Sumรกrio
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Prefácio
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Capítulo 1 Sonho recorrente
17
Capítulo 2 Difícil recomeço
25
Capítulo 3 Na escuridão
33
Capítulo 4 O cenário da infelicidade
43
Capítulo 5 Resistindo à verdade
55
Capítulo 6 Enfim uma pista
65
Capítulo 7 Mergulho no passado
73
Capítulo 8 No vale das sombras
81
Capítulo 9 O resgate
93
Capítulo 10 Entre a luz e a treva
103
Capítulo 11 Doce reencontro
111
Capítulo 12 Prazer que dura pouco
117
Capítulo 13 A escolha de cada um
127
Capítulo 14 Abençoada oportunidade
135
Capítulo 15 Voltando à carne
143
Capítulo 16 Luta contra a depressão
153
Capítulo 17 Marcas da rebeldia
163
Capítulo 18 No aconchego doméstico
173
Capítulo 19 Enfrentando a realidade
181
Capítulo 20 Compromisso aceito
191
Capítulo 21 Transcomunicação
201
Capítulo 22 A nova chance
213
Capítulo 23 Vínculos perturbadores
223
Capítulo 24 Triunfo do bem
233
Capítulo 25 Perdão incondicional
243
Capítulo 26 O trabalho continua
246
Extras
Prefácio VENHO MAIS UMA VEZ FALAR diretamente aos jovens, a quem dedico profundo amor e os melhores desejos de felicidade e sucesso. Muito me preocupo com esses queridos irmãos que iniciam a marcha na terra com o ímpeto e a confiança de que tudo têm nas mãos, de que tudo podem. Dirijo minhas palavras e meus esforços aos moços, na esperança de que possam caminhar vitoriosos, dando passos certos e firmes na estrada do bem. Também eu já atravessei, cheio de arroubos e determinações, essa fase marcante e decisiva em que nos lançamos para a vida com o desejo de tudo abraçar e tudo mudar. É natural. Mas que, dentre os muitos sentimentos que acalentam, os mais novos jamais se esqueçam do amor a Deus e ao próximo, síntese vii
dos valores que lhes trarão sabedoria para as resoluções a serem tomadas. Atalhos difíceis e dolorosos poderão ser evitados, e a existência aproveitada ao máximo, em toda a sua beleza e emoção, se apenas e tão somente aprenderem a amar e respeitar as leis divinas. Por fim, faço minhas as reflexões de Emmanuel: A juventude pode ser comparada a esperançosa saída de um barco para viagem importante. A infância foi a preparação, a velhice será a chegada ao porto. Todas as fases requisitam as lições dos marinheiros experientes, aprendendo-se a organizar e a terminar a viagem com o êxito desejável. A todos os jovens, o meu voto de que a vida seja uma bela e longa viagem, cheia de aventuras, desafios e alegrias, e que ao final da jornada cada um esteja realizado e feliz pelas escolhas que efetuou. Que Jesus os abençoe e os guie. Bento José Atibaia, junho de 2011
viii
Capítulo 1
Sonho recorrente COMEÇAVA A ESCURECER. Sentados em uma trilha estreita, que terminava logo à frente na densa floresta amazônica, dois jovens buscavam fôlego para prosseguir. Virando o cantil quase vazio, Matilde tomou os últimos goles de água; estava sedenta. Rubens arrancou-lhe a vasilha das mãos e gritou; – O que está fazendo? Não vê que temos de guardar essa água, a única que nos resta?! – Quer que eu morra de sede? O rapaz constatou que a água tinha acabado e jogou o cantil de volta aos pés dela. – Venha, precisamos continuar. – Estou cansada... e não quero entrar na floresta... sinto medo... Ele agarrou-a pelos braços e arrastou-a com energia. – Vamos, temos de nos esconder na mata. – Onde estão meus pais? E os seus? Onde foram 11
parar? Quero encontrá-los, Rubens, estou com muito medo! Os dois ainda conversavam quando sons de tiros ecoaram secos, entre a algazarra dos pássaros ao findar do dia. Depois, gritos e mais tiros. Matilde pulou e juntos afundaram na mata cerrada. Enquanto corriam, ela indagou: – O que os soldados querem? – Pôr fim ao nosso movimento. – Não podem fazer isso! Não passam de bandidos a serviço do governo... – Achava que iriam ficar quietos, vendo o movimento crescer, ganhar força? Eles querem controlar tudo... A moça parou, respirando ofegante. Rubens insistiu: – Vamos, ande. Não podemos parar agora, ou nos alcançarão... – Não estou aguentando... O barulho dos soldados aumentou de súbito. Aproximavam-se depressa. Eram muitos, centenas deles. Os dois, paralisados, escutavam com clareza as ordens gritadas. – Achem os miseráveis! Não deixem nenhum vivo! Acabem com eles! Atirem sem dó, e sem perguntas. Nenhum desses malditos rebeldes deve sobreviver. De onde se agachara, Matilde avistou ao longe o lenço que a mãe usava quando fugira. Era inconfun12
dível. Estava jogado no chão, rasgado e sujo. Logo adiante, o braço da mulher surgia largado e imóvel entre as folhagens. Em lágrimas e rangendo os dentes, ela balbuciou: – É minha mãe, eles a mataram! Levantou-se e correu naquela direção, alvoroçando as folhas ao redor. Ao chegar perto, comprovou o que temia. A mãe acabara de morrer. Ergueu-se furiosa. Ia gritar, quando mão forte tapou-lhe a boca e foi arrastada mata adentro. Rubens permanecera agachado e a perdera de vista. Queria correr atrás dela, porém os perseguidores estavam cada vez mais próximos. Deitou-se abaixo de um toco e ficou imóvel até que desaparecessem. Passou a noite ali mesmo, rezando para que nenhum dos perigosos animais da floresta o atacasse. Pela manhã, seguiu os rastros que supunha serem de Matilde. Encontrou um grupo de rebeldes que se dispersara, fugindo dos soldados. Juntou-se a eles, endossando a animosidade que sentiam pelo governo. Estavam enlouquecidos de ódio, agora que vários deles haviam sido covardemente mortos pelos soldados – tal como a mãe de Rubens e a de Matilde, sua melhor amiga. – Vamos acabar com esse governo! – gritou Diego, que logo se transformou no líder daquele pequeno grupo. Um deles riu. – Somos um bando de fracos maltrapilhos. Como 13
lutar contra o exército nacional? Eles possuem armas poderosas, que não temos a mínima condição de enfrentar! Enquanto enterravam alguns de seus amigos, Diego declarou, seguro: – Seremos a maior e mais firme resistência de que já se teve notícia neste país. – Resistir como? – o outro insistia. – Compraremos armas tão potentes quanto as deles, e os acertaremos com as mesmas balas que nos atingiram. – E onde arrumaremos o dinheiro? Tirando do bolso um maço de folhas de coca, esmagou-as e disse: – Não se preocupe. Sei muito bem onde arranjaremos primeiro o dinheiro e depois as armas. Subiu em uma pedra e bradou a plenos pulmões, erguendo o maço de folhas: – Quem está comigo? Quem quer acabar com os lustradinhos que acham que podem mandar em tudo? Esses imperialistas também têm de pagar! É deles que vamos tirar o dinheiro. – Como? – gritou alguém no meio do povo. Mostrando as folhas, garantiu: – Eles nos darão tudo o que queremos... Juntem-se a mim, e seremos a maior força desta nação! SERGINHO SENTOU-SE NA CAMA, suando frio. 14
Vinha tendo aquele sonho repetidas vezes e não sabia o que significava. Sentia como se houvesse participado daquela perseguição e de tudo aquilo... No entanto, ao acordar, as lembranças se desvaneciam... Lívia bateu e entrou. – Bom dia. – Bom dia – respondeu meio mal-humorado. – Pensei que hoje fosse acordar mais animado. Afinal, estava tão ansioso para começar sua busca... Serginho se lembrou da namorada e deu um pulo da cama. – Paula! É verdade! Havia até esquecido... – Esqueceu? – Tive outra vez aquele sonho. – O da floresta? – Isso. De uns tempos para cá, sonho sempre com a mesma coisa... Estranho... O que quer dizer, Lívia? – Sonhos podem ter várias origens; inclusive, podem ser lembranças do passado. – Será? Não me identifico com ninguém dentre aqueles com quem tenho sonhado... – Tem certeza? – fitou-o séria ao fazer a indagação. Apesar de fixar o olhar na prima, o jovem mantinha a mente distante, nos personagens com os quais acabara de sonhar. Ela, então, arrancou-o de seus pensamentos: – Vamos, Messias nos aguarda; vai à crosta conosco em busca de Paula. 15
Capítulo 2
Difícil recomeço A SALA ESTAVA NA PENUMBRA, somente uma nesga de luz entrava pela fresta da cortina entreaberta. Ao som de sua cantora preferida, que com voz límpida enchia o ambiente, Patrícia, esparramada no sofá, tinha o corpo inerte e a mente vagando sem destino. De vez em quando pegava o copo e sorvia o conteúdo em grandes goles. Seu maior esforço era ir até a geladeira e pegar outra cerveja. Espalhadas por todos os cômodos do apartamento, multiplicavam-se as latas vazias. Arnaldo virou a chave na porta e entrou, mais uma vez encontrando a esposa entregue à depressão. Sem se deter, foi direto para o próprio quarto. Desde a morte de Paula não compartilhavam o dormitório. A música parou por um momento e depois foi a televisão, com volume exagerado, que começou a exibir um antigo show de Elis Regina. Patrícia agora 17
se entregava mais profundamente à melancolia e à tristeza. Percebera a chegada do marido, que a tratava com total desprezo. Já quase não conversavam. O belo e sofisticado apartamento, localizado no Alto de Pinheiros, na capital paulista, tinha latas e garrafas de bebidas por toda parte. Quando Serginho entrou, seguido por Lívia, Messias, Arnaldo e Sônia, ficou penalizado. Encarando o instrutor que carinhosamente o acompanhava desde a colônia espiritual, justificou-se: – Era por isso, Messias, que eu sentia tanta necessidade de vir em socorro desta família... A situação é lastimável... Messias manteve-se calado, em oração. Serginho, depois de observar atentamente tudo ao redor, olhou para a prima e questionou: – Não entendo por que ela se entrega à depressão dessa forma... Não procura auxílio? – A fé é uma bênção, Serginho, e nas horas mais difíceis nos sustenta e nos ajuda a encontrar o caminho. É o que falta a Patrícia. Carrega enorme culpa e se cobra pelo que aconteceu à filha. Além disso, o marido também a acusa, ainda que sem articular palavras. – Mas por quê? – Ela não soube dar a Paula aquilo que deveria. Na verdade, rejeitou-a, desde o princípio. Sentia atração e repulsa pela menina, desde a mais tenra idade. 18
Lívia interrompeu a explicação e pediu que Serginho igualmente se conservasse em oração. Arnaldo, que já havia trocado de roupa, entrou na sala e com violência arrancou o copo das mãos da esposa. Muito irritado, gritava: – Não suporto mais esta situação! – Cale a boca! – Patrícia afrontou-o. – Você não manda em mim. Tudo isto me pertence. Tem de me aguentar... Sabe que não pode ordenar-me nada. Sou dona de tudo o que possuímos. Agora me diga: o que fará? Pretende separar-se de mim? E correr o risco de perder a boa vida? Ela fez breve pausa, agarrou o copo de novo e se largou no sofá. Então continuou: – Não, querido. Sei que sua ambição não lhe permite tomar essa atitude. Portanto, volte ao seu canto e deixe-me em paz com minha tristeza. O marido se calou por alguns instantes; depois falou, sinceramente interessado: – Afinal, por que todo esse sofrimento? Você nunca se importou tanto com Paula... Nem se relacionavam direito. Sua filha cresceu nas mãos de babás, tendo-a poucas vezes por perto. Eu lhe avisei que deveria dar maior atenção à menina, mas você não demonstrava interesse em passar mais tempo com ela. E assim, o que significa esse procedimento? Até compreendo que sinta falta dela... Quanto à depressão, que a deixa prostrada desse jeito, não 19
consigo entender. Você precisa de ajuda. Tem ido ao psiquiatra? Completamente embriagada, Patrícia retorquiu: – Não é da sua conta. Você não é capaz de me compreender... Nunca foi. Ela se afastou e o marido a observou calado, até que resmungou entre os dentes: – Mulher inútil... Ao notar que Arnaldo deixava o lar, ela ergueu de leve os olhos por sobre os ombros, com desdém, e gritou: – Não ouse tornar a sumir por vários dias, está me ouvindo? Ou acabo de vez com sua ilusão de riqueza... Não houve resposta. Ele desaparecera e Patrícia, rangendo os dentes, chorou amargurada. Serginho, que assistira à cena sentado num canto da sala, virou-se para a prima e comentou: – Sinto-me péssimo em ficar aqui de espectador, sem fazer nada. Temos de ajudar essas pessoas... Angustiado, o rapaz suspirou. Messias o advertiu, firme: – Se deseja mesmo fazer algo positivo, primeiro fortaleça seus pensamentos e sentimentos. Não se deixe envolver dessa maneira pelas pesadas energias que dominam e destroem o lar de nossos irmãos. Por certo eles necessitam de ajuda, mas antes precisam ajudar-se a si próprios. Caso não tenha autocontrole, você os prejudicará ainda mais, acentuando as vibra20
ções deletérias que já dominam esta casa. Serginho apertou a mão da prima, carinhoso, e com um sorriso fitou os demais membros do pequeno grupo: – Ainda bem que tenho vocês ao meu lado. Seria impossível fazer qualquer coisa sozinho. – Não se subestime, você tem feito progressos... – Lívia falou ternamente. – Entretanto, acho o aprendizado tão lento... Messias interveio com serenidade: – O crescimento verdadeiro é gradativo. Contudo, uma vez que um conhecimento é de fato conquistado por nossa alma através da experiência, da vivência, nunca mais o perdemos... Ele passa a fazer parte de nossa bagagem interior. O rapaz sorriu de novo e observou: – Como dizem, vale a pena progredir. A afirmação deu ensejo ao comentário de Lívia: – Progredir não é uma pena, mas exige trabalho consciente e constante, e vale todo o nosso esforço. As recompensas são muito grandes... Primeiro surgem dentro de nós, depois alcançam o exterior, alterando a paisagem à nossa volta e interferindo em nossas experiências futuras. Temos a liberdade das escolhas e colheremos sempre o resultado delas. Serginho se calou por instantes, até fitar a prima e pedir: – Vamos orar por eles... 21
Messias estendeu as mãos, convidando o grupo a formar um pequeno círculo, e aquiesceu: – Sim, vamos interceder por nossos irmãos. O coordenador da equipe guardou breve silêncio, e em seguida proferiu prece singela e cheia de emoção. As entidades do reduzido grupo eram pouco a pouco envolvidas em luz cintilante, pelo amor que permutavam. Como um dínamo potente, as vibrações amorosas aumentavam, gerando luz ao redor. Antes mesmo que Messias terminasse a curta oração, o ambiente tornou-se mais sombrio. Vultos enegrecidos começaram a ser vistos caminhando por ali. Alguns usavam pesado capuz que lhes ocultava o semblante, outros tinham olhos enraivecidos e aparência completamente descomposta; eram como farrapos humanos, cheios de ódio. De súbito, a atmosfera fez-se ainda mais densa. Foi aí que Messias alertou: – É hora de partir. Serginho tentava dizer algo, quando seu coração começou a bater descompassado, a voz calou-lhe na garganta e a respiração falhou. Saíram. Somente ao atingirem uma região mais afastada, no campo, Messias quebrou o silêncio, perguntando ao rapaz: – Sente-se melhor? – O que foi aquilo? – São as companhias com que nossos irmãos sintonizam através de hábitos mentais. 22
– Nossa! Foi horrível! Que seres apavorantes... Lívia colocou o dedo na boca do primo, impedindo-o de continuar, e esclareceu: – São nossos irmãos que ainda não conseguem enxergar a luz. A influência que exercem sobre a família é acolhida sem resistência e estabelecem perfeita troca de fluidos, alimentando-se mutuamente. Abatido e com voz trêmula, Serginho disparou: – E agora, como poderemos ajudá-los? E como vamos auxiliar Paula? Onde será que ela está neste momento? E em que condições? Messias e Lívia trocaram expressivo olhar, sem articular palavra.
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