Ruina no Gerês

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RUíNA NO GERÊS EDUARDO SOUTO DE MOURA


UNIVERSIDADE DE ÉVORA | DEPARTAMENTO DE ARQUITECTURA | 2012.2013 | METODOLOGIAS DE INVESTIGAÇÃO I João Soares

RECONVERSÃO DE UMA RUÍNA NO GERÊS

Trabalho da autoria de: António Pontes 26460 João Varela 26067

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INTRODUÇÃO O tempo assume na arquitectura, tal como no quotidiano, um papel condicionante, tornando-se o centro de muitas questões em torno das quais os arquitectos se debruçam e ancoram os seus projectos. Tal como a matéria, ou de uma forma mais imaterial, as leis da física, o espaço ou a luz, o Tempo constitui um instrumento ao qual simplesmente não passamos ao lado, ele está lá e não o podemos evitar, mas em certa medida, podemos observar e aprender como o podemos controlar. Deste modo, destacam-se entre as mais variadas obras arquitectónicas aspectos que, directamente ou indirectamente, relacionados com este tema, do Tempo, marcam a obra dos arquitectos. Destaca-se acima de tudo a sensibilidade que esses arquitectos mostram para com este tema imprescindível, tal como a imagem e o destaque que alcançam, tornando-se referências tanto para a arquitectura nacional como internacional. Entre estes arquitectos, encontramos o português Eduardo Souto de Moura, que nasceu em 25 de Julho de 1952 no Porto, a mesma cidade onde cresceu e estudou, frequentando a Escola Superior de Belas Artes e posteriormente a Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto. A sua obra está repleta de sensibilidade, para além de outros aspectos, revela uma grande preocupação para com o tempo e para com o existente, demonstrando “respeito pelos mais velhos”. É neste sentido que este trabalho se debruça, mergulhando naquela que, porém muito desconhecida, é considerada a primeira obra de Souto de Moura, enquanto arquitecto independente. Mas antes de passarmos à análise desta obra há que, ligá-la a uma das várias e distintas acepções de tempo (o tempo cronológico, o tempo interior, tempo como somatório dos tempos, e por fim o tempo meteorológico). Dentre elas facilmente conseguimos escolher uma que diga de uma forma mais geral respeito à obra em estudo, será então “o tempo como somatório dos tempos” – a intervenção arquitectónica como dispositivo capaz de relacionar diferentes tempos (históricos) sedimentados, onde seja claro o posicionamento de uma intervenção em relação a pré-existências.

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TEMPO E RUINA Ruína é o resultado de um processo onde o tempo actua e desgasta a matéria, esta acção é permanente e age sobre ambos os elementos, arquitectura e natureza. A arquitectura enquanto objecto de criação, não perdura muito tempo no seu estado inicial, a forma tal como foi idealizada pelo arquitecto, torna-se rapidamente objecto da acção do tempo, aproximando-se, através de um longo processo, da condição inicial e possivelmente da condição total de natureza. No caso da obra em estudo uma vez que é construída no interior da ruína, a sua degradação nunca será muito visível, porém ao construir esta nova estrutura no seu interior, souto de moura dá à sua intervenção parte da história associada à própria ruína e torna a intervenção parte do lugar, quase invisível. Neste caso a ruína é o elemento que permite unificar a arquitectura e a natureza. FIG. 1

“…não é o lugar que dá fama à ruína, é esta que enobrece e embeleza o lugar.” [1] Mas a ruína não se trata apenas de um resultado do tempo sobre a matéria, é a metáfora de um fim anunciado ou quiçá o principio de uma nova natureza, é também a representação de uma memória, é um registo de um tempo passado que sabemos que nos pertence. Assim estes elementos, registos de outros tempos, essenciais para a “sustentabilidade emocional” de uma sociedade, determinam, que a partir dos mesmos se possa inventar ou imaginar memórias colectivas. As ruínas são formas que nos remetem para o passado, não tem necessariamente de lhe pertencer, souto de moura é exemplo disto quando cria a ruína de forma a dar fundamento ao seu projecto. Usa a memória como produto da imaginação. Os objectos que remetem para o passado cumprem a função de ligar o passado ao presente e assim suportam as culturas, necessitam de uma memória, de uma história. “Porque a ruína deixa de ser Arquitectura e passa a ser natureza. Mantive a ruína para manter essa pretensão de ser quase obra natural, anónima” [2] A ideia principal é muitas vezes baseada na relação da ruína com o novo e da ruína com o sítio. A ruína é muitas das vezes encarada por Souto de Moura como peça estruturante, que justifica e dá força a todo o projecto. Exemplo disto é a obra em estudo, “Ruína no Gerês” (1980-82), primeira obra feita de forma totalmente autónoma, de uma inocência assumida pelo próprio, respeitando a preexistência (antigo celeiro abandonado) realçando-a com os novos materiais, dos quais se destaca o pano de vidro e a cobertura. Souto Moura na ruína do Gerês, realça e defende a imagem de fim ao invés de a restaurar por completo, como se de um cirurgião se tratasse, pega no cadáver ali plantado e coloca-lhe um novo coração, sem nunca tocar na pele (os muros de pedra, foram como que cristalizados, a ruína parou no tempo. Como se o arquitecto pretendesse romper o ciclo responsável pela transformação do artefacto em Natureza), pois é ela que aproxima a sua intervenção da natureza, de um estado de perfeição, ambicionando chegar ao estado de anonimato, um anonimato, que não tenciona contar histórias, mas sim deixar as pessoas “ouvir histórias” (criando condições e motivos, para novos utilizadores usufruírem de um espaço recuperado para ser reutilizado). “Na medida em que desenvolve seu trabalho, ele preserva um tipo de necessidade nostálgica por um suporte físico para a memória do sítio, seus usos prévios, trilhas, e edifícios demolidos ou a serem transformados. Tal obsessão poética e romântica pode ser levada ao extremo na criação de contextos artificiais, falsas ruínas a serem restauradas, novas paredes de velhos tempos que interceptam, ao mesmo tempo em que suportam, as novas composições, tanto separando algumas áreas quanto estabelecendo novas linhas de continuidade. A construção do sítio, que nunca é tratado como um mero cenário para um novo objecto, pode mesmo tornar-se sua dissimulação.” [3]

FIG. 2 [1] Lord Byron citado por Carlo Carena, Ruína-Restauro, in Enciclopédia Einaudi Volume I memória história, p.109 [2] Eduardo Souto de Moura [3] Alexandre Alves Costa (1990, p. 59)

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O uso da ruína como forma de representação é encarado como uma tentativa de domínio do tempo como matéria de projecto que se reflecte no lugar imaginado, pelo arquitecto e também no tempo imaginado. “A casa foi construída no interior dessas paredes, dissimulando-se o mais possível na paisagem – como demonstra o recurso ao plano de vidro, que reflecte e transporta a natureza para o interior da casa ao mesmo tempo que a dissimula do exterior; o tecto plano, indispensável para a conformação do espaço interno, foi colocado, também de forma a ser totalmente imperceptível do exterior; a divisão interna, por meio de um plano e um pilar confirma o carácter minimal da intervenção resultante de um processo e não de uma ideia formal concebida a priori. A reconversão desta ruína foi o primeiro passo de uma pesquisa lúcida sobre os processos de arquitectura e da natureza, e da sua compatibilidade fixados neste projecto com o objectivo de ser a obra anónima, que é o contrário de passar despercebida” [4] FIG. 3

O vidro o aço, a cobertura plana, a forma imaculada como todos estes elementos são desenhados até ao mais pequeno detalhe, assim como a precisão na sua colocação, contrastam com o passado, acentuando o corte, denunciando um novo tempo. Um tempo que pretende continuar a utopia clássica de aproximação à natureza. “…cheguei à conclusão que renovações ou recuperações num edifício têm que ser muito radicais; construir algo de novo tem que ser radical. Quando se unem dois tipos de edifícios, velho e novo, o novo, tem que ser uma boa solução radical” [5]

[4] Eduardo Souto de Moura in (trigueiros, 2000 p.34) [5] Álvaro Siza (em entrevista por Dorien Boasson, in Arquitectura e renovação em Portugal, p.25)

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ASPECTOS CONSTRUTIVOS A RELAÇÃO DO PLANO DE VIDRO COM A LAJE A ruína do geres apresenta um muro pré-existente em pedra que vai sofrendo viragens (torções) nos cunhais, sendo somente interrompido por um grande plano de vidro que faz a relação da casa com a paisagem. O que acontece é que quando o plano de vidro sobe até a testa da laje de cobertura, dissimulando a fresta (pela sua repercussão na materialidade do vidro), consideramos que esse plano se expressa como meio de afirmação do muro, enquanto que, quando o plano de vidro sobe até ao limite inferior da laje, esta cai sobre os muros e o próprio pano de vidro, como se de um “tampo” se tratasse, e transmite assim a ideia de ficar emoldurado, assim colocado, o vidro reforça a percepção de uma “caixa”, isto é o que acontece na ruína do Gerês, que de forma muito simplificada se pode comparar a uma pequena caixa, encaixada milimetricamente no interior de uma ruína. Esta solução resulta da necessidade de, em alçado, a composição ser constituída por cheios e vazios (muros e planos de vidro) para que não aparentem ter remate superior – uma pequena mentira, uma vez que essa articulação continua a existir, mas escondida.

VIDRO ESPELHADO (INTERIOR/EXTERIOR) A casa nunca se encontra completamente dissimulada, é apenas denunciada por um plano de vidro, que reflecte a paisagem natural envolvente. O vidro, através de reflexo, transfigura-se em natureza. O recurso ao vidro espelhado surge como necessidade de ocultar, por completo a testa da laje (que resulta da necessidade de evidenciar o muro de vidro) o que confere uma dupla dimensão á fronteira interior/exterior provocando uma leitura contraditória, enquanto que no interior a continuidade visual com a paisagem é evidente (fronteira dissimulada), no exterior, o vidro espelhado oculta a imagem do espaço interior, oferecendo uma natureza reflectida em seu lugar (a fronteira é evidente). Este reflectir da natureza em seu redor ajuda, no diluir da própria obra, na paisagem, auxiliando na sua integração no lugar, uma vez que a sua presença no exterior não é demasiado forte.

FIG. 4

CAIXILHARIA (INTERIOR/EXTERIOR) A caixilharia de correr permite, efectivamente, uma abolição física da fronteira/exterior, e acima de tudo, representa a flexibilidade de poder tornar um espaço exterior, num prolongamento do espaço interior. A ruína no Gerês possui, 3 planos de correr (2 planos de vidro e um plano opaco, que serve de divisória interna) que se encontram num ponto, reforçado pela presença de um pilar. A partir desses 3 planos podem ser recolhidos. O recuo das caixilharias dos planos de vidro permite uma nova unificação da habitação com a natureza, é por isso que possivelmente souto moura prescinde do avanço do envidraçado (ainda que de poucos centímetros) o que lhe daria mais área útil, mas que tornaria a caixilharia mais visível, quebrando a leitura e dissimulação, as caixilharias ao estarem recuadas, encontram-se ainda em parte escondidas pela própria estrutura da ruína.

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O PILAR ISOLADO “o sistema construtivo é quase sempre o mesmo: paredes, tecto em contínuo, em betão armado, e quando necessário um pilar metálico fora do contexto (ajuda a definir espaços) ”. [6] Na pequena habitação do Gerês encontramos um esbelto pilar de betão que possui uma secção mínima adequada à própria dimensão da casa, a secção deste pilar corresponde á largura da parede divisória entre a zona de estar e dormir, colocado no alinhamento dessa parede e sensivelmente á mesma distância das extremidades do plano de vidro da fachada, o pilar assume-se não só como um elemento de pontuação do espaço, mas também como auxílio na definição e organização do próprio, assim como de forma funcional, como um reforço estrutural que sustenta a laje de betão da cobertura, este pilar e a parede, juntos fazem referência ao sistema pontual e ao sistema maciço, que neste caso específico, nos aparecem em simultâneo. Este tipo de sistema, é muito recorrente na obra de souto moura, mas também na obra de Álvaro Siza. A obra à primeira vista não aparenta ser complexa, mas é quando a começamos a dissecar, que nos apercebemos do esforço associado à dissimulação dos sistemas construtivos, o que nos faz acreditar na simplicidade da obra, esta complexidade dissimulada é crucial para a resolução dos problemas, e a sua simplicidade aparente evita que, a imagem global da obra seja prejudicada, pelo excesso de pormenor à vista.

FIG. 5

FIG. 6 [6] Souto de Moura, Expositivo, et ul 2003 p 92.

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INFLUÊNCIAS E REFERÊNCIAS PARA A OBRA DE SOUTO DE MOURA SOUTO MOURA E MIES VAN DER ROHE Uma das principais referências para Souto de Moura é sem dúvida, e de acordo com inúmeros artigos, textos e citações do próprio, o Arquitecto Mies van der Rohe. Para Mies o arquitecto tinha como principal obrigação representar através do desenho rigoroso e cartesiano, da perfeição do detalhe, o universo e a sua essência, “ambicionando ordenar tanto o território como a vida.” Desta forma, para Mies, a arquitectura não é algo meramente formal, é mais que uma concretização formal, é a procura de uma inter-relação entre espaços, compondo e completando um universo perfeito, a obra. A imagem de um esqueleto para cada edifício, que em última análise é a estrutura que resiste ao tempo, tornou clara uma procura da essência a partir do interior, ou seja, da estrutura, tornando-se esta imagem de edifícios em construção, com a estrutura em aço ou betão á vista, o objectivo e conceito construtivo ideal.

FIG. 7

Para podemos compreender a utopia neste conceito de Mies, temos como bom exemplo o Pavilhão de Barcelona (1929), que Souto Moura teria gostado de ser o próprio a desenhá-lo (conforme afirma a biografia da universidade do Porto), nele está expressa a clara função de atravessamento, de percurso contemplativo, porém está provido de mecanismos que o defendem como o tecto branco que representa um céu e uma estrutura cartesiana, muito regular e correctamente desenhada que representa o próprio universo e exprime pelo menos a intenção de aproximação a essa condição. Souto de Moura pega nesta noção de Mies e aplica-lhe uma nova noção de uma epiderme, uma pele, que, segundo mies, não deve esconder a estrutura, deixando-a perceptível, nem tem por obrigação corresponder á estrutura original, como são exemplos os seus edifícios espelhados de Chicago. Assumindo portanto uma forma dissimulada porém perceptível. Para Souto de Moura, este conceito de pele surgirá através de um fascínio pelas ruinas, com as quais teve contacto desde uma fase muito inicial da sua carreira – nomeadamente na obra em estudo – sendo que alguns críticos afirmam que estas primeiras experiências se baseavam muito na aplicação do modelo Farnsworth ao espaço confinado que é a ruína, em que a pele assumia igualmente o carácter estrutural, delimitada no topo por uma laje e na frente por um plano de vidro (referido noutro tópico) enquanto imponentes muros “belos pela sua estabilidade e precariedade” (muros característicos do norte que o fascinam desde a intervenção no SAAL), dão forma e determinam a implantação do novo corpo, tornando o conjunto num objecto de contemplação – tal como acontece no Pavilhão de Barcelona

FIG. 8

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INFLUÊNCIA NAS OBRAS SEGUINTES A ruína no Gerês, enquanto primeira experiência, serviu de referência a obras posteriores de Souto de Moura, os casos onde esta influência é mais marcante são as casas de Baião e Moledo. Existe nelas uma verdadeira simplicidade volumétrica, onde é notável a ausência de muros soltos e, por outro lado, a relação muito forte com o tema da caixa. A principal característica da Ruína no Gerês, que Souto de Moura aperfeiçoou na Casa em Baião (1990-93), foi esta ideia de dissimulação no lugar, mais especificamente, nas ruínas preexistentes (muros de suporte regulares em pedra e o esqueleto de uma casa), que, tal como os suportes dos livros numa estante, suportam e delimitam a nova extensão de vidro espelhado – utilizado para reflectir a natureza envolvente, de modo a melhor integrar a casa no lugar - este envidraçado cobre toda a testa da laje, dissimulando-a, como referimos anteriormente.Num segundo momento o carácter de dissimulação da casa é também realçado pela cobertura composta por vegetação espontânea, que ajuda a acentuar a dissimulação com a natureza circundante. Existe ainda a ruína lateral à casa, que surge como um jardim de inverno, e a arquitectura torna-se natureza. Mais tarde, Souto de Moura aplica este modelo na casa Moledo (1991-96). A habitação unifamiliar no Minho é outro exemplo notável da dissimulação da obra no lugar. Aqui, num lugar de socalcos, e própria obra é um socalco, da mesma forma que o exemplo anterior, estaria completamente dissimulada no terreno se não fosse a presença de um plano de vidro, indispensável para a habitabilidade da casa.Porém, nesta obra, Souto de Moura não se limita apenas a colocar um novo corpo, existe toda uma manipulação do sítio realizada em sintonia com o desenvolvimento do projecto da casa. Os socalcos existentes sugeriam uma ideia, mas a sua altura não correspondia a uma solução possível. Face a este paradoxo, o arquitecto viu-se obrigado a alterar profundamente o sítio. Os socalcos, apesar de existirem (e de terem, de certo modo, introduzido parte da solução) viram a sua altura ser duplicada a fim de melhor se relacionarem com o pé direito que a casa necessitava.Numa posição dominante sobre o Atlântico, junto á fronteira com Galiza, a cobertura simples é um ponto de referência, limitada pelo plano de vidro da fachada e o plano de vidro traseiro, exposto a um sulco de rocha mãe, esta laje adquire um carácter de “mesa”, com a chaminé e as saídas de serviço dispostas á semelhança de uma composição de natureza morta tridimensional. Contudo a influência da ruína do Gerês em Baião e Moledo sobressai num último aspecto: não sendo nenhuma das três habitações de carácter urbano, definem-se os muros existentes não como limites do lote mas como muros de contenção de terras; não obstante, as casas aproveitam ou redefinem esses muros, aproveitando-os como frente para as casas – rasgando-os para inserir os planos de vidro – que se adequam à direcção principal da casa, conformada como um volume paralelepipédico ou como um conjunto de planos.

FIG. 9

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CABANA PRIMITIVA OU ABRIGO As interpretações de vários autores atribuem ainda significados, um tanto ao quanto poéticos, à obra. O primeiro exemplo é de Ronaldo A. Ströher que compara a obra a “uma construção feita por Norman Foster para refúgio individual, numa encosta da Cornualha, adequadamente chamada de “Cockpit Gazebo”, acrescentando que: “tanto o refúgio de Foster, como o do Gerês, Baião ou Moledo, representam essa atitude do abrigo, com tecnologia e conforto absolutamente contemporâneos, disfarçado pela ruína ou pela própria natureza. É como se (…) o homem contemporâneo, por perplexidade ou desilusão, colocasse a sua Farnsworth dentro de uma caverna da Anatólia, fugindo do convívio social e participando da natureza apenas quando convém, sem abrir mão, no entanto, das conquistas tecnológicas e do conforto a que tanto se acostumou.” [7]

A segunda comparação é feita por Raymund Ryan e diz: “em meados do século XVIII o abade Laugier escreveu sobre a cabana primitiva, uma unidade essencial de habitação que, surgida do desconhecido, se converteria na origem de estilos e sistemas inteiros. O substituto da ruina do Gerês, com uma fachada de vidro móvel e o seu espaço único que se abre para a natureza, é a «cabana primitiva» de Souto de Moura. Ainda que o edifício seja minúsculo, quase invisível, e esteja muito afastado da cidade, continua a ser um arquétipo na obra do arquitecto.” [8] A terceira comparação é feita por nós, e diz respeito a uma das obras de Corbusier, obra esta não tão falada como outras, mas que influenciou numerosas arquitecturas e reflexões, trata-se de uma pequena cabana de madeira construída no inicio do século 50 na costa de cap-Martin, como local para passar as férias de verão e espaço de convívio e debate entre amigos, o “petit cabanon”. Que é muito semelhante à ruína do Gerês, não só no que diz respeito ao fim para que foi construída, mas também em termos de aproveitamneto de áreas, assim como no uso de tecnologia, e sistemas construtivos de elevado grau de perfeccionismo, que permitem a garantia de conforto no seu interior.

FIG. 11 FIG. 12 FIG. 13 [7] (in CASAS DO NORTE DE EDUARDO SOUTO DE MOURA, Ronaldo de Azambuja Ströher, pag.110) [8] (in Construcción audaz: com 284 Ilustraciones, de Raymund Ryan, p.74)

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CONCLUSÃO

ruína do Gerês revelou assim a capacidade de unir duas gerações distintas, dois programas, um “dispositivo capaz de relacionar diferentes tempos históricos sedimentados”, mais especificamente, a intervenção tornou o que em tempos foi um celeiro num espaço de habitação, e porque nada é perene, só o tempo sabe o que um dia ela virá novamente a ser. O mesmo se sucede com as mais recentes obras de Souto de Moura, demonstrando, uma após outra, o desenvolver desta sensibilidade pelo pré-existente e pelo local, enquanto testemunhos do tempo e da história, até o momento em que esses testemunhos são reinventados e manipulados pelo redesenhar da ruína.

FIG. 14

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BILBIOGRAFIA

Eduardo Souto de Moura, 22 Casas – Ordem dos Arquitectos Souto de Moura: Introductions, Souto de Moura, Wilfried Wang e Álvaro Siza – Editorial GG, SA, Barcelona 1990 Fragmento, Representação da Memoria na Arquitectura – Prova Final para Licenciatura em Arquitectura, FAUP 2005/2006 Forma e Estrutura na Obra de Eduardo Souto de Moura, Oito Tópicos de Arquitectura: A Contradição como parte do Projecto – Prova Final para Licenciatura em Arquitectura, FAUP 2006/2007 Casas Do Norte De Eduardo Souto De Moura, Ronaldo De Azambuja Ströher, ARQTexto 2005 Construcción Audaz: Com 284 Ilustraciones, De Raymund Ryan – Editorial NEREA 2002 Conversaciones con Eduardo Souto de Moura, Xavier Güell – Proyectando Leyendo: Apuntes De Proyectos 1, Escuela Técnica Superior De Arquitectura De Sevilla 2008 New Stone Architecture, David Dermie – McGraw-Hill Education 2003 Casas Refugio, Gustau Gili Gafetti – Editorial GG, SA Barcelona 2002

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ANEXOS

FIG. 15 a 20 FIG. 21

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ÍNDICE TEMÁTICO INTRODUÇÃO

1

TEMPO E RUINA

2

ASPECTOS CONSTRUTIVOS A RELAÇÃO DO PLANO DE VIDRO COM A LAJE

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VIDRO ESPELHADO (INTERIOR/EXTERIOR)

4

CAIXILHARIA (INTERIOR/EXTERIOR) O PILAR ISOLADO

4 5

INFLUÊNCIAS E REFERÊNCIAS PARA A OBRA DE SOUTO DE MOURA SOUTO MOURA E MIES VAN DER ROHE

6

INFLUÊNCIA NAS OBRAS SEGUINTES

7

CABANA PRIMITIVA OU ABRIGO

8

CONCLUSÃO

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BIBLIOGRAFIA

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ANEXOS

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ÍNDICES

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ÍNDICE DE IMAGENS CAPA FIG. 1 FIG. 2 FIG. 3 FIG. 4

FIG. 5

FIG. 6 FIG. 7 FIG. 8 FIG. 9 FIG. 10 FIG. 11 FIG. 12 FIG. 13 FIG. 14 FIG. 15-20 FIG. 21

ESBOÇO DO PROJECTO in Eduardo Souto Moura - 22 Casas RUINA E SUA IMPLANTAÇÃO NO TERRENO in Eduardo Souto Moura - 22 Casas RELAÇÃO DA RUINA COM A VEGETAÇÃO ENVOLVENTE in Eduardo Souto Moura - 22 Casas FACHADA PRINCIPAL DE VIDRO in Eduardo Souto Moura - 22 Casas RELAÇÃO ENTRE A RUINA E O NOVO, EVIDENCIANDO O PLANO DE VIDRO, O PILAR E A TESTA DA LAJE in Eduardo Souto Moura - 22 Casas PILAR ISOLADO, ILUSTRANDO SUA RELAÇÃO COM O PLANO DE VIDRO E O PLANO POSTERIOR in Eduardo Souto Moura - 22 Casas COBERTURA E PAISAGEM in Eduardo Souto Moura - 22 Casas PAVILHÃO BARCELONA DE MIES VAN DER ROHE in www.miesbcn.com FARNSWORTH DE MIES VAN DER ROHE in pt.wikipedia.org/wiki/Ludwig_Mies_van_der_Rohe FOTO E AXONOMETRIA DA CASA EM BAIÃO in smg.photobucket.com/profile/rael_portugal FOTO E AXONOMETRIA DA CASA EM MOLEDO in wikiarquitectura.com/index.php/House_in_Moledo COCKPIT GAZEBO DE FOSTER in Norman Foster - Team 4 Magazine A CABANA POR LAUGIER in pms2004.no.sapo.pt/arquitectura PETIT CABANON in http://www.modavivendi.com/?p=273 PAISAGEM DESDE O EXTERIOR DA HABITAÇÃO in Eduardo Souto Moura - 22 Casas PLANTAS CORTES E ALÇADOS in Eduardo Souto Moura - 22 Casas Ortofotomapa - in bing.com/maps/

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