Revista Uot

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Ponto Literário livraria de usados

(Livros e discos de vinil) Rua Sebastião Sette, 97 Tel: (32) 3372-3799 Centro-São João del- Rei- MG pontoliterario@yahoo.com.br www.estantevirtual/pontoliterario

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UÓT?!|Abril de 2013 3


CARTA DO EDITOR

PERFIL

A

na Paula Gomes, Paulinha para os íntimos, é uma capixaba nascida em Ibatiba e residente em Cariacica. Numa conversa com a galera de UÓT?! a pequena dos sonhos grandes conta um pouco sobre Aurora, banda utópica em que ela atua como vocalista. No bate papo você, caro leitor, também fica sabendo um pouco mais sobre a vocalista e o seu relacionamento com a música. Acredita que além de cantar ela também é a responsável por compor músicas carregadas de lirismos? Não? Então vem com a gente e se prepara, porque a prosa foi boa.

UÓT?! Yes, queremos banana! Nossa revista quer saber O QUÊ?! O que acontece na nossa música, o que foi importante na história da música nacional, quem, como, quando, onde...?! – queremos ser o RG da música brasileira.

Por Artur Caldas UÓT?! Como surgiu o nome Aurora? AP: Em uma conversa de buteco, acabou que pegou.

Nossa missão é incentivar a valorização da música nacional, sem xenofobia quanto ao que vem do estrangeiro e sem ufanismo em relação ao que é nosso, mas agitando uma cena musical que é muito rica, original e muitas vezes pouco divulgada.

UÓT?! Por quais artistas você se sente influenciada? E quem dessa nova geração de músicos brasileiros você tem ouvido? AP: Por muitos, mas as referências mais fortes são de Caetano, Chico, Roberto Carlos, Erasmo, Camelo. Tenho escutado Silva, Jeneci, Mallu.

UÓT?! Você compõe e canta suas próprias músicas, de onde veio a inspiração para fazer música? AP: Eu me inspiro nas pessoas, em eventos cotidianos, em sentimentos e histórias corriqueiras. Gosto da singeleza das coisas, e tudo que é singelo me inspira.

A UÓT?! mostra novidades tanto quanto resgata grandes momentos da música nacional. Afinal, tupi or not tupi – essa é a questão, leitor! Olhe – dessa vez – para o seu próprio umbigo.

EXPEDIENTE / N. 1 / ANO 1 / ABRIL 2013 Editora chefe: Dani da Gama Editores: Ana Claudia Lima Artur Caldas Editora de arte: Cecília Santos Redatores: Ana Claudia Lima Artur Caldas Cecília Santos Dani da Gama Revisão de texto: Dani da Gama Comercial: Artur Caldas Cecília Santos Coordenadores: Alessandra de Falco Marcius Barcelos

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de mim, ou dos integrantes para existir.

UÓT?! “Laranja” é record de visualizações no canal de Aurora no youtube. Para quem você compôs a música? Em uma das partes ela faz uma conotação ao livro Pequeno Príncipe, isso quer dizer que a literatura e meios fora do contexto musical também influenciam a banda? AP: Laranja foi escrita para uma pessoa muito especial, que me lembrava o Pequeno Príncipe. Nos gestos, no modo de enxergar as coisas. Bom, tudo que é singelo, bonito, artístico, pode ser referência pra mim nas composições. Principalmente livros, pois gosto de fazer trilhas pra uma personagem, ou pra uma história. UÓT?! É verdade que você não gosta que se refira a Aurora como “Banda Aurora” mas apenas como Aurora? Por quê? AP: Não é que eu não goste. Eu apenas gosto de me referir a Aurora como alguém, como algo fora de nós, além de banda. Aurora é um sonho, uma história, ela independe

“Eu me inspiro nas pessoas, em eventos cotidianos, em sentimentos e histórias corriqueiras. Gosto da singeleza das coisas, e tudo que é singelo me inspira”

Acesse: http://www.youtube. com/watch?v=ue-YhBDSJRc https://www.facebook.com/ oficiaurora

UÓT?! Quais são os projetos para o futuro de Aurora? AP: A gente não pensa muito em coisas muito distantes, em um futuro muito distante. Como eu disse antes, a Aurora é algo vivo, que independe de nós. A banda passou por muitas modificações, e por muitos acontecimentos, ainda precisamos nos organizar, ver como vão ficar as coisas daqui pra frente. UÓT?! Fiquei sabendo que Aurora pretende lançar um EP, pode nos contar como será? AP: Gravamos algumas coisas, ainda falta guitarras e metais, e alguns arranjos. Nós paramos, pois algumas pessoas saíram, algumas coisas aconteceram, mas quando tudo se resolver nós pretendemos fazer show de lançamento, e um clipe que já foi iniciado, mas precisa ser concluído. UÓT?! De onde surgiu seu relacionamento com a música? AP: Surgiu de dentro de mim. Não sei explicar como ou quando começou, acho que já nasci fazendo isso, fazendo música. UÓT?!| Abril de 2013 5


BRASILIDADES

BRASILIDADES

Menina dos olhos

Ser brega nunca foi tão cool O shake de inovação da banda UÓ

O frescor da nova MPB

Por Artur Caldas

Por Ana Claudia Lima

“O brega é o novo preto!” Se você pensa que essa é uma nova máxima usada no mundo da moda, está muito enganado. Por enquanto, a poluição colorida dos anos 80 continua guardada há quarenta décadas e a gente agradece. O brega agora desfila em outras passarelas, é uma tendência musical. Sua essência, enraizada em terras nordestinas, passou por uma repaginada e alcançou o sucesso nas paradas brasileiras. Um dos precursores dessa nova roupagem, o trio de Goiás composto por Mateus Carrilho, Davi Sabbag e a musa Candy Mel, forma a divertida e irreverente Banda Uó. O estouro da banda aconteceu em 2011, com a saída de Flora Maria e a entrada de Candy Mel. Foi também nesse ano que a música “Shake de amor” (versão de Whip my Hair, de Willow Smith) bombava na rede e consagrava o trio goiano como os moderninhos do brega, ganhando o VMB 2011 de melhor videoclipe pela MTV Brasil. O som da banda passa por todas as tribos, é o “É o tchan” da geração Y. Talvez, todo esse devaneio cult se dê pelo constante contraste que a banda nos apresenta. Roupas fashionistas, bigodes hipsters e cabelos coloridos, toda essa modernidade combinada com versões eletrônicas e bregas de grandes clássicos do mundo pop. É para deixar qualquer diva pop no chinelo. Afinal, mixar todos esses elementos de diferentes esferas sociais num resultado final conciso e inovador não é para qualquer um. Ainda hoje, três anos depois do surgimento da banda, o trio continua recolhendo os fru6

tos do “eletrobrega sensação” (como eles mesmos chamam). De lá pra cá lançaram um EP e um álbum, “Me emoldurei de presente pra te ter” e “Motel”, respectivamente. “Motel”, álbum do último trabalho, conta com a participação especial de outra grande rainha da música brasileira, Preta Gil. Não bastasse o respaldo da cantora, os meninos fashionistas do brega mostraram que já são gente grande no meio e alcançaram com o álbum a primeira posição de vendas no iTunes apenas na primeira semana. É, parece que o hype agora é ser do brega. Ai que uó!

Dona de uma beleza marcante, um carisma surpreendente e um nome inusitado, Tiê Gasparinetti Biral, despertou ainda jovem sua audácia e coragem que seriam suas características definitivas. Nascida em uma família de classe média, com apenas 13 anos Tiê ingressou no mundo da moda sem, no entanto, esquecer suas afinidades musicais. No ano de 2000 a jovem embarcou para uma temporada de um ano em Nova York onde estudou música, expressão corporal e aperfeiçoamento vocal. De volta ao Brasil e decidida a dedicar-se ao cenário musical, ela começou a fazer shows em bares e casas de shows de pequeno porte. A meiguice melódica da cantora despertou o interesse crítico que logo a elegeu uma das mais promissoras vozes brasileira, e em 2007 ela gravou em parceria com Dudu Tsuda (tecladista da conceituada banda mineira Pato Fu) um EP com quatro músicas. No ano de 2009, somando 28 anos e em plena maturidade musical, Tiê lançou seu primeiro disco denominado “Sweet Jardim”, que trazia dez faixas autorais gravadas ao vivo que tiveram grande aceitação do público. O cd trazia além de músicas autobiográficas como “Passarinho”, canções arrebatado-

ras e emocionantes como “A bailarina e o Astronauta” que contava com o acompanhamento fiel de sua intérprete ao violão e parcerias importantes como de Toquinho em sua canção-título. Além de render uma indicação de revelação do Prêmio Multishow de 2010, “Sweet Jardim” lhe proporcionou shows por todo Brasil e Nova York, uma turnê pela Europa e foi eleito pelo periódico Folha de São Paulo como um dos 50 discos que ajudaram a formar a identidade musical brasileira nos anos 2000. Entusiasmada pela receptividade alcançada no primeiro trabalho, a cantora lançou em 2011 seu segundo trabalho que recebeu o nome de “A coruja e o Coração” trazendo releituras de sucessos, além de parcerias e participações especiais como de Marcelo Jeneci e Tulipa Ruiz. Considerado uma das mais satisfatórias surpresas do cenário musical brasileiro e com um instrumental mais denso que no primeiro cd, a música principal do aclamado “A coruja e o Coração” foi a autoral “A varanda da Liz”, uma homenagem que a cantora fez a sua filha. Com desenvoltura e charme, Tiê vem conquistando ouvidos e corações enquanto se encaminha para o hall das maiores cantoras de todos os tempos.

álbum motel

lançado em setembro de 2012 em edição do selo Vigilante, da gravadora Deck. Em Motel, os mordeninhos do brega - formado por Davi Sabbag, Mateus Carillho e Mel Gonçalves - apresenta faixas inéditas como Búzios do Coração, Castelo de Areias, Vânia, Cowboy e Malandro.

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TUPI OR NOT TUPI

BPM BRAZILIAN POP MUSIC O samba do estrangeiro doido invade a música popular brasileira. Onde foi parar o Brasil? Por Dani Da Gama

O

Brasil é um país de misturas, o que faz do brasileiro um povo sem similar. Verdade é, que um paíscontinente como o nosso, que faz serem compatriotas os índios amazônicos, os tecnológicos paulistas e os sulistas germânicos, só poderia mesmo gerar um povo muito rico em cultura. Mas apesar da pouca história – não somos milenares como os chineses, nem clássicos como os gregos –, bem que poderíamos ter uma cultura, além de rica, mais forte. Estou falando de uma cultura brasileira. Miscigenada, sim – é nossa natureza –, mas não “importada”. Vamos falar de música. A música brasileira sempre viveu numa gangorra. É a gente que já internalizou tanto essa cultura de brazilian, numa nação em que até o povão é pop – curte funk, rap, reggae... Aí música nacional, mesmo, vira axé music ou mangue beat... Pronto! Precisava ter sobrenome americano... E o estilo interiorano que leva nome e sobrenome brasileiríssimos – música sertaneja – re-grava Bee Gees e Celine Dion... Sertanejo? Ou o nome emprestado de outros tempos está errado, ou o sertão mudou. De vez em quando tambem cantam um country... puro Nashville. Música popular brasileira. Coisa confusa. E não é porque banda de rock regrava Fábio Jr. Confusa porque cantora axé canta música romântica, e o axé mesmo acaba ficando para aquelas bandas que têm mais bunda do que música e dão um maravilhoso incentivo à criatividade, com suas letras de duplo sentido. (E o Olodum, que tocou seus tambores para um Caetano regravando Bob Dylan – Xiii... – e se juntou a Michael Jackson – o rei do “pop” – no quase templo da cultura afro-brasileira – o Pelô!). A Música nacional está confusa porque Cazuza morreu. Renato Russo morreu. Agora o Chorão também se foi em seu skate envenenado. Chico Science morreu e eu queria saber por que não podia ser “Ciência”, Chico?

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(Já pensou a Gal virar Gal Coast?). Também está nenhum nutriente. Música McDonald’s. Em matéria de confuso porque dupla sertaneja faz baladinha hambúrguer, OK, mas em letra eles são bem fraquinromântica plugada – saudade da viola, unplugged... hos. Tem muito baby, muito love e muito come on (e A MPB está confusa porque parece que em música panfletária tem muito palavrão). Mas bolar um “na desordem do armário embutiMPB parou em Caetano, Gil e Chico. A música brasileira do meu paletó enlaça o teu vestido”, Mas eles não tocam nas rádios, e tem muita gente fazendo boa MPB sempre viveu numa só a gente. Também temos o original, o Poetinha, aquele que queria uma que não chega nas estações. Nas rágangorra. E a gente mulher que tivesse saboneteiras... dios a juventude ouve funk – músiA MPB, de um lado, perdeu Raul cas que fazem as mulheres retro- que já internalizou cederem até antes da queima dos – goste ou não goste, não há como sutiãs.Mulher objeto,sem nenhuma tanto essa cultura negar Raul – por outro, tem grupos e noção de sê-lo. Faz o homem acredi- de brazilian, numa cantores já “meio mortos”, ressuscitados pelos poderes paranormais do tar que “o melhor movimento feminino é”, mesmo, “o dos quadris”. nação em que até o marketing. De repente um grupo de que ninguém se lembra mais grava A MPB está meio perpovão é pop um especial para a TV e vira a última dida porque a nova MPB tem raízes no soul, no R&B... Ou tem letras com- moda... – isso é o “Capital”, já não inicial... Aquilo que plexas demais para nós, meros apreciadores. gira o capitalismo naquilo que não pode ser só arte Na verdade a gente não quer ter que entender porque artista, produtor, equipe também têm que Kant ou Nietzshce. A gente quer curtir um som. comer (e só Woodstock acabou sendo de graça...). E Andy Warhol estava corretíssimo com sua E poetas? Nesse momento de covers americanos? Música americana é boa, sim, mas a letra, é pre- tese dos “15 minutos de fama” (em alguns casos, ciso admitir... Fácil de engolir, de digerir, mas sem que bom que são só 15!) e os grupos e cantores vão se substituindo e sendo idolatrados e no minuto seguinte ninguém mais se lembra deles... (Ah, em falar em Andy Warhol, bem que podia ter tese do Chacrinha divulgada internacionalmente pra gente citar num texto, né? “Quem não se comunica se trumbica” podia aparecer num artigo americano da Time). A gente precisa é se educar pra olhar pra gente. Pra falar da gente. Pra ouvir a gente. Não é com xenofobia que isso se resolve. Boa música é pra se ouvir e apreciar, seja americana, russa ou guatemalteca. E aqui ninguém está entrando no mérito do gosto: discutimos o fato de a música brasileira não ser brasileira. Precisamos que haja várias prateleiras de estilos musicais brasileiros! Mas que haja qualidade, que não se promovam baixarias musicais, e não se eleja como “cantor” o cara que desafina mas é bonitão – e o público feminino grita tanto que a voz dele é o que menos importa – ou como “cantora” a “popozuda” que precisa de recursos fonográficos para ficar audível no play-back e “pornográficos” para manter o público atento... Que haja comprometimento com a difusão da cultura, a necessidade de compreender, de educar-se, com a arte. Para essa criançada não ser educada achando importante saber a coreografia do “Quadradinho de Oito” pra ser alguém na vida. Que haja realmente vários estilos de música popular brasileira, mas que haja – sem redundância – MPB BRASILEIRA.

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ERA UMA VEZ

ERA UMA VEZ

1973: O ano que vivemos sem perigo O ano de 73 foi marcado pelo lançamento de álbuns brilhantes, que marcaram para sempre a música brasileira Por Dani Da Gama

1973: No ano da crise do petróleo, o brasilei- joada enquanto um capixaba tímido bota seu bloco ro usava boca de sino, venerava Darlene Glória e Fittipaldi, e Médici governava o país. O público se ligava na primeira novela a cores, e se escandalizava com Maria Schneider dançando um último tango e com a velha nudez castigada de Nelson Rodrigues. O Rio de Janeiro continuava lindo, e Odair José cantava “Pare de tomar a pílula”. Então surgem de sampa guitarras elétricas disparadas por performáticos jovens maquiados, um doce malandro carioca aparece no meio de uma fei-

na rua e o baiano Raulzito grita “Cuidado”!, sabese lá contra qual inimigo. Numa época de censura política, artistas moveram-se pela sinceridade poética e inovação instrumental com uma força criativa que hoje a censura – dessa vez estética – talvez não permitiria. Filhos da MPB, dos festivais e da Tropicália. A coisa só podia dar boa. Feliz ano velho.

Por Dani Da Gama

Krig-ha, Bandolo. Raul Seixas

Krig-ha, Bandolo! é emblemático. Absurdo. Eterno. Do repertório inventivo e singular de Raulzito, que até hoje é lembrado por uma legião de fãs que pedem – Toca Raul! –, algumas das mais famosas canções estão nesse álbum. De cara, surge afirmando sua vocação – a mosca que pousou na nossa sopa. Se gue embalando filosofias metafísicas, indo do ritmo gospell de “Dentadura Postiça” ao rockabilly de “Al Capone”. Dos clássicos, “Metamorfose Ambulante” e o folk “As Minas do Rei Salomão”. O disco encerra com “Ouro de Tolo”, longa poesia sobre melodia simples, considerada uma revolução na forma de cantar – quase uma conversa. Aliás, o álbum não podia terminar melhor, pois com sua crítica social não há como não refletir ou sentir-se parte de algo decadente. O disco não se cala, prosseguindo profético, usando humor, genialidade e a lucidez do maluco beleza.

Quero botar meu bloco na rua. Sérgio Sampaio A vida pode não se resumir a festivais, como Vandré denunciou. Mas o discurso bravo da faixa título de “Quero botar meu bloco na rua”, finalista da FIC de 72, pode resumir algumas vidas. A marcha corajosa acusava um desejo de grito em meio à repressão, mas até hoje serve como hino de movimento de cabeças encaracoladas de cucas maravilhosas. O álbum foi produzido pelo seu amigo Raul Seixas, e é vívido e poético como poucos. Do samba “Cala a Boca Zebedeu”, ao baixo melodicamente embalando a nostálgica “Eu sou aquele que disse”, e o rock icônico de “Viajei de Trem”. Em todas as canções do álbum as letras – pura poesia – conversam com finas melodias. Samba, Blues, Chorinho e Rock, arranjados com violão, baixo, e a voz de um gênio. Sem mais - obra prima.

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Secos e Molhados. Secos

e Molhados

A hora e a vez das guitarras, em uma experiência insólita que uniu teatro, música, folclore e um tanto de androginia. Ney Matogrosso e suas performances originais, as maquiagens e purpurinas, as poesias cantadas, o baixo arrasador de “Amor”. Para além dos hits óbvios – “Sangue Latino” e “O Vira” – as letras de “Assim Assado” em franca crítica social, a pergunta fatídica de “Mulher Barriguda” – haverá guerra ainda? – são ainda atuais. Momentos como a introdução extasiante de “Primavera nos Dentes”, o trabalho cuidadoso com os vocais, as bem feitas linhas de baixo, e os arranjos singulares tornam este álbum brilhante. Gravado em 15 dias, o álbum de um grupo meteórico conseguiu registrar canções que até hoje não deixam pedra sobre predra.

Pérola Negra. Luíz Melo-

dia

Carioca do Estácio, filho de sambista, poeta e romântico ao tutano. Luiz Melodia é uma voz marcante e compositor primoroso. “Pérola Negra” nos apresenta com fineza a voz e as composições deste sorridente sofredor. Sofre em “Farrapo Humano” – propondo um suicídio a caco de telha. Morre de amor em “Estácio holly Estácio”. Aciona guitarra em “Pra aquietar”. Ao lado da simplicidade das canções, o timbre potente e sofisticado de Melodia, que comete suas declarações de amor ao Estácio e ao amor. Do divertido “Forró de Janeiro”, segue para um sambinha em “Vale quanto Pesa” e o chorinho de “Estácio, eu e você”. Instrumentalmente impecável é a faixa-título, com metais e eterno romantismo. “Pérola Negra” é uma pérola, música nacional genuína do artista que leva Melodia por sobrenome.

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CAIXINHA DE MÚSICA

TÚNEL DO TEMPO

O que ouve?

Os bons malditos da MPB

Perguntamos a músicos de diferentes estilos: que álbum nacional mais te influenciou? Descobrimos que todos eles têm um apreço por algum álbum tupiniquim. Isso é para mostrar a influência da nossa música para artistas que tocam rock, blues, progressivo... e nacional, claro!!

Tropicalismo, Rock’n roll,Bossa Nova, Jovem Guarda.. entre tantos rótulos, alguns músicos geniais da década de 70 receberam uma classificação nada agradável: foram os “malditos” da MPB, inovadores e poéticos até os ossos, que revolucionaram a linguagem e a sonoridade da música brasileira, passando longe das FMs e, muito, das gravadoras.

Por Dani Da Gama

Daniel da Gama - baixista

na banda de rock progressivo Chave da Noite, de Santa Catarina

Guitarrista e vocalista da banda Blue Flames, cover do Jimmy Hendrix

“O disco Estação Elétrica, do Bixo da Seda, de 1976. Rock’n’roll com jeito progressivo e muito swing, tudo misturado. Sem contar a ‘pegada da banda’ e os vocais, é sonzeira apesar do som de ‘garagem’, ótimo disco. Faixas top: Trem Já brilhou e É como teria que ser”.

“O álbum Secos e Molhados me influenciou principalmente por causa do trabalho com os vocais. Sempre prestei muito atenção no baixo também. As linhas são muito bem feitas. E é sempre bom lembrar que se não fossem os músicos de apoio e os arranjadores (tão apagados) o som dos caras não seria tão brilhante”.

Jéssica Máximo - es-

Bigo Blues – baixista na banda

“O álbum que mais me influenciou foi Catavento e Girassol, dos compositores Guinga e Aldir Blanc, interpretado pela cantora Leila Pinheiro. Este álbum me influenciou muito pela qualidade harmônica e poética das músicas. Os autores abordam a cultura brasileira com uma poética pela qual me identifico muito e me inspiro. Sem dar juízo de valor para a questão da cultura nacional eles abordam os costumes e problemáticas de várias regiões brasileiras. Me espelho muito nesses artistas.”

“Jards Macalé - 1972, além de reunir composições dele com seus principais parceiros, Wally Salormonn, Capinan ,Torquato Neto tem uma musicalidade de natureza experimental, gravado basicamente no estúdio em forma de jam session com Tutti Moreno na bateria e o imortal guitarrista Lanny Gordin, considerado na época o Jimi Hendrix Brasileiro. Lanny além de gravar os violões gravou também as linhas de baixos. Além das canções transitarem pelo Rock, Blues, Jazz, Bossa e Tropicalismo e suas letras com a tão conhecida poesia marginal, é curioso perceber a formaçao musical do disco, pouco comum para a época, Violão, Baixo e Bateria. Jards Macalé e Lanny Gordin abriram a mente e o leque para muitos, Brasil a dentro e mundo a fora.

tudante de Música, faz voz e violão interpretando MPB

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Guilherme Augusto –

de blues The Blues Planes

Por Dani Da Gama Tom Zé, Sergio Sampaio, Jards Macalé, Jorge Mauter, Luiz Melodia, Walter Franco, Itamar Assumpção. Músicos que quando surgiram, nos idos de 70, foram considerados impopulares, por fazerem músicas difíceis de compreender e de rotular. Como diria Jards Macalé, na canção “Let’s Play That”, vieram para desafinar o coro dos contentes. Fazendo um som genuinamente artístico, com letras de pura poesia e sonoridade não vinculada a nenhum “partido” musical da época, alguns acabaram morrendo no total esquecimento, outros apenas na atualidade estão obtendo o devido reconhecimento. Por não terem espaço nos catálogos das gravadoras e ficando conhecidos por uma parte bem restrita do público, foram batizados de “malditos” pela imprensa. Na época parecia haver espaço para muitas vertentes musicais. Assim como havia a Jovem Guarda, o público mais intelectualizado ouvia bossa nova e o rock tinha espaço com Mutantes e outras bandas mais experimentais. Mas mesmo Mutantes precisou se vincular ao movimento tropicalista para finalmente aparecer, cantando ao lado de Gilberto Gil no festival de 67 a música “Domingo no Parque”. O que parece unir o grupo heterogêneo dos malditos foi sua sonoridade com arranjos bem trabalhados, e suas letras muitas vezes herméticas, como o fazia - e muito - Tom Zé. Esses estranhos no ninho faziam “apenas” música, “apenas” poesia, e prezavam a autenticidade que lhes custou o sucesso, já que se recusavam a atender pedidos de gravadoras para compor músicas mais comerciais. Sua alma estava em suas músicas, e eles não tinham nenhuma intenção de vendê-la. E mesmo não vendendo milhares de discos e sendo pouco lembrados até hoje, os malditos da MPB deixaram um legado para a música brasileira, influenciando artistas que hoje os homenageiam, em projetos como “Bendito é o maldito entre as mulheres”, que em 2011 apresentou shows com vozes femininas

da nova MPB cantando canções de alguns “malditos”. Hoje temos uma geração forte de bandas independentes, fazendo música não comercial, favorecidas pelo cenário digital. Não é mais essencial que uma banda tenha uma gravadora e um Sergio Sampaio selo para ser conhecida, ela pode usar o myspace ou redes sociais, para ser vista e lembrada. Esses músicos têm buscado a originalidade e novidade que tentavam trazer os “malditos” há quatro décadas, experimentando fazer arte além da grana, já que se foi o tempo em que era necessário pagar jabá e tocar na rádio para a música aparecer – e hoje quem está experimentando fazer sons diferentes e genuínos tem aparecido para um público que busca algo diferente de simples música fast food. Apesar de nos depararmos com uma identidade funesta para a música brasileira, ouvindo as rádios e programas de TV proliferando suas duplas sertanejas e funks de gosto sempre duvidoso, podemos ver que, como antes, basta procurar porque sempre existem bons letristas, músicos e intérpretes nos mais variados estilos dentro da MPB. Hoje, poderíamos chamar de “malditos” as centenas de bandas independentes que tocam em bares e esquinas de todo o país, com letras poéticas e incursões instrumentais inovadoras, versus a massa sertaneja/pagode/funk que toca nas rádios. Música boa existe e toca, sim, é preciso ouvir o que está amaldiçoado, mas nunca fadado ao desengano...e quem tiver ouvidos, que ouça. UÓT?!| Abril de 2013 13


SINESTESIA

Personagens que marcaram a música brasileira A arte de ver o som: Dicas de documentários de alguns compositores/cantores que, de certa forma, tiveram e ainda têm grande importância na música no Brasil. Por Cecília Santos

MÚSICA PARA ACAMPAMENTO

Aqui a gente tem uma certa tendência para listinhas. Os filmes para assistir em dias de chuva, os livros pra ler antes de morrer, as melhores piadinhas pra não contar no velório... então segue nossa lista do mês para...

As melhores músicas para viajar Por Ana Cláudia lima

Fabricando Tom Zé, de Décio Matos Jr (Brasil, 2006) A partir de uma turnê na Europa como plano de fundo, o filme retrata não só o gênio, mas também o besta Tom Zé. O documentário mostra depoimentos dos membros da trupe tropicalista, Caetano e Gil, que comentam sobre a ausência do cantor baiano entre os membros do movimento nas fotos da década de 70 a 90. Caetano o chama de gênio. É Neusa, esposa de Tom Zé, quem mostra o lado humano do compositor, suas dores, sua dedicação a música, o lado bonito de sua existência.

Loki- Arnaldo Baptista, de Paulo Henrique Fotenelle (Brasil, 2008) Loki- Disco que expressa grandes sentimentos do músico Arnaldo Baptista durante um período conturbado de sua vida, após a primeira desintegração dos “Mutantes” , banda da qual fazia parte, e o fim do casamento com Rita Lee, na época, também integrante dos “Mutantes”. O filme relata, além dessa fase depressiva presente no disco Lóki, outros momentos da vida e sentimentos de Arnaldo, como o seu novo amor e atual esposa, Lucinha Barbosa, sua vida com ela, a paixão pela pintura e a paz encontrada.

* A banda – Nara Leão * Rosa de Hiroshima – Secos e Molhados * Wavez– Tom Jobim * Tempo perdido – Legião Urbana * Você vai ver – João Gilberto * Esconderijo – Ana Cañas * Gente Humilde – Chico Buarque * Sonhos não envelhecem – Clube da esquina * O barquinho - Maysa * Sangrando – Gonzaguinha * Refrão de um bolero – Engenheiros do Hawaii * Aquarela do Brasil – Francisco Alves * As rosas não falam – Cartola * Oceano – Djavan * Foi um rio que passou em minha vida – Paulinho da viola * Saudosa Maloca – Demônios da Garoa * Cálice – Chico Buarque e Milton Nascimento * Como nossos pais – Elis Regina * Bandeira branca – Dalva de Oliveira * Gatinha manhosa – Erasmo Carlos

* Tropicália – Caetano Veloso * País Tropical – Wilson Simonal * Da lama ao caos – Chico Science e Nação Zumbi * Pescador de ilusões – O rappa * O anjo mais velho – O teatro mágico * Ideologia – Cazuza * Um dia, um adeus – Guilherme Arantes * Pra ser sincero – Engenheiros do Hawaii * Ana Júlia – Los Hermanos * Palavras não falam – Mariana Aydar * Amor perfeito – Roberto Carlos * O bêbado e a equilibrista – Elis Regina * Pra Não Dizer Que Não Falei Das Flores – Geraldo Vandré * Garota de Ipanema – Pery Ribeiro * Eu sei que vou te amar – Vinícius de Moraes * Travessia – Milton Nascimento * Trem azul – Lô Borges * Ando meio desligado – Os mutantes * Disparada – Jair Rodrigues * Conversa de Botequim – Noel Rosa

Raul- O Início, O Fim e O Meio, de Walter Carvalho (Brasil, 2012) A questão do filme é: Quem foi Raul? Entrevistas com várias pessoas que de alguma forma conviveram com o ícone do rock brasileiro, família, amigos, conhecidos, tentam definir um certo Raul, não um certo, mas sim muitos e diferentes Rauls. Segundo Paulo Coelho, “Raul é mito” e por isso seria impossível biografá-lo, pois “não se conta a história de mitos”.

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UÓT?!| Abril de 2013 15



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