Real Gazeta do Alto Minho | N.º 29

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REAL GAZETA DO ALTO MINHO EDIÇÃO DO CENTRO DE ESTUDOS ADRIANO XAVIER CORDEIRO | N.º 29

DIRECTOR J O S É A N Í B A L MARINHO GOMES REDACTOR PORFÍRIO SILVA

ENTREVISTA À DRA. ILDA ARAÚJO NOVO

SETEMBRO 2021

PÁG. 36

‘… como Chefe de Estado, o Rei seria sempre - em princípio independente e supra partidário. Essa isenção e distanciamento traria inegáveis vantagens para preservar os princípios básicos que devem ser inerentes a um regime democrático…’


CONTEÚDO PÁG. 09 - O MUNICIPALISMO E AS ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS PÁG. 13 - O ESCRITOR AÇORIANO VALDEMAR MOTA MORRE AOS 88 ANOS PÁG. 16 - A DINAMARCA MONARQUIA ANTIGA, EXEMPLO DE MODERNIDADE PÁG. 28 - MONARQUIA E MUNICÍPIOS PÁG. 36 - ENTREVISTA À EXMA. SENHORA DRA. ILDA ARAÚJO NOVO PÁG. 40 - S. BARTOLOMEU DOS MÁRTIRES A DOUTOR DA IGREJA! PÁG. 44 - ZÉ MARIA, UMA PERSONAGEM INESQUECÍVEL PÁG. 52 - OS VINHOS DE VIANA E O VINHO DO PORTO UMA PROPOSTA DE INTERPRETAÇÃO PÁG. 59 - TENDÊNCIAS GLOBAIS NA GESTÃO DE PESSOAS DEPOIS DA PANDEMIA PÁG. 66 - A PRIMEIRA VISITA DE D. PEDRO A VÍTOR HUGO PÁG. 68 - RECORDANDO O DR. JOSÉ MARIA DE LACERDA E MEGRE PÁG. 70 - NA POLÍTICA, MUDAMSE OS TEMPOS, MANTÊM-SE AS ATITUDES A PROPÓSITO DA OBRA A QUEDA DE UM ANJO, DE CAMILO

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REAL GAZETA DO ALTO MINHO

EDITORIAL J O S É A N Í B A L M A R I N H O G O M E S Em defesa do Alto Minho. À atenção dos concelhos de Caminha, Vila Nova de Cerveira, Viana do Castelo, Ponte de Lima e Paredes de Coura.

Dois dias após as eleições autárquicas, e numa altura em que a Serra de Arga, que abrange uma área de 10 mil hectares nos concelhos de Caminha, Vila Nova de Cerveira, Viana do Castelo e Ponte de Lima, dos quais 4.280 estão classificados como Sítio de Importância Comunitária e encontram-se, actualmente em fase de classificação como Área de Paisagem Protegida de Interesse Regional , eis que a Direção Geral de Energia e Geologia (DGEG) colocou em Consulta Pública o Relatório de Avaliação Ambiental Preliminar do Programa de Prospeção e Pesquisa de Lítio (PPP Lítio), que se encontra disponível entre os dias 28 de Setembro e 10 de Novembro do presente ano. Pena é que o início da consulta não tivesse acontecido antes das eleições autárquicas, possibilitando a sua discussão entre as diversas candidaturas, durante o período da campanha eleitoral. Compete às populações pronunciarem-se negativamente, recusando liminarmente a exploração de lítio na Serra de Arga e também em Paredes de Coura. De igual modo, os autarcas podem e devem proceder a alterações dos PDM municipais, inviabilizando desta forma a exploração do lítio nos seus concelhos. A exploração de lítio é por norma realizada a céu aberto, logo, apresenta graves riscos para o ambiente e para os ecossistemas. Contribui para a destruição da paisagem natural, com impactos directos na memória coletiva das populações. Leva à destruição dos ecossistemas e dos valores naturais, quer através da destruição directa de habitats, quer através do procedimento/processos de extracção, tratamento e transporte do minério. Liberta grandes quantidades de partículas sobre a vegetação envolvente, assim como sobre as populações próximas das zonas de mineração, e tem uma influência negativa sobre os sistemas de húmidos e linhas de água superficiais.

A escavação dos solos vai alterar o normal escoamento das linhas de água, fazendo com que a qualidade da água fique afectada, pela infiltração e percolação de derrames de combustíveis e óleos lubrificantes devido à circulação de equipamentos. Altera a paisagem sonora, devido ao ruído elevado e forte perturbação e impacto da matriz sonora da região. Tem também efeitos visuais, uma vez que o desmonte a céu aberto leva à descaracterização da paisagem e provoca impactos visuais pelo contraste entre a área explorada e o meio envolvente, alterando também a morfologia do terreno. Também os solos, que eram de ocupação agrícola e florestal, passam a ter um uso extractivo. De igual modo não podemos esquecer os efeitos sociais, uma vez que irá existir uma alteração das actividades económicas existentes, como a agricultura, exploração florestal, pastorícia e apicultura. Por último, convém não esquecer, no caso concreto da Serra de Arga e da zona da Cruz Vermelha, na Área Protegida do Corno de Bico, em Paredes de Coura, que ocupa as serras a sul de Paredes de Coura até ao Rio Lima, a alcateia de lobos que permanece nessa zona, já por si ameaçada, poderá simplesmente desaparecer se exploração do lítio avançar. Por tudo o que ficou dito, digo não à exploração do lítio, e, se o governo insistir na sua teimosia de permitir a exploração no Alto Minho, o povo terá de sair de novo à rua, como o fez no dia 4 de Setembro de 1981, na manifestação contra a central térmica a carvão da Amorosa, a maior manifestação popular que se realizou em Viana do Castelo, na qual estive presente e pude verificar os milhares de rostos anónimos que de forma pacífica se manifestaram contra a referida central térmica.

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REIS DE PORTUGAL

D. Miguel

Nascimento – 26 de Outubro de 1801 no Palácio Real de Queluz, Lisboa. Morte – 14 de Novembro de 1866, Wertheim, sepultado no Convento dos Franciscanos de Engelberg, em Grossheubach. A 5 de Abril de 1967, foi o seu corpo transladado para o Panteão da Dinastia de Bragança, na Igreja de São Vicente de Fora, Lisboa. Reinado – 11 de Junho de 1828 a 26 de Maio de 1834. Consorte – D. Adelaide de LöwensteinWertheim-Rosenberg. Dinastia – Bragança. Cognome – “o Tradicionalista”.

Títulos, estilos e honrarias

“Sua Alteza, o Sereníssimo Infante D. Miguel” (26 de Outubro de 1801 - 11 de Junho de 1828). “Sua Majestade, o Rei” (11 de Junho de 1828 a 26 de Maio de 1834). Duque de Bragança (26 de Maio de 1834 a 14 de Novembro de 1866). Grão-Prior do Crato e da Ordem de S. João de Jerusalém (1828 – 1834). Senhor do Infantado (1826-1834) . Duque de Beja (1816-1834). Senhor de Samora Correia. Grã-Cavaleiro da Ordem do Tosão de Ouro, de Espanha. O estilo oficial de D. Miguel como Rei era: “Sua Majestade Fidelíssima, D. Miguel I, Rei de Portugal e Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc.”.

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Gonzaga de Paula de Assis Inês Sofia Romana de Bragança), infanta de Portugal, (nasceu a 5 de Agosto de 1852, no Castelo de Heubach, em Kleinheubach, Baviera, sobre terra levada de Portugal e faleceu em Viena, a 15 de Fevereiro de 1941). Casou com D. Afonso Carlos de Bourbon, Duque de São Jaime, o pretendente carlista ao trono espanhol (como Afonso Carlos I) e pretendente legitimista ao trono francês (como Carlos XII), filho de João, Conde de Montizón, e da arquiduquesa Maria Beatriz de Áustria-Este. Teve apenas um filho, que morreu poucas horas após o nascimento em 1874.

Como Rei de Portugal, foi Mestre das seguintes Ordens:

Grão-

Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo Ordem de São Bento de Avis Ordem Militar de Sant'Iago da Espada Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito Real Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa Filhos

D. Maria das Neves de Bragança (D. Maria das Neves Isabel Eulália Carlota Adelaide Micaela Gabriela Rafaela

D. Miguel de Bragança (D. Miguel Maria Carlos Egídio Constantino Gabriel Rafael Gonzaga Francisco de Paula e Januário de Bragança), Príncipe de Portugal, Duque de Bragança (na série legitimista) considerado pelos seus partidários co o herdeiro dos direitos reais de seu pai (e por isso designado D. Miguel II), (nasceu a 19 de Setembro de 1853, no Castelo de Heubach, em Kleinheubach, Baviera, e faleceu em Seebenstein, Áustria, a 11 de Outubro de 1927), Casou a 1.ª vez com a Princesa Isabel Maria Maximiliana de Thurn e Taxis, filha do príncipe-herdeiro Maximiliano António de Thurn e Taxis e da duquesa Helena Carolina da Baviera, c.g. Casou 2.ª vez com Maria Teresa de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg, filha de Carlos, sexto príncipe de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg, e da princesa Sofia de Liechtenstein, c.g., de quem foi filho Sua Alteza Real o Senhor D. Duarte Nuno de Bragança, Príncipe de Portugal, Duque de Bragança, pai de Sua Alteza Real, o Senhor Dom Duarte Pio, Duque de Bragança e Chefe da Casa Real Portuguesa, c.g.

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D. Maria Teresa de Bragança (D. Maria Teresa da Imaculada Conceição Fernanda Eulália Leopoldina Adelaide Isabel Carolina Micaela Rafaela Gabriela Francisca de Assis de Paula Gonzaga Inês Sofia Bartolomeu dos Anjos de Bragança), infanta de Portugal e, pelo seu casamento Princesa Imperial e Arquiduques de Áustria (nasceu a 24 de Agosto de 1855 no Castelo de Heubach, em Kleinheubach, Baviera e faleceu em Viena a 12 de Fevereiro de 1944). Casou com o arquiduque Carlos Luís da Áustria, filho de Francisco Carlos da Áustria e de Sofia da Baviera c.g. D. Maria José de Bragança (D. Maria José Beatriz Joana Eulália Leopoldina Adelaide Isabel Carolina Micaela Rafaela Gabriela Francisca de Assis e de Paula Inês Sofia Joaquina Teresa Benedita Bernardina de Bragança), infanta de Portugal, (nasceu a 19 de Março de 1857 no Castelo de Bronnbach (Grão-Ducado de Baden e faleceu em Viena a 11 de Março de 1943). Casou com Carlos Teodoro, Duque na Baviera, de quem foi a segunda mulher, filho de Maximiliano José, Duque na Baviera, e da princesa Luísa Guilhermina da Baviera, c.g. D. Aldegundes de Bragança (D. Aldegundes de Jesus Maria Francisca de Assis e de Paula Adelaide Eulália Leopoldina Carolina Micaela Rafaela Gabriela Gonzaga Inês Isabel Avelina Ana Estanislau Sofia Bernardina de Bragança), infanta de Portugal, Princesa de Parma e condessa de Bardi pelo seu casamento (nasceu a 10 de Novembro de 1858 no castelo de Bronnbach e faleceu em Gunten, Suiça a 15 de Fevereiro de 1946). Casou com o príncipe Henrique de Bourbon-Parma, conde de Bardi, filho do duque Carlos III de Parma e da princesa Luísa de França, s.g.

D. Maria Ana de Bragança (D. Maria Ana do Carmo Henrique Teresa Adelaide Joana Carolina Inês Sofia Eulália Leopoldina Isabel Bernardina Micaela Gabriela Rafaela Francisca de Assis e de Paula Inácia Gonzaga de Bragança), infanta de Portugal e pelo seu casamento, Grã-Duquesa do Luxemburgo, (nasceu a 13 de Julho de 1861, no castelo de Bronnbach an der Tauber e faleceu em Nova Iorque a 31 de Julho de 1942). Casou com Guilherme IV, Grão-Duque de Luxemburgo, filho do grão-duque Adolfo do Luxemburgo e da princesa Adelaide Maria de Anhalt-Dessau, c.g. D. Maria Antónia de Bragança (D. Maria Antónia Adelaide Camila Carolina Eulália Leopoldina Sofia Inês Francisca de Assis e de Paula Micaela Rafaela Gabriela Gonzaga Gregória Bernardina Benedita Andrea de Bragança) infanta de Portugal e, pelo seu casamento Duquesa de Parma e Infanta de Espanha (nasceu a 28 de Novembro de 1862 no castelo de Bronnbach e faleceu no castelo de Berg, Luxemburgo a 14 de Maio de 1959). Casou com o duque Roberto I de Parma, filho do duque Carlos III de Parma e da princesa Luísa de Bourbon, c.g. Filhos naturais

De D. Antónia Francisca Ribeiro do Carmo D. Maria da Assunção de Bragança (D. Maria da Assunção Ribeiro do Carmo e Bragança) que reivindicou o estatuto de Infanta de Portugal e, consequentemente, de Princesa da Beira e de Princesa Real de Portugal (nasceu a 12 de Março de 1831 em Lisboa e faleceu em Roma, 9 de Julho de 1897), s.g.

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De mãe não identificada D. Maria de Jesus de Bragança (D. Maria de Jesus de Bragança e Bourbon), que reivindicou o estatuto de Infanta de Portugal e, consequentemente, de Princesa da Beira e de Princesa Real de Portugal. Casou 1.º vez com D. Silverio Rodriguez, s.g. Casou 2.º vez com D. Tomás José Fletcher de Melo Homem, filho de António José de Melo e D. Constança da Costa Posser Fletcher. C.g.

qualidades supriram mais tarde a falta de estudos científicos e políticos.» (Herchen, pp. 107-108).

Pai D. João VI Mãe D. Carlota Joaquina

D. Miguel em pessoa

«Era um belo mancebo de feições regulares e fisionomia distinta; o temperamento impulsivo e generoso traduzia-se-lhe nos modos vivos e desembaraçados e no andar elástico. Tinha o cabelo preto e muito farto, a testa alta e bem desenhada denotando inteligência, nariz aquilino, olhos castanhos, rasgados, brilhantes e tão expressivos que nele se retratava como num espelho cada movimento da sua alma; o sorriso era franco ainda que malicioso e cheio de mocidade e frescura; todos aqueles que com ele tratavam, portugueses ou estrangeiros, celebravam unanimemente o seu extraordinário poder de sedução. Não afirmamos que o moço infante sentisse especial prazer em estar sentado à banca de trabalho e encerrado com livros num quarto de estudo. […] Também não afirmaremos que a sua educação fosse objecto de esmerados rigores. […] A sua energia e outras

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O MUNICIPALISMO E AS ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS ANTÓNIO DE SOUZA-CARDOSO

Abstract

Résumé

Because democracy starts with the theory of small numbers. When the universe widens and the object of decision moves away to an abstract plane, far from the reach of practical knowledge of the populations, the reliability of the vote weakens and its agents are vulnerable to manipulation exerted by financial centralism and political mediation. Organic democracy is the only one that gives value to suffrage, because it encourages the decision to come from enlightened knowledge and not from manipulation or absenteeism. Democracy without proximity is subject to everything, even corruption due to the lack of legitimate and knowledgeable scrutiny.

Parce que la démocratie commence par la théorie des petits nombres. Lorsque l'univers s'élargit et que l'objet de la décision s'éloigne vers un plan abstrait, loin de la portée des connaissances pratiques des populations, la fiabilité du vote s'affaiblit et ses agents sont vulnérables aux manipulations exercées par le centralisme financier et la médiation politique. La démocratie organique est la seule qui valorise le suffrage, car elle encourage la décision à venir d'un savoir éclairé et non de la manipulation ou de l'absentéisme. La démocratie sans proximité est sujette à tout, même à la corruption en raison de l'absence de contrôle légitime et informé.

Key words: Municipalism; municipal elections; organic democracy; regionalization.

Mots clés: Municipalisme; élections municipales; démocratie organique; régionalisation.

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Escrevo no dia em que se realizam em Portugal as eleições Autárquicas. Assistimos ao frenesim dos Presidentes ou Secretários-Gerais dos Partidos, fazerem a mala e percorrerem Portugal de lés a lés prometendo tudo o que já tinham prometido ou o que ainda há para prometer, no embalo de uma bazuca que custa a ser percebida pelas organizações e pelas empresas. Percebemos rapidamente a perversão do sistema centralista. O que conta é o grande líder para o bem e para o mal ̶ O que vale são as suas promessas ou contra-promessas. O que decide é a sua presença estimuladora ou a sua ausência desdenhosa. Mas voltemos ao princípio: Porque é que é grave este tipo de prática que é animada por um sistema partidário que tudo controla e por um sistema mediático que para além do que já é conhecido só se interessa pelo bizarro ou pelo macabro? Porque a democracia começa pela teoria dos pequenos números. Quando o universo se alarga e o objecto de decisão se afasta para um plano abstrato, longe do alcance do conhecimento prático das populações, a fiabilidade do voto fragiliza-se e os seus agentes ficam vulneráveis á manipulação exercida pelo centralismo financeiro e pelo mediatismo político. As eleições autárquicas são a hipótese mais genuína de uma plena realização do sistema democrático. Porque os eleitos são próximos e conhecidos daqueles que os elegem, porque a política local se pragmatiza nos anseios verdadeiros das populações.

Escolher o filho do velho professor da escola ou o tio de um dos nossos parceiros da bola, é escolher de entre o conjunto das famílias que constituem a polis, e poder discernir na análise de mérito subjacente às propostas concretas que protagonizam. Dir-me-ão que isso só acontece nos pequenos concelhos onde as pessoas se conhecem e podem participar nos problemas da polis. Mas não, não é assim porque os concelhos não são mais que a reunião das freguesias e ´cada uma das freguesias em que votamos tem o seu próprio parlamento – a assembleia em cujos candidatos cada um de nós pode votar. E até o pode fazer diferentemente entre a freguesia e o concelho. A isto chama-se democracia orgânica. A única que dá valor ao sufrágio. Porque estimula a que a decisão provenha do conhecimento esclarecido e não da manipulação ou do absentismo. Sim, porque o sentimento dos muitos que não votam (tantas vezes superiores em número dos que acabam por votar) é que estão a decidir por coisas que não conhecem e onde não participam verdadeiramente; é que estão a decidir entre pessoas cujos méritos não distinguem e sobre promessas que não comprometem verdadeiramente os seus autores. A democracia sem proximidade, sujeita-se a tudo, até à corrupção pela falta de escrutínio legitimo e sabedor. E é este o interesse que tem também a Regionalização. Que não é mais do que a reunião dos municípios em regiões. Que se irmanam pelos mesmos anseios, que se agregam contra os mesmos problemas. Que se resolvem na partilha dos sonhos e no afastar das angústias das populações que os compõem.

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Os que na polis se tiverem distinguido pelo saber fazer publico, serão aqueles que os seus concidadãos escolherão para gerir as regiões. E isso faria com que os Órgãos centrais pudessem ser representados apenas pelos representantes eleitos nas regiões, exercendo um poder de coordenação, de agregação e de concertação dos poderes municipais e regionais e assegurando assim uma muito maior coesão interna, para que foco pudesse ser a representação externa e a cooperação transnacional. Claro que para isso seria necessário que os municípios e regiões tivessem igualmente autonomia financeira, tendo acesso directo a parte dos impostos auferidos com base nos rendimentos dos seus cidadãos e das suas empresas. Porque sem autonomia financeira mais vale chamar à Descentralização de Desresponsabilização que não é o mais que o Centralismo tem feito em relação a muitas delegações de competências passadas para os municípios em áreas onde a proximidade faz de facto a diferença. De resto, como todos sabem, as Autarquias têm sempre ganho em termos de eficiência e serviço público quando a sua actuação é comparada, em igualdade de circunstâncias, à da Administração central. Esta a razão por que, em dia de eleições autárquicas, me sinto particularmente desapontado. Pela qualidade da nossa democracia que perde mais uma oportunidade de se reencontrar naquilo que é mais

essencial à sua prevalência e compreensão. E pelas tantas terras de Portugal que em vez de decidirem os seus desígnios estão antes a decidir pela continuação do Governo ou pelas sobrevivências dos líderes da oposição. Quando todos percebermos que a democracia depende da qualidade da decisão que propicia aos seus concidadãos, então poderemos viver num Pais mais justo, mais harmonioso e verdadeiramente dirigido pelos mais capazes. E com esse nome ou com outro estará finalmente feita em Portugal a Regionalização!

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DOM JOÃO I INVOCANDO NOSSA SENHORA DA OLIVEIRA NA BATALHA DE ALJUBARROTA

Autor: Frei Manuel dos Reis Museu de Alberto Sampaio Guimarães

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O ESCRITOR AÇORIANO VALDEMAR MOTA MORRE AOS 88 ANOS JÁCOME DE BRUGES BETTENCOURT

Abstract

Résumé

Valdemar Mota, one of the 19 founders of the Real Associação da Ilha Terceira, writer, journalist, storyteller, historical researcher, genealogist and columnist, collaborated in dozens of media in the Azores, mainland and diaspora. A wellknown and esteemed figure, especially on Terceira Island, published 16 books, 33 offprints and anthologies, 15 speeches, conferences or communications and 604 articles published in newspapers and magazines, died on 15 September 2021.

Valdemar Mota, l'un des 19 fondateurs de la Real Associação da Ilha Terceira, écrivain, journaliste, nouvelliste, chercheur historique, généalogiste et chroniqueur, a collaboré à des dizaines de médias aux Açores, sur le continent et dans la diaspora. Une figure connue et estimée, notamment sur l'île de Terceira, a publié 16 livres, 33 tirés à part et anthologies, 15 discours, conférences ou communications et 604 articles publiés dans des journaux et magazines, décédé le 15 septembre 2021.

Key words: Valdemar Terceira; historical journalist.

Mota; Ilha researcher;

Valdemar Mota de Ornelas da Silva Gonçalves, nascido em 11 de abril de 1933 na freguesia de Nossa Senhora da Conceição, Angra do Heroísmo, faleceu a semana passada no Hospital desta cidade, dia 15 de setembro de 2021, na freguesia de Santa Luzia, aos 88 anos de idade, realizando-se o seu funeral após Missa de corpo presente na Sé Catedral d’Angra, no dia seguinte, para o cemitério da Nossa Senhora do Livramento, onde a sua urna ficou depositada em jazigo da família.

Mots clés: Valdemar Terceira; chercheur journaliste.

Mota; Ilha historique;

Figura muito conhecida e estimada, sobretudo na Ilha Terceira, de quem ainda no mês de janeiro último, foi lançada a sua obra na íntegra, ou seja, o que escreveu entre 1953 e 2017. O escritor Victor Rui Dores em artigo no Diário Insular, datado de 23 de fevereiro, a propósito de “Obras Completas” de Valdemar Mota, que acabava de ser publicada pela Turiscon Editora, sob a direção de Liduino Borba, começa por lembrar o prefácio do livro “Misericórdia da Praia da Vitória (14981998) de Valdemar Mota, da autoria de

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Joaquim

Veríssimo

Serrão,

que

rigorosamente define este Terceirense em três palavras “documentado, útil e instrutivo”. E, não tem sido poucos os que vem referindo

o

interesse

compilação

dos

desta

trabalhos

de

Valdemar Mota, agora ao dispor de todos nós em três volumes de 1000 páginas, num total de 3092, incluindo o Prefácio do Prelado Diocesano, Nota do Editor, Elenco Bibliográfico, Nota Curricular

do

Genealógica,

Autor

e

como

Nota

refere

em

“Atlântico Expresso” de 1 de fevereiro, o jornalista Santos Narciso, que alude o

facto

de

publicado

16

Valdemar livros,

Mota

33

ter

separatas

e

antologias, 15 palestras, conferências ou comunicações e 604 artigos saídos em jornais e revistas. É,

sem

dúvida

um

contributo

inestimável para a história dos Açores, em vários aspetos, acrescendo ainda o facto

de

reunir

interessante

acervo

fotográfico. Entre

os

livros

destacamos:

O

da

sua

Visconde

autoria

de

Porto

Martim. Um benemérito açoriano no Brasil: 1976; João Baptista Machado. Mártir e Glória dos Açores. 1985; O pastel na cultura e no comércio dos Açores,

1976

Salvador,

e

1991;

1981,

Santa

1982

e

do

2007;

Misericórdia da Praia da Vitória. 1998 e 2011; Notas Históricas sobre Bispos Açorianos Irmandade

(2

vols.)

de

1986

Nossa

e

2016;

Senhora

A do

Livramento nos seus 150 anos, 2003. Escritor,

jornalista,

contista,

investigador histórico, genealogista e

colunista, colaborou em dezenas de órgãos de comunicação social dos Açores, do continente e da diáspora. Foi empresário e administrador da firma Frederico A. Vasconcelos, Herd. Lda. de Angra. Paralelamente, foi membro da Assembleia Municipal, vereador e vogal do Conselho de Administração dos Serviços Municipalizados de Angra. Presidiu à direção do Recolhimento de Jesus Maria José (Mónicas) durante 12 anos, dirigindo ainda a Confederação Operária Terceirense e a Associação Cristã da Mocidade (ACM), entre outros cargos de relevo. Foi sócio efetivo do Instituto Açoriano de Cultura, do Instituto Histórico da Ilha Terceira, do Instituto Histórico e Genealógico de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil, da Sociedade Histórica da Independência de Portugal, da Academia Portuguesa de Ex-Líbris, fundador do Núcleo Cultural Ferreira Drumond, etc. Era comendador da Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém, 1988, oficial da Ordem de Mérito pelo Presidente da República, em 10 de junho de 1998 e Medalha de Honra do Município Angrense (2006), entre outras veneras que possuía. Valdemar Mota, terá sido iniciado, no gosto pela Causa Real ainda de calções, frequentando a antiga Escola Comercial e Industrial Madeira Pinto, depois “batizada” de Salazar, tendo assistido à visita a Angra do Heroísmo, em junho de 1948, de Dom Duarte Nuno de Bragança. E, daí em diante participa em todas as atividades do grupo de monárquicos local. Acompanhou as visitas de Dom Duarte,

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Duque de Bragança, a partir de 1975, à Ilha Terceira.

Mendes. No final da eucaristia, o cónego Hélder Fonseca Mendes lembrou Valdemar Mota e a sua grandiosa obra em prol da Diocese de Angra. Ficaram de luto D. Francisca da Silva Pires Mota, com quem casou em 1955, a filha D. Francisca Inês e marido Dr. Luís Azevedo, antigo subinspetor regional do trabalho, a neta Sofia, engenheira zootécnica pela Universidade dos Açores, o neto Miguel e mulher (ambos médicos, dando consultas no Porto e Braga) e a neta Raquel (psicóloga pela Universidade do Minho, que se encontra aí, a concluir o seu doutoramento). Casa da Quinta da Estrela, em Angra do Heroísmo, 2021.09.25

Valdemar Mota recebe em 17 de agosto de 2006 nos Paços do Concelho de Angra a Medalha de Honra do Município.

Foi um dos 19 fundadores da Real Associação assinaram

da o

constituição

Ilha

ato

Terceira,

notarial

estatutária

que

da

em

13

sua de

maio de 1996 e presidiu logo à direção inicial. Dom Duarte de Bragança ao tomar conhecimentos

do

sucedido,

logo

enviou à Família de Valdemar Mota uma sentida mensagem. A missa do 7.º dia realizou-se na Sé Catedral de Angra, no dia 25 (sábado), presidida

pelo

cónego

Ângelo

Valadão, acompanhado pelos cónegos Hélder Fonseca Mendes e João Maria

Angra, 2009.05.24. Valdemar Mota e Senhora, Jácome de Bruges Bettencourt, Dom Duarte de Bragança, António da Fonseca Marcos (Provedor da Misericórdia) e João Maria Mendes participaram em cerimónias do Espírito Santo da Misericórdia e seguidamente na Função no Pavilhão da Misericórdia em S. Carlos, com mais de mil Irmãos e familiares.

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A DINAMARCA - MONARQUIA ANTIGA, EXEMPLO DE MODERNIDADE ANTÓNIO PINHEIRO-MARQUES

Abstract

Résumé

The evolution of the Danish Monarchy, from an elective monarchy to hereditary monarchy and from absolute monarchy to modern constitutional monarchy. The political system of a parliamentary constitutional monarchy.

L’évolution du Danemark, d’une monarchie élective à une monarchie héréditaire et d’une monarchie absolue à une moderne monarchie constitutionnelle. Le système politique d’une monarchie constitutionnelle parlementaire.

Key words: Monarchy; absolutism: constitutionalism; parliamentary democracy; welfare state.

Mots clés: Monarchie; absolutisme; constitutionnalisme; démocratie parlementaire; état-providence.

A monarquia dinamarquesa

como de utilidade pública, entre elas a notável ponte de Ravning, com cerca de 760 metros de comprimento e cinco de largura, que foi considerada a maior ponte da Dinamarca até 1935. Este rei estabeleceu também a cunhagem de moeda para todo o reino. Conhecido como Haroldo Dente Azul, em dinamarquês Harald Blåtand Gormsen

Possivelmente com mais de mil e duzentos anos, é considerada uma das mais antigas monarquias europeias, com as duas outras escandinavas e a Inglaterra. Os primeiros reis surgem nos séculos IX e X, ainda num território dividido. Gormo, o Velho, considerado o primeiro rei da Dinamarca já unificada, teria reinado de 936 possivelmente a 958 ou 959. Sucedeulhe Haroldo I, que reinou até 986, período em que se consolidou o processo de unificação do país e se verificou a conversão ao cristianismo. Desta época restam vestígios de inúmeras construções, tanto militares

( Harald Bluetooth ), deu o nome, mil anos depois, ao sistema de comunicações lançado pela empresa multinacional Ericsson, em memória dos seus esforços unificadores das tribos nórdicas. O logótipo da tecnologia Bluetooth é formado pela junção, em carateres rúnicos, das iniciais do rei ( Harald Blåtand ).

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Harald Blåtand

Destes

primeiros

dinamarquês, dinásticas

séculos

datam

entre

do

as

reino

alianças

Portugal

e

a

Dinamarca, com os casamentos, no século XIII, da Infanta D. Berengária (filha

de

D.

Sancho

I)

com

o

Rei

Valdemar II, e da Infanta D. Leonor,

Túmulo de Margarida I na Catedral de Roskilde, Panteão dos Reis da Dinamarca

sua sobrinha (filha de D. Afonso II) com o Rei Valdemar III. De Valdemar II

e

Berengária

Margarida

I,

em

foi

quarta

cujo

neta

reinado

se

verificou a união pessoal dos reinos nórdicos, em 1397, conhecida como União de Kalmar, Suécia

(que

com a Noruega e a

então

abrangia

a

Finlândia) num vasto império, que do Mar

Báltico,

países

integrando

mencionados

além

dos

também

o

ducado da Estónia, nos séculos XIII e XIV, se estendia no Altlântico até à Gronelândia e Islândia, incluindo os arquipélagos

das

Faroe,

Órcades

e

Shetland. A União de Kalmar perdurou até 1523, ano da secessão da Suécia, quando foi proclamado Rei Gustavo I Vasa, enquanto a Noruega continuou unida à Dinamarca até 1814. Evolução de monarquia eletiva para monarquia

hereditária

e

de

monarquia absoluta para monarquia constitucional

A monarquia absoluta

A derrota dinamarquesa na Guerra dos Trinta Anos levou a que o país, pelas cláusulas do Tratado de Lübeck, em 1629, embora recuperasse territórios que detinha antes da guerra, se visse obrigado a não interferir nas questões internas do Santo Império, marcando este tratado o fim da hegemonia dinamarquesa no Báltico e abrindo caminho à preponderância sueca. Ainda no século XVII, as guerras entre a Dinamarca e a Suécia levaram a resultados desastrosos para a primeira, tanto em termos territoriais como financeiros, conforme os tratados de paz de Roskilde, em 1658, e de Copenhaga, em 1660. Tendo subido ao trono em 1648, em plena crise financeira, Frederico III tinha aceitado uma Carta da Coroação (documento estabelecendo privilégios e liberdades que os reis vinham concedendo do século XIII ao século

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XVII, quando da sua subida ao trono eletivo) com fortes restrições das suas prerrogativas como rei, forma de conseguir obter financiamento por parte da nobreza. Em consequência, a reunião em Copenhaga em 1660 da Assembleia dos Estados do Reino para avaliar e retificar a situação financeira, teve como resultado não só alterar o sistema sucessório de monarquia eletiva para monarquia hereditária (já era costume ser eleito como sucessor o filho mais velho do monarca), mas também introduzir o absolutismo régio. O estamento da nobreza, prejudicado pela perceção da sua incapacidade depois das derrotas militares nas guerras com a Suécia, e depois de abolido em 1660 o Conselho do Reino ( Rigsrådet ) por Frederico III, acabou por facilitar a aceitação da Lei da Soberania, naturalmente aprovada um ano depois pela nobreza, clero, burgueses e agricultores, impondo a “Soberania absoluta do Rei”, bem como a monarquia hereditária. Poucos anos depois é aprovada a Lei do Rei ( Lex Regia ou Kongeloven ) em 1665, consolidando-se o sistema sucessório hereditário ao mesmo tempo que ficava definitivamente instituída a monarquia absoluta. A Dinamarca foi certamente o único estado europeu dotado deste sistema com um texto constitucional que esteve vigente até 1849. O poder absoluto do rei é hoje visto como tendo vindo a favorecer a democratização do sistema político, ao reduzir a importância do estamento da nobreza na economia e na vida política, enquanto promovia a subida da burguesia urbana e

também dos terratenentes, com as reformas e incentivos na agricultura, setor fundamental da economia. Por outro lado, durante parte do século XVI e todo o século XVII, o movimento luterano do pietismo, determinante em vários países protestantes, entre os quais a Dinamarca, para além de enunciar preceitos teológicos e doutrinários, influenciou também a área social e a educação. Assim, as escolas paroquiais tiveram um papel ativo e relevante na alfabetização (a instrução obrigatória viria a ser introduzida mais tarde, em 1814), permitindo que a imprensa chegasse tanto às áreas rurais como a zonas urbanas pobres. Estas transformações prepararam o caminho à difusão dos ideais liberais e à evolução do sistema político. No entender de Jens Faerkel, no seu estudo sobre a Constituição da Dinamarca, “a monarquia absoluta foi paternalista, moderada, burocrática mais do que despótica”. Expansão marítima e colónias

É no período de monarquia absoluta que, em pleno mercantilismo e com uma situação económica e financeira difícil, a Dinamarca procura estender-se a outras paragens e fontes de comércio, mais a sul. Confinados entre o mar do Norte e os estreitos que o ligam ao mar Báltico, os povos que habitaram a península da Jutlândia e as suas mais de 1400 ilhas (cerca de 440 de maior importância) desenvolveram, desde os tempos dos viquingues e como seria de esperar, a construção de embarcações e uma intensa atividade marítima. Canuto II, o Grande, neto de Haraldo I, reinou na

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primeira metade do século XI (de 1016/1018 a 1035) num império no Mar do Norte, que incluía a Dinamarca, a Inglaterra e a Noruega. Para a expansão ultramarina o país contava com a construção de navios mercantes e com a marinha real, formalmente instituída em 1510, por disposição do Rei Hans (João, soberano da Dinamarca, da Noruega e da Suécia e ainda duque de Schleswig e de Holstein). Para além da Gronelândia, Islândia e Ilhas Faroe, integradas no Reino da Noruega, posteriormente sob a égide da dupla coroa em consequência da união dinástica entre a Dinamarca e a Noruega, os dinamarqueses foram estabelecendo ao longo dos séculos XVII e XVIII (sem chegar a ocupar territórios extensos e de forma pacífica, como tratados ou por compra ou concessões) uma série de posições costeiras ou de ilhas que lhes permitiram o reabastecimento dos navios e o comércio com o interior.

No início do século XVII, o Rei Cristiano IV, seguidor das teorias mercantilistas, pretendendo aumentar as receitas do Estado, interessou-se pelo comércio ultramarino, tendo concedido uma carta régia em 1616 para criação da Companhia das Índias Orientais e enviado uma expedição a Ceilão, iniciativa que resultou num tratado de comércio em 1620 e na posse de Tranquebar e Serampore. Frederico IV promoveu em 1706 uma missão evangelizadora à Índia que integrava igualmente médicos. As possessões dinamarquesas na Índia acabaram por ser vendidas à Grã-Bretanha no século XIX. A Dinamarca começou a interessar-se por África a partir de 1658, com o estabelecimento no ano seguinte da Companhia da África Dinamarquesa, para o tráfico de escravos para as Caraíbas. Esta companhia acabaria por ser absorvida pela Companhia das Índias Ocidentais Dinamarquesas, em 1671. Surgiu assim um conjunto de entrepostos comerciais e fortificações, na Costa do Ouro (hoje, Gana) que acabariam por ser vendidos à GrãBretanha em 1850. Quanto às Caraíbas, em processo iniciado em 1665, a Dinamarca veio a ocupar algumas ilhas, conhecidas por Índias Ocidentais Dinamarquesas. Com o declínio da produção de açúcar devido à abolição da escravatura e consequente diminuição do interesse económico das ilhas, estas seriam cedidas por venda aos Estados Unidos em 1917, passando a integrar o território da Ilhas Virgens americanas.

Cristiano IV

Índia - Forte Dabneborg, Costa de Coromandel

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Monarquia constitucional

As transformações sociais e económicas ocorridas nos vários países europeus, nos primeiros anos do século XIX, bem como uma multiplicidade de causas que variavam de país para país, levaram ao aparecimento de uma onda revolucionária que culminou em 1848. Frederico VI introduz reformas incipientes em 1831 e 1834, com a constituição de Assembleias Consultivas dos Estados (Jutlândia, Holstein, Schleswig e Ilhas). Formadas por representantes da aristocracia, dos burgueses e dos agricultores, estas assembleias podiam debater e propor leis, mas tinham apenas funções de aconselhamento. Os camponeses formaram uma sociedade, que publicava o semanário “Amigo do Campesinato” e apoiava o movimento nacional liberal, entretanto aparecido nos inícios da década de 40, que pedia reformas políticas e uma constituição que garantisse o governo representativo. O sucessor de Frederico VI, Cristiano VIII, embora rei absoluto, era considerado um reformador, mas faleceu no início de 1848 sem ter concretizado alterações no sistema político. O pedido de reformas prosseguiu com manifestações em Copenhaga, o que levou Frederico VII, filho do anterior monarca (mostrando ter compreendido bem as intenções de Cristiano VIII e as aspirações da população) a pôr termo à monarquia absoluta, aceitando que fosse elaborada uma nova constituição prevendo um parlamento eleito. A Lei Constitucional de 1849 foi aprovada pela assembleia constituinte e sancionada por Frederico VII a 5 de

junho, data conhecida como Dia da Constituição, um feriado nacional. A sua elaboração sofreu a influência das Constituições da Noruega (1814) e da Bélgica (1831). Ao longo dos seus cem artigos estabeleceu os princípios fundamentais da democracia dinamarquesa, entre os quais os direitos individuais, designadamente quanto à propriedade privada, e as liberdades de expressão, de reunião e de religião.

Frederico VII

A constituição de 1849, uma das mais antigas do mundo, sofreu poucas alterações, das quais as mais significativas são a extensão do direito de voto às mulheres, instaurando o sufrágio universal a 5 de junho de 1915, e a abertura da sucessão na coroa às mulheres, em vasta revisão que resultou na Lei Constitucional de 1953, menos

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extensa que o anterior texto de 1849, embora contenha boa parte das suas disposições. Sistema político

A Rainha representa a permanência e unidade do Estado, detendo um papel simbólico e limitado na governação do país, sem interferir em questões políticas. Procede à nomeação formal do governo e promulga a legislação aprovada pelo parlamento, representando o país internacionalmente e competindo-lhe o Comando supremo das Forças Armadas, à semelhança do que sucede com outros monarcas europeus. No entanto, embora sem intervenção política, a sua presença e a da família real é uma constante da vida nacional. A Rainha Margarida II, sem ser chefe da Igreja Evangélica-Luterana, mantém com esta uma estreita ligação uma vez que os monarcas devem pertencer à Igreja reconhecida pelo Estado. Nos casos de impedimento ou ausência, a Rainha é substituída por um Regente, habitualmente o príncipe herdeiro Frederico, ou por impossibilidade deste por outro membro da família real.

Poder executivo

Margarida II está à frente, embora apenas nominalmente, do poder executivo que é exercido pelo governo. Depois de eleições legislativas, a monarca indigita o líder do partido mais votado para formar governo. Devido à representação partidária no parlamento, sem maioria absoluta de um só partido, desde 1945 só houve dois governos maioritários, tendo os restantes sido governos de coligação. O governo é formado pelo primeiroministro e cerca de dezassete ministros, que são politicamente responsáveis perante o parlamento. A reunião do governo em sessão presidida pela soberana é designada por Conselho de Estado, ao qual pertence o sucessor da Coroa a partir da maioridade. A assinatura das leis pela Rainha é habitualmente feita em reunião deste conselho.

Frontão de altar desenhado e bordado pela Rainha Margarida II para a capela do castelo de Vitemberga, por ocasião das comemorações de Lutero, em 2017 A Rainha e o Príncipe Herdeiro Frederico em reunião do Conselho de Estado

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No momento da sucessão na Coroa, o novo monarca deve assinar uma declaração solene de adesão à Constituição ante o Conselho de Estado, sendo o duplicado deste documento entregue ao parlamento. Na impossibilidade de o procedimento ser imediatamente respeitado (por eventual ausência, por exemplo), o Conselho de Estado assume o interinato até que seja possível que o novo monarca o faça. Este preceito é desnecessário se o monarca já tiver assinado a referida declaração de adesão à Constituição enquanto sucessor na Coroa. Poder legislativo

Ao terminar com o regime absoluto sob o qual se encontrava o país, a Constituição de 1849 estabeleceu um parlamento ( Rigsdagen ) bicameral ( Landsting e Folketing ), tendo as duas câmaras poderes semelhantes. A nova constituição de 1953, possivelmente por ser considerada desnecessária a existência de duas câmaras com poderes e funções iguais, reduziu o parlamento apenas ao Folketing , antecipando o que viria a suceder nos outros dois reinos nórdicos com a redução das duas câmaras dos respetivos parlamentos a uma só, na Suécia em 1971 e na Noruega em 2007. O atual Folketing é formado por 179 deputados (incluindo dois pelas Ilhas Faroe e outros dois pela Gronelândia), com um mandato de 4 anos (podendo, no entanto, o primeiroministro convocar eleições antecipadas) e eleitos pelo sistema de representação proporcional (método de Hondt), beneficiando os partidos

menos votados de um sistema de compensação, com a atribuição de lugares no parlamento por forma a que todas as tendências políticas estejam representadas. Atualmente estão presentes no parlamento 16 partidos políticos. Habitualmente a Rainha assiste à primeira sessão parlamentar. A iniciativa legislativa cabe tanto ao governo como aos deputados. O Presidente do Folketing poderá solicitar aos deputados a reapreciação de um diploma caso considere que está em desacordo com os princípios constitucionais. Segundo o determinado na Constituição de 1953, as leis devem ser assinadas pelo monarca num prazo de 30 dias após ter sido concluído o processo legislativo no parlamento. A última vez que se verificou veto de legislação foi em 1865, no reinado de Cristiano IX. Por outro lado, o parlamento pode, com uma moção de censura, determinar a demissão do governo ou apenas de um ministro. É interessante relevar também que os pedidos de naturalização como cidadão dinamarquês devem ser individualmente aprovados pelo parlamento e passam à assinatura da Rainha, em reunião do Conselho de Estado. Poder judicial

O poder judicial, exercido pelos tribunais, é independente dos poderes legislativo e executivo. As nomeações para o Supremo Tribunal de Justiça são feitas sob proposta de uma comissão independente de juízes, devendo os membros do Supremo Tribunal eleger o

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seu presidente. Na Dinamarca não existe um tribunal constitucional, pelo que, sendo o caso, qualquer tribunal poderia decidir da constitucionalidade das leis e não as aplicar. Em casos políticos, a decisão teria possivelmente de ser tomada pelo Supremo Tribunal de Justiça. Os países integrantes do Reino da Dinamarca

O Reino da Dinamarca, um Estado unitário, compõe-se da Dinamarca propriamente dita ( Danmarks Rige ), as Ilhas Faroe e a Gronelância, com um mesmo monarca. Estes dois territórios estiveram desde o século XIV ligados à Coroa da Dinamarca e Noruega e permaneceram unidos ao primeiro país (tal como a Islândia) conforme previsto na Paz de Kiel, em 1814, quando da separação da Noruega. Com forte identidade própria, possuem um elevado grau de autonomia desde 1948 e 1979, respetivamente, estando a competência em matéria de relações externas e defesa reservadas ao governo de Copenhaga. A Coroa e o Governo são representados em ambos os países por Altos Comissários, com assento nos respetivos parlamentos, mas sem direito de voto. Em ambos existem igrejas luteranas nacionais, com origem na Igreja Luterana da Dinamarca. O Reino da Dinamarca, devido à extensão dos territórios no Atlântico Norte, detém atualmente uma Zona Económica Exclusiva de 2.551.238 quilómetros quadrados, a 15ª maior do mundo.

As Ilhas Faroé

Desde a Paz de Kiel que as Ilhas Faroe ficaram integradas no território do Reino da Dinamarca, tendo em 1946 sido referendada a sua secessão (com 50,74% dos votos a favor e 49,26% contra). Entretanto, nas eleições para o parlamento local desse mesmo ano, os partidos unionistas obtiveram a maioria e o país acabou por obter autogoverno em 1948. A legislação nas Ilhas Faroe deve respeitar a Constituição, vigente em toda a Dinamarca, e no último caso de incompatibilidade, em 2011, o governo das ilhas foi posto perante a escolha entre alterar a legislação ou optar pela secessão, tendo vingado a primeira possibilidade e permanecido no Reino da Dinamarca. As Faroe não fazem parte da União Europeia, mas dispõem de uma Missão junto desta, em Bruxelas, e também em seis outras capitais (Copenhaga, Londres, Moscovo, Pequim, Reiquiavique e Telavive). Por outro lado, participam, como membro associado, na FAO e na Organização Marítima Internacional, bem como noutras organizações internacionais relativas aos oceanos e às pescas, mantendo uma ativa cooperação no âmbito do Conselho Nórdico.

Visita da Rainha às Ilhas Faroe - 2021

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Com pouco mais de 53.000 habitantes num território de 1.399 km2, as Ilhas dispõem de um parlamento de 33 membros, o Løgting, uma das assembleias mais antigas do mundo, remontando ao período viquingue. Existem nove partidos, dos quais sete têm representação parlamentar, num espetro político diversificado de posições unionistas ou independentistas, neutras e também pró-república. O governo de coligação, devido à fragmentação partidária, é formado por um primeiro ministro e seis outros ministros. No sistema judicial está previsto recurso para os tribunais superiores da Dinamarca. A Gronelândia

Integrada no Reino da Dinamarca desde o tratado de Kiel, a Gronelândia adquiriu uma reforçada autonomia funcional durante a segunda guerra mundial, período em que a Dinamarca se encontrou em situação de protetorado alemão, tendo estreitado relações (designadamente as trocas comerciais), com o Canadá e os Estados Unidos. Este país, dado o interesse estratégico daquele território, pretendeu comprar a Gronelândia em 1946 (por 100 milhões de dólares da época), ideia recorrente, que possivelmente também já existira em relação à Islândia, e que já vinha do século XIX. A oferta foi rejeitada pelo governo de Copenhaga. Finda a guerra, a Gronelândia viu alterado o seu estatuto colonial, passando com a Constituição de 1953 a fazer parte integrante do Reino da Dinamarca, desenvolvendo o estado de bem-estar segundo o modelo dinamarquês, e reforçando a sua evolução para a

autonomia, reconhecida em 1979. Na sequência de um referendo na Gronelândia, em 2009, ficou garantido um maior nível de autogoverno, a população reconhecida como um povo com identidade própria e o gronelandês como única língua oficial, no que então foi considerado como mais um passo para a independência. Tendo aderido às Comunidades Europeias com a Dinamarca, em 1973, a Gronelândia veio a optar, depois da concessão de autonomia em 1979, por sair (devido a divergências quanto ao setor das pescas) o que se verificou em 1985, passando a ter uma parceria com a União Europeia e a integrar o grupo de Países e Territórios de Ultramar. A Gronelândia está representada por Missões em Copenhaga, Reiquiavique, Washington e junto da União Europeia e participa no Conselho Nórdico, no Conselho do Ártico e na Comissão Baleeira Internacional, devendo ser destacado o trabalho, com a Dinamarca, no âmbito das Nações Unidas relativo à situação dos Povos do Ártico. Sendo a maior ilha do mundo, com 2.166.086 quilómetros quadrados, a Gronelândia tem uma reduzida população de 56.000 habitantes. O parlamento (Inatsisartut), conta com 31 membros, eleitos por cinco dos sete partidos existentes no país e dos quais quatro são independentistas. O governo de coligação é formado por um primeiro-ministro e nove ministros. Também o sistema judicial gronelandês prevê recurso para o Supremo Tribunal da Dinamarca.

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Popularidade

Os monarcas dinamarqueses têm gozado de uma razoável popularidade de meados do século XIX até à atualidade. Frederico VII foi considerado um líder natural e herói pelas suas posições na difícil questão dos ducados de Schleswig-Holstein e durante a guerra de Schleswig, de 1848 a 1851. Cristiano IX, conhecido como o “Avô da Europa”, devido aos casamentos dos filhos com membros de várias famílias reinantes, teve de enfrentar a segunda guerra de Schleswig em que a Dinamarca foi derrotada, sofrendo as consequências desse facto. No entanto, no seu reinado a Islândia recebeu uma constituição e autogoverno, em 1874, e o sistema de segurança social foi-se desenvolvendo com pensões para os idosos, em 1891, e apoios às famílias e aos desempregados, em 1892. Frederico VIII, que teve um reinado curto, era muito favorável ao sistema parlamentar e à introdução de reformas. Cristiano X enfrentou em 1920 uma grave crise provocada pela questão da reintegração do Schleswig na Dinamarca. Favorável à opinião dos nacionalistas e em oposição com o seu primeiro-ministro, forçou a sua demissão, tendo porém de vir a recuar. Foi a última vez que o rei da Dinamarca demitiu um primeiroministro, passando desde então a ser escrupulosamente respeitado o funcionamento da democracia parlamentar, entretanto consolidada. Este rei aceitou a independência da Islândia, na sequência de um referendo que rejeitou a união com a Dinamarca (o Acto de União de 1918 concedia igual estatuto aos dois

países, com um mesmo rei) e a transformação da Islândia numa república. O referendo, realizado em plena guerra, e com a Dinamarca ocupada pelas tropas alemãs, foi mal recebido pela opinião pública dinamarquesa. No entanto, Cristiano X deixou imediatamente de se intitular Rei da Islândia e enviou uma mensagem de felicitações às autoridades islandesas. Durante a segunda guerra mundial, tornou-se um símbolo nacional da resistência aos ocupantes. Frederico IX, por sua vez, incentivou a recuperação do país no pós-guerra e assistiu às alterações constitucionais de 1953. Muito popular na Marinha Real, onde fez carreira, era igualmente apreciado como pianista e como maestro, tendo feito gravações à frente da Orquestra Real Dinamarquesa e da Orquestra Sinfónica Nacional. Sucessora de 56 reis (entre os quais apenas uma rainha, Margarida I), os quais a partir de 1513 têm vindo a alternar os nomes Cristiano e Frederico, Margarida II, filha de Frederico IX e mãe de um futuro Frederico X, encontra-se no lugar de um Cristiano na lista dos monarcas dinamarqueses. Esta alternância contribui para a impressão tanto de continuidade da instituição como também, muito possivelmente, de estabilidade da sociedade dinamarquesa.

Gravações de Frederico IX como maestro

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Ao subir ao trono, abandonou os títulos históricos dos reis seus predecessores, que incluíam a designação de ”Rei dos Godos e dos Vendos” e foi proclamada simplesmente como Rainha da Dinamarca. O seu casamento em 1967, com o diplomata francês Henrique de Monpezat, foi o segundo de uma princesa herdeira fora do círculo das famílias reais (o primeiro tinha sido, no ano anterior, o da Princesa Beatriz dos Países Baixos). Muito querida e admirada pelos dinamarqueses pela forma dedicada com que cumpre as suas funções, é especialmente apreciada pela vasta obra artística, que abrange pintura, desenho, paramentaria, cenografia e figurinos para teatro, cinema e ballet, bem como ilustrações para livros, entre os quais a obra de Tolkien ”O Senhor dos Anéis” em 1977, reeditada em 2002.

Duas das ilustrações, por Hingahild Grathmer (pseudónimo de Margarida II), para a obra de Tolkien, O Senhor dos Anéis

Margarida II tem mais de trinta exposições realizadas, na Dinamarca mas também no estrangeiro, de Tóquio ou Pequim a Nova Iorque. Algumas das suas obras estão em exposição permanente na Galeria Nacional da Dinamarca, no Museu de Arte de Aarhus e na Galeria de Arte de Køge. Com o Príncipe Henrique, traduziu para dinamarquês ”Tous les hommes sont mortels” de Simone de Beauvoir. E traduziu igualmente obras de Stig Strömholm e Erik Linklater. O seu pensamento é conhecido através de entrevistas e livros sobre o seu reinado, um dos quais “De Dybest Rødder” (“As raízes mais profundas”) sobre história da Dinamarca, desde os primeiros tempos à atualidade, publicado em 2016, escrito por Margarida II em colaboração com o escritor e jornalista dinamarquês Thomas Larsen. Nele faz notar as mudanças do país durante os seus então 44 anos de reinado, abordando os problemas da imigração e referindo que o país tinha mudado de “uma curiosidade amigável para o cepticismo” sobre este tema. Também as mensagens de Ano Novo, que prepara com o gabinete do primeiroministro, permitem à monarca fazer saber a sua opinião sobre os acontecimentos transcorridos no ano que acabou. Gozam de grandes audiências com o país parado, para assistir e debater a mensagem, em família e com amigos. A popularidade da monarquia anda na casa dos 80%, bem compreensível sabendo-se do empenho com que a Rainha Margarida II e a sua família cumprem as suas funções e abordam as causas de interesse da sociedade contemporânea dinamarquesa.

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Depois de se ter dissolvido a união dos reinos nórdicos,estes continuam, séculos depois, ligados por fortes laços, reforçados pelas estreitas ligações entre as três famílias reinantes. Este relacionamento especial abrange também as Repúblicas da Finlândia e da Islândia. Por último, de relevar que a Dinamarca, como é sabido, está em lugares cimeiros

dos índices mundiais relativos à democraticidade (7º) e à transparência (1º) e dos países com menor corrupção (1º). Com 61 960 dólares de renda nacional per capita e com uma dívida pública de 33,2% do PIB, esta bem antiga monarquia é simultaneamente um exemplo de moderno estado de bem-estar social.

As Raízes mais profundas - a Rainha conta a história da Dinamarca aos Dinamarqueses

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MONARQUIA E MUNICÍPIOS MIGUEL VILLAS-BOAS

Antigos Paços do Concelho da Cidade do Porto

Abstract

Résumé

At the opposite of lhe republic is the most perfect of regimes: the temperate Monarchy. In the organic monarchy or under a traditional aegis, the King reigns and governs, but his power is limited by the assemblies - namely the Cortes, the professional associations and the municipalism constituted by representatives of the intermediary bodies, of the natural groups that make up the Community, which are responsible for the administration of state affairs, and lhe Counties.

A l'opposé de la république se trouve le plus parfait des régimes : la monarchie tempérée. Dans la monarchie organique ou sous une égide traditionnelle, le Roi règne et gouverne, mais son pouvoir est limité par les assemblées - à savoir les Cortes, les associations professionnelles et le municipalisme constituées de représentants des corps intermédiaires, des groupements naturels qui font la Communauté, qui sont chargés de l'administration des affaires de l'État, et les Comtès.

Key words: Organic Counties; True Democracy.

Mots clés: Monarchie Comtès; Vraie Democracie.

Monarchy;

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Organique;


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‘A dignificação política do nosso País conseguir-se-á quando os homens bons de Portugal se resolverem a arrancar os Municípios das mãos em que caíram, cortando

pela

raiz

o

partidismo.’,

escreveu o doutrinador monárquico e antimaçónico António Sardinha.

O Municipalismo opõe-se ao regime que enaltece o culto à autoridade central do Estado. Com a refundação do Condado Portucalense, em 1096, o Conde D. Henrique apostou fortemente na criação de povoações autónomas. Também desde a origem do novel Reino ibérico, os Municípios estiveram no âmago da governação do território português. Foi com El-Rei Dom Afonso III de Portugal, nas Cortes de Leiria de 1254, que as liberdades municipais passaram a ser uma regra essencial de governação, pois a representação nacional foi alargada aos Municípios. O papel democrático dos municípios tornava-o em real representante de toda a comunidade local diante do Rei que valorizava o apoio popular, tornando a Monarquia Portuguesa uma democracia orgânica, pois os conselhos municipais compostos por ‘vizinhos’ tinham capacidade política e um enorme conjunto de liberdades fundamentais, regalias e seguranças e regras da vida comunitária, normalmente consignadas em carta de Foral - que elencava as matérias relativas à liberdade das pessoas, ao direito de asilo, à defesa dos direitos em juízo, à tributação, à inviolabilidade do domicílio – tudo isto em plena Idade Média.

Desta forma, descentralizava-se o poder fazendo com que os munícipes tivessem voz através de representantes efectivos, livres, independentes e apartidários, cientes das necessidades do território, das suas virtualidades e das suas gentes, e que nominalmente eleito, podia ser responsabilizado directamente e destituído caso não cumprisse de forma digna e competente o mandato para o qual fora eleito. Estas comunidades permaneciam leais à Coroa que via na sua existência duas vantagens fundamentais: assegurarem o controlo do território, e servirem de contraponto ao espírito autonomista da nobreza ou seja ao feudalismo.

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Na Presença d'El-Rei D. João I


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A importância destes concelhos era tal que eram enviados representantes às Cortes - as cúrias onde estavam representados os Três Estados do Reino tendo assim participação na governação. A Monarquia era pois, já nesses iniciais tempos Portugueses, uma verdadeira democracia e igualmente popular na qual, por exemplo, a qualquer hora do dia ou da noite o Juiz do Povo se poderia apresentar no Paço à Presença do Rei e reclamar de injustiças ou peticionar graças. Que diria hoje, Sua Excelência O Senhor Protocolo de Estado confrontado com igual cenário?! A democracia popular ficava à porta, claramente! A restauração social dos órgãos naturais como a família, os municípios, a universidade, os grémios e as corporações, com autonomia e liberdade é a única forma de combater a consolidação definitiva do totalitarismo tecnocrático e da sociedade de massas. O estado totalitário, centralizador e burocrático ao serviço dos grupos de interesse e do economicismo materialista burguês é o poder que impede a restauração da monarquia popular e social que vê a comunidade como um conjunto de organismos naturais, vivos e livres. O municipalismo e o foralismo, chaves da democracia orgânica aos quais está intimamente ligada a subsidiariedade, são as bases que permitem a possibilidade de haver liberdade. O Estado moderno, com o seu centralismo, estabeleceu o totalitarismo tecnocrático, ao qual estamos subjugados. A Monarquia Temperada com elementos democráticos e aristocráticos é a única condição que

possibilita o municipalismo. Sem os foros não há democracia republicana e numa Monarquia Constitucional sem municipalismo o Estado não cumprirá verdadeiramente as suas funções sociais; sem o Rei e os foros e comunidades autónomas desaparecem, ou pela desagregação da sociedade, ou pelo receio que o Estado fraco tem delas.

Antigo Brasão Cidade de Lisboa

O municipalismo é o caminho certo para uma verdadeira democracia. A democracia foral e municipal é a primeira ligação da ordem social e política. O municipalismo comunitarista é essencial para uma verdadeira democracia.

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É necessário exigir poder económico e político para os municípios livres, pois só estes podem expressar a Monarquia orgânica, onde com o autodomínio existe o pleno e livre exercício da soberania social em toda a hierarquia das pessoas colectivas e classes que são a garantia das verdadeiras liberdades contra todos os regimes totalitários e centralizadores. A predisposição natural e social do homem fez nascer a Família, o município, a região e a Nação. Monarquia Representativa só pode existir quando o Rei reina e governa, com o seu poder limitado pelas assembleias onde estão os representantes dos grupos sociais naturais com representação efectiva da sociedade. A única Res publica democrática é essa; claro que não na acepção dos conceitos de ’república’ e ‘democracia’ apropriados pelo liberalismo burguês revolucionário que implantou o regime inaugurado no 5 de Outubro de 1910 – essa república portuguesa é conhecida obra da maçonaria e de seus asseclas carbonários e demoliberalismo socialista no de 1974 até hoje. A Democracia partidocrata, nem é uma verdadeira república, nem uma verdadeira Democracia, pois foge a sete pés do exercício directo do poder pelas forças vivas da sociedade. Antes existe um sistema rotativo de poder, com grupos, em que são sempre os mesmos a ter acesso ao poder, barricados há décadas nas mesmas dinastias oligárquicas e plutocratas que sobraçam as rendosas sinecuras, pastas do poder e lucrativas negociatas do regímen enquanto impõem ao cidadão comum – afastado dos centros de decisão – deveres que os seus supostos representantes não cumprem.

Como muito assertivamente descreveu João Ameal em «Integralismo Lusitano – Estudos Portugueses»: ‘A Democracia declara que o Poder reside na multidão. Formularemos, então, o seguinte dilema: ou a multidão é, ao mesmo tempo, governante e governada (e logo se vê que isto é contra a razão e totalmente impossível na prática) – ou a multidão delega o governo de qualquer maneira, indicando, ela própria, quem deve governá-la. Mas, nesta segunda solução, encontrase já a condenação da Democracia. A Democracia pura passa a não existir. O seu primeiro gesto é renegar-se a si mesma. Já não é a multidão, o povo, quem governa. «Nesse momento, pois, a soberania, deslocada do eleitorado para os seus representantes, sem possibilidade de uma fiscalização eficaz por parte daquele no seu modo de exercício, será assim, já não a vontade do povo – mas apenas a de uma aristocracia casual e momentaneamente constituída» – demonstrou, muito bem, o Professor da Universidade de Coimbra, Doutor Luís Cabral de Moncada. A Soberania do Povo foi sempre um logro. Soberano – dizem-lhe – por intermédio dos seus delegados. Esses delegados, escolhidos nos centros partidários, não são mais do que agentes de certas facções, cujo fim determinante é o assalto ao Poder. E assim, em nome da soberania popular, tem lugar a mais hipócrita e astuciosa soberania dos partidos. Nem admira. O ponto de partida, quimérico e perigoso, havia de produzir estas consequências...

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Logo, a Democracia, baseando-se na atribuição do Poder à multidão que nunca o chega a exercer de facto – é um contra-senso.’

Tudo foi simulado, tudo foi fingido, ou seja, a dita "democracia" dos tempos modernos baseia-se nos mesmos princípios e fundamentos de todo o Liberal-socialismo: Estado a administrar os municípios, representação individual indirecta, ideológica e partidária, a prazo e termo certos. E no fundo da pirâmide, o povo, os eleitores, que deixam votar porque ganham sempre os que lá estão, isto é, o sistema, os políticos do costume e as suas clientelas que iludem a massa! O povo não sabe protestar e dá tudo o que lhe pedem, e quando lhe dá para uns arremedo de protesto são logo enquadrados como sendo uma minoria de safados, empurrando-os para a condição de párias criminosos. Assim, em Monarquia, os municípios (comunidades e as suas corporações locais de base) além de se autoadministrarem, são representados de forma directa, corporativa e orgânica em sede nacional.

Bandeiras Monarquia Portuguesa

Só na Monarquia Representativa ou Temperada em que o Rei reina e governa, com o seu poder limitado pelas assembleias onde estão os representantes dos grupos sociais naturais podemos falar de verdadeira representação da comunidade. Assim, o Rei e o seu Ministério governam o que é transversal aos municípios: as Forças Armadas, as Finanças públicas, a Diplomacia). O Rei governa, mas não administra, isso competiria ao Conselho de Ministros e às suas atribuições de administração pública, a que hoje comummente se chama Governo. In "Do Governo da República Pelo Rei", Décimo sexto capítulo do livro "Razões Reais", o doutrinador monárquico português Mário Saraiva explica:

Dr. Mário Saraiva, Doutrinador Monárquico

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‘A questão política, tal como tem sido posta,

nos

termos

monárquicos

fratricidas

contra

republicanos,

republicanos contra monárquicos, não pode

conduzir

a

nenhuma

solução

nacional. Republicanos

e

monárquicos

e

monárquicos,

republicanos

é

necessário compreendê-lo e afirmá-lo — nada existe do que aparentemente nos separa, tão importante como o que verdadeiramente

nos

aproxima:

o

mesmo acrisolado interesse pela Coisa Pública, conscientes de que praticamos um dever cívico, e a primazia que nesse sentido concordamos em dar à Política. Com

a

massa

descolorida

dos

indiferentes, dos apolíticos, é que, nem uns nem outros, temos afinidade. Lamentavelmente

temos

vivido

demasiado sob o império injusto de certas palavras fetiches. Monarquia? Pois não é verdade que a tomamos hoje

com

o

significado

rigoroso

de

algum dia, mando de um só? Pois não é verdade que esse mando de um só se situa atualmente no conceito do

ditador

totalitário,

que

nós

repudiamos? República? No

seu

tempo,

em

1923,

chamou

aos

"almas

republicanas"

Sardinha

não

melhores repeliu

alguém

integralistas e de

Antônio todo

a

designação, respondendo: "o adjetivo republicano

pode

caber-nos,

na

verdade, desde que lhe precisemos o sentido". E, apoiando-se na autoridade de Maurras, transcrevia-o: "a palavra República tem um sentido razoável; mesmo depois do restabelecimento da

Monarquia, ela poderá continuar a usar-se na interpretação que indicava o âmbito dos negócios públicos". Era essa, aliás, a acepção tradicional, tão frequentemente encontrada nos nossos clássicos: Res-pública, República, Coisa do Povo. Os nossos Reis foram mais longe e empregaram a palavra República indistintamente como sinônimo de reino. Ao promulgar as leis, a fórmula usual era: "para serviço de Deus, meu e bem da República..." De onde se vê que Realeza e República não se consideravam incompatíveis. Antes da divisão fratricida — monárquicos e republicanos — quando a unidade nacional não precisava de ser invocada por tão natural que era, a Realeza conciliava-se com a República, mais exatamente, o Rei completava a República, fazia parte dela. Assim o Padre Antônio Vieira dizia: "um Rei muito repúblico". Restituída a República ao seu conceito elevado de vivência em plenitude de direitos cívicos, de insofismável liberdade do Povo nos negócios da sua governação, da autonomia administrativa do país — o que nos separa então dos amigos republicanos? O fecho da República? Têm-no eles com uma Presidência eletiva, mas supomos que mais por um arrastado preconceito ideológico do que por uma meditada convicção, e daqui a esperança do nosso apelo. Uma República de caráter nacional, a República no conceito referido, exige, para que não perca esse caráter, uma magistratura que seja, por princípio, também nacional, isto é, independente na origem, com requisito da imparcialidade e da justiça, igual para

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todos, representativa da totalidade da grei e da sua continuidade histórica. Esta

exigência

ultrapassa

de

predicados

compreensivelmente

as

possibilidades individuais de qualquer pessoa

escolhida,

contraria

até

porque

formalmente

pelo

se

próprio

ato da escolha. A Realeza, pela instituição dinástica, como já vimos, faculta-nos de modo especial

o

preenchimento

desses

predicados. Que a falência das repúblicas provém em

grande

parte

do

inconveniente

modo de preenchimento da chefia do Estado,

encontra-se,

constantemente

aliás,

demonstrado

na

prática. A

disputa

repetida

do

lugar

da

Presidência conduz normalmente aos dois males extremos: ou à desordem produzida

pelo

choque

das

forças

políticas, ou à imposição ditatorial de uma dessas forças políticas. O estado de equilíbrio é raro e difícil, e sempre instável. As repúblicas existentes (atualmente quase todas na oscilação autoritária) confirmam esta observação que, de resto, vem de todos os tempos. A verdade — não é nenhum paradoxo! —

é

que

pela

Realeza

melhor

se

defendem e conservam as Repúblicas. E veja-se se não é assim. Todos os Reinos europeus servem de exemplo, sem

exceção.

essas

Repúblicas,

tendo na suprema magistratura um Rei, conseguem manter, neste mundo oprimido e revolto dos nossos dias, a espontânea harmonia da autoridade e da

liberdade.

conseguem Repúblicas.

Só ser

esses

Reinos

verdadeiras

A verificação destas realidades patentes sobre as deduções da inteligência, tem levado alguns dos mais penetrantes espíritos republicanos, à conclusão da necessidade do Poder Real e Dinástico. Vencendo os preconceitos da falsa oposição entre República e Realeza, esses nobres espíritos puderam sentir a alegria de encontrar a autêntica solução política e, com o entusiasmo dos convertidos, têm vindo a revelar-se como os seus ardorosos propugnadores. "Do Governo da República pelo Rei". É este o título de um livro antigo escrito em 1496 por Diogo Lopes Rebelo, que fora mestre do jovem Duque de Beja, depois D. Manuel I. Pouco importa se é agora já inútil o que dizem as suas velhas páginas. O que nos diz e sugere o seu título, isso sim, tem luminosa atualidade e flagrante oportunidade. Não duvidamos de que bem mais do que na era de Quatrocentos. Então a República portuguesa tinha um Rei e conhecia o apogeu da sua grandeza. Hoje, Estado Republicano não é sinônimo de República. Falta-lhe o Rei.’

Hoje, teríamos um Rei, como Chefe de Estado ou Monarca, orientador da «função governativa suprema» e sempre no interesse do Bemcomum. O papel do Conselho de Ministros do monarca desdobrava-se nas funções executivas da defesa diplomática e militar, da gestão financeira geral. Na outra face do poder, a descentralização assentava num sistema de reconhecimento dos corpos intermédios corporações, sindicatos, províncias, municípios.

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Recusa-se o rotativismo dos Partidos ideológicos, o regime das oligarquias partidárias, pretendendo-se uma Monarquia assente na representação regionalista, municipalista e sindicalista, segundo as antigas tradições da Monarquia portuguesa. Os partidos políticos não podem ter o exclusivo do poder de governação, da administração pública do país, nem do poder legislativo e terão assento parlamentar nas Cortes tal como as forças vivas da Comunidade. Rei, Cortes e Municípios (essas pequenas repúblicas autónomas sob a égide um regime Monárquico nacional).

Agostinho da Silva, in “Cartas inéditas”, explicou: ‘Continuo firme na ideia de que a Monarquia coordenadora de Municípios Republicanos foi o regime mais certo para Portugal. (…) o município, clara e inteiramente "republicano". Como "coordenador geral" e "inspirador" o Rei...’

O Rei seria como uma entidade unificadora dos municípios, das províncias e das corporações autónomas, um Monarca Soberano agregador desse todo que é a Pátria, a Nação.

Antigo Brasão Cidade Viana do Castelo

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ENTREVISTA DA REAL GAZETA DO ALTO MINHO À EXMA. SENHORA DRA. ILDA ARAÚJO NOVO

A Vereação de Viana do Castelo, 2005

‘UMA VERDADEIRA DEMOCRACIA É E DEVE SER TENDENTE A LEVAR OS CIDADÃOS A PARTICIPAR NA GOVERNAÇÃO;’

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RGAM.-

É

eventos

presença

assídua

organizados

Associação

de

pela

Viana

do

em

IAN - As pessoas têm que sentir que

Real

podem influenciar a vida em sociedade,

Castelo.

Podemos concluir que é Monárquica?

IAN - O meu pai era monárquico. Devo conceder que também simpatizo com a causa monárquica e daí que tenha subscrito a petição de inclusão de Sua Alteza Real, o Duque de Bragança, no protocolo do Estado. Seria favorável a uma monarquia em Portugal, designadamente por estar ciente de que a Causa Real defende uma monarquia constitucional democrática, com limitação dos poderes do Rei, que não desempenha funções executivas, a exemplo do que sucede em algumas monarquias europeias.

RGAM.-

Exerceu

diversas

quer por acções, intervenções, quer pelo exercício do voto. O voto directo em todas as eleições poderia ser um factor determinante, bem como a criação de regras que tornassem o exercício do voto uma obrigação cívica, em vez de ser, como é actualmente, um direito dos cidadãos.

funções

públicas, designadamente deputada. Ao

exercer

essas

funções

influenciada

positivamente

consciência

de

era pela

correligionária

monárquica?

IAN - Tenho princípios de vida, por educação e formação, que me orientam no dia a dia e que tenho por positivos, sendo certo que muitos são comuns e afins à consciência monárquica.

RGAM.casos

Como

se

recentes,

pode

os

aferir

cidadãos

com estão

cada vez mais alheados e nalguns casos mesmo divorciados do sistema

Assembleia da Republica, Parlamento dos Jovens - Maio, 2019

RGAM. – Uma Monarquia não seria mais vantajosa para o país, uma vez que na chefia de Estado republicana existe

das

uma fulanização do cargo, enquanto

os

um Rei é institucional - a Coroa vale

representam. Como se pode reforçar a

independentemente da figura que a

representatividade

cinge?

político, instituições

das

pessoas

que

e

supostamente democrática

de

modo a colmatar esse afastamento?

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IAN - Reconheço que, como Chefe de

RGAM. – Não seria o municipalismo o

Estado,

caminho certo para uma verdadeira

o

princípio

Rei -

seria

sempre

independente

partidário.

Essa

distanciamento

e

-

em

supra

isenção traria

e

inegáveis

democracia, uma vez que atenuaria o centralismo tecnocrático do Estado,

vantagens para preservar os princípios

levava

básicos que devem ser inerentes a um

governação e atenuaria a indiferença

regime democrático, sem desrespeito

dos cidadãos para com as instituições?

pela

forma

como

republicana

exige

e

de

consagra

os

cidadãos

a

participar

da

governo, a

nossa

Constituição.

IAN - Uma verdadeira democracia é e deve ser tendente a levar os cidadãos a participar

na

governação;

qualquer

RGAM. – V. Exa. apresenta-se a votos

solução

nas

cidadãos das instituições será relevante

Eleições

Monarquia existia

Autárquicas.

Portuguesa,

uma

Ora,

até

democracia

na

1834,

orgânica,

uma vez que os conselhos municipais

para

que

permita

atenuar

as

aproximar

actuais

os

condições

governativas.

compostos por ‘vizinhos’ tinham larga capacidade política e desta forma, descentralizava-se o poder fazendo com que os munícipes tivessem voz através de representantes efectivos, livres, independentes. Não seria este modelo um exemplo a adaptar para os dias de hoje?

IAN - Entendo que o actual modelo pode

e

deve

ser

18 de Junho 2004, Cerimónia Outorga do Foral Vereadora

aperfeiçoado,

nomeadamente no que se refere a uma

RGAM. – Vivemos tempos de profundo

maior

maniqueísmo,

independência

financeira

das

e

autonomia

freguesias

face

às

Câmaras Municipais. Voltar ao regime dos conselhos municipais, pese embora lhe

reconheça

dificilmente actualmente.

seria

virtualidades, exequível

com

uma

concepção

dualista quase absoluta e que tende a dividir

a

antagónicos.

sociedade Não

completamente apartidário, agregadora?

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ser

em

poderia

campos um

Rei,

independente

e

uma

figura


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IAN - A imagem que transcende das

afabilidade e natural simpatia, pareceu-

monarquias vigentes na Europa é de

me uma pessoa ponderada, com um

estabilidade

constitucional,

preparação,

dedicação,

isenção,

espírito

de

missão. Consequentemente, quem, por convicção

ou

simpatia,

defende

ou

conhecimento profundo e pragmático da realidade portuguesa, revelando genuíno interesse pela procura de soluções para

aceita a causa monárquica, tem como

os

problemas

pressuposto que um Rei será uma figura

portugueses.

e

dificuldades

dos

socialmente consensual e, por maioria de razão, politicamente agregadora. RGAM. – Quer deixar uma mensagem RGAM.

O

Senhor

Dom

incansavelmente,

Duarte

final aos Monárquicos Portugueses?

enquanto

descendente dos Reis portugueses,

IAN - A Causa da Monarquia e do Rei

personifica,

deve,

Nação

como

secular

inclusive

fora

reconhecido

e

ninguém,

que do

é País

alvo

de

esta

Portugal, onde

é

inúmeras

manifestações

de

afeição

comunidades

portuguesas,

pelas por

no

meu

entender,

continuar

a

pugnar pela atribuição de funções de representatividade ao Chefe da Casa de Bragança,

S.A.R.

Dom

Duarte,

no

protocolo do Estado.

estrangeiros, pelos povos do antigo

A

Império,

histórica, em cerimónias oficiais, pelo

e

especificamente

pelos

representação

dinastia

Chefe

foi o primeiro a encabeçar a Causa de

indubitavelmente o reconhecimento da

Timor e a desenvolver uma enorme

importância que tem e deve ter na nossa

pró-independência

de

Timor Loro Sae como Presidente da Campanha Timor 87. Que opinião tem do Duque de Bragança?

Casa

nossa

Timorenses, que não esquecem que

actividade

da

da

Real,

será

sociedade. Assim sendo, decerto que influenciará positivamente

o

prosseguimento

dos

objectivos da Causa Real.

IAN - Tive oportunidade de privar com Sua Alteza Real, o Senhor Dom Duarte,

Muito Obrigado!

ainda que de forma breve, aquando da sua vinda a Viana do Castelo a convite

Entrevista realizada por Miguel Villas-Boas

da

para a Real Gazeta do Alto Minho da Real

autarquia,

altura

em

que

era

vereadora municipal. Além da notória

Associação de Viana do Castelo.

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PÁGINA 40 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

S. BARTOLOMEU DOS MÁRTIRES A DOUTOR DA IGREJA! CARLOS AGUIAR GOMES

Abstract

Résumé

Dom Frei Bartolomeu dos Mártires, Archbishop of Braga, who on horseback on a mule sought poor villages, was an example of humility, sobriety, charity, justice, tolerance, wisdom. His “Catechism” was famous, which parish priests should explain on Sundays to all the faithful, given their ignorance and that of their parishioners.

Dom Frei Bartolomeu dos Mártires, archevêque de Braga, qui à cheval sur une mule recherchait les villages pauvres, était un exemple d'humilité, de sobriété, de charité, de justice, de tolérance, de sagesse. Son «Catéchisme» était célèbre, que les curés devaient expliquer le dimanche à tous les fidèles, vu leur ignorance et celle de leurs paroissiens.

Key words: Frei Bartolomeu dos Mártires; Archbishop of Braga; Council of Trent.

Mots clés: Frei Bartolomeu dos Mártires; archevêque de Braga; Conseil de Trente.

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Quando andava no Liceu, talvez no 4º ano, “conheci” Dom Frei Bartolomeu dos Mártires, a partir de extractos que continha a Selecta Literária (o livro de leitura-literatura de Português) da “Vida do Arcebispo” de Frei Luís de Sousa. Talvez uma página desta obra. Mas uma página que me marcou até hoje e me fez admirar imenso este Arcebispo de Braga de quem nunca ouvira falar até essa altura. E fiquei fascinado… Um Arcebispo de Braga, a cavalo de uma mula, no rigor do Inverno transmontano, calcorreava caminhos ínvios à procura de aldeias pobres, negras, analfabetas e ignorantes das “coisas” de Deus! Não levava séquito pomposo nem abundância de víveres. Ia pobre como os pobres que ia visitar e ensinar. Pobremente morreu, partilhando sempre tudo, que era pouco por sua vontade, com quem nada tinha.

Vivia pobremente. E, por exemplo, disse directamente ao Papa que a baixela de prata em que eram servidas as refeições não ficavam bem e logo se comprometeu, e cumpriu, de lhe enviar um serviço de porcelana.

Adolescente, achava espantoso como um Senhor, Arcebispo de Braga, se deslocava assim, vivia assim e dava o exemplo a todos de uma vida austera mais consentânea com a sua condição de cristão. Mas era um intelectual do mais elevado gabarito, tanto quanto a sua humildade. Ficou-me gravada na memória a figura de Dom Frei Bartolomeu dos Mártires, um lisboeta (baptizado na hoje Basílica dos Mártires) que tinha optado pela vida frugal e desprendida dos dominicanos e que muito contrariado aceita a insistência da Rainha para ser o Arcebispo de Braga. Os meus leitores, que sabem muito mais do que eu sobre a vida e a obra deste grande Arcebispo de Braga, perdoar-me-ão de aqui exarar alguns dados conhecidos de todos O Concílio de Trento, grande acontecimento da vida da Igreja, teve, além do Papa, como grande protagonista o “Bracarense”, como era conhecido. A sua obra “Estímulo de Pastores” que escreveu para si, teve um sucesso enorme na altura e no II Concílio do Vaticano, quatrocentos anos depois, foi distribuído a todos os Padres conciliares. Ficou célebre o seu “Catecismo” que os párocos deveriam explicar aos Domingos a todos os fregueses, dada a suma ignorância destes e dos seus paroquianos! O “Bracarense” (como os actuais e futuros bracarenses se deveriam orgulhar deste epíteto dado ao mais extraordinário Arcebispo de Braga – não refiro os brilhantíssimos Antístites de Braga que deixaram marcas profundas. Dom Frei Bartolomeu dos Mártires atingiu outro patamar de santidade!), foi “canonizado” pelo povo, sobretudo entre os mais pobres da “Viana da Foz do Lima”, finalmente, a Igreja canonizou-o de facto em 10 de Novembro de 2019, pelo Papa Francisco, na Basílica de S. Pedro.

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PÁGINA 42 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Que exemplo é a sua vida, a oportunidade do seu saber plasmada em várias (p.e. “Estimulo de Pastores” e “Catecismo”) que ainda hoje são lidas e tidas como referências. S. Frei Bartolomeu dos Mártires merece ser declarado Doutor da Igreja!

Estátua de São D. Frei Bartolomeu dos Mártires inaugurada no ano de 2008 em Viana do Castelo. Busca representar uma figuras mais importante de região, pela sua dedicação aos pobres e doentes, notável participação e

Notas biográficas: Nasceu em Lisboa e aí baptizado (na igreja dos Mártires, saí o seu nome como frade dominicano) a 3 de Maio de 1514. Arcebispo de Braga de 1559 a 1582, tendo oferecido muita resistência em aceitar servir a Igreja como Arcebispo de Braga e Primaz das Espanhas (dignidade que defendeu tenazmente). Participou com grande actividade e eloquência em 1562 e 1563, respeitado por todos os Padres conciliares e pelo próprio Papa, no Concílio de Trento. Percorreu grande parte da sua imensa arquidiocese numa mula. Faleceu com 76 anos, em 16 de Julho de 1590 no Convento de S. Domingos, Viana do Castelo, que por ele foi mandado construir e onde repousam os seus restos mortais.

…Mas será preciso divulgar muito mais a vida e o exemplo deste grande Arcebispo de Braga, sobretudo, hoje, em que uma crise profunda abala os fundamentos da sociedade e a que a Igreja não escapa. S.

Frei

Bartolomeu

dos

Mártires

é

exemplo de humildade, de sobriedade, de caridade, de justiça, de tolerância, de

sabedoria

que

não

se

aloja

em

mentes egoístas … Como já escrevi acima, desde a minha adolescência que Dom Frei Bartolomeu dos Mártires me fascina. Que

riqueza

hoje

praticamente

inexplorada é a sua obra escrita! Tumulo Frei Bartolomeu Martires, Viana do Castelo

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REAL GAZETA DO ALTO MINHO

NOTA INFORMATIVA A Direcção da Real Associação de Viana do Castelo, com mandato para o triénio 2020-2023, cumprimenta V. Exas, desejando desde já a continuação de um bom ano de 2021. A Real Associação de Viana do Castelo tem um plano de actividades e orçamento para 2021, que inclui diversas iniciativas, que vão desde a organização de conferências à publicação da Real Gazeta do Alto Minho, órgão oficial de comunicação da Real Associação de Viana do Castelo, do qual muito nos orgulhamos, e que se pretende sejam executadas com a participação de todos os associados, simpatizantes e entidades que entendam colaborar, com o intuito de contribuir e ajudar a dinamizar o ideal Monárquico que todos nós abraçamos convictamente. Atendendo à necessidade imperiosa que temos em angariar recursos financeiros necessários ao normal funcionamento da Real Associação, e tendo em conta que uma das competências da Direcção é a cobrança de quotas, eu, em nome da Direcção e na qualidade de Tesoureiro, venho por este meio solicitar a V. Exas. a regularização da QUOTA DE ASSOCIADO REFERENTE ao ano de 2021, no valor de 20,00 € (vinte euros), preferencialmente por transferência bancária, para:

Titular da Conta: Real Associação de Viana do Castelo Entidade bancária: Caixa de Crédito Agrícola Agência: Ponte de Lima IBAN: PT 50 0045 1427 40026139242 47 Número de conta: 1427 40026139242 SWIFT: CCCMPTPL Caso seja possível, pede-se o favor de enviarem por e-mail (real.associacao.viana@gmail.com e amorim.afc@gmail.com) informação da regularização da quota (ex: comprovativo), após o que procederemos de imediato à emissão do recibo de liquidação. Cordiais cumprimentos e saudações monárquicas, Filipe Amorim Tesoureiro da RAVC

FICHA TÉCNICA TÍTULO: REAL GAZETA DO ALTO MINHO PROPRIEDADE: REAL ASSOCIAÇÃO DE VIANA DO CASTELO PERIODICIDADE: TRIMESTRAL DIRECTOR: JOSÉ ANÍBAL MARINHO GOMES REDACTOR: PORFÍRIO SILVA WEB: WWW.REALVCASTELO.PT EMAIL: REAL.ASSOCIACAO.VIANA@GMAIL.COM

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ZÉ MARIA, UMA PERSONAGEM INESQUECÍVEL ANTÓNIO MONIZ PALME

Abstract

Résumé

José Maria Lacerda e Megre, monarchist, member of the Real Associação de Viana do Castelo, fado singer and poet, an unavoidable figure in Ponte da Barca and in the old academy of Coimbra, was part of a group of independent people that in Porto brought together more than one thousands of supporters, to demand the resignation of Marcelo Caetano. In Coimbra, as a student, he was part of a group of independent monarchists who animated political academic life in this city. He was responsible for “O Povo da Barca”, where for six years, every two weeks, he enriched its pages with interesting editorials.

José Maria Lacerda e Megre, monarchiste, membre de la Real Associação de Viana do Castelo, chanteur de fado et poète, figure incontournable à Ponte da Barca et dans l'ancienne académie de Coimbra, faisait partie d'un groupe de personnes indépendantes qui, à Porto, ont amené réunissant plus d'un millier de supporters, pour exiger la démission de Marcelo Caetano. A Coimbra, en tant qu'étudiant, il rejoint un groupe de monarchistes indépendants qui animent la vie politique universitaire de cette ville. Il était responsable de «O Povo da Barca», où pendant six ans, toutes les deux semaines, il a enrichi ses pages d'éditoriaux intéressants.

Key words: Monarchist; fado singer; poet; writer.

Mots clés: Monarchiste; chanteur de fado; poète; écrivain.

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O meu companheiro inseparável de muitas dezenas de anos, José Maria das Neves Pimenta de Castro Lacerda e Megre, sem pedir autorização à Família e aos Amigos, resolveu partir para Deus, procurando um diferente género de felicidade e de paz, que aqui na Terra não existe. Tal, apesar de toda a sua vida ser um processo de explosões de alegria sem fim, de que todos os seus semelhantes beneficiaram e puderam livremente participar e auferir sem qualquer tipo de limitações. Enfim, em contra partida, com a sua trágica ausência, fomos invadidos pela tristeza e desolação. Fui companheiro do Zé Maria, no Liceu Passos Manuel, em Lisboa, com Ele peregrinei pelos bancos da Universidade de Coimbra, pelas paradas da vida militar e, finalmente, pelos encontros e desencontros da vida familiar e social, onde o Fado foi importante condimento. E poderia dizer muito mais sobre o meu velho e querido amigo, visto que, no cumprimento das suas obrigações militares, foi parar a Moçambique, levando consigo a Família, lá lhe nascendo um filho. Portou-se de modo exemplar, tanto como cidadão na luta pelo progresso da comunidade local, como na realização das tarefas militares de que foi incumbido. Foi magistrado e coordenador da Polícia Judiciária, dirigindo o respectivo Gabinete de Imprensa. Foi responsável pelo combate à droga, prendendo perigosos traficantes, muitas vezes com risco da própria vida, em operações de armas na mão. Recordo a sua amargura e desespero, quando ao seu lado, numa operação de madrugada, de espera a um perigoso

grupo de marginais da droga, o seu companheiro e subordinado Carvalho foi abatido com uma rajada de metralhadora, cerca do Museu dos Carros Eléctricos. Foi responsável pelo velho jornal “O Povo da Barca”, onde durante seis anos, quinzenalmente, enriquecia as suas páginas com interessantes editoriais. Não posso deixar de referir que o Zé Maria fez parte de um grupo de gente independente que, no Porto, reuniu mais de um milhar de apoiantes, para exigir que Marcelo Caetano se demitisse, única via para fazer mudanças radicais no País que impedissem uma revolução que já se adivinhava. Mas vou acabar por aqui a radiografia sem graça que todos os seres humanos contabilizam no fim das suas vidas. Vou sim falar do Zé Maria como figura incontornável tanto na sua Terra Natal, como na velha academia de Coimbra, na defesa da poesia portuguesa e dos costumes autênticos da nossa Pátria e, principalmente, na protecção e manutenção de uma sempre sã amizade com gente de todos os extractos socias e de todas as raças e feitios. Em Coimbra, onde gravou um disco, era meu companheiro de estudos, parceiro de frequentes serenatas, tocadas por mim à guitarra e pelo Zé Maria, à viola, participando ainda num grupo de gente da noite e de artistas, em que as ideias políticas e religiosas diferentes se entrecruzavam, sem uma beliscadura para qualquer um dos componentes da vadiagem intelectual noturna, tão útil para relaxar o espírito, mal encerradas as páginas das fatais sebentas. Grupo eclético esse, sempre a variar de componentes, lá

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calhando tropeçar com o eterno boémio e poeta Zeca Afonso, ou com o Adriano Correia de Oliveira, com a sua diferente e sublime voz ou com os fiéis acompanhantes de estúrdia, de discussão política e até de assaltos a incautas capoeiras da vizinhança, nomeadamente o popular grupo dos “mosquiteiros” e companhia Lda.

Mas o Zé Maria não era apenas isso. Ele defendia os poetas portugueses que eram ouvidos e amados pelo Povo, livre de preconceitos e dos ditames culturais em moda, despojado da burguesinha vergonha das falsas maiorias ou seitas culturais e sociais. A defesa por si feita da figura e da poesia de Pedro Homem de Melo não pode ser esquecida. Numa fase em que a politicagem se utilizou

de intelectuais medíocres, que tentavam dominar e vaguear pelo mundo da hipocrisia cultural, o Zé Maria, frontalmente, como o Cid Campeador, transmitindo a maneira de sentir do Povo Português, levantou o gládio bem alto, atrevendo-se a publicar várias edições da poesia do vate minhoto e de trazer a sua poesia para a ribalta das plateias públicas e para as páginas da imprensa descomprometida. O poeta de Cabanas, apesar de não ser aceite pela escumalha pseudo intelectual de então, vendida à baixa política, nunca parou a sua actividade de poeta... O Zé Maria fez frente corajosamente aos poetastros medíocres que por aí vagueiam, de letras grossas e de rimas mal acabadas, dando razão ao Povo simples para quem Pedro Homem de Mello é um dos melhores poetas do seu tempo e que o Povo entende perfeitamente e espontaneamente canta. A má vontade igualmente se revelou contra a memória do poeta sampedrense, António Correia de Oliveira, que também teve a defesa intransigente do Zé Maria e dos seus “compagnons de route” das Artes e das Letras. Recordo que Pedro Homem de Mello foi injustamente saneado do estabelecimento de ensino, onde dava aulas, e da Televisão, onde dirigia um espectacular programa de folclore, com um recorde de audiência fora do vulgar. Pois bem, apesar da sua actuação contra a corrente, isto é, contra o politicamente correcto, o seu Club dos Poetas Vivos sobreviveu galhardamente a todas as arremetidas que a baixa política ensaiou.

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Mas, além de tudo, o Zé Maria tinha uma facilidade de comunicação fora do vulgar. No meio de um grupo desconhecido, minutos passados era o centro das atenções e o interlocutor de histórias divertidas que ia improvisando consoante o grau cultural dos ouvintes. As suas histórias de Coimbra entraram já na mitologia da Lusa Atenas. O mesmo se passando com os seus passes de surpresa, que encantavam quem o escutava. As histórias em que o nosso Zé Maria é herói são muitas, contudo não posso deixar de relatar pelo menos três episódios muito diferentes e que espelham a sua rica personalidade. Grande efervescência em Coimbra, antes do 25 de Abril, pois um grupo quis levar, para uma conferência, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, o jornalista e intelectual Augusto Abelaira. Contudo, o director da altura, Prof. Doutor Miranda Barbosa, não permitiu tal, pois quem escolhia os conferencistas, com determinada antecedência, era um conselho para tal nomeado. Perante a fúria e os protestos desse grupo académico, o lente Pacheco de Amorim veio rapidamente ao encontro dos desejos desses descontentes e cedeu as instalações de um Instituto de Coimbra, de que era dirigente. E a tempestade passou. Claro que determinado sector político da academia, convocou uma Assembleia Geral, no Palácio dos Grilos, então sede da Associação Académica, para criticarem o Prof. Miranda Barbosa. Mas rebentou-lhes a castanha na boca, pois a maioria dos presentes, onde se incluía o Zé Maria, só permitiam a referida censura se ao mesmo tempo se homenageasse Pacheco de Amorim.

A rapaziada cripto comunista não contava com este passe de magia e vieram com um ar ingénuo, alegar docemente que o agradecimento calava mais fundo no coração de cada um, se fosse silencioso. Claro que a resposta não se fez esperar, explicando um dos oradores que a censura, igualmente, calava mais fundo no mais profundo silêncio. A Censura teria muito mais efeito feita no íntimo de cada um, afirmava-se, alto e em bom som!!! Claro que o problema azedou e alguém injuriou politicamente o orador que usava a palavra e que não gostou nada que o tivessem chamado fascista ou coisa do género. Recordo que em campos opostos, entre os vários oradores estava a minha pessoa, o José Luís Nunes e o Zé Maria. O colega ofendido atirou-se de cabeça para cima do ofensor. Troca de murros à antiga portuguesa e o Sr. Chico da Académica, com a sua longa experiência neste género de situações, cortou a luz. Os componentes da Assembleia apenas tinham a luz da porta de saída, por onde, na verdade, acabou por desaparecer toda a rapaziada. No dia seguinte, juntou-se muita gente à porta da Faculdade de Letras e começaram alguns a dar morras a Miranda Barbosa e outros Vivas a Pacheco de Amorim. Aos vivas e aos morras, as cenas de pugilato estavam iminentes no meio da confusão da entrada da Faculdade de Letras. Devo lembrar que havia uma reunião de ranchos folclóricos promovida pela Secção de Folclore da Académica. Eis senão quando, propositadamente, aparece o Zé Maria a chefiar o rancho de Ponte da Barca, com o Manel Ceguinho à cabeceira, de acordeão em riste, a tocar um animado vira, seguido de todo rancho a dançar,

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tendo como primeiro par o Zé Maria e uma bonita dançarina. Entraram dentro do pátio de entrada sempre a dançar o vira. As raparigas puxavam os rapazes estudantes para dançarem e os elementos masculinos as raparigas. Foi um sucesso. As ameaças das previsíveis cenas de violência bem depressa de desvaneceram, perante aquele refinado apontamento de folclore, que invadiu a Faculdade de Letras. Foi um sucesso. O Manel Ceguinho, um invisual certificado, nem se apercebeu do perigo que correu. A maioria gostou e a intervenção do Zé Maria acabou com aquela estúpida divisão, calando uma minoria que apenas pretendia tirar dividendos políticos da situação. Um segundo apontamento, que não posso deixar de referir, passou-se em Coimbra, no tempo da outra Senhora. Numa das sessões dos Estudos Doutrinários, realizados em Coimbra, muitos estudantes ficaram deslumbrados com as posições políticas tomadas por Francisco Sousa Tavares, um monárquico independente, mal visto pela situação e pela própria oposição nomeadamente devido a um projecto de Constituição Monárquica, por si feita, para o Povo Português. Claro que esse projecto foi imediatamente apreendido pela polícia política antes de sair da tipografia. Mas sempre acontece circularem à socapa alguns exemplares, à revelia da censura. Eu fui um dos felizes que conseguiu obter a Constituição do Tareco, popular alcunha do grande advogado e político Francisco Sousa Tavares, casado com a poetiza, Sophia Mello Breyner Andresen. Esse novo grupo de monárquicos independentes animaram a vida política académica de Coimbra.

Mais tarde, nos idos de sessenta, Francisco Sousa Tavares, acompanhado da mulher, a poetisa autora da “Menina do Mar”, foi convidado para falar sobre qualquer matéria, cujo título preciso já não recordo. A Sua Mulher foi sentada em lugar de destaque, na primeira fila, sendo premiada com um enorme e lindíssimo ramo de flores, debaixo do carinho e admiração de todos os presentes. Claro que alguns monárquicos independentes também apareceram. Eu próprio, o Zé Maria, o Guilherme Almeida Coutinho de Vouzela, o Honório Pinto da Costa, irmão do presidente do F. C. do PORTO e, pelo menos o Ilídio, de Trás-osMontes, onde tem feito a sua vida como advogado. Ora bem, perante tanta gente para o ouvir, Francisco Sousa Tavares não resistiu, na sua dissertação, em fazer uma viva crítica à situação política de então. Começámos a ver que estavam uns ouvintes que se não sentavam e pareciam estar de vigilância à porta do salão, vestidos com umas gabardines bem características, escondidos nas golas sebentas levantadas e que, se não faziam parte da indumentária crónica da polícia política, até parecia!!! Empurravam quem passava perto para terem livre o campo de acção. Mal acabou a sessão, vimos que o drama ia acontecer. O orador monárquico ia ser preso com pernas e tudo, atendendo às divagações verbais, pouco consentâneas com o regime, feitas em público. Imediatamente corremos para junto dele e pegámos o magro e esguio canastro de Sousa Tavares, pelas pernas, levantando-o e transportando o nosso Mestre como quem leva um pálio, num andor da procissão da Rainha

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Santa. De rompante, passámos rapidamente com aquela carga humana, pela porta de saída, ultrapassando os espantados pides, apanhados de surpresa. Cá fora, Sousa Tavares não se calou, continuando a gesticular e correndo o risco de se desequilibrar do alto daquele estranho suporte de admiradores. O escândalo já era grande com os presentes a protestarem. Os Pides desapareceram, mas foram prontamente substituídos. Um grupo de polícias apareceu em cena, naturalmente chamado para prender os apoiantes do orador, pois quando os cavalheiros das gabardines tentaram apear Sousa Tavares dos nossos ombros, nós não permitimos, distribuindo pontapés a torto e a direito. Ao mesmo tempo, a doce poetiza, seu cônjuge, dava fortes batidas na cabeça dos agentes de gabardine com o farfalhudo ramo de flores antes recebido. Claro que os policiais chegados usaram outros expedientes, enchendo-nos o físico de pancadas de cassetete, pois estávamos impedidos de nos defender, para não deixar cair o andor humano que transportávamos. Os paisanos presentes começaram a protestar contra a polícia e, por encanto, apareceu um salvador milagroso com uma viatura automóvel, onde se meteu o casal, desaparecendo a toda a velocidade. E lá ficámos nós a sós com as nossas meditações e com uns galos na cabeça e nódoas negras distribuídas pelo físico. O Honório protestava pelas bastonadas recebidas e já pensava queixar-se a qualquer organização internacional, enquanto os companheiros de aventuras lhe diziam que já estava em idade de apanhar umas boas bordoadas pelos lombos

abaixo. As autoridades nem nos deram a importância de nos prender para não aumentar o escândalo que já vogava de vento em popa. Abandonaram-nos à nossa sorte. Até era uma ofensa!!! Na verdade, nunca fomos presos por motivos políticos, a não ser por assédio a vistosas galinhas só das capoeiras conhecidas. Nisso fazíamos questão. Não nos metíamos com uma qualquer franga de pescoço pelado de qualquer proveniência. Uma espécie de snobismo galináceo. E para finalizar os episódios sobre as graças repentinas e graciosas do saudoso Zé Maria, recordo que nas comemorações da Criação do Concelho de Vizela, para animar a multidão de milhares de pessoas que festejava o novo Concelho, os antigos estudantes de Coimbra de Vizela, nomeadamente a escritora, Srª Drª Maria José Pacheco, e o Sr. Eng.º Adelino Campante, fizeram que a Comissão de Festas convidasse o Grupo de Fados “Coimbra Eterna”, da Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra, do Porto, para ultimarem as variedades apresentadas, durante todo o dia e toda a noite de 19 de Março, na praça pública a regurgitar de gente. Lá foi o grupo de fados, comigo e o Arménio Assis à guitarra, à viola o Manuel Campos Costa e o Juiz Conselheiro, Mário Araújo Ribeiro, e como cantores Eng. Napoleão Amorim, Prof. Doutor Henrique Tomás Veiga, Zé Archer de Carvalho e o nosso Zé Maria Lacerda e Megre. Acabada a Serenata, como o público não parasse de pedir mais e continuasse a bater freneticamente as palmas, o grupo cantou a bonita melodia “Coimbra tem mais encanto na hora da despedida”. O último verso, cantado pelo Zé Maria, foi

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porém dito com outra letra, com grande surpresa do gigantesco auditório:- “Vizela tem mais encanto na hora da Autonomia”. Calculam o que aconteceu…. Um sentimental e inocente Fado de Coimbra, transformado numa canção de intervenção política. Foi o fim do mundo. O Povo Vizelense ainda hoje em dia recorda essa facécia coimbrã do saudoso Zé Maria. Serenata de Homenagem aos dirigentes da Académica, na Casa da Beira Alta, no Porto; Da esquerda para a direita: António Moniz Palme e Assis e Santos à guitarra e Zé Maria Lacerda e Megre à viola.

Partida, com o Orfeão Académico de Coimbra, para os Estados Unidos; Da esquerda para a direita: Padre Paredinhas, Zé Maria Lacerda e Megre, Nuno Tavares, António Moniz Palme e Luis Loureiro. Homenagem ao Senhor D. Duarte Pio, no Castelo da Vila da Feira: Canta a dupla José Maria Lacerda e Megre e António Moniz Palme.

Sessão de Fados de Lisboa, na Casa da Mariquinhas; Zé Maria Lacerda e Megre à viola e António Moniz Palme à guitarra.

Homenagem a José Archer de Carvalho; 1º Plano: Paulo Alão à viola, António Moniz Palme e Octávio Sérgio à guitarra; 2º Plano: José Maria Lacerda e Megre, Henrique Tomás Veiga e Nuno Oliveira.

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OS VINHOS DE VIANA E O VINHO DO PORTO UMA PROPOSTA DE INTERPRETAÇÃO * MANUEL CARDOSO

Abstract

Résumé

In the Middle Ages Minho wines, known as Vinhos de Viana because they were exported from the Viana bar in Foz do Lima, gained international fame due to several factors, including that of having benefited from the quality of the climatic period called Optimum Climatic Medieval in that average temperatures were as high or higher than today. Its decline in quality followed the drop in temperature and the climatic irregularity that occurred with the so-called Little Ice Age, accentuated especially since the 16th century and especially in the so-called Late Maunder Minimum, from 1675 to 1715, in which rainfall persistent, dry, long and cold winters, storms and floods have also caused other problems such as the silting up of the Viana do Castelo bar. The decline of Viana wines was gradually accompanied by the rise of wines exported from Porto, coming from various parts of the Douro and other parts of the country, called Port Wine because it was exported from the bar of this city. This transition took place coinciding with the final decades of the 17th century and the beginning of the 18th century.

Au Moyen Âge, les vins du Minho, connus sous le nom de Vinhos de Viana parce qu'ils étaient exportés du bar Viana à Foz do Lima, ont acquis une renommée internationale grâce à plusieurs facteurs, dont celui d'avoir bénéficié de la qualité de la période climatique appelée Optimum Climatique Médiéval en que les températures moyennes étaient aussi élevées ou plus élevées qu'aujourd'hui. Sa baisse de qualité fait suite à la baisse de température et à l'irrégularité climatique survenues avec ce qu'on appelle le Petit Age Glaciaire, accentué surtout depuis le XVIe siècle et surtout dans le Minimum de Maunder tardif, de 1675 à 1715, au cours duquel les précipitations persistent, les hivers secs, longs et froids, les tempêtes et les inondations ont également causé d'autres problèmes tels que l'ensablement du bar Viana do Castelo. Le déclin des vins de Viana s'est progressivement accompagné de l'essor des vins exportés de Porto, provenant de diverses parties du Douro et d'autres régions du pays, appelés Vin de Porto car exportés depuis le bar de cette ville. Cette transition a eu lieu coïncidant avec les dernières décennies du XVIIe siècle et le début du XVIIIe siècle.

Key words: Wines from Viana; Monção; Ribeira Lima; Basto; Cima Douro; Port Wine; Optimum Climatic Medieval; Little Ice Age; Late Maunder Minimum.

Mots clés: Vins de Viana; Monção; Ribeira Lima; Basto; Cima Douro; Porto; Optimum Climatique Médiéval; Petit âge glaciaire; Minimum de Maunder tardif.

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Desde a nossa Primeira Dinastia, quiçá antes, que os vinhos do Entre-Douro e Minho foram exportados pela barra de Caminha e, sobretudo, pela barra de Viana do Castelo, então Viana da Foz do Lima, de onde há mesmo a referência da expedição duma pipa para as cerimónias de entronização dum Bispo de Inglaterra em 1295! Já antes, 1261, está documentada a produção de vinhos de qualidade em Monção. Esses vinhos, que seriam predominantemente tintos, gozavam de sólida reputação e evoluíram até ao fim da Idade Média de tal modo que chegaram a ser considerados tão finos e apaladados como os de Borgonha, evolução essa a que não foi estranha a acção dos monges beneditinos e de Cister. A produção assegurava quantidades que satisfaziam o autoconsumo e o negócio local e sobravam para ser comercializadas para fora: para o Porto, para Lisboa, para o estrangeiro, sobretudo para Inglaterra, tendo-se estabelecido uma feitoria inglesa em

Viana da Foz do Lima com actividade também em Monção, que comprava e fazia embarcar vinhos provenientes sobretudo desta última vila e da Ribeira Lima (Ponte de Lima, Arcos de Vale de Vez, Ponte da Barca). As zonas de produção foram-se estendendo e a acção de prospecção de fornecedores por parte dos negociantes foi-se especializando tendo chegado mesmo a haver vinhos de Basto e de Riba Douro a ser expedidos por aquela cidade costeira do Minho. Com a segunda metade do século XVII assistirse-á ao declínio do movimento por Viana e suceder-lhe-á o Porto, sendo a data de ponto de não retorno a de 167778, tornando-se tal inevitável devido a políticas administrativas e fiscais que beneficiaram sobretudo os ingleses nesta última cidade, a tratados internacionais, à preferência dos exportadores por vinhos de outro perfil e ainda às dificuldades de acostagem e navegação no porto de Viana, cujo cais terá sido danificado por mau tempo

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várias vezes e as vias de navegação assoreadas também várias vezes, uma das quais em 1709 e após despesas e trabalhos de correcção anteriores. Apesar disto, os vinhos de Monção continuaram a ter procura e eram feitos transportar em lanchas de cabotagem de Caminha e Viana para o Porto, sendo apreciáveis as suas quantidades mesmo em 1730, já com um florescente movimento de vinhos do Cima Douro para a barra deste rio, com trato pelos mercadores e taberneiros do Porto e de Gaia aos estrangeiros que os exportavam. O que acabámos de escrever é consensual entre os autores António Barros Cardoso, Charles Sellers, Aurélio de Oliveira, Gonçalo Maia Marques, Anselmo Mendes e muitos outros que, mais profundamente do que eu, estudaram e publicaram trabalhos, teses, artigos e livros sobre o assunto dos Vinhos Verdes. Queremos pedir a atenção para que esta fase da história dos Vinhos Verdes, da Idade Média até aos setecentos, seja considerada em três períodos distintos: um que dura cerca de três séculos, XIII, XIV e XV, em que se estabelece de forma segura a produção de vinho do Entre Douro e Minho com exportação sobretudo por Viana, um vinho sobre o qual não há referência de defeitos; o dos séculos XVI e parte do XVII, ao longo dos quais a sua qualidade se terá pouco a pouco deteriorado, em que os comerciantes começam à procura de outras fontes de vinho tentando manter as que tradicionalmente são fornecedoras e demandando ainda a barra de Viana mas em que está já documentada a existência de diferentes tipos de vinho, denotando-se diferenciação entre vinhos de

diferentes perfis; o do final do século XVII e do início do século XVIII, em que se assiste ao declínio da produção de vinho do Entre Douro e Minho para exportação e a sua “substituição” pelos vinhos do Cima Douro e do Porto, em rápida expansão, sendo que se estabelece a feitoria inglesa no Porto e passa a haver a presença dum Cônsul residente. Para tal declínio são apontadas guerras e devastações, fugas das populações e abandono dos campos e das vinhas, problemas de navegação na barra de Viana, medidas discricionárias que beneficiaram os ingleses no Porto e uma misteriosa e não identificada doença que teria afectado as vinhas do Minho. Charles Sellers no seu Oporto Old and New resume redutora:

de

forma

“In

eloquente

course

of

mas

years

the

exports of wine from the Province of Minho ceased because that from the Douro

region

furthermore,

was

many

of

preferred; the

Minho

wines succumbed to a disease of wich we have no details”.

Os vinhos então conhecidos como “vinho de Viana” terão sido de muitos perfis. Para gozarem da fama de “comparáveis aos de Borgonha”, os “maduros de Monção” seriam diferentes dos de hoje e, na sua maioria, tintos. Eram conhecidos, tal como os de Ribadavia, por serem “vinhos parduscos” isto é, feitos com uvas brancas e tintas. A sua qualidade fê-los ganhar distinção e notoriedade a ponto de terem valor de exportação para a Inglaterra, a Flandres (o flamengo Clenardo, no século XVI, a viver em Portugal, referese-lhes positivamente como “vinhos de estalo”!), a Alemanha, a Terra Nova e o Rio de Janeiro. Aguentaram-se em

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competição com os vinhos do Douro, tendo Thomas Woodmass, citado por Gonçalo Maia Marques, afirmado: “os vinhos de Monção e de Viana são muito

judiciosamente

tidos

como

muito similares aos da Borgonha (…) paguei pouco

muito de

igualava

mais

Borgonha com

o

caro

por

que

que,

um

não

por

se

muito

menos dinheiro, bebi em Viana”. É a

partir dos finais do século XVI que surge a designação de vinho verde para outra categoria de vinhos, também exportada por Viana. Tinham baixo valor alcoólico, frescura natural, mas com sabor “um pouco ao agraço” por serem feitos de “uva mal sazonada”. Eram despachados em grande quantidade para as armadas e tabernas por serem mais baratos e comparáveis aos amarais (do latim amarus, amargo), sendo designados pelos ingleses de eager wine ( in old English

and

old

French

the

word

eager – aigre – meant sour or sharp ).

Era o verde de ramo, dito azedo por Sá de Miranda, e que teve grande comercialização para marinheiros e trabalhadores rurais, a par dos de melhor qualidade para as classes mais abastadas. Nos conventos era o vinho dos trabalhadores rurais e que era vendido para fora. Quem negociou muito destes vinhos de Viana já na segunda metade do século XVII foram os Bearsley, estabelecidos primeiro em Viana e, depois, no Porto.

Após alguns pioneiros, terá sido Job Bearsley a partir de 1659 quem se terá interessado em mais larga escala pelos vinhos durienses (“calibrados” com aguardente pelos mercadores e taberneiros do Porto pelo menos desde 1610, quando se deu um recrudescimento do seu comércio após anos de estagnação), com paladar mais ao gosto preferido pelos seus clientes ingleses. A pouco e pouco foram crescendo as quantidades de vinho preparado no Porto e em Gaia por si adquiridas e exportadas e cada vez mais decrescendo as de vinhos de Viana, com a excepção de se manter ininterrupto o interesse pelo de Monção. Os Bearsley percorreram bem o Minho, subindo o Lima nos barcos de água-arriba até Ponte de Lima e, depois, a cavalo ou noutro meio de transporte ficaram a conhecer bem os produtores da Ribeira Lima e de Monção. Empreenderam mesmo uma ou mais incursões ao Douro a partir de Viana e, tomando conhecimento da região, essa informação terá pesado nas decisões empresariais da família que chegou a adquirir, algumas décadas depois, uma quinta nesta região. As rotas comerciais de então estavam estabelecidas e a comunidade estrangeira de Viana tão bem implantada, com Vice-Cônsul residente, que durante anos houve várias tentativas e obras para o conserto dos cais e desassoreamento da barra mas a natureza terá repetido, em maus invernos quase sucessivos, os estragos que inviabilizaram a sua utilização segura por navios de maior porte. Pelo que a atractividade do Porto, para a qual contribuiu também a política fiscal, como dissemos, acabou por levar a melhor. Podemos resumir que a

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ascensão do vinho do Porto se dá com o declínio do vinho de Viana pela alteração verificada nos perfis destes vinhos, pelos benefícios fiscais dados no Porto e por uma questão de navegabilidade e comunicações. Os Bearsley, tal como outros, viveram nessas realidades e tiveram de tomar decisões. O primeiro dos três períodos a que nos referimos acima, em que o vinho verde, pardusco ou tinto, ganhou notoriedade e passou a ser exportado, coincide com o chamado óptimo climático medieval em que as temperaturas foram superiores à média e houve chuvas e estações amenas e regulares. Cremos que tal foi particularmente bom para a agricultura e, nomeadamente, a viticultura, excepto alguns anos pontualmente irregulares. A actividade agrícola e económica em geral ganhou um grande incremento durante o óptimo climático medieval e ainda se manteve durante quase um século após, beneficiando da experiência das culturas entretanto implantadas (houve entretanto a ocorrência calamitosa da peste negra em diversos surtos mas não nos vamos ocupar agora dessa perturbação). No segundo período, nos séculos XV e, sobretudo, XVI, o clima foi fortemente alterado, agravaram-se as condições da chamada Pequena Idade do Gelo sentida por toda a Europa e a que não escapou o Noroeste Peninsular, as temperaturas desceram e muito, as estações passaram a ser irregulares e com anomalias climáticas frequentes com chuvas a estender-se até Julho e anos de seca extrema em que as árvores secaram. A regra passou a ser uma grande imprevisibilidade devido a uma grande irregularidade e variabilidade térmica e pluviométrica.

Houve muitos anos em que as chuvas prolongadas impediram trabalhos agrícolas em Maio, Junho e Julho! Os verões passaram a ser frescos com picos de temperaturas extremas, muitos anos chuvosos ou com falta de chuva a ponto de que “ as viñas se secassem por el estio e falta de agua ”. Ora, para

a fotossíntese e para a maturação das uvas exige-se uma amplitude de temperaturas entre 10°C e 35°C, que os terrenos tenham boa drenagem e que o stress hídrico não ultrapasse a tolerância de cada casta. Por isso esse período terá feito com que as uvas não amadurecessem completamente em todos os locais e daí, cremos, não ser coincidência que a expressão vinho verde

e

eager

wine

e

as

suas

características tenham surgido a partir do século XVI e tenham perdurado. Porque esses anos de temperaturas médias mais baixas e clima mais rigoroso e anómalo durou até meados do século XIX. Aliás, agravou-se especialmente no período em que estamos focados, que temporalmente ocorre de finais do século XVII e início do século XVIII, acima referido, conhecido na história do clima como o Mínimo de Maunder Tardio, de 1675 a 1715, em que as colheitas foram irregularíssimas, houve cheias frequentes, Primaveras e Outonos frios, Verões amenos ou mesmo frios, anos de secas estivais prolongadas em Setembro e Outubro e anos de chuvas persistentes que não deixaram amadurecer os frutos. O ano de 1694 ficou conhecido como o da grande seca e o de 1709 como o do grande Inverno. Tudo isto cremos que não será coincidência nem alheio às mudanças verificadas na produção e comércio de vinhos nos séculos XVII e XVIII. O

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declínio do vinho verde dessa época e a ascensão do vinho do Cima Douro, onde o clima é mais quente porque com maior influência continental e mediterrânica do que o do atlântico Entre Douro e Minho e onde as condições extremas terão tido menos impacto nas vinhas, foi em boa parte o produto de tais irregularidades climáticas que, vividas pelos comerciantes e repercutidas na qualidade dos vinhos, os obrigaram a decidir ano a ano em face das melhores ou piores, neste caso bem piores, vindimas no Entre Douro e Minho. Não terá sido uma disease a acontecer no Minho, como referia Charles Sellers, mas terá sido o clima, um clima que não terá devastado todas as vinhas, mas terá comprometido muitas e sucessivas vindimas.

Diagrama esquemático da variação da temperatura global nos últimos 1000 anos (Folland et al., 1990).

Esta proposta de interpretação sobre o declínio do vinho de Viana e, como tal, dos Vinhos Verdes há quatro e três séculos é falível, evidentemente, mas merece alguma atenção e discussão para o presente já que, estando agora nós num período em que há um aquecimento global e as temperaturas voltam a ser da ordem das que ocorreram durante o óptimo climático

medieval, surge uma oportunidade climática para tentar recuperar algumas das características que terão estado na base da fama antiga e internacional, que vem do tempo da nossa primeira dinastia!, dos vinhos tintos de Entre Douro e Minho. Em gabinetes de estudos das empresas deve ter havido esta consideração para alguns dos investimentos que têm estado, ultimamente, a ser feitos na região. Não será fruto do acaso que algumas castas em determinados terroirs e geografias apareçam a desafiar o status quo . O terroir é o mesmo de há quinhentos e de há mil anos, haverá que adequar a biologia ao climat que se adivinha para os próximos tempos. Numa leitura rápida poder-se-á logo questionar: então se a Pequena Idade do Gelo terminou em meados do século XIX, por que não recuperaram os vinhos verdes as suas características anteriores, entretanto? Não sabemos a resposta mas há desde logo variáveis em hipótese a considerar para discussão – e uma discussão interessante!: a implantação e tipo da vinha, os sistemas de condução e o facto, de suma importância, de que desde a segunda metade do século XIX as castas no Entre Douro e Minho obrigam a porta-enxertos para a sua sobrevivência e isso terá alterado, e muitas vezes de forma cega, tanto para o melhor como para o pior, a expressão fenológica e as características produtivas da videira… mas tal ficará para discussão de especialistas, que ouvirei ou lerei atentamente.

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Bibliografia

consultada

para

a

redacção deste artigo:

-Francisco Girão, um inovador da vitivinicultura do Norte de Portugal, Vol. I e II, coordenação de Nuno Magalhães, edição da Fundação Francisco Girão, 2011; -Vinhos Verdes, a região, a História e o Património, António Barros Cardoso, ed. Município de Ponte de Lima, 2016; -La Pequeña Edad de Hielo en Galicia: Estado de la cuestión y Estudio Histórico, Camilo Fernández Cortizo, Universidad de Santiago de Compostela, in Obradoiro de Historia Moderna, n.º 25, 9-39, 2016; -Alterações Climáticas e Agricultura, Dionísio Afonso Gonçalves, Tomás de Figueiredo e António Castro Ribeiro, in Revista da APH, n.º 110, 30-33, 2012; -Do vinho de Deus ao vinho dos Homens: o vinho, os Mosteiros e o Entre Douro e Minho. Gonçalo Maia Marques. Dissertação de Doutoramento em História. Faculdade de Letras da Universidade do Porto. FCG. 2011; -O Sector dos Vinhos no Entre Douro e Minho nos tempos do Antigo Regime, Aurélio de Oliveira, FLUP, 2012, disponível em pdf online; -Os vinhos no Porto, Aurélio de Oliveira, in Douro, Estudos e Documentos, Vol. I (3), 1997 (2.º), 45-70; -Os Vinhos em Portugal (1300-1820), Aurélio de Oliveira, comunicação apresentada no Congresso internacional VIII Seminario Iberoamericano. Viticultura e Ciencias Sociales, universidade de Talca, Janeiro 2006, disponível online;

-Estrangeiros, Vinhos de Viana e Vinhos do Porto (Séculos XVII - XVIII), António de Barros Cardoso, Revista Iberoamericana de Viticultura, Agroindustria y Ruralidad, vol. 4, núm. 12, septiembre-, 2017, pp. 163-179. Universidad de Santiago de Chile; -Oporto Old and New, Charles Sellers, ed. Herbert E. Harper, London, 1899; -Metz : une « ville du vin » confrontée au petit âge glaciaire à la fin du Moyen Âge (v. 1400-1540), Laurent Litzenburger, Extrait de : Patrick Demouy (dir.), Les Boissons, éd. électronique, Paris, Éd. du Comité des travaux historiques et scientifiques (Actes des congrès nationaux des sociétés historiques et scientifiques), 2014. Disponível online; -Variações climáticas do passado: chave para o entendimento do presente? Exemplo referente a Portugal (16751715), Maria João Alcoforado, UL, in Territorium 6, 1999. Disponível online; Agradeço à Doutora Anabela Ramos algumas pistas bibliográficas importantes que me indicou.

* O autor publicou este artigo no Blog “A drive in my country” https://adriveinmycountry.blogspot.com/20 21/09/os-vinhos-de-viana-e-o-vinho-doporto.html

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TENDÊNCIAS GLOBAIS NA GESTÃO DE PESSOAS DEPOIS DA PANDEMIA GONÇALO SAMPAIO E MELO

Abstract

Résumé

People as resources are naturally invaluable assets of an organization but as the world of work evolving every year, also happens to the HR Landscape . For a business to be successful all companies are obligated to enhance their workforce by aligning their human resource strategies with the latest top 6 trends. With the advancement in technology, the HR departments have been digitally transforming over the years. The COVID 19 pandemic has compelled HR professionals to respond to critical business priorities, handle fluctuations in the workforce, and harness the latest technologies. With millennials and Gen Z, employers worldwide are in demand of tech-powered ways to manage, recruit, and engage their employees. The trends of artificial intelligence, datadriven new strategics etc. will drive the HR management in 2021 to improve employee engagement to boost a business.

Les personnes en tant que ressources sont naturellement des atouts inestimables pour une organisation, mais comme le monde du travail évolue chaque année, cela arrive également au paysage RH. Pour qu'une entreprise réussisse, toutes les entreprises sont obligées d'améliorer leurs effectifs en alignant leurs stratégies de ressources humaines sur les 6 dernières tendances. Avec les progrès de la technologie, les services RH se sont transformés numériquement au fil des ans. La pandémie de COVID 19 a obligé les professionnels des RH à répondre aux priorités critiques, à gérer les fluctuations de la main-d'œuvre et à exploiter les technologies. Avec la génération Y et la Z, les employeurs du monde entier sont à la recherche de moyens technologiques pour gérer, recruter et s'engager. Les tendances de l'intelligence artificielle, des nouvelles stratégies basées sur les données, etc. conduiront la gestion des ressources humaines en 2021 à améliorer l'engagement des employés pour dynamiser une entreprise.

Key words: Human Resources; Pandemy; trends; Management.

Mots clés: Ressources humaines; pandémie; Tendances; administration.

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Somos seres de metamorfose ininterrupta e no tempo atual, pelo qual um certo nível de tensão é esperado para que novos significados possam fluir, a gestão de pessoas resume-se a movimento e transformação. A mesma tensão que desorganiza também organiza gerando criatividade, caos ou sabedoria. As práticas de Recursos Humanos (RH) têm de ser mais impactantes do que nunca para podermos manter os negócios atualizados, as empresas proactivas. Atrair e formar de certa maneira novos talentos é o grande impulsionador de crescimento.

1.

Preparação da Força de Trabalho

O aperfeiçoamento das habilidades para desenvolver a competência do seu colaborador é um desafio prioritário. As empresas devem incentivar os seus funcionários a aprimorarem o seu nível

de qualificação e tendo em consideração o ambiente tecnológico em rápida mudança. Ter experiência em apenas um campo não favorece o encontro com novas valências. Para extrair o melhor da equipa é decisivo o trabalho colaborativo até porque incentiva a eficiência e a produtividade. As exigências ocorridas levaram as empresas a transitar para o trabalho remoto que, sem dúvida, oferece melhor flexibilidade sem induzir repercussões na produtividade. No entanto, a constituição de equipas virtuais não faz sentido se indissociável de uma preparação e manutenção presencial, o que evidencia a relevância das soluções que estimulam o trabalho em equipa para maximizar os resultados a partir de um relacionamento sempre melhor. Os novos hábitos indicam será cada vez mais frequente o trabalho remoto e flexível suscitado pelo aproveitamento recente da tecnologia, mídia social e plataformas de comunicação.

2.

Inteligência Artificial

Uma forma de aperfeiçoar a cultura da empresa é aumentar a experiência dos seus colaboradores. As tecnologias baseadas em AI continuarão a aumentar em todo o setor de gestão de

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pessoas, o que tem uma ampla gama de impactos. A Inteligência Artificial (AI) tem diversas áreas de aplicação, por exemplo o Machine Learning as a

3.

Service

e-recrutamento de aceitar ou não candidatos á escolha de planos de benefícios e vantagens no local do trabalho ao planeamento de eventos ou avaliação de desempenho. O uso de métricas e análise de dados fornece informação mais objetiva e pode atenuar o efeito de suposições. Existe uma grande quantidade de informação que pode ser medida. A implementação de um conjunto de métricas relevantes pode fornecer uma visão sobre a eficiência e o impacto da workforce uma vez dividida em três

(MLaaS) ,

que

pode

ser

incorporado às novas tecnologias de RH redefinindo todas as suas funcionalidades. Gradualmente a IA esta a ser implementada para substituir agentes humanos de atendimento ao cliente. Apesar de esses ‘bots’ estarem preparados para responder a perguntas economizando custos ainda é necessária a presença de uma equipa de atendimento presencial. Usar a AI elimina a necessidade de responder a perguntas repetitivas libertando os membros da equipa para responde a perguntas mais complexas, consequentemente, manter os clientes satisfeitos. Como em outros departamentos os profissionais de RH devem tomar dezenas de decisões cujo impacto na direção da empresa pode ser determinante para conseguir vencer num ambiente cada vez mais competitivo e dinâmico. O constante desenvolvimento organizacional é elemento essencial de mudança pelo que é inadiável alinhar a cada momento os processos internos com a estratégia. Uma gestão de RH baseada em dados permite equipar a organização com habilidades e conhecimento para prosperar.

Estratégias Data-driven

A implementação de estratégias datadriven influencia a qualidade desde o

dimensões; (1) Métricas de performance (2) métricas de workforce e (3) métricas de recrutamento.

A função de RH deve através da sua transformação digital otimizar a eficiência operacional, recorrendo à análise de dados para simplificar ou mesmo automatizar operações de gestão. A escolha de soluções ajuda a gestão a expandir o seu leque de aplicações automatizar tarefas para melhorar a eficiência de equipas permitindo estas se focarem em tarefas de maior valor acrescentado.

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dimensões pelas quais as organizações podem gerir a transição para as expectativas da geração Z e dos millennials .

Muitas empresas desesperadas com a saída de talentos desenvolvem programas de trainees com o intuito

4.

Estruturas organizacionais Mais

Planas

As estruturas socio-organizacionais devem agora ser mais planas, com menor distância hierárquica. Como uma liderança que possa prosperar num ambiente mais multifuncional e colaborativo, e assim beneficiar de uma menor burocracia, melhor comunicação e capacidade de tomar decisões. Naturalmente os níveis de responsabilidade são mais elevados em organizações planas, matriciais, reduzindo níveis excessivos de gestão. Também proporciona um ambiente de trabalho mais flexível e ajuda a reter colaboradores talentosos. Os jovens desejam horários mais ajustáveis para terem uma vida social. Percebendo deste facto as empresas vão começar a reajustar a sua política de regime de trabalho pois se permanecerem inflexíveis tendem a perder talento. É um desafio interminável melhorar a experiência de trabalho. Pois estes esperam desfrutar, sempre nesta era de digitalização, de uma experiência melhor. Á medida que nos vamos aproximando do ‘ Talent Cliff ’ devem as organizações se preparar para a reforma de grande parte da força de trabalho da história. Coaching , Mentoring ,

e job

shadowing

são as

destes adquirem boas práticas para impactar positivamente o negócio. É importante desenvolver estratégias que possam garantir que as novas gerações entre na força de trabalho. Espera-se que os estilos de liderança evoluam para permitir que os colaboradores tragam novos conhecimentos para a organização.

5.

Equilíbrio de género - Liderança

O líder ‘herói’ destrói a criatividade da equipa. A crença que o líder pode fazer tudo melhor que ninguém acaba por ser a causa da inibição da produtividade da workforce . A pessoa mais inteligente deve agora procurar resposta no grupo dos seus subordinados diretos. O facto de existirem diferenças de género tem sido comprovado que a representação feminina em equipas de liderança melhora os resultados das organizações. Para as mulheres a comunicação é antes de mais uma ferramenta para aperfeiçoar as

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conexões sociais. Para criar relacionamentos, são genericamente mais expressivas. Em termos gerais os homens usam a linguagem para exercer domínio e alcançar resultados mais objetivos e tangíveis. Estas diferenças de género não diferem apenas na maneira com comunicamos, mas também na maneira como tentam influenciar. Foi comprovado que a forte representação feminina num programa de desenvolvimento de liderança bemsucedido as diferenças entre homens e mulheres complementam-se em termos de táticas de influência e tem implicações resultantes dos estereótipos no local de trabalho. Importa orientar para o desenvolvimento de habilidades sociais, pois à medida que o papel de um líder migra para equipes de gestão de diversos membros, heterogéneas, com diferentes habilidades técnicas e áreas de especialização, haverá maior ênfase na necessidade desses líderes desenvolverem suas ‘habilidades pessoais’, tipos de habilidades incluem inteligência emocional, criatividade, adaptabilidade e gestão de tempo Os funcionários podes aprender até as mais difíceis tarefas, as habilidades especificas necessárias para cumprir a sua função, mas habilidades sociais e interpessoais são aprendidas com o tempo. Investir no desenvolvimento de formação de habilidades sociais resulta no aumento do potencial de liderança e desempenho no trabalho. À medida que a função de RH gravita para o centro das organizações os diretores de RH são chamados para as decisões gerais, para criar modelos operacionais

que impactem financeiros.

6.

os

resultados

Transformação digital

Nos últimos tempos tivemos que nos adaptar para resistir num contexto inesperado de uma crise de saúde sem precedentes. Os gestores de RH devem agora ser a força motriz nesta acelerada transformação digital. Devem ser protagonistas dotados de soluções tecnológicas de RH aprimoradas e ampliadas no que diz respeito à inteligência artificial. O Barómetro Kaizen RH demonstra que hoje as organizações focam-se na preparação do capital humano para diferentes cenários de médio e longo prazo enquanto que antes de pandemia tinham como prioridade a retenção de talento. Digitalizar processos e formar colaboradores pelo que empresas mais tradicionais tem que investir em formar colaboradores para que cada um destes se sinta capaz de usufruir de ferramentas de trabalho remoto. Não basta aproveitar de cada colaborador o seu ponto forte e preciso saber adaptar o uso da tecnologia a cada faixa etária de maneira a assegurar uma transformação diária para atingir níveis de desempenho económico e financeiro de excelência. Pro-atividade na gestão de mudança é a tendência-chave para enfrentar os

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desafios futuros e atuar de forma sustentável. Para uma adaptação rápida aos novos tempos e desafios. Conclusões

Nestes dois anos as organizações viram se forçadas a mudar a forma de trabalhar, de servir e de comunicar com os clientes. Quase de um dia para o outro este momento disruptivo alterou o funcionamento interno e externo das empresas e as suas prioridades. Os sistemas de trabalho á distância foram acelerados e impulsaram novos hábitos. Oito em cada dez empresas prepara-se para aderir a um sistema híbrido com dias de trabalho remoto e outros presenciais. Mas quais os desafios que esta nova dinâmica vai trazer? O pontochave para um regime funcionar é a

garantia de uma comunicação eficiente e bem coordenada. 70% dos colaboradores dizem que ainda não dominam as novas habilidades exigidas. Os processos devem ser agilizados pela AI, com uma reengenharia que permita um serviço mais rápido, com foco no valor entregue ao cliente e suprimindo tempos e tarefas de desperdício do lado dos colaboradores. Por último devemos medir, envolvendo cada equipa e cada indivíduo na identificação e concretização de oportunidades. Devemos implementar uma estratégica de análise de dados que para aumentar a performance e evidenciar a importância de cada área para os resultados da organização.

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A PRIMEIRA VISITA DE D. PEDRO A VÍTOR HUGO HUMBERTO PINHO DA SILVA

Abstract

Résumé

On a trip he made to Europe, D. Pedro II wanted to personally meet Vítor Hugo, a notable writer, whom he admired and appreciated. Vítor Hugo refused the Emperor's invitation, in an impolite way, however, D. Pedro II did not give up and went to visit him himself. They talked for two hours and when they left, Vítor Hugo was fascinated by the friendliness and simplicity of D. Pedro. Although Vitor Hugo was a convinced republican, he was delighted, and since then he has become a great friend of the Emperor.

Lors d'un voyage qu'il a fait en Europe, D. Pedro II a voulu rencontrer personnellement Vítor Hugo, un écrivain remarquable, qu'il admirait et appréciait. Vítor Hugo a refusé l'invitation de l'Empereur, d'une manière impolie, cependant, D. Pedro II n'a pas abandonné et est allé lui-même lui rendre visite. Ils ont parlé pendant deux heures et quand ils sont partis, Vítor Hugo a été fasciné par la gentillesse et la simplicité de D. Pedro. Bien que Vitor Hugo fût un républicain convaincu, il était ravi, et depuis il est devenu un grand ami de l'Empereur. Mots clés: D. Pedro II; Vitor Hugo; Paris.

Key words: D. Pedro II; Vitor Hugo; Paris.

O livro: “Vitor Hugo chez lui”, inclui a curiosa visita, realizada pelo Imperador, a 22 de Maio de 1877, ao célebre poeta. Não li a obra, mas a tradução, que Ramalho fez a 30 de Julho, para a “Gazeta de Noticias”; mais tarde incluída, pela Livraria Clássica Editora, em: “Notas de Viagem”. D. Pedro II desejava, ardentemente conhecer Vítor Hugo, em pessoa, mas receava comparecer em sua casa. Resolveu, então, pedir-lhe, através da embaixada brasileira, se lhe dava a honra de o vir visitar. Respondeu-lhe Vítor Hugo, que não ia a casa de ninguém.

Combinaram, todavia, encontrarem-se no Senado; mas também não se concretizou. Uma manhã, pelas nove horas, o Imperador, pôs de parte o receio e o protocolo, e bateu timidamente, à porta da casa de Vítor Hugo. Segundo a tradução livre de Ramalho, o encontro decorreu deste jeito: - “Peço-lhe Sr. Vítor Hugo, que me diga uma palavra de animação; acho-me cheio de timidez”- disse D. Pedro”. O poeta ofereceu-lhe, gentilmente, um fauteuil.

D. Pedro II agradeceu, e continuou:

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- “Sentar-me em um fauteuil ao lado de Vítor Hugo, eis o que verdadeiramente me produz o efeito de ocupar um trono.” E falando das monarquias, prosseguiu: “É preciso, não queremos demasiadamente mal aos meus colegas: são homens de tal forma rodeados, de tal modo traídos, por tal forma enganados, que na verdade eles não podem pensar como a gente pensa.” Ao que Vítor Hugo, respondeu: Oh! Vossa Majestade é único...felizmente!” Como D. Pedro mostrasse gosto de conhecer a família, Vítor Hugo mandou chamar os netos, que como avô, dedicara-lhes o livro: “L'Art D'être Grand-Père”: “Jeanne (menina de olhos azuis, que o poeta amava enternecidamente) apresento-te o Imperador do Brasil.” E logo de seguida: - “Tenho a honra de apresentar, meu neto Jeorge.” O Imperador fez-lhe um carinho, e: - “Aqui, meu jovem amigo, não há senão uma majestade; é a do seu avô.” E virando-se para Jeanne: - “Queres dar-me o prazer de me abraçar?...” Deu-lhe a face para o Imperador beijar. - “Então?... vamos, abraça-me tu, que é o que eu te peço!” Jeanne (a medo) abraça o pescoço de D. Pedro. - “Bastará – Jeanne, bastará! Creio que não quererás dar o luxo de começar o teu dia esganando um Imperador!...” A conversa continuou: Contou-lhe, o poeta, a sua vida e seus hábitos, em Paris: todos os dias após o almoço dava uma volta pela cidade, no

alto de um ómnibus. Prazer que o Imperador não podia... - “Privado, eu, de trepar ao alto dos ómnibus. Mas de modo algum! É precisamente no alto dos ómnibus que eu tenho o meu lugar - um lugar de imperial.” - Disse D. Pedro. Vítor Hugo interroga-o se não receava sair tanto tempo do Brasil: - “Não: eu sou substituído no Brasil por gente que vale tanto e que vale mais de que eu. Além do que, não perco o meu tempo aqui. Reino sobre um povo jovem e é principalmente em o esclarecer, em o guiar, em o melhorar, em o fazer progredir que eu desejo usar dos meus direitos...Ou antes...Não me exprimi bem...Eu tenho direitos. Do que uso apenas é do poder que recebi do acaso, da sorte e da herança da família.” Vítor Hugo amaciando a voz: - “A família de Vossa Majestade é venerável. Vossa Majestade é um filho de Marco Aurélio.” O aprazível encontro durou meio-dia. D. Pedro foi convidado a jantar, no dia seguinte. Vítor Hugo oferece-lhe o último livro, com dedicatória: “A D. Pedro de Alcântara, Vitor Hugo.” Depois desta visita, a família de Vítor Hugo, tornou-se grande amiga do Imperador. Os diálogos apresentados, foram transcritos, literalmente do livro: “Vitor Hugo chez lui”, segundo a tradução livre de Ramalho Ortigão.

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RECORDANDO O DR. JOSÉ MARIA DE LACERDA E MEGRE MARTA PIMENTEL FERREIRA E AUGUSTO DE MAGALHÃES SANT’ANA

Abstract

Résumé

We remember José Maria de Lacerda e Megre, an enthusiastic monarchist and great promoter of the traditions of Ponte da Barca, who died on August 14.

Nous nous souvenons de José Maria de Lacerda e Megre, monarchist enthousiaste et grand promoteur des traditions de Ponte da Barca, décédé de 14 août.

Key words: José Maria de Lacerda e Megre; monarchist; Ponte da Barca.

Mots clés: José Maria de Lacerda e Megre; monarchique; Ponte da Barca.

A morte do Dr. José Maria de Lacerda e Megre, ocorrida no dia 14 de Agosto, leva-nos a rememorar o grande barquense e monárquico entusiasta que vai deixar um vazio insubstituível entre os que com ele conviveram.

Nascido em Ponte da Barca a 14 de Novembro de 1939, aí passou a sua infância até acompanhar a família para Lisboa quando o pai foi colocado no Ministério da Justiça. Mais tarde foi estudar para a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra onde seu pai, também licenciado em Direito, já estudara. Nesta cidade frequentou os meios académicos e ganhou o gosto pelas suas tradições, nomeadamente o fado coimbrão. Fez a sua vida profissional como Magistrado e Coordenador na Polícia Judiciária do Porto até à aposentação. Oriundo de família numerosa, era também pai de cinco filhos. No entanto, toda a vida se considerou um barquense e sempre lutou pela divulgação de Ponte da Barca onde quer que se encontrasse. Recordamos a realização das reuniões do “Clube dos Poetas Vivos”, na Casa do

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Correio-Mor, que levaram muitos intelectuais à Vila, bem como a sua colaboração assídua com os jornais locais, nomeadamente “O Povo da Barca” de que foi Director. Editou mesmo um livro com as múltiplas crónicas escritas para este jornal. Amigo de Pedro Homem de Mello, também editou os manuscritos inéditos deste autor, além de outras publicações de vário teor. Não faltava aos passeios organizados pela Real Associação de Viana do Castelo e às múltiplas manifestações monárquicas, sempre com o entusiasmo que lhe era conhecido.

O folclore local e o fado de Coimbra também o acompanhavam para todo o lado com a alegria de viver que lhe era tão característica. A missa de sétimo dia, celebrada na Matriz da Barca, foi um exemplo disso mesmo, com a participação de testemunhos dos filhos e entoação de baladas de Coimbra pelos familiares. Com o desaparecimento do Dr. José Maria de Lacerda e Megre, a Ponte da Barca ficou mais pobre.

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NA POLÍTICA, MUDAM-SE OS TEMPOS, MANTÊM-SE AS ATITUDES A PROPÓSITO DA OBRA A QUEDA DE UM ANJO, DE CAMILO MARIANA DE MAGALHÃES SANT’ANA

Abstract

Résumé

Camilo’s work, despite having been written 155 years ago, continues to reflect national politics.

L’œuvre de Camilo, bien qu’elle ait été écrite il y as 155 ans, continue de refléter la politique nacionale.

Key words: Politics; Camilo Castelo-Branco.

Mots clés: Branco.

Politique;

Camilo

Castelo-

O recente período de eleições autárquicas trouxe-me à memória o livro de Camilo Castelo-Branco “A Queda de um Anjo”, escrito em 1866. Resolvi, pois, revisitá-lo. O herói da história, Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda, morgado da Agra de Freimas, é um honrado fidalgo transmontano, defensor acérrimo dos bons costumes. Casado com a sua segunda prima D. Teodora Barbuda de Figueiroa, morgada de Travanca, mulher de pouca beleza, mas “ muito apontada em amanho de casa ”, Calisto

Elói passa os dias na biblioteca a ler clássicos.

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“fermentou

Ora,

na

mente

dos

principais lavradores e párocos das freguesias do círculo eleitoral a ideia de levar ao Parlamento o morgado da Agra de Freimas. Os deputados eleitos até àquele ano, no círculo de Calisto Elói, eram coisas que os constituintes realmente

não

tinham

enviado

ao

congresso legislativo. Pela maior parte, os

representantes

dos

mirandeses

tinham sido uns rapazes bem-falantes, (..) gente conhecida pela figura desde o botequim até S. Carlos (...). Em geral, aquela juventude esperançosa, eleita por Miranda e outros sertões lusitanos, não sabia topograficamente em que parte

demoravam

comitentes,

nem

aborígenes

das

mais

os

povos

entendia serranias

necessidades

que

seus

que

os

tivessem

fazerem-se

representar, obrigados pelo regímen

Com muita graça, Camilo introduz no Parlamento, um rival à altura de Calisto, o Dr. Libório, deputado pelo Porto, homem que fala com um tais floreados que se torna quase ininteligível. É nesta disputa que Calisto Elói passa a ser uma estrela nas Cortes. “Eu direi a V. Exa. qual eloquência considero necessária nesta casa da Nação: é a eloquência que a Nação entenda. A arte de bem falar, ars bene dicendi,

é

o

estudo

da

clareza

no

exprimir a ideia. Os afectos, as galas da

linguagem,

que

lhe

tolhem

o

mostrar-se e dar-se a conhecer dos rudos, não é arte, é tramóia, não é luz, é

escuridão.

Os

mandaram-me

meus aqui

constituintes falar

das

necessidades deles em termos tais que por

eles

V.

Exa.

e

a

Câmara

lhas

conheçam, ponderem e remedeiem.”

da constituição.”

Ainda hoje, os candidatos dos principais partidos aos vários círculos eleitorais continuam a ser os mesmos “rapazes bem-falantes”, que desconhecem as terras que vão representar. Nestas eleições autárquicas, multiplicaram-se os exemplos de candidatos a Câmaras sem qualquer ligação ao município. O que interessa é lançar um nome sonante, que capitalize votos. Seguindo com a história de Camilo, o herói Calisto é mesmo eleito deputado e segue para as Cortes em Lisboa. Aí, depara-se com um mundo totalmente avesso à sua educação: “eu entro a desconfiar que a besta do Apocalipse já

tem

três

pés

bem

ferrados

no

Parlamento! Quando lá meter o quarto pé, a gente escorreita é posta fora da sala a coices.”

Adaptado da capa do livro “A Queda dum Anjo, Editora Martin Claret.

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Quantas vezes escutamos as respostas dos nossos governantes às perguntas dos deputados, dos entrevistadores ou do povo que os interpela e pensamos, falou, falou e não disse nada? Pelos vistos, já era assim há 155 anos. Mas eis que a influência dos pares e os males de amores, começam a influenciar o nosso herói. “Sarmento,

Por outro lado, já não se ouve no parlamento a eloquência dos tempos de Camilo, e há quem não se prive de proferir insultos directos em mau português. Passados 155 anos, “A Queda de um Anjo” continua a ser uma excelente rábula da vida política nacional.

com delicada liberdade, observou a preponderância que os costumes de Lisboa iam actuando sobre o ânimo do seu bom amigo. Sentiu que os ruins exemplos

vingassem

quebrantar

aquela admirável singeleza de trajo e maneiras que o morgado trouxera da sua

província.

Lamentou

que,

em

menos de três meses, o modelo do português

dos

bons

tempos

se

baralhasse com os usos modernos e viciosos.”

Depois de ficar famoso pela sua luta pelos povos da província, contra os interesses do Governo, Calisto Elói acaba por passar de legitimista a governamental. “Explicou a profissão da sua nova fé, respeitando as crenças políticas dos seus antigos correligionários. Disse que escolhia fileiras

o dos

seu

humilde

posto

governamentais,

nas

porque

O Anjo antes da queda © Correio do Minho

era figadal inimigo da desordem, e convencido estava de que a ordem só podia mantê-la o poder executivo, e não

mantê-la,

senão

defendê-la

Nota

para consolidar as posições, obtidas contra os cobiçosos delas.”

Quantos políticos conhecemos nós que num dia defendem uma ideia, e no seguinte o seu contrário? Mais uma vez, as últimas eleições autárquicas foram profícuas em trocas de cadeiras.

A obra encontra-se sob domínio público ao abrigo do art.º 31 do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (70 anos após a morte do autor), pelo que pode ser encontrada gratuitamente na internet.

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COMEMORAÇÃO DOS 30 ANOS DA REAL ASSOCIAÇÃO DE BRAGA - DIA 15 DE OUTUBRO ÀS 21H:30M Auditório da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva em Braga 1. Intervenções do Presidente da Direcção da Real Associação de Braga, Gonçalo Pimenta de Castro, e do Presidente da Assembleia Geral, António Brochado Pedras, sobre o papel desta Real Associação no Distrito de Braga, na defesa do ideal monárquico e da Família Real Portuguesa. 2. Concerto com o duo de violino e piano, elementos da Orquestra Príncipe da Beira - OPB. Duração prevista sessenta (60) minutos.

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CONCURSOS ESCOLARES A IMPORTÂNCIA DO RECONTRO DE VALDEVEZ PARA A FORMAÇÃO DE PORTUGAL

No âmbito da política de gradual desconfinamento adotada pelo XXII Governo Constitucional, e no caminho da retoma das actividades económicas, sociais e culturais, designadamente o regresso ao ensino presencial com a abertura do ano lectivo 2021/2022 entre os dias 14 e 17 de Setembro, a Real Associação de Viana do Castelo e o Grupo de Estudos do Património Arcuense (GEPA), anunciam a abertura dos concursos escolares, suspensos no ano lectivo anterior, devido à Covid 19. Assim, no seguimento do sucesso alcançado com os Concursos Escolares anteriores, que decorreram nos anos lectivos 2015/2016 e 2017-2018, a Real Associação de Viana do Castelo, procurando contribuir para a defesa da identidade nacional e para o reforço da fidelidade à matriz histórica de Portugal, através da consciencialização do património cultural português e da identidade nacional, o Centro de Estudos Adriano Xavier Cordeiro, criado pela Real Associação de Viana do Castelo propõe-se realizar, em colaboração com o Grupo de Estudos do Património Arcuense (GEPA), no ano lectivo 2021/2022 três Concursos, abrangendo os alunos do ensino básico (1.º, 2.º e 3.º Ciclos escolaridade), ensino secundário e profissional do “Distrito de Viana do Castelo”. Os concursos arrancarão oficialmente no dia 15 de Outubro de 2021, e o tema globalizador para o próximo ano é “ A importância do Recontro de Valdevez para a formação de Portugal ”.

Os trabalhos deverão ser entregues entre os dias 17 de Janeiro e 22 de Abril de 2022, na Biblioteca da Escola, ao cuidado do professor responsável. Viagem no Tempo… A IMPORTÂNCIA DO RECONTRO DE VALDEVEZ PARA A FORMAÇÃO DE PORTUGAL dirigido aos alunos do 1.º e 2.º Ciclo do Ensino Básico que terão de completar a frase “ O Recontro de Valdevez foi importante para a Formação de Portugal porque… ” Prémios: 1.º Prémio , conta poupança no valor de 300,00€; 2.º Prémio , conta poupança no valor de 200,00€; 3.º Prémio , conta poupança jovem no valor de 100,00€ e Diploma de Participação. Um concurso para ti: A IMPORTÂNCIA DO RECONTRO DE VALDEVEZ PARA A FORMAÇÃO DE PORTUGAL – dirigido aos alunos do ensino básico (do 3.º Ciclo do Ensino Básico, Ensino Secundário e Profissional) do distrito de Viana do Castelo para apresentação de trabalhos (individuais ou em grupo) sobre o tema. Prémios: 1.º Prémio , conta poupança no valor de 500,00€; 2.º Prémio , conta poupança no valor de 300,00€; 3.º Prémio , conta poupança jovem no valor de 150,00€ e Diploma de Participação.

SETEMBRO 2021


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Prémio Europeu de Excelência: “A IMPORTÂNCIA DO RECONTRO DE VALDEVEZ PARA A FORMAÇÃO DE PORTUGAL” – dirigido aos alunos do ensino básico (do 3.º Ciclo do Ensino Básico, Ensino Secundário e Profissional) do distrito de Viana do Castelo para apresentação de trabalhos (individuais ou em grupo) sobre o tema. Prémio : Deslocação a Bruxelas e ao Parlamento Europeu do(s) aluno(s) vencedor(es). Este Prémio, atribuído pelo Eurodeputado Nuno Melo, inclui a deslocação, alojamento e refeições, extensivos ao(s) professor(es) responsável(eis) pelo acolhimento do concurso no estabelecimento de Ensino até ao número máximo de dois docentes e Diploma de Participação.

Anúncio 2022.

do(s)

Vencedor(es) :

Junho

de

Entrega de Prémios : 30 de Novembro de 2022 (passível de alteração em função da evolução da situação pandémica).

Para consultar o regulamento e os prémios dos concursos basta clicar em cima da imagem do mesmo.

Para mais informações contactar a organização: real.associacao.viana@gmail.com info@gepa.pt https://gepa.pt/

SETEMBRO 2021



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