atuar com paliativos interminavelmente é o que causa uma desestruturação progressiva do nosso sistema de ensino. O compositor Bezerra da Silva, em sua canção “Violência gera violência” profetizou: “Já é hora de uma nova consciência, vamos dar um basta à violência e fazer reinar a união”. Dar um basta para que as mães possam desejar “bons estudos” aos filhos que deixam nas escolas ao invés de desejar “cuidado”. E que o lamentável caso de Realengo não seja só só uma lembrança, mas que nos sirva de alerta.

ARTIGO

Que nos sirva de alerta Ana Luiza Fernandes

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esde pequenos escutamos nossos pais e professores pregarem o valor do ensino na vida de um cidadão, antes mesmo de sabermos o que a palavra cidadão significa. A família e a escola são pilares fundamentais no desenvolvimento de valores morais e sociais nas crianças, mas cabe aos pais dar a elas a noção de respeito ao próximo. Já no papel de fortalecer conceitos de cidadania e bem estar social estão, juntamente com os pais, as cadeiras escolares. Depois do ataque a estudantes em Realengo, pensamos: “Aonde foi parar aquele local onde as criancas iam estudar para sair de lá seres instruídos e preparados para a vida?”. Amparados pela realidade de que o assassino de Realengo sofria de graves perturbações mentais, somos levados a pensar que esse não passou de um caso isolado e nossas escolas continuam com a missão que sempre tiveram no imaginário familiar. Mas não é assim. Alunos agredidos, livros roubados, funcionários humilhados e ofensas entre professores e alunos são fatos frequen-

tes nas escolas brasileiras. Todos esses são exemplos de situações que precisam ser enfrentadas com a mesma firmeza com que debatemos a violência no Rio de Janeiro. Com tanta agressão física e verbal e tanto desrespeito sendo vistos nas escolas, que lição os estudantes irão tirar da vida escolar? De cidadania e bons costumes é que não é. Isso tudo nos faz ver a situação caótica que se instalou não só nas escolas, mas em todo lugar, onde qualquer um pode sair por aí armado. Mesmo em São João del Rei, cidade classificada como pacata pela maioria da população, a preocupação com a violência nas escolas está presente. “Depois do atentado no Rio de Janeiro, eu tive medo de mandar meu filho pra escola, ele estuda numa escola municipal, fui até conversar com a professora” afirma a faxineira F. B. dos Santos. Se a violência passa a ser rotineira, ela se torna um ato comum, impassível de qualquer indignação. E é inaceitável que nossas crianças se acostumem com a agressividade dentro da escola. Quando um aluno agri-

EXPEDIENTE Ora-Pro-Nobis: Curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade Federal de

São João del-Rei Coordenador do curso: Jairo Faria Mendes Orientação: João Barreto, Kátia Lombardi, Paulo Henrique Caetano e Vanessa Maia Barbosa de Paiva Editora: Ana Luiza Fernandes Subeditora: Carol Argamim Gouvêa Arte e Diagramação: André N. P. Azevedo, Quéfrem Vieira Fotografia: Ana Gabriela Oliveira, André N. P. Azevedo, Íris Marinelli, Vinícius B. Gomes, Wanderson Nascimento Charge: Rodrigo Antunes Redação: Adriano Moura, Ana Luiza Fernandes, Ana Gabriela Oliveira, André N.P. Azevedo, Claudia Lino, Gabriel Riceputi, Laís Gottardo, Íris Marinelli, Marcelo Alves, Mario Chaves Jr, Vinícius B. Gomes e Violeta Cunha, Wanderson NascimentoEnd: Campus Tancredo Neves (CTAN), Av. Visconde do Rio Preto, s/n°, CEP 36301360, Colônia do Bengo – São João del-Rei Gráfica: Setor de Gráfica – SEGRA Tiragem: 2000 exemplares E-mail: orapronobis@hotmail.com

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CIDADE

Idosos sofrem com a falta de acessibilidade São João del-Rei ainda não promove alternativas suficientes para a 4ª idade Marcelo Alves

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Íris Marinelli

e acordo com o Censo/2010, São João del-Rei possui 976 pessoas com mais de 80 anos, a denominada 4ª idade. Esses cidadãos sofrem de doenças que dificultam a mobilidade e a autonomia. No entanto, pessoas da quarta idade e deficientes físicos não possuem alternativas de acessibilidade em prédios públicos municipais, como a Câmara de Vereadores, a Prefeitura e o Prédio da Administração. Além disso, enfrentam problemas com os passeios e transporte coletivo municipal. A cidade acessível, segundo definição do Estatuto do Idoso (projeto de lei nº 3.561, de 1997), é a que garante a toda sociedade a faculdade de ir e vir nos locais públicos comunitários e diminui as barreiras urbanas que possam dificultar a locomoção. A pedagoga especialista em gerontologia, Maria José Cassiano de Oliveira, acredita que São João del-Rei ainda não desenvolveu essa mentalidade. Para ela, o município não possui políticas de integração dos mais velhos. O prédio da Prefeitura, por exemplo, é um palacete histórico de dois andares. Uma escada íngreme é a única ligação entre os níveis e não há projeto de adequação para idosos e deficientes físicos. O edifício da Transportes coletivos não estão adequados para idosos administração, que centraliza as Secretarias mais importantes, também não possui elevador. “Vocês nem imaginam as dificuldades para os idosos irem aos espaços de representação reivindicar seus direitos, como a Câmara de Vereadores e a Prefeitura. O acesso é bem complicado, com escadas muito inclinadas, que impossibilitam a subida do idoso”, declara Maria Cassiano. A assessoria de imprensa da Prefeitura afirmou que deve partir do Legislativo uma lei que obrigue os prédios municipais a terem opções de acessibilidade. O setor também se disponibilizou a fazer um levantamento dos prédios públicos que ofere- Íris Marinelli cem acessibilidade. Contudo, mais de uma semana após a requisição, não deu resposta. Apenas os prédios mais novos, como o Fórum, o Ministério Público e o Batalhão da Polícia Militar foram projetados de acordo com as necessidades dos idosos. O conselheiro de Preservação do Patrimônio Público, Roberto Maldos, enfatizou que a prerrogativa de adaptar os edifícios públicos é do Executivo Municipal. “Quem tem que exercer esse papel é a Prefeitura. Há lugares que não têm acessos para deficientes ou não possuem acessibilidade adequada, as pessoas têm que começar a cobrar o Executivo. Não compete a nós ou ao IPHAN fazer isso”, disse. Ele também explicou que muitos prédios já possuem as alterações necessárias. “O Museu Regional tem uma cadeira que sobe todas as escadas até o terceiro andar, que facilita para quem não pode andar ou tem dificuldade de locomoção. Muitos outros prédios tem elevadores”, informou Maldos. A arquiteta e mestra em gerontologia, Adriana de Almeida Prado, aponta que as cidades precisam desenvolver políticas voltadas para “o acesso de todos a prédios e espaços pú- Calçamento da cidade dificulda a caminhada dos mais velhos

Temos que ter muito cuidado, porque é muito perigoso, podemos cair e quebrar algum osso.

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blicos; cuidar para que não haja obstáculos de mobilidade, projetar edifícios multigeracionais e veículos que minimizem as dificuldades de pessoas com idade e deficiências”. Dificuldades Maria Cassiano afirma que São João delRei ainda não pensa nos idosos em diversos aspectos. “A acessibilidade é um dos mais trágicos. Os mais velhos não têm como atravessar as ruas, pois os semáforos mudam muito rápido. Não há praças suficientes para convivência, as calçadas dificultam a caminhada e faltam banheiros públicos”, reclama a pedagoga. São comuns a muitos cidadãos com mais de 80 anos os problemas com mobilidade e acesso a prédios públicos em São João del -Rei. Nesse sentido, Maria Cristina Lima, de 80 anos, diz que enfrenta obstáculos de forma diária. “Saio muito de casa, vou à missa todos os dias, pego ônibus. A pessoa mais idosa tem mais dificuldade, mas ainda conseguimos passear. Temos que ter muito cuidado, porque é muito perigoso, podemos cair e quebrar algum osso. Andar na rua é complicado, porque os carros não respeitam”, afirma Maria Lima. Zeni Cordeiro, de 81 anos, comenta que ficou mais caseira com a idade. “Assisto a missa na televisão, não vou à igreja porque é muito longe da minha casa e não aguento andar muito. Ela também sente insegurança para atravessar as ruas e reclama da velocidade dos sinais. “Os carros não respeitam e eu desequilibro. Cismo que vou cair”, diz. As cidades devem manter calçadas com piso estável, reto e com superfície antiderrapante, informa a arquiteta Adriana de Almeida. O que é um desafio para cidades históricas, com ruas estreitas e irregulares. A pedagoga Maria Cassiano conta que “as pessoas tropeçam muito nos paralelepípedos. As quedas para os idosos costumam ser muito perigosas”. Transporte público A circulação por transporte coletivo também não está totalmente adequada, afirma a gerontóloga. “Só quem dá conta das atividades diárias consegue pegar um ônibus. Mas com muita dificuldade ainda, as pessoas não tem consciência de que devem que ceder os lugares da frente. Os assentos reservados não bastam. Os motoristas não foram capacitados para receber as pessoas mais velhas e apenas alguns ônibus têm degraus rebaixados”, declara Maria Cassiano. Marcia Leila de Castro Pellegrinelli, de 81 anos, aponta que o mais difícil para os idosos é a ausência de um transporte coletivo específico. “Deveria ter um transporte para os idosos em cada bairro. Os espetáculos religiosos, por exemplo, a gente perde porque são à noite. E acrescenta: “Acho muito importante que a comunidade desenvolva alternativas e a Prefeitura deveria tem uma van”. Jandira Pereira Lima, de 90 anos, conta que os filhos a proibiram de andar de ônibus por precaução. “Eu ando para lá e para cá de carro, só ando a pé perto de casa”.


POLÍTICA

Mudanças no CONSU causam polê Íris Marinelli

Mudança na escolha do representante discente no CONSU divide opiniões entre alunos

Gabriel Riceputi

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o dia 18 de abril de 2011, foi aprovada, em reunião marcada por grande controvérsia e tumulto, a proposta de mudança do estatuto do Conselho Universitário (CONSU) da UFSJ. O texto, escrito pela vice-reitora da universidade, professora Valéria Heloísa Kemp, traz como principais mudanças ao estatuto atual, o aumento do número de vagas no conselho reservadas a técnicos administrativos, corpo discente e representantes dos campi fora de sede. Tanto técnicos como alunos passam a ter cinco vagas no conselho, ao invés das duas que possuíam até então (no caso dos estudantes, uma das cinco vagas fica reservada para um aluno da pós-graduação), enquanto os campi Centro Oeste e Sete Lagoas passam a ter 4 e 2 vagas respectivamente, destinadas ao corpo docente. Mas o ponto que despertou toda a polêmica dentro da proposta foi a mudança na forma de escolha do representante discente para o conselho. O estatuto atual da UFSJ, em vigor desde 2005, traz em seu texto, no inciso V do artigo 10, que a representatividade estudantil dentro do CONSU se dará por meio de “dois membros do Corpo Discente, indicados pelo órgão representativo dos estudantes, na forma prescrita no seu Estatuto e, na falta desse órgão, eleito por seus pares”. Sendo o DCE o órgão representativo atual dos estudantes, é ele que indica os representantes discentes dentro do CONSU, através dos Conselhos de Entidades de Base (CEB). Dentro destas CEB, os candidatos para cadeiras no CONSU se apresentam perante os Centros Acadêmicos presentes e, sendo aprovado por maioria, são indicados como representantes estudantis dentro do Conselho. O que muda com a aprovação do novo texto é a função do DCE na escolha do representante para o CONSU. A partir dessa reformulação, os membros discentes no conselho não serão mais indicados pelo órgão representativo, mas sim eleitos pelos seus pares, em eleições diretas. A relatora do projeto, Valéria Kemp, recorre ao princípio da isonomia na representatividade acadêmica para justificar a mudança: “Tanto técnicos quanto docentes são escolhidos por seus pares para integrar o CONSU, somente com os alunos o processo é diferente”, afirma a vice-reitora. Essa alteração está causando polêmica por parte do DCE. Daniel Gonzaga Miranda, estudante do curso de história e 1º tesoureiro do DCE, apon-

ta falhas dentro do texto aprovado. “Eleito pelos seus pares é extremamente vago. No modelo do DCE atual, os representantes estão sendo eleitos por seus pares, uma vez que cada aluno vota em seu CA e este CA irá votar no representante, baseado no que é acordado com os alunos de seu respectivo curso”, declara Daniel. Ele ainda aponta os possíveis efeitos colaterais de uma implementação do formato de eleições diretas: “Todos sabemos que, apesar de ser uma enorme conquista, nosso modelo democrático atual não é perfeito. O que tememos é que nesse processo, a representatividade estudantil caia no discurso vazio da politicagem, da política do marketing e com isso se perca o voto politizado dos alunos”. A questão da fiscalização e acesso ao representante eleito pelos alunos também é outro ponto questionado por

Temos que construir uma participação em conjunto com o DCE e com as bases estudantis

Daniel. Para ele, não existe nenhum mecanismo que garanta prestação de contas por parte dos representantes eleitos nesse novo modelo. “No atual modelo, com a indicação pelo DCE, possuímos o critério da revogabilidade. Através desse critério, temos a garantia de que não haverá posicionamento pessoal do representante dentro do conselho e que este terá que votar de acordo com o que foi decidido nas CEB, ou simplesmente terá seu mandato revogado”. Para Valéria Kemp, a fiscalização dentro do novo modelo deve ser algo a ser decidido pelos próprios alunos. A vice-reitora afirma que a reformulação diz respeito somente ao Conselho Universitário e a forma de escolha de seus membros, deixando claro que será o movimento estudantil

que irá guiar as novas formas de fiscalização e participação: “O único ponto que foi proposto e aprovado foi a mudança para as eleições diretas. O modo como as eleições irão transcorrer e como a fiscalização se dará, cabe aos alunos decidirem”, declara Valéria, acrescentando que qualquer decisão posterior sobre o assunto poderá vir a fazer parte de resoluções complementares. Um dos principais nomes ligados ao movimento Diretas Já, o estudante do terceiro período do curso de Comunicação Social, Carlos Bem, rebate a questão da revogabilidade. Para ele, o modelo de fiscalização proposto pelo DCE acaba se mostrando arbitrário. O que ele propõe é a modificação de tempo de mandato de dois para um ano, com possibilidade de apenas uma reeleição. “Levando em conta o tempo de férias, o período real de atuação do conselheiro seria de sete meses, tempo razoável para se avaliar a atuação do representante. Dessa maneira, nossa revogabilidade se daria através do voto”, declara Carlos. Vladmir Agostini Cerqueira, professor e conselheiro do Departamento de Música (DMUSI), que votou a favor da proposta das diretas, justifica seu voto por entender que o que estava sendo votado não era sobre a estrutura do DCE ou do movimento estudantil, mas sim sobre a estrutura do próprio CONSU, acrescentando que pelo fato de o texto aprovado ainda estar muito cru e genérico, irá (e deve) despertar diversas discussões sobre o assunto por parte dos alunos. “Temos que construir uma participação em conjunto com o DCE e com as bases estudantis, não necessariamente concordando em tudo”, declara Vladmir. Representação dos campi fora de sede no CONSU Uma das questões cruciais para as mudanças pontuais no estatuto foi a questão da pouca representatividade dos três campi fora de sede dentro do conselho. Cada um dos campi possuía até então um representante apenas dentro do CONSU. Com o aumento de cadeiras para representantes docentes para os campi Centro Oeste e de Sete Lagoas, questiona-se sobre a participação do corpo discente destes campi dentro do conselho. Com o aumento de dois para cinco membros do corpo discente no Consu, a proposta do DCE, dentro do formato antigo do estatuto, seria de que cada uma das 4 vagas reservadas para a graduação fosse distribuída igualitariamente entre cada pólo.

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êmica entre estudantes na UFSJ “Nossa proposta é que uma vaga fosse destinada para São João, uma para Divinópolis, uma para Sete Lagoas e uma para Ouro Branco”, diz Daniel. Para ele, o novo formato de diretas acabaria tirando a possibilidade dos campi fora de São João terem uma chance real de conseguir eleger um membro dentro do conselho: “Por possuir um número reduzido de alunos em relação à sede, esses campi estariam praticamente fora da disputa”. Questionada sobre essa questão, Valéria Kemp reafirma que o modo de organização vai depender única e exclusivamente do próprio movimento estudantil. “É uma decisão que deve ser decidida pelo segmento dos discentes. Acredito que das assembleias que estão sendo realizadas pelo DCE possa surgir alguma ideia para o tópico” acrescenta a vice-reitora. Carlos Bem afirma que a proposta do movimento Diretas é a mesma colocada pelo DCE, garantindo uma vaga pra cada pólo da universidade: “Também pretendemos assegurar que cada um dos campi fora de sede esteja representado dentro do CONSU, juntamente com o membro representante de São João del-Rei”.

Íris Marinelli

Movimento Diretas Já O movimento Diretas Já é composto por um grupo de alunos que propõem um outro conceito de representação estudantil diferente do modelo atual do DCE. “O DCE não é modelo único e perfeito de representação estudantil. O que estamos buscando é uma nova fórmula, pois não nos vemos representados pelo DCE”, afirma Carlos Bem. Para ele o DCE constitui um grupo político extremamente fechado e que representa apenas alguns segmentos isolados dentro da universidade. “Prova disso é que os únicos estudantes indicados pelo DCE são da história e da filosofia. Quando indicam um representante, já chegam com um grupinho fechado e definido. O atual representante não passa pelo crivo de todos os estudantes. Isso pra mim não é democrático” acrescenta. Daniel Gonzaga rebate a afirmação chamando todos para a participação junto ao movimento estudantil: “Quem não se sente representado, acha o horário das reuniões ruim, sente a necessidade de

Alunos debatem durante a Calourada Política no CTAN

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que seja feita alguma mudança, que venha e participe, contribua, faça-se representar”. Daniel diz que por diversas vezes o espaço das CEB foi aberto para o debate do modelo proposto pelo movimento das Diretas, mas que este nunca compareceu às reuniões. Sobre as eleições, Carlos Bem diz ser favorável que o próprio movimento defina os mecanismos de funcionamento do processo e que a construção das novas regras seja definida junto aos estudantes. Questionado se será candidato para representante dentro do CONSU, Carlos afirma que nada ainda está certo e quem decidirá isso é o coletivo do movimento responsável pelas diretas. DCE promove assembleias sobre o assunto No meio de toda a polêmica sobre o tema, o DCE está promovendo assembleias em todos os campi da universidade, inclusive nos situados fora de sede, para estabelecer o debate, esclarecer os pontos necessários e para que os estudantes votem como acham a melhor maneira de escolha de representante. Até o presente momento, o quorum necessário para a validação nas assembleias, correspondente a 10% do corpo discente da universidade, não foi atingido. Mas os membros do DCE estão otimistas que com as assembléias restantes o número será alcançado. Os resultados da votação indicam uma vitória esmagadora por parte da proposta do DCE. Para Daniel, “este evento está sendo muito positivo para o DCE, pois estamos tendo que resolver na marra e em curto espaço de tempo, todos os problemas que estávamos botando na mesa e protelando indefinidamente”. O movimento Diretas se reservou no direito de não comparecer às assembleias, por entender que o que o DCE quer, na verdade, não é debater sobre o assunto, mas sim atacar e enfraquecer o movimento favorável às eleições dos representantes pelos seus pares. “Em primeiro momento, quando a Diretas quis debater, eles se preocuparam em atacar e difamar o movimento. Sabíamos que eles iriam recrutar a ‘tropa de choque’ deles para destruir a imagem do movimento dentro dessas ‘assembleias’”, afirma Carlos Bem, que ainda questiona, levando em conta a relativa pequena participação dos estudantes nas assembleias, a força do discurso do

DCE: “Com assembleias esvaziadas, nos perguntamos agora onde estão os 2011 alunos que assinaram as listas pedindo as assembleias e que o DCE tanto bradou que estavam sendo desrespeitados”. DCE questiona legitimidade da votação que aprovou as diretas Na reunião do dia 18 de abril, a proposta para a mudança no estatuto foi colocada para votação em regime de urgência, de acordo com pedido do conselheiro José Luiz de Oliveira, representante do Departamento de Filosofia (DFIME), que foi votado e aprovado por 21 votos favoráveis. “Propus o regime de urgência por entender que o DCE já havia tido tempo hábil o suficiente para propor discussões entre os discentes e também pelo fato de a pauta estar empacada nesse assunto por mais de um mês”. O conselheiro André Luan Nunes Macedo questionou a necessidade de votação urgente para o tema da representatividade estudantil e, munido de um abaixo assinado contendo 2011 assinaturas de estudantes pedindo tempo para debate, fez o requerimento de que a votação fosse adiada para outra ocasião. Seu pedido não foi atendido e o tópico foi colocado para votação no mesmo dia. Quando a proposta foi colocada para votação dentro do CONSU, a sala de reunião, que estava lotada de alunos, apoiando tanto as Diretas quanto o DCE, tornou-se um “pandemônio”. Os estudantes que apoiavam o DCE começaram a gritar palavras de ordem com o intuito de impedir a votação e conseguir mais tempo para que as assembleias fossem realizadas. O presidente do conselho, o reitor Helvécio Luiz Reis, tentou então encaminhar a votação nominalmente, mas vendo-se impossibilitado, realizou a votação por contraste, fazendo uso de microfone e propondo que quem fosse contra a aprovação do texto que se manifestasse. Sem nenhuma contestação, a votação foi dada por encerrada e aprovada por unanimidade. O que o DCE contesta é que não houve clareza para se realizar a votação e que muitos dos conselheiros sequer ouviram o que estava sendo dito pelo presidente do conselho. “Teve conselheiro que chegou para a secretária que estava registrando a ata da reunião e perguntou se tinha havido votação e qual havia sido seu voto”, ironiza Daniel. Para Vladmir Cerqueira, no entanto, divergências pela votação de contraste foram esclarecidas em reunião seguinte do CONSU e, embora alguns conselheiros tenham declarado não terem entendido, o número de membros que afirmaram ter ouvido foi suficiente e, portanto, não tirou a legitimidade da votação. A próxima movimentação do DCE será a de entrar com uma representação junto ao Ministério Público para contestar a validade da votação que aprovou a mudança no estatuto e que modificou a forma de escolha dos representantes discentes. Para isso, pretende buscar a colaboração dos conselheiros que votaram contra a proposta de modificação. “Já estamos avaliando, junto a advogados, a melhor maneira de lidar judicialmente com o caso, para que possamos reverter essa intervenção da reitoria dentro do movimento estudantil”, declara Daniel. *Colaboração de Thallyson Alves


CULTURA

Um Barroco ainda desconhecido Projeto busca evidenciar as características do barroco de São João del-Rei Ana Luiza Fernandes e Violeta Cunha

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André N. P. Azevedo

ão João del-Rei tem entre suas peculiaridades um rico patrimônio arquitetônico. De pontos altos da cidade é possível ver planos em que se intercalam exemplares da arquitetura colonial, barroca, art déco, modernista e contemporânea. Embora marcado pela diversidade, o lugar é berço de uma singularidade, um estilo próprio de barroco que marca a identidade do local. Ainda não existia um estudo acerca do estilo barroco são-joanense. A professora Letícia Martins Andrade, responsável por disciplinas e pesquisas relacionadas à História da Arte da Universidade Federal de São João del-Rei, desenvolve hoje um projeto acadêmico que tem objetivo de descobrir as características do estilo encontrado na cidade e ressaltar sua importância. De acordo com a pesquisadora, a união de influências ibéricas a traços que já despontavam de nossa cultura nacional gerou a arte barroca da cidade. “O que não é conhecido não é valorizado”, comentou a professora, afirmando que a desvalorização do patrimônio de São João del-Rei em relação aos patrimônios de outras cidades mineiras se deve, principalmente, ao desconhecimento do valor que esse patrimônio tem. A existência de um estilo específico em São João del-Rei e também em outras cidades se deve às divergências que o Barroco original, nascido na Europa durante o século XVII, sofreu até chegar em terras tupiniquins. Ou seja, o Barroco chegou tardiamente ao país, passando primeiro pelo litoral e, mais adiante, ao interior do continente. Segundo Letícia Andrade, o tempo que os materiais, os modelos e as técnicas levavam para chegar até o local de construção desses edifícios, de Portugal até o interior do Brasil, é um dos fatores para o surgimento de diversos tipos de barroco. Um exemplo dessa situação pode ser encontrado na Igreja Matriz de Nossa Senhora do Pilar, que possui, na capela-mor, pinturas que imitam os azulejos portugueses, em razão da impossibilidade

André N. P. Azevedo

Apesar de sua singularidade ainda não existe um estudo sobre o estilo Barroco são-joanense

de azulejos autênticos chegarem intactos com os materiais e as técnicas locais. “No ao interior vindos no lombo de burros. Brasil, a técnica era deficiente, não havia escolas de formação de arquitetos, esculO Barroco mineiro tores e pintores na colônia, e, sobretudo, O Barroco são-joanense está inclu- os materiais eram diferentes. Os artistas ído no chamado “Barroco mineiro” de gênio aqui na colônia vão saber fazer que carrega várias características que uso criativo e original de materiais lodiferem o nosso estilo daqueles en- cais e, a partir de modelos europeus, vão contrados em outras regiões do país. criar uma nova linguagem.” esclarece. O Barroco nasce para glorificar e enLetícia Andrade contou que o estilo volver o fiel, seja na Europa ou aqui em predominante no litoral é mais próxiMinas Gerais e carrega como característi- mo do europeu, importado diretamente ca principal o rebuscamento, a caracterís- de Portugal. Essa influência é tão grantica primeira desse estilo que precisa criar de que em alguns casos construções já impacto sobre o observador-fiel. Por- vinham “pré-fabricadas” de Portugal, tanto, é uma característica intrínseca do todas as peças já tinham seu próprio lubarroco, não apenas do Barroco mineiro. gar e vinham inclusive enumeradas. De acordo com Letícia, o estilo segue protótipos europeus que chegavam às A Influência da Igreja Católica colônias em grande parte por meio de reA Igreja Católica teve grande influênproduções gravadas, que seriam copiadas cia na vinda e na proliferação do barroco aqui. A grande diferença é que os modelos pelo país. Os motivos que condicionaram europeus vão ser interpretados na colônia a ostentação e a alegoria barrocas no litoral nordestino eram ligados à necessidade de a Igreja se mostrar presente num processo de acelerada conquista e ocupação das terras brasileiras. Em Minas Gerais, a disputa entre as irmandades favoreceu o desenvolvimento das artes, pois todas desejavam ter os mais belos templos. As diferenças entre os Barrocos de Minas são muitas, e até mesmo entre Tiradentes e São João del-Rei, cidades muitas próximas, há distinções que ainda estão sendo estudadas. “Se formos comparar a talha [escultura de relevos ornamentais em madeira integrada à arquitetura sobretudo nos altares] do interior da Matriz do Pilar e a talha da Matriz de Santo Antônio em Tiradentes, a diferença é tão abrupta, tão gritante, e foram feitas exataDetalhe de pintura que imita azulejo português na Igreja N.S do Pilar mente no mesmo período (...) A talha do

Pilar é única”, acrescentou a professora. A principal expressão do Barroco-rococó em São João del-Rei é a Igreja de São Francisco de Assis, que conta com a obra da portada principal de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. O estilo da igreja contém traços do rococó, já que São João teve o desenvolvimento tardio do Barroco, o que justifica essa mistura dos dois estilos. O estilo Barroco de São João del-Rei começa a ser estudado e valorizado na cultura nacional como um dos expoentes da beleza arquitetônica de cidades históricas do país. Não apenas a arquitetura das igrejas e a escultura dos retábulos sugerem peculiaridades capazes de confirmar um estilo particular. Com o desenvolvimento das pesquisas, também na pintura vinculada à arquitetura vemos surgir a possibilidade de identificação de uma escola local. Preservação Para garantir a proteção desse acervo que conta a história da cidade, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan – realiza projetos de segurança e restauração das obras. “Está sendo implantado um sistema de segurança na Igreja de São Francisco de Assis, na Igreja de Nossa Senhora do Carmo e também na Basílica de Nossa Senhora do Pilar. O acervo de São João del Rei é valiosíssimo, temos obras de Aleijadinho, pratarias e pinturas centenárias”, afirmou o chefe do escritório técnico do Iphan São João del-Rei, Mario Ferrari. Segundo Ferrari, o Iphan também tem outra preocupação quando se dedica a proteção das obras, que é a da prevenção a roubos desse patrimônio, uma vez que existem quadrilhas especializadas nesse tipo de delito.

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GASTRONOMIA

Divino sabor da tradição mineira Adriano Moura, Ana Gabriela e Wanderson Nascimento

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le é um alimento de alto valor nutricional, produz ornamento exuberante e cerca viva intransponível. Tem baixo custo e é de fácil acesso e cultivo: o ora-pro-nobis, ou Pereskia aculiata, é uma trepadeira que faz parte da tradição mineira. A planta pertence à família dos cactos, nativa da região que vem desde a Flórida até o Brasil e, como dizem os mineiros, ‘é como mato, dá em qualquer lugar’. O chef de cozinha João Lombardi explica que a hortaliça está presente na culinária mineira tanto em pratos simples quanto em sofisticados. Ele conta que, de acordo com a tradição local, “a planta existia em abundância cercando a igreja Matriz Santo Antônio de Tiradentes, mas o padre não permitia que ninguém a colhesse. Na hora da missa, as pessoas aproveitavam para colher a folhinha enquanto o padre rezava a ladainha do orapro-nobis, orai por nós em latim”. No restaurante de Lombardi, de mesmo nome da planta, o ora-pro-nobis acompanha receitas de frango, o mais tradicional e mais pedido, costelinha, risoto, caldo de milho verde, batizado de milhonóbis, entre outros. Segundo ele, a procura pelos pratos é grande e a maioria dos clientes é de fora.

A pedido da reportagem, o representante comercial André Vidal provou pela primeira vez o tradicional frango com ora-pro-nobis. Para ele, a receita “ é saborosa. O frango é um pouquinho mais picante; é interessante. A folha tem um sabor um pouco puxado para um hortelã, junto com uma serralha... não dá pra você identificar direito o sabor, mas é delicioso”, diz. Já a dona de casa Maria de Lourdes Giarola tem uma muda do vegetal na horta e diz consumir com moderação no dia-a-dia. “Nós não comemos muito, porque dizem que faz mal para os rins e porque é muito quente. Eu costumo fazer para as visitas e geralmente preparo refogado com frango ou com carne moída, pimentão e tomate”, afirma. A nutricionista do Posto Central de Saúde de Santa Cruz de Minas, Thaís Cristiane Fuzatto, explica que a planta não faz mal à saúde. “É como se estivesse comendo alface todo dia”, afirma. Entretanto, ela ressalta que o excesso da hortaliça não é recomendado àqueles que tenham pré-disposição a problemas renais. “O excesso de proteína, cálcio e fósforo vão acentuar o funcionamento dos rins e dificultar a filtração glomerular [filtra-

Wanderson Nascimento

Frango com ora-pro-nobis: um dos pratos mais pedidos nos restaurantes ção dos rins], com aumento das escórias nitrogenadas, como uréia e creatinina, e outros compostos nitrogenados.” A dificuldade em filtrar o sangue gera o problema renal. De acordo com Thaís, o ora-pro-nobis tem 25% de proteína de alto valor biológico, o que significa que uma alta porcentagem, 85%, dessa proteína é digerida pelo corpo humano. Além disso, é rico em vitaminas

A, B e C e minerais, como cálcio, fósforo e ferro. Ela concorda com aqueles que defendem o uso da planta como complemento alimentar na dieta do brasileiro, mas ressalta que “só o ora-pro-nobis não vai curar a fome de ninguém.” Thaís lembra que, por ele ser rico em proteína e ferro, é um bom auxiliar na luta contra a anemia.

ESPORTE

São João del-Rei sedia campeonato de Karatê Cidade recebeu segunda etapa do Campeonato Mineiro de Karatê Interestilos Mario Chaves Jr, Vinícius B. Gomes e Laís Gottardo

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ão João del-Rei recebeu, no dia 22 de maio, a segunda etapa do Campeonato Mineiro de Karatê Interestilos. O evento aconteceu no Ginásio Poliesportivo do Athletic Club e contou com a presença de cerca duzentos e cinquenta atletas de todo o estado. O campeonato foi organizado pela Federação Mineira de Karatê Interestilos (FMKI) através de uma comissão de academia filiadas, formada pelo projeto “Karatê para todos”, da UFSJ, e pelas academias KS e Sochin Dojo. Os primeiros a demonstrar suas habilidades foram as crianças, que eram maioria nessa etapa. Sob o olhar atento dos árbitros, dos pais ansiosos nas arquibancadas e de diversos outros colegas à espera de sua vez, meninas e meninos surpreenderam pela concentração em cada movimento. Leonice Aparecida Ramos, mãe de uma atleta de São Lourenço, estava acompanhando o evento narrou a alegria de estar com a filha Byara, de onze anos. Leonice disse que sempre acompanha a filha no esporte e citou alguns dos benefícios que ele trouxe: “o karatê ajuda no comportamento, pois desenvolve a responsabilidade e a disciplina. É preciso aprender a cumprir horários”. Felipe, de sete anos, também estava com a mãe, Tania Kobayashi. Detentor da faixa vermelha e com três medalhas conquistadas, ele se disse muito feliz pelo dia vitorioso que teve. Na variedade de categorias em disputa estava o experiente, Wagner Tadeu Resende, 65 anos, servidor técnico-administrativo da

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UFSJ. Além de competir, sendo o atleta de “ultimamente tem tido muitas mulheres maior idade na categoria Master, participou, no karatê. Os campeonatos costumam ter durante todo o dia, da organização do mes- uma grande quantidade e as categorias estão mo. “Eu convocaria a todos os jovens que, cheias. O nível está aumentando”. A atleta ao invés de ficarem na rua indo para as dro- Tâmila, que é filha de um Sensei, pratica gas, viessem para o karatê ou para qualquer o esporte há quatro anos e ressalta que anesporte, para que, baseado nisso, construís- tes as academias tinham poucas mulhesem um alicerce para seu futuro”. Com essa res, mas hoje a realidade é bem diferente. mensagem que ele quis mostrar a importânNo início do ano ocorreu a 1ª Etapa do cia do esporte que o tornou popular, com Campeonato Mineiro de Karatê Interestilos o carinhoso apelido de “Vovô do Karatê”. em Elói Mendes. O evento reuniu 360 lutaO Sensei e árbitro da FMKI, Maicon dores de 28 academias de diversas cidades, José Pereira, da cidade de Elói Menincluindo a equipe de São João del-Rei. des, participou do campeonato e Ao todo, o Campeonato Mineiro de ressaltou que há diversas categoKaratê Interestilos conta com cinco rias, desde os quatro anos de idade etapas durante o ano. A 3ª etapa já até as categorias mais avançadas. está marcada, na cidade de Alfenas, Além disso, ele explicou um pouco no dia 7 julho. A diversidade de atlesobre as regras básicas do esporte. tas e a confraternização realizada en“Existem áreas para se bater que tre eles e a comunidade que os valem ponto: peito, abdome, recebem faz desse evento costas e lateral da cabeça. A esportivo um relevante frente não pode tocar”. encontro para todos As lutas duram dois que veem no karatê minutos, mas vence uma oportunidade quem primeiro conde cuidar da saúde quistar quatro pone exercer cidadania. tos dentro desse limite. As mulheres também Presença Ilustre estavam presentes em granRonald Bauer prade número, competindo em todas as categorias. A atleta Felipe Kobayashi de Bárbara, de 14 anos, veio de apenas 7 anos exibe suas Betim e destacou a participamedalhas conquistadas ção das mulheres no esporte: Foto: Vinícius B. Gomes

tica jiu-jitsu desde os dez anos de idade e hoje pode se orgulhar dos seus oito títulos mundiais no esporte. O consagrado esportista prestigiou a segunda etapa do Campeonato Mineiro de Karatê Interestilos das arquibancadas, mostrando seu apoio ao esporte, que ele também pratica. Além dos títulos mundiais, Bauer é campeão mineiro desde 1984 e já conquistou o campeonato sul-americano e o pan-americano. Com experiência de 31 anos no esporte ele falou da importância dessas atividades para a sociedade: “o esporte é a melhor forma de inserção social. Através da luta, principalmente, porque ela estimula a disciplina, a coordenação e a concentração”. Bauer possui uma academia em São João del-Rei e realiza também projetos sociais com crianças carentes, ensinando-lhes o jiu-jitsu e transformando em ação esse seu pensamento. O karatê e o jiu-jitsu se aproximam por serem artes marciais com origens próximas, mas possuem suas diferenças. “O karatê é ‘caminho das mãos vazias’. Ele se fundamenta em socos e chutes. O Jiu-jitsu é uma luta de contato parecida com o judô, em que você joga o adversário no chão, tenta imobilizá-lo, finalizá-lo com uma chave de braço ou enforcamento, que seria o nocaute”. Bauer ressalta ainda a importância desse evento para São João del-Rei e cobra das autoridades e da iniciativa privada mais apoio ao esporte, pois considera que ele pode trazer um futuro melhor para muitos jovens.


PERFIL

Quaglia, o mestre do gesto

Íris Marinelli

(...) E não há melhor resposta/que o espetáculo da vida:/vê-la desfiar seu fio,/que também se chama vida,/ver a fábrica que ela mesma,/teimosamente, se fabrica,/vê-la brotar como há pouco/em nova vida explodida (...)” João Cabral de Melo Neto André N. P. Azevedo, Cláudia Lino e Íris Marinelli

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iver. Talvez seja isso que todos nós procuramos em cada coisa que ganhe nosso empenho. E é isso o que João Garboggini Quaglia conseguiu. Viveu, mais do que tudo. Hoje o pintor vive em São João del-Rei, interior de Minas Gerais. Sua casa é tranquila, afastada do agito da cidade, e, claro, conta com um ateliê de pintura que guarda um pouco de seu trabalho. Mas antes disso, o artista passou por muito mais. Quaglia nasceu em Salvador, Bahia - é impossível deixar de dizer que seu sotaque continua vivo, mesmo depois de tanto tempo. Lá mesmo, iniciou os estudos artísticos, aprendeu litografia (técnica de gravurismo que utiliza, basicamente, uma pedra calcária e tintas gordurosas). Mas não demorou muito para que saísse da Bahia e se mudasse para o Rio de Janeiro, lugar em que sua história foi se tornando cada vez mais rica. No Rio, estudou na Escola Nacional de Belas Artes, quando as universidades eram, segundo Quaglia, “do Brasil”. Hoje, a faculdade se tornou UFRJ, e, o prédio onde Quaglia se graduou é o Museu Nacional de Belas Artes. Escultura, xilogravura, pintura em tela, fotografia, litografia: Quaglia sabe expressar sua arte em várias formas. Mas sua trajetória não foi totalmente artística, visto que trabalhou como jornalista para a Folha de São Paulo (em sua filial no Rio), e ainda se tornou oficial da

Aeronáutica. Sem contar o tempo em que trabalhou na fazenda de seu irmão. Quaglia é uma pessoa de várias facetas, que aprendeu com cada experiência vivida. Além de ter tido várias atividades diferentes, inúmeros lugares receberam Quaglia e sua arte. Além do Rio de Janeiro e da Bahia, ele também morou no Rio Grande

Você é predestinado às coisas

do Sul, sendo um dos fundadores da Universidade Federal de Santa Maria. Além disso, a vida o levou para cidades como Madrid e Paris. Isso permitiu que conhecesse pessoas que fizeram parte de sua vida. O poeta João Cabral de Melo Neto, por exemplo, teve um livro ilustrado pelo pintor: Corrida de Touros, que descreve as touradas da Espanha, país onde se conheceram. Se hoje Quaglia vive em São

João del-Rei é por causa de sua família. Assim como sua vida, sua pintura também passou por diversas fases. Para o artista, sua fase inicial é a preferida, pois o desenho era feito de forma mais “solta”. Depois, foi buscando seu próprio estilo, algo precioso em sua carreira; que o possibilitou a passar sua mensagem por meio da arte com cada vez mais força. Além disso, uma definição o acompanha pela vida: “a pintura é o ato de documentar o gesto sobre um suporte. Não é bonito? O pintor tem que dominar o gesto para ser bom”. Segundo o próprio Quaglia, tudo pelo que passou já estava preparado. “Você é predestinado às coisas. Você pode desejar o que quiser”, ensina. Em certo momento, ele lembra a última vez que viu João Cabral de Melo Neto – em sua última entrevista ainda vivo. “O jornalista perguntou pra ele se ele tinha medo da morte. Como pode uma coisa dessas?”, conta indignado pela pergunta feita. Afinal, morrer é algo para o qual estamos predestinados. Mas qual o motivo de temer isso se podemos passar ainda por muitas coisas na vida? Ainda mais diante de uma jornada como a de Quaglia. Em certo ponto da entrevista, ele nos aconselha a gravar todas as entrevistas que fizermos, pois não podemos perder os detalhes. Sem ele mesmo ter notado, a entrevista estava sim, sendo gravada.

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