Jornalismo UFU Ano 9 • 41ª edição Set./Out. de 2018 Distribuição gratuita
comum
senso
Anonimato dos museus da UFU Página 6
Políticas
Vida na Universidade
Esportes
Quilombolas relatam que ações afirmativas ainda são pouco divulgadas
Mudança de cursos para o Campus Glória afeta a rotina dos alunos
UFU reafirma inclusão de pessoas com deficiência no cenário esportivo
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DA REDAÇÃO EDITORIAL//
Diversidade invisível
Em um momento conturbado, marcado por discussões políticas, acentua-se ainda mais a falta de conhecimento e interesse pela cultura e a diversidade. Acontecimentos como o incêndio do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, em setembro, comprovam a negligência por parte não só do governo, como de uma população que apenas demonstra preocupação com a cultura em casos extremos. Uberlândia reflete essa indiferença, já que os estudantes da UFU e, até mesmo, os moradores da cidade mineira, desconhecem os cinco museus da Universidade, como o Museu Universitário de Arte (MUnA), que data de 1975. Há a insuficiência de olhares para a história e também uma carência de espaço na mídia em relação às minorias sociais, uma vez que os direitos são diminuídos. É o caso das comunidades qui-
lombolas, que desconhecem a oportunidade de bolsa-auxílio oferecida pela UFU. Ainda em um espaço de pouca visibilidade, o Campus Glória, por muito tempo isolado dos olhares dos discentes, continua enfrentando alguns problemas, mesmo com a migração de alguns cursos para o local, como a falta de horários dos ônibus intercampi e o funcionamento do Restaurante Universitário improvisado. Na vertente do esporte, o espaço da diversidade é abordado, já que ainda não existe uma competição voltada para pessoas com deficiência, como uma Paralimpíada da UFU. A importância de voltar os enfoques da mídia e da sociedade para esses públicos também deve ser vista como um processo, construído a partir de ações altruístas e de veículos que deem voz a todos. O aplicativo Michelzinho, criado por um
doutorando da UFU para ajudar na comunicação de crianças com autismo, é um exemplo disso. Apresentado no livreto, o aplicativo CookAll também é uma forma tecnológica de dar abertura a questões de interesse dos estudantes, antes sem destaque, como no caso da alimentação saudável. Nesta edição do Senso InComum, o objetivo é refletir sobre o que é pouco discutido, como a importância do conhecimento sobre a história e a cultura do Brasil e o espaço da alteridade na UFU e na comunidade externa. Por fim, o jornal cumpre sua função de informar e esclarecer ao leitor a relevância de tais temas na atualidade e se mostra como uma maneira de combater a negligência social através da comunicação. Veja em: https://sensoincomum.net/
CRÔNICA//
Medalha de Honra RAFAEL GOBI Era um dia dos mais ensolarados que se pode ter na cálida Uberlândia. Passava das três horas da tarde de um domingo e muitas pessoas se aglomeravam na quadra G2 do Campus Educação Física da UFU. Na arquibancada, vozes cantavam hinos de suas atléticas, misturados com gritos de apoio e alegria. De um lado, ficavam as atletas da categoria feminina. A final do peso meio-leve feminino foi entre Camila Franco e Nathália Borges. Embora as duas estivessem na final da competição mais importante de uma das maiores universidade do Brasil, nenhuma delas parecia se importar. As duas riam e conversavam enquanto lutavam. Pareciam não sentir a pressão da torcida ou das atléticas da
Medicina ou da Educa. Estavam apenas se divertindo. “A de faixa vermelha vai ganhar. Ela é a professora da outra”, me disse Juan, um dos repórteres que cobria as finais do Judô para o Projeto Arquibancada UFU, se referindo à Camila Franco. No último golpe da luta, as duas riam uma para outra, quando, sem titubear, em um movimento ágil, Camila agarra o braço direito de Nathália e agacha ao mesmo tempo, usando a força de sua oponente para conquistar um Wazari, que a levou a vitória. Depois de receber o golpe, Nathália se levanta e pergunta, olhando para o juiz e para sua adversária: “Acabou?” Quando recebe a confirmação da derrota, abre um sorriso e abraça Camila. As duas começam a pular de alegria. Sim, a perde-
dora estava pulando de alegria! Duas mulheres que transformaram o tatame da final de um campeonato em seu pequeno quadrado azul de diversão. Camila, ao lado da derrotada Nathália, sorri tão profundamente quanto a aluna, feliz e realizada. Ver uma de suas aprendizes em uma final, se divertindo e lutando bem, é um feito que poucos mestres têm o prazer de realizar. E, ainda, decidir um campeonato com sua atleta é algo que só aqueles que amam e dão a vida pelo esporte conseguem. Quando pensei que elas não se importavam com a luta, e por isso se divertiam tanto, estava inteiramente errado. O maior motivo da alegria e o que mais importava era estar naquele tatame.
JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA (UFU) Reitor Valder Steffen Jr - Diretora da Faced Geovana Ferreira Melo - Coordenador do Curso de Jornalismo Marcelo Marques de Araújo - Professores Responsáveis Gerson de Sousa, Ivanise Andrade, Raquel Timponi - Jornalista Responsável Raquel Timponi (0015003/MG) Revisão Ivanise Andrade - Editoras-Chefe Ana Luiza Vargas e Eduarda Yamaguchi - Editoras de Capa Loise Monteiro e Thais Fernandes - Foto de capa Maria Júlia Araújo - Editores de Sessões Ally Kalout, Clarice Bertoni, Eduardo Simões, Genivan Júnior, Giovanna Cavalcanti, Leandro Fernandes, Luiz Gustavo Ribeiro, Mateus Oliveira, Matheus Minuncio, Roberto Vicente, Valquíria Vieira, Vinícius Passos e Vitória Bertolucci - Repórteres Amanda Marques, Aurélio Barcelos, Beatriz Ortiz, Cecília Almeida, Heitor Gomes, Jhonatan Dias, Maria Júlia Araújo, Mateus Prata, Matheus Maia, Monallysa Leite, Naiara Ashaia, Pedro Henrique de Paula, Rafael Gobi, Sara Camelo e Thiago Crepaldi "Zina" - Fotorreportagem Ana Luíza Vargas e Eduarda Yamaguchi - Livreto Tuila Tachikawa e Valquíria Vieira - Ilustrações Vanessa Gianotti - Finalização Danielle Buiatti Tiragem 2000 exemplares Impressão Imprensa Universitária - Gráfica UFU sensoincomumufu@gmail.com www.sensoincomum.net
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POLÍTICAS
Adesão de quilombolas na UFU ainda é baixa Falta de diálogo entre academia e comunidade é uma das causas da pouca aderência de alunos oriundos de quilombos NAIARA ASHAIA O levantamento das comunidades quilombolas do Brasil, realizado pela Fundação Cultural Palmares em 2017, concluiu que Minas Gerais possuía 328 dos 3051 quilombos brasileiros. Mas devido à estrutura das comunidades e à falta de conhecimento sobre as universidades, o número de quilombolas no ensino superior é pequeno. De acordo com a Pró-Reitoria de Assistência Estudantil (Proae), da UFU, dentre os 84 alunos que participam do Programa Bolsa Permanência (PBP) na Instituição, apenas dois são oriundos de comunidades quilombolas. Um deles é o estudante de Ciência da Computação Túlio Roquete, do Quilombo São Domingos, Paracatu (MG). Influenciado por um primo que cursou Química Industrial na UFU, Roquete passou o ensino médio estudando para o vestibular. Ele relata que a tradição em São Domingos é tão presente que outros primos preferem continuar na comunidade e cursar faculdade pelas proximidades. Roquete participa do PBP, iniciativa do Governo Federal. O objetivo é possibilitar a continuidade de alunos de baixa renda nas universidades, promovendo acesso ao ensino superior. O recurso corresponde a um auxílio de R$400, estabelecido pelo Ministério da Educação. Para indígenas e quilombolas, é garantido pelo menos o dobro desse valor. “Só com esse dinheiro eu já consigo me manter. Pago o aluguel, as contas e a minha alimentação”, declara Roquete. Apesar de receber o benefício, o estudante ressalta que falta divulgação sobre a existência deste. “Antes de vir para a faculdade, ninguém na minha família conhecia a bolsa. Meu primo estudou aqui sem saber que podia solicitar”, destaca. POLÍTICAS PÚBLICAS DE INCLUSÃO Outro problema é a falta de políticas públicas para alunos quilombolas. Roquete acredita que uma forma de promover o conhecimento, tanto sobre os quilombos quanto sobre a universidade, seria manter o aluno ligado à comunidade. “Cobrar trabalhos envolvendo a comunidade é uma forma de expandir o conhecimento sobre nós para outras pessoas”, explica. O estudante de Engenharia Química Paulo Cé-
TÚLIO ROQUETE: APENAS 6% DOS ESTUDANTES DO PBP SÃO ORIUNDOS DE COMUNIDADE QUILOMBOLA . FOTO: GABRIEL CAIXETA
sar da Silva soube da bolsa por uma aluna do curso de Letras da UFU, que pesquisava em seu mestrado sobre os quilombos da região de Varjão de Minas, entre eles a Comunidade Corte. Ao conseguir a certificação como quilombola, a população soube de benefícios como o PBP. Silva relata que recebeu críticas quando recorreu ao auxílio. “Pessoas da minha turma me criticaram, questionando porque nós temos o direito de receber a bolsa agora, se sofremos anos atrás”. Mesmo assim, o estudante acredita que o PBP é importante, por ser uma forma de retratar a dívida histórica do país com a população negra. O diretor da Proae, Noriel Viana Pereira, conta que alunos de baixa renda podem ter acesso às bolsas de assistência estudantil. “Não ocorre grande procura de informações, tampouco o cadastro no site do MEC, uma vez que não é a UFU quem coordena as inscrições”, diz. Pereira informa que foram aprovadas mais quatro bolsas para quilombolas em 2018. Para a professora doutora da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), que coorde-
na o Núcleo de Estudos Afro Brasileiros e Indígenas (Neabi/UENF), Maria Clareth Gonçalves Reis, apenas o PBP não é suficiente. “Permanência não é apenas uma bolsa. É preciso também o apoio afetivo, trabalhar a relação psicológica. A bolsa não vai suprir o racismo que o aluno sofre”. Para ela, uma das dificuldades para a saída da comunidade é o preconceito racial, aliado ao cultural: ser oriundo de um quilombo. A professora se mostra preocupada com a relação estabelecida entre o universo acadêmico e o quilombola. “Muitas comunidades hoje não aceitam mais pesquisadores, pois eles os tratam como objeto. Eles não são objetos de pesquisa, são sujeitos da pesquisa”, argumenta. Para o futuro, Reis afirma que a entrada de quilombolas no ensino superior deve contar com a colaboração dos professores. “Queremos criar esse espaço na universidade. Isso fortalece a ação e a trazer outros jovens. Traz visibilidade para esses sujeitos que nós consideramos tão importantes”, conclui.
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VIDA NA UNIVERSIDADE
UFU lista opções de intercâmbio, após corte de verbas Apesar da extinção do Ciência sem Fronteiras, a UFU conta com outras oportunidades de auxílio estudantil HEITOR GOMES O intercâmbio é uma das experiências mais enriquecedoras disponibilizadas aos discentes que buscam crescimento acadêmico, pessoal e profissional em outras instituições. Contudo, com os cortes de verbas no ensino e o fim de bolsas, os estudantes passaram a buscar novas possibilidades. Com a extinção do Ciência sem Fronteiras (CsF) em 2015, a secretária executiva da Diretoria de Relações Internacionais e Interinstitucionais (DRII), Daline Mendonça, afirma que a média de enviados para intercâmbio caiu pela metade. Isso afetou os convênios com países parceiros, embora Mendonça afirme que a diretoria continua captando novos recursos. O fim do programa impactou ainda os estudantes que já haviam começado os estudos fora do país, com atrasos na entrega das bolsas do governo. Entretanto, esse não foi o caso de Igor Iasco, que cursa Engenharia e realizou intercâmbio nos Estados Unidos, pelo edital de 2014. “Eu recebia a bolsa a cada três meses: uma ainda no Brasil e as
demais já nos Estados Unidos. As de lá atrasaram, mas a daqui veio na data certa”, lembra. Apesar da extinção do CsF, há outras oportunidades dentro e fora da UFU. São exemplos os auxílios da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (Proae), as bolsas do programa Santander Universidades e a Association Internationale des Étudiants en Sciences Economiques et Commerciales (Aiesec), que não exige vínculo com a UFU. A ALTERNATIVA NACIONAL Outra forma de acesso é a mobilidade nacional, também ofertada nos editais anuais da DRII. O programa conta com financiamento do Banco Santander em parceria com a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e tem duração de um semestre letivo. Em 2016, a estudante de Relações Internacionais Taynara Dias passou um período na Universidade de Brasília (UnB) com o auxílio. “Convivi com
profissionais e tive matérias interessantes, como Proteção Internacional dos Direitos Humanos”, finaliza, comprovando o benefício da experiência.
DALINE MENDONÇA: DRII CAPTA NOVOS RECURSOS PARA CONVÊNIOS . FOTO: RODOLFO GARCIA
Ensino de línguas gratuito é uma realidade na UFU O programa IsF atende a demanda dos estudantes, professores e técnicos administrativos da universidade MATHEUS MAIA Aprender idiomas com uma metodologia de participação ativa em línguas estrangeiras é uma realidade concreta na UFU. Gratuito e voltado para o âmbito acadêmico, o curso existe desde 2014 e faz parte do Programa Idioma sem Fronteiras (IsF). Criado em 2010, pelo Ministério da Educação (MEC), o IsF possui uma ferramenta de diagnóstico da proficiência do idioma inglês. O professor de inglês no IsF, Lucas Martins, afirma que fazer parte do programa era um sonho almejado desde o primeiro período de graduação em Letras. “Estar em sala de aula é um grande privilégio, já que, ao mesmo tempo em que ensino esse é, há também um espaço de
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aprendizado”, destaca. Martins explica que a troca constante que há entre os professores é um aspecto interessante do programa. OPORTUNIDADE E ADESÃO A graduanda em Teatro e aluna do IsF, Margareth Louise Lamounier, lembra que o curso favoreceu a criação de laços, além do conhecimento sobre a língua inglesa. A aluna afirma que foi uma porta de entrada para novas relações, pois permitiu pluralidades que não estão presentes nos cursos de graduação. A discente avalia que tanto a metodologia quanto os professores tornam o ambiente em sala mais atrativo. Porém, se diz preocupada com a
baixa adesão por parte dos alunos. Assim como Martins, Lamounier também vê a necessidade de uma maior aproximação entre as coordenações dos cursos da UFU e o programa, para que mais universitários saibam da existência do IsF. O coordenador do IsF UFU, Ivan Marcos Ribeiro, avalia: “Estar presente em todos os processos deste programa é uma satisfação, pois o IsF, além de proporcionar a formação e capacitação de professores de Linguística, é uma ferramenta de internacionalização para a universidade”. Ribeiro ainda ressalta a importância de lidar com as diferenças e propiciar maior apreciação e conhecimento sobre as culturas estrangeiras.
VIDA NA UNIVERSIDADE
Aos poucos, Campus Glória é ocupado Faculdade de Medicina Veterinária e Instituto de Ciências Agrárias de Uberlândia migraram para o local CECÍLIA ALMEIDA
O CAMPUS GLÓRIA, COM ÁREA DE 2.937.044,00M², ABRIGARÁ DISCIPLINAS DE TRÊS CURSOS EM 2019 . FOTO: SARA CAMELO
Com uma história de ocupação, assentamento, disputa judicial e doação de terreno para o estado, o Campus Glória da UFU, em Uberlândia, permanece um lugar tranquilo. Ele agora se prepara para abrigar, a partir do segundo semestre de 2019, disciplinas de mais três cursos: Engenharias: Mecânica, Mecatrônica e Aeronáutica. Nesse segundo semestre de 2018, houve um aumento do número de discentes e 1380 alunos passaram a frequentar o local. Ajudam a compor o espaço um restaurante universitário (RU) que funciona ainda provisoriamente, uma biblioteca setorial e informativos colados nos murais, indicando os horários do ônibus Intercampi. Porém, mesmo com a chegada dos estudantes, ainda continua vazio. A biblioteca é o principal exemplo da tranquilidade no campus. Ela possui armários para os discentes guardarem seus materiais e 50% do acervo dos cursos, mas poucas pessoas frequentam o local durante a maior parte do dia. Um food truck fixo funciona como lanchonete, não existem locais para xerox, nem serviços mé-
dicos. O Glória não tem atividades à noite e o último intercampi sai às 17h50. Em um dos blocos acontecem as aulas e no outro fica a parte administrativa da Faculdade de Medicina Veterinária e do Instituto de Ciências Agrárias. Ainda assim sobram salas livres. Há quem veja vantagens em estudar no local, como a discente de Veterinária Isadora Otoni, que prefere a tranquilidade do Glória ao movimento do Umuarama. “Os outros campi estão muito cheios. No semestre passado eu fui procurar uma sala para estudar e não encontrei”, conta. Segundo o representante da Prefeitura Universitária no Glória, Janderson Cristian, a mudança para as novas instalações é justificada pela falta de espaço físico dos outros campi. INFRAESTRUTURA Alguns discentes são indiferentes à mudança. É o caso da estudante de Zootecnia Amanda Fonseca. “Não há vantagens, nem desvantagens. É normal”, pondera. Outros não gostaram, como a aluna de Zootecnia Bruna Silvestre. Para ela, a
falta de serviços no campus é um problema e o isolamento gera preocupações sobre a segurança. O vigilante José Santos, contudo, afirma que, desde o início do funcionamento, não foi registrada nenhuma ameaça às pessoas que trabalham ou estudam no local. A distância e os horários do intercampi são as principais reclamações relatadas pelos alunos. O trajeto dura, em média, 30 minutos do Umuarama ao Glória e possui cinco horários para a ida e seis para a volta, sendo que alguns dias da semana apresentam menos horários disponíveis para transporte. Porém, os discentes alegam não ser suficiente. Bruna Silvestre mudou-se de Ribeirão Preto (SP) para estudar e a distância a incomoda. “Já aconteceu de eu perder o intercampi e não conseguir assistir a aula da manhã. Deveriam colocar mais horários”, reclama. O diretor de logística da Prefeitura Universitária da UFU, Flávio Martins, explica que o número de horários do intercampi já aumentou para esse semestre e que foi feita uma parceria com a Prefeitura Municipal para ônibus saírem do Terminal Santa Luzia em direção ao Glória. O RU provisório está instalado em quatro salas de aulas. Apesar de servir refeições, o espaço foi minimamente alterado, sendo possível almoçar com uma vista para o quadro negro. A maior modificação realizada foi a abertura de portas que ligam os cômodos. Uma funcionária lava as louças manualmente em uma das salas improvisadas. Porém, mesmo ao meio dia, não há filas. Segundo o nutricionista do RU, Adolfo Cosentino, ainda não há previsões concretas para a construção de um novo espaço. O Plano Diretor, que orienta a edificação do Campus Glória, foi aprovado em 2011, mas nunca foi revisto. A arquiteta da divisão de projetos da Diretoria de Infraestrutura da UFU, Flávia Fernandes, explica que deveria haver uma comissão para revisar o Plano a cada dois anos, mas isso ainda não ocorreu, porque o local ainda não havia sido ocupado. Segundo ela, não há planos para novas estruturas. Somente projetos para acomodação dos alunos, como a criação de laboratórios.
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ESPECIAL
Comunidade UFU ignora seus museus Incêndio no Museu Nacional despertou atenção para novas vistorias em Uberlândia MARIA JÚLIA ARAÚJO O incêndio do Museu Nacional do Rio de Janeiro, sob a responsabilidade do setor de cultura da UFRJ Universidade Federal do Rio Janeiro (UFRJ), ocorrido no mês de setembro, tornou visível a situação de abandono dos museus brasileiros. Na UFU, os museus que não eram vistoriados há, no mínimo, dois anos passaram por avaliação do Corpo de Bombeiros em setembro. Ainda assim, continuam pouco visitados.
Enquete realizada pela reportagem do Senso Incomum com 100 estudantes do campus Santa Mônica revelou que 72% dos entrevistados nunca visitaram os museus da própria instituição. Outros 23% disseram sequer saber da existência deles. Outros três alunos informaram que, mesmo sem terem ido a um museu da UFU, já visitaram outros em cidades européias. A Universidade conta com cinco
instalações situadas em diferentes pontos da cidade de Uberlândia. São essas: o Museu de Biodiversidade do Cerrado (MBC), Museu DICA - Diversão com Ciência e Arte, Museu de Minerais e Rochas (MMR), Museu do Índio (Musíndio) e o Museu Universitário de Arte (MUnA). SEGURANÇA Em Uberlândia, 11 museus foram checados. Dentre eles, apenas dois
VAZIO DO MUSEU DE MINERAIS E ROCHAS DEMONSTRA A FALTA DE INTERESSE DO PÚBLICO CONFORME ENQUETE . FOTO: MARINA BARQUETE
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contavam com um projeto de segurança, nenhum pertencente à UFU. Funcionários dos Museus da Universidade afirmam que nos últimos dois anos os estabelecimentos não haviam sido vistoriados. Isso mudou somente em setembro de 2018, após o ocorrido no Museu Nacional do Rio de Janeiro, quando o Comando Geral do Corpo de Bombeiros de Minas determinou a vistoria dos estabelecimentos. O diretor de Cultura da UFU, Alexandre Molina, explica que, nos últimos dois anos, a diretoria não teve conhecimento sobre um acontecimento semelhante. Mas enfatizou que, dos cinco espaços existentes, o único que está sobre responsabilidade da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura é o Museu do Índio. Os outros são vinculados a unidades acadêmicas específicas. A coordenadora do Museu do Índio, Lidia Meirelles, afirma que nos últimos cinco anos essa foi a única vez em que o espaço passou por esse processo. “Primeiro eles chegaram sem avisar, fizeram um laudo e um boletim de ocorrência. Dias depois, vieram outros dois bombeiros que nos alertaram sobre problemas com os extintores de incêndio e a iluminação de sinalização. Estamos providenciando a regularização”, relata. No Museu da Biodiversidade do Cerrado, a técnica em educação ambiental e uma das responsáveis pelo estabelecimento, Dóris Vasconcelos, não se recorda de nenhuma vistoria
ESPECIAL
MUSEU, VINCULADO AO INSTITUTO DE GEOGRAFIA, CONTÉM 750 AMOSTRAS EM SEU ACERVO EXPOSITIVO. FOTO: MARINA BARQUETE
anterior a essa última. Assim como no Museu do Índio, o espaço foi notificado devido à má condição dos equipamentos de incêndio. As demandas estão sendo analisadas para que sejam solucionadas, mas a falta de verbas é um obstáculo. “Infelizmente, os recursos para a Cultura são escassos. Mesmo que quase todas as universidades públicas do Brasil estejam vinculadas a espaços culturais, nós não temos, no âmbito do Ministério da Educação, uma rubrica específica destinada a esses tipos de ações”, destaca Alexandre Molina. O diretor de Cultura informa ainda que o Corpo de Bombeiros tem sido solícito e está oferecendo, em parceria com a universidade, um treinamento para os servidores. O objetivo é orientá-los a reagir em caso de acidentes, como o que ocorreu no Museu Nacional do Rio de Janeiro, e evitar que tragédias semelhantes se repitam. OS ESTUDANTES E OS MUSEUS Um dos questionamentos recorrentes após a tragédia no Museu
Nacional foi quanto à visitação do local. Em 2017, um número maior de brasileiros foi ao Museu do Louvre, na França, do que ao da UFRJ, de acordo com reportagem da BBC Brasil. Em Uberlândia, os estudantes da UFU também não possuem o hábito de irem aos museus da própria universidade, como aponta a enquete feita pelo jornal. Os principais motivos evidenciados pelos alunos para não frequentarem os museus da instituição são a falta de informação sobre a localização, escassez de divulgação e, até mesmo, falta de interesse. Molina esclarece não poder afirmar que falta divulgação. “Desconfio um pouco dessa questão. Os Museus fazem comunicação direta com as comunidades através das redes sociais e a replicações e visualizações são significativas”, informa. Ele ressalta que existem setores com interesses específicos nos espaços, como o Instituto de Biologia no MBC e o de Artes no MUnA. Motivada pela constatação de que os alunos não visitam os museus, a Diretoria de Cultura está
realizando uma pesquisa sobre a situação. “A pesquisa ocorreu porque percebemos que há uma demanda maior dos serviços prestados nestes espaços por parte da comunidade externa do que da universitária”, aponta Molina. O funcionário do Museu do Índio e um dos guias do espaço Francisco Roque reforça que o maior público é a comunidade externa à UFU, principalmente vinda de escolas municipais e estaduais. Os alunos da universidade raramente vão ao estabelecimento e, quando isso ocorre, é através da condução de um professor. A secretária do MUnA, Jaqueline Batista, informa que, assim como no Museu do Índio, o público maior é a população externa e que a presença da comunidade universitária é rara. A estudante de Enfermagem da UFU Bruna Duarte visitou o Museu do Índio em outubro, monitorando pacientes do Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD). Ela conta que a ideia foi proporcionar vivências como forma de reinserção social. “Eles saem daqui se sentindo como parte da socieda-
de. Acho que todos os pacientes de diferentes âmbitos de saúde mental deveriam ter a oportunidade de visitar o espaço”, ressalta Duarte. Quando questionada sobre a experiência pessoal no museu, ela afirma ter gostado da exposição e não ter críticas ao estabelecimento. “Achei interessante: O museu tem peças diferentes e de variados povos indígenas. Gostei da forma como a visita é guiada. Primeiro eles explicam a história e depois nos dão espaço para perguntar e entender melhor”, elogia. Com o objetivo de aproximar a comunidade universitária dos espaços culturais, a Diretoria de Cultura da UFU está desenvolvendo um aplicativo que contribuirá na divulgação das exposições e programação dos espaços. O intuito também é notificar quando houver novidades e informar sobre horários e localizações. Ainda não há previsão de lançamento. O Corpo de Bombeiros foi procurado pela reportagem para falar sobre as vistorias, mas não se pronunciou. Para saber mais sobre os museus acesse o site do Senso.
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CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Aplicativo auxilia no tratamento de autistas O APP “Michelzinho”, desenvolvido por um doutorando da UFU, é uma homenagem ao melhor amigo do criador do produto e tem como intuito ajudar crianças autistas a superar a dificuldade de se expressar PEDRO HENRIQUE DE PAULA “Oi, quem é?” questiona Heitor Rodrigues, cinco anos, ao abrir o portão de uma vez para receber uma visita inesperada. Com a expressão dura e aspecto acuado, o garoto, antes que escute qualquer coisa, diz: “minha mãe já vem” e corre para dentro da casa sem olhar para trás. A postura travada, a aparência séria e as frases monossilábicas do garoto explicitam os motivos que incentivaram o cientista da computação Adilmar Coelho a criar um aplicativo que auxilia os autistas a se expressarem. Realizar e reconhecer expressões de forma natural são dificuldades diárias para crianças com autismo. É perceptível que Heitor lida com esses problemas no cotidiano, mas o menino demonstra não se importar com tal situação. O aplicativo pretende exercitar, por meio de um jogo, as expressões das pessoas que possuem o espectro autista. O responsável pelo desenvolvimento do aplicativo de nome “Michelzinho - Emoções e Autismo” explica como o produto colabora com o tratamento do transtorno. “A ideia de criar o aplicativo voltado para esse tipo de público surgiu ainda durante o mestrado, quando eu já trabalhava com esse contexto imagético e de processamento de emoções”, conta o doutorando, ao relembrar o processo de criação do software. “Foi no meu doutorado, porém, que tive o conhecimento das dificuldades que esse público possui para reconhecer e reproduzir expressões faciais de forma natural, o que acaba atrapalhando na convivência do dia a dia”, aponta o cientista da computação. A criança que recebeu o estranho no portão, de maneira rígida e seca, quando apresentada ao aplicativo, as poucos se mostra receptiva à proposta de realizar o primeiro contato com o produto. “O Heitor é ligado em tecnologia, não é, meu filho?”, diz Tereza Cristina, mãe do Heitor, que recebeu o diagnóstico da criança após perceber que seu filho tinha resistência em interagir com os colegas. Entre risadas e expressões da criança, Tereza Cristina explica peculiaridades sobre a rotina do filho. Segundo ela, Heitor convive com um time
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HEITOR ESTÁ FAMILIARIZADO COM O APP: PRÁTICA DE NOVAS EXPRESSÕES FACIAIS MELHORA SUA INTERAÇÃO COM AS PESSOAS . FOTO: AMANDA MARQUES
de especialistas que o auxilia em seu tratamento e conta com o apoio de uma especialista em Psicomotricidade e Psicopedagogia, Amanda Rodrigues. Referência no campo em Uberlândia, a psicóloga concorda quanto ao êxito na associação de tecnologias e o tratamento do autismo. “Hoje em dia não podemos deixar de pensar em usar a tecnologia no cotidiano do ser humano. Com as pessoas que estão dentro do espectro autista não é diferente”, ressalta Rodrigues. Se depender dos planos de Adilmar Coelho para o futuro, a comunidade autista estará amparada e o Heitor e outras crianças de sua idade terão muitos jogos para descobrir pela frente. De acordo com o doutorando, a próxima iniciativa é dar espaço para aplicativos que trabalham outras características do autismo. Vinculados ao Michelzinho, os programas serão disponibilizados em todas as plataformas digitais para download. “Minha ideia é interligar o Michelzinho a aplicativos que estão em processo de produção e permi-
tir que pais e profissionais utilizem essas ferramentas, tanto no cotidiano quanto nos consultórios”, revela o desenvolvedor da aplicação. Atualmente, o “Michelzinho - Emoções e Autismo” está disponível para download somente no sistema operacional Android, no Google Play, e pode ser adquirido de forma gratuita. SOBRE O AUTISMO O Transtorno do Espectro Autista (TEA), popularmente conhecido como Autismo, é uma síndrome diagnosticada nos primeiros anos de vida e que afeta as habilidades de aprendizagem e comunicação do indivíduo. O distúrbio é dividido em três níveis que se diferem em sua gravidade, sendo os graus leve, moderado e severo. Com o tratamento adequado, autistas que apresentam grau leve - como o Heitor - podem desenvolver uma vida comum e praticar as mesmas atividades que indivíduos desprovidos da síndrome.
SAÚDE
Grupos terapêuticos na UFU são alternativas no tratamento psicológico Pesquisa da Andifes indica que 30% dos graduandos brasileiros em instituições federais já buscaram atendimento MONALLYSA LEITE E JHONATAN GONZAGA Em setembro deste ano, a Divisão de Saúde (Disau) da UFU passou a organizar grupos terapêuticos em favor da saúde emocional dos estudantes. As novas vivências dos universitários impactam diretamente na saúde mental. A rotina de estudos e preocupações pode gerar infelicidade, depressão, perda de autoconfiança ou insônia. Com isso, os grupos apresentam-se como um espaço de escuta, fala e acolhimento, potencializando as trocas dialógicas e o compartilhamento dessas experiências. Pesquisa da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais do Ensino Superior (Andifes), realizada em 2016, revelou que 30% dos estudantes de graduação em instituições federais no Brasil já procuraram algum tipo de atendimento psicológico. A estudante do curso de Letras Beatriz*, de 21 anos, conta que já teve depressão e recorreu ao acompanhamento psicológico que a Disau disponibiliza para os estudantes. Apesar de afirmar que a psicóloga foi receptiva, a estudante considera esse tipo de atendimento pouco efetivo. “Só se for para um caso de emergência, pois são oferecidas somente três sessões gratuitas para avaliação”. Logo depois, o paciente é encaminhado para um outro psicólogo pago, explica a estudante, argumentando que os alunos sem condições financeiras acabam desistindo. Para ela, são necessárias alternativas para atender esta demanda da universidade. No caso do estudante do curso de Medicina Veterinária Henrique*, de 17 anos, o auxílio foi encontrado nos grupos terapêuticos. “É um lugar para o desabafo, em que sabemos que as outras pessoas vão ouvir e ajudar”, comenta. Ele explica também a razão e quando resolveu procurar apoio. “Estou no primeiro período e são muitas coisas que estou vivenciando, como morar sozinho. O principal motivo da ajuda é a nova vida que estou levando. Às vezes, é difícil lidar com isso”, reflete. A psicóloga Michele Falco, da Disau, que presta atendimento a esses grupos, reitera que a ação
ALUNOS PARTICIPAM DE TERAPIAS COMO O REIKI: NOVAS VIVÊNCIAS IMPACTAM NA SAÚDE MENTAL . FOTO: RAFAEL GOBI
está sempre aberta a novos participantes e que todos podem se expressar a qualquer momento de forma espontânea. “Não são encontros fechados ou estruturados individualmente. Eles são discutidos e construídos coletivamente”, explica. Quando perguntada sobre a repercussão deste trabalho, a psicóloga pondera que, devido ao início recente dos encontros e à baixa adesão até então, não foi possível avaliar ainda os resultados. “Estamos fortalecendo a divulgação dos grupos junto à comunidade universitária objetivando uma maior aceitação”, finaliza.
às 10h30, e às quartas e quintas-feiras, das 13h às 15h30, com atendimento realizado na Disau, na sala 125 do bloco 3E, campus Santa Mônica. A Divisão de Saúde disponibiliza o telefone 3230-9558 ou e-mail disau@proae.ufu.br para eventuais dúvidas e informações sobre o serviço.
INFORMAÇÕES SOBRE O SERVIÇO Foram criados dois grupos terapêuticos, com dias e horários diferentes, e sempre mediados por duas psicólogas. O grupo 1 ocorre todas as sextasfeiras, no campus Umuarama, sala 8C 107, das 14h às 15h30. Já o grupo 2 acontece às quintas-feiras, no campus Santa Mônica, sala 3D 106, das 9h às 10h30. O atendimento da orientação psicológica está disponível às terças e quartas-feiras, das 7h30
Reiki na UFU - Projeto de terapia por harmonização dos chakras corporais. Encontros às quartas-feiras, às 16h, no bloco 8C do Campus Umuarama. Yoga no Santa Aulas de Yoga com encontros às segundas ou às quintas-feiras. As matrículas podem ser feitas pela página do projeto no Facebook.
* Nomes fictícios para preservar a identidade dos entrevistados
GRUPOS DE APOIO
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CULTURA
Exposição celebra memórias de João Quituba A Uberlândia do século XX é relembrada por meio das fotografias do comerciante SARA CAMELO Balconista, colecionador e amante da fotografia. João Quituba tinha estilo. “Ele amava aquela gravata borboleta”, diz o curador Velso Carlos, ao lembrar do amigo. Mas o que Sr. João amava mesmo era a sua querida Uberlândia. O amor era tanto que deixou o legado de mais de 2,5 mil fotografias da cidade, produzidas entre as décadas de 20 e 80, que estão presentes até dezembro na exposição “Pelas Lentes da Memória”, no Centro de Documentação e Pesquisa em História (CDHIS) da UFU. A fascinação no rosto de quem aprecia a exposição é evidente. É o caso da aposentada Edisonina Cavalcanti, que reconheceu um velho amigo de seu pai entre as fotos de Quituba, e ainda se emocionou ao ver a avenida onde morou quando criança. “Hoje em dia as nossas emoções, os momentos que vivemos, as pessoas que cruzam nosso caminho são esquecidas facilmente”, reflete Cavalcanti, que conta ter muitas fotos impressas por gostar de segurar as lembranças
na mão. História semelhante é a de Velso Carlos. Em 1987, largou a carreira de economista para se dedicar ao emprego no CDHIS, onde teve a chance de conhecer Quituba. Lá, ele passa seus dias desfrutando das histórias de Uberlândia, e lembra a primeira vez que chegou na cidade. “A antiga rodoviária tinha charretes, as ruas eram estreitas e as casas sem garagem”, recorda. Para os alunos da rede pública que visitam o museu, o sentimento é de entusiasmo. A guia da exposição, Aline Guerra, explica que as associações feitas pelas crianças por meio das imagens fazem com que elas conheçam a cultura e os costumes de uma época passada. Mas o olhar de quem está no presente é o da mudança do espaço da cidade mineira. “Quem ia imaginar, na década de 40, que hoje Uberlândia teria seis terminais?”, questiona a graduanda em História Maria Gabriela Olivério. Ainda para a estudante, a memória é diferente
para cada pessoa. Para Quituba, poderiam ser as tardes em que passou fotografando Uberlândia. O cheiro da casa que morou quando criança seria a de Cavalcanti. Para Carlos, a primeira vez que caminhou pela praça Clarimundo em 1964. E para Olivério, na atualidade, a memória é uma forma de reconhecimento e ressignificação do presente por meio das fotografias do passado.
FOTOGRAFIAS FORAM PRODUZIDAS ENTRE AS DÉCADAS DE 20 E 80 . FOTO: CECÍLIA ALMEIDA
Realidades brasileiras pelo olhar da câmera Filmes etnográficos propõem novas perspectivas a questões contemporâneas BEATRIZ ORTIZ Quem nunca sonhou em produzir um filme? A emoção de escrever roteiros, registrar histórias e produzir cenas já parece uma realidade distante. Mas, imagine agora produzir um filme que registre outras realidades e outras formas de conceber essas realidades. Nada disso é impossível: vêm ganhando espaço, no Brasil, o cinema documental e os filmes etnográficos. Um exemplo é a produção “Meu Corpo É Político”. Nascido com o apoio do Fundo Setorial de Audiovisual (FSA), o documentário acompanha a luta política dos transsexuais através do cotidiano de quatro militantes LGBT, moradores da periferia de São Paulo. A produção foi concretizada pela produtora Alice Riff, que atribui importância aos novos olhares às realidades brasileiras. “É essencial en-
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tendermos que existem produções no Brasil com o desejo de pensar cinema, linguagem e o próprio país em narrativas que fujam do tradicional, que queiram experimentar outros cinemas”, afirma. Em 2018, “Meu Corpo É Político” fez parte da programação do forumdoc.mg, um fórum de Antropologia e Cinema que, todos os anos, sai de Belo Horizonte e caminha por várias cidades mineiras, exibindo filmes selecionados. Há três anos o evento é organizado na cidade de Uberlândia pela professora Valéria Martins, do Instituto de Ciências Sociais (Incis) da UFU. Para a docente, os filmes etnográficos mostram questões sociais prementes, que precisam de reflexão, discussão e ação. “Para que não atuemos de forma preconceituosa e limitada, é pre-
ciso conhecer outros mundos além dos nossos. E a Antropologia contribui para isso. Ela multiplica os mundos”, esclarece. Enquanto isso, os estudantes aproveitam a oportunidade. O aluno de Jornalismo da UFU Guilherme Amaral se impressionou com o fórum. “Consumir esse tipo de material é uma experiência e tanto. Conhecer um novo tipo de produção, tem um apelo cultural e social maior. É admirável”, conclui. Àqueles que ousam aventurar-se pela cinematografia, basta manter-se atentos aos editais do Ministério da Cultura (MinC), da Agência Nacional de Cinema (Ancine) e de outros órgãos federais voltados à promoção do audiovisual. E você, quando vai começar a gravar o próprio filme?
ESPORTES
Pessoas com deficiência encontram inclusão social no esporte Universidade conta com programa que auxilia e promove atividades esportivas voltadas a paratletas AURÉLIO BARCELOS E THIAGO CREPALDI “ZINA” pessoas. “Já são sete anos praticando o golbol. O esporte me deu uma família, devolveu minha liberdade, minha independência e me permitiu sonhar novamente”, comemora a paratleta. O coordenador do Núcleo de Paradesporto da Fundação Uberlandense do Turismo, Esporte e Lazer (Futel), Hudson Pamplona, destaca a importância do reconhecimento das modalidades paralímpicas. “A visibilidade das modalidades do paradesporto é fundamental, para que as pessoas com deficiência iniciem a prática cada vez mais cedo e reconheçam a possibilidade de inclusão social e melhoria da qualidade de vida”, aponta.
GISELI FERREIRA, CAMPEÃ BRASILEIRA: PRÁTICA DE GOLBOL PARA SUPERAR DEPRESSÃO FOTO: THIAGO CREPALDI "ZINA"
O último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2010, apontou que, aproximadamente, 24% da população brasileira possui algum tipo de deficiência. Nesse contexto, o envolvimento em atividades desportivas e recreativas tem sido um importante aliado à promoção da qualidade de vida, à reabilitação, à integração social, ao bem-estar físico e mental. O responsável técnico da modalidade golbol do Programa de Atividades Físicas para Pessoas com Deficiência (PAPD) da UFU, Fernando Dias, explica que o esporte proporciona muitos benefícios para as múltiplas deficiências. “A prática promove momentos de interação social com outras pessoas e as tiram da rotina. Além disso, eles mostram para a sociedade a sua existência”. Atleta que participa do programa, Giseli Ferreira conta que na adolescência já tinha aptidão pelas aulas de Educação Física da escola. Contudo, aos poucos foi perdendo a visão e, gradativa-
mente, se afastou das quadras. Em 2011, a paratleta entrou em depressão por conta da cegueira e tentou por várias vezes tirar a própria vida. “Foi uma fase muito difícil para mim, era um sentimento horrível. Eu vivia à base de remédios”, relembra. Nesta época, a convite de uma amiga, ela conheceu o golbol, criado exclusivamente para atletas cegos. A psicóloga clínica Vivian Varaldo destaca que a prática de esporte é uma fonte de cura emocional. “Quando a deficiência é adquirida, a pessoa entra num processo de luto. Nesse momento, a atividade física pode ajudar na superação como fonte de cura interna”. Na prática do golbol, Ferreira revela que passou por esse processo de recuperação. “Aos poucos consegui sair da depressão e fui tomando gosto pela modalidade”. A terapeuta ainda esclarece que o ambiente do esporte permite a socialização e o autoconhecimento por meio da troca de experiências com as outras
A PARALIMPÍADA UFU Nos últimos anos, principalmente após os Jogos Paralímpicos de Pequim, o paradesporto ganhou força em Uberlândia (MG). Em 2016, a cidade conseguiu levar sete atletas para os Jogos Paralímpicos do Rio de Janeiro, conquistando quatro medalhas: duas de prata e duas de bronze. Porém, a UFU vive uma realidade diferente. Segundo o coordenador da Divisão de Esporte e Lazer Universitário (Diesu), Adilson de Souza, a universidade não apresenta um número considerável de paratletas para promover um campeonato exclusivo da categoria. A medalhista de bronze dos Jogos Panamericanos de Toronto de 2015, Daniele Martins, estudante de Gestão da Informação na UFU, acredita que a responsabilidade de trazer o paradesporto para campeonatos internos é de todos. “Não adianta cruzar os braços e reclamar da Diesu. Tudo começa com um movimento estudantil. A partir disso, conseguiremos mexer nas estruturas visando o apoio necessário para nós”, afirma. Souza, mesmo reconhecendo a falta de diálogo entre a divisão e o paradesporto, não descarta a possibilidade de uma Paralimpíada na UFU ou a inserção de modalidades paralímpicas na competição. Porém, complementa que depende de uma maior mobilização dos paratletas.
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DIVERSIDADE
Resistência em nós ANA LUÍZA VARGAS E EDUARDA YAMAGUCHI Expressar a criatividade por meio da arte é uma forma de resistência. As artesãs Ligia Fonseca e Sofia Klinke, com a criação da marca “Arte em Nó”, ocuparam um espaço no bloco 5O do Campus Santa Mônica da UFU para expor seus artesanatos e demonstrar a importância de manifestações culturais na Universidade. A dupla conta com vendas também no meio digital, para investir na diversidade do seu público. Como ex-estudante do curso de Ciências Sociais da UFU, Klinke trouxe a namorada, que já viajava com seus produtos em macramê, para o ambiente acadêmico. Ativa nas manifestações estudantis, Fonseca, mesmo sem vínculo com a UFU, participou de movimentos, como a ocupação do antigo Restaurante Universitário. Essa resistência se vê presente mesmo no bloco em que trabalham, através de olhares preconceituosos de algumas pessoas que transitam no ambiente. Elas acreditam que a luta pelo trabalho como artesãs deve acontecer diariamente. FOTOS: ANA LUIZA VARGAS / EDUARDA YAMAGUCHI
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