Introdução a Filosofia II

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Filosofia (do grego philos - amor, amizade + sophia - sabedoria) modernamente é uma disciplina, ou uma área de estudos, que envolve a investigação, análise, discussão, formação e reflexão de idéias (ou visões de mundo) em uma situação geral, abstrata

Originou-se da inquietação gerada pela curiosidade

interpretações

comumente

aceitas

sobre

a

sua

própria

realidade. As interpretações comumente aceitas pelo homem constituem

inicialmente

o

embasamento

de

todo

o

conhecimento. Estas interpretações foram adquiridas, enriquecidas e repassadas de geração em geração. Ocorreram inicialmente através da observação dos fenômenos naturais e sofreram influência das relações humanas estabelecidas até a formação da sociedade, isto em conformidade com os padrões de comportamentos éticos ou morais tidos como aceitáveis em

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humana em compreender e questionar os valores e as

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

ou fundamental.


nenhum espetáculo é mais atraente para o homem do que o próprio homem. HOMEM

Em sentido amplo, homem é qualquer membro da espécie o

humana. Assim ele é entendido pela filosofia e abordado, em cada

homem, para que faças

um de seus aspectos particulares, pela biologia, antropologia,

caso dele, para que te

história, medicina e outras disciplinas que o têm por objeto. A tarefa

ocupes dele, para que o

de definir homem, consiste em procurar respostas para algumas

inspeciones cada manhã

perguntas essenciais: qual a natureza ou a essência do homem?

e o examines a cada

Como se distingue ele dos outros seres orgânicos, especialmente

momento?" "O homem

dos animais superiores? Essa distinção é essencial e absoluta, ou

é a medida de todas as

apenas uma variação de grau? Qual o lugar do homem no mundo?

coisas." "Muitas são as

Qual sua missão ou seu destino? Como se relaciona com Deus ou

coisas

com absoluto?

"...

Que

é

grandiosas

dotadas de vida, mas a Abordagem filosófica

mais grandiosa de todas é o homem." A primeira dessas

três

frases

é

A noção ocidental de

uma das perguntas que

homem

como

dirige

a

Deus;

a

como ponto

indivíduo de

tem

partida

o

segunda, uma reflexão

pensamento

do

grego

Sócrates e Platão, cada ente só

Protágoras; e a terceira, uma fala da tragédia Antígona, de

pode ser definido se todos os

Sófocles. A elas poderiam reunir-se milhares de outras sobre o

seres

mesmo tema, de todas as épocas e civilizações, o que mostra que

classificados

nada preocupa tanto o homem quanto a condição humana, e

articulações

pensador

do

ontológicas.

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grego.

universo

estiverem

segundo lógicas Definir

Para

um

certas e ente

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consiste então em tomar a categoria à qual ele pertence e situar

Na concepção judaico-cristã, o homem também se acha

essa categoria no lugar ontológico que lhe corresponde. Esse lugar

suspenso entre dois mundos: o finito e infinito, o que opõe em uma

ontológico é determinado por dois elementos de caráter lógico: a

mesma natureza a insignificância e a imensa grandeza. Afirma

categoria próxima e a diferença específica. Por eles se chega à

Pascal que "... a natureza do homem pode ser considerada de duas

definição de Aristóteles: o homem é um animal racional. Animal é a

maneiras: uma, segundo seu fim, e então é grande e incomparável;

categoria próxima, na qual se inclui o homem; racional é a

outra, segundo a multidão, como se aprecia a natureza do cavalo e

diferença específica, por meio da qual se distingue conceitualmente

do cão, e então é abjeto e vil. Esses são os dois caminhos que

os homens dos outros animais. Para a filosofia grega, o homem é

levam a julgamentos tão diversos do homem, e a tantas discussões

um "ser racional", ou melhor dito, um animal que possui razão. Essa

dos filósofos."

definição implica dizer que o homem é uma coisa cuja natureza Abordagem biológica

consiste em poder dizer o que são as outras coisas. Ou seja, a razão permite ao homem definir-se e definir o conjunto do universo. Os gregos admitem que o homem tenha sido "formado", e

Para as ciências naturais, a dificuldade de definir o que

também que sua formação tenha obedecido a condições especiais

seja "homem" consiste em escolher entre dois pontos de vista: o da

em relação aos demais seres, mas rejeitam a hipótese da criação. A

estrutura anatômica e o que se refere às faculdades reflexivas. No

visão do homem como ser criado é comum ao judaísmo e ao

primeiro

cristianismo e exerceu forte influência sobre todas as concepções

animalidade; no segundo, estaria pairando sobre o mundo, isolado

filosóficas relacionadas com essas religiões e também com o

da natureza. Uma definição mais abrangente e completa de homem

islamismo. O homem seria, então, uma criatura, ou seja, um ser

deveria levar em conta, portanto, tudo o que nele seja suscetível de

cuja realidade não é própria, mas que foi criado "à imagem e

constatação positiva, isto é, além da conformação anatômica, é

semelhança de Deus", o que lhe confere superioridade em relação

preciso considerar a faculdade de pensar. Dessa dupla abordagem

aos outros seres. Para os gregos, o homem vive em dois mundos: o

se depreende a originalidade do fenômeno humano.

caso,

o

homem

encontrar-se-ia

imerso

em

sua

mundo sensível, que ele apreende pelos sentidos, e o mundo

O mais exterior dos caracteres humanos é sua tênue

inteligível, que apreende pela razão, e onde se confirma sua

diferenciação morfológica, dada por especializações anatômicas (a

realidade como ser racional.

face menor que o crânio, a postura vertical etc.) e fisiológicas (o desamparo em que se encontra o ser humano nos primeiros meses

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de vida, a sexualidade aperiódica etc.). Mesmo assim, dentro dos

funções de equilíbrio e suporte do corpo na posição ereta; membros

critérios adotados pela biologia para classificar os seres vivos, pode-

inferiores hipertrofiados, adaptados para o andar bípede; membros

se dizer que, por sua estrutura orgânica, o homem não pode aspirar

superiores mais curtos e aperfeiçoados, com mãos grandes e

senão a um lugar modesto na taxionomia animal: ele pertence ao

preênseis, dotadas de dedos curtos e polegar oponível; nariz

subfilo dos vertebrados, à ordem dos primatas e a uma família

saliente com pontas e asas bem desenvolvidas; ausência completa

formada por um único gênero, Homo. Mas outra característica

de

zoológica do homem evidencia prontamente sua originalidade: a

secundário no corpo, exceto na cabeça, regiões axilares e púbica e

capacidade de expansão e conquista. Apesar da homogeneidade do

no rosto dos adultos masculinos; e presença de lábios cheios,

grupo humano, o homem conquistou em relação ao conjunto do

evertidos e membranosos.

pêlos

táteis

ou

tentáculos;

escassez

acentuada

de

pêlo

globo um sucesso vital sem precedentes, que se explica, pelo Abordagem antropológica

menos em parte, pela aparição, com o homem, de uma nova fase na história da vida: o uso de instrumentos artificiais, mais uma característica do fenômeno humano.

A classificação dos seres vivos proposta por Lineu e

As tentativas de inserir o homem dentro da ordem dos primatas não primam pela precisão, uma vez que as diferenças de detalhes são complexas e controversas. O tamanho, e mais ainda, a complexidade do cérebro humano em relação ao dos primatas nãohumanos constitui o principal ponto de diferenciação anatômica. A postura

ereta

é

também

um

aspecto

importante.

Outras

características anatômicas que distinguem o homem dos outros primatas,

seja

dos

macacos

antropóides,

seja

dos

primatas

inferiores, além do tamanho absoluto e relativo do cérebro, são: o pé, que serve de suporte e não é preênsil; o primeiro dedo do pé, que não é oponível; os maxilares, de tamanho reduzido e pouco salientes; a ausência de caninos salientes e interpostos; curva lombar, bacia e pelve formadas ou modificadas para atender às

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George-Louis Leclerc Buffon, no século XVIII, permitiu pela primeira

variedade de ambientes naturais e possibilita, dentro das limitações

vez integrar o homem numa série zoológica e estudá-lo pelo

ambientais, tipos de vida que tanto podem resultar de uma escolha

método das ciências naturais. A espécie Homo sapiens faz parte do

como de uma determinação psicológica interna. A herança cultural é

gênero Homo, o que deixa aberta a possibilidade de existência de

a

outras espécies. O próprio gênero Homo pertence à família dos

aprendizagem. A cultura se transmite sob forma de padrões

hominídeos, à ordem dos primatas, à classe dos mamíferos, ao

explícitos e implícitos de comportamento e em suas materializações.

subfilo dos vertebrados e ao filo dos cordados. Dentro da espécie,

O homem é, portanto, um animal portador de cultura, seja pelo

pode-se distinguir os grupos (negro, branco, pigmeu etc) e dentro

domínio da linguagem, seja pelos padrões de organização familiar,

de cada grupo as raças (nórdica, alpina, australiana etc), depois as

pelo uso de ferramentas, enfim, pelo controle de um vasto domínio

sub-raças, os tipos etc.

de conhecimento empírico e pela presença de elementos de ordem

transmissão

das

características

culturais

pelo

ensino

e

simbólica, como tabus, mitos, rituais religiosos etc.

A classificação do homem a partir do modelo zoológico introduziu o conceito diferencial de raça e, ao mesmo tempo, tornou possível

definir

a

espécie

por

outros

aspectos

que

não

Abordagem psico-sociológica

a

racionalidade. Homo sapiens não é necessariamente sinônimo de animal racional. Os critérios anatômicos e fisiológicos é que foram

Permanece

vaga

e

ambígua

a

correlação

entre

as

considerados com maior rigor para a diferenciação da espécie. A

dimensões física e cultural do homem. Tal ambigüidade levanta a

antropologia preocupou-se também com os problemas da origem e

dúvida quanto ao problema de ser o homem causa ou resultado,

da filiação da espécie. O Homo sapiens não é senão o elo atual de

criatura ou criador de seu patrimônio cultural. A questão do

uma ou várias longas cadeias de ancestrais hominídeos e pré-

determinismo ou da liberdade da condição humana extrapola o

hominídeos e talvez símios. Mas a reação à taxionomia positivista

âmbito da antropologia e convoca a uma perspectiva inovadora no

acabou por impor um modelo que, sem desprezar os traços

campo das ciências humanas, trazida pela psicologia: o conceito

anatomo-fisiológicos, restituiu à antropologia geral as dimensões

psicanalítico de inconsciente. Essa noção, que foi a principal

mentais do homem -- psicológicas, culturais etc.

descoberta de Sigmund Freud, veio mostrar que o psiquismo não é

Outra contribuição ao aprofundamento da perspectiva

redutível ao consciente e que certos conteúdos psíquicos só se

antropológica foi o estudo da herança cultural. Em muitos aspectos,

tornam

é ela que permite ao homem moldar uma vida adaptada à

resistências.

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acessíveis

à

consciência

depois

de

vencidas

certas

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Para a sociologia, o homem, como ser social, é resultado de processos sociais e de cultura que antecedem ao aparecimento do indivíduo. O homem nasce com uma base orgânica, que o permite

desenvolver-se

em

pessoa.

Seus

órgãos

e

sentidos

estabelecem o contato entre o que é verdadeiramente hereditário, natural e individual, e a vida social e a cultura. O comportamento humano

dá-se

informação.

num

Cada

quadro

homem

de

recebe

circulação

permanente

ininterruptamente

de

estímulos

diversos e diversamente organizados, aos quais responde por comportamentos. Se isso é verdadeiro para qualquer ser vivo, no homem se distingue pelas propriedades de sistematização, de transferência e de significação.

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de interesses antagônicos e conflitos no corpo social que devem ser POLÍTICA

controlados para preservar a ordem social ou buscar o bem comum. Ciência política

O choque de interesses entre indivíduos e grupos na sociedade provoca a luta pelo poder e seu exercício em diferentes grandes

Disciplina recente, a ciência política surgiu da necessidade

pensadores tentaram estabelecer os elementos universais de uma

de formar gestores públicos e oferecer uma estrutura de reflexão

ordem justa nos negócios humanos, o que deu origem a teorias

sobre as questões públicas. Seu objetivo é estudar o poder político,

políticas numerosas e, freqüentemente, contraditórias.

suas formas concretas de manifestação e tendências evolutivas.

configurações

institucionais.

Ao

longo

de

séculos,

Cabe assim à ciência política explicar os motivos das relações que Política, em sentido estrito, é a arte de governar a polis, ou

existem entre os poderes políticos e a sociedade, as diversas formas

cidade-estado, e deriva do adjetivo politikós, que significa tudo o

de organização do estado e sua dominação por classes ou grupos, a

que se relaciona à cidade, isto é, tudo o que é urbano, público, civil

formação da vontade política do povo e as diferentes teorias

e social. Em acepção ampla, política é o estudo do fenômeno do

relativas à prática política.

poder, entendido como a capacidade que um indivíduo ou grupo

A ciência política utiliza métodos de ciências empíricas,

organizado tem de exercer controle imperativo sobre a população

como a física e a biologia, e metodologias e especificidades de

de um território, mesmo quando é necessário o uso da força.

outros ramos do conhecimento, como filosofia, história, direito,

O conceito de política é estreitamente vinculado ao de

sociologia e economia, e sua finalidade é descrever aquilo que é e

poder em três esferas básicas: (1) a luta pelo poder; (2) o conjunto

não o que deveria ser. Nesse sentido, distingue-se da filosofia

de instituições por meio das quais esse poder se exerce; (3) e a

política, área normativa voltada para conceitos como direito e

reflexão teórica sobre a origem, estrutura e razão de ser do poder.

justiça; da antropologia política, que estuda o fenômeno político

O poder político se caracteriza pela exclusividade do direito do uso

como uma constante em todas as sociedades humanas ao longo de

da força em relação ao conjunto da sociedade, que lhe confere a

sua história; e da sociologia política, que estuda os fenômenos

legitimidade desse uso. O exercício do poder se justifica como a

sociais a partir de uma visão política.

solução para regular e equilibrar a ordem e a justiça na sociedade; e o uso da força, inerente a todo poder político, indica a presença

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Luta pelo poder

Os meios pacíficos de luta pelo poder indicam estado avançado de civilização e a racionalidade das concepções políticas. As

A história humana é basicamente uma história da política,

formas

básicas

de

luta

pacífica,

própria

dos

sistemas

isto é, das lutas travadas por indivíduos, grupos ou nações para

democráticos, são as eleições e plebiscitos. Nas democracias,

conquistar, manter ou ampliar o poder político. Essas lutas podem

reconhece-se que a soberania popular é o princípio de legitimação

ser violentas, na forma de assassínio de dirigentes, guerras,

do poder e portanto a direção do estado cabe à facção ou partido

revoluções e golpes de estado, ou pacíficas, por meio de eleições e

que obtiver a maioria dos votos livremente expressos pelo povo.

plebiscitos.

Trata-se de um procedimento racional, que pressupõe a igualdade

A luta violenta é uma das formas mais primitivas de

dos cidadãos perante a lei e que tende a harmonizar os conflitos de

conquista e manutenção do poder, embora ainda seja adotada em

interesse, embora eles continuem a existir e muitas vezes se

algumas nações modernas. São numerosos os exemplos, ao longo

manifestem de forma violenta.

da história das nações, de assassínios de dirigentes por uma pessoa ou um grupo de pessoas para a tomada do poder; e de insurreições e revoluções populares, uma forma de luta política violenta que visa não só conquistar o poder mas transformar de modo radical as condições sociais ou a organização do estado. Nesses casos, a violência se manifesta também na defesa daqueles que detêm o poder e querem manter a situação social tradicional. As revoluções francesa e russa mudaram a história do mundo moderno. A mudança de um regime político pode se dar ainda pelo golpe de estado, forma de ação política violenta comum na história das nações da América Latina. As guerras são o modo mais extremo Instituições políticas

e violento da luta política, já que o objetivo é destruir o adversário, e podem ser externas, entre duas ou mais nações, ou internas ou civis, entre facções de uma nação.

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Órgãos permanentes por meio dos quais se exerce o poder político, as instituições políticas evoluíram de acordo com o grau de racionalidade alcançado pelos homens. Nas antigas civilizações orientais, em Roma e na Europa medieval, os sistemas políticos tinham como característica comum a personalização do poder, justificada por instâncias mágicas, religiosas ou carismáticas. Faraó egípcio, imperador romano ou rei cristão, o detentor do poder se confundia com o próprio poder. Sua justificativa era a força, traduzida pelo poder militar, poder de curar ou poder sobre as forças da natureza. Constantemente desafiado por aqueles que se julgavam

possuidores

das

mesmas

credenciais,

o

poder

personalizado gerou a instabilidade política e o uso da violência como forma de solução de conflitos. No final da Idade Média, mudanças políticas, econômicas e sociais determinaram o surgimento de novas concepções sobre o estado. O progresso da burguesia e da economia favoreceu a Os

centralização do poder nas monarquias absolutas. O estado tornou-

sistemas

liberais,

cuja

representatividade

era

inicialmente restrita, aperfeiçoaram os mecanismos democráticos e,

se racional e suas estruturas se institucionalizaram, de acordo com as novas necessidades sociais. A vitória da burguesia sobre a

ao incorporarem o sufrágio universal, reconheceram de forma plena

sociedade feudal, na revolução francesa, desmistificou o poder por

a igualdade de todos os cidadãos perante a lei. A institucionalização

direito divino e consagrou o princípio da soberania popular. O povo,

do poder exigiu a adoção de constituições que, como expressão da

única fonte de poder, podia transferir seu exercício a representantes

vontade popular, devem reger a ação do estado. Nos sistemas

por ele eleitos.

democráticos, a legitimidade do poder deriva de sua origem na vontade popular e de seu exercício de acordo com a lei. A doutrina da clássica divisão do poder político, elaborada por Montesquieu, é comum a quase todos os sistemas políticos dos

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estados modernos. O poder legislativo, formado por parlamentares

a monarquia absoluta e sua concepção de liberdade era diferente da

eleitos pelo povo, elabora as leis e controla os atos do poder

visão grega, que a civilização ocidental incorporou -- mesmo

executivo; o executivo, também eleito pelo povo, executa a lei e

quando submetidos ao despotismo de um chefe absoluto, seus

administra o estado; o judiciário interpreta e aplica as leis e atua

povos consideravam-se livres se o soberano fosse de sua raça e

como juiz nos conflitos entre os outros poderes. A divisão de

religião. As cidades da Grécia não se uniram sob um poder imperial

poderes ajuda a evitar o abuso de poder por meio do controle

centralizador e conservaram sua autonomia. Suas leis emanavam

recíproco dos vários órgãos do estado. Nas modernas sociedades democráticas, além dos poderes

da vontade dos cidadãos e seu principal órgão de governo era a

institucionalizados existem organizações que participam do poder ou

assembléia de todos os cidadãos, responsáveis pela defesa das leis

nele influem: partidos políticos, sindicatos de classe, grupos de

fundamentais e da ordem pública. A necessidade da educação

interesse,

política dos cidadãos tornou-se, assim, tema de pensadores políticos

associações

profissionais,

imprensa,

freqüentemente

como Platão e Aristóteles.

chamada de quarto poder, e outras. Nos regimes totalitários, a

Em suas obras, das quais a mais importante é A república,

existência de um partido único no poder diminui as chances de

Platão define a democracia como o estado no qual reina a liberdade

participação da sociedade nos assuntos políticos nacionais.

e descreve uma sociedade utópica dirigida pelos filósofos, únicos História das idéias políticas

conhecedores da autêntica realidade, que ocupariam o lugar dos reis, tiranos e oligarcas. Para Platão, a virtude fundamental da polis

Além de lutar pelo poder e de criar instituições para

é a justiça, pela qual se alcança a harmonia entre os indivíduos e o

exercê-lo, o homem também examina sua origem, natureza e

estado. No sistema de Platão, o governo seria entregue aos sábios,

significado. Dessas reflexões resultaram diferentes doutrinas e

a defesa aos guerreiros e a produção a uma terceira classe, privada

teorias políticas.

de direitos políticos. Aristóteles, discípulo de Platão e mestre de Alexandre o

Antiguidade

Grande, deixou a obra política mais influente na antiguidade clássica e na Idade Média. Em Política, o primeiro tratado conhecido sobre a

São escassas as referências a doutrinas políticas dos

natureza, funções e divisão do estado e as várias formas de

grandes impérios orientais. Admitiam como única forma de governo

governo, defendeu como Platão equilíbrio e moderação na prática

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do poder. Empírico, considerou impraticáveis muitos dos conceitos

escravidão, fundamento social econômico do mundo antigo. Ao

de Platão e viu a arte política como parte da biologia e da ética.

tornar-se religião oficial, o cristianismo aliou-se ao poder temporal e

Para Aristóteles, a polis é o ambiente adequado ao

admitiu a organização social existente, inclusive a escravidão. Santo

desenvolvimento das aptidões humanas. Como o homem é, por

Agostinho, a quem se atribui a fundação da filosofia da história,

natureza, um animal político, a associação é natural e não

afirma que os cristãos, embora voltados para a vida eterna, não

convencional. Na busca do bem, o homem forma a comunidade, que

deixam de viver a vida efêmera do mundo real. Moram em cidades

se organiza pela distribuição das tarefas especializadas. Como

temporais mas, como cristãos, são também habitantes da "cidade

Platão, Aristóteles admitiu a escravidão e sustentou que os homens

de Deus" e, portanto, um só povo.

são senhores ou escravos por natureza. Concebeu três formas de

Santo Agostinho não formulou uma doutrina política, mas a

governo: a monarquia, governo de um só, a aristocracia, governo

teocracia está implícita em seu pensamento. A solução dos

de uma elite, e a democracia, governo do povo. A corrupção dessas

problemas sociais e políticos é de ordem moral e religiosa e todo

formas daria lugar, respectivamente, à tirania, à oligarquia e à

bom cristão será, por isso mesmo, bom cidadão. O regime político

demagogia. Considerou que o melhor regime seria uma forma

não importa ao cristão, desde que não o obrigue a contrariar a lei

mista, no qual as virtudes das três formas se complementariam e se

de Deus. Considera, pois, um dever a obediência aos governantes,

equilibrariam.

desde que se concilie com o serviço divino. Testemunha da a

dissolução do Império Romano, contemporâneo da conversão de

república, o império e o corpo de direito civil, mas não elaboraram

Constantino ao cristianismo, santo Agostinho justifica a escravidão

uma teoria geral do estado ou de direito. Entre os intérpretes da

como um castigo do pecado. Introduzida por Deus, "seria insurgir-

política romana destacam-se o grego Políbio e Cícero, que pouco

se contra Sua vontade querer suprimi-la".

Os

romanos,

herdeiros

da

cultura

grega,

criaram

acrescentaram à filosofia política dos gregos.

No século XIII, santo Tomás de Aquino, o grande pensador político do cristianismo medieval, definiu em linhas gerais a

Idade Média

teocracia. Retomou os conceitos de Aristóteles e os adaptou às condições da sociedade cristã. Afirmou que a ação política é ética e

O cristianismo introduziu, nos últimos séculos do Império

a lei um mecanismo regulador que promove a felicidade. Como

Romano, a idéia da igualdade entre todos os homens, filhos do

Aristóteles, considerou ideal um regime político misto com as

mesmo

virtudes das três formas de governo, monarquia, aristocracia e

Deus,

uma

noção

que

contestava

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

implicitamente

a

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democracia. Na Summa teologica, justifica a escravidão, que

individual a um governante, o Leviatã, mediante um contrato que

considera natural. Em relação ao senhor, o escravo "é instrumento,

pode ser revogado a qualquer momento. Baruch de Spinoza prega a tolerância e a liberdade

pois entre o senhor e o escravo há um direito especial de

intelectual. Temeroso dos dogmas metafísicos e religiosos, justifica

dominação".

o poder político unicamente por sua utilidade e considera justa a Renascimento

rebelião se o poder se torna tirânico. Em seu Tratado teológicopolítico, afirma que os governantes devem cuidar para que os membros

Os teóricos políticos do período caracterizaram-se pela

da

sociedade

desenvolvam

ao

máximo

as

suas

capacidades intelectuais e humanas.

reflexão crítica sobre o poder e o estado. Em O príncipe, Maquiavel secularizou a filosofia política e separou o exercício do poder da

Montesquieu e Jean-Jacques Rousseau destacam-se como

moral cristã. Diplomata e administrador experiente, cético e

teóricos da democracia moderna. Montesquieu exerceu influência

realista, defende a constituição de um estado forte e aconselha o

duradoura com O espírito das leis, no qual estabeleceu a doutrina

governante a preocupar-se apenas em conservar a própria vida e o

da divisão dos poderes, base dos regimes constitucionais modernos.

estado, pois na política o que vale é o resultado. O príncipe deve

Rousseau sustenta, no Contrato social, que a soberania pertence ao

buscar o sucesso sem se preocupar com os meios. Com Maquiavel

povo, que livremente transfere seu exercício ao governante. Suas

surgiram os primeiros contornos da doutrina da razão de estado,

idéias democráticas inspiraram os líderes da revolução francesa e

segundo a qual a segurança do estado tem tal importância que,

contribuíram para a queda da monarquia absoluta, a extinção dos

para garanti-la, o governante pode violar qualquer norma jurídica,

privilégios da nobreza e do clero e a tomada do poder pela

moral, política e econômica. Maquiavel foi o primeiro pensador a

burguesia.

fazer distinção entre a moral pública e a moral particular. Pensamento contemporâneo

Thomas Hobbes, autor de Leviatã, considera a monarquia absoluta o melhor regime político e afirma que o estado surge da necessidade de controlar a violência dos homens entre si. Como

No século XIX, uma das correntes do pensamento político

Maquiavel, não confia no homem, que considera depravado e anti-

foi o utilitarismo, segundo o qual se deve avaliar a ação do governo

social por natureza. É o poder que gera a lei e não o contrário; a lei

pela felicidade que proporciona aos cidadãos. Jeremy Bentham,

só prevalece se os cidadãos concordarem em transferir seu poder

primeiro divulgador das idéias utilitaristas e seguidor das doutrinas

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

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econômicas de Adam Smith e David Ricardo, teóricos do laissez-

sociedade deva adaptar-se, mas "o movimento real que suprime o

faire (liberalismo econômico), considera que o governo deve limitar-

atual

se a garantir a liberdade individual e o livre jogo das forças de

pressupostos já existentes". O socialismo sucederia ao capitalismo

mercado, que geram prosperidade.

assim como o capitalismo sucedeu ao feudalismo e será a solução

estado

de

coisas",

e

"cujas

condições

decorrem

de

das contradições do capitalismo. Assim, sua realização não seria utópica, mas resultaria de uma exigência objetiva do processo histórico em determinada fase de seu desenvolvimento. O estado, expressão

política

da

classe

economicamente

dominante,

desapareceria numa sociedade sem classes. Depois

da

primeira

guerra

mundial,

surgiram

novas

doutrinas baseadas nas correntes políticas do século XIX. O liberalismo

político,

associado

nem

sempre

legitimamente

ao

liberalismo econômico, pareceu entrar em dissolução, confirmada pela depressão econômica de 1929, e predominaram as visões totalitárias do poder. Em oposição ao liberalismo político, surgiram as teorias

A partir do marxismo, Lenin elaborou uma teoria do estado

socialistas em suas duas vertentes, a utópica e a científica. Robert

comunista e comandou na Rússia a primeira revolução operária

Owen, Pierre-Joseph Proudhon e Henri de Saint-Simon foram alguns

contra o sistema capitalista. Sobre a base marxista-leninista, Stalin

dos teóricos do socialismo utópico. Owen e Proudhon denunciaram a

organizou o estado totalitário para estruturar a ditadura do

organização institucional, econômica e educacional de seus países e

proletariado

defendem a criação de sociedades cooperativas de produção, ao

marxistas que discordaram de Stalin e acreditaram na diversidade

passo que Saint-Simon preconizou a industrialização e a dissolução

de vias para atingir o mesmo fim destacam-se Trotski, Tito e Mao

do estado.

Zedong (Mao Tsé-tung).

e

alcançar

o

comunismo.

Entre

os

pensadores

Karl Marx e Friedrich Engels desenvolvem a teoria do

A outra vertente do totalitarismo foi o fascismo, baseado

socialismo científico, que deixou marcas profundas e duradouras na

na crítica aos abusos do capitalismo e do comunismo. Formadas por

evolução das idéias políticas. Seu socialismo não é um ideal a que a

elementos heterogêneos e muitas vezes incoerentes, as ideologias

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

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fascistas deram fundamento intelectual aos regimes que tendiam a

O processo separatista ganhou consistência com a chegada

sobrepor o poder absoluto do estado aos indivíduos, como o

de D. João VI em 1808 e culminou com a independência. A primeira

fascismo na Itália de Benito Mussolini e o nacional-socialismo na

constituição brasileira, outorgada pelo imperador D. Pedro I,

Alemanha de Adolf Hitler.

baseou-se no despotismo esclarecido e inovou na doutrina da divisão de poderes, ao incluir o poder moderador do monarca ao

Após a segunda guerra mundial, a democracia liberal, já

lado dos clássicos poderes executivo, legislativo e judiciário.

dissociada do liberalismo econômico, ressurgiu em diversos países europeus e americanos. Em suas instituições, as democracias

As elites brasileiras, compostas de grandes senhores

acrescentaram os direitos sociais, como o direito ao trabalho e ao bem-estar, aos direitos individuais. No final da década de 1980, a dissolução da União Soviética levou ao desaparecimento dos regimes

comunistas

no

leste

europeu

e

ao

predomínio

da

democracia liberal. Poder político no Brasil

O absolutismo foi a base das concepções políticas que vigoraram no Brasil colonial, regido pelas leis e o sistema político de Portugal.

Ao

longo

do

século

XVIII,

ocorreram

movimentos

autonomistas com fundo republicano e liberal, inspirados nos modelos das repúblicas veneziana e americana. As idéias que inspiraram a revolução francesa disseminaram-se pela colônia nas obras de Voltaire, Rousseau e Montesquieu mas o liberalismo só se manifestou de modo mais concreto nos episódios da inconfidência mineira, que evidenciaram as contradições entre a crescente burguesia e as classes agrárias dominantes.

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

14

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


agrários e comerciantes, instalaram-se no poder e competiram com

dominantes e esqueciam seu radicalismo assim que assumiam o

o imperador pelo controle da nação. O cunho liberal da constituição

poder. As elites agrárias e comerciais mantinham-se como a única

foi amenizado pela adoção de mecanismos como o voto censitário,

força política e dominavam o cenário nacional. Entretanto, os

que excluiu a maioria da população do processo eleitoral, e a

grandes temas da república e da abolição da escravatura ganhavam

vitaliciedade dos senadores e dos membros do Conselho de Estado,

espaço e apoio crescentes, principalmente na burguesia urbana, que

que assegurou a permanência das elites no poder. O confronto

se ressentia das dificuldades de implantação plena do capitalismo

permanente entre essas elites e o imperador e a oposição dos

numa economia atrasada, que buscava se modernizar. Republicanos

liberais radicais, que se ressentiam da centralização excessiva do

e abolicionistas inauguraram um estilo novo na política brasileira e

poder e defendiam o federalismo, culminaram na abdicação do

convocaram as populações das cidades à defesa de suas idéias.

soberano em favor de D. Pedro II, então menor de idade.

Apesar dessa mobilização, a república foi instaurada pela elite, sem

O

período

da

regência

foi

marcado

pela

participação popular.

pressão

permanente das aristocracias locais, que exigiam maior autonomia

A abolição da escravatura em 1888 marcou o fim do

de ação política, e por conflitos entre liberais e conservadores, que

império brasileiro e o início da república, instalada no ano seguinte,

se traduziram em rebeliões regionais e levantes populares, em

mas permaneceu o autoritarismo do poder central, profundamente

alguns casos de inspiração separatista e republicana. Pouco depois

entranhado na cultura política nacional. A constituição liberal de

de

regime

1891 estabeleceu um presidencialismo forte e centralizado, que não

executivos,

resolveu as contradições políticas herdadas do império nem excluiu

transferidos para um primeiro-ministro escolhido entre os membros

do poder as elites, acrescidas então de novas forças econômicas,

do partido majoritário nas eleições. Preservou, porém, o poder

como os produtores de café, que determinavam os caminhos da

moderador, o que na prática manteve o governo sob seu controle.

nação. Na fase que se seguiu, conhecida como República Velha,

assumir

o

parlamentarista

trono, e

abriu

D.

Pedro

mão

II

de

estabeleceu

seus

poderes

o

predominaram as oligarquias de São Paulo e Minas Gerais, os

Os primeiros anos do governo do segundo reinado foram marcados

por

revoltas

regionais

e,

ao

mesmo

tempo,

estados economicamente mais avançados.

pela

consolidação das instituições nacionais e pelo aprofundamento do

Durante a primeira guerra mundial, o país conheceu

sentimento de nacionalidade em todo o território brasileiro. Os

notável

liberais, que se alternaram com os conservadores no governo ao

dominado pelos interesses das oligarquias rurais e da burguesia

longo

mercantil. As contradições entre uma economia que se modernizava

do

segundo

reinado,

pertenciam

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

também

às

classes

15

expansão

industrial,

mas

o

poder

político

continuou

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


fortaleceram e representaram efetivamente os diversos segmentos políticos e ideológicos da nação. O modelo econômico e social, porém,

não

se

alterou,

especialmente

na

estrutura

agrária

dominada pelas elites obsoletas. O choque entre avanços políticos e econômicos e a manutenção de um modelo social ultrapassado levaram setores progressistas e conservadores à radicalização.

e um modelo político retrógrado geraram inquietações políticas que se expressaram em movimentos como o tenentismo. O processo eleitoral, marcado pela fraude e a exclusão de vasta parcela da população, mostrou-se incapaz de solucionar as distorções do sistema, agravadas por dificuldades financeiras e do comércio exterior que a crise mundial de 1929 aprofundou, com a queda drástica das exportações de produtos primários. Com a revolução de 1930, a burguesia industrial teve maior participação no poder, mas as contradições do regime não foram solucionadas. Conflitos entre as oligarquias e os tenentistas e a

ausência

de

mudanças

estruturais

necessárias

levaram

à

implantação da ditadura do Estado Novo, que se prolongou até 1945. A constituição de 1946 deu início a um período de crescimento

econômico

e

aprofundamento

dos

mecanismos

democráticos. Houve mudanças no sistema eleitoral e participação efetiva do povo no processo político. Os partidos políticos se

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

16

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


CIDADANIA

divisão social do trabalho. São direitos atribuídos a uma entidade coletiva, e ao indivíduo apenas em decorrência de sua participação Foi

de

um

discurso

em um desses "corpos" sociais.

do

Pierre-Augustin

O termo cidadão tornou-se sinônimo de homem livre,

Caron de Beaumarchais, em

portador de direitos e obrigações a título individual, assegurados em

outubro de 1774, que surgiu

lei. É na cidade que se formam as forças sociais mais diretamente

o

interessadas na individualização e na codificação desses direitos: a

dramaturgo

sentido

moderno

da

burguesia e a moderna economia capitalista.

palavra cidadão -- que ganharia maior ressonância nos primeiros

Ao ultrapassar os estreitos limites do mundo medieval --

meses da revolução francesa, com a Declaração dos Direitos do

pela interligação de feiras e comunas, pelo estabelecimento de rotas

Homem e do Cidadão. Em sentido etimológico, cidadania refere-se à condição dos

regulares de comércio, entre regiões da Europa e entre os

que residem na cidade. Ao mesmo tempo, diz da condição de um

continentes --, a dinâmica da economia capitalista favorece a

indivíduo como membro de um estado, como portador de direitos e

imposição de uma jurisdição uniforme em determinados territórios,

obrigações. A associação entre os dois significados deve-se a uma

cuja extensão e perfil derivam tanto da interdependência interna

transformação fundamental no mundo moderno: a formação dos

enquanto "mercado", como dos fatores culturais, lingüísticos,

estados centralizados, impondo jurisdição uniforme sobre um

políticos e militares que favorecem a unificação.

território não limitado aos burgos medievais. Na

Europa,

até

o

início

dos

Em seus primórdios, a constituição do estado moderno e tempos

modernos,

o

da economia comercial capitalista é uma grande força libertária. Em

reconhecimento de direitos civis e sua consagração em documentos

primeiro lugar, pela dilatação de horizontes, pela emancipação dos

escritos (constituições) eram limitados aos burgos ou cidades. A

indivíduos ante o localismo, ante as convenções medievais que

individualização desses direitos a rigor não existe até o surgimento

impediam ou dificultavam a escolha de uma ocupação diferente da

da teoria dos direitos naturais do indivíduo e do contrato social,

transmitida como herança familiar; libertária, também, ante as

bases filosóficas do antigo liberalismo. Nesse sentido, os privilégios

tradições e crenças que se diluíam com a maior mobilidade

e imunidades dos burgos medievais não diferem, quanto à forma,

geográfica e social; mas libertária, sobretudo, pela imposição de

dos direitos e obrigações das corporações e outros agrupamentos,

uma jurisdição uniforme, que superava o arbítrio dos senhores

decorrentes de sua posição ou função na hierarquia social e na

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

17

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


feudais e reconhecia a todos os mesmos direitos e obrigações,

consagração formal de certos direitos, o processo político de sua

independentemente de seu trabalho ou condição socioeconômica.

obtenção e a criação das condições socioeconômicas que lhe dão efetividade.

Além do sentido sociológico, a cidadania tem um sentido político, que expressa a igualdade perante a lei, conquistada pelas grandes

revoluções

(inglesa,

francesa

e

americana),

e

posteriormente reconhecida no mundo inteiro. Nessa perspectiva, a passagem do âmbito limitado - dos burgos - ao significado amplo da cidadania nacional é a própria história da formação e unificação dos estados modernos, capazes de exercer efetivo controle sobre seus respectivos territórios e de garantir os mesmos direitos a todos os seus habitantes. É fundamentalmente uma garantia negativa: contra as limitações convencionais ao comportamento individual e contra o poder arbitrário, público ou privado. Rumo à universalização. A cidadania é originalmente um direito burguês. Contudo, quando reivindicada como soma de direitos fundamentais do indivíduo, estes se tornam neutros quanto a seus beneficiários presentes e potenciais. Vista como processo histórico gradual, a extensão da cidadania é (1) a transformação da estrutura social pré-moderna no quadro da economia capitalista e do estado nacional moderno e (2) o reconhecimento e a universalização de toda uma série de novos direitos que, em parte, são indispensáveis ao funcionamento da economia capitalista moderna e, em parte, são resultado concreto do conflito político dentro de cada país. Portanto, trata-se de um conceito ao mesmo tempo jurídico, sociológico e político: descreve a

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

18

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


limitada, visto que seus limites coincidem com os da liberdade dos Cidadania e democracia

outros homens. A primeira concretização da teoria jurídica dos direitos

A cidadania tem dois aspectos: (1) o institucional, porque

humanos foi o Bill of Rights, de 1689 -- a declaração de direitos

envolve o reconhecimento explícito e a garantia de certos direitos

inglesa. Só depois da independência dos Estados Unidos, porém, as

fundamentais, embora sua institucionalização nunca seja constante

declarações

e irredutível; (2) e o processual, porque as garantias civis e

adquirem o perfil de relação de direitos oponíveis ao estado, e dos

políticas, bem como o conteúdo substantivo, social e econômico,

quais os indivíduos são titulares diretos. Dada sua importância, o

não podem ser vistos como entidades fixas e definitivas, mas

direito constitucional clássico dividia as leis fundamentais em duas

apenas como um processo em constante reafirmação, com limiares

partes: uma estabelecia os poderes e seu funcionamento; outra, os

abaixo dos quais não há democracia. Democrático, no sentido

direitos e garantias individuais.

de

direitos,

inseridas

nas

constituições

escritas,

No Brasil, é clássica a definição dada por Rui Barbosa às

liberal, é o país que, além das garantias jurídicas e políticas

garantias, desdobramento dos direitos individuais: "Os direitos são

fundamentais, institucionaliza amplamente a participação política.

aspectos, Direitos e garantias individuais

manifestações

da

personalidade

humana

em

sua

existência subjetiva, ou nas suas situações de relações com a sociedade,

ou

os

indivíduos

que

a

compõem.

As

garantias

A necessidade de certas prerrogativas que limitem o poder

constitucionais stricto sensu são as solenidades tutelares de que a

político em suas relações com a pessoa humana são, muito

lei circunda alguns desses direitos contra os abusos do poder." É o

provavelmente, criação do cristianismo, que definiu o primeiro

caso do direito à liberdade pessoal, cuja garantia é o recurso do

terreno interditado ao estado: o espiritual.

habeas corpus.

No campo do direito positivo, foi a revolução francesa que Direitos sociais

incorporou o sistema dos direitos humanos ao direito constitucional moderno. A teoria do direito constitucional dividiu, de início, os direitos humanos em naturais e civis, considerando que a liberdade

Na antiguidade, considerava-se que o trabalho manual não

natural, mais ampla, evolui para o conceito de liberdade civil, mais

era compatível com a inteligência crítica e especulativa, ideal do estado.

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

19

Daí

o

reconhecimento

da

escravidão,

que

restringia

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


Os regimes de governo são justos na medida em que as

consideravelmente os ideais teóricos da democracia direta. A do cristianismo baseou-se principalmente na

liberdades são defendidas, mesmo em épocas de crise. Os princípios

dignificação do trabalho manual. Por conseguinte, durante a Idade

gerais de direito são sempre os mesmos: processo legal, ausência

Média, o trabalho era considerado um dever social e mesmo

de crueldade, respeito à dignidade humana. As formas de execução

religioso do indivíduo.

desses princípios também não variam. Resumem-se em leis

revolução social

anteriores, em garantias eficazes de defesa e, como sempre, acima

Com o declínio das corporações de ofício, que controlavam

de tudo, em justiça independente e imparcial.

o trabalho medieval, e o surgimento das oficinas de trabalho, de características diferentes, entre as quais a relação salarial entre

Suspensão das garantias constitucionais. No Brasil, a

operário e patrão, estão dadas as condições propícias ao capitalismo

instabilidade do poder político e as lutas oligárquicas durante a

mercantilista da época do Renascimento e da Reforma.

primeira república fizeram do estado de sítio e da intervenção revolução

federal os centros de convergência dos debates jurídicos e das

francesa, viu-se diante dos problemas sociais decorrentes da

ações políticas. Também o Supremo Tribunal Federal defrontou-se

revolução industrial. Assim, tornou-se indispensável a intervenção

freqüentemente com o problema. No entanto os fatos mais de uma

do estado entre as partes desiguais em confronto no campo do

vez atropelaram o direito ao longo da história do Brasil.

Mais tarde, a

burguesia, que dominara

a

trabalho, para regular o mercado livre em que o trabalhador era cruelmente explorado. Atualmente não se pode conceber a proteção jurídica dos direitos individuais sem o reconhecimento e a proteção dos direitos sociais do homem, que são oponíveis não ao estado, mas ao capital, e têm na ação do estado sua garantia. Hoje existe um grande movimento pelo reconhecimento, definição e garantia internacionais dos direitos humanos. Em 10 de dezembro de 1948, a assembléia geral da Organização das Nações Unidas (ONU) adotou em Paris a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que só terá força obrigatória quando for uma convenção firmada por todos os países membros da ONU.

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

20

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


as religiões têm como característica comum o reconhecimento do RELIGIÃO

sagrado (definição do filósofo e teólogo alemão Rudolf Otto) e a dependência do homem de poderes supramundanos (definição do teólogo alemão Friedrich Schleiermacher). A observância e a

O medo do desconhecido e a necessidade de dar sentido ao mundo que o cerca levaram o homem a fundar diversos sistemas de

experiência

religiosas

têm

por

objetivo

prestar

tributos

e

crenças, cerimônias e cultos -- muitas vezes centrados na figura de

estabelecer formas de submissão a esses poderes, nos quais está

um ente supremo -- que o ajudam a compreender o significado

implícita a idéia da existência de ser ou seres superiores que

último de sua própria natureza. Mitos, superstições ou ritos mágicos

criaram e controlam o cosmos e a vida humana.

que as sociedades primitivas teceram em torno de uma existência

Aquelas características, que de certa forma não distinguem

sobrenatural, inatingível pela razão, equivaleram à crença num ser

uma religião de outra, levaram ao debate sobre religião natural e

superior e ao desejo de comunhão com ele, nas primeiras formas de

religião revelada, o que recebeu significação especial nas teologias

religião.

judaica e cristã. O americano Mircea Éliade, historiador das Religião (do latim religio, cognato de religare, "ligar",

religiões, denominou "hierofania" a essa manifestação do sagrado,

"apertar", "atar", com referência a laços que unam o homem à

ou seja, algo sagrado que é mostrado ao homem. Seja a

divindade) é como o conjunto de relações teóricas e práticas

manifestação do sagrado uma pedra ou uma árvore, seja a doutrina

estabelecidas entre os homens e uma potência superior, à qual se

da encarnação de Deus em Jesus Cristo, trata-se sempre de uma

rende culto, individual ou coletivo, por seu caráter divino e sagrado.

hierofania, de um ato misterioso que revela algo completamente

Assim, religião constitui um corpo organizado de crenças que

diferente da realidade do mundo natural, profano.

ultrapassam a realidade da ordem natural e que tem por objeto o sagrado ou

sobrenatural, sobre o qual

elabora

Por mais que a mentalidade ocidental moderna possa

sentimentos,

repudiar certas expressões rudimentares ou exóticas das religiões

pensamentos e ações.

primitivas, na realidade a pedra e a árvore não são adoradas

Essa definição abrange tanto as religiões dos povos ditos

enquanto

tais,

como

expressões

de

algo

sagrado,

que

primitivos quanto as formas mais complexas de organização dos

paradoxalmente transforma o objeto numa outra realidade. O

vários sistemas religiosos, embora variem muito os conceitos sobre

sagrado e o profano configuram duas modalidades de estar no

o conteúdo e a natureza da experiência religiosa. Apesar dessa

mundo e duas atitudes existenciais do homem ao longo de sua

variedade e da universalidade do fenômeno no tempo e no espaço,

história. Contudo, as reações do homem frente ao sagrado, em

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

21

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


diferentes contextos históricos, não são uniformes e expressam um

naturais ou a necessidade de obter seus benefícios impeliu-o a

fenômeno cultural e social complexo, apesar da base comum.

render-lhes veneração e culto.

classificação

O fetichismo e o totemismo podem ser considerados

sistemática das religiões, pode-se agrupá-las em duas categorias

variantes do animismo. O fetichismo refere-se à denominação que

amplas: religiões primitivas e religiões superiores. Nessa divisão, o

os portugueses deram à religião dos negros da África ocidental e

qualificativo superior refere-se ao desenvolvimento cultural e não ao

que se ampliou até confundir-se com o animismo. Consiste na

nível de religiosidade.

veneração a objetos aos quais se atribuem poderes sobrenaturais

Embora

não

seja

fácil

elaborar

uma

ou que são possuídos por um espírito. Mais que uma religião, o Religiões primitivas

totemismo seria um sistema de crenças e práticas culturais que estabelece relação especial entre um indivíduo ou grupo de

A importância do culto aos antepassados levou filósofos e

indivíduos e um animal -- às vezes também um vegetal, um

historiadores -- como Evêmero, no século IV a.C. -- a considerá-lo a

fenômeno natural ou algum objeto material -- ao qual se rende

origem da religião. As sepulturas paleolíticas corroboram essa

algum tipo de culto e respeito e em relação ao qual se estabelecem

opinião, pois comprovam já haver, naquele período, a crença numa

determinadas proibições (uso como alimento, contato etc.).

vida depois da morte e no poder ou influência dos antepassados Religiões superiores

sobre a vida cotidiana do clã familiar. Os integrantes do clã obrigavam-se a praticar ritos em homenagem a seus defuntos pelo temor a represálias ou pelo desejo de obter benefícios ou, ainda,

À medida que o homem passou a organizar sua existência

por considerá-los divinizados.

numa base racional, a multiplicidade de poderes divinos e sobre-

No século XIX, os estudos realizados pelo antropólogo

humanos do primitivo animismo não conseguiu mais satisfazer a

britânico Edward Burnett Tylor deram origem ao conceito de

necessidade de estabelecer uma relação coerente com as múltiplas

animismo, aplicado desde então a todas as religiões primitivas.

forças espirituais que povoavam o universo. Surgiram assim as

Tylor sustentou que o homem primitivo, a partir da experiência do

religiões politeístas, panteístas, deístas e monoteístas, expressões

sonho e do fenômeno da respiração, concebeu a existência de uma

das condições sociais e culturais de cada época e das características

alma ou princípio vital imaterial que habitava todos os seres

dos povos em que surgiram.

dotados de movimento e vida. O temor diante dos fenômenos

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

22

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


As religiões politeístas afirmam a existência de vários

devem ser similares, reguladas com a mesma precisão e, portanto,

deuses, aos quais rendem culto. Existem duas teorias contraditórias

naturais. O período do Iluminismo (séculos XVII-XVIII) proclamou o

sobre a origem do politeísmo: para alguns, é a forma primitiva da

culto à deusa razão e a revolução francesa ajudou a organizá-lo.

religião, que mais tarde teria evoluído até o monoteísmo; para outros, ao contrário, é uma degeneração do monoteísmo primitivo. O politeísmo reflete a experiência humana de um universo no qual se manifestam diversas formas de poder sobre-humano; no entanto, nas religiões politeístas ocorre com freqüência uma hierarquia, com um deus supremo que reina e que, em geral, pode ser a origem dos demais deuses. O problema do politeísmo seria delimitar o que se entende como deus ou como algo sobre-humano. Politeístas foram a religião grega e a romana. O panteísmo é uma filosofia que, por levar a extremos as

As religiões monoteístas professam a crença num Deus

noções de absoluto e de infinito, próprias do conceito de Deus,

único, transcendente -- distinto e superior ao universo -- e pessoal.

chega a considerá-lo como a única realidade existente e, portanto, a

Um dos grandes problemas do monoteísmo é a explicação da

identificá-lo com o mundo. É clássica a formulação do filósofo

existência do mal no mundo, o que levou diversas religiões a

Baruch Spinoza, no século XVII: Deus sive natura (Deus ou

adotarem um sistema dualista, o maniqueísmo, fundado nos

natureza). Alguns filósofos gregos e estóicos foram panteístas,

princípios supremos do bem e do mal.

doutrina que também é a base fundamental do budismo.

As grandes religiões monoteístas são o judaísmo, o

Também uma corrente filosófica, o deísmo reconhece a

cristianismo -- que professa a existência de um só Deus, apesar de

existência de Deus enquanto constitui um ser supremo de atributos

reconhecer, como mistério, três pessoas divinas -- e o islamismo.

totalmente indeterminados. Essa doutrina funda-se na religião

Elementos

natural, que nega a revelação. O que o homem conhece a respeito

dos

sistemas

religiosos.

Os

princípios elementares comuns à maioria das religiões conhecidas

de Deus não decorre apenas das deduções da própria razão

na história podem agrupar-se nos seguintes capítulos: crenças,

humana. Se o universo físico é regulado por leis segundo a vontade

ritos, normas de conduta e instituições.

de Deus, as relações entre Deus e o mundo moral e espiritual

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

característicos

23

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


Toda religião pressupõe algumas crenças básicas, como a

constituem a teologia ou ensinamento de cada religião, que enfoca

sobrevivência depois da morte, mundo sobrenatural etc., ao menos

temas sobre a divindade, suas relações com os homens e os

como fundamento dos ritos que pratica. Essas crenças podem ser

problemas humanos cruciais -- a morte, a moral, as relações

de tipo mitológico -- relatos simbólicos sobre a origem dos deuses,

humanas etc. Entre as crenças destaca-se, em geral, uma visão

do mundo ou

conceitos

esperançosa sobre a salvação definitiva das calamidades presentes,

transmitidos por revelação da divindade, que dá origem à religião

que pode ir desde a mera ausência de sofrimento até a incógnita do

revelada e que são recolhidos nas escrituras sagradas em termos

nirvana ou a felicidade plena de um paraíso.

do

próprio povo;

ou

dogmático --

A manifestação das próprias crenças e anseios mediante

simbólicos, mas também conceituais.

ações simbólicas é inerente à expressividade humana. Da mesma forma, as crenças e sentimentos religiosos têm se manifestado através dos ritos, ou ações sagradas, praticados nas diferentes religiões.

Até

no

budismo,

contra

o

ensinamento

de

Buda,

desenvolveram-se desde o começo diversas classes de rituais. Toda religião que seja mais do que uma filosofia gera uma série de ritos ao ser vivida pelo povo. Existem ritos culturais em honra à divindade, ritos funerários, ritos de bênçãos ou de consagração e muitos outros. Observa-se em geral, nas diversas religiões, a existência de ministros ou sacerdotes encarregados de celebrar os principais rituais e, em especial, o culto à divindade. Os atos mais importantes desse culto são oferendas e sacrifícios praticados em conjunto, com invocações e orações. Com freqüência celebram-se os ritos em lugares e épocas considerados sagrados, especialmente dedicados à divindade, e observados com escrupulosa exatidão através dos

Os

tempos.

conceitos fundamentais organizam-se, de modo geral, em um credo ou profissão de fé; as deduções ou explicações de tais conceitos

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

24

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


O terceiro elemento característico de toda religião é o estabelecimento, mais ou menos coercitivo, de normas de conduta do indivíduo ou do grupo no que se refere a Deus, a seus semelhantes e a si mesmo. O primeiro comportamento exigido é a conversão ou mudança para um novo modo de vida. Com relação a Deus, destacam-se as atitudes de veneração, obediência, oração e, em algumas religiões, o amor. Na conduta no âmbito da esfera humana entra, em maior ou menor medida, um sistema de normas éticas. Quase instituições

todas

as

dogmáticas

religiões

cristalizam-se

(doutrinárias)

e

cultuais

em

algumas

(sacerdócio,

hierarquia). Muitas delas chegam a institucionalizar a conduta, com a criação até mesmo de tribunais de justiça e sanções e a organizar administrativamente as diversas comunidades de crentes e suas propriedades. Essas instituições dão forma e coesão aos crentes como um grupo social -- religião, povo, igreja, comunidade; a elas somam-se outras instituições voluntárias de tipo assistencial ou de plena dedicação religiosa, que correspondem a grupos informais dentro do grupo institucionalizado. As instituições consideram imprescindível a forma externa, enquanto que a fé considera o espírito interno como essencial à religião.

INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO FILOSÓFICO

25

JOSÉ AUGUSTO FIORIN (ORG.)


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